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Como

estimar
recalque em
fundações

Guia da Engenharia
prefácio

Você já ouviu falar dos famosos "edifícios tortos" da orla de


Santos? Ou da Torre de Pisa, na Itália? Você sabe o porquê
dessas edificações apresentarem desaprumos tão
significativos?
Então, isso acontece por conta do recalque no solo!

Desaprumo na Torre de Pisa

Nesse e-book você aprenderá os principais conceitos que


envolvem recalque
Espero que tenha uma incrível leitura e que aprenda muito
ao longo do e-book! Então, vamos logo ao conteúdo?
índice

2
[ 5 ] os conceitos iniciais [ 39 ] recalque em areias
por trás do recalque nos através do método de
solos Schmertmann

[ 12 ] cálculo do recalque [ 48 ] exercício resolvido


no solo: meios elásticos do método de
homogêneos Schmertmann

[ 24 ] exercícios resolvidos
de recalque em solos
argilosos
sobre o autor

3
Meu nome é Filipe Marinho e serei seu ajudante nessa
jornada de conhecimento.
Para você ir me conhecendo, sou Engenheiro Civil,
graduado na Universidade Federal do Piauí, sou
Especialista em Estruturas de Concreto e Fundações.
Também fui professor substituto das disciplinas de
Mecânica dos Solos na Universidade Federal do Piauí.
Atuo profissionalmente elaborando Projetos Estruturais e
de Fundações.
Além disso, sou um pseudosommelier de cervejas e cafés e
poeta fajuto nas horas vagas.
Depois dessa breve apresentação, espere que você goste do
conteúdo que preparei para você. Aproveite a leitura!
4
“Não há nada que eu
acredite mais
fortemente do que
jovens interessados em
ciência e engenharia,
para um futuro melhor,
para toda a
humanidade.”
Bill Nye
1

5
os conceitos iniciais
por trás do recalque
nos solos

Nesse capítulo você aprenderá os principais conceitos que


envolvem recalque. Além disso, também serão abordados
alguns limites toleráveis para evitar problemas estruturais
ou mesmo de utilização da edificação.

Conceitos iniciais

Vamos direto ao conceito de recalque. Bem, o recalque de


uma fundação é basicamente o deslocamento vertical de
sua base em relação a um ponto indeslocável, ou seja, um
ponto fixo.
Ele ocorre pela variação do volume, ou da forma, do
maciço de solo que se encontra abaixo da fundação.
Ou seja, é importante salientar que o recalque de

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fundações, bem como o desaprumo de edifícios, ocorrem
em qualquer edificação, e não só nos famosos casos citados
acima. Porém, é comum que tais deformações tenham
pequenas dimensões e sejam praticamente imperceptíveis a
olho nu!
Nós chamamos de recalque absoluto (  ) o que ocorre em
cada sapata isoladamente e recalque diferencial (  ), ou
relativo, o que ocorre entre duas sapatas.
Ou seja, se o recalque em cada sapata for de 2,0 cm,
podemos dizer que o recalque absoluto em cada uma foi
correspondente a tal valor, porém, o recalque diferencial
entre as duas é zero, visto que as duas sofreram o mesmo
recalque.

Recalques absoluto e diferencial


O que é preocupante, de fato, são elevados recalques

7
diferenciais, pois esses acabam por gerar tensões internas
nas peças estruturais, além de desaprumos, como já citados
anteriormente. O ideal é que uma edificação apresente
fundações com recalques absolutos de ordem de grandeza
semelhantes!
Nós podemos ainda dividir o recalque absoluto (  ) em
duas parcelas:
 = c + i

Onde:
• c : recalque por adensamento;

• i : recalque imediato;
Lembrando que o recalque por adensamento é aquele que
acontece principalmente em argilas saturadas submetidas a
carregamentos constantes.

Tolerância a recalque

Nós já falamos que recalques ocorrem em todos os


edifícios. Também já comentamos sobre recalques
absolutos e diferenciais.
Mas afinal, qual o limite para esses recalques para evitar
problemas estruturais?
Bem, inicialmente, precisamos que você entenda que além
dos problemas estruturais, outros inconvenientes podem
ocorrer com recalques excessivos.
Por exemplo, fissuras em alvenarias ou até mesmo a

8
dificuldade de abrir ou fechar uma porta pois a mesma
parece "torta".
Por isso, dividiremos os danos causados pela
movimentação das fundações em três grupos, segundo
Skempton-MacDonald:
1. Danos arquitetônicos: esse grupo é composto por
aqueles danos que causam um desconforto visual dos
usuários da edificação, como os desaprumos no
prédio e trincas em paredes;
2. Danos à funcionalidade: esse grupo é caracterizado
por danos que ainda não são estruturais, mas que
complicam a utilização da edificação. Por exemplo, o
desaprumo de um prédio pode inverter inclinações
de instalações sanitárias, emperrar portas e janelas ou
desgastar o uso de elevadores.
3. Danos estruturais: são danos que, por
comprometerem a estrutura do edifício, põem em
risco a estabilidade do mesmo.
E então, sabendo disso, quais os limites de recalque no
solo para evitar tais danos?

