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Dessa forma Arendt situa Eichmann como um homem que buscava a ascensão social e
por conseguinte estaria disposto a fazer o que fosse para obter sucesso e a partir do desejo
de ascensão na esfera de poder público e social , Partindo para a prática do mal mesmo
que uma prática burocrática, logo suas alegações de Inocência não poderiam ser aceitas,
pois Eichmann agia com uma racionalidade individual, para o seu bem individual e não
ao bem coletivo.
E assim autora consegue demonstrar a partir do julgamento de Eichmann, um “mero”
funcionário do estado como o mal, a morte e o horror eram estatizados, burocráticos a
partir das funções de servidores comuns a plenos olhos e como a ascensão do fascismo se
deu por esses meios e a organização e poder desse estado para executar o mal.
Já Mbembe traz a teoria da necropolítica, que seria o poder de matar do estado ou melhor
dizendo o poder do estado de ditar quem deve morrer ou quem pode viver, tendo como
base as noções de biopoder de Foucault e as formas do estado de controle de população.
O autor tenta demonstrar e explicar as variadas formas na contemporaneidade a tentativa
de execução de determinados grupos, como exemplo a população negra e os parâmetros
de raça do estado.
Para Mbembe , essa ideia de extermínio dos inimigos do estado vem está ligado com o
período colonial e dessa forma ele faz críticas análises de Foucault por conta da visão e
viés eurocêntrico de percepção, pois existem fatores e fenômenos ligados ao imperialismo
colonial que Foucault ignora em certo ponto.
Há também a questão dos discursos, pois a partir dos discursos das autoridades do Estado
é possível que sejam promovidas inimizades entre grupos, tal como entre alemães e
judeus que levou a Alemanha nazista, como também os discursos que promovem o
racismo na sociedade em geral. Todos esses discursos acabam por incentivar o
extermínio de um determinado grupo, o colocam como um inimigo a ser combatido pelo
estado para resolução de problemas “limpeza” da sociedade.
Contudo, Mbembe traz uma analise muito mais profunda desse discurso e dessa função
do Estado em relação a populações marginalizadas, como a população negra que sofre
um processo histórico de marginalização, sendo segregada, sendo o inimigo a ser
combatido nos mais variados contextos, fosse no processo de segregação racial
americana, no apartheid na África do Sul ou mesmo no Brasil com todo o processo de
marginalização de pessoas negras pós escravatura e período colonial. Logo, partindo
dessa questão histórica é possível compreender todo o discurso criado ao longo de séculos
para a criminalização desses povos, deixados à margem da sociedade durante o
colonialismo e atualmente no processo neoliberal e dessa forma, no contexto
contemporâneo o individuo negro é o inimigo, é o marginal, o ladrão que age contra o
cidadão de bem, que atrapalha sua rotina e assim o Estado intensifica esse discurso, toma
sua licença para matar, usar sua função assassina tendo como alvo essa população não
abastada.
“Na Alemanha de hoje, essa ideia de judeus ‘importantes’ ainda não foi esquecida. Veteranos e outros
grupos privilegiados não são mais mencionados, mas o destino de judeus ‘famosos’ ainda é deplorado à
custa de todos os outros. Não são poucos, principalmente entre a elite cultural, os que ainda lamentam
publicamente o fato de a Alemanha ter despachado Einstein, sem perceber que era um crime muito maior
matar o pequeno Hans Cohn da esquina, mesmo que ele não fosse nenhum gênio. (Arendt, pág.151)”
É possível observar assim a questão de visão valor desses corpos pela sociedade e elite
alemã, um corpo judeu com valor era um corpo intelectualmente útil de alguma forma, já
uma criança sem muitos saberes ou posição prestigiada era um corpo sem valor a nação.
Dessa forma, também é possível comparar com o contexto da marginalização colonial,
compreendo a organização e a desvalorização que a elite colonial e hoje neoliberal
promoveu à populações marginalizadas, buscando os impedir de ascensão seja financeira
ou intelectual, perpetuando ainda mais a ideia de não valor e agregação desses indivíduos
a sociedade, os projetando como atrasados e incapazes em um mundo capitalista e
neoliberal cheio de “oportunidades”, tornando-os assim o inimigo.
Referências:
ARENDT, Hannah. Eichmann em Jerusalém: um relato sobre a banalidade do mal.
São Paulo: Companhia das Letras, 1999, p. 13-31, 128-151.