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A COMUNICAÇÃO PRÉVIA

Trabalho Escrito Final da Unidade Curricular de Direito do Urbanismo

Raquel Alexandra Bártolo Andrade


(nº 142722080)

Lisboa
Junho de 2023
Índice
1. Introdução.................................................................................................................. 3

2. Evolução histórica da figura da comunicação prévia ................................................ 3

2.1 Críticas ao antigo regime ........................................................................................ 4


2.2 A questão da terminologia ...................................................................................... 5
3. A “nova” figura da comunicação prévia ................................................................... 6

3.1 Comunicação prévia: viável? ................................................................................. 7


3.2 Constrangimentos associados à falta de controlo prévio ........................................ 8
4. Natureza do Procedimento de Comunicação Prévia ................................................. 9

5. Fiscalização de ilegalidades urbanísticas sobre a emissão do título da comunicação

prévia .............................................................................................................................. 10

6. Conclusão ................................................................................................................ 12

Bibliografia ..................................................................................................................... 13

2
1. Introdução

Desde a década de 80 do século passado, o Estado Português tem vindo a


implementar processos de desburocratização que visaram transferir outrora tarefas
públicas, para a esfera privada dos particulares – os quais assistiram ao aumento das suas
responsabilidades. Neste contexto, o legislador procurou adotar novos sistemas e
modalidades de controlo preventivo no que respeita à legalidade das atuações privadas.

Efetivamente, nas mui doutas palavras de João Miranda, tem-se observado que a
supracitada “migração de tarefas públicas para a esfera privada (privatização), o
fenómeno, menos sublinhado, de ativação e de reforço das responsabilidades próprias dos
particulares (…) desembocou naquilo a que alguns autores apelidaram de «Estado
magro» (schlanker Staat)”1.

Neste sentido, verificamos uma conjuntura que procura a “substituição do


tradicional princípio da autoridade pública por um princípio de auto-responsabilidade dos
administrados: em vez de mecanismos de controlo assentes em procedimentos de
autorização prévia dos poderes públicos, instituem-se formas de controlo preventivo da
responsabilidade dos próprios particulares interessados em desenvolver atividades que
apresentam algum potencial de perigo e cujo exercício se mantém, por isso mesmo,
condicionado e fora da esfera de livre disposição dos interessados”2.

De facto, na pretensa do legislador de simplificar os procedimentos de controlo


prévio urbanístico, o Decreto-Lei nº 136/2014 foi criado com o propósito de ser uma
autêntica comunicação prévia, embora agora se designe por “comunicação prévia com
prazo”. Vejamos.

2. Evolução histórica da figura da comunicação prévia

Primeiramente, a comunicação prévia era estimada enquanto um procedimento de


controlo aplicável às operações de impacto e importância diminuta que compreendia a
apresentação da comunicação prévia por parte do interessado que, na ausência de
pronúncia por parte da Administração Pública (doravante AP), era tido como sendo

1
Cfr. JOÃO MIRANDA, A Função Pública Urbanística e o seu Exercício por Particulares, Coimbra:
Coimbra Editora, 2012 cit., p. 448.
2
Cfr. PEDRO COSTA GONÇALVES, “Simplificação procedimental e controlo prévio das operações
urbanísticas”, in FERNANDO ALVES CORREIA (Coord.), I Jornadas Luso-Espanholas de Urbanismo
(Actas), Coimbra: Almedina, 2009, pp. 79 e 80.

3
“apenas um efeito permissivo, sem que fosse, por isso, praticado qualquer acto
administrativo, ainda que tácito ou silente”3.

No que respeita às operações urbanísticas que eram sujeitas a comunicação prévia,


estas abrangiam “(…) as obras de alteração no interior dos edifícios, não classificados,
ou suas frações desde que não implicassem modificações da estrutura resistente dos
edifícios das cérceas, das fachadas e da forma dos telhados e das obras de edificação e de
demolição, dispensadas de licença e/ou autorização, mediante previsão em regulamento
municipal, por se considerarem de escassa relevância urbanística”4.