Distorção angular e recalques máximos

Então, Skempton e MacDonald pesquisaram centenas de


edifícios e chegaram a algumas conclusões.
Eles atribuíram os principais danos à edificações a

9
distorção angular, que nada mais é do que o recalque
diferencial (  ) entre fundações dividido pela distância
entre elas (l), chegando aos seguintes valores:

•  / l =1:300: acarretam trincas em paredes da


edificação;
•  / l =1:150: distorções angulares dessa ordem de
grandeza ocasionam danos estruturais em vigas e
pilares;

Distorção angular

Além disso, também chegou a valores considerados


máximos permitidos para recalques diferenciais e
absolutos, apresentados no quadro abaixo.
Tabela 1

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Tipo de recalque Areia Argila
 máx 25 mm 40 mm
40 mm, para 65 mm, para
máx
sapatas isoladas sapatas isoladas
40 a 65mm, para 65 a 100 mm, para
máx
radiês radiês

Vale lembrar que alguns casos, como estruturas de


alvenaria estrutural ou prédios elevados, demandam uma
análise mais criteriosa dos recalques nas fundações!
11
“Infelizmente os solos
foram feitos pela
natureza, e não pelo
homem. E os produtos
da natureza são sempre
complexos”
Karl von Terzaghi
2

12
cálculo do recalque no
solo: meios elásticos
homogêneos

Durante a leitura do capítulo anterior, você deve ter ficado


se perguntando: como eu posso calcular os recalques da
minha fundação?
Então eu te respondo: nesse capítulo você vai aprender
métodos para estimar o recalque de fundações assentes em
solos de meio elásticos homogêneos!
Ficou confuso? Fica tranquilo, prometo que no fim da
leitura você estará entendendo tudo!
Vamos lá?
Recalque e o módulo de deformabilidade

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Antes de iniciarmos o conteúdo propriamente dito, vamos
só relembrar um pequeno detalhe do capítulo anterior.
Nós podemos dividir o recalque absoluto  em duas
parcelas:
 = c + i

Onde:
• c : recalque por adensamento;

• i : recalque imediato;

Embora o recalque por adensamento não possa ser


ignorado em solos argilosos saturados, pois pode
apresentar valores elevados, nesse capítulo nos reteremos
mais ao estudo do cálculo do recalque imediato!
É muito importante entender a relação entre o cálculo do
recalque imediato e o módulo de deformabilidade do solo,
visto que tal cálculo é feito a partir da Teoria da
Elasticidade.
Mas afinal, o que é módulo de deformabilidade?
Sabe aquele nosso velho gráfico conhecido de tensão x
deformação? Pois é, talvez você já tenha ouvido falar sobre
módulo de elasticidade, que é a relação entre a tensão e a
deformação, obtida através desse gráfico.
Módulo de deformabilidade tem exatamente o mesmo
conceito!
Entretanto, como solos geralmente não apresentam
característica elástica, ou seja, apresentam deformações
permanentes quando submetidos a tensão normal,

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costuma-se chamar a relação entre tensão e deformação de
módulo de deformabilidade ( Es )!
Então, podemos considerar para os solos um gráfico de
tensão x deformação linear não elástico. Ou seja, apresenta
linearidade entre tensão aplicada e deformação sofrida,
porém, ao ser retirada a tensão, sofre deformações
residuais. Podemos observar tal comportamento na figura
abaixo.

Comportamento linear não elástico do solo

De acordo com a variação de Es em função da


profundidade do maciço de solo, podemos dividir tal
maciço em três tipos:

• Meio elástico homogêneo (MEH): quando Es não


varia em função da profundidade do solo;
• Meio elástico não homogêneo: quando Es varia em

15
função da profundidade;
• Meio de Gibson: é um tipo específico de meio
elástico não homogêneo. Nesse meio, Es é
considerado zero na superfície e considera-se que ele
varia linearmente com a profundidade.

Nesse capítulo, trataremos da estimativa de recalques


para MEH, que são representados principalmente por
argilas sobreadensadas.

