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_____________ CAPÍTULO 7 _____________

O DOM DE JESUS
Estávamos no meio de uma comissão da igreja, quando alguém
apresentou uma carta urgente. A carta era de um dos membros da
congregação, que se convencera de que a Igreja era Babilônia e exigia
que seu nome fosse removido dos registros da congregação.
Depois de ler trechos da carta, ficamos todos sem fala. Alguns
começaram a lacrimejar. Como era possível? Todos nós o
conhecíamos. Ele era um membro calado, cauteloso e fiel, com um
semblante triste, mas de espírito bondoso. Sozinho desde que sua
esposa o abandonara, sabíamos que ele frequentava uma reunião
semanal ou quinzenal de uns poucos adventistas, dirigidos por um
homem influente que se opunha à igreja. Suspeitávamos que aquelas
reuniões eram como veneno para a alma e, depois de investigar um
pouco mais, percebemos o estrago. Nosso amigo fora a primeira
vítima.
"Eu me prontifico a visitá-lo!", disse Mike, o líder do ministério
pessoal. O estranho foi que ele disse isso com um sorriso no rosto,
como se soubesse de algo que não sabíamos. Ele visitou o irmão
solitário todos os dias — todos os dias! — por seis semanas. Ele
passava entre 45 minutos a três horas com esse irmão, todas as tardes
ou noites. Pediu que o irmão dissidente partilhasse com ele a tal nova
"luz". Ele ouvia e fazia perguntas esclarecedoras. Mike, aos poucos,
começou, sempre gentil e cautelosamente, a comentar a Palavra, o
ensino de Deus acerca da identidade e do caráter da igreja
remanescente. Depois, orava com ele, por seu crescimento em Cristo,
seu testemunho em favor de outros, sua saúde e sua vida. Fez uma
sólida amizade.
Em um sábado de manhã — nunca me esquecerei — enquanto
fazíamos o costumeiro momento de oração das 7h em uma das salas
da igreja, Mike entrou com nosso irmão confuso, lado a lado. "Louvado
seja o Senhor!", disse Mike, como introdução, com a marca registrada
de seu sorriso. “Louvado seja Jesus!”, ecoou nosso recém-resgatado
irmão, para nunca mais duvidar daquilo que Deus pensa de sua amada
Igreja, com seus tantos defeitos.
Você pode exclamar: Puxa! Visitação todos os dias por seis
semanas? Com essa dedicação e intensidade, tudo pode mudar na
igreja. E se você pensar isso, acredito que estará certo. Esse não foi um
ato incomum e esporádico de bondade da parte de Mike. Ele tem sido
assim já faz algum tempo, desde que Jesus assumiu o lugar central em
seu coração.
Certa ocasião, quando alguns casamentos começaram a fracassar
e os homens se separaram de suas esposas, Mike os convidou para
morar com ele durante o período de transição. Um a um, os homens
foram, até que os quatro quartos da casa de Mike estivessem
ocupados. Então, ele saiu e alugou um apartamento temporariamente
para si, enquanto continuava cobrindo as despesas da casa. Estudava
a Palavra com os homens e orava com eles, e especialmente por eles.
Sabia que estavam magoados, zangados e confusos acerca do futuro.
Lembro-me, distintamente, de um dos homens. A esposa dele havia
buscado conselho e me contou coisas que eu desejaria nunca ter
conhecido a respeito da quele irmão. Mas, com o passar dos meses,
cada um daqueles homens experimentou a cura de seu casamento.
Isso é um milagre assombroso, quando você considera os desafios que
alguns enfrentavam. Mike havia decidido orar até que eles voltassem
para as respectivas esposas.
Eu poderia contar outras coisas mais sobre Mike, e talvez algum
dia ele me permita escrever sua história. Você acredita que o Espírito
Santo vivia e atuava na vida desse homem? O que você pensa que é
necessário para uma vida como essa? Paulo nos dá a resposta: "Deus
quis dar a conhecer qual seja a riqueza da glória deste mistério entre
os gentios, isto é, Cristo em vós, a esperança da glória" (Cl 1:27, itálico
acrescentado).

