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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE

CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ESTUDOS DA MÍDIA

LORENNA ARACELLY CABRAL DE OLIVEIRA

O USO DO STORYTELLING PARA COMPOSIÇÃO DE NARRATIVAS NO


PODCASTING: UM ESTUDO DO “CASO EVANDRO”

NATAL
2022
LORENNA ARACELLY CABRAL DE OLIVEIRA

O USO DO STORYTELLING PARA COMPOSIÇÃO DE NARRATIVAS NO


PODCASTING: UM ESTUDO DO “CASO EVANDRO”

Dissertação apresentada ao Programa de


Pós-graduação em Estudos da Mídia, da
Universidade Federal do Rio Grande do
Norte, como requisito para obtenção do
grau de Mestre em Estudos da Mídia.

Linha de Pesquisa: Estudos da Mídia e


Práticas Sociais

Orientadora: Profª Drª. Valquíria Aparecida


Passos Kneipp.

NATAL
2022

Esta obra está licenciada com uma licença Creative Commons Atribuição 4.0
Internacional. Permite que outros distribuam, remixem, adaptem e desenvolvam
seu trabalho, mesmo comercialmente, desde que creditem a você pela criação
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Universidade Federal do Rio Grande do Norte - UFRN
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Catalogação de Publicação na Fonte. UFRN - Biblioteca Setorial do Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes -
CCHLA

Oliveira, Lorenna Aracely Cabral de.


O uso do storytelling para composição de narrativas no
podcasting: um estudo do "caso Evandro" / Lorenna Aracely Cabral
de Oliveira. - 2023.
123f.: il.

Dissertação (mestrado) - Ciências Humanas, Letras e Artes,


Programa de Pós-graduação em Estudos da Mídia, Universidade
Federal do Rio Grande do Norte, Natal, RN, 2023.
Orientadora: Prof.ª Dr.ª Valquíria Aparecida Passos Kneipp.

1. Podcast. 2. Storytelling. 3. Elementos parassonoros. 4. O


caso Evandro. I. Kneipp, Valquíria Aparecida Passos. II. Título.

RN/UF/BS-CCHLA CDU 681.84

Elaborado por Ana Luísa Lincka de Sousa - CRB-15/748


LORENNA ARACELLY CABRAL DE OLIVEIRA

O USO DO STORYTELLING PARA COMPOSIÇÃO DE NARRATIVAS NO


PODCASTING: UM ESTUDO DO “CASO EVANDRO”

Dissertação apresentada ao Programa de


Pós-graduação em Estudos da Mídia, da
Universidade Federal do Rio Grande do
Norte, como requisito para obtenção do
grau de Mestre em Estudos da Mídia.

Aprovada em: ______/______/______

BANCA EXAMINADORA

__________________________________________
Prof.ª Dr.ª Valquíria Aparecida Passos Kneipp – UFRN
Orientadora

___________________________________________
Profº. Drº. Marcelo Bolshaw Gomes – UFRN
Membro Interno

___________________________________________
Profº. Drº. Hélcio Pacheco de Medeiros – UFRN
Membro Externo

___________________________________________
Profª. Drª. Suelly Maria Maux Dias – UFPB
Membro Externo
Dedico este trabalho aos meus pais, que
não pouparam esforços para que eu
pudesse realizar o sonho de me tornar
uma pesquisadora.
AGRADECIMENTOS

A jornada acadêmica na pós-graduação é muitas vezes solitária e se mostrou ainda


mais desafiadora em virtude da Pandemia. Ter a oportunidade de concluir esse importante
passo na minha formação acadêmica com amigos e colegas ao longo desse caminho fez a
experiência menos dolorosa.
Agradeço a DEUS pelo dom da vida, renovado a cada provação que se apresenta e
nos objetivos que se concretizam. Agradeço aos mais importantes da minha vida, a minha
família, em especial a minha mãe Newman e ao meu pai, Adalberto, ao meu irmão, Marcus
que acompanharam de perto o grande esforço que foi concluir esse mestrado.
Aos colegas do PPgEM, especialmente aos amigos do grupo de Pesquisa Gemini,
especialmente a Maria Aparecida e Luciana Mendes, pelo compartilhamento de ansiedades
e dúvidas durante essa jornada.
Às amigas virtuais, porém sempre presentes, Bianca Senna, Carol Gualter, Dandara
Morena e Valéria Loureiro por compartilharem comigo o amor pelos livros de romance.
À minha orientadora e mentora acadêmica Valquíria Kneipp pelos valiosos
momentos de discussão e conhecimentos compartilhados.
Agradeço também aos professores Marcelo Bolshaw, Adriano Cruz pelas valiosas
contribuições nesse percurso acadêmico. Ao professor Hélcio Pacheco, agradeço pela
paixão nos ensinamentos em Rádio ainda durante a graduação em Radialismo e no estágio
docência, como também pelas colaborações na Banca de Qualificação e por aceitar o
convite para a banca de Defesa. À professora Suelly Dias, que prontamente aceitou o
convite para a banca de Defesa.
À Capes, pelo apoio financeiro que possibilitou o privilégio, de dedicar-me a algo
pelo qual tenho paixão.
A todos que ajudaram com contribuições, seja na trajetória acadêmica, seja na
amizade, meu muito obrigado.
O áudio é o meio mais poderosos para se contar histórias.
Alex Blomberg (Radialista e podcaster)
RESUMO

Esta pesquisa analisa a presença da técnica storytelling aplicada nos podcasts narrativos -
contemplando estratégias utilizadas para a construção de narrativas. O objeto de pesquisa
consiste na quarta temporada do podcast Projeto Humanos – O Caso Evandro. A produção
apresenta uma investigação aprofundada do assassinato do garoto Evandro, questionando
a veracidade dos acontecimentos, bem como, a autoria do crime. A série jornalística põe
em diálogo o gênero true crime com o formato storytelling. Essa pesquisa compreende
além dos episódios do podcast, os elementos parassonoros (KISCHINHEVSKY E
MODESTO, 2014) que compõe a enciclopédia do Caso Evandro. A pesquisa analisou
como se configura o processo de produção da técnica storytelling aplicada aos podcasts e
em que medida os elementos parassonoros são utilizados para compor a narrativa. A base
teórica do estudo parte do conceito de podcast, discute a composição das produções em
áudio no formato storytelling (VICENTE E SOARES, 2021) e como os elementos
parassonoros (KISCHINHEVSKY E MODESTO, 2014) complementam a narrativa
central do podcast. O objetivo deste trabalho foi analisar a técnica de storytelling utilizada
na produção do Caso Evandro e como essa estratégia auxilia a narrativa do podcast. Como
procedimentos metodológicos, utilizamos uma abordagem multimétodos que se apoia nas
fases exploratória, descritiva e explicativa, e se desdobra neste estudo na utilização das
ferramentas de análise de conteúdo (BARDIN, 2011) e estudo de caso (YIN, 2001). A
análise permitiu considerar que o podcast ocupa na atualidade papel importante na
construção de narrativas em áudio, através de seus formatos e técnicas utilizadas e trabalha
a fim de construir o universo narrativo através da linguagem radiofônica e elementos do
storytelling, bem como, com a utilização de elementos parassonoros.

Palavras-chave: Podcast; Storytelling; elementos parassonoros; O caso Evandro.


ABSTRACT

This dissertation analyzes the presence of the storytelling technique applied in narrative
podcasts ー contemplating strategies used for the construction of narratives. The research
object is the fourth season of the podcast Projeto Humanos – O Caso Evandro. The
production presents an in-depth investigation on the murder of the boy Evandro, and
questions the veracity of the events, as well as the authorship of the crime. The journalistic
series puts the true crime genre into dialogue with the storytelling format. In addition to
the podcast episodes, it is also understood the parasound elements (KISCHINHEVSKY
AND MODESTO, 2014) that comprise the encyclopedia of the “O Caso Evandro”. The
research analyzed how the production process of the storytelling technique applied to
podcasts is configured and to what extent the parasound elements are used to comprise the
narrative. The theoretical basis of the study starts from the concept of “podcast”, discusses
the composition of audio productions in the storytelling format (VICENTE AND
SOARES, 2021), and how the parasound elements (KISCHINHEVSKY AND
MODESTO, 2014) complement the central narrative of the podcast. This work aimed to
analyze the storytelling technique used in the production of “O Caso Evandro” and how
this strategy assists the narrative of the podcast. As methodological procedures, a
multimethod approach was used, based on the exploratory, descriptive, and explanatory
phases, and unfolded into this study from the use of Content Analysis (BARDIN, 2011)
and Case Study (YIN, 2001). The analysis considered that the podcast currently occupies
an important role in the construction of audio narratives through its used formats and
techniques. Moreover, it also works to build the narrative universe through radio language
and storytelling elements, as well as parasound elements.

Keywords: Podcast; storytelling; parasound elements; The Evandro Case.


LISTA DE FIGURAS

FIGURA 1: COMO FUNCIONA O FEED RSS .......................................................................... 23


FIGURA 2: DEFINIÇÃO DE PODCASTING E PODCAST ........................................................... 27
FIGURA 3: BUSCA PELA PALAVRA PODCAST NO BRASIL DE 2004 ATÉ JULHO 2021............ 32
FIGURA 4: PARADIGMA DO ROTEIRO................................................................................. 47
FIGURA 5: OS PILARES DO PODCAST.................................................................................. 51
FIGURA 6: ESQUEMA DE REPRESENTAÇÃO DE UMA CÉLULA DE AÇÃO................................ 54
FIGURA 7: FÓRMULAS NARRATIVAS................................................................................... 56
FIGURA 8: ENCICLOPÉDIA DO CASO EVANDRO .................................................................. 65
FIGURA 9: LINHA DO TEMPO DO PROJETO H UMANOS ........................................................ 69
FIGURA 10: PODCAST PROJETO HUMANOS, 4ª TEMPORADA O CASO EVANDRO ................. 70
FIGURA 11: CARACTERÍSTICAS DA QUARTA TEMPORADA DO PROJETO HUMANOS .............. 71
FIGURA 12: REPRODUÇÃO DO EPISÓDIO 1 NO SITE PROJETO HUMANOS ............................ 79
FIGURA 13: I MAGEM EXPLICATIVA PRESENTE NA ENCICLOPÉDIA DO CASO EVANDRO .... 104
LISTA DE QUADROS

QUADRO 1: I NVESTIGAÇÃO CONCEITUAL DOS TERMOS PODCASTING E PODCAST .............. 25


QUADRO 2: EIXOS CATEGORIAIS ....................................................................................... 34
QUADRO 3: PARTES E EPISÓDIOS DA TEMPORADA O CASO EVANDRO. .............................. 74
QUADRO 4:EPISÓDIOS SELECIONADOS PARA ANÁLISE....................................................... 83
QUADRO 5: Q UADRO MATRICIAL DAS CATEGORIAS PARA ANÁLISE NO PODCAST CASO
EVANDRO ................................................................................................................... 89
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO................................................................................................................ 12
1. PODCAST: ESPECIFICIDADES DO MEIO .......................................................... 21
1.1 INÍCIO E PRINCIPAIS MARCOS DA TRAJETÓRIA DO PODCAST ......................... 22
1.2 UMA PODOSFERA BRASILEIRA............................................................................. 29
1.3 UMA PROPOSTA PARA CLASSIFICAÇÃO DE PODCAST ...................................... 32
1.4 O GÊNERO TRUE CRIME......................................................................................... 35
1.4.1 Produções true crime em podcasts.......................................................................... 37
2. STORYTELLING NO CONTEXTO DOS RECURSOS SONOROS .................... 44
2.1 NARRATIVAS E STORYTELLING ........................................................................... 44
2.2 STORYTELLING EM PODCASTS............................................................................. 49
2.2.1 Aplicações da técnica storytelling nos podcasts....................................................... 54
2.3 ELEMENTOS CONSTITUTIVOS DO STORYTELLING NO PODCAST .................... 57
2.4 ALGUNS ELEMENTOS PARASSONOROS............................................................... 62
3. PROJETO HUMANOS: APRESENTAÇÃO ........................................................... 67
3.1 CRIAÇÃO E PERCURSO DO PROJETO HUMANOS ................................................ 67
3.2 O CASO EVANDRO: A QUARTA TEMPORADA DO PROJETO HUMANOS ........... 69
3.3 O CRIME................................................................................................................... 72
3.4 CARACTERÍSTICAS DA TEMPORADA................................................................... 73
3.4.1 O podcaster, Mizanzuk.......................................................................................... 80
4. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS E ANÁLISE ....................................... 82
4.1 SELEÇÃO DO CORPUS ............................................................................................ 83
4.2 PESQUISA BIBLIOGRÁFICA ................................................................................... 84
4.3 COLETA DE AMOSTRAGEM................................................................................... 85
4.4 INSTRUMENTAL DA ANÁLISE............................................................................... 85
4.4.1 Estudo de caso ...................................................................................................... 85
4.2.2 Análise de conteúdo .............................................................................................. 87
4.5 ANÁLISE DOS EPISÓDIOS....................................................................................... 91
CONSIDERAÇÕES FINAIS ........................................................................................ 107
REFERÊNCIAS............................................................................................................. 112
APÊNDICE A – TRANSCRIÇÃO DOS EPISÓDIO ANALISADOS...................... 123
12

INTRODUÇÃO

Qualquer definição primária de podcast pode iniciar com a declaração de que


carrega consigo a essência do rádio tradicional com as possibilidades da internet. Desde o
seu início, o podcast se tornou um dos principais recursos de comunicação personalizada,
pois dialoga com nichos específicos valendo-se de produções segmentadas. Além disso, os
podcasts usufruem das transformações na ordem socioeconômica e cultural para explorar
a comunicação oral e criar experiências sonoras.
Através dessa explicação, é possível perceber porque a proposta do Projeto
Humanos é narrar histórias reais da vida cotidiana e contá-la em diversos episódios com
uso de linguagem sonora, por meio da narração. O caso Evandro é a quarta temporada do
Projeto Humanos, uma história real, contada através de uma série em áudio no formato
storytelling por Ivan Mizanzuk. Investigando-se o desaparecimento e o posterior
assassinato do garoto Evandro, em 1992, em Guaratuba, no Paraná, o podcast esquadrinhou
a condenação, talvez injustificada, de sete acusados. Para discutir esse acontecimento, o
podcast iniciou uma busca que atravessa desde entrevistas, recuperação de áudios - de
confissões, dos julgamentos e matérias de TV -, documentos, visitas ao local do crime,
entre outras várias formas de investigação.
O podcast Caso Evandro caracteriza-se como um fenômeno, pelo seu alcance, por
seu intercâmbio com outros formatos e pela conexão com seu público. Um primeiro
levantamento sobre os seus números já demonstra a relevância: a temporada alcançou a
marca de 9 milhões de downloads e tornou-se uma referência na podosfera brasileira,
mantendo-se nas listas de podcasts mais ouvidos ao longo da exibição da temporada. A
repercussão positiva resultou em outros produtos midiáticos, como um livro1 e uma série
documental para TV 2 , sendo o primeiro podcast a ser adaptado para o audiovisual
brasileiro. Também influenciou no aumento da criação de podcasts narrativos sobre crimes
reais no cenário nacional. Por consequência, obteve o envolvimento de fãs, que se reuniam
em grupos online nas redes sociais para debater detalhes apresentados nos episódios, em

1 O livro “O caso Evandro: Sete acusados, duas polícias, o corpo e uma trama diabólica” de Ivan Mizanzuk
foi lançado em junho de 2021 pela Happer Collins Brasil.
2 A série documental “O Caso Evandro” em nove episódios, original Globoplay (2021) em parceria com a

Glaz Entretenimento, tem a direção de Aly Muritiba e Michelle Chevrand.


13

uma busca rápida pela rede social Facebook encontramos pelo menos 3 grupos privados
sobre o podcast criados em 2019 e que variam entre 2 mil e 14 mil participantes3 .
Relatos de crimes reais geram muito interesse do público. Biressi (2001) explica
que o interesse ocorre através da tentativa de capturar a experiência peculiar de certos
acontecimentos e as consequências para os envolvidos, da forma mais verdadeira possível.
Portanto, seguindo essa vocação natural de contar histórias, os podcasts de crimes reais
tornaram-se bastante comuns. O surgimento do gênero True Crime como uma forma de
prestígio cultural em várias mídias - da televisão aos filmes e séries, aos livros e podcasts
- oferece uma oportunidade atraente para investigar um gênero específico que midiatiza
conteúdo jornalístico e investigativo como crimes em série, desaparecimentos,
assassinatos, feminicídios e outros.
Kischinhevsky (2018), aponta que os mais populares abordam crimes ou envolvem
investigações marcadas por controvérsias, sempre histórias reais que tiveram alguma
cobertura da imprensa, mas não com a devida profundidade. Tal envolvimento parte em
muito do cenário no qual, Caso Evandro prosperou. O programa carrega a marca de outros
sucessos e acontecimento presentes na cultura pop atual como, Serial 4 (2014). Bonini
(2015) afirma que um grande número de programas se destacou nesse grupo inicial de
produtores de rádio narrativo que trabalhavam em emissoras públicas americanas, sendo a
série investigativa de Sarah Koenig o caso mais popular. Haja vista, é sabido que a escuta
de podcast tem uma distribuição de cauda longa (ANDERSON, 2006), com os grandes
sucessos liderando o caminho.
Diante disso, reconhecer o Projeto Humanos e o seu protagonismo no Brasil, e
possivelmente na América Latina, nos posiciona no cenário conceitual sobre podcast
narrativo no mundo, pois com a ausência de emissoras públicas, o papel determinante no
cenário nacional é dos atores independentes, sem vínculo com empresas de mídia
hegemônica e/ou comercial, sendo o idealizador Ivan Mizanzuk e como consequência o
Caso Evandro, o representante desse movimento que se conecta ao público com um modelo
autossustentável e conquista o espaço até então disponível no ambiente digital.
O trabalho tem por foco analisar o podcast a partir da lógica de uma mídia em
ascensão, a partir da noção de ecologia midiática (SCOLARI, 2015). Essa metáfora
ecológica aplicada aos meios de comunicação admite duas interpretações: primeiro, que

3 O Site Buzzfeed relata em uma matéria sobre um desses grupos: https://buzzfeed.com.br/post/caso-


evandro-esse-grupo-do-face-discute-o-crime-com-os-envolvidos. Acesso em: 6 set 2021.
4 Disponível em: https://serialpodcast.org/season-one. Acesso em: 20 jul 2021.
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eles constituem um ambiente que modifica a nossa percepção e cognição; segundo, que as
mídias são espécies que vivem em um ecossistema e estabelecem relações entre si e com
os seus usuários. Neste sentido, os meios assumem papéis distintos dos que antes possuíam,
e complementares entre si.
O conceito de rádio expandido (KISCHINHEVSKY, 2016) compreende o rádio
como um meio que extrapola as ondas hertzianas. Dessa forma, o rádio se expande para
além do aparelho tradicional, tal como, nos dispositivos móveis, TV por assinatura,
internet, redes sociais, webrádios, podcasts, entre outros. O rádio, ao inserir-se na cultura
da convergência, “foi forçado a se reinventar mais uma vez e, surpreendentemente, mostrou
maior capacidade de reação do que outros meios de comunicação” (KISCHINHEVSKY,
2016, p. 13). E uma dessas revoluções palpáveis de se investigar é justamente a nova
roupagem pela qual o rádio expandido (KISCHINHEVSKY, 2016) e hipermidiático
(LOPEZ, 2010), assume através do podcast.
Essa pesquisa nasce no contexto do aumento do interesse sobre os podcasts no
Brasil. De acordo com dados divulgados pela PodPesquisa 5 , realizada pela Associação
Brasileira de Podcasters (ABPOD) em 2018 - ano de lançamento da quarta temporada do
Projeto Humanos, havia mais de 2 mil programas ativos no Brasil. Paralelamente ao
aumento da produção, cresce também o número de ouvintes. Fato corroborado pela
pesquisa Kantar Ibope (2021), que afirma que 31% dos ouvintes com acesso à internet ou
com aplicativos de áudio ouviram podcasts (pesquisa avaliou o período de três meses
daquele ano) - um aumento de 32% em relação ao ano de 2020 6 , o que confirma a
relevância e o crescimento do interesse dos brasileiros em relação a esse tipo de narrativa
digital. Esses dados colaboram para que o podcast seja percebido como uma tendência
global, relacionada a utilização dos recursos da linguagem sonora e radiofônica.
A abordagem pesquisada compreende o podcast enquanto uma forma cultural que
se baseia nas novas formas de sociabilidade e na construção de uma rede de identificações
culturais, valorizadas e prestigiadas pelos usuários (HERSCHMANN;
KISCHINHEVSKY, 2007). Ocorre que com a possibilidade de usos diferenciados,
permitiu que qualquer usuário pudesse criar seu próprio conteúdo sob demanda. É através

5Disponível em: https: https://abpod.com.br/podpesquisa /. Acesso em: 21 fev 2020.


6Disponível em: https://www.kantaribopemedia.com/estudo-da-kantar-ibope-media-indica -que-consumo-
de-radio-aumentou-e-alcanca-80-dos-brasileiros/. Acesso em: 10 mar 2022.
15

dessa prática social comunicativa onde são estabelecidas novas formas de mediação
sociocultural.
Logo, facilitado pelo acesso aos smartphones, tornou-se na atualidade para uma
grande maioria de pessoas a principal maneira de consumir conteúdo em áudio. Da mesma
forma, as transformações nos aplicativos de escuta teriam um importante papel nas formas
de experimentações da mídia sonora digital (MORRIS; PATTERSON, 2015).
No caso do objeto dessa pesquisa, histórias reais humanizam emoções complexas e
mostram exemplos de comportamento humano sob ameaças e como as pessoas mudam
com o tempo. Elas tornam o assunto mais claro e significativo para o seu público ouvinte.
À primeira vista, o Caso Evandro é um drama em áudio que narra um evento imersivo,
onde um garoto comum sofre um horror indescritível. Apesar disso, também é a história
dos acusados que confessaram o crime sob tortura. Ambas as histórias são seguidas por um
jornalista investigativo cavando seu caminho através de uma teia de perguntas sem
respostas.
Com o foco nessas transformações, deslocamos nossa atenção para um elemento
crucial na narrativa do Caso Evandro e que parece, inicialmente, ser o responsável por
organizar em todos os níveis e conduzir a história: o storytelling. “Vivemos em um mundo
mediado por informações que, unidas, constroem narrativas” (MUSSE, FERNANDEZ,
2017, p. 2). Ao utilizar a técnica storytelling para contar histórias de uma forma que capta
a atenção e envolve o público, o formato oferece um design de áudio que eleva a
experiência de imersão, transformando a narrativa de forma significativa. Incorporando,
desta forma, uma nova prática social na produção de conteúdo sonoro.
Storytelling é uma palavra em inglês que pode ser definida como a arte ou atividade
de escrever, ler ou contar histórias, segundo o Cambridge Dictionary7 . Como podemos ver
nesta tradução do original inglês, optamos nesta pesquisa por não traduzir o vocábulo. A
razão considera alguns fatores como: a aceitação do termo para definir um campo de
estudos mais abrangente; e o fato de não existir uma palavra de tradução direta ao conceito.
Não se referindo a uma mídia específica, em sua tradução literal é algo como “contar
histórias”. A possível tradução de “Storytelling” para “Contação de história”, poderia
remeter a prática pedagógica de narrar histórias na educação infantil. Por essas razões, Ivan
Mizanzuk, idealizador e produtor do podcast o caso Evandro, opta por sua aplicação em
inglês. Nessa pesquisa, o storytelling pode ser interpretado como storytelling sonoro, no

7 Disponível em: https://dictionary.cambridge.org/pt/dicionario/ingles/storytelling. Acesso em: 14 out 2021.


16

qual a narrativa ocorre através do som, que contempla um roteiro reflexivo infundido em
uma dimensão sonora.
O termo é utilizado para construir narrativas com base na habilidade de contar
histórias, como ressalta a definição feita pela National Storytelling Network (2022):
“storytelling é a arte interativa de usar palavras e ações para revelar os elementos e as
imagens de uma história, incentivando a imaginação do ouvinte” 8 .
Aqui vale ressaltar que, embora o vocábulo storytelling não esteja - ainda -
incorporado à língua portuguesa de acordo com o acordo ortográfico da língua portuguesa,
mantido pela Academia Brasileira de Letras, sendo ainda um estrangeirismo, optamos por
não utilizar o termo em itálico, reservando este recurso para ênfases no texto, haja vista,
que este conceito refere-se a principal abordagem teórica e tem seu uso recorrente nessa
pesquisa. É preciso distinguir que, nesta pesquisa, o significado assumido pelo termo
storytelling por vezes pode assumir a perspectiva de técnica ou de formato. Afinal de
contas, o que é storytelling? Percebe-se, nas definições, certa tendência em considerar
como uma arte de contar histórias, ou seja, um conjunto de técnicas narrativas para
construção de uma história. Nessa perspectiva, pode ser entendido como um recurso, ou
seja, um meio que utiliza elementos que auxiliam o detalhamento dos acontecimentos de
um texto narrativo.
Isto posto, nessa pesquisa especificamente, atua como técnica quando incorporar a
aplicação desse conceito para a construção do fazer narrativo; será formato quando o
resultado da aplicação dessa técnica resultar num produto, seja um episódio ou série com
personagens, conflitos e arcos narrativos que conferem significado as intencionalidades
narrativas.
O storytelling, de modo amplo, pode ser aplicado por meio de vários formatos.
Tomando emprestado o aforismo de Marshall McLuhan (1911-1980), neste caso o meio é
a mensagem, já que o meio é um recurso sonoro transformador que reorganiza experiências
de maneiras únicas. Portanto, a utilização do storytelling em mídias sonoras une a
possibilidade de contar histórias relevantes com técnicas que permitem criar a sensação de
uma narrativa atrativa e onde o público se sinta imerso (VIANA, 2020a).
Para a escolha do podcast que compõem o corpus, delimitou-se a análise da
temporada que investiga os personagens e eventos sob uma lógica narrativa estruturada

8No original: “Storytelling is the interactive art of using words and actions to reveal the elements and
images of a story while encouraging the listener’s imagination” (NETWORK, 2022).
17

com uma técnica que utiliza recursos que mantém o ouvinte atraído o tempo todo. O uso
da produção de som é uma das características do Caso Evandro que imprime identidade ao
programa, o silêncio, sua trilha musical, depoimentos gravados, narração e efeitos sonoros
são combinados de uma maneira harmoniosa. Ao contrário de outros podcasts em que há
interação entre mais de uma pessoa, Ivan Mizanzuk narra sozinho e conta o caso em
primeira pessoa, como um narrador padrão. Utilizando a voz num tom confessional, tecendo
comentários e suas indagações fruto da sua consciência. Ele levanta questões, interroga e faz
observações.
A aplicação correta da sua entonação e o ritmo com que as palavras são proferidas
confere emoção ao roteiro. Esses componentes conseguem imprimir ritmo e originalidade
para a obra. Lindgren (2016) atribui a popularidade do formato narrativo em podcasts ao
envolvimento dos apresentadores, que têm em comum uma abordagem mais pessoal ao
contar as histórias. São essas transformações que vão organizando a escuta e dando
significação aos personagens e seus respectivos atos.
Identifica-se que ao ressignificar as “maneiras de fazer” (CERTEAU, 2000), o
podcast faz uso dessa forma de composição para expressar tecnicidades relacionadas ao
processo narrativo. A partir disso, a escolha do Caso Evandro se mostrou adequada por ser
o podcast que congrega, enredo forte, personagens interessantes, pesquisa sólida e uma
estrutura narrativa definida a partir do modo de produção (WILLIAMS, 2011) evidenciado
pelo recurso storytelling.
Posto isso, a pesquisa realizou um estudo de caso a partir da análise da quarta
temporada do Projeto Humanos – O caso Evandro. As formas narrativas e os processos
midiáticos que se instauram no âmbito da produção e técnica desta temporada são
fundamentais para que pudéssemos fazer uma análise dos podcasts narrativos de forma
mais complexa e representativa, a fim de tecer uma definição delimitadora e sistemática do
formato storytelling como prática social. Partindo dessa compreensão, esta dissertação
possui potencial comunicacional, pois utiliza novas formas e linguagens para aprimorar
esse recurso de áudio, possibilitando uma relevante contribuição no estudo desta nova
prática social.
O objetivo foi, assim, por um lado, analisar a técnica storytelling aplicada em
podcasts, e, por outro, relacioná-lo a uma ampla produção de obras centradas em
radiojornalismo narrativo em podcast (KISCHINHEVSKY, 2018) cuja classificação,
define serem histórias relatadas quase que como numa grande reportagem e tem como foco
as produções que carregam a narrativa como eixo central do relato jornalístico. Tendo em
18

vista que, apesar dos estudos reconhecerem o formato storytelling como uma técnica, e as
características próprias dessa narrativa não ficcional, precisamos, em um primeiro
momento, organizar seus conceitos, corpus e peculiaridades próprias. Depois, tendo em
mãos essas ferramentas, fazer uma análise da estrutura do formato, descrevendo os
elementos e como eles contribuem para a construção do universo narrativo.
Como primeiro passo na delimitação do formato storytelling, a pesquisa optou por
partir dos mesmos princípios de que a técnica, posteriormente, será utilizada para tentar
rastrear as particularidades pertinentes a essa categoria.
De modo, que com o cenário em constante evolução e o surgimento dos
podcasts, esta nova plataforma de distribuição de conteúdo que além de utilizar
linguagem similar ao empregado no rádio, aplicam técnicas narrativas que aumentam o
envolvimento emocional do ouvinte e transformam em uma experiência mais imersiva.
Contudo, apenas recentemente o formato começou a se popularizar no Brasil. Lançado em
2015, o podcast Projeto Humanos é considerado um dos pioneiros desse formato.
Diante do exposto, o ponto nodal da presente pesquisa foi: como se configura o
processo de produção da técnica storytelling aplicada aos podcasts tendo como foco a
quarta temporada do Projeto Humanos – O Caso Evandro e em que medida os elementos
parassonoros são utilizados para compor essa narrativa?
Pelo fato da técnica storytelling aplicada aos pod casts possuir características
próprias que compreende um estilo e elementos específicos, trabalhamos com a hipótese
que esse formato de podcast propicia a criação de nova identidade narrativa que articula
uma linguagem própria para o meio sonoro; e considera tanto as técnicas
literárias/narrativas como a textura sonora, apresentando uma experiência informativa e
imersiva.
A partir da relação entre podcast, formato e storytelling, e de observações prévias
realizadas sobre o podcast selecionado, destacou-se como objetivo geral: analisar a técnica
storytelling utilizada na produção do Caso Evandro e como essa estratégia auxilia a
construção da narrativa deste podcast. Norteamos a pesquisa de acordo com três objetivos
específicos: investigar nos episódios quais os principais elementos da técnica storytelling
praticada pelo Caso Evandro; classificar as principais características da estrutura narrativa
na quarta temporada do podcast Projeto Humanos; compreender e analisar os elementos
parassonoros disponibilizados através da enciclopédia e como eles contribuem na
construção do universo narrativo no podcast Caso Evandro.
19

A pesquisa se enquadra na linha de Estudos da Mídia e Práticas Sociais, uma vez


que estuda o podcast enquanto um processo midiático cultural através de seus modos de
produção. Nesse universo, o podcast assume um papel na atualidade, não como um
dispositivo que emprega tecnologia, mas como uma transformação cultural que altera o
curso e as formas de interação nos processos sociais e como um importante espaço de
comunicação midiática.
Quanto às motivações de ordem prática, a pesquisa contribui para a discussão social
do podcast como um recurso que materializa o propósito de contar histórias, pautar
assuntos relevantes na sociedade, buscando destaque na vida das pessoas e ousando
transformar os hábitos dos ouvintes. Além disso, é oportuno um estudo que contemple as
práticas de produção ressignificadas do meio radiofônico através do podcast com foco nas
estratégias praticadas pelos formatos.
Quanto à ordem acadêmica, a pesquisa traz inovação para o estudo de podcast, já
que estuda o formato e os elementos empregados pela temporada do Projeto Humanos, com
o propósito de amplificar as perspectivas sobre a técnica storytelling no ambiente sonoro,
relevante contribuição para as investigações sobre narrativas não ficcionais.
Com a análise desta temporada, propõe-se refletir a utilização de como essa técnica
– ou seja, o procedimento que opera ao longo de vários episódios e atua na composição
narrativa em métodos de produção, formas de organização do enredo e linguagem –
expressa efetivamente suas linguagens e práticas, a fim d e proporcionar maior imersão ao
ouvinte.
Concernente às questões pessoais, a escolha do tema também se prende ao fato do
mesmo estar em linha direta com a área de atuação da pesquisadora, considerando que a
formação acadêmica se deu em Comunicação Social – habilitação em Radialismo, a autora
é admiradora incontestável do rádio e mídia sonora em suas mais diversas manifestações.
Outrossim, há a importância de discutir como um formato produzido independente
poderia afetar as práticas sociais de produção sonora, haja vista estamos vivendo uma nova
“era de ouro do áudio” (SEBASTIAN TOMICH apud FERRARETTO, 2019), em meio a
uma época que se faz cada vez mais presente em nosso cotidiano, a partir do crescimento
dos próprios podcasts, rádios online e smart speakers9 .