Camada semi-infinita

Vamos iniciar nosso estudo sobre recalque em MEH por


uma situação simples: uma camada semi-infinita de solo.
Para essa situação, podemos utilizar a seguinte formulação:

1 − 2
i =   B  Ip
Es

Onde:

•  : tensão média na superfície de contato entre


fundação e solo;
• B: largura da fundação;
•  : coeficiente de Poisson do maciço de solo;
• I p : fator de influência, que varia de acordo com a
rigidez e forma da fundação, cujos valores são
apresentados abaixo.
Tabela 2

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Sapata flexível Sapata
Forma
Centro Canto Médio rígida
Circular 1,00 0,64 0,85 0,79
Quadrada 1,12 0,56 0,95 0,99
L/B=1,5 1,36 0,67 1,15
2 1,52 0,76 1,30
3 1,78 0,88 1,52
5 2,10 1,05 1,83
10 2,53 1,26 2,25
100 4,00 2,00 3,70

Ou seja, podemos perceber que em um MEH, sapatas


flexíveis apresentam maiores recalques no centro e
menores nas bordas.

Camada Finita

Nós já vimos a formulação para estimar o recalque


imediato em camadas semi-infinitas.
Entretanto, muitas vezes existe apenas uma camada de
"pequena espessura" sobre um material praticamente
indeformável, como por exemplo, um maciço rochoso.
Nesse caso, podemos utilizar a solução de Janbu. Através
da Teoria da Elasticidade e de considerações feitas, como
 = 0,5, Janbu chegou a seguinte formulação para sapatas

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flexíveis:

 B
i = 0  1 
Es

Onde:

•  0 e 1 : fatores de influência de embutimento da


sapata e de espessura da camada de solo;

Considerando uma fundação de dimensões de base BxL ou


uma circular de diâmetro B assentada a uma profundidade
h e sendo H a distância da base da fundação ao maciço
indeslocável, temos os seguintes ábacos para determinação
de  0 e 1 .

Ábaco 1 de Janbu
18
Ábaco 2 de Janbu

Multicamadas

Outra situação também bem usual é a ocorrência de


diversas camadas de solo do tipo MEH, cada camada com
seu módulo de deformabilidade definido, sobrejacentes a
uma camada indeslocável, como apresentado na figura
abaixo.

Situação de multicamadas de solo


Nesse caso, podemos calcular o recalque do solo como

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sendo a soma dos recalques da camada 1 e da camada 2.

i = 1 + 2

Para o cálculo de 1 , devemos considerar a camada 1 como


uma camada finita. Além disso, a interface entre a primeira
e a segunda camada deve ser considerada como a camada
indeslocável.
Para o cálculo de 2 devemos fazer as mesmas
considerações de camada finita. Porém, além disso,
devemos também fazer um pequeno ajuste nas dimensões
da sapata, a fim de utilizarmos os ábacos de Janbu, e na
tensão do solo no topo da camada 2, visto que há um
espraiamento da carga da cota de assentamento inicial da
sapata até a interface das camadas 1 e 2.
Ou seja, o que devemos fazer é considerar um
espraiamento de carga na inclinação 1:2 da cota de
assentamento até o topo da camada 2.
As dimensões, bem como as tensões, calculadas a partir
desse espraiamento é que deverão ser utilizadas para o
cálculo de 2 .
20
Consideração para cálculo de recalque em multicamadas

Entendeu tudo?
Caso tenha ficado alguma dúvida, não se preocupe que no
próximo capítulo iremos resolver exemplos e tudo ficará
ainda mais claro pra você!

Parâmetros de compressibilidade

Se você chegou até aqui, pode estar se perguntando: tudo


bem, eu até entendi tudo, mas como eu determino o
módulo de deformabilidade das camadas e seus
coeficientes de Poisson para aplicar as fórmulas
apresentadas?
Então, vamos começar pelo módulo de deformabilidade.
Para a estimativa do módulo de deformabilidade podemos
usar a formulação simples de Teixeira e Godoy, que
associam tal parâmetro com o índice Nspt do solo. A

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formulação é a seguinte:

Es =   K  Nspt

Onde  e K variam de acordo com o solo e podem ser obtidos


através das tabelas abaixo.

Tabela 3

Solo 
Areia 3
Silte 5
Argila 7

Tabela 4

Solo K (MPa)
Areia com pedregulhos 1,1
Areia 0,9
Areia siltosa 0,70
Areia argilosa 0,55
Silte arenoso 0,45
Silte 0,35
Argila arenosa 0,30
Silte argiloso 0,25
Argila siltosa 0,20
Para a estimativa do coeficiente de Poisson, podemos usar

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a tabela de Teixeira e Godoy apresentada abaixo.

Tabela 5

Solo 
Areia pouco compacta 0,2
Areia compacta 0,4
Silte 0,3-0,5
Argila saturada 0,4-0,5
Argila não saturada 0,1-0,3

Pronto! Viu como o cálculo de recalque no solo não é


nenhum bicho-de-sete-cabeças? No próximo capítulo você
aprenderá, através de exemplos resolvidos, como aplicar as
formulações aprendidas nesse capítulo!
23
“Prefiro sempre o temor
do entendimento ao
temor da ignorância”
Douglas Adams
3

24
exercícios resolvidos
de recalque em solos
argilosos

Neste capítulo resolveremos juntos dois exercícios de


estimativa de recalque em solos argilosos.
Vamos nos ater inicialmente a resolução de questões
referentes à recalques em meios elásticos homogêneos
(MEH), geralmente representado por solos argilosos
sobreadensados.
Agora, sem mais delongas, vamos para o conteúdo!

