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SÉRIE OFTALM O LOGIA BRASILEIRA

C O N S E L H O B R A S I L E I R O DE O F T A L M O L O G I A

3a Edição

Coordenador
MILTON RUIZ ALVES

SEMIOLOGIA BASICA
EM OFTALMOLOGIA

C A R L O S A U G U S T O M O REIRA

CONSELHO BRASILEIRO IE0FTAW0L061A


CONSELHO BRASILEIRO DE OFTALMOLOGIA

SERIE
OFTALMOLOGIA BRASILEIRA

3a Edição

SEMIOLOGIA BÁSICA EM OFTALMOLOGIA

2013-2014
CONSELHO BRASILEIRO DE OFTALMOLOGIA

SERIE
OFTALMOLOGIA BRASILEIRA

3a Edição

SEMIOLOGIA BASICA EM OFTALMOLOGIA

2013-2014
SÉRIE
OFTALMOLOGIA BRASILEIRA
Conselho Brasileiro de Oftalmologia - CBO

SEMIOLOGIA BÁSICA EM OFTALMOLOGIA

EDITOR

Carlos Augusto Moreira

Professor Titular de Oftalmologia da Universidade Federal do Paraná, PR


Professor Titular da Faculdade Evangélica de Medicina do Paraná, PR
Professor Doutor e Livre-Docente da Faculdade de Medicina da Universidade Federal do
Paraná, PR
Membro da Academia Paranaense de Medicina, PR

COORDENADOR
Milton Ruiz Alves

m
GUANABARA
KOOGAN
C u ltu ra Médica®
Rio de Janeiro - RJ - Brazil

V
CIP-BRASIL. CATALOGAÇAO NA PUBLICAÇÃO
SINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS, RJ

S474
3. ed.

Semiologia básica em oftalmologia / Carlos Augusto Moreira ; coordenação Milton Ruiz


Alves. - 3. ed. - Rio de Janeiro : Cultura Médica : Guanabara Koogan, 2013.
II. (Oftalmologia Brasileira)

Inclui bibliografia e índice


ISBN 978-85-7006-570-4

1. Oftalmologia. 2. Semiologia (Medicina). I. Moreira, Carlos Augusto. II. Alves,


Milton Ruiz.

13-02605 CDD: 617.7


CDU: 617.7

© Copyright 2013 Cultura Médica®

Esta obra está protegida pela Lei n° 9.610 dos Direitos Autorais, de 19 de fevereiro de 1998, sanciona­
da e publicada no Diário Oficial da União em 20 de fevereiro de 1998.
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Site: www.culturamedica.com.br
e-mail: cultura@culturamedica.com.br

VI
Colaboradores

Ana Tereza Ramos Moreira Marcelo Luiz Gehlen


Cinara S. de Oliveira Godoy Mário Luiz Ribeiro Monteiro
Daniel Wasilewski Mário Teruo Sato
Fábio Eduardo Eberhardt Alves Otávio Siqueira Bisneto
Fernando dos Reis Spada Rodrigo Beraldi Kormann
Glaucio de Godoy Rogério João de Almeida Torres
Jayme Arana Rommel Josué Zago
Kenji Sakata Saly Moreira
Lisandro Sakata Sâmia Ali Wahab
Luciane Bugmann Moreira

VII
Apresentação

Quando do lançamento da Serie Oftalmologia Brasileira, o Professor Hamilton Moreira, entào


presidente do CBO, inicia o seu prefácio da seguinte maneira: sào acima de 6000 páginas, es­
critas por mais de 400 professores. É a maior obra da maior instituição oftalmológica brasilei­
ra: o Conselho Brasileiro de Oftalmologia.
A concretização da Série Oftalmologia Brasileira representa a continuidade de um traba­
lho, um marco, a realização de um sonho.
Com o pensamento voltado na defesa desse sonho que, tenho certeza, é compartilhado
pela maioria dos oftalmologistas brasileiros, estamos dando início a uma revisão dos livros
que compõem a série. Além das atualizações e correções, resolvemos repaginá-los, dando-lhes
uma nova roupagem, melhorando sua edição, de maneira a tornar sua leitura a mais prazerosa
possível.
Defender, preservar e aperfeiçoar a cultura brasileira, aqui representada pelo que achamos
de essencial na formação dos nossos Oftalmologistas, é responsabilidade e dever maior do
Conselho Brasileiro de Oftalmologia.
O conhecimento é a base de nossa soberania, e cultuar e difundir o que temos de melhor
é a nossa obrigação.
O Conselho Brasileiro de Oftalmologia se sente orgulhoso por poder oferecer aos nossos
residentes o que achamos essencial em sua formação.
Sabemos que ainda existirão erros e correções serão sempre necessárias, mas também
temos consciência de que todos os autores fizeram o melhor que puderam.
Uma boa leitura a todos.

Marco Antônio Rey de Faria


Presidente do CBO

IX
Agradecimentos

O projeto de atualização e impressão desta terceira edição da “Série Oftalmologia Brasileira”


contou, novamente, com a parceria privilegiada estabelecida pelo Conselho Brasileiro de Oftal­
mologia com importantes empresas do segmento oftálmico estabelecidas no Brasil.
Aos autores e colaboradores, responsáveis pela excelente qualidade desta obra, nossos
mais profundos agradecimentos pela ampla revisão e atualização do conteúdo e, sobretudo,
pelo resultado conseguido que a mantém em lugar de destaque entre as mais importantes
publicações de Oftalmologia do mundo.
Aos presidentes, diretores e demais funcionários da Alcon, Genom, Johnson & Johnson e
Varilux nossos sinceros reconhecimentos pela forma preferencial com que investiram neste
projeto, contribuindo de modo efetivo não só para a divulgação do conhecimento, mas, tam­
bém, para a valorização da Oftalmologia e daqueles que a praticam.
Aos jovens oftalmologistas, oferecemos esta terceira edição da “Série Oftalmologia Bra­
sileira” , importante fonte de transmissão de conhecimentos, esperando que possa contribuir
tanto para a formação básica quanto para a educação continuada. Sintam orgulho desta obra,
boa leitura!

Milton Ruiz Alves


Coordenador da Série Oftalmologia Brasileira

A lco rí
a Novartis company GOE N O M
FTALM O LO GIA

u m a Le n te C s s iL o r I C s s iL o r

XI
Agradeço às duas mulheres de minha vida, Saly, minha esposa, minha incentivadora e Luciane,
dedicada orientadora na composição deste livro.
Meus agradecimentos a todos os colaboradores e a Senhora Kely Bertholdo, incansável
digitadora e hábil conhecedora de computação, por sua atenção.
O Editor

XII
Prólogo

Consideramos neste livro os exames oftalmológicos possíveis de realizar em um consultório


básico de oftalmologia.
Imaginamos esses consultórios aparelhados com instrumental indispensável, podendo ser
utilizados em uma consulta oftalmológica e com preço de compra dentro das possibilidades
de um oftalmologista iniciante.
Indicamos, também, a possibilidade e a necessidade eventual de exames mais sofistica­
dos, e que nesses casos seria indispensável o auxílio de centros capacitados para tal fim.
Acreditamos firmemente que o diagnóstico da imensa maioria das doenças oculares pode
ser feito desta forma, prescindindo grandes despesas, por vezes impostas aos nossos pacien­
tes, com inúmeros e dispendiosos exames complementares, nem sempre indispensáveis.
Pensamos que os consultórios oftalmológicos pessoais são a cabeça e o império dos pro­
fissionais médicos da especialidade, e que a inteligência, o exame acurado, a conversa inicial
e a final com o paciente são de suma importância.
Sem depreciar os “centros diagnósticos” desejamos resgatar a consulta oftalmológica e
mostrar, principalmente aos nossos residentes, o valor dos exames e dos diagnósticos feitos
em consultório, inclusive, e principalmente, àqueles oftalmologistas que estão afastados dos
grandes centros.
Lembramos que o cérebro, as mãos e os olhos dos médicos oftalmologistas são os princi­
pais instrumentos para o diagnóstico, mas é o conhecimento da especialidade e da medicina,
incomparável mestre a nos orientar.

Carlos Augusto Moreira

XIII
Sumário

1 O Consultório Básico de Oftalmologia e Anam nese.............................................................................1


Carlos Augusto Moreira

2 Avaliação da Visào C e n tra l................................................................................................................................29


Otávio Siqueira Bisneto

3 Semiologia Básica da Visào Periférica e Campimetria....................................................................... 51


Mário Tento Sato

4 Biomicroscopia Básica em Oftalm ologia................................................................................................... 69


Fernando dos Reis Spada

5 Semiologia da Pupila..............................................................................................................................................91
Mário Temo Sato

6 Oftalmoscopia Básica em O ftalm ologia.................................................................................................105


Rommel Josué Zago • Fábio Eduardo Eberhardt Alves

7 Tonometria 123
Rogério Joào de Almeida Torres

8 Périmétria Com putadorizada....................................................................................................................... 131


Rogério Joào de Almeida Torres

XV
9 Semiologia Básica das Pálpebras, Vias Lacrimais e Órbitas...................................................... 147
Rodrigo Beraldi Kormann

10 Semiologia Básica da Conjuntiva.............................................................................................................171


Daniel Wasilewski • Sâmia Ali Wahab

11 Semiologia Básica da C ó rn e a .................................................................................................................. 181


Glaucio de Godoy • Cinara S. de Oliveira Godoy

12 Semiologia do Filme Lacrimal.................................................................................................................. 195


Luciane Bugmann Moreira

13 Semiologia Básica do Cristalino.............................................................................................................209


Cinara S. de Oliveira Godoy • Carlos Augusto Moreira

14 Semiologia Básica da Úvea e Esclera.................................................................................................... 223


Marcelo Luiz Gehlen

15 Semiologia Básica da Retina.....................................................................................................................237


Fábio Eduardo Eberhardt Alves • Rommel Josué Zago

16 Semiologia Básica do Glaucom a.............................................................................................................249


Kenji Sakata • Lisandro Sakata

17 Semiologia Básica do Estrabismo..........................................................................................................271


Ana Tereza Ramos Moreira

18 Semiologia Básica em Oftalmopediatria............................................................................................ 285


Carlos Augusto Moreira

19 Semiologia Básica em Neuroftalmologia............................................................................................ 297


Mário Luiz Ribeiro Monteiro

20 Semiologia do Candidato ao Uso de Lentes de Contato............................................................313


Luciane Bugmann Moreira • Saly Moreira

21 Quando os Exames Complementares são Indispensáveis......................................................... 323


Jayme Arana

índice Alfabético............................................................................................................................................. 355

XVI
O Consultório Básico de
Oftalmologia e Anamnese

CARLOS AUGUSTO MOREIRA

O CONSULTÓRIO BÁSICO DE OFTALMOLOGIA


Uma sala que comporte com comodidade:
1. Uma mesa com cadeiras para o oftalmologista e para o paciente e acompanhante com ilu­
minação suficiente para visualização do paciente por inteiro
2. Um equipo de refração composto de cadeira, coluna, refratômetro de Greens com varetas
de madox, forômetro, cilindros cruzados, projetor de optótipos e retinoscópio.
3. Lanterna para exame externo dos olhos, pálpebras, movimentos oculares, aparência e fá­
cies do paciente e sensibilidade à luz. Pesquisar reflexos pupilares
4. Oftalmoscópio direto e binocular com as respectivas lentes
5. Lâmpada de fenda com tonômetro de aplanação e lentes acessórias para gonioscopia e
exame da retina
6. Caixa de lentes e armação de prova
7. Caixa de prismas
8. Tabela pseudoisocromática de Ishihara
9. Tela de Amsler
10. Régua para medir a distância interpupilar
11. Pá de cover para exame de forias e tropias
12. Ponto de luz para fixação à distância
13. Ceratômetro
M.Lensômetro
15. Eventuais

1
2 Semiologia Básica em Oftalmologia

16. Campímetro de Goldman ou Humphrey’s


17. Colírios
• Anestésico
• Midriáticos:
- Atropina
- Ciclopentolato (cicloplégico)
- Tropicamida (mydracyl)
• Miótico
- Pilocarpina a 2%
• Colírio
■ Metilcelulose
■ Corantes:
• Fluoresceína (bastonete)
• Rosa-bengala (bastonete)
■ Instrumental:
• Blefarostato
• Lanceta para corpo estranho
• Pinça para cílio
■ Material de curativos
• Algodão
• Gaze
• Micropore
• Cotonetes
• Monóculo

Observação: caso pratique uma subespecialidade, obter aparelhos necessários ao seu de­
sempenho em maior profundidade.

ANAMNESE
A Oftalmologia sempre teve o conceito de especialidade objetiva e onde há pouca necessidade
de ouvir.
Entretanto, não nos parece correto difundir a ideia de que pouco ou quase nada podemos
obter da anamnese. Pelo contrário, é a anamnese um dos pontos principais do exame oftal­
mológico. Durante a anamnese é que o médico tem a oportunidade de conhecer seu paciente,
tornar-se seu amigo e solidário para sua cura, tentar desvendar os caminhos para o diagnósti­
co. Fazer dele seu colaborador nos exames que seguem e cumpridor das indicações do trata­
mento prescrito. Devemos ouvir muito e perguntar o necessário. São informações, por vezes
preciosas, que trazem orientação para o diagnóstico e um exame objetivo mais profundo dos
setores envolvidos, levando a um tratamento mais adequado que pode inclusive envolver doen­
ças sistêmicas.
Acreditamos, também, que no mesmo momento em que conversamos com o paciente
este deverá estar sendo observado como um todo, em sua postura, fácies, motilidade e posi-
O Consultório Básico de Oftalmologia e Anamnese 3

ção dos olhos, edemas, lesões na face, enfim, lembrando que a Oftalmologia é parte da me­
dicina e que até problemas psíquicos podem ser parte da doença ocular e que somente no
momento em que se inicia a consulta podem ser observados e inquiridos, conseguindo ganhar
a confiança dos pacientes.
Em verdade não existe uma anamnese-padrão. Varia com a própria doença, a personalida­
de, cultura e amizade com o médico. Gostaríamos de citar alguns itens que julgamos impor­
tantes e devem ser lembrados:

Identificação e dados gerais do paciente


Nome
Sexo
Idade
Raça
Profissão
Local de nascimento
Residência atual
Encaminhamento
Endereço e contato - Telefone

Na identificação existem dados importantes para orientar o diagnóstico. Doenças pre-


valentes em um dos sexos, grupos etários, doenças endêmicas em certas regiões podem ser
elementos necessários para o diagnóstico.

Profissão
As exigências profissionais são muito variadas e podem exigir capacidade visual perfeita ou mes­
mo pouca visão. Certas doenças desde o início podem ter prognóstico visual inferior às necessi­
dades do paciente, e com muito cuidado devemos evitar choques emocionais e psíquicos, entre­
tanto, o paciente deverá ser informado para poder tomar providências adequadas e em tempo
para superar suas dificuldades. Com certa frequência poderá haver readaptação profissional ou
evitar-se a escolha de uma atividade incompatível com suas possibilidades visuais.

Encaminhamento
Na ficha do paciente deve estar mencionado o médico, instituição ou pessoa que o encami­
nhou, para que o oftalmologista possa retornar informações e dar facilidade para o possível
retorno, dando continuidade ao tratamento. Instituições devem conhecer a gravidade, tempo
de afastamento e necessidade de encaminhamento para a previdência, por solicitação ou au­
torização do paciente.

Queixa principal
Deve estar em destaque, pois o doente deseja a solução do que ele acredita ser seu principal
problema. A informação sobre a origem, o tratamento e sua solução traz muita satisfação ao
4 Semiologia Básica em Oftalmologia

paciente e este passará a ter maior confiança no médico. O que pode parecer perda de tempo
abrirá um caminho mais fácil para ambos.

Outros sintomas oculares e sistêmicos


Frequentemente são indispensáveis para estabelecer um diagnóstico preciso. As síndromes,
especialmente as neurológicas, têm um conjunto de sintomas e dados para seu diagnóstico e
orientação da possível solução.
Colocamos um simples exemplo: A enxaqueca, que somente será diagnosticada por seus
sintomas subjetivos característicos. O papel hereditário de uma doença que esconde dados
objetivos, somente suas características subjetivas trarão o diagnóstico e o tratamento de uma
enfermidade que traz muito sofrimento.

Início e evolução
São informações preciosas para o diagnóstico de enfermidades muito parecidas, como as neu-
ropatias ópticas, glaucomas secundários, tipos de estrabismo e que têm tratamento e prog­
nóstico diferente. Certas enfermidades têm necessidade de tratamento de urgência e algumas
doenças podem levar a importante redução visual.

Consultas anteriores
r

E informação que deve ser avaliada. Tratamentos efetuados e cirurgias realizadas, devem ser
do nosso conhecimento. Avaliar fracassos e seus motivos.

Medicação que está usando ou que já usou


A lista de medicamentos e sua efetividade pode ser longa mas é muito importante. Lembre­
mos o diabetes e seu controle tão importante para o tratamento clínico da retinopatia diabé­
tica. Os corticoides que estão sendo usados em doenças imunológicas devem ser conhecidos.
Os vários colírios, que vêm sendo usados com suas eventuais indicações e contraindicações,
devem ser conhecidos. Isso somente para citar alguns elementos e nos dar a ideia da impor­
tância deste item.

Dados genéticos e familiares


A influência hereditária é extensa em oftalmologia. Os grupos de risco podem ser funda­
mentais na avaliação de certas enfermidades. Basta citar o glaucoma, estrabismo, vícios de
refração, degenerações de retina e muitos outros para nos convencermos de sua importân­
cia. Hoje, com maior informação e a Internet à disposição devemos estar conscientes que os
pacientes podem conhecer muito de sua enfermidade e nos demonstrar que devemos ter o
conhecimento e a clareza para agregar esses elementos às nossas conclusões.
O Consultório Básico de Oftalmologia e Anamnese 5

Condições de vida (profissional e lazer)


O lazer e certas profissões podem expor ao traumatismo ocular e outros sintomas que tra­
zem com frequência à consulta. O tipo de correção óptica indicado para diferentes pacientes
deve estar bem definido na hora da prescrição de óculos ou outro tipo de terapêutica. Como
exemplo citaremos o olho seco que piora com o uso de ar-condicionado e outras atividades
frequentes na vida atual. Hábitos de higiene e condições de infecção ocular devem ser levan­
tados. Teríamos centenas de observações a fazer, entretanto, o bom censo pode nos ajudar.

A anamnese deve ser orientada?


Por vezes encontramos pacientes que não nos dão informações absolutamente necessárias,
portanto, até certa forma e quando necessário, devemos perguntar e esclarecer pontos duvi­
dosos. Outros são prolixos e devemos orientá-los a informar o que é realmente importante.
Em conclusão: a anamnese é baseada no bom senso e conhecimento oftalmológico do
médico. Pode ser, também, um exercício de paciência do profissional, forma indispensável no
atendimento de nossos pacientes.

EXAME DAS VIAS ÓPTICAS


Alterações visuais
O exame neuroftalmológico é bastante amplo e conforme os sintomas levantados durante a
anamnese podemos nos orientar para avaliar as vias ópticas que quando lesionadas produzem
alterações visuais. Elas carream o influxo nervoso criado na retina pelos fotorreceptores que
são conduzidos pelos nervos ópticos, quiasma, bandeletas ópticas, corpo geniculado lateral,
irradiações ópticas, até o córtex visual ocipital.
O conhecimento da anatomia de cada uma dessas estruturas e suas funções contribui em
muito para avaliarmos sua atividade e a agressão a este sistema neurológico e as possíveis
causas lesivas.
Necessitamos, entretanto, avaliar com atenção o globo ocular, pois alterações da córnea,
câmara anterior, cristalino, corpo vítreo, retina, úvea, esclera, glaucoma, alterações refrativas,
estrabismos e ambliopias podem ser causa de transtornos visuais e devem ser afastadas para,
então, lançarmos vista para as vias ópticas que necessitam ser pesquisadas como local da lesão
que produz, com certa frequência, problemas visuais.
Inicialmente lembramos que essas estruturas se dividem em pré e pós-quiasmáticas. As
pré-quiasmativas (disco óptico e nervo óptico) (NO) quando lesionadas em um dos lados vão
se traduzir em alterações visuais em um só olho, como, por exemplo, as neurites ópticas, as
neuropatias ópticas isquêmicas, os traumas na região frontal lesionando o NO em seu trajeto
no canal óptico orbitário, nos processos compressivos orbitários e outros menos frequentes.
Para a visão ser comprometida em ambos olhos a lesão tem que existir nos dois lados.
6 | Semiologia Básica em Oftalmologia

Quando a lesão é quiasmática, local onde há a junção das fibras do setor medial dos dois
NO, a alteração visual é traduzida por hemianopsia bitemporal com formas incongruentes na
maioria.
Nos componentes anatômicos após a passagem das fibras pelo quiasma óptico as lesões
são expressadas por alterações visuais em ambos os olhos formando as hemianopsias homô­
nimas, isto é quando a hemianopsia é à esquerda a lesão cerebral é à direita e vice-versa. Essas
alterações têm formas próprias conforme a posição da lesão no encéfalo, mais próximas do
quiasma, próximas dos ventrículos laterais ou atingem as irradiações ópticas mais próximas da
córtex occiptal ou mesmo no próprio córtex occipital como acontece nos acidentes vasculares
que atingem a artéria cerebral posterior (ver capítulo do campo visual para maiores detalhes).
As lesões das vias ópticas podem ter como agentes processos inflamatórios, infecciosos,
tumores degenerativos, tóxicos, diabetes, hipertensão arterial, hipertensão intracraniana, etc.
Os exames que a seguir deverão ser realizados: acuidade visual, reflexos pupilares, fundo
de olho, campo visual e outros são descritos adiante.

ALTERAÇÕES DA MOTRICIDADE
Inicialmente devemos lembrar que os movimentos binoculares são comandados por centros
supranucleares localizados no córtex pré-frontal, no mesencéfalo. Neste trajeto recebem fi­
bras provenientes do cerebelo e do sistema vestibular que fazem a modulação em amplitude e
velocidade da atividade motora binocular. Algumas destas atividades são voluntárias e outras
involuntárias, por exemplo como voluntárias temos as versões e vergências e das involuntárias
os movimentos de seguimento e retorno a fixação.
Todos estes comandos são de ordem binocular. Existe também um estímulo de relaxamen­
to dos músculos antagonistas para facilitar esta tarefa. Por último há movimentos oculares que
procuram compensar os desvios posturais da cabeça e do corpo produzindo rotação e desvios
dos olhos e movimentos da cabeça.
Os três nervos cranianos (III, IV e VI), o parassimpático e simpático são os responsáveis
pelo comando dos movimentos oculares, das pálpebras, pupilares e acomodação.
A atividade dos músculos extrínsecos é que produz o movimento dos olhos. É indispensá­
vel o conhecimento da anatomia e das relações dos nervos: oculomotor (III par), nervo troclear
(IV par) e nervo abducente (VI) desde os centros corticais, seu trajeto até os núcleos periféri­
cos de comando binocular que por sua vez transferem aos núcleos periféricos que comandam
a ação específica de cada músculo extrínseco ocular. O trajeto periférico percorre a base do
crânio, entra na órbita pela fissura orbital superior e chega aos músculo que inerva. As rela­
ções com vasos e outras estruturas nervosas e ósseas devem ser conhecidas em virtude de seu
papel eventual como causa de eventuais lesões que comprimem ou lesionam esses nervos,
(p.ex., aneurisma da artéria comunicante posterior e paralisia do III par).
Alterações motoras oculares produzem desvios oculares e como consequência estrabis­
mos incomitantes, diplopias e eventualmente tortícolis compensatórios característicos. Esses
desvios podem se recuperar em 3 a 6 meses, período que devemos nos abster de tentativas
cirúrgicas.
O Consultório Básico de Oftalmologia e Anamnese 7

São características as lesões de cada nervo encarregado da motricidade ocular:


■ Lesão do nervo oculomotor (III par): produz ptose palpebral, estrabismo divergente com
deslocamento para baixo do globo ocular e midríase (lesão do parassimpático).
■ Lesão do nervo troclear (IV par) produz: estrabismo vertical com o olho desviado para cima
e para dentro. O sinal de Bielchoviski é característico aumentando o desvio vertical quando
se inclina a cabeça para o lado do olho lesionado.
■ Lesão do nervo abducente (VI) produz: estrabismo convergente que aumenta o ângulo de
desvio quando se olha para o lado do músculo paralítico (incomitância).

Em casos que não se recuperarem após 6 meses podemos corrigir o desvio ocular que cau­
sa diplopia ou a ptose palpebral, cirurgicamente ou por prismas quando o desvio em posição
primária de mirada é pequeno.
Neste grupo há necessidade de fazer uma boa anamnese levantando muito bem as ca­
racterísticas do problema visual, seu início, problemas associados e causas atribuídas como
agente da lesão.
Essas paralisias decorrentes de lesões do nervo em seu trajeto periférico são fáceis de
serem diagnosticadas pelo estrabismo incomitante, observando o aumento do desvio quando
solicitamos ao paciente para olhar para o lado da ação do músculo paralisado e reduzindo o
desvio nas miradas no sentido oposto.
Neste exame devemos solicitar que o paciente olhe no sentido das seis principais posi­
ções diagnósticas: lateral direita, lateral esquerda, superior direita, superior esquerda, inferior
direita, inferior esquerda.
Os músculos oculares extrínsecos podem também estar envolvidos em lesões deles pró­
prios sem lesão neurológica, como, por exemplo, em lesões traumáticas da tróclea alterando
a ação o oblíquo superior e causando estrabismo. Também a doença de Graves produz es-
pessamento por infiltração principalmente do músculo reto inferior e eventualmente do reto
medial. Esses espessamentos musculares podem ser constatados pela tomografia computa­
dorizada que inclusive pode localizar se o infiltrado está em toda a extensão do músculo ou
localizado.
Traumatismos médios faciais e laterais da face podem fazer fraturas com deslocamentos
ósseos que impedem a movimentação ocular ou pinçamentos musculares nas fraturas do as­
soalho da órbita.
Tumores orbitários podem deslocar os olhos para a frente (exoftalmias) ou lateralmente.
Esses problemas devem ser enfrentados com terapêutica médica ou cirúrgica de urgência ou
esperando algum tempo de evolução.

Acuidade visual
A acuidade visual deve ser medida sem correção e com correção refrativa. Devemos avaliar a
visão central e a periférica e essa pesquisa é feita com diversas técnicas e aparelhos que são
melhor detalhados no Capítulo 2.
8 Semiologia Básica em Oftalmologia

Pupilas
■ Estática: miose, midríase, anisocoria (muito importante nos traumas cranianos). Para avaliar
melhor a anisocoria podemos estimular esta situação fazendo a iluminação alternada dos
olhos (Swing teste pupilar), verificando a presença de lesão no nervo óptico, via ascendente
do reflexo fotomotor (pupila de Marcus Gunn).
■ Dinâmica: os reflexos pupilares à luz, direto e consensual e à convergência são importantes
para o diagnóstico de lesões do NO e do nervo oculomotor (suas fibras parassimpáticas).
r

Pupilas: E muito importante avaliar as pupilas no exame neuroftalmológico.

Deve ser evitado o uso de qualquer colírio para clarear ou descongestionar os olhos, ou
colírios midriáticos antes do exame pupilar.
O tamanho da pupila depende da iluminação do ambiente e de luz incidente nos olhos.
Normalmente o diâmetro de pupilas normais é de 3 a 4 mm, entretanto, depende da idade e
de doenças oculares ou sistêmicas e inclusive de medicações oculares ou sistêmicas. Uso de
fármacos também faz variar seu tamanho, principalmente produzindo midríase.
Normalmente as pupilas têm o mesmo tamanho (isocoria). Quando seu tamanho é diferen­
te nos dois olhos chamamos de anisocoria. Isso pode acontecer por miose ou midríase em um
dos olhos. Pode, também, haver midríase em ambos os olhos.
Os principais reflexos pupilares são: reflexo à luz (reflexo fotomotor) produz miose em AO,
e o reflexo à convergência e acomodação que produz miose em AO.
A anisocoria por midríase em um dos olhos é bastante evidente nos traumas de cabeça
e significa lesão do nervo oculomotor principalmente em casos de hemorragia extradural e
hérnia do hipocampo com compressão de nervo oculomotor. Significa grande risco para a vida
do paciente e emergência de atendimento médico.
Nos casos de anisocoria por lesão de nervo óptico, lesão da via ascendente (centrípeta)
do reflexo fotomotor, pode ficar mais evidente com a pesquisa da midríase com a iluminação
alternada dos olhos (Swing teste).
Mais raro é encontrar a pupila tônica da síndrome de Adie que é característica e melhor
vista à lâmpada de fenda aumentando bruscamente sua iluminação. Os exames farmacológicos
com colírios midriáticos ou mióticos podem ser realizados quando desejamos avaliar a ativida­
de do simpático ou parassimpático.

FUNDOSCOPIA: principalmente alterações do disco óptico. O exame de fundo de olho é muito


importante. Avaliamos a retina e com muita atenção o disco óptico para constatarmos atro­
fias ópticas totais ou parciais, edema inflamatório, papiledemas, malformações e presença de
drusas de papilas, tumores, colobomas e outros problemas. É necessário avaliar os dois olhos
para comparar melhor pequenas alterações e evidenciar problemas locais ou sistêmicos res­
ponsáveis das lesões encontradas.
A fotografia do fundo de olho, estereofoto de nervo óptico e OCT pode servir para diag­
nóstico em exames futuros da evolução do problema.
Exames complementares:
- Fotografia estereoscópica
- OCT do disco óptico
O Consultório Básico de Oftalmologia e Anamnese | 9

- Tomografia computadorizada do encéfalo e crânio, órbita com canal óptico, músculos


extrínsecos oculares
- Ressonância magnética do encéfalo
- Potencial visual evocado
- Punção lombar e exames de liquor.

Esses exames são solicitados conforme a necessidade de avaliar as causas eventualmente


envolvidas no processo, ou lesões que influenciam nas funções visuais. Principalmente na evo­
lutiva como tumores, aneurismas, etc.

Potencial visual evocado (VER/PVE)


O estímulo da retina por um flash de luz produz um sinal elétrico que percorre toda a via óp­
tica até o córtex visual situado na região occipital. Captado por eletrodos e registrados em
gráficos que indicam a sanidade ou lesões em qualquer das estruturas das vias ópticas até o
córtex occipital.
Deve ser observada a latência (tempo da chegada da onda elétrica ao córtex visual), a for­
ma e amplitude da onda produzida pelo córtex visual na área occipital.
Nas neuropatias ópticas compressivas ou tóxicas encontramos redução da amplitude da
onda cortical mais do que o tempo de latência. Nas doenças desmielinizantes se dá o inverso,
a latência é mais ampliada do que a alteração da onda. Há um retardo na transmissão da onda
até o córtex.
O estudo do VER associado à eletrorretinografia (ERG) quando normal pode nos dar infor­
mações sobre a capacidade visual em crianças pré-verbais ou pessoas incapazes de informar
em testes comuns de acuidade visual.
Antes de realizarmos o VER devemos observar se não há problemas oculares (opacidades
dos meios transparentes, lesões retinianas amplas e fazemos correções refrativas amplas caso
existam para individualizarmos a pesquisa das vias ópticas pelo potencial visual evocado.

Campo visual
O exame do campo visual é muito importante em neuroftalmologia. Deve ser realizado para
o diagnóstico e também para avaliação da evolução do problema que lesiona as vias ópticas.
Há várias técnicas e aparelhos para avaliar o campo visual, desde as formas mais simples
até as mais sofisticadas (ver o Capítulo 3).
Lembramos que nas emergências, como nos traumas cefálicos, em pacientes acamados e
também em crianças, podemos lançar mão do método do campo visual de confrontação que
apesar da “simplicidade e limitações” pode nos dar informações sobre perdas visuais mono-
culares ou binoculares, como também sobre hemianopsias homônimas ou heterônimas, he­
mianopsias altitudinais, escotomas centrais ou perdas periféricas e nos orientar para exames
com aparelhos mais sofisticados que nos darão informações mais precisas (ver o Capítulo 3).
Entre esses aparelhos queremos citar o campímetro de Goldmann que consegue traçar cír­
culos pela união de pontos com idêntica sensibilidade chamadas isópteras conseguindo assim
dar forma às perdas visuais e chegarmos a localizar o lugar da lesão na via óptica.
10 Semiologia Básica em Oftalmologia

Os campímetros de Humpheys dão maior precisão e se baseiam na iluminação de pontos


na cúpula que aumentando sua intensidade luminosa progressivamente medem a sensibilida­
de da retina em centenas de lugares transferindo para o papel a imagem dos escotomas. Este
tipo de campímetro pode usar a cor azul sobre fundo amarelo demonstrando maior sensibili­
dade com este artifício e agregando áreas mais amplas de perda campimétrica.
Gostaríamos de citar aqui os fundamentos das alterações campimétricas e que não podem
ser esquecidas para todos os oftalmologistas:
As lesões pré-quiasmáticas produzem perdas visuais monoculares (escotomas centrais,
centrocecais, altitudinais, arciformes, periféricos ou perda total da visão do olho do mesmo
lado da lesão. Teremos também lesões das vias pupilares aferentes com redução ou perda do
reflexo fotomotor do mesmo olho e redução do fotomotor consensual no outro olho.
As lesões quiasmáticas produzem hemianopsias heterônimas (bitemporais) são incon­
gruentes e por vezes associadas a lesões do nervo óptico já na entrada do quiasma - com
frequência são causadas por compressões por tumores de estruturas vizinhas como hipófise,
meninges, craniofaringiomas.
As lesões das vias ópticas retroquiasmáticas produzem hemianopsias homônimas ou qua-
drantopsias homônimas. Quando as lesões das vias ópticas retroquiasmáticas estão localiza­
das mais anteriormente (próximas do quiasma) as perdas visuais nos campos visuais são incon­
gruentes (de forma dissemelhante), quando já estão localizadas próximas do polo posterior as
hemianopsias são congruentes (semelhantes) nos dois lados e produzem bissectação da área
central (visão macular cortada ao meio) (ver o Capítulo 3)
Quando a hemianopsia homônima é consequência de lesão cortical occipital, frequente­
mente causada por acidente vascular encefálico ou obstrução da artéria cerebral posterior há
sparríng de mácula (preservação campimétrica da mácula) ocasionado pela dupla vasculariza­
ção desta área.

Fundoscopia ocular
O exame do fundo de olho (retina e disco óptico) é rotina importante em neuroftalmologia.
Pode ser visualizado com oftalmoscópio monocular (oftalmoscopia direta), oftalmoscopia bi­
nocular indireta (imagem invertida com estereoscopia) ou em biomicroscopia (na lâmpada de
fenda).
Na retina devemos observar lesões por retinocoroidite (especialmente por toxoplasmose),
degenerações, angiomatoses, vasculites, sinais de retinopatia por hipertensão arterial, arte­
riosclerose, retinopatia por diabetes e outras que podem estar associadas a alterações visuais
e motoras dos olhos ou mesmo serem lesões características de síndromes encefaloculares.
Observar as veias e artérias (obstruídas, ingurgitadas ou filiformes).
O exame do disco óptico tem valor preponderante no exame neuroftalmológico. Observar
suas bordas (bem delimitadas ou borradas; sua superfície pálida ou rosada, elevada ou depri­
mida, alteração anatômica ou malformação. Avaliar se o disco apresenta edema ou é atrófico.
Caso haja hipertensão intracraniana o disco dos dois olhos pode ter características de papile-
dema (ver o Capítulo de Neuroftalmologia).
Afinal, verificar se o disco óptico é normal ou tem características de papilite, neurite óp­
tica, atrofia de disco óptico, malformações, drusas de papila, neovascularização, papiledema,
O Consultório Básico de Oftalmologia e Anamnese | 11

engurgitamento venoso, ausência de pulso venoso espontâneo, hemorragias, tumores ou ou­


tras alterações, o OCT do disco e mácula, pode ajudar no diagnóstico.

Tomografia computadorizada (TC)


A TC de órbita é um dos exames mais importantes para o diagnóstico de tumores orbitários
intra e extraconais e sua relação com as estruturas na órbita, tais como, o nervo óptico, globo
r

ocular, paredes ósseas. E indispensável para o diagnóstico da doença de Graves, processos


inflamatórios ou infecciosos das órbitas. Os cortes coronais da TC são muito importantes no
diagnóstico da doença de Graves.
Nos traumatismos da face e na região frontal do crânio com fraturas nas paredes orbitá-
rias, principalmente das fraturas do assoalho da órbita com ou sem pinçamento de músculos
(especialmente do músculo reto inferior), a tomografia computadorizada é especialmente im­
portante.

Ressonância magnética (RM) de órbita, cranioencefálica e


angiorressonância
A RM não tem radiação ionizante e portanto não produz efeitos danosos aos tecidos exami­
nados. Tem muita importância para avaliação do ápice orbitário e do nervo óptico e nos pro­
cessos de neurite óptica, tumores do NO e suas bainhas como também do canal óptico nas
fraturas da região frontal do crânio.
Nas neurites ópticas de origem desmielinizante podem demonstrar no encéfalo manchas
brancas periventriculares, características de esclerose múltipla.
A ressonância magnética cranioencefálica é indispensável para avaliar a presença e loca­
lização de tumores, degenerações, malformações vasculares, microangiopatias, aneurismas,
angiomatoses, obstruções vasculares, fístulas carotidocavernosas, hemorragias intracranianas
ou extrameníngeas, doenças desmielinizantes, traumatismos, corpos estranhos, etc.
A angiorressonância com uso de contraste (gadolínio) pode demonstrar aneurismas, fístu­
las arteriovenosas e obstruções vasculares. Como exemplo gostaríamos de citar o aneurisma
da artéria comunicante posterior que pode ser encontrado nos casos de paralisia do nervo
oculomotor (III par) que acomete adultos jovens e até a meia-idade; que tem necessidade de
embolização com certa urgência. Esta terapêutica é também usada nas fístulas arteriovenosas.
A localização de tumores encefálicos, angiomatoses, meninges e nervos intracranianos e
orbitários é indispensável na neuroftalmologia.

RELAÇÕES ENTRE O APARELHO VISUAL E O SISTEMA VESTÍBULO-


COCLEAR. RELAÇÕES ANATÔMICAS E FUNCIONAIS
Vertebrados primitivos (peixes e anfíbios) eram providos de um elaborado sistema de órgãos
laterais que os capacitavam a guiar seus movimentos respondendo às vibrações do meio aquá­
tico em que viviam. Goltz (1870) foi o primeiro a demonstrar que o “labirinto” pertence a um
sistema de órgãos encarregados do mecanismo postural, e encontrados em todos os vertebra-
12 Semiologia Básica em Oftalmologia

dos. Quando os vertebrados se tornaram terrestres, esses órgãos laterais desapareceram e o


labirinto com o sistema vestibular permaneceu e assumiu o principal papel na atividade postu­
ral. Quando apareceram os mamíferos, os impulsos proprioceptivos dos membros começaram
a ter grande importância no controle da postura, mas o labirinto continuou a ser o principal
órgão. Quando esses estímulos chegaram ao Tegmentum e ao Tectum eles se correlacionaram
com a visão e outros estímulos.
Mais tarde, com o desenvolvimento do sistema nervoso, importante grupo de centros ner­
vosos na área do mesencéfalo controlou e ajudou na manutenção da postura.
Acima deste sistema, o cerebelo veio servir como controlador e organizador do labirinto
e seus órgãos associados. O cerebelo controla a força necessária para efetivar um movimento
adequado à postura desejada.
Com o desenvolvimento da visão binocular a coordenação entre os olhos e o labirinto se
tornou mais importante até, eventualmente, os olhos poderem substituir e adequadamente
compensar pela perda eventual de ambos labirintos, agindo vicariantemente por eles quando
são destruídos.
Parece que o labirinto domina o sistema proprioceptivo e os olhos tendem a dominar o
labirinto, enquanto o cerebelo é o mecanismo diferenciador e integrador.
Em razão deste mecanismo postural, a conexão central do VIII nervo e sua relação com os
núcleos do sistema motor ocular se torna de capital importância.
O VIII nervo é dividido em duas partes: (1) a divisão vestibular, servindo principalmente o
labirinto, e (2) a divisão coclear, subservindo principalmente a cóclea. O primeiro, assim, toma
parte primariamente com os impulsos proprioceptivos, e o segundo principalmente com os
estímulos esteroceptivos, mas é necessário notar que ambos são fundamentalmente similares
e em ambos os casos os receptores consistem de células equipadas com cílios imersos em
fluído.
A cóclea e o labirinto são semelhantes em origem e parece que as duas divisões do nervo
não são marcadamente diferenciadas em fibras de atividade postural e auditivas: muitas fibras
que provêm da cóclea são associadas com o gânglio vestibular de Scarpa que recebem fibras
essencialmente dos canais semicirculares; e ao contrário muitas fibras no nervo coclear têm
origem vestibular. As experiências de Wilkler (1918) confirmam este inter-relacionamento. No
nível do tronco cerebral não há reconhecimento de audição, mas só de atividade motora. As
conexões do nervo óptico no tronco cerebral são essencialmente fotostáticas e as fibras que
provêm do nervo óptico ali são puramente gravistáticas e portanto envolvidas em atividade
motora.
As vias dos nervos vestibulares e cocleares em sua parte morfológica, certamente, já fo­
ram descritas em outro capítulo e não temos intenção de repeti-las.

ENVOLVIMENTO OCULAR NOS REFLEXOS VESTIBULARES


As alterações das versões (movimentos oculares binoculares); desvios conjugados dos olhos
e nistagmos devem fazer parte do conhecimento de oftalmologistas, otorrinolaringologistas,
neurologistas e de médicos que atendem emergência e traumatismos cefálicos.
O Consultório Básico de Oftalmologia e Anamnese 13

A anulação da visão pela oclusão dos olhos conduz ao aparecimento de alterações postu-
rais e eventualmente a dificuldade ou impossibilidade de orientação espacial.

REFLEXOS ESTATOCINÉTICOS
Considerando que reflexos estáticos são considerados para evidenciar orientação anormal, refle­
xos estatocinéticos são realizados para observar mudanças em movimentos, sua iniciação, acele­
ração ou desaceleração. Um movimento da cabeça induz um estímulo labiríntico e a resposta
produz um movimento involuntário de vai e vem nos olhos (nistagmo) consistindo de uma fase
lenta e outra rápida de recuperação em sentido oposto, todos esses movimentos são realiza­
dos para reter os olhos, o maior tempo possível, na mesma posição relativa do campo visual;
isto é conseguido por um movimento lento em sentido oposto ao movimento da cabeça e logo
após é seguido de um movimento rápido para permitir a nova apreciação visual.

PROVA CALÓRICA (NISTAGMO CALÓRICO)


Estímulos calóricos do labirinto, introduzindo água fria (entre 22° e 27°C) ou quente (entre
40° e 45°C) dentro do conduto auditivo externo, induz um pronunciado movimento ocular
de nistagmo. Quando é usada água fria a fase lenta do nistagmo é dirigida para o lado do ou­
vido estimulado, e quando é usada água quente a fase lenta é dirigida para o lado oposto. O
nistagmo obtido pode ser horizontal, vertical ou rotatório conforme a posição da cabeça no
momento de estímulo.
O tempo latente para o aparecimento do nistagmo é de 4 a 30 s e o tempo de nistagmo
de 2 min.
Após o estímulo labiríntico há sensação de rotação e pode chegar a tontura e eventual­
mente náuseas.
Três causas do nistagmo pela prova calórica podem ser consideradas: 1) movimento de
corrente do fluído labiríntico, 2) inibição com água fria e estimulação com água quente do
labirinto e 3) uma causa vascular, pois a água fria causa vasoconstrição e a água quente vaso-
dilatação.
Gostaria de passar a experiência pessoal que tenho com uma simplificação deste pro­
cesso: Utilizando água fria de torneira levemente amornada entre as mãos, em uma seringa
de 20 ml e irrigando durante 20 s a orelha externa, (deve ser observado se o conduto audi­
tivo externo está livre de sangue ou cerúmen) obtemos com facilidade o aparecimento do
nistagmo com sua fase rápida para o lado oposto. Dessa forma, podemos constatar pelo apa­
recimento do nistagmo que uma longa parte da protuberância e do tronco cerebral estão in­
denes. Isto é muito importante nos sérios traumas cefálicos e nos serviços de emergências,
tendo em conta que em muitos casos não podemos perder tempo com exames demorados.
Tivemos a oportunidade de avaliar um grande número de pessoas com lesões graves ence­
fálicas em um acidente de aviação próximo a Curitiba, e que o neurocirurgião que chefiava
a equipe usou esta técnica de exame para triar as pessoas que tinham condições melhores
de sobrevida, pois o centro de atendimento cirúrgico não dispunha de condições de atendi­
14 Semiologia Básica em Oftalmologia

mentos de todos os lesionados ao mesmo tempo. Nos pacientes em coma esse exame pode
ser de relevância.

NISTAGMO POR COMPRESSÃO


Teste mais difícil de realizar. Utiliza-se um pequeno balão inflável no conduto auditivo que pela
insuflação produz compressão controlada sobre o tímpano e consequentemente nistagmo.

NISTAGMO ELÉTRICO
Estimulação galvânica do labirinto produz nistagmo.
Quando o anódio é posto sobre o labirinto de um lado, a fase lenta do nistagmo provo­
cado é para o mesmo lado. Quando o catódio é colocado no outro lado o nistagmo pode ser
observado.
Explica-se este fenômeno pela movimentação da linfa dentro dos canais semicirculares do la­
birinto causada pela cataforese. Outros autores acreditam ser uma estimulação diretamente feita
sobre o nervo vestibular pela corrente elétrica. Os movimentos oculares e, inclusive da cabeça,
tornam mais difíceis a interpretação deste tipo de estímulo produzido por corrente elétrica.

NISTAGMO
Acreditamos ser importante algumas informações gerais para melhor compreender este tema.

MOVIMENTOS DE SEGUIMENTO
Os olhos podem ser deslocados seguindo o movimento de um objeto que se desloca no campo
visual. Esse movimento de perseguição é uniforme e necessita de fixação macular, portando
uma acuidade visual suficiente. Ele é comandado por áreas temporoparietoccipitais que en­
viam estímulos para a zona reticular do tronco cerebral e são harmonizados e controlados
pelo cerebelo.

MOVIMENTOS VOLUNTÁRIOS
Estes movimentos têm comando no córtex frontal e o deslocamento dos olhos se faz de forma
sacádica, em pequenos segmentos consecutivos até chegar ao novo ponto de fixação deseja­
do, são movimentos voluntários.

MOVIMENTOS DE ORIGEM VESTIBULAR


São os primeiros a se formar e, portanto, os mais antigos a se desenvolverem no feto.
O Consultório Básico de Oftalmologia e Anamnese 15

Pelo movimento da cabeça há movimentação da endolinfa nos canais semicirculares do labi­


rinto o que desencadeia a movimentação ocular. Já na fase de gestação esses movimentos ocula­
res se realizam. Eles também são regulados em intensidade e amplitude pelo cerebelo.
Outras informações se fazem importantes nesse início:

NISTAGMOS VERDADEIROS: movimentos rítmicos e involuntários dos olhos. São movimentos


rítmicos com frequência, amplitude e velocidades uniformes. Se relacionam com a atividade
do sistema labiríntico.
MOVIMENTOS NISTAGMOIDES (FALSOS NISTAGMOS): movimentos arrítmicos e involuntários.
Têm amplitude, frequência, direção e velocidades variáveis. São causados por redução visual
importante e dificuldade de fixação central, macular. Têm necessidade de avaliação de função
ocular e das vias ópticas. Quando muito amplos, frequentemente são chamados de “movimen­
tos vagabundos dos olhos” e característicos dos quase ou completamente cegos.
NITAGMOS EM SACUDIDELAS: caracterizam-se por serem rítmicos com uma fase lenta seguida
por uma fase rápida.

Descritos pelas seguintes características:


■ Direção dada por sua fase rápida:
• Horizontal (para a direita ou para a esquerda)
• Vertical (para cima ou para baixo)
• Rotatória (sentido horário ou anti-horário)
■ Amplitude: grande ou pequeno ângulo.
■ Frequência: rápida ou lenta.
■ Ponto de bloqueio: em mirada lateral ou convergência (posição em que o nistagmo é re­
duzido ou desaparece). Este tipo têm frequentemente condição de ser melhorado com o
auxílio de prismas ou cirurgia dos quatro músculos.
■ Posições compensadoras da cabeça: tortícolis ou sacudidas rítmicas da cabeça em sentido
oposto ao do nistagmo.

NISTAGMOS PENDULARES: têm igual velocidade nos dois sentidos. Frequentemente muito rá­
pidos. Melhor observados pela oftalmoscopia que vê a movimentação do disco óptico. Têm
pequena amplitude. Frequentemente ligados à fixação.
NISTAGMOS LATENTES: aparecem pela cobertura (oclusão) do olho de melhor visão. Geralmen­
te um dos olhos tem deficiência visual e dificuldade de fixação.
MOVIMENTOS NISTAGMOIDES: são arrítmicos, involuntários, têm direções variáveis, frequente­
mente amplos e intensa redução visual. Têm como causas ambliopia privacional, lesões macu­
lares amplas, toxoplasmose congênita, glaucoma congênito, microftalmias secundárias, opaci-
ficação de córnea e meios transparentes e cataratas congênitas.
NISTAGMOS CONGÊNITOS: classicamente horizontais em sacudidelas. Com frequência rítmica.
Têm posição de bloqueio em mirada lateral ou convergência. Em alguns casos se associam à
hipermetropia e astigmatismo. Devem ser diferenciados dos movimentos nistagmoides. Não
têm lesões oculares ou de vias ópticas constatáveis objetivamente. A refração e outros exames
oftalmológicos devem ser feitos com os dois olhos abertos e com liberdade de movimentação
da cabeça para assumir espontaneamente posição de bloqueio ou de redução do nistagmo. A
16 Semiologia Básica em Oftalmologia

visão binocular exercida durante o exame facilita e não o confunde com redução visual devido
ao movimento ocular mais intenso que acontece na visão monocular pelo bloqueio por oclu­
são de um dos olhos, o que se faz comumente nos exames de refração. Pessoalmente preferir­
mos fazer esses exames com a armação de prova em vez de colocação do Greens que impede
a visualização dos olhos do paciente e também o impede de mover a cabeça em compensação
do nistagmo, buscando com inclinações a posição de melhor visão. A indagação da existência
de problemas semelhantes em membros da família pode levantar suspeita de alterações ge­
néticas.

O nistagmo congênito sem lesão de retina ou alteração vestibular costuma melhorar com
a idade e obter melhor capacidade visual. Em caso de bloqueio em posição de tortícolis inten­
so pode ser indicada cirurgia dos quatro músculos e da qual temos experiência com correções
surpreendentes.

NISTAGMO DE ORIGEM VESTIBULAR


O nistagmo de origem vestibular é um movimento ocular sincrônico e de igual amplitude
em ambos os olhos, em sacudidelas que envolve a contração de um parelha de músculos e
o relaxamento de seus antagonistas em virtude da inervação recíproca. Essa coordenação é
demonstrada experimentalmente pela eletromiografia. Em geral o movimento ocular ocorre
no mesmo plano do canal semicircular estimulado. O estímulo do canal semicircular externo
produz nistagmo horizontal; o canal inferior (posterior) produz nistagmo vertical e o canal
superior (anterior), causa nistagmo rotatório.
É necessário saber que o importante núcleo vestibular faz inúmeras conexões: com o ce-
rebelo, com o mesencéfalo, com a medula, com o corpo trapezoide, com a cóclea e com o cór­
tex, particularmente com a área visual e o lobo temporal. Envia, também, fibras diretas para
o feixe longitudinal medial e faz múltiplas sinapses com a formação reticular paramediana da
ponte. O cerebelo é particularmente importante em virtude das íntimas relações entre ele e o
sistema vestibular, proporcionando organização e modulando os movimentos.

LESÃO PERIFÉRICA VESTÍBULO COCLEAR


Há sintomas auditivos associados com frequência: redução da audição ou mesmo surdez, zum­
bidos e nistagmo horizontal em sacudidelas. Aparecem por vezes movimentos compensató­
rios da cabeça. A neuroimagem pode ser utilizada para o diagnóstico (tomografia computado­
rizada e ressonância magnética), entretanto, costuma ser pouco relevante.

LESÃO CENTRAL
Nas lesões do mesencéfalo e troncocerebral, não existem possibilidades de melhora e o nis­
tagmo é assimétrico, com frequência vertical com a fase rápida para baixo. Tem como causas
O Consultório Básico de Oftalmologia e Anamnese 17

prováveis malformações ou tumores pedunculares. Outras causas menos frequentes são a es-
clerose múltipla ou alterações vasculares.
Quando a lesão é do colículo superior no tronco cerebral ou no córtex frontal o nistagmo
apresenta movimentos sacádicos, isto é, tem uma fase lenta de desvio seguida de uma fase
rápida de recuperação da posição dos olhos.
A região cortical parietotemporocciptal comanda os movimentos de perseguição que são
movimentos uniformes de seguimento de um objeto que se desloca no campo visual.
A formação reticular pontina paramediana está envolvida no nistagmo horizontal.
O fascículo longitudinal medial está envolvido no movimento vertical dos olhos principal­
mente no deslocamento dos olhos de cima para baixo.
Os canais semicirculares comandam o núcleo vestibular que encaminha o estímulo ao nú­
cleo do sexto par e ao núcleo para-abducente, levando a movimentos laterais, horizontais e
seu estímulo ou lesão produz nistagmo em sacudidelas.

EXAME DO PACIENTE COM NISTAGMO


ANAMNESE: para o bom conhecimento do nistagmo e seu diagnóstico etiológico há necessida­
de de informações sobre a época do aparecimento, sua duração, sintomas relacionados com
o nistagmo, outros sintomas vestibulares cocleares e tronculares. Doenças sistêmicas, vascu­
lares, o diabetes e doenças hemorrágicas ou traumatismos cefálicos devem ser levantados.7
EXAME DO NISTAGMO: com iluminação suficiente para observação dos olhos em visão binocu­
lar avaliamos se o nistagmo é binocular e rítmico em sacudidelas com a amplitude, velocidades
e frequência constantes ou se é irregular, pendular ou tem movimentos assimétricos e em va­
rias direções. Por vezes, a utilização da lâmpada de fenda facilita para observação de pequenos
nistagmos, nistagmos rotatórios ou pendulares com velocidade acentuada. No fundo de olho
a observação do movimento da papila pode caracterizar o nistagmo de pequena amplitude.
No caso de alterações vestibulares já vimos que o nistagmo costuma ser horizontal nas lesões
periféricas (vestíbulo-cocleares) e apresenta-se em sacudidelas com fase rápida e fase lenta, é
uniforme e constante. Pode haver pontos de bloqueio parcial com o tortícolis compensador
ou se o bloqueio é completo.

A nistagmografia é mais uma forma objetiva, com utilização acadêmica, mas pouco acres­
centa à observação detalhada do nistagmo. A tomografia e a ressonância magnética do osso
petroso, da orelha média, do labirinto, da mastoide, do mesencéfalo e do tronco cerebral po­
dem ajudar em certas lesões nestas áreas.

EXAME OFTALMOLÓGICO COMPLETO


Lesões da retina avaliadas pelo fundo de olho, o exame dos meios transparentes pela biomi-
croscopia na lâmpada de fenda, a acuidade visual, a fixação macular, a motilidade extrínseca e
o estrabismo devem ser examinados com atenção e anotadas as alterações.
18 Semiologia Básica em Oftalmologia

TRATAMENTO
Problemas visuais e vestibulares devem ser tratados quando possível, a recuperação da acui­
dade visual e do campo visual podem conduzir a melhora. Quando existe bloqueio presente
pode-se tentar o uso de prismas ou da cirurgia de quatro músculos, onde temos boa experiência
pessoal. O eventual estrabismo associado pode ser corrigido com a cirurgia em um só tempo.
O nistagmo congênito, quando não existem lesões oculares que reduzam a visão por si e na
ausência de lesões neurológicas, pode ter um prognóstico favorável e a evolução deve ser ob­
servada por longo tempo.
Apresentarei a seguir, algumas doenças que associam lesões vestíbulo-cocleares a proble­
mas do aparelho visual. Serão poucas entre um grande número delas, entretanto, acredito se­
rem as mais frequentes e servirem como exemplos, pois demonstram que variadas etiologias
podem estar presentes e trazerem associadas alterações características desses dois sistemas.

Fratura de osso petroso


As fraturas do rochedo (osso petroso) não são muito frequentes. Traumatismos laterais e fron­
tais do crânio podem levar à fratura do osso temporal e por extensão do rochedo que é parte
deste osso craniano. Quando isso acontece pode haver lesão do VII par (nervo facial), lesões
no sistema vestibular periférico (canais semicirculares); cóclea e compressão do VI par (n.
abducente) pelo deslocamento e edema da área onde este nervo transita por debaixo do liga­
mento petroso clinóideo. Esta fratura pode ser constatada por radiografia ou por tomografia
computadorizada.
Clinicamente podem ser evidenciados os seguintes sinais: nistagmo, surdez, tonturas e
eventualmente náuseas, paralisia facial periférica (paralisia de Bell) com lagoftalmia e também
paralisia de abdução do olho pela lesão do VI par (n. abducente) e consequente estrabismo
convergente.
Certamente todos esses sinais não estão sempre associados e neste tipo de fratura a sua
presença depende da extensão e localização da lesão traumática. Na recuperação destas le­
sões é comum que a surdez permaneça após a recuperação eventual da paralisia do VI par, que
produz o estrabismo convergente.

Petrosite
O sexto par (n. abducente) passa através do canal de Dorello. Este canal é um espaço limitado
abaixo pelo osso petroso e acima pelo ligamento petrosoclinóideo que liga o ápice do osso
petroso a apófise clinoide posterior. O seio venoso petroso inferior passa através do mesmo
espaço e pode comprimir o sexto nervo quando o seio venoso se dilata como na presença de
fístula carotidocavernosa, causando estrabismo convergente. Neste processo também cons­
tatamos exoftalmia pulsátil e aspecto fundoscópico com ingurgitamento venoso na retina e
edema de papila.
Processos inflamatórios ou infecciosos originados na orelha média (otite média) ou mas-
toidites podem afetar o sexto nervo secundariamente pela petrosite (síndrome de Gradenigo).
(Neuro-Ophthalmology, Basic and Clinicai Science Course 1997 - 1998 pág 123 - American
O Consultório Básico de Oftalmologia e Anamnese 19

Academy of Ophthalmology). Esses pacientes podem ter dor na região e redução da audição.
Nos movimentos binoculares para o lado da lesão pode aparecer nistagmo lento em sacudi­
delas.
Paralisia facial periférica com lagoftalmia (impossibilidade de oclusão das pálpebras) do
olho ipsilateral pode estar presente e seu tratamento se impõe de forma imediata motivada
pela exposição do globo ocular e consequente lesão da córnea.

Esclerose múltipla
A esclerose múltipla (EM) é uma enfermidade imunológica e desmielinizante. Em virtude de,
frequentemente, ter queixas visuais o oftalmologista costuma ser o primeiro médico a ser con-
r r r

sultado. E mais frequente nos países com maior latitude. E mais ou menos rara na África e na
Ásia, afeta mais as mulheres que os homens (2:1). É mais frequente entre jovens adultos entre
25 e 40 anos. Os familiares tem maior risco de terem a enfermidade e existe forte associação
com antígeno HLA- DR2.
r

E uma doença crônica com recaídas e intervalos variáveis. A evolução em 10 a 20% é ine­
xorável, podendo levar à morte em alguns anos.
A EM tem uma grande variedade de sintomas que vão piorando em cada crise de sua evo­
lução.
A sintomatologia oftalmológica é parte importante do quadro clínico. A neurite óptica
(NO), com frequência, é o primeiro sinal da enfermidade.
Tipicamente, episódios significantes que duram semanas ou meses podem apresentar di-
plopia transitória, ataxia, vertigem, parestesias, disfunção vesical e fraqueza nas extremidades.
Fadiga e depressão são comuns e podem preceder o início de alterações neurológicas focais.
A EM é uma doença da substância branca do sistema nervoso. Desmielinização é o pri­
meiro acontecimento patológico. Ela é vista em associação com infiltração local de células
mononucleares perivasculares, o que é seguido de remoção da mielina por macrófagos. As
placas são frequentemente vistas na substância branca das margens ventriculares, no nervo
óptico, quiasma, no corpo caloso, na medula, no tronco e pedúnculos do cerebelo. Os nervos
periféricos não são envolvidos.

NEURITE ÓPTICA: a neurite óptica é caracterizada por perda visual aguda ou subaguda, se­
guidamente com dor retrobulbar ou associada aos movimentos oculares. Usualmente afeta
pacientes entre 15 e 45 anos e predominantemente mulheres. O processo é frequentemente
retrobulbar (2/3 dos casos) e há, na maioria, um escotoma central com intensa redução da acui­
dade visual. Em mais de 70% dos casos existe recuperação visual em 2 a 3 meses, persistindo
sequelas (fenômeno de Uhthoff).

Entre todos os casos de neurite óptica, mais de 30% envolvem outros sintomas e achados
de típica esclerose múltipla após 4 anos do primeiro ataque. O exame de ressonância magné­
tica do sistema nervoso central é importante para um diagnóstico definitivo, mas essas lesões
podem aparecer somente alguns anos após o primeiro ataque de neurite óptica.
ONTT (teste terapêutico de neurite óptica) demonstrou que somente a injeção endove­
nosa de metilprednisolona (250 mg a cada 6 horas durante 3 dias) seguida de prednisona oral
20 Semiologia Básica em Oftalmologia

(lmg/kg/dia durante 11 dias) tem algum valor para abreviar o ataque de neurite óptica causada
pela esclerose múltipla. Corticoide oral em baixas doses piora o quadro da esclerose múltipla
dando oportunidade de redução dos períodos intermediários.

NISTAGMO: nistagmo é frequentemente visto em EM. Ele pode ser horizontal, rotatório ou ver­
tical; podendo ser pendular ou em sacudidelas. Vários achados oculares que se originam em
lesão cerebelar podem estar presentes. Ocasionalmente a esclerose múltipla produz a síndro-
me de Parinaud (nistagmo vertical e alteração motora). Pacientes com anormalidade motora
nos olhos se queixam de diplopia, visão borrada ou ocilopsia.
FUNDOSCOPIA: quando a neurite óptica é posterior (atrás dos olhos) a papila pode apresentar
aspecto normal. Por vezes, quando a neurite óptica é mais anterior e atinge a papila há sinais
de edema papilar e na angiografia vemos vazamento de contraste em torno da papila. Em 10%
dos casos pode-se notar embainhamento venoso na periferia da retina.

A pupila pode apresentar ligeira midríase e redução do reflexo fotomotor direto que é me­
lhor evidenciado pelo pupilar swinging test (iluminação alternada das pupilas), demonstrando
defeito de condução das fibras aferentes do reflexo fotomotor no olho comprometido.

AVALIAÇÃO LABORATORIAL
Não existe um teste laboratorial inequívoco para o diagnóstico da esclerose múltipla que per­
manece com o diagnóstico clínico como seu pilar mais seguro.
Testes como ressonância magnética encefálica, tomografia computadorizada e potencial
visual evocado, ajudam a confirmar o diagnóstico.
O exame do líquido cefalorraquidiano coletado o por punção lombar é anormal em mais
de 90% como foi descrito. A elevação da imunoglobulina G (IgG) e do índice IgG/albumina e a
presença da faixa oligoclonal IgG são os mais comuns índices de anormalidades. Entretanto,
nenhum desses achados é específico para doenças desmielinizantes.
A ressonância magnética tem a possibilidade de demonstrar em 85 a 95% dos pacientes
placas periventriculares de desmielinização em esclerose múltipla clinicamente definida e 66
a 76% em pacientes com esclerose múltipla suspeitada. Na presença de neurite óptica em ati­
vidade a RM com técnica de supressão da gordura pode demonstrar placas no nervo óptico.

TRATAMENTO
Não existe um tratamento provado na EM, entretanto, pulsoterapia com metilprednisolona
(250 mg IV cada 6 h durante 3 dias) seguida de prednisona oral (lmg/kg/dia durante 11 dias),
tem demonstrado eficiência na redução do tempo da crise de neurite óptica, entretanto não
parece interferir na repetição das crises e na evolução crônica da enfermidade.
O Consultório Básico de Oftalmologia e Anamnese 21

SÍNDROME DE VOGT-KOYANAGI-HARADA
A síndrome de Vogt-Koyanagi-Harada é uma enfermidade que atinge os olhos, pele, ouvido e
meninges.
0 sinal mais importante é uma uveíte difusa bilateral, geralmente granulomatosa, com
descolamento exsudativo de retina e papilite. Acompanham esta uveite, pleiocitose do líquido
cefalorraquidiano, (manifestações meníngeas), cefaleia, (manifestações auditivas), acufenos,
r

hipoacusias (manifestações dermatológicas) vitiligo, poliose e alopecia. E mais frequente em


mulheres, segundo Belfort Jr. e Couto. Tem maior incidência entre orientais e raças com maior
pigmentação e é mais encontrada na região sul da América do Sul (2,5 a \4%).
r

E uma doença autoimune tendo sido sugerido por autores japoneses ser imunidade hu-
moral e celular contra melanócitos.
Existe um tripé em que se funda o diagnóstico:
- Pródromos
- Sintomas oculares
- Manifestações extraoculares

SINTOMAS PRODRÔMICOS: dias antes da constatação da uveíte há forte cefaleia occipital, ton­
tura, náuseas, vertigens, febre, acufenos, rigidez de nuca e em seguida aparecem metamor-
fopsias relacionadas com o edema de retina. Nesta fase o exame neurológico (inclusive tomo-
grafia e eletroencefalografia) são normais, salvo o exame do líquido cefalorraquidiano que
apresenta pleiocitose com linfocitose em 85% dos casos.
SINTOMAS OCULARES: os sintomas que aparecem precocemente no período agudo da síndro­
me são: uveíte anterior, papilite, edema da retina, descolamento exsudativo da retina e redu­
ção visual.

Os sinais que aparecem no período de convalescência são lesões semelhantes a nódulos


na retina (também encontrados na oftalmia simpática), linhas de demarcação do descolamento
de retina, neovascularização da retina, neovascularização na região sub-retiniana e na papila
e mais tarde encontramos a retina despigmentada (amarelada) com aspecto pulverulento em
sal e pimenta.
Em um caso nosso houve atrofia ocular com hipotensão, microftalmia secundária, catara­
ta, cegueira, poliose e alopecia (Fig. 1).

MANIFESTAÇÕES EXTRAOCULARES: pleocitose do líquido cefalorraquidiano, (normalmente 4 cé­


lulas por mm3) em sua maioria linfócitos. Há um aumento do número de células, indicativo
do processo inflamatório, chegando entre 10 e 100 células por mm3. Há um predomínio de
linfócitos e aumento de albumina e valores normais de proteínas.
DISACUSIA: mais de 70% dos doentes têm disacusia que pode ser em alguns casos o único
sintoma prodrômico. Este problema auditivo pode durar anos e são acufenos permanentes
e hipoacusias de alta frequência. O exame audiométrico pode revelar melhor estes sintomas.
MANIFESTAÇÕES DERMATOLÓGICAS: vitiligo (descoramento da pele), poliose (cílios brancos) e
alopecia. São mais frequentes na região periocular (cílios, sobrancelhas e pele das pálpebras).
Podem aparecer em fases precoces, mas são mais frequentes e visíveis em fases tardias.
22 Semiologia Básica em Oftalmologia

Fig.1 Doença de Vogt-Koyanagi-Harada. À esquerda, veêm-se poliose nos cílios, atrofia e


cegueira binocular. À direita, notam-se manchas de vitiligo e alopecia. (Casos da Clínica Prof.
Moreira).

Exames complementares
■ Punção lombar
■ Audiometria
■ Angiofluoresceinografia
■ Ecografia ocular
■ Antígeno S retinal (resposta imune antígeno-específica)
■ Antígeno de histocompatibilidade (HLA DR4 e DRW53)

Tratamento
r

E de fundamental importância. Deve ser sistêmico, precoce, agressivo e prolongado (6 a 12


meses).
São usados corticoides em altas doses (prednisona oral entre 80 e 120 mg/dia). Pode ser
realizada pulsoterapia intravenosa.
Outras alternativas terapêuticas: imunossupressores de preferência ciclosporina A.

TRATAMENTO TÓPICO: atropina a \% e corticoides potentes em forma de colírio. Devem ser ava­
liados periodicamente e sua manutenção ou intensidade vai depender da atividade inflamató­
ria do segmento anterior. Avaliar pressão intraocular, exsudação e aderências da úvea anterior.

A síndrome de Vogt-Koyamagi-Harada é doença grave de evolução variável e o tratamento


tardio pode ser pouco eficiente para evitar sequelas graves e inclusive a cegueira binocular.