9Os smart speakers são um sistema de inteligência artificial de voz e avançam em seu aprendizado de
acordo com o uso dado a eles (KISCHINHEVSKY, LOPEZ, 2018).
20

A dissertação está estruturada em cinco capítulos. O primeiro capítulo contextualiza


a mídia podcast em uma perspectiva histórica, na qual resgatam-se aspectos relacionados
ao seu surgimento e evolução no cenário brasileiro, como também a apresentação das
características dos formatos e do gênero true crime, uma breve contextualização das
produções em áudio deste gênero.
O segundo capítulo aborda o storytelling aplicado ao meio sonoro e seus elementos
constitutivos. Neste capítulo dá-se ainda a ênfase à relação dos elementos parassonoros que
complementam a narrativa central do podcast. O terceiro capítulo apresenta em detalhes o
objeto da pesquisa, o podcast Projeto Humanos, delineando a quarta temporada, suas
características, o crime e o seu idealizador.
No quarto capítulo, evidencia a trajetória percorrida através dos procedimentos
metodológicos e da abordagem multimétodos adotados durante a pesquisa. Tem-se ainda
a delimitação das unidades em categorias e formas de aplicação no estudo. O quinto
capítulo traz a apresentação dos dados, características principais do podcast e a análise do
material.
As considerações finais apresentam, enfim, as reflexões acerca do formato
storytelling para composição de narrativa e as perspectivas d a utilização da técnica frente
as constantes experimentações da modalidade sonora apresentada.
21

1. PODCAST: ESPECIFICIDADES DO MEIO

[...] o que pode tornar o podcast um sucesso não é seu


status de rádio disruptor (como alguns dos primeiros
discursos previram), mas sim como uma plataforma
que deu novo fôlego ao estabelecido e, em alguns
casos tropos e formas amplamente
esquecidos (MARKMAN, 2015, p. 241, tradução
nossa)10 .

Neste capítulo, serão tratadas as especificidades do podcast levando-se em conta


suas características. Antes, será traçado um breve histórico do processo podcasting ao
produto. Primeiro há uma explicação sobre a mídia enquanto modalidade radiofônica que
deu origem, descrevendo a primeira e a segunda era (BONINI, 2015) e suas categorias
(gêneros e formatos). O objetivo é levantar todos os conceitos pertinentes ao meio condutor
da técnica storytelling, objeto desta pesquisa, para que se possa compreendê-la da forma
aprofundada nas próximas etapas.
Uma modalidade de radiofonia sob demanda, assincrônica, que vai além da oferta
de conteúdos em websites de emissoras, assim Kischinhevsky (2018) define o podcast. Nos
últimos anos, o conceito de escuta sob demanda se popularizou e tornou o podcast uma
nova opção em áudio. Os programas em áudio estão ganhando espaço significativo no
cenário digital, pois se apresentam como um canal propício para contar histórias, produzir
conteúdo sobre os mais diversos temas e formatos, tendo como vantagem grande conexão
com o público, além de oferecer autonomia e produção descentralizada.
Considerados uma inovação da comunicação sonora, o meio se utiliza da voz e da
linguagem radiofônica para se comunicar. Os podcasts reúnem memórias do rádio,
concepções relacionadas à mídia sonora e articulam, em simultâneo, características da
lógica digital, com a possibilidade de imersão. Foi a partir das apreensões provenientes dos
estudos de rádio e mídia sonora, tais como a definição de podcast com base na forma
específica de compreendê-lo, que as reflexões que possuíam como centro a questão do seu
vínculo com o meio radiofônico e seu conteúdo base ficaram em evidência (MEDEIROS,
2006).

10No original: “[...] Overall, what this symposium offers us as scholars is an opportunity to reflect that what
may make podcasting successful is not its status as a radio disruptor (as some of the early discourse predicted),
but rather as a platform that has breathed new life into established, and in some cases largely forgo tten tropes
and forms”.
22

1.1 INÍCIO E PRINCIPAIS MARCOS DA TRAJETÓRIA DO PODCAST

Compreendido como um conteúdo sonoro disponível na internet, o podcast surge a


partir do Feed RSS11 configurado, sobretudo, pela distribuição/atualização de conteúdo
online. Em 2001, após experimentos com a tecnologia RSS para distribuição de links de
áudio, o programador Dave Wine criou o que ficou conhecido como RSS 2.0 (MACK;
RATCLIFFE, 2007.
Com adaptações do código Adam Curry, ex-VJ da MTV norte-americana na década
de 1980, desenvolveu uma forma de transferir arquivos de áudio disponibilizados através
do feed RSS para um agregador no iTunes - o feedRSStoiPod -, esse procedimento
sincronizava arquivos de áudio do computador diretamente com o dispositivo iPod. A
partir desse experimento Curry ficou conhecido como o pai do podcasting, o Podfather
(MACK; RATCLIFFE, 2007).

O principal papel de Adam Curry para o podcasting foi a popularização


do meio. Seu podcast de Daily Source Code, que era uma parte musical,
e parte uma evangelização midiática, tornou-se uma espécie de fenômeno
no final de 2004 e início de 2005. Curry tornou-se a primeira estrela do
podcasting. Ele fez campanha para as pessoas comuns "retomarem a
mídia" [...]. (MACK; RATCLIFFE, 2007, p. 42, tradução nossa) 12 .

O termo podcasting foi utilizado pela primeira vez no artigo Audible Revolution, de
12 de fevereiro de 2004, escrito pelo jornalista britânico Ben Hammersley para o jornal
The Guardian, que indagava:

Tocadores de MP3, como o iPod da Apple, em muitos bolsos, softwares


de produção de áudio baratos ou de graça, e blogs, uma parte estabelecida
da internet; todos os ingredientes estão lá para um novo boom no rádio
amador. Mas como chamamos isso? Audioblogging? Podcasting? Mídia
de Guerrilha? (HAMMERSLEY, 2004, tradução nossa) 13 .

11 É a sigla em inglês para Rich Site Summary ou Really Simple Syndication, uma forma simplificada de
apresentar o conteúdo de um site.
12 No original: “Adam Curry’s main role in podcasting was the popularization of the medium. His Daily

Source Code podcast, a part-music, part-The-Man-Evangelizing-the-Medium, became something of a


phenomenon in late 2004 and early 2005. Curry became podcasting’s first star. He campaigned for
ordinary people to ‘take back the media’ [...].”
13 No original: “MP3 players, like Apple’s iPod, in many pockets, áudio production software cheap or free,

and weblogging an established part of the internet; all the ingredients are there for a new boom in amateur
radio. But what to call it? Audioblogging? Podcasting? GuerillaMedia?”. Disponível em:
https://www.theguardian.com/media/2004/feb/12/broadcasting.digitalmedia . Acesso em: 22 jun. 2021
23

De acordo com Izuzquiza (2019, p. 25, tradução nossa) 14 , “o feed RSS é um


documento de texto no qual são coletados os dados básicos de uma sucessão de
publicações: o nome da obra, sua descrição, seu autor, os títulos das entregas que a
compõem, suas descrições e onde podemos encontrá-las”. De maneira simplificada, o feed
RSS faz o reconhecimento da linguagem XML devidamente registrada para que o conteúdo
seja distribuído por meio de softwares, aplicativos ou páginas na internet, permitindo que
os usuários recebam atualizações regulares, segundo a figura 1.

Figura 1: Como funciona o feed RSS

Fonte: Elaborado pela Autora

Conforme foi apresentado na figura 01, o primeiro passo é o podcaster gravar um


episódio de podcast, em seguida ao criar um feed RSS gera um arquivo onde aparecem as
principais informações sobre o programa , esse link é disponibilizado para agregadores e
aplicativos, ao se inscrever em um desses suportes os usuários são informados das
notificações e atualizações automaticamente.
Uma das principais características da ferramenta RSS é a possibilidade de usos
diferenciados, ou seja, com isso, é possível o acompanhamento e/ou download automático
do conteúdo de um podcast (SILVA; OLIVEIRA, 2020). É importante ressaltar que a
tecnologia RSS permitia que outros formatos midiáticos (vídeos, fotos, textos etc.) também
fossem transferidos, contudo, o áudio ganhou destaque.

14No original: “El feed RSS es un documento de texto en el que se recogen los datos básicos de una sucesión
de publicaciones: El nombre de la obra, su descripción, su autor, los títulos de las entregas que lo componen,
sus descripciones, y dónde podemos encontrarlas”.
24

Vicente (2018a) destaca a forte conexão da empresa Apple no cenário estabelecido,


explícito inclusive no termo proposto por Hammersley, já que o termo podcasting
representa a junção das palavras iPod e broadcasting (transmissão via rádio). Ainda em
2005, a Apple, vendo o potencial dessa tendência, adicionou um diretório específico para
podcasts, atualizando seu programa de gerenciamento de música iTunes. Dessa forma, a
popularidade dos podcasts sofreu significativo aumento. Concomitante a isso, o dicionário
americano New Oxford American Dictionary elegeu o vocábulo podcast como a palavra do
ano de 2005 (FOLHA DE SP, 2005).
Para Primo (2005), o podcasting vai além da distribuição e escuta de arquivos de
áudio. Dessa maneira, o podcasting é compreendido como “uma tecnologia para
distribuição, recepção e escuta sob demanda de conteúdo sonoro” (BONINI, 2020, p. 14).
Silva e Oliveira (2020) aponta quais foram as condições que permitiram a ascensão do
podcasting:

Como um processo para elaboração de programas de áudio sob demanda


que podem ser baixados para escuta a qualquer momento e em qualquer
lugar – sem a limitação do alcance das ondas. Os programas são, na
verdade arquivos digitais de áudio (podcasts), que podem ser de gêneros
e formatos diversificados. São armazenados em sites que os distribuem
por meio da tecnologia feed RSS (Really Simple Syndication) para
aplicativos e plataformas de streaming (transmissão de dados digitais via
internet que podem ser on demand ou live streaming). O feed RSS
permite que o usuário se mantenha atualizado dos novos episódios sem a
necessidade de ir até o site onde o arquivo está hospedado. Basta que faça
a assinatura do respectivo programa no aplicativo ou plataforma de seu
interesse (SILVA; OLIVEIRA, 2020, p. 184).

Na dificuldade de não haver uma conceituação única, as discussões atravessaram


outros caminhos. Com isso em mente, foi realizado uma investigação conceitual entre as
principais definições de podcast e podcasting entre os estudiosos do tema. Este
levantamento foi realizado com base na ordem cronológica/data de publicação e apresentou
estes significados, conforme o quadro a baixo.
25

Quadro 1: Investigação conceitual dos termos Podcasting e Podcast

AUTOR(ES) TERMO UTILIZADO DEFINIÇÃO


CASTRO (2005)15 Um produto da nova fase da
PODCASTING cibercultura, marcada pela mobilidade
das tecnologias wireless (p. 7)
PRIMO (2005) PODCASTING Uma nova forma de produção e escuta
de informações sonoras (p. 6)
Um sistema de produção e difusão de
PODCAST arquivos sonoros que guardam
LEMOS (2005) similitudes com o formato dos
programas de rádio (p. 1).
Conteúdo de mídia entregue
BERRY (2006) PODCASTING automaticamente a um assinante via
Internet (p.144, tradução nossa)16 .
Uma forma de produção descentralizada
de conteúdo sonoro que disponibiliza os
MEDEIROS (2006) PODCASTING arquivos na Internet para serem
baixados quando o usuário bem entender
(p. 3-4)
HERSCHMANN E Modalidade de rádio sob demanda (p.
KISCHINHEVSKY PODCASTING 103).
(2008)
Permite a disponibilização de áudios em
LOPEZ (2010) PODCAST sites para serem consumidos sob
demanda pelo ouvinte-internauta
(p.127).
Entendidos aqui como novas
modalidades de radiofonia,
KISCHINHEVSKY PODCASTING complementares à radiodifusão sonora
(2012)
em ondas hertzianas ou via internet (p.
426).
O podcast é um conteúdo, normalmente
em áudio, produzido sobre os mais
PODCAST E diversos temas e disponibilizado na
NEIVA (2013) PODCASTING internet, especialmente nas plataformas
de streaming, [...] podcasting, que é o ato
ou processo de criação e transmissão (p.
438).
Uma forma de difusão, via rede, de
FERRARETTO (2014) PODCASTING arquivos ou séries de arquivos – os
podcasts, nesse caso específico de áudio
com linguagem radiofônica (p. 22-3).

15 Em trabalho pioneiro, Gisela (2005), destacou as questões relacionadas ao consumo dos arquivos sonoros
digitais (KISCHINHEVSKY, 2011).
16 No Original: “media content delivered automatically to a subscriber via the Internet ”.
26

AUTOR(ES) TERMO UTILIZADO DEFINIÇÃO


Uma tecnologia para distribuição,
BONINI (2015) PODCASTING recepção e escuta sob demanda de
conteúdo sonoro produzido por
tradicionais editores (p. 14).
O termo podcasting para designar a
VICENTE (2018a) PODCASTING E prática de produção e distribuição de
PODCAST arquivos, enquanto podcast será
utilizado para definir programas e
episódios (p. 88)
Disseminação de arquivos digitais de
BUFARAH JÚNIOR PODCAST áudio através da web com periodicidade
(2020) e utilizando tecnologias de indexação
RSS (p. 37)
Fonte: Elaborado pela autora

A palavra, que até poucos anos era desconhecida da maioria das pessoas, foi
classificada e organizada de acordo com suas características de produção. Ao longo dos
anos, conforme o quadro, podemos perceber que os autores buscaram construir um
significado que evidenciasse as diferenças entre os termos. Embora, podcast e podcasting
sejam vocábulos utilizados para se referir ao formato, ambos indicam ideias diferentes.
Assim, para compreendermos os termos e partindo do pensamento de McLuhan,
junto a outros ecólogos da mídia como ressaltam Strate, Braga, Levinson (2019, p. 45), “ao
dizer que o meio é a mensagem, McLuhan está nos dizendo para trocar a figura pelo fundo,
a mensagem pelo meio. Geralmente ignoramos o meio e prestamos atenção apenas ao
conteúdo, mas é o meio que tem maior impacto em nossa vida”.
O que fica evidente no uso do podcast, que pode ser utilizado tanto para o
entretenimento quanto para o se informar, porém, tudo isso será insignificante diante da
revolução sonora causada pelo uso do podcasting, a partir das práticas criadas com essa
tecnologia. Essa inovação tornou o conteúdo sonoro muito mais acessível, permitindo o
público a possibilidade de ouvir onde quiser, como quiser e quando quiser, como também
participativo já que qualquer pessoa pode produzir um podcast e distribuir pela internet.
De modo que, o podcasting é a prática cultural e social de produção e consumo de conteúdo
sonoro digital (BONINI, 2020), que envolve suas formas de circulação, interação e
características. Sendo mais amplo e complexo que o próprio podcast. E o podcast é o
produto (episódio ou série) resultado dessa prática social, conforme figura 2:
27

Figura 2: Definição de Podcasting e Podcast

Fonte: Elaborado pela autora

No início do seu surgimento, a mídia podcast fez pesquisadores contestarem o seu


vínculo com o rádio e inclusive com seu conteúdo basilar (VIANA, 2020b). Medeiros
(2006, p. 07) um dos primeiros autores brasileiros a pesquisar a respeito do tema, relata as
principais diferenças entre os meios e afirma que “o podcasting se opõe ao rádio, uma vez
que, para o rádio, o fluxo é vital, caso contrário não podemos caracterizar uma programação
ou uma ‘grade’ de programação, diferente de um Podcast que não depende de um fluxo de
transmissão para ser ouvido”.
Alguns anos depois a atenção era voltada para o caráter multimídia do podcast,
como aponta Carvalho (2011, p. 03): “o podcast é uma ferramenta de distribuição de
conteúdo digital via internet, portanto, pode ser suporte também de vídeos, textos, imagens
estáticas e até mesmo de pacote de arquivos compactados”. De acordo com Vicente
(2018b), a tradição radiofônica das emissoras públicas, teve e tem uma importância
fundamental na consolidação do podcast e na definição de sua identidade.
Entretanto, com os avanços das discussões e a própria reformulação do conceito de
rádio, como “uma linguagem comunicacional específica, que usa a voz, a música, os efeitos
sonoros e o silêncio, independente do suporte tecnológico” (FERRARETTO,
KISCHINHEVSKY, 2010, p. 1010), o podcast passou a ser considerado uma modalidade
radiofônica, pois está inserido num cenário de metamorfose protagonizado pelo rádio
hertziano.
No contexto atual, os estudos giram em torno das suas potencialidades e
complexidades narrativas (VIANA, 2020b). O enfoque das discussões é o áudio e a
28

linguagem radiofônica, suas características e possibilidades de experimentações práticas e


teóricas, bem como nas formas de financiamento de mídia.
Deste modo, percebe-se que a prática do podcasting em seu início estava ligada
principalmente à distribuição de arquivos de áudio pela internet para download e posterior
reprodução (VICENTE, 2018b). Nos anos que se seguiram, impulsionados pela internet,
proliferação dos smartphones e o surgimento de novas tecnologias, os hábitos e a forma de
consumo foram atualizados até a chegada do streaming.
Nesse cenário, surge a “segunda era do podcasting” (BONINI, 2015) nos Estados
Unidos em 2012, caracterizada pela transformação do podcasting em uma prática produtiva
comercial para meio massivo. Onde, alguns famosos podcasts do rádio público americano,
lançam uma maneira de financiar inteiramente seus programas por meio de seus próprios
ouvintes, por plataformas de financiamento coletivo.
Bonini (2015, p.19) ressalta que o “podcasting deve ser visto como um meio digital
massivo em si, não como uma alternativa à radiodifusão, nem como uma renovação de sua
forma, com novos mercados emergentes e modelos de negócios, bem como um crescente
número de ouvintes e produtores”.
Esse período caracterizado como segunda era apresenta características que vão
contribuir para a proposta de classificação de podcasts por diversos pesquisadores ao longo
dos anos. Berry (2019) realizou um estudo para mapear alguns aspectos inerentes ao
podcast e identificou cinco características principais do formato: intimidade,
informalidade, inovação, independência e (des)intermediação. O autor relata que, o fato de
o ouvinte fazer uma escolha deliberada ao ouvir um podcast cria um vínculo - permanente
ou não - entre o ouvinte e o podcaster, proporcionando uma abertura para a intimidade.
Observa-se que, com a intimidade vem a informalidade que assume um tom despojado de
conversação. Como uma mídia em expansão firmemente estabelecida com atributos de
inovação, apresenta conteúdos distintos e direcionados ao ouvinte, nos quais mostram sua
independência e falam diretamente com o seu público por meio da desintermediação (a
maneira pela qual os podcasts permitem que os podcasters ignorem os meios de
comunicação tradicionais e falem diretamente com o público). (BERRY, 2019).
Após o estudo de aspectos fundamentais e dos principais marcos na trajetória do
podcast, passaremos aos mais relevantes registros do podcast no cenário brasileiro.
29

1.2 UMA PODOSFERA BRASILEIRA

Em 21 de outubro de 2004, foi publicado o primeiro episódio do Digital Minds, que


veio a ser o primeiro podcast do Brasil. Criado por Danilo Medeiros, o programa abordava
tecnologia, ciência, música, cultura e surgiu como parte do blog de mesmo nome. Embora
não tenha sido o primeiro blog a disponibilizar arquivos de áudio para download, porém o
primeiro a fazê-lo através do podcasting (LUIZ; ASSIS, 2010).
No ano seguinte, em 2005, foi organizada a primeira edição da Conferência
Brasileira de Podcast (PodCon Brasil). O primeiro evento brasileiro dedicado
exclusivamente ao assunto foi organizado por Ricardo Macari e patrocinado pelo podcaster
Eddie Silva e pela cervejaria Kaiser, ocorreu nos dias 2 e 3 de dezembro em Curitiba, no
Paraná (LUIZ, 2014).
Apesar do grande crescimento do podcast, ainda em 2005, ocorreu o chamado
podfade, que significou o fim de vários programas não somente no Brasil como no mundo.
Esses acontecimentos continuaram até o início de 2006. O cenário brasileiro de podcast só
recuperou o fôlego em 2008 quando o prêmio iBest, um dos principais prêmios brasileiros
voltados para internet, incluiu a categoria podcast para julgamento de voto popular, sendo
seu vencedor o Nerdcast, seguido por Rapaduracast e Monacast, estes sendo os
representantes da nova geração de Podcasters (LUIZ, 2014).
Foi durante a realização da PodCon 2005, que teve início o desenvolvimento da
Associação Brasileira de Podcast (ABPod). Após o evento, fomentou-se em listas de
discussão a criação da associação. Assim, em 13 de maio de 2006 foi criado o órgão de
associação, coordenação, orientação e representação dos produtores, locutores,
comentaristas e veiculadores de podcast, em todo o território nacional e teve como seu
primeiro presidente o podcaster Maestro Billy. Em 2008 houve a primeira edição da
PodPesquisa, criada inicialmente por Marcelo Oliveira (Projeto Fritzlandia) com o apoio
de Ronaldo Ferreira (Racum), com a intenção de conhecer a comunidade e o ouvinte de
Podcast no Brasil (ABPod, 2021).
Em dezembro de 2005, saía a única edição da Revista Vocêpod sobre podcast ligada
ao Portal Vocêpod, cujo slogan era “A revista do podcast brasileiro”, que reunia
informações e notícias diárias, tutoriais sobre gravação e publicação e fórum para resolução
de dúvidas. Sendo também um local para hospedagem gratuita de podcasts. Eddie Silva,
idealizador do projeto, ressalta a importância do título nessa época, “com o lançamento da
30

Revista Vocêpod, estamos mostrando ao mundo que o Brasil está se preparando para
acolher esta nova ‘mania’ que é o podcast” (SILVA, 2005, p. 4).
Os podcasts brasileiros se assemelhavam aos programas americanos e tinham
pouquíssimas edições remetendo aos programas ao vivo de rádio. Os programas buscavam
utilizar trilha e efeitos sonoros que valorizavam a presença do locutor. Esses programas em
áudio eram voltados para os jovens com pautas leves, repletos de humor (LUIZ, 2014).
Apostando nesse formato surge em abril de 2006 o podcast Nerd Connection, que
mais tarde veio a se tornar conhecido como, Nerdcast. O conteúdo em áudio compõe o blog
Jovem Nerd, criado em 2002 por Alexandre Jovem Nerd Ottoni e Deive Azaghal. O
formato baseia-se em uma conversa informal sobre temas gerais do ponto de vista do nerd,
que podem variar entre ciência, inovação, tecnologia e entretenimento, sempre com humor.
Atualmente é um dos mais antigos podcasts em exercício na podosfera brasileira, estando
entre os mais ouvidos, foi o primeiro podcast brasileiro e o terceiro do mundo a atingir a
marca de 1 bilhão de downloads17 , e o mais premiado. Além disso, é o caso brasileiro mais
citado em bibliografia acadêmica (FREIRE, 2015).
Desde 2010 o tema podcast é presença marcante nas ed ições da Campus Party
Brasil. O evento focado em inovação, criatividade, ciências e empreendedorismo reuniu
nesse ano numa banca extraoficial, dezenas de produtores numa participação conjunta em
diversos programas e a criação de um site Campus Metacast, que concentrava a divulgação
através de blog e feed RSS de episódios que tivessem a campus party como tema ou foram
produzidos durante o evento (LUIZ e ASSIS, 2010).
No ano seguinte, a bancada de Podcasters realizaram uma Maratona Podcastal, a
hashtag #maratonapod foi tão comentada que chegou ao trending topics do Twitter. Em
2012, a campus party disponibilizou um estúdio totalmente equipado, visando a geração
contínua de conteúdo durante o evento, o Cubo Geek. A programação exclusiva foi
transmitida por streaming. Diversas atividades ocorreram, entre elas o Podcast Tutorial
Live (tutoriais sobre podcast), gravação de podcasts ao vivo, além de 10 podcasts
escolhidos entre os inscritos puderam usufruir do horário de experimentação
(BONASSOLI, 2016).
A tradição de podcasters no evento se confirma na edição 2020 com a criação da
Arena Podcast, coordenado pela Abpod com palestras voltadas para o conteúdo em áudio.

17Disponível em: https://veja.abril.com.br/coluna/radar-economico/a-magalu-virou-nerd-e-arrematou-o-


nerdcast/ . Acesso em 15 jun 2022.
31

Foram realizadas 26 horas de conteúdo em 21 atividades, das quais algumas delas


discutiam a presença das mulheres, negros e da comunidade LGBTQIA+ na podosfera com
a participação de 30 palestrantes/podcasters (ABPOD, 2020).
Embora o cenário brasileiro de podcasts nunca tenha deixado de existir, é a partir
da propagação dos smartphones, melhoria na qualidade da internet móvel e a popularização
de inúmeras plataformas de streaming que transformam o podcast em um novo processo
midiático. Em edição recente a pesquisa Panorama Mobile Time/Opinion Box 18 , analisou
o uso de aplicativos no nosso país e entrevistou 2.041 brasileiros com 16 anos ou mais que
acessam a Internet e usam smartphone. Pela primeira vez a pesquisa mediu o hábito dos
brasileiros de escutar podcasts; 38% dos entrevistados afirmam que ouvem podcasts em
seus smartphones. Não existe diferença significativa entre homens e mulheres, e nem entre
classes sociais. Porém, a análise por faixa etária revela que os jovens gostam mais desse
tipo de conteúdo: 47% daqueles entre 16 e 29 anos escutam podcasts, ante 36% no grupo
de 30 a 49 anos, e 29%, entre aqueles com 50 anos ou mais. Os aplicativos mais usados
para essa finalidade são Spotify com 36% e YouTube com 23%.
No contexto brasileiro, dois fatos importantes ocorreram em 2019, que
influenciaram o de consumo de conteúdos sonoros. Nesse ano, o Spotify realizou altos
investimentos visando tornar-se o principal streaming para escuta de áudio. Para isso,
investiu na aquisição de empresas de tecnologia e produção de podcast, desenvolveu
programas exclusivos e promoveu o evento Spotify for Podcasters Summit, o maior evento
de podcasts da América Latina, onde foram discutidas soluções e ferramentas sobre o
mercado de podcasts. O segundo fator foi a entrada de muitos grupos de comunicação como
Globo, Estadão e UOL na criação de podcast, tornando essa mídia conhecida do grande
público (SILVA; SANTOS, 2020).
Observa-se nesse período, logo após o Grupo Globo divulgar seus próprios
podcasts, em telejornais e programas de TV, um crescimento na busca pela palavra no
Google em agosto de 2019, atingindo um pico de popularidade do termo, ajudando a tornar
o conceito mais familiar, conforme mostra a figura 3.