Exercício 1 - Recalque em camadas semi-infinitas

Vamos começar com um exercício bem simples!


Considere uma sapata rígida de 1,50m x 1,50m de base,
assentada a uma profundidade de 1,0m sobre uma camada
de argila saturada sobreadensada que pode ser
considerada como semi-infinita. Sabendo que a mesma

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recebe da superestrutura uma carga de 300 kN e que a
Nspt dessa camada é igual a 12, estime o recalque imediato
previsto para essa sapata.

Esquema do exercício 1

Resolução

Bem, como o problema se trata de uma camada semi-


infinita de argila sobreadensada e com o Nspt constante ao
longo de sua profundidade, iremos utilizar a seguinte
fórmula:

1 − 2
i =   B  Ip
Es

Onde:
•  : tensão média na superfície de contato entre

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fundação e solo;
• B: largura da fundação;
•  : coeficiente de Poisson do maciço de solo;
• I p : fator de influência, que varia de acordo com a
rigidez e forma da fundação, cujos valores são
apresentados abaixo.

Então, vamos calcular termo a termo da formulação!


Inicialmente, calcularemos a tensão média na superfície de
contato, para isso, basta fazermos a razão da carga na
sapata e sua área de base.

300kN
=
1,50m 1,50m

 = 133,33kN / m2

O coeficiente de Poisson do maciço pode ser estimado de


acordo com a Tabela 5, já apresentada no capítulo anterior.
Tabela 6

Solo 
Areia pouco compacta 0,2
Areia compacta 0,4
Silte 0,3-0,5
Argila saturada 0,4-0,5
Argila não saturada 0,1-0,3

Utilizaremos para esse exercício  = 0,5 .


Agora basta determinarmos o módulo de deformabilidade
do solo E S . Para isso, utilizaremos a seguinte formulação:
Es =   K  Nspt

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Onde  e K podem ser estimados a partir das Tabelas 3 e 4,
também já apresentadas no capítulo anterior.
Tabela 7

Solo 
Areia 3
Silte 5
Argila 7

Tabela 8

Solo K (MPa)
Areia com pedregulhos 1,1
Areia 0,9
Areia siltosa 0,70
Areia argilosa 0,55
Silte arenoso 0,45
Silte 0,35
Argila arenosa 0,30
Silte argiloso 0,25
Argila siltosa 0,20

Então, por simplificação, consideraremos a camada como


argila siltosa, visto que ela apresenta o menor valor de K
para as argilas. Algumas literaturas ainda indicam a
utilização de um valor inferior a esse, mas a nível
acadêmico, iremos utilizar essa simplificação. Assim,

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chegamos a:

Es = 7 0,2MPa 12

ES = 16,8 MPa

Por fim, com a utilização da Tabela 2 abaixo, verificamos que


IP = 0,99.

Tabela 9

Sapata flexível Sapata


Forma
Centro Canto Médio rígida
Circular 1,00 0,64 0,85 0,79
Quadrada 1,12 0,56 0,95 0,99
L/B=1,5 1,36 0,67 1,15
2 1,52 0,76 1,30
3 1,78 0,88 1,52
5 2,10 1,05 1,83
10 2,53 1,26 2,25
100 4,00 2,00 3,70

Agora é só aplicar na formulação apresentada no início da


questão. Lembrando de ter bastante cuidado com as
unidades utilizadas. Aqui, para melhor compreensão,
colocarei as unidades no SI.

1 − 2
i =   B  Ip
Es
1− 0,52
i = 133,33103 1,50   0,99

29
16,8 106

i = 8,84 10−3 m

i = 8,84mm

Pronto! O recalque imediato estimado para essa fundação


é de 8,84mm!

Exercício 2 - Recalque em várias camadas finitas

Considere agora, a mesma sapata da questão anterior


(1,50m x 1,50 m) agora assentada em um solo cujo perfil é
apresentado na figura abaixo.
30
Esquema do exercício 2
Estime o recalque imediato para tal sapata para a condição
apresentada.

Resolução

Essa é uma questão clássica de recalque em camadas finitas


para meios elásticos homogêneos. Para a resolução desse
exercício, vamos seguir o seguinte passo a passo:
1. Estimar o recalque da primeira camada,

31
considerando que o nível -2,0m é o impenetrável
para essa camada.
2. Considerar uma sapata fictícia na interface das
camadas 1 e 2, formada a partir do espraiamento de
tensões numa inclinação de 1:2.
3. Estimar o recalque para a camada 2.
4. Somar o recalque da primeira e segunda camada e
assim, estimar o recalque imediato total para essa
fundação.