Cristo e o Espírito
O que Paulo quis dizer com "Cristo em vós"? Isso é realmente
possível? Considere esta declaração: "E por meio do Espírito que Cristo
habita em nós; e o Espírito de Deus, recebido no coração pela fé, é o
princípio da vida eterna."1 Foi isso que você leu? Por meio do Espírito,
Cristo habita em nós. Habitar é viver ou ficar como morador
permanente. Você pode conhecer melhor o pensamento de Jesus em
sua Palavra quando Ele habita em você. Considere esta outra
declaração:

A transformação do caráter é o testemunho para o


mundo de que Cristo habita no ser. O Espírito de Deus
produz uma nova vida, levando os pensamentos e os
desejos à obediência à vontade de Cristo; e o homem
Interior é renovado segundo a imagem de Deus.2

A vida abundante que Jesus prometeu (Jo 10:10), e que todos


gostariam de viver, não é nada mais, nada menos do que Jesus em
você por meio do Espírito Santo. Quando prometeu o Espírito Santo
aos discípulos, Jesus estava dando a si mesmo por intermédio do
Consolador e, por isso, convinha que Ele partisse (Jo 16:7). "Quando
vier", disse Jesus com referência ao Espírito, "Ele me glorificará,
porque há de receber do que é meu e vo-lo há de anunciar" (v. 13, 14).
Paulo diz que, "se alguém não tem o Espírito de Cristo, esse tal não é
dele" (Rm 8:9). A seguir, diz: "Se, porém, Cristo está em vós, [...] o
espírito é vida" (v. 10). Era o Espírito de Cristo no íntimo dos profetas
do Antigo Testamento que os levava a profetizar "acerca da graça a
vós outros destinada" (1 Pe 1:10).
O "Espírito de Cristo" é um espírito que emana de Cristo ou é o
Espírito Santo?
Isaías havia profetizado que o "Espírito do Senhor", a terceira
pessoa da Trindade, repousaria sobre o Messias. Diz ele: "o Espírito de
sabedoria e de entendimento, o Espírito de conselho e de fortaleza, o
Espírito de conhecimento e de temor do SENHOR" (Is 11:2). O Espírito
é mencionado sete vezes nessa passagem, no texto original. No livro
do Apocalipse, sete espíritos são mencionados com referência ao
Cordeiro que foi morto (Ap 5:6). Na Bíblia, o número sete indica
totalidade e perfeição. Assim, Jesus é aquele cheio do Espírito, o
supremo exemplo de alguém com a plenitude da presença de Deus em
sua vida, alguém que diariamente recebia o batismo do Espírito Santo.
Essa é a razão por que Paulo e Pedro usaram a expressão "o Espírito
de Cristo". Cristo era tão cheio do Espírito Santo que os dois eram
como um só e o mesmo Deus, embora fossem pessoas distintas.
O dom de Deus
Quando consideramos a expressão "o dom de Deus" no Novo
Testamento, encontramos essa bela verdade. O dom de Deus é o
Espírito Santo ou é a salvação em Jesus? Vamos recapitular alguns
exemplos.
O primeiro é o encontro de Jesus com a mulher samaritana.
"Replicou-lhe Jesus: Se conheceras o dom de Deus e quem é o que te
pede: dá-me de beber, tu lhe pedirias, e Ele te daria água viva" (Jo
4:10).
Que dom é esse? O contexto indica o dom da salvação.
Em seguida, vem a repreensão de Pedro a Simão, por tentar obter
o dom do Espírito Santo mediante dinheiro. "Pedro, porém, lhe
respondeu: O teu dinheiro seja contigo para perdição, pois julgaste
adquirir, por meio dele, o dom de Deus" (At 8:20).
O terceiro exemplo é a imortal declaração paulina: "Porque o
salário do pecado é a morte, mas o dom gratuito de Deus é a vida
eterna em Cristo Jesus, nosso Senhor" (Rm 6:23).
No quarto exemplo, temos Paulo defendendo o dom espiritual do
celibato na igreja de Corinto: "Quero que todos os homens sejam tais
como também eu sou; no entanto, cada um tem de Deus o seu próprio
dom; um, na verdade, de um modo; outro, de outro" (I Co 7:7).
A passagem seguinte é uma das mais fortes declarações sobre
como somos salvos: "Porque pela graça sois salvos, mediante a fé; e
isto não vem de vós; é dom de Deus; não de obras, para que ninguém
se glorie" (Ef 2:8, 9).
Um último texto é uma admoestação ao tímido Timóteo: "Por
esta razão, pois, te admoesto que reavives o dom de Deus que há em
ti pela imposição das minhas mãos. Porque Deus não nos tem dado
espírito de covardia, mas de poder, de amor e de moderação" (2Tm
1:6,7).
Você observou? Três vezes, "o dom de Deus" se refere ao dom da
salvação em Cristo, e três vezes, ao dom ou dons do Espírito Santo. O
fato é que, com o Espírito, vem tudo de que necessitamos em Jesus. A
salvação e o recebimento do Espírito estão interligados.
Unicamente aos que esperam humildemente em
Deus, que estão atentos à sua direção e à sua graça, é
concedido o Espírito. O poder de Deus aguarda que o
peçam e o recebam. Esta bênção prometida, reclamada
pela fé, traz após si todas as outras bênçãos. E concedida
segundo as riquezas da graça de Cristo, e Ele está pronto
a suprir toda pessoa segundo sua capacidade para
receber.3