18 A pesquisa foi realizada entre os dias 13 e 23 de abril de 2022 e está disponível no endereço eletrônico:
https://www.mobiletime.com.br/pesquisas/uso-de-apps-no-brasil-junho-de-2022/. Acesso em 22 jul 2022.
32

Figura 3: Busca pela palavra Podcast no Brasil de 2004 até julho 2021

Fonte: Google Trends (Acesso em: 25 out 2021)

Em janeiro de 2021, o grupo Globo apresentou sua estratégia para o segmento de


áudio digital, durante o AudioDay Globo. Além de transformar o Globoplay num hub de
podcasts, que passa a reunir em um ambiente único os podcasts produzidos internamente
pelo G1, GE e GShow, parceria com a produtora B9, novos títulos produzidos por criadores
e produtores independentes e ainda a transmissão das rádios CBN Rio e SP (GSHOW,
2021).
Atualmente, por meio de consenso entre a comunidade produtora de podcasts, desde
2014 comemora-se o dia do podcast no Brasil em 21 de outubro, uma iniciativa para
promover e divulgar o formato no país. O dia foi escolhido em alusão ao primeiro podcast
nacional publicado. O dia internacional do podcast é celebrado em 30 de setembro
(ESTEVAM, 2020).
Listados os aspectos do podcast no cenário brasileiro e para que se possa visualizar
essa mídia pela perspectiva do formato e tipo de conteúdo, propõe-se a classificação dos
podcasts em categorias no próximo tópico.

1.3 UMA PROPOSTA PARA CLASSIFICAÇÃO DE PODCAST

Em seus primeiros anos existia uma escassez de propostas classificatória s .


Medeiros (2006) propôs uma das primeiras classificações que podem ser divididas em
quatro modelos diferentes, sendo eles: metáfora, editado, registro e educacional.
33

No modelo metáfora o autor tenta aproximar ao máximo dos elementos do


programa de rádio de uma emissora convencional com locutor, vinhetas, efeitos e blocos
musicais. Como exemplo temos a experiência de Adam Curry na produção do primeiro
podcast em 2004, onde ele desejava criar um “programa de rádio” personalizado.
No modelo Editado as emissoras de rádio editam os programas veiculados em sua
programação em tempo real, disponibilizando-o no seu site para serem ouvidos em
momento oportuno pelos seus ouvintes. O modelo Registro, também conhecido como
audioblogs, com conteúdo e temáticas diversas e por fim, o Educacional onde é possível
disponibilizar aulas, muitas vezes em forma de edições continuadas (MEDEIROS, 2006).
Nos anos seguintes, com o cenário em constante evolução, os podcasts
percorrem um caminho de mudanças que inicia com idealização de um tema para a
classificação de seus programas e uma variedade de gêneros e formatos foi sendo
experimentada pelos produtores de podcast nessa época. Tendo em conta as especificidades
e como o conteúdo é apresentado em áudio, influenciados pela temática e na maneira como
será contado, e ainda fatores como modelo de gravação e edição. Todos esses itens
permitem ilustrar características que contribuem para definir o gênero e o formato dos
programas.
Diversas compreensões e propostas de classificação foram desenvolvidas, tais
como radiojornalismo narrativo em podcasting por Kischinhevsky (2018). Martinez-Costa
e Gárate (2019) apresenta uma observação para os podcasts daily news ou noticiosos
diários, que no que lhe concerne podem ser divididos em três subcategorias como propõe
Newman e Gallo (2019) sendo micro-boletim, resumo de notícias e análise aprofundada.
Já Berry (2020) lança uma proposta experimental e minimalista que considera às
três principais tipologias - conversa, narrativa e ficção. Enquanto Bufarah Jr (2021)
desenvolve um sistema de classificação com base nos conceitos de radiojornalismo e
gêneros radiofônicos e Martins e Fraga (2021) com uma proposta atrelada exclusivamente
às produções televisivas.
Viana e Chagas (2021) afirmam que os pesquisadores vêm tentando classificar os
podcasts enquadrando-os ora em gêneros, ora em formatos. Os autores apresentam uma
análise com as características e estruturas mais utilizadas pelos 50 podcasts mais ouvidos
em plataformas como Spotify, Google Podcasts e Apple Podcasts. A partir disso, o trabalho
expõe uma proposta preliminar de categorização de oito eixos estruturais mais utilizados
conforme quadro abaixo:
34

Quadro 2: Eixos Categoriais

Relato Crônica ou narração particular, voltada diretamente ao ouvinte, realizada por


uma ou mais vozes, buscando promover uma reflexão sobre informações de
interesse pessoal em temáticas de nicho.
Predomina a troca ou exposição de ideias entre participantes com, ou sem
Debate convidados externos com a ancoragem de um “apresentador” ou “ host”.
Nesta estrutura, os participantes dialogam e interagem entre si, muitas vezes
direcionando sua fala um para o outro.
Conta uma história real utilizando de personagens com enredo marcado por
Narrativas da conflitos e arcos narrativos. Dentre ele, estão as produções caracterizadas por
Realidade uma apuração em profundidade, na qual o jornalista ouve amplamente as
fontes e recorre à ilustração desses personagens várias vezes ao longo da
produção (KISCHINHEVSKY, 2018).
Entrevista Realizada pelo/a host do podcast com direcionamento de perguntas a um ou
mais convidados com a finalidade de entender sobre um assunto específico.
Diferencia-se do debate, pois raramente há interação direta ou diálogo entre
os entrevistados – quando há mais de um, no programa –, o/a host é sempre
o mediador.
Instrutivo Podcast de caráter instrutivo cujo objetivo é desenvolver, aperfeiçoar ou
exercitar algo de interesse do ouvinte. Possui estrutura como uma aula ou a
um curso.
Narrativas Conta uma história ficcional utilizando personagens, enredo(s) marcado(s)
Ficcionais por conflitos e arcos narrativos.
Noticiosos Os podcasts noticiosos podem ser diários, como os Daily News, definidos
segundo Martinez Costa e Gárate (2019, p. 320) como produtos criados “para
distribuição multiplataforma sob demanda por uma marca de notícias de
prestígio, cujo objetivo é expor e explicar tópicos diários atuais em um
formato curto, entre 3 e 25 minutos”, ou então com frequências diferentes
desta, como os semanais de análise. Ainda seguimos a microdivisão de
Newman e Gallo (2019) que identificam três subcategorias: a) Micro-boletins
- de 1 a 5 minutos, visam fornecer um resumo rápido das notícias do dia; b)
Resumo de notícias - de 6 a 15 minutos, são podcasts mais longos que
procuram informar as pessoas em determinados momentos do dia com uma
breve atualização; c) Análise aprofundada - geralmente com foco em um
assunto específico, apresenta 20 minutos ou mais de duração.
Remediados Produtos oriundos de outras mídias (Rádio, TV e Internet), inseridos na
podosfera em forma de repositórios. A compreensão sobre os podcasts
remediados também se aproxima com a ideia do que Negredo e Salaverria
(2008) chamam de “shovelware” enquanto publicações sem adaptação ao
suporte.
Fonte: Viana e Chagas (2021)

De forma resumida, Viana e Chagas (2021, p. 14) argumenta que, “os eixos
estruturais nos ajudam a compreender melhor os componentes dos podcasts para além dos
35

gêneros e formatos, já que estes dois, quando especificamente relacionados a esta mídia,
estão em constante mutação e experimentação”.
O objeto de estudo desta pesquisa se enquadra no eixo categorial narrativas da
realidade ou radiojornalismo narrativo em podcasting (KISCHINHEVSKY, 2018), pois se
propõe a relatar histórias de crimes reais. Assim, após esse breve levantamento das
principais propostas de classificação e dos podcasts, passaremos ao estudo específico do
gênero true crime empregado na temporada aqui analisada.

1.4 O GÊNERO TRUE CRIME

A expressão True Crime quer dizer crime de verdade ou crime real, mas costuma
ser utilizado sem tradução, em inglês. Segundo Gaspar (2013, p. 1) “o ‘crime real’ é um
gênero literário de não ficção em que o autor examina um crime verídico e constrói uma
narrativa sobre as ações das pessoas envolvidas no caso”. Ocorre de forma recorrente no
meio literário, podcast e audiovisual, onde um crime verdadeiro é esmiuçado, mostrando o
detalhamento das ações de pessoas reais e a sua investigação, onde “são promovidas como
histórias de entretenimento, apesar dos seus conteúdos sérios e pesados” (GASPAR, 2013,
p. 1).
Oriundo da literatura, a origem do true crime moderno, tem como marco inicial,
para alguns autores, a obra A Sangue Frio (1966), de Truman Capote (1924 -1984). O
grande atrativo foram as mudanças das passagens dos meros relatos de crime para o estilo
novelístico atual (GASPAR, 2013). Capote, em entrevista à Plimpton em 1966, explica a
escolha de um crime como tema do seu livro; “sendo o coração humano do jeito que é,
assassinato era um tema que provavelmente não iria ser obscurecido ou envelhecer com o
tempo” (PLIMPTON, 1966, on-line, tradução nossa)19 . Em síntese, A Sangue Frio relata
os acontecimentos posteriores ao assassinato de da família Clutter em sua casa em
Holcomb no Kansas.
As narrativas de crimes são tão antigas quanto a criação do mundo relatada na Bíblia
Sagrada. Em sua obra Punnett (2018, p. 5-6) observa que quando Caim matou seu irmão
Abel e tentou encobri-lo, “um motivo foi estabelecido, o assassinato foi cometid o, um

No original: “(...) the human heart being what it is, murder was a theme not likely to darken and yellow
19

with time”.
36

encobrimento foi tentado, o crime foi resolvido, e o perpetrador foi levado à justiça – com
Deus como o primeiro detetive de homicídios”.
Esse tipo de relato foi se perpetuando ao longo dos séculos. Histórias sobre
assassinatos e outros tipos de violência reais começaram a ser impressas em panfletos
durante o século XVI e XVII para assegurar a ordem pública. Os relatos jornalísticos de
atos criminais, pelo menos no mundo ocidental, sugerem uma concepção mais antiga de
pecado, ligando suas histórias a uma mensagem cristã (GASPAR, 2013).
Em 1773, no Reino Unido, George Wilkinson publicou The Newgate Calendar que
surgiu como uma compilação de diversos crimes da época, incluindo detalhes do dia-a-dia
particulares aos envolvidos e diferente dos panfletos, eram feitas em edições bem-
acabadas, consideravelmente mais caras e destinadas a uma burguesia capaz de pagar por
seus custos (SILVA, 2019).
Nos Estados Unidos, essa narrativa começou nas revistas policiais, segundo Scaggs
(2005) as revistas pulp impressas em papel de baixo custo, eram publicações semanais
baratas e de capas extravagantes, destinadas a atrair um público interessado em histórias
consideradas sensacionalistas e melodramáticas, “a revista True Detective, em específico,
foi pioneira em apresentar histórias baseadas em crimes reais, circulando nos Estados
Unidos entre 1924 e 1995” (BORGES, 2017, p. 26).
Nesse sentido, “como uma vertente definida, o true crime se organizaria apenas no
século XX” (SILVA, 2019, p. 69). Aqui no Brasil, na década de 70 e 80, relatos de crimes
dominavam o rádio através do radialista Gil Gomes, que já naquela época utilizava-se de
técnicas narrativas para descrever os personagens e cenários dos crimes, sempre repetindo
frases e acompanhados de uma trilha sonora de suspense que despertava sensações ao
aumentar o volume conforme o desenrolar dos fatos. Para Martins (2009) a forma de narrar
e dramatizar os fatos, consagrou estilo de diversos radialistas, tudo isso aliado a uma
estrutura semelhante à de uma novela radiofônica para noticiar os crimes.
As histórias sobre crimes reais incluem assassinatos geralmente em série, crimes
hediondos, casos misteriosos e atos bárbaros. O enfoque varia entre a mente do criminoso,
a cena do crime e os acontecimentos do caso – incluindo detalhes sobre as investigações e
as falhas que possam ter ocorrido –, os investigadores, as vítimas, explicação do método
do criminoso (o modus operandi), o julgamento e a condenação. Gaspar (2013, p. 07)
ressalta que “o crime real é um testemunho e um embelezamento da violência bruta”.
As obras em sua maioria são documentais com abordagem jornalística, incluindo
entrevistas, áudios do processo, gravação em tribunais/salas de audiência, reportagens e
37

matérias da imprensa sobre o caso retratado. As produções buscam revelar as


particularidades dos criminosos e acusados, dando oportunidade para que eles falem sobre
o ocorrido e expliquem suas motivações. Romero-Domínguez (2020, p. 16), afirma que “a
ordem institucional das fontes autorizadas (polícia, juízes, testemunhas, vítimas, parentes
e amigos) é subvertida e o discurso dos criminosos é convertido em depoimentos relevantes
e autorizados”.
Uma das explicações pela crescente popularidade do true crime na cultura do
entretenimento, atraindo grande atenção da audiência feminina, seria por simular a função
do telespectador no lugar de investigador, com a possibilidade de descobrir o mistério da
trama respondendo o who done it 20 do caso criminal, tal como visto nas séries ficcionais
de investigação (ROMERO-DOMÍNGUEZ, 2020).
Ao longo do seu processo de constituição o Caso Evandro combinou ações que o
caracterizam como um true crime; além de ser uma narrativa contada após um crime
traumático e real com caráter investigativo. Engloba estratégias que incluem algumas
técnicas narrativas ficcionais/literárias visando o apelo emocional do público, a busca por
justiça com foco na vítima, no podcast o garoto Evandro, assim como grande rigor na
perscrutação dos fatos que geram questionamentos e contesta vereditos.
Na próxima seção, ainda discutindo o gênero true crime, será explanada sua
aplicação nos podcasts e consequente relação com o formato storytelling.

1.4.1 Produções true crime em podcasts

Embora existam muitos livros, séries e documentários que reconstituem crimes


reais, “o gênero encontrou seu lugar no podcasting, onde ganhou imensa popularidade”
(CLAUSEN; SIKJAER, 2021, p. 150). Vários foram os crimes transferidos das páginas
dos jornais para produções em áudio no mundo inteiro, como o podcast In the Dark (2016)
da American Public Media e o já citado, Serial (2014).
Criado pela jornalista investigativa Sarah Koenig e derivado do This American
Life, Serial conta a história real do assassinato de uma garota, chamada Hae Min Lee, filha
de imigrantes coreanos, e tem como principal acusado o seu ex-namorado, Adnan Syed. O
caso ocorreu em janeiro de 1999 nos Estados Unidos. A visibilidade desse podcast é
destacada por Vicente (2018b):

20Também conhecido como whodunit é um recurso narrativo utilizado nas histórias policiais que significa
“quem fez isso?”, referindo-se ao culpado do assassinato na trama. (MAYER, 2010).
38

Serial conquistou alguns dos principais prêmios de jornalismo dos


Estados Unidos como Peabody, Edward R. Murrow, duPont-Columbia,
Scripps Howard e Silver Gavel Award for Media and the Arts21,
tornando-se um marco na história do podcasting, tanto pelo seu grande
sucesso – foi o podcast que mais rapidamente alcançou a marca de 5
milhões de downloads no iTunes Store – quanto pela enorme repercussão
que obteve, dando inédita visibilidade ao mundo do podcast (VICENTE,
2018b, p. 99).

O êxito de Serial também marca a eclosão dos podcasts em formato storytelling -


conforme será detalhada no próximo capítulo -, aqueles onde a história pode ser contada
ao longo de uma temporada, dispondo de tempo para contar todas as minúcias, explorar
autos processuais e entrevistar os envolvidos no caso. Nos últimos anos, desde que a série
se tornou um fenômeno, uma sucessão de podcasts investigativos – vale salientar, nem
todos sobre crimes verdadeiros – surgiram, com um crescimento exponencial a cada ano.
As produções em áudio dispõem de potencial para desencadear o renascimento do
jornalismo investigativo. O meio pode ser ideal para explorar um tópico em profundidade
utilizando técnicas narrativas que tornam os temas mais complicados acessíveis a um
público mais amplo. Bem como, explorar reportagens extensas, pois, “no podcasting o
tempo é fluido, sem restrições” (McHUGH, 2022, p. 57, tradução nossa)21 .
O gênero invadiu o mundo do podcast e acumula alguns dos melhores exemplos de
investigações que variam entre casos arquivados, fatos criminais, fraudes e denúncias.
Ainda que, o podcast divulgue eventos que aconteceram décadas atrás, as questões
exploradas são de caráter relevante e, possivelmente, não chegariam ao público caso esse
trabalho não fosse adaptado para o áudio.
Sequeira (2005, p. 15) destaca que: “[...] embora qualquer prática jornalística
pressuponha alguma investigação, há uma categoria que se diferencia de outras”. O
jornalismo investigativo é como uma modalidade, contínua, que se apresenta através da
pauta, do método de apuração, da forma e do conteúdo final de como a reportagem se
apresenta (FORTES, 2005). Desse modo, possui suas próprias particularidades e
características:
A diferença do jornalismo investigativo aos demais setores da atividade
são as circunstâncias, normalmente mais complexas, dos fatos, sua
extensão noticiosa e o tempo de duração que, necessariamente, deve ser
maior, embora quase sempre exercido sobre pressão (FORTES, 2005,
p.35).

21 No original: “But in podcasting time is fluid, unconstrained”.


39

Nessa perspectiva, pode-se entender que o podcast investigativo ocorre fruto de


uma apuração extensa e minuciosa dos fatos, buscando desenvolver reportagens mais
aprofundadas e com uma ampla visão dos fatos, onde os temas e personagens possuam
relevância junto da audiência. Conforme ressalta Kischinhevsky (2018):

Este novo gênero envolveria reportagens investigativas com apuração


exaustiva de informações, o que permitiria reconstituição –no âmbito
narrativo, evidentemente – de cenas e ambiências, bem como reportagens
de interesse humano, que mobilizam arquétipos em novas roupagens,
numa tática para sensibilizar a audiência e estabelecer vínculos entre
ouvintes e personagens representados (KISCHINHEVSKY, 2018, p. 79).

As histórias relatadas nas reportagens investigativas, muitas por grupos de


comunicação, publicadas em série ao longo de dias ou semanas, despertam bastante a
atenção do público em virtude da intimidade que formato em áudio oferece. De fato, caso
seja bem realizado, um tratamento de roteiro e estrutura narrativa em podcast pode
proporcionar profundidade e conexão emocional que os demais veículos de mídia não
conseguem reproduzir.
O podcast narrativo de não ficção contribuiu consistentemente para um novo tipo
de estilo investigativo; são reportagens em áudio que narram as experiências gravadas do
apresentador enquanto investigam um acontecimento ou mistério. O modo como o repórter
conduz os ouvintes através de seu processo de pesquisa passo a passo e como essa narrativa
é estruturada pode ser tão ou mais fascinante do que a história que de fato está sendo
contada.
Observa-se que em algumas situações, os podcasts vão desenvolvendo a linha
narrativa e consequentemente, contando o acontecimento (ou caso criminal) à medida que
descobrem novas transformações. A inovação consiste em expor os vários aspectos da
história e revelar detalhes que tornem o caso interessante, porém, mantendo sempre uma
perspectiva ampla sobre o caso, como ocorre no objeto empírico dessa pesquisa. Uma das
formas mais eficientes de perseguir essa apuração no podcast de natureza investigativa é
realizar uma grande pesquisa e incluir material de arquivo, entrevistas, colagens sonoras e
comentários do narrador.
O grande diferencial desses podcasts foi criar uma combinação entre investigações,
que une os conceitos e as técnicas da reportagem investigativa impressa longa, com as
características do entretenimento, que tornam os podcasts um produto derivado do
infotenimento (MARTINO, 2009), sendo um meio ideal para informar e envolver. Vale
40

ressaltar que, entretenimento não está necessariamente relacionado a jocoso, todavia um


bom podcast investigativo deve ser intrigante e espirituoso, sem esquecer do seu propósito;
revelar assuntos ocultados.
Como sabemos, o jornalismo investigativo é dispendioso, demorado e complexo
para se produzir. McHugh (2022, p. 213, tradução nossa) 22 salienta que “podcasts
investigativos ou de crimes reais exigem grandes investimentos de tempo e recursos e não
devem ser realizados levianamente”. Algumas situações podem levar até anos para serem
desvendadas e os acontecimentos poderem ser expostos, basta ver que para produzir uma
única história, repórteres têm de vasculhar arquivos, cultivar fontes, rastrear pistas e checar
fatos incansavelmente.
A junção do jornalismo investigativo ao podcasting oferece um caminho promissor
para contadores de histórias de não-ficção de todos os tipos a atrair um público grande o
suficiente para ser sustentável financeiramente. Embora projetos de investigação exija um
investimento significativo, caso os ouvintes continuem ávidos por esse formato, as
plataformas, anunciantes e apoiadores provavelmente pagarão pelo financiamento.
Ainda que podcast de crimes reais e jornalismo investigativo possam se sobrepor.
Em geral, a maioria dos projetos investigativos se concentra em descobrir algum tipo de
atividade criminosa. Isso foi visto no podcast Uol Investiga23 , sua primeira temporada A
vida secreta de Jair, traz uma série de investigações sobre o envolvimento do presidente da
República, Jair Bolsonaro, no esquema ilegal de entrega de salários de seus assessores na
época em que ele exerceu seguidos mandatos de deputado federal. Entretanto, existem
várias características que distinguem esses tipos de podcasts.
Diferentemente do podcast de crimes reais, os investigativos costumam usar um
tom jornalístico mais apurado e documental em suas produções. Alguns utilizam seu
potencial para questionar tópicos e estimular reflexões sobre temas diversos e pertinentes.
Já a linguagem empregada em diversos programas de crimes reais, alimenta aquele desejo
de olhar para algo terrível e/ou trágico, onde muitas vezes utiliza um estilo excitante e
eventualmente assume um caráter desumano, uma vez que acabam explorando as vítimas e
suas famílias.

22 No original: “Investigative or true-crime podcasts require huge investments of time and resources and
should not be lightly undertaken”.
23 Disponível em: https://noticias.uol.com.br/podcast/uol-investiga/. Acesso em: 17 a go 2022.
41

O true crime é quase exclusivamente feito por mulheres e - principalmente - para


mulheres. Fato corroborado pela pesquisa realizada pela plataforma de streaming Spotify,
“true crime é um tópico quente entre as ouvintes”; no intervalo de 2018 e 2019 o gênero
cresceu 16% entre o público feminino da plataforma (FRUTUOSO, MARQUES, 2021).
Em 2010, Vicary e Fraley estudaram o fascínio feminino pelo crime real em livros e
descobriu que as mulheres são mais atraídas por esse gênero do que os homens porque as
mulheres desejam evitar ser vítimas de um crime e desejam aprender táticas de
sobrevivência.
No Spotify, além da criação de uma playlist exclusiva intitulada de True Crime, que
reúne 99 programas (inter)nacionais com essa temática, sendo 12 de criação do próprio
agregador 24 , onde os programas são focados em histórias de crimes, suspenses e/ou
mistérios. Viana e Pernisa Jr (2020, p. 8) afirmam que “a produção de podcasts de True
Crime é um fenômeno muito mais recente no Brasil”. Segundo eles, em levantamento
realizado no ano de 2020 na plataforma Spotify, o episódio internacional mais antigo foi
disponibilizado em janeiro de 2014, enquanto o nacional, em junho de 2018.
O gênero é tão prolífico que algumas versões de programas em áudio foram
adaptadas para a TV em séries ficcionais ou documentais. Como ressalta Vicente (2021, p.
295) “a mais importante demonstração da força da linguagem sonora, atualmente, vem de
experiências transmidiáticas representadas pela adaptação de podcasts na forma de séries
televisivas”. Podcasts como Lore25 e Homecoming26 foram adaptados para o audiovisual
pela Amazon Prime. Assim como Dirty Jonh27 pela Netflix, Serial pela HBO (VICENTE,
2021) e aqui no Brasil, O caso Evandro pelo Globoplay.
Os podcasts nessa temática variam entre um novo crime a cada nova edição e a
temporada inteira dedicada a um único caso, em que alguns são idealizados por
especialistas na área criminal ou detetives amadores tentando ajudar as famílias a encontrar
respostas, outros se concentram em trazer publicidade para casos arquivados em
comunidades sub-representadas. Dos crimes célebres aos infames, as produções em áudio
se revezam contando as histórias de crimes reais, explorando uma ampla gama de casos e
suas diferentes perspectivas.

24 Disponível em: https://bityli.com/PRizPu. Acesso em: 22 out 2021.


25 Disponível em: https://www.lorepodcast.com/. Acesso em: 15 set 2021.
26 Disponível em: https://gimletmedia.com/shows/homecoming. Acesso em: 15 set 2021.
27 Disponível em: https://www.stitcher.com/show/dirty-john. Acesso em: 15 set 2021.
42

A abordagem sobre crimes pode ser realizada sob diversas perspectivas:


por detetives e policiais, parentes de vítimas e parentes de criminosos,
além de jornalistas e outros profissionais. O podcasting permite uma
autonomia na produção ao possibilitar que outras pessoas interessadas
nas narrativas produzam seus próprios programas fora do mainstrem
(VIANA E PERNISA JR, 2020, p. 3-4).

Ao passo que o vício dos ouvintes em casos arquivados, crimes não identificados
ou suspeitas de condenações injustas, contendo descrições exageradas dos acontecimentos
e narrando cenas sanguinárias, as investigações amadoras pelos podcasters continua, pois
“não existe uma teoria abrangente que determine o que é e o que não é crime verdadeiro” 28
(PUNNETT, 2018, p. 02, tradução nossa).
Segundo Punnett (2018), existe sete critérios comuns ao gênero. Porém, nem todo
produto de crime verdadeiro exibirá todos os fatores. O primeiro tema, teleologia, é
relacionado por todo o gênero. Dessa forma, assume-se que toda narrativa de crime
verdadeira seja verdadeira ou, ao menos, pretenda ser não-ficção, “há um pacto implícito
sobre essas produções que deve ser respeitado, o fato de tratar-se de casos reais” (VIANA,
PERNIZA JR, 2020, p. 4). Outros códigos incluem a busca de justiça (com foco nas
vítimas); subversão do status quo (por exemplo, questionar vereditos ou interrogar normas
sociais); geográfico (onde a localidade e a hora dos eventos são essenciais para a narrativa);
forense (os elementos sistemáticos e científicos da criminologia); elementos vocativos (por
exemplo, narradores não neutros) e folclóricos (apelo emocional ou mensagem moral da
história).
No entanto, o relato de histórias sobre crimes reais e seus desdobramentos pode
conduzir o ouvinte a caminhos equivocados ao apresentar informações cuidadosamente
selecionadas, porém, incompletas e em alguns casos, dando voz apenas a uma versão dos
fatos. Alguns podcasts relatam estar educando a sua audiência sobre o funcionamento do
sistema judiciário criminal, ainda que seus programas possam influenciar a opinião pública
sobre os processos judiciais.
Além disso, existe uma longa lista de críticas sobre os princípios morais desses
programas, “devido à mediação e representação que o gênero proporciona dos
acontecimentos criminais na sociedade, acabam por surgir algumas problemáticas éticas e
críticas que não podem deixar de ser abordadas” (GASPAR, 2013, p. 6), como a constante
exploração de crimes envolvendo mulheres.

28 No original: “there is no overarching theory that determines what is and what is not true crime”.
43

A partir do ano 2020, inúmeros podcasts sobre crimes reais surgiram na podosfera
brasileira, o que possibilitou o ganho da importância na produção deste gênero. Nesse
campo, alguns dos mais conhecidos exemplos, tem a opção de cobrir um novo caso a cada
episódio, tal como o Modus Operandi29 e 1001 crimes30 , ou apresentam uma história ao
longo de uma temporada, no caso Evandro, por exemplo, cada uma dessas possibilidades
moldou o gênero à sua maneira.
Alguns são resultados de jornalismo investigativo profundo; como a produção da
Folha de São Paulo, A mulher da casa abandonada 31 , e outros, como a produção Praia dos
Ossos32 , mudaram completamente a maneira como pensamos sobre a narrativa de crimes.
Embora possa não se encaixar no estereótipo do crime verdadeiro, não há como negar que
os podcasts produzidos pela Rádio Novelo 33 , Praia dos Ossos e Crime e Castigo 34
incentivaram as discussões sobre gênero e justiça a partir de crimes reais na sociedade. Há
ainda os produzidos por veículos de comunicação, o Ficha Criminal do UOL 35 , ou até
internacionais traduzidos para o português, como a série original Assassinos em Série36
produzida pelo Spotify Studios.
Conforme foi exposto, os podcasts sobre crimes reais são parte integrante do
cenário de mídia e abordam desde tragédias a mistérios. Entretanto, ainda que existam em
abundância e abordem casos mais antigos e menos notórios, é necessária uma habilidade
investigativa que contemple pesquisa, especialistas, contexto e ética de trabalho para serem
realizados.
Uma variedade de versões em áudio, com técnicas de narração e trilha sonora sobre
histórias de crimes verdadeiros, foram refinadas e utilizam a técnica storytelling com
grande efeito e popularidade na atualidade, como será abordado no próximo capítulo.

29 Disponível em: https://bityli.com/miuMOve. Acesso em: 16 ago 2022.


30 Disponível em: https://bityli.com/IcqmsU. Acesso em: 16 ago 2022.
31 Disponível em: https://bityli.com/gukHhX. Acesso em: 16 ago 2022.
32 Disponível em: https://bityli.com/mjpAUWw. Acesso em: 16 ago 2022.
33 Disponível em: https://www.radionovelo.com.br/. Acesso em: 16 ago 2022.
34 Disponível em: https://bityli.com/FTlceZO. Acesso em: 16 ago 2022.
35 Disponível em: https://bityli.com/lhKzHnC. Acesso em: 16 ago 2022.
36 Disponível em: https://bityli.com/MoUsXr. Acesso em: 16 ago 2022.
44

2. STORYTELLING NO CONTEXTO DOS RECURSOS SONOROS

(...) Para que o mais banal dos


Acontecimentos se torne uma
Aventura, é preciso e basta que nos
Ponhamos a narrá-lo.
(SARTRE, 1938, p. 55)

Há algo sobre contar histórias que transcende a língua que falamos. Contar histórias
está na essência do ser humano. A narrativa sendo uma característica inerente da linguagem
humana, organiza os pensamentos e confere significado ao conectar fatos e experiências.
A existência humana é em si uma grande narrativa construída sobre muitas outras
narrativas concomitantes, complementares ou divergentes, porém em constante diálogo
(FERNANDES, 2019). A narrativa do Caso Evandro tem como foco a abordagem do crime
e outras várias tramas entre elas a intolerância religiosa, o sistema criminal brasileiro e a
tortura.
As narrativas nos moldam e nos transformam, partimos da ideia que o storytelling
é a capacidade de contar histórias a partir de narrativas envolventes. Para isso, compreende
que os podcasters são contadores de histórias e que a narrativa em áudio compreende em
certa maneira um encaixe de palavras que utiliza com destreza de elementos como efeitos
sonoros, música e silêncio para criar uma estrutura imersiva. O Caso Evandro recorre a
várias estratégias de storytelling e aproveita as potencialidades do áudio para o uso dessa
técnica, propiciando uma narrativa atrativa, em que os ouvintes experienciem a
imersividade.
Dessa forma, o terceiro capítulo inicia com uma breve abordagem sobre narrativas,
para em seguida aprofundar os fundamentos do storytelling aplicado ao áudio e como esta
técnica foi transformada pelo podcasting. O outro subcapítulo discorre sobre os elementos
parassonoros que compõem as narrativas sonoras sobre crimes, buscando entender de que
maneira esses recursos surgiram para agregar valores ao formato em áudio.

