Você está na página 1de 7

CONSELHO REGIONAL DE ENFERMAGEM DE SÃO PAULO

PARECER COREN-SP 023/2012 – CT


PRCI nº 99.692/2012 e Ticket nº 278.257

Assunto:
Impossibilidade de aplicação de
Clexane®(Enoxaparina) via subcutânea (SC) por
cuidador.

1. Do fato
Solicitação de parecer sobre a possibilidade do cuidador realizar o procedimento
de administração de Clexane® (enoxaparina) por via subcutânea (SC).

2. Da fundamentação e análise
O cuidado humano ou cuidar de si representa a essência do viver humano; assim,
exercer o autocuidado é uma condição humana. E, ainda, cuidar do outro sempre representa
uma condição temporária e circunstancial, na medida em que o outro está impossibilitado
de se cuidar (GONÇALVES; AVAREZ; SANTOS, 2000).
O cuidado acontece nos seres, a partir deles e por meio deles, coexistindo na
natureza e por onde suas estruturas podem ser pensadas, pois estão presentes na
organização da vida dos seres, nos seus domínios biológicos, antropológicos, psicológicos,
sociológicos, entre outros (ERDMANN, 1996).
Atualmente, com a grande expectativa de vida e o surgimento de diferentes
agravos, as pessoas acabam recebendo, muitas vezes, os cuidados em suas residências,
também denominados de cuidados domiciliares realizados por cuidadores e profissionais da
equipe de enfermagem.

1
CONSELHO REGIONAL DE ENFERMAGEM DE SÃO PAULO

Bueno (2011) ilustra que “o cuidador poderia ser um familiar, um amigo, vizinho
ou indivíduo contratado pela família para cuidar do paciente, sendo que, na ausência da
família, é ele que responderia pelos cuidados não técnicos a serem realizados pelo
paciente”.
O cuidador é aquele que assume a responsabilidade de dar suporte ou incentivar a
realização das atividades da vida diária, tendo em vista a ascensão da qualidade de vida do
idoso ou outra pessoa cuidada (SENA et al., 2006). No domicílio, ele tem como objetivo
incentivar a independência da pessoa, diminuindo possíveis agravamentos devido à
incapacidade ou doença. Visa, então, à promoção e/ou manutenção da saúde
(MACARENHAS; BARROS; CARVALHO, 2006).
Segundo o Classificação Brasileira de Ocupações (CBO), proposta pelo
Ministério de Trabalho e Emprego, a ocupação de cuidador é acessível:

[...] a pessoas com dois anos de experiência em domicílios ou instituições


cuidadoras públicas, privadas ou ONGS, em funções supervisionadas de pajem,
mãe-substituta ou auxiliar de cuidador, cuidando de pessoas das mais variadas
idades. O acesso ao emprego também ocorre por meio de cursos e treinamentos
de formação profissional básicos, concomitante ou após a formação mínima que
varia da quarta série do ensino fundamental até o ensino médio. Podem ter acesso
os trabalhadores que estão sendo reconvertidos da ocupação de atendente de
enfermagem.[...] (BRASIL, 2012)

Observe-se, ainda, o fato de que na mesma família, estão classificadas as seguintes


ocupações: babá, cuidador de idosos, mãe social e cuidador de saúde, excluindo-se desta
classificação os Técnicos e Auxiliares de enfermagem, por pertencerem a categoria
diferenciada.
No que diz respeito ao cuidado direto aos pacientes pelos cuidadores, a CBO
determina tarefas específicas de sua competência, tais como:

2
CONSELHO REGIONAL DE ENFERMAGEM DE SÃO PAULO

[...]

A – CUIDAR DA PESSOA

1. Informar-se sobre CJAI ( Criança, Jovem, Adulto e Idoso) grifo nosso


2. Cuidar da aparência e higiene pessoal;
3. Observar os horários das atividades diárias de CJAI;
4. Ajudar o CJAI no banho, alimentação no andar e nas necessidades fisiológicas
5. Estar atento às ações de CJAI;
6. Verificar informações dadas por CJAI;
7. Informar-se do dia-a-dia de CJAI no retorno de sua folga;
8. Relatar o dia-a-dia da CJAI aos pais ou responsáveis;
9. Educar a criança e o adolescente nos deveres da casa e comunitários;
10. Manter o lazer e a recreação no dia-a-dia.

[...]