E por isso que, ao receber o Espírito Santo, você recebe a


salvação. O dom do Espírito é o dom da salvação. "Espere", você
pergunta, "os discípulos ainda não estavam salvos, no momento em
que receberam o Espírito no Pentecostes?" A resposta a essa pergunta
é sim e não.

Uma vez ou todos os dias?


A salvação não é algo que você experimenta apenas uma vez na
vida, assim como não é algo que não possa ser revertido. Quando os
cristãos dizem: "Fui salvo no dia tal e tal", estão apenas se referindo a
sua primeira aceitação consciente de Jesus. Alguns, infelizmente,
acreditam naquilo que é popularmente conhecido como "uma vez
salvo, salvo para sempre" e acham de fato que essa experiência única
é suficiente. Entretanto, a Bíblia diz que devemos morrer
"diariamente" para o eu (Rm 6:11; I Co 15:31).
Se devemos morrer diariamente para o pecado, isso só pode
significar que ressuscitamos diariamente para a nova vida (Rm 6:5)!
Anos atrás, ouvi Morris Venden dizer que a maneira apropriada de
expressar a salvação pessoal é dizer: "Fui salvo, sou salvo e serei
salvo." Em outras palavras, fui salvo há dois mil anos, porque Jesus
morreu na cruz inclusive por mim. Fui salvo quando me converti. Sou
salvo diariamente quando respondo, pela fé, à graça de Deus, e serei
salvo quando Ele vier nas nuvens e minha natureza pecaminosa der
lugar a outra, incorruptível (1 Co 15:51-54).
E a mesma coisa com o Espírito. Não recebemos o Espírito uma
vez só na vida, mas cada dia, tão frequentemente e tantas vezes
quantas abrirmos 0 coração para recebê-lo. Não aguardamos até
experimentar algo sobrenatural, algum choque elétrico, ou calor
Interno, ou milagre físico para saber que o Espírito passou a residir no
templo do nosso corpo. O Espírito vem pela fé. E o que Paulo nos
ensina (Gl 3:2,14). E a fé não é algo que você vê ou sente, mas algo em
que você decide acreditar porque Deus disse que ela aí está.
O problema de muitos é desejar os dons do Espírito antes de
desejar o próprio Espírito. Desejam as manifestações do Espírito: o
poder, os milagres, a atuação sobrenatural de Deus, mas não têm
tanta certeza de que desejam o Espírito, a menos que Ele se manifeste
com alarde. Desejam os dons, mas não o Doador.
Há alguns anos, descobri algo interessante enquanto estudava o
assunto dos dons espirituais. Lemos em Romanos 12 que há
"diferentes dons segundo a graça que nos foi dada"; por isso, devemos
usá-los "segundo a proporção da fé" (v. 6). Em 1 Pedro 4, aprendemos
a servir uns aos outros, cada um conforme o dom que recebeu, como
bons despenseiros da multiforme graça de Deus" (v. 10). Qual é o
denominador comum nesses textos? A graça de Deus. A palavra grega
para “graça” é charis, que algumas versões simplesmente traduzem
como "caridade". Isso significa que os dons do Espírito são dons da
graça, ou charismata. Isto é, são uma expressão do Espírito,
produzidos pelo amor do Salvador. A graça é o favor de Deus em
benefício da nossa salvação! "Porque pela graça sois salvos, mediante
a fé; e isto não vem de vós; é dom de Deus; não de obras, para que
ninguém se glorie" (Ef 2:8, 9). A conclusão lógica é que esses dons
espirituais são dons de Jesus, que dá graça a todos os que a recebem
pela fé!
A questão é que os dons espirituais não vêm de algum depósito
cósmico, alguma fonte inanimada de energia celestial. Eles vêm de
Jesus, como parte de sua graça. Assim, todos os que experimentam a
graça de Jesus recebem os dons de Jesus. Se você tem Jesus, tem dons
espirituais. Peça para ter o Espírito em sua vida, para ter Jesus no
coração. Receba Jesus no coração e você viverá a vida do Espírito.