2.1 NARRATIVAS E STORYTELLING

Aqui há um esforço de caracterização de narrativa, pois, a partir da compreensão


de seu conceito, se concebe o surgimento do storytelling como estratégia de comunicação,
e consequentemente sua aplicação ao ambiente sonoro. A criação de narrativas é ancestral
45

para a espécie humana e reproduziu conhecimentos por meio de artes rupestres, ao redor
de fogueiras, em tábuas e pedras com inscrições milenares, em pergaminhos e livros com
relatos e experiências que perduram de geração em geração. Ainda que se faça isso
naturalmente, compreende-se a importância do papel de contar histórias na constituição do
homem como um ser social. Para Barthes (2013, p. 19), “a narrativa está presente em todos
os tempos, em todos os lugares, em todas as sociedades; a narrativa começa com a própria
história da humanidade”.
Os primeiros estudos sobre a narrativa começaram entre 335 a.C. e 323 a.C., na
Grécia Antiga, com Aristóteles, em um conjunto de anotações que ficou conhecido como
Poética. O manual para criação de formas narrativas apresenta “uma sistematização sobre
o discurso literário, na qual são discutidas a natureza da poesia e suas espécies, critérios
distintos de imitação narrativa, gêneros e verossimilhança” (ARAÚJO, M., 2011, p. 72).
Sua análise da vida no teatro através da tragédia e da comédia foi tão completa que
influenciou inúmeras teorias sobre narração e escrita de relatos literários e até hoje, sua
obra ainda remete à compreensão da narrativa.
Atualmente se consome mais narrativas do que em qualquer outro momento ao
longo da trajetória histórica. Seja o que se vê na internet, anúncios, músicas, todos contêm
narrativa (GLASS, 2009). Pois, vale registrar que narrativas nada mais são do que histórias.
De forma simples, pode ser definida como a apresentação de uma sequência de eventos,
cuja disposição no tempo implica conexão casual. Sendo composta por duas partes: a
fábula, que consiste no conteúdo da história; e a narração, que consiste no modo como esse
conteúdo é contado (MARCONDES FILHO, 2009), produzindo significados visando
atrair, envolver e convencer o interlocutor por meio de uma troca de sentidos (MOTTA,
2013).
A ordenação sequencial de eventos do início ao fim, conhecido por narrativa,
possuem características e elementos próprios tais como enredo, personagens, tempo,
espaço, foco narrativo, etc. Hergesel (2020) destaca algumas vertentes estruturalistas
distintas, porém complementares para se entender uma narrativa:

um conjunto de etapas pelas quais um herói transita para conquistar


seus objetivos e retornar ao seu território de origem (a “jornada do
herói” ou “monomito”, de Joseph Campbell); um conjunto de
características coincidentes nos contos de cunho fantástico (a
“morfologia do conto maravilhoso”, de Vladimir Propp); a criação de
mitos e o combustível cultural que eles possuem (o “mito”, de Roland
Barthes); um modelo de como se comportam as ações de determinados
46

personagens dentro das narrativas (as “funções actanciais”, de A. J.


Greimas); construções de personalidades-modelo, levando em
consideração o que existe em um imaginário coletivo (os “arquétipos”,
de Carl Gustav Jung) (HERGESEL, 2020, p. 13).

Uma maneira de refletir sobre narrativas é como uma história pode ser contada.
Araújo (2011) informa que a partir da segunda metade do século XX, os estudos dos
teóricos Roland Barthes, Claude Bremond, Gérard Genette, A. J. Greimas e entre outros,
iniciaram uma mudança radical nos pressupostos conceituais da narrativa. “Com isso, a
narrativa deixa de estar associada apenas à linguagem verbal escrita, para ser encarada
como um fenômeno universal, amplamente vasto, susceptível de apresentar-se sob
diferentes suportes e em tempos diversos” (ARAÚJO, B., 2011, p. 4).
O produtor e apresentador do programa de rádio This is American Life, Ira Glass
(2009), em uma entrevista a Current TV relatou sobre os dois blocos básicos para construir
uma história a ser contada através dos meios de comunicação. Glass descreve o que ele
denomina de anedota que, na verdade, é uma sequência de ações. Algo como, isso estava
acontecendo, isso levou a isso e depois disso, veio a seguir. Onde não importa o quão
desinteressante seja uma ação, se ela é colocada em cadeia sequencial, dá a impressão de
que algo interessante está para acontecer e que a história caminha para uma direção onde
algo será descoberto. O outro bloco de construção refere-se à reflexão, que consiste em
levantar questões e respondê-las gradualmente. Sendo necessário intercalar os dois blocos
para criar momentos de ação e reflexão:

por que estou perdendo tempo ouvindo essa história? você tem as duas
partes da estrutura, você tem a anedota e o momento de reflexão, e muitas
vezes você terá uma anedota que simplesmente mata, [...] isso é tão
interessante, mas no final não significa absolutamente nada, não lhe diz
nada de novo. E às vezes sabemos que temos algo aqui, algo meio
atraente, mas simplesmente não parece se encaixar, e muitas vezes é seu
trabalho ser implacável e entender que ou você não tem uma sequência
de ações ou você não tem um momento de reflexão e vai precisar de
ambos (GLASS, 2009, Tradução nossa) 37 .

37No original: “Why am I wasting time hearing this story? you have the two parts of the structure, you have
the anedocte and the moment of reflection, and often you'll have an anedocte t hat just kills, [...] that is so
interesting, but in the end it means absolutely nothing,it doesn’t tell you anything new. And sometimes we
know we have something here, something kind of compelling but it just doesn’t seem to become together...
and often it's your job to be kind of ruthless and understand that either you don't have a sequence of actions
or you don't have a moment of reflection, and you're going to need both”.
47

Para Field (2001), a estrutura em três atos tem como estratégia mostrar os destaques
de uma boa história reunindo as diferentes partes, como ações, cenas, entrevistas,
descrições que compõem a construção narrativa e os personagens (figura 4).

Figura 4: Paradigma do Roteiro

Fonte: Elaboração própria com base em Field (2001).

Comparato (2000, p. 369) afirma que “dentro dos três atos estão situados os eixos
sobre os quais giram os acontecimentos é que propulsionam a história para um estágio
superior”. Nesse sentido, o Ato I ou início, sendo uma unidade de introdução, para
apresentar a história e seus principais elementos como personagens e situações. O Ato II
ou meio é a confrontação sendo representada pelos problemas. Field (2001, p. 15) afirma
que “sem conflito, não há personagem; sem personagem, não há ação; sem ação, não há
história; e sem história, não há roteiro” e por fim, o Ato III, ou Resolução. Field (2001)
lembra que resolução não significa fim e sim solução. Não sendo, portanto, necessário um
final feliz.
Após apresentar a teoria geral sobre a prática narrativa, algumas reflexões em
relação aos modelos clássicos de construção de enredos, neste ponto, serão feitas a
aplicação da técnica à realidade do contexto sonoro. No áudio, a narrativa ganha espaço na
ficção (audiosséries, radionovelas), no radiojornalismo (reportagens, audiodocumentários,
narração de fatos) e de modo específico, nos podcasts.
Vicente e Soares (2021) compreende que o conceito de narrativa é definido como
mais abrangente que o de storytelling. Ao fazer isso, aqui surge o storytelling como “uma
das estratégias utilizadas na construção de narrativas por meio de palavras, imagens e sons,
mas não esgota todas as possibilidades contidas no ato de contar histórias” (VICENTE,
48

SOARES, 2021, p. 258). De modo que, Mcsill (2013, p. 31) esclarece que o “storytelling
é a arte de contar uma história, ou seja, por meio da palavra escrita, da música, da mímica,
das imagens, do som ou dos meios digitais”.
Isso posto, o storytelling deve respeitar regras e normas (estrutura), porque essa é a
única maneira de obter uma (boa) narrativa que influenciará o público. Em consonância,
Palacios e Terenzzo (2016, p. 87) afirmam que o storytelling enquanto técnica é um
processo que pode ser aprendido, pois “existem regras que não podem ser quebradas para
que o seu mecanismo funcione”.
Segundo Xavier (2015) é possível definir o storytelling conforme três pontos de
vistas diferentes: pragmática, pictórica ou poética.

Definição Pragmática: storytelling é a tecnarte de elaborar e encadear


cenas, dando-lhes um sentido envolvente que capte a atenção das pessoas
e enseje a assimilação de uma ideia central; Definição Pictórica:
storytelling é a técnica de moldar e juntar as peças de um quebra-cabeças,
formando um quadro memorável; Definição Poética: storytelling é a
tecnarte de empilhar tijolos narrativos, construindo monumentos
imaginários repletos de significado (XAVIER, 2015, p. 10).

Núñez (2009, p. 26) define storytelling como “uma ferramenta de comunicação


estruturada em uma sequência de acontecimentos que apelam a nossos sentidos e
emoções”. Essa sequência permite pensar como a informação é apresentada através da
técnica, além de produzir conteúdo relevante, contribui para as diversas experiências do
público com o meio. O caso Evandro mostrou que a forma como a informação era
apresentada e a transparência de Mizanzuk ao relatar o que estava fazendo ou pensando,
ou muitas vezes quando ele não sabia de fato o que tinha acontecido, permitiu ao público
mergulhar na história e estabelecer uma conexão emocional com o podcast.
A técnica é frequentemente utilizada na comunicação empresarial ou como uma
estratégia aplicada ao marketing digital para engajar e vender mais. Entretanto, também é
utilizada de maneira recorrente em diversas plataformas, estando presente na literatura, nos
produtos audiovisuais, jornalísticos e nos podcasts. As formas de uso do storytelling no
ambiente sonoro partem das particularidades e possibilidades disponíveis no formato
podcast, já que contam com uma edição que privilegiam a história, unindo entrevistas, sons
e músicas de modo a criar uma experiência imersiva. Lima (2009, p. 358) ressalta que “o
estilo narrativo corresponde a uma tendência natural humana, há milênios, que é contar e
receber (ouvir, ver, ler) histórias”.
49

Ao longo de toda a história do rádio, o veículo tem dado provas que é um meio
propício para contação de histórias. Esta qualidade é exemplificada na célebre
dramatização de “A Guerra dos Mundos”, por Orson Welles e sua equipe, em 1938. Na
época a rádio CBS, nos Estados Unidos, realizou uma transmissão, que era, na verdade,
uma apresentação de radioteatro e causou o pânico em mais de um milhão de seus ouvintes.
Adaptando uma ficção, The War of the Worlds, do escritor inglês Herbert George Wells,
que utilizou de todos os recursos do radiojornalismo, como entrevistas com autoridades,
reportagens externas e narrou a possível invasão do planeta por alienígenas (MEDITSCH,
2008).
No período conhecido como “Época de Ouro do Rádio” (ORTRIWANO, 1985),
Santos (2016), destaca que o rádio brasileiro viveu uma fase de apogeu e desenvolveu seu
maior potencial criativo. Foi diante da influência de importantes dramas radiofônicos
americanos que as produções brasileiras, normalmente seriadas, passaram a utilizar o
recurso de dramatização da realidade (SANTOS, 2016). Uma das principais produções
baseadas em fatos reais dramatizados, O Crime não compensa, exibido pela Rádio Record
entre o final dos anos 1940 e início dos anos 1950, reconstituía cenas de crimes e “tinham,
portanto, uma característica documental, uma natureza de não-ficção" (GUERRINI JR.,
2013, p.25).
A estrutura narrativa nas produções radiofônicas como as radionovelas, seriados,
radioteatros e até os recentes podcasts narrativos não ficcionais carregam internamente uma
série de critérios norteadores da técnica storytelling. Nesse contexto, o uso da técnica
revelou um nicho no mercado para boas e bem contadas histórias em formatos que já não
encontravam espaço no rádio hertiziano, como o podcast.

2.2 STORYTELLING EM PODCASTS

Desde o seu surgimento no início dos anos 2000, o podcasting firmou-se como uma
mídia favorável para experimentações em áudio: de um lado, as produções no estilo
metáfora do rádio (MEDEIROS, 2006) e, por outro, pelo uso alternativo da mídia nas
experimentações sonoras, de formatos e gêneros. Conforme Palacios e Tererenzzo (2016,
p. 40) “toda vez que aparece um novo meio de comunicação — e essas ferramentas cada
vez mais estão vinculadas à tecnologia — os olhos do mercado se voltam para ele, em
busca de novas formas de diálogo com a audiência”.
50

No cenário atual das transformações no ecossistema de mídia sonora, novos tipos


de podcasts estão sendo disponibilizados a todo momento. Em uma rápida investigação
pela podosfera, pode-se constatar sem grande rigor as seguintes categorias: pessoas
conversando e pessoas contando histórias. Cada podcast se encaixa em uma dessas duas
categorias, haja vista, na maioria das vezes, quando as pessoas estão conversando em um
podcast, elas estão efetivamente contando histórias (Nuzum, 2019). O próprio relato
comunica algo diferente de como o formato comunica, essas experiências comunicam tanto
enquanto estilo quanto conteúdo.
Logo, cada mídia possui seus atributos diferenciadores, trata-se de encontrar uma
boa história e consequentemente, um bom contador de histórias, e se apoiar nela. Com isso,
podcasts narrativos de não ficção despontaram como um formato essencial na oferta de
empresas de mídia e plataformas de produção de áudio digital, não apenas pela atratividade
de suas tramas e enredos, mas também porque renovam as formas de contar a história
informativa, resultando em um ambiente propício para inovações em linguagem e
experiências imersivas de produção e escuta ao reinventar a estrutura narrativa.
A diversidade de categorias e formatos no ambiente sonoro estabelece a
complexidade do conteúdo, assim quando falamos de storytelling no podcast, falamos de
formato, de como contar o que o narrador quer contar. Admitir essa complexificação
estética (Viana, 2020c) acarreta analisar cada estrutura, ferramenta, recurso e formato que
nem conhecíamos. Pois, o grande desafio é tornar toda e qualquer história interessante.
Na atualidade, percebemos que existe um crescente interesse por conteúdos
voltados a narrativas em áudio. Fato corroborado pelo estudo realizado pela plataforma
CupomValido.com.br com dados da Statista e IBOPE, que indica que o formato que
envolve narrativas de histórias reais (como o Caso Evandro) é o segundo mais consumido,
ficando atrás apenas do formato de entrevistas38 . O crescimento desse tipo de podcasts
representou uma nova oportunidade de acesso a trajetórias de vida cada vez mais variadas.
Detoni (2019, p. 14) chama atenção para as possibilidades narrativas e acústicas
que o podcast em formato storytelling podem possibilitar, “as narrativas em áudio podem
oferecer originalidade, relevância e variedade cultural”. As iniciativas abordam vozes
criativas que estimulam a criação de imagens através de uma narração - com alguma
intensidade -, música ou efeitos sonoros intercalados.

38Disponível em: https://exame.com/pop/brasil-e-o-3o-pais-que-mais-consome-podcast-no-mundo/. Acesso


em: 30 jun. de 2022.
51

A inovação estrutural de um podcast narrativo está em criar um roteiro que


considere todas as cenas, personagens, ações, pontos de virada na trama alinhados por meio
do áudio e transformando em uma experiência envolvente para os ouvintes. Cada meio tem
sua respectiva potência. No podcasting elas são representadas no que McHugh (2022),
designou como os pilares do podcast. Organizados visualmente e representados em um
diagrama de Venn (figura 5), todos os conjuntos de atributos; conhecimento; história,
entretenimento, autenticidade, intimidade, empatia (conexão com o apresentador)
apresentam como denominador, o áudio. O podcast congrega diversos tópicos de interesse
que variam entre como as histórias são contadas de modo que possa transmitir
conhecimento e entretenimento para a sua audiência.

Figura 5: Os Pilares do Podcast

Fonte: McHugh (2022, tradução nossa)

McHugh (2022) explica que podcasts bem executados podem alcançar uma
intimidade única, aprimorada quando você ouve por meio de fones de ouvido e alimentada
pelo poder afetivo da voz com os apresentadores dos programas. Essa conexão dá aos
podcasts uma sensação de autenticidade valorizada porque estabelece uma produção de
empatia e emoção por intermédio do poder afetivo do som e da voz.
As rádios públicas americanas desempenharam um papel fundamental na criação
de um ecossistema de podcasts narrativos. Criado em 1995, This American Life é um
programa de rádio semanal americano de uma hora apresentado por Ira Glass e produzido
pela WBEZ. Com foco em jornalismo de não ficção, apresenta relatos de pessoas comuns
sobre acontecimentos que marcaram suas vidas. Semanalmente, Glass segue um tema e
52

compartilha as histórias como “pequenos filmes para rádio” (THIS AMERICAN LIFE,
2022).
Desde 1999, quando a American Journalism Review declarou que o programa
estava “na vanguarda de uma revolução jornalística” 39 , surgiu uma geração de podcasts e
programas de rádio utilizando as lições sobre jornalismo narrativo e servindo de referência
para outros produtos em áudio ao redor do mundo. Como Radiolab, no ar desde 2002, é
um programa documental narrativo com temas científicos, filosóficos e políticos. Cada
episódio com uma hora de duração, normalmente trata de um tópico específico e o investiga
de vários ângulos diferentes. Destaca-se pelo design de som inovador, intercalando
informações e música. Ganhador de dois prêmios Peabody40 , está entre os podcasts mais
ouvidos dos EUA. Outros exemplos de podcasts narrativos influenciados por This
American Life são Invisibilia, StartUp, Reply All, Snap Judgment, Love + Rádio,
Heavyweight.
De forma geral, McHugh (2022) destaca que os podcasts narrativos contam com
enredo, personagens, voz e som. “Eles também precisam de uma estrutura forte para
suportar um formato episódico” (p. 14, tradução nossa)41 . No podcast, o conceito no que
se refere a mensagem pode seguir algumas abordagens; cada episódio do programa como
uma narrativa independente ou uma série de episódios de podcasts formando uma
temporada.
Para Nuzum (2019) existem três categorias narrativas, sendo: 1) narrativa sazonal:
contada ao longo de vários episódios, seu arco narrativo emerge ao longo de uma
temporada ou um período designado. Essa característica está presente na quarta temporada
do Projeto Humanos - O caso Evandro; 2) narrativa episódica: cada episódio do programa
contém uma única história contada ao longo desse produto e ainda; 3) narrativas múltiplas:
um único episódio contém várias histórias narrativas (por vezes combinadas em um tema
unificador). Todas podem ser formas eficazes de narrar uma história, depende do formato,
do assunto e da maneira como será contada.
Silva e Oliveira (2020) caracterizam podcasts storytelling como narrativas em série,
geralmente divididos em temporadas que apresentam roteiro bem construído e com

39 Disponível em: https://ajrarchive.org/article.asp?id=326&id=326. Acesso em: 22 ago 2022.


40 O prêmio George Foster Peabody, reconhece órgãos de mídia, associações e indivíduos que tenham
prestado serviços públicos dignos de distinção e mérito, através de seus respetivos veículos de
comunicação.
41 No original: “They also need a strong structure to support an episodic format”.
53

linguagem radiofônica, revelam grande preocupação artística e estética. Esse formato


preza por uma narrativa de abordagem mais focada e expandida.
Para McHugh (2022), o podcast narrativo altamente elaborado, seja ficção ou não
ficção é o epítome da forma. A ascensão da técnica storytelling aplicada aos conteúdos
sonoros intensificou o crescimento de podcasts narrativos não ficcionais, onde as histórias
são relatadas quase que como numa grande reportagem. O formato radiojornalismo
narrativo em podcasting (KISCHINHEVSKY, 2018), trouxe nos últimos anos princípios
da literatura e jornalismo adaptados ao meio sonoro.
O formato apresenta algumas características, entre elas: a produção inteiramente
roteirizada em que os episódios seguem um arco narrativo, utilizam ganchos e
normalmente apresentam resumos explicativos na abertura e/ou encerramento dos
episódios. Além disso, empregam trilha musical, bem como o silêncio para despertar
sentimentos e sensações. Também recorrem à ilustração de personagens, descrição de
cenários e situações; e frequentemente faz-se uso do narrador em primeira pessoa pelos
apresentadores, onde verbalizam suas dúvidas, impressões e opiniões
(KISCHINHEVSKY, 2018).
O radiojornalismo narrativo em podcasting possui três principais dimensões que
caracterizam o formato: “o estilo narrativo, com estruturas mais próximas às das histórias
de ficção; o jornalismo, com seus processos e protocolos que preservam a veracidade das
informações; e o rádio, que oferece as possibilidades narrativas do som” (JÁUREGUI;
VIANA, 2021, p. 3).
Podcasts com a temática criminal ou investigativo adotaram esse estilo narrativo e
desenvolveram uma organização própria. É possível verificar que entre os podcasts mais
populares nessas categorias, muitos narram as experiências do apresentador enquanto
investigam uma questão ou mistério, evidenciando uma apuração extensa e minuciosa dos
fatos e informações. A configuração é estabelecida em paradigmas de roteiro e estrutura
intercalado aos enunciados sonoros como músicas, efeitos e narração para criar uma trama
envolvente no âmbito dos podcasts. Protagonizam narrativas longas tanto na extensão
(tamanho da temporada) quanto no tempo de duração de alguns episódios, como o objeto
empírico dessa pesquisa O Caso Evandro, que está dividido em 36 episódios.
54

2.2.1 Aplicações da técnica storytelling nos podcasts

O podcast desfruta de diversas possibilidades de usos para ordenar uma narrativa


que está sendo contada, e não emprega técnicas e regras específicas para que se alcance
esse objetivo com eficiência, principalmente quando se trata de contar histórias. Entretanto,
Ivan Mizanzuk, em seu workshop 42 sobre storytelling, ensina algumas das principais
técnicas para narrativas em áudio, entre elas o método das células de ação. Segundo
Mizanzuk (2021, informação verbal)43 , cada célula da macro história possui uma, micro
história e consequentemente, sua célula de ação. A ideia consiste em começar pela
informação principal, acrescentar detalhes curiosos, seguido do punchline e encerrar com
uma reflexão. E assim a estrutura vai se repetindo ou não, até que a história seja concluída.
(figura 6).

Figura 6: Esquema de representação de uma célula de ação

Fonte: Elaborada pela autora com base nas informações de Mizanzuk (2020).

As células de ação estão organizadas em ação - algo acontece e gera interesse;


detalhes curiosos – tendo a curiosidade saciada, mas não completamente. Nesse momento
é necessário introduzir outra informação interessante, que gera mais curiosidade. Punchline
- renova a curiosidade e dá um novo fôlego a história. Para Mizanzuk é o momento que
mais será lembrado. Dilemas e contradições são ótimos recursos nesse momento da

42O Curso de Storytelling é ministrado algumas vezes ao ano desde 2018.


43Informa ção fornecida por Ivan Mizanzuk em seu curso de Storytelling, realizado por esta pesquisadora
em fevereiro de 2021.
55

narrativa e finalmente, a reflexão – pensamento de encerramento relativo ao tema


abordado. Normalmente, a reflexão aparece esporadicamente, não em todas as repetições
da estrutura (MIZANZUK, 2021, informação verbal).
Sobre a importância da célula de ação nos podcast storytelling, Mizanzuk explica
que, “em um podcast storytelling, a célula de ação dura em torno de 1 minuto e 30 segundos
até no máximo três minutos de duração. Logo, um episódio de uma hora terá em torno de
trinta células de ação” (MIZANZUK, 2021, informação verbal).
Existe uma máxima que toda história começa com duas promessas: uma é evidente,
a outra está escondida. Diante dessa afirmação, captamos que toda trama deve ser sobre
algo grandioso, ou seja, ter uma profundidade (macro história). Já os personagens que
permeiam a narrativa e as questões relacionadas geralmente estão no plano da superfície
(micro história). Em outras palavras, enquanto algumas narrativas mantém o foco voltado
para o desenvolvimento psicológico dos personagens (character driven), outras optam por
tramas baseadas na trama (plot driven) sendo focadas na sequência de fatos que
impulsionam o plot (FURUZAWA, 2013).
Em seu livro Out on the Wire - the Storytelling Secrets of the New Masters of Radio
(2015 – sem tradução no Brasil), Jessica Abel apresenta uma investigação sobre as técnicas
narrativas e ideias da nova geração de jornalistas/contadores de histórias americanos no
rádio e podcasts em formato de história em quadrinhos. A autora reúne alguns
procedimentos utilizados nos podcasts narrativos, tais como a frase de foco, a fórmula da
história XY e a fórmula Soren. Na frase de foco, “alguém faz alguma coisa, porque _____,
mas ____”. Abel (2015) afirma que:

Uma frase de foco bem-sucedida é a versão mais simples e básica do seu


arco narrativo. Você tem um personagem motivado que está em algum
tipo de jornada, uma jornada desencadeada por um evento, algum tipo de
mudança de circunstâncias. É para isso que o “mas” na frase de foco
aponta (PODCAST OUT ON THE WIRE, 2015, ONLINE, tradução
nossa)44 .

Dessa forma, alguém é o personagem, faz alguma coisa é o elemento de


desenvolvimento da ação, porque é a motivação, assim, mas tem o efeito de conflito ou
tensão na história.

44No original: “A successful focus sentence is the most basic, bare bones version of your narrative arc.
You’ve got a motivated character that’s on some kind of journey, a journey set off by an event, some kind
of change of circumstances. That’s what the “but” in the focus sentence points to”.
56

A fórmula da história XY (XY Story Formula), criada por Alex Blumberg 45 e


também descrita no livro de Abel (2015), apresenta-se da seguinte forma: “Estou fazendo
uma história sobre X. E o que é interessante nisso é Y” (p. 57, tradução nossa)46 . Essa
ferramenta confirma a história em duas frases, onde o X exemplifica o assunto principal.
Ao passo que, Y deve ser uma ideia impactante ou incomum.
Já a fórmula Soren, desenvolvida por Soren Wheeler, editor executivo da RadioLab,
têm a sua aplicação: “Alguém está motivado a fazer isso que está fazendo por causa
disso____, mas então isso acontece, e então ele tem que fazer isso _____. E, portanto, isso
____ que leva a isso ____ e, finalmente, você não vai acreditar, mas isso____. E a razão
pela qual isso importa para todos que andam na face da terra é ESSA” (ABEL, 2015,
ONLINE)47 .
Assim, Mizanzuk (2021, informação verbal) afirma que as técnicas utilizadas
funcionam de maneira um tanto semelhante, mas também podem ser usadas em conjunto
uma com a outra, em uma configuração complementar, como podemos observar na figura
abaixo:

Figura 7: Fórmulas narrativas

Fonte: MIZANZUK (2021)

45 Jornalista de rádio integrou as equipes de This American Life e Planet Money, fundador da red e de podcasts
Gimlet Media.
46 No original: “I’m doing a story about X. And what’s interesting about it is Y”.
47 No original: “Someone is motivated to do this thing he’s doing because of this… but then this happens,

and so he has to do this… And therefore, this…which leads to this…and finally, you won’t believe it, but
THIS… And the reason this matters to everyone walking the face of the earth is THIS”.
57

As fórmulas narrativas não são necessariamente uma inovação, mas a forma como
os podcasters as recombinam contribui para que o produto final se apresente de forma
absolutamente nova. Assim, em resumo a premissa básica das fórmulas, fundamenta-se na
ideia de que:

a frase de foco é um arco narrativo inicial; a fórmula da história XY lhe


dirá o gancho: por que você vai ouvir? O que há de estranho, incomum
ou surpreendente na situação, ou nos eventos da história? O Soren
encapsula os principais pontos cronológicos da história (e exige que os
eventos em questão sejam inacreditáveis (PODCAST OUT ON THE
WIRE, 2015, ONLINE, tradução nossa) 48 .

Portanto, ao definir a abordagem narrativa da história, elas são transformadas em


algo que as pessoas queiram ouvir, apostando na valorização do relato. Após o estudo de
algumas técnicas e aplicações, pode-se compreender como se comporta, nesse contexto, os
elementos que compõem o storytelling praticado no âmbito dos podcasts.

2.3 ELEMENTOS CONSTITUTIVOS DO STORYTELLING NO PODCAST

Nos últimos anos, os podcasts narrativos de não ficção despontaram como um


formato essencial na oferta de empresas de mídia e plataformas de produção de áudio
digital, não apenas pela atratividade de suas tramas e enredos, mas também porque
renovaram as formas de contar a história com caráter informativo, resultando em um
ambiente propício para inovações em linguagem e experiências imersivas de produção e
escuta ao reinventar a estrutura narrativa.
O storytelling é uma nova forma de comunicar, apresentar e organizar as narrativas,
por isso, aplicado no ambiente dos recursos sonoros, é caracterizado por vários elementos
narrativos:

Grandes histórias de áudio contêm CENAS. As cenas contêm


PERSONAGENS. Personagens têm MOTIVAÇÕES. As motivações os
levam à AÇÃO. Eles encontram RESISTÊNCIA. A história tem
RESOLUÇÃO. Em última análise, a história tem uma LIÇÃO. E as

48No original: “The focus sentence is a baby narrative arc. The XY Story Formula will tell you the hook:
why will you listen? What’s odd or unusual or surprising about the situation or events of the story? The
Soren encapsulates the major chronological points of the story (and demands that the events in question be
fucking unbelieveable)”.
58

melhores histórias oferecem REVIRAVOLTAS (NUZUM, 2019, p. 113,


tradução nossa)49 .