RUBÉOLA MATERNA
A rubéola materna no primeiro trimestre de gravidez pode levar à presença de graves lesões
oculares e auditivas. Quando a rubéola se inicia muito cedo na gestação não há imunidade fe­
tal para prevenir as lesões. É também necessário lembrar que para o vírus entrar no cristalino é
preciso ter acesso através dos vasos hialóideos que no primeiro trimestre de gravidez nutrem
O Consultório Básico de Oftalmologia e Anamnese 23

o cristalino. Dessa forma, a ação teratogênica do vírus da rubéola produz o envolvimento de


vários órgãos e sistemas, podendo causar aborto precoce, prematuridade, malformações car­
díacas, surdez, anomalias dentárias, retardo mental e do crescimento, microcefalia, defeitos
ósseos, trombocitopenia, púrpura, hepatoesplenomegalia, icterícia e catarata. Esses pacien­
tes abrigam o vírus e o excretam por um longo período. Tem-se recolhido vírus vivos dentro
do cristalino 35 meses após o nascimento, e na urina 29 anos após a infecção congênita por
rubéola.
As lesões oculares são amplas e sérias. Turvação de córnea por envolvimento do endotélio
que pode retardar a formação da membrana de Descemet. A catarata ocorre entre a 2- e 1l â
semanas de gestação. O estroma da íris é atrófico; o músculo iridodilatador é hipoplásico ou
ausente (o que impede a dilatação da pupila por midriático). Há necrose do epitélio pigmentar
da íris e do corpo ciliar (a íris toma uma coloração azulada). Existe uma iridociclite subclínica
que perdura até o período neonatal, o que pode levar a uma grave inflamação após inter­
venções cirúrgicas como a da catarata congênita e glaucoma congênito. Infiltração celular na
coroide e alterações do epitélio pigmentar da retina causam uma modificação no aspecto of-
talmoscópico da retina (retina em sal e pimenta). As lesões na retina produzem redução visual
mesmo após a cirurgia exitosa da catarata, a perspectiva visual é inferior a obtida nos casos
de catarata congênita isolada. Microftalmia e microcórnea podem ocorrer e com frequência
podem se associar a estrabismo, nistagmo e alta miopia (Fig. 2).

Figs. 2 (A-C) A. Catarata rubeólica: Microftalmia discreta, irís azulada, opacidade de cristalino
(leucocoria), cílios alongados. B. Catarata rubeólica monocular (OE). Microftalmia, irís azulada
hipoplásica, catarata (leucocoria). C. Criança operada de catarata congênita aos 3 meses, usando,
sem problemas, correção óptica com óculos. (Casos do Hospital de Olhos do Paraná.)
24 | Semiologia Básica em Oftalmologia

A catarata e microftalmia acompanhadas de surdez são muito relevantes e chamam a aten­


ção dos oftalmologistas e otologistas. Apesar de um prognóstico pior para cirurgia da catarata
rubeólica devemos fazer a cirurgia nos três primeiros meses de nascimento para evitarmos a
ambliopia privacional que é irreversível. Esta cirurgia não pode sofrer retardos e deverá ser
realizada por médicos experientes que manejem a facectomia a vitrectomia anterior e cap-
sulectomias posterior e anterior com eficiência, pois em outras condições poderemos ter
inflamação intraocular com opacidades secundárias e glaucoma. A necessidade de medicação
cortisônica e anti-hipertensiva ocular ao lado de avaliações seguidas pode previnir a eventual
perda visual e até do globo ocular.
Os otologistas têm algumas condições para estimular a audição e utilizar aparelhos preco­
cemente para obter alguma melhora. Em caso de diagnóstico de surdez através do potencial
auditivo evocado e audiometria com obtenção do gráfico da audição do recém-nato, pode-se
avaliar a importância da lesão.

DEGENERAÇÕES PIGMENTARES DA RETINA E SURDEZ


As degenerações pigmentares da retina são processos genéticos que em alguns casos estão
associados às lesões cocleares proporcionando síndromes que apresentam perda auditiva e
por vezes completa surdez. De 13 a 25% dos pacientes com retinose pigmentar apresentam
surdez.
Síndrome de Usher tem as seguintes alterações: retinose pigmentar, déficit auditivo con­
gênito e alterações vestibulares.
■ Existem várias síndromes semelhantes anteriormente descritas, causando ao paciente, ge­
ralmente após a segunda década de vida, séria dificuldade visual e surdez associadas, que
levam a grandes problemas de comunicação com o meio e seu aprendizado se torna difícil.
■ Amaurose congênita de Leber: nesta síndrome encontramos distrofia tapetorretiniana, nis-
tagmo e redução progressiva da visão.
■ Cerca de 20% dos portadores de retinose pigmentar têm problema no sistema coclear com
baixa audição, portanto, a pesquisa de problemas auditivos em todos os pacientes portado­
res de degenerações hereditárias da retina devem ter oportunidade de exame da audição e
busca da correção ou melhora deste quadro.

Na síndrome de Alport além de malformações da face há hipoacusia intensa e catarata.


O aconselhamento genético é importante para evitar os casamentos consanguíneos nos
casos de genes recessivos e a reincidência das lesões em órgãos de tal importância como os
encarregados da visão e da audição, que podem se apresentar em outros filhos e descenden­
tes.
O Consultório Básico de Oftalmologia e Anamnese 25

AVALIAÇÕES ANATÔMICAS E LESÕES MESENCEFÁLICAS, PONTINAS E


DOS FASCÍCULOS DOS NERVOS MOTORES OCULARES
As lesões dessas estruturas são mais frequentemente encontradas nos problemas vasculares,
tumorais, neuropatias desmielinizantes ou traumas cefálicos. Elas tem sinais e sintomas de­
pendentes da altura em que o tronco cerebral foi lesionado, produzindo síndromes caracterís­
ticas. As principais são síndrome de Weber, síndrome de Foville, síndrome de Millard Gubler,
síndrome de Parinaud e paralisia internuclear.
Na fase aguda da lesão troncular causada por trauma (acidente de trânsito com desloca­
mento da cabeça em chicote para trás) o paciente se encontra agitado, semicomatoso emitin­
do sons desconexos e miose bilateral. Ao exame podemos encontrar alteração motora ocular
associada a paralisias no dimidio contralateral (paralisia alterna).
■ Síndrome de Weber: paralisia de III par e hemiplegia contralateral.
■ Síndrome de Foville: desvio conjugado com paralisia do reto lateral e eventualmente para­
lisia facial com hipoestesia do mesmo lado.
■ Síndrome de Millard Gubler: paralisia de VI par com hemiplegia contralateral.
■ Síndrome de Parinaud: impossibilidade de olhar para cima.
■ Paralisia internuclear: lesiona o feixe ascendente entre o núcleo para-abducente e o núcleo
do III par. Apresenta atividade normal de adução na convergência e paralisia do reto medial
do lado da lesão da mirada lateral para o lado lesionado.

CENTROS SUPRANUCLEARES RESPONSÁVEIS PELOS MOVIMENTOS


BINOCULARES CONJUGADOS
Movimentos conjugados horizontais: os movimentos conjugados horizontais binoculares es­
tão localizados na região dorsal da ponte dentro do núcleo do sexto nervo com o qual se rela­
ciona. A lesão do núcleo na mirada conjugada horizontal causa paralisia da mirada ipsilateral,
propiciando um desvio conjugado dos olhos para o lado oposto. A causa vascular é a mais
frequente e nessas ocasiões a falha circulatória também no núcleo do nervo facial e porções
do núcleo do nervo trigêmeo propiciam paralisia facial ipsilateral e problemas de sensibilidade
da hemiface do mesmo lado (síndrome de Foville).
Movimentos conjugados verticais: os centros da mirada conjugada vertical dos olhos es­
tão localizados junto à face rostral do núcleo do terceiro par no pedúnculo. Neste local eles
recebem sinal que vem de baixo através do fascículo longitudinal medial e também sinais
diretos que provem das vias supranucleares. As vias de movimentos para cima e para baixo
são separadas no pedúnculo. As vias para olhar para cima são dorsais e cruzam na comissura
posterior. O núcleo de Cajal tem um importante papel no olhar para cima.
Lesões nessas regiões podem produzir paralisia do olhar para cima (síndrome de Parinaud)
e na maioria das vezes têm origem vascular.
26 Semiologia Básica em Oftalmologia

CONEXÕES INTERNUCLEARES, PARALISIAS INTERNUCLEARES


HORIZONTAIS
O fascículo longitudinal medial proporciona a principal comunicação entre o centro pontino
de olhar horizontal e o centro peduncular do olhar vertical que por sua vez estimula o subcentro
do músculo reto medial do lado oposto. A lesão desta área geralmente é causada por doença
desmielinizante em jovens e por microangiopatias em idosos. Entretanto, podem ter como
causa tumores, infecções e malformações arteriovenosas. Em alguns casos podem ser bilateral
principalmente em doenças desmielinizantes.

NERVO OCULOMOTOR (TERCEIRO PAR)


O nervo oculomotor é formado por fibras que provêm do complexo oculomotor que se loca­
liza no mesencefálo em uma coluna de subnúcleos, cada um deles oferecendo fibras nervosas
para ação de um dos músculos inervados pelo terceiro par. Os subnúcleos que inervam o oblí­
quo inferior, o reto inferior e o reto medial não se cruzam. O músculo reto superior recebe
inervação cruzada do subnúcleo situado no mesencéfalo contralateral. O núcleo de Edinger
Westphal (parassimpático) inerva a pupila ipsilateral produzindo miose.
As lesões do núcleo ou de um de seus subnúcleos são relativamente raras. Na lesão nuclear
pode haver ptose palpebral bilateral, mas também pode faltar esta ptose. No trajeto intrape-
duncular ele cruza o núcleo vermelho cuja lesão produz tremor rubral.
Lesões do fascículo do terceiro par podem acontecer em toda a extensão do seu trajeto
na base do crânio e dentro do seio cavernoso. Na maioria das vezes essa lesões têm origem
vascular ou metastática de tumores. A paralisia do terceiro par pode ser acompanhada por
outros sintomas neurológicos, tais como ataxia cerebelar (síndrome de Natehnagel) perda da
sensibilidade contralateral e tremor rubral (síndrome de Benedikt). Mais anteriormente pode
envolver o pedúnculo cerebral produzindo paralisia espástica do dimidio contralateral (sín­
drome de Weber).
Após sair do neuroeixo passa entre a artéria cerebral posterior e cerebelar superior e se
junta paralelamente à artéria comunicante posterior onde pode sofrer compressão de aneuris­
ma desta última. Esta causa é frequente na paralisia do terceiro par em adultos jovens. Neste
caso sempre é acompanhada de midríase pupilar por lesão do parassimpático e dor. Massa
tumoral ou principalmente hemorragia extradural pode produzir aumento agudo da pressão
intracraniana supratentorial com herniação do úncus através do buraco do tentório e com­
primir as fibras parassimpáticas do oculomotor com midríase consequente do mesmo lado
da lesão. Em virtude da frequência dos traumas cefálicos no trânsito e indústria a anisocoria
consequente e eventual deve ser buscada e alertar para a gravidade do problema que necessita
atendimento médico de urgência.
O terceiro par em seu trajeto para a frente, entra na parede lateral do seio cavernoso se­
guindo junto ao quarto par (nervo troclear) onde pode ser lesionado por fístula carotidacaver-
nosa e aneurisma da carótida.
O Consultório Básico de Oftalmologia e Anamnese 27

Tumores particularmente, meningiomas, neurilemomas, hemangiomas, apoplexia da pi­


tuitária, processos infecciosos e granulomatosos, tais como herpes-zóster e síndrome de Tolo-
sa-Hunt. Nesses casos podem acontecer outros sintomas causados por lesões no nervo trocle-
ar e também no nervo trigêmeo, causando perda da sensibilidade facial.
Em pessoas idosas a microangiopatia pode produzir infarto do nervo oculomotor, geral­
mente sem alteração pupilar e, apesar de frequentemente essas pessoas serem diabéticas,
essa afecção não é a causa inicial desta patologia.
Na órbita o terceiro par penetra pela fissura orbital superior e se divide em dois ramos: um
superior que inerva o músculo levantador da pálpebra superior e o músculo reto superior. O
ramo inferior inerva os músculos reto medial, reto inferior, oblíquo inferior e fornece as fibras
do parassimpático que inervam a pupila e o músculo ciliar. As causas mais frequente da lesão
do terceiro par na órbita são os traumatismos na face, infecções virais e tumores.

NERVO TROCLEAR (QUARTO PAR)


O núcleo do IV par fica na extremidade caudal do complexo oculomotor dentro dos pedúncu-
r

los cerebrais. E rara a paralisia relacionada com a lesão do núcleo do IV par. Tem como cau-
r

sa mais frequente problemas vasculares, traumáticos e doenças desmilienizantes. E o único


nervo motor que emerge do neuroeixo na face dorsal e tem necessidade de contorná-lo para
tomar o mesmo sentido do terceiro par. As suas fibras fazem decussação completa. Somente
traumas que atingem a face dorsal do mesencéfalo podem atingi-lo e produzir paralisia bila­
teral. Seu trajeto até a órbita é longo e ele segue junto com o terceiro par inclusive dentro na
parede do seio cavernoso. Já na órbita cirurgias próximas ao vértice orbitário podem atingi-lo
produzindo paralisias irreversíveis. Paralisia do músculo oblíquo superior, ou mesmo lesão de
sua tróclea pode levar à desvio vertical do olho para cima e de movimento de torção condu­
zindo o paciente a ter diplopia e tortícolis característicos. O desvio vertical para cima é em
virtude da ação de seu antagonista o oblíquo inferior indene. Para o diagnóstico, o desvio ver­
tical da paralisia não é um estrabismo muito notado, entretanto, ao desviarmos a cabeça para
o lado do músculo lesionado aumenta este desvio vertical (sinal de Bielchovski).

PARALISIA DO VI PAR NERVO (ABDUCENTE)


Tem como característica a paralisia de abdução e estrabismo convergente incomitante que
aumenta o desvio na mirada para o lado do músculo paralítico. Este desvio é mais notado
quando o paciente fixa um ponto a frente e faz-se a oclusão alternada dos olhos. Quando o
VI par é afetado dentro do tronco cerebral, pode estar acontecendo doença desmielinizante,
especialmente em jovens ou lesão vascular em idosos. Em crianças pode ser causada por glio-
ma na ponte cerebral; neste caso pode haver paralisia lateral de abdução. Esta paralisia pode
estar associada a paralisia de VII par (paralisia do facial) e redução da sensibilidade facial com
hemiparesia do dimidio contralateral (síndrome de Millard Gluber).
28 Semiologia Básica em Oftalmologia

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ders. Philadelphia: Lippincott Williams & Wilkins, 2005 p. 1133-1173.
Walsh and Hoyt's, Clinical Neuro - Ophthalmology, 6th ed., Vol.I, Chapter 23, Multiple Sclerosis p. 1133-1173. Philadelphia:
Lippincott Williams & Wilkins, 2005.

Nota: Recomendamos, para aprofundamento na matéria; Duke Elder, S. Medical History In em of Ophthalmology, vol.
XII. P. 5 -6 S y s t
f-M

Avaliação da Visão Central

OTÁVIO SIQUEIRA BISNETO

ACUIDADE VISUAL
A medida da acuidade visual é, sem dúvida, a forma mais comum de avaliação da função visual
nos consultórios oftalmológicos de todo o mundo.
Primariamente permite uma boa avaliação tanto da integridade do sistema óptico ocular
quanto da via neurológica da visão subsequente à fóvea, já que para uma boa acuidade visual
é necessário que ambos os sistemas funcionem apropriadamente.
A acuidade visual é utilizada para demonstrar o sta tu s da visão central, sendo fundamen­
tal para tarefas rotineiras de um oftalmologista, como prescrição de óculos ou adaptação de
lentes de contato. Do ponto de vista funcional, a acuidade visual é fundamental nas tarefas
do dia a dia de qualquer pessoa como leitura, reconhecimento de outras pessoas ou qualquer
atividade que necessite de visão central.
A acuidade visual representa o mínimo ângulo de resolução (MAR) de determinado objeto
espacial definido, sendo o fundamento teórico para a construção de todas a escalas com a
finalidade de quantificar a acuidade visual.
O mínimo ângulo de resolução define o poder de resolução de um olho humano, que é de
cerca de 1 min de grau (1/60 de grau). Isso significa que dois pontos, para serem distinguidos
como sendo efetivamente dois pontos (e não um único), devem estar separados, quando to­
mamos o olho como vértice, por um ângulo de no mínimo 1 min de grau.
Existem teoricamente três tipos de medida de acuidade visual: acuidade de detecção,
acuidade de resolução e acuidade de identificação.
A acuidade de detecção refere-se ao menor estímulo visual provocado por um objeto ou
parte de um elemento que pode ser distinguida de um campo uniforme.
A acuidade de resolução determina a menor quantidade de detalhe espacial que possibili­
ta a distinção de um objeto de outro ao seu lado. Em termos práticos seria a menor distância

29
30 Semiologia Básica em Oftalmologia

entre dois objetos que permite à fóvea identificá-los como dois objetos distintos e não somen­
te um. Pode ser testada através de listras claras e escuras alternadas, em que o observador
deve relatar a orientação das listras, se verticais ou horizontais.
A acuidade de identificação, por sua vez, é representada pelo menor detalhe espacial que
r

possibilita o reconhecimento de um objeto, como por exemplo, uma letra. E o tipo de medida
de acuidade visual que se realiza nos consultórios através das tabelas de optótipos. Nestas
tabelas a representação da acuidade visual é realizada através do mínimo ângulo de resolução,
ou da anotação de Snellen, que por sua vez é também baseada no mínimo ângulo de resolu­
ção. Na maioria das tabelas de acuidade visual, o mínimo ângulo de resolução é determinado
pela espessura de cada elemento da letra, sendo que cada letra tem o seu tamanho total defi­
nido por 5 vezes esta espessura; na tabela de Snellen por exemplo, a visão “normal” é deter­
minada pelo mínimo ângulo de resolução de 1 min de arco, com o tamanho total da letra de 5
min de arco. Esta forma de construção das tabelas de acuidade visual é basicamente a mesma
desde Snellen em 1862, sendo ainda hoje a forma mais comum de avaliação da acuidade vi­
sual. Conhecida como anotação de Snellen, a acuidade visual é representada por uma fração,
onde o numerador é a distância em que o exame está sendo realizado, usualmente 20 pés ou
6 m, e o denominador a distância que um observador “normal” conseguiria ver a letra, sendo
determinado então que a fração 20/20 representa a visão “normal”. Ressalta-se que o padrão
de visão “normal” como 20/20 foi tomado há mais de 100 anos, porém, sabe-se hoje que prin­
cipalmente indivíduos abaixo de 50 anos de idade, possuem visão melhor que 20/20, sendo
motivo de grande discussão, qual seria portanto, o real valor da chamada visão “normal”.
Outros desenhos de tabela de medida da acuidade visual são disponíveis, representando
uma evolução da tabela de Snellen. Um exemplo é a tabela de Bailey-Lovie (Fig. 1). São várias
as vantagens em relação a tabela de Snellen. As letras utilizadas são igualmente legíveis entre
si, o número de letras em cada linha é o mesmo, o espaço entre as letras é proporcional ao
tamanho da letra, e a diferença de tamanho entre as letras de linhas diferentes é calculado em
escala logarítmica. Este tipo de tabela permite a aferição da acuidade visual em notação de
Snellen, MAR ou logMAR. Por representar uma medida mais fidedigna da acuidade visual, este

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H V Z D S
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C Z S H N
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U Fig. 1 Tabela de Bailey-Lovie.


Avaliação da Visão Central 31

tipo de tabela popularizou-se ao ser utilizada no conhecido estudo The Ecirly Treatment Diabetic
Retinopathy Stucly, sendo até hoje a tabela utilizada na maioria dos estudos multicêntricos do
National Eye Institute.
Recentemente, a medida da acuidade visual tem sido tema de discussões, pois sabe-se que
diversos fatores podem influenciar os resultados, tornando muito baixa a sua reprodutibilida-
de. O próprio desenvolvimento da cirurgia refrativa e do exame de frentes de onda mostrou a
importância do tema, ficando claro a diferença entre exames de alto e baixo contraste, com ou
sem ofuscamento, influência do tamanho pupilar no exame, e até mesmo detalhes como quais
são as letras utilizadas no teste, já que, por exemplo, a letra “o” ou “z” é muito mais fácil de
ser identificada que um “h” que pode facilmente ser confundido com um “n” .
Assim, estudos que analisem a iluminação, o contraste dos optótipos em relação ao fundo,
o tipo das letras utilizadas, e até mesmo o tempo disponível para a leitura, ou a velocidade de
leitura, devem contribuir de forma significativa para o aprimoramento do teste de acuidade
visual.
Diversas outras formas de medida da acuidade visual foram desenvolvidas para aplicação
em crianças ou pessoas com alguma dificuldade para a aplicação da tabela de Snellen conven­
cional. São bons exemplos as tabelas com figuras, o conhecido “E-game”, os testes do olhar
preferencial, o teste do nistagmo optocinético, ou mesmo o potencial visual evocado. Recen­
temente estão disponíveis programas de computador que reúnem vários modelos de tabelas
e testes que podem ser utilizados de acordo com cada caso em uma tela de computador posi­
cionada diante do paciente para a realização do exame.

ACUIDADE VISUAL PARA PERTO


A acuidade visual para perto é testada para avaliar a visão de leitura. Deve ser testada em
pacientes maiores de 40 anos de idade, hipermetropes ou com queixa de visão para perto.
Existem várias tabelas que podem ser utilizadas. Estas tabelas devem ser colocadas a uma
distância de 33-40 cm do paciente. O resultado desta aferição é a menor linha que o paciente
pode ler e pode ser expresso de três maneiras: 1) Snellen equivalente; 2) Jaeger (variando de
J 1 a J6) e 3) Sloan que varia de 1,25 M a 0,37 M.
A tabela de Jaeger não obedece progressão lógica e nenhum cálculo científico, apenas re­
duz progressivamente o tamanho das letras. A anotação em escala M Sloan é a mais recomen­
dada por seguir um padrão lógico, porém a tabela de Jaeger é a mais utilizada pela maioria
dos oftalmologistas.

VISÃO DE CORES
História
O interesse e a curiosidade sobre o fenômeno da visão de cores remontam à Antiguidade, com
especulações feitas por vários filósofos e cientistas, porém, é apenas no início do século XIX,
que Young e Helmholtz, apresentam a teoria tricromática, em que afirmam que o olho huma­
no possui três tipos diferentes de receptores visuais, os cones, sensíveis às luzes vermelha,
32 Semiologia Básica em Oftalmologia

verde e azul. No entanto, a teoria tricromática não conseguia explicar a variedade de fenôme­
nos cromáticos encontrados na natureza. Em particular ela falhava ao explicar por que certas
combinações de cores cancelavam umas às outras e por que com outras combinações isso não
ocorria. Assim, em 1878, o fisiologista alemão Ewald Hering propôs a teoria da oponência das
cores, que sugeria a existência de três canais de cores oponentes, mutuamente inibitórios:
vermelho-verde, azul-amarelo e branco-preto.
Essas duas teorias formaram a base do entendimento da visão de cores. Desde então, o
estudo da sensibilidade cromática vem crescendo ao longo dos anos, com descobertas e avan­
ços importantes.

Avaliação da sensibilidade cromática


Nos defeitos de visão de cores, podem estar afetados os três atributos que caracterizam a sen­
sação de cor: tom, saturação e brilho, em graus variáveis.
Os testes de visão de cores são usados para os seguintes fins:
■ triagem;
■ caracterizar o tipo de defeito;
■ diferenciar entre defeito congênito e adquirido;
■ avaliar a gravidade do defeito;
■ para orientar testes vocacionais.

Os testes para visão de cores obedecem à padronização de reprodução de cores propos­


ta pela Comissão Internacional de Iluminação Comission Internationale de FÉclairage - CIE), de
1932. Essa comissão adotou um método colorimétrico baseado nas especificações de cores
em um sistema cartesiano de três coordenadas, o chamado Diagrama de Cromaticidade ou
Espaço de Cores da CIE de 1931.
O diagnóstico e a classificação de um defeito da sensibilidade cromática são tarefas longas
e exigem experiência.
Estima-se que existam cerca de 200 métodos desenvolvidos ao longo dos anos, mas, atual­
mente, apenas cerca de 20 testes são comumente encontrados.
Esses testes são disponibilizados de diferentes formas, sendo as principais as pranchas
pseudoisocromáticas, os testes de arranjo ou ordenamento de matizes, de equalização, de
nomeação e os computadorizados, entre outros.
Não existe um teste de visão de cores ideal, aplicável para todas as propostas, que forneça
diagnóstico exato. Assim, o uso de dois ou três testes independentes fornece um resultado
mais confiável, embora isso nem sempre seja possível.
A avaliação do senso cromático deve ser feita sempre de um olho por vez, pois podem
ocorrer diferenças de desempenho entre os olhos quando se pesquisam alterações adquiridas,
principalmente.

Iluminação para testes de visão de cores


A avaliação da sensibilidade cromática só tem valor científico se realizada sob condições de
iluminação padronizadas. A CIE padronizou, em 1931, os tipos básicos de fontes luminosas,
Avaliação da Visão Central | 33

chamadas iluminantes A, B, C, D55 e D65. Essa padronização é baseada na temperatura de


cor (ou cromaticidade) de cada uma das diferentes fontes luminosas. Temperatura de cor é
a medida científica do equilíbrio dos comprimentos de onda encontrados em qualquer luz
“branca”. Originalmente, o termo é utilizado para descrever a “brancura” da luz da lâmpada
incandescente. A temperatura da cor está diretamente relacionada com a temperatura física
do filamento nas lâmpadas incandescentes, de modo que a escala de temperatura Kelvin (I<)
é utilizada para descrever a temperatura da cor. A cromaticidade é expressa em Kelvins (K) ou
como coordenadas “x” e “y” no Diagrama de Cromaticidade da CIE.
Preconiza-se o uso da lâmpada de Macbeth (Gretag Macbeth Corporation), que proporcio­
na uma temperatura de cor de 6.740° Kelvin, que corresponde à fonte iluminante C, represen­
tativa da luz do dia, de acordo com a padronização da CIE. Porém, recentemente essa fonte
tornou-se de difícil obtenção e alto custo, o que levou os pesquisadores a utilizarem uma
alternativa que simula as condições de iluminação proporcionadas por ela: uma fonte de luz
incandescente (lâmpada de 100 watts), com óculos de filtros azuis, produzidos pela própria
Macbeth, fornecendo uma iluminância (medida da densidade de fluxo luminoso incidente em
uma superfície padronizada) de 500 lux na superfície de teste.

Pranchas pseudoisocromáticas (PIC)


Stilling, em 1878, foi o primeiro a publicar uma série de pranchas pseudoisocromáticas.
Existem diversas variantes destes testes, nos quais observa-se, geralmente, um objeto
delineado por uma diferença de cores, com um fundo de igual reflectância de luminosidade,
para evitar vestígios não coloridos. O objeto pode ser um número, uma letra, um padrão a ser
traçado, um símbolo ou um optótipo, como o C de Landolt ou o E para analfabetos.
As PIC podem se apresentar de diferentes formas, com diferentes propósitos.

PRANCHAS DE DEMONSTRAÇÃO: neste tipo de prancha a figura é apresentada com uma lumi­
nosidade de contraste significante em relação ao fundo, assim, a sensibilidade cromática não
é necessária para uma resposta correta.
PRANCHAS DE DESAPARECIMENTO (OU MASCARAMENTO): aqui, o objeto é construído com uma
diferença de cores em relação ao fundo, porém, se sua cor estiver próxima ou no eixo de con­
fusão de um indivíduo com visão dicromática, ele não será visível.
PRANCHAS COMBINADAS: esse tipo de prancha possui dois objetos definidos, um do tipo de­
monstrativo e outro mascarado, com os das pranchas de desaparecimento. Assim, um indiví­
duo normal conseguirá ver ambos, enquanto um dicromata verá apenas o objeto com diferen­
ça de contraste, ou, do tipo demonstrativo.
PRANCHAS DIAGNÓSTICAS: essas pranchas são basicamente do tipo de desaparecimento (mas­
caradas), mas, com duas figuras, uma para ser confundida por protanômalos e outra para ser
confundida por deuteranômalos. As cores escolhidas fazem parte da porção do círculo de co­
res onde as diferenças entre protans e deutans são mais pronunciadas.
PRANCHAS QUANTITATIVAS: aqui, as pranchas são ordenadas em séries em que as cores vão se
diferenciando progressivamente, com o objetivo de quantificar a gravidade do defeito.
PRANCHAS ESCONDIDAS: são desenvolvidas para serem identificadas somente por indivíduos
com deficiência da visão cromática. Nesse caso, as figuras são construídas com cores pertencen-
34 Semiologia Básica em Oftalmologia

tes a um eixo de confusão, enquanto o fundo é construído com cores pertencentes a outro eixo
de confusão, tornando possível sua identificação pelos dicromatas. Já um indivíduo normal vê
apenas uma variedade de cores diferentes, sem diferenciar qualquer figura do fundo.

TESTE DE ISHIHARA
Sem dúvida, é o teste de pranchas mais conhecido e usado no mundo. Foi publicado pela pri­
meira vez em 1906 e foi reproduzido em várias edições, ao longo dos anos. Possui pranchas de
demonstração, mascaradas, escondidas e diagnósticas. As edições mais usadas possuem nú­
meros e linhas traçadas como objetos a serem identificados. Atualmente, estão disponíveis as
versões de 24 e de 38 pranchas (Figs. 2 e 3) Através dos anos, têm sido feitas várias avaliações
sobre a eficácia do teste de Ishihara, que passou por aperfeiçoamentos, graças às modernas
técnicas de diferenciação e reprodução de cores.
Estudos mostram que ele continua sendo o exame mais eficaz para uma rápida iden­
tificação das deficiências congênitas para visão de cores. Apesar de ser desenvolvido para
detecção e diagnóstico das alterações congênitas da visão de cores, o teste de Ishihara
também pode ser usado na detecção de defeitos adquiridos da visão de cores. O teste de
Ishihara contém também pranchas que visam diferenciar protanomalias de deuteranomalias.
Não possui pranchas para identificação de tritanomalias congênitas, mas, pacientes com de­
ficiências adquiridas graves tipo III de Verriest podem cometer erros semelhantes àqueles
com deficiência vermelho-verde. Além disso, esse teste não consegue fornecer uma avalia­
ção quantitativa da deficiência apresentada, pois não possui pranchas para mensuração da
gravidade do defeito.

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Fig. 3 Exemplo de prancha utilizada no teste


Fig.2 Teste de Ishihara. de Ishihara.
Avaliação da Visão Central 35

PRANCHAS PSEUDOISOCROMÁTICAS DA A M E R I C A N O P T I C A L H A R D Y -

R A N D - R I T T L E R ( A O - H R R )

Teste atualmente publicado pela Richmond Products, tem como objetivo detectar deficiências
congênitas do tipo protan, deutan, tritan e tetrartan e estimar a gravidade do defeito. O termo
tetrartan vem da suposta consideração de que possa haver um quarto tipo de defeito congê­
nito, envolvendo um possível fotopigmento com absorção na região amarela do espectro. As
pranchas para detectar alterações do tipo tetrartan são supérfluas. Esse teste já passou por
quatro edições (1955, 1957, 1996 e 2002). A mais recente, revisada por Bailey e Neitz, está
melhor ajustada às linhas de confusão e possui as pranchas de detecção de defeitos protan e
deutan severos com menos saturação que a versão original. Essa foi uma estratégia usada para
corrigir o fenômeno que ocorria com a versão original, em que pacientes dicromatas com de­
ficiências graves dificilmente cometiam erros nas pranchas designadas para detectá-los.
A principal crítica ao teste AO-HRR é a sua falha em diagnosticar deficiências vermelho-
verde com acurácia, pois pessoas com sensibilidade cromática normal podem ser classificadas
como deficientes, fornecendo resultados falso-positivos.
O contrário também pode ocorrer, embora, com menor frequência.
Porém, suas vantagens fazem com que esse teste seja largamente usado, junto com outros
testes destinados a triagens, como o Ishihara. Entre elas, podemos citar a presença de pran­
chas destinadas à detecção de defeitos azul-amarelo, as quais raramente são encontradas nas
outras PIC; os símbolos utilizados são fáceis de ensinar a crianças, analfabetos, ou a pessoas
que tenham alfabetização com notações de estilos diferentes (chineses, árabes, etc.); é o teste
do tipo PIC mais sensível para diferenciar e classificar os defeitos deutan e protan.

PRANCHAS PSEUDOISOCROMÁTICAS S T A N D A R D (SPP)


Esse teste é publicado em dois volumes. O volume 1 é destinado a examinar pacientes com
alterações congênitas da sensibilidade cromática. Contém pranchas de demonstração, combi­
nação, de mascaramento e diagnósticas. Assim como o Ishihara, é adequado para deficiências
do tipo vermelho-verde e não fornece avaliação quantitativa do defeito.
O volume 2 foi desenvolvido para a detecção de defeitos adquiridos da sensibilidade cro­
mática, com pranchas que testam defeitos vermelho-verde, azul-amarelo e escotópicos.
Esse teste alcançou um grau de aceitação importante, sendo um dos mais usados nos es­
tudos dos defeitos adquiridos da sensibilidade cromática.

OUTROS TESTES DE PRANCHAS PSEUDOISOCROMÁTICAS (PIC)


Há uma variedade de outros testes do tipo PIC, porém, eles não forneceram vantagens su­
ficientes sobre os outros testes já mencionados. Nenhum deles superou o teste de Ishihara
para screening, o teste AO-HRR para diagnóstico quantitativo e o teste SPP parte 2 para triar
defeitos adquiridos.
36 | Semiologia Básica em Oftalmologia

Podemos citar o teste CVTME (Colour Vision TestingMade Easy), desenvolvido especialmen­
te para uso em crianças, devido à facilidade de identificação de seus símbolos (Fig. 4)
Como outras opções, temos: teste de Dvorine, produzido nos Estados Unidos em 1944
e atualizado em 1953, para defeitos vermelho-verde; teste TMC-Tokyo Medicai College, pro­
duzido em 1954, com pranchas para detectar defeitos vermelho-verde e azul-amarelo; teste
de Farnsworth “F2” , de 1955, que possui pranchas para detecção de tritanopia, mas foi muito
usado para triagem dos defeitos vermelho-verde, tanto congênitos quanto adquiridos.

Testes de arranjo ou de ordenamento de matizes


T e s t e d e F a m s w o r t h - M u n s e l l 1 0 0 H u e ( F M 1 0 0 )

Farnsworth desenvolveu testes de cores com papéis coloridos extraídos do livro de cores de
Munsell, os quais diferem somente no tom ou matiz, tendo saturação e brilho constantes
quando analisadas por indivíduos normais. A grande vantagem do uso desse teste é que ele
pode ser aplicado em indivíduos com deficiências congênitas ou adquiridas. Porém, seu uso
no estudo das deficiências congênitas é limitado, pois nem sempre consegue classificar o de­
feito em protan ou deutan. O seu valor no estudo das deficiências adquiridas é notável, prin­
cipalmente para efeito de seguimento.
Outra aplicação importante do teste FM 100 Hue é promover a classificação de indivíduos
com visão cromática normal em grupos que possuem discriminação cromática alta, média e
baixa, fator extremamente importante para o desempenho profissional em alguns setores es­
pecíficos, como nas indústrias têxteis e de tintas.
O teste FM 100 Hue possui 85 peças, divididas em 4 caixas de madeira. Cada caixa con­
tém duas cores fixas de referência, no início e no fim da sequência (Fig. 5). As peças móveis
(numeradas) são as que ficam entre as peças de referência e devem ser recolocadas na ordem
correta, uma vez extraídas da caixa e misturadas entre si, ao iniciar-se o teste. A divisão de
cores das caixas é a seguinte:
■ Caixa 1: peças 85 a 21 (rosa, passa por alaranjado, até amarelo).
■ Caixa 2: peças 22 a 42 (amarelo a azul-esverdeado).
■ Caixa 3: peças 43 a 63 (azul-esverdeado a azul-púpura).
■ Caixa 4: peças 64 a 84 (azul a púrpura-avermelhado, até rosa)..
Avaliação da Visão Central 37

Fig.5 Teste de Farnsw orth-M unsell 100 Hue


(FM 100).

Farnsworth elaborou um método de avaliar o escore de erros, atribuindo um escore a


cada cor, que é a soma da diferença absoluta entre o número de uma cor e os das cores co­
locadas ao lado dela. As cores colocadas na sequência correta recebem o escore 2. Tomemos
como exemplo uma sequência de peças supostamente arranjadas por um paciente: 1 ,2 , 3,
5, 4, 8, 7, 6, 9. Para sabermos os escores de uma peça (escore parcial), devemos proceder da
seguinte forma: para a peça 2 o escore é (2-1) + (3-2) = 2 (normal), ou seja, está colocada
no lugar correto, entre as peças 1 e 3. Para a peça 8, o escore é (8-4) + (8-7) = 5, sendo o es­
core parcial de 3, pois subtraímos 2 que é o escore mínimo possível. Os escores individuais
das peças numeradas são então transferidos para um diagrama polar, onde a circunferência
representa cada uma das 85 cores e o raio representa o total do número de erros para cada
peça móvel. De acordo com padrões característicos do gráfico formado, pode ser possível
classificar o indivíduo como portador de defeito do tipo tritan, deutan ou protan, ou como
portador de baixa discriminação cromática sem padrão definido. Atualmente, existem pro­
gramas que permitem o lançamento da sequência elaborada pelo paciente diretamente no
computador, que fornecerá, entre outros dados, o gráfico polar, utilizando o método de
análise desenvolvido por Vingrys.
O desempenho na realização desse teste é altamente dependente da idade, com melhor
desempenho por volta da 2a e 3a décadas de vida. A partir daí, o desempenho cai progressiva­
mente. Nos dois extremos de idade, o escore de erros tende a ser maior, às vezes, mostrando
um defeito do tipo tritan. Nos indivíduos idosos, isso pode estar relacionado com a perda de
transparência do cristalino, que se torna amarelado. Nos mais jovens, esse fato pode ser atri­
buído, entre outras coisas, à falta de atenção durante o exame.
r

E um teste valioso na prática clínica, porém, seu uso é limitado devido ao fato de ser um
teste longo e que depende inteiramente da colaboração e do entendimento do paciente.
Algumas tentativas de melhorar sua aplicação foram descritas. O trabalho de Nichols mos­
trou que o uso isolado da caixa 2 para acompanhamento de pacientes com neuropatias ópticas
adquiridas tem sensibilidade e especificidade semelhantes ao teste inteiro.
38 | Semiologia Básica em Oftalmologia

T e s t e s d e F a r n s w o r t h - M u n s e l l D - 1 5 o u P a n e i D - 1 5 e d e L a n t h o n y D e s a t u r e d D - 1 5

Desenvolvido por Farnsworth, esse teste também utiliza cores do círculo de cores de Munsell,
porém usando menos tons. Consiste em uma caixa contendo uma peça colorida fixa, no início
da sequência a ser reproduzida, e 15 peças coloridas móveis. 0 indivíduo testado é solicita­
do a arranjá-las na ordem correta. A interpretação é dada pela inspeção visual da sequência
montada.
O seu objetivo é diferenciar defeitos graves da visão cromática dos defeitos médios e dos
indivíduos normais. Juntamente com o teste de Ishihara, é um dos testes mais aplicados nas
baterias de testes clínicos, sendo também largamente usado na avaliação de defeitos adquiri­
dos da sensibilidade cromática.
O teste de Lanthony D -í5 Desatured tem como objetivo avaliar os indivíduos que consegui­
ram realizar o teste de Farnsworth-Munsell D-15 sem dificuldades. É esperado que esses indiví­
duos cometam erros nessa segunda avaliação, pois as peças desse teste possuem diferenças
de cores menores que o primeiro. Também vem sendo muito usado no estudo das deficiências
adquiridas da visão de cores.

Testes de equalização
A n o m a l o s c ó p i o s

O anomaloscópio de Nagel foi desenvolvido em 1907, com o objetivo de diferenciar deficiên­


cias do tipo deutan de protan, sendo considerado o teste mais sensível para esse fim. Baseia-se
na equação de Rayleigh, que usou uma mistura de luzes espectrais de lítio e tório para mime-
tizar o espectro do sódio: vermelho + verde = amarelo
Em termos de comprimento de onda, o anomaloscópio de Nagel utiliza luz de 670,8 nm
(vermelho) com luz de 546 nm (verde). Essa mistura de cores espectrais resulta no amarelo de
comprimento de onda de 589,3 nm.
O anomaloscópio de Nagel não está mais disponível comercialmente, porém, existem dois
anomaloscópios equivalentes que podem ser encontrados atualmente: o de Neitz e o Oculus
Heidelberg.
Os anomaloscópios permitem a classificação fiel das deficiências congênitas, diferencian­
do indivíduos com tricromatismo anômalo de normais e dicromatas de tricromatas anômalos,
além de identificar tricromatismo anômalo grave.

T e s t e d a C i t y U n i v e r s i t y ( C U T )

Nesse teste são apresentadas 10 pranchas, com 5 pontos coloridos cada.


O indivíduo testado é solicitado a escolher, entre os 4 pontos de cores diferentes, qual
é o que mais se assemelha à cor do ponto que está no centro da figura. Um dos pontos seria
a alternativa correta e os outros três são escolhidos de forma a se localizarem nos eixos de
confusão de defeitos deutan, protan e tritan. Esse teste tem um grau de dificuldade semelhan­
te ao teste de Farnswort-Munsell D-15. A vantagem é que nesse tipo de teste o indivíduo não
manipula e nem suja as cores, pois não toca nas pranchas. Pode ser usado para testar defeitos
congênitos e adquiridos.
Avaliação da Visão Central 39

Testes de nomeação de cores


Conhecidos como lanternas coloridas, não são testes seguros para avaliar detalhadamente as
alterações da visão cromática. Porém, podem ter um desempenho satisfatório nas avaliações
ocupacionais, como ferroviários, marinheiros e motoristas, pois simulam uma situação prática.
Podem ser altamente influenciados pelas diferenças de intensidade luminosa.
O teste Farnsworth Lantern (FaLant), desenvolvido para uso da marinha norte-americana,
possui luzes vermelha, verde e branca e serve para triagem dos candidatos a ingresso na mari­
nha e aeronáutica. É mais difícil passar nesse teste do que no teste de Farnsworth D-Í5. Não é
mais encontrado comercialmente, mas o equipamento Stereo Optical OPTEC 900 é usado como
substituto, inclusive pela marinha norte-americana.

C a m b r i d g e C o l o u r T e s t

Teste recente, aplicado por computador, tem sido aplicado em estudos científicos, com a van­
tagem de permitir o ajuste da diferença de cromaticidade entre o alvo e o fundo, de acordo
com a performance do indivíduo examinado.

VISÃO DE CONTRASTE
O sistema visual funciona em uma enorme variedade de níveis de iluminação, que se estende
de uma condição noturna até condições de ofuscamento.
O desempenho visual é dependente de diversos fatores: integridade da retina e das vias
ópticas neurais, qualidade da imagem retiniana e nível de luminância do ambiente. Por sua vez
a qualidade da imagem retiniana é dependente dos erros refrativos, do tamanho pupilar e da
qualidade óptica da córnea e do cristalino.
A acuidade visual mede a capacidade do sistema visual de reconhecer um alvo, e isso de­
pende de três fatores principais: a iluminação do fundo, o contraste do alvo com o fundo e
o ângulo que o alvo subtende no ponto nodal do olho. Porém, a visão é complexa e exige a
interação de muitos fatores, tanto fisiológicos quanto psicológicos.
A moderna semiologia ocular deve abordar aspectos clínicos da visão que não se restrin­
jam apenas àqueles obtidos em um consultório médico, com iluminação artificial nem sempre
adequada, diferentemente das condições reais de vida do paciente. Pessoas portadoras de
catarata podem ter uma excelente visão no consultório, e muito baixa visão em ambientes bas­
tante iluminados à luz do dia. Outro exemplo da importância do estudo da visão de contraste
são pessoas portadoras de degeneração tapetorretiniana, que apesar de possuírem acuidade
visual 20/15 em ambientes bem iluminados, podem ter grande dificuldade, por exemplo, para
enxergar um veículo cinza em condições de baixa iluminação.
Assim, o conceito e a avaliação clássicos da acuidade visual são muito restritos, uma vez
que analisam apenas as respostas da função da área foveal, e por isso, a validade do exame de
sensibilidade ao contraste.
A ideia de medir-se a sensibilidade de contraste não é nova; em 1886, March estudou a
percepção de contraste e contorno utilizando padrões baseados nas senoides de Fourier. Em
1889, Berry usou tabelas de baixo contraste para medir acuidade visual, sendo estas já co-
40 Semiologia Básica em Oftalmologia

mercializadas em Londres em 1918. Scadde, em 1956, foi o primeiro a medir sensibilidade ao


contraste usando barras verticais senoides em grades. Em meados da década de 1970, Arden
desenvolveu uma série de pranchas fotográficas para medir contraste.
A sensibilidade ao contraste é definida como a recíproca da quantidade mínima de con­
traste necessária para detectar uma grade de uma frequência espacial específica.
A determinação da sensibilidade de contraste está relacionada com a forma como o sis­
tema visual analisa uma cena, determinando o padrão de claros e escuros de localizações no
espaço. A imagem é transformada em uma representação de frequências espaciais, no caso
experimental, variando em uma única dimensão. A função de contraste resultante a partir das
frequências espaciais é indicativa da qualidade do sistema visual em termos de resolução es­
pacial. Quanto maior a frequência espacial, maior a resolução espacial. A curva de contraste
indica a partir de qual nível de contraste pode-se resolver o padrão de claro e escuro. Esta
relação está intimamente ligada à acuidade visual e pode detectar com precisão as perdas em
termo de contraste após cirurgia.
O limiar de contraste é medido por um conjunto de várias frequências espaciais. A fre­
quência espacial é definida como o número de ciclos por grau de ângulo de visão. Um ciclo é
formado por um par de barras branca e preta.
A função de sensibilidade ao contraste descreve o desempenho do sistema visual em ní­
veis diferentes de contrastes.
O teste de sensibilidade ao contraste abrange o estudo da perimácula, paramácula e má­
cula, o que o diferencia da medida da acuidade visual realizada através da tabela de Snellen.
Possui inestimável valor no reconhecimento precoce das alterações oculares, antes mesmo
que essa se faça clinicamente reconhecível. Enquanto a acuidade visual tem as características
já referidas, a curva de sensibilidade ao contraste faz a análise psicofísica do estado clínico do
olho, explorando não apenas a área foveolar, mas também áreas adjacentes. Dessa maneira,
exprime, com maior precisão, a capacidade do sistema visual em distinguir o limiar mínimo
do cinza.
Vários testes de sensibilidade ao contraste estão disponíveis no mercado, descreveremos
a seguir um dos mais utilizados nos consultórios médicos pela sua simplicidade de instalação
e uso.

V i s i o n C o n t r a s t T e s t S y s t e m 6500®
Este teste é representado por um painel, apresentando círculos preenchidos por listras de
frequência espaciais diferentes, chamadas de barras senoidais, representadas por letras A, B,
C, D e E na vertical. Em cada frequência espacial, apresenta diferenças de contraste que são
representadas por números de 1 a 9 na horizontal da esquerda para a direita, sendo o menor
contraste à direita (Fig. 6).
O painel deve ser colocado em uma parede que receba luz uniforme no nível dos olhos
do paciente e com luminância entre 30 a 70 Foot Lambert aferida com fotômetro. Usa-se um
medidor de luz da Vistech Consultants para medir a luminância do painel, no ambiente a ser
Avaliação da Visão Central 41

Fig. 6 VCTS 6500.

realizado o exame, o que permite a padronização dele. O paciente deve estar a 3 m da tabela.
O paciente informa a posição das listras, isto é, se estão inclinadas para esquerda, direita ou
na vertical, ou ainda, se não há listras no círculo. O menor contraste referido pelo paciente
para cada frequência é anotado em um gráfico, traçando-se então uma curva. O gráfico mos­
tra uma área cinza-escura que demonstra que curvas contidas nesta área representam uma
sensibilidade normal ao contraste. Pode-se realizar o teste com e sem correção óptica, sendo
interessante opção realizá-lo sob ofuscamento.

Outros testes de sensibilidade ao contraste


Além do VCTS 6500®, existem outras tabelas para aferição da sensibilidade ao contraste. Os
principais exemplos são as tabelas de Bailey-Lovie, Regan e Neima e Pelli-Robson(Fig. 7). Con­
sistem em tabelas típicas de aferição de acuidade visual através de letras, porém, com variação
do contraste entre as letras e o fundo. Fornecem ao examinador um exame menos detalhado
quando comparado ao VCTS 6500®, pois este analisa a sensibilidade ao contraste em diferen­
tes frequências espaciais.
42 | Semiologia Básica em Oftalmologia

r» A f T 9 C * * « T iV f r v Ç n a ü rr

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V R K D R
N H c S O K
S C N O Z V

Fig. 7 Teste de Pelli-Robson.

O REFRATOR*1
2
O refrator de Green é o aparelho mundialmente utilizado para a realização da refração ocular.
Equipamento obrigatório no consultório oftalmológico básico. Contém lentes esféricas, cilín­
dricas e acessórios da caixa de provas distribuídos em discos. Possui um braço ajustável com
alavanca de mola que suspende o aparelho em frente ao paciente, o qual mantém sua testa em
contato com a testeira ajustável do aparelho.
O refrator contém três grupos de discos, uma para lentes esféricas, outro para lentes cilín­
dricas e um terceiro de acessórios. As lentes variam a cada 0,25D, as esféricas podendo variar
em média de -19,0D a +17,0D e as cilíndricas até 6,0D nos modelos American Optical ou até
2,5D nos modelos Bausch & Lomb (no Brasil utilizam-se lentes cilíndricas negativas).
Existe uma roda auxiliar no refrator com a qual podemos fazer alterações rápidas de
±3,0D. Há o cilindro cruzado de Jackson, ajustamento da distância interpupilar e do nivela­
mento. A distância vértice entre as lentes e a córnea também é ajustável, sendo a distância de
12 mm a mais utilizada.
De cada lado do refrator há uma esfera grande que controla o grau das lentes esféricas,
quando girada para baixo as lentes tornam-se mais positivas, quando girada para cima as
lentes tornam-se mais negativas. Os controles do cilindro (para grau e eixo) estão localizados
próximos ao centro. Os graus aparecem em janelas próximas aos controles, tanto das lentes
esféricas quanto cilíndricas, significando os pretos lentes positivas e as vermelhas lentes ne­
gativas.
Avaliação da Visão Central 43

Refrator modelo A m e r i c a n O p t i c a l

A seguir descreveremos o refrator modelo American Optical (Fig. 8), por ser comumente utili­
zado no Brasil.

1. CONTROLE DO PODER ESFERICO


Pode aferir dioptrias de + 16,50D a -19,00D em passos de 0,25D. Alguns refratores pos­
suem lentes auxiliares de + 0,12D.
r

E possível colocar lentes esféricas acessórias de + 10,00D e -10,00D, nesse caso poderes
de +26,75D a -29,00D podem ser medidos.
2. MEDIDA DO PODER E EIXO DO CILINDRO
O poder da lente cilíndrica pode ser aferido de 0 a -6,00D em passos de 0,25D. Pode-se
usar as lentes cilíndricas auxiliares de -0,12D e aferir em passos de 0,12D. Utilizando as lentes
cilíndricas acessórias de -2,00D pode-se aferir de 0 a -8,00D cilíndricas. O eixo do cilindro é
graduado de 0-180° em passos de 5o.
3. CILINDRO CRUZADO
Girando a maçaneta do eixo do cilindro, o cilindro cruzado moverá em um mecanismo
sincronizado.
r

E composto de uma lente esferocilíndrica que tem uma potência negativa em um meri­
diano e uma positiva no outro. Utilizamos o cilindro cruzado, geralmente +0,25/-0,25D ou
+0,50/-0,50, para refinar tanto o eixo quanto o grau do cilindro corretor. Os eixos cruzados
localizam-se a 45° fora do alinhamento do botão serrilhado. O meridiano positivo é marcado
com pontos brancos e o negativo com pontos vermelhos. Devemos iniciar o teste de cilindro
cruzado determinando o eixo e posteriormente o poder do cilindro. Quando examinamos o
eixo, devemos perguntar ao paciente qual a melhor imagem comparando-se os dois lados da
lente mostrados alternadamente para o paciente. O eixo deve ser sempre deslocado em dire­
ção a marcação vermelha até que o paciente não note diferença na nitidez das imagens obser­
vadas. Determinado o eixo do cilindro, girando-se a lente 45° fora do eixo do astigmatismo e
novamente alternando-se os meridianos positivo e negativo, determina-se o poder cilíndrico.

Fig. 8 Refrator modelo Am erican Optical.


44 Semiologia Básica em Oftalmologia

0 objetivo novamente é obter imagens semelhantes, para isso, por exemplo, deve-se aumen­
tar a potência do cilindro em -0,25D se a melhor imagem aparece com o meridiano negativo
sobre o eixo do cilindro, se aparecer com o meridiano positivo sobre o eixo do cilindro deve-se
diminuir em -0,25D a potência do cilindro.
4. PRISMA ROTATÓRIO DE RISLEY
Os prismas variam até 20A em passos de 1A, podendo-se variar potência e eixo de forma
independente nos dois olhos.
5. VARETAS DE MADDOX
São utilizadas principalmente para medir forias verticais e horizontais. O paciente deve
fixar uma fonte de luz à distância de 5 m, colocando-se a vareta de Maddox diante de um olho
que observará uma linha no sentido perpendicular à vareta. Se a linha observada é vertical,
para medir foria horizontal, pergunta-se se está colocada à direita, esquerda ou atravessando
a luz. Se horizontal (mediando-se, portanto, foria vertical) pede-se que diga se está acima,
abaixo ou atravessando a luz.
6. LENTES AUXILIARES
“O” - aberto
“R” ou “ +1,50” - lentes para retinoscopia (utilizadas para não ser necessário descontar a dis­
tância de trabalho quando esta é 66 cm).
“P” - lente polaroide (olho direito: 135°, olho esquerdo: 45°)
Esta lente pode ser usada para vários testes polaroides, como, por exemplo, heteroforia,
balanço binocular, visão estereoscópica.
“RMW” &”WMV” - Maddox vertical (olho direito: vermelho; olho esquerdo: branco)
Pode ser usado para medida de heteroforia.
“RMH”&“WMH” - Maddox horizontal (olho direito: vermelho;olho esquerdo: branco)
Pode ser usado para medida de heteroforia.
“RL”&“GL” - lente vermelha, lente verde (olho direito: vermelho; olho esquerdo: verde)
“ + 1,2 ” - lente com +0,12D esféricas
“PH” - Pin Hole.
“6AU ou 10AI” - Dissociação prismática (olho direito: 6A base superior; olho esquerdo 10A
base inferior)
Pode ser usada para aferir heteroforia.
“ ± ,5 0 ” - ±0,50D cilindro cruzado fixo.
“OC” - ocluído

CAIXA DE PROVAS*lo
Apesar de todos os recursos disponíveis no refrator é indispensável a presença de uma caixa
de provas (Fig. 9) no consultório oftalmológico básico. Independente do tamanho ou mode­
lo da caixa (há diversos disponíveis no mercado) existem inúmeras situações no dia a dia de
um consultório oftalmológico que necessitam do uso da armação de prova. As lentes da cai­
xa de prova podem ser utilizadas não só para a realização da retinoscopia em pessoas com
necessidades especiais, como para o teste de adaptação a novos óculos. São bastante úteis
Avaliação da Visão Central 45

as caixas que contêm ainda lentes prismáticas, já que muitas vezes verifica-se dificuldade de
adaptação com essas lentes.

CAIXA DE PRISMAS
Apesar do refrator possuir uma lente prismática rotatória, é fundamental que o oftalmologista
possua uma caixa de prismas (Fig. 10) principalmente para o exame de estrabismo em crian­
ças, devido a baixa colaboração das mesmas durante o exame.

Fig. 10 Caixa de prisma e régua de Luneau.

REFRAÇÃO AUTOMATIZADA
Nos últimos anos verificou-se uma grande evolução da refração automatizada. Com o desen­
volvimento da análise de frentes de onda, é possível, hoje, obter-se a refração esferocilíndrica
com grande precisão de forma rápida e reprodutível. São aparelhos de grande utilidade em
serviços de alto volume de exames, assim como em pacientes pouco colaborativos no exame
46 Semiologia Básica em Oftalmologia

subjetivo. Apesar disso, sempre se deve refinar o exame do refrator automatizado no refrator
de Green.
Para maior precisão do exame realizado, deve-se realizar cicloplegia, pois mesmo com o
desenvolvimento de mecanismos para se evitar os efeitos da acomodação no momento do
exame, ainda pode haver a obtenção de resultados imprecisos, principalmente em pacientes
jovens.
O maior fator limitante para o seu uso ainda é o alto custo da aquisição e manutenção
desses aparelhos.

RETINOSCOPIA
Também conhecida como esquiascopia representa o mais prático, barato e exato dos mé­
todos objetivos de refração. Consiste em observar o movimento da faixa de luz do reti-
noscópio de Copeland através da pupila. Esses movimentos serão neutralizados por lente
positivas ou negativas, colocadas em frente ao olho examinado. Mais preciso se realizado
sob cicloplegia, devem-se acrescentar lentes esféricas positivas se a faixa luminosa se
mover no mesmo sentido do movimento, acrescentando-se lentes esféricas negativas se a
faixa luminosa se mover no sentido oposto ao do movimento. A refração esférica é deter­
minada na dioptria mais positiva em que o movimento é anulado. Como esse exame deve
ser realizado em dois meridianos ortogonais a diferença entre os mesmos representa o
poder cilíndrico da refração, podendo-se ainda com certa prática determinar o eixo apro­
ximado. Para maior precisão deste exame o médico deve estar atento a determinação da
sua distância de trabalho que na maioria das pessoas é 66 cm, acarretando diferença de
-1,50D na refração encontrada. Para se calcular o número de dioptrias a serem desconta­
das pode ser utilizada a fórmula a seguir.

Dioptrias = -------------------í-----------------------
Distância do Paciente (metros)

Além de determinar, a refração é um exame que pode sugerir, através do reflexo retinos-
cópico, outras patologias oftalmológicas, como, por exemplo, o ceratocone que possui classi­
camente reflexo retinoscópico em tesoura.

TESTE BICROMÁTICO
O teste bicromático ou duocromático é um teste de refração subjetiva utilizado após a reali-
r

zação do teste objetivo. E um teste rápido, que permite refinar a refração esférica evitando
hipo ou hipercorreções. Tem como princípio o fenômeno de aberração cromática (depende
da posição da imagem com relação à retina). A luz branca ao entrar no olho sofre um desvio
e dispersão diferente dependendo do comprimento de onda de seus componentes. A luz
vermelha possui o maior comprimento de onda e sofre menor convergência ao atravessar os
meios transparentes do olho. A luz verde possui o menor comprimento de onda e sofre maior
convergência. A luz amarela possui um comprimento de onda intermediário entre a luz verme-
Avaliação da Visão Central 47

lha e verde. Por isso, a imagem da luz vermelha forma-se posteriormente à luz verde e da luz
amarela aproximadamente no meio dos focos vermelho e verde.
O teste bicromático utiliza tabela de acuidade visual com optótipos pretos. Esta tabela é
dividida ao meio, sendo a metade com fundo vermelho e a outra com fundo verde. Pede-se
para o paciente comparar em qual lado, no vermelho ou verde, as letras pretas podem ser me­
lhor visualizadas. Este teste não tem finalidade de determinar a acuidade visual.
O paciente emetrope referirá que tanto do lado verde quanto do vermelho as letras pretas
são igualmente nítidas. O paciente míope verá melhor as letras sobre o vermelho e nesse caso
devemos acrescentar lentes esféricas negativas de 0,25D até igualar. O paciente hipermetrope
verá melhor as letras sobre o verde e nesse caso devemos acrescentar lentes esféricas positivas
de 0,25D até igualar.
Se hipercorrigirmos o hipermetrope ele referirá que as letras pretas estão mais nítidas no
lado vermelho. Se hipercorrigirmos o míope ele referirá que as letras pretas estão mais nítidas
no lado verde, conforme o quadro a seguir:

Melhor visão com: Verde Vermelho

Míope Hipercorrigido Hipocorrigido


Hipermetrope Hipocorrigido Hipercorrigido

O teste é sensível a uma alteração de refração menor ou igual a 0,25D. Deve ser realizado
com a sala escura e cada olho avaliado separadamente. Após realizar o teste monocularmente
este pode ser realizado binocularmente, podendo o paciente aceitar mudança de 0,25D esfé­
ricas positivas ou negativas.
O teste não pode ser realizado quando a acuidade visual é menor que 20/30, sendo mais
confiável quando realizado sob cicloplegia.
Pode ser utilizado para determinar a adição de uma prescrição. Para isso, utiliza-se uma
lanterna com a metade verde e outra vermelha, nesse caso deve ser realizado binocularmen­
te. Coloca-se uma tabela de leitura a uma distância de 33 a 40 cm, neste caso o presbita lerá
melhor sobre o verde, pois o olho presbita funciona como um olho hipermetrope, com capa­
cidade de acomodação reduzida. Nesse caso acrescentamos lentes esféricas positivas até os
optótipos ficarem igualmente nítidos tanto do lado verde quanto do vermelho.
Este teste também pode ser realizado em pessoas daltônicas, porém nesse caso o pacien­
te referirá se as letras pretas estão mais nítidas no lado direito ou esquerdo. Isso é possível
pois o teste é baseado na aberração cromática e não na discriminação de cores.

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Site: < http://www. institutoalcon.com/ia.asp>
Semiologia Básica da Visão
Periférica e Campimetria

MÁRIO TERUO SATO

DEFINIÇÕES
Campo visual (CV)
O campo visual corresponde a uma área no espaço que o olho imóvel percebe durante a fi-
xaçào central. É de fundamental importância como exame complementar na oftalmologia, na
avaliação funcional das vias ópticas. O padrão do defeito encontrado auxilia no diagnóstico de
lesões nessas vias, bem como a gravidade e o controle evolutivo (monitoração da progressão
e remissão). Serão discutidos neste capítulo todos os tipos de campimetria, exceto a compu­
tadorizada, que será discutida em um capítulo específico.

Limites do campo visual monocular


O campo visual periférico é testado usando-se um estímulo branco de 3 mm no perímetro ma­
nual de Goldmann. Na Figura 1 C encontram-se representadas as legendas utilizadas no gráfico
do CV manual. Os limites são: 60° superior (S), 95° temporal (T), 75° inferior (I) e 60° nasal (N).

Limites do campo visual binocular


É formado pela superposição do campos temporal e nasal dos olhos direito e esquerdo. O
campo binocular tem um formato oval, aproximadamente 200° no sentido horizontal superior
e 130° em extensão vertical.

Perimetria
É a delimitação externa do campo visual.

51
52 Semiologia Básica em Oftalmologia

Isópteras
Curvas unindo pontos de igual sensibilidade retiniana, formando uma circunferência similar às
encontradas nos mapas geográficos altitudinais (Fig. 1C).

Campos visuais central e periférico


Central inclui uma área do ponto de fixação até um círculo de 30°.
Periférico estende-se dos 30° para a periferia.

Escotoma fisiológico ou mancha cega de Mariotte


r

E sempre do lado temporal do campo visual, independente do olho a ser testado, corresponde
ao disco óptico e se localiza cerca de 15,5° a partir da fixação e cerca de 1,5° abaixo no meri­
diano horizontal. Possui um formato oval e tem 7,5° no meridiano vertical e 5,5° no meridiano
horizontal (Fig. 1C).

Escotomas
Local do campo visual em que um objeto não é visto, em local que seria normalmente visto.
Pode ser absoluto, que é a área do campo em que a perda visual é total e nenhum objeto é
visualizado. Relativo, área do campo em que estímulos de baixa intensidade não podem ser
vistos, mas que estímulos de maior intensidade podem.
O escotoma é positivo quando o paciente o percebe como área escura no espaço, e pode
ser causado por alterações pré-retinianas. O escotoma é negativo quando o paciente não tem
conhecimento da sua existência, é o tipo mais comum e é decorrente de lesão desde a retina
até o córtex visual.

Hemianopsias
Cegueira de metade do CV em um ou ambos os olhos. São classificadas em:
■ Homônimas - defeito da metade direita ou esquerda do CV de ambos os olhos, não afetando
a outra metade.
■ Escotomas hemianópicos homônimos - defeitos geralmente congruentes situados na região
paracentral do campo homônimo. Tem como etiologia causas vasculares ou traumáticas no
córtex visual.
■ Heterônimas - ausência parcial ou total da percepção a estímulos visuais em ambos os hemi-
campos, temporal ou nasal, corresponde à hemianopsia bitemporal ou binasal.
■ Altitudinais - acomete a metade inferior ou a superior do CV, uni ou bilateral.
■ Congruentes - defeito do CV simétrico ou similar em ambos os olhos; quanto mais posterior
é a lesão nas vias ópticas maior é a congruência.
■ Incongruentes - defeito do CV assimétrico ou dissimilar em ambos os olhos, acontece nas
lesões anteriores das vias ópticas.
Semiologia Básica da Visão Periférica e Campimetria 53

■ Bissectação cia área macular - característica de lesões não corticais anteriores ao córtex visual
e incongruente. Quando corticais há a preservação da mácula, é congruente e geralmente
de origem vascular.

APARELHOS - PERÍMETROS OU CAMPÍMETROS

Tela tangente ou plana de Bjerrum


É um tecido quadrado preto de feltro, preso a parede, que possui pontos delimitados a cada
30° da circunferência, bordados com linha de cor negra e não perceptíveis pelo paciente.
Usado para se examinar os 30° do CV central, a partir do ponto de fixação e também para de­
terminar o tamanho da mancha cega. Um disco branco é posicionado no centro da tela como
alvo de fixação.

Arcos perimétricos
Em desuso por sua imperfeição.

Perímetro da cúpula de Goldmann


r

Existem várias marcas. E um perímetro de precisão, usado para medir os CV central e periféri­
co. Possibilita o exame em movimento do alvo ou perimetria cinética, como também com um
alvo estático ou perimetria estática.
r

E realizado em uma cúpula hemisférica onde o paciente coloca o queixo para realizar o
exame (Fig. 1B). Possui na parte posterior uma luz interna para iluminar a tela, onde é colo­
cado o gráfico (Fig. IA). O instrumento possui um fotômetro para manter o contraste entre o
alvo e a iluminação de fundo da cúpula constante. Um equipamento pantográfico móvel per­
mite que o alvo luminoso seja projetado no interior da cúpula. Na parte posterior do aparelho,
há um telescópio onde o examinador controla a fixação do paciente, também há os controles
do projetor da mira, como a cor, brilho ou tamanho (Fig. IA). O paciente responde ao teste
através de uma campainha conectada ao campímetro (Fig. 1B).

TÉCNICAS
Campimetria de confrontação
É a técnica recomendada na sala de emergência, em pacientes acamados com baixa concentra­
ção e em crianças. Este exame com examinadores treinados, é uma técnica simples, rápida e
que deve fazer parte da rotina dos exames oftalmológico e neurológico. O CV de confrontação
é um teste de triagem e os pacientes, na medida do possível, devem ser submetidos posterior­
mente a outros tipos de perimetria.
Na realização do exame o paciente deve ficar sentado, aproximadamente a 1 m do exa­
minador, no mesmo nível, devendo fechar um dos olhos e orientar para que o paciente fixe
54 | Semiologia Básica em Oftalmologia

no olho não ocluso ou no nariz do examinador (p. ex., ao avaliar o CV do olho esquerdo do
paciente, cobre-se o olho direito deste que fixa no olho direito do examinador). O estímulo
a ser apresentado deve estar na metade da distância entre o examinador e o paciente. Por
convenção inicia-se pelo olho direito, mas na prática inicia-se pelo olho de melhor visão. O
paciente é questionado como vê a face do examinador, nesta etapa do exame é possível de­
tectar defeitos dos CV central, altitudinal ou hemianopsia; por exemplo, se ao fixar no nariz o
paciente consegue ver somente a parte superior da face, provavelmente apresenta um defeito
altitudinal inferior.
O examinador pode usar vários tipos de estímulos, tais como os dedos, abaixador de lín­
gua com marca e cores na sua extremidade, tampas de colírios e pequenos brinquedos.
O CV de confrontação deve ser realizado nos quatro quadrantes, incluindo o hemicampo
superior e o inferior ao longo do meridiano horizontal e hemicampo nasal e temporal ao longo
do meridiano vertical, bem como dos campos visuais central e periférico.
No exame do CV periférico o examinador apresenta um estímulo simples, que move fora
dos limites do campo em direção a fixação, até o ponto em que o paciente detecte o estímulo;
isto é repetido em todas as direções para gerar uma isóptera periférica.
Em muitas situações o teste de confrontação duplo simultâneo, que é realizado apresen­
tando um estímulo (dedos) de forma estática ou dinâmica entre os hemicampos, detecta de­
feitos homônimos ou heterônimos.
Na criança podem ser usados fantoches ou pedir para que esta imite os dedos, quando
percebe o estímulo ela olha em direção a este, sendo possível detectar defeitos hemianópicos.
A vantagem do CV de confrontação é a sua simplicidade, flexibilidade e velocidade de
aplicação, este exame pode ser realizado em qualquer local, principalmente em pacientes
internados.
A desvantagem é a falta de normatização, a natureza qualitativa e a limitação em se de­
tectar defeitos sutis.