Passo 1

Para estimar o recalque da camada 1, vamos considerar


que o impenetrável se encontra na interface entre as
camadas 1 e 2. Logo, utilizaremos a formulação de camada
finita:

 B
i = 0  1 
Es

Onde:

•  0 e 1 : fatores de influência de embutimento da


sapata e de espessura da camada de solo;

Para a primeira camada, temos que h=H=1,0m e B=1,50m.


Logo, temos os seguintes valores para a determinação de
 0 e 1 :
h 1,0
= = 0,67

32
B 1,5

H 1,0
= = 0,67
B 1,5

Então, utilizando os ábacos de Janbu, conforme figuras


abaixo, temos:

0 = 0,80

1 = 0,32

Ábaco de Janbu para camada 1


33
Ábaco de Janbu para a camada 1

Como o solo da camada 1 é o mesmo do exercício passado


seu módulo de deformabilidade já foi calculado:
ES = 16,8 MPa

Lembrando que por se tratar também da mesma sapata do


exercício anterior, a tensão atuante na sapata é:
 = 133,33kN / m2
Então, colocando todos os dados no SI, para não nos
perdemos nas unidades, temos:
133,33103 1,50
i1 = 0,8  0,32 
16,8 106
i1 = 3,0510−3 m
 i1 = 3,05mm

Então, já determinamos o recalque imediato para a camada


1!
Passo 2

34
Agora, a partir do espraiamento de tensões, iremos
considerar uma sapata fictícia na interface de contato entre
as camadas 1 e 2.
Para isso, considerando um espraiamento de 1:2, temos a
seguinte situação:

Esquema da sapata fictícia

Então, para o cálculo do recalque imediato para a camada


2, teremos uma sapata fictícia com B=2,50m apoiada no
topo da camada!
Passo 3

35
Agora que já sabemos a largura da sapata fictícia,
precisamos determinar a tensão atuante nessa sapata!
Sabemos que a carga que vem da superestrutura é a
mesma, 300 kN. Logo, para calcular essa nova tensão, basta
dividirmos essa carga pela nova área de base:

300kN
 =
2,50m  2,50m

  = 48kN / m2
Agora, iremos calcular o módulo de deformabilidade do
solo para a camada 2.
Para isso, iremos utilizar a mesma formulação e tabelas já
utilizadas no exercício 1, porém modificando o Nspt para o
da segunda camada, que vale 20. Logo, temos:

E 's =   K  Nspt

E 's = 7 0,2MPa  20

E 'S = 28,0 MPa

Para calcular o recalque imediato então, basta determinar,


pelos ábacos de Janbu, os fatores  0 e 1 . Então, para a

sapata fictícia apoiada no topo da camada 2, temos o


seguinte:

h 2,0
= = 0,80
B 2,5
H 2,0
= = 0,80

36
B 2,5

Então, utilizando os ábacos de Janbu, conforme figuras abaixo,


temos:

0 = 0,72

1 = 0,40

Ábaco de Janbu para a camada 2

Ábaco de Janbu para a camada 2


Então, colocando todos os dados no SI, para não nos

37
perdemos nas unidades, temos:

48,0 103  2,50


i 2 = 0,72  0,40 
28,0 106

i2 = 1,2310−3 m

 i 2 = 1,23mm

Pronto! Já estimamos também o recalque imediato da


segunda camada, resultando em 1,23 mm.

Passo 4

Finalmente, basta somarmos os resultados encontrados


para o recalque das camadas 1 e 2 para estimarmos o
recalque total da fundação:

i = i1 + i 2

i = 3,05 +1,23

 i = 4,28mm

Pronto! Finalizamos nossa questão! Viu como não tem


nenhum segredo estimar recalque em meios elásticos
homogêneos de várias camadas?
No próximo capítulo vamos começar a tratar da estimativa
de recalque para solos arenosos e apresentaremos o
Método de Schmertmann.
38
“O início da sabedoria é
a admissão da própria
ignorância...”
Sócrates
4

39
recalque em areias
através do método de
Schmertmann

A partir de agora, que já vimos com mais calma os


conceitos de recalque em argilas, passaremos a estudar
formas de estimar o recalque em solos arenosos.
Neste capítulo você verá o método de Schmertmann, que é
um dos mais conhecidos para a estimativa de recalque em
areias!