O poder do áudio como artifício para contar histórias por intermédio do podcast
permite ao ouvinte visualizar essas cenas em sua cabeça e viajar com o interlocutor através
da sua jornada sonora, proporcionando uma experiência imersiva. “As cenas consistem em
imagens, imagens que existem apenas na mente do ouvinte, mas evocam lugares (onde as
coisas acontecem) e ações (o que acontece lá)” (NUZUM, 2019, p. 114, tradução nossa) 50 .
E isso vem do princípio mais básico da narrativa, o qual é: mostre, não diga. Que consiste
em apontar detalhes da trama que o ouvinte desconhece, em detrimento de apenas falar.
Contadores de história em áudio recomendam ter parcimônia ao ato de descrever, o ideal é
empregar uma descrição contextualizada utilizando fatos e ações.
As cenas contêm personagens. Os personagens estão no centro das narrativas; eles
são os indivíduos que seguimos na jornada de cada história. Os personagens podem ser
pessoas, animais, objetos ou lugares que acompanhamos durante toda a história. As lições
que aprendem, os desafios que enfrentam e os sentimentos que sentem será compartilhado
pelo público. O desenvolvimento do personagem impulsiona o processo da narrativa. Pode
se dizer que, algumas importantes narrativas em áudio que surgiram nos últimos anos
foram construídas com base em um jornalismo literário, focados em personagen s
(VICENTE, SOARES, 2021).
O arco do personagem é influenciado pelas possíveis escolhas e motivações para
superar os obstáculos e levá-los a ação. “Ação são os atos literais iniciados pelos
personagens em busca de algo” (NUZUM, 2019, p. 117, tradução nossa) 51 . Através da ação
surgem os obstáculos e/ou dilemas, todos esses fatores contribuem para tornar não somente
a cena, como os personagens e a histórias mais complexos e, consequentemente, mais
profundos e interessantes. Ainda que, nem sempre a trama seja encerrada com um desfecho
favorável, a resolução é um elemento intrigante na narrativa e sua ausência só funciona
caso seja proposital (NUZUM, 2019).

49 No original: “Great audio stories contain SCENES. Scenes contain CHARACTERS. Characters have
MOTIVATIONS. Motivations lead them to ACTION. They encounter RESISTANCE. The story has
RESOLUTION. Ultimately, the story has a LESSON. And the best stories offer TWISTS”.
50 No original: “Scenes consist of images, images that exist only in the listener’s mind, yet evoke places

(where things happen) and actions (what happens there)”.


51 No original: “Action is the literal acts initiated by the characters in pursuit of som ething”.
59

Nuzum (2019), destaca que “toda história tem uma moral” (p. 119, tradução
nossa) 52 , ainda que essa lição seja óbvia ou implícita, todas carregam consigo uma
mensagem a ser aprendida. Porém, as melhores histórias têm reviravoltas. A partir dessa
afirmação, pode-se deduzir que uma boa reviravolta é um item essencial para o
desenvolvimento da narrativa (NUZUM, 2019).
O storytelling, portanto, utiliza elementos próprios de uma narrativa clássica – ação,
conflito, superação desse conflito –, de modo que após compreendermos a utilização dos
elementos e blocos de construção da história, partimos ao entendimento de como unir todos
de modo coerente, através do roteiro.
Os podcasts narrativos investem no roteiro como recurso para contar uma história
de maneira memorável. São diversos elementos como trechos de entrevistas, personagens,
cenas, falas e ações espontâneas, construídos sobre um arco narrativo que auxiliam na
narrativa.
A construção do roteiro é considerada um processo central nesse tipo de produção,
haja vista é nessa estrutura que são listados todos os itens ou recursos para narrar uma trama
envolvente. Para além de empregar uma linguagem descritiva para colocar o ouvinte em
vários locais, o roteiro em áudio carrega uma grande diferença do roteiro para ser lido ou
assistido. E essa é, muitas vezes, a etapa mais difícil da produção de um episódio. Um
roteiro para ser ouvido deve agrupar algumas particularidades como clareza e naturalidade
ao falar, sentenças curtas seguida de pequenas pausas que permita aos ouvintes absorver o
que ouvem, tudo isso intercalando várias camadas de sons (músicas, efeitos sonoros,
ambiente natural e silêncio) para criar uma subjetividade (McHUGH, 2022).
É artifício também do áudio dissociar tempo e espaço, de modo que nas narrativas
sonoras, todos os níveis espaciais e temporais podem ser rapidamente conectados ou
alterados. Essa escolha oferece possibilidades criativas onde a trama pode desenvolver-se
descontinuamente sem seguir uma linha cronológica (PREGER, 2019).
Narrativas em áudio têm atenção especial em sua ambientação, a fim de criar uma
experiência, oferecem um mergulho nos sons utilizando material de gravação autêntico
como também, detalhes sonoros intrigantes acerca da trama. Para Schafer, a paisagem
sonora pode ser “um ambiente real ou uma construção abstrata qualquer, como
composições musicais, programas de rádio, etc.” (1991, p. 274-275). A atmosfera criada a
partir da paisagem sonora consegue transmitir além dos sons, sentimentos e sensações,

52 No original: “Every story has a moral”.


60

implantando impressões em seus sentidos, através do seu ouvido, de modo a “conduzir o


ouvinte a vivenciar histórias em situações imaginadas ou reproduzidas, numa forma de
imersão com o conteúdo, sejam elas reais ou de ficção” (VIANA, 2020c, p. 95).
Sabe-se que o áudio é um meio íntimo e impactante, de modo que a voz é capaz de
envolver o público construindo uma conexão direta e pessoal. Lindgren (2020) destaca que,
que o movimento em direção às narrativas pessoais é intrinsecamente ligado à natureza
íntima do meio sonoro, pois histórias em áudio exploram nossas vidas por meio de sons e
da palavra falada, sussurradas intimamente em nossos ouvidos. “Histórias voltaram a ser
contadas na primeira pessoa só com o uso da voz, sem o auxílio de qualquer outro recurso
sonoro” (DETONI, 2019, p. 9).
Uma característica essencial das histórias de áudio é o narrador ou apresentador.
Preger (2019), afirma que “no rádio e nos podcasts, o narrador quase sempre será
reconhecível como uma pessoa real. Apenas pela voz dele” (p. 212, tradução nossa) 53 .
Como ouvintes, costumamos estabelecer uma relação parassocial (GILES, 2002) com o
anfitrião do podcast, tornando a figura deste comunicador um ponto de referência e
identificação. A pesquisa identificou que Ivan Mizanzuk cumpriu essa função no podcast
Projeto Humanos.
Além do narrador, que pode facilitar uma identificação com o enredo, os produtores
de áudio também têm várias maneiras de mergulhar os ouvintes profund amente na história.
Uma delas, é o uso recorrente dos elementos da linguagem radiofônica, definida como:

conjunto de formas sonoras e não sonoras representado pelos sistemas


expressivos da palavra, da música, dos efeitos sonoros e do silêncio, cuja
significação vem determinada pelo conjunto de recursos técnico-
expressivos da reprodução sonora e pelo conjunto de fatores que
caracterizam o processo de percepção sonora e imaginativo-visual dos
ouvintes (BALSEBRE, 2005, p.329).

Embora, os podcasts tenham promovido diversas inovações no campo das


narrativas, assim como qualquer outro programa de rádio, utiliza-se dos elementos que
compõem a linguagem sonora que serão brevemente descritos:
Para Balsebre (2004) a palavra é indispensável no conjunto da linguagem
radiofônica, pois é o instrumento usual da expressão direta do pensamento humano e
também veículo de nossa socialização.

53No original: “In Radio und Podcast wird der Erzähler fast immer als echte Person erkennbar sein. Allein
durch seine Stimme”.
61

Outro elemento sonoro constituinte da linguagem radiofônica é a trilha musical.


Kaplún (1999, p. 106) destaca que “no rádio, e sobretudo em radiodrama, a música constitui
também uma linguagem; adquire valor de signo expressivo, como a palavra. Não a
utilizamos como mero adorno, mas para sugerir e significar algo; sublinhar uma situação,
descrever um estado de ânimo”. A música é uma ferramenta útil que ajuda a ilustrar um
ponto e “contribui para a criação de imagens auditivas” (BALSEBRE, 2005, p. 332).
Os efeitos sonoros incluem sons não-verbais e não-musicais criados ou
programados eletronicamente, são concebidos como “um conjunto de formas sonoras
representadas por sons inarticulados ou sons da estrutura musical, provenientes de fontes
sonoras naturais e/ou artificiais, que objetivamente e subjetivamente restauram a realidade
construindo uma imagem” (BALSEBRE, 2004, p. 125).
Por último, o silêncio que, “potencializa a expressão, a dramaticidade e a
polissemia da mensagem radiofônica, delimita núcleos narrativos e psicológicos e serve
como elemento de distância e reflexão” (GOLIN, 2010, p. 764). Vale ressaltar que, a
linguagem radiofônica é resultado não apenas da utilização isolada de cada um dos
elementos, mas do seu conjunto.
Em podcasts narrativos a edição final tem fundamental importância no processo de
pós-produção, pois seu emprego torna a pesquisa documental, personagens e enredo
sonoramente interessantes. De maneira que, a edição cuidadosa de uma narrativa em áudio
pode fazer uma grande diferença na qualidade do episódio e na experiência do ouvinte.
Existem muitos estilos e técnicas diferentes quando se trata de edição em podcast.
Vale lembrar que não há nenhum manual que diga exatamente como editar uma
produção em áudio. Tudo depende da abordagem, conteúdo e dos objetivos do programa.
Os programas em formato storytelling exigem um trabalho mais esmerado de edição. Ainda
que a edição seja construída utilizando diversos elementos sonoros, esses episódios
priorizam um lado mais criativo e subjetivo que envolve escolher quando editar, o que
cortar, onde fazer pausas ou adicionar música e efeitos.
Como destacou Vicente (2018b, p. 105), “nos podcasts é possível o
desenvolvimento de uma produção mais elaborada, com um trabalho de edição complexo,
no qual podem ser incluídos ambientes, efeitos, vozes, trilha musical e material
previamente gravado”. O poder da edição compassiva também está em ressaltar o silêncio,
haja vista os silêncios são importantes na comunicação, em produções narrativas o silêncio,
assim como as pausas ou os momentos mais lentos usados estrategicamente podem ser
62

muito impactantes. Embora, fique claro, cada programa requer seu próprio nível único de
detalhes na edição.
Independentemente disso, o áudio como forma de contar histórias ainda está em
evolução. Assim, encerrando-se a exposição dos conceitos aqui elencados, essenciais para
a fundamentação da definição do storytelling aplicado ao meio sonoro, nos lançaremos ao
estudo dos aspectos teóricos dos elementos parassonoros que podem complementar o
áudio.

2.4 ALGUNS ELEMENTOS PARASSONOROS

Estudiosos afirmam que, “o primo em primeiro grau do rádio, o podcasting,


chegou discretamente como uma inovação tecnológica em 2001” (McHUGH, 2022, p. 05,
tradução nossa)54 , no meio digital. Sabendo que a internet é inerentemente multimídia, os
podcasts começaram lentamente a experimentar diferentes maneiras de unir vídeos,
fotografias, infográficos, mapas, entre outros como parte de sua produção. No esforço para
atrair novos ouvintes, os podcasts precisam ir além do áudio e para isso, buscam utilizar-
se de novas estratégias de distribuição. Isso significa que os podcasts buscaram ressaltar as
características de cada produto ou serviço para as diversas mídias, com o propósito de
ampliar a audiência e aumentar seu contato com o ouvinte-internauta a fim de transformar
a maneira de se consumirem os produtos ofertados.
Na atualidade observamos que a mídia sonora vive uma crescente demanda por
conteúdo multiplataforma para se ater às novidades disponíveis no mundo online. Nesse
contexto, o podcast adotou a utilização de elementos parassonoros para garantir interesse
e consequentemente audiência do seu público ouvinte em meio ao competitivo cenário da
podosfera.
Segundo Kischinhevsky e Modesto (2014) elementos parassonoros, são:

fotos, vídeos, ícones, infográficos e outras ilustrações de sites de


emissoras, toda a arquitetura de interação (botões de compartilhar,
etiquetar, curtir, espaços para comentários), textos, hiperlinks, perfis de
estações ou de comunicadores em serviços de microblogging e sites de
relacionamento, aplicativos para web rádio ou podcasting, serviços de
rádio social (KISCHINHEVSKY E MODESTO, 2014, p.19).

54
No original: “Radio’s flirty first cousin, podcasting, arrived quietly as a techinnovation in 2001[...]”.
63

Verifica-se que o objetivo dos elementos parassonoros é encontrar uma forma de


adicionar todo o potencial comunicacional e informativo das versões em áudio para seus
conteúdos multiplataforma, funcionando como um complemento do seu conteúdo sonoro.
Viana e Perniza Jr. (2020) afirmam que, os elementos parassonoros ampliam a
compreensão do ouvinte sobre o conteúdo tratado em áudio, e atuam como ferramentas de
interação que permitem o envolvimento do público ao acessar esses materiais. O podcast é
um dispositivo que permite trabalhar variados temas e formatos, utilizando diversos
recursos que podem, inclusive, integrar uma narrativa transmídia.
A inovação estrutural (ofertando materiais extras) e narrativa identificadas no
podcast Caso Evandro são resultados de um processo de convergência digital. Em seu site,
o Caso Evandro disponibiliza além dos episódios em podcasts, uma Enciclopédia 55 com
mapa, fotos, documentos, vídeos e entrevistas, esses recursos contribuem para a construção
de um universo narrativo que complementa o áudio em um ambiente digital, porém sem
descaracterizar a linguagem radiofônica.
O podcast congrega a junção da linguagem radiofônica e as potencialidades da
internet através dos elementos parassonoros com recursos interativos, hipertextuais e
multimídia. Aliando a mobilidade e interatividade, tais suportes passaram a permitir uma
maior participação por parte do ouvinte-internauta. Estes mecanismos atuam como reforço
do áudio e podem ser executados a partir da construção de uma proposta que conta com a
disposição de materiais adicionais organizados, a fim de facilitar a compreensão dos
conteúdos e proporcionar uma maior imersão na narrativa.
A pesquisa entende a rede articulada pelo Caso Evandro a partir da ótica onde os
diferentes elementos que coexistem com o podcast e em que seu ouvinte pode transitar. O
objetivo da Enciclopédia, conforme a página no site do Projeto Humanos: “... Esta história
possui vários personagens e, por conta disso, pode ser um pouco difícil de entender. Foi
pensando nisso que montamos essa Enciclopédia” (PROJETO HUMANOS, 2018).
Uma variedade de conteúdos como materiais extras, resumos, mapa de Guaratuba,
lista de personagens está disponível na enciclopédia presente no site do Projeto Humanos.
Esses conteúdos ajudam o público a relembrar o que já foi exibido, motivando que as
pessoas continuem ouvindo o podcast. Enquanto os registros da cobertura midiática do
crime nas fotografias e recortes de jornais e revista da época, vídeos de reportagens sobre

55 Atualmente chamada de Wiki do Caso Evandro.


64

o caso assumem papel de complementar aos episódios, ampliando o conhecimento sobre o


contexto histórico.
Oliveira e Kneipp (2021, p. 12) ressaltam: “que iniciativa de utilizar a enciclopédia,
se ajusta a convergência e contribui para um novo entendimento, com a experimentação
desses elementos, promovendo uma comunicação mais ampla e diversificada”. Desse
modo, é possível perceber que a narrativa extrapola o áudio, mas o tem como elemento
central.
Entretanto, a produção oferece um percurso que pode ser feito ao se ouvir o podcast,
que inclui todos os elementos disponibilizados na enciclopédia, os acontecimentos em
curso e outros textos que desenvolvem em outros meios a partir do programa principal.
Kischinhevsky e Modesto (2014, p. 19) afirmam que “a comunicação radiofônica é
predominantemente sonora, sim, mas não se descaracteriza pela incorporação de elementos
textuais ou visuais. A radiofonia prescinde de textos ou imagens para ser apreendida pela
audiência”.
A quarta temporada do podcast O Caso Evandro, investiu em elementos que operam
na construção de uma nova composição discursiva da narrativa em áudio, ampliando seu
enredo sonoro para a plataforma web. O áudio, ao expandir para o meio digital, permanece
com seu atributo focado no sonoro, enquanto outros elementos – como o uso de mapa,
fotografias e vídeos – são englobados em sua estrutura.
Além da transmissão dos episódios em áudio, o podcast ofereceu conteúdos e
recursos no site oficial da produção, para consumo simultâneo ao do podcast, de maneira
dinâmica que complementem a narrativa central da produção em áudio. Vicente (2018b),
ressalta a importância dos podcasts possuírem seus próprios sites; “isso possibilita não só
uma melhor interação com os ouvintes como a associação dos programas em áudio a
elementos textuais e visuais que os tornam mais atraentes e fornecem informações
adicionais sobre o seu conteúdo” (VICENTE, 2018b, p. 91).
A partir do site, podemos observar a variedade de mídias utilizadas na composição
da narrativa que utiliza a enciclopédia como um banco de dados, como mostra a figura 8.
65

Figura 8: Enciclopédia do Caso Evandro

Fonte: Captura de Tela do site Projeto Humanos (PROJETO HUMANOS, 2018).

Observa-se na imagem os seguintes itens: Mapa de Guaratuba; Materiais Extras,


Resumos, etc.; Personagens; Polícias. Existe ainda a possibilidade de navegar entre alguns
Sub-temas pré-definidos pela produção organizados em ordem alfabética.
O site oferece uma caixa de busca para que o ouvinte-internauta possa realizar a
procura de modo autônomo. A temporada lança mão de um mapa interativo da região de
Guaratuba, onde o ouvinte-internauta pode ser conduzido visualmente por uma rota traçada
entre as principais localizações do Caso Evandro.
Na categoria Materiais Extras, Resumos, etc., é possível consultar informações
extras sobre cada um dos episódios da temporada. Cada episódio disponibiliza conteúdos
66

que podem variar de textos, fotografias, documentos judiciais e vídeos que complementam
a narrativa central do episódio. Os textos estão interconectados com links e hiperlinks que
permitem a maior contextualização da informação. Em diversos episódios a fotografia é a
ferramenta que contextualiza o conteúdo histórico ao oferecer imagens e recortes de jornais
para ilustrar o enredo do áudio.
É importante ressaltar do emprego de fotografias, pois estas dispõem de recursos
imagéticos que comunicam tanto quanto um texto escrito e/ou falado. Os vídeos
disponibilizados pela enciclopédia são registros dos acontecimentos produzidos por outros
meios de comunicação ou pela polícia. Parte desses conteúdos em vídeo foram
digitalizados e são a versão completa de confissões ou entrevistas que foram parcialmente
transmitidos pelo podcast.
Em Personagens, estão listados em ordem alfabética 208 pessoas que, de alguma
forma, estão envolvidos na história. Em Polícias, são apresentadas as, quatros instâncias
policiais envolvidas, o grupo AGUIA da polícia militar, grupo TIGRE da polícia civil, o
Serviço de Investigação de Crianças Desaparecidas - SICRIDE e a Polícia Federal.
O uso dos elementos parassonoros pode abrir a possibilidade de permitir que as
pessoas que precisam de mais informações obtenham rapidamente caso precisem de algo
ou talvez alguma explicação de fundo. E esse tipo de uso permite que os elementos
colaborem para o entendimento geral da história ou a informações mais aprofundadas sobre
personagens, cenários e tramas. A pesquisa entende que o podcast Caso Evando constrói
narrativas distintas daquelas veiculadas somente pelo sonoro e possibilita formas de escuta
particulares ao integrar elementos parassonoros.
67

3. PROJETO HUMANOS: APRESENTAÇÃO

Histórias Reais sobre pessoas reais.


(Ivan Mizanzuk)

O podcast ocupa na atualidade papel relevante na construção de narrativas em


áudio, através de seus formatos e técnicas utilizadas. Essas narrativas em áudio
provenientes do rádio contribuem para aumentar o uso da técnica storytelling em podcasts
e se tornar particularmente interessante analisar o Projeto Humanos, que se constitui como
um grande documentário em áudio distribuído na internet.
O programa se caracteriza por uma intensa comunicabilidade com outros textos e
“aproxima-se de práticas conhecidas no país como jornalismo narrativo e/ou literário”
(PROJETO HUMANOS, 2017), dedica-se em “montar linhas narrativas mais imersivas,
nas quais os ouvintes possam ter uma relação mais visceral com a história que lhes é
contada” (PROJETO HUMANOS, 2017). A série jornalística com produção brasileira
manifesta-se como tal forma patente, evidencia essa qualidade, explora o formato e aposta
nos elementos, numa dinâmica que ajuda atingir cada vez mais ouvintes.
Dessa forma, este capítulo inicia com um passeio não só pelas várias temporadas e
componentes que dialogam diretamente com a quarta temporada, objeto de estudo desta
pesquisa, mas pela própria narrativa criminal e um olhar mais detalhado para as
características técnicas da temporada primordiais para o podcast analisado. Busca-se,
assim, neste capítulo circundar algumas particularidades estabelecidas pelo podcast Projeto
Humanos.

3.1 CRIAÇÃO E PERCURSO DO PROJETO HUMANOS

O Projeto Humanos surgiu no Brasil, em agosto de 2015, produzido pelo Anticast56 .


Idealizado pelo podcaster Ivan Mizanzuk, o podcast em formato storytelling, tem
inspiração direta em Serial. A iniciativa surgiu após estudar técnicas narrativas em
diversos cursos. A primeira experiência neste formato ocorreu no episódio O Bom de
Briga57 . Ivan Mizanzuk entrevistou seu pai, Emerson Mizanzuk, sobre uma briga que ele

56 É uma rede de podcasts com os mais variados temas, criado em 2011 por Ivan Mizanzuk, Marcos Beccari
e Rafael Ancara. No seu início, era um programa dedicado a falar sobre design, comunicação e cultura.
57 Disponível em: https://www.projetohumanos.com.br/especiais/ph0/. Acesso em 25 out 2021.
68

teve quando criança em Curitiba. Após ser bem recebido pelos ouvintes do Anticast, o que
serviu de estímulo para a criação da primeira série de programas no estilo de temporad as,
tendo em vista o tempo de produção. Mizanzuk em entrevista ao Rodrigo Tigre para seu
livro relata como iniciou o podcast: “Foi, então, uma questão de juntar o que eu gostava no
áudio com o que eu gostava de ler e contar histórias e como adaptar tudo isso para o áudio.
E daí nasceu o Projeto Humanos” (TIGRE, 2021, p. 35-36).
A primeira temporada do Projeto Humanos, denominada As Filhas da Guerra 58 ,
surgiu em agosto de 2015 e narrava a história de uma sobrevivente do holocausto, a judia
iugoslava, Lili Jaffe. No mesmo ano foram realizadas uma série de programas especiais,
entre eles; A Verdade Nua e Crua59 e a série Crônicas60 . No episódio A Verdade nua e crua,
narra o período no qual uma mulher tem fotos íntimas vazadas na internet, fazendo da sua
vida um caos. A série Crônicas, formada por 4 episódios com foco em narrativas em
primeira pessoa, foi resultado de um treinamento realizado por Mizanzuk com candidatos
a colaboradores, ensinando técnicas de gravação, entrevista, storytelling e edição.
O Coração do Mundo61 ; a segunda temporada estreou em março de 2016 com 14
episódios e buscava contar as experiências individuais de brasileiros e refugiados que se
envolveram com conflitos no Oriente Médio, desde o 11 de Setembro até a Guerra da Síria.
A partir de treinamentos realizados entre 2015 e 2016 foi idealizada a terceira
temporada, “O Que faz um Herói?”62 . A temporada conta com 6 histórias independentes
entre si que explora momentos de heroísmo realizados por pessoas comuns (PROJETO
HUMANOS, 2015). Pensando em facilitar a compreensão dos eventos, foi elaborada uma
linha do tempo cronológica como mostra a figura 9 a seguir:

58 Disponível em: https://www.projetohumanos.com.br/temporada/as-filhas-da-guerra/. Acesso em 25 out


2021.
59 Disponível em: https://www.projetohumanos.com.br/especiais/ph6/. Acesso em 25 out 2021.
60 Disponível em: https://www.projetohumanos.com.br/temporada/cronicas/. Acesso em 25 out 2021.
61 Disponível em: https://www.projetohumanos.com.br/temporada/o-coracao-do-mundo/. Acesso em 25 out

2021.
62 Disponível em: https://www.projetohumanos.com.br/temporada/o-que-faz-um-heroi/. Acesso em: 14 set

2021.
69

Figura 9: Linha do Tempo do Projeto Humanos

Fonte: Autoria própria com base nas informações do site Projeto Humanos.

Segundo o site oficial do projeto, a quarta temporada do objeto de estudo, foi a


primeira temporada totalmente dedicada a um caso criminal brasileiro.

3.2 O CASO EVANDRO: A QUARTA TEMPORADA DO PROJETO HUMANOS

A quarta temporada do Projeto Humanos é também uma história real, dividida em


36 episódios, que alcançou a marca de 9 milhões de downloads63 . No início de 2015, Ivan
Mizanzuk, o idealizador e narrador, começou a pesquisa sobre o caso, reunindo todos os
autos do processo judicial, tendo acesso aos 60 volumes e mais de 20 mil páginas do
processo na Justiça, material veiculado na imprensa e entrevistas com os vários envolvidos
no crime. Antes da estreia oficial, o podcast passou por alguns adiamentos:

No episódio “Aviso Importante” do Anticast, publicado em 23 de agosto


de 2017, Mizanzuk relata que a quarta temporada, prevista para o dia 28
de agosto, teria que ser adiada. O último trâmite processual do caso havia
ocorrido em 2016, finalizando até aquele momento o caso. Porém, em
2017, o processo recebeu um novo recurso de uma das partes envolvidas
e o caso retornou às instâncias judiciais. Para não direcionar algum tipo
de interpretação, seja por parte dos envolvidos ou da justiça, o podcaster
decidiu pelo adiamento da temporada. Em 17 de janeiro de 2018, o
Anticast disponibilizou uma atualização para os ouvintes sobre o
andamento do projeto e uma possível data de lançamento (ALVES, 2021,
p. 43).

63Disponível em: https://kogut.oglobo.globo.com/noticias-da-tv/noticia/2021/05/criador-do-podcast-caso-


evandro-ivan-mizanzuk-fala-sobre-participacao-em-serie-do-globoplay-e-novo-projeto-para-2022.html.
Acesso em: 11 mai 2021.
70

Segundo Mizanzuk (2021, p. 310) “após cerca de três anos de pesquisa, em 31 de


outubro de 2018, Dia das Bruxas, publiquei o primeiro episódio da quarta temporada do
podcast Projeto Humanos, O caso Evandro”. Sua estreia ocorreu nas principais plataformas
digitais de áudio, no site oficial64 , além de feed RSS próprio. O podcast é uma produção
seriada que soma 53 horas, em que cada episódio tem entre uma e duas horas de duração.
Desde janeiro de 2021, o programa passou a ser distribuído pelo Globoplay.
O primeiro elemento a chamar a atenção, quando lidamos com essa temporada do
podcast, é o foco em sua materialidade, já presente no aviso inicial; “este programa
descreve cenas fortes e não é recomendável para pessoas sensíveis”, para logo em seguida
iniciar a narração do apresentador Mizanzuk, dando início à quarta temporad a. A história
gira em torno de um caso criminal real que narra o desaparecimento do menino Evandro
Ramos Caetano, cujo nome dá título à temporada. O crime, anteriormente conhecido no
Paraná por Bruxas de Guaratuba, fazia alusão ao possível envolvimento de uma seita
satânica, que existia na região. Mizanzuk (2021, p. 8) destaca, “na contramão do imaginário
paranaense, preferi chamar os eventos ligados às tais ‘bruxas’ de “O caso Evandro”.

Figura 10: Podcast Projeto Humanos, 4ª temporada O Caso Evandro

Fonte: Projeto Humanos.

Seu idealizador não escolheu um furo de reportagem ou um relato pouco


documentado para contar. Ainda que o crime tenha sido bastante noticiado ao longo das
décadas passadas, seu alcance e repercussão tinha caráter regional. Portanto, além de

64O site oficial da quarta temporada do Projeto Humanos:


https://www.projetohumanos.com.br/temporada/o-caso-evandro/ . Acesso em 14 jan 2021.
71

apresentar o caso para um público mais abrangente, a quarta temporada também lança luz
sobre temas importantes como tortura, investigações questionáveis, problemas processuais,
pânico satânico65 , entre outros. Mizanzuk (2021) ressalta ainda que, “o podcast é a minha
tentativa de fazer uma profunda reflexão sobre segurança pública no Brasil” 66 .
O caso Evandro, por sua complexidade que é fruto de seus elementos reais,
criminais, narrativos, fornece um conteúdo rico para leituras em relação aos processos de
produção, articulando entre as várias peculiaridades apresentadas nesta temporada. A
figura 11 representa as características e os aspectos predominantes envolvidos na quarta
temporada do Projeto Humanos identificados por esse estudo.

Figura 11: Características da quarta temporada do projeto humanos

Fonte: Elaborado pela autora.

Desse modo, o podcast enquadra-se: como não ficcional, pois aborda um fato real;
investigativo, pois não está apenas investigando a morte de um garoto e seus
desdobramentos, mas falhas sistêmicas nos inquéritos policiais; documental, pois se utiliza

65
O pânico satânico é um fenômeno midiático e social que surgiu nos EUA na década de 1980, centrado na
crença em rituais e cultos satanistas e na certeza de que o Mal, encarnado, está por trás de algum crime.
66 Disponível em: https://oglobo.globo.com/cultura/fenomeno-na-web-podcast-caso-evandro-inspira -serie-

documental-do-globoplay-1-25010274. Acesso em 04 jul 2022.


72

de documentos judiciários assim como matérias e reportagens jornalísticas para embasar


toda a sua pesquisa; assim como pertencente ao gênero true crime, por retratar um
acontecimento criminal. Uma das características mais importantes do fenômeno
contemporâneo dos podcasts em formato storytelling, é relativo à sua estrutura. São
narrativas longas, de aspectos sazonais (NUZUM, 2019), contada ao longo de vários
episódios e, portanto, se apresentam como uma produção seriada.