Tabela de Amsler
Consiste em um cartão com várias linhas que se cruzam vertical e horizontalmente, formando
quadrados (formam um ângulo visual de I o). Avaliam-se os 10° centrais da visão, no centro há
um ponto preto para a fixação do paciente.
O paciente é orientado a fixar no ponto central há 30 cm, monocular com a melhor cor­
reção para perto e apontar qualquer região na tabela, onde a linha está distorcida (metamor-
fopsia), borrada ou ausente; após a detecção, o paciente é orientado a fazer a anotação desses
defeitos na tabela.
Tem indicação para os pequenos escotomas centrais e paracentrais, degeneração relacio­
nada com a idade, coriorretinopatia central serosa, entre outras aplicações.

Teste de tela tangente (1 e 2 metros)


O teste da tela tangente examina os 30° centrais do CV independentemente da distância entre
o paciente e a tela. Para a realização do exame tem-se quatro pontos cegos fracamente indi­
cados na tela, onde são projetados os escotomas fisiológicos, correspondentes a projeção do
Semiologia Básica da Visão Periférica e Campimetria 55

disco óptico. O menor par de ovais direito e esquerdo é usado para o teste a 1 m e o maior par
de ovais para o teste à distância de 2 m.
O campo é realizado em cada olho, com alvos brancos de dois tamanhos, ocasionalmente
podem ser usados alvos coloridos. Fonte de luz uniforme é usada sobre a tela em torno de 7
cd (candeias por pé quadrado).
Usa-se um bastão preto com o alvo preso na ponta, move-se o alvo do CV periférico não
visualizado até a região central ao longo de cada meridiano, o examinador mapeia 1 ou 2 isóp-
teras cineticamente, usando alvos de 1 a 5 mm. Atualmente, usam-se lanternas que apresen­
tam pontos de luzes (apontador a laser). A terminologia para o alvo é para o seu diâmetro, cor
e distância do teste em milímetros, ou seja a denominação 1/1.000 W, é para um alvo branco
de 1 mm de diâmetro, à distância de 1 metro. Quando usam-se alvos coloridos, o ponto a ser
gravado é quando o paciente reconhece a cor verdadeira e não quando o objeto é visto, erro
comum nesse tipo de exame.
Vários tipos de defeitos podem ser detectados, tais como aumento da mancha cega, esco-
tomas (arqueado, central, cecocentral e paracentral).

Perimetria manual no campímetro de Goldmann


Para a realização do exame o paciente deve estar confortável, sentado e com o queixo no su­
porte da cúpula do campímetro, mantendo o olho a ser testado em um ponto de fixação (espe­
lho do telescópico) (Fig. 1B). Através do telescópico na parte posterior do aparelho, o exami­
nador regula a correta posição dos olhos, bem como faz medida do diâmetro pupilar (Fig. IA).
O paciente é instruído para apertar um botão da campainha, quando o objeto em movi­
mento é visualizado no seu campo de visão (perimetria cinética). O instrumento deve ser cali­
brado previamente a cada exame, para manter o estímulo e iluminação de fundo constantes,
possibilitando que o exame seja reprodutível e para comparar a evolução de patologias nesse
tipo de exame. Vários índices do estímulo podem ser ajustados para tamanhos (0= 1/16 mm2,
1= 1/4 mm2, 11= 1 mm2, 111= 4 mm2, IV= 16 mm2, V = 64 mm2), níveis de iluminação (1,2, 3,
4) e cinco filtros intermediários (a, b, c, d, e) (Fig. 1C). O filtro (4) e o filtro (e) não reduzem a
luminosidade e são nulos. O perímetro também dispõe de filtros cromáticos (vermelho, verde
e azul).
Esse perímetro utiliza os estímulos cinéticos ou estáticos, avalia-se todo o campo visual
desde o central até a periferia. Na avaliação dos 30° centrais é necessário correção para perto
nos pacientes com presbiopia.
A primeira etapa do exame visa determinar a mancha cega, assim o paciente fica ciente
caso haja um escotoma. A mancha cega é sempre temporal no CV e encontra-se entre 13° e
18° temporais a partir da fixação, normalmente utiliza-se o alvo de 1-1 ou I-2e (Fig. 1C). Para
determinar o seu limite, move-se o objeto até a mancha cega onde este desaparece, quando
localizado, move-se o objeto até que seja visualizado em pelo menos 4 meridianos, assim,
unindo os pontos desses meridianos tem-se o formato do escotoma fisiológico.
Para delimitar-se um escotoma, faz-se de maneira similar a delimitação da mancha cega.
Podem-se usar estímulos coloridos que podem ser relativos, mas um escotoma para um objeto
branco é absoluto.
56 Semiologia Básica em Oftalmologia

Para o exame do CV periférico, utiliza-se o estímulo I-4e (Fig. 1C). O exame é realizado
movendo-se o objeto, progressivamente, da periferia do campo para o centro, de uma área
não visualizada, até que o paciente visualize o objeto, então com paciente instruído para tocar
a campainha, marca-se um X no gráfico, na ponta do braço pantográfico na parte posterior
do aparelho. Oito meridianos periféricos espaçados em 30° são necessários para realizar o
exame, ao se fazer a junção destes pontos (X ou marcados) com o mesmo estímulo, uma linha
concêntrica é obtida e denominada isóptera (Fig. 1C).

Figs. 1 (A-C) Perímetro manual tipo Goldmann da marca TOC (Takata Ophthalmic Instruments). A. Vista
posterior onde ficam o examinador, gráfico do campo visual e coluna pantográfica. B. Vista anterior, suporte
onde o paciente se posiciona para o campo visual, ponto de fixação no fundo da cúpula e campainha à
esquerda do perímetro. C. Gráfico do perímetro manual, com traçados das isópteras do olho direito e a
mancha cega. No canto inferior esquerdo estão os estímulos utilizados. R = olho direito; T = temporal; N =
nasal; I = inferior; S = superior; QTS = quadrante temporal superior; QTI = quadrante temporal inferior; QNI =
quadrante nasal inferior; QNS = quadrante nasal superior.
Semiologia Básica da Visão Periférica e Campimetria 57

Para avaliar o CV central utilizam-se normalmente estímulos I-2e, testando-se os meridia­


nos a cada 15° ou 30°.
Na realização da perimetria estática no perímetro de Goldmann, o estímulo permanece
imóvel na região do campo a ser examinada. O que varia é a luminosidade do estímulo por
meio de filtros até alcançar o limiar de percepção do paciente (estímulos de intensidade cres­
cente), que dá as informações através de uma campainha, registradas em um gráfico para a
perimetria estática. O teste estático, ou liga-desliga do estímulo, pode ser usado para iden­
tificar um escotoma, sendo que o limite é delineado pela técnica cinética em que há o movi­
mento do estímulo de uma área de não percepção, para uma área de percepção do estímulo.
Outra aplicação é na detecção precoce e acompanhamento da evolução do glaucoma, porém
atualmente esta técnica é empregada mais nos perímetros automatizados (ver capítulo sobre
perimetria automatizada).
A vantagem da perimetria manual é examinar os campos visuais, central e periférico, ser
possível realizar em crianças colaborativas a partir dos 5 a 6 anos de idade e em pacientes com
baixa da visão ou perda de visão grave.
As desvantagens são que os resultados dependem da habilidade do perimetrista e falta
normatização em grandes populações.

ALTERAÇÕES NO CAMPO VISUAL


Para entendimento da representação gráfica do CV, tem-se um traçado do CV manual. Como
exemplo mostra-se um escotoma juncional e as representações simbólicas ao lado (Fig. 2C). É
importante ressaltar que as alterações campimétricas na prática não são exatamente as nota­
ções simbólicas, fazem-se esse tipo de notações nos livros para simplificação didática.
Para a interpretação do CV daremos ênfase à anatomia, tipo de alterações campimétricas
e às causas que a provocaram, iniciando pela retina ao córtex visual.

Retinopatias
Os axônios das células ganglionares da retina são arranjados em três modelos básicos: 1) o feixe
papilomacular (M), que corresponde às fibras da mácula e ao nervo óptico; é representado pela
área central de fixação no campo visual. Lesão nesta área produz os escotomas central e ceco-
central (Figs. 2C, 3D e E); 2) fibras arqueadas temporais* superiores (1) e inferiores (2) responsá­
veis pelos defeitos arqueados inferiores e superiores (Figs. 2A e 3A); e 3) fibras nasais superiores
e inferiores (2 e 3) da retina (Fig. 2A), que têm um padrão radial e que vão para a margem nasal
do disco óptico, sendo representadas na área temporal, além da mancha cega de Mariotte.
As alterações do CV correspondem ao trajeto das fibras nervosas, não respeitando o me­
ridiano vertical na representação gráfica. Frequentemente, correspondem à projeção da área
da lesão vista no oftalmoscópio.
O campo visual na retina é invertido em relação ao ponto de fixação, o CV superior cai na
região inferior da fóvea, o CV inferior na retina superior, o CV nasal na retina temporal e CV
temporal na retina nasal.

* A rafe temporal divide a retina temporal em porções superior e inferior, é a projeção do CV no meridiano horizontal
(metade superior e inferior do CV). A metade nasal e temporal da retina é dividida por uma linha imaginária vertical
r

que passa através da fóvea (Fig. 2A). E a projeção do CV no meridiano vertical (metade temporal e nasal do CV).
58 Semiologia Básica em Oftalmologia

Figs. 2 (A-C) Trajeto das fibras nervosas da retina até o trato óptico. Representação gráfica e simbólica do
escotoma juncional, no campo visual do manual de Goldmann. Feixe papilomacular (M), feixe de fibras
arqueadas da retina temporal superior (1) e da inferior (4) e fibras radiais nasais superior (2) e inferior (3). A.
Fundo de olho direito e secção mostrando a orientação das fibras nervosas no nervo óptico direito, trato
óptico direito e nervo óptico esquerdo. B. Nervo óptico esquerdo, decussação das fibras retinianas nasais no
quiasma e traçado representando a lesão no escotoma juncional do nervo óptico direito. C. Escotoma
juncional da lesão no nervo óptico direito na Figura 2B. Escotoma cecocentral no CV direito e pequeno defeito
temporal superior no CV esquerdo. Círculo pequeno ao lado dos campos representa simbolicamente os
defeitos nos gráficos.

Nas retinopatias é importante a aplicação do CV nas distrofias retinianas, que são divididas
em distrofias maculares e degeneração hereditária do epitélio pigmentar da retina (DHEPR).
Para o diagnóstico dessas entidades, além do CV os exames de eletrofisiologia (eletro-oculograma
e eletrorretinograma) têm papel fundamental.
Distrofias maculares são degenerações da retina e coroide, que afetam predominante­
mente a área macular, sendo progressivas, bilaterais e de caráter hereditário. As alterações
campimétricas na maioria são defeitos centrais (Figs. 3D e E), temos como exemplo principais
a doença de Stargardt e distrofia de cones.
Semiologia Básica da Visão Periférica e Campimetria 59

A DHEPR é uma doença heredorretiniana generalizada, tendo a retinose pigmentosa como


representante. É uma doença degenerativa que cursa com nictalopia, palidez do disco, estrei­
tamento arteriolar e dispersão pigmentar em forma de espículas e apresenta o eletrorretino-
grama bastante alterado. O CV inicial é em forma de anel (anular) e posteriormente tubular
com a constrição das isópteras (Fig. 3G).
As maculopatias são hereditárias e adquiridas; as hereditárias, foram descritas anterior­
mente como distrofias maculares. Nas maculopatias adquiridas temos a maculopatia pelo uso

Olho esquerdo Olho direito


T N T N

A B AV = 20/40

H AV = variável

3mm W/ .000 mm

Figs. 3 (A-H) Tipos de perda do campo visual monocular no olho esquerdo, na tela tangente com objeto
branco de 3 mm a 1 m de distância. A. Escotoma arqueado superior. B. Defeito altitudinal inferior respeitando
o meridiano horizontal. C. Aumento da mancha cega. D. Escotoma central e escotoma fisiológico (mancha
cega normal). E. Escotoma cecocentral. F. Hemianopsia temporal respeitando o meridiano vertical, mas
envolvendo a visão central. G. Constrição generalizada do campo visual em duas isópteras e H - defeito no
campo visual não orgânico. (Adaptado de Wray SH, Pavan-Langston D.)
60 Semiologia Básica em Oftalmologia

de cloroquina e coroidorretinopatia central serosa, ambas defeitos do CV predominantemente


centrais.
No descolamento de retina a alteração do CV depende da extensão e do padrão do des­
colamento. O CV mostra a extensão, a intensidade e a lesão retiniana progressiva do desloca­
mento. Pode ser usado para o acompanhamento no pré e pós-operatórios.

Vias ópticas
Representam as alterações do CV desde o nervo óptico até córtex visual (Fig. 4). Na retina após
a sinapse nas células ganglionares, os axônios convergem para um ponto, formando o nervo
óptico. No quiasma as fibras nasais ipsilaterais cruzam para se juntarem com as fibras tempo­
rais do olho contralateral não cruzadas, formando o trato óptico, que faz sinapse no corpo
geniculado lateral, formando com os seus novos axônios as radiações ópticas, que por fim
chegam ao córtex visual estriado ou córtex primário (área 17 de Brodmann) no lobo occipital.

Disco óptico e nervo óptico


No disco óptico e na porção inicial retrobulbar do nervo óptico, as fibras papilomaculares ocu­
pam o segmento temporal, as fibras arqueadas ocupam os segmentos superior e inferior e as
da retina nasal a margem remanescente nasal. Nos segmentos intracanalicular e intracraniano,
as fibras papilomaculares migram para o centro do nervo, as fibras nasais vão para a parte me­
dial e as arqueadas para a parte lateral do nervo óptico (Fig. 2A).
A lesão do nervo óptico produz apenas lesão no CV monocular. Na extrema periferia do
nervo óptico, ela produz o escotoina juncional que tem representação bilateral. Isso acontece
porque próximo ao quiasma as fibras da retina inferonasal do olho oposto, voltam-se poste­
riormente no nervo óptico, formando o joelho anterior de von Willebrand, antes de fazer a
decussação para o quiasma (Fig. 2B). Há escotoma cecocentral ipsilateral e quadrantopsia su­
perior contralateral à lesão (Figs. 2C e 4.3). Esta alteração é um importante sinal de localização
de compressão pré-quiasmática, sendo conhecida também como síndrome do nervo óptico
distai, síndrome quiasmática anterior e escotoma juncional de Traquair.

ESCOTOMAS ARQUEADOS: são o escotomas cujo ápice origina-se da mancha cega e toma um
aspecto arqueado (Fig. 3A). Muitos escotomas paracentrais são escotomas arqueados. Pode
evoluir para um defeito altitudinal (Fig. 3B), bem como um degrau nasal de Rõnne. O defeito
arqueado tem a borda limitada precisamente no meridiano horizontal. Lesões discretas, tais
como neuropatia óptica isquêmica, glaucoma, atrofia secundária ao papiledema cursam com
estes defeitos.
ESCOTOMA CECOCENTRAL: é um escotoma central (fixação) que se estende até a mancha cega
e que envolve o feixe papilomacular (Figs. 3E e 4.2). É o tipo de alteração mais frequente nos
casos de neurite retrobulbar, papilite (neurite óptica anterior), aqui é importante pensar em
causa desmielinizante. Em crianças as neurites são geralmente benignas e de etiologia virai.
r

E a alteração mais comum também na neuropatia óptica hereditária de Leber, na ambliopia


tóxica-alcóolica e nas neuropatias ópticas nutricionais (hipovitaminoses).
Semiologia Básica da Visão Periférica e Campimetria 61

DEFEITO ALTITUDINAL: é o tipo de defeito que compromete as metades inferior (Fig. 3B) e su­
perior do CV, ocorre predominantemente nos casos de neuropatias ópticas isquêmicas ante­
riores não arteríticas ou arteríticas. Este tipo de defeito ocorre porque a irrigação pré-laminar
e a laminar do disco óptico são feitas por um círculo arterial elipsoide (círculo de Haller-Zinn),
esta elipse é dividida em partes superior e inferior, a partir da entrada das artérias ciliares pos­
teriores curtas, provocando uma irrigação altitudinal para a porção anterior do nervo óptico.
AUMENTO DA MANCHA CEGA (FIGS. 3C E 4.1): ocorre pelo aumento da espessura da camada de
fibras nervosas ao redor do disco óptico, isso dificulta que um estímulo luminoso atinja a ca­
mada de receptores, é traduzido no CV com o aumento do escotoma fisiológico. A principal
etiologia é o papiledema, que representa a hipertensão intracraniana elevada e que é tradu­
zido no edema de papila bilateralmente. Devem ser afastados os tumores, fístulas carotidoca-
vernosas e o pseudotumor cerebral.
CONSTRIÇÃO GENERALIZADA (FIG. 3G): é menos específica e não localizadora de lesão no nervo
óptico, ao menos que seja unilateral, geralmente indica envolvimento difuso do nervo óptico,
traduz-se pela contração das isópteras e preservação da visão, pode ser indicativo da síndro-
me do meningioma da bainha perióptica.

Fig. 4 Local das lesões nas vias ópticas e tipos de defeitos campimétricos. 1 - Lesão no disco óptico esquerdo
e aumento da mancha cega no CV em olho esquerdo (OE). 2 - Nervo óptico direito e escotoma cecocentral no
CV de olho direito (OD). 3 - Nervo óptico esquerdo pré-quiasmático com escotoma juncional (escotoma
cecocentral no CV de OD e pequeno defeito temporal superior no CV do OE). 4 - Quiasma com hemianopsia
bitemporal. 5 - Trato óptico esquerdo e hemianopsia homônima não congruente direita. 6 - Trato óptico
posterior direito e hemianopsia homônima esquerda. 7 - Lobo temporal esquerdo e quadrantopsia superior
direita. 8 - Lobo parietal esquerdo e hemianopsia homônima direita. 9 - Lobo occipital direito e hemianopsia
homônima esquerda com preservação macular. 10 - Fissura calcarina anterior direita e abolição da crescente
temporal esquerda. 11 - Ponta do lobo occipital esquerdo e escotoma hemianópico homônimo direito.
62 I Semiologia Básica em Oftalmologia

Quiasma óptico
Lesão no quiasma provoca defeito bitemporal com bordas regulares e que respeita o meridia­
no vertical (Fig. 4.4). A visão central é geralmente envolvida. Os defeitos são variáveis depen­
dendo da posição do quiasma, direção da compressão e da distribuição das fibras cruzadas
nasais.
As causas mais comuns de lesões quiasmáticas são o adenoma hipofisário, craniofaringio-
ma, meningioma, aneurisma da artéria carótida e trauma craniano.

DEFEITOS NO CAMPO VISUAL MONOCULAR (FIG. 3F): são decorrentes de defeito dos feixes de
fibras arqueadas que respeitam o meridiano vertical e causam hemianopsia temporal. A he­
mianopsia temporal monocular é rara e representa a oclusão ou estase dos vasos que nutrem
o quiasma.
DEFEITO NO CV BINOCULAR: o perimetrista pode sugerir a localização da lesão do quiasma nas
posições superior, inferior, anterior ou posterior.

Compressão no ângulo anterior do quiasma causa o escotoma juncional (já descrito ante­
riormente).
Compressão na parte mediana do quiasma de baixo para cima (fibras inferonasais cruza­
das), causa uma quadrantopsia bitemporal superior inicialmente, e com o aumento da com­
pressão o defeito progride no sentido horário no olho direito e anti-horário no olho esquerdo
(direção das setas) (Figs. 5A e C), chegando a hemianopsia a ser bitemporal, como exemplo
temos o adenoma hipofisário.
Compressão na parte mediana do quiasma de cima para baixo, produz uma quadrantopsia
bitemporal inferior (fibras superonasais cruzadas), com o aumento da compressão o defeito
progride no sentido anti-horário no olho direito e horário no esquerdo (direção das setas) (Fig.
5B). Exemplo deste tipo de lesão campimétrica é causada pelo craniofaringioma.
Compressão na parte posterior do quiasma por cima (fibras da metade nasal da mácula),
produz escotoma hemianópico bitemporal (Fig. 5D).
Compressão bilateral pela margem lateral do quiasma produz hemianopsia binasal (fibras
temporais não cruzadas) (Fig. 5E), exemplo é o aneurisma da artéria carótida.
Massa na região retroquiasmática deslocando o quiasma, produz hemianopsia homônima
incongruente porque afeta também o trato óptico.
Semiologia Básica da Visão Periférica e Campimetria 63

Olho esquerdo Olho direito

T N N T

A AV = 20/20 AV = 20/400

B AV = 20/20 AV = 20/400

C AV = 20/20 AV = 20/400

D AV = 20/20 AV = 20/20

E AV = 20/20 AV = 20/20

3mm W/1.000 mm

Figs. 5 (A-E) Tipos de defeitos do CV bitemporal na tela tangente com objeto branco de 3 mm e a 1 m de
distância. A. Lesão anterior e inferior do quiasma com compressão do nervo óptico. B. Lesão anterior e
superior do quiasma afetando predominantemente o lado direito. C. Lesão progressiva inferior do quiasma.
D. Lesão posterior do quiasma causando escotoma hemianópico bitemporal. E. Compressões laterais do
quiasma causando hemianopsia binasal. Setas = direção da progressão do defeito; AV = acuidade visual; T=
temporal; N= nasal. (Adaptado e modificado de Wray SH, Pavan-Langston D.)

Trato óptico
As fibras que vêm da retina após passarem pelo quiasma tornam-se mais aglomeradas. No fi­
nal do trato óptico e no corpo geniculado lateral as fibras que começaram na porção superior
do nervo óptico tornam-se mediais, e as fibras inferiores do nervo óptico tornam-se laterais
(Fig. 2A). Esta rotação resulta em uma localização medial para as fibras do quadrante superior
de cada retina (1 = fibras da retina temporal superior do olho ipsilateral e 2 = fibras da retina
nasal superior cruzadas do olho contralateral) e localização lateral para as fibras do quadrante
inferior de cada retina (3= fibras da retina temporal inferior do olho ipsilateral e 4 = fibras
da retina nasal inferior cruzadas do olho contralateral). As fibras maculares (M) estão entre a
64 | Semiologia Básica em Oftalmologia

porção superomedial e inferolateral das fibras nervosas do trato óptico e do corpo geniculado
lateral.
Na lesão do trato óptico anterior temos uma hemianopsia homônima incongruente (Figs.
4.5 e 6D), que cursa com defeito pupilar aferente relativo contralateral e palidez do disco óp­
tico em forma de banda, isso acontece porque as fibras nasais cruzadas têm maior representa­
ção no CV. A resposta é fraca à luz no hemicampo com a hemianopsia e normal no hemicampo
normal (pupila hemianópica de Wernicke).
Lesão no trato óptico posterior resulta em uma hemianopsia homônima completa (Fig.
4.6), incongruente e com bissectação da mácula.
Lesões no trato óptico são raras e ocorrem no traumatismo craniano, adenoma hipofisá-
rio, craniofaringioma e nas malformações vasculares.

Corpo geniculado lateral (CGL)


O CGL tem 6 lâminas, numeradas do ventre para o dorso, as camadas 1,4 e 6 recebem as fibras
cruzadas do olho contralateral e as camadas 2, 3 e 5 as fibras não cruzadas do olho ipsilateral.
Nesta localização há um alinhamento vertical do CV. O lado direito do cérebro recebe informa­
ções do lado esquerdo do CV e vice-versa; então o trato óptico direito e o CGL direito recebem
informações do CV esquerdo, ou seja, informações da metade direita de cada retina (retina
temporal em olho direito e retina nasal em olho esquerdo).
Lesões no CGL são extremamente raras, produzem hemianopsias homônimas altamente
incongruentes.

Radiações ópticas (trato geniculocalcarino)


As fibras nervosas das radiações ópticas se originam das 6 camadas do CGL.
Todas as fibras espalham-se lateral e inferiormente em volta do corno temporal do ventrí­
culo lateral. Ao se espalharem lateralmente as fibras ascendem um pouco no braço posterior
da cápsula interna; lesões vasculares nessa região provocam hemiplegia e hemianopsia homô­
nima.
As fibras mais anteroinferiores formam a alça de Meyer, que contém projeções das fibras
retinianas inferiores que se espalham em direção ao polo do lobo temporal. Lesão nesta região
produz quadrantopsia homônima superior (pie in the sky) (Figs. 4.7 e 6A).
Profundamente no lobo parietal, as radiações ópticas encontram-se externas ao trígono e
passam para a superfície medial do lobo occipital (sulco calcarino estriado).
Lesões nas radiações ópticas anteriores tendem a ser incongruentes e quando se aproxi­
mam do córtex visual tendem a ser congruentes. Lesões nas radiações ópticas no lobo tempo­
ral causam quadrantopsia superior e no lobo parietal superior causam quadrantopsia inferior
(pie o/7 the floor) (Fig. 6C).
Lesões no lobo parietal causam um defeito na atenção. No teste de confrontação simultâ­
nea há o fenômeno da extinção, ou seja, ao apresentarem-se simultaneamente dois estímulos,
como, por exemplo, o movimento dos dedos das mãos, o estímulo não é visível no CV afetado,
mas previamente com o teste de confrontação simples este mesmo objeto era visível neste
mesmo campo afetado.
Semiologia Básica da Visão Periférica e Campimetria 65

Lesão temporoparietal à esquerda causa quadrantopsia homônima superior à direita (Fig.


6B) ou hemianopsia homônima completa à direita (Fig. 6E), lesão tempoparietal à esquerda
cursa com defeito de reconhecimento de símbolo visual, alexia e agrafia. Lesão temporopa­
rietal à direita causa defeito de julgamento na relação espacial, agnosia topográfica e apraxia
construcional.
Lesão parietoccipital cursa com hemianopsia homônima completa (Fig. 6E) e ausência do
nistagmo optocinético, quando as faixas do cilindro optocinético são movimentadas em dire­
ção à lesão; no fechamento forçado das pálpebras, os olhos do paciente desviam conjugada-
mente para cima e lateralmente para o lado oposto da lesão (sinal de Cogan).

Figs. 6 (A-F) Tipos de defeitos campimétricos homônimos. A. Quadrantopsia temporal superior direita (pie
in the sky), devido à lesão das fibras anteroinferiores das radiações ópticas no lobo temporal esquerdo. B.
Quadrantopsia temporal superior direita completa, devido à lesão nas radiações ópticas no lobo
temporoparietal esquerdo. C. Quadrantopsia temporal inferior completa direita, devido à lesão nas radiações
ópticas no lobo parietal (pie on the floor ). D. Hemianopsia homônima direita incongruente, devido à lesão nas
radiações ópticas anteriores. E. Hemianopsia homônima completa direita, devido à lesão nas radiações
ópticas temporoparietal ou córtex visual esquerda. F. Escotoma hemianópico homônimo congruente em
direção à fixação no quadrante inferior esquerdo, devido à lesão no córtex visual direito (Wray SH, Pavan-
Langston D.)

Córtex visual
O córtex visual primário (área 17 de Brodmann) ou córtex estriado está na superfície medial
do lobo occipital na fissura inter-hemisférica. Os córtex dos dois lobos occipitais constituem
as paredes do sulco calcarino.
O lábio dorsal superior do sulco recebe a projeção do quadrante superior de ambas as
retinas e representa o quadrante inferior do CV binocular do lado oposto.
66 Semiologia Básica em Oftalmologia

O lábio ventral inferior do sulco é representado pelo quadrante superior do CV binocular


do lado oposto.
A periferia da retina é representada mais anteriormente, profundamente na região rostral
do córtex visual, próximo ao esplênio do corpo caloso.
A mácula é representada posteriormente (na ponta do córtex occipital), por uma extensa
área do córtex visual e estende-se posterolateralmente no lobo occipital; é suscetível a trau­
mas e ferimentos por arma de fogo.
O tipo mais comum de defeito do CV em lesão do córtex visual é a hemianopsia homônima
congruente contralateral. Está frequentemente relacionado com a oclusão embólica da artéria
cerebral posterior quando há preservação da visão macular (não há bissectação da mácula),
outras causas incluem os traumatismos, tumores, abscesso e desmielinização.
Escotoma hemianópico homônimo congruente tende a ser de forma setorial, preenchen­
do uma área triangular do quadrante, o ápice aponta para a fixação (Fig. 6F). Esse tipo de cam­
po está relacionado com o dano no polo occipital.
Na hemianopsia homônima com preservação macular (Fig. 4.9), a lesão é quase sempre no
lobo occipital e a etiologia é quase sempre infarto no território da artéria cerebral posterior.
Escotomas altitudinais ocorrem mais frequentemente aos traumas ou ferimento por balas
que passam horizontalmente através de ambos os lobos occipitais.
Preservação da crescente temporal, na presença de hemianopsia homônima congruente,
permite a localização da lesão na região posterior do córtex estriado, com a preservação do
córtex anterior. Lesão na fissura calcarina anterior produz defeito na crescente temporal ou o
elimina (Fig. 4.10). Lesão na ponta do lobo occipital produz escotomas hemianópicos homô­
nimos (Fig. 4.11).
Hemianopsia homônima bilateral resulta da lesão isquêmica bilateral do córtex visual. Po­
dendo ser de dois tipos: 1- na cegueira cortical, o paciente não está consciente da sua ceguei­
ra, é denominada síndrome de Anton, sendo caracterizada por cegueira bilateral, reflexos pu­
pilares normais, fundo de olho normal, negação da cegueira e lesão occipitocortical bilateral;
e 2- visão em túnel com preservação macular, resulta da oclusão bilateral das artérias cerebrais
posteriores ou infarto do lobo occipital, mas com preservação da ilha central da visão, o CV
periférico é contraído e a visão está preservada.

Defeitos de campo de origem não orgânica


Na ausência de alterações no nervo óptico (sem edema do disco, atrofia e do defeito pupilar
aferente relativo) e degenerações retinianas; a presença de campos uni (Fig. 3G) ou bilaterais
contraídos, frequentemente é o tipo mais comum de alterações campimétricas nas causas
funcionais ou não orgânicas. Estes achados podem ser resultados da fadiga, falta de atenção,
incompreensão, simulação ou histeria dos pacientes. Campos visuais em espiral (Fig. 3H) e
tubular também são comuns na histeria, as isópteras no campo de Goldmann não são repro­
dutíveis.
Pode-se usar a tela tangente para a diferenciação entre a constrição do CV não orgâni­
ca (histeria ou simulação) e orgânica. Para esta diferenciação o paciente é testado com alvo
branco de 9 mm a 1 m e posteriomente a 2 m com alvo branco de 18 mm. O campo deve
expandir-se o dobro do tamanho original em pacientes normais. A falha em detectar o aumen­
Semiologia Básica da Visão Periférica e Campimetria 67

to do campo (CV tubular) é não fisiológica e indica um componente não orgânico no paciente
examinado.

BIBLIOGRAFIA
Dias JFP. Campo visual. In: Dias JFP, Imamura PM. 2a ed. Rio de Janeiro: Cultura Médica, 2001 ; p. 1-10.
Dias JFP.Terminologia e interpretação dos defeitos do campo visual. In: Dias JFP, Imamura PM. 2a ed. Rio de Janeiro: Cultura
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Miller NR, Newman NJ. Approach to the patient: examination of the visual sensory system. In: Miller NR, Newman NJ -The
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Wilson II FM. Oftalmologia prática - manual para o residente. In: Wilson II FM. Campo visual. 4a ed. Rio de Janeiro: Revinter,
2004, p. 143-69. Tradução do original americano, Practical ophthalmology - a manual for beginning residents, 4th ed.
American Academy of Ophthalmology.
Wray SH, Pavan-Langston D. Neuroophthalmology: visual fields, optic nerve and pupil. Pavan-Langston D. Manual of ocu­
lar diagnosis and therapy. 5th ed. Philadelphia: Lippincott Williams & Wilkins, 2002, p. 365-78.

L i t e r a t u r a S u g e r i d a

1. Wray SH, Pavan-Langston D. Neuroophthalmology: visual fields, optic nerve and pupil. Pavan-Langston D. Manual of
ocular diagnosis and therapy. 5th ed. Philadelphia: Lippincott Williams & Wilkins, 2002; p. 365-78.
Biomicroscopia Básica em
Oftalmologia

FERNANDO DOS REIS SPADA

INTRODUÇÃO
Talvez nenhum outro instrumento no armamentário oftalmológico seja tào versátil e útil no
exame ocular quanto a lâmpada de fenda. Sua utilidade é demonstrada nào só no exame dos
anexos oculares (pálpebras e cílios) e segmento anterior (conjuntiva, córnea, íris, cristalino),
como também na avaliação do segmento posterior mediante a utilização de lentes acessórias
(corneanas ou pré-comeanas). Além disso, também é muito útil para a realização de tonome-
tria (acoplamento de tonômetros) e gonioscopia (lentes de 3 ou 4 espelhos de Goldmann e
Zeiss, respectivamente).
Por propiciar o estudo de praticamente todas as estruturas oculares, uma lâmpada de
fenda de boa qualidade, além de bom conhecimento de todas as suas funções e seu adequado
controle, é, hoje, essencial para a boa prática oftalmológica diária.

HISTÓRIA
Até o surgimento dos primeiros biomicroscópios o exame ocular se baseava apenas na ilu­
minação solar para uma melhor observação das estruturas oculares. No início do século XIX,
Himly e Mackenzie enfatizaram a importância de um feixe oblíquo, focal e condensado de
luz, no exame ocular. Em 1923, Purkinje utilizou pela primeira vez uma lente manual para
magnificar detalhes da íris e uma segunda lente condensadora para formar um forte feixe de
luz oblíquo. Trinta anos mais tarde, Liebreich publicou discussões sobre a técnica de exame,
advogando seu uso por todos os oftalmologistas. Liebreich também foi o primeiro a descrever
o uso de diferentes formas de feixe luminoso no estudo ocular, o que de maneira grosseira,
se aproxima das técnicas de exame atuais. Em 1863, DeWecker mostrou um biomicroscópio
70 Semiologia Básica em Oftalmologia

monocular portátil que se apoiava na face do paciente, associado a uma lente condensadora
de luz (Fig. 1).
Em 1891, Aubert e Greenough apresentaram um biomicroscópio binocular no congresso
oftalmológico de Heidelberg. Seis anos mais tarde, Czapski e Schatz melhoraram o projeto,
conseguindo, através de sistemas ópticos independentes, melhor estereopsia, com imagens
mais brilhantes e tamanhos iguais (Fig. 2).
Apesar dessa grande evolução, havia certa desconfiança em relação a estes aparelhos, pois
a iluminação obtida deixava muito a desejar. Mas em 3 de agosto de 1911 tudo mudou com a
apresentação, por Gullstrand, de seu projeto de iluminação em fenda (Fig. 3).
Bastou Henker, em 1916, juntar o microscópio de Czapski com a iluminação em fenda de
Gullstrand para que surgisse a lâmpada de fenda nos padrões atuais (Fig. 4).
Desta data em diante, inúmeros aprimoramentos foram obtidos nos sistemas de ilumina­
ção (com feixes luminosos mais potentes, homogêneos e com tamanho e inclinação variáveis),
microscópico (com melhores e maiores magnificações e estereopsia) e mecânico (com melhor
integração entre os dois sistemas anteriores, além de um controle de focalização mais fácil).

Fig. 1 Biomicroscópio monocular portátil de DeWecker (1863).

Fig. 2 Biomicroscópio binocular de Czapski e Schatz (1897).

Fig. 3 Iluminação em fenda de Gullstrand (1911).


Biomicroscopia Básica em Oftalmologia 71

Fig. 4 Junção, por Henker, do microscópio de Czapski com a


iluminação em fenda de Gullstrand (1916).

LÂMPADAS DE FENDA ATUAIS


As lâmpadas de fenda atuais são compostas por três sistemas: a) biomicroscópio, através do
qual o olho é observado; b) de iluminação, com funções especiais (fenda) que dão nome ao
aparelho; c) mecânico e de focalização que dá suporte às outras duas partes facilitando o exa­
me (Fig. 5).

Fig. 5 Lâmpada de fenda Topcon modelo SL-3C e seus sistemas:


A - microscópico; B - de iluminação; C - mecânico e de focalização.

Sistema de iluminação
Tem por função produzir uma imagem em fenda mais brilhante e homogênea possível, com
comprimento, largura e inclinação variáveis, e a uma distância determinada do instrumento,
de maneira a permitir a manipulação do olho pelo examinador.
r

E composto por lâmpadas, espelhos, diafragmas e filtros. Apresenta a possibilidade de


rotação da fenda, além de inclinação da iluminação ou desacoplagem da mesma em relação à
imagem.
As lâmpadas podem ser convencionais ou halógenas. As últimas, apesar de apresentarem
feixe luminoso mais intenso e homogêneo, são mais caras, o que muitas vezes as afasta de
parte dos consultórios oftalmológicos brasileiros.
72 Semiologia Básica em Oftalmologia

Dois espelhos compõem o sistema. O grande, em formato de raquete, é o que quase sempre
é utilizado. O pequeno, de formato retangular, é utilizado apenas quando há uma angulação me­
nor ou igual a 10° entre o sistema de iluminação e o microscópio (estudo do segmento posterior).
Os diafragmas têm como função mudar a largura e o comprimento da fenda luminosa. A
largura é modificada utilizando-se o parafuso na base do sistema de iluminação (Fig. 6E). Varia
de 0 a 9 mm, tornando-se um círculo quando em abertura máxima. Para controle do compri­
mento ou altura da fenda, deve-se movimentar a haste junto ao controle do filtro azul, poden­
do variar desde 0,2 mm até 9 mm (Fig. 7C).
A rotação da fenda (vertical, horizontal ou oblíqua) é obtida através da lateralização da
cabeça do sistema de iluminação, sem que o corpo desta seja movido. Este movimento é útil
quando se utiliza lentes acessórias com espelhos para avaliação da periferia retiniana ou seio
camerular. Já a inclinação do sistema de iluminação (0o a 20°) é obtida utilizando-se a trava
para inclinação do sistema, e serve para melhor observar a periferia retiniana, base do corpo
vítreo e seio camerular (Fig. 8).
Em casos onde é interessante um feixe luminoso não coincidente com o foco do micros­
cópio (campos negro e vermelho, por exemplo), pode-se desacoplar o sistema de iluminação
do sistema microscópico através do afrouxamento do parafuso de conjugação iluminação/
microscópio (Fig. 6D).

Fig. 6 A - Joystick para controle de movimentação e focalização


da lâmpada de fenda. B - Parafuso para travamento dos
movimentos da base da lâmpada. C - Pino para inclinação do
sistema de iluminação. D - Parafuso para acoplar/desacoplar a
lâmpada de fenda. E - Parafuso para controle da largura da fenda.

Fig. 7 A - Mostrador, em milímetros, da altura da fenda


luminosa. B -Seletor do filtro de luz. C - Parafuso para controle
da altura da fenda luminosa.
Biomicroscopia Básica em Oftalmologia 73

Fig. 8 Lâmpada de fenda com sistema de iluminação


na posição vertical e inclinado.

Três tipos de filtro são observados em uma lâmpada de fenda: filtro de cobalto (ou luz
azul), utilizado nos exames com fluoresceína, como avaliação do epitélio corneano, lágrima
(BUT), ou tonometria; filtro red-free (luz verde) utilizado no estudo da camada de fibras ner­
vosas, lesões retinocoroideanas, vasos retinianos, corpo vítreo e humor aquoso; filtro de luz
e calor, indicado para diminuir a fotofobia em pacientes que devem ser submetidos a exame
com iluminação voltada diretamente ao olho (Fig. 7B).

Sistema microscópico
Idealmente deve propiciar ótima observação estereoscópica com magnificações variáveis. Os
campos de visão e profundidade de foco devem ser os maiores possíveis, e deve haver espaço
suficiente em frente ao microscópio para a manipulação ocular.
r

E composto por oculares, sistema de prismas, objetivas e canhões das oculares, graduados
em dioptrias. Pode proporcionar magnificações de imagem nas melhores lâmpadas de fenda,
de 6x, 10x, 16x, 25x e 40x.

Sistemas mecânico e de focalização


Deve ser o mais funcional possível, integrando, mas também permitindo, movimentos suaves
e independentes entre os sistemas de iluminação e microscópio. Além disso, com o joystick,
deve permitir o controle dos movimentos em três dimensões (X, Y, Z).
r

E composto pela base da lâmpada de fenda, onde se encontra o joystick, parafuso de tra-
vamento da base e cremalheira (ou trilho), por onde a base se desloca.

TIPOS DE ILUMINAÇÃO
Dois tipos básicos de iluminação são utilizados: direta e indireta.
74 | Semiologia Básica em Oftalmologia

Iluminação direta
E a iluminação em que objeto observado e iluminação empregada são coincidentes, ou seja,
estão localizados em um mesmo plano. Pode ser difusa (fenda ampla) ou focal, sendo a focal
subdividida em paralelepípedo, corte óptico, pincel luminoso e microscopia especular.

Iluminação direta difusa


Utiliza feixe luminoso amplo (fenda aberta) e tem por finalidade o estudo global da estrutura
ocular. Nesta modalidade, a iluminação (fenda aberta) tem formato circular e é apenas leve­
mente menor do que o campo de visão (Fig. 9).

Fig. 9 Iluminação direta difusa. (Imagem fornecida pelo Dr.


Fernando Oréfice.)

I l u m i n a ç ã o d i r e t a f o c a l

Utiliza a iluminação em fenda com diferentes espessuras e altura, com o intuito de se estudar
em detalhes as estruturas oculares (Fig. 10). Pode ser:
■ Paralelepípedo: formado quando se utiliza fenda de pequena espessura, observando-se
uma face anterior, uma face posterior, uma base superior, uma base inferior, uma face me­
dial e uma face lateral. Tem por objetivo o estudo da posição de lesões nas estruturas ocu­
lares, principalmente a córnea (Fig. 11).
■ Corte óptico: formado ao se diminuir a espessura do paralelepípedo, de maneira que
as faces medial e lateral se encontrem. Assim, se observará apenas uma linha de perfil
anterior (LPA), que corresponde à face anterior do paralelepípedo, e uma linha de perfil
posterior (LPP), que corresponde à face posterior do paralelepípedo. Tem por finalidade
o estudo de saliências ou depressões, além da localização da profundidade das lesões na
córnea (Fig. 11).
■ Pincel luminoso: formado quando se utiliza uma fenda de 1 x 1 mm. Está indicado no es­
tudo do humor aquoso (avaliação de células e flare em reações de câmara anterior) e vítreo
anterior (Fig. 12).
Biomicroscopia Básica em Oftalmologia 75

Fig. 10 Iluminação direta focal. (Imagem fornecida pelo Dr.


Fernando Oréfice.)

Fig. 11 À esquerda, iluminação direta focal tipo


paralelepípedo; à direita, iluminação direta focal tipo
corte óptico, com linha de perfil anterior (ABCD) e
linha de perfil posterior (A' B' C D'). (Imagem
fornecida pelo Dr. Fernando Oréfice.)

Fig.12 Iluminação direta focal tipo pincel luminoso


para avaliação do humor aquoso. (Imagem fornecida
pelo Dr. Fernando Oréfice.)

■ Iluminação especular: utilizada para avaliação do endotélio corneano, a iluminação espe­


cular é obtida quando se forma um ângulo entre o braço de iluminação e o braço do mi­
croscópio superior a 60°, focalizando-se o microscópio no endotélio com grande aumento.
Devido ao grande aumento da imagem, e consequente pequena área em estudo, neste tipo
de iluminação a observação é monocular (Fig. 13).
76 Semiologia Básica em Oftalmologia

Fig. 13 Iluminação direta focal tipo


especular para a avaliação do endoté-
lio corneano. (Imagem fornecida pelo
Dr. Fernando Oréfice.)

Iluminação indireta
r

E aquela em que objeto observado e feixe luminoso são focalizados em planos diferentes.
Também pode ser classificada em focal ou difusa, sendo esta última subdividida em campo
negro, campo amarelo, campo branco e campo vermelho.

I l u m i n a ç ã o i n d i r e t a f o c a l

Obtida quando o feixe luminoso é projetado próximo, mas não no mesmo plano ao objeto em
r

observação. Util na avaliação de margens de lesões, como úlceras corneanas, e no estudo de


estruturas brilhantes, como conjuntivas bulbar e tarsal, onde o reflexo da iluminação atrapalha
a observação da estrutura em estudo, quando focalizado no mesmo plano. Nesta iluminação,
microscópio e braço de iluminação devem estar desacoplados.

I l u m i n a ç ã o i n d i r e t a d i f u s a

Também conhecida como retroiluminação ou campos, é obtida com a projeção do feixe lumi­
noso em um plano localizado atrás do objeto em observação, com o intuito de se estudar as
estruturas sob um campo retroiluminado:
■ Campo vermelho: obtido ao projetar-se o feixe luminoso através da pupila, no plano coroi-
dorretiniano. Este feixe deve ser denso, porém pequeno, não tocando as margens da pu­
pila. Utilizado principalmente para o estudo do cristalino e epitélio pigmentário da íris. É
binocular em caso de pupila midriática e monocular em pupilas dinâmicas (Fig. 14).
■ Campo negro: projeta-se o feixe luminoso na periferia da córnea e focaliza-se o microscópio
na córnea (lâmpada de fenda desacoplada), com o objetivo de estudar as estruturas corneanas
anteriores (Fig. 15).
■ Campo amarelo: é obtido através da projeção de feixe luminoso inclinado no plano da
íris, sendo observadas as estruturas anteriores à iluminação obtida pela reflexão da luz na
mesma. Utilizado para estudo da córnea e câmara anterior, está indicado na avaliação de
precipitados ceráticos e vasos e nervos corneanos (Fig. 16).
■ Campo branco: o feixe luminoso é projetado no cristalino e são estudadas estruturas ante­
riores a este, como humor aquoso e epitélio pigmentário da íris, além da metade anterior
do cristalino. Assim como no campo vermelho, o feixe luminoso também não deve tocar as
margens da pupila (Fig. 17).
Biomicroscopia Básica em Oftalmologia 77

Fig. 14 Iluminação indireta difusa


tipo campo vermelho. Observa-se, à
direita, rarefação do epitélio pigmentar
iriano, ou retroiluminação positiva.
(Imagem fornecida pelo Dr. Fernando
Oréfice.)

yu

Fig. 15 Iluminação indireta difusa


tipo campo negro. Observa-se, à
direita, distrofia corneana granular.
(Imagem fornecida pelo Dr. Fer­
nando Oréfice.)

Fig. 16 Iluminação indireta difusa tipo campo amarelo.


(Imagem fornecida pelo Dr. Fernando Oréfice.)

Fig. 17 Iluminação indireta difusa tipo campo


amarelo. (Imagem fornecida pelo Dr. Fernando
Oréfice.)
78 Semiologia Básica em Oftalmologia

LENTES ACESSÓRIAS
Utilizadas para se estudar o seio camerular, periferia retiniana, base do vítreo e polo posterior,
podem ser divididas em pré-corneanas e corneanas.

Lentes pré-corneanas
Também conhecidas como lentes de não contato, por não necessitarem de contato com o olho
para realização do exame, têm nesse fato sua grande vantagem, pois podem ser usadas em pa­
cientes mais apreensivos, como crianças, e em casos de infecções oculares ou pós-operatório.
Como desvantagens, podemos citar menores campos de visão e magnificação do que os obti­
dos com as lentes de contato, além da necessidade de iluminação muito forte.
As mais utilizadas na prática diária são do tipo Volk, que são convexas e asféricas, forman­
do imagens reais e invertidas. Podem ter 60, 78 e 90 dioptrias, sendo as duas últimas as mais
difundidas na prática oftalmológica diária (Fig. 18).
As lentes de 78D fornecem imagens com maiores aumento e resolução, porém com campo
de visão menor do que com a lente de 90D. São muito importantes na observação de peque­
nos detalhes das estruturas do polo posterior.
As lentes de 90D fornecem maior campo de visão (até 60° com pupilas maiores que 5 mm),
permitindo assim maior facilidade de exame em pupilas muito pequenas, porém com menor
magnificação do que com a lente de 78D. Por isso, como desvantagens, podemos citar a maior
dificuldade na observação de detalhes das estruturas do polo posterior, além da necessidade
de maior proximidade da lente em relação ao olho para focalização.
Outra lente cujo uso não é tão difundido, mas que em alguns serviços é utilizada, é a lente
de Hruby, que geralmente vem de fábrica já acoplada à lâmpada de fenda através de um braço
articulado. Constitui-se de uma lente plano-côncava, de 58,5D, que é utilizada a 10 a 20 mm da
córnea, com a parte côncava voltada para a mesma. Forma imagem virtual e direita, mas com
magnificação pequena e campo de visão que não ultrapassa o polo posterior.

Fig. 18 Lentes pré-corneanas tipo Volk.

Lentes corneanas
Também conhecidas por lentes de contato, pela necessidade de contato com o olho observa­
do, permitem o estudo das estruturas oculares diretamente através de sua parte óptica (lente
propriamente dita), ou indiretamente através de seus espelhos.
Biomicroscopia Básica em Oftalmologia 79

■ Lente de três espelhos de Goldmann (Fig. 19): lente côncava, com poder de -64D, forma
imagem retiniana virtual e direita, com bom campo (ângulo) de visão de 30°. Apresenta 3
espelhos com angulações diferentes. Através do espelho angulado a 59° (Fig. 19, espelho
3), observam-se as estruturas do seio camerular, ora serrata e base do corpo vítreo; no es­
pelho angulado a 67° observam-se região anterior do equador retiniano, retina periférica e
margem posterior do corpo vítreo (Fig. 19, espelho 2); o espelho angulado a 73° permite a
observação da região entre equador, polo posterior e cortical do corpo vítreo (Fig. 19, es­
pelho 1). Além disso, podem-se examinar corpo vítreo e polo posterior através da abertura
central da lente.

Tem como maior vantagem sua versatilidade, pois permite avaliação desde o polo poste­
rior até o seio camerular. Como desvantagens, a necessidade de anestésico para a realização
do exame, o fato de apresentar apenas 1 espelho para observação do seio camerular, o que faz
necessária a rotação da lente para que se possa observar 360°, além da necessidade do uso de
substância viscoelástica.
■ Lente de 4 espelhos de Zeiss: apresenta 4 espelhos com a mesma angulação (62°), permi­
tindo a realização de gonioscopia 360° sem a necessidade de rotação da lente. Além disso,
permite uma gonioscopia dinâmica ou de indentação, isto é, através da pressão exercida
pela lente sobre a córnea, o humor aquoso é direcionado para o seio camerular, abrindo-se
assim o recesso angular, diferenciando-se, desta maneira, ângulos estreitos, onde há aber­
tura do ângulo com esta manobra, de ângulos fechados (sinequiados), onde não há abertura
dele. Outra vantagem é a não necessidade de uso de viscoelástico. Também permite a ob­
servação do corpo vítreo e polo posterior através da abertura central da lente. Entre as des­
vantagens, além do uso obrigatório de anestésico, pode-se citar a impossibilidade de estu­
do da periferia retiniana e base do corpo vítreo, pois não há espelhos angulados para isso.

0 = Observação das áreas centrais da retina

1 = Observação da média periferiria retiniana

2 = Observação da extrema periferia retiniana


e base vítrea

3 = Observação do seio camerular

Fig. 19 Lente corneana de Goldmann com 3 espelhos e seus respectivos campos de


visão.
80 Semiologia Básica em Oftalmologia

BIOMICROSCOPIA DO SEGMENTO ANTERIOR


Para o exame do segmento anterior do olho, a biomicroscopia é o exame mais utilizado e existem
diversas e diferentes formas de se analisar e estudar cada parte do olho humano utilizando a lâm-
r

pada de fenda. E um exame fundamental e indispensável em todas as consultas oftalmológicas.

Pálpebras e margens palpebrais


O exame biomicroscópio começa sempre pelas pálpebras, margens palpebrais, cílios e pontos
lacrimais, onde podemos encontrar informações importantes que podem estar causando irri­
tação, baixa visual, prurido e outros sintomas. Os tipos de iluminação utilizados são a direta
difusa e direta focal.
No exame das pálpebras, podem-se observar alterações inflamatórias e infecciosas como
blefarites, calázio, hordéolo, meibomite e ainda alterações ciliares como triquíase, distiquíase
e madarose. Usando o corte óptico podemos estudar o ponto lacrimal, observando sua locali­
zação (entrópio ou ectrópio), orifício, coloração e funcionalidade.

Conjuntiva e esclera
No exame da conjuntiva e esclera os tipos de iluminação mais utilizados são a diretas difusa e
focal. Também as iluminações indiretas difusa e focal podem ser empregadas, estando indicadas
quando o reflexo brilhante da iluminação direta na conjuntiva estiver atrapalhando a observa­
ção de alguma de suas estruturas.
O estudo da conjuntiva traz várias informações importantes para o examinador. No exame da
conjuntiva bulbar pede-se para o paciente olhar para todas as direções, o que propicia o exame da
conjuntiva do lado oposto ao olhar. No exame da conjuntiva tarsal e fórnice conjuntival deve-se
utilizar um cotonete como auxílio para everter as pálpebras e observar melhor as estruturas.
Para fins diagnósticos, apenas os 2/4 centrais da conjuntiva tarsal apresentam valor diag­
nóstico. Os 1/4 temporal e nasal, e alguns milímetros das bordas livres e plateau frequentemen­
te apresentam alterações, como folículos, e não devem ser considerados patológicos.
Algumas alterações inflamatórias e infecciosas da conjuntiva têm importante valor diag­
nóstico e, por isso, serão descritas com maior detalhamento:
■ Hipertrofia papilar (Fig. 20A): encontrada apenas onde a conjuntiva está aderida aos teci­
dos subjacentes por septos fibrosos (tarso e limbo). São dobras ou projeções de epitélio

Figs. 20 (A-C) A. Conjuntivite papilar gigante. B. Hemorragia subconjuntival. C. Pterígio.


(Imagens fornecidas pelo Dr. Umberto Benelli - www.eyetalas.com.)
Biomicroscopia Básica em Oftalmologia 81

hipertrófico, com forma poligonal (devido à delimitação por septos fibrosos) e centro fibro-
r

vascular. Seu vaso central se arboriza ao atingir a superfície. E um sinal inespecífico de in­
flamação conjuntival, resultante de edema e infiltração conjuntival por polimorfonucleares
(PMN) (Tabela I).

TABELA I Avaliação da conjuntivite quanto à reação conjuntival


Etiologia Folículos Papilas Pseudomembranas
Virai + —
*
Bacteriana —
+ **
Alérgica —
+ —

Chlamydia + — —

Tóxica + — —

+: presente / ausente. * presente em algumas infecções por adenovírus.**presente em infecções por Corynebacterium diphtheriae
e Streptococcus beta-hemolíticos.

■ Hipertrofia folicular: encontrada na conjuntiva tarsal superior, fundo de saco inferior e lim­
bo. São elevações branco-amareladas, arredondadas da conjuntiva, produzidas por respos­
ta linfocítica. Ao contrário das papilas, não apresentam um vaso central, mais sim ao redor
de sua base (Tabela I).
■ Membranas e pseudomembranas: são depósitos de fibrina aderidos ao epitélio conjuntival.
A diferenciação entre as duas está no fato de a membrana verdadeira ser decorrente de uma
inflamação mais intensa, provocando sangramento quando removida (Tabela I).
■ Secreção conjuntival: pode ser aquosa, mucosa, mucopurulenta ou purulenta. Sua definição
é importante no auxílio diagnóstico da conjuntivite (Tabela II).

TABELA II Avaliação da conjuntivite quanto à secreção


Etiologia Serosa Mucosa Mucopurulenta Purulenta
Bacteriana — —
+ +
Virai + — — —

Alérgica + + — —

Chlamydia —
+ + —

Tóxica + + + —

+: presente / ausente.

■ Flictênulas: são nódulos com pronunciada infiltração leucocitária decorrentes da reação de


hipersensibilidade celular, localizados no epitélio da conjuntiva ou da córnea. Podem ser
causadas por estafilococo ou tuberculoproteína.
■ Granulomas: são nódulos sésseis ou pedunculados, semelhantes a pólipos. São encontra­
dos em infecções ou processos irritativos crônicos, como a presença de corpos estranhos
ou fios de sutura.
■ Cicatrizes: compõem-se de cordões ou áreas de fibrose, brancas ou calcáreas, localizados
em regiões conjuntivais submetidas a traumas mecânicos (cirurgia), químicos (queimadu­
ras), irradiação ou inflamação (síndrome de Stevens-Johnson). No tracoma estão predomi­
nantemente localizados no tarso superior.
82 Semiologia Básica em Oftalmologia

■ Simbléfaro: são áreas de aderência entre as conjuntivas bulbar e tarsal. Ocorre em queima­
duras ou inflamações oculares graves (síndrome de Stevens-Johnson). Quando ocorre ade­
são completa entre conjuntivas bulbar e tarsal, denomina-se anquilobléfaro.

A esclera também deve ser avaliada, pois pode ser a causa de olho vermelho em muitos
pacientes, através de alterações como esclerites, episclerites, nodulações, escleromalácia e
outros. Pode ser necessária a utilização do filtro red-free, com o qual se observa melhor em
que camada estão os vasos sanguíneos dilatados, ajudando na diferenciação entre esclerite e
episclerite.

Filme lacrimal
Vários pacientes têm queixas de dores e irritação ocular por disfunções do filme lacrimal. Por
isso, é sempre importante avaliar o volume, qualidade, produção e drenagem lacrimal.
Com a observação do filme lacrimal podem-se perceber debris oleosos no caso de disfun­
ção das glândulas de Meibomius e, examinando a superfície corneana, podem-se observar
defeitos epiteliais ponteados (puntata), como nos casos de ceratoconjuntivite sicca.
Um teste utilizado para mensurar a qualidade do filme lacrimal é o break-up time (BUT), em
que se instila 1 gota de colírio de fluoresceína a 2% e com o paciente sem piscar, observa-se
usando o filtro de cobalto (luz azul) da lâmpada de fenda, o tempo de quebra do filme lacrimal.
Em olhos normais, o tempo de rotura varia entre 10 e 35 s; tempo menor que 10 s é sugestivo
de olho seco e, menor do que 5 s, é claramente anormal.
Outro teste também utilizado para quantificar o grau de olho seco do paciente é o teste
com corante rosa-bengala a \%, onde se instila o corante na região do fórnice inferior sem
anestesia e se observa com luz anerita a presença do corante e sua intensidade. A partir daí,
utiliza-se a escala de Bijsterveld (Fig. 21), em que cada região (conjuntiva nasal, córnea e con­
juntiva temporal) recebe uma graduação de 0 a 3 de acordo com a intesidade do corante (1)
coloração puntiforme, (2) pontos confluentes e (3) placas extensas de coloração. O teste tam­
bém pode ser feito com corante lisamina verde que é menos irritativo para a superfície ocular.

Fig. 21 Escala numérica de Bijsterveld. Acima: divisão da


superfície ocular em 3 áreas que poderão receber graduação
de 0 a 3; abaixo: esquema de graduação em relação a
intensidade do corante.
Biomicroscopia Básica em Oftalmologia | 83

Córnea
A biomicroscopia é de extrema importância no exame da córnea, sendo na maioria dos casos
o único equipamento utilizado para exame e diagnóstico de patologias corneanas.
A lâmpada de fenda oferece várias opções de iluminação para um exame mais detalhado.
Começando pelo epitélio corneano, podemos utilizar a ilum inação direta difusa para uma ampla
percepção de toda a estrutura. Após, utilizando o paralelepípedo e o corte óptico, estuda-se em
detalhes a córnea em toda a sua profundidade. Com o auxílio de corantes como a fluoresceína a
2% observamos mais claramente as irregularidades e defeitos corneanos, evidenciando lesões
superficiais, úlceras, infiltrados, ceratites e outros (Fig. 22D).
Para estudar o estroma corneano, utilizamos inicialmente o paralelepípedo e corte óptico
para observar a espessura, irregularidades das faces anterior e posterior, edema, lesões ou
opacidades intraestromais. Utilizam-se também técnicas de ilum inação indireta tipo cam po ne­
g r o , em que ao iluminarmos a periferia corneana poderemos evidenciar toda a estrutura cor-
neana anterior, sendo este o exame de eleição para o estudo do microedema setorial ou do
difuso, como, por exemplo, o edema causado por lentes de contato. E com a ilum inação indireta
do tipo cam po am arelo por retroiluminação, observam-se precipitados ceráticos, nervos e vasos
corneanos.
Por último, para estudar a face posterior da córnea formada pela membrana de Descemet
e o endotélio, dispomos da técnica de ilum inação especular, com a qual podemos observar al­
terações na estrutura celular endotelial, como as observadas na córnea g u tta ta ou distrofia de
Fuchs.
Durante a biomicroscopia da córnea podemos encontrar diversos sinais que nos guiam no
diagnóstico e terapêutica. Alguns mais importantes são citados a seguir:
■ Megalocórnea: pode ser apenas uma alteração congênita em que o segmento anterior do
olho é maior do que o normal ou pode ser sinal de glaucoma congênito, quando a pressão
intraocular está aumentada.
■ Embriotoxo anterior ou arco senil (Fig. 22A): opacidade circular periférica de cerca de 1 mm
r
de extensão, acometendo as camadas anteriores do estroma corneano. E observada em
idosos e não tem significado patológico.
■ Embriotoxo posterior: representa uma acentuação do anel de Schwalbe, formando um anel
em torno do limbo. Pode estar associado à síndrome de Axelfend-Rieger.
■ Edema corneano: pode estar presente em diversas patologias e ter grande importância no
diagnóstico e terapêutica. Pode acometer somente o epitélio, ou mesmo estroma e endo­
télio, apresentando-se com perda do brilho corneano, aumento da espessura da córnea e
perda de transparência.
■ Epiteliopatia pontilhada: caracterizada por pequenos pontos branco-acinzentados, que co­
ram facilmente com fluoresceína. É um sinal inespecífico presente em diversas ceratopatias.
■ Infiltrado subepitelial: é uma opacidade inflamatória na porção anterior da camada de Bowman,
que às vezes pode erodir o epitélio. Ocorre especialmente na ceratoconjuntivite adenoviral.
■ Defeito epitelial: caracterizado por uma área focal de desepitelização que pode ter diversas
causas, tais como trauma, queimaduras químicas, olho seco, ceratopatia neurotrófica, cera-
tite herpética, uso crônico de colírio anestésico e outros.
84 Semiologia Básica em Oftalmologia

Figs. 22 (A-D) A. Arco senil. B. Ceratopatia em faixa. C. Precipitados ceráticos. D.


Ceratite herpética. (Imagens fornecidas pelo Dr. Umberto Benelli - www.eyetalas.com.)

■ Pannus: presente em diversas doenças. E caracterizado por abundante vascularização que


continua além da região límbica em direção a córnea clara.
■ Dellen: é uma depressão e afmamento localizado na periferia corneana, adjacente a uma
área elevada do limbo, com epitélio íntegro. Comum em pterígios e pinguéculas.
■ Dobras da membrana de Descemet: observam-se pregas na Descemet que podem ser cau­
sadas por pressão intraocular diminuída ou por edema corneano. Comum após cirurgias
intraoculares e em transplante de córnea.
■ Depósitos: vários metais e medicamentos podem fazer depósitos corneanos que serão dife­
renciados pela cor e forma. A argirose (impregnação por prata) localiza-se nas membranas
basais do epitélio e endotélio, conferindo uma cor cinza-azulada, esverdeada ou dourada
à córnea. A siderose (impregnação por ferro) caracteriza-se pela presença de grânulos cin­
zentos no estroma superficial e epitélio.

Câmara anterior
Câmara anterior é o espaço preenchido por humor aquoso localizado entre o endotélio corneano
anteriormente e a íris e pupila posteriormente. Quando normal este espaço é opticamente vazio.
Biomicroscopia Básica em Oftalmologia 85

0 exame clássico dessa estrutura se faz com o pincel luminoso, formado com uma fenda
pequena de 1 mm x 1 mm, projetada obliquamente sobre a pupila, com luminosidade intensa
e grande aumento.
Algumas vezes podemos observar células flutuando no humor aquoso. As células quan­
do vermelhas podem ser provenientes de hifema com diversas origens, e quando brancas,
são indícios de inflamação (irite, iridociclite, pan-uveíte ou ceratite). Para acompanharmos
a evolução de um paciente, utilizamos uma escala de graduação de 1 a 4 + de celularidade
(Tabela III).

TABELA III Graduação da reação inflamatória/infecciosa de câmara anterior


Graduação Presença de células
Zero Zero
Traços de células <5
+ 5 a 10
++ 11 a 20
+++ 21 a 50
++++ > 50

Também podemos observar o que chamamos de flare, que é um aumento na concentração


de proteínas no humor aquoso que provoca uma aparência esfumaçada na luz que atravessa a
câmara anterior. Utilizamos também a escala de 1 a 4 + para quantificar o nível de flare. Um +
significa uma leve turvação do humor aquoso e 4 + significa um humor aquoso coagulado por
fibrina. Entre os dois extremos, graduamos com 2 + e 3+ (Tabela IV).
A solução de fluoresceína atravessa facilmente a camâra anterior e pode mimetizar um
flare, por isso devemos evitar o uso dessa solução antes do estudo do humor aquoso.

TABELA IV Graduação da reação inflamatória/infecciosa de câmara anterior


Graduação Presença de Flare
+ Mínimo - detectável
++ Moderado - visualização de detalhes da íris
+++ Importante - detalhes da íris obscurecidos
++++ Intenso - presença de exsudato fibrinoso intenso

íris
A íris é uma estrutura opaca e a melhor forma de observar suas anormalidades é através da
iluminação direta. Utilizando o paralelepípedo e corte óptico podem-se estudar possíveis irregula­
ridades na superfície iriana, seus músculos e camadas.
r

E importante também para documentação de anormalidades irianas, a utilização da téc­


nica de campo vermelho. A íris em condições normais é totalmente opaca, e quando usamos o
campo vermelho observamos reflexo apenas na pupila. Porém, em condições como albinismo
e síndrome de disperção pigmentar, podemos observar as falhas no epitélio pigmentário atra­
vés do reflexo vermelho. Outra indicação para essa técnica é estudar a permeabilidade de uma
iridotomia, que quando pérvia ou funcionante, também apresenta retroiluminação positiva.
86 Semiologia Básica em Oftalmologia

Fig. 23 À esquerda: desenho mostrando a presença de células na câmara anterior, e à


direita, presença de flore no aquoso.

Figs. 24 (A-C) A. Catarata nuclear. B. Pseudoesfoliação. C. Opacificação da cápsula


posterior com pérolas de Elschnig. (Imagens fornecidas pelo Dr. Umberto Benelli - www.
eyetalas.com.)

Um sinal característico e importante de inflamação granulomatosa na íris são os nódulos,


que podem ser:
■ Nódulos de Koeppe: pequenos e localizados na borda pupilar.
■ Nódulos de Busacca: menos comuns e se localizam na superfície da íris longe da borda
pupilar.

Cristalino
A principal anormalidade encontrada durante o exame do cristalino é a catarata. Entre os vá­
rios sistemas de classificação existentes atualmente, o mais aceito é o Sistema de Classificação
de Opacidades do Cristalino (Lens Opacities Classification System - LOCS). Em sua 3a edição
(LOCS III), classifica as cataratas em três tipos: nuclear (0 a 6+), cortical (0 a 5 + ) e subcapsular
posterior (0 a 5 + ) (Fig. 25).
Biomicroscopia Básica em Oftalmologia | 87

Fig. 25 Classificação LOCS III.

Para a biomicroscopia cristaliniana é necessário mídriase medicamentosa para melhor ob­


servação de toda a estrutura. Podemos inicialmente utilizar a iluminação direta difusa para um
estudo do conjunto, observando se há opacidades ou mesmo outras anomalias, como subluxa-
ção, ectopia, microfacia e outros. Com a iluminação focal através do paralelepípedo e corte ópti­
co podemos estudar a profundidade e local da opacidade com maior precisão, além de obser­
var, na cápsula cristaliniana anterior, a presença ou não de pseudoesfoliação. Ainda podemos
utilizar a iluminação indireta tipo campo vermelho, que por retroiluminação torna possível uma
melhor observação de pequenas opacidades corticais ou da cápsula posterior.

Vítreo anterior
A estrutura mais posterior que podemos observar na biomicroscopia do segmento anterior é
o vítreo anterior. Com a pupila dilatada e iluminação direta tipo corte óptico podemos estudar o
vítreo imediatamente posterior ao cristalino e observar se ele é opticamente limpo ou se há
presença de opacidades que podem sugerir uma inflamação ou sangramento.
Como no humor aquoso, podemos encontrar celularidade vítrea anormal que também
será graduada de 1+ a 4 + , podendo ser células vermelhas (hemorragia vítrea) ou brancas (vi-
treíte ou uveíte posterior).