O significado de ‘Cristo em nós’


Uma de minhas declarações preferidas de Ellen White sobre o
Espírito Santo é a seguinte:
Oremos para que as poderosas energias do Espírito
Santo, com todo o seu poder vivificador, restaurador e
transformador possam atuar como uma corrente elétrica
sobre o coração atacado de paralisia, fazendo com que
cada nervo estremeça com nova vida, restaurando o
homem todo, de seu estado terreno, sensual e morto,
para o de perfeita saúde espiritual. Como resultado, você
se tornará participante da natureza divina, "tendo
escapado da corrupção, que, pela concupiscência, há no
mundo" (2Pe 1:4); e em sua alma será refletida a imagem
daquele por cujas feridas você foi curado.4

Por mais emocionante e empolgante que seja essa declaração —


"poderosas energias", “como uma corrente elétrica”, “fazendo com
que cada nervo estremeça” — não devemos deixar escapar o óbvio:
"você se tornará participante da natureza divina [...] e em sua alma
será refletida a imagem [de Cristo]."
A ideia toda de viver no "poder de sua ressurreição" é que
devemos conformar-nos “com Ele na sua morte” (Fp 3:10). A maioria
dos cristãos, incluindo a maioria dos adventistas do sétimo dia que
conheço, deixa de entender o fato de que aquilo que Jesus nos dá não
é apenas o perdão do pecado, mas também o poder para uma vida
nova. Esse poder, porém, não vem da morte de Cristo na cruz; vem da
presença de Cristo na sala do trono de Deus.
Permita-me explicar. O que Cristo realizou na cruz foi o resgate de
nossa alma. Ele foi nosso substituto. Deveríamos ter morrido para
sempre. Em vez disso, Ele se tornou pecado em nosso favor e morreu
a segunda morte por nós (2Co 5:21). Ele pagou a penalidade do nosso
pecado, adquirindo o direito de nos perdoar os pecados, algo que Ele
garante, desde que lhe confessemos nossas culpas (1Jo 1:9). Contudo,
o perdão do pecado não é a vitória sobre o pecado. O perdão lida com
o passado, não com o presente. Se fôssemos apenas perdoados, vez
após vez, nunca chegaríamos ao ponto de ser participantes da
natureza divina. É verdade, "ainda não se manifestou o que haveremos
de ser", mas a expectativa é que "seremos semelhantes a Ele" (1 Jo
3:2).
A esta altura, muitas pessoas ficam nervosas. Imaginam que isso
signifique que precisamos ser perfeitos, a fim de sermos "semelhantes
a Ele". Nosso registro de pecados é tão enraizado, consistente e
esmagador que, naturalmente, nos desesperamos, achando que
jamais alcançaremos esse estágio de vitória. No entanto, não há
necessidade para desespero.

Ao pecado só se poderia resistir e vencer por meio


da poderosa operação da terceira pessoa da Trindade, a
qual viria, não com energia modificada, mas na plenitude
do divino poder. E o Espírito que torna eficaz o que foi
realizado pelo Redentor do mundo. E por meio do Espírito
que o coração é purificado. Por Ele, o crente se torna
participante da natureza divina. Cristo deu seu Espírito
como um poder divino para vencer toda tendência
hereditária e cultivada para o mal, e gravar seu próprio
caráter em sua igreja.5