D – CUIDAR DA SAÚDE

1. Observar temperatura, urina, fezes e vômitos;


2. Controlar e observar a qualidade do sono;
3. Ajudar nas terapias ocupacionais e físicas;
4. Ter cuidados especiais com deficiências e dependências físicas de CJAI;
5. Manusear adequadamente CJAI;
6. Observar alterações físicas;
7. Observar as alterações de comportamento;
8. Lidar com comportamentos compulsivos e evitar ferimentos;
9. Controlar guarda, horário e ingestão de medicamentos, em domicílio;
10. Acompanhar o CJAI em consultas e atendimentos médico-hospitalar;
11. Relatar a orientação médica aos responsáveis;
12. Seguir a orientação médica

[...] (BRASIL, 2012).

A enoxaparina (Clexane®) é um anticoagulante da classe das heparinas de baixo


peso molecular. Suas aplicações clínicas estão relacionadas às suas propriedades
antitrombóticas, sendo utilizada para inibir a formação de coágulos em veias ou artérias e
evitar potenciais complicações agudas ou crônicas de tromboses venosas ou arteriais,
embolia pulmonar, infarto do miocárdio ou morte de origem cardiovascular. Como ocorre
com todos os anticoagulantes, o efeito colateral mais frequentemente relatado foi o
sangramento (SANOFI-AVENTIS, 2006).

3
CONSELHO REGIONAL DE ENFERMAGEM DE SÃO PAULO

O Clexane® é uma medicação utilizada em pacientes por via subcutânea que tem
uma absorção lenta através de capilares de forma contínua e segura e deve ser aplicado com
segurança nos pacientes (SANOFI-AVENTIS, 2006).
Além disto, deve-se observar, na administração deste medicamento, a escolha do
local de aplicação de menor inervação local, com acesso facilitado para absorção adequada
do medicamento. A aplicação, em geral, é realizada em parede abdominal, face
anterolateral da coxa e face externa do braço. O ângulo de aplicação deve ser de 90º com
agulha e calibre adequados, ou seja, 13 x 4,5.
O Clexane®, assim como qualquer outro anticoagulante, deve ser utilizado com
cautela em pacientes com alto risco de hemorragia, como nos casos de alterações na
hemostase; história de úlcera péptica; acidente vascular cerebral isquêmico recente;
hipertensão arterial grave não controlada por medicamentos; retinopatia diabética;
neurocirurgia ou cirurgia oftálmica recente (RHODIA-FARMA, 2012).
Por fim, para administração do Clexane® há necessidade de possuir conhecimento
e embasamento técnico e científico, que estão aquém dos conhecimentos e habilidades
técnicas que o cuidador possui. Este deve assumir somente ações básicas de auxílio de vida
diários, ou seja, fornecer todos os cuidados não especializados para pacientes que não
podem cuidar de si mesmos (BELLEHUMEUR, 2007).
O único profissional habilitado a prestar cuidados integrais e técnicos aos
pacientes, incluindo a administração de medicamentos por via subcutânea, seria o
profissional de enfermagem regularmente inscrito no órgão de classe da categoria, o qual
exerce as atividades conforme a Lei do Exercício Profissional de Enfermagem,
regulamentada pelo Decreto n° 94.406/87 (BRASIL, 1986, 1987).

3. Da Conclusão

Ante o exposto acima, pondera-se por não concordar com a aplicação de Clexane®
por via subcutânea pelo cuidador em pacientes no domicílio, visto que é um procedimento

4
CONSELHO REGIONAL DE ENFERMAGEM DE SÃO PAULO

por via parenteral, que se não bem administrado poderá trazer riscos e complicações aos
pacientes, principalmente se estes forem portadores de mais de uma patologia
concomitantemente.
O procedimento deve ser assumido por profissionais de enfermagem, lembrando
que se realizados por Técnicos ou Auxiliares de Enfermagem, estes desenvolverão a ação
somente sob orientação, delegação e supervisão do Enfermeiro, de acordo com o artigo 15
da Lei n° 7.498/86 (BRASIL, 1986).

É o parecer.
São Paulo, 20 de agosto de 2012.
Membros da Câmara Técnica

Prof. Dr. Mauro Antonio Pires Dias da Silva Ms. Marcília R. C. Bonacordi Gonçalves
Enfermeiro Enfermeira
Presidente Conselheira
COREN-SP 5.866 COREN-SP 47.797

Profa. Dra. Carmen Maria Casquel Monti Juliani Prof. Dr. Paulo Cobellis Gomes
Enfermeira Enfermeiro
COREN-SP 44.306 COREN-SP 15.838

Profa. Dra. Consuelo Garcia Corrêa Ms. William Malagutti


Enfermeira Enfermeiro
COREN-SP 37.317 COREN-SP 36.580

Prof. Dr. João Batista de Freitas Alessandro Lopes Andrighetto


Enfermeiro Enfermeiro
COREN-SP 43.776 COREN-SP 73.104

Regiane Fernandes
Enfermeira e Fiscal
COREN-SP 68.316

5
CONSELHO REGIONAL DE ENFERMAGEM DE SÃO PAULO

Referências

BELLEHUMEUR, Cathy; et al. Home Care. Cuidados Domiciliares: Protocolos para a


Prática Clínica. Tradução de Ivan Lourenço Gomes. Revisão técnica de Christina
Aparecida Ribeiro e Marivan Santiago Abrahão. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2007.