BIOMICROSCOPIA DO SEGMENTO POSTERIOR


Com auxílio de lentes acessórias, pré-corneanas ou corneanas, podemos utilizar a lâmpada
de fenda para estudo do polo posterior do globo ocular. Com lentes pré-corneanas tipo Volk
estuda-se com detalhes todo o polo posterior, nervo óptico e mácula, e com lentes corneanas
específicas, também é possível observar a retina da média periferia até a pars plana.
88 Semiologia Básica em Oftalmologia

DOCUMENTAÇÃO
Documentação fotográfica
Para melhor acompanhamento da evolução dos pacientes, e também por motivos médico-legais,
todos os exames que apresentem anormalidades devem ser devidamente registrados. A me­
lhor maneira para registrar esses dados é através de fotografias. Atualmente, é possível acoplar
máquinas fotográficas digitais ou sistemas de captação computadorizados de imagens nas lâm­
padas de fenda para a documentação e seguimento dos pacientes (Fig. 26). Isso permite econo­
mizar dinheiro, não gastando com filmes e revelação, além de se poder avaliar a qualidade da
imagem obtida, repetindo-se a captação da imagem sempre que não esteja satisfatória.

Fig. 26 Sistema de captação de imagem digitalizado.

Documentação esquemática (desenhos)


Como os sistemas de fotodocumentação, sejam digitais ou não, apresentam custo não acessí­
vel à boa parte dos oftalmologistas, uma outra maneira de documentar os achados clínicos é
através de desenho. Waring e Laibson descreveram uma maneira com cores padronizadas para
se desenhar as alterações biomicroscópicas oculares (Tabela V). Como regra primordial, deve-se,
além de se respeitar as cores sugeridas, sempre desenhar o segmento anterior em visões fron­
tal e lateral, tentando registrar o segmento anterior como uma estrutura 3D.

TABELA V Esquema de desenho de Waring e Laibson


Sistema para Desenho de Achados Biomicroscópicos de Waring e Laibson
Preto Cicatriz, degeneração, sutura, LC (pontilhado)
Azul Edema, dobras de Descemet
Marrom Pigmentos, íris
Vermelho Sangue, rosa-bengala
Verde Defeitos epiteliais, LIOs, vítreo
Amarelo ou laranja Infiltrado, hipópio, precipitado cerático
Biomicroscopia Básica em Oftalmologia 89

Fig. 27 Observam-se edema estromal desenhado em azul e precipitados


ceráticos no endotélio (em laranja). Inferiormente, existe neovascularização
desenhada em vermelho e superiormente observamos uma cicatriz ou
leucoma desenhado na cor preta.

Fig. 28 No corte frontal, observamos uma linha pontilhada simbolizando


lente de contato, mais ao centro temos um desenho esquematizando um
transplante corneano com sutura contínua e em verde, desenho simbolizando
vítreo. No corte lateral observamos desenhado em verde, o vítreo e a lente
intraocular; e em preto, o local da incisão do enxerto corneano e sutura.

Fig. 29 Neste esquema observamos desenhado em verde um defeito


epitelial com infiltrado estromal (em amarelo) e inferiormente, também em
amarelo, desenho simbolizando hipópio.
90 Semiologia Básica em Oftalmologia

BIBLIOGRAFIA
Belfort Júnior R, Kara-José N. Córnea Clínica - Cirúrgica; São Paulo: Roca, 1996.
Freitas LL. Cristalino e Catarata - Diagnóstico eTratamento. São Paulo: Santos, 2004.
Gullstrand A. Demonstration der Nerstspaltlampe. Heidelberg: Heidelberger Bericht, 1911.
Kanski JJ. Oftalmologia Clínica - Uma abordagem Sistemática. 4a ed. Rio de Janeiro: RioMed, 2004.
Tasman W, Jaeger EA. Duane's Clinical Ophthalmology, 2005.
Yamane R. Semiologia Ocular. 2a ed. Rio de Janeiro: Cultura Médica, 2003.

L i t e r a t u r a S u g e r i d a

1. Yamane R. Semiologia Ocular. 2a ed. Rio de Janeiro: Cultura Médica, 2003.


2. Belfort Júnior R; Kara-José N. Córnea Clínica - Cirúrgica; São Paulo: Roca, 1996.
U-»

Semiologia da Pupila

MÁRIO TERUO SATO

ANATOMIA
A abertura da íris chama-se pupila, é onde a luz passa para atingir a retina. As pupilas tendem
a ser menores em bebês e maiores em crianças e adultos jovens, tornando-se menores com a
idade.
A pupila normal é redonda, localizada centralmente no globo ocular, de contorno regular
e tamanho similar em ambos os olhos.
A mobilidade da íris permite que a pupila mude de tamanho. Os músculos que compõem
a íris sào de dois tipos: músculo esfíncter da pupila, que se encontra na sua margem e é iner-
vado pelo sistema nervoso parassimpático, responsável pela contração da pupila ou miose, e
músculo dilatador da pupila, que se estende da margem para a raiz da íris, e é inervado pelo
sistema nervoso simpático, responsável pela dilatação da pupila ou midríase.
A via parassimpática ou braço aferente do arco pupilar ou do reflexo fotomotor, inicia-se
com a chegada da luz nas células ganglionares da retina, posteriormente trafegam pelo nervo
óptico e metade das fibras decussam no quiasma (54% cruzam, e 47% permanecem ipsilate-
rais), após passarem pelo trato óptico deixam-no antes de chegar no corpo geniculado lateral,
sem fazer sinapse, para penetrar no mesencéfalo. A primeira sinapse ocorre nos núcleos pré-
-tectais ipsilateral e contralateral passando pela comissura posterior em relação ao colículo su­
perior. As fibras posteriormente fazem sinapses nos núcleos de Edinger-Westphalen ipsilateral
e contralateral, que fazem parte do núcleo do nervo oculomotor (III par craniano).
A via eferente do reflexo pupilar inicia-se nos núcleos de Edinger-Westphalen e trafegam
junto com o nervo oculomotor. As fibras pupilomotoras no espaço subaracnóideo estão na
superfície e migram da porção superomedial para a posição inferior à medida que trafegam
em direção a fissura orbitária superior, nessa topografia encontram-se a junção da artéria
carótida interna e a artéria comunicante posterior passando por cima do nervo oculomotor;

91
92 Semiologia Básica em Oftalmologia

o nervo oculomotor ao passar pelo seio cavernoso, encontra-se na parede lateral superior, e
após penetrar na órbita pela fissura orbitária superior, divide-se em superior e inferior geral­
mente após passar o anel de Zinn. Da divisão inferior parte o ramo que inerva o músculo oblí­
quo inferior, e deste partem as fibras parassimpáticas que vão fazer sinapses no gânglio ciliar,
depois continuam com os nervos ciliares curtos, que penetram no espaço supracoroide para
invervarem o músculo esfíncter da pupila.
A via simpática consiste em um arco de três neurônios. O neurônio de primeira ordem
inicia-se na região posterolateral do hipotálamo, e desce pela coluna cinzenta intermédio late­
ral na medula espinal, fazendo sinapse em C8 a T2 no núcleo cilioespinal de Budge-Haller. Os
axônios de segunda ordem emergem da medula espinal próximo da raiz ventral de T I , depois
unem-se à cadeia simpática cervical paravertebral, ao ascender cruzam o ápice do pulmão,
passando pelo gânglio estrelado sem fazer sinapse, gânglio cervical superior, em volta da arté­
ria subclávia, até chegarem ao gânglio cervical medial. Ao chegarem no ângulo da mandíbula
(bifurcação da artéria carótida, C3-C4), o neurônio de segunda ordem faz sinapse no gânglio
cervical superior. As fibras pós-ganglionares dos neurônios de terceira ordem continuam na
parede da artéria carótida interna, passando pelo seio cavernoso, em um curto trajeto juntam-
se ao nervo abducente e aderem à primeira divisão oftálmica do nervo trigêmeo, depois de
passarem pelo seio cavernoso, continuam como ramo nasociliar e posteriormente como ner­
vo ciliar longo, terminando no músculo dilatador da íris. As fibras para o músculo de Müller
trafegam ao longo da artéria oftálmica, e as fibras sudomotoras bem como as vasomotoras
trafegam junto à artéria carótida externa.
O gânglio ciliar está localizado aproximadamente a 1 cm em frente ao anel de Zinn, do
lado da artéria oftálmica, entre o nervo óptico e o músculo reto lateral, e recebe três raízes:
■ Fibra sensorial longa do ramo nasociliar da primeira divisão do trigêmeo (V]), tem 10 a 12
cm de comprimento, inervando a córnea, íris e corpo ciliar.
■ Raiz motora curta que vem do músculo oblíquo inferior, que é resultado da divisão inferior
do nervo oculomotor. As fibras motoras fazem sinapses no gânglio ciliar e carregam os axô­
nios parassimpáticos para o músculo esfíncter da pupila.
■ Raiz simpática que vem do plexo em volta da artéria carótida interna, passa pela órbita e
entra no gânglio ciliar sem fazer sinapse, inerva os vasos sanguíneos e o músculo dilatador
da pupila.

Dessas raízes somente as fibras parassimpáticas fazem sinapse no gânglio ciliar, que conti­
nuam como nervos ciliares curtos, trafegam de ambos os lados do nervo óptico e junto com os
nervos ciliares longos, entram no espaço supracoróideo e inervam a córnea, corpo ciliar e íris.
A sincinesia para perto, origina-se na área cortical periestriada (área 19 de Brodmann), no
final superior do sulco calcarino, compreende a tríade: convergência dos olhos, acomodação
da lente e miose das pupilas.
A via para o reflexo para perto é mais ventralmente ao braço aferente do reflexo pupilar.
Tem uma relação de células ganglionares que invervam o músculo ciliar versus o esfíncter da
íris de 30:1, esta é a base para a dissociação luz-perto.
Semiologia da Pupila | 93

SEMIOLOGIA DA PUPILA

Dividiremos em: avaliação da pupila, defeito pupilar aferente relativo e as anisocorias.

Avaliação da pupila
Os materiais necessários para avaliação da pupila são um transiluminador, pupilômetro e ré-
r
gua com filtros de densidade neutra (Fig. 1). E necessário também uma sala cuja iluminação
seja facilmente controlada e colírios para os testes farmacológicos.
Para a avaliação do tamanho pupilar no escuro, ilumina-se as pupilas de baixo do nariz
para cima com a luz da sala apagada, ou em uma sala semiescura com controle da intensidade
da luz, de modo que seja a menor intensidade, em que é possível se visualizar as pupilas. A
avaliação no claro é realizada acendendo-se a luz da sala. Feito isso, registram-se os diâmetros
pupilares em ambas as condições de exames.
Para evitar a miose por acomodação o paciente é orientado a fixar em um alvo distante.
As medidas devem ser realizadas em 5 a 10 s após a mudança da iluminação para evitar a flu­
tuação da pupila.
Iluminando-se um olho de um indivíduo normal, ambas as pupilas se contraem. A resposta
pupilar no olho iluminado é denominada reflexo fotomotor direto, e a resposta no outro olho
de reflexo fotomotor consensual.
Devido à hemidecussação das fibras aferentes pupilomotoras no quiasma e segunda hemi-
decussação no mesencéfalo, o reflexo fotomotor e o consensual são iguais, esta dupla hemi­
decussação assegura uma inervação igualitária, o que previne a diferença dos diâmetros pupi­
lares ou anisocoria. Quando as pupilas são normais, elas são denominadas isocóricas (diâmetros
pupilares similares) e fotorreagentes (presença dos reflexos fotomotor e consensual).
O reflexo para perto deve ser realizado em uma sala semiescura, onde o tamanho pupilar
seja mediano e um objeto para perto visível. O teste é realizado pedindo-se para o paciente
olhar para um alvo a distância e depois move-se tal alvo (tabela de Jaeger ou polegar do pa­
ciente) na linha de visão para perto, do paciente, a fim de estimular a acomodação e observar

Fig. 1 Materiais para o exame da pupila. De cima para baixo


temos o transiluminador, pupilômetro e régua com os filtros de
densidade neutra.
94 I Semiologia Básica em Oftalmologia

o reflexo pupilar. A intensidade da resposta pode ser graduada em 0 para ausência de resposta
e 4 + para uma resposta rápida e intensa.
Ocasionalmente, o exame pupilar pode ser de difícil interpretação naqueles pacientes
com alta amplitude de variação fisiológica do tamanho pupilar, conhecida como hipo.
A influência mais importante no tamanho da pupila é a quantidade da luz ambiente. O
estado da adaptação da retina também afeta o tamanho. Sonolência diminui a atividade sim­
pática, o que resulta em pupilas pequenas. Excitação, susto (terror psicótico), barulho e belis­
cão atrás da nuca (dor), aumentam o tamanho pupilar. O aumento da pressão intraocular no
glaucoma agudo aumenta a pupila, provavelmente devido à isquemia na íris. Isquemia cere­
bral resulta frequentemente em dilatação pupilar ou midríase, provavelmente por isquemia
no tronco cerebral, o mesmo acontecendo com epilepsia do grande mal. Pequenas pupilas
sugerem hemorragia pontina, intoxicação por narcóticos ou uso de pilocarpina. Pupilas ex­
tremamente dilatadas sugerem bloqueio farmacológico do parassimpático (atropina, colírios
descongestionantes, etc.).
O exame na lâmpada de fenda é fundamental para avaliar anormalidades pupilares. Uma
sinequia posterior, provocada por uveíte pode explicar a miose ou midríase pupilar unilateral;
é importante realizar uma gonioscopia em pacientes com a pupila dilatada que têm história
de olho vermelho ou dor, devido ao risco de glaucoma agudo de ângulo fechado. A transilu-
minação da íris pode mostrar evidências de traumas, infecções ou inflamações prévias. Com o
maior aumento na lâmpada de fenda e ligando e desligando-se a luz, podemos verificar se há
um defeito segmentar que ocorre na pupila tônica ou regeneração aberrante do nervo oculo­
motor.
Qualquer desordem física ou mecânica na íris pode resultar em deformidades pupilares.
Trauma ocular pode causar um rasgo na margem pupilar e resultar em midríase. Iridodiálise
é quando há desinserção da raiz da íris. A neovascularização pode distorcer a íris e afetar o
reflexo pupilar. Malformações irianas, como o coloboma e aniridia, afetam o tamanho e a fun­
ção pupilar. A maior causa de irregularidade na pupila provalvemente é a cirurgia de catarata.
As duas raras condições que causam irregularidades pupilares por alterações na inverva-
ção são:
■ Pupila em forma de “girino” (ta p d o le ): situação que ocorre em indivíduos normais, sem
história de enxaqueca. Há uma dilatação setorial da pupila terminando em poucos minutos
e retornando ao normal. Ocorre várias vezes ao dia ou semanas e depois desaparece pro­
vavelmente devido ao espasmo segmentar do músculo dilatador da íris, e é uma condição
benigna. Esta irritação eventualmente causa perda de fibras do simpático e síndrome de
Horner (Fig. 2).
■ Pupila paradoxal: cursa com constrição pupilar no escuro, tem como causas a cegueira con­
gênita noturna estacionária, acromatopsia congênita, anomalias do disco óptico (colobo­
ma, hipoplasia), nistagmo congênito e distrofias retinianas (retinose pigmentar, distrofias
maculares); o mecanismo é desconhecido.
Semiologia da Pupila | 95

Fig.2 Foto no escuro que mostra irregularidade


na íris em forma de cauda de girino em olho
direito.

Defeito pupilar aferente relativo (DPAR)


Quando o paciente tem uma neuropatia óptica monocular ou binocular assimétrica, ao cobrir-se
alternadamente cada olho a pupila do olho normal contrai quando é descoberto e o olho anor­
mal quando é coberto; a pupila do olho anormal dilata quando é descoberto e a pupila do olho
normal quando é coberto. É chamado de fenômeno de Marcus-Gunn e a anormalidade pupilar
de pupila de Marcus-Gunn.
O teste de iluminação alternada rápida (sw in g in g fla sh lig h t test), é usado para detectar o de­
feito pupilar aferente relativo (DPAR). Este sinal indica afecção ou hipofunção na via óptica ante­
rior (nervo óptico, quiasma e trato óptico)*. Ele é considerado o sinal objetivo mais importante
em neuroftalmologia. Ele não é visto em dano simétrico das vias ópticas anteriores ao corpo
geniculado lateral, nos pacientes que têm catarata ou outras opacidades de meios, erros refra-
tivos e perdas visuais funcionais ou corticais. O DPAR geralmente é proporcional a perda visual.
O teste de iluminação alternada rápida é realizado alternando-se a luz em cada olho. Para
realizá-lo, primeiramente é importante uma boa fonte de luz, usualmente um transilumina-
dor; quanto maior o contraste entre a sala e a fonte de luz, maior será o DPAR. Em segundo,
o paciente deve fixar em um alvo distante, para prevenir a acomodação. Terceiro, em pacien­
tes com olhos não alinhados (estrabismo) tem que haver o cuidado para incidir a luz no eixo
visual. Quarto, a luz deve ser alternada em cada olho rapidamente e permanecer por 3 a 5 s,
para permitir a estabilização da pupila. Quinto, para realizar este teste é importante que a luz
seja mantida o mesmo tempo em cada pupila. Portanto, há duas etapas da resposta pupilar a
serem observadas: 1) constrição pupilar inicial e 2) escape pupilar, 2 a 5 s após a incidência da
luz na pupila. Muitos examinadores alternam a velocidade do movimento da luz em cada olho,
e frequentemente há uma velocidade ótima em que o DPAR é elucidado.
O DPAR é oriundo da disparidade entre os reflexos fotomotor e consensual no olho afeta­
do, a luz ao ser alternada rapidamente em cada olho, contrai a pupila normal e dilata ambas
as pupilas, quando o olho afetado é iluminado.
O DPAR pode ser quantificado de 1+ a 4 + , com 1+ indicando um DPAR leve e 4 + indican­
do amaurose; outra maneira mais precisa é realizada, usando-se filtros de densidade neutra
(0,3; 0,6; 0,9 e 1,2 log), a quantificação é feita colocando-se alternadamente o filtro de menor
intensidade (0,3 log) no olho normal e aumentando-se até que não haja o DPAR, este filtro que
neutralizou o DPAR é o filtro a ser registrado.
Na detecção do DPAR sutil, utiliza-se o filtro de 0,3 log, e coloca-se alternadamente em
cada olho, realizando a iluminação alternada rápida, se houver um defeito sutil em qualquer
um dos olhos haverá um DPAR, isso acontece porque houve a redução da luz no olho afetado,
simulando um defeito na aferência, e assim evidenciando um DPAR.

* Antes de chegar ao corpo geniculado lateral acontece a hemidecussação das fibras pupilomotoras, na lesão das vias
ópticas retrogeniculadas não há DPAR.
96 Semiologia Básica em Oftalmologia

Há correlação da gravidade do DPAR com o tamanho do defeito do campo visual periféri­


co na perimetria de Goldmann. Há menos correlação quando se detecta alteração do campo
visual central nos perímetros automatizados.

Anisocorias
Distúrbios eferentes da pupila são usualmente unilaterais e causam uma diferença no tamanho
entre as pupilas e são denominadas de anisocorias.
Para a avaliação das anisocorias, além dos exames anteriormente expostos como os refle­
xos fotomotor e consensual, teste iluminação alternada rápida, biomicroscopia do segmento
anterior, medida do diâmetro pupilar em ambientes claro e escuro; é necessário avaliar a mo­
tilidade ocular extrínseca (detectar paresias e paralisias dos nervos cranianos que inervam o
olho) e o fundo de olho sob dilatação (neurites, neuropatias ópticas, glaucoma, etc.).
Ao se determinar a presença da anisocoria, o médico deve determinar o seu grau e medir
se é maior em ambiente claro ou no escuro.
Se houver maior anisocoria no escuro (a pupila miótica é a afetada), as possibilidades
diagnósticas são:
■ Anisocoria fisiológica.
■ Síndrome de Claude-Bernard-Horner ou síndrome de Horner.
■ Hiperatividade simpática.
■ Fármacos (pilocarpina, organofosforados).
■ Alterações locais na íris (sinequias e irites) - visualizadas na lâmpada de fenda.

ANISOCORIA FISIOLÓGICA: no escuro 20% da população normal têm anisocoria de 0,4 mm ou


mais. No claro esta porcentagem cai para 10%, a diferença pode ser de até 1,0 mm, sendo que
na maioria dos pacientes é de 0,6 mm. Esta anisocoria tem como característica não variar com
os níveis de iluminação, variar de um dia para outro, ou mesmo de hora em hora. Não está
relacionada há erros refrativos e as motilidades oculares intrínseca e extrínseca são normais.
Quando há suspeita de anisocoria fisiológica, pede-se ao paciente que traga fotografias anti­
gas, pois a anisocoria pode ser vista retrogradamente na infância.
SÍNDROME DE HORNER: quando a inervação simpática para o olho é interrompida, há o enfra­
quecimento dos músculos retratores das pálpebras (músculo de Müller), causando ptose de 2
a 3 mm. O músculo dilatador da pupila também é enfraquecido, causando miose. O controle
da sudorese e vasomotor da face é perdido, menos identificado hoje pelo uso de ar-condicio-
nado, ocorrendo nas lesões simpáticas próximas à bifurcação da artéria carótida.

A combinação de ptose, miose, enoftalmia aparente e anidrose facial, é chamada de sín­


drome de Horner.
Quando é congênito, acontece em crianças com menos de 2 anos e apresenta heterocro-
mia da íris, sendo a pupila afetada mais clara (Figs. 3A e B). Geralmente ocorre em traumas
no parto, por lesão no plexo braquial. A síndrome de Horner adquirida na infância (primeiros
5 anos de vida), indica a possibilidade de neuroblastoma na cadeia simpática torácica. A do­
sagem de catecolaminas é frequentemente aumentada, sendo necessário pedir neuroimagem
Semiologia da Pupila 97

Figs. 3 (A e B) Síndrome de Horner congênito. A. Foto realizado no claro onde se nota discreta
ptose e íris de cor esverdada em olho direito e castanho em olho esquerdo. B. Foto no escuro
com câmara infravermelho, notam -se discreta ptose e anisocoria com a pupila em olho direito
menor que a do olho esquerdo.

para o pescoço, tórax e abdome. Em ambas as formas, congênitas ou adquiridas, é importante


a avaliação pelo pediatra.
A lesão na via simpática pode ser nos neurônios centrais (primeira ordem), pré-gangliona-
res (segunda ordem) e pós-ganglionares (terceira ordem).
Para a confirmação ou não da síndrome de Horner, instilam-se colírios de cocaína de 4 a
10% em cada olho, onde há dilatação somente da pupila normal. Esta medicação age bloquean­
do a recaptação de noradrenalina nas terminações nervosas simpáticas. Se a via simpática está
interrompida em qualquer nível, a noradrenalina não é liberada nas terminações, e a cocaína
não terá efeito na pupila miótica. Sem o teste da cocaína o diagnóstico pelo critério clínico
somente é presuntivo.
Com o diagnóstico da síndrome de Horner estabelecido, utiliza-se a hidroxianfetamina a
\% (paredrina). O teste deve ser realizado 24 h após o teste da cocaína, porque este interfere
na ação da hidroxianfetamina. Se os neurônios de primeira e segunda ordens estão lesionados
e a via final está intacta, o neurônio é capaz de produzir, transportar e liberar a noradrenalina.
Quando a hidroxianfetamina é usada, a pupila dilata, porque esta droga estimula a liberação
de noradrenalina pelos terminais nervosos pós-ganglionares. Se não houver a dilatação, a le­
são é no neurônio de terceira ordem. Não há testes farmacológicos para diferenciar entre a
lesão dos neurônios de primeira e segunda ordens.
Quando observamos a dilatação pupilar na síndrome de Horner, devemos observar a re-
dilatação pupilar. Um método simples é observar as pupilas em um ambiente escuro, após
apagar as luzes. A pupila normal retorna ao seu maior tamanho em 10a 15 s, a maior parte da
dilatação ocorre nos primeiros 5 s. Pupilas que mostram retardo na dilatação, demoram até 25
s, com a maior parte da dilatação ocorrendo de 5 a 15 s.
Realizado o diagnóstico e a provável localização das lesões nas vias simpáticas, é impor­
tante separar clinicamente estas vias em três divisões.
1. Síndrome de Horner central (neurônio de primeira ordem): as lesões ocorrem no tronco
cerebral e na coluna espinal.
• Acidente cerebrovascular (síndrome de Wallenberg).
• Trauma.
• Doença desmielinizante.
• Neoplasias.
• Siringomielia.
2. Síndrome de Horner pré-ganglionar (neurônio de segunda ordem):
• Lesões no tórax: tumor de Pancoast (carcinoma oculto no ápice do pulmão), massa no
mediastino e pós-cirurgia cardíaca com implante de ponte de safena (Figs. 4A e B).
98 Semiologia Básica em Oftalmologia

Figs. 4 (A e B) Síndrome de Horner secundária a pós-operatório de ponte de safena. A. Foto


no escuro, nota se ptose discreta em olho direito e anisocoria com a pupila de olho direito menor
que olho esquerdo. B. Foto no claro, notam-se ptose discreta e diminuição da anisocoria com a
pupila do olho esquerdo com tamanho quase similar a do olho direito.

• Lesões no pescoço: trauma, abcesso, neoplasia distireoidiana e linfadenopatia.


• Cirurgias: tireoidectomia, cirurgia radical no pescoço, angiografia de carótida.
3. Síndrome de Horner pós-ganglionar (neurônio de terceira ordem):
• Lesões extracranianas similares às listadas no neurônio de segunda ordem.
• Variante da enxaqueca: cefaleia histamínica, neuralgia partrigeminal de Raeder.
• Otite média complicada.
• Lesões no seio cavernoso/ fissura orbitária superior (se houver lesão do nervo abducen-
te, haverá diplopia).
• Dissecção da artéria carótida interna.
• Isolada, geralmente é benigna se de longa data e não apresentar dor.

HIPERATIVIDADE SIMPÁTICA:
■ A pupila em calda de girino (já descrita).
■ Midríase unilateral episódica, ocorre em pacientes jovens durante um ataque típico de en­
xaqueca.
ESTIMULAÇÃO FARMACOLÓGICA DO ESFÍNCTER DA ÍRIS: os organofosforados produzem miose
não reativa e miopia.

O uso de pilocarpina em um olho para a prevenção do glaucoma agudo de ângulo fechado.


Geralmente os pacientes referem uso de colírios ou ingestão de produtos tóxicos.
Se houver anisocoria maior no claro (a pupila midriática é a afetada) as possibilidades
diagnósticas são:
• Pupila tônica.
• Pupila por lesão do nervo oculomotor (III par craniano).
• Pupila no trauma.
• Pupila por uso de medicamento.
• Lesões no segmento anterior (glaucoma agudo, uveítes, etc.) - estas lesões são visualiza­
das no exame biomicroscópico e discutidas em capítulos específicos deste livro.

A pupila tônica de Holmes-Adie: ocorre por lesão no gânglio ciliar e seus nervos na órbi­
ta. Caracteriza-se por acometer mais mulheres (70%), de 20 a 50 anos de idade. Os pacientes
queixam-se de fotofobia, visão borrada e anisocoria, quando há arreflexia (patelar e aquileu), é
denominada síndrome de Holmes-Adie, se somente a pupila é envolvida é denominada pupila
de Adie. O quadro clínico caracteriza-se por:
■ Pupila dilatada unilateralmente em 80% dos casos, o que resulta em anisocoria pouco rea­
gente à luz e boa resposta para perto (dissociação luz-perto) (Figs. 5A-C).
Semiologia da Pupila 99

Figs. 5 (A-C) Paciente com a síndrome de Holmes-Adie em olho direito. A. Pouca


resposta à luz na pupila do olho direito. B. Boa resposta à luz na pupila normal. C. Boa
resposta para perto em ambas as pupilas.

■ Redilatação vagarosa, quando o paciente olha para perto e para longe.


■ Contração segmentar na lâmpada de fenda (“movimentos vermiformes”), visualizada com
maior aumento.
■ Paresia de acomodação, o paciente tem dificuldade para ler.
■ Denervação supersensitiva colinérgica, demonstrada pelo teste da pilocarpina a 0,10 %, di­
luída em soro fisiológico, que é instilada em ambos os olhos. A pupila afetada após o teste
contrai mais que a pupila não afetada (Figs. 6A e B), o que resulta em teste positivo para a
pupila tônica.

A pupila tônica de Holmes-Adie é uma condição benigna, e com o tempo há a tendência


de a pupila afetada tornar-se menor que a normal, isso acontece em uma taxa de 4 %ao ano.
A etiologia é desconhecida. Nos casos de fotofobia ou visão borrada é indicada a pilocarpina
diluída.
Raras condições sistêmicas podem estar associadas à pupila tônica, tais como varicela-zós-
ter, arterite de células gigantes, lues e trauma na órbita. Pupila tônica bilateral pode ser vista
nos pacientes com diabetes, alcoolismo, lues, doença de Lyme e disautonomias associadas ao
câncer e amiloidose.

PUPILA NA LESÃO DO III PAR: danos no nervo oculomotor, no espaço subaracnóideo cursam
com midríase média decorrente das fibras pupilares, que são superficiais no nervo. O envolvi­
mento pupilar quase sempre é acompanhado de ptose e limitação da motilidade ocular (Figs.
7A-E). Quando a pupila é envolvida, deve ser excluída a possibilidade de aneurisma na junção
da artéria carótida interna e da artéria comunicante posterior, quando não há envolvimento

Figs. 6 (A e B) Paciente com pupila tônica de Holmes-Adie em olho direito. A. Presença


de anisocoria no claro, pupila de olho direito maior que o olho esquerdo. B. Após teste
da pilocarpina a 0,10%, a pupila do olho direito é menor que a do olho esquerdo.
100 Semiologia Básica em Oftalmologia

Figs. 7 (A-F) Paciente com paralisia do nervo


oculomotor em olho direito. A. Limitação na elevação
do olho direito. B. Abdução normal em olho direito. C.
Ptose total em olho direito e pupila normal em olho
esquerdo. D. Limitação na adução e midríase do olho
direito. E. Limitação na depressão do olho direito. F.
Arteriografia cerebral: aneurisma sacular gigante no
topo da a. basilar.

pupilar podem estar associadas a causas isquêmicas, tais como hipertensão arterial sistêmica
ou diabetes.

Como diagnóstico diferencial temos a pupila no trauma e a medicamentosa, nestes casos


podemos usar o teste do colírio de pilocarpina a Nos casos de midríase por lesão do III par,
há a constrição da pupila, e na pupila medicamentosa e no trauma não há resposta.

PUPILA NO TRAUMA: ocorre por trauma contuso que causa midríase, devido ao dano no esfínc-
ter da íris. A pupila pode ser miótica inicialmente, mas brevemente torna-se média dilatada e
pouco responsiva à luz, com a anisocoria sendo maior no claro que em ambiente escuro (Figs.
8A e B). Geralmente com um bom exame biomicroscópico e a história do paciente, é possível
se realizar o diagnóstico. Este tipo de pupila não responde ao teste de pilocarpina a \% e algu­
mas vezes é confundido com a pupila por uso de fármacos.
PUPILA POR USO DE MEDICAMENTO: acontece quando midriáticos são instilados acidental ou
intencionalmente no olho, a pupila torna-se dilatada, pouco reativa à luz e para perto. O uso
de medicamento produz uma paralisia de todo o esfíncter e a dilatação da pupila geralmente
é total. A pilocarpina a \% pode ser usada no diagnóstico diferencial com a lesão do III par. Os
Semiologia da Pupila 101

Figs. 8 (A e B) Anisocoria por trauma em olho


direito. A. Anisocoria maior no claro. B. Diminui­
ção da anisocoria no escuro.

fármacos que podem causar midríase são os colírios vasoconstritores e midriáticos, como o
ciclopentolato e a atropina.

DISSOCIAÇÃO LUZ-PERTO
Resposta pupilar mais intensa para o reflexo de perto que para a luz, ocorre na pupila tônica
(já descrito), pupila de Argyll-Robertson e por lesão no mesencéfalo.
Pupila de Argyll-Robertson: responde rápido para perto, pouco à luz e dilatação pobre no
escuro, e é responsiva aos midriáticos, geralmente bilaterais, e patognomônica de neurolues.
Outras causas incluem a esclerose múltipla, diabetes melito, sarcoidose e alcoolismo crônico.
Lesão no mesencéfalo ou síndrome de Parinaud ou síndrome do aqueduto Sylviano: caracteriza-se
pela retração palpébral, convergência e nistagmo, na tentativa de elevação dos olhos. As pu­
pilas estão dilatadas e respondem melhor para perto do que para a luz, o local da lesão é no
mesencéfalo dorsal e as causas são o tumor pineal e a hidrocefalia.

DISTÚRBIOS NO COMA
■ Pupila de Hutchinson, pupila unilateralmente dilatada e pouco responsiva à luz no pacien­
te em coma. Geralmente causada por massa supratentorial (tumor, hematoma subdural),
que causa deslocamento para baixo do giro hipocampal e herniação uncal, pressionando o
III par.
■ Lesão no hipotálamo posterior e ventrolateral causa a síndrome de Horner ipsilateral.
■ Na lesão no diencéfalo, as pupilas são simétricas, pequenas e reagem à luz vigorosamente.
■ Na lesão no mesencéfalo, as pupilas são médias dilatadas e não reativas à luz.
■ Na lesão na ponte, as pupilas são pequenas bilateralmente (pin point).
■ Em pacientes em coma profundo, pelo fato de as vias ópticas serem resistentes ao insulto
metabólico. Na presença de reflexo pupilar à luz em paciente com depressão respiratória,
flacidez muscular, não responsiva aos testes calóricos, os achados são sugestivos de coma
metabólico.
102 Semiologia Básica em Oftalmologia

MEDICAMENTOS QUE AGEM NA PUPILA


■ Medicamentos anticolinérgicos ou parassimpaticolíticos: dilatam a pupila por bloqueio
da acetilcolina, competindo com estas nas células efetoras do esfíncter da íris, prevenindo
a despolarização. A atropina, tropicamida (niydriacyl) e ciclopentolato (cicloplégico) fazem
parte dessa classe de fármacos. A paralisia resultante do esfíncter da íris resulta em midría-
se. A midríase facilita o fundo de olho sob dilatação e no tratamento das uveítes anteriores,
para a prevenção de sinequias posteriores.

Estes medicamentos paralisam também o músculo ciliar, o que alivia a dor nas uveítes. O
bloqueio da acomodação (cicloplegia) permite a refração em crianças.
No tratamento de uveítes ou para a correção total do estrabismo acomodativo, são neces­
sários colírios potentes, como a atropina e a escopolamina.
A atropina a 0,5 ou \%é usada na dosagem de 12/12 h, enquanto persistir a uveíte, e para
a refração em crianças geralmente utiliza-se a dosagem de 1 gota de atropina a 0,5% de 12/12
horas 3 dias antes do exame. A atropina a 1% é usada em adultos. O efeito inicia em 45 a 120
min e a duração da ação persiste por 7 a 14 dias.
O cloridrato de ciclopentolato a 1%(cicloplégico) é usado de 12/12 h. A duração do trata­
mento depende da intensidade das uveítes, na cicloplegia para a refração é usado 1 gota de 5
em 5 min por 2 vezes, o efeito ocorre em 30 a 60 min após a instilação e persiste por 8 a 24 h.
Podem ocorrer efeitos colaterais, tais como confusão e delírios (efeito hipnótico).
A tropicamida a \% na cicloplegia é usada na mesma posologia do ciclopentolato e o efeito
ocorre em 20 a 40 min, a ação dura de 4 a 6 h.
A duração da ação é altamente variável, sendo que o efeito na pupila (midríase) dura mais
que o efeito cicloplégico.
Os efeitos colaterais locais da atropina são o edema e maceração das pálpebras bem como
hiperemia da conjuntiva, ela é contraindicada em bebês, pacientes albinos e com síndrome
de Down. Efeitos sistêmicos dos parassimpaticolíticos, especialmente em crianças, são febre,
eritema pelo corpo, taquicardia, visão borrada, confusão, delírios, constipação e retenção uri­
nária. Casos moderados requerem somente a descontinuação do fármaco; os casos graves po­
dem ser tratados com fisostigmina subcutânea, na dose de 0,25 mg a cada 15 min, até debelar
os sintomas, ou 1 gota de atropina a \% = 0,5 mg de fisostigmina.
A lidocaína e anestésicos similares produzem midríase ao serem injetados na órbita.
■ Fármacos simpaticomiméticos ou agentes agonistas a r adrenérgicos: agem diretamente
estimulando os receptores a-adrenérgicos das terminações nervosas, têm como exemplo
a fenilefrina, que estimula o músculo dilatador da pupila produzindo midríase. Como a
inervação parassimpática do esfíncter da íris é mais forte do que a do músculo dilatador, é
necessária a administração de outro agente cicloplégico ao examinar o fundo de olho sob
dilatação, para que não ocorra a miose pela luz do oftalmoscópio indireto no momento do
exame.
Semiologia da Pupila 103

A absorção sistêmica da fenilefrina pode elevar a pressão sanguínea, isso tem significância
clínica em crianças e em pacientes que estão usando medicamentos com efeitos adrenérgicos
(reserpina, antidepressivos tricíclicos e inibidores da monoamina oxidase [MAO]). A fenilefma
a 10% é disponibilizada na forma de colírio. O seu uso tem sido associado a derrames cere­
brais, infarto do miocárdio e insuficiência cardíaca.
r

E usado como colírio midriático para realizar fundo de olho ou na cirurgia de catarata,
geralmente na dosagem de 1 gota de 5/5 min 2 ou 3 vezes, o efeito ocorre em 30 a 60 min e
a ação persiste por 3 a 5 h.
A cocaína é aplicada na conjuntiva como anestésico tópico e como teste farmacológico na
síndrome de Horner.
Maleato de feniramina e maleato de clorfeniramina são usados como descongestionantes
tópicos oculares e podem causar midríase.
■ Drogas parassimpaticomiméticas (colinérgicas): devido à similaridade da acetilcolina, que
age nas células do músculo esfíncter da íris. Têm três mecanismos de ação. Primeiro, con­
traem a pupila causando a miose. Segundo, contraem as fibras do músculo ciliar, relaxam a
tensão zonular, permitindo que a lente se projete para a frente, assumindo uma forma mais
esférica (acomodação). Terceiro, causam contração das fibras longitudinais do músculo ci­
liar, produzindo tensão no esporão escleral e facilitando o escoamento do humor aquoso. A
contração do músculo ciliar também produz tensão na periferia da retina, ocasionalmente
resultando em buraco na retina e eventualmente descolamento de retina regmatogênico.

A acetilcolina não penetra bem no epitélio corneano, e é rapidamente degrada pela anti-
colinesterase. O carbacol a 0,01% (miostat) é usado para fazer a miose nas cirurgias de segmen­
to anterior. Este fármaco produz rápida miose e previne a captura da lente intraocular pela íris
e o encarceramento na ferida cirúrgica. Outro efeito benéfico do carbacol é que como é um
agente hipotensor, baixa a pressão intraocular nas primeiras 24 h após a cirurgia.
A pilocarpina na diluição de 0,10% é usada no diagnóstico de pupila tônica de Adie.
Os colírios de pilocarpina a 1%, 2% e 4% são usados para o tratamento do glaucoma agudo
de ângulo aberto, usa-se geralmente 1 gota a cada 6 h. O uso de pilocarpina a 4% é contraindi-
cado nos ataques agudos de glaucoma agudo de ângulo fechado, neste caso usa-se pilocarpina
a 1%ou 2%.
Os efeitos colaterais locais são a miopia, catarata e miose em pacientes idosos que já têm
catarata inicial. Em altas concentrações podem ocasionar cistos na íris e descolamento da reti­
na. Os efeitos sistêmicos da pilocarpina são raros, quando presentes consistem em salivação,
diarreia, vômitos, espasmos brônquicos, diaforese e urgência miccional. Podem ser usados no
controle da esotropia acomodativa devido à estimulação do músculo ciliar.
O início dos efeitos ocorre em 30 a 60 min e duram de 3 a 5 h.
A fisostigmina é um anticolinesterásico que causa miose e é usado para combater o efeito
colateral da atropina.
Os inseticidas ou ésteres organofosforados (paration, hexaetiltetrafosfato, ecotiofato)
causam miose de longa duração.
104 Semiologia Básica em Oftalmologia

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VO

Oftalmoscopia Básica em
Oftalmologia

ROMMEL JOSUÉ ZAGO • FÁBIO EDUARDO EBERHARDT ALVES

HISTÓRIA
Um dos grandes avanços no exame oftalmológico foi a oftalmoscopia. Essa possibilidade de
observarmos a retina e o vítreo começou com a introdução do oftalmoscópio por Hermann
von Helmholtz, que utilizou princípios conhecidos de óptica para fazer a observação do in­
terior do olho (Figs. 1 e 2). Suas descobertas foram apresentadas na Sociedade de Física de
Berlin em dezembro de 1850, e em 1851 foram publicadas na sua monografia. Isso fez com
que a oftalmologia desse um grande salto, talvez um dos maiores de sua história, já que al-

F ig .l Hermann von Helmholtz. Fig.2 Primeiro oftalmoscópio direto.

105
106 Semiologia Básica em Oftalmologia

terações intraoculares podiam agora ser vistas in vivo, e doenças que levavam os pacientes a
importante perda da visão podiam ser mais bem estudadas. Já no ano seguinte, várias melho­
ras foram feitas na invenção de von Helmholtz; Rekoss adicionou novas lentes que facilitavam
o foco, Epkens e Donders introduziram um espelho perfurado que melhorava a iluminação e
Ruete desenvolveu um método de oftalmoscopia indireta. E graças a esses desenvolvimentos
e aos conhecimentos adquiridos através deles a oftalmologia passou a ser uma das primeiras
especialidades da medicina a ser reconhecida.
Antes de von Helmholtz vários cientistas tentaram sem êxito desenvolver um oftalmos-
cópio. Como, por exemplo, Kusmaul (1845) que teve problemas com a iluminação, Cumming
(1846) e Brücke (1847) observaram que colocando uma luz em linha com o olho do observador
obtinham um reflexo do fundo de olho, mas não conseguiram formar uma imagem.

ANAMNESE
O exame de retina inicia com a avaliação do paciente no momento que este entra no consul­
tório. O andar, se tropeça ou esbarra nas laterais, pode indicar perda de visão periférica, se
está sendo conduzido e se existe dificuldade com o ambiente, caso este esteja escuro (pode
indicar dificuldade na adaptação claro-escuro, como, por exemplo, cegueiras noturnas e reti­
nas panfotocoaguladas).
A identificação também é importante, pois nela conhecemos a idade do paciente, ocupa­
ção, sexo, raça e procedência. Informações que podem ser de grande valia na hora do raciocí­
nio para o diagnóstico.
Na queixa principal temos uma ideia, muitas vezes vaga, da patologia e cabe estabele­
cermos as características principais dessa doença na coleta da história principal. Devemos
tentar estabelecer tempo de início, duração, forma de apresentação, se o problema é mono­
cular ou binocular, se existem fatores de melhora ou de piora, se a doença está estável em
todo o seu período ou se teve variação bem como a presença de sintomas que apareceram
antes ou associados à patologia. Sintomas como redução da acuidade visual, micropsias,
metamorfopsias, escotomas centrais e periféricos (e se estes escotomas são positivos ou
negativos), floaters e fotopsias devem sempre ser pesquisados, se o paciente não os referir
espontaneamente.
A história médica pregressa não pode ser esquecida, pois nela vão estar inseridos fatores
importantes para o diagnóstico, tais como prematuridade e utilização de oxigênio suplemen­
tar logo após o nascimento, diabetes, hipertensão arterial, uso de medicações concomitantes
(p. ex., antimaláricos, corticoides, quimioterapia, imunosupressores, etc.) e tratamentos clíni­
cos ou cirúrgicos tanto oculares quanto sistêmicos.
A história familiar é de fundamental importância se tratamos das doenças neurológicas,
distrofias e degenerações de retina, bem como de doenças hereditárias e geneticamente de­
terminadas.
Oftalmoscopia Básica em Oftalmologia 107

Sempre devemos nos atentar para revisão de sistemas, pois não é incomum a associação
de doenças oculares com outras doenças sistêmicas.

EXAME OFTALMOLÓGICO BÁSICO


Todo o exame oftalmológico é importante no paciente de retina.
Inspeção - desvios oculares, ptose, sinais de paralisia facial, etc.
Motilidade ocular extrínseca - determinando paresias e paralisias da musculatura ocular
extrínseca.
Reflexo fotom otor- defeitos pupilares relativos e absolutos, patologias de pupila (Horner,
Adie, Argil-Robinson, etc.).
Teste de visão central - acuidade visual para longe e para perto, tela de Amsler, visão de
cores e sensibilidade ao contraste.
Teste da visão periférica - perimetria, campo visual, pesquisa de floaters e fotopsias.
Biomicroscopia de segmento anterior.

Tonometria
Se não houver contraindicação deve-se então proceder a midríase para melhor exame da reti­
na com a utilização de equipamento adequado.
Caso haja contraindicação para midríase, como, por exemplo, câmara anterior rasa e glau-
coma de ângulo fechado, o exame fundoscópico pode ser realizado com o oftalmoscópio di­
reto e com lentes para biomicroscopia de fundo de olho com pupila estreita como a lente de
90 dioptrias e a de grande angular.

PRINCÍPIOS BÁSICOS DA OFTALMOSCOPIA DIRETA


O princípio básico da oftalmoscopia direta é bastante simples. Se o olho de um paciente é
emetrope, raios de luz que saem da retina deste paciente emergem como um feixe paralelo. Se
esse feixe paralelo penetra na pupila de um observador emetrope, este será focado na retina
e formará uma imagem.
Porém, isso só acontece se o feixe de luz que entra, o feixe que sai e o olho do observador
r

estiverem opticamente alinhados com o olho do paciente. E por essa razão que a pupila nor­
malmente aparece preta, pois geralmente as fontes luminosas não estão alinhadas com olho
do observador e este vê apenas áreas não iluminadas do interior do olho.
Atualmente os oftalmoscópios diretos usam a metade inferior da pupila do paciente para
iluminação através de um pequeno espelho ou prisma e a metade superior para observação.
O campo de visão é bastante limitado, pois o máximo de área de exame que conseguimos
gerar vai depender do máximo de diâmetro do feixe de luz que conseguirmos fazer passar pela
pupila do paciente.
A magnificação na oftalmoscopia direta é de 1/1, ou seja, se ambos (observador e pacien­
te) forem emetropes o tamanho da imagem retiniana no olho do observador será igual ao
108 Semiologia Básica em Oftalmologia

tamanho do detalhe visto. Por exemplo, a imagem da papila vai medir um diâmetro de papila
na retina do observador.
Outra forma de calcularmos a magnificação é compararmos quantas vezes maior é um
objeto na visão do observador na oftalmoscopia, com a visão que ele teria deste objeto na
distância-padrão de 25 cm (1/4D). Mantendo o exemplo da papila para atingir a magnificação
de um diâmetro de papila na retina deste objeto se estivesse localizado a 25 cm deveríamos
usar uma lente de 60D, ou seja, a distância focal de 1/60 seria 15 vezes mais próxima que o 1/4
padrão, o que significaria uma magnificação de 15 vezes.
Todos esses cálculos são considerados quando tanto o observador quanto o paciente são
emetropes, se isso não acontece os cálculos são diferentes e também serão diferentes os ta­
manhos das imagens geradas. Por exemplo, em pacientes míopes é necessário colocarmos
lentes negativas no oftalmoscópio, o que funcionaria como um telescópio de Galileu gerando
uma imagem maior. O contrário é verdadeiro, em pacientes alto hipermetropes e afácicos, a
colocação de lentes positivas funciona como um telescópio reverso e diminui o tamanho da
imagem.

TÉCNICA DE EXAME DA OFTALMOSCOPIA DIRETA


A técnica de exame da oftalmoscopia direta é bastante difundida e é essencial que este exame,
seja realizado tanto nas consultas oftalmológicas quanto nas consultas da clínica geral.
O médico deve tentar obter o máximo de midríase que conseguir na pupila do paciente,
seja pelo escurecimento da sala de exame seja pela utilização de medicamentos que gerem
essa midríase.
Deve então regular o aparelho com o diâmetro do feixe de luz que mais se adapte à pupila
do paciente (quanto maior o diâmetro do feixe maior é a área iluminada, mas também é maior
a possibilidade de termos luz refletida que irá nos atrapalhar no exame).
Uma vez localizado o reflexo vermelho do paciente com o oftalmoscópio direto à distância
de 20 cm, devemos nos aproximar do olho examinado o máximo possível até obtermos uma
imagem focada. Isso se dá a uma distância de 2 a 5 cm, e para que possamos chegar próximo
o suficiente devemos examinar o olho direito do paciente com o nosso olho direito e o olho
esquerdo com o nosso olho esquerdo.
Grandes diferenças de refração entre o examinador e o paciente podem ser compensadas
com a colocação de lentes convergentes (+ ) ou divergentes (-) no oftalmoscópio, lentes que
são localizadas dentro do aparelho (disco de lentes introduzido por Rekoss em 1852). Isso
também pode dar uma ideia aproximada da refração do paciente, quando subtraímos a refra­
ção do observador.
A maioria dos oftalmoscópios diretos possui um jogo de aberturas que permite adaptar­
mos o diâmetro do feixe de acordo com a pupila do paciente ou usar o filtro polarizador (o
das linhas cruzadas) para diminuir os reflexos corneanos, que podem prejudicar a visibilidade.
Também possui um feixe em fenda que pode dar noção de estruturas elevadas na retina, um
feixe para avaliar a fixação, um feixe verde que facilita a visibilidade da camada de fibras ner­
vosas, de algumas alterações maculares e das estruturas vasculares e um feixe azul que pode
inclusive ser usado na avaliação de contraste, como a fluoresceína (Fig. 3).
Oftalmoscopia Básica em Oftalmologia 109

Fig. 3 Exemplo de oftalmoscópio direto (minimodelo, da Heine).

Principais utilizações do oftalmoscópio direto:


Exame de rotina em todos os pacientes para observação da papila e da região macular
(imprescindível em todas as consultas em que não for utilizada a oftalmoscopia indireta ou
biomicroscopia para avaliação da retina).
Também podem ser usados para avaliar, grosseiramente, a córnea e a pupila do paciente
se colocarmos a lente com poder dióptrico +15 e ficarmos a 5 cm do paciente.
Se colocarmos a lente no poder dióptrico +6 e nos posicionarmos a 15 cm do paciente
teremos uma boa avaliação do reflexo vermelho e de opacidades que possam existir no cris­
talino e até no vítreo anterior (teremos uma noção melhor da localização se pedirmos para o
paciente olhar para cima e para baixo).

OFTALMOSCOPIA BINOCULAR INDIRETA


A oftalmoscopia monocular indireta foi descoberta por Ruete em 1851, pouco após a introdu­
ção da oftalmoscopia direta por Helmholtz. Mas somente em 1947 após a introdução do oftal­
moscópio binocular indireto (OBI) por Schepens, ela se popularizou, proporcionando imagem
estereoscópica do fundo de olho.
Com a depressão escleral - Trantas, 1900, também reintroduzida por Schepens, a oftal­
moscopia binocular indireta permitiu detalhada observação de todo o fundo de olho, desde o
disco óptico até a pars plana.
Devido às limitações do oftalmoscópio direto, como o pequeno campo de visão e difi­
culdade em examinar a periferia retiniana, este vem sendo mais utilizado por estudantes e
110 Semiologia Básica em Oftalmologia

médicos de outras especialidades e progressivamente substituído pelo oftalmoscópio indireto


pelos oftalmologistas.
As vantagens da OBI: o feixe de luz pode penetrar em meios mais opacos; permite me­
lhor visão global da retina; os erros refrativos do paciente e do examinador não interferem
no exame; estereopsia; maior distância de trabalho; maior facilidade para examinar crianças e
pacientes pouco colaborativos; uso em centro cirúrgico.
No exame de OBI a distância entre o médico e o paciente é de cerca de um comprimento
de braço. O paciente pode ser examinado sentado, mas para exame mais completo e cuidado­
so é recomendado que esteja deitado. A lente é segurada com uma das mãos em uma distância
apropriada do olho do paciente. O oftalmoscópio, as lentes condensadoras e a pupila do olho
examinado deverão estar em um mesmo eixo. Esse sistema óptico produz uma imagem virtual,
invertida do fundo do olho do paciente a aproximadamente 20 polegadas do examinador. O
médico precisa se habituar à imagem virtual suspensa no ar.
Para o exame usa-se mais comumente a lente de +20D, que nos dá uma magnificação de
2,5 vezes e um campo visual de 35° (Fig. 4), também podem ser utilizadas as lentes de +14,
+28 +30D. Quanto maior a dioptria da lente menor a magnificação da imagem e maior seu
campo de visão. Também podem ser usadas lentes amarelas, que permitem maior conforto
para o paciente, sendo muito úteis para triagem.
Alguns oftalmoscópios possuem filtro verde, que permite melhor observação de altera­
ções do epitélio pigmentar retiniano e membrana limitante interna (Fig. 5).
Técnica de exame:
■ Local em penumbra permite melhor contraste e menos reflexos externos na lente.
■ Adaptação luminosa do examinador.
■ Feixe luminoso intenso.

Fig. 4 Exemplo de lente condensadora para oftalmoscopia


binocular indireta (modelo de 20D da Volk).

Fig. 5 Exemplo de oftalmoscópio binocular indireto (modelo


Welch-Allyn).
Oftalmoscopia Básica em Oftalmologia 111

■ Orientar o paciente sobre o desconforto do exame e sobre sua segurança.


■ Boa midríase.
■ Posicionamento adequado do paciente, orientar direção do olhar.
■ Paciente deve manter o olho não examinado aberto.
■ Lente de exame levemente inclinada para diminuir reflexos.
■ Depressão escleral - em casos em que necessitamos de uma avaliação da extrema periferia
e de pars plana podemos realizar a introflexão da retina, melhorando a observação e au­
mentando o contraste, permitindo, assim, identificar alterações sutis (Fig. 6).

Fig. 6 Imagem de rotura retiniana com introflexão escleral.

Técnica de depressão escleral:


■ O depressor escleral pode ser no formato clássico de dedal com uma haste curva ou no for­
mato de caneta com pontas de diferentes formatos. Ou no consultório pode-se improvisar
com um cotonete ou clipe de papel.
■ A anestesia tópica pode ser utilizada se a introflexão for realizada diretamente sobre o glo­
bo ocular. Podendo ser dispensada caso o exame seja realizado sobre as pálpebras.
■ Para realizarmos o exame da retina superior devemos pedir para o paciente olhar para bai­
xo, posicionar o depressor na margem superior do tarso da pálpebra superior e solicitar
que olhe para cima lentamente. Uma vez posicionado o olho, o depressor e a lente pode­
mos pressionar o depressor delicadamente, bem como movimentá-lo.
■ O exame da retina inferior é procedido solicitando que o paciente olhe para cima e então
se posiciona o depressor escleral na pálpebra inferior e após solicitar que o paciente olhe
para baixo novamente.
■ O exame da periferia das 3 e 9 h pode ser realizado puxando a pálpebra superior para baixo
ou diretamente sobre a conjuntiva.
■ Deve-se observar o disco óptico durante o exame para detectarmos a presença do pulso ar­
terial, que significa que a pressão exercida está sendo excessiva. Também evitar a depressão
escleral no pós-operatório de cirurgia ocular, esperando de 6 a 8 semanas para realizá-la.

BIOMICROSCOPIA DO SEGMENTO POSTERIOR


Também são recomendadas uma boa midríase e a colocação da sala em penumbra.
O corpo vítreo anterior é observado, nos seus dois terços anteriores, sem a necessidade
do auxílio de lentes, enquanto o terço posterior necessita do uso de lentes, que podem ser
pré-corneais ou corneais.
112 Semiologia Básica em Oftalmologia

Lentes de não contato: a de Hruby é pré-corneana de não contato plano côncava (-58,6 D),
produz uma imagem virtual direta do vítreo posterior e retina. Seu campo de visão é pequeno.
A lente pré-corneana positiva produz imagem real e invertida. Têm maior ângulo de ob­
servação com iluminação, maior campo visual, menor distorção e glare.
A lente + 60D fornece uma imagem com grande magnificação, mas de difícil focalização,
sendo ideal para observar mácula e disco óptico.
A lente +78D produz boa distância de trabalho e magnificação satisfatória, sendo boa
para exames prolongados.
A lente + 90D permite amplo campo de visão para exame geral do fundo de olho, mas tem
pequena magnificação (Fig. 7).
As lentes pré-corneais mais difundidas são as Doublé Aspheric +60, +90 e +78D, a Super
Field NC e a Super-Pupil NC. Esta última juntamente com a +90 permite o exame biomicros-
cópico áofundus mesmo com pupila estreita.
Lentes de contato: as lentes com espelhos foram desenvolvidas por Goldmann e servem
para o exame do seio camerular, do corpo vítreo, da papila óptica e das retinas central e pe­
riférica (Fig. 8). Para uma boa estereopsia do fundo é necessário que se incline o sistema de
iluminação com fenda oblíqua ou horizontal, dependendo da região a ser examinada.
Sob o ponto de vista óptico, considera-se a abertura central da lente destinada ao exame
do polo posterior. Os espelhos têm um intervalo de 120° entre si, e a angulação das lentes é
de 73°, 67° e 59° com relação à superfície frontal. Permitindo, assim, que esta lente sirva ao
exame desde o polo posterior até a retina e o vítreo periféricos. Quanto maior a angulação do
espelho mais posterior é seu campo de observação. O espelho de 73° cobre a região equato-

Fig. 7 Exemplo de lente de biomicroscopia de 90D (modelo


Volk).

Fig. 8 Lentes de três espelhos (modelo Volk).


Oftalmoscopia Básica em Oftalmologia | 1 1 3

rial do fimcliis e as porções correspondentes do corpo vítreo. O espelho de 67° destina-se ao


estudo da periferia do fundo, da porção anterior do equador à margem posterior da ora serrata
e base do corpo vítreo. O espelho de 59°, semicircular, destina-se ao exame da ora serrata, base
do vítreo e seio camerular.
As lentes espelhadas são difíceis de serem utilizadas em crianças e adultos muito sensí­
veis. Também requerem cuidados ao serem utilizadas em pacientes vítimas de trauma ou ope­
rados recentemente. Têm campo de visão limitado quando comparadas às de grande angular.
As lentes de contato fundoscópicas de grande angular estão disponíveis em diferentes
potências. Apresentam imagem real e invertida. Permitem, devido à sua maior potência di-
óptrica, observação de grande campo. As desvantagens são os reflexos produzidos por sua
superfície, que são difíceis de eliminar, e o desconforto causado pela luz ao paciente.

TIPOS DE ILUMINAÇÃO
Iluminação direta - nela a focalização tanto do objeto quanto da luz está em um mesmo pla­
no. Pode ser difusa, para estudo global das estruturas, ou focal, para estudar os detalhes. Na
focal forma-se o paralelepípedo que tem como objetivo o estudo da posição, nas estruturas
oculares, das lesões em observação. Reduzindo-se a espessura do paralelepípedo temos o
corte óptico, que se caracteriza por duas linhas: a do perfil anterior, que corresponde à face
anterior do paralelepípedo e a linha do perfil posterior, que corresponde à face posterior do
mesmo. Tem como objetivo o estudo das depressões, das saliências e também da localização
das estruturas no sentido anteroposterior.
Iluminação indireta - a focalização do objeto e da luz se faz em planos diferentes.
Iluminação indireta focal - o feixe luminoso é projetado próximo ao objeto em observa­
ção e tem como objetivo o estudo das margens da lesão.
Iluminação indireta difusa - também conhecida por diafanoscopia, retroiluminação e cam­
pos. Projeta-se o feixe luminoso no plano localizado atrás do objeto em observação e tem
como objetivo estudar as estruturas em um campo retroiluminado.
Campo vermelho - projeta-se o feixe luminoso no plano retinocoroideano e estudam-se as
estruturas aquém do mesmo. É utilizado principalmente no estudo do corpo vítreo, do crista­
lino e do epitélio pigmentar da íris.
■ Biomicroscopia do corpo vítreo.

Iluminação direta difusa - serve para estudar o vítreo de modo geral.


Iluminação direta focal - o corte óptico permite o estudo seriado da arquitetura do vítreo
anterior.
Iluminação indireta difusa - campo vermelho é o mais utilizado, permite a detecção de
alterações incipientes. Muito útil no acompanhamento das uveítes.
Biomicroscopia da cabeça do nervo óptico.
Busacca distinguiu esta estrutura em duas áreas, área discai, representada pela cabeça do
nervo óptico, e área peridiscal, representada por um tecido glial que ultrapassa o anel escleral
e se prolonga na retina peridiscal.
Iluminação direta difusa - observação de modo geral.
114 Semiologia Básica em Oftalmologia

Iluminação direta focal - o corte óptico e paralelepípedo permitem estudar as áreas discai
e peridiscal.
Iluminação indireta focal - permite diferenciar entre edema, drusas e gliose.
Iluminação indireta difusa - campo vermelho estuda o vítreo pré-discal. Serve para eviden­
ciar células inflamatórias, hemorrágicas e pigmentares.
■ Biomicroscopia da retina.

Lentes - três espelhos de Goldmann; Super Field; quadrasférica; transequator; mainster;


superquad.
Iluminação direta focal - com o corte óptico podem-se estudar as saliências e depressões
da retina. Fazer a maior angulação possível entre o sistema de iluminação e o sistema do mi­
croscópico, para que a linha do perfil anterior do corte óptico fique afastada da linha do perfil
posterior. Assim, estuda-se a região como um todo.
Iluminação indireta focal - geralmente o funcliis apresenta um brilho exagerado e esta ilu­
minação permite perceber nitidamente as margens das alterações aí localizadas.
Iluminação indireta difusa - campo vermelho: o vítreo pré-retiniano pode ser estudado.
■ Biomicroscopia da mácula.

Iluminação direta difusa - permite o delineamento da área macular. A direta focal, na for­
ma de paralelepípedo fino, ou na forma de corte óptico, facilita a identificação das estruturas.
Para o estudo da fóvea, muitas vezes o filtro red-free é necessário para reduzir o reflexo dessa
área e salientar os vasos da região.
Iluminação indireta focal - o feixe luminoso é projetado próximo ao objeto em observa­
ção e tem como objetivo observar as margens da lesão.
Iluminação indireta difusa - na forma de campo vermelho observa o vítreo pré-macular,
dando a possibilidade de evidenciar processo inflamatório.
Silverberg et ai (1998) realizaram um estudo comparativo entre a biomicroscopia de con­
tato e a de não contato no estudo do edema cistoide de fóvea, concluindo que a primeira tem
sensibilidade e especificidade maiores.
■ Biomicroscopia da periferia da retina.

O estudo biomicroscópico da periferia da retina e da base do vítreo pode ser realizado


com o uso de lentes pré-corneais e corneais, que permitem observar até a média periferia.
Para estudar a ora serrata, da periferia mais anterior e da pars plana, deve-se utilizar um de­
pressor escleral.
A iluminação deverá ser sempre direta focal em forma de paralelepípedo fino e, mais es-
pecificamente, em corte óptico, porque geralmente nestas regiões o que se estuda são saliên­
cias, depressões e bridas.

PRINCIPAIS USOS
Exame das alterações do corpo vítreo: liquefação do vítreo (sínquise), colapso do vítreo (siné-
rese), descolamento do corpo vítreo, trações do vítreo, vitreosquise, opacidades vítreas.
Oftalmoscopia Básica em Oftalmologia 115

Exame da periferia da retina: observação das estruturas retinianas periféricas, como os


nervos ciliares posteriores, ampola da vorticosa, vasos retinianos periféricos, ora serrata, pars
plana, base do vítreo, degenerações retinianas periféricas benignas e as predisponentes ao
descolamento de retina, hiperplasia e atrofia do epitélio pigmentar retiniano, tufos vitreorre-
tinianos, complexos ou dobras meridionais, buracos e roturas retinianas, tumores e alterações
vasculares e inflamatórias, descolamentos de retina.

DILATAÇÃO DA PUPILA
Para o exame da retina muitas vezes é necessário a midríase do paciente (principalmente para
o exame da periferia retiniana bem como para o exame detalhado da mácula que é facilitado
pela midríase). Para este procedimento podemos utilizar duas classes de medicamentos: os
midriáticos (simpaticomiméticos) e os cicloplégicos (parassimpaticolíticos). Quando for neces­
sário uma midríase maior podemos associar as duas classes de medicação.

MIDRIÁTICOS
Hidrocloridrato de fenilefrina
Apresentação: usado na forma de colírio a 2,5 e 10%.
Dosagem: 1 gota a cada 5 a 10 min 1 a 3 vezes.
Início e duração da ação: inicia-se em 30 min e dura cerca de 2 a 3 h.
Efeitos colaterais e reações adversas: em pacientes recém-nascidos, em cardíacos e em
pacientes que utilizaram reserpina, guanetidina ou antidepressivos tricíclicos deve ser evita­
da a solução a 10% por seus efeitos no aumento da pressão vascular. Alguns pacientes podem
apresentar alergia a esta medicação.

CICLOPLÉGICOS
Sulfato de atropina
Apresentação: usado na forma de colírio a 0,5 e 3% e pomada a 0,5 e 1%
Dosagem: 1 gota a cada 12 h.
Início e duração da ação: inicia-se em 30 min com ação máxima em 2 h e pode durar cer­
ca de 2 semanas (por causa dessa longa duração a atropina é pouco utilizada na prática da
oftalmoscopia, sendo mais útil para refração em crianças e adultos bem como coadjuvante no
tratamento de uveítes).
Efeitos colaterais e reações adversas: a sua absorção sistêmica pode induzir alteração de
comportamento (agitação), rubor de face, boca seca, pele aquecida pela vasodilatação e taqui-
cardia. Esses efeitos são observados principalmente em crianças.
116 | Semiologia Básica em Oftalmologia

Hidrocloridrato de ciclopentolato
Apresentação: usado na forma de colírio de a 0,5, 1 e 2%.
Dosagem: 1 gota a cada 10 min a 1 a 3 vezes (dose para realização de oftalmoscopia).
Início e duração da ação: inicia-se em 30 a 60 min e pode durar cerca de 24 h (por causa
dessa longa duração também é pouco utilizada na prática da oftalmoscopia em adultos bem
como sendo mais útil para refração).
Efeitos colaterais e reações adversas: ocasionalmente pode provocar sintomas neurológi­
cos (alucinações visuais, fala ininteligível e ataxia).

Tropicamida
Apresentação: usado na forma de colírio a 0,5 e \%.
Dosagem: 1 gota a cada 5 min de 1 a 3 vezes.
Início e duração da ação: sua ação de cicloplegia ocorre em 20 a 25 min, sendo essa ação
bastante fugaz, por isso optamos por essa medicação mais para a oftalmoscopia que para a
refração. Sua ação pode durar cerca de 5 a 6 h.
Quando estamos diante de crianças, principalmente as de baixa idade e recém-nascidos,
temos que levar em consideração o benefício do uso destas medicações e os seus riscos. Como
em alguns casos é necessário a midríase dos olhos destes pacientes, sugere-se a utilização de
hidrocloridrato de ciclopentolato a 0,5% com 1 gota a cada 10 min de 1 a 3 vezes, conforme
a necessidade.

SEDAÇÃO
Em alguns casos temos que utilizar a sedação para examinar pacientes em idade pré-escolar
ou muito agitados. Para isso podemos lançar mão de substâncias indutoras do sono, como,
por exemplo, o hidrato de cloral e o midazolan.

Hidrato de cloral
Potente indutor do sono, porém sem características de mantenedor do sono, analgésico, e
pela sua dose tóxica ser muito próxima da dose terapêutica também não é utilizado como
anestésico.
Ele é um tricloroaldeído, que é metabolizado no fígado em tricloroetanol, sua forma ativa.
Sua concentração plasmática total se dá em 30 a 60 min após a ingestão oral e tem meia-vida
de 4 a 12 h, quando é metabolizado no fígado e excretado via renal.
Devido ao seu gosto amargo pode induzir vômitos quando administrado via oral. Existe
também na forma de supositórios.
As doses no adulto variam de 0,5 a 1 g para efeito leve hipnótico, podendo chegar a 2 g.
r

E considerada dose oral tóxica, em adultos, 10 g.


As doses na pediatria podem ser calculadas em função do peso: 100 mg/kg de peso corpo­
ral para os primeiros 10 kg e 50 mg/ kg para cada quilograma adicional. Caso esta medicação
seja necessária, sugere-se um ambiente com assistência cardiorrespiratória.
Oftalmoscopia Básica em Oftalmologia 117

Doses maiores que 100 mg/kg podem levar à depressão respiratória, hipotensão arterial
e miose.
São contraindicações: insuficiências respiratória, renal, cardíaca ou hepática.
O uso crônico do hidrato de cloral pode causar dependência física, tolerância e vício.
Na maioria dos casos, por medida de segurança, os procedimentos são realizados sob
anestesia geral inalatória em centro cirúrgico com a participação de um anestesiologista.