Como acontece isso? A chave está na segunda obra de Jesus em


nosso favor: sua vida em nós. Assim como aceitamos sua morte na cruz
para o perdão de nossos pecados, é nosso privilégio aceitar sua própria
vida, a fim de que nosso pecado seja vencido.6 Aqui está o maravilhoso
resumo de Paulo: "Porque, se nós, quando Inimigos, reconciliados com
Deus mediante a morte do seu Filho, muito mais, estando já
reconciliados, seremos salvos pela sua vida" (Rm 5:10).
Segundo Paulo, o que na realidade nos salva? A vida de Cristo, não
apenas sua morte. Por quê? Porque uma das coisas que Jesus veio
fazer aqui foi provar ao universo que a alegação de Lúcifer era uma
mentira. O diabo argumentava que nenhuma criatura podia cumprir a
lei de Deus e viver uma vida perfeita. Afinal, ele não era o melhor
exemplo? Criado perfeito desde o início, dotado de maravilhosos dons
e habilidades (Ez 28:12-15, 17), nem mesmo ele fora capaz de andar
no caminho justo. E o exemplo B: Adão e Eva? O que, então, se pode
esperar de nós? "E uma causa perdida", apregoava Satanás. "Se és um
Deus de justiça, como dizes, tens a obrigação de aniquilar a todos,
assim como estás pretendendo destruir a mim."
Sim, tudo parecia ser uma causa perdida, especialmente depois
que Adão e Eva cederam ao pecado enquanto eram puros e viviam em
um ambiente perfeito. Entretanto, Jesus viria como o segundo Adão
(1Co 15:45) para provar que se pode viver sem pecar. Com efeito, o
Filho de Deus foi muito além da alegação de Satanás. Ele veio a um
mundo com milênios de prática do pecado em seu registro. A
manjedoura de Belém ficava longe do Éden. No entanto, por 33 anos,
Jesus resistiu ao pecado até a morte. Era batizado diariamente com o
Espírito de Deus. Diariamente passava horas em comunhão com o pai,
para respirar a atmosfera do Céu, a qual lhe permitiria andar sem
tropeçar em um mundo não só mergulhado em pecado, mas inclinado
a fazê-lo cair.7 Essa foi a sua vitória! Não só a cruz, mas uma vida sem
pecado, a despeito dos ataques constantes.
Quando Jesus morreu na cruz, o diabo nada tinha nele (Jo 14:30).
Ninguém lhe tirou a vida, tampouco. Ele a entregou (Jo 10:17, 18;
19:30).8 E a razão pela qual o fez foi pagar a penalidade de nossos
pecados. Ele era o divino sacrifício substitutivo em nosso favor. Sua
morte em nosso lugar, então, deu-lhe o direito de nos conceder sua
vida perfeita. Assim, o que Jesus nos dá é tanto sua morte quanto sua
vida!
Mais uma vez, sua vida em nós por meio do Espírito é que tornará
possível a vitória sobre o pecado. Essa verdade está em toda parte na
Escritura: "Estou crucificado com Cristo; logo, já não sou eu quem vive,
mas Cristo vive em mim; e esse viver que, agora, tenho na carne, vivo
pela fé no Filho de Deus, que me amou e a si mesmo se entregou por
mim (Gl 2:19, 20, itálico acrescentado).
"Pensai nas coisas lá do alto, não nas que são aqui da terra." Por
que, Paulo? "Porque morrestes, e a vossa vida está oculta juntamente
com Cristo, em Deus. Quando Cristo, que é a nossa vida, se manifestar
[por ocasião da segunda vinda], então, vós também sereis
manifestados com Ele, em glória" (Cl 3:2-4, itálico acrescentado).
"Porquanto, para mim, o viver é Cristo, e o morrer é lucro" (Fp
1:21, itálico acrescentado), "Eu sou a porta", disse Jesus. "Se alguém
entrar por mim, será salvo; [...] Eu vim para que tenham vida e a
tenham em abundância" (Jo 10:9, 10, itálico acrescentado).
A vida de Cristo em nós, por meio do Espírito, nos levará a obter,
certamente, a vitória sobre o pecado em nossa vida. Lembre-se: tanto
as tendências herdadas quanto as cultivadas serão vencidas o pecado
como hábito é vencido por meio da santificação, e o pecado como
condição será superado na glorificação. Nada podemos em nós
mesmos. Mas, em Cristo, somos mais que vencedores.