Recalques em areia

As areias não podem ser consideradas como meios


elásticos homogêneos. O que isso quer dizer?
Que, mesmo para areias com granulometria homogênea,
seu módulo de deformabilidade não é constante
independente da profundidade.
Ou seja, o módulo de deformabilidade do solo ( E S )

40
aumenta com o aumento da profundidade, devido ao
efeito de confinamento nesse tipo de solo.
Então, como podemos estimar o recalque para solos
arenosos?
Bem, o que podemos fazer é dividir o solo em várias
camadas de pequenas espessuras, de forma a considerar
que para tal camada, teremos um E S constante. Então,

podemos resolver como um problema de multicamadas


para MEH.
Com base nessa consideração, e também através da
utilização da Teoria da Elasticidade, Schmertamann
elaborou em 1970 um método para a estimativa de
recalque em areias. Tal método foi aprimorado em 1978.
A seguir, veremos cada um com mais calma!

Método de Schmertmann (1970)

Schmertmann, através da fundamentos teóricos e de


modelos computacionais, estudou a deformação vertical
em solos arenosos submetidos à carregamentos externos.
Então, chegou à seguinte formulação:


z =  Iz
Es

Onde:

•  z : deformação vertical na profundidade z;


•  : carregamento uniforme;

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• I z : fator de influência na deformação, obtido por
meio do gráfico abaixo.

Fator Iz para método de Schmertmann (1970)

Podemos perceber por esse gráfico de I z que a máxima


deformação não ocorre na superfície de contato entre a
fundação e o solo, porém, a uma profundidade z = B / 2, em
que B é a largura da fundação.
Percebemos também que, a partir dessa profundidade, as
deformações vão se tornando menores, até terem valores
mínimos a uma profundidade z = 2B .
Para complementar a formulação anterior, podemos
considerar o embutimento da fundação, que vai minorar as
deformações obtidas. Podemos também estimar a
deformação ao longo do tempo. Para isso, vamos utilizar os
coeficientes C1 e C2, respectivamente.
Embutimento da fundação

42
Para considerar o embutimento da fundação no cálculo de
recalque por meio do Método de Schmertmann,
utilizaremos o coeficiente C1, que pode ser determinado
através da seguinte formulação:

q
C1 = 1− 0,5  0,5
*
Onde:

• q : tensão vertical efetiva na cota de apoio da


fundação;
•  * : tensão líquida aplicada pela fundação ( *=  −q
)

Entenda que utilizamos a tensão líquida visto que a parcela


de sobrecarga q, teoricamente não deve gerar recalque no
solo, já que houve um alívio de tensões com esse valor
decorrente da escavação do solo para execução da
fundação.
Em fundações rasas, a consideração da tensão líquida não
apresenta grande influência no recalque, porém, em
fundações profundas, como tubulões, a utilização do
coeficiente de embutimento gera valores consideráveis na
redução do recalque.

Efeito do tempo

Embora estudos comprovem que em solos arenosos o


recalque imediato seja responsável pela grande parcela do
recalque total do solo, nós também podemos estimar o

43
recalque ao longo do tempo, através do coeficiente de
correção C2, dado na fórmula abaixo:

 t 
C2 = 1+ 0,2  log  
 0,1 

Onde:

• t: tempo em anos.

Caso você queira ignorar o recalque ao longo do tempo e


considerar apenas o recalque imediato, basta considerar
C2 = 1.

Formulação

Então, para finalizar o conteúdo referente ao método de


Schmertmann de 1970, vamos apresentar a formulação
final, que nada mais é do que a fórmula apresentada
inicialmente acrescida dos coeficientes de correção C1 e C2,
conforme apresentado abaixo:

n  Iz 
d = C1  C2   *      z 
i =1  Es i

Onde:

•  d : recalque total;
• I z : fator de influência à meia altura da i-nésima
camada;
• E S : módulo de deformabilidade da i-nésima camada;
•  z : espessura da i-nésima camada;
Roteiro de cálculo

44
Agora, para enfim, utilizarmos corretamente o método de
Schmertmann, vamos seguir os cinco passos a seguir:

1. Calcular valores de q,  * , C1 e C2 (lembrando que o


valor de C2 é opcional, caso você queira determinar o
recalque ao longo do tempo);
2. Desenhar o triângulo do fator de influência I Z a
partir da base da fundação;
3. Dividir o solo abaixo da fundação em subcamadas
com valores de ES constantes e espessura máxima
B/2, de forma nessa divisão, alguma subcamada
coincida com a profundidade B/2 (valor máximo de
I Z para o triângulo criado no passo 2);
4. Fazer uma tabela com seis colunas: número da
I
camada,  z , IZ , Nspt, ES e z   z ;
Es
5. Fazer o somatório dos valores da última coluna e
multiplicá-lo por C1, C2 e  * .

Pronto! Sei que pode parecer difícil, mas não se preocupe,


se ainda ficou alguma dúvida, tenho certeza que no
próximo capítulo, com uma questão resolvida você
entenderá tudo!
Agora vamos estudar um pouco sobre o método
aprimorado de Schmertmann, de 1978.