DESCRIÇÃO DO FUNDO DE OLHO


O exame do fundo de olho tem como objetivo principal a observação da retina e de suas al­
terações (Fig. 9).
r

A retina é a túnica interna do globo ocular. E um tecido que tem cerca de 0,1 mm de es­
pessura na ora serrata, 0,2 mm no equador e 0,56 mm adjacente à cabeça do nervo óptico. A
face interna da retina está em contato com o vítreo e sua face externa com o EPR, separado
deste pelo espaço sub-retiniano. A retina neurossensorial encontra-se colada firmemente em
duas áreas: no disco óptico e na ora serrata. Nos outros locais a retina está aderida ao EPR
pelos microvilos que envolvem individualmente os segmentos externos dos fotorreceptores
através de mecanismos de bomba que drenam o líquido sub-retiniano e deixam esse espaço
virtual vazio. A presença de líquido nesse espaço sub-retiniano vai provocar o que chamamos
de descolamento de retina.
Perifericamente, a retina sensorial estende-se para a ora serrata, onde continua como um
epitélio não pigmentado do corpo ciliar, que juntamente com a projeção anterior do EPR
formado de células ricas em melanina, cobrem o corpo ciliar, os processos ciliares e a porção
posterior da íris.
Uma vez verificado se a retina está colada iniciamos a descrição do fundo de olho propria­
mente dito. A nossa atenção está voltada inicialmente para o polo posterior, onde observamos:
A papila ou disco óptico - é normalmente redondo ou ligeiramente ovalado e possui uma
escavação central, que pode ou não estar presente. A parte do disco que se encontra entre
a borda do disco óptico e a escavação é chamada de rima neural e apresenta normalmente a
coloração variando entre o alaranjado e o rosa.
Dado importante para o nosso exame é o que chamamos de relação disco/escavação que
é geralmente até 1/3, no entanto, a escavação fisiológica não é tão fácil de ser definida se fo­
rem levadas em conta as variações de raça (negros têm escavações fisiológicas maiores que os
brancos), idade (a escavação pode ir aumentando com a idade) e ametropias (míopes têm pa-

Fig.9 Fundo de olho normal.


118 Semiologia Básica em Oftalmologia

pilas e escavações maiores). Outros fatores de confusão nessa avaliação são as papilas inclina­
das, as hipoplásicas, os colobomas de disco óptico ou peridiscais, a fosseta de papila e outras
alterações, como o morning glory, megalopapila, estafilomas e displasias de papila.
As bordas das papilas são geralmente bem definidas. E nessas bordas podemos observar
algumas alterações, tais como a persistência de fibras de mielina (que se apresenta como um
tecido branco brilhante que acompanha a distribuição das fibras nervosas), a esclerose de
coroide peridiscal senil, a presença de halos pigmentados peridiscais (zonas alfa e beta) e a
coroidose miópica (que muitas vezes apresenta-se na forma de uma crescente temporal). A
perda da nitidez dessas bordas pode se dar por pseudopapiledema (principalmente por drusas
gigantes de papila), papiledema verdadeiro (secundário à hipertensão intracraniana) e edema
de papila (por neuropatia óptica isquêmica anterior, neurite óptica e outras afecções inflama­
tórias do nervo óptico).
O nervo óptico é composto pelos axônios das células ganglionares, tecido glial, colágeno
e pelos vasos sanguíneos (saída dos ramos da artéria central da retina, entrada dos ramos da
veia central da retina e na borda do disco observamos em alguns casos a artéria ciliorretinia-
na). Os axônios formam a camada de fibras nervosas que deve ter nossa especial atenção ao
examinarmos a região peripapilar já que defeitos nesta camada podem ser observados em
doenças como o glaucoma (sinal de Hoyt). A papila deve sempre ser alvo de um exame mais
aprofundado já que além de sinais de glaucoma, como assimetria de escavação entre a papi­
la dos dois olhos, hemorragias superficiais na papila, aumento setorial da escavação, perda
setorial da rima neural (NOTCH), progressão da escavação com o passar do tempo, vasos em
passarela, vasos em baioneta, deslocamento nasal dos vasos, palidez regional da rima e lâmina
crivosa visível chegando a formar uma fosseta de papila adquirida (Fig. 10).
A retina central, ou região macular, está definida histologicamente como a área da retina
posterior que possui pelo menos duas fileiras de núcleos na camada das células gangliona­
res, e oftalmoscopicamente observamos na região da retina central uma coloração amarelada
(possui um corante chamado xantofila). Esta região esta localizada entre as arcadas vasculares
temporais.
A fóvea é uma zona de 1,5 mm de diâmetro central. A superfície interna da retina na fóvea
é côncava em razão do afmamento das camadas retinianas internas (as camadas de fibras ner­
vosas, células ganglionares e camada plexiforme interna estão ausentes na fóvea). A camada
nuclear interna é reduzida a uma fila dupla de células nas bordas da fóvea e também inexis­
tente dentro da fóvea. O centro (0,57 mm de diâmetro) da camada fotorreceptora da fóvea
é composto inteiramente de cones. Quase todos vasos sanguíneos nessa parte da retina são

Fig. 10 Escavação glaucomatosa de papila com NOTCH inferior


e anéis pigmentados (zonas alfa e beta).
Oftalmoscopia Básica em Oftalmologia 119

capilares, e a região central da fóvea é livre de capilares, sendo conhecida como FAZ - zona
avascular da fóvea que possui 0,4 mm de diâmetro. Na angiografia fluorescente, o FAZ é um
importante ponto de referência que ajuda a localizar o centro da fóvea.
Fovéola: no centro da fóvea encontra-se a fovéola que tem 0,35 mm de diâmetro e está si­
tuada dentro do FAZ. No centro da fovéola existe uma pequena concavidade que é chamada de
umbus onde há uma grande concentração de corpos celulares de cones alongados, segmentos
externos dos cones vermelhos e verdes. Na região mais central, 2o, acredita-se que não possua
cones azuis. A fovéola está aproximadamente cerca de 4,0 mm temporal e 0,5 a 0,8 mm infe­
rior a uma linha horizontal desenhada pelo centro do disco óptico.
Parafóvea: a fóvea é circundada pela saliência chamada parafóvea, uma região mais espessa
da retina devido ao acúmulo da camada das células ganglionares e células da camada nuclear
interna deslocada da fóvea. A camada das fibras nervosas é também relativamente espessa, es­
pecialmente no nível do feixe papilomacular na margem nasal. A relação cone/bastonete é 1:1.
Mácula clínica: muitos oftalmologistas consideram a mácula como a área compreendida
pela fóvea e a parafóvea (em torno de 2,85 mm de diâmetro), entretanto outros consideram a
mácula aquela região apenas da fóvea.
Arcadas vasculares: na papila observamos a saída dos vasos centrais da retina (artéria e
veia) que a partir daí vão se dividir em ramos. Geralmente observamos uma artéria e uma veia
com suas respectivas ramificações para cada setor (temporal superior, temporal inferior, nasal
superior e nasal inferior). As artérias vão se dividindo e dicotomizando em ângulos agudos ou
em “Y ” até a periferia, com um desenho semelhante observado nas veias. Os ramos arteriais
e os venosos se cruzam no seu trajeto até a periferia em ângulos agudos, e dificilmente exis­
te compressão de um vaso sobre o outro neste tipo de cruzamento. Quando temos quadros
de HAS crônica, além das alterações mais comuns (arteriosclerose e aterosclerose), podemos
observar uma mudança da angulação no cruzamento da artéria com a veia que pode passar de
ângulos agudos para ângulos de 90°, em alguns casos esta posição anômala da artéria pode
chegar a ocluir o ramo venoso que passa abaixo dela. Em 20% dos casos podemos observar
também uma artéria oriunda da circulação coroideana saindo da borda do disco óptico, esta
artéria é conhecida como artéria ciliorretiniana e geralmente irriga o feixe papilomacular e a
região macular. Podemos diferenciar a artéria da veia pela sua espessura (geralmente são 2/3
da espessura da veia) e tem coloração mais avermelhada, enquanto a veia é mais arroxeada, e
pela presença do reflexo dorsal que a artéria possui.
Em direção à periferia temos a continuação das arcadas vasculares para cada quadrante, e
por transparência do EPR podemos ver as ampolas das veias vorticosas que drenam a coroide.
Ora serrata é a junção da retina neurossensorial com o epitélio não pigmentado do corpo
ciliar. Esta região tem esse nome por ser uma sequência de dentes e baías. A maior densidade
de dentes aparece no quadrante inferonasal e a menor quantidade está no quadrante infero-
temporal. O número de dentes varia de 16 a 48, tendo em média 25 a 30. A ora serrata mede
2,1 mm em largura, temporalmente e 0,7 para 0,8 mm, nasalmente. O termo ora serrata se
refere ao aspecto serrilhado desta zona, a qual se denomina processo denteado, ou dente,
invadindo anteriormente a pars plana do corpo ciliado, e baías que representam a extensão
posterior da pars plana. Os maiores números de processos denteados e baías são encontrados
no quadrante superonasal, com uma progressiva diminuição de número nos quadrantes infe­
ronasal, superotemporal e inferotemporal.
120 | Semiologia Básica em Oftalmologia

A ora serrata é localizada mais anteriormente no lado nasal que temporal; a ora nasal está
a 6 mm posterior ao limbo, e a ora temporal a 7 mm posterior ao limbo. Como uma referência
externa aproximada, as localizações das inserções dos músculos retos estão bem próximas da
ora serrata, exceto a inserção do músculo reto superior, o qual varia de 7,0 a 7,7 mm posterior
ao limbo e está frequentemente posterior à ora. O equador é localizado 6 a 8 mm posterior à
ora e a mácula é 18 a 20 mm posterior ao equador. A distância média da ora serrata ao nervo
óptico é 32,5 mm temporal, 27 mm nasal e 31 mm superior e inferior.
Além das estruturas retinianas podemos observar o vítreo que, na maioria dos casos, é
transparente e nos pacientes mais jovens está aderido a retina (principalmente nas arcadas
vasculares, papila e no local de maior aderência, que é a base vítrea localizada na ora serrata)
formando um reflexo característico que diminui com a idade e com o descolamento posterior
do vítreo.
O tamanho de estruturas e as distâncias na retina são medidos em DP (diâmetros de papi­
la), e quando vamos localizar certas estruturas podemos utilizar as regiões da retina, tais como
polo posterior, arcadas, meia periferia e periferia (neste último podemos utilizar as horas do
relógio para localizar melhor a região que está sendo descrita) e também podemos dividir a
retina nos seus quatro quadrantes: temporais superior e inferior e nasais superior e inferior.

OUTRAS FORMAS PARA A AVALIAÇÃO DA RETINA


Embora a oftalmoscopia básica (direta e indireta) seja suficiente para a avaliação de boa parte
dos pacientes, em alguns casos precisamos lançar mão de alguns exames complementares:
Ecografia - para avaliar a retina e a cavidade vítrea quando os meios não estão transpa­
rentes ou quando queremos avaliar estruturas sólidas intraoculares, trações vitreorretinianas
e até a mobilidade da própria retina quando esta se encontra descolada. Estruturas como a
coroide, nervo óptico, musculatura extraocular e espaço retro-ocular também podem ser ava­
liados pela ecografia.
Angiografia - onde avaliamos a circulação, alterações vasculares, vazamentos e alterações
do EPR com a fluoresceína (mais usada para a retina) e a com indocianina verde (mais usada
para a coroide).
OCT - a tomografia de coerência óptica (OCT) é um exame muito útil na avaliação de pa­
tologias maculares (membranas epi e sub-retinianas, buracos maculares, avaliação de edema
retiniano por oclusão venosa e retinopatia diabética, entre outras). Podemos contar com este
exame quando vamos avaliar o glaucoma, e através dele podemos fazer medições importantes
da papila e sua escavação bem como da camada de fibras nervosas.
Campo visual - exame de fundamental importância na avaliação de algumas patologias
de retina, tais como retinose pigmentar (avaliando a evolução do escotoma anular da doen­
ça), maculopatias medicamentosas iniciais (detectando alterações da sensibilidade macular no
campo de 10° que podem aparecer antes que a acuidade visual e a fundoscopia estejam alte­
radas), neuropatias e neurites ópticas.
Oftalmoscopia Básica em Oftalmologia 121

BIBLIOGRAFIA
Siqueira RC, Oréfice F. Mapeamento de Retina: oftalmoscopia binocular indireta e biomicroscopia do segmento posterior.
Rio de Janeiro: RioMed, 2000.
Oréfice F. Uveíte Clínica & Cirúrgica. 2- ed. Rio de Janeiro: Cultura Médica, 2005.
Ambujamra S, etal. Retina e vítreo: clínica e cirúrgica. São Paulo: Roca, 2000.
Ryan SJ. Retina. 3rded. Vol. 1. St. Louis: Mosby, 2001.

L i t e r a t u r a S u g e r i d a

1. Siqueira RC, Oréfice F. Mapeamento de Retina: oftalmoscopia binocular indireta e biomicroscopia do segmento poste­
rior. Rio de Janeiro: Rio Med, 2000.
Tonometria

ROGÉRIO JOÃO DE ALMEIDA TORRES

INTRODUÇÃO
A tonometria é a medição da pressão intraocular (PIO), fundamental na propedêutica básica
do exame oftalmológico. Estudos demonstram uma forte correlação entre o nível de pressão
intraocular e a prevalência e incidência de dano glaucomatoso. A elevação da PIO aumenta o
risco de desenvolvimento de glaucoma. Por este motivo a PIO é o principal fator de risco para
esta doença e também é um dos principais parâmetros para o diagnóstico e acompanhamento
do glaucoma.

PRESSÃO INTRAOCULAR
Dados obtidos a partir de grandes estudos epidemiológicos indicam que a PIO média é de
aproximadamente 15,5 mmHg, com um desvio-padrão de 2,6 mmHg. Valores acima de 21
mmHg têm sido usados para separar pacientes normotensos dos hipertensos. Ainda não está
estabelecido qual nível de pressão deve ser considerado normal ou seguro, já que alguns
olhos podem sofrer danos com pressão de 18 ou menor, enquanto outros toleram pressão de
30 mmHg. Portanto, a ocorrência de lesão glaucomatosa parece depender da suscetibilidade
individual da estrutura da cabeça do nervo óptico a um dado nível de PIO.
A existência de pacientes que desenvolvem glaucoma apesar de apresentarem baixos ní­
veis de PIO e de outros que, apesar do tratamento, o glaucoma progride, sugere que existem
outros fatores patogênicos além da PIO.
A relação entre a pressão sanguínea (pressão de perfusào ocular - PPO) e a PIO pode ter
importância na indução da neuropatia óptica: a hipotensão sistêmica, especialmente durante
o sono, tem sido sugerida como uma possível causa da diminuição da perfusào do nervo ópti­
co, resultando em dano celular. A PIO e a PPO têm variações circadianas fisiológicas, mas seus
124 Semiologia Básica em Oftalmologia

picos e vales não ocorrem necessariamente de forma simultânea. Na verdade, há momentos


durante o dia, como as primeiras horas da manhã, durante os quais a PIO elevada coincide
com a pressão sanguínea relativamente baixa - o resultado é a baixa pressão de perfusão ocu­
lar. Em indivíduos saudáveis o fluxo sanguíneo ocular é autorregulado através da alteração da
resistência dos vasos para manter o fluxo sanguíneo estável, preservando assim a integridade
do tecido em face às mudanças na PPO. Porém, se o sistema autorregulador estiver defeituo­
so e ocorrerem períodos de perfusão inadequada o resultado é a isquemia. Se a isquemia for
prolongada, haverá necrose local do tecido e isso poderá desencadear a apoptose da célula
ganglionar.
Tem sido demonstrado que aqueles com pressão de perfusão inferior a 50 mmHg apresen­
tam maior risco para glaucoma primário de ângulo aberto e para aqueles que atingem nível de
30 mmHg o risco é quatro vezes maior.
Alguns fatores podem influenciar a PIO, tais como batimento cardíaco, prática de exercí­
cios físicos, respiração, nível de hidratação, hora do dia, medicações tópicas e sistêmicas, etc.
O consumo de álcool pode reduzir temporariamente a PIO. A Cannabis diminui a PIO, porém
sua eficácia não foi comprovada clinicamente. A PIO usualmente aumenta com a idade e é
geneticamente influenciada. A medida da PIO também pode ser influenciada pela espessura
corneana e suas propriedades visco elásticas. As córneas mais espessas hiperestimam a PIO e
as mais finas hipoestimam a PIO.
Vários estudos têm mostrado as implicações da flutuação da PIO na fisiopatogênese do
glaucoma. Em indivíduos normais podem ser encontradas variações entre 2 e 6 mmHg. Já nos
pacientes glaucomatosos, com PIO habitualmente elevada, as flutuações são maiores, muitas
vezes ultrapassando os 10 mmHg. A maioria das pessoas, normais ou glaucomatosas, atinge
seus picos de pressão nas primeiras horas da manhã, entre 5 e 7 h, ainda na cama. Por este
motivo, aferições da pressão em diferentes horários podem ajudar a detectar picos pressóri-
cos. Isso pode ajudar a explicar a razão de, em alguns casos, a lesão do nervo óptico continuar
a progredir mesmo com medições de pressões normais, aferidas durante os atendimentos em
consultório. Estudos recentes têm mostrado que estas flutuações e picos de PIO devem ser
considerados como fatores de risco para o desenvolvimento e progressão do glaucoma.
A melhor forma de avaliar as flutuações, picos e médias da PIO é a realização da curva ten-
sional diária completa, de 24 h. Devido às dificuldades para colocar essa estratégia em prática,
outras opções foram desenvolvidas.
O método de curva tensional diária modificada (CTDm), que consiste em medir-se a PIO
de 4 a 5 vezes ao dia, é o mais utilizado no estudo da PIO e através dele podemos avaliar a
flutuação, o pico e a média. Já o teste de sobrecarga hídrica (TSH) é um teste de estresse em­
pregado para avaliar como um olho é capaz de lidar com um aumento transitório da PIO. Ele
serve para determinar a sua flutuação e o seu pico. Os pacientes glaucomatosos apresentam
uma dificuldade de drenagem do humor aquoso através da malha trabecular e, portanto, cos­
tumam ter um rápido pico de PIO após uma grande ingesta de água. Para o teste o paciente
deve estar em jejum de 4 h. Após aferida a PIO basal, ele ingere 800 ml de água em 10 min.
Novas medidas são então obtidas após 15, 30 e 45 min.
Medeiros et al. encontraram correlação entre o pico diário da PIO e o pico do TSH em
pacientes glaucomatosos, durante o tratamento clínico. Susanna et al., estudando pacientes
Tonometria 125

que controlavam glaucoma em consultório, encontraram picos e flutuações maiores no TSH


do que na CTDm,
Como mencionado anteriormente, a PIO é o principal fator de risco para o glaucoma e sua
redução é o único tratamento cientificamente comprovado capaz de conter a evolução da doen­
ça. Conseguir uma redução da PIO a níveis em que a doença pareça improvável de progredir
pode ser considerado o conceito de “pressão-alvo”. Recentemente, vários estudos clínicos de
longo prazo deixam claro que uma grande redução da PIO através de uma terapia agressiva
produz melhores resultados para evitar ou diminuir a progressão da lesão glaucomatosa.
The Normal Tension Glaucoma Study (NTGS) estabeleceu que uma diminuição de 30% na
PIO reduziu a piora do campo visual, de 30% para 10%, após 5 anos. The Advanced Glaucoma
Intervention Study (AGIS) mostrou que quanto mais baixas forem a PIO e a flutuação, menor a
progressão do campo visual. The Ocular Hypertension Treatment Study (OHTS) mostrou que o tra­
tamento dos hipertensos oculares reduziu o risco de desenvolvimento da doença de 10% para
5%, em 5 anos. The Early Manifest Glaucoma Trial (EMGT) evidenciou que o tratamento reduziu
a progressão do dano glaucomatoso de 62% para 45% em 5 anos e estabeleceu que para cada
1 mmHg de redução da PIO o risco de progressão do glaucoma diminui em 10%.

TONÔMETROS
Em 1826, William Bowman introduziu o exame bidigital como uma maneira de medir a PIO,
recomendando a sua inclusão na rotina do exame clínico.
Em 1862, von Graefe idealizou a tonometria de indentação escleral. Mais tarde, em 1884,
com a descoberta da cocaína, o ponto de apoio do tonômetro passou a ser corneano. A partir
de 1905, Schiotz construiu vários modelos com aceitação universal, e seu aparelho tornou-se
padrão ouro por mais de 50 anos.
O princípio da tonometria de aplanação passou a ser valorizado quando Maklakov apre­
sentou seu tonômetro em 1892. A partir daí, ao longo dos anos, a tonometria foi sendo apri­
morada, até que Goldmann, em 1954, construiu o primeiro tonômetro acoplado à lâmpada de
fenda. Pela sua precisão, simplicidade e praticidade, o seu uso teve aceitação mundial e até
hoje representa o padrão ouro da tonometria.
Nos últimos anos, vários tonômetros foram desenvolvidos. Alguns, dispensando o conta­
to com a córnea e a anestesia tópica, utilizando jato de ar; outros que independem de uma
superfície regular da córnea (Tonopen); e outros que não sofrem influência da espessura cor-
neana, apresentando um registro contínuo da PIO (Pascal). Recentemente foi desenvolvido um
aparelho que monitora a PIO durante 24 h por telemetria, através de uma lente de contato, na
qual está acoplado um chip.
A seguir descreveremos os métodos e aparelhos de avaliação da pressão intraocular.

Avaliação bidigital
É possível estimar a PIO pela pressão digital no globo ocular. Este teste pode ser usado com
pacientes que não cooperam e é útil apenas para detectar grandes diferenças entre os dois
olhos.
126 | Semiologia Básica em Oftalmologia

Tonômetro de indentação ( zto


ih
cS)
Este tonômetro usa um êmbolo para empurrar a córnea suavemente. A PIO é medida pela
quantidade de peso necessária para achatar a córnea. Este teste não é tão preciso como o
tonômetro de aplanação e é pouco usado, tendo o seu valor nos casos de córneas irregulares
por cicatrizes.

Tonômetro de aplanação de G o l d m a n n (TAG)


A tonometria de aplanação é o método mais usado. Ela é baseada no princípio de Imbert-Fick,
que afirma que a pressão no interior de uma esfera perfeita, seca e de parede infmitamente
fina é igual à força necessária para aplanar a sua superfície, dividida pela área de aplanação.
Goldmann desenvolveu seu aparelho com espessuras centrais de córnea de aproximadamente
520 pm, medidas através da paquimetria óptica.
Este tipo de tonômetro está acoplado à lâmpada de fenda e utiliza um pequeno cone de
plástico para aplanar uma área da córnea de 3,06 mm de diâmetro. A força necessária exercida
pelo cone para achatar a córnea determina a PIO.

A t é c n i c a p a r a a t o n o m e t r i a d e a p l a n a ç ã o e n v o l v e

■ Após a esterilização da ponta do tonômetro instila-se uma gota de anestésico, em seguida


uma gota de fluoresceína (ou tira de papel de fluoresceína) e enxuga-se o excesso de lágri­
ma. Posiciona-se o paciente junto ao aparelho, deixando o queixo e a região frontal apoia­
dos, e os olhos nivelados na mesma direção de uma marca horizontal existente na haste de
sustentação de apoio da cabeça do paciente.
■ Ajusta-se o tonômetro para 10 mmHg e alinha-se o cone do tonômetro com o centro da
córnea. Posiciona-se o braço de iluminação da lâmpada de fenda a um ângulo aproxima­
do de 45° com o braço do observador, para maximizar a iluminação da ponta do cone do
tonômetro. Pede-se ao paciente para deixar os olhos bem abertos, olhar para frente, e de
forma suave, avança-se a lâmpada de fenda até o cone entrar em contato com a córnea. Se
necessário segura-se as pálpebras para deixar os olhos mais abertos;
■ Ajusta-se a lâmpada de fenda até que os dois semicírculos estejam simétricos. Gira-se o
tambor, que está ao lado do tonômetro, até que as bordas internas dos dois semicírculos se
encontrem. Se a flutuação do pulso ocular for grande, escolhe-se o ponto onde as bordas
internas dos meniscos se encontram. Neste ponto, a córnea está indentada em 3,06 mm,
a capilaridade do filme lacrimal está equilibrada com a espessura da córnea e a força (em
gramas) aplicada pelo tonômetro é um décimo da PIO em mmHg. Em seguida, afasta-se o
tonômetro do olho e faz-se a leitura do valor da tonometria em mmHg. Deve-se confirmar
o resultado através de uma nova leitura. Se a diferença for maior que 2 mmHg, uma terceira
medida deve ser tomada e a média deve ser feita.

Erros encontrados na medição da PIO incluem:


■ pressão sobre o globo ocular;
■ aperto da pálpebra no momento do exame;
■ manobra de Valsalva;
Tonometria 127

■ colarinho ou gravata apertada;


■ não alinhamento vertical dos meniscos (um semicírculo menor que o outro);
■ astigmatismo maior que 4 dioptrias;
■ irregularidade da córnea que leva à distorção das miras afetando a precisão da medida;
■ medidas repetidas e prolongadas que induzem uma diminuição da PIO;
■ tonômetro descalibrado;
■ propriedades biomecânicas da córnea;
■ hipoestimação da PIO: pela falta de fluoresceína, edema corneano, córneas finas e medição
sobre lentes de contato gelatinosas;
■ hiperestimação da PIO: pelo excesso de fluoresceína (os meniscos mais largos), cicatriz cor-
neana e córnea espessa.

Nos 30 min que seguem a realização da tonometria, o paciente deve ser orientado para
piscar com maior frequência e não esfregar os olhos, para evitar uma lesão em um epitélio cor­
neano já fragilizado pela anestesia e tonometria. Existe ainda, apesar de pequeno, o risco de
reação alérgica ao medicamento usado. Para prevenir a transferência de agentes infecciosos,
os tonômetros devem ser limpos após cada uso.
Recentemente, a importância da espessura central corneana (ECC) e seus efeitos sobre a
precisão da medida da PIO tornou-se mais compreendida. O tonômetro de Goldmann é mais
preciso para a ECC de 520 pm, enquanto estudos populacionais mostram uma variação da
ECC entre 537 e 554 pm. O Estudo de Tratamento da Hipertensão Ocular (Ocular Hypertension
Treatment Study - OHTS) demonstrou que córneas mais finas eram um forte fator preditivo
para o desenvolvimento do glaucoma nos hipertensos oculares. Neste estudo, indivíduos com
uma espessura da córnea inferior a 555 pm tinham um risco três vezes maior de desenvolver
glaucoma em comparação com os participantes que tinham uma espessura corneana superior
a 588 pm.
De maneira geral, através de estudos publicados, pode estimar-se que para uma diferença
de 10 pm na ECC, a partir da média da população (cerca de 542 pm), existe uma diferença de
0,5 mmHg entre a pressão atual e a pressão medida com um tonômetro de Goldmann. No en­
tanto, é importante lembrar que a relação entre a medida da PIO e a ECC não é linear, e que,
na melhor das hipóteses, os fatores de correção são apenas estimativas. Além disso, deve-se
levar em consideração as variações das propriedades biomecânicas da córnea. Os tonômetros
de Goldmann, de Perkins, o pneumotonômetro, o tonômetro de não contato e o Tonopen são
todos afetados pela ECC. Atualmente, não existe nenhum fator de correção validado e, portan­
to, a aplicação clínica de qualquer um dos métodos de correção deve ser evitada.

Tonômetro de Perkins
É um tonômetro de aplanação portátil, com as mesmas características que o de Goldmann. É
útil em crianças, em pacientes incapazes de cooperar com o exame quando sentados na frente
da lâmpada de fenda, ou em pacientes acamados ou anestesiados.
Em relação ao controle de infecção, o cone de plástico de aplanação dos tonômetros
Goldmann e Perkins deve ser limpo imediatamente após seu uso. Ele deve ficar embebido em
uma solução 1:10 de hipoclorito de sódio, ou peróxido de hidrogênio a 3%, ou em álcool iso-
128 Semiologia Básica em Oftalmologia

propílico a 70%, durante 5 min, ou ser completamente limpo com uma esponja de álcool. Caso
uma solução seja usada, o cone deve ser lavado e limpo antes de ser reutilizado. Se álcool for
utilizado, deve-se secar ou deixar evaporar antes de reutilizá-lo para evitar danos ao epitélio.

Tonômetros transpalpebrais
Recentemente, foram desenvolvidos instrumentos que medem a PIO através das pálpebras,
como o Proview e o TGDc-01. Embora estes instrumentos, geralmente, não sejam precisos
para uso clínico, eles podem ter algum valor na avaliação da PIO, quando a tonometria normal
não é possível, como acontece nos casos de próteses corneanas e córneas totalmente opacas.

Tonômetro de não contato (TNC)


A tonometria de não contato (ou tonometria de sopro) é diferente da pneumotonometria e foi
desenvolvida por Bernard Grolman da Reichert, Inc (antiga American Optical). Ela utiliza um
rápido sopro de ar para aplanar a córnea. A aplanação da córnea é detectada através de um
sistema eletro-óptico. A pressão intraocular é estimada detectando a força do sopro de ar no
instante da aplanação.
O primeiro estudo clínico sobre o TNC foi descrito em 1973 por Forbes e ressaltava suas
vantagens na aplicabilidade para programas de rastreamento, pelo fato de não precisar do uso
do colírio anestésico e também pelo menor risco de contaminação.
O TNC sofre influência da espessura e curvatura da córnea. Quando comparado ao TAG,
suas medidas são consistentemente maiores e apresentam grandes variações. Recomenda-se
que medidas acima de 20 mmHg sejam confirmadas pelo TAG.

Tonômetro pneumático ou pneumotonômetro


r

E um tonômetro de aplanação e de contato, que apresenta um sensor na sua ponta que con­
verte o sinal pneumático em um sinal elétrico. O princípio do cálculo para conversão da PIO
é complexo. Essencialmente, a córnea é aplanada por uma força proporcional à PIO inicial. A
resistência ao fluxo de ar através do centro do tonômetro é então medida. Por ele aplanar ape­
nas uma pequena área da córnea, ele é especialmente útil na presença de cicatrizes e edema
da córnea. Ele também tem sido considerado um dos melhores métodos de avaliação da PIO
em crianças. Uma nova versão deste aparelho permite a medição da PIO, a pulsação, a ampli­
tude do pulso e o fluxo sanguíneo ocular pulsátil.

Tonômetro de indentação eletrônico (Tonopen)


r

E um tonômetro digital, portátil, que tem o formato de uma caneta e que aplana uma pequena
área da córnea. Um protetor descartável é usado na sua ponta para aferir a medida, o que dimi­
nui o risco de contaminação para o paciente. É particularmente útil na presença de cicatrizes
e edema de córnea. O Tonopen além de fornecer valores maiores da PIO que o de Goldmann,
é influenciado pela espessura corneana. Após a instilação do colírio anestésico, coloca-se deli­
cadamente a ponta arredondada do Tonopen diretamente sobre a córnea. Quatro leituras são
Tonometria 129

tomadas em cada olho. Após as quatro leituras, a média da PIO é mostrada em um pequeno
painel eletrônico.

Tonômetro de contorno dinâmico (Pascal®)


O tonômetro de contorno dinâmico (TCD), também conhecido como PASCAL®, é um dispositi­
vo que opera acoplado à lâmpada de fenda de forma semelhante ao tonômetro de aplanação
r

de Goldmann, porém menos suscetível às variações biomecânicas da córnea. E um tonômetro


preciso, mesmo quando a córnea é muito fina, apresenta edema ou possui uma curvatura ir­
regular.
Ele utiliza o princípio de ajuste do contorno em vez da aplanação e tende a eliminar fa­
tores de erro do tipo espessura corneana, rigidez e propriedades elásticas. O PASCAL tem
sua ponta oca, com formato semelhante ao da córnea com um microssensor de pressão no
centro. Ao entrar em contato com o filme lacrimal, na área central da córnea, o sensor inicia
automaticamente a obtenção dos dados. Esta peculiaridade do aparelho evita a deformação da
córnea durante a medição, diminuindo, dessa forma, as influências da curvatura, da espessura
da córnea e das suas variações biomecânicas na medição da PIO. Porém, ele tem a sua eficácia
comprometida quando a curvatura corneana é significantemente diferente das normais, como
acontece no pós-operatório de transplante, nas córneas planas e no buftalmo.
O aparelho registra 100 medidas por segundo e também fornece dados referentes à hemo-
dinâmica ocular, calculando a média de flutuações da amplitude do pulso ocular (APO), corre­
lacionado com o pulso arterial ou ciclo cardíaco. O ciclo completo para a medição requer 8 s.

ORA - O C U L A R R E S P O N S E A N A L Y Z E R

O ORA é um tonômetro de não contato (sopro de ar) que não requer anestesia tópica e é co­
mercializado pela Reichert Ophthalmic Instruments. Ele monitora dinamicamente a resposta de
aplanamento da córnea pelo jato de ar, de modo a determinar as propriedades biomecânicas
da córnea, juntamente com as medidas da pressão intraocular. Além da medida da PIO calibra­
da de acordo com o padrão ouro, (IOPg - Goldmann correlated Intraocular pressure), existe um
cálculo para determinar uma pressão compensada da córnea de acordo com as propriedades
biomecânicas encontradas (IOPcc - corneai compensated Intraocular pressure). Além das medidas
pressóricas, IOPg e IOPcc, o ORA determina a histerese corneana (CH - Corneai Hysteresis) que é
um parâmetro relacionado com a viscoelasticidade da córnea e o fator de resistência corneana
(CRF - Corneai Resistance Factor). O conhecimento da PIO e da histerese corneana possibilita o
cálculo da pressão compensando-se as influências das características biomecânicas da córnea.

Tonômetro de rebote (iCare)


A tonometria de rebote utiliza um método dinâmico eletromecânico para medir a PIO. O dis­
positivo consiste em duas bobinas, uma propulsora e a outra de detecção, colocadas em torno
de um eixo central que contém uma sonda magnetizada. A aplicação de uma corrente eléctrica
transitória para a bobina propulsora empurra a sonda em direção à córnea. Este movimento da
130 Semiologia Básica em Oftalmologia

sonda magnetizada induz uma tensão no interior do sistema, que é monitorada pelo sensor,
permitindo que a velocidade e direção do movimento da sonda sejam determinadas. A sonda
desacelera ao encontrar a superfície da córnea, retorna ao seu ponto de partida e volta a repe­
tir o movimento. A medição da PIO é dada pela velocidade da desaceleração da sonda, isto é,
quanto maior a velocidade de desaceleração maior é a PIO.
O tonômetro é portátil, simples e de fácil uso. Ele é ativado ao apertar um botão e não
é necessário anestesia. Ele realiza seis leituras da PIO, descarta automaticamente a maior e a
menor, realiza a média, e apresenta no visor digital a leitura final da pressão intraocular.

Monitoração contínua da PIO durante 24 h por lente de contato


(SENSIMEDTriggerfish Sensor®)
O SENSIMED Triggerfish Sensor® apresenta uma revolucionária tecnologia de monitoração con­
tínua da PIO, durante 24 h através de um sensor. O sistema consiste em uma lente de contato ge­
latinosa hidrofílica, descartável, contendo medidores de tensão passivos e ativos, incorporados
no silicone da lente, que monitoraram as flutuações no diâmetro da junção corneoescleral. Essas
flutuações estão diretamente relacionadas com as variações da PIO. Por telemetria, os sinais são
enviados para uma antena adesiva, usada em volta do olho, e a partir da antena, através de um
cabo fino e flexível, para um gravador portátil fixado na cintura do paciente. De preferência, o
paciente deve manter as atividades normais, incluindo os períodos de sono. Ao retornar ao mé­
dico, os dados são transferidos do gravador para o computador para análise imediata, utilizando
a tecnologia Bluetooth. Este sistema de monitoramento da PIO está sendo estudado em alguns
centros da Europa e seu uso ainda não foi liberado nos EUA.
Apesar dos novos avanços da tonometria, a medida com o tonômetro de aplanação de
Goldmann continua sendo o padrão ouro na avaliação do glaucoma.

BIBLIOGRAFIA
Ambrosio Jr. R, Alonso RZ, Siqueira R, Ventura M. Avaliação da córnea - Biomecânica da córnea: influência de fatorescorne-
anosnaavaliação da pressão intraocular e no glaucoma. In: Dias JFR Almeida HG, PrataJr JÁ. Glaucoma. Rio de Janeiro:
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Asrani S, Zeimer R, Wilensky J etal. Large diurnal fluctuations in intraocular pressure are an independent risk factor in pa­
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Weinreb RN, Brandt JD, Garway-Heath D, Medeiros F. Consensus Series 4. Intraocular Pressure. Amsterdan, The Nether­
lands: Kugler Publications, 2007.
oo

Périmétria Computadorizada

ROGÉRIO JOÃO DE ALMEIDA TORRES

CONCEITOS BÁSICOS
O campo visual é, em termos simples, tudo o que enxergamos com os olhos abertos. Suas
dimensões são 60° superior e nasal, 70° inferior e 90° temporal. O exame de campo visual,
depois da medida da acuidade visual, é o exame mais utilizado para avaliação da função visual.
A perimetria é o método-padrão de medir a disfunção visual. Ela mede a sensibilidade em
perceber a luz, ou a capacidade da pessoa em distinguir um estímulo em um plano de fundo
uniforme. Traquair (1875-1954) comparou o campo visual normal com uma ilha de visão cerca­
da por um mar de cegueira. A altura da ilha em determinado ponto é proporcional à sensibili­
dade retiniana. O cume da ilha corresponde à fóvea e tem sua altura gradativamente diminuída
à medida que se aproxima da periferia, isto é, em direção ao nível do mar. O declive do lado
nasal é mais acentuado do que o lado temporal. Ao lado do cume da ilha (a 15° temporal),
encontra-se uma cratera: a mancha cega (Fig. 1).
A perimetria era realizada inicialmente de forma manual (cinética e estática) e exigia co­
nhecimento e habilidade do perimetrista para a validação do exame. Nas últimas duas déca-

Fig. 1 A ilha de visão.

131
132 Semiologia Básica em Oftalmologia

das, a périmétria automatizada estática tornou-se padrão para avaliar a função visual no glau­
coma. Com este método, as medições dos limiares de sensibilidade passaram a ser realizadas
através de vários pontos, utilizando estímulos brancos sobre um fundo branco. Dessa forma,
o exame de campo visual pôde ser uniformizado, sem depender da subjetividade do perime-
trista. A périmétria computadorizada pode ser comparada a um mapa topográfico da ilha de
visão, em que cada valor numérico da sensibilidade de cada ponto pesquisado no campo visual
corresponde à altura da ilha de visão para aquele ponto específico.
O limiar de sensibilidade (Threshold) corresponde à menor intensidade luminosa medida
em decibéis que o indivíduo percebe 50% das vezes. O campímetro pesquisa o limiar de sen­
sibilidade partindo de um estímulo luminoso intenso e apresentando estímulos 2 a 3 dB mais
fracos (dependendo da estratégia) até que o paciente não consiga mais percebê-lo. Em segui­
da, o aparelho começa a apresentar estímulos 1 dB mais intensos até que o paciente consiga
percebê-los. O limiar de sensibilidade diminui cerca de 1 dB a cada 10 anos de idade e 0,3 dB
para cada I o de excentricidade.
No glaucoma, a périmétria tem dois objetivos principais:
1. a identificação e quantificação dos campos anormais;
2. a avaliação longitudinal para detectar a progressão glaucomatosa.

A quantificação da sensibilidade do campo visual permite a detecção de perda inicial, em


comparação com os dados normativos. Os testes de campo visual quando realizados regular­
mente, na presença da doença, fornecem informações valiosas no sentido de diferenciar entre
a estabilidade e a perda progressiva.

PROGRAMAS E ESTRATÉGIAS
O campímetro Humphrey (modelo 750) é o equipamento mais utilizado na prática clínica. O
resultado é impresso pelo computador, expresso em um gráfico em tons de cinza, associado
a índices de confiabilidade, probabilidade de existência de defeito, progressão, etc., avaliados
por um pacote estatístico. Fogem ao controle do computador os efeitos de aprendizado e de
fadiga ao exame. Para melhorar os resultados, foram desenvolvidas estratégias de teste mais
rápidas que a tradicional Full-threshold como as supralimiares, o Fast-Threshold, o FASTPAC e as
novas estratégias SITA (Swedish Interactive Threshold Algorithm).
Os programas utilizados no diagnóstico e acompanhamento de pacientes glaucomatosos
são o central 24-2 e 30-2 threshold, o SITA 24-2 e 30-2, o SWAP 24-2 e 30-2 e o SITA SWAP 24-2.
Testes supraliminares podem ser úteis para pesquisar a perda de campo visual em diferen­
tes patologias. Porém, não são recomendados na suspeita de glaucoma porque eles não forne­
cem uma boa referência para comparação futura. O programa central 10-2 deve ser usado nos
pacientes com perda avançada de campo visual, cuja visão central está ameaçada. Isso permite
ao oftalmologista acompanhar as alterações com muito mais pontos no interior da ilha central
e dessa forma melhorar a detecção da progressão.
No impresso do exame de campo visual, vários dados são listados e serão explicados a
seguir. Todos estes dados devem ser levados em consideração na interpretação do exame.
Périmétria Computadorizada 133

INTERPRETAÇÃO DO CAMPO VISUAL


A interpretação do exame começa através da análise de todos os dados fornecidos pelo com­
putador na parte superior da folha impressa, que incluem o nome do paciente, data de nasci­
mento, data e hora do exame, tipo de teste realizado (estratégia), estímulo utilizado, lumino­
sidade do fundo, acuidade visual, prescrição utilizada e diâmetro pupilar.
Na sequência será avaliada a confiabilidade do exame através dos índices impressos no
canto superior esquerdo.

índices de confiabilidade
Com o objetivo de verificar a atenção do paciente durante a execução do exame, o campíme-
tro prepara armadilhas:
■ Perda da fixação - 5% de todos os estímulos são projetados sobre a mancha cega (represen­
tada por um A na tela do computador); se o paciente apertar a campainha significa que ele
não estava olhando para a mira e o campímetro registra uma perda de fixação e imprime
um “xx” ao lado do índice e mostra a mensagem Low Patient Reliability. Um índice de até 20%
é considerado tolerável;
■ Falso-negativo - a apresentação de estímulo 10 dB maior que o limiar de sensibilidade pes­
quisado para determinado ponto e não percebido pelo paciente corresponde a um falso-ne-
gativo; esta situação ocorre no paciente sonolento ou desatento e o computador imprime
“xx” e mostra a mensagem Low Patient Reliability. Estes pacientes podem apresentar exames
do tipo “trevo de 4 folhas“, em que as regiões periféricas do campo visual mostram acentu­
ada diminuição de sensibilidade, enquanto as regiões mais centrais permanecem normais.
Um índice de até 33% é considerado tolerável.
■ Falso-positivo - durante o exame, o campímetro simula um estímulo (catch trials) fazendo
um ruído de movimentação do projetor sem, no entanto, apresentar o estímulo; se o pa­
ciente apertar a campainha registra-se um falso-positivo. Esta situação é observada em pa­
cientes ansiosos, que se sentem obrigados a perceber todos os estímulos para se sair bem
no exame (uhappy clicker”); observa-se no gráfico de escala em tons de cinza a presença de
escotomas brancos que correspondem a valores elevados dos limiares de sensibilidade e a
r

mensagem Abnormally Fligh Sensitivity é impressa no GHT. índice de até 33% é considerado
tolerável; quando o índice for mais alto, o computador imprime “xx” e a mensagem Low
Patient Reliability.

Gráficos numéricos e escala em tons de cinza


O gráfico numérico mostra o limiar de sensibilidade pesquisado para cada ponto. O mapa de
números está localizado na parte superior, à esquerda da impressão. Os valores em parênteses
mostram a segunda medida do limiar para determinar a flutuação, que é realizada em 10 locais
predeterminados.
Imagine-se observando a ilha de visão muito acima de sua superfície. A escala em tons de
cinza nos dá uma imagem dos 30° centrais, onde pontos claros representam áreas de maior
altura (maior sensibilidade e de maior valor numérico) e pontos escuros representam áreas de
1 3 4 | Semiologia Básica em Oftalmologia

menor altura (sensibilidade mais baixa e de menor valor numérico). Este gráfico está situado à
direita do gráfico numérico. A escala mostrada no fim do exame tem apenas 8 tons de cinza.
Regiões que diferem em mais de 4 dB são apresentadas em tons diferentes.

Gráficos de t o t a l e p a t t e r n d e v i a t i o n

O Total Deviation (TD), composto por dois gráficos localizados abaixo à esquerda, mostra a
diferença, em decibéis, entre a sensibilidade pesquisada em cada ponto e os valores médios
populacionais para a mesma idade.
O Pattern Deviation (PD) é composto por dois gráficos localizados à direita do gráfico TD.
Sua importância está em determinar o padrão de anormalidade localizada no campo visual. O
PD deriva do TD, retirando o efeito de depressão difusa e eliminando a perda homogênia do
defeito, tornando mais aparentes os defeitos localizados ou mais profundos. Ele é principal­
mente útil nos pacientes com depressão generalizada provocada pela catarata e pela miose.
Sob os respectivos gráficos encontra-se uma coluna com símbolos de probabilidade, que
indica a chance de esta diferença ocorrer na população normal. Exemplificando, um quadrado
escuro indica que o desvio do normal daquele ponto ocorre em menos de 0,5% dos indivíduos
normais (total deviation) ou que a chance daquele ponto com sensibilidade diminuída ser nor­
mal é de 0,5% (pattern deviation).

índices globais
Os índices Globais (IG) são parâmetros estatísticos complementares e estão localizados abai­
xo do gráfico com tons de cinza. Estas informações, em conjunto com a história clínica do
paciente e exames oftalmológicos, podem conduzir a um rápido diagnóstico. Ao lado dos IG
estão as interpretações estatísticas e seus significados. São quatro os IGs a serem analisados:
■ MD (Mean Deviation) - índice indicativo de sensibilidade média ou de altura média da ilha de
visão. O MD pode ser negativo, indicando sensibilidade geral abaixo da média, ou positivo,
indicando sensibilidade acima da média. Um valor baixo de MD pode ser encontrado tanto
na presença de catarata quanto de glaucoma.
■ PSD (Pattern Standard Deviation) - em termos estatísticos representa o desvio-padrão do
MD; índice indicativo de regularidade da superfície da ilha de visão. Na presença de defei­
tos localizados encontra-se aumentado. Um PSD próximo a zero quer dizer que a superfície
da ilha de visão é lisa sem irregularidades, ao passo que um PSD aumentado indica relevo
acidentado. Na presença de catarata, a ilha de visão estará deprimida, mas sem alterações
importantes na sua forma. No entanto, um paciente com escotoma glaucomatoso terá a
ilha de forma irregular, apresentando algumas regiões mais deprimidas do que outras.
■ SF (Short Temi Fliictuation) - corresponde à variação intrateste. Durante o exame, o limiar
de sensibilidade é pesquisado duas vezes em 10 pontos predeterminados. Espera-se uma
variação de 2 dB na sensibilidade para o mesmo ponto. Qualquer flutuação acima de 3 dB
pode ser indicativa de uma errada informação por parte do paciente ou defeito glaucoma­
toso iminente, principalmente se localizada ao redor de um defeito.
Périmétria Computadorizada 135

■ CPSD (Correctecl Pcittem Standard Deviation) - corresponde ao PSD corrigido pelo SF, isto é,
a variabilidade representada pelo SF durante o teste é removida do PSD e somente a irre­
gularidade causada pela atual perda do campo visual é apresentada, produzindo o CPSD.

Glaucoma H e m i f i e l d T e s t

O Glaucoma Hemifield Test (GHT) avalia 5 zonas (grupos de pontos) no hemicampo superior
e compara-as com suas áreas correspondentes no hemicampo inferior. Esta análise baseia-se
no comprometimento assimétrico entre os dois hemicampos observado no glaucoma. Um es-
r

core é atribuído a cada zona com base no mapa de probabilidades do PD. E feita então uma
comparação de cada zona superior com a zona inferior correspondente, e a diferença entre os
escores das duas zonas é comparada com a existente na população normal. Como resultado,
o GHT fornece uma entre cinco mensagens possíveis:
■ Within normal limits (dentro do normal).
■ Borderline (limítrofe): a diferença entre os escores de pelo menos um par de zonas excede à
encontrada em 97% dos indivíduos normais.
■ Outside normal limits (fora do normal): quando a diferença em pelo menos um par de zonas
excede àquela encontrada em 99% da população, ou quando os escores individuais em am­
bos os pares de qualquer zona excedem os encontrados em 99,5% da população normal.
■ Abnormally high sensitivity (sensibilidade anormalmente alta): ocorre quando a sensibilidade
global é maior do que a encontrada em 99,5% da população normal. Aparece frequentemen­
te em exames com elevado número de falso-positivos.
■ General reduction of sensitivity (redução generalizada da sensibilidade retiniana): esta redução
na sensibilidade ocorre em menos de 0,5% dos indivíduos normais.

Um GHT fora do normal é 95% sensível e 95% específico para glaucoma.


Considerando o descrito anteriormente, o médico deve ter cautela na interpretação dos
resultados perimétricos. Mesmo usando as melhores estratégias, o teste é ainda subjetivo.
Portanto, um novo defeito ou agravamento de um defeito já existente deverá ser confirmado,
e, em conjunto com outros dados pertinentes, a sua implicação clínica deve ser validada.
O primeiro aspecto do campo visual a ser avaliado é a sua qualidade e confiabilidade. Ou­
tras avaliações incluem o percentual de perdas de fixação, os falso-positivos e falso-negativos
e as flutuações. Deve-se ficar atento ás áreas danificadas do campo que mostram maior variabi­
lidade do que as áreas normais. Um dano glaucomatoso pode causar um aumento de respostas
falso-negativas não relacionadas com a confiabilidade das respostas do paciente. Lembrar que
os artefatos podem representar defeitos que na realidade não existem.

O CAMPO VISUAL NO GLAUCOMA


A perimetria computadorizada é utilizada no glaucoma para proporcionar análise do estado
funcional do nervo óptico. Apesar de ser um indicador pouco sensível do dano glaucomatoso
(pelo menos 30 a 50% das fibras nervosas devem estar lesionadas para o aparecimento dos
primeiros defeitos campimétricos), a perimetria se presta para o diagnóstico da doença e para
136 Semiologia Básica em Oftalmologia

a avaliação da sua gravidade. Além disso, a perimetria serve como indicador relativamente
sensível da progressão do glaucoma.

Considerações anatômicas
Para se entender as características do campo visual no glaucoma é fundamental entender a dis­
posição das fibras nervosas na retina. A camada de fibras nervosas da retina pode ser dividida
em 4 grandes feixes de fibras: as fibras temporais superiores, as temporais inferiores, o feixe
papilomacular e as fibras nasais. As fibras temporais superiores não avançam até a hemirreti-
na inferior e vice-versa; as fibras temporais superior e inferior acham-se separadas pela rafe
mediana (Fig.2). Por isso, o defeito glaucomatoso sempre respeita o meridiano horizontal no
aspecto nasal do campo visual.
A passagem das fibras nervosas no disco óptico também é peculiar. As fibras correspon­
dentes às regiões da retina mais distantes da papila adentram mais próximas às bordas no
canal escleral, isto é, na periferia do disco. Por outro lado, as fibras correspondentes às regiões
mais próximas da papila adentram na região mais central do disco. Isso explica o fato dos de­
feitos campimétricos no glaucoma quase sempre estarem localizados nos 30° centrais.
Em geral, no glaucoma, as primeiras fibras nervosas a serem afetadas são as que entram
nos polos superior e inferior do nervo óptico, dando origem aos escotomas paracentrais e
defeitos arqueados típicos. O feixe papilomacular e a ilha central de visão costumam ser os
últimos a serem afetados no curso da doença. A fixação central poderá ser acometida mais
precocemente nos olhos com miopia axial. As fibras nasais do nervo óptico costumam ser afe­
tadas mais tardiamente.

Fig. 2 Disposição das fibras nervosas da retina.

Diagnóstico do defeito campimétrico do glaucoma


Quando testado em condições fotópicas, o campo visual normal demonstra a maior sensi­
bilidade centralmente, reduzindo de forma constante em direção à periferia. Um conjunto
de dois ou mais pontos com diminuição > 5 dB, comparada com os pontos ao seu redor, é
considerado suspeito. Um único ponto, com uma diminuição > 10 dB é incomum, mas a sua
importância não é de maior valor quando comparado a um agrupamento de pontos. Pontos
correspondentes acima e abaixo da linha central horizontal não devem variar significativa-
mente. Normalmente o campo superior está deprimido em 1 a 2 dB quando comparado com
o campo inferior.
Périmétria Computadorizada 137

Para se identificar um exame como glaucomatoso podemos utilizar os critérios diagnós­


ticos de Anderson (Anderson DR. Automated Static Perimetry. St. Louis: Mosby; 1993:123). A
presença de pelo menos um destes critérios levanta a suspeita de glaucoma e um segundo
exame é necessário para confirmação.

Critérios mínimos para defeito glaucomatoso de Anderson:


■ 3 ou mais pontos adjacentes não periféricos no campo 30-2, em uma localização típica de
glaucoma, com dois deles com p < 5% e um com p< \% no Pattern Deviation em dois campos
consecutivos ou;
■ GHT outside normal limits em dois campos visuais ou;
■ CPSD com p < 5% em dois campos visuais consecutivos.

Outros critérios para definir o defeito glaucomatoso foram propostos por Caprioli (Caprio-
li J. Automated perimetry in glaucoma. Am J Ophthalmol 1991; 111:235-9). Estes critérios fo­
ram definidos para os 30° centrais. Na aplicação dos critérios rigoroso e moderado excluem-se
a mancha cega e as linhas superiores e inferiores do programa central 30-2 threshold. A dimi­
nuição da sensibilidade é relativa aos valores normais ou pontos contíguos. Pode-se utilizar o
mapa de probabilidade que compara os valores dos limiares medidos com os valores normais.
Nesse caso, substitui-se a diminuição de 5 dB por P < 0,05 e 10 dB por P < 0,01.

Critério rigoroso de Caprioli:


■ 4 ou mais pontos adjacentes com diminuição de pelo menos 5 dB;
■ 3 ou mais pontos adjacentes com diminuição de pelo menos 10 dB;
■ diferença de pelo menos 10 dB ao longo do meridiano horizontal em 3 pontos adjacentes.

Critério moderado de Caprioli:


■ 3 ou mais pontos adjacentes com diminuição de pelo menos 5 dB;
■ 2 ou mais pontos adjacentes com diminuição de pelo menos 10 dB;
■ diferença de pelo menos 10 dB ao longo do meridiano horizontal em 2 pontos adjacentes.

Critério liberal de Caprioli:


■ 2 ou mais pontos adjacentes com diminuição de pelo menos 5 dB;
■ 1 ou mais ponto(s) adjacente(s) com diminuição de pelo menos 10 dB;
■ diferença de pelo menos 5 dB ao longo do meridiano horizontal em 2 pontos adjacentes.

O Collaborative Normal-Tension Glaucoma Study Group definiu outros critérios para defeitos
campimétricos glaucomatosos:
■ pelo menos 3 pontos adjacentes com diminuição de 5 ou mais dB sendo um destes pontos
com diminuição de pelo menos 10 dB, reprodutíveis em segundo exame;
■ pelo menos 2 pontos adjacentes com diminuição de 10 ou mais dB;
■ pelo menos 3 pontos adjacentes com diminuição de 5 ou mais dB ao longo do meridiano
horizontal;
■ MD inferior a 2 dB.
138 Semiologia Básica em Oftalmologia

A reprodutibilidade em pelo menos dois campos visuais é um fator obrigatório nos crité­
rios apresentados, sendo a correlação clínica fundamental para o diagnóstico.

Características dos defeitos glaucomatosos


Os defeitos campimétricos no glaucoma caracteristicamente são, na maioria das vezes, locali­
zados: sempre respeitam o meridiano horizontal; geralmente iniciam-se no lado nasal (corres­
pondente às fibras temporais); e quase sempre são detectados nos 30° centrais. Os defeitos
típicos de glaucoma são:
■ degrau nasal e escotoma paracentral (os mais comuns);
■ diminuição generalizada da sensibilidade, embora inespecífica;
■ escotoma arqueado superior ou inferior;
■ defeito temporal em cunha (mais raro);
■ defeito altitudinal dividindo a fixação;
■ escotoma em anel, formado pela união de 2 escotomas arqueados;
■ campo tubular central e ilha temporal (defeitos tardios).

Avaliação da gravidade do glaucoma


A perimetria computadorizada serve para avaliar a gravidade do glaucoma no paciente. Pode-
se classificar o defeito do campo visual em precoce, moderado e grave (Hoddapp E, Parrish RI<
II, Anderson DR. Clinicai decisions in glaucoma. St. Louis, 1993, 52-61). Esta classificação tem
implicações no tratamento do glaucoma.

Critérios para defeito precoce (leve):


■ MD diminuído, mas não menor que - 6 dB.
■ Menos de 25% dos pontos com p < 5% e menos de \5% dos pontos com p < \% no Pattern
Deviation.
■ Nenhum ponto dentro dos 5o centrais com sensibilidade menor que 15 dB.

Critérios para defeito moderado:


■ MD diminuído entre - 6 dB e -12 dB.
■ Menos de 50% dos pontos com p < 5% e menos de 25% dos pontos com p < 1% no Pattern
Deviation.
■ Nenhum ponto dentro dos 5o centrais com sensibilidade menor ou igual a 0 dB.
■ Apenas um hemicampo contendo um ponto com sensibilidade menor que 15 dB dentro
dos 5o centrais.

Critérios para defeito avançado (grave):


■ MD menor que -12 dB.
■ Mais de 50% dos pontos com p < 5% e mais de 25% dos pontos com p < 1%.
■ Qualquer ponto dentro dos 5o centrais com sensibilidade menor ou igual a 0 dB.
■ Os dois hemicampos contendo pontos com sensibilidade menor que 15 dB dentro dos 5o
centrais.
Périmétria Computadorizada 139

Avaliação da progressão do glaucoma


A avaliação da progressão do glaucoma é muito controversa. Algumas fórmulas matemáticas
foram desenvolvidas para este fim; entretanto, todas são falhas, pois não se pode esperar
que uma variável biológica se comporte de maneira exata. Estudos multicêntricos adotaram
diferentes sistemas de critérios de progressão. 0 grande desafio ao se avaliar a progressão
do glaucoma é diferenciar a progressão de fato do long terni fluctuation (variação interteste). A
perimetria é um exame psicofísico que depende da colaboração do paciente; se por algum mo­
tivo, o paciente não estiver disposto durante a realização do exame, o resultado não refletirá
a sua real situação. Este é um dos fatores que levam a flutuação interteste.
Os defeitos campimétricos do glaucoma podem progredir de quatro formas, segundo os
critérios propostos por Anderson:
■ Surgimento de outro defeito
• diminuição de pelo menos 5 dB em três pontos adjacentes, não periféricos, em áreas
previamente normais no exame baseline ou;
• diminuição de 10dB em um ou mais pontos previamente normal em dois exames ante­
riores consecutivos.
■ Aumento na profundidade do defeito inicial (piora da sensibilidade)
• diminuição de pelo menos 10 dB em três pontos adjacentes, não periféricos, em área já
alterada no exame baseline.
■ Aumento na extensão do defeito inicial
• diminuição de pelo menos 10 dB em um ponto previamente normal dentro dos 15° cen­
trais ou de dois pontos quando fora dos 15° centrais, em área adjacente a defeito prévio.
■ Depressão generalizada.
• diminuição de pelos menos 10 dB em todos os pontos. Este achado é bastante inespe-
cífico, podendo decorrer também das opacidades dos meios transparentes, da miose e
dos erros de lentes corretivas.

A seguir, definiremos alguns programas de avaliação da progressão no glaucoma:

OverView
Este programa apresenta na sua impressão todos os campos em ordem cronológica, mostran­
do o gráfico em tons de cinza, o gráfico numérico e os gráficos de probabilidade Total Devia-
tion e Pattern Deviation. Ele mostra ainda os índices de confiabilidade, diâmetro da pupila, e os
valores do GHT, MD, PSD, SF e CPSD. No overview não são feitas análises estatísticas a respeito
da progressão e o julgamento é basicamente clínico, sendo importante a correlação com a
clínica do paciente.

Change analysis
É um programa de comparação de dados, específico para avaliar a progressão. Nele são dispo­
nibilizados os gráficos do Box P/ot, os gráficos dos índices globais MD, SF, PSD e CPSD, além
do Linear Regression Analysis (LRA). Este último analisa especificamente o MD quando existem
140 Semiologia Básica em Oftalmologia

mais de cinco exames realizados em um intervalo de tempo que permite a realização de cálcu­
lo estatístico e também realiza um cálculo de regressão linear deste índice, disponibilizando
em variações de decibéis por ano. Uma curva negativa do MD maior que 0,5 dB/ano (p < 0,05)
indica progressão. Este método é menos sensível e pouco específico.

G l a u c o m a c h a n g e p r o b a b i l i t y (GCP)
Este programa, também disponível no pacote estatístico do HFA, faz a análise estatística de
cada ponto do campo visual e é baseado em análise de eventos. A variação da sensibilidade de
cada ponto é comparada com a variação da sensibilidade de um grupo de pacientes glauco-
matosos estáveis. Esta comparação é baseada nos mapas do Total Deviation. Dessa forma, alte­
rações de opacidade dos meios transparentes podem influenciar as análises da progressão do
glaucoma. A piora da sensibilidade (p < 0,05) é indicada por um triângulo preto e a presença
de dois pontos contíguos dentro ou adjacentes ao defeito prévio indica progressão.
Uma nova versão modificada do GCP, baseada nos mapas do Pattern Deviation, com o nome
comercial de Glaucoma Progressor Analysis (GPA) foi apresentada com algumas modificações que
permitem a análise de exames realizados com a estratégia SITA, que será discutida mais adiante.

Progressor
O programa Progressor foi desenvolvido pelo Institute of Ophthalmology e pelo Moorfielcls Eye
Hospital, London. Este método faz uma análise de regressão linear para determinar a curva de
mudança da sensibilidade para cada ponto do campo visual representado de forma gráfica. A
piora significativa em pelo menos dois pontos indica progressão. Este programa parece ser
mais confiável que o glaucoma change probability e o linear regression analysis.

P o i n t w i s e c o m p a r i s o n (análise ponto a ponto)


Este método de análise foi elaborado pelo Normal-tension Glaucoma Study Group (Schulzer M.
Ophthalmology 1994; 101:1589-1595). A progressão é suspeita quando pelo menos dois pon­
tos contíguos dentro ou adjacentes ao defeito preexistente diminuíram a sensibilidade em 10
dB ou três vezes o SF médio (o que for maior). A progressão deve ser confirmada com pelo
menos mais um exame. Este método parece ser o mais sensível e específico.
Todos os métodos campimétricos de avaliação da progressão do glaucoma são limitados
em função da própria natureza do exame. Toda suspeita de progressão deve ser confirmada
por um segundo exame campimétrico e deve ser coerente com os achados clínicos, principal­
mente com o aspecto da escavação do disco óptico. Devemos utilizar todos os meios prope­
dêuticos disponíveis para evitar enganos.

SITA
SITA é a sigla em inglês para Swedish Interactive Threshold Algorithm. Trata-se de uma estraté­
gia de exame perimétrico disponível no perímetro Humphrey Field Analyzer (HFA) série 700,
que diminui o tempo de execução do exame de 30 a 50% (SITA Standard) e 70% (SITA Fast). O
Périmétria Computadorizada 141

número de estímulos apresentados é reduzido em quase 30%. A brevidade do teste é obtida


utilizando o conhecimento dos limiares de sensibilidade para cada ponto na população geral,
do monitoramento das respostas do paciente, ajustando o ritmo do exame e comparando as
regiões vizinhas para ajustar a estimativa do limiar. A pesquisa dos índices de confiabilidade
é diferente da realizada na estratégia Full Threshold, buscando diminuir o tempo do exame. A
sensibilidade e a especificidade do SITA no diagnóstico de glaucoma são similares às da es­
tratégia Full Threshold. O SITA Fcist não deve ser usado na avaliação de rotina em suspeitos de
glaucoma ou pacientes com glaucoma e deve ser reservado apenas para pacientes que não
conseguem realizar o SITA Standard devido a limitações mentais ou físicas.
Independente da estratégia a ser utilizada, SITA ou Full Threshold, a exigência fundamental
para um acompanhamento em longo prazo, é que tenhamos campos visuais confiáveis como
baseline. Muitas vezes o paciente experimenta um efeito aprendizagem e o segundo campo
visual pode mostrar melhora substancial em relação ao primeiro. Pelo menos dois campos vi­
suais devem ser obtidos o mais cedo possível no decurso da doença de um paciente. Se eles
forem bem diferentes, um terceiro teste deve ser realizado. Subsequentes campos visuais de­
vem ser comparados com estes campos de base. Se um campo de controle diferir do baseline,
o teste deverá ser repetido para confirmação.
A estratégia SITA não pesquisa o SF (flutuação) e o CPSD. Assim, para se aplicar os critérios
diagnósticos de Anderson, substituímos o CPSD pelo PSD. Os critérios de Caprioli também
podem ser utilizados para esta estratégia.
Não existem regras rígidas e rápidas para definir o que determina uma progressão. Basi­
camente, são duas as abordagens para analisar a progressão, uma baseada em eventos (event-based
analysis) e outra baseada em tendências (trend-based analysis). A primeira compara o exame atual
com um anterior (geralmente o baseline). Se o defeito encontrado for significativamente pior,
a progressão é sinalizada. Isto é chamado de análise baseada em evento, já que a estratégia
procura por defeitos no exame atual que não estavam presentes no exame anterior. A segunda
abordagem, em vez de apenas comparar alguns exames, procura por mudanças que possam
ocorrer de forma progressiva, analisando todos os testes disponíveis em um determinado
período de tempo. Além de avaliar se a progressão ocorreu, a análise baseada em tendência
permite estimar o índice da progressão. Sabe-se que alguns pacientes podem apresentar uma
progressão mais rápida que outros, e estimar o índice de progressão de cada indivíduo é im­
portante para avaliar a agressividade necessária do tratamento e a resposta à terapia.
Na estratégia SITA, a determinação da progressão pode ser feita através da Análise Ponto
a Ponto segundo os critérios do CNTGS (pouco utilizada); Guided Progression Analysis (GPA) e o
Guided Progression Analysis com Visual Field Index (VFI) ou GPA II.

Guided progression analysis (GPA)


O GPA é um software que está disponível nos perímetros Humphrey modelos HFA II e HFA II-i e
pode ser utilizado com as estratégias Full Threshold (24-2 e 30-2), SITA Standard e SITA Fast. Ele
estima a progressão usando a análise de regressão linear do MD e da sensibilidade retiniana de
cada ponto do campo visual. Ele estabelece automaticamente como baseline os dois primeiros
exames realizados, independentemente da estratégia usada (Full Threshold ou SITA). A partir
daí os exames subsequentes são comparados com o baseline. Ele utiliza a análise baseada em
142 Semiologia Básica em Oftalmologia

eventos e a comparação é feita com base nos mapas do Pattern Deviation. Portanto, ele ajusta
os defeitos difusos, diminuindo as influências de opacidades dos meios transparentes.
Na análise do gráfico Progression Analysis podemos encontrar símbolos na forma de triân­
gulos, que significam pontos que mudaram além da variabilidade esperada. O triângulo vazio
(A) significa que a diferença de valor encontrado entre o exame atual e o baseline apresenta
uma probabilidade menor que 5%de ocorrer em uma população de glaucomatosos estáveis da
mesma faixa etária. O triângulo preenchido pela metade significa que essa baixa probabilidade
de ocorrência se repetiu em dois exames consecutivos no mesmo ponto. E o triângulo total­
mente preenchido (▲) significa que essa baixa probabilidade de ocorrência se repetiu em três
exames consecutivos no mesmo ponto.
O GPA Alert é um aviso que o programa dá ao examinador referente à progressão. Quando
aparecem três ou mais triângulos preenchidos até a metade em dois exames consecutivos ob-
serva-se uma mensagem Possible Progression (possível progressão) e quando aparecem três ou
mais triângulos totalmente preenchidos em dois exames consecutivos observa-se uma men­
sagem Likely Progression (provável progressão). O GPA ainda avalia a velocidade de progressão
através da curva do MD.