No entanto, a Lei nº 60/2007, de 4 de Setembro promoveu uma Reforma


legislativa de que foi alvo o Regime jurídico da urbanização e edificação (doravante
RJUE). Este diploma, veio consagrar uma “comunicação prévia com prazo”, sendo que
era fixado um período temporal para que a AP utilizasse o seu “poder de veto” para se
opor no caso de não serem cumpridas as exigências legais aplicáveis in casu. Não sendo
apurada uma oposição, originar-se-ia um ato de admissão da pretensão do interessado ex
lege que lhe permitiria iniciar legalmente a sua atividade. Nesta perspetiva, ao ser aceite
a comunicação prévia, esta teria natureza de ato administrativo, não somente por motivos
de cariz formal pois era um resultado claro do disposto na epígrafe do art. 36.º-A, para
além da equiparação desta à figura da licença em diversos elementos normativos – sendo
a título de exemplo o seu regime de prorrogação (art. 53.º, n.º 3), validade da admissão
da comunicação prévia (arts. 67.º e 68.º), a caducidade e revogação (arts.71º e 73º) e da
renovação (art. 72º).

Ora, aquando da entrada em vigor do Decreto-Lei nº 26/2010, de 30 de Março,


assistiu-se a uma ampliação do escopo da comunicação prévia. Para além disso, no que
dizia respeito à tramitação dos procedimentos de gestão urbanística, a comunicação
prévia começou a ser tida como procedimento-regra (v. art. 4.º, n.º 4 deste diploma legal).

2.1 Críticas ao antigo regime


Tamanho enfoque nesta figura devia-se à busca pela simplificação procedimental,
mas será que o diploma legal cumpriu o seu desidrato? Ora, perfilhamos do entendimento
de FERNANDA PAULA OLIVEIRA quando defende que “a aplicação deste

3
cfr. FERNANDA PAULA OLIVEIRA, Direito do Urbanismo., cit., p.339
4
cfr. FERNANDA PAULA OLIVEIRA, et al., cit., p.339.)

4
procedimento nem sempre resultou clara e sem dificuldades para os interessados e para a
Administração”. Vejamos.

Efetivamente, o regime não permitia ao interessado ter uma certeza jurídica


quanto ao que seria decidido posteriormente pela AP sendo que acabava por “(…)
permanecer sempre a dúvida se a falta de rejeição dentro do prazo legal corresponde ou
não a uma apreciação favorável da pretensão urbanística, ou é antes, resultado de não ter
havido tempo (…) para a sua apreciação5”.

Para além disso, cumpre apontar que uma das grandes desvantagens deste regime
era o aumento das responsabilidades e custos iniciais para o interessado que teria de
liquidar as taxas, apresentar todos os projetos no início do processo, e ainda a totalidade
dos componentes referentes à realização da operação urbanística em apreço. Desta forma,
num panorama marcado pela crise financeira e imobiliária, esta figura não se torna
apetecível para o interessado, nem tampouco para os municípios que teriam uma carga de
trabalho acrescida devido ao encurtamento dos prazos para apreciação (v. arts. 53º, nº 1 e
57º, nº 1).

2.2 A questão da terminologia

Secundariamente, muitos na doutrina criticaram – e, a nosso ver, com razão de


facto – que, no que respeita à expressão utilizada pelo legislador no ora aprovado diploma
legal, isto é, a “comunicação prévia com prazo”, seria infeliz e desadequada.

Uma vez transposta a Diretiva de Serviços através do Decreto-Lei nº 92/2010, de


26 de Julho, o artigo 8.º, n.º 2, al. a) e b) regulou a destrinça entre: a mera comunicação
prévia, enquanto “uma declaração efetuada pelo prestador de serviços necessária ao início
da actividade, que permita o exercício da mesma imediatamente após a sua comunicação
à autoridade administrativa”; e, por outro lado, a comunicação prévia com prazo como
sendo “uma declaração efectuada pelo prestador de serviços necessária ao início da
actividade, que permita o exercício da mesma quando a autoridade administrativa não se
pronuncie após o decurso de um determinado prazo”;

5
CARLOS JOSÉ BATALHÃO, «A comunicação prévia: do modelo teórico à experiência autárquica», in
DRL, Nº 16, Abril/Junho, 2011, p.68.