Ele em mim, e eu nele


Cristo, no entanto, pode não apenas viver em mim por meio do
Espírito Santo. Sua conquista na cruz em favor do mundo inteiro
significa que também estou incluído em seu sacrifício. Eu estava lá,
"nele", por assim dizer. Os teólogos chamam isso de o tema "em
Cristo", tantas vezes abordado por Paulo.
Um versículo em que é fácil de entender esse ponto seria aquele
no qual Paulo falou aos idólatras atenienses acerca do Deus
desconhecido: "Pois nele vivemos, e nos movemos, e existimos" (At
17:28). Isto é, vivemos porque Deus vive — nossa vida depende dele.
Contudo, foi o próprio Jesus quem abriu o caminho para esse conceito,
na noite em que apresentou o Espírito aos discípulos: "Eu sou a videira,
vós, os ramos. Quem permanece em mim, e Eu, nele, esse dá muito
fruto; porque sem mim nada podeis fazer" (Jo 15:5, itálico
acrescentado).
O capítulo 1 de Efésios está repleto desse conceito. "[Deus] nos
escolheu, nele, antes da fundação do mundo" (v. 4); "no qual temos a
redenção, pelo seu sangue" (v. 7); "nele, digo, no qual fomos também
feitos herança, predestinados segundo o [seu] propósito" (v. 11); "em
quem também vós [...] fostes selados com o Santo Espírito da
promessa (v. 13). Finalmente, Paulo pôde dizer aos colossenses:
"Também, nele' estais aperfeiçoados" (Cl 2:10).
O apóstolo João reduz essa ideia ao básico: "Nisto sabemos que
estamos nele: aquele que diz que permanece nele, esse deve também
andar assim como Ele andou" (1 Jo 2:5, 6). Depois diz: "Filhinhos,
agora, pois, permanecei nele", pois "todo aquele que permanece nele
não vive pecando" (1 Jo 2:28; 3:6). “Nisto conhecemos que
permanecemos nele, e Ele, em nós: em que nos deu do seu Espírito"
(1 Jo 4:13).
Imagine o quadro comigo. Cristo em nós, a esperança da glória, e
nós em Cristo, sepultados e ressuscitados com Ele. Significa que
estamos cercados por Jesus, não é? Estamos completamente
cobertos, por dentro e por fora. Isso deveria fazer alguma diferença
em nossa vida? Isso deve mudar tudo a nosso respeito.
Frank Phillips, pastor e missionário cujos ensinos foram
popularizados uma geração após sua morte,9 costumava contar uma
experiência que ele certa vez ouviu de uma jovem esposa e mãe
durante uma reunião campal. Ela o procurou em busca de conselho.
Seu casamento estava se desintegrando. O marido era descrente,
irresponsável, bebia demais e não se importava com a família. O tinha
uma garotinha e um menino de cinco meses de idade. Eles haviam
tentado aconselhamento, mas nada ajudou. Cansada, ela estava
pronta para jogar a toalha.
— A senhora está disposta a fazer o que for necessário para
salvar seu casamento? — perguntou o pastor. Ela fez uma pausa,
achando que já havia feito de tudo.
— Sim, acho que estou — respondeu ela.
— Então, leve consigo o texto que está neste cartão. Leia-o,
pense nele e ore a esse respeito. E, se decidir agir de acordo com ele,
Deus curará seu casamento.
O pastor orou com ela, e a senhora se foi. O cartão continha uma
declaração do pequeno livro O Maior Discurso de Cristo:

A presença do Pai circundava a Cristo e nada lhe


sobrevinha sem que o infinito amor permitisse, para a
bênção do mundo. Aí estava sua fonte de conforto, e ela
existe para nós. Aquele que estiver impregnado do
Espírito de Cristo, habita em Cristo. O golpe que lhe é
dirigido cai sobre o Salvador, que o circunda com sua
presença. O que quer que lhe aconteça vem de Cristo.
Não precisa sozinho resistir ao mal, porque cristo é sua
defesa. Nada lhe pode tocar a não ser pela permissão de
nosso Senhor; e todas as coisas que são permitidas
"contribuem juntamente para o bem daqueles que amam
a Deus" (Rm 8:28).10