GPA com visual field index (VFI) ou GPA II


O VFI é o mais recente software, incorporado ao GPA, que está disponível no perímetro Hum-
phrey modelo HFA II-i, utilizado com a estratégia SITA Standard (24-2 e 30-2). Ele foi desenvol­
vido com o propósito de melhor avaliar o índice da progressão com a perimetria acromática
padrão. O objetivo desta análise não é detectar a progressão que pode ser feita com o próprio
GPA, mas é fornecer informação sobre o índice de deterioração (taxa de progressão) do cam­
po visual e também dar uma estimativa ao paciente do risco futuro de perda visual. O VFI é
calculado em porcentagem do campo visual normal, após um ajuste para a idade. Portanto,
um VFI de 100% representa um campo visual completamente normal, enquanto um VFI de 0%
representa um campo visual perimetricamente cego. No impresso do GPA II, o VFI aparece com
valor percentual para cada exame, mostrando uma análise de tendência e relacionando com a
idade. O GPA II não inclui em sua análise o primeiro campo visual caso um efeito aprendizado
seja detectado automaticamente, nem os pacientes que apresentam MD abaixo de -20dB. O
VFIGPAII não tem seus valores alterados na se altera na presença da catarata.
Enquanto o MD é baseado apenas no mapa do total deviation, sofrendo assim a influência
da catarata, o VFI é baseado tanto no mapa do pattern deviation (PD) quanto no mapa do total
deviation (TD). O primeiro (PD) auxilia na identificação de possíveis pontos de progressão e o
segundo (TD) é usado para o cálculo real de mudança do valor do Total Deviation, complemen­
tando um ao outro. Além disso, o algoritmo VFI utiliza diferentes pesos para diferentes locais,
dando mais peso aos pontos centrais, que tem mais impacto na qualidade de visão do pacien­
te. O escore final do VFI é a mediana de todos os escores ponderados. O VFI também fornece
uma estimativa da perda adicional do campo visual que ocorrerá nos próximos 5 anos, desde
que o mesmo índice de progressão seja mantido neste período. Esta informação é importante
para o clínico, já que ele pode estimar os anos que um dado paciente levará para avançar ao
estágio do campo visual perimetricamente cego se nenhuma ação for tomada para melhorar
o controle da doença.
Périmétria Computadorizada 143

O menor tempo despendido para realização da périmétria computadorizada com SITA


tem feito desta estratégia a preferida entre os clínicos e vem substituindo a estratégia Full
Threshold na prática clínica.
Além da périmétria computadorizada padrão, branco no branco, outras tecnologias de
avaliação do campo visual foram desenvolvidas. Atualmente as duas técnicas mais utilizadas
são a périmétria azul-amarelo (SWAP) e a périmétria de frequência dupla (FDT), que serão dis­
cutidas a seguir.

PERIMETRIA AZUL-AMARELO (SWAP)


O SWAP (short wavelength automated perimetry) ou perimetria azul-amarelo é um exame
que utiliza o estímulo azul (tamanho V de Goldmann), projetado sobre o fundo amarelo. A luz
amarela causa fadiga dos fotorreceptores dos cones verdes e vermelhos e produz pouco efeito
sobre os fotorreceptores dos cones azuis (ondas curtas). Isso permite isolar e medir a função
das células ganglionares azuis-amarelas (células biestratificadas B-Y).
A vantagem do exame é permitir o diagnóstico mais precoce do glaucoma. Acredita-se que
as células ganglionares B-Y são seletivamente lesadas na fase inicial do glaucoma, e por testar
a sua função pode-se diagnosticar a doença mais cedo. Outra teoria sugere que por se testar
um segmento específico do sistema visual, há menos redundância e a perda visual pode ser
detectada mais precocemente. Um número considerável de hipertensos oculares que apresen­
ta perimetria acromática normal revela alguma alteração no SWAP. A perimetria azul-amarelo
é capaz de detectar defeitos campimétricos até cinco anos antes da perimetria acromática
convencional (PAC).
No perímetro Humphrey, podem ser utilizadas as estratégias Full Threshold e SITA. O im­
presso do exame é similar ao da PAC. Observa-se na escala de tons cinza uma diminuição mais
acentuada dos defeitos em comparação à perimetria acromática. Como existe uma depressão
difusa dos limiares de sensibilidade, a análise dos gráficos do Pattern Deviation, que avaliam a
presença de defeitos localizados, é de extrema importância. Os critérios de defeito glauco-
matoso podem ser os mesmos utilizados na perimetria convencional, podendo ser seguidos
pelos critérios sugeridos por Anderson, já descritos anteriormente. Outro critério sugerido é
o de V. Polo et al. (Ophthalmol 2001: 108: 285-9), porém ele é baseado no Total Deviation.

Critérios de defeito de campo com SWAP:


■ grupo de 4 ou mais pontos no Total Deviation com sensibilidade diminuída à significância
de P < 5% ou
■ grupo de 3 ou mais pontos no Total Deviation com sensibilidade diminuída à significância
de P < \%.

As desvantagens do Full Threshold-S\NAP (FS) incluem tempo de exame mais prolongado,


entre 15 a 20 min; efeito aprendizado mais acentuado e a influência da opacidade do cristalino
na transmissão da luz azul, interferindo na interpretação dos resultados. A estratégia SITA-
SWAP (SS) foi introduzida no aparelho Flumphrey (HFA II-i), reduzindo o tempo de exame para
um terço em relação ao FS, sem interferir na sua sensibilidade. Portanto, o exame passou a ser
144 I Semiologia Básica em Oftalmologia

realizado em 3 a 6 min, de forma fácil e bem tolerada, melhorando a variabilidade intrateste


e o efeito aprendizado.
A indicação básica da périmétria azul-amarelo (SWAP) é para pacientes suspeitos de glau­
coma (hipertensão ocular, alteração estrutural da camada de fibra e/ou do nervo óptico, asso­
ciados ou não à história familiar) com périmétria acromática normal. Porém, outras indicações
têm sido sugeridas, apesar de controversas:
1. acompanhamento de pacientes com hipertensão ocular ou alterações no nervo óptico su­
gestivas de glaucoma, mas que ainda não apresentam lesão na périmétria acromática e na
périmétria azul-amarelo;
2. acompanhamento de pacientes com defeitos glaucomatosos identificados na périmétria
azul-amarelo, mas ainda não revelados na périmétria acromática;
3. acompanhamento de pacientes com defeitos glaucomatosos já identificados na périmétria
acromática, na tentativa de se identificar mais precocemente a progressão com a périmé­
tria azul-amarelo.

Vários estudos sugerem que a taxa de aparecimento de defeitos campimétricos no glau­


coma inicial deve ser maior no campo visual azul-amarelo do que na périmétria acromática
convencional (branco no branco). O SWAP é adequado para a identificação de indivíduos pro­
pensos a desenvolver perda de campo visual na périmétria acromática. A perda repetitiva de
campo visual no SWAP deve ser cuidadosamente monitorada. Os achados da périmétria
azul-amarelo sempre devem ser correlacionados com achados clínicos.

PERIMETRIA DE FREQUÊNCIA DUPLA


Frequency Doubling Technology, FDT, é a tecnologia usada na périmétria de frequência dupla
(FDP). Ela é baseada na teoria de que células ganglionares do tipo magnocelular são danifi­
cadas mais precocemente no curso da neuropatia óptica glaucomatosa. Portanto, a avaliação
seletiva dos subgrupos destas células poderia detectar precocemente o déficit funcional no
glaucoma.
O equipamento de périmétria FDT (Welch Allyn, Zeiss-Humphrey) utiliza o estímulo de
frequência dupla, baseado na percepção de uma sequência de barras verticais apresentadas
sob uma frequência espacial baixa (0,25 ciclo/grau) e sob uma alta frequência temporal (25
Fiz). A apresentação destes estímulos produz uma ilusão óptica de duplicação espacial do nú­
mero de barras. O estímulo é apresentado em regiões aleatórias do campo visual e dura 720
milissegundos em intervalos não rítmicos de até 500 milissegundos. O contraste do estímulo
é ajustado de acordo com a técnica de pesquisa binária modificada (Modified Binary Search ou
MOBS). O paciente é instruído para apertar a campainha sempre que o estímulo é percebido.
O exame é rápido e dura entre 4 e 5 min para um teste de limiar de sensibilidade (Full
Threshold, N-20 e N-30) e de 1,5 min para um teste supralimiar (screening, C-20). As miras apre­
sentadas são de baixa luminosidade, em número de 17 para o programa N-20 e de 19 para o
Périmétria Computadorizada 145

programa N-30. Exceto pela mira central que é arredondada e tem 5o, as outras são quadradas
e tem 10°. O olho não examinado é fechado automaticamente e o olho examinado não precisa
de correção óptica até 6D. O diâmetro pupilar acima de 2 mm não tem influência no resulta­
do. Assim como na perimetria acromática, o FDT apresenta o efeito aprendizado, e pacientes
inexperientes na realização da perimetria podem apresentar alterações que não correspon­
dem à realidade. Por este motivo as alterações encontradas devem ser confirmadas por um
novo exame.
O impresso dos resultados no teste screening mostra o tempo de duração do exame e os
índices de confiabilidade. O impresso dos resultados do Full Threshold mostra os gráficos com
valores de sensibilidade de cada região, o Total e o Pattern Deviation, os índices globais MD e
PSD, e o limiar foveal.
Vários critérios têm sido sugeridos para definir um defeito glaucomatoso. Usando um pro­
tocolo de rastreamento do FDT, Quigley encontrou um melhor desempenho no diagnóstico do
glaucoma, com sensibilidade de 91% e especificidade de 94%, usando como critério a presença
de dois pontos anormais independente da gravidade do defeito.
Além do seu uso para triagem populacional, o FDT tem se mostrado útil na detecção do
glaucoma. Medeiros et a i, em estudo longitudinal e observacional de ± 4 anos, em 105 pa­
cientes com suspeita de glaucoma, com perimetria acromática normal, mostraram, entre ou­
tros resultados, que 59% das anormalidades do FDT precederam as alterações na perimetria
acromática em quatro anos. O estudo sugere que o FDT tem um valor preditivo negativo alto.
A principal indicação do FDT é a identificação de defeitos no campo visual ainda não de­
tectados pela perimetria acromática. O seu uso, combinado com a perimetria azul-amarelo e
os achados clínicos, deve melhorar o diagnóstico precoce do glaucoma.
A nova versão da perimetria de frequência dupla, o MATRIX, aumentou o número de estí­
mulos diminuindo suas áreas. Os programas 30-2, 24-2 e 10-2 apresentam 69, 55 e 44 estímu­
los, respectivamente, além do GHT e a possibilidade de imprimir os exames anteriores (serial
field overview).

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146 Semiologia Básica em Oftalmologia

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ON

Semiologia Básica das


Pálpebras, Vias Lacrimais e
Órbitas
RODRIGO BERALDI KORMANN

As pálpebras são de extrema importância na proteção do globo ocular e na distribuição da


lágrima.
As pálpebras superior e inferior se unem, formando um canto interno (ou medial) e um
canto externo (ou temporal). O canto temporal é usualmente mais alto que o medial. A pál­
pebra superior é mais arqueada que a pálpebra inferior. O ápice da pálpebra superior é bem
acima da borda nasal da pupila e o ponto mais baixo da pálpebra inferior é a borda temporal
da pupila. A margem da pálpebra superior, nos adultos, se posiciona 2 mm do limbo superior
e a pálpebra inferior tangencia o limbo inferior. No canto medial, existe a carúncula, estrutura
formada por glândulas sebáceas e alguns pelos; também no canto medial existe a prega semi­
lunar (tecido conjuntivo que contém músculo liso).
O comprimento horizontal das pálpebras é de 30 mm e a distância entre as margens pal-
pebrais superior e inferior (fenda palpebral) é aproximadamente de 10 mm, medidas estas que
podem variar principalmente dependendo da raça do paciente.
As pálpebras podem ser divididas em duas lamelas: anterior (pele e músculo orbicular) e
posterior (tarso e conjuntiva) (Fig. 1).
A pele palpebral é muito fina e o tecido subcutâneo praticamente inexistente.
O músculo orbicular é responsável pelo fechar dos olhos (inervado pelo VII par), podendo
ser dividido em pré-tarsal, pré-septal e orbital.
Os tendões cantais são extensão do músculo orbicular. O tendão cantai lateral se insere
na parede lateral da órbita (tubérculo de Whitnall) e o medial emite um ramo anterior que se
insere na crista lacrimal anterior e processo frontal da maxila bem como um ramo posterior
que se insere na crista lacrimal posterior. O saco lacrimal é envolvido pelos ramos anterior e
posterior do tendão cantai medial.
As placas tarsais são estruturas semielípticas e planas, constituídas de tecido conjuntivo
fibroso denso, responsáveis por manter a estrutura das pálpebras. Medem cerca de 12 mm de

147
148 Semiologia Básica em Oftalmologia

Fig.1 Lamelas palpebrais.

altura (tarso superior) e 4 mm de altura (tarso inferior), 28 mm de comprimento e 1 mm de


espessura. No interior do tarso encontram-se as glândulas de Meibomius, que se abrem na
margem palpebral. 0 tarso tem pouca aderência na sua face anterior como músculo orbicular,
mas está firmemente aderido na sua face posterior à conjuntiva.
A conjuntiva é a camada mais interna da lamela posterior, possui epitélio escamoso não
queratinizado e com células caliciformes. A conjuntiva reveste internamente as pálpebras
(conjuntiva palpebral), forma o fórnice conjuntival (superior e inferior) e reveste o bulbo ocu­
lar até o limbo (conjuntiva bulbar).
O músculo levantador da pálpebra superior é reponsável pela elevação da pálpebra su­
perior (inervado pelo III par), tendo origem no ápice da órbita, e ao passar pelo ligamento
de Whitnall, transforma-se em aponeurose, que insere-se na face anterior, do terço superior,
da placa tarsal superior, emitindo ramos para a pele da pálpebra superior (formando o sulco
palpebral). O ligamento de Whitnall estende-se da fáscia da glândula lacrimal à tróclea medial­
mente.
O músculo de Müller, também é responsável por pequena parte da elevação da pálpebra
superior (inervação simpática), encontrando-se entre a conjuntiva e a aponeurose do músculo
levantador da pálpebra superior, tendo origem neste e inserindo-se na borda superior da placa
tarsal superior.
Os retratores da pálpebra inferior são a fáscia capsulopalpebral do músculo reto inferior
e músculo oblíquo inferior.
O septo orbitário limita a região palpebral da região orbitária, localizado anteriormente
à gordura pré-aponeurótica (três bolsas na pálpebra inferior e duas bolsas na pálpebra supe­
rior), tem origem no rebordo orbitário e se funde com a aponeurose do músculo levantador
da pálpebra superior (Figs. 2 e 3).
A vascularização das pálpebras é muito rica, sendo suprida por ramos da artéria carótida
externa (artéria angular) e artéria carótida interna (ramos terminais da artéria oftálmica) (Fig. 4).
A circulação venosa é feita pela veia angular e veia temporal (drenagem pré-tarsal) e veias
orbitárias, veia facial e plexo pterigóideo (drenagem pós-tarsal) (Fig. 5).
Semiologia Básica das Pálpebras, Vias Lacrimais e Órbitas 149

1 - M.Müller
2- M. orbicular
3- L. Whitnall
4- M. elevador
5- Tarso

Fig.2 Perfil da pálpebra superior.

Fig.3 Perfil da pálpebra inferior.

Artéria
supraorbital
Artéria Arcada marginal
lacrimal

Artéria
angular

Arcada
marginal Artéria
inferior facial
Fig. 4 Vascularização palpebral. infraorbital

A inervação pode ser dividida em sensitiva (V par) e motora (III e VII pares e fibras simpá­
ticas) (Fig. 6).
A drenagem linfática das pálpebras é para linfonodos pré-auriculares (pálpebra superior e
canto medial) e submandibulares (pálpebra inferior e canto lateral) (Fig. 7).
Para uma boa semiologia palpebral, além de testes específicos para cada patologia, deve­
mos iniciar pelo próprio exame oftalmológico geral.
150 Semiologia Básica em Oftalmologia

Seio
Seio frontal
cavernoso Veia oftálmica
superior

Veia oftálmica
inferior

Plexo
venoso
pterigóideo

Seio maxilar Fig. 5 Drenagem venosa.

Nervo Nervo
supraorbital supratroclear
Nervo
infraorbital

infraorbital
Fig. 6 Inervação palpebral.

Drenagem linfática

Drenagem linfática.

A avaliação das pálpebras deve ser feita de preferência sob luz natural. Devemos avaliar
a posição anatômica das pálpebras, coloração, presença de lesões tumorais, o movimento
de piscar, a oclusão palpebral e algum movimento anômalo. A lâmpada de fenda avaliamos a
Semiologia Básica das Pálpebras, Vias Lacrimais e Órbitas 151

margem palpebral que deve estar em contato com o bulbo ocular; a fileira de cílios (que não
devem tocar a córnea); a posição dos pontos lacrimais (pérvios e voltados para o globo ocular);
o orifício das glândulas de Meibomius e o fórnice conjuntival. Devemos avaliar a tensão das
pálpebras inferiores realizando testes específicos (Snap Back Test e Distraction Test, descritos
anteriormente.
Quando a margem palpebral está invertida, chamamos de entrópio e se evertida, ectrópio
(Figs. 8 e 9).
A correta posição dos cílios também é fundamental. Se houver cílio mal direcionado, to­
cando na superfície ocular (triquíase) ou uma fileira anômala de cílios invertidos em direção
ao globo ocular (distiquíase), devem ser corrigidos, pois os sintomas e danos causados, prin­
cipalmente à córnea, podem ser graves e irreversíveis (Figs. 10 e 11).
Os pontos lacrimais inferiores e superiores, normalmente não devem ser vistos, pois
quando tópicos, só podemos observá-los evertendo levemente as pálpebras na porção medial.
Além da posição correta dos pontos lacrimais, também devemos observar se estão pérvios,
estenosados ou totalmente obstruídos.
As lesões palpebrais devem ser minuciosamente descritas: pigmentadas ou não, superfi­
ciais ou infiltrativas, elevadas ou planas, bem delimitadas ou sem limites precisos, causando
deformidade na margem palpebral ou perda de cílios e se possuem neovasos. Estas caracte-

Fig. 8 Entrópio involucional.

Fig. 9 Ectrópio involucional.


152 Semiologia Básica em Oftalmologia

Fig. 10 Distiquíase.

Fig. 11 Triquíase.

rísticas citadas, juntamente com idade, profissão, raça, tempo de início e a evolução da lesão,
podem ajudar na diferenciação entre benignidade ou malignidade do tumor.
As lesões benignas são maioria os tumores palpebrais (papiloma escamoso, calásio, ne-
vos, xantelasma, milia, cisto de epiderme, ceratose seborreica, corno cutâneo, molusco con­
tagioso, etc.). Podemos necessitar da biópsia incisional para programar a cirurgia (lesões mal
delimitadas ou mais extensas e infiltrativas), e quando indicamos a excisão completa primária
ou chamada biópsia excisional (lesões delimitadas, menores ou superficiais) é mandatório o
anatomopatológico. A técnica micrográfica de Mohs é interessante pela alta porcentagem de
cura, com pequena remoção de tecido sadio. A cirurgia de Mohs é realizada com cuidadoso
mapa do tumor, com sessões de congelação e, se necessário, subsequentes ressecções do local
(Figs. 12 a 15).
Semiologia Básica das Pálpebras, Vias Lacrimais e Órbitas 153

Entre as lesões malignas palpebrais, podemos citar o carcinoma basocelular (tumor ocu­
lar maligno mais comum, 90%), mais frequente na pálpebra inferior e clinicamente indiferen-
ciável do carcinoma espinocelular, este também mais frequente na pálpebra inferior e mais
agressivo, podendo inclusive provocar metástases. O carcinoma de glândula sebácea é menos
frequente que os anteriores e mais comum na pálpebra superior, porém bem mais agressivo
(pior sobrevida se maior que 10 mm ou mais de 6 meses de evolução). O melanoma maligno
de pálpebra é raro, sem padrão de cor definida, com bordas irregulares, forma assimétrica e
geralmente maior que 6 mm de diâmetro (Figs. 16 e 17).

Fig. 16 Carcinoma basocelular.

Fig. 17 Carcinoma de glândula sebácea.


154 Semiologia Básica em Oftalmologia

O tratamento das lesões palpebrais benignas e malignas, vai desde cauterização e exérese
simples até exéreses com reconstruções menores ou mais complexas, quimioterapia e radio­
terapia.
A avaliação ectoscópica das pálpebras é extremamente importante para o diagnóstico
correto. Em uma simples inspeção podemos perceber variações entre os olhos e em relação à
anatomia normal. Geralmente no início do exame, o paciente está ansioso e os olhos podem
ficar mais abertos que o usual, sendo aconselhável solicitar para que relaxe durante o exame.
A margem palpebral é dividida pelo ponto lacrimal em porções ciliar e lacrimal. A espes­
sura é pouco maior superiormente (1,95 mm em adultos). A margem palpebral possui a lamela
anterior (pele e músculo orbicular) e a lamela posterior (tarso e conjuntiva). Separando as duas
lamelas, podemos encontrar a linha cinzenta (músculo de Riolam), a qual é ausente na porção
lacrimal.
Na lamela anterior encontramos os cílios, que atravessam o músculo orbicular e alcançam
o tarso, tendo uma orientação convexa externa. A ptose ciliar (os cílios perdem a convexidade
normal) pode ser encontrada na síndrome da flacidez da pálpebra superior, doença de Hansen,
pós-blefaroplastias, etc.
As pálpebras superiores têm uma forma mais arqueada do que as inferiores, possuem um
sulco palpebral que pode variar em sua altura, mas normalmente é simétrico ao contralateral.
0 sulco palpebral superior é formado pela inserção anterior de fibras da aponeurose do mús­
culo levantador da pálpebra superior. Existe grande variabilidade na posição e na forma do sul­
co, podendo ser encontrados sulcos assimétricos, duplos e mal definidos. A medida do sulco
palpebral superior é feita com um paquímetro ou régua, da margem da pálpebra superior até o
próprio sulco palpebral. Nos orientais o sulco é geralmente mais baixo (4 a 6 mm) do que nos
ocidentais (6 a 10 mm). Na ptose, diante de sulcos palpebrais mais altos, podemos pensar em
uma desinserção do músculo levantador da pálpebra superior (Fig. 18).
Ainda nas pálpebras superiores, temos a prega palpebral, que seria a quantidade de pele
existente abaixo do sulco palpebral superior, na posição primária do olhar, tendo também for­
te relação com idade e raça. O excesso de prega palpebral em pessoas idosas é chamado de
dermatocalase e em pessoas mais jovens, principalmente mulheres, de blefarocalase.
Ptose palpebral é quando a margem da pálpebra superior está mais que 2 mm abaixo
do limbo superior da córnea. Se a pálpebra superior estiver tangenciando ou acima do
limbo corneai superior, trata-se de retração palpebral (sinal comumente encontrado na
oftalmopatia distireóidea). É importante excluir casos de pseudoptoses (estrabismos, tu­
mor, etc.) (Fig. 19).

Fig. 19 Ptose.
Semiologia Básica das Pálpebras, Vias Lacrimais e Órbitas 155

Os retradores da pálpebra superior são constituídos pelo músculo levantador da pálpebra


superior, músculo de Müller e músculos frontais.
As pálpebras inferiores, menos arqueadas, tangenciam o limbo inferior. Quando retraídas, cha­
mamos de escleral show, podendo ocorrer na ptose congênita, doenças cicatriciais e autoimunes.
Normalmente o canto temporal da pálpebra inferior é pouco mais elevado que o canto
medial, e o sulco palpebral inferior mais apagado (Fig. 20).
A avaliação da oclusão palpebral é muito importante, pois uma má oclusão (lagoftalmo),
pode ser muito danoso para a córnea, principalmente em indivíduos com reflexo de Bell po­
bre, teste do reflexo descrito anteriormente (Fig. 21).

Fig. 21 Lagoftalmo.

TESTES PALPEBRAIS ESPECÍFICOS


Entrópio e ectrópio
O snap back test e o distraction test, são dois exames que devem ser feitos rotineiramente para
observar-mos se existe ou não frouxidão das pálpebras, normalmente inferiores.
Com o dedo indicador tracionamos a pálpebra inferior para baixo e pedindo para o pacien­
te não piscar, a soltamos, avaliando se esta volta para sua posição anatômica (snap back test),
se houver dificuldade em retornar o contato da margem palpebral com o globo ocular, existe
frouxidão palpebral (leve, moderada ou grave) (Fig. 22).
156 Semiologia Básica em Oftalmologia

O distraction test é realizado pinçando a pálpebra inferior, com o polegar e o indicador, pu­
xando em direção oposta ao globo ocular. Se esta distração for maior que 6 mm, dizemos que
existe uma frouxidão palpebral horizontal (Fig. 23).
Quando abaixamos a pálpebra inferior, com o paciente olhando para cima, e encontramos
um fórnice conjuntival elevado, suspeitamos de desinserção dos retratores da pálpebra infe­
rior, comum no entrópio involucional. Outra manobra utilizada no entrópio, para diferenciar o
tipo involucional do cicatricial, é tentando colocar a margem palpebral inferior na sua posição
habitual, se ela permanecer neste local enquanto o paciente não pisca, parece tratar-se de
etiologia involucional, mas se não parar na posição tópica, pode ser cicatricial. A avaliação da
conjuntiva palpebral é fundamental para descartar lesões cicatriciais e tumorais.

Ptose
A fenda palpebral é a medida da margem da pálpebra inferior até a margem da pálpebra supe­
rior, geralmente em torno de 8 a 10 mm, na posição primária do olhar. A fenda palpebral sofre
variações de acordo com a posição dos olhos. Existem forças ativas (neuromusculares) e passi­
vas (tecidos e ligamentos), que proporcionam o equilíbrio palpebral. A medida da fenda palpe­
bral é extremamente importante na oculoplástica, e varia de acordo com a mirada, podendo
ser mensurada por régua ou atualmente pode-se medir através de imagens digitais (Fig. 24).
Parâmetros médios da fenda palpebral (em PPO):
■ Horizontal = 26,2 mm.
■ Vertical = 9,02 mm.
■ Obliquidade = ângulo externo da fenda palpebral em média de 5o mais alto que o ângulo
interno.
■ Contorno palpebral = ponto culminante do contorno da pálpebra superior está 1,04 mm
lateral à linha média da fenda palpebral e na pálpebra inferior o ponto mais baixo está a
1,19 mm lateralmente a esta linha.
■ DMR1 = distância margem reflexo superior/DRM2 = distância margem reflexo inferior.

Fig. 24 Medida da fenda palpebral.


Semiologia Básica das Pálpebras, Vias Lacrimais e Órbitas 157

A distância margem reflexo seria a medida da margem da pálpebra superior ao reflexo de


Hirshiberg, também na posição primária do olhar, normalmente em torno de 2 a 5 mm DMR1.
Ela é a melhor mensuração da fenda palpebral (Figs. 25A e B).
A função do músculo levantador da pálpebra superior é fundamental na classificação do
tipo de ptose e na escolha do procedimento cirúrgico. A função geralmente está relacionada
com o grau de ptose. A função pobre é refletida pelo apagamento do sulco palpebral superior.
Com o polegar segurando o músculo frontal do lado a ser medido, pedimos ao paciente para
olhar para baixo, então solicitamos que eleve ao máximo os olhos para cima, sem mexer a ca­
beça, e medimos o quanto a margem da pálpebra superior elevou-se (Figs. 26A e B).
Uma medida pobre (1 a 4 mm), sugere etiologia congênita, miopática ou neurogênica, e
uma função boa (> 10 mm) sugere desinserção do músculo levantador da pálpebra superior. O
valor normal da função do músculo levantador da pálpebra superior está em torno de 15 mm.
O reflexo de Bell, essencial em pré-operatórios de ptose, é realizado pedindo para o pa­
ciente fechar os olhos e lentamente tentamos abri-los para observar-mos a posição dos olhos
(normalmente superotemporal) (Fig. 27).

Figs. 25 (A e B) Distância margem reflexo. A. DMR1 = 4,1 mm. B. DMR2 = 6,6 mm.

Figs. 26 (A e B) Medida da função do músculo levantador da pálpebra superior.


158 Semiologia Básica em Oftalmologia

Fig. 27 Reflexo de Bell.

A sensibilidade corneana deve ser pesquisada (delicadamente com ponta de um cotonete


ou um estensiômetro), pois uma hipoestesia proporciona maiores chances de complicações
pós-operatórias.
O teste de Shirmer e o But (break up time), também devem ser realizados no pré-operatório
de cirurgias palpebrais, principalmente em blefaroplastias, pois olhos secos graves são, inclu­
sive, contraindicação para correção cirúrgica (Fig. 28).
O licl-lag é a restrição da excursão da pálpebra superior no olhar para baixo, sinal impor­
tante na retração palpebral (p. ex., orbitopatia distireóidea).
No teste da fenilefrina a 10%, pingamos 1 gota de colírio e aguardamos 5 min, observando
r

se existe aumento da fenda palpebral. E importante para avaliar a via simpática da inervação e
0 músculo de Müller, que são hipersensíveis a medicamentos adrenérgicos. A resposta normal
é uma elevação da pálpebra superior em torno de 2 mm e uma retração da pálpebra inferior de
1 a 2 mm. Teste importante para classificar o tipo de ptose e programar a correção cirúrgica.
A documentação fotográfica pré e pós-operatórias é muito importante e deve ser rotineira.

Fig. 28 Teste de Shirmer.

Dermatocalase
r

E o excesso de pele palpebral superior e inferior, causado pela senilidade, normalmente com
presença de bolsas de gordura (por frouxidão do septo orbitário). O diagnóstico diferencial é
com blefarocalase, causado por uma patologia palpebral (edemas de repetição), geralmente
em pessoas mais jovens. De acordo com o tamanho da dermatocalase pode haver compro­
metimento do campo visual superior. Na avaliação pré-operatória da blefaroplastia, existem
cuidados a serem tomados, principalmente a expectativa do paciente. Em relação ao exame
Semiologia Básica das Pálpebras, Vias Lacrimais e Órbitas 159

propriamente dito, além do exame oftalmológico geral, devemos avaliar a posição dos super-
cílios, fenda palpébral, sulcos palpebrais, presença ou não de bolsas de gordura, sinais de olho
seco e outros. As complicações mais frequentes são disfunções do filme lacrimal, problemas
cicatriciais, ectrópio, assimetrias de sulco palpébral, ceratite de exposição e lagoftalmo, entre
outros.

VIAS LACRIMAIS
O sistema lacrimal inclui a lubrificação dos olhos e a drenagem da lágrima. O filme lacrimal é
produzido por contribuição da conjuntiva, pálpebras e das glândulas lacrimais. A lágrima é dis­
tribuída uniformemente nos olhos com o piscar natural e espontâneo das pálpebras. O piscar
tem função de “bomba lacrimal”, impulsionando a lágrima para o sistema de drenagem lacrimal.
O filme lacrimal era classificado como composto por três camadas (mucosa, aquosa e oleo­
sa), mas novos conceitos têm sido apresentados, propondo sua formação por apenas duas
camadas, uma camada lipídica mais superficial, produzida principalmente pelas glândulas de
Meibomius que serve para retardar a evaporação e manter o filme lacrimal uniforme e outra
camada mais interna, mais espessa, contendo muco diluído (camada mucoaquosa), produzida
principalmente pela glândula lacrimal principal e glândulas lacrimais acessórias (Krause e Wol-
fring) (Figs. 29 e 30).

Fig. 29 Filme lacrimal.

Glândula
lacrimal
! principal

- Porções:
11- Orbitária
i 2- Lacrimal

Fig. 30 Glândula lacrimal principal.


160 Semiologia Básica em Oftalmologia

As glândulas lacrimais principais ficam superotemporal na órbita e possuem dois lobos


(orbital e palpebral), divididos pelo corno lateral da aponeurose do músculo levantador da pál­
pebra superior. No fórnice conjuntival temporossuperior é onde se abrem os duetos da glân­
dula lacrimal principal. Em muitos pacientes podemos observar o lobo palpebral da glândula
lacrimal, evertendo a pálpebra superior.
O sistema de drenagem lacrimal inicia-se com os pontos lacrimais (inferior e superior), am­
pola lacrimal (vertical) e canalículos lacrimais (inferior e superior), dispostos horizontalmente
e que na maioria das pessoas se unem formando um canalículo comum, que desemboca no
saco lacrimal. Este percurso até a entrada no saco lacrimal, chamamos de via lacrimal alta.
Após o saco lacrimal temos o dueto nasolacrimal, que termina em uma abertura no meato na­
sal inferior (este último percurso é chamado de via lacrimal baixa). Existem inúmeras válvulas
no sistema de drenagem lacrimal, entre elas podemos citar a válvula de Rosenmuller (entre
o canalículo comum e o saco lacrimal), válvula de Krause (entre o saco lacrimal e o dueto na­
solacrimal), válvula de Hasner (entre o dueto nasolacrimal e o meato nasal inferior) (Fig. 31).
Diante de um paciente com epífora, é fundamental determinar a causa para a escolha do
tratamento mais adequado. Primeiramente devemos diferenciar o lacrimejamento, que signi­
fica uma disfunção na produção de lágrima, podendo ser decorrente de inúmeras causas (p.
ex., triquíase, glaucoma congênito, ceratite, etc.), de epífora, a qual é uma anormalidade na
drenagem lacrimal (p. ex., obstrução canalicular, obstrução congênita das vias lacrimais, etc.).
Durante a inspenção do paciente, podemos observar a posição das pálpebras, se os dois
olhos estão “molhados” ou apenas um olho, se existe hiperemia conjuntival ou algum sinal
inflamatório palpebral.
Na biomicroscopia, avaliamos as margens palpebrais, cílios, tensão das pálpebras, córnea,
conjuntiva e fórnice conjuntival. Excluindo alterações que possam levar a um lacrimejamento
reflexo, iniciamos a investigação da causa da epífora.
Primeiro examinando os pontos lacrimais, se estão tópicos ou ectropiados, pérvios ou
estenosados; depois os canalículos lacrimais (superior e inferior), principalmente se estão in­
flamados. Podemos fazer a expressão dos canalículos (com cotonete), para observar se existe
refluxo de secreção ou cálculos no seu interior (suspeitando da canaliculite).
Existem testes específicos para investigar se existe alguma obstrução das vias lacrimais, se
é total ou parcial e o local da obstrução. O exame em adultos é diferente do exame nas crianças,

I U r '
'c íW Í*
í
SaccDäcrimal

Ducto-nasolacrimal

V eato nasal inferior


1 Fig. 31 Sistema de drenagem lacrimal.
Semiologia Básica das Pálpebras, Vias Lacrimais e Órbitas 161

nestas além da anamnese detalhada, da inspeção e de testes das vias lacrimais (teste de desapa­
recimento do corante ou chamado teste de Milder, cateterização canalicular, compressão do saco
lacrimal, teste de Jones e outros) fazemos um teste específico para crianças, que é o teste de obser­
vação da fluoresceína oral (TOFO). No teste de desaparecimento do corante (TDC), ou teste de Zap-
pia Milder, pingamos 1 gota de fluoresceína sódica a apenas no olho com sintomas (se criança)
e após uns 3 min, observamos o menisco lacrimal com luz azul de cobalto. Se o menisco lacrimal
estiver aumentando (> 1 mm), suspeitamos de obstrução de vias lacrimais (Fig. 32).
Em seguida, aproximadamente 40 min após o TDC, com um abaixador de língua e luz azul
de cobalto, inspecionamos a orofaringe da criança para identificar a presença ou não da fluo­
resceína a 1%, que seria o teste de observação da fluoresceína oral (TOFO) (Fig. 33).
r

E possível fazer o TDC pingando 1 gota de fluoresceína nos dois olhos consecutivamen­
te, é válido para comparar o menisco lacrimal entre os olhos, podendo inclusive observar o
corante pelo orifício nasal em alguns casos, comprovando a permeabilidade da via lacrimal
correspondente, no entanto o TOFO ficará prejudicado, pois com a presença da fluoresceína
na orofaringe, não podemos saber de qual olho esta é proveniente (Fig. 34).
Os exames complementares, raramente são necessários, apenas em crianças operadas
sem sucesso, suspeita de tumores ou mielomeningocele (p. ex., dacriocistografia, ecografia,
tomografia computadorizada, etc.).

Fig. 32 Teste de desaparecimento do corante.

Fig. 33 Teste de observação de fluoresceína oral.

Fig. 34 Menisco normal à direita, com corante na narina do lado


direito. Menisco aumentado à esquerda, ausência de corante na
narina do lado esquerdo.
162 Semiologia Básica em Oftalmologia

Nos adultos, além da inspeção e biomicroscopia, realizamos o TDC, teste de cateterização


dos canalículos lacrimais, teste de Jones I modificado, teste de Jones I e teste de Jones II. Tam­
bém apenas em casos selecionados solicitamos exames complementares, como a dacriocinti-
lografia em suspeita de bloqueio funcional ou obstruções parciais, dacriocistografia em casos
de dúvida diagnóstica da altura da obstrução (obstrução do canalículo comum ou baixas com
saco atrófico), reoperações e tomografia computadorizada em suspeita de tumores.
O TDC é semelhante ao descrito nas crianças, no entanto pingamos 1 gota do corante nos
dois olhos do paciente e após 3 min comparamos o menisco lacrimal entre os dois olhos. O
TDC tem alta confiabilidade para o diagnóstico de processo obstrutivo, mas não orienta quan­
to a localização da obstrução. Devemos tomar cuidado com a falsa interpretação quando o
saco lacrimal é bem dilatado, pois nestes casos apenas 1 gota de fluoresceína pode dar uma
falsa impressão de um teste normal (menisco lacrimal normal), nestes casos pingar mais uma
ou duas vezes a fluoresceína e a expressão do saco lacrimal são fundamentais. A expressão
do saco lacrimal do lado onde há suspeita de obstrução das vias lacrimais, colocando o dedo
indicador no local anatômico do saco lacrimal e fazendo a expressão no sentido retrógrado da
via lacrimal excretora, deve sempre ser realizada e caso haja refluxo de secreção pelos pontos
lacrimais, praticamente revela uma obstrução baixa da via lacrimal, podendo inclusive classifi­
car o tamanho da dilatação do saco lacrimal.
O teste de Jones I modificado pode ser feito em seguida, observando 20 a 30 min após o
TDC, apenas inspecionando a cavidade nasal com luz azul de cobalto à procura de fluoresceína
sódica a 1%, indicando a permeabilidade da via. Não observando o corante, pegamos um espé-
culo nasal e uma haste com algodão na extremidade (swcib), e introduzimos cuidadosamente
no meato nasal inferior para procurar a fluoresceína (teste de Jones I) (Figs. 35A e B).
O teste de Jones II, um pouco desconfortável para ser realizado de rotina no consultório,
deve ser reservado em casos de dúvida diagnóstica com os exames anteriores. Este teste é
feito irrigando o canalículo lacrimal inferior com água destilada, estando ocluído o ponto
lacrimal superior. Observamos a presença da água destilada (corada ou não) pela cavidade
nasal, pedindo para o paciente ficar com a cabeça um pouco inclinada para frente durante a
irrigação.

Figs. 35 (A e B) A. Teste de Jones I modificado. B. Teste de Jones I.


Semiologia Básica das Pálpebras, Vias Lacrimais e Órbitas 163

Interpretando o teste de Jones II:


■ Ausência de água pelo nariz = obstrução total alta ou baixa da via lacrimal.
■ Presença de água destilada sem corante pelo nariz = obstrução parcial alta da via lacrimal.
■ Presença de água destilada corada pelo nariz = obstrução parcial baixa da via lacrimal (Figs.
36A e B).

Suspeitando-se de obstrução total, para diferenciar obstrução de via lacrimal alta ou bai­
xa, podemos fazer a expressão do saco lacrimal, considerando obstrução total baixa se houver
refluxo de secreção. Também na obstrução total, podemos realizar a cateterização dos canalí-
culos lacrimais superior e inferior, após termos pingado 1 gota de colírio anestésico, dilatamos
o ponto lacrimal e introduzimos cuidadosamente uma sonda de Bowman fina através do cana-
lículo inferior até sentir o osso lacrimal, constatando, assim, a permeabilidade do canalículo
(Harcl Stop). Se houver resistência (elástica), suspeitamos de uma obstrução canalicular (Soft
Stop). Esta manobra é igualmente realizada pelo canalículo lacrimal superior (Figs. 37A e B).

Figs. 36 (A e B) Teste de Jones II.


164 Semiologia Básica em Oftalmologia

A - Hard Stop B - Soft Stop

Figs. 37 (A e B) A. H ardStop. B. SoftStop. Teste de cateterização dos canalículos lacrimais.

O mecanismo da drenagem lacrimal depende da sucção produzida ao fechar as pálpebras


durante a ação exercida sobre o saco lacrimal quando da contração do músculo orbicular.
O exame rinológico é necessário para a pesquisa clínica e indispensável no planejamento
cirúrgico, podendo ser feito com endoscópio nasal, que tem sido fundamental no tratamento
dos problemas de drenagem lacrimal, tanto no pré-operatório, quanto no per e pós-operatório.
O endoscópio nasal tem sido fundamental no tratamento dos problemas de drenagem
lacrimal, tanto no pré-operatório quanto no peri e pós-operatório.
O tratamento das obstruções de vias lacrimais é eminentemente cirúrgico, variando com a
idade, procedimentos anteriormente realizados e altura da obstrução. Podemos utilizar punc-
toplastias (abertura dos pontos lacrimais em casos de estenose ou obstrução total), sondagens
das vias lacrimais (apenas em crianças), sondagem com intubação das vias lacrimais, dacrio-
cistorrinostomias (em obstruções baixas) e conjuntivodacriocistorrinostomias (em obstruções
canaliculares).

ÓRBITA
A órbita é uma cavidade óssea que protege o globo ocular. O ângulo formado entre as paredes
laterais da órbita é de 90° e entre as paredes lateral e medial, em torno de 45°. Existem seios
(frontal, etmoidal, maxilar e esfenoidal) que circundam a órbita. A órbita é formada pelos os­
sos: etmoide, frontal, lacrimal, maxilar, palatino, esfenoide e zigomático (Figs. 38 e 39).
A cavidade orbitária é formada pela periórbita, nervo óptico, músculos oculares extrínse­
cos, gordura orbitária, vasos e nervos. O conteúdo orbitário é revestido por um tecido adipo­
so, que funciona como proteção e sustentação do globo ocular.
O principal suprimento sanguíneo da órbita é a artéria oftálmica, que penetra pelo canal
óptico. As principais veias são: oftálmica superior, oftálmica inferior e central da retina. Parece
não existir drenagem linfática. A inervação é motora (III, IV, VI) e sensorial (divisão oftálmica
e maxilar do V par).
A presença de proptose ou deslocamento do globo ocular sugere doença orbitária. As cau­
sas mais comuns de proptose em crianças diferem das principais causas nos adultos.
Semiologia Básica das Pálpebras, Vias Lacrimais e Órbitas 165

Fig. 38 Órbita esquerda, vista anterior.

Fig. 39 Órbita.

O exame detalhado do paciente é fundamental para o diagnóstico e indicação da conduta


a ser tomada.
A anamnese, como toda investigação diagnóstica, é extremamente importante e indispen­
sável.
Em relação à anamnese nas patologias orbitárias, a dor, progressão nos direciona para
a etiologia, assim como no exame físico, a inspeção (proptose ocular, sinais inflamatórios),
palpação e usculta nos ajudam no diagnóstico etiológico. Os exames de imagem (tomografia
computadorizada, com ou sem contraste, ressonância magnética), são usualmente requeridos.
A dor está presente nos processos inflamatórios, infecciosos, hemorragias e envolvimento
ósseo ou de nervo.
Se a progressão é rápida (horas ou dias), intermediária (semanas e meses) ou lenta (meses
ou anos). Processos rápidos (hemorragias, infecção, inflamação) e lentos (inflamatórios crôni­
cos, neoplasma benigno, linfomas).
A inspeção dos globos oculares mostra se existe proptose ocular ou exoftalmia (globo
ocular projetado anteriormente). A proptose ocular pode ser mensurada pela exoftalmome-
tria, que é a medida entre a margem orbitária lateral ao ápice da córnea (tipos de exoftalmô-
metro: Hertel, Luede e outros). A medida considerada normal para crianças é de 14 mm e no
adulto de 16 mm. Normalmente é considerado exoftalmia uma medida acima de 20 mm ou
uma diferença maior que 3 mm entre os olhos (traumas ou variações congênitas podem ser
responsáveis por variações). Outra maneira de avaliar se há exoftalmia é inspecionando o pa­
ciente por trás, com a cabeça inclinada para cima e solicitando que olhe para baixo.
166 Semiologia Básica em Oftalmologia

Pode ser unilateral ou bilateral, proptose leve, moderada ou grave e, se é axial (processo
intracone) ou lateralizada (processo expansivo na situação oposta à lateralização).
A ausculta, realizada na região superotemporal, nos ajuda no diagnóstico de doenças es­
pecíficas (fístula carótida cavernosa).
Observar se há redutibilidade ou não da proptose, pela palpação; também devemos palpar
os rebordos orbitários, observando fraturas, espessamento ou hiperostoses. Na maioria das
vezes podemos palpar a lesão. Se a massa é palpável, é necessário verificar a forma, tamanho,
posição e se está fixa ou não em tecidos adjacentes. A causa mais comum de proptose pulsátil
é a neurofibromatose.
A causa mais comum de proptose uni ou bilateral em adultos é a orbitopatia distireóidea.
Outras causas comuns incluem lesões linfoides, doença inflamatória orbital idiopática, heman­
gioma cavernoso, metástases, tumor de glândula lacrimal e tumor de nervo óptico.
O diagnóstico diferencial, nos adultos, pode ser baseado na direção do deslocamento do
olho. Quando o deslocamento é axial pensamos em orbitopatia distireóidea (alargamento dos
músculos extraoculares, principalmente o reto medial, Fig. 40), hemangioma cavernoso (mas­
sa intraconal), e meningioma de nervo óptico (tumor do nervo óptico). Se o deslocamento não
for axial:
■ Inferior:
• Tumor misto benigno ou tumor linfoide (de glândula lacrimal).
• Mucocele (seio frontal) (Fig. 41).
• Meningioma da asa do esfenoide (teto da órbita).

Fig. 40 Exoftalmia e espessamento dos músculos extraoculares na oftalmopatia


distereóidea.

Fig. 41 Mucocele de seio frontal.


Semiologia Básica das Pálpebras, Vias Lacrimais e Órbitas 167

■ Lateral:
• Mucocele (seio etmoidal).
■ Superior:
• Carcinoma (seio maxilar).
• Tumor linfoide.
■ Medial:
• Carcinoma de pulmão (enoftalmo).

A proptose em crianças é incomumente causada por malignidade, sendo que o mais co­
mum cisto dermoide, hemangioma capilar, celulite orbital, rabdomiossarcoma, linfangioma e
glioma de nervo óptico (Figs. 42 a 44).
A orbitopatia distireóidea é rara em crianças. Se a proptose for rápida o rabdomiossarco­
ma deve ser considerado. O tratamento de hemagioma capilar deve ser considerado se houver
ambliopia ou deformidades faciais. Em suspeita de celulite orbital devemos pedir exame de
imagem, e o tratamento é de urgência, tentando identificar a causa (p. ex., picada de inseto,
sinusite), nestes casos o tratamento é normalmente clínico e muitas vezes pode ser necessário
internação. Em alguns casos precisamos de biópsia incisional para obter o diagnóstico e pos­
teriormente indicar o tratamento cirúrgico mais adequado.
Exames complementares, como a radiografia simples, tomografia computadorizada, ressonân­
cia magnética, podem ser solicitados como complementação diagnóstica e planejamento cirúrgico.

Fig. 42 Cisto dermoide.

Fig. 43 Rabdomiossarcoma.
168 Semiologia Básica em Oftalmologia

TRAUMA DE ÓRBITA
Diante de um paciente com trauma de órbita, primeiramente devemos priorizar as funções
vitais e posteriormente avaliar os olhos, as pálpebras, vias lacrimais e órbitas.
A inspeção pode nos sugerir fratura de órbita mediante sinais de enoftalmia, exoftalmia
(hematoma retro-orbitário), equimose periorbitária, epistaxe, enfisema subcutâneo e restri­
ções da motricidade ocular extrínseca (sugere encarceramento muscular) (Fig. 45).
Também é importante palpar a rima orbitária e testar a sensibilidade da face, pois uma
hipoestesia da área inervada pelo nervo infraorbitário (Fig. 46), sugere uma fratura de assoa­
lho de órbita.
Diplopia é comum estar presente logo após o trauma e melhorar espontaneamente com
as semanas seguintes, caso não melhore suspeitamos de fratura de alguma parede orbitária.
No entanto, a enoftalmia (retração posterior do globo ocular), normalmente não está presente
nas primeiras semanas pós-trauma, aparecendo mais tardiamente.
A tomografia computadorizada (axial e coronal) é o exame de eleição em suspeita de fra­
tura de órbita (Fig. 47).
O tratamento inicial na maioria das vezes é clínico (orientações gerais, como evitar atividade
física, não assoar nariz com força, antibioticoterapia profilática e acompanhamento).

Fig. 45 Fratura de assoalho de órbita.


Semiologia Básica das Pálpebras, Vias Lacrimais e Órbitas 169

f t

Fig. 46 Área de inervação do nervo infraorbitário.

Fig. 47 Tomografia computadorizada mostrando encarcera­


mento de músculo reto inferior do olho esquerdo, ao olhar para
cima, em fratura de assoalho da órbita à esquerda.

O tratamento cirúrgico pode ser mais precoce (nas primeiras semanas) em casos de fratu­
ras mais complexas, encarceramento muscular ou presença de alguns corpos estranhos orbitá-
rios ou mais tardio (meses após a trauma) em casos de diplopia persistente, enoftalmo maior
que 2 mm ou na presença de alguns corpos estranhos mais inertes.

BIBLIOGRAFIA
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Semiologia Básica da
Conjuntiva

DANIEL WASILEWSKI • SÂMIA AU WAHAB

ANATOMIA DA CONJUNTIVA
A conjuntiva se localiza na superfície ocular e, embora seja contínua, é didaticamente descrita
como tendo uma porção palpebral (tarsal) e outra bulbar, separadas por uma dobra tecidual,
em fundo de saco, chamada fórnice. A conjuntiva bulbar reveste a parte anterior do globo,
exceto a córnea, sendo pouco aderida à cápsula de tenon subjacente, porém, adere-se firme­
mente à regiào limbar. A conjuntiva tarsal reveste a parte posterior das pálpebras, aderindo-se
firmemente às placas tarsais.
Em posição primária, os fórnices superior e inferior distam aproximadamente 8 mm do
limbo; os fórnices medial e lateral distam, respectivamente, 5 e 14 mm do limbo.
Duas estruturas diferenciadas se apresentam na porção medial da conjuntiva. A prega
semilunar, que serve como fonte adicional da conjuntiva, permitindo a abdução do globo, e a
carúncula que, por ser uma modificação de tecido cutâneo, pode conter pelos, glândulas se-
báceas e sudoríparas (Fig. 1).
Histologicamente, a conjuntiva apresenta um epitélio com 2 a 5 camadas de células, sen­
do a mais interna aderida a uma membrana basal. Estas células possuem microvilosidades e

171
172 Semiologia Básica em Oftalmologia

glicocálice, que são responsáveis pela aderência da lágrima. As células epiteliais da conjuntiva
possuem bordas interdigitadas, unidas umas às outras por desmossomos. O epitélio também
tem a propriedade de ser semipermeável, permitindo a passagem de moléculas lipossolúveis
da lágrima para a conjuntiva e dificultando o movimento de proteínas e outras substâncias
hidrossolúveis no sentido oposto.
Originando-se na camada basal do epitélio conjuntival, as células caliciformes são as prin­
cipais fontes de produção de mucina e estão distribuídas por toda a conjuntiva, na forma
isolada ou agrupadas em criptas mucosas. Existe maior quantidade destas células na região
nasal, particularmente na prega semilunar. Elas se originam na camada basal do epitélio e vão
se avolumando à medida que caminham para a superfície, onde descarregam seu conteúdo de
mucina e se descamam. Seu número aumenta nas inflamações crônicas e diminui no olho seco,
no penfigoide e na deficiência de vitamina A.
O estroma ou córion está situado logo abaixo da membrana basal epitelial, apresentando-se
liso, sem pregas ou sulcos, exceto na região limbar. No estroma estão localizadas as glândulas
lacrimais acessórias (Krause e Wolfring). Estas glândulas se diferenciam de acordo com o local
em que se encontram na superfície ocular.
Há controvérsias em relação à localização das células germinativas conjuntivais. Estudos
recentes mostram que estas células encontram-se distribuídas de maneira uniforme pela con­
juntiva bulbar.

Colorações utilizadas para a avaliação da conjuntiva


FLUORESCEÍNA: possui um tom alaranjado, que evidencia áreas desepitelizadas e ulceradas da
conjuntiva. Para observar esse tipo de coloração, usa-se o filtro azul de cobalto na lâmpada
de fenda. Também é possível identificar erosões, muco e filamentos. Nos casos de traumas
conjuntivais, é fundamental a coloração com fluoresceína, com o objetivo de evidenciar e de­
limitar a extensão da lesão (Figs. 2 a 4).
ROSA-BENGALA: é um corante vital de coloração rósea, captado por células desvitalizadas e
utilizado para avaliar o sofrimento epitelial. Na deficiência lacrimal, a coloração é mais evi­
dente nos setores nasal e temporal, já no caso de exposição noturna, a área corada é a bulbar
inferior.
LISSAMINA VERDE: é um corante ácido, orgânico sintético, de coloração esverdeada que cora a
córnea e conjuntiva de forma bastante similar ao rosa-bengala, porém menos tóxico e menos
irritativo na superfície ocular.

Fig. 2 Coloração de fluoresceína através do azul de cobalto.


Semiologia Básica da Conjuntiva | 1 7 3

Fig. 3 Superfície ocular corada com fluoresceína.

I 1 ft
Fig. 4 Bastões de fluoresceína, lissamina verde e rosa-bengala.

AZUL DE TOLUIDINA: é utilizado para impregnação de células displásicas, auxiliando no diag-


nósico de lesões suspeitas.

BIOMICROSCOPIA DA CONJUNTIVA

A biomicroscopia da conjuntiva é um exame básico e fundamental, que permite o diagnós­


tico de uma série de patologias da superfície ocular somente pela observação da conjuntiva
através da lâmpada de fenda. Deve ser realizada em todos os pacientes submetidos a exame
oftalmológico no consultório médico.
Ao examinar a conjuntiva, é importante atentar-se às queixas do paciente para que o exa­
me possa ser bem direcionado. Uma anamnese detalhada é de fundamental importância nos
casos complicados em que existem diversas hipóteses diagnósticas.
Além de atentar-se aos dados do paciente, como sexo, idade e raça, deve-se questionar
quanto ao tipo de sintoma, intensidade, quando teve início e se foi de forma aguda ou crô­
nica, monocularidade ou binocularidade, outras alterações ou patologias associadas, dores
articulares, uso de medicamentos, possibilidade de contágio e se já houve o mesmo problema
anteriormente.
As queixas referentes às doenças da conjuntiva são bastante diversificadas e de intensida­
de muito variável.

DOR: qualquer processo inflamatório ou traumático da conjuntiva pode causar dor de diferen­
tes intensidades. Deve-se pensar nas conjuntivites e nos traumas da conjuntiva.
SENSAÇÃO DE CORPO ESTRANHO (OU DE AREIA NOS OLHOS): geralmente ocorre devido à pre­
sença de um corpo estranho sobre a conjuntiva. Na maioria dos casos, localizado no tarso su­
174 | Semiologia Básica em Oftalmologia

perior. Porém, também pode ocorrer triquíase, meibomite, olho seco, lesões corneanas devido
à presença de muco ou filamentos em casos de processo inflamatório por diferentes causas.
PRURIDO: é a sintomatologia típica dos processos alérgicos, porém pode estar relacionado com o
r
olho seco. E muito importante saber diferenciar estas duas patologias. Nos processos alérgicos,
o prurido geralmente vem acompanhado da presença de papilas na conjuntiva tarsal.
SECREÇÃO: a presença de secreção ocorre principalmente nas conjuntivites. É importante sa­
ber o tipo e intensidade da secreção para fazer o diagnóstico diferencial entre as causas virais,
bacterianas ou alérgicas.
LACRIMEJAMENTO EXCESSIVO: pode ocorrer mesmo sem que haja qualquer alteração na con­
juntiva, como, por exemplo, nas obstruções do sistema lacrimal.
LINFADENOPATIA PRÉ-AURICULAR OU SUBMANDIBULAR: é típica das infecções conjuntivais prin­
cipalmente de causa virai. Porém, algumas bactérias também podem induzir o aparecimento
dessa alteração.
OLHO VERMELHO: o olho vermelho é um capítulo à parte. Pode ocorrer devido à dilatação dos
vasos conjuntivais, episclerais, esclerais, ou até do extravasamento de sangue por uma rotura
de um vaso conjuntival (hiposfagma). É muito importante saber diferenciar o local anatômico
afetado onde está a causa da hiperemia ocular.

Inflamações intraoculares, principalmente as uveítes, geram hiperemia ao redor do limbo


(pericerática ou injeção ciliar). Lesões na conjuntiva causam congestão dos vasos conjuntivais,
que se movem sobre a esclera. Inflamações episclerais (episclerite) e esclerais (esclerite) indu­
zem alterações nestas regiões específicas, que não se movem abaixo da conjuntiva.

DIMINUIÇÃO DA VISÃO: as patologias conjuntivais dificilmente cursam com diminuição da acui­


dade visual, exceto nos casos em que existe comprometimento corneano associado, como,
por exemplo, na ceratoconjuntivite epidêmica.

Tipos de iluminação da conjuntiva na lâmpada de fenda


ILUMINAÇÃO DIRETA DIFUSA: estuda a conjuntiva como um todo e sua interação com as estru­
turas oculares adjacentes. Através da iluminação direta difusa, é possível a análise das bordas
palpebrais, cílios, orifícios das glândulas de Meibomius e pontos lacrimais. Esse tipo de ilu­
minação é realizado com a fenda aberta ao máximo e a luz incidindo diretamente de forma
perpendicular ou oblíqua na superfície ocular.

Deve-se atentar à avaliação do aspecto anatômico da conjuntiva, estado do epitélio, análi­


se dos vasos conjuntivais, lubrificação da superfície conjuntival, estenose dos vasos, ingurgita­
mento, tortuosidade, hemorragias subconjuntivais, linfangiectasias, hemangiomas, avaliação
do fundo de saco conjuntival, conjuntiva palpebral e margem palpebral.
Para o exame completo da conjuntiva, deve-se avaliá-la nas posições extremas do olhar.
Por exemplo, para o exame da região nasal da conjuntiva, pede-se que o paciente faça abdu­
ção.
■ Iluminação direta em fenda: este tipo de iluminação é realizado com a fenda fechada par­
cialmente, formando um corte óptico. Tem a finalidade de observar forma, relevo e densi-
Semiologia Básica da Conjuntiva | 175

dade de alterações conjuntivais. Este tipo de iluminação é muito utilizado para a avaliação
da córnea.
■ Iluminação com filtro verde: o filtro verde da lâmpada de fenda é usado com a finalidade
de melhor evidenciar as alterações vasculares da conjuntiva.

Exame do fundo de saco inferior


Para a avaliação do fundo de saco inferior, deve-se tracionar a borda palpebral inferior para
baixo e pedir que o paciente olhe para cima. Assim, todo o fundo de saco fica exposto, facili­
tando a observação da conjuntiva em toda a sua extensão.

Exame do fundo de saco superior


O exame do fundo de saco superior é realizado através da inversão da pálpebra superior. Para
inverter a pálpebra superior, pede-se que o paciente mantenha os olhos relaxados e olhando
para baixo. Deve-se então tracionar a borda palpebral superior para longe da superfície ocular
e, com o dedo indicador da mão contralateral ou com o auxílio de um cotonete, empurrar a
borda superior da cartilagem tarsal para baixo e fazer, ao mesmo tempo, um movimento con­
trário para cima com a mão que segura a borda palpebral.
No exame do fundo de saco, deve-se atentar para a coloração da mucosa conjuntival, áreas
pigmentadas, presença de edema ou de sinais específicos, como folículos ou papilas. Também
devem ser observados a presença e tipo de secreção conjuntival, além de cicatrizes ou encur­
tamento do fundo de saco. É muito importante que esta análise seja minuciosa principalmente
quando há história de corpo estranho. Nestes casos, é interessante pingar 1 gota de anestési­
co e passar um cotonete em fundo de saco. Além disso, a córnea também deve ser examinada.
Observar se existe alguma lesão que possa ser proveniente de um corpo estranho conjuntival.

Biomicroscopia das alterações conjuntivais


PAPILA (FIG. 5): consiste em uma hiperplasia do epitélio conjuntival, constituída por elementos
do sistema imune (linfócitos, plasmócitos e eosinófilos) que, centrados por um vaso sanguí­
neo, localizam-se na conjuntiva palpebral e no limbo, onde o epitélio conjuntival adere-se às
estruturas subjacentes através de um septo fibroso. Geralmente, as papilas estão associadas a
processos infecciosos, alérgicos ou irritativos crônicos. Seu tamanho pode ser muito variável.

Fig. 5 Papilas.
176 | Semiologia Básica em Oftalmologia

No exame biomicroscópico, quando são de tamanho pequeno ou mediano, formam um mo­


saico, sendo possível observar um tufo vascular no centro de cada papila. Quando são muito
grandes (papilas gigantes), aparecem como vegetações papilomatosas, podendo até causar
lesões crônicas e graves no epitélio corneano.
As causas são blefarite crônica, conjuntivites alérgica e bacteriana, uso de lentes de con­
tato e ceratoconjuntivite límbica superior.

FOLÍCULOS (FIG. 6): aparecem como pequenas elevações arredondadas, translúcidas ou opa­
lescentes, formadas por focos subepiteliais de tecido linfoide hiperplásico. Cada folículo é
circundado por pequenos vasos, sendo encontrados somente nos fundos de saco conjuntivais.
Quanto mais grave e duradoura a inflamação, maiores os folículos.
As causas são infecções virais e por clamídia, síndrome oculoglandular de Parinaud e hi-
persensibilidade a medicações tópicas.

HIPEREMIA: ocorre pela dilatação dos vasos conjuntivais. Sua intensidade é muito variável e
depende da causa. Através da conjuntiva, podem-se observar os vasos episclerais. Para dife­
renciar os vasos conjuntivais dos episclerais basta observar ou induzir a movimentação da con­
juntiva com um cotonete. Os vasos conjuntivais irão mover-se juntamente com a conjuntiva
enquanto os vasos episclerais permanecem imóveis.
As causas da hiperemia conjuntival são as patologias que cursam com inflamação da su­
perfície ocular, trauma que gera irritação da conjuntiva e os erros refrativos.

SECREÇÃO: ao exame clínico, é importante observarmos o tipo de secreção, para fornecer


suporte clínico para o diagnóstico. Aspectos como cor, quantidade e viscosidade devem ser
analisados.
As secreções conjuntivais evidenciam reação inflamatória aguda ou crônica. Dependen­
do do tipo e causa da reação inflamatória, a secreção conjuntival terá um aspecto específico,
sendo composta principalmente pelo exsudato proveniente dos vasos dilatados e filtrada pelo
epitélio conjuntival.
A secreção conjuntival pode ser aquosa, mucosa, purulenta, mucopurulenta ou serossan-
guinolenta.
■ Aquosa: exsudato seroso e lágrima proveniente da secreção reflexa. Típica das conjuntivites
virais e alérgicas agudas.

Fig.6 Folículos.
Semiologia Básica da Conjuntiva | 1 7 7

■ Mucosa: típica da conjuntivite vernal e do olho seco.


■ Purulenta: ocorre nos casos de conjuntivite aguda bacteriana. Geralmente de coloração
amarelada ou esverdeada.
■ Mucopurulenta: geralmente associada a infecções bacterianas e por clamídia.
■ Serossanguinolenta: ocorre principalmente nas infecções virais graves.

Quando a conjuntivite se torna crônica, apesar de cada tipo de secreção nos orientar para
um tipo de agente etiológico, o ideal é recorrer à análise laboratorial para definirmos adequa­
damente o tratamento e minimizar o desconforto do paciente, bem como as possíveis seque­
las de uma infecção tratada inadequadamente.

HEMORRAGIA SUBCONJUNTIVAL (HIPOSFAGMA): é a presença de sangue no espaço subconjun-


tival, que ocorre devido à rotura de um vaso sanguíneo da conjuntiva. Pode ocorrer de for­
ma idiopática ou por hipertensão arterial sistêmica, trauma contuso, manobra de Valsalva,
uso de anticoagulantes ou discrasias sanguíneas. Apresenta-se como uma mancha de cor
vermelho-vinhoso (sangue) na área onde ocorreu o extravasamento (a coloração depende do
tempo em que o sangue está estagnado). Pode ocorrer em toda a área conjuntival quando o
sangramento é mais extenso. No caso de trauma ocular, o hiposfagma pode estar associado a
uma laceração de conjuntiva, em que normalmente a conduta é expectante.
EDEMA (FIG. 7): presença de fluido que atravessa a parede dos vasos inflamados e deposita-se
entre a conjuntiva e a esclera de forma difusa ou localizada. Devido à sua firme aderência
aos planos adjacentes na conjuntiva palpebral, o edema não ocasiona elevação nesta região.
Na conjuntiva bulbar, o edema produz levantamento do epitélio, que pode ser especialmen­
te marcado ao redor do limbo, aparecendo uma elevação circular ao redor de toda a córnea
(quemose). Entre as principais causas estão as conjuntivites alérgicas agudas e as infecciosas.
PSEUDOMEMBRANAS: consistem em exsudatos coagulados aderentes ao epitélio conjuntival
inflamado. São facilmente removidas, deixando o epitélio intacto. As causas são conjuntivite
adenoviral intensa, infecções gonocócicas, conjuntivite lenhosa e síndrome de Stevens-John-
son.
MEMBRANAS VERDADEIRAS: infiltram-se entre as camadas superficiais do epitélio. As tentati­
vas de retirada são geralmente seguidas pela descamação do epitélio e sangramento local. As
causas são infecções por S. pyogen es e difteria.
FIBROSE CONJUNTIVAL: ocorre principalmente nos casos de lesões cicatriciais da conjuntiva ou
inflamações crônicas.

Fig.7 Quemose.
178 | Semiologia Básica em Oftalmologia

As causas são penfigoide cicatricial, conjuntivite alérgica crônica, tracoma e síndrome de


Stevens-Johnson.

CONJUNTIVOCALASE: caracteriza-se pela presença de dobras redundantes, frouxas, não ede-


matosas da conjuntiva bulbar inferior interposta entre o globo e a pálpebra inferior. Essa
condição tende a ser bilateral, podendo localizar-se nas partes lateral, central e medial da con­
juntiva. É mais comumente encontrada em idosos, embora já tenha sido descrita em pacientes
jovens com até 15 anos de idade. Há associações com dermatocalase, lagoftalmo, pseudopte-
rígio e pinguécula.
CISTOS CONJUNTIVAIS: acúmulo de conteúdo fluido claro sob o epitélio conjuntival, apresen­
tando parede bem delgada.
CONCREÇÕES: consistem em pequenos e múltiplos depósitos branco-amarelados, mais comu­
mente encontrados na conjuntiva tarsal inferior e fórnice. Mais comuns em indivíduos idosos
e podem causar sensação de corpo estranho.
SIMBLÉFARO (FIG. 8): é uma complicação resultante da aderência entre as conjuntivas bulbar e
palpebral, de intensidade variável, podendo restringir os movimentos extraoculares.

As causas são penfigoide cicatricial, conjuntivite atópica crônica, tracoma, síndrome de


Stevens-Johnson, queimaduras químicas e térmicas, entre outras.

ANQUILOBLÉFARO: é a formação de aderência entre as pálpebras inferior e superior no canto


externo.

As causas são as doenças inflamatórias crônicas da superfície ocular, queimaduras quími­


cas e térmicas, penfigoide cicatricial e síndrome de Stevens-Johnson.

PINGUÉCULA (DEPÓSITOS DE LIPÍDIOS) (FIG. 9): são depósitos branco-amarelados na conjuntiva


bulbar adjacente ao limbo temporal ou nasal. Podem induzir reação inflamatória conjuntival
(pingueculite).
PTERÍGIO (FIG. 10): é a proliferação desordenada de tecido fibrovascular da conjuntiva em di­
reção à córnea, podendo ser nasal e/ou temporal. A etiologia ainda é desconhecida, porém
alguns estudos mostram que existe influência de fatores ambientais (exposição crônica a pó,
poeira, fumaça e aos raios ultravioleta) e genéticos. Pode ser primário ou recidivado.

Fig.8 Simbléfaro.
Semiologia Básica da Conjuntiva | 179

Fig. 9 Pinguécula.

TUMORES CONJUNTIVAIS: são alterações da conjuntiva que podem geralmente estar relaciona­
das à pigmentação (nevo, melanoma) (Fig. 11), vascularização (hemangioma) ou proliferação
tecidual (carcinoma epidermoide). Quando se observa uma lesão na conjuntiva com carac­
terísticas suspeitas de malignidade, deve-se utilizar corante como o azul de toluidina, que
possui afinidade por células displásicas. Caso as lesões suspeitas corem, é um dado a mais
para definir a conduta a ser seguida. Nos casos em que há dúvida no diagnóstico, a biópsia é
fundamental. Na suspeita de malignidade, deve-se proceder a biópsia excisional associada à
aplicação de mitomicina C ou crioterapia.