5
Em suma, na letra do regime anterior, designava-se de “comunicação prévia” a
um sistema que, verdadeiramente, corresponde a uma “comunicação prévia com prazo”;
ao passo que, no novo regime, passou a intitular-se de “comunicação prévia com prazo”
um procedimento que é uma “mera comunicação prévia”, sendo que não existe controlo
material prévio da operação urbanística em causa.

No entanto, importa mencionar que, no que diz respeito aos ordenamentos


jurídico-urbanísticos estrangeiros, verificamos que o legislador italiano, o francês, o
espanhol, e também, embora em pequena medida, o alemão, têm procurado estabelecer
uma maior simplificação nestes assuntos, servindo-se de sistemas que em muito se
aproximam da nossa figura nacional da “comunicação prévia com prazo”, instituída pelo
RJUE anterior.

3. A “nova” figura da comunicação prévia

O Decreto-Lei nº 136/2014 veio implementar variadas alterações ao controlo prévio


das operações urbanísticas, especialmente no que respeita à comunicação prévia o que,
inevitavelmente manteve e suscitou algumas críticas a esta figura.

Nas palavras de LUCIANO MARCOS6, a “nova natureza da comunicação prévia –


sem controlo prévio, ou seja, dispensando a prática de quaisquer atos permissivos.
Materializa não o princípio da Lei de Bases citado no Preâmbulo do Decreto-Lei n.º
136/2014, de 9 de setembro, ao invés, um princípio da mesma lei que prevê a isenção de
controlo prévio quando a «salvaguarda dos interesses públicos em causa seja compatível
com a existência de um mero controlo sucessivo (…) desde que as condições de
realização sejam suficientemente definidas em plano municipal», no entanto, não
obedecendo aos seus pressupostos”.

O procedimento de comunicação prévia tem início com a apresentação da


comunicação, a ser dirigida ao presidente da câmara municipal, por intermédio da
plataforma eletrónica7 mencionada do art. 8.º-A n.º 1 do RJUE, com os componentes

6
Cit. in A revisão do RJUE aprovada pelo Decreto-Lei n.º 136/2014, de 9 de novembro – uma reforma
(des)necessária?, pp. 32-33).
7
As operações urbanísticas alvo de comunicação prévia são diariamente facultadas na plataforma eletrónica
mencionada no art. 8.º-A, n.º 1 que profere o comprovativo eletrónico da sua apresentação (art. 35.º n.º 5 e
art. 9.º n.º 6 do RJUE).

6
referidos no artigo 9.º n.ºs 1 e 2 do RJUE, conjuntamente dos componentes instrutórios
previstos pela Portaria n.º 113/2015 de 22 de abril, em que conste o termo de
responsabilidade subscrito pelo técnico legalmente habilitado que certifique a
observância das leis e regulamentos aplicáveis (artigo 35.º n.ºs 1 e 4 do RJUE).

A comunicação prévia é uma declaração que possibilita ao interessado atuar


prontamente à execução de certas operações urbanísticas sem haver necessidade de outros
atos permissivos (art. 34.º n.º 2 do RJUE), após o pagamento das devidas taxas ser feito
por autoliquidação. Todavia, este resultado só se irá verificar caso a comunicação não
seja, dentro de determinado prazo, rejeitada por questões de cariz formal e processual.