3.3 O CRIME

O podcast resgata o caso real de assassinato que envolve elementos como vingança,
conspiração política e rituais macabros. Em 6 de abril de 1992, o garoto Evandro, com 6
anos, desapareceu a caminho da escola na cidade de Guaratuba, no litoral do estado do
Paraná. Dias depois, em 11 de abril de 1992, seu corpo foi encontrado sem mãos, cabelos
e vísceras em um matagal a 1900 metros da casa de Evandro.
Em julho do mesmo ano, após meses de investigações, o inquérito policial concluiu
que o crime foi praticado em um ritual macabro. Sete pessoas foram presas, o pai-de-santo
Osvaldo Marceneiro, o pintor Vicente Paulo Ferreira, o artesão Davi dos Santos, o
serralheiro Airton Bardelli dos Santos, Francisco Sérgio Cristofollini, além da então
primeira-dama da cidade Celina Abagge e sua filha, Beatriz Abagge. Tornando-se assim
conhecido o caso popularmente como as “Bruxas de Guaratuba” (PROJETO HUMANOS,
2018).
Em junho, o engenheiro Diógenes Caetano da Silva realizou denúncia ao ministério
público de que a morte do sobrinho teria ocorrido em um ritual satânico. A investigação
que acabou envolvendo políticos locais foi primeiramente investigada pelo Grupo TIGRE
(Tático Integrado de Grupos de Repressão Especial) da Polícia Civil do Paraná. Logo em
seguida, sem o devido conhecimento da unidade, o Ministério Público passou o caso para
o Grupo ÁGUIA (Ação de Grupo Unido de Inteligência e Ataque) da Polícia Militar do
Paraná no dia 21 de junho de 1992.
Onze dias depois, o caso havia sido solucionado e os setes suspeitos presos. Dentre
eles, Beatriz Abagge, Osvaldo Marcineiro, Davi dos Santos Soares e Vicente de Paula
possuem confissões gravadas em áudio ou vídeo, mas depois alegaram que foram
torturados pelos policiais para confessar o crime. Até hoje, trinta anos depois, após cinco
julgamentos diferentes e embora seja considerado pela Justiça do Paraná como um caso
solucionado, o crime não foi totalmente esclarecido.
73

Em 1998, ocorreu o primeiro julgamento que ficou conhecido como o mais longo
júri da história do Brasil, com 34 dias. Celina e Beatriz Abagge foram julgadas no Fórum
de São José dos Pinhais e consideradas inocentes. Ainda que, Ademir Caetano tenha
reconhecido o corpo da criança como sendo de seu filho Evandro, com base nas roupas e
em uma marca de nascença, os jurados entenderam que o corpo encontrado não seria do
menino. Porém, essa decisão foi anulada pelo Tribunal de Justiça do Paraná, que garantiu
haver prova científica de que o corpo era do garoto.
Osvaldo Marceneiro, Vicente Paulo Ferreira e Davi dos Santos foram a julgamento
em 1999, em um júri que não chegou ao fim. Em um novo julgamento, em 2004, os três
foram condenados. Marceneiro e Ferreira são condenados por homicídio triplamente
qualificado e sequestro. Eles foram sentenciados a 20 anos e d ois meses de reclusão cada,
mas recorreram da decisão. Ferreira faleceu enquanto estava preso e Santos foi condenado
apenas por homicídio. Ele deveria ficar detido por 18 anos, mas cumpre pena em liberdade.
Em 2005, Airton Bardelli dos Santos e Francisco Sérgio Cristofollini, que nunca
chegaram a confessar o crime, foram absolvidos pelo júri. Em 2011, Beatriz foi julgada
novamente na 2ª vara do Tribunal do Júri de Curitiba e condenada a 21 anos de prisão. O
crime já havia prescrito para Celina, que naquela data estava com mais de 70 anos.
Atualmente, todos estão em liberdade.
Um detalhe que chama a atenção foi o novo acontecimento que emergiu durante a
temporada de exibição do podcast. No dia 10 de março de 2020, foi publicado o episódio
25 intitulado “Sete Segundos”, em que áudios encontrados em mini-fitas cassetes, podem
comprovar que os então suspeitos pelo desaparecimento e morte de Evandro Ramos
Caetano foram torturados para confessar o crime.

3.4 CARACTERÍSTICAS DA TEMPORADA

O caso não é contado em ordem cronológica e está dividido em seis partes, de forma
que cada uma delas é dedicada a um tema específico da história, conforme podemos
observar no quadro 3 com as características detalhadas sobre a primeira temporada do
podcast. Esse formato torna o grande número de informações mais inteligível e assim o
ouvinte termina o primeiro episódio com uma convicção, no segundo tem outra e assim por
diante.
74

Quadro 3: Partes e Episódios da temporada O Caso Evandro.

PARTES* EPISÓDIOS* SINOPSE


No dia 6 de Abril de 1992, na cidade de
Guaratuba, litoral do Paraná, o menino
Episódio 1: O Caso Evandro Evandro Ramos Caetano desapareceu. E a
partir desse dia, Guaratuba nunca mais foi
a mesma.
Em Julho de 1992, sete pessoas foram
presas em Guaratuba após delas terem
confessado que teriam sacrificado o
Episódio 2: As Confissões menino Evandro Ramos Caetano num
ritual satânico. Mas o Grupo TIGRE que
investigava o caso não teve nada a ver
com as prisões.
A denúncia de Diógenes Caetano dos
Santos Filho apontando suas suspeitas
PARTE 1: contra a família Abagge foi a responsável
O CASO Episódio 3: O Acusador pelo envolvimento do Grupo ÁGUIA da
EVANDRO Polícia Militar e as prisões dos sete
acusados. Teria Diógenes ajudado a
solucionar o caso Evandro? Ou teria ele
feito uma armação contra as Abagge?
Durante os júris referentes ao Caso
Evandro, as defesas levantavam a
possibilidade de Diógenes possuir
Episódio 4: “Tá Lançado o interesses políticos ao denunciar as
veneno” Abagge. Qual era o cenário político de
Guaratuba e no Paraná no início da
década de 1990? O quão longe Diógenes
seria capaz de ir em suas acusações?
No dia 15 de Fevereiro de 1992, dois
meses antes de Evandro, uma outra
criança havia desaparecido em
Episódio 5: A Outra Criança Guaratuba. Seu nome era Leandro Bossi
e, após a prisão dos sete acusados, um
novo delegado foi designado para
continuar as investigações do caso Bossi.
Estariam relacionados os casos de
Leandro e Evandro?
Em março de 1993, uma ossada foi
encontrada num local próximo onde foi
encontrado o corpo reconhecido como o
Episódio 6: Outros Corpos de Evandro Ramos Caetano em Abril de
1992. Essa ossada estava com trajes que
seriam os de Leandro Bossi. E a cada
novo corpo, mais dúvidas surgiram em
Guaratuba.
Nos dias 1 e 2 de Julho de 1992, cinco
Episódio 7: As Fitas VHS pessoas foram presas em Guaratuba. O
grupo ÁGUIA, da Polícia Militar, gravou
75

PARTES* EPISÓDIOS* SINOPSE


as confissões de algumas delas em vídeo.

Após serem presas no dia 2 de Julho de


Episódio 8: O Fórum 1992, as Abagge foram encaminhadas ao
Fórum de Guaratuba para prestarem
depoimentos.
As confissões de Beatriz e Celina
Episódio 9: A Fita Cassete Abagge gravadas em fita cassete foram
amplamente divulgadas na imprensa da
época. Mas onde ela foi gravada?
Nos dias 1 e 2 de Julho de 1992, cinco
PARTE 2: Episódio 10: As Prisões de 1 e pessoas foram presas. As defesas
2 de julho alegaram sequestro e tortura para
AS CONFISSÕES obtenção de confissões.
Durante as prisões de 1 e 2 de Julho de
1992, Celina e Beatriz afirmam que
Episódio 11: A Mansão foram levadas para uma chácara. Mas
Stroessner Osvaldo e Davi afirmavam que, além da
chácara, também teriam ido para outra
casa.
No dia seguinte às prisões dos cinco
Episódio 12: “Eu sou um primeiros acusados, mais duas pessoas
número” foram presas em Guaratuba,
completando assim o número sete.
No dia 3 de Julho, os primeiros cinco
Episódio 13: Os exames de presos foram ao IML de Curitiba.
lesões corporais Haveria indícios de tortura neles? Quais
outras controvérsias?
Entre 1992 e 1998, os médicos que
PARTE 3: Episódio 14: Os Médicos realizaram os exames de lesões corporais
no IML de Curitiba prestaram alguns
COISAS depoimentos. O que eles diziam?
ESTRANHAS E
Acerca das alegações de torturas, os
ARGUMENTOS
DA Episódio 15: Os Detalhes acusados enfrentam um problema nos
ACUSAÇÃO júris: às vezes lembram pouco, às vezes
lembram muito.
O inquérito para apuração das alegações
de torturas foi arquivado por uma
Episódio 16: O Arquivamento promotora chamada Elaine Sanches.
Quem era ela e por quais motivos o
inquérito foi arquivado?
No dia 29 de Maio de 1992, Diógenes
Caetano do Santos Filho foi ao
Ministério Público do Paraná e prestou
Episódio 17: A Denúncia sua declaração que, de acordo com as
defesas, levou à prisão dos sete acusados.
Mas como que ele chegou àquelas
conclusões?
Um dos eventos que mais chamava a
76

PARTES* EPISÓDIOS* SINOPSE


atenção da acusação era a busca feita de
Episódio 18: Dia 6 ou 7? madrugada pelos tios de Evandro com
dois dos sete acusados, logo após o
desaparecimento do menino. Mas qual
foi a data exata dessa busca?
Beatriz Abagge alegava que na noite do
PARTE 4: dia 7 de Abril de 1992, data e horário em
que teria ocorrido o ritual, estava em
ÁLIBIS E
TESTEMUNHAS Episódio 19: Os Álibis das casa, recebendo o grupo TIGRE. Já
DE ACUSAÇÃO Abagge Celina alegava que estava em uma festa
acompanhada de seu marido, o prefeito
Aldo Abagge. Será que há pessoas que
confirmam esses álibis?
Duas testemunhas foram essenciais para
a construção da denúncia do Ministério
Episódio 20: Um trabalho na Público contra os sete acusados. Uma
Serraria delas afirmava ter visto os acusados na
serraria, realizando um trabalho. Essa
pessoa era o vigia do local.
Irineu Wenceslau de Oliveira era o
guardião da serraria Abagge. De acordo
com o dossiê “Operação Magia Negra”,
Episódio 21: O Guardião redigido pelo então capitão do Grupo
ÁGUIA Valdir Copetti Neves, Irineu
teria sido dispensado numa noite e
testemunhado um ritual na serraria. Mas
o que foi que ele viu exatamente?
Edésio da Silva era uma das principais
testemunhas de acusação. De acordo com
Episódio 22: A Outra seu relato, na manhã do dia 6 de Abril de
Testemunha 1992, ele passava pela rua onde Evandro
morava e testemunhou ele sendo
sequestrado por Celina, Beatriz e mais
um homem.
De acordo com uma denúncia prestada
em 1993, a testemunha de acusação
Edésio da Silva passou a receber
Episódio 23: A Fita Escondida ameaças para que mudasse seu
depoimento a partir de dezembro de
1992. Como base para esta denúncia,
havia uma fita cassete que Edésio gravou
escondido.
Ao andar por Guaratuba nos dias de hoje,
muitos habitantes ainda tem lembranças
Episódio 24: Um Dia em sobre o caso. Como que eles relatam o
Guaratuba que viram e viveram? E como que entrou
em cena uma nova testemunha de
acusação em Outubro de 1997?
77

PARTES* EPISÓDIOS* SINOPSE


Diógenes Caetano dos Santos Filho
Direito de resposta de requisita um direito de resposta após ter
Diógenes postado comentários no Spreaker do
Projeto Humanos.
EXTRAS Sob a luz de novos documentos, é hora
Episódio 25: Sete Segundos de revisarmos algumas informações que
passamos em episódios passados. E
também de mudar a história para sempre.
Após as prisões de julho, os advogados
Episódio 26: O Corpo de defesa passaram a questionar a
identidade do corpo.
A altura do corpo é um dos pontos
Episódio 27: A Altura centrais do debate entre acusação e
defesa. Como ela foi medida?
A defesa sempre argumentou que o corpo
aparentava estar num estado que não
Episódio 28: Quanto Tempo? corresponderia com o tempo em que
Evandro desapareceu. Como se calcula
isso?
Antes do DNA, o exame de arcada
PARTE 5: dentária seria o procedimento definitivo
O CORPO Episódio 29: Dentes para identificação do cadáver. Mas por
que ele foi tão questionado pelas
defesas?
Em 1992, exames de DNA eram
Episódio 30: O DNA- Parte 1 raridades caras. Para padrões da época, o
corpo já estava identificado. Por que
então ele foi realizado?
Além do problema da cadeia de custódia,
Episódio 31: O DNA- Parte 2 as defesas também apontavam problemas
na forma como o teste de DNA foi
realizado.
Com base no laudo de DNA, o Ministério
Público afirmava que havia presença de
Episódio 32: O DNA- Parte 3 sangue humano nos materiais coletados
dos acusados – mas essa afirmação é
mais confusa do que se imagina. Até que
ponto as fés determinam as conclusões
deste caso?
A maior parte dos relatórios de
investigação do Grupo TIGRE
Episódio 33: Retratos Falados encontram-se num apenso chamado de
“Dossiê X”. Nele, temos maiores
detalhes dos rumos e suspeitos que se
desenhavam nas semanas seguintes ao
assassinato de Evandro.
Durante os três meses em que o Grupo
TIGRE investigou o Caso Evandro em
Episódio 34: O Lenhador 1992, um morador do matagal sempre
78

PARTES* EPISÓDIOS* SINOPSE


PARTE 6: trazia novas informações a cada novo
OUTROS depoimento. Com o passar dos dias,
SUSPEITOS Euclídio (também conhecido como
“Euclides” ou “Barba”) tornou-se o
principal suspeito do delegado chefe.
No mesmo período em que Leandro
Bossi e Evandro Ramos Caetano
desapareceram, membros do Lineamento
Universal Superior (LUS) estavam em
Episódio 35: Lus Guaratuba – entre eles, seus líderes
Valentina de Andrade e José Teruggi.
Após os fatos do Paraná, Valentina foi
acusada de ser a líder de uma seita que
sacrificava crianças em Altamira, no
estado do Pará. Seriam eles potenciais
suspeitos do caso Guaratuba?
O encerramento de algumas pendências,
Episódio 36: Alguns Finais apontamentos de prováveis caminhos e
as algumas teorias pessoais.
Episódio 37: Osvaldo Após anos em silêncio, Osvaldo decide
BÔNUS Marcineiro falar e contar sua própria história.
*A ordem e o títulos dos episódios conforme publicado no site Projeto Humanos e em todas as
plataformas de áudio.
Fonte: Elaborada pela Autora.

A temporada é marcada por algumas pausas entre os lançamentos dos episódios. A


primeira parte foi lançada semanalmente em 2018. Após uma breve pausa entre dezembro
de 2018 e fevereiro de 2019, o podcast retornou lançando as partes dois, três, quatro e
extras. Em março de 2020, depois de um hiato de 9 meses, foi lançado o episódio Sete
Segundos. Mizanzuk (2021) explica o motivo de ter lançado novo episódio nesta data:

Após meses de apuração e estudo, como mencionei, as fitas foram


exibidas e publicadas com uma profunda análise no episódio 25 do
podcast O caso Evandro, em 10 de março de 2020. Nesse dia também
ocorria a última diária de gravações da série audiovisual de mesmo nome
que o Globoplay estrearia em 2021. Como eu já estava com esse material
havia meses, tinha sugerido para a equipe de produção um final: que
alguns dos personagens dessa história ouvissem trechos das fitas novas
enquanto as câmeras captassem suas reações. [...] Quase no fim da diária,
com as últimas gravações ocorrendo, publiquei o episódio no podcast
(MIZANZUK, 2021, p. 337).

Em setembro de 2020 retornou com a parte cinco e seis do podcast, finalizando em


novembro do mesmo ano. Em oito de julho de 2021, foi publicado um episódio de
79

atualização da quarta temporada com Osvaldo Marcineiro. O episódio é a versão estendida


da entrevista para o episódio extra da série audiovisual do Globoplay com os diretores Aly
Muritiba e Michelle Chevrand.
No site do programa (figura 12) é possível ver de que maneiras a narrativa busca
dialogar com elementos externos ao áudio. Além de disponibilizar seus episódios tanto por
um feed RSS, seu site possui um tocador para streaming e arquivos MP3 para download,
como também, uma Enciclopédia com outros elementos parassonoros (textos, imagens,
links, documentos, mapas, ferramentas de compartilhamento de conteúdo, entre outros),
conforme já foi apresentado no capítulo 2.

Cada capítulo é acompanhado por uma pequena descrição, e logo abaixo o link para
a enciclopédia onde o ouvinte-internauta (LOPEZ, 2010), encontra diversos conteúdos
relacionados. Não há no site oficial, um espaço para os ouvintes do podcast comentarem
e/ou debaterem o conteúdo da série.

Figura 12: Reprodução do Episódio 1 no Site Projeto Humanos

Fonte: Captura de tela (Projeto Humanos, 2018).

Essa temporada chamou a atenção do público pelas inúmeras reviravoltas e seguiu


para outras plataformas. A história, que já havia se transformado em série de TV, inspirou
também um livro escrito pelo próprio Mizanzuk. O livro O Caso Evandro: sete acusados,
80

duas polícias, o corpo e uma trama diabólica, lançado em junho de 2021 pela Harper
Collins Brasil, relata a partir de suas pesquisas as investigações sobre o caso. Segundo
Moreira e Bonafé (2022) durante a semana do seu lançamento o livro entrou na lista dos
mais vendidos da revista Veja na categoria não ficção. Já a série documental em oito
episódios com direção de Aly Muritiba e Michelle Chevrand é a primeira a ser adaptada de
um podcast, sendo uma produção audiovisual do Globoplay em parceria com a Glaz
Entretenimento. Mizanzuk participa como consultor, além de dar depoimentos.

3.4.1 O podcaster, Mizanzuk

O percurso do Caso Evandro gira em torno da perspectiva de Ivan Mizanzuk. É ele


quem conduz os episódios, faz as entrevistas e apresenta todas as informações relacionadas
ao caso, por meio de uma narrativa em primeira pessoa.
O apresentador abre novas potencialidades, McHugh (2022, p. 56, tradução
nossa) 67 , ressalta que “um dos tropos de assinatura no podcasting é a centralidade do
apresentador, como um personagem por direito próprio” [...] eles podem se revelar como
pessoas reais, com fraquezas, medos, pontos fortes e fracos”. Não por acaso, Preger (2019),
afirma que “um apresentador onisciente e distante não é uma escolha promissora. O
narrador é o personagem mais importante ao lado do protagonista (se não o mesmo). Ele
conduz através da história e liga o ouvinte à história com sua personalidade” (p. 97,
tradução nossa)68 .
Ao levantar os dados biográficos de Mizanzuk, buscamos relacionar aspectos de
sua trajetória referentes ao estilo próprio e sua voz autoral empregados no Caso Evandro.
O podcaster curitibano, é formado em Design Gráfico pela Pontifícia Universidade
Católica do Paraná (PUCPR), com mestrado em Ciências da Religião pela Pontifícia
Universidade Católica de São Paulo (PUCSP) e doutorado em Tecnologia pela
Universidade Tecnológica Federal do Paraná (UTFPR). Atuou como professor
universitário nos cursos de Arquitetura e Design na PUCPR, enquanto criou, produziu,
editou e apresentou os podcasts Anticast (2011) e Projeto Humanos (2015).

67
No original: “One of the signature tropes in podcasting is the centrality of the host, as a character in their
own right. [...] they can reveal themselves as real people, with foibles, fears, strengths and weaknesses”.
68 No original: “Ein allwissender, distanzierter Präsentator ist keine erfolgversprechende Wahl. Der Erzähler

ist neben dem Protagonisten die wichtigste Figur (wenn es nicht sogar dieselbe ist). Er leitet durch die
Geschichte und bindet mit seiner Persönlichkeit den Hörer an die Geschichte”.
81

Mizanzuk (2021) ressalta a importância do seu trabalho enquanto pesquisador


cientifico, para a produção da quarta temporada:

Como sou professor universitário, e aproveitando o que aprendi de


metodologia durante o doutorado, pude aplicar no caso Evandro meu
conhecimento de método e rigor científico de pesquisa, mesmo que em
algo distante da minha área de formação. [...] Foi na vida acadêmica que
aprendi que não se faz uma afirmação sem citar fontes, que se deve
sempre verificar se a informação encontra eco em outros autores e quais
são seus contra-argumentos (MIZANZUK, 2021, p. 402).

No ano 2013, lançou o livro “Existe Design?”, d o qual foi co-autor e em 2014,
lançou o romance de terror de sua autoria, “Até o Fim da Queda”, que segundo Mizanzuk
(2021, p. 401), “eu me inspirava, em parte, na história das “bruxas de Guaratuba” – apesar
de à época conhecer apenas superficialmente o caso” (grifo do autor). Em 2015 lançou o
Arcano XV, a história de um homem que recebe visitas noturnas de uma entidade
sobrenatural.
Com essa prerrogativa, Mizanzuk já estava realizando um estudo para o futuro
trabalho - narrar histórias de crimes reais através do podcast. O podcaster utiliza uma
estrutura narrativa que explora a técnica storytelling. É necessário sublinhar que o trabalho
de Mizanzuk, no podcast ao mesmo tempo que é narrador/escritor/investigador, é saber
manejar bem as técnicas narrativas, de modo que possa contar uma história agradável,
informativa e imersiva.
Mais do que um recurso estilístico, percebe-se uma ideia bem sucedida, que
renovou as formas de contar histórias em áudio. Tal empenho, rendeu a Ivan Mizanzuk o
convite da Rede Globo para integrar o hub de podcasts do Globoplay. Atualmente, mantém
duas produções em áudio: o podcast de entrevistas chamado Conversas Paralelas 69 , que
segundo sua descrição “explora os interesses secretos de pessoas ilustres ou os
conhecimentos ilustres de pessoas interessantes” (CONVERSAS PARALELAS, 2021), e
a quinta temporada do Projeto Humanos, intitulada Altamira 70 , que investiga uma série de
crimes onde vários garotos foram mortos e emasculados na cidade de Altamira, no Pará.

69 Disponível em: https://9h.fit/UGNMbV . Acesso em: 20 jun 2022.


70 Disponível em: https://www.projetohumanos.com.br/temporada/altamira/. Acesso em: 20 jun 2022.
82

4. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS E ANÁLISE

Após apresentarmos uma discussão teórica baseada na pesquisa bibliográfica que


permitiu compreender e refletir sobre o atual cenário ocupado pelo podcast e a técnica
storytelling e sobre qual perspectiva ela se enquad ra nesta pesquisa, utilizamos, na
continuidade desse estudo, uma combinação de ferramentas metodológicas, tendo cada
uma sua importância em determinada fase do trabalho. Kischinhevsky et al. (2015, p. 8-9)
discorrem sobre a prática metodológica nas pesquisas relacionadas ao rádio e a mídia
sonora e defendem uma abordagem multimétodo, visto que cada aspecto do rádio – como
produção, transmissão, linguagem, etc. – engloba diversas esferas e que “cada uma destas
perspectivas traz consigo um arcabouço teórico-metodológico específico”.
Buscando responder à questão central da pesquisa – como se configura o processo
de produção da técnica storytelling aplicada aos podcasts tendo como foco a quarta
temporada do Projeto Humanos – O Caso Evandro e em que medida os elementos
parassonoros são utilizados para compor essa narrativa? –, são utilizadas abordagens
metodológicas mistas.
Desse modo e considerando a riqueza do material empírico, a abordagem
metodológica adotada nesta dissertação enquadra-se em uma pesquisa qualitativa, que para
Malhotra (2007) é uma pesquisa baseada em pequenas amostras que proporciona
percepções e compreensão do contexto do problema.
Para atender aos objetivos dessa pesquisa quanto ao nível de profundidade da
abordagem, será utilizada a técnica de triangulação (TRIVIÑOS, 1987, p. 138), que “tem
por objetivo básico abranger a máxima amplitude na descrição, explicação e compreensão
do foco em estudo”. Na fase exploratória, realizamos a seleção do corpus estudado e para
conhecer mais detalhadamente o objeto, foram realizados consumos aleatórios e depois
direcionados – que geraram pesquisas parciais de alguns dos episódios que compõem a
amostra. Já na descritiva, realizamos a coleta da amostragem a ser estudada detalhadamente
para posterior análise. Na terceira fase, a explicativa, recorremos a instrumentos específicos
para compreender e comparar os dados relacionados. Utilizamos o estudo de caso, com
base nas ideias de Yin (2001), e a análise de conteúdo, baseada nos conceitos de Bardin
(2011).
O percurso deste capítulo, busca chegar a uma proposta de leitura para O Caso
Evandro que envolva analisar o podcast a partir de uma dimensão sonora ampliada, que se
83

restrinja apenas aos episódios do podcast. Para começar, faremos algumas considerações
metodológicas que explicam como o podcast foi pela pesquisa investigado.

4.1 SELEÇÃO DO CORPUS

Para desenvolver este estudo, foram selecionados alguns episódios da quarta


temporada com o intuito de exemplificar a complexidade narrativa a partir do uso da
técnica storytelling em podcasts. Trabalhamos com os seguintes episódios:

Quadro 4: Episódios selecionados para Análise


PARTES TÍTULO DURAÇÃO PUBLICAÇÃO

PARTE 1: O Caso Episódio 1- O Caso Evandro 1h 5min 31 de outubro de 2018


Evandro
Episódio 6 - Outros Corpos 2h 9min 04 de dezembro de 2018
PARTE 2: As Episódio 7 – As Fitas VHS 2h 10min 20 de fevereiro de 2019
Confissões Episódio 12 – “Eu sou um 1h 22min 27 de março de 2019
número”
PARTE 3: Coisas Episódio 13- Os exames de 1h 18min 03 de abril de 2019
Estranhas e lesões corporais
Argumentos da Episódio 16 - O arquivamento 1h 27min 24 de abril de 2019
Acusação
PARTE 4: Álibis e Episódio 17 – A denúncia 1h 20min 01de maio de 2019
Testemunhas de Episódio 24 – Um dia em 1h 39min 19 de junho de 2019
Acusação Guaratuba
Episódio 26 – O corpo 1h 15min 01de setembro de 2020
PARTE 5: O Corpo
Episódios 32- O DNA – Parte 3 2h 18min 13 de outubro de 2020
PARTE 6: Outros Episódio 33- Retratos Falados 1h 8min 20 de outubro de 2020
Suspeitos Episódio 36 - Alguns Finais 1h 35min 10 de novembro de
2020
Fonte: Elaborado pela Autora com base em Projeto Humanos (2018).

A escolha por esses episódios foi resultado do que eles representam na estruturação
dos acontecimentos narrativos ao longo da temporada: são eles o primeiro e último episódio
pertencente as seis partes do conjunto da temporada do podcast. Outrossim, a escolha por
esses episódios se deu em virtude ao grande número de episódios e da quantidade de horas
da produção sonora71 , resultando em uma temporada extensa, sendo necessário realizar um

71A produção sonora referente a quarta temporada do projeto Humanos em seus 36 episódios totalizou 54
horas.
84

recorte baseado na organização e na forma que Mizanzuk considera mais coerente e melhor
traduz os efeitos de sentido pretendidos por ele.
A temporada d’O Caso Evandro parte de uma narrativa de áudio serializada, em
que os episódios foram lançados semanalmente, havendo alguns blocos de espaço entre a
disponibilização das partes, uma vez que a pesquisa e consequentemente a história estava
realmente evoluindo à medida que seu idealizador a contava. Caracterizada como uma
narrativa sazonal (NUZUM, 2019), onde as informações fornecidas em um episódio
oferecem o que você precisa entender para o próximo.
Sobre os elementos parassonoros, tivemos como norte enciclopédia voltada para o
ambiente digital que reúne em sua estrutura um agrupamento de arquivos que auxiliam a
compreensão da narrativa sonora. Dessa forma, com o foco na integração do conteúdo em
áudio com os outros elementos multimídias, a produção explora uma inovação narrativa na
tentativa de expandir ou explicar melhor detalhes dos episódios.
Logo, a pesquisa trabalha com um corpus que constituem os episódios sonoros e os
elementos parassonoros que estão presentes na ecologia das mídias (SCOLARI, 2015). O
objetivo dessa escolha é ter como fenômeno estudado a técnica storytelling como estratégia
narrativa no meio sonoro, através do podcast. Dessa forma, poderemos estabelecer como a
técnica storytelling auxilia essas produções narrativas para apontar tendências e
perspectivas.

4.2 PESQUISA BIBLIOGRÁFICA

A primeira fase do estudo compreende a pesquisa bibliográfica, os assuntos


estudados estão diretamente relacionamos aos capítulos teóricos iniciais dessa dissertação.
Cabe ressaltar que as bases teóricas utilizadas para a revisão bibliográfica incluem livros,
artigos, dissertações e teses, e procura investigar um material que apresentasse informações
de referência ao estudo da temática podcasting, avaliando as contribuições e lacunas ainda
presentes ao que se refere ao tema proposto. Em geral, foram lidas obras relacionadas, a
mídia podcast, gênero true crime, a técnica storytelling, elementos parassonoros, a fim de
criar uma base teórica para discussões condizentes com a aplicação empírica deste estudo.
O objetivo dessa revisão de literatura foi traçar um pano de fundo conceitual para discutir
os objetos estudados e compreender o atual estado da arte das pesquisas relacionadas aos
podcasts narrativos.
85

4.3 COLETA DE AMOSTRAGEM

A coleta da amostragem se deu por meio do download do material sonoro


disponibilizado no site da produção. Depois disso, foi utilizado Google Pinpoint para subir
arquivos na nuvem e transcrever os áudios automaticamente. O Google Pinpoint é uma
ferramenta de pesquisa do Google Journalist Studio que facilita a triagem de abundantes
dados de pesquisas jornalísticas. Ao receber um arquivo de áudio que deve ter um limite
de duração de até duas horas, o Pinpoint gera um PDF com a transcrição, que também pode
ser baixada em formato txt. Todos esses formatos foram arquivados para serem analisados
por meio das ferramentas metodológicas apresentadas no Apêndice A.