Fig.11 Nevo conjuntival melanocítico.

Avaliação do estado microcirculatório através da biomicroscopia


conjuntival
Entre os inúmeros métodos clínicos de pesquisa da microcirculação, o mais promissor é a bio­
microscopia da conjuntiva bulbar. O valor deste método em pesquisas clínicas é decorrente de
180 I Semiologia Básica em Oftalmologia

sua completa informação, disponibilidade, não invasivo, próximo às condições naturais. Uma
oportunidade de supervisionar praticamente todas as partes do sistema microcirculatório.
Portanto, a biomicroscopia conjuntival permite estimar a condição dos microvasos (arteríolas,
vênulas, capilares), espaços perivasculares, estrutura do fluxo sanguíneo, tipo e grau de lesões
intravasculares da microcirculação.

BIBLIOGRAFIA
Anishchanka U, Konstantinova E, Lapitskii V, et ai Development of the method of the bulbar conjunctiva images estima­
tion for investigation of microcirculation state in cardiovascular diseases. Annales AcademiaeMedicae Bialostocensis. Vol.
50, suppl. 2,2005.
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Dantas AM. Anatomia Funcional do Olho e Seus Anexos. Rio de Janeiro: Colina, 1983; p. 435.
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Kanski JJ. Oftalmologia Clínica: Uma abordagem sistemática, 5â ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2004; p. 733.
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Oftalmol, Vol 7, n. 4,2004.
Spalton DJ, Hitchings RA, Hunter PA. Atlas Colorido de Clínica Oftalmológica, 2- ed. São Paulo: Manole, 1998.
Yamane R. Semiologia Ocular. 2- ed., Rio de Janeiro: Cultura Médica, 2003; p. 460.

Literatura Sugerida
1. Gomes JAP, Alves MR. Superfície Ocular: Córnea, limbo, conjuntiva, filme lacrimal. Rio de Janeiro: Cultura Médica, 2006;
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2. Yamane R. Semiologia Ocular. 2- ed., Rio de Janeiro: Cultura Médica, 2003; p. 460.
3. Kanski JJ. Oftalmologia Clínica: uma abordagem sistemática, 5â ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2004. p. 733.
Semiologia Básica da Córnea

GLAUCIO DE GODOY • CINARA S. DE OLIVEIRA GODOY

INTRODUÇÃO

A córnea é um tecido transparente que corresponde à porção anterior da túnica fibrosa exter-
r

na do globo ocular. Possui função óptica e de proteção das estruturas anteriores do olho. E
avascular e inervada por uma fina rede amielínica derivada do nervo nasociliar. Por ser a estru­
tura mais anterior do bulbo ocular, a córnea possui fácil acessibilidade, o que torna mais fácil
o seu exame e o diagnóstico das várias doenças que a acometem.

ANATOMIA

A córnea possui diâmetro horizontal que varia de 11 a 12 mm e vertical de 10 a 11 mm. O seu


ápice possui raio de curvatura anterior de aproximadamente 7,8 mm e posterior de 6,6 mm.
A espessura da córnea central é de aproximadamente 0,5 mm, aumentando para 0,7 mm na
periferia. Apresenta poder refrativo axial de aproximadamente 43 dioptrias.
Existem cinco camadas histológicas distintas. O epitélio consiste em células colunares
basais, presas à sua membrana basal, células alares intermediárias e células superficiais alon­
gadas, com núcleos achatados em contato direto com o filme lacrimal. A camada de Bowman é
uma condensação acelular do estroma superficial com aproximadamente 10 a 20 micrômetros
de espessura, que fica imediatamente abaixo da membrana basal epitelial. O estroma forma
mais de 90% da espessura da córnea e consiste em lamelas colágenas em uma matriz de pro-
teoglicanos entremeada com ceratócitos. A membrana de Descemet é composta por uma tra­
ma de fibrilas colágenas que tem cerca de 3 micrômetros de espessura ao nascimento, a qual
aumenta continuamente com o tempo devido à atividade das células endoteliais. O endotélio
consiste em uma única camada de células hexagonais que não se dividem durante a vida, mas
que são capazes de aumentar e espalhar-se para preencher defeitos na camada celular.

181
182 | Semiologia Básica em Oftalmologia

SEMIOLOGIA

Na prática diária, a maioria das informações clínicas necessárias para o diagnóstico das doen­
ças corneanas mais comuns pode ser obtida a partir de anamnese detalhada e exame oftal­
mológico minucioso, feito através de aparelhos ao alcance do oftalmologista geral. Cabe ao
médico obter o maior número possível de informações através de seu exame, interpretá-las e
decidir sobre a necessidade ou não de exames subsidiários.

Medida da acuidade visual e refração


A medida da acuidade visual é de grande importância para se avaliar o grau de comprometi­
mento da visão de um paciente frente a uma possível doença corneana. A esquiascopia reali­
zada durante este exame traz informações vitais sobre as condições dos meios refrativos e em
especial da córnea. Pacientes com ectasias corneanas, como o ceratocone, podem apresentar
o sinal característico do “reflexo em tesoura” que caracteriza a irregularidade na superfície
corneana decorrente da doença. Da mesma forma, opacidades corneanas de diversas causas
podem ser observadas através deste exame inicial. A medida da acuidade visual potencial
(PAM) consiste em outra forma de se determinar a capacidade de visão de um paciente com
opacidade central ou com irregularidade na superfície corneana.

Ectoscopia
O exame ocular externo das estruturas oculares deve ser feito preferencialmente à luz do
dia, ou em sala bem iluminada, a fim de se observar aspectos gerais de defeitos grosseiros
que possam estar alterando a anatomia corneana. Algumas doenças corneanas congênitas são
facilmente diagnosticadas através de exame ectoscópico, tais como megalocórnea, microcór-
nea, córnea oval, esclerocórnea, entre outras. Em pacientes com ceratocone, o sinal de Mun-
son pode ser evidenciado e consiste na observação da curvatura corneana exacerbada através
da análise de seu contorno moldado na pálpebra inferior do paciente quando este olha para
baixo (Fig. 1).

Sinal de Munson.

Biomicroscopia
É o exame que mais subsídios traz ao estudo clínico da córnea. A sua maior eficiência depende
do emprego de diferentes técnicas de iluminação.
Semiologia Básica da Córnea 183

I l u m i n a ç ã o d i r e t a

É aquela em que a focalização, tanto do objeto quanto da luz, está localizada em um mesmo
plano. Pode ser de diferentes tipos:
■ Iluminação direta difusa, na qual se projeta um feixe luminoso cilíndrico com o objetivo de
se analisar a córnea como um todo.
■ Iluminação direta focal, que tem como objetivo a análise dos detalhes anatômicos e que, para
o estudo da córnea, pode ser de dois tipos:
• Em paralelepípedo, na qual se projeta um feixe de luz de formato retangular, contendo
faces anterior, posterior, duas faces laterais e bases superior e inferior. Tem como objeti­
vo o estudo da posição de lesões em relação às camadas da córnea.
• Corte óptico, no qual se projeta um feixe extremamente fino que irá formar duas linhas:
linha do perfil anterior (filme lacrimal, epitélio, camada de Bowman e primeiras lamelas
do estroma) e linha do perfil posterior (últimas lamelas do estroma, Descemet e endo-
télio). Tem como objetivo o estudo das depressões, das saliências e da localização de
lesões na córnea.
■ Iluminação tipo especular, é obtida através do fenômeno de reflexão total quando o raio lu­
minoso atravessa dois meios com índices de refração diferentes e o ângulo formado entre
o braço de iluminação e o braço do microscópio é superior a 60°. Esse tipo de iluminação
é monocular devido à pequena área de estudo.

I l u m i n a ç ã o i n d i r e t a

É aquela em que a focalização do objeto e da luz se faz em planos diferentes. Pode ser:
■ Iluminação indireta focal, na qual o feixe luminoso é projetado próximo à lesão corneana para
o estudo de suas margens. Nesse tipo de iluminação é necessário desacoplar a lâmpada de
fenda (sistema de iluminação paralelo ao microscópio).
■ Iluminação indireta difusa, também conhecida como diafanoscopia ou retroiluminação. É
aquela em que se projeta o feixe luminoso no plano localizado atrás do objeto em obser­
vação e tem como objetivo estudar as estruturas sob um campo retroiluminado. Pode ser:
• Campo negro, no qual projeta-se a luz na periferia da córnea e coloca-se o campo do mi­
croscópio em direção à córnea (lâmpada desacoplada); tem como objetivo o estudo do
r

epitélio e estruturas anteriores da córnea e do limbo oposto à incidência da luz. E útil no


estudo de microedemas setoriais ou difusos;
r

• Campo amarelo, na qual projeta-se o feixe luminoso bem inclinado na íris. Util para o
estudo de precipitados ceráticos e vasos na córnea.

Devem-se observar que as camadas de Bowman e de Descemet não são visíveis ao exame
biomicroscópico. Da mesma forma, o epitélio também não é visível; observa-se no seu lugar
um espaço opticamente vazio.
As doenças adquiridas podem ser classificadas através de sua localização na córnea. Para
o diagnóstico biomicroscópico destas anomalias, além do emprego das diferentes técnicas de
iluminação anteriores, o uso de corantes vitais é de grande auxílio ao oftalmologista geral.
Tem, entre outras indicações, papel importante na detecção de lesões corneanas epiteliais. O
uso de fluoresceína, apresentada na forma de colírio ou bastão, é indicado para detectar defei­
184 Semiologia Básica em Oftalmologia

tos epiteliais, impregnando-se estes locais. Implica no emprego de filtro azul-cobalto, presen­
te na haste de iluminação da lâmpada de fenda. O rosa-bengala é usado para destacar células
epiteliais anormais e alterações de superfície ocular associadas ao olho seco, pois impregna-se
em células desvitalizadas e naquelas que perderam sua superfície mucosa normal.

A l t e r a ç õ e s d o e p i t é l i o

Edema
Quando de aparecimento agudo, ocorre por quebra da barreira epitelial ou endotelial (glau-
coma, ceratite, distrofia de Fuchs, traumatismo, uveítes e após cirurgias oculares). O edema
macrobolhoso pode ser observado através de corte óptico; já o edema microbolhoso, pode
apenas ser observado através de iluminação em campo negro.

Vesículas
São formações arredondadas, bem delimitadas, que fazem saliência no perfil anterior da cór­
nea e que contêm líquido em seu interior. O corte óptico é a iluminação de escolha.

Filamentos
São compostos por muco recoberto por células epiteliais degeneradas. Possuem uma base
que se encontra aderida em uma área do epitélio e uma terminação livre. Coram apenas com
rosa-bengala. Ocorrem em processos degenerativos, edema prolongado, olho seco, ceratocon-
juntivite límbica superior, ceratite herpética e blefaroespasmo essencial. Estudados através de
iluminação indireta focal e em paralelepípedo.

Xerose
Caracteriza-se pela queratinização das células superficiais do epitélio corneano apresentando
perda do brilho e ressecamento. Ocorre em pacientes desnutridos e com deficiência de vita­
mina A. No corte óptico observa-se irregularidade na superfície corneana.

Epiteliopatia pontilhada
Caracterizada por pequenos pontos branco-acinzentados, levemente deprimidos, que coram
bem com a fluoresceína e não com o rosa-bengala (Fig. 2). É um sinal inespecífico de cerato-
patia, ocorrendo em diversas doenças. Iluminação indireta focal: permite determinar se as

Fig. 2 Epiteliopatia pontilhada corando com fluoresceína.


Semiologia Básica da Córnea 185

lesões estão em atividade. As lesões ativas apresentam margens borradas e as formas inativas
apresentam margens a pique.

Cerotite epiteliol pontilhado


Caracterizada por opacidades epiteliais granulares branco-acinzentadas, levemente elevadas,
múltiplas, isoladas ou confluentes, que coram bem com o rosa-bengala e pouco ou nada com
a fluoresceína. Ocorre nas infecções virais, especialmente por adenovírus e herpes simples e
na ceratite pontilhada de Thygeson. Iluminação indireta focal: permite determinar se as lesões
estão ou não em atividade.

Infiltrado subepitelial
É uma opacidade inflamatória, em forma de moeda, na porção anterior da Bowman, que ocor­
re especialmente na ceratoconjuntivite epidêmica. Campo negro: fornece uma visão global
dos infiltrados tanto no que diz respeito à quantidade quanto ao tamanho das lesões. Ilumina­
ção indireta focal: é a mais utilizada, pois permite avaliar a presença de edema circunlesional.

Defeito epitelial
É uma área focal de perda epitelial, causado geralmente por trauma e que cora muito bem com
a fluoresceína. Com o tratamento adequado cicatriza sem deixar sequelas. Os defeitos epite­
liais persistentes são as erosões corneanas, que não cicatrizam no período de tempo espera­
do. Ocorrem na ceratopatia neurotrófica (Fig. 3), ceratite herpética, queimaduras químicas,
olho seco e uso crônico de anestésicos tópicos e outros colírios.

Fig. 3 Úlcera neurotrófica com defeito epitelial persistente.

Pannus
É um tecido com surgimento secundário a uma inflamação infiltrante e proliferante, carac­
terizado por abundante vascularização na região límbica. Pode ser encontrado em diversas
doenças. Corte óptico: vê-se uma camada de 1 a 2 mm de espessura, constituída pelo epitélio
e tecido infiltrado.
Na fase de regressão e de esclerose do pannus, tem-se biomicroscopicamente:
■ Corte óptico: diminuição da espessura da zona de Bowman.
■ Paralelepípedo: diminuição do ingurgitamento vascular pelo desaparecimento de seus ra­
músculos mais finos e pela diminuição da infiltração.
186 Semiologia Básica em Oftalmologia

Alterações da camada de Bowman


Roturas
No ceratocone e nos traumatismos, podem ocorrer roturas desta camada e, como ela não se
regenera, este local é ocupado por células do epitélio. Corte óptico: deve ser realizado para se
diferenciar as roturas desta camada daquelas da membrana de Descemet.

Degeneração em faixa
r

E uma faixa opaca, superficial, branca ou ligeiramente cinza, ocupando a zona da córnea cor­
respondente à fenda palpebral. Tem seu início próximo à região límbica nasal ou temporal,
deixando um espaço de tecido normal entre o limbo e sua posição inicial. Iluminação direta
focal: esta camada mostra zonas de espessamento mais brancas, alternadas com zonas mais
finas, em geral redondas, dando a aparência de buracos. Em grande aumento, pode-se consta­
tar que esta camada é finamente granulosa.

Alterações do estroma
Infiltrados estromais
Iluminação direta difusa: são observados como opacidades granulares focais no nível do es­
troma.
Corte óptico: mostra um aumento da distância entre as linhas de perfil anterior e poste­
rior e permite estudar sua profundidade.
Campo amarelo: importante no caso de lesões profundas, para determinar se o infiltrado
está em atividade.

Edema estromaI
Observam-se espaços opticamente vazios entre as lamelas do estroma, aumento da espessura
da córnea e diminuição da transparência.

Arco lipídico
Aparece sempre sob a forma de um anel esbranquiçado, tendo algumas vezes nuances cinza
ou amarelo. É concêntrico à periferia da córnea, deixando um espaço livre entre o limbo e a
sua margem proximal. Corte óptico: o arco lipídico atinge as camadas posteriores e o terço
anterior do parênquima. Paralelepípedo: a estrutura se mostra granulada.

Ceratite estroma/necrosante
Caracterizada por infiltrado inflamatório amarelo-esbranquiçado, edema, com ou sem neo-
vasos no estroma corneano. Ocorre nas ceratites bacterianas, fúngicas e no herpes simples
ocular.
Semiologia Básica da Córnea 187

Ceratite estroma/Não necrosante (disciforme)


Ocorre geralmente em adultos e é unilateral. Caracteriza-se pelo aparecimento de um disco
cinzento, situado nas camadas intermediárias do estroma, geralmente com uma opacidade
central mais densa, comumente de etiologia herpética. Corte óptico: a linha do perfil posterior
está abaulada em direção à câmara anterior, enquanto a linha do perfil anterior é quase nor­
mal, com dobras de Descemet; nos casos de irite, com precipitados ceráticos. Paralelepípedo:
aspecto discoidal, cor cinzenta dentro do estroma.

Ceratite periférica
Inicia como um infiltrado acinzentado perilímbico, com tendência a progredir circunferencial-
mente e centralmente e evolui com erosão do epitélio e degeneração das camadas superficiais
do estroma. Corte óptico: é a iluminação de escolha para o estudo das ceratites periféricas,
especialmente das formas não degenerativas, pois permite a determinação da profundidade
das lesões.

Dellen
Consiste em uma depressão e afinamento localizados na região periférica da córnea, adjacen-
tes a uma área elevada do limbo (Fig. 4). A fluoresceína deposita-se na lesão, mas o epitélio
geralmente está preservado.

Fig. 4 Dellen na região nasal, caracterizado por afinamento local.

Vascularização estromal
Os vasos corneanos observados à biomicroscopia são veias, pois as artérias dificilmente são
vistas. Paralelepípedo: permite a localização dos vasos na profundidade do estroma. Campo
amarelo: permite a diferenciação entre os vasos esclerosados, chamados fantasmas, dos ner­
vos corneanos.

Ectasia cornearia ou ceratocone anterior


A córnea apresenta-se fina em seu centro e, pouco a pouco, projeta-se para diante. Tem-se, nesta
entidade, a presença das linhas de Vogt. Corte óptico: diminuição da espessura corneana.
188 Semiologia Básica em Oftalmologia

Alterações da membrana de Descemet


Pregas da membrana de Descemet
As dobras da membrana de Descemet representam uma diminuição da pressão intraocular e
caracterizam-se biomicroscopicamente por duas linhas brilhantes separadas por um espaço
escuro. Estas linhas geralmente são tortuosas, e esta tortuosidade é decorrente do aspecto
elástico da membrana de Descemet. Iluminação direta focal: com o paralelepípedo, vê-se uma
estria com reflexo dourado central; tal estria apresenta uma forma de sulco, em cujas margens
não há brilho; vê-se o aspecto de invaginação da membrana de Descemet para a câmara ante­
rior. Corte óptico: mesmo aspecto. Campo negro: observam-se estrias escuras e diminuição da
transparência da córnea.

Roturas da Descemet
São observadas, na iluminação tipo paralelepípedo estreito, como estrias geralmente forma­
das por simples linhas vítreas, sem o brilho dourado ou a protrusão para a câmara anterior.
Ocorrem no glaucoma congênito, tocotraumatismo e ceratocone (Fig. 5).

Hidropsia aguda no ceratocone: rotura da Descemet.

Alterações do endotélio
Edema endotelial
O mosaico do endotélio torna-se enfumaçado. Iluminação direta focal: de difícil estudo, po­
rém, em certas fases, no corte óptico vê-se aumento da espessura da linha do perfil posterior.

Endotelite
Apresenta-se, na iluminação tipo paralelepípedo de média espessura, com precipitados queráti-
cos, isolados ou formando linhas, que podem iniciar-se perifericamente e progredir para o cen­
tro, causando edema corneano secundário. Em casos graves, observam-se placas esbranquiçadas
no endotélio e reação inflamatória na câmara anterior. Corte óptico: mostra, nos casos agudos,
irregularidades na linha do perfil posterior. Nos casos crônicos, esta se mostra anfractuosa.

Ceratite guttata de Vogt


Iluminação especular: o mosaico dourado do endotélio é preenchido por pequenos espaços
arredondados, delimitados, escuros, que são os corpúsculos de Hassal-Henle.
Semiologia Básica da Córnea | 189

Precipitados queráticos
São depósitos de células e fibrinas, localizados no endotélio corneano, que podem se apre­
sentar sob variadas formas, tamanhos e colorações. Os depósitos de fibrina estão geralmente
presentes nas fases iniciais de qualquer processo inflamatório. São caracterizados por depósi­
tos finos, localizados especialmente na metade inferior do endotélio. Os depósitos de células
inflamatórias tipo mutton-fat apresentam aspecto de pequenas gotas de cera, às vezes coales-
centes. Podem sofrer pigmentação amarelada. São encontrados nas iridociclites granuloma-
tosas e considerados sua característica principal. Os depósitos de células inflamatórias tipo
branco possuem aspecto morfológico constante durante sua evolução, quer em tamanho ou
na coloração. Localizam-se principalmente na metade inferior da córnea e são característicos
das iridociclites não granulomatosas. O campo amarelo permite o estudo das margens das le­
sões, determinando se há atividade inflamatória.

Depósitos de pigmentos
O fuso de Krukenberg-Axenfeld consiste em uma melanose endotelial secundária à deposição
de pigmento provenientes da íris, no glaucoma pigmentário. Campo amarelo: é a iluminação
de eleição para o seu estudo.
O anel pigmentar de Kayser-Fleisher consiste em um anel límbico que aparece na doença
de Wilson. O paralelepípedo estreito é usado para o seu estudo, com movimento de varredu­
ra, para determinar a extensão da lesão. O corte óptico define a profundidade e espessura do
anel.

Depósitos de metais
Crisíase ocular é o nome dado ao depósito de ouro na córnea e é caracterizado por grânulos
finos de cor dourada a violeta no estroma.
A impregnação por mercúrio caracteriza-se pela opacidade homogênea, de cor rosada ou
castanha no estroma corneano.
O depósito de cobre na córnea é chamado de calcose e é observado como uma coloração
azul-esverdeada entre o endotélio e a Descemet.
A argirose, que é a impregnação pela prata, localiza-se nas membranas basais do epitélio
e endotélio, conferindo-lhes uma cor cinza-azulada, esverdeada ou dourada.
A impregnação por ferro, ou siderose, caracteriza-se pela presença de grânulos cinzentos
no estroma superficial e no epitélio. O paralelepípedo e o corte óptico são as iluminações de
eleição para o estudo dos depósitos de metais na córnea.
As iluminações direta difusa e de campo negro devem ser usadas quando a localização dos
depósitos for epitelial.

Depósitos de fármacos
A clorpromazina se deposita em grânulos amarelos, marrons ou brancos no estroma profundo.
A cloroquina e a amiodarona formam múltiplos pontos brancos ou amarelos no epitélio
corneano.
190 Semiologia Básica em Oftalmologia

O uso prolongado de epinefrina pode provocar depósitos corneanos escuros, marrons ou


negros.

Análise da curvatura corneana (ceratometria e ceratoscopia)


O conhecimento dos valores da curvatura corneana ajuda na análise de pacientes candidatos
a procedimentos refrativos ou à adaptação de lentes de contato, bem como no diagnóstico e
tratamento de doenças que afetam a córnea.

Ceratometria
No ano de 1728 Pourfour de Petit inventou um aparelho conhecido como oftalmômetro, mais
tarde aperfeiçoado por Javal (1883) e Helmholtz (1924), dando origem ao atual ceratômetro
capaz de medir a curvatura anterior da córnea.
O ceratômetro atua projetando um círculo luminoso sobre a córnea a uma distância co­
nhecida. O círculo projetado será refletido pela córnea do paciente e poderá ser visto pelo exa­
minador através do aparelho. Com a utilização de prismas, a imagem obtida é dividida em três
círculos orientados a 90° um do outro, que serão utilizados na medição da curvatura corneana
central em dois eixos. Estes círculos possuem sinais de (+ ) e (-) conforme ilustrado (Fig. 6).
Após o alinhamento e a focalização das imagens, deve-se proceder à verificação do eixo
do astigmatismo através da rotação do ceratômetro, até que os sinais de (+ ) dos dois círculos
inferiores estejam no mesmo plano, conforme ilustrado adiante (Fig. 7).
A medida do diâmetro corneano horizontal é feita por meio da sobreposição dos dois
sinais de (+), que é obtida girando-se o botão correspondente do ceratômetro. Da mesma
forma, obtém-se o diâmetro vertical pela sobreposição dos dois sinais de (-) dos círculos à
direita, girando-se o botão oposto ao anterior (Fig. 8).
O mecanismo de funcionamento do ceratômetro pode ser explicado pelo fato de o ta­
manho da imagem determinar a curvatura corneana. Assim, quanto menor for o tamanho do
círculo refletido, mais curva será a córnea e vice-versa. Dessa forma, uma córnea com diâmetro
vertical mais curvo que o horizontal, refletirá os círculos ligeiramente elípticos, com menor
diâmetro no sentido vertical. Portanto, ao medir as distâncias horizontal e vertical o aparelho
realiza o cálculo da curvatura corneana e, consequentemente, do seu astigmatismo. A deter-

Fig. 6 Imagem produzida pelo ceratômetro Bausch & Lomb.


Semiologia Básica da Córnea 191

EIXO HORIZONTAL NÃO ALINHADO EIXO HORIZONTAL ALINHADO

O O
o o
Fig. 7 Verificação do eixo do astigmatismo após alinhamento e focalização das
imagens.

A1 - Sinal de (+) não sobreposto B1 - Sinal de (-) não sobreposto


A2 - Sinal de (+) sobreposto B2 - Sinal de (-) sobreposto

Õ~

Fig. 8 Sobreposição dos sinais (+) e dos sinais (-) dos círculos.

minação do astigmatismo corneano é especialmente útil na medição do poder das lentes in-
traoculares e na adaptação de lentes de contato.
A ceratometria é um método preciso para a medida do contorno corneano. Ela, entretan­
to, fornece dados limitados, uma vez que a porção periférica da córnea não é analisada e sim
apenas os seus 3 mm centrais. Além disso, a ceratometria assume que a córnea é esférica ou
esferocilídrica em casos de astigmatismo corneano. Córneas com astigmatismo irregular ou
submetidas à cirurgia refrativa possuem formas notadamente diferentes destas. Mesmo olhos
normais podem apresentar córneas assimétricas. Nesses casos, somente uma avaliação gros­
seira poderá ser realizada.
192 Semiologia Básica em Oftalmologia

Em pacientes com curvaturas muito elevadas, como nos casos de ceratocone, a imagem
produzida será bastante pequena e distorcida, muitas vezes ultrapassando os limites do ins­
trumento. Nesses casos, podemos adaptar uma lente positiva e então transformar a leitura de
acordo com tabelas de conversão.
Existem situações onde o diâmetro mais curvo não é perpendicular ao diâmetro mais
plano, nesses casos, as leituras devem ser tomadas separadamente e anotados os dois eixos.
Estaremos frente a um astigmatismo chamado bioblíquo.

Ceratoscopia
A ceratoscopia é o exame utilizado para avaliar a regularidade da curvatura anterior da córnea.
Para tal, utiliza-se um aparelho conhecido como ceratoscópio, que projeta múltiplos anéis
concêntricos sobre a superfície corneana. O princípio não difere da ceratometria e baseia-se
no fato de a córnea poder se comportar como um espelho esférico convexo ao se incidir uma
luz sobre ela. A partir dos experimentos responsáveis pela descoberta dessa propriedade da
córnea, surgiram os primeiros ceratoscópios.
Foi Plácido quem, em 1880, desenvolveu o primeiro aparelho, consistindo em um disco
plano com cinco anéis concêntricos alternados em preto e branco pintados ao redor de um
orifício central e com uma fonte luminosa atrás do ombro do examinador. Este observa a cór­
nea através da abertura central do disco. Com o disco de Plácido temos condições de examinar
aproximadamente 40% da superfície corneana. Mais tarde, o aparelho foi aperfeiçoado e popu­
larizado por Gullstrand e mais recentemente por Rowsey et al. (1988; 1981).
O termo ceratoscopia corresponde à observação direta das imagens refletidas na córnea
através do aparelho. Informações topográficas de uma grande área da córnea podem ser obti­
das com este exame, bem como uma grande variedade de anomalias do formato corneano. Se
estas imagens puderem ser fotografadas, tem-se então a fotoceratoscopia. Alguns fotoceratos-
cópios projetam quantidades maiores de anéis, permitindo realizar uma análise qualitativa de
uma porção mais ampla da córnea (Fig. 9).
A interpretação dos resultados depende das variações da largura dos anéis iluminados
e dos espaços entre eles. Ambos irão depender das características da superfície corneana.
Córneas com distribuição uniforme do seu poder dióptrico e sem evidências de astigmatismo
acentuado produzirão anéis circulares, concêntricos e com espessura e espaçamento unifor­
mes. Córneas mais curvas, contendo maior poder dióptrico, produzirão linhas estreitas com
distâncias curtas entre elas ao passo que em córneas mais planas, tanto a largura dos anéis
quanto os espaços entre eles serão maiores (Fig. 10).

Fig. 9 O fotoceratoscópio é uma câmara fotográfica acoplada a


um cone que projeta 9 a 12 anéis sobre a superfície corneana.
Semiologia Básica da Córnea 193

Fig. 10 Fotoceratoscopia de uma córnea normal, sem evidências


de astigmatismo acentuado, apresentando anéis circulares, com
espessura e espaçamento uniformes.

Do mesmo modo que córneas mais curvas ou mais planas produzem alterações nos anéis
refletidos, astigmatismos corneanos acentuados induzirão padrões característicos à ceratos-
copia. Astigmatismos regulares produzirão distorções elípticas, com o diâmetro correspon­
dente ao de maior poder dióptrico coincidindo com o menor eixo da elipse. Astigmatismos
irregulares produzirão anéis tortuosos, com distâncias irregulares entre eles e podem ser ob­
servados nas ectasias e cicatrizes corneanas, pterígio, trauma ocular após cirurgias oculares
(Fig. 11) e no olho seco. Em pacientes com ceratocone, as alterações descritas anteriormente
tendem a concentrar-se na porção paracentral inferior e pode-se também observar diminuição
do diâmetro dos anéis centrais em virtude do grande poder dióptrico nesta região.
A fotoceratoscopia permite a identificação de uma série de anomalias da superfície cornea-
na e suas vantagens sobre o ceratômetro são significantes. A principal delas é a possibilidade
de avaliação de cerca de 55% da área corneana total. Além disso, o fotoceratoscópio não con­
sidera a córnea como um elemento esférico ou esferocilíndrico uniforme. Entretanto, a impos­
sibilidade de análise quantitativa das informações, tornando as interpretações subjetivas, e a
incapacidade de se detectar astigmatismos menores que 3 dioptrias, constituem as principais
limitações deste instrumento.

Fig. 11 Fotoceratoscopia de um paciente submetido a


ceratotomia radial. É possível identificar onde foram feitas as
incisões radiais.

Sensibilidade corneana
A inervação corneana é suprida pelo nervo nasociliar, proveniente do ramo oftálmico do V par
craniano. Na prática diária, a avaliação da sensibilidade corneana pode ser feita por meio de
exames simples, sem a necessidade de aparelhos mais complexos para sua execução (estesiôme-
r

tro). E especialmente útil na avaliação de pacientes com suspeita de ceratopatia neurotrófica.


194 Semiologia Básica em Oftalmologia

A sensibilidade corneana é facilmente testada usando-se como comparação o olho con-


tralateral. Para isso, um chumaço de algodão enrolado em uma haste apropriada ou um pe­
daço de 5 cm de fio dental extrafmo (sem sabor) podem ser utilizados. Toca-se levemente
nos quatro quadrantes da córnea, alternando-se os dois olhos e evitando-se os cílios. A cada
quadrante examinado, o paciente é questionado a respeito da sensibilidade naquele ponto,
sempre comparando-se os dois olhos. A resposta do paciente será registrada como normal,
diminuída ou ausente. Dessa forma, pode-se avaliar a maioria dos casos com sensibilidade
corneana anormal.

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rM

Semiologia do Filme Lacrimal

LUCIANE BUGMANN MOREIRA

Um filme lacrimal normal é essencial para a higidez do segmento anterior do olho, especial­
mente da córnea. Sua principal função é tornar a superfície anterior da córnea lisa e uniforme,
r

proporcionando imagens nítidas. E tal a sua importância que pode ser considerado como a
camada mais superficial da córnea.
A frequência de olho seco na população é bastante elevada. Recentemente, a pesquisa­
dora Debra Schaumberg realizou o primeiro grande estudo com 37 mil mulheres nos EUA e
relatou uma incidência de 7,8% acima de 50 anos de idade, com aumento da prevalência com
a idade. Na prática médica no Brasil, estima-se que aproximadamente 75% das pessoas tenham
algum sinal ou sintoma de olho seco no grupo etário superior a 65 anos de idade.
Além da função óptica o filme lacrimal exerce as seguintes funções:
■ Umedecimento e lubrificação da córnea e conjuntiva
■ Atividade antimicrobiana
■ Interferência nos mecanismos imunológicos
■ Remoção de bactérias e células descamadas
■ Aporte de oxigênio ao epitélio corneai
■ Nutrição para o epitélio corneai
■ Auxílio nos processos cicatriciais
■ Veículo de difusão de fatores de crescimento
■ Veículo de colírios.

Pacientes com alterações qualitativas ou quantitativas do filme lacrimal podem apresentar


doenças do segmento anterior do globo ocular, por vezes sérias, e raramente são bons usuá­
rios de lentes de contato.
O termo “olho seco” é utilizado para referir as alterações do filme lacrimal com patoge­
nias diversas, mas podem causar muitos sinais e sintomas comuns por mudanças da superfície

195
196 Semiologia Básica em Oftalmologia

ocular e das glândulas lacrimais. A disfunção lacrimal pode ocorrer por diminuição da produ­
ção lacrimal ou por aumento da evaporação. Na prática a caracterização entre portadores de
deficiência da quantidade aquosa da lágrima e de doenças das glândulas de Meibomius pode
ser difícil (Holland E J, Mannis MJ).
A frequência de alteração do filme lacrimal é grande e daí decorre da importância de seu
diagnóstico precoce e respectivo tratamento.

FILME LACRIMAL
Classicamente, o filme lacrimal é composto de três camadas. A superficial, mais externa, é
formada de lipídios de baixa polaridade como a cera e os ésteres de colesterol, produzidos
pelas glândulas de Meibomius e acessoriamente pelas glândulas de Zeiss e Mohl. Esta camada
é formada de lipídios que se espalham pela superfície aquosa, tendo como função retardar
a evaporação da camada aquosa e diminuir a tensão superficial do filme lacrimal. A segunda
camada é aquosa produzida pela glândula lacrimal principal e pelas acessórias, constituindo
a maior parte da espessura do filme lacrimal. Nela encontram-se dissolvidos sais minerais e
proteínas encarregadas da imunidade. A camada mais profunda que se coloca intimamente
ligada à superfície das células epiteliais da córnea e de suas microvilosidades é constituída de
mucina produzida pelas células caliciformes da conjuntiva (Goblet cells). A intimidade dessa ca­
mada de mucina com as microvilodades das células epiteliais da córnea funciona em conjunto
e são chamadas de glicocálice, transformando e epitélio corneai que é hidrófobo em hidrófilo,
fazendo com que a camada aquosa permaneça sobre o epitélio da córnea dando condições
insubstituíveis para sua vitalidade.
Atualmente, sabe-se que as três camadas não são tão distintas. A mucina está por toda a
lagrima em concentrações diferentes aumentando quanto mais próximo das células epiteliais
para dar mais aderência ao filme lacrimal.

Composição química da lágrima


A composição química da camada aquosa da lágrima é similar àquela do humor aquoso,
ambos têm a origem comum no soro sanguíneo. Entretanto, a lágrima sofre algumas modifica­
ções ao atravessar o epitélio secretor da glândula lacrimal.
r r

Agua: E o elemento mais encontrado e corresponde a 98,2% do volume total. Sofre altera­
ções durante o pestanejar e quando a fenda palpebral permanece aberta.
r

Eletrólitos: E difícil a sua dosagem devido a quantidade insuficiente de lágrima existente.


A concentração desses elementos varia na razão inversa do lacrimejamento. Os valores médios
são Na + = 4,45g/l; Cl-= 3,90g/l; I<= 1,2 g/1.
Glicose: A média é de 0,65 g/1 sendo a sua concentração na lágrima bem menor do que no
plasma. No diabético seu valor está aumentado e no indivíduo normal seu valor não se altera,
mesmo com ingestão maior de açúcares.
Ureia: 030 g/1 em média.
Aminoácidos: 7,5 mg/100 ml em média.
Semiologia do Filme Lacrimal 197

Proteínas: Aproximadamente 5 g/1. Encontram-se as três frações: albumina, globulinas e


lisozima. Das globulinas, duas imunoglobulinas aparecem em taxas elevadas na lágrima: IgA
e IgG (5% do total). A lisozima é uma enzima lítica existente na lágrima, no muconasal e na
r

maioria dos tecidos e secreções. E um antibiótico natural, inibe por lise o desenvolvimento de
inúmeras bactérias patógenas e desempenha um importante papel protetor contra as infec­
ções. Existem inúmeras lisozimas.
Células em suspensão na lágrima: Existem células epiteliais descamadas e micro-organis­
mos saprófitas em número de 500.000 mm3 aproximadamente.
Lipídios: A lágrima é composta por lipídios não polarizados.

EXAME DO PACIENTE PARA ABORDAGEM DIAGNÓSTICA DO FILME


LACRIMAL
Anamnese
O conhecimento das condições do filme lacrimal se inicia com a história dos problemas ocu­
lares relatados pelo paciente, por vezes minucioso na anamnese bem feita e dirigida. Fatores
oculares, sistêmicos e ambientais muitas vezes são importantes na alteração desta camada
que protege o olho e lhe dá condições de permitir boa visão. Devemos lembrar que existem
causas congênitas de olho seco, como a síndrome de Ridley-Day, alacrimia congênita, síndro-
mes de Adie e de Shy-Drager.
São múltiplas as causas que devem ser levantadas e diagnosticadas na obtenção de um
diagnóstico completo e tratamento adequado.

Profissão e hábitos de vida


Algumas profissões expõem as pessoas a longos períodos de atividades em ambientes desfa­
voráveis que interferem na composição, quantidade e higidez do filme lacrimal. Como exem­
plos, podemos destacar:
■ Agricultores: estão sujeitos ao sol, vento, poeira e produtos químicos pulverizados nas
plantações. São profissionais que trabalham em situação que podem levar à alteração do
filme lacrimal por contaminação com fungos e partículas deletérias aos olhos.
■ Mineradores: vivem em meio à poeira de calcáreos, pedras, gases, fuligem que penetram
nos pulmões e olhos alterando o filme lacrimal e a superfície ocular produzindo irritação e
inflamação na superfície externa dos olhos.
■ Motoqueiros e ciclistas: quando não usam protetores adequados para os olhos podem so­
frer o impacto de pequenos fragmentos suspensos no ar e também do vento que penetra
pela fenda palpebral.
■ Digitadores: exige leitura prolongada e atenção em computadores durante muitas horas do
dia, alterando a frequência do pestanejar.
198 Semiologia Básica em Oftalmologia

Fatores ambientais
Ambientes muito secos com ar-condicionado e substâncias irritantes em suspensão no ar po­
dem agredir os olhos e em especial o filme lacrimal, em pessoas que vivem confinadas em
certos locais.
As lentes de contato de qualquer tipo, quando no olho, podem atuar como estímulo pro-
r

vocativo de olho seco. E mais frequente com lente de contato hidrofílica (quando muito del­
gadas e com alta hidratação) do que com a rígida gás-permeável. A lente de contato pode
evidenciar o quadro clínico de olho seco assintomático e ser responsável por injeção ciliar em
3 e 9 h, mudanças na espessura corneai, aperto dos parâmetros e induzir astigmatismo pelo
ressecamento da margem da lente gelatinosa.
O uso crônico de certos medicamentos como psicotrópicos, betabloqueadores, anticon­
cepcionais, diuréticos, anti-histâmínicos e anticolinérgicos alteram o filme lacrimal.

Alterações hormonais
A idade avançada por si só é um condicionante na qualidade e quantidade do filme lacrimal.
Mudanças hormonais originadas pela menopausa podem influenciar produzindo sintomas de
“olho seco”.
Muitas vezes, as alterações metabólicas causadas pelo estresse podem provocar sintomas
de olho seco e epiteliopatia.
Sintomas de olho seco podem estar associados a problemas hormonais por alteração ti-
reoidiana.

Doenças associadas
As doenças que podem cursar com olho seco são: síndrome de Sjögren, artrite reumatoide, lú­
pus eritematoso, hipertireoidismo, esclerodermia, escorbuto, penfigoide, púrpura tromboci-
topênica, Stevens-Johnson, rosácea, dermatite seborreica, psoríase, ictiose, ceratose folicular,
redução da sensibilidade corneai.

S í n d r o m e d e S j õ e g r e n

A produção deficiente de lágrima sem aumento da evaporação é derivada de doenças da glân­


dula lacrimal como a síndrome de Sjögren primária ou a secundária quando associadas às
doenças reumatológicas.
A síndrome de Sjögren é uma doença autoimune que reduz a secreção de todas as glân­
dulas extrínsecas por infiltração linfoplasmocitária, produzindo redução da camada aquosa de
filme lacrimal.
Para diagnosticar a síndrome de Sjögren, devem-se avaliar as manifestações orais, fazer
biópsia de glândula salivar contendo pelo menos 4 lóbulos e analisar autoanticorpos circulan­
tes, além dos testes de avaliação do filme lacrimal.
Os anticorpos contra ribonucleoproteínas: anti-Ro (SS-A) e anti-La (SS-B) são muito fre­
quentes nos pacientes com síndrome de Sjögren primária e menos frequentes na secundária.
Já o fator reumatoide (FR) e fator antinúcleo (FAN) são mais frequentes na síndrome de Sjögren
Semiologia do Filme Lacrimal | 199

secundária que na primária. Também estão circulantes no sangue periférico autoanticorpos


contra receptores muscarínicos (anti-MUC3) e contra proteínas do citoesqueleto das células
acinares (anti-alfa-fodrim).
Existem vários critérios para estabelecer o diagnóstico definitivo da síndrome de Sjõgren.
O mais atual é o critério europeu modificado pelo Grupo de Consenso Americano-Europeu
(2002) que consiste em 6 questões.

C r i t é r i o E u r o p e u M o d i f i c a d o p e l o G r u p o d e C o n s e n s o A m e r i c a n o - E u r o p e u

Sintomas oculares
Pelo menos uma resposta afirmativa para uma das três questões formuladas a seguir:
a) Tem problemas oculares diários e persistentes, relacionados com quadro de olho seco há
mais de três meses?
b) Tem sensação de areia ou queimação ocular?
c) Usa colírios lubrificantes mais de três vezes ao dia?

Sintomas orais
Pelo menos uma resposta afirmativa para uma das três questões formuladas a seguir:
a) Tem sensação de boca seca há mais de três meses?
b) Tem inchaço recorrente ou persistente das glândulas salivares, na idade adulta?
c) Sente necessidade de ingerir líquidos para ajudar na deglutição de alimentos sólidos?

Sinais oculares
Evidencia de modo objetivo o comprometimento ocular, quando pelo menos um dos dois tes­
tes a seguir é positivo.
a) Teste de Schirmer I (= 5 mm em 5 min)
b) Rosa Bengala (= 4 pontos na escala de Bijsterveld)

Achados histopatológicos
Aglomeração de pelo menos 50 células mononucleares em uma biópsia de 4 mm2 da glândula
salivar.

Comprometimento da glândula salivar


Evidencia de modo objetivo o comprometimento das glândulas salivares, com pelo menos um
dos três métodos a seguir.
a) Cintilografia da glândula salivar
b) Sialografia da glândula parótida
c) Fluxo salivar sem estímulo reflexo (= 1,5 ml em 15 min)
200 Semiologia Básica em Oftalmologia

Autoanticorpos
Presença de pelo menos um dos seguintes autoanticorpos séricos:
a) Anticorpos contra os antígenos Ro/SS-A ou La/SS-B
b) Anticorpos antinuclear
c) Fator reumatoide
Critérios de exclusão: Linfoma preexistente, AIDS, sarcoidose ou doença do enxerto versus
hospedeiro.

I n t e r p r e t a ç ã o d o s r e s u l t a d o s

■ Provável síndrome de Sjögren primária: presença de pelo menos 3 dos 6 itens.


■ Síndrome de Sjögren primária: presença de pelo menos 4 dos 6 itens (aceitando como pa­
drão sorológico positivo apenas SS-A ou SS-B).
■ Provável síndrome de Sjögren secundária: combinação da resposta positiva para o item 1
ou 2 com pelo menos 1 item positivo entre as questões 3, 4 ou 5.
■ Síndrome de Sjögren secundária: combinação da resposta positiva para os itens 1 ou 2 com
pelo menos 2 itens positivos entre as questões 3, 4 ou 5.

Alterações oculares
BLEFARITES: produzem alteração lipídica aumentando a evaporação da lágrima causando olho
seco. Disfunções das glândulas meibomianas desestabilizam o filme lacrimal.
Conjuntivites crônicas ou agudas (conjuntivite primaveril, gonocócica, pseudomembrano-
sa, e as produzidas por adenoviroses) ocasionam redução das células caliciformes que pode
ser intensa, reduzindo a produção de mucina tornando a composição do filme lacrimal inade­
quada para proteger a córnea.
Queimaduras químicas oculares podem produzir alterações na córnea e conjuntiva des­
truindo glândulas indispensáveis na formação do filme lacrimal, além de causar simbléfaro e
lesões graves na córnea.

EXOLFTALMIA: originada de tumores orbitários, orbitopatia de Graves ou mesmo traumatismos


e anomalias de órbita expõe a córnea às interpéries do meio ambiente dessecando a superfí­
cie do globo ocular, provocando diminuição ou até desaparecimento das células conjuntivais
produtoras de mucina.
LAGOFTALMO: é a incapacidade do fechamento das pálpebras causada por paralisia facial pe­
riférica, retração cicatricial das pálpebras, hipertonia do elevador da pálpebra superior ou
cirurgias plásticas que podem expor a córnea causando alterações no filme lacrimal, inclusive
úlceras corneais.
ECTRÓPIO: é causa frequente de alterações no filme lacrimal devido à exposição ocular além
de cursar geralmente com blefarite.
ENTRÓPIO ETRIAQUÍASE: podem roçar a córnea, causando lesões na mesma e desestabilizando
o filme lacrimal.
Semiologia do Filme Lacrimal 201

Lesões de córnea causadas por traumatismo que produzem irregularidades na superfície


corneai, com frequência, trazem comprometimento na aderência do filme lacrimal na região
afetada causando sintomas de olho seco.

Sinais e sintomas
Os sintomas mais comuns referidos por pacientes portadores de olho seco são: sensação de
corpo estranho (areia nos olhos), ardor ocular, dor, prurido, fotofobia, lacrimejamento e visão
embaçada. Esses sintomas pioram quando associados a outros fatores já descritos e, também,
dependendo da hora do dia há exacerbação dos sintomas.
O olho pode apresentar-se vermelho (hiperemia) e com secreção espessa e filamentar.
Além desses sinais a deficiência na produção de lágrima pode levar a defeitos epiteliais, au­
mento da quantidade de muco na superfície ocular e nos casos mais graves úlceras de córnea.
O olho seco crônico pode, além de diminuir a quantidade do volume aquoso, também au­
mentar a quantidade de células inflamatórias e da osmolaridade da lágrima.
A baixa visão em olho seco pode ocorrer pela insuficiência de lágrima transitoriamente ou
como consequência de ceratite puntata pelo olho seco mais persistente e até úlcera de córnea
em casos mais sérios.
Existem questionários padronizados para facilitar o diagnóstico de olho seco. Estes po­
dem ser utilizados para auxiliar no diagnóstico, para avaliar o impacto da doença na qualidade
de vida dos portadores e para acompanhar a evolução da doença e sua resposta aos tratamen­
tos propostos. São encontrados o de MacMonies, o de Rolando e atualmente o “OSDI” (ocular
surface disease index). Este último disponível na Internet. Estão baseados nos sintomas e na
história que mais frequentemente são relatados pelos pacientes de olho seco. O questionário
é entregue ao paciente para responder em casa ou no próprio consultório médico.

Biomicroscopia do segmento anterior


Provavelmente é o exame mais importante para avaliar o filme lacrimal, e a superfície do globo
ocular e seus anexos.
Há necessidade de observar a altura do menisco lacrimal (Fig. 1), que se localiza entre a
pálpebra inferior e a superfície ocular, e se esse menisco tem adequado volume ou se é pobre
ou inexistente. O menisco lacrimal normal deve ser contínuo, e possuir aproximadamente 1,0
mm de altura. Deve-se também avaliar o tempo de rotura do filme lacrimal, o grau de oleosida­
de da lágrima e a presença de filamentos, muco e debris (Figs. 2A e B). São indicativos de olho
seco: menisco muito fino, menisco separado da superfície ocular por uma dobra da conjuntiva,

Fig. i Menisco lacrimal corado com fluoresceína.


202 Semiologia Básica em Oftalmologia

Figs. 2 (A e B) A. presença de filamentos B. presença de muco no filme lacrimal


pré-corneal.

aparecimento de uma faixa negra entre o menisco e a superfície ocular corada com fluoresce-
ína vista com luz azul de cobalto.
Na córnea procura-se por ceratite filamentar e puntata (Fig. 3). Erosões recorrentes de
córnea também devem ser pesquisadas.
Fazer eversão da pálpebra e verificar se a conjuntiva que reveste internamente está nor­
mal, se há simbléfaro, cicatrizes de tracoma ou deformidades que possam dificultar a função
da pálpebra em homogeneização do filme lacrimal. Avaliar a margem palpebral e os orifícios
das glândulas de Meibomius. Comprimir levemente a pálpebra e observar se flui dos orifícios
secreção normal. Os cílios e folículos pilosos devem ser examinados para verificar a presença
de blefarite.
Observar na motricidade palpebral se existe fechamento completo da nictação e se a
frequência é suficiente (normalmente a média de piscar espontaneamente é de 12 vezes por
min).
Comprimir o saco lacrimal para ver se há refluxo de secreção, pois a obstrução do saco
lacrimal ou dos canalículos é diagnóstico diferencial de olho seco. O olho seco possui lacri-
mejamento reflexo, enquanto a obstrução de saco lacrimal produz lacrimejamento pela falta
de excreção.
Quando há suspeita de disfunção do filme lacrimal deve ser feita a avaliação através dos
testes diagnósticos.

Fig. 3 Ceratite puntata em olho seco.


Semiologia do Filme Lacrimal | 203

CORANTES VITAIS UTILIZADOS PARA AVALIAÇÃO DO FILME


LACRIMAL
Fluoresceína sódica
É usada para evidenciar áreas desepitelizadas da córnea e conjuntiva. Também auxilia no exa­
me biomiscroscópico para identificar o menisco lacrimal, irregularidades do filme lacrimal,
debris, erosões, muco e filamentos. O teste que mede o tempo de rotura do filme lacrimal,
descrito logo a seguir, é feito com fluoresceína e é muito usado pela facilidade de execução.
A fluoresceína sódica pode ser aplicada sob a forma de solução aquosa ou de fitas de pa­
pel esterilizadas. Dá-se preferência ao uso do papel-filtro porque a solução é muito suscetível
à contaminação bacteriana. Para observar este tipo de coloração, usa-se a luz azul de cobalto
na lâmpada de fenda.

Rosa-bengala
Cora áreas de células mortas ou em sofrimento epitelial. Na deficiência lacrimal, a coloração
é mais evidente no setor nasal e temporal, enquanto por exposição noturna a área corada é a
bulbar inferior. Esse corante facilita a visualização de debris, secreções e de lesões de células
epiteliais desvitalizadas. Há indicações que o rosa-bengala também se liga às células epiteliais
normais, mas são bloqueadas pelas proteínas da lágrima, entretanto, quando existir alterações
do filme lacrimal, a coloração ocorrerá nas áreas da superfície ocular desprotegidas das prote­
ínas que constituem a lágrima.
O teste com esse corante consiste na instilação de uma gota de corante rosa-bengala a
\% no fundo de saco conjuntival inferior ou bastão de rosa-bengala esterilizado, previamente
anestesiado para diminuir o ardor e o desconforto que pode ocasionar. Após 30 s procede-se
a lavagem com solução salina isotônica. As áreas de comprometimento corneai e conjuntival
aparecem com um pontilhado vermelho.

Lissamina verde
É um corante ácido orgânico e sintético, de coloração esverdeada que cora áreas de células
desvitalizadas na córnea e na conjuntiva de forma bastante similar ao rosa-bengala, porém é
menos tóxico e menos irritativo para a superfície ocular.

TESTES CLÍNICOS PARA AVALIAÇÃO DO FILME LACRIMAL


Tempo de rotura do filme lacrimal (break up time - BUT)
Com esse teste se estuda a estabilidade do filme lacrimal pré-corneal. Usa-se o corante de fluores­
ceína sódica a 0,1% no fundo do saco conjuntival inferior do olho a ser examinado. Logo após
solicita-se ao paciente que pisque algumas vezes e feche os olhos. Após abri-los que permane­
ça sem piscar enquanto o médico observa o filme lacrimal pela biomicroscopia sob iluminação
focal direta e com luz azul de cobalto. Marca-se o tempo que leva para o aparecimento da
rotura do filme que aparece como áreas negras que se formam repentinamente sobre a córnea
204 Semiologia Básica em Oftalmologia

ou pontos secos. E considerado normal o tempo de 10 s ou mais. Um tempo de rotura inferior


a 10 s é anormal, indicando instabilidade lacrimal e, portanto, olho seco.
O tempo de rotura do filme lacrimal é um exame que deve ser feito de rotina na avaliação
do paciente para olho seco (Fig. 4).

Tempo de rotura do filme lacrimal (BUT) de olho seco.

Padrão de coloração da conjuntiva e córnea com rosa-bengala


Pode-se classificar o padrão da coloração de acordo com a observação da conjuntiva bulbar
nasal e temporal e da córnea na área interpalpebral. O sistema mais fácil para ser utilizado
baseia-se na graduação que varia de 0 a 3 (sem coloração, leve, moderada e intensa) em cada
uma das áreas avaliadas. Portanto, a graduação máxima que pode ser obtida é igual a 9 (Fig. 5).

Olho seco corado com rosa-bengala - graduação leve.

Testes de Schirmer
São realizados para medições quantitativas das lágrimas. Existem três variantes.

T e s t e d e S c h i r m e r I: ( s e m a n e s t é s i c o )

Avalia diretamente a deficiência aquosa da lágrima. Mede a secreção total das lágrimas (basal
+ reflexa). Não deve ser usado nenhum colírio, particularmente, anestésico antes do exame.
Realiza-se o teste utilizando tiras de papel-filtro de Whatman n- 41 com 35 mm de com­
primento por 5 mm de largura, que é dobrado a 5 mm em uma extremidade. Esta parte dobra­
da é colocada no fundo de saco conjuntival inferior na altura da união do terço médio com o
Semiologia do Filme Lacrimal 205

terço externo da pálpebra inferior. Não se deve colocar no centro pelo risco de lesar a córnea.
A manobra deve ser realizada com suavidade evitando qualquer irritação ocular (Fig.6). O am­
biente não deve ter luzes fortes e nem corrente de ar. No final de 5 min retira-se e mede-se o
comprimento da coluna úmida a partir da dobra do papel.
Em um indivíduo normal um comprimento de 10 a 30 mm é umedecido em 5 min. Quando
o comprimento do papel umedecido ultrapassa 30 mm em 5 min, trata-se de uma hiperse-
creção reflexa e quando é inferior ou igual a 10 mm em 5 min indica diminuição da secreção
aquosa.
Os resultados do teste de Schirmer se expressam:
m prlirla rln n a n p l ím m l

B
Figs. 6 (A e B) A. Esquema da realização do teste de Schirmer. B. Exame realizado em
paciente com olho seco.

T e s t e d e S c h i r m e r I I

Sua finalidade é medir a secreção lacrimal quantitativa reflexa. O teste é realizado do mesmo
modo do Schirmer I. Neste teste a mucosa nasal do paciente é irritada por meio de algodão
seco por fricção e se usa anestésico ocular. A medida do papel umedecido é feita após 2 min
206 Semiologia Básica em Oftalmologia

e se o comprimento do papel umedecido for inferior a 15 mm é indicativo de insuficiência


lacrimal reflexa.

T e s t e S c h i r m e r I I I

Estuda a secreção lacrimal reflexa estimulada pela ação do sol, após instilação de anestésico.
Está em desuso pela sua difícil realização.

Teste da secreção lacrimal basal


Estuda a quantidade de secreção aquosa basal após bloqueio da secreção reflexa com anes­
tésico ocular. O método é uma variante do teste de Schirmer I com a diferença de que é feito
com colírio anestésico e é o modo mais usado ultimamente. Instilam-se duas gotas de colírio
anestésico a fim de anular toda secreção reflexa e só obter a secreção basal. São considerados
normais valores acima de 10 mm, mas existem grandes variações individuais. Medidas meno­
res que 10 mm são sugestivas de deficiência aquosa do filme lacrimal.

Teste do d e a r a n c e da fluoresceína
Mede-se a concentração do corante de fluoresceína em diferentes tempos pelo aparelho
fluorofotômetro.
Pode ser feito verificando a drenagem da lágrima que é medida após a instilação do coran­
te, com papel de filtro em vários tempos, mas é menos preciso que no uso do fluorofotômetro.

PROVAS LABORATORIAIS
Avaliação do perfil proteico do filme lacrimal
Podem-se determinar as concentrações de proteínas na lágrima, como lisozima e lactoferrina,
que se encontram diminuídas na deficiência aquosa do filme lacrimal.

Análise do muco ( o c u l a r f e r n i n g t e s t )

r r

E um teste qualitativo simples para o estudo do muco conjuntival. E realizado espalhando-se


e esfregaço conjuntival em uma lâmina de vidro limpa, deixando-o secar. Microscópicas arbo­
rizações (no formato de samambaias) são observadas em olhos normais. Em pacientes com
olho seco (penfigoide ocular, síndrome de Stevens-Johnson, cicatrização conjuntival difusa),
essa arborização do muco é reduzida ou não aparece. A ausência do padrão em forma de folha
de samambaia indica deficiência primária de mucina.

Osmolaridade do filme lacrimal


O aumento da osmolaridade das lágrimas acontece tanto com redução da produção hídrica
quanto com o aumento da evaporação por disfunção das glândulas de Meibomius. A lágrima é
Semiologia do Filme Lacrimal 207

coletada do menisco inferior e necessita de osmômetro para ser medida. Ainda é pouco usada
na rotina clínica.

Citologia de impressão da conjuntiva


Utiliza raspado conjuntival para avaliação qualitativa e quantitativa das células caliciformes.

Biópsia de conjuntiva e glândula lacrimal


Utiliza-se em certos casos para diagnóstico etiológico da enfermidade básica.
Nenhum teste é suficientemente específico para confirmar o diagnóstico de olho seco.
Esta confirmação deve ser feita pela combinação das informações de anamnese, exame oftal­
mológico e dos resultados de um ou mais testes.
Conclui-se que pode se chegar ao diagnóstico de olho seco na prática oftalmológica fa-
zendo-se:
■ Anamnese: é muito importante. Através dela se suspeita de olho seco.
■ Exame oftalmológico: biomicroscopia com observação do filme lacrimal e do menisco la­
crimal.
■ Testes clínicos da função lacrimal que podem ser realizados pelo oftalmologista em seu
próprio consultório, são em geral suficientes para confirmar a suspeita de olho seco:
• Quantificação da secreção lacrimal.
• Determinação da estabilidade lacrimal.
• Determinação da integridade do filme lacrimal e do epitélio corneai com corantes vitais.

BIBLIOGRAFIA
Felberg S e Dantas PEC Diagnóstico e tratamento da síndrome de Sjögren - atualização continuada. Arg Brás Oftalmol,
2006; 69(6):959-63
Gomes JAP, Alves MR. Ocular: Córnea, limbo, conjuntiva, filme lacrimal. Rio de Janeiro: Cultura Médica, 2006; 391
Liew MS, Zhang M, Kim E, Akpek EK. Prevalence and predictors of Sjogren's syndrome in a prospective cohort of patients
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Mah F, Milner M,Yiu S, Donnenfeld E, Conway TM, Hollander DA. PERSIST: Physician's Evaluation of Restasis(®) Satisfaction
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Moreira SMB, Moreira H, Moreira L. Olho seco - Relação com o uso de lentes de contato In: Lente de Contato 3â ed. Rio de
Janeiro: Cultura Médica, 2004; 65-70.
Murube J. Olho Seco. Quito - Equador,Tecnimedia Editorial, S.L, 1997; 7-238.

Literatura Sugerida
Murube J. Olho Seco. Quito - Equador,Tecnimedia Editorial, S.L, 1997; 7-238.
Semiologia Básica do
Cristalino

CINARA S. DE OLIVEIRA GODOY •CARLOS AUGUSTO MOREIRA

O cristalino ou lente ocular é um dos principais elementos do globo ocular para o enfoque da
r

imagem na retina. E o único dioptro ocular capaz de modificar sua forma em um mecanismo
chamado de “acomodação” e permitir o enfoque da imagem de objetos situados próximo dos
olhos, permitindo ao indivíduo 1er e trabalhar em atividades que exigem visão nítida de perto.
Certamente é um dos problemas oculares que leva um grande contingente de indivíduos à
consulta oftalmológica.
Quando incluímos indivíduos com dificuldade de visão de perto após a quarta década de
vida (presbiopia) e os portadores de redução da transparência do cristalino (catarata), o que
pode levá-los a cegueira funcional tratável, torna-se um problema social.

ANATOMIA E FISIOLOGIA
O cristalino tem a forma de uma lente situada logo atrás da pupila e suspensa em posição pela
zônula, um ligamento que une seu equador ao corpo ciliar onde está o músculo ciliar encarre­
gado de sua movimentação no ato da acomodação.
Ele tem origem no ectoderma de revestimento que se invagina muito cedo no embrião
quando se inicia a formação da placa cristaliniana e logo depois forma um pequeno cisto, que
migra para sua posição intraocular para formar a lente madura.
O cristalino tem a forma de uma lente biconvexa transparente, tendo uma cápsula que
o reveste e que apresenta em suas faces internas equatorial e posterior células que formam
fibras cristalinianas que se dispõem de maneira capaz de constituir uma massa transparente,
tendo no centro um núcleo mais rígido e ao seu redor o córtex que é mais mole, permitindo a
modificação de sua forma quando da acomodação.
O núcleo do cristalino tem um crescimento contínuo durante a vida e faz com que o nú­
cleo vá se tornando mais duro, reduzindo gradativamente sua capacidade acomodativa.

209
210 Semiologia Básica em Oftalmologia

No ato da acomodação há uma contração do músculo ciliar situado dentro do corpo ciliar
e que dessa forma afrouxa a zônula fazendo com que o cristalino aumente sua potência refra-
tiva à custa, principalmente, do aumento da curvatura da face anterior.

EXAME DO CRISTALINO
A anamnese dos problemas cristalinianos passa na maioria dos casos por queixas de visão.
Devem ser levantados dados sobre época do início (congênita, na infância, puberdade, após
45 ou 60 anos) forma de início progressivo, lento ou mais rápido. Praticamente todos cursam
sem dor.
Presença de traumatismos oculares, mesmo após longo tempo, deve ser levantada.
Doenças oculares inflamatórias e glaucoma são importantes.
Doenças sistêmicas, como o diabetes e hipertensão arterial, deve ser inquiridas.
Presença de cirurgias oculares, descolamento de retina, etc.
Os sintomas visuais devem ser detalhados: visão turva, enfumaçada, pior em ambientes
muito iluminados, diplopia monocular, mudança de óculos recentemente com variação do
grau da lente.
História ocular na família com cirurgia ou casos de catarata, glaucoma, doenças da retina.
Enfim, todos esses dados são importantes, mas é a queixa visual que ocorre na catarata e
na presbiopia que é muito característica e prevalece na maioria das vezes.

ACUIDADE VISUAL: com a melhor correção óptica deve ser realizada em ambiente pouco ilumi­
nado e logo após bem iluminado, para avaliar a diferença que pode existir. Observar a variação
de grau e a redução visual em cada olho separadamente que por vezes, nas cataratas evoluí­
das, pode chegar a percepção de vultos ou a cegueira funcional. Entretanto, devemos lembrar
que somente a opacidade do cristalino nunca chega à ausência da percepção luminosa e à
projeção espacial de uma luz que desloquemos no espaço diante desses olhos quase cegos. A
luz focal pode ser localizada pelo paciente.
Caso o paciente não perceba a luz pontual que incidimos sobre um de seus olhos, deve­
mos pensar em problemas na retina, nervo óptico ou glaucoma muito evoluído.

ILUMINAÇÃO OBLÍQUA COM LANTERNA: observamos dessa forma a pupila que com a presença
de catarata vai se tornando esbranquiçada, e nos casos muito avançados pode adquirir tons
marrons.
ILUMINAÇÃO COAXIAL: a melhor forma é utilizar o oftalmoscópio direto a uma distância de
cerca de 20 cm dos olhos do paciente. Quando esta luz estiver alinhada com a linha de visão
central do paciente normal, a pupila aparece iluminada e com a coloração vermelha causada
pelo reflexo da luz no fundo do olho. Nos casos de catarata, a pupila vai perdendo esse aspec­
to e se tornando escura (Fig. 1, catarata congênita).
Esse exame deve, preferentemente, ser realizado sob midríase. Com o retinoscópio tam­
bém é possível realizá-lo.
Semiologia Básica do Cristalino 211

Fig.1 Catarata rubeólica total. Hipoplasia de íris, microftalmia,


cílios alongados e pupila branca.

BIOMISCROSCOPIA: é o exame fundamental para o cristalino. Sob midríase e utilizando a lâm­


pada de fenda podemos avaliar a posição, malformações, transparência, opacidades e localiza­
ção das mesmas; enfim, observar todos os tipos de patologia do cristalino. Podemos ver sine-
quias da íris no cristalino, depósitos inflamatórios sobre sua cápsula anterior ou a posterior e
r

observar o vítreo anterior. E indispensável para avaliar a presença de processos intraoculares,


para o diagnóstico etiológico ou para conhecer problemas relevantes no tratamento.
A biomicroscopia deve ser feita inicialmente sob luz difusa, pequeno aumento e menor
iluminação e em seguida buscar luz mais intensa e focalizada, obtendo a imagem em paralele­
pípedo que será vista com maior aumento. Por último faremos com a fenda estreita para obter
um corte óptico do cristalino e poder localizar a profundidade da opacidade.
A redução do feixe luminoso em uma faixa estreita produz um verdadeiro corte óptico
do cristalino, permitindo observar a localização da opacidade, da lesão ou corpo estranho, se
está sobre a cápsula, subcapsular, cortical, nuclear, cápsula posterior ou atrás dela. Podemos,
também, avaliar o tamanho e coloração do núcleo e ter indiretamente noção da dureza e difi­
culdades cirúrgicas que eventualmente teremos.
Nas cataratas hipermaduras pode haver processo degenerativo do córtex que se liquidifica
propiciando ao núcleo duro se depositar na parte inferior do cristalino (catarata morgagniana),
dificultando a cirurgia.
A biomicroscopia nos casos de afacia poderá, além da ausência do cristalino, mostrar a
presença de restos de massas ou cápsulas cristalinianas e a condição do vítreo que pode fazer
saliência através da pupila com a forma de champignon, e a situação da hialoide anterior in­
tacta ou com rotura.
As subluxações do cristalino e sua origem traumática ou espontânea podem ser vistas.
Alterações da forma, como lenticones anterior ou posterior, lentiglobus, resíduos pigmen­
tares congênitos em forma de espículas aderidos à cápsula anterior.
A aderência do cristalino com a íris formando sinequias posteriores, que por vezes aderem
em todo o contorno pupilar formando seclusão pupilar denunciando processos inflamatórios.
Esta condição leva ao glaucoma secundário.
212 Semiologia Básica em Oftalmologia

Diagnóstico de hiperplasia do vítreo primário com suas características. A catarata rubeó-


lica é denunciada por microftalmia, hipoplasia da íris que se apresenta azulada e com pupila
estreita que não dilata sob midriáticos.
A biomicroscopia é o exame indispensável de uma riqueza incomparável que nos trás
muita satisfação.

EXAME OFTALMOSCÓPICO: é muito importante para avaliação da retina, e em especial da má­


cula e disco óptico.
Deve ser realizado com o oftalmópio binocular indireto e sob intensa midríase, caso seja
possível. Mesmo com opacidades pequenas ou médias e com fundo ocular visto com algu­
ma turvação podemos avaliar as condições da mácula e disco, estabelecendo condições de
prognóstico visual pós-cirurgia de catarata. Acreditamos ser fundamental para o médico e o
paciente.

ECOGRAFIA: é importante em casos de opacidade muito intensa do cristalino. Como este exa­
me pode ser difícil de realizar devido a preços ou outras dificuldades, podemos recorrer a ob­
servação de luz pontual projetada sobre o olho partindo dos quatro quadrantes do espaço e
da área central e que seja bem localizada pelo paciente. Entretanto, os resultados obtidos são
inferiores ao da ecografia bem realizada.
O exame do vítreo anterior também pode ser realizado por ecografia.