Conforme o art. 4.º, n.º 4 RJUE, “As operações urbanísticas agora sujeitas a
comunicação prévia são as seguintes: a) as obras de reconstrução das quais não resulte
um aumento da altura da fachada ou do número de pisos; b) as obras de urbanização e os
trabalhos de remodelação de terrenos em área abrangida por operação de loteamento; c)
as obras de construção, de alteração ou de ampliação em área abrangida por operação de
loteamento ou plano de pormenor; d) as obras de construção, de alteração ou de ampliação
em zona urbana consolidada que respeitem os planos municipais ou intermunicipais e das
quais não resulte edificação com cércea superior à altura mais frequente das fachadas da
frente edificada do lado do arruamento onde se integra a nova edificação, no troço de rua
compreendido entre as duas transversais mais próximas, para um e para outro lado; e) a
edificação de piscinas associadas a edificação principal; f) as operações urbanísticas
precedidas de informação prévia favorável, nos termos dos nºs 2 e 3 do artigo 14º; i) As
obras resultantes de uma intimação da câmara municipal, nos termos previsto no artigo
90.º-A.”

3.1 Comunicação prévia: viável?

Cumpre apreciar que, apesar dos particulares pouparem tempo, pelo menos à
partida, com o surgimento da comunicação prévia em face à desnecessidade de controlo
prévio, muitos autores vêm tal benesse como um verdadeiro presente envenenado pois
irá, por outro lado, sobrecarregar os interessados com a preparação minuciosa do
procedimento, com atenção a um alargamento dos custos envolvidos. Afinal, nas
situações em que haja incertezas sobre determinados elementos urbanísticos suscetíveis

7
a serem arguidos pelos serviços municipais (ou, igualmente, terceiros interessados) a
posteriori – tal conduzirá ao pagamento de coimas avultadas em valor.

Neste contexto de incerteza e receio do pagamento de coimas, é compreensível


que os particulares, quando deparados com a figura de comunicação prévia ou pedido de
informação prévia ou, ainda, o processo de licenciamento; irão escolher os dois últimos
em prejuízo do primeiro.

Ora, justamente, embora o regime-regra seja atualmente o da comunicação prévia,


dado os seus constrangimentos, e a possibilidade – dada pelo legislador – do particular
eleger o pedido de licença urbanística – tendo esta, então, maior procura – será
discordante com o intuito de simplificação do legislador, culminando com uma maior
burocratização do processo.

3.2 Constrangimentos associados à falta de controlo prévio

Está subjacente ao Regime, o intuito de simplificação almejado pelo legislador, a


minoração dos diversos custos referentes ao controlo da atividade de urbanização e
edificação, será que a figura da comunicação prévia cumpre este propósito? Vejamos.

Verdadeiramente, é ponto assente que uma vez que quase que se extingue o
controlo prévio a ser realizado por parte dos municípios, há uma redução dos custos quer
para a Administração – responsáveis pelo controlo preventivo – quer para os particulares
que não terão de pagar taxas urbanísticas para a admissão da sua comunicação prévia.

No entanto, nem tudo é tão ameno, sendo verificável o aumento de uma sucessão
de outros tantos custos para a Administração e para os próprios particulares.

Primeiramente, se à priori se reduzem os custos, tal representa um aumento destes


quando o processo for sujeito a um controlo a posteriori a ser realizado pela
Administração. Neste contexto, cumpre recordar que, embora se preze uma relativa
emancipação quando se prevê que certas tarefas recaiam sobre os particulares, isto não
pode representar uma deserção do controlo público sobre a legalidade urbanística
alicerçada em bens jurídicos jusfundamentais, o que acarretará o aumento dos recursos
materiais e humanos empregues a este assunto.

Por outro lado, quando se encoraja o desempenho de tarefas e funções pelos


particulares, tal poderá significar um aumento dos encargos para estes a fim que se

8
possam munir das condições necessárias à prossecução da operação urbanística em mãos.
Com isto, temos em mente as responsabilidades autónomas relativas à contratação de uma
panóplia de técnicos especializados que realizem a completa instrução do processo; a
autoliquidação das respetivas taxas; determinar quais são os componentes pertinentes à
comunicação prévia e sua execução; atentar aos critérios legais e regulamentares em vigor
aplicáveis ao projeto, entre outras.