BRASIL. Decreto nº 94.406, de 08 de junho de 1987. Regulamenta a Lei nº 7.498, de 25 de


junho de 1986, que dispõe sobre o exercício da Enfermagem, e dá outras providências.
Disponível em: <http://site.portalcofen.gov.br/node/4173>. Acesso em: 20 ago. 2012.

BRASIL. Lei nº 7.498, de 25 de junho de 1986. Dispõe sobre a regulamentação do


exercício da Enfermagem e dá outras providências. Disponível em:
<http://site.portalcofen.gov.br/node/4161>. Acesso em: 20 ago. 2012.

BRASIL. Ministério do Trabalho e Emprego. Portaria Ministerial nº 397, de 9 de outubro


de 2002. Classificação Brasileira de Ocupações. Disponível em:
<http://www.mtecbo.gov.br/cbosite/pages/pesquisas/BuscaPorTituloResultado.jsf>. Acesso
em: 15 ago. 2012.

BUENO, P. D. R. (Org.). Home care. O que o profissional de enfermagem precisa saber


sobre assistência domiciliar. São Paulo: Rideel, 2008.

ERDMANN, A. L. Sistemas de cuidados de enfermagem. Pelotas: Universitária/ UFPel;


1996.

GONÇALVES, L. I. T; ALVAREZ, A. M.; SANTOS, S. M. A. Cuidadores leigos de


pessoas idosas. In: Duarte L. A. O.; DIOGO, M. J. E. Atendimento Domiciliar: um
enfoque gerontológico. São Paulo: Atheneu; 2000.

6
CONSELHO REGIONAL DE ENFERMAGEM DE SÃO PAULO

MASCARENHAS, S. H. Z.; BARROS, A. C. T.; CARVALHO, S. J. C. Um olhar atento


sobre a prática do cuidador familiar. Rev. Min. Enferm., v. 10, n. 2, abr./jun. 2006. p. 132-
37. Disponível em:
<http://www.enf.ufmg.br/site_novo/modules/mastop_publish/files/files_4c1226cccbe9c.pdf
>. Acesso em: 22 ago. 2012.

RHODIA-FARMA. Bulário eletrônico. Clexane. Disponível em


<http://www.medicamentobrasil.com.br/produtos_descricao_bulario.asp?codigo_bulario=6
359>. Acesso em: 17 ago. 2012.

SANOFI-AVENTIS. Novo Estudo mostra que Clexane® (Enoxaparina sódica injetável) é


mais efetivo que a heparina não fracionada (HNF) para a prevenção do risco de
tromboembolismo venoso (TEV) em pacientes com acidente vascular cerebral isquêmico
agudo. 2006. Disponível em <http://www.sanofi.com.br/l/br/pt/layout.jsp?cnt=4627516E-
E8EA-471A-A3DA-BE58721C2B81&strSelectView=CONTENT-
NORMAL&strPageView=2>. Acesso em: 17 ago. 2012.

SENA, R. R. D.; SILVA, K. L.; RATES H. F.; VIVAS, K. L.; QUEIROZ, C. M.;
BARRETO, F. O. O Cotidiano da cuidadora no domicílio: desafios do bem fazer solitário.
Cogitare Enferm., v. 11, n. 2, maio/ago. 2006. Disponível em:
<http://www.google.com.br/url?sa=t&rct=j&q=O+Cotidiano+do+cuidador+no+domic%C3
%ADlio:+desafios+do+bem+fazer+solit%C3%A1rio&source=web&cd=1&ved=0CEUQFj
AA&url=http%3A%2F%2Fojs.c3sl.ufpr.br%2Fojs2%2Findex.php%2Fcogitare%2Farticle
%2Fdownload%2F6854%2F4868&ei=iwNBUJncEe-
M6QGD4YCwBg&usg=AFQjCNGEZGZD6i7m4DBRBs0wMOosNTgGxw>. Acesso em:
20 ago. 2012.
Aprovado na 802ª Reunião Plenária Ordinária.

Você também pode gostar