4.4 INSTRUMENTAL DA ANÁLISE

Como instrumentos de análise e sistematização dos dados coletados, recorremos a


duas perspectivas metodológicas: a) estudo de caso único e b) análise de conteúdo.
Objetivamos realizar um estudo de caso a partir do Caso Evandro. Temos como base uma
detalhada análise do podcast – e dos indícios que dele surgem – para fazer encadeamentos
e traçar comentários sobre a composição narrativa, o papel do narrador, a linguagem sonora
e as relações com os elementos parassonoros que emergem dessa ocorrência. Em conjunto,
a Análise de Conteúdo, na perspectiva de Bardin (2011), visa identificar nos episódios da
temporada elementos de caracterização de uma produção enquadrada no radiojornalismo
narrativo em podcasting (KISCHINHEVSKY, 2018).

4.4.1 Estudo de caso

Nessa pesquisa, utilizamos o estudo de caso para complementar as limitações dos


outros métodos empregados com a finalidade de entender como se dá a composição
narrativa no podcast utilizando a técnica storytelling. Entende-se como estudo de caso é
um estudo profundo e exaustivo de um ou poucos objetos, permitindo seu amplo e
detalhado conhecimento. Yin (2001) descreve situações nas quais o estudo de caso é
indicado. Como ocorre quando o caso em pauta é crítico para testar uma hipótese ou teoria
previamente explicitada, como o emprego da técnica storytelling no podcast estudado.
Esse método, segundo YIN (2001, p. 19), é melhor utilizado “quando é preciso
responder questões do tipo “como” e “por quê” o pesquisador tem pouco controle sobre os
86

eventos e quando o foco se encontra em fenômenos contemporâneos inseridos em algum


contexto da vida real”. Uma vez que esta pesquisa visa à obtenção de respostas para as
perguntas “Como o storytelling foi utilizado no podcast Caso Evandro?”, “Como essa
estratégia auxilia na narrativa desse podcast?”, mas também busca categorizar essa técnica
e, ao seu final, classificar as etapas aplicadas na estrutura narrativa do podcast, considera-
se que este estudo de caso se encaixa na classificação de um estudo de caso único.
Segundo Yin (2001), a lógica do planejamento deste método pode ser representada
com duas partes de uma definição técnica; o estudo de caso é uma pesquisa empírica que
investiga um fenômeno contemporâneo em profundidade e em seu contexto da realidade,
especialmente quando os limites entre o fenômeno e o contexto não são claramente
evidentes. Sobre esta proposição, podemos enquadrar os podcasts em formato storytelling
como um fenômeno contemporâneo, haja vista, mantêm lógicas de produção e práticas
diferenciadas com linguagens e elementos próprios.
O estudo de caso único “pode confirmar, desafiar ou ampliar a teoria. Ele pode ser
usado, então, para determinar se as proposições da teoria são corretas ou se algum conjunto
alternativo de explanações pode ser mais relevante” (YIN, 2001, p. 71). Ou seja, ao
trabalhar com esta opção, pode-se obter um resultado que comprove determinada teoria ou
que a refute, necessitando de mais observações. Apesar de se tratar de um Estudo de Caso
único, isto é, apenas a quarta temporada do podcast Projeto Humanos – O caso Evandro,
isso não invalida a confiabilidade ou generalização da pesquisa, uma vez que para alguns
estudiosos, como Yin (2001), pode haver tanto Estudo de Caso único como múltiplo, sendo
um e outro apenas variantes. Além disso, o Estudo de Caso único é representativo porque
se assemelha a outros casos, ou seja, a outros podcasts em formato narrativo não ficcionais.
De acordo com Yin (2001), as evidências para um estudo de caso podem vir de seis
fontes distintas: documentos, registros em arquivos, entrevistas, observação direta,
observação participante e artefatos físicos. O autor também explica que, como pré-requisito
para um estudo de caso válido, ou seja, para que o estudo tenha credibilidade, faz-se
necessária a triangulação de técnicas para verificação dos dados (YIN, 2001).
No caso desta pesquisa, foram adotadas as seguintes técnicas: pesquisa
bibliográfica e documental, análise de conteúdo e observação direta. O levantamento de
dados foi obtido em observações descritiva virtual não-participante (LAKATOS;
MARCONI, 2003), por meio da escuta do podcast, bem como, a enciclopédia do caso
Evandro no site do podcast.
87

A importância de trabalhar o estudo de caso como um método de investigação


empírica trouxe a compreensão da necessidade de um aprofundamento na pesquisa do
objeto, para que assim os dados informados na pesquisa bibliográfica confluam com os
apresentados nas outras bases de dados desta pesquisa.
Com base no que foi descrito, entende-se que esta pesquisa pode enquadrar-se no
conceito de um estudo de caso que analisa a utilização da técnica storytelling pela quarta
temporada do podcast O Caso Evandro, sua produção e a forma como compõem a narrativa,
bem como ela utiliza os mecanismos parassonoros na construção do universo narrativo do
podcast. Portanto, aplicado ao problema proposto, o estudo de caso como metodologia
permitirá apontar tendências e características a partir de uma realidade.

4.2.2 Análise de conteúdo

A análise de conteúdo é uma metodologia que vem sendo utilizada em vários


estudos relacionados à comunicação, e nessa pesquisa é utilizada como uma das estratégias
na etapa explicativa. A análise terá uma abordagem qualitativa, que recai sobre “a presença
ou a ausência de uma característica de conteúdo, ou de um conjunto de características num
determinado fragmento da mensagem que é tomada em consideração” (BARDIN, 2011, p.
26-27).
A análise de conteúdo é uma ferramenta metodológica capaz de investigar diversos
elementos presentes em uma mesma informação, característica importante considerando
que serão analisados episódios em áudio que possuem elementos parassonoros na
composição de sua narrativa;

A matéria-prima da análise de conteúdo pode constituir-se de qualquer


material oriundo de comunicação verbal ou não-verbal, como cartas,
cartazes, jornais, revistas, informes, livros, relatos auto-biográficos,
discos, gravações, entrevistas, diários pessoais, filmes, fotografias,
vídeos, etc. Contudo os dados advindos dessas diversificadas fontes
chegam ao investigador em estado bruto, necessitando, então ser
processados para, dessa maneira, facilitar o trabalho de compreensão,
interpretação e inferência a que aspira a análise de conteúdo. (MORAES,
1999, p. 2).

Esse método permite que sejam construídas interpretações, pois tem por finalidade
a descrição objetiva, sistemática como define Bardin (1977):
88

Um conjunto de técnicas de análise das comunicações visando obter por


procedimentos sistemáticos e objetivos de descrição do conteúdo das
mensagens) indicadores (quantitativos ou não) que permitam a inferência
de conhecimentos relativos às condições de produção/recepção (variáveis
inferidas) destas mensagens (BARDIN, 2011, 48).

Ainda de acordo com a autora, o objetivo da análise de conteúdo não é meramente


descritivo, mas de inferência que se realiza por “base indicadora de frequência” ou
“indicadores combinados” (BARDIN, 2011). Para fazer a análise de conteúdo, seguimos
as etapas formuladas por Bardin, que podem ser divididos em três partes: pré-análise,
exploração do material e tratamento dos resultados, nessa ordem.
A pré-análise, segundo Bardin (2011), é a primeira fase de organização da análise
e que se debruça em três pontos: escolha dos documentos, formulação das hipóteses, dos
objetivos e indicadores que dá base à interpretação final; além do mais, essa fase é
constituída das seguintes atividades: leitura flutuante, momento em que há o primeiro
contato com o material a ser analisado em que o pesquisador têm suas primeiras impressões
acerca do material; escolha dos documentos e formulação de hipóteses.
No momento da leitura flutuante, foram observados a quarta temporada inteira do
podcast projeto Humanos que utiliza a técnica storytelling em sua produção. O corpus -
“conjunto dos documentos tidos em conta para serem submetidos aos procedimentos
analíticos” (BARDIN, 2011, p.126) - escolhidos foram o primeiro é o último episódio de
cada uma das seis partes da temporada O Caso Evandro seguindo a regra da
homogeneidade, pois possuem a mesma natureza dentro dos critérios previamente
escolhidos por esta pesquisadora. Segue-se, também, as regras de representatividade a
amostra deve representar o universo), exaustividade (deve-se esgotar a totalidade da
comunicação, não omitir nada), pertinência (os documentos precisam adaptar-se ao
conteúdo e objetivo da pesquisa) e exclusividade (um elemento não deve ser classificado
em mais de uma categoria). A hipótese formulada é que o podcast O caso Evandro constrói
um universo narrativo utilizando a técnica storytelling e os elementos parassonoros.
A preparação do material se faz pela transcrição do primeiro episódio pela
ferramenta pinpoint. Com o áudio transcrito, inicia-se a leitura flutuante. Em seguida,
passa-se a escolha de índices ou categorias, que surgirão da hipótese, e a organização destes
em indicadores ou temas. Os temas que se repetem com muita frequência são recortados
“do texto em unidades comparáveis de categorização para análise temática e de
modalidades de codificação para o registro dos dados” (Bardin, 2011, p.100).
89

Na segunda fase, ou fase de exploração do material se refere a administrar as


decisões tomadas na etapa anterior. Esta é uma fase longa que contempla a construção do
processo de codificação considera os recortes que foram feitos no texto em unidades de
registos, como foram definidas as regras para a contagem e como foram classificadas e
agrupadas as informações em categorias temáticas (BARDIN, 2011).
A primeira, unidades de registro e de contexto, “correspondem ao segmento de
conteúdo que será considerado como unidade base, visando a categorização e a contagem
frequencial” (QUADROS et al., 2014, p. 93) e ajudam a guiar e delimitar quais tipos de
dados são relevantes na busca pela resposta do problema de pesquisa. Cada unidade de
registro é dividida em unidades de análise.
A categorização, de acordo com Bardin (2011), é um dos procedimentos da análise
de conteúdo e consiste em uma classificação de elementos com um título genérico que
possibilita a transformação de dados brutos em organizados. Esta pesquisa abordou uma
categorização de acordo conforme a pertinência, neste tipo, “o sistema de categorias deve
refletir as intenções da investigação, as questões do analista e/ou corresponder às
características das mensagens” (BARDIN, 2011, p.150). No quadro abaixo, apresentamos
as unidades investigadas que vão contribuir para a coleta de dados e categorização das
informações.

Quadro 5: Quadro Matricial das Categorias para análise no podcast Caso Evandro

Análise de Conteúdo Narrativo e sonoro em O Caso Evandro


Unidade de Registro Unidade de Análise Critérios
Verificar se o personagem é
descrito de maneira a
Personagem Ilustração dos Personagens
ilustrar a imagem mental
dele.
Presença do narrador em
primeira pessoa,
Narração Presença do Narrador
explanando suas dúvidas,
impressões e opiniões.
Verificar se a narrativa
segue um arco narrativo
Arco Narrativo
(início, meio fim) se insere,
ganchos e fórmulas
narrativas.
Verificar se existem
Descrição de Cenas descrições de
cenas/cenários e situações.
Características da Narrativa
Verificar como o conteúdo
em áudio é utilizado de
Criatividade /Imersão
90

maneira que proporcionem


uma experiência imersiva.
Recapitulação Verificar se apresenta
resumos explicativos ou
recapitulação de fatos, datas
e personagens.
Verificar se a trilha sonora
contribui na composição do
Música áudio dando o tom à
mensagem, trazendo a
emoção e o sentimento.
Verificar se os efeitos
sonoros oferecem o sentido
conotativo à narrativa,
Efeitos Sonoros podendo ter funções de criar
Linguagem Sonora ambientes, trazer
expressividade e
ornamentar o ambiente da
mensagem.
Verificar como se dá a
presença da voz humana em
Palavra/Voz
meio a outros elementos
presentes no podcast.
Verificar se na reportagem é
citado sobre os documentos
Conteúdo Extras
extras como essas
informações se relacionam
com o podcast.
Elementos Parassonoros
Conteúdo Histórico Mídias que rementem a
acontecimentos passados
(fotos, vídeos, áudios) e essa
reconstituição da memória
se relaciona com o áudio da
narrativa.
Fonte: Elaborado pela Autora.

Nesta pesquisa a categorização se apoiou em: personagens; narração; características


da narrativa; linguagem sonora; edição e elementos parassonoros como informação. Que
no que lhe concerne são sub divididas em unidades de análise onde; A unidade de registro
personagem consiste apenas na unidade de análise ilustração de personagens e procura
investigar se a descrição do personagem contribui para construção da imagem mental dele.
A categoria Narração que nos apresenta as possibilidades da presença do narrador no
podcast. Características da narrativa assume as sub-categorias de arco narrativo, descrição
de cenas, criatividade/imersão e recapitulação. Dessa forma, podemos observar a variedade
de elementos utilizados na composição da narrativa. A Linguagem Radiofônica é dividida
em palavra, música e efeitos sonoros. Embora o item silêncio esteja presente na temporada,
optamos por retira-lo da análise pois é bastante difícil analisa-lo, uma vez que, o silêncio é
91

inserido no podcast de maneira rápida e enfática para demonstrar medo e/ou tensão e vem
sempre acompanhado de uma trilha musical que ressalta sua função. Por último, elementos
parassonoros consistem em conteúdos extras e conteúdos históricos.
Visto essas unidades de análise, a segunda fase da codificação corresponde às regras
de enumeração que dizem respeito ao modo de contagem das unidades de registro. A
terceira fase do processo de análise do conteúdo é denominada tratamento dos resultados –
a inferência e interpretação. Após os resultados brutos, o pesquisador visa torná-los
significativos e válidos, permitindo que compreendamos o significado do que foi coletado.

4.5 ANÁLISE DOS EPISÓDIOS

Durante a análise de conteúdo, foram levantados o uso dos elementos constitutivos


do storytelling para sua abordagem e os enquadramentos dados aos recursos no podcast,
para que se possa chegar ao processo de produção da técnica storytelling dentro dos
conceitos teóricos tratados nos primeiros capítulos desta dissertação.
Todos os episódios analisados foram retirados do site oficial do podcast responsável
pelo armazenamento online do material. Todos os links para o acesso aos episódios estão
identificados nas notas de rodapé deste tópico de pesquisa, possibilitando que nosso leitor
ouça os programas que estão sendo analisados, bem como possa ler suas respectivas
transcrições, na íntegra.
A análise ocorreu pelas categorias já discriminadas, iremos descrever como os
operadores se comportaram ao longo dos episódios, foi possível identificar padrões
que se repetem na construção dos conteúdos, que possibilitam traçar uma estrutura modelo
para os podcasts em formato narrativo, cujo detalhamento será feito a seguir

1) Personagem

Identificamos que a categoria personagem está presente em todos os episódios


analisados. De acordo com Sodré e Ferrari (1986, p. 125), “há muitas maneiras de escrever
uma história, mas nenhuma pode prescindir de personagens”. Temos, então, sempre que
uma nova pessoa é introduzida na narrativa o narrador contextualiza sua presença, falando
seu nome e função. Geralmente, essa apresentação vem logo após um pequeno trecho onde
a voz do personagem é incorporada à trama. A construção da imagem mental é acionada
através dos depoimentos em áudio, tornando-se mais impactante para essa história, uma
92

vez que são relatados através da voz dos personagens reais. “Este é um depoimento de
Luiz Carlos de Oliveira prestado em 2005, no julgamento dos réus Airton Bardelli e Sérgio
Cristofolini, quem está fazendo as perguntas é o juiz Rogério Etzel (O CASO EVANDRO,
2018).
Como a temporada contém mais de duzentos personagens, sempre que o indivíduo
é inserido na trama, Mizanzuk o apresenta novamente de modo que não reste dúvidas de
quem está realizando o relato.
A temporada é centrada no desenvolvimento dos setes acusados, porém cada
personagem, entre delegados, promotores, jornalistas e inclusive o narrador tem o seu
momento de passar de coadjuvante a protagonista, revelando aspectos até então
insuspeitados. Dessa forma, a figura de Mizanzuk é visto como personagem dessa história
tanto quanto Evandro e os acusados, tornando-se um personagem intrigante para a
narrativa.
Sodré e Ferrari (1986, p. 125) ressalta que, “existe sempre um momento na narrativa
em que a ação se interrompe para dar lugar à descrição (interior ou exterior) de um
personagem”. Como podemos verificar no episódio 7 – As Fitas VHS, Mizanzuk descreve
o momento em que Davi está sendo interrogado diante de uma câmera de vídeo. “Davi tem
cabelos longos, um cavanhaque está na frente da mesma parede branca. Usa uma camisa
polo Clara também tem as mãos algemadas e também parece estar bem cansado” (O CASO
EVANDRO, 2018).
Assim, com base nessa categoria, percebemos que todos os personagens são
ilustrados de modo a criar uma imagem mental, que contribui não apenas para uma
concepção física, como também de algumas características da personalidade das pessoas
que compõem essa narrativa.

2) Narração:

Na obra, o idealizador e roteirista Ivan Mizanzuk, performa também como narrador.


Assim, ele conduz a narrativa em primeira pessoa contando a trama com uma espécie de
informalidade, ainda que a temporada se passe pela ótica criminal. Logo em seus minutos
iniciais Mizanzuk mostra sua presença e relata suas dúvidas e desejos. Os pontos da trama
são organizados e compartilhados pelo narrador, ele conduz através da história e liga o
ouvinte a trama com sua personalidade. Ele nos permite participar de seus pensamentos e
reflexões – e, portanto, de seu processo de conhecimento. Em alguns trechos, Mizanzuk
93

não apenas nos conta o resultado de suas reflexões, mas também nos deixa participar de
seu processo de descoberta. Desta forma, permanece sempre transparente e confiável.
Mizanzuk assume o papel do narrador viajante apresentado por Benjamin (1987),
na medida em que este recorre do seu conhecimento advindo da sua experiência enquanto
pesquisador e com diferentes lugares e situações toda a espécie de fatos sobre o crime para
trazê-los aos ouvintes a partir de sua interpretação.
Mizanzuk solicita: “Antes de começar eu gostaria de pedir que você faça algo por
mim” (O CASO EVANDRO, 2018). Mizanzuk usa um estilo coloquial, uma abordagem
mais relaxada quando relata seu pedido e que gera uma enorme intimidade.
Em diversos momentos ao longo da temporada Mizanzuk expressa suas dúvidas e
inquietações como nesses trechos do episódio 6: “Eu não tive como verificar nada disso
então eu só deixo aqui o aviso e vocês tirem suas conclusões” ou “o problema talvez seja
o seguinte e aqui eu estou chutando...” (O CASO EVANDRO, 2018). Benjamin (1987)
afirma que cabe ao narrador narrar o miraculoso, o extraordinário, deixando que as
interpretações e que a psicologia fique a cargo de cad a ouvinte. Dessa forma, “ele é livre
para interpretar a história como quiser, e com isso o episódio narrado atinge uma amplitude
que não existe na informação” (BENJAMIN, 1987, p. 203).
Não apenas estamos a par das interpretações e conjecturas de Mizanzuk, mas
ganhamos uma camada extra de compreensão através de seu tom – sua raiva, seu desgosto,
sua tristeza. A presença de Mizanzuk enquanto narrador e personagem dessa trama é tão
forte que ao longo da temporada o ouvinte é estimulado a vibrar e lamentar junto com ele
a cada novo acontecimento.

3) Características da Narrativa:

Dos quatro itens analisados dentro da categoria características da Narrativa, o Caso


Evandro apresenta todos eles de forma bastante clara.

a) Arco Narrativo
O podcast se constrói por meio de um arco narrativo que utiliza técnicas narrativas
como suspense (cliffhanger) e reviravoltas (plot twist) para estabelecer uma narrativa
elíptica e fragmentada entre os episódios em que a todo momento os ouvintes se perguntam
o que irá acontecer em seguida, além de múltiplos fios narrativos. Souza (2021) relata que:
94

Se o cliffhanger é usado no final do capítulo para incentivar o espectador


a acompanhar uma sequência, o plot twist determina a virada no enredo
a mudança não prevista da narrativa que, assim como o cliffhanger,
objetiva manter o interesse do público na obra. Ou seja, o cliffhanger
mantém uma informação para gerar curiosidade, à medida que o plot twist
faz uma revelação que surpreende o espectador (SOUZA, 2021, p.57)

No primeiro episódio da temporada, Mizanzuk apresenta a estruturação sequencial


do enredo; o cenário da década de 90 e os constantes sequestros que ocorriam naquela
ocasião, a cidade de Guaratuba, onde os fatos ocorreram, o desaparecimento do garoto
Evandro, as investigações, o corpo do garoto é encontrado e para por fim, o episódio
terminar com um gancho narrativo que o crime foi praticado em um ritual religioso e os
acusados revelando como o crime ocorreu. De modo, que tanto o episódio como a
temporada estruturam, de forma particular, com os ganchos dramáticos, os chamados
cliffhangers para prender a atenção do ouvinte, segundo a intenção do seu idealizador, de
maneira a incentivar a curiosidade e seu consumo. Furtado define que o cliffhanger refere-
se a uma narrativa “na qual, a terminar cada capítulo, tem início (ou surge a iminência de)
um confronto, uma revelação ou qualquer outro acontecimento decisivo para o desenrolar
da história, cujo desfecho apenas é dado a conhecer no episódio seguinte” (FURTADO,
2009, p.1).
No contexto dessa temporada do Projeto Humanos, o cliffhanger pode acontecer
tanto entre episódios quanto entre as partes. Como exemplo de cliffhanger entre episódios,
podemos citar o exemplo do primeiro episódio. No final do primeiro episódio são
apresentadas as confissões de cinco pessoas que confessaram que o mataram o garoto em
Evandro Ramos, entre elas Celina e Beatriz Abagge, respectivamente a esposa e filha do
prefeito. A prisão de Celina e Beatriz é um cliffhanger porque é uma cena que acontece ao
final do primeiro episódio e que gera uma dubiedade do que vem a seguir, criando
questionamentos do tipo “o que exatamente aconteceu?”. A resposta, obviamente, só é dada
no início do segundo episódio: revela-se que, sete pessoas foram presas em Guaratuba após
terem confessado que teriam sacrificado o menino Evandro num ritual macabro, a mando
de Beatriz e Celina Abagge. Como exemplo de um cliffhanger entre as partes da temporada
podemos citar o final da parte um (episódio 6) em que as Confissões gravadas foram obtidas
sobre tortura. O cliffhanger acontece quando é exibido o trecho das gravações da fita VHS
em que Beatriz é estimulada a dar detalhes de como o crime ocorreu. Diferentemente do
cliffhanger que acontece entre episódios e que gera perguntas específicas e pontuais, o que
ocorre entre as partes da temporada tende a ter maior amplitude na narrat iva, mais
95

consequências e a gerar mais dúvidas nos ouvintes. Cada narrativa inconclusiva, seja dos
personagens principais ou dos secundários, gera outros questionamentos.
Com base, nessa premissa identificamos que o podcast Caso Evandro possui um
roteiro que emprega uma escolha criativa que reforça alguns plot twists (reviravoltas) no
enredo, como quando se é revelado que os acusados foram na verdade torturados para
confessar o crime ou quando médico legista testemunha de acusação se suicida dias antes
de comparecer ao fórum para ser interrogado.
A temporada também traz diversos fios narrativos. Convém destacar que fio
narrativo é caracterizado como um conjunto de eventos interligados que envolvem os
personagens em uma ação (WOLF, 2012). O episódio seis explora uma das ramificações
da trama que é o caso Leandro Bossi. Embora ela seja tratada de modo mais detalhado
nesse episódio o próprio Mizanzuk ressalta que a história de João Bossi não se encerra por
aqui. Assim como, o episódio 33 que se dedica a contar o rumo e os suspeitos que se
delineava nas semanas seguintes ao assassinato de Evandro. Conforme podemos verificar
nesse excerto:
MIZANZUK: A ideia é então contar os casos de Testemunhas e suspeitos
que mais tiveram a atenção do grupo TIGRE. É consenso que a operação
do grupo águia da polícia militar destruiu e contaminou o trabalho de
investigação que estava sendo feito, a partir das prisões tudo vira um
misto de confusão e paranoia. Por isso eu quero tentar olhar para antes de
toda loucura que o caso se tornou e ver se algo pode ser aproveitado.
Então vamos voltar no tempo e olhar para o primeiro suspeito preso pelo
caso Evandro, antes dos sete acusados. [Ivan Mizanzuk, apresentador do
Projeto Humanos, no episódio 33 – 04’24’’].

Mizanzuk ressalta que a ideia desse episódio é falar sobre as testemunhas e os


suspeitos que mais tiveram a atenção da Polícia Civil, antes da confusão gerada pela prisão
das Abagge e dos outros cinco acusados (O CASO EVANDRO, 2018). Dessa forma, o
episódio mostra em detalhes um dos inúmeros fios narrativos que entrelaçam esse caso,
ainda que a maioria desses acontecimentos nunca gerou grandes linhas de investigação.

b) Descrição de cenas:

Mizanzuk constrói ao longo de toda a temporada uma ambientação que contempla


desde a descrição de detalhes visuais das entrevistas de que participa, até mesmo
comentários que acrescentam significado às experiências dos personagens. Como também
96

detalhamento de espaços, ações e pensamentos. Como no episódio 24 - Um dia em


Guaratuba.
MIZANZUK: Eu estava com meu gravador na mão com microfone e
tudo, mas em algumas horas eu usava meu celular para gravar também,
pois ele era bem menos intimidador. E o que eu queria mapear era o que
as pessoas achavam sobre todo o caso, o que será que elas lembravam?
O que será que ela sabe ou talvez o que acham que sabe? [Ivan Mizanzuk,
apresentador do Projeto Humanos, no episódio 24 -7’35”].

Descrever os equipamentos utilizados na entrevista é um artifício para nos mostrar


os bastidores da história e os percalços que enfrentou ao longo do processo de investigação.
No primeiro episódio da temporada, um trecho é dedicado a uma descrição da
cidade de Guaratuba através de um vídeo institucional. Com o intuito de transmitir o visual
comum na época que o crime ocorreu e ambientar o ouvinte naquela localidade. “Neste
vídeo são mostradas cenas de ruas pavimentadas pessoas andando na praia, a estátua do
Cristo na cidade tudo acompanhado por músicas que mostram que de fato estamos no início
dos anos 90” (O CASO EVANDRO, 2018). Esse tipo de descrição de ambientes repete-se
em diversos momentos durante a temporada.
Por se tratar de um caso criminal, existe um detalhamento na descrição, quase
repulsiva, das cenas que envolvem o sacrifício do garoto Evandro. Esse processo descritivo
além de permitir um mergulho na trama também pod e abalar efetivamente o ouvinte com
uma sobrecarga sensorial na descrição de cenas de violência. Não à toa, Mizanzuk sempre
ressalta que irá falar de temas sensíveis. Como no primeiro episódio em que ele descreve
sobre o estado do corpo da criança encontrado no matagal:

MIZANZUK: O corpo da criança foi encontrado a cerca de 800 metros


de distância da casa de Evandro era no Matagal afastado do centro com
poucas casas ao redor. E o estado em que se encontrava era horrível, mas
os detalhes sobre eles são importantes. Por isso um aviso se você tem
estômago fraco, eu recomendo que você pule alguns segundos... [Ivan
Mizanzuk, apresentador do Projeto Humanos, no episódio 1 – 43’08”].

Esse tipo de descrição auxilia na compreensão dos fatos narrados. Esse artifício é
utilizado também pelos convidados de modo a apresentar os cenários e acontecimentos
para os ouvintes, conforme o exemplo do episódio 13.

ZIPPIN: então eu fui aí esse é um alojamento que tinha ali na rua Santo
Antônio, do lado do quartel da polícia militar, conversei com as duas
pessoalmente, ali numa sala separada lá sem qualquer vamos dizer assim
97

vigilância ou qualquer outro problema e ela me descreveram o que tinha


acontecido. [Episódio 13 – 01’06”, Os Exames de Lesões Corporais,
advogado de defesa das Abagges, Dálio Zappin, descreve sobre o
primeiro atendimento na madrugada do 03 de julho].

Essas descrições oferecem uma proximidade com o real, de modo que possibilitam
uma incursão detalhada nos ambientes através das descrições desses espaços, que tendem
não somente retratar apenas a aparência desses lugares, mas seu funcionamento,
localização, relação com os espaços comuns e etc.

c) Criatividade:

Inspirado pela criatividade de uma nova geração de produtores no movimento do


podcast narrativo americano, a abordagem de Mizanzuk enquanto roteirista do Caso
Evandro, inova ao abordar um tema não ficcional a partir da técnica storytelling utilizando
princípios do jornalismo literário.
Com originalidade e inovação na abordagem de temas dramáticos, o roteiro
contempla decisões criativas e editoriais que levam em conta não somente a força da
narrativa, mas a emoção, a ética e o impacto dessa história na audiência. Mizanzuk afirmou
em entrevista ao portal UOL 72 que “acontece de eu estar fazendo um episódio sobre tal
assunto, me fazer uma pergunta, procurar nos autos e começar toda uma nova linha de
narrativa”.
Como em um podcast narrativo a duração do programa não é um problema, o
formato proporciona aos produtores de áudio a oportunidade de serem mais inventivos e
experimentais com as histórias que pretendiam contar. Como ressalta Oliveira (2018, p.
31), “são colocados como os programas de maior qualidade e criatividade, tanto no Brasil
como nos Estados Unidos e servem como elemento de distinção para os produtores, em
contraposição ao formato de talk show, considerados mais fáceis de fazer”. O formato mesa
redonda, estilo talk show, apresenta proposta diferente do Projeto Humanos, por ser mais
conversacional e improvisado.
Constrói-se, nessas narrativas um enfoque totalmente original, com suas próprias
subjetividades, baseada em uma linha documental, possuem linguagem informal,
elementos sonoros amplos utilizando áudios históricos, reportagens, depoimentos em

72Disponível em: https://entretenimento.uol.com.br/noticias/redacao/2019/04/21/podcast -sobre-menino-


assassinado-no-pr-deve-atingir-1-milhao-de-downloads.htm. Acesso em 02 nov 2022.
98

pesquisa e entrevistas com diversos personagens criando cenas sonoras com o “ propósito
de iluminar novos caminhos para a compreensão do leitor” (LIMA, 2009, p. 385), e aqui,
de modo particular, ao ouvinte. Isso pode ser visto no último episódio quando Mizanzuk
apresenta prováveis caminhos e as algumas teorias pessoais:

MIZANZUK: Por isso ao pensarmos em outros possíveis caminhos na


busca pelo verdadeiro assassino de Evandro Ramos Caetano, precisamos
definir o que acreditamos ser ou não real. É o que eu pretendo fazer neste
último episódio. No esforço de tentar estabelecer o que é válido, eu listei
nove pontos que eu creio ser importante para compreensão do meu
raciocínio. Então vamos a ele... [Ivan Mizanzuk, apresentador do Projeto
Humanos, no episódio 36 – 34’37’’].