Com efeito, será que podemos falar de um regime simplificado quando, na prática,
os particulares têm – ao invés da Administração – de permanentemente se dirigir a uma
panóplia distinta de entidades públicas para adquirirem, por exemplo, todos os pareceres
legalmente exigidos? Não. Ademais, poderemos admitir que exista uma verdadeira
redução dos custos financeiros, quando a autonomia dos particulares acarreta, muitas
vezes, ao pagamento de coimas avultadas no âmbito de processos contra-ordenacionais,
que não teriam lugar caso existisse controlo prévio? Nem tampouco.

Além disso, JOÃO MIRANDA também menciona um outro problema que “ainda
que se trate de matérias técnicas, os peritos (técnicos privados) são chamados a controlar
e a certificar a legalidade das acções do promotor, sem que para tanto estejam sempre
habilitados da necessária formação jurídica ou sejam auxiliados por quem a detenha”8.
Inevitavelmente, tal realidade, resulta numa sobrecarga a recair sobre os técnicos que
assistem os particulares interessados na operação urbanística.

4. Natureza do Procedimento de Comunicação Prévia

É controvertida a questão relativa à natureza da comunicação prévia.

Ora, pode ser argumentado que a comunicação prévia não é um procedimento de


controlo prévio visto que neste não está conjeturada a prática de atos permissivos9 da
execução da operação urbanística, em contraste com o que sucede nos procedimentos de
licenciamento ou nos de autorização.

8
JOÃO MIRANDA, A Função Pública Urbanística e o seu Exercício por Particulares, Coimbra: Coimbra
Editora, 2012, cit., p. 511.
9
Atos permissivos são, segundo DIOGO FREITAS DO AMARAL, os atos administrativos “que
possibilitam a alguém a adoção de uma conduta ou a omissão de um comportamento que, de outro modo,
lhe estaria vedado” – Curso de Direito Administrativo, Vol. II, Almedina, 2009, p. 256.

9
Em contrapartida, é defensável que, uma vez que a execução das operações
urbanísticas está sujeita a comunicação prévia, a sua prossecução está subordinada a um
controlo formal prévio. Destarte, aqui se alicerça o entendimento de que este é um
procedimento de controlo prévio, mesmo que de natureza tão-somente formal.

Seja como for, este último é o entendimento perfilhado pelo legislador que qualifica
o procedimento de comunicação prévia como um procedimento de controlo prévio, no
entanto, é de enfatizar que, de acordo com o Preâmbulo do Decreto-Lei n.º 136/2014, este
é um “controlo prévio de natureza meramente formal”.

Com efeito, o RJUE, com as suas mais recentes alterações constantes no Decreto-Lei
n.º 136/2014, de 9 de setembro, não só não julga as operações urbanísticas sujeitas a
comunicação prévia como estão eximes de controlo prévio como se antecipa a sujeição
ao procedimento regulado pela subsecção V, da secção II do diploma.

Ora, no caso de se verificarem ilegalidades ou infrações de cariz formal ou processual,


tal pode levar à aplicação de um ato de rejeição liminar ou, ainda, no seguimento de
despacho de aperfeiçoamento, quando não são corrigidas irregularidades ou completadas
as devidas comunicações, tal desembocará na impraticabilidade da realização da operação
urbanística em causa.

5. Fiscalização de ilegalidades urbanísticas sobre a emissão do título da


comunicação prévia

Podemos enumerar cinco hipóteses a partir daquelas que são as tipologias de


ilegalidades e infrações urbanísticas que resultam do artigo 102.º n.º 1:

“(i) a realização de operações urbanísticas sem necessários atos de controlo prévio


(licença ou autorização de utilização), traduzindo uma carência de ato permissivo para
operações urbanísticas que o exijam;

(ii) a realização de operações urbanísticas em desconformidade com atos de controlo


prévio, correspondendo a uma infração das condições do ato administrativo pela operação
urbanística;

(iii) a realização de operações urbanísticas tituladas por ato revogado, anulado ou


declarado nulo, equivalendo à falta de efeito jurídico titulador do ato de operações
urbanísticas que o exijam;

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(iv) a realização de operações urbanísticas em desconformidade com o conteúdo da
comunicação prévia, traduzindo uma violação das normas que prescrevem uma
consistência entre, de um lado, a operação comunicada e respetivos documentos
instrutórios e, do outro, a operação realizada (artigos 4º, nº 4 e 32º nºs 2 e 4) e;

(v) a realização de operações urbanísticas em desconformidade com as normas legais


ou regulamentares aplicáveis, correspondendo a uma infração normativa pela operação
urbanística”.