Você, provavelmente, precisará ler o texto outra vez. Em primeiro


lugar, o Pai circundou a Cristo, a mesma coisa que Cristo faz em nossa
vida. Ele está em nós, e nós estamos nele. Em outras palavras, estamos
completamente circundados por Jesus. Depois, nada aconteceu a
Cristo a não ser aquilo que o Pai permitiu, para abençoar o mundo.
Isso não foi apenas a fonte de consolo dele, mas deve também ser a
nossa. É por isso que não precisamos resistir ao mal sozinhos. Cristo
não o fez sozinho. Nada nos pode tocar, exceto pela permissão de
nosso Senhor. Seja qual for o mal que possa nos atingir, isso cooperará
juntamente para o bem. Bem, é mais fácil dizer do que fazer, certo?
A mulher leu a citação, orou a respeito e tomou a decisão de viver
segundo o que estava escrito. Se uma infeliz vida doméstica devia ser
o seu quinhão, ela não só a aceitaria, mas a abraçaria, sabendo que
Cristo já havia filtrado essa experiência em favor dela. A mulher
conseguiu?
Nos primeiros três meses, depois que começou a dar graças a
Deus pelas coisas que, naturalmente, ela desprezaria ou desejaria que
não acontecessem, seu casamento e seu esposo ficaram ainda piores.
Em uma provação que a levava todos os dias a se ajoelhar por longo
tempo, ela escolheu reconhecer que Jesus se encontrava em ação,
quando parecia tão claro que era Satanás quem estava no controle.
Entretanto, ela perseverou, acreditando que estava circundada por
Jesus e que Ele tinha o poder de filtrar qualquer coisa que a atingisse.
De repente, as coisas começaram a mudar. O esposo parou de
beber, permaneceu no emprego, tomou interesse pela família e
ajudou a cuidar das crianças. Começou, inclusive, a fazer por ela coisas
que nunca fazia antes. Passava tempo com ela todas as tardes: uma
caminhada, um passeio, uma ida à sorveteria. Ela nem acreditava no
que estava acontecendo com ele. Que mudança!
Dar graças a Deus por esse desdobramento se tornou multo mais
fácil que antes. Ela via que as coisas não podiam ficar melhores. Então,
certa noite, enquanto sua sogra cuidava das crianças, eles saíram para
Um passeio. A sogra pôs o bebê para dormir, que então estava com 11
meses, e sentou-se para tirar um cochilo, deixando destampado frasco
de seu medicamento sobre o balcão. O menino acordou e conseguiu
se arrastar para fora do berço. Alcançou as pílulas da vovó e engoliu
uma por uma. Depois de poucos minutos, jazia no chão. Quando a avó
despertou e viu o que acontecera devido a sua negligência, ficou
literalmente paralisada na cadeira. Não conseguia nem gritar por
socorro, por estar em choque.
Quando os pais chegaram, agarraram o pequenino e correram
com ele para o hospital. Porém, ele morreu apenas uma hora mais
tarde. Como foi possível? Da bem-aventurança a uma tragédia
completa no decurso de uma hora. O esposo não conseguiu suportar
a perda e desapareceu. Os parentes, por solidariedade, também
queriam morrer. A mulher, só e desesperada, clamou a Deus: "Como
posso aceitar isso como vindo de ti, Senhor? Onde estavas Tu nessa
hora? Isso é obra do diabo, justamente quando as coisas iam tão
bem!" Assim, ela abandonou sua convicção de que Deus estava no
controle de sua vida. No entanto, notou que isso piorava as coisas.
Depois de três semanas, sentia-se deprimida, sozinha e com o coração
partido.
Uma tarde, viu que alguém da igreja estacionava na frente de sua
casa para visitá-la. Toda visita era a mesma coisa: as pessoas se
condoíam de sua perda, mas isso apenas a levava a conservar o foco
sobre a tragédia.
Enquanto ela se dirigia à porta, o Espírito a impressionou: "Você
não prometeu que receberia tudo o que lhe acontecesse como vindo
de minha parte?" Subjugada, ela chorou. "Sim, Senhor, prometi. Por
favor, perdoa-me. Não compreendo, e isso dói muito, mas entrego até
mesmo a morte de meu filho a ti. Escolho acreditar que estavas
presente quando isso aconteceu e o permitiste em tua infinita
sabedoria." Essa prece durou apenas uns poucos segundos.
Abrindo a porta, ela ergueu a mão e disse: "Por favor, não diga
nada. Preciso entregar tudo a Jesus agora mesmo. Você se ajoelharia
e oraria comigo, para que eu consiga fazer isso?" Três semanas após a
morte do bebê, o esposo retornou. Ele fora até o inferno e voltou.
Disse que sentia muito tê-la deixado na hora de sua maior
necessidade, e sentia que precisava conhecer a Deus da maneira que
ela o conhecia, Disse-lhe que não aguentava mais aquela vida e
desejava entregá-la a Cristo. Dias depois, os parentes chegaram para
uma visita. Comentaram que, muitos anos antes, haviam sido
adventistas, mas tinham deixado a igreja. Não criaram os filhos de
acordo com a fé. Viam, porém, que ela parecia conhecer a Deus
pessoalmente, que ela era a pessoa mais parecida com Cristo que eles
conheciam. Confessaram que precisavam de sua ajuda a fim de voltar
para Deus.
A jovem senhora pode não saber ainda por que seu bebê morreu
ou por que aquilo aconteceu em circunstâncias tão trágicas. No
entanto, ela sabe que o verá quando Jesus vier outra vez. E agora ela
sabe que seu esposo e a família toda estarão lá também.
"Cristo em mim, a esperança da glória." Essa é a obra do Espírito
em nossa vida. Isso é vida abundante. E disso que o mundo inteiro
necessita: Jesus vivendo em nós por meio do Espírito Santo.