Método de Schmertmann (1978)

O método de Schmertmann de 1978 é um aprimoramento


da metodologia anterior. Não há muitas modificações, mas
substitui o método de 1970.
As principais diferenças do método de Schmertmann de

45
1978 para o de 1970 são que o novo faz uma diferenciação
entre sapatas quadradas e sapatas corridas e,
consequentemente, apresenta um novo gráfico para
determinação de IZ , apresentado abaixo:

Fator IZ para método de Schmertmann (1978)

Podemos perceber algumas mudanças nesse novo gráfico,


em comparação com o anterior. Percebemos que o valor de
I Zmáx não é mais constante e agora varia segundo a

seguinte formulação:

*
I zmáx = 0,5 + 0,1
v

Onde:
•  v : tensão vertical efetiva na profundidade

46
correspondente a I Zmáx .

Para fundações que nem sejam quadradas, mas também


não atendam a condição de L / B 10 , devemos
construir um diagrama intermediário entre os dois já
apresentados pelo gráfico de Schmertmann, de forma que o
"bulbo de recalque", ou seja, a ordenada máxima do gráfico
seja:

z = 2B[1+ log(L / B)]

Vale ressaltar também que, apesar de o método ser


desenvolvido para fundações, pode também ser utilizado
para a estimativa de recalque em tubulões, visto que há um
fator de correção (C1) para o embutimento da fundação no
solo.
47
“Toda tese científica é
provisória.”
Richard Feynman
5

48
exercício resolvido
sobre método de
Schmertmann

Agora que você já conhece o método de Schmertmann,


vamos aplicá-lo a um exemplo prático para melhor fixação
do conteúdo.
Nesse capítulo resolveremos o mesmo exercício proposto.
Uma resolução pelo método de Schmertmann de 1970 e
outra resolução com o método de 1978.

Exercício proposto

Estime o recalque imediato da sapata indicada na figura


abaixo. A sapata é rígida e quadrada, com B=L=2,0m,
apoiada na cota de -1,0m, que aplica no solo uma tensão de
0,25 MPa.
49
Perfil do solo para o exemplo

Resolução pelo método de Schmertmann (1970)

Bem, relembrando o método de Schmertmann (1970),


apresentado anteriormente no capítulo 4, temos que a
fórmula geral para a utilização desse método é:

n  Iz 
d = C1  C2   *      z 
i =1  Es i
Onde:

50
•  d : recalque total;
• I z : fator de influência à meia altura da i-nésima
camada;
• E S : módulo de deformabilidade da i-nésima camada;
•  z : espessura da i-nésima camada;

Então, vamos determinar cada termo da fórmula!

Cálculo de C1

Para considerar o embutimento da fundação no cálculo de


recalque por meio do Método de Schmertmann,
utilizaremos o coeficiente C1, que pode ser determinado
através da seguinte formulação:

q
C1 = 1− 0,5  0,5
*
Onde:

• q : tensão vertical efetiva na cota de apoio da


fundação;
•  * : tensão líquida aplicada pela fundação ( *=  −q
)

Como o peso específico da areia em questão é  = 17kN / m3 ,


temos que a tensão vertical efetiva na cota de apoio é:

q = 17 1,0 = 17kN / m2

Então, podemos afirmar que a tensão líquida vale:

 * = 250kN / 2 −17kN / m2 = 233kN / m2


Logo:

51
17
C1 = 1 − 0,5  = 0,96
233

Cálculo de C2

O coeficiente de correção C2 é utilizado para levarmos em


conta a ação do tempo no recalque de uma fundação.
Como, para o exemplo em questão, queremos determinar
apenas o recalque imediato, podemos assumir que C2 = 1,0.

Cálculo de ES

Para a estimativa do módulo de deformabilidade podemos


usar a formulação, já apresentada nos capítulos anteriores,
de Teixeira e Godoy:
Es =   K  Nspt
Onde  e K podem ser estimados a partir das Tabelas 3 e
4, também já apresentadas nos capítulos anteriores.
Tabela 10

Solo 
Areia 3
Silte 5
Argila 7
Tabela 11

52
Solo K (MPa)
Areia com pedregulhos 1,1
Areia 0,9
Areia siltosa 0,70
Areia argilosa 0,55
Silte arenoso 0,45
Silte 0,35
Argila arenosa 0,30
Silte argiloso 0,25
Argila siltosa 0,20

Então, para o solo em questão temos:

Es = 3 0,9 Nspt

Es = 2,7 Nspt( MPa)

Cálculo de IZ

Para a determinação do fator de influência IZ no método


de Schmertmann (1970) utilizamos o seguinte gráfico:
53
Fator Iz para método de Schmertmann (1970)

Substituindo para o valor da largura de nossa sapata


B=2,0m, temos a configuração apresentada na figura
abaixo.