Ora, justamente, a utilidade da fiscalização, concomitantemente com as medidas de


reposição da legalidade, é limitada pelo prazo de dez anos para a declaração de nulidade,
estabelecido no artigo 69.º quando se trata de ações de controlo prévio. Para confrontar,
o n.º 9.º do artigo 35.º determina que o dever de fiscalização da legalidade de operações
sujeitas a comunicação prévia caduca dez anos após a data de emissão do respetivo título.

Do artigo 35º nº 9 não se poderá extrair que, vencido o prazo de 10 anos sobre a
emissão do título da comunicação prévia, quaisquer operações urbanísticas a esta sujeitas
ficam verdadeiramente isentas de fiscalização ou das medidas de reposição da legalidade
articuladas. Verdadeiramente, a rácio da norma expressa na letra da lei é que, uma vez
caducada a obrigação, resta apenas uma autorização do órgão competente para dispor das
ações de fiscalização pelos respetivos funcionários municipais (cfr. artigo 94º, nº 1). No
entanto, estes não terão de ordenar oficiosamente tais ações de fiscalização por passagem
do período-limite, ao invés, terão de praticar a discricionariedade decorrente da decisão
de as ordenar, especialmente quando estas são requeridas por terceiros interessados.

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6. Conclusão

O novo regime da comunicação prévia nasceu alicerçado em diversas promessas,


propósitos e desejos de simplificação, desburocratização do legislador. No entanto,
verificamos que, em muitos casos, tal não foi alcançado, ficando esta figura aquém das
espectativas e, noutros aspetos, vindo mesmo trazer uma maior sobrecarga.

Verdadeiramente, ao deixar de existir um controlo prévio na maioria das operações


urbanísticas, tal acarreta inevitáveis dificuldades para os particulares interessados em
realizar determinada operação urbanística, muitas vezes culminando em evitáveis coimas
para estes e, por outro lado, acaba por a posteriori apresentar custos para a Administração.

Julgamos pertinente, ainda, referir que o novo regime não veio acompanhado de
quaisquer estudos demonstrativos quanto a saber se a “antiga” comunicação prévia teve
efeitos positivos ou negativos para a regulamentação urbanística nacional. Não é
justificado, empiricamente, a necessidade efetiva da adoção da nova solução.

Ora, justamente, a prática municipal enfrenta dificuldades decorrentes do novo regime da


comunicação prévia que, sem surpresa, cairá progressivamente em desuso e conferirá
maior popularidade à escolha pelo processo de licenciamento.

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Bibliografia

• AMARAL, DIOGO FREITAS DO, – Curso de Direito Administrativo, Vol. II,


Almedina, 2009.

• BATALHÃO, CARLOS JOSÉ, “A comunicação prévia: do modelo teórico à


experiência autárquica”, in DRL, Nº 16, Abril/Junho, 2011.

• MARCOS, LUCIANO – “A revisão do RJUE aprovada pelo Decreto-Lei n.º


136/2014, de 9 de novembro – uma reforma (des)necessária?”

• MATOS, ISABEL ABALADA, “O novo procedimento de comunicação prévia”,


in: Cláudio Monteiro, Jaime Valle, João Miranda, Revisão do Regime Jurídico da
Urbanização e Edificação, Coimbra

• MIRANDA, JOÃO – “A Função Pública Urbanística e o seu Exercício por


Particulares”, Coimbra: Coimbra Editora, 2012

• OLIVEIRA, FERNANDA PAULA – “Direito do Urbanismo”, Almedina

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