Perguntas para reflexão ou estudo em grupo


1. O que o impressionou na história de Mike?
2. O que é "Cristo em vós, a esperança da glória"? O que significa
essa expressão?
3. Quando começa a vida eterna? Por que nesse momento?
4. por que a Bíblia, às vezes, usa a expressão "Espírito de Cristo"?
5. Em que sentido o dom do Espírito é o dom da salvação?
6. De que modo fomos salvos? Somos salvos ou seremos salvos?
7. Como você reage à declaração: "Todos os que experimentam
a graça de Jesus recebem os dons de Jesus"?
8. Se aceitar a morte de Jesus na cruz cobre nossos pecados, o
que produz a vitória sobre o pecado em nossa vida?
9. O que, de fato, nos salva: a morte de Jesus ou a vida de Jesus?
Explique.
10. Como podemos chegar ao ponto de realmente crer que tudo
o que nos acontece é filtrado pelo amor de Cristo, como vimos na
história da jovem senhora?
11. Depois de ler este capítulo, qual é seu maior desejo?

1
O Desejado de Todas as Nações, p. 388.
2 Profetas e Reis, p. 233.
3 O Desejado de Todas as Nações, p. 672.
4 Testemunhos Para a Igreja, v. 5, p. 267.
5 O Desejado de Todas as Nações, p. 671.
6
Existe uma diferença importante entre "pecados" e "pecado". Os seres humanos sio pecadores
por natureza. Nasceram em pecado, sua propensão é para o pecado, sua tendência natural é
correr nessa direção e distanciar-se de Deus. Isso é chamado pecado original; é o pecado como
condição de vida. Pecados, porém, são o resultado de ser pecador por natureza. Cometemos
pecados porque somos homens e mulheres em pecado, sob "a lei do pecado e da morte". Deus
pode perdoar nossos pecados, mas o único remédio para nosso pecado [singular], nosso estado
como seres pecadores, é uma nova natureza a ser estabelecida na glorificação. O perdão e a
santificação tratam com nossos pecados e com os hábitos pecaminosos. É por isso que devemos
nascer de novo para ser justificados, perdoados santificados e, por fim, glorificados, na segunda
vinda.
7 Ver A Ciência do Bom Viver, p. 51-58, para recapitular a experiência devocional de Jesus com o

Pai.
8
João 19:30 diz: "E, inclinando a cabeça, rendeu o espírito [respiração]." Na morte, a pessoa deixa
de respirar; por isso a cabeça dele se inclinaria. Aqui lemos que Jesus inclinou a cabeça primeiro,
e depois expirou. O verbo está correto: Ele "rendeu" o espírito. Rendeu a vida.
9
Ver, por exemplo, seu livro His Robe of Mine (Berrien Springs, MI: Justified Walk Ministries,
2003); ver outras fontes [inclusive em português] no site: www.justifiedwalk.com.
10
O Maior Discurso de Cristo, p. 71.

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