As cenas sonoras exploram seu potencial expressivo e sua capacidade de contar


uma história e atuam como instrumentos de imersão.
Como o podcast Projeto Humanos investe na narrativa, na exploração de
personagens e na aproximação com a audiência pretendida – características naturais do
áudio – apresenta maior potencial imersivo. Ademais, sua quarta temporada emprega a
convergência em seu conteúdo, traz uma produção especial, intitulada enciclopédia, sobre
os eventos relacionados a morte do garoto Evandro que apresenta mapa, explora
hipertextualidade para complementação de conteúdo, apresenta documentos históricos e
fotografias para ilustrar pessoas e lugares. Por conta disso, o podcast tem adaptado o seu
conteúdo para trazer informações adicionais que o ouvinte tenha uma maior imersão da
narrativa.

d) Recapitulação

Os episódios seguem estruturas similares, onde cada episódio é aberto com um


aviso de gatilho e conteúdo, uma recapitulação que se inicia com a frase “no episódio
anterior”, na voz de Mizanzuk, e reúne os principais trechos do episódio antecedente,
seguido da abertura do programa e a recomendação, “se você não ouviu os episódios
anteriores, pare, volte e ouça em sequência”. Posteriormente, Mizanzuk busca
contextualizar e delinear os assuntos tratados no episódio. A partir daí, são apresentadas
todas as entrevistas e investigações que o compõem, sempre acompanhadas de explicações
e comentários do apresentador.
A produção em áudio também apresenta recapitulação ao término do episódio
quando o narrador recita a frase “No próximo episódio...”, logo em seguida, surgem
99

diversos trechos de sonoras, intercalando falas dos personagens e recortes de matérias


jornalísticas de momentos explicativos sobre o que aconteceu. Esses trechos colaboram
para aumentar a curiosidade, pois trazem informações até então incompletas ou
inconclusivas. Quando Mizanzuk ressurge, oferece um pequeno resumo sobre o que será o
episódio seguinte e finaliza com a frase: “O que aconteceu exatamente você saberá no
próximo episódio... aqui no Projeto Humanos, O caso Evandro” (O CASO EVANDRO,
2018), seguido dos créditos do programa.
Assim como os resumos e a chamadas para o próximo episódio, outros recursos
como recapitulação de fatos e datas através de linhas do tempo, são utilizados ao longo dos
episódios de modo que ao recapitular informações já apresentadas e adicionar novas
perspectivas, contribui para rememorar os diversos acontecimentos da trama e auxiliar na
compreensão da narrativa, mantendo o nível de interesse dos ouvintes. Esse recurso vem
sendo utilizado em narrativas radiofônicas desde a década de 30, como ressalta Matos:

Em 1930, foi ao ar a primeira radionovela, Painted Dreams, em que uma


viúva e sua filha vivem diversas situações cotidianas. À época, a
impossibilidade, como no cinema, de arquivamento e retomada de
mensagens, acrescida da linguagem exclusivamente auditiva, agregou ao
corte estratégico a necessidade de rememoração do corte anterior (antes
das entregas) e de retomadas de conteúdo através de lembranças ou
menções recapitulativas por parte dos personagens. Os ouvintes que
esquecessem informações anteriores ou perdessem alguma entrega
podiam, assim, continuar acompanhando a série sem dificuldades. Além
disso, temas de agrado popular são adotados, pois facilitam a
compreensão geral, o que acaba por impor certo padrão temático e certa
regularidade na dinâmica de desenvolvimento (MATTOS, 2018, p.275).

Conforme já pontuado, os resumos ou a retomada de assuntos já citados em


episódios interiores são um recurso utilizado para recapitular os fatos, como vemos no
exemplo a seguir:

MIZANZUK: é este aspecto que vamos começar a aprofundar a partir


deste Episódio, contudo para fazer isso antes temos que entender melhor
que confissões eram essas, e sabendo também do quão complexo esse
caso é vamos retomar um pouco a nossa linha do tempo para não nos
perdemos. [Ivan Mizanzuk, apresentador do Projeto Humanos, no
episódio 7 – 8’12’’].

Outro exemplo presente na temporada de recapitulação de eventos citados


anteriormente;
100

MIZANZUK: Primeiro temos que ter em mente os panfletos que


Diógenes fazia contra a administração Abagge e que eles foram
produzidos no período de mais ou menos dois anos, eu já mencionei isso
anteriormente...[Ivan Mizanzuk, apresentador do Projeto Humanos, no
episódio 17 – 01’06’’].

De modo geral identificamos que a construção narrativa no podcast vai além do


esperado, fazendo com que o arco narrativo, a multiplicidade de fios, as descrições de cenas
e as diversas formas de recapitulação dos eventos sejam estímulos viciantes que contribuem
de forma fundamental para a conquista do público ouvinte.

4) Linguagem sonora:

No caso Evandro a paisagem sonora é composta por todos os seus elementos


sonoros: além da trilha musical, os efeitos sonoros, as vozes tanto dos personagens que
aparecem a cada episódio, como também, a de Mizanzuk que é a voz autoral na figura do
Narrador, assim como o silêncio.

a) Trilha Musical:

Sua trilha musical também apresenta funções importantes no programa. A música-


tema, intitulada 06 de abril de 1992, assim como toda trilha sonora73 composta pelo músico
Felipe Ayres. São dezoito canções instrumentais disponibilizadas nas principais
plataformas de áudio. As músicas, especialmente compostas para o podcast são essenciais
para criar o clima sombrio, dão o tom e ordenam o sentimento e as sensações a serem
acionados durante os episódios, de forma a pontuar momentos importantes da narrativa,
chamando a atenção do ouvinte para as novas informações reveladas. No primeiro episódio,
a música Medo, aparece ao longo do episódio, como um leitmotiv (Richard Wagner) que
atua como motivo condutor e relaciona ao uso recorrente de uma determinada melodia,
criando vínculos com eventos, personagens ou ideias em uma trama.
A música na temporada do caso Evandro reforça a identidade do programa,
acionando tensões e emoções, dialogando com os princípios da linguagem sonora. O tema

73 Disponível em: https://open.spotify.com/album/00Oxaeedxh2iE0phBRgLBk. Acesso em 24 out 2022.


101

06 de abril de 1992 torna-se um modo de identificar o programa, e assume a função de


abertura e encerramento do podcast.
Além da música-tema, o episódio conta com diversos outros momentos em que as
narrações e entrevistas são acompanhadas por uma trilha original composta por Ayres. No
episódio seis ao realizar uma linha do tempo cronológica há uma inserção da trilha musical,
algumas peças se encaixam, marcando o início e assim destacando cada nova informação
que vai sendo divulgada. Em outro momento em uma passagem onde Mizanzuk ressalta
suas dúvidas sobre os acontecimentos é inserida a música Ruínas para marcar a passagem
de suas indagações. Podemos inferir que a música no caso Evandro é utilizada basicamente
com finalidade de criar tensão narrativa, conexão e quebra de cenas, de modo, que a música
se mistura as vozes e destaca a narrativa.
Nuzum (2019, p. 133) destaca que tanto o som quanto a música são ferramentas
muito poderosas. “Ambos evocam coisas que não são ditas, apontam a atenção de um
ouvinte para um momento importante, fornecem pistas emocionais para o ouvinte sobre
humor e sentimento e fornecem a estética de seu trabalho”.

b) Efeitos Sonoros

Além da música compõem a paisagem, os efeitos sonoros, ainda que de modo


muito pontual e quase discreto. Entretanto, os episódios iniciam com o efeito sonoro do
barulho das teclas de uma máquina de escrever, que está em consonância com a época que
o crime ocorreu, onde depoimentos eram registrados em máquinas de datilografia, assim
como também, é uma ferramenta de trabalho do escritor, do contador de histórias, e aparece
representada na arte de capa da temporada.
O som ambiente, os ruídos e/ou elementos que participam das entrevistas tudo
isso contribui para ilustrar a paisagem sonora. O som de uma TV sendo sintonizada,
aparece sempre que uma matéria jornalística é introduzida no decorrer dos episódios com
a função demarcar essas ocorrências.

[Efeito da TV]
REPÓRTER: O corpo de Evandro foi encontrado no dia 11 de abril, um
sábado. Desde o primeiro dia em que Evandro desapareceu, houve vigília
na casa do garoto, nem a polícia dispensou a ajuda de videntes para
encontrar Evandro. A família e a polícia checavam imediatamente toda a
pista, desespero da família aumentava. No dia 11 de abril a presença de
urubus no Matagal que fica perto da casa de Evandro chamou a atenção
de um lenhador... (Episódio 1 – 40’14”)
102

Durante a temporada, as confissões gravadas nas fitas VHS são utilizadas em


diversos momentos, o áudio dessas fitas possui chiados que demonstram que sua origem é
antiga e por isso não apresentam melhor qualidade sonora. O Caso Evandro cria diversas
imagens sonoras, ao não retirar das situações de entrevista os ruídos e sons que compõem
o ambiente no qual Mizanzuk e seus entrevistados estão. A inserção de efeitos sonoros
escolhidos, permite redimensionar a experiência de escuta e organizar a linha narrativa
apresentada.

c) Voz:

A voz é o elemento mais presente e instantaneamente percebido no podcast,


principalmente a de seu narrador, o podcaster Ivan Mizanzuk. Por apresentar um programa
em áudio, que se constitui ativamente na narração, sua voz ocupa grande parte dos
episódios no Caso Evandro. Mizanzuk expressa uma voz nítida, com eloquência, e
apresenta seus argumentos de forma pausada. A entonação da voz, o ritmo e sua modulação
são aspectos que contribuem na construção da relação com o ouvinte. Em determinados
momentos, Mizanzuk utiliza um tom de voz mais enfático com a necessidade de destacar
alguns pontos importantes da sua mensagem, como visto no seguinte trecho:

MIZANZUK: “Para mim tudo isso são indícios fortes de que no mínimo
algo de muito estranho aconteceu nesse circo todo. Então fica aqui o re-
gistro de algo que me chamou bastante atenção, quem falou seita satânica
e coisas do tipo foi a imprensa e autoridades. Mesmo que os sete fossem
culpados já haveria em um forte indício de como que os acusados foram
retratados para a população em geral” [Ivan Mizanzuk, apresentador do
Projeto Humanos, no episódio 12 – 45’51’’]

Ao longo da temporada em diversos momentos, a voz de Mizanzuk se sobrepõem


aos áudios utilizados na produção seja para explicar, recapitular ou justificar o motivo de
estar aparentemente desviando do arco narrativo central do episódio. Ainda que o uso da
palavra/voz por muitos momentos se confunda com o uso do item Narrador, aqui
preferimos evidenciar como um recurso expressivo fazendo parte de uma linguagem
radiofônica/sonora como ressalta Reis (2012, p. 5) “se por um lado reproduz a realidade,
um objeto ou uma ideia, por outro lado evoca sensações e estimula a imaginação. É o
instrumento pelo qual se expressa o pensamento humano”. O fragmento, a seguir expõe
tanto o fato, quanto as impressões e os sentimentos.
103

MIZANZUK: Aqui eu tenho que explicar um pouco do problema que eu


enfrentei tentando entender esse inquérito, pelo menos até onde pude per-
ceber nas mais de 20 mil páginas do processo esse inquérito das alegações
de tortura não está tudo junto em uma sessão muito lógica, mas sim ele
está espalhado em uma série de depoimentos e outros documentos e com
uma paginação fora da ordem cronológica. Eu já utilizei alguns desses
depoimentos aqui como do então Capitão do grupo águia Valdir Copetti
Neves e do Doutor Raul de Moura Rezende, um dos médicos que fizeram
o exame de lesões corporais nas Abagge. A sensação que eu tenho é que
são como peças de quebra-cabeças que estão espalhados e eu acabo tendo
que deduzir boa parte de como que ela se encaixam, pode ser também um
problema das cópias que eu tenho aqui comigo a qualidade das páginas
escaneadas, não é das melhores e pode ser que haja páginas faltando [Ivan
Mizanzuk, apresentador do Projeto Humanos, no episódio 16 – 4’12’’,
grifo nosso]

Dotado de uma composição sonora que lhe é própria em decorrência da técnica do


storytelling, a temporada foi elaborada pensando na combinação entre todos os elementos
da linguagem radiofônica e nas suas implicações.

5) Elementos parassonoros:

O podcast congrega a junção da linguagem sonora e as potencialidades da internet


através dos elementos parassonoros com recursos interativos, hipertextuais e multimídia
que complementam as informações disponibilizada pelo áudio por meio de fotografias,
mapa e textos.

a) Conteúdo Extra

Ao longo da temporada, Mizanzuk ressalta a importância de sempre que surgirem


dúvidas os ouvintes consultem a enciclopédia do caso Evandro presente no site do Projeto
Humanos. Embora, a enciclopédia seja citada com maior ênfase ao término d os episódios,
como podemos comprovar nesse exemplo retirado do episódio 1 e que se repete ao longo
de todos os episódios da temporada:

MIZANZUK: essa história que estamos contando tem muitos


personagens e eventos. Então para facilitar se você entrar na sessão do
caso Evandro em projetohumanos.com.br você encontrará um post
chamado enciclopédia. Se você quiser saber mais sobre algum
personagem ou evento que citamos é só dar uma olhada lá, nós vamos
acrescentar mais coisas a enciclopédia à medida que novos episódios
104

forem sendo publicados (Ivan Mizanzuk, apresentador do Projeto


Humanos, no episódio 1- 59’11”).

Tendo em mente que o áudio é a espinha dorsal dessa produção, Mizanzuk descreve
em detalhes o conteúdo de uma fotografia e oferece a possibilidade de consulta na
enciclopédia, ressaltando o caráter de complementação dos elementos parassonoros, sem
descaracterizar o áudio.

MIZANZUK: a imagem que o Bruno me mandou está na Enciclopédia


do Caso Evandro no post referente a este Episódio. Mas para você que
não pode conferir agora eu vou fazer o melhor possível para descrever
ela aqui. Na imagem é possível ver várias bolinhas e elas estão
distribuídas em três linhas e cinco colunas. Nas primeiras colunas à
esquerda, as bolinhas estão mais fortes à medida que vão para a direita
elas vão ficando mais apagadas. (Ivan Mizanzuk, apresentador do Projeto
Humanos, no episódio 32 – 27’13”).

Além da imagem disponibilizada no campo extras do episódio 32, a enciclopédia


disponibiliza diversos laudos e documentos, como também uma espécie de resumo do
episódio.

Figura 13: Imagem explicativa presente na Enciclopédia do Caso Evandro (EP 32)

Fonte: Captura de tela (PROJETO HUMANOS, 2018)

Temos uma narrativa que vai além do áudio, mas o tem como elemento central,
assim os ouvintes-internautas podem acessar o conteúdo, ver fotografias, ter acesso aos
materiais que compõem cada episódio do podcast e a história que eles contam.
105

b) Conteúdo histórico

Nessa unidade de análise, buscamos mídias (fotos, vídeos, áudios) que rementem a
acontecimentos passados, e como essa reconstituição da memória se relaciona com o áudio
da narrativa.
Por se tratar de uma história que ocorreu na década de 90 e tendo em vista, “o papel
fundamental da imprensa na construção do caso, o uso de tais materiais (especialmente os
anexados no processo) tornou-se imprescindível” (O CASO EVANDRO, 2018). A
perspectiva do compartilhamento de conteúdo através da enciclopédia permite “encontrar
registros da cobertura midiática do crime nas reproduções dos jornais e revista da época e
vídeos de reportagens sobre o caso. Estes conteúdos assumem papel de complementar os
episódios ampliando o conhecimento sobre o contexto histórico” (OLIVEIRA, KNEIPP,
2021, p. 6-7).
Como fonte de pesquisa, foram utilizadas diversas matérias de TV de redes e
emissoras como Rede Globo e SBT, assim como também emissoras que não existem mais
como a Rede OM e TV Independência. Isso pode ser ilustrado brevemente nessa passagem:

MIZANZUK: Essa versão de que Diógenes teria induzido o pai de


Evandro a reconhecê-lo, já foi apresentado aqui por mim em um episódio
passado. Eu vou repetir aqui para citarmos da onde que ela vem. O trecho
que vocês ouvirão a seguir é do programa Jogo Limpo, da extinta TV
Independência, o programa foi ao ar em 1995 e quem está respondendo
às perguntas do apresentador Mauro Baruque é o advogado de defesa
Figueiredo Basto Ivan Mizanzuk, apresentador do Projeto Humanos, no
episódio 26 – 27’01”).

Os demais vídeos foram obtidos através de arquivos pessoais ou ainda na rede social
YouTube. Com essa diversidade de possibilidades de utilização dos conteúdos
audiovisuais, foi possível acessar inúmeras informações sobre acontecimentos
relacionados ao crime. Outra reconstituição dessa memória ocorre no dossiê que reúne
todas as matérias no antigo Jornal Hora H, de Curitiba, hoje extinto disponibilizado na
enciclopédia.

MIZANZUK: Como eu avisei, o Jornal Hora H, já não existe mais e por


isso eu tenho que aqui agradecer ao meu amigo, Luiz Izalberti, jornalista
que realizou mais extensa pesquisa nos arquivos da biblioteca pública do
Paraná buscando resgatar a cronologia dessas matérias. O dossiê que ele
106

montou com imagens de todas as matérias, está disponível para download


para quem quiser conferir na sessão de materiais extras deste episódio, lá
na enciclopédia do Projeto Humanos, no nosso site. Mas é sempre bom
avisar que tanto o livro do Diógenes quanto essas matérias do jornal H
trazem mais informações do que eu revelei para vocês e que trarei no
futuro com mais cuidado. (Ivan Mizanzuk, apresentador do Projeto
Humanos, no episódio 6 – 23’20”).

Assim, os textos sonoros também nos chegam por meio de formas não sonoras
historicamente situadas – pelas matérias impressas e audiovisuais sobre o caso, e nosso
percurso histórico em relação ao podcast leva em consideração além do áudio, esses
documentos disponibilizados na enciclopédia.
107

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Embora já exista há quase duas décadas, o podcasting só recentemente se


estabeleceu como uma plataforma de conteúdo midiático, rompendo seus laços com o rádio
e desenvolvendo seu próprio conjunto de práticas, lógicas e modelos. Nesse contexto, o
podcast, ganhou espaço como meio de comunicação, seja de notícias, ficção ou não-ficção
e redefiniu a forma como contamos e consumimos histórias. Essa nova prática social
midiática reafirma a proposta de McLuhan sobre a mídia como extensão do homem, ao
proporcionar ao ouvinte imersão e participação.
Iniciar essa conclusão mencionando o podcast como um lugar propício para
contação de histórias pode parecer repetitivo, mas é um indício muito explícito de uma
observação que nos faz, perceber a ascensão do meio como terreno fértil e criativo para
composição de narrativas como vimos ao longo desta dissertação. Nesse sentido, a
utilização da técnica storytelling é fundamental para ajudar a compreender o modo de
produção desses programas de áudio narrativos, condição essencial para o surgimento de
uma nova dimensão sonora.
As inquietações norteadoras relevantes a esta pesquisa foram motivadas ao
acompanhar o lançamento de cada novo episódio da temporada do Caso Evandro, e a cada
surpresa ao contemplar a construção deliberada do Projeto Humanos de contar histórias em
áudio. No primeiro momento, além de situarmos a trajetória do podcast, buscamos
caracterizar a técnica storytelling, considerando suas especificidades no caso das relações
entre os produtos sonoros. Tomamos como premissa que a técnica se configura como um
modelo de produção a partir do qual são utilizados diversos elementos que contribuem para
a criação de conteúdos de maneira estratégica, a fim de ressaltar as potencialidades da mídia
sonora.
Situamos a revisão teórica dos textos, primordialmente, nos desenhos conceituais
de rádio expandido (KISCHINHEVSKY, 2016), podcast (BONINI, 2015;
KISCHINHEVSKY, 2018), storytelling (VICENTE, SOARES, 2021), e elementos
parassonoros (KISCHINHEVSKY E MODESTO, 2014) para compreendermos o atual
cenário em que estão inseridas as narrativas em áudio e quais as forças propulsoras
auxiliaram a abordagem narrativa da história. Esta pesquisa foi articulada em quatro
capítulos, a partir da utilização de uma abordagem metodológica multimétodos, devido à
dimensão multifacetada do objeto empírico selecionado e das suas peculiaridades ao
articular o áudio a outros conteúdos parassonoros.
108

Dessa forma, buscamos analisar como estes elementos contribuem na forma de


contar uma história, tendo como ponto de partida o estudo da técnica storytelling aplicada
na quarta temporada do Projeto Humanos, bem como a utilização dos elementos
parassonoros, contribuem para as transformações criativas na produção do podcast Caso
Evandro.
Através da pesquisa, objetivou-se demonstrar a eficiência, ou falta dela, na
utilização da técnica storytelling enquanto método que produz uma história com conteúdo
cuidadosamente elaborado. Sua influência na realização dos episódios e sua relevância na
criação de roteiros dos mesmo em decorrência dos recursos ilimitados de storytelling
adotados na temporada e qual impacto direto do seu uso para entendermos com maior
clareza como foram aplicadas algumas das principais táticas narrativas na quarta temporada
do Projeto Humanos e suas implicações. A partir deste entendimento podemos destacar
qual impacto isso terá nas formas como as produções são desenvolvidas e produzidas.
Com essa pesquisa foi possível identificar a técnica storytelling utilizada na
produção do Caso Evandro e como essa estratégia auxilia a narrativa deste podcast, definiu-
se três objetivos específicos, que foram alcançados nessa dissertação. No primeiro
investigou-se nos episódios quais os principais elementos da técnica storytelling praticada
pelo Caso Evandro. A análise revelou que a temporada utiliza de forma adequada a técnica
storytelling - incluindo o personagem no centro da narrativa, narrador em primeira pessoa,
descrições de personagens e cenários, recapitulações, uso de arcos narrativos e fórmulas
narrativas como ganchos e reviravoltas para atenderem aos objetivos de um podcast
narrativo. Seguem os princípios do jornalismo literário e efetuam isso ao lançarem mão de
um viés humanizado, com criatividade e empatia, além de utilizarem os elementos da
linguagem radiofônica na composição da narrativa sonora.
Identificado um modelo geral de produção narrativa em podcasts com inúmeras
características, nos dedicamos a identificar se esses aspectos são aplicados na quarta
temporada. Partimos, antes da distinção do que se configura como narrativa de não ficção,
de outros modelos como investigativo, documental e true crime, para poder situar o objeto
empírico da pesquisa dentro de uma linha que combinou diferentes modelos na concepção
do podcast.
Determinado um modelo de produção narrativa nos recursos sonoros, investigamos
sua aplicação ao podcast a partir de levantamentos de experiências recentes e da pesquisa
empírica. Também foi possível identificar que os atributos de composição desse formato
109

são utilizados a partir de novas perspectivas e com funções demarcadas a fim de gerar um
efeito deliberado de maior envolvimento e interação com o público.
A partir dos resultados obtidos na análise, a classificação é de que a temporada tem
como principais características; além do formato storytelling, atributos elencados como
uma narrativa de não-ficção, fundamentada no jornalismo investigativo e documental, do
gênero true crime, com aspectos serializada, sazonal e sendo considerada também uma
narrativa longa. As características, citada no capítulo três, se materializa por meio das
explicações que contextualizam e explicam minuciosamente que a temporada pode assumir
estas peculiaridades. De modo que, o podcast caso Evandro pode ser considerado, uma
história não ficcional baseada em um true crime, o eixo da narrativa é centrado numa
história humana, de modo a enfatizar uma trama que envolve drama, suspense e emoção.
Ao apresentarmos atributos definidores da temporada, acreditamos que as
produções em geral podem possuir a maior parte das características, mas não
necessariamente todas.
Reafirmamos a importância do tema analisado pelo fato de existirem ainda poucos
estudos no Brasil que tratam da técnica storytelling como um recurso narrativo aplicado ao
meio podcasting. No que toca a questão do mapeamento das características da produção
brasileira, contribuímos seja identificando, seja no levantamento de um repertório de
procedimentos narrativos utilizados por podcasters, assim como na geração de novos
dados, coletados a partir do livro de códigos da análise de conteúdo.
A articulação dessa técnica facilita o modo de produção e abre possibilidades
criativas de uso, uma vez que combina as ideias de forma a apresentar uma abordagem
única para entrevistas e composição de histórias. A especificidade e a complexidade da
técnica storytelling, dita legitimamente os processos de produção de um podcast narrativo,
contribuindo assim para a sua consolidação, popularização e relevância num contexto
midiático de crescente plataformização.
A análise permitiu considerar que o podcast ocupa na atualidade papel importante
na construção de narrativas em áudio, através de seus formatos e técnicas utilizadas.
Constatamos que o produto sonoro é o principal condutor da narrativa (mídia regente) e
trabalha como o propósito de construir o universo narrativo através não somente da
linguagem radiofônica e elementos do storytelling, bem como, com a utilização de
elementos parassonoros e a criação de um banco de dados, por meio da enciclopédia
(estratégias de transmidiação). A fim de que, ouvinte possa se movimentar em outras
direções inspirados pela escuta, mas não se limitando somente ao áudio.
110

A construção de que Caso Evandro, embora mantenha entre suas essências a


natureza documental, tem seu caráter atualizado quando utiliza os elementos parassonoros
para distribuir uma gama maior de conteúdos e peculiaridades da ocorrência histórica na
enciclopédia de uma forma mais acessível ao ouvinte-internauta. Uma vez que o áudio
provocou a imaginação, que poderá ser complementada com esses elementos parassonoros.
Com isso, a hipótese do trabalho de que esse formato de podcast propicia a criação
de nova identidade narrativa que articula uma linguagem própria para o meio sonoro; e
considera tanto as técnicas literárias/narrativas como a textura sonora, apresentando uma
experiência informativa e imersiva se confirmou pois o podcast dialoga diretamente com o
trabalho de investigação realizado pela produção da série em áudio, utilizando o recurso
do storytelling e as diversas possibilidades de narrar uma história não apenas pela forma
como é contada, mas também pelo uso da linguagem radiofônica na construção de uma
paisagem sonora.
Ademais, o processo de produção da técnica storytelling nos podcasts se configura
a partir da utilização dos elementos constitutivos como personagens, arco narrativo,
presença do narrador e são construídos com uma linguagem radiofônica, levando em conta
um relato humanizado.
Portanto, pode-se inferir que o podcast por estar em constante experimentação
inova ao empregar técnicas narrativas, proporcionando novas experiências que estimulem
o ouvinte-internauta a interagir com os aspectos sonoros e parassonoros viabilizando uma
melhor imersão. O storytelling e os elementos parassonoros reconfiguram as lógicas
criativas e a relação entre produtores e ouvintes. Ambos, desempenham um importante
papel para as narrativas em áudio, uma vez que utilizam recursos criativos como aliados
para criar uma experiência imersiva inaugurando uma nova fase na comunicação sonora.
Por fim, é importante salientar que, apesar da técnica storytelling existir há décadas,
o modo como é montada de forma criativa e coerente para obter o máximo impacto no áudio
é recente e precisa ser explorada em âmbito acadêmico. Dessa forma, esperamos que esta
pesquisa seja uma pequena, mas importante, colaboração para um campo de estudos ainda
muito tímido no Brasil e cuja relevância é ímpar para uma reflexão dessa prática social
comunicativa. Com isso, desejamos que este estudo possa instigar outros pesquisadores e
profissionais da comunicação a buscarem nos produtos sonoros histórias que utilizem o
storytelling, de maneira inovadora, de forma a encontrar outras características não citadas
nessa dissertação.
111

Esta pesquisa não esgota o tema, mas permite a expansão da discussão para novos
contextos. De modo que, deixa-se como sugestão um futuro estudo, a fim de verificar as
novas possibilidades narrativas de expansão do conteúdo e a união de outras plataformas e
suportes ao conteúdo em áudio, adequadas à nova era de ouro do áudio digital e transmídia,
que perpassa pelos novos formatos presentes na ecologia das mídias.
112

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123

APÊNDICE A – TRANSCRIÇÃO DOS EPISÓDIO ANALISADOS

EPISÓDIOS* LINK PARA ACESSO A TRANSCRIÇÃO

Episódio 1 https://bityli.com/FiRDkEyiO

Episódio 6 - Parte 1 https://bityli.com/LPaMdToLz

Episódio 6 - Parte 2 https://bityli.com/eBstiHDWm

Episódio 7- Parte 1 https://bityli.com/acbiUSCvE

Episódio 7- Parte 2 https://bityli.com/rnGPLFrFd

Episódio 12 https://bityli.com/azqcMkHPX

Episódio 13 https://bityli.com/BDLFFCndQ

Episódio 16 https://bityli.com/HeNewg

Episódio 17 https://bityli.com/VYFLEXMes

Episódio 24 https://bityli.com/MgJvZGFTC

Episódio 26 https://bityli.com/DQuqFSgEI

Episódio 32 - Parte 1 https://bityli.com/GzHiXGBZJ

Episódio 32 - Parte 2 https://bityli.com/QqhnUdOmJ

Episódio 33 https://bityli.com/hUdwRJodl

Episódio 36 https://bityli.com/XhCttsALg

*A plataforma Pinpoint possui o limite máximo de até 2h de áudio para


transcrição de cada arquivo, por esse motivo alguns episódios foram divididos.

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