Determinação do fator Iz para o método de Schmertmann


(1970)
Então, podemos montar uma tabela com os valores de IZ.

54
Lembrando que, para compatibilização de unidades,
podemos usar os valores de tensão em MPa e os de
comprimento em mm. Logo, temos:
Iz
Camada z IZ Nspt ES (MPa) 
Es z

1 1000 0,3 10 27 11,11


2 1000 0,5 12 32,4 15,43
3 1000 0,3 15 40,5 7,41
4 1000 0,1 15 40,5 2,47

Então, temos todos os dados para aplicar a formulação de


Schmertmann (1970).

n  Iz 
d = C1  C2  *     z 
i =1  Es i

d = 0,96 1,0  0,233 (11,11 +15,43 + 7,41 + 2,47)

d = 8,15mm

Ou seja, o recalque imediato estimado pelo método de


Schmertmann (1970) para a sapata apresentada na
questão é de 9,87 mm.

Resolução pelo método de Schmertmann (1978)

O método de Schmertmann de 1978 é um aprimoramento


da metodologia anterior. Tal metodologia veio para
substituir o método de 1970.
A principal mudança do método de Schmertmann de 1978

55
para o de 1970 é a determinação do fator de influência IZ. A
nova metodologia apresenta novos gráficos para a
determinação desse fator, conforme a figura abaixo.

Fator Iz para método de Schmertmann (1978)

Ou seja, a formulação para o método de 1978 é igual a do


método de Schmertmann de 1970. Então, utilizaremos os
mesmos valores de C1, C2,  * e ES já calculados no
exemplo anterior.
Iremos apenas calcular diferentes fatores de IZ. Então, o
valor de I Zmáx para tal método é calculado como:

*
I Zmáx = 0,5 + 0,1
v
Onde:

56
•  v : tensão vertical efetiva na profundidade
correspondente a I Zmáx ;

Sabemos que nossa sapata apresenta I Zmáx a uma

profundidade de 2,0m, logo, para essa profundidade,


temos que a tensão vertical efetiva vale:

v =   h

 v = 17kN / m3  2,0m

 v = 34kN / m2 = 0,034MPa

Logo:

0,233
I Zmáx = 0,5 + 0,1
0,034

I Zmáx = 0,76

Chegamos então ao seguinte gráfico de IZ.


57
Determinação do fator Iz para o método de Schmertmann
(1978)

Podemos então, agora, elaborar outra tabela com os valores


respectivos de Iz para cada camada:
Iz
Camada z IZ Nspt ES (MPa) 
Es z

1 1000 0,43 10 27 15,93


2 1000 0,63 12 32,4 19,44
3 1000 0,38 15 40,5 9,38
4 1000 0,12 15 40,5 2,96

Pronto! Agora basta aplicarmos a formulação do método


de Schmertmann!

n  Iz 
d = C1  C2  *     z 
i =1  Es i
d = 0,96 1,0  0,233  (15,93 +19,44 + 9,38 + 2,96)

58
d = 10,67mm

Ou seja, o recalque imediato estimado para a mesma


fundação, aplicando agora o método de Schmertmann de
1978 é de 10,67mm.

Estimando o recalque ao longo do tempo

Segundo estudos, em solos arenosos o recalque imediato é


responsável pela grande parcela do recalque total do solo.
Porém, podemos estimar esse recalque ao longo do tempo!
Na resolução do nosso exercício, nos atemos a determinar o
recalque imediato, logo assumimos o fator C2=1,0.
Para estimarmos os recalques ao longo do tempo para
ambos os casos, basta apenas calcularmos C2 para um
intervalo de tempo que se deseja estimar o recalque e
multiplicar pelo valor de recalque imediato encontrado.
Temos então a seguinte formulação para a determinação de
C2 .

 t 
C2 = 1+ 0,2  log  
 0,1 

Onde:

• t: tempo em anos.

Ou seja, vamos determinar agora o valor de C2 para um


tempo arbitrado de 5 anos.
 5 
C2 = 1+ 0,2  log 

59

 0,1 

C2 = 1,34

Ou seja, matematicamente isso quer dizer que há, em 5


anos, um acréscimo de 34% de recalque nessa fundação.
Logo teremos para ambos os casos analisados.

• Método de Schmertmann (1970): foi encontrado um


recalque imediato de 8,15 mm, logo temos que o
recalque estimado ao final de 5 anos será de 10,92
mm.
• Método de Schmertmann (1978): foi encontrado um
recalque imediato de 10,67 mm, logo temos que o
recalque estimado ao final de 5 anos será de 14,30
mm.

E com esse conteúdo, encerramos aqui nosso e-book sobre


recalque no solo. Espero que você tenha gostado do nosso
conteúdo!
Abraço e até a próxima!

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