TONOMETRIA: o glaucoma é mais frequente na terceira idade, mesma época em que se desen­
volve a catarata senil. Quando existe PIO elevada ou o paciente faz uso de medicação anti-
glaucomatosa devemos atentar para um prognóstico mais sombrio e mesmo a necessidade de
cirurgia de catarata combinada com cirurgia antiglaucomatosa.
AVALIAÇÃO DE DOENÇAS DAS PÁLPEBRAS E VIAS LACRIMAIS: as blefarites, conjuntivites e dacrio-
cistites devem ser pesquisadas e tratadas previamente a cirurgias intraoculares. Nesses casos
a medicação pré-operatória e a antissepsia ocular no ato cirúrgico devem ser muito mais cui­
dadosas.
EXAMES DE OUTRAS ALTERAÇÕES DO CRISTALINO: são visíveis na biomicroscopia.
1. Afacia: ausência do cristalino. Na área pupilar vê-se o vítreo que pode ter a hialoide íntegra
ou rota, se de origem espontânea ou traumática. A cirurgia de facectomia é a maior causa
de afacia.
2. Alterações do tamanho do cristalino:
■ Microfacia: o cristalino apresenta-se com menor tamanho e pode ser acompanhado de ou­
tras malformações congênitas como na síndrome de Marchesani e homocistinúria, sendo
possível sua luxação para a câmara anterior.
3. Alterações da forma do cristalino:
■ Lenticone anterior: há uma deformidade anterior em forma de cone. Esta alteração pode
ser acompanhada de ceratocone posterior, e é bastante rara.
■ Lenticome posterior: o cone está situado na cápsula posterior. Mais frequentemente bila­
teral e é associado à síndrome de Alport.
Semiologia Básica do Cristalino 213

Lentiglobo: pode estar localizado na cápsula anterior ou na posterior, tem forma globosa e
está associado à opacificação da cápsula posterior do cristalino.
Coloboma do cristalino: o equador da lente é deformado (falta uma parte) e parece acha­
tado. Localizado inferiormente, e frequentemente associado a coloboma uveal com falta da
zônula na mesma área. Com frequência há catarata. Temos um caso particular associado à
aniridia e catarata total.

Fig. 2 Aniridia, catarata, coloboma de cristalino e luxação de


cristalino.

ALTERAÇÕES DE POSIÇÃO DO CRISTALINO


LUXAÇÕES NA CÂMARA ANTERIOR: são facilmente observadas pela biomicroscopia. Podem ser
espontâneas ou traumáticas.
Na forma espontânea: podem ocorrer em certas síndromes como na homocistinúria.
Quando o cristalino está fortemente ligado ao vítreo pelo ligamento de Wieger, permanece
quase no centro da pupila que se contrai em miose, aprisiona o cristalino e causa glaucoma
do tipo inverso pelo bloqueio do fluxo do aquoso que não poderá passar da câmara posterior
para a anterior, aumentando a PIO. Em outras síndromes, tais como na esfero e microfacia,
pode ocorrer a mesma situação (Fig. 3).
Na forma traumática: vemos com o cristalino luxado a presença de vítreo na câmara an­
terior e também, eventualmente, com sangue nas fases iniciais. O cristalino luxado permane­
cendo na câmara anterior desenvolve catarata, glaucoma e processo inflamatório com muita
frequência.

LUXAÇÃO POSTERIOR DO CRISTALINO: luxação para o vítreo. E possível observá-la pela oftal-
moscopia binocular indireta, sendo mais fácil quando está opacificada. Também é possível ob-
servá-la pela biomicroscopia com auxílio das lentes de observação da retina e pela ecografia.
O cristalino luxado no vítreo sempre se localiza no setor inferior, próximo do equador. Nesses
casos a biomicroscopia detecta a falta do cristalino em sua posição normal.

Fig. 3 Homocistinúria, subluxação de cristalino para câmara


anterior.
214 Semiologia Básica em Oftalmologia

SUBLUXAÇÕES DO CRISTALINO: são os deslocamentos parciais do cristalino, aparecendo seu


equador na área pupilar na microscopia. Podem ser de origem traumática ou espontânea.
SUBLUXAÇÕES TRAUMÁTICAS: há uma língua de vítreos que assoma a câmara anterior através
da pupila. Frequentemente acompanhada de midríase e rotura do esfíncter pupilar. Por vezes
existe hifema.
O paciente pode referir a presença de diplopia monocular. Miopia na região que o feixe
luminoso cruza a área com a margem da lente e outra imagem pela área afácica. Há também
astigmatismo lenticular.

SUBLUXAÇÕES ESPONTÂNEAS: as mais frequentes são encontradas na síndrome de Marfan (Fig. 4).

Fig.4 Síndrome de Marfan. Subluxação de cristalino.

SÍNDROME DE MARFAN
Síndrome genética dominante, causada por anormalidade no tecido conjuntivo (hipoplasia).
Caracteristicamente acometem pessoas altas, longilíneas, com aracnodactilia (Fig. 5), anorma­
lidades cardíacas e oculares. Os olhos apresentam subluxação bilateral e simétrica dos crista­
linos, que se deslocam para cima e temporalmente. Apresentam miopia axial e risco de desco­
lamento de retina. O cristalino tem firme adesão ao vítreo dificultando a cirurgia.

HOMOCISTINÚRIA: é causada por erro inato do metabolismo da metionina. É um processo


genético autossômico recessivo. Desenvolve-se na adolescência e tem como característica ec-
toscópica acometer pessoas altas, com cabelos claros, faces e nariz rosados, provocando epi­
lepsia, retardo mental e subluxação do cristalino por ter a zônula enfraquecida. O processo é
bilateral e simétrico. A lente subluxada pode chegar a câmara anterior, bloqueando a pupila e
causando glaucoma tipo inverso (Fig. 6).

Fig. 5 Síndrome de Marfan. Aracnodactilia.


Semiologia Básica do Cristalino 215

Fig. 6 Homocistinúria, subluxação de cristalino, nariz e faces


vermelhas. Retardo mental, convulsivo.

Há tendência a fenômenos tromboembólicos e riscos durante anestesia geral. Geralmente


não sobrevivem a terceira ou quarta década de vida.

HIPERLISINEMIA: é rara e causada por erro inato do metabolismo da lisina. Apresentam ectopia
da lente, retardo mental e hipotonia muscular.
DEFICIÊNCIA SULFITO-OXIDASE: é muito rara. Causada por erro inato do metabolismo, apresen­
ta ectopia da lente, grave retardo mental e convulsões.
ECTOPIA DA LENTE E DA PUPILA: é uma síndrome genética autossômica recessiva, em que a
lente e a pupila se deslocam em sentidos opostos. É um processo bilateral e simétrico, acom­
panhado de miopia axial, descolamento de retina, megalocórnea, catarata e íris translúcida.

CATARATAS CONGÊNITA E INFANTIL


Na anamnese podemos encontrar:
■ História de doença materna ou ingestão de medicações durante a gravidez para rubéola
congênita e comumente associada à formação de catarata intrauterina, assim como toxo­
plasmose congênita e infecção por citomegalovírus durante a gestação. Ingestão de talido-
mida ou corticosteroides durante esse período também é causa frequente.
■ Exposição materna à radiação.
■ Doença congênita associada. Catarata congênita pode ser observada em crianças com erros
inatos do metabolismo, como galactosemia e síndrome de Lowe.
■ História familiar de catarata congênita: a catarata hereditária, relacionada com traço autos-
sômico dominante, corresponde a cerca de 33% dos casos de catarata congênita.
216 Semiologia Básica em Oftalmologia

A catarata congênita está presente ao nascimento.


A catarata infantil se desenvolve durante os primeiros anos de vida.
Essas cataratas se apresentam em 1 para cada 2.000 crianças nascidas vivas. Podem ter
um largo espectro de gravidade e formas. Podem ser unitaterais ou bilaterais. Causadas por
problemas genéticos, metabólicos, infecções maternas (rubéola a mais comum), anomalias
oculares, fatores tóxicos, idiopáticas.
A rubéola materna é uma de suas causas.

SÍNDROMES MASCARADAS: retinoblastoma, uveites podem parecer catarata em um exame mais


superficial.

Na catarata adquirida deve-se avaliar:


■ Idade: é diretamente proporcional à frequência de catarata do tipo senil, especialmente
após os 65 anos de idade, em virtude de alterações bioquímicas observadas nessa fase da
vida; precipitação de proteínas insolúveis, formação de radicais livres, alterações na com­
posição da membrana celular, entre outras.
■ História de trauma: formação de catarata pode estar associada à presença de trauma per-
furante ou contuso, devido a alterações metabólicas associadas ou não à lesão da cápsula
r

anterior do cristalino. E a causa mais comum de catarata unilateral em jovens. O processo


pode acontecer anos após o trauma e frequentemente está associado a alterações anatômi­
cas do segmento anterior do globo ocular.

AFACIA
Pode também ser secundária, mais comum e ocorre em consequência de trauma ou cirurgia
de facectomia.
Na forma congênita pode haver associação com outras malformações.

LENTICONES E LENTIGLOBO
LENTICONES: deformação em cone na superfície anterior ou posterior do cristalino.
A forma posterior axial e unilateral é mais comum.
A forma posterior, mais frequentemente bilateral, é associada à síndrome de Alport.

LENTIGLOBO: anterior ou posterior, com forma globosa.


O lentiglobo posterior é mais comum e associado à opacidade do polo posterior da cáp­
sula.
Na retinoscopia revela reflexo distorcido e miópico na área central.
Na biomiscroscopia também pode revelar esta deformidade.
Semiologia Básica do Cristalino 217

COLOBOMA DO CRISTALINO
É anomalia de forma. O equador da lente é deformado (falta uma parte) e parece achatado.
Localizado inferiormente e com frequência associado a coloboma uveal com falta da zô-
nula na área. Normalmente há catarata.

MANCHA DE MITTENDORF
Opacidade congênita no polo posterior do cristalino, resultante de remanescente do sistema
hialoide. Pode estar associado à faixa fibrótica e remanescente da artéria hialoide no vítreo.
Com a midríase são vistas as “cabeças” dos processo ciliares na margem da pupila. Pode ocor­
rer catarata total (Fig. 7).

Fig. 7 Hiperplasia de vítreo primário, catarata total, mancha de


Mittendorf. Visão dos processos ciliares na margem pupilar.
Microftalmia.

ESTRELAS EPICAPSULARES
Remanescentes da membrana pupilar fetal de Wachendorf, situadas sobre a cápsula anterior
parecendo pequenas formações de espículas pigmentadas de cor marron. Devem ser diferen­
ciadas de acúmulos de pigmento visual que podem se aderir a cápsula anterior após uveítes
anteriores, pouco ou nada interferem na visão.

ANOMALIAS DE PETERS
É síndrome de disgenesia mesodermal ou síndrome de clivagem da câmara anterior.
Podem também ser encontradas as seguintes anomalias: adesão entre a córnea e a íris,
catarata cortical ou polar anterior, deslocamento anterior da lente, microesferofaquia.

MICROESFEROFAQUIA
Cristalino pequeno e globoso.
r

E uma anormalidade do desenvolvimento. Está associada mais comumente à síndrome de


Weill-Marchesani e mais raramente às síndromes de Marfan, Peters, Alport e Lowe; também
aparece na rubéola congênita.
218 Semiologia Básica em Oftalmologia

Descolamento anterior dessa lente pode bloquear a pupila e causar glaucoma pelo fecha­
mento de ângulo bem como exigir iridotomia ou dilatação pupilar.

ANIRIDIA
Síndrome pan-ocular. Pode apresentar glaucoma, hipolasia de nervo óptico, redução visual,
nistagmo, catarata progressiva.

CLASSIFICAÇÃO MORFOLÓGICA DAS CATARATAS


Configurações e gravidade variadas, exigindo por vezes atuação intensa e precoce do médico
para evitar a ambliopia privacional com prejuízo visual irreversível. Segundo o aspecto, a re­
gião do cristalino opacificada e a gravidade temos:

CATARATA POLAR: opacidade que envolve a cápsula e o córtex subcapsular anterior ou poste-
r

rior. A catarata polar anterior não produz grande redução visual. E bilateral e não progressiva.
A catarata polar posterior produz maior redução visual, pode ser unilateral e estar associada a
remanescentes do sistema hialóideo.
SUTURAL: são opacidades das suturas em y do núcleo fetal. Raramente reduzem a visão. São
bilaterais e simétricas.
NUCLEAR: envolvem o núcleo embrionário e por vezes o núcleo fetal. Usualmente são bila­
terais e a redução visual é variável e depende do tamanho e amplitude em relação à pupila.
Olhos com catarata nuclear tendem a ser pequenos.
CAPSULAR: são pequenas opacificações da cápsula anterior e não prejudicam a visão.
r

LAMELAR OU ZONULAR: é o tipo mais comum de catarata congênita ou infantil. E bilateral e


simétrica, e o comprometimento visual varia com a densidade e tamanho da opacidade. Causa­
da por problema genético ou tóxico durante a gestação. Formada por opacidade em camadas
e com “cavaleiros” na periferia (formações opacas que se superpõem ao equador do núcleo).
COMPLETA: toda a lente está opacificada e não se vê nenhuma área vermelha na pupila, pode
ser uni ou bilateral com profunda redução visual.
MEMBRANOSA: é catarata que tem parte de seu córtex reabsorvida, permanecendo como uma
membrana branca, densa. Há intensa redução visual.
RUBEÓLICA: produzida pela rubéola materna durante a gestação. São cataratas completas em
um olho pequeno com hipoplasia da íris e com pupila que não se dilata. Quando a rubéola
materna se dá no primeiro trimestre da gestação os olhos são mais afetados, inclusive a retina
e há comprometimento sistémico-cardíaco, surdez e retardo mental.

CATARATA SENIL
Entre as anormalidades cristalinianas, a catarata senil é a mais frequente. E definida como uma
r

opacificação cristaliniana (nuclear ou cortical) associada ao processo de envelhecimento. E um


fenômeno progressivo, porém, com evolução variável de pessoa para pessoa. É responsável
Semiologia Básica do Cristalino 219

por 50% dos casos de cegueira reversível no mundo e estima-se que aproximadamente 50%
das pessoas acima de 60 anos de idade apresentem algum grau de comprometimento crista-
liniano.

O EXAME DO PACIENTE COM CATARATA SENIL


É importante, durante a conversa com o paciente, avaliar as características da perda visual: iní­
cio (abrupto ou insidioso), evolução (rápida ou lenta), piora em ambientes claros e associação
com outros sintomas visuais.
Sabe-se que sintomas de baixa visual são muitas vezes subjetivos e variam de pessoa para
pessoa. Assim, é sempre muito importante tentar entender o impacto dessa perda visual nas
atividades diárias do paciente e na sua qualidade de vida.
Hábitos de vida, uso contínuo de medicações, associação com possíveis doenças sistêmi­
cas e história de trauma ocular também devem ser investigados.

CATARATA TRAUMÁTICA
E a causa mais comum de catarata unilateral em jovens. O processo pode acontecer anos após
o trauma e frequentemente está associado a alterações anatômicas do segmento anterior do
globo ocular.

CATARATA POR USO DE MEDICAMENTOS SISTÊMICOS OU OCULARES


Uso crônico de medicações: anticolinesterásicos, antipsicóticos, fenotiazinas e, principalmen­
te, corticosteroides podem estar relacionados com o surgimento de catarata adquirida.
Catarata por inflamação ocular prévia: catarata secundária à uveíte é causa frequente,
especialmente em jovens. Portanto, deve-se pesquisar história de baixa visual antecedida por
episódios de dor, fotofobia e vermelhidão ocular.
Exposição à radiação: pesquisar possível exposição à radiação infravermelha (sopradores
de vidro), radiação ionizante (raios X), ou choque elétrico.
Doenças sistêmicas associadas: entre elas, o diabetes melito é a mais frequente. O pro­
cesso ocorre pela transformação da glicose em sorbitol, através da enzima aldose redutase, o
que leva à hidratação e à opacificação do cristalino. Hipocalcemia, doença de Wilson, distrofia
miotônica e dermatite atópica também devem ser lembradas.

ACUIDADE VISUAL
Baixa acuidade visual é a principal queixa de pacientes com distúrbios cristalinianos. O sinto­
ma geralmente referido, nos casos de catarata, é a turvação visual progressiva, com diminui­
ção da percepção de cores, podendo ser uni ou bilateral. Deve-se sempre levar em conside-
220 Semiologia Básica em Oftalmologia

ração a subjetividade desse sintoma assim como o fato de o teste pela tabela de Snellen não
explicar eventuais queixas de perda da função visual, melhor avaliada pelos testes psicofísicos.
Cataratas subcapsulares posteriores estão frequentemente associadas à baixa visual já em
estágios iniciais. Ofuscamento, caracterizado por deficiência visual em ambientes claros, tam­
bém é frequente. Cataratas nucleares podem levar à melhora da acuidade visual para perto em
decorrência do fenômeno da miopização. Diplopia monocular está comumente relacionada
com opacidades envolvendo o centro do núcleo cristaliniano.

ESQUIASCOPIA
Durante a esquiascopia, pistas sobre o grau de comprometimento cristaliniano, especialmente
nos casos de catarata, já poderão ser encontradas. Cataratas muito densas poderão impossi­
bilitar este exame. A mensuração da melhor acuidade visual corrigida é fundamental e serve
como parâmetro aos demais exames, na tentativa de se avaliar a relevância da desordem cris-
taliniana na visão do paciente.

EXAME DA PUPILA
Os reflexos fotomotores direto e consensual não estão alterados em pacientes portadores de
doenças cristalinianas, mesmo nos casos de catarata densa. Este teste é de grande importância
na diferenciação dos casos de baixa visual em razão de alterações neuroftalmológicas.

BIOMICROSCOPIA DO CRISTALINO
Deve ser realizada sob midríase máxima, o que possibilita observação de 80% do cristalino. Ini­
cialmente, utiliza-se o menor aumento a fim de se obter campo de visão e profundidade de foco
maiores. A observação de detalhes é feita nos maiores aumentos. A densidade óptica do cristalino
é identificada pela maior ou menor diminuição da intensidade do feixe luminoso que o atravessa.
A relação entre o cristalino e as estruturas vizinhas deve sempre ser analisada. Avaliar:
■ Cápsula anterior.
■ Região subcapsular anterior.
■ Córtex anterior.
■ Região nuclear.
■ Córtex posterior.
■ Região subcapsular posterior.
■ Cápsula posterior.

Durante o estudo biomicroscópico do cristalino, três tipos de iluminação podem ser uti­
lizados:
■ Iluminação direta difusa: para estudo de todo o conjunto (Fig. 8).
■ Iluminação focal:
• Paralelepípedo: para estudo em estereopsia.
Semiologia Básica do Cristalino 221

Fig.8 Iluminação direta difusa.

• Corte óptico: para estudo de profundidade.


• Especular: para estudo das regiões subcapsulares.
■ Iluminação indireta: o campo vermelho é muito útil para observação de pequenas opacida­
des, principalmente as localizadas em região subcapsular posterior (Fig. 9).

Fig.9 Iluminação indireta.

AVALIAÇÃO FUNDOSCÓPICA E DA FUNÇÃO MACULAR


Como última etapa na avaliação do paciente com distúrbios cristalinianos, em especial naque­
les com catarata, deve-se determinar se a alteração presente é ou não proporcional à piora na
acuidade visual do paciente. Para tal, devem-se procurar possíveis alterações morfológicas e/
ou funcionais do segmento posterior para se determinar quais pacientes terão prognóstico
reservado.
Existem vários equipamentos disponíveis aos oftalmologistas para este fim, porém, al­
guns testes são de fácil realização em um consultório básico. Função macular retiniana pode
ser prevista através do super-pinhole, na qual a acuidade visual do paciente é testada através
de uma fonte luminosa de optótipos disposta a 1 m deste com auxílio de buraco estenopeico.
O teste do verde-vermelho, também de fácil execução, pode ser utilizado para se avaliar, de
forma aproximada, a visão de cores do paciente. Alterações morfológicas podem ser deter­
minadas através de exame de oftalmoscopia direta, oftalmoscopia indireta e biomicroscopia
de fundo. Importante midríase e iluminação intensa podem dar uma boa ideia sobre a retina
e disco óptico - associado ao reflexo fotomotor e à projeção luminosa de baixa intensidade
nos quatro quadrantes e área central. Nas cataratas monoculares pode se testar o Swinging
Semiologia Básica em Oftalmologia

pupilar, teste para avaliar o nervo óptico. Nos casos de catarata total, ecografia ocular é im­
prescindível.

BIBLIOGRAFIA
Arieta CEL Cristalino e Catarata. Rio de Janeiro: Cultura Médica, 2002.
Oréfice F, Boratto LM. Biomicroscopia e Gonioscopia. Rio de Janeiro: Cultura Médica, 1989.
Padilha M. Catarata. Rio de Janeiro: Cultura Médica, 2003.
Rezende F. Cirurgia da Catarata. 2- ed., Rio de Janeiro: Cultura Médica, 2002.

Literatura Sugerida
1. Arieta CEL, Cristalino e Catarata. 2a ed., Rio de Janeiro: Cultura Médica, 2002.
Semiologia Básica da Uvea e
Esclera

MARCELO LUIZ GEHLEN

INTRODUÇÃO
O olho humano tem aproximadamente 24 mm de diâmetro, tamanho e consistência muito
semelhante à uva, etiologia do nome do tecido em questão, a úvea. Esse tecido consiste na
camada nutridora e vascular do olho. Os vasos sanguíneos chegam ao órgão, principalmente
através da íris, corpo ciliar e coroide, trazendo células de todas as linhagens que o sangue
contém. Uveíte consiste na inflamação inespecífica da úvea. Como mantém contato irrestrito
com o sangue, a úvea apresenta-se como a entrada de células inflamatórias e anticorpos para o
órgão. Dessa forma, as uveítes têm estreita ligação com a clínica médica, pois várias patologias
inflamatórias sistêmicas e infecciosas passam pela afecção intraocular.
A camada vascular intermédia do olho é composta de três porções distintas. A íris está na
região anterior e sua inflamação chama-se irite ou uveíte anterior. Atingindo-se o corpo ciliar,
denomina-se ciclite ou uveíte intermediária. Se ocorrer em segmento posterior, mais especifi-
camente na coroide, então passa a se chamar uveíte posterior ou coroidite. Devido à sua ínti­
ma ligação com a retina, comumente denomina-se também a uveíte posterior de coriorretinite
ou retinocoroidite. Dependendo do local da inflamação temos diferentes tipos de lesões e pa­
tologias das mais distintas. As etiologias também são bem diferentes entre as uveítes. Quanto
mais anterior for a inflamação ocular, mais predominam as autoimunidades. Quanto mais pos­
terior o sítio da lesão, excetuando-se as vasculites, mais comuns são as infecções. Certamente
isso não é regra, apenas uma tendência.
As uveítes anteriores e intermediárias são mais comuns em países ricos, enquanto as pos­
teriores prevalecem em países pobres e em desenvolvimento.
Quando se diagnostica uma uveíte anterior, pensa-se logo em patologias inflamatórias de
origem imunológica, apesar de algumas poucas e raras infecções, como a hanseníase, ocorre­
rem. No corpo ciliar, a reação pode alternar entre doenças imunes, como, por exemplo, a escle-
224 Semiologia Básica em Oftalmologia

rose múltipla e/ou infecciosas, como a tuberculose. Ao se deparar com uma uveíte posterior,
o médico deve raciocinar em termos de doença infecciosa, até que se prove o contrário. Vas-
culite é um tipo de uveíte posterior de origem geralmente autoimune e frequentemente é en­
contrada no lúpus eritematoso sistêmico, na doença de Behçet e na sarcoidose. Esclerite, que
consiste na inflamação do estroma escleral, provoca uveíte em até 75% dos casos, dependendo
da intensidade. As doenças causadoras da esclerite são granulomatosas e graves, podendo
atingir a úvea subjacente devido à necrose local. A uveíte que foi derivada de uma esclerite
costuma ser mais séria e ter mais complicações intraoculares, tais como catarata complicada,
glaucoma secundário e descolamento de retina. Entre as doenças da esclera que mais causam
uveítes estão a granulomatose de Wegener e a sarcoidose.
Portanto, uveíte deve ser tratada como um prenúncio de doença sistêmica ou a própria
atividade da mesma. Não raramente, o diagnóstico etiológico de uma irite é extremamente
difícil, pois a inflamação ocular pode vir muito antes da inflamação sistêmica. Também pode
acontecer de a uveíte ser o primeiro sinal da doença e o oftalmologista auxiliar no diagnóstico
precoce de uma patologia reumática, por exemplo.
A autoimunidade frequentemente afeta o olho. Há diversas teorias para essa relação. Tal­
vez o mais interessante, seja o fato de o clínico e o oftalmologista entenderem o órgão como
um verdadeiro “reduto” do sistema imune. O olho não possui sistema linfático, porém consis­
te em um dos poucos órgãos humanos que tem íntima relação com tamanha diversidade de
patologias sistêmicas. O fundo de olho, talvez por ser o local do corpo humano onde podemos
ver os vasos sanguíneos, representa o “espelho” do processo imune ativo, demonstrado atra­
vés da vasculite dos capilares retinianos. Com todas essas ferramentas de auxílio diagnóstico,
o oftalmologista pode mensurar o processo inflamatório e comunicar ao clínico, infectologis-
ta, imunologista, reumatologista, entre outros, a atividade da doença e suas consequências.
Entenda-se que uveíte é acometimento grave do olho. Toda inflamação deve ser tratada
de maneira a restaurar a acuidade visual o mais rápido possível. Para tanto, também devemos
compactuar com o fato de que o tratamento passa pelo diagnóstico preciso ou o menos errô­
neo possível. Então, nessa ocasião, a anamnese e exame físico clínico podem fazer a diferença.
Exemplificando: de nada vale o diagnóstico oftalmológico de uma uveíte posterior sem a cor­
reta identificação da causa-base. Sem esta correlação etiológica, o tratamento fica comprome­
tido. Em algumas uveítes, o médico precisa descartar hipóteses etiológicas infecciosas para
que a terapêutica com cortisona, caso seja instituída, não piore a afecção ocular.
A uveíte causa sérios problemas à visão. Algumas vezes os distúrbios visuais passam por
pequenos escotomas e redução discreta da acuidade visual. Outras vezes, a inflamação intraocular
promove cegueira e até perda do globo ocular (phtisis bulbi). Para que o estrago seja o mínimo
possível, o diagnóstico e a intervenção terapêutica devem ser rápidos e eficazes.
Clinicamente a uveíte é caracterizada pela redução da acuidade visual. Este acometimen­
to decorre, geralmente, da turvação dos meios transparentes do olho. Ao se examinar com o
oftalmoscópio direto e observar ausência do reflexo vermelho a distância, o diagnóstico de
uveíte deve ser pensado. As chances aumentam ainda mais se o paciente tiver história de di­
minuição súbita da visão. Em algumas vezes, no entanto, o reflexo vermelho é pouco alterado
e o diagnóstico somente fica evidente à biomicroscopia ou na fundoscopia indireta.
Doenças dos anexos oculares dificilmente ou quase nunca causam perda da visão. Este é
o grande diferencial da uveíte. Seja pela opacificação dos meios, pela lesão indireta da córnea
Semiologia Básica da Úvea e Esclera

ou cristalino ou pela lesão direta do complexo coroide-retina, a inflamação intraocular carac-


teristicamente tem, como o primeiro e principal sintoma clínico, a redução da acuidade visual.
Existem certas peculiaridades com relação à turvação da visão em uveítes. Ao se deparar
com importante perda de acuidade visual, o médico deve imaginar o sítio posterior como sen­
do o afetado. Lesões anteriores e intermediárias promovem menos déficit visual. Quanto mais
perto do nervo óptico estiver a afecção, mais grave é a perda visual.
Por mais inflamado que esteja o olho, em suas fases iniciais dificilmente causa dor im­
portante. Quando se tem um olho muito congesto e vermelho e o paciente possui dor forte e
lancinante, a suspeita passa a ser de esclerite como a causadora da uveíte. Em uma fase mais
crônica, a inflamação intraocular pode causar glaucoma secundário ou até atrofia do globo
ocular (phtisis bulbi), aumentando a intensidade da dor.
Grande parte das uveítes posteriores e intermediárias não provocam olho vermelho, fa­
zendo com que a queixa do paciente restrinja-se à perda da acuidade visual. Neste caso, torna-se
importante a dilatação da pupila e avaliação do segmento posterior com o oftalmoscópio in­
direto. Contrariamente à uveíte anterior, que cursa com hiperemias pericerática ou perilimbar,
e o diagnóstico frequentemente vem pela biomicroscopia, realizada com auxílio da lâmpada
de fenda.

UVEÍTE ANTERIOR
Comentários
Entre as uveítes, a anterior é a mais indolente. Diversas vezes, mesmo sem tratamento, pode
curar espontaneamente. No entanto, pode ser entendida como a manifestação de alguma doença
sistêmica que está por vir ou já está instalada clinicamente. Atividade da inflamação na íris sig­
nifica descontrole sistêmico da doença de base, caso exista. Cerca de 50% dos casos de irites
não possuem diagnóstico etiológico na primeira crise. No decorrer do processo, esse número
cai e quanto mais vezes o processo inflamatório volta, aumentam as chances de se encontrar
uma doença autoimune. Todas as vezes que o indivíduo se queixar de algum componente
sistêmico, o oftalmologista tem por obrigação realizar a pesquisa etiológica da uveíte. Logi­
camente que, na maioria dos casos, as pessoas não correlacionam suas manifestações gerais
com o olho. Necessariamente o médico deve fazer este papel, direcionando a anamnese para
o diagnóstico de seu interesse. Em inflamação intraocular, do início ao fim do processo, a ana­
mnese é o fundamento básico e a ferramenta mais importante para o prognóstico visual. A boa
relação médico-paciente e a completa revisão de sistemas evitam desperdício de exames não
indicados e desnecessários.

Acuidade visual
O paciente afetado apresenta-se com redução discreta da acuidade visual. Na maioria das ve­
zes, a acuidade está por volta de 20/40 a 20/60. Obviamente que, dependendo da intensidade
da inflamação, essa visão pode ser muito pior. Porém, quando se diagnostica uma uveíte ante­
rior com visão pior que 20/200 então imagina-se que o processo não esteja localizado somen­
te anteriormente, mas posteriormente também. Nesse caso teríamos como diagnóstico uma
226 Semiologia Básica em Oftalmologia

pan-uveíte, em que o segmento posterior foi a origem da irite. A uveíte anterior não provoca
a posterior, mas a intermediária pode ser concomitante à anterior. Quando há inflamação de
corpo ciliar associada à irite, a visão piora significativamente.

Olho vermelho
A unilateralidade da doença ocorre em quase a totalidade dos indivíduos afetados. A hipere-
mia geralmente fica restrita ao limbo. Os fundos de saco conjuntivais raramente ficam ver­
melhos, diferenciando, em muito, das conjuntivites. As hiperemias pericerática ou perilimbar
apresentam-se, obrigatoriamente, 360° ao redor da córnea. Se for observada apenas uma
hiperemia localizada, o diagnóstico pode ser uma ceratite focal periférica, confundindo o qua­
dro clínico. Na uveíte anterior não há secreção ocular. Algumas vezes, por irritação secundária
da córnea, pode haver lacrimejamento. Olho vermelho de forma difusa também confunde o
diagnóstico, mas se for bilateral, há grandes chances de ser conjuntivite. Episclerite pode levar
à hiperemia localizada, mas não nos 360° em volta da córnea. Na esclerite, o olho vermelho
vem associado à dor e fotofobia intensas. Os vasos da esclera profunda ficam ingurgitados e,
ao pingar uma gota de fenilefrina a 10%, o olho permanece vermelho devido à profundidade
da inflamação. Não devemos esquecer que esclerite pode desenvolver uveíte, especialmente
se houver necrose do tecido.

Reflexo vermelho a distância


Esse reflexo frequentemente está diminuído na irite devido à turvação do humor aquoso,
chamado clinicamente de JJare. Mesmo assim, dificilmente ele está ausente nas uveítes leves.
Pode estar ausente quando o processo inflamatório for muito intenso ou quando houver uma
complicação como a catarata. Pelo fato de a doença ser unilateral na maioria dos indivíduos,
vale a pena comparar o reflexo vermelho do olho normal com o do afetado.

Biomicroscopia
Os sinais e sintomas descritos anteriormente auxiliam na suspeita clínica. O exame de bio­
microscopia com a lâmpada de fenda faz o diagnóstico definitivo. Existem inúmeros sinais
microscópicos que comprovam a inflamação da íris. Os primeiros e mais corriqueiros são os
PKs (precipitados ceráticos) (Fig. 1). Os PKs são grupamentos de células inflamatórias que se
depositam na face interna da córnea. Indicam atividade da doença quando são brancos e nu-

Fig. 1 Uveíte anterior apresentando PKs na câmara anterior.


Semiologia Básica da Úvea e Esclera

merosos. Cronicamente tornam-se pigmentados e podem permanecer até por anos grudados
na córnea. Quando adquirem pigmentos não obrigatoriamente existe atividade da doença. Há
diversos tipos de PKs. Os mais comuns, finos, decorrem de doenças autoimunes na maioria
dos casos. Precipitados grosseiros denominados de “gordura de carneiro’’ (mutton-fat) apare­
cem em doenças granulomatosas ou em pan-uveítes. Essa correlação não necessariamente é
mandatória. Existem patologias granulomatosas que causam PKs finos e vice-versa. Quando
existem PKs grosseiros e de origem granulomatosa, observar se existem granulomas na íris.
Nódulos de Busacca no estroma e nódulos de Koeppe na borda da pupila são comuns nestes
casos. Ao tornar-se inflamada, a íris exsuda. Proteínas plasmáticas podem circular no humor
aquoso e, juntamente com células, tornam turvo o líquido transparente. Este sinal clínico
denomina-se flare e acompanha a intensidade de aparecimento dos PKs. Quanto mais intenso
forem os PKs e o flare, haverá maior redução de acuidade visual. Efeito Tyndall ocorre quando
se enxergam células no humor aquoso através do deslocamento do feixe de luz da lâmpada de
fenda. Aliás, o feixe da lâmpada de fenda pode auxiliar muito o diagnóstico. A alta intensidade
da luz refletida na íris auxilia a visualização de células no humor aquoso, e a formação da fen­
da ajuda na localização e quantificação dos PKs na face interna da córnea. A alta viscosidade
do humor aquoso, propiciada pelas proteínas plasmáticas de alto peso molecular, aumenta a
possibilidade de aderência entre estruturas intraoculares. Sinequias posteriores são exemplos
de adesão entre a íris e o cristalino. Esta forma de brida pode estender-se a 360° e formar
a seclusão pupilar, impedindo a passagem do humor aquoso da câmara posterior para a an-
terior provocando uma rápida hipertensão ocular, gerando o glaucoma secundário. As vezes
há formação de uma membrana na pupila e então denomina-se de oclusão pupilar. Sinequias
anteriores também podem aparecer aumentando a pressão intraocular devido à adesão entre
r

íris e córnea, na região do ângulo iridocorneano onde existe o trabeculado. E fato que, quan­
to mais intensa for a inflamação e mais grosseiros forem os PKs, há maior possibilidade de
aparecimento das sinequias. Também existe correlação entre sinequias posteriores e uveíte
intermediária. Quanto mais aderência existir entre o cristalino e a íris, mais acredita-se que a
irite esteja correlacionada com a inflamação concomitante de corpo ciliar.

Complicações
Inicialmente, a inflamação intraocular reduz a pressão ocular por diminuir a produção do hu­
mor aquoso. Porém, no decorrer do processo, e com certa frequência, as uveítes anteriores
promovem hipertensão ocular devido ao aparecimento das altas proteínas de peso molecular
e células no humor aquoso. Essas proteínas obstruem a malha trabecular, aumentando os va-
■\

lores pressóricos. As vezes, a inflamação estende-se ao próprio trabeculado, promovendo uma


trabeculite e estreitando a malha absortiva desse tecido. Ressalta-se que o corticoide tópico,
que geralmente é utilizado para o tratamento da irite, pode elevar a pressão intraocular, espe­
cialmente após a redução do processo inflamatório. Outra complicação comum é a opacifica-
ção do cristalino. Deve-se ter muito cuidado ao operar a catarata pós-uveíte, pois a inflamação
costuma voltar no pós-operatório. Contraindica-se a facectomia na vigência da inflamação.
Qualquer procedimento cirúrgico em um olho previamente inflamado requer especial atenção
devido ao maior índice de complicações graves, incluindo descolamento da retina. São co­
muns também, as opacidades de cápsula posterior.
228 Semiologia Básica em Oftalmologia

Etiologia
Geralmente a causa idiopática prevalece na primeira crise de uveíte anterior sem queixa sistê­
mica por parte do paciente. Das causas identificáveis, as espondiloartrites são as mais frequen­
tes (Tabela I). Em torno de 50% das irites são HLA-B27 positivas. Não necessariamente deve ha­
ver uma espondiloartropatia seronegativa como causa definida. Na prática, observam-se muitos
casos que clinicamente não correspondem a espondiloartropatias, mas que apresentam uveíte
anterior e HLA-B27+. Metade dos pacientes com a primeira crise de irite não possui clínica
sistêmica evidente, dificultando a identificação da patologia de base. A partir da segunda ou
terceira vez, o quadro clínico pode aparecer, facilitando o diagnóstico. Entre as patologias, a
espondilite anquilosante é seguramente ainda a causa mais comum de uveíte anterior no nos­
so meio. Outras doenças reumatológicas a serem descartadas são artrite psoriática, síndrome
de Reiter, doença inflamatória intestinal, doença de Behçet e lúpus eritematoso sistêmico.
Em suspeita de doença granulomatosa, o médico deve lembrar da hanseníase, da tubercu­
lose, da síndrome de imunodeficiência adquirida, da sarcoidose, da sífilis, do herpes vírus e
de outras viroses da infância, como sarampo, rubéola e varicela. Destaque especial deve ser
dado à infecção por hanseníase, herpes simples, varicela-zóster e tuberculose. Os pacientes
hansenianos, em geral adultos e idosos, que possuem afecção da úvea anterior, apresentam
outros sinais oculares concomitantemente como blefarite, tilose, madarose, olho seco e hi-
possensibilidade corneana. Na ceratouveíte herpética também há diminuição da sensibilidade
da córnea, além de endotelite (inflamação das células endoteliais) e, em muitos casos, ceratite
epitelial associada. No herpes-zóster, o sinal de Hutchinson (acometimento do dermátomo do
trigêmeo na região de pele nasal) pode ser um prenúncio de irite e ceratite. Na tuberculose,
o corpo ciliar e coroide são comumente atingidos, juntamente com a íris. Estas patologias
infecciosas ocorrem mais frequentemente em adultos jovens e idosos. Quando uma criança
apresentar inflamação ativa de maneira crônica e recidivante, o diagnóstico mais provável é
de artrite idiopática da infância, antes denominada artrite reumatoide juvenil. Nesse caso, o
olho geralmente é calmo, branco, com pouca reação de câmara, mas que pode trazer consigo
complicações graves como o glaucoma, ceratite em faixa e catarata. O acompanhamento das
crianças que têm fator antinuclear positivo (FAN + ) deve ser feito a cada 4 meses, já que essas
crianças, especialmente as que têm a doença na forma pauci ou oligoarticular, estão no gru­
po de risco para desenvolvimento de inflamação intraocular. As crianças que possuem fator
reumatoide positivo e fator antinuclear negativo mais raramente desenvolvem uveíte. As HLA-
-B27 positivas têm mais chance de apresentarem doença ocular em fases mais tardias da vida,
comportando-se de forma semelhante às espondiloartrites.

TABELA I Correlação entre uveíte e espondiloartrites


Doença Chance de uveíte em um Chance da doença em um paciente
paciente com a doença com uveíte
Espondilite anquilosante 20 a 30% 30 a 50% das uveites anteriores agudas
15% de qualquer uveíte
Síndrome de Reiter 12 a 37% 5 a 10% das uveites anteriores agudas
3% de qualquer uveíte
Artropatia psoriásica 7 a 16% < 1% de qualquer uveíte
Doença inflamatória do intestino 2 a 9% 2 a 3% de qualquer uveíte
Semiologia Básica da Úvea e Esclera

UVEÍTE INTERMEDIÁRIA
Comentários
Infelizmente, a uveíte intermediária é muito pouco diagnosticada na prática diária do oftal­
mologista. Isso ocorre pela dificuldade na identificação da inflamação do corpo ciliar. Entre as
uveítes, certamente é a mais rara. No entanto, sua cronicidade atinge a retina e deixa sequelas
que são confundidas pelos médicos com outras patologias, como a retinopatia serosa central,
o edema macular cistoide idiopático, o buraco macular, etc. Em grande parte dos casos, a cicli-
te atinge a mácula silenciosamente deixando uma “sequela” chamada edema macular, que com
o tempo pode tornar-se cística e complicar ainda mais seu tratamento. As patologias causado­
ras dessa entidade são obscuras e frequentemente a maioria dos casos é intitulado idiopático.
Sabemos que a falta da etiologia pode ser temporária e a busca incessante da causa deve ser
uma obstinação do médico. Como relatado, a identificação da inflamação do corpo ciliar é bas­
tante difícil, tornando o diagnóstico muito tardio, resultando em tratamento ineficaz. Portan­
to, a anamnese minuciosa e dirigida nessa entidade clínica é o principal meio de investigação
da patologia de base e seu pronto atendimento reduz a morbidade e as sequelas do processo.

Acuidade visual
Não é comum o indivíduo afetado apresentar-se com acuidade visual pior que 20/200. Porém,
como já foi comentado, a ciclite pode causar edema macular reduzindo a acuidade visual de
maneira mais intensa. Quando há turvação vítrea importante, o glare ou ofuscamento pode
aparecer, além da catarata capsular posterior, resultando em diminuição de visão. Concluindo,
o paciente varia muito sua acuidade, perdendo pouca visão quando não há sequela da infla­
mação e muita redução quando complicações tardias, como o edema e o buraco macular, já
tiverem se instalado.

Olho vermelho
Hiperemia pericerática pode aparecer nesse tipo de uveíte, mas é bem menos frequente do
que na uveíte anterior. Dificilmente há dor ocular ou fotofobia, a não ser que haja glaucoma
secundário ou afecção da córnea. Como existe possibilidade de concomitância entre uveítes
anterior e intermediária, em todo olho vermelho com sinequias posteriores intensas, deve-se
pensar em ciclite associada à irite.

Reflexo vermelho a distância


Se a turvação em vítreo anterior estiver presente no eixo pupilar, o reflexo estará ausente ou
bem diminuído. Caso a exsudação vítrea esteja depositada na porção inferior do corpo ciliar
(devido à ação da gravidade) o reflexo pode ficar normal. Esta afecção revela por que o pacien­
te se queixa de turvação maior da visão pela manhã (exsudação espalhada no vítreo anterior
atingindo o eixo óptico) melhorando com o passar do dia (exsudação deposita-se no vítreo
anterior inferiormente pela ação da gravidade).
230 Semiologia Básica em Oftalmologia

Biomicroscopia
O diagnóstico realizado pelo oftalmologista mais experiente é prontamente feito pela lâmpa­
da de fenda com o aparecimento da exsudação no vítreo anterior (Fig. 2). São verificadas cé­
lulas inflamatórias, parecidas com os PKs na face interna da córnea, só que no vítreo anterior.
Na maioria dos casos há necessidade de verificação da inflamação pela oftalmoscopia indireta
com dilatação de pupila para se verificar possíveis alterações retinianas e fazer diagnóstico di­
ferencial com uveíte posterior. Na biomicroscopia, o aparecimento de sinequias posteriores é
bastante comum. Quando se vê muitas sinequias posteriores em uma uveíte anterior, pensa-se
que este paciente possa estar sofrendo também de uma uveíte intermediária. Caracteristica-
mente, este tipo de sinequia é difícil de se desfazer. A pressão intraocular é baixa no início do
quadro de ciclite, no entanto, no decorrer do processo, a pressão pode subir e até promover
glaucoma secundário. A presença de catarata capsular posterior é bem mais comum neste
quadro inflamatório pela proximidade do local da inflamação.

Fig. 2 Uveíte intermediária demonstrando vitreíte anterior.

Oftalmoscopia
A presença de snowball (bola de neve) e snowbcmk (banco de neve) na ciclite não é mandatória.
Estes exsudatos no vítreo anterior, depositados inferiormente, são vistos no final do dia quan­
do o paciente, por ação da gravidade, permite que os encontre de maneira clássica. Na prática
diária, a turvação em vítreo anterior e a perda do reflexo foveal (pelo edema macular) são os
achados mais frequentes na ciclite, na fundoscopia indireta. Portanto, em todos os indivíduos
com suspeita clínica de ciclite, devem-se dilatar a pupila e realizar a ampla avaliação da retina,
procurando excluir coriorretinites causadoras de turvação vítrea. Logicamente, também para
auxílio no diagnóstico da própria uveíte intermediária com a presença dos exsudatos próxi­
mos de corpo ciliar.

Complicações
A catarata causada pela uveíte é a complicação mais frequente desse tipo de afecção ocular.
A opacificação do cristalino é capsular posterior, reduzindo de forma importante a acuidade
visual. Glaucoma secundário pelas sinequias posteriores também ocorre e deve ser tratado
precocemente, assim como na uveíte anterior. Descolamento de corpo ciliar não é comum,
mas pode aparecer em fases agudas do processo. A ecografia ocular consiste em um excelen­
te modo de quantificação da inflamação de corpo ciliar pela possibilidade de mensuração da
Semiologia Básica da Úvea e Esclera 231

espessura do tecido afetado. O edema crônico da mácula, além de reduzir a visão, pode tornar-se
cístico e complicar sobremaneira seu tratamento (Fig. 3). Talvez essa seja a complicação mais
temida desta patologia, pois pode resultar inclusive em buraco macular. Tração vítrea cons­
tantemente aparece nos casos de recidiva. Em algumas patologias, como a síndrome de Vogt-
-Koyanagi-Harada, a úvea intermédia é afetada de maneira intensa e a ecografia torna-se um
bom modo de acompanhamento desses pacientes.

Fig. 3 Tomografia de coerência óptica (OCT) mostrando edema


macular decorrente de uveíte intermediária.

Etiologia
As causas são obscuras e a inflamação de corpo ciliar precede muitas patologias sistêmicas. As
doenças associadas a essa entidade são a sarcoidose, a esclerose múltipla, a doença de Wipple
e o linfoma. No entanto, potencialmente, todas as causas de uveíte anterior podem provocar
ciclite. Algumas infecções, principalmente a tuberculose, também precipitam o processo infla­
matório no corpo ciliar.

UVEÍTE POSTERIOR
Comentários
No Brasil, historicamente, as uveites posteriores são causas frequentes de cegueira. Epidemio-
logicamente, há regiões que demonstram verdadeiras endemias dessa patologia. Em países
pobres, as infecções são preponderantes. Alguns países ricos raramente apresentam uveites
posteriores por motivo infeccioso. Nestas localidades, o processo autoimune continua preva­
lecendo, assim como nas uveites anteriores. Por ser comum e levar a perda de atividade produ­
tiva da população ativa por redução importante da visão, a coriorretinite ou a retinocoroidite
devem ser consideradas um problema social grave e de saúde pública. Programas de informa­
ção e higienização são fundamentais para o controle das infecções intraoculares.

Acuidade visual
O indivíduo afetado pela coriorretinite apresenta-se basicamente com redução da acuidade
visual. Se a lesão coroidiana atingir o polo posterior (próximo ao nervo óptico e mácula), a
acuidade visual fica pior que 20/200. Nos casos de exsudação vítrea (vitreíte) difusa ou poste­
rior também há perda relativamente grande. Somente não ocorre redução grave da acuidade
Semiologia Básica em Oftalmologia

quando a lesão for periférica, sem vitreíte e sem edema macular. Nesta forma, aparecem ape­
nas escotomas em campo visual. Em pacientes com coriorretinites muito próximas ao nervo
óptico (neurorretinites) pode resultar em atrofia óptica com amaurose. Em algumas situações,
a uveíte posterior avança ao segmento anterior provocando a pan-uveíte, momento em que
há maior risco de atrofia do globo ocular (phtisis bulbi). Frequentemente são observados des­
colamentos de retina nas coriorretinites extensas, fato complicador da patologia que vem
geralmente associado à ausência de percepção luminosa.

Olho vermelho e reflexo vermelho a distância


O olho não fica congesto nem hiperemiado na uveíte posterior, salvo se esta inflamação esten-
der-se à porção anterior do globo ocular, causando uveíte anterior ou propiciando complica­
ções como o glaucoma secundário, glaucoma neovascular e atrofia do globo ocular. O reflexo
vermelho a distância apresenta-se ausente se houver vitreíte (turvação do corpo vítreo), lesões
extensas de coriorretinite ou descolamento de retina. Permanece normal nas lesões periféri­
cas sem turvação dos meios. Na maioria das vezes, o olho está calmo, branco e o reflexo ver­
melho reduzido.

Biomicroscopia
Na coriorretinite sem acometimento do segmento anterior (sem pan-uveíte), o exame na lâm­
pada de fenda não apresenta anormalidades. Apenas evidencia-se a presença de células no
vítreo, em algumas situações de exsudação intensa. Obviamente se for realizado o exame de
biomicroscopia de fundo, a lesão retiniana poderá ser observada. Sinequias posteriores não
são corriqueiras, assim como o glaucoma secundário que é menos comum que nas uveítes
anteriores e intermediária.

Oftalmoscopia
O exame de eleição para o diagnóstico e acompanhamento das coriorretinites é a fundos-
copia indireta. Sempre sob dilatação da pupila, o examinador consegue identificar a lesão
no complexo retina-coroide. Geralmente observa-se lesão esbranquiçada, exsudativa, com
bordas indefinidas, de padrão tridimensional afetando o vítreo posterior. A vitreíte também
é comum e dificulta, em grande parte dos casos, na visualização do segmento posterior.
Nódulos e granulomas podem aparecer e, nesta situação, apresentam-se com bordas níti­
das, elevados, isolados ou múltiplos, esbranquiçados ou amarelados. Hemorragias intra e/ou
pré-retinianas, hemorragia vítrea, exsudatos duros e algodonosos, edemas macular (Fig. 4)
e de retina periférica, descolamento seroso, vasculites, entre outras, são consequências do
processo inflamatório de segmento posterior. Nesta patologia encontram-se quase todos os
tipos de alterações retinianas possíveis. O descolamento de retina também é comum, espe­
cialmente nos indivíduos que têm inflamação crônica e traves vítreas por longo período de
tempo. Todo paciente que apresentar pressão intraocular baixa juntamente com exsudação
vítrea e fibrose, lembrar a possibilidade de descolamento de retina. A ecografia ocular, nes­
tes casos, confirma a hipótese.
Semiologia Básica da Úvea e Esclera

Fig.4 Edema macular secundário à vasculite.

Complicações
As sequelas que levam a perda visual, neste tipo de patologia, infelizmente são bastante co­
muns. Descolamento de retina e isquemia do segmento posterior são as mais graves compli­
cações das coriorretinites. A exsudação no vítreo pode levar à cicatrização e tração vitreorre-
tiniana, levando ao descolamento da retina. A isquemia da retina, pelo descolamento ou pela
lesão extensa da retina, propicia a liberação de fatores de crescimento endotelial provocando
o aparecimento de neovasos. Estes vasos malformados migram para o segmento anterior, blo­
queando o trabeculado no ângulo iridocorneano e desenvolvendo o glaucoma neovascular. A
pressão intraocular pode atingir níveis elevadíssimos e, além de causar atrofia óptica, acaba
por lesionar as próprias células do corpo ciliar produtoras de humor aquoso. Estas células pa­
ram de produzir humor aquoso e a atrofia ocular (phtisis bulbi) está instalada. Neste momento
a córnea perde sua transparência e a deturgescência ineficaz aumenta a tensão tissular do te­
cido, aumentando mais ainda a dor e a fotofobia. Felizmente, a maioria dos olhos não evolui
assim. A lesão cicatricial da coriorretinite consiste na sequela mais comum da uveíte posterior
(Fig. 5). Logicamente, onde instala-se essa cicatriz há perda visual irreversível. Alguns pacien­
tes podem evoluir ainda com pan-uveíte e apresentarem glaucoma secundário com sinequias
posteriores. A catarata também aparece, especialmente se houver vitreíte por longo período
de tempo.

Fig. 5 Fibrose no vítreo com tração vitreorretiniana pós-uveíte


posterior.

Etiologia
Como já comentado, a uveíte posterior tem sua etiologia dependendo das condições de hi­
giene e saneamento básico da população. A princípio, quase toda coriorretinite tem fundo
234 Semiologia Básica em Oftalmologia

infeccioso. Até provarem o contrário, todos os trabalhos epidemiológicos de investigação


das causas das coriorretinites mostram infecção em torno de 90%. Em grande parte do Bra­
sil, a toxoplasmose lidera. O Toxoplasma gondii pode atingir a retina de forma congênita ou
adquirida. Na congênita, a infecção intrauterina no primeiro trimestre pode causar aborto.
No segundo trimestre pode levar à tétrade de Sabin (coriorretinite, calcificações cerebrais,
retardo mental e microcefalia) e no terceiro trimestre o oocisto da toxoplasmose pode ins-
talar-se na retina e eclodir seus trofozoítas somente depois de 20 a 40 anos. As lesões pro­
venientes de origem congênita apresentam mais tendência à recidiva e são encontradas em
maior número que nas adquiridas. A sorologia IgM geralmente é negativa e a IgG mostra alta
titulação por ser a uveíte posterior uma infecção secundária da toxoplasmose. A tubercu­
lose gera granulomas no fundo de olho, vitreíte e coriorretinites, mostrando teste de Man-
toux forte reator. A sífilis deve ser lembrada ao apresentar-se com lesões exsudativas em
vítreo associada à coriorretinite em “sal e pimenta” nos pacientes imunossuprimidos com
VDRL em alta titulação e FTAbs positivo. O vírus da imunodeficiência humana pode causar
manchas algodonosas na retina, além de propiciar o aparecimento das lesões exsudativas e
hemorrágicas do citomegalovírus, especialmente se a concentração dos linfócitos T CD4+
estiver baixa (menos de 100 células). Vírus herpes simples, zóster, Epstein-Barr, rubéola e sa­
rampo também podem afetar a úvea posterior, principalmente na infância. Nesta faixa etária
ainda devem ser lembradas a toxocaríase, lesão coriorretiniana causada pela larva do Toxoca-
ra canis, comum em fezes de filhotes de cães. Necrose retiniana aguda provoca lesões exten­
sas hemorrágicas e exsudativas (lesões de “catchup com maionese”) e pode estar associada
a alguma virose. Doenças autoimunes também podem causar uveíte posterior. Sarcoidose
promove periflebite e hemorragias em “chama de vela” , além de granulomas em coroide.
Doença de Behçet induz vasculite em capilares retinianos e de coroide. O lúpus eritemato-
so sistêmico também gera vasculite e forma exsudatos algodonosos extensos, chamados
de corpos cistoides na retina. Fenômenos trombóticos e hemorrágicos com presença de
vasculite chamam atenção para a síndrome de anticorpos antifosfolípides, que demonstram
anticorpos anticoagulante lúpico e anticardiolipina positivos (Fig. 6). Pan-arterite nodosa
pode formar microaneurismas e outras colagenoses menos comuns, como policondrite reci-
divante e dermatopolimiosite podem resultar em vasculite retiniana.

Fig. 6 Angiografia fluoresceínica mostrando vasculite em


paciente com síndrome de anticorpo antifosfolípide.
Semiologia Básica da Úvea e Esclera

PAN-UVEÍTE
Esta patologia, que decorre da inflamação generalizada de todos os segmentos da úvea, tem ori­
gem na coroide ou corpo ciliar. Uma uveíte anterior não causa a posterior, mas o contrário é prová­
vel. As coriorretinites frequentemente causam discreta inflamação do segmento anterior. Portanto,
as causas mais comuns dessa doença são as mesmas já discutidas no item das uveítes posteriores.
As pan-uveítes reduzem muito a acuidade visual, perdendo reflexo vermelho a distância e
causando olho vermelho em decorrência da atividade da inflamação na íris. Os sinais e sinto­
mas, portanto, são uma associação entre as diversas formas de uveíte.
As causas são as mesmas das uveítes posteriores. Porém há duas patologias que devem
ser estudadas separadamente: a síndrome de Vogt-Koyanagi-Harada e a oftalmia simpática. Es­
tas duas patologias são etimologicamente parecidas e referem a origem autoimune contra os
melanócitos. Devem ser pensadas quando há pan-uveíte bilateral concomitante. Geralmente
a primeira camada a inflamar é o corpo ciliar e o vítreo. Posteriormente, há formas da doença
que cursam com descolamento seroso da retina e sinequias posteriores e outras que atingem
mais o segmento anterior. Glaucoma secundário e catarata são complicações muito frequen­
tes. A síndrome de Vogt-Koyanagi-Harada possui sintomas sistêmicos como cefaleia por me-
ningismo, zumbido, hipoacusia, vitiligo, poliose, mechas brancas no cabelo e alopecia.

EPISCLERITES E ESCLERITES
A esclera possui três camadas: a episclera, cuja inflamação chama-se episclerite, o estroma e a
lâmina fusca. A esclerite compreende a afecção de todas as camadas da esclera, incluindo a epis­
clerite. A episclerite tem caráter benigno, autolimitada e quase indolente. Somente devemos
observar doença sistêmica nos casos recidivantes e em crianças. Na maioria dos casos, a doença
é idiopática, acomete adultos jovens e apresenta como clínica discreto desconforto, fotofobia e
lacrimejamento. O olho vermelho é característico, demonstrando hiperemia localizada de forma
nodular ou difusa. Não há redução da acuidade visual e a dor não é importante. Ao instilar 1 gota
de fenilefrina tópica a 10%, os vasos episclerais são atingidos pela vasoconstrição propiciada pelo
colírio e o olho fica branco, o que não ocorre quando a inflamação está instalada em tecidos
mais profundos. A esclerite, contrariamente à episclerite, compreende causas granulomatosas
de doenças sistêmicas. Tuberculose, hanseníase, herpes, HIV, sarcoidose, doença de Behçet, gra-
nulomatose de Wegener, sífilis, trauma, lúpus e outras colagenoses podem causar o processo
inflamatório escleral. Certamente, a etiologia mais comum é a artrite reumatoide do adulto,
que classicamente é descrita como escleromalácia perfurante (scleromalacia perforans) (Fig. 7).
Na realidade, raramente perfura e sugere apenas afmamento escleral pela necrose de parte do
tecido. As esclerites são classificadas como anteriores ao equador ocular ou posteriores. O qua­
dro clínico é semelhante, com exceção da posterior que não aparece no olho vermelho por estar
“escondida” dos olhos do examinador. A dor costuma ser lancinante e intensa. A acuidade visual
pode ser afetada se a esclerite causar uveíte secundária. Isso ocorre nos casos mais graves com
necrose e nódulos inflamatórios profundos. Então, a classificação passa também pelo crivo da
inflamação e da necrose, ou seja, pode ser anterior necrosante com ou sem inflamação (sem
inflamação é a famosa escleromalácia perfurante da artrite reumatoide). Pode ser anterior não
Semiologia Básica em Oftalmologia

Fig. 7 Esclerite necrosante sem inflamação - escleromalácia


perfurante em paciente com artrite reumatoide.

necrosante com inflamação de forma nodular ou difusa (esta última aparece como a forma mais
comum de apresentação). A forma de apresentação posterior também pode apresentar necrose
ou não e seu diagnóstico é ecográfico. Suspeita-se quando o paciente tem pouca redução da vi­
são (pelo edema macular ou dobras de coroide), dor intensa, olho quase nada congesto na região
anterior e discreta exoftalmia ou proptose. A esclerite nodular, especialmente a necrosante, está
mais associada à presença de uveíte que as demais formas de apresentação.
Esclerite é sinônimo de doença ocular grave e, além de complicar com uveíte, pode levar
à phtisis bulbi.

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L i t e r a t u r a S u g e r i d a

1. Uveites - Fernando O. Manual do CBO - Uveites.


2. Reumato-oftalmologia - Marcelo Gehlen eThelma Skare. 1â ed., São Paulo:Tecmedd, 2007.
Ln

Semiologia Básica da Retina

FÁBIO EDUARDO EBERHARDT ALVES • ROMMEL JOSUÉ ZAGO

ALTERAÇÕES VASCULARES
Hemorragias em chama de vela: hemorragias localizadas nas camadas superficiais da retina
(camada de fibras nervosas) geralmente obedecem à orientação das fibras da região onde es­
tão localizadas. São encontradas em doenças, como a retinopatia diabética, oclusões vascula­
res, retinopatia hipertensiva, e quando localizadas sobre ou ao redor da papila podem indicar
a existência de um glaucoma descontrolado.
Micro-hemorragias e hemorragias intrarretinianas profundas - são hemorragias de aspec­
to arredondado e estão localizadas nas camadas mais profundas da retina. Ocorrem em várias
doenças, como, por exemplo, retinopatia diabética, oclusões venosas e leucemia.
Manchas algodonosas: também chamadas de corpos cistoides, indicam uma isquemia se­
torial da camada de fibras nervosas com inibição do transporte axoplasmático e são originadas
de uma oclusão da arteríola pré-capilar. Principais doenças causadoras são retinopatia diabéti­
ca, retinopatia hipertensiva, oclusões vasculares, retinopatia de células falciformes, retinopa­
tia radioativa, vasculites, colagenoses, leucemias e AIDS.
Exsudatos lipídicos: depósitos de resíduos de colesterol nas camadas plexiformes interna
e externa. Aparecem secundários a vazamentos crônicos de material intravascular para o es­
paço extracelular. Encontrado em doenças, como a retinopatia diabética, oclusões venosas e
DMRI.
Exsudatos duros: extravasamento de conteúdo intravascular, amarelado, localizado princi­
palmente na camada plexiforme externa. Ocorre em doenças que cursam com incompetência
vascular, como a retinopatia diabética, oclusões venosas e telangiectasias.
Microaneurismas: são dilatações fusiformes ou arredondadas dos capilares retinianos e
ocorrem pela perda setorial de pericitos. Ocorrem principalmente na retinopatia diabética.
238 Semiologia Básica em Oftalmologia

Macroaneurismas: são dilatações arredondadas ou fusiformes de ramos da artéria central


da retina. Aparecem como lesões arredondadas vermelhas ou esbranquiçadas e estão locali­
zados principalmente nas bifurcações do ramo arterial ou em um cruzamento arteriovenoso.
Podem ser encontrados na HAS crônica e principalmente em pacientes do sexo feminino na
sexta e sétima décadas de vida.
Telangiectasias: são ectasias do leito capilar dos vasos retinianos terminais. Podem estar
localizadas em qualquer lugar da retina, mas as mais características são as telangiectasias jus-
tafoveais idiopáticas.
Neovasos: são vasos anômalos, geralmente mais finos e tortuosos, encontrados em tu­
fos ou isolados, localizados no plano logo acima da retina ou já invadindo significativamente
a cavidade vítrea. Estão geralmente associados a áreas de má perfusão vascular e isquemia
próximos a sua localização. Encontrados em doenças como a retinopatia diabética, oclusões
venosas e vasculopatias oclusivas (p. ex., doença de Eales, anemia de células falciformes e
vasculites).
Aumento da tortuosidade vascular: encontrados em processos tracionais (p. ex., membra­
na epirretiniana, vitreorretinopatia exsudativa familial e retinopatia da prematuridade) e em
processos vasculares propriamente ditos, como retinopatia hipertensiva, retinopatia diabética
e oclusões venosas.
Colaterais (shunts): os shunts venosos ocorrem em duas topografias principais: shunts opto-
ciliares, que são comunicações entre a circulação venosa retiniana e circulação coróidea, apa­
recem como alças na cabeça do nervo óptico. Ocorrem, principalmente, em casos de oclusão
da veia central da retina ou no meningioma da bainha do nervo óptico. E shunts entre arcadas
venosas que ocorrem após a oclusão de uma delas para que ocorra a derivação do fluxo da
veia ocluída para a veia que está patente. Temos também shunts arteriovenosos que podem
ocorrer em malformações, como a síndrome de Wyburn-Mason, e em processos oclusivos como
a doença de Eales e na anemia de células falciformes.
Beading venoso: dilatação venosa irregular dando a aparência de rosário ou salsichas. Ocor­
re principalmente na retinopatia diabética e indica sinais de isquemia retiniana nesta doença.
IRMA: anormalidades microvasculares intrarretinianas. Refletem processos neovasculares
que ainda não romperam a membrana limitante interna em direção ao vítreo. Ocorre princi­
palmente na retinopatia diabética.
Embainhamento vascular: aparece como uma bainha esbranquiçada ao redor de vasos re­
tinianos e mostra que esses vasos foram vítimas de um processo inflamatório ou obstrutivo.
Êmbolos: tem três variedades principais: êmbolos de colesterol originados das artérias
carótidas comum e interna, êmbolos de plaquetas e fibrina originados de arteriosclerose dos
grandes vasos e êmbolos calcificados de alterações das válvulas cardíacas. Estão localizados
no sistema da artéria central da retina, podem ser vistos mais comumente nas bifurcações dos
ramos arteriais e na origem da artéria central.
Alterações hipertensivas: as mais comuns são a arteriosclerose (estreitamento à custa de
espessamento das camadas média e íntima e que aparecem como estreitamento focal ou difu­
so dos vasos arteriais e pelo aumento do seu reflexo dorsal da artéria acometida) e a ateros-
clerose que é o processo de formação do ateroma na camada íntima das arteríolas retinianas.
Semiologia Básica da Retina

ALTERAÇÕES MACULARES
Drusas de retina: são depósitos extracelulares amarelados que ficam entre a membrana basal
do EPR e a membrana de Bruch. Podem ser classificadas em duras (com as bordas bem defini­
das) e moles (com as bordas mal definidas) (Fig. 1). Foram classificadas no estudo AREDS (Age-
Related Eye Disease Study) de acordo com o seu tamanho e correlação com a DM RI.
Categoria 1 da AREDS (sem DMRI): é quando não encontramos drusas na região macular
ou encontramos apenas drusas pequenas (menores que 63 micra de diâmetro). Foi o grupo
controle da AREDS.
Categoria 2 da AREDS (DMRI inicial): é quando temos uma combinação de drusas peque­
nas em maior quantidade com drusas intermediárias (63 a 124 micra de diâmetro) ou associa­
das a anormalidades do EPR.
Categoria 3 da AREDS (DMRI intermediária): consiste de extensas áreas com drusas inter­
mediárias e pelo menos uma drusa grande (maior que 125 micra) ou uma área de atrofia geo­
gráfica que não envolva o centro da fóvea.
Categoria 4 da AREDS (DMRI avançada): quando é encontrada uma ou mais das seguintes
alterações: atrofia geográfica do EPR e coriocapilar envolvendo o centro da fóvea ou macu-
lopatia neovascular com membrana neovascular sub-retiniana, descolamento seroso ou serohe-
morrágico da retina ou do EPR, exsudação lipídica, proliferação fibrovascular sub-retiniana ou
subEPR ou cicatriz disciforme.
Neovascularização sub-retiniana (Fig. 2): são vasos da coriocapilar que perfuram e crescem
através da membrana de Bruch e entram no espaço subEPR e sub-retiniano. Quando cicatriza­
dos podem formar uma área de tecido fibrovascular chamada de cicatriz disciforme.

Fig. 1 Drusas moles e coalescentes na região macular.

Fig. 2 Membrana neovascular sub-retiniana com hemorragia


associada.
240 Semiologia Básica em Oftalmologia

Rotura de coroide: aparece como uma ou várias linhas concêntricas ao disco óptico. Geral­
mente estão associadas a hemorragias sub-retinianas e processos traumáticos. Podem tardia­
mente evoluir com MNVSR neste local.
Estafiloma posterior: ectasia da esclera no polo posterior. Está geralmente associada a
maculopatia miópica que são pontos de despigmentação do EPR por atrofia deste. Geralmente
ocorre em miopias superiores há 3,00D.
Atrofia coriorretiniana: área com atrofia da coroide e do EPR através da qual, algumas ve­
zes, podemos observar a esclera.
Lacker cracken são pequenas linhas observadas na região macular de pacientes com alta
miopia e refletem pequenas roturas da membrana de Bruch neste setor e podem, algumas ve­
zes, estar associadas à MNVSR.
Estrias angioides: são roturas da membrana de Bruch que aparecem na região peripapilar
como linhas escurecidas marrons ou vermelhas e podem se estender em várias direções a par­
tir da papila e, se atingirem a região macular, podem levar à baixa da acuidade visual. Nesta
patologia a membrana de Bruch está geralmente afinada e calcificada.
Descolamento neurossensorial: acúmulo de fluido ou sangue entre a retina neurossenso-
rial e o EPR. Aparece como região delimitada de alteração da coloração à custa de diminuição
da visibilização do EPR e da coriocapilar subjacente. Aparece em doenças como coroidopatia
serosa central, DMRI, vasculopatia polipoidal idiopática.
Descolamento de EPR: acúmulo de fluido ou sangue abaixo do EPR. Aparece geralmente
associado a drusas moles e MNVSR.
Atrofia do epitélio pigmentar da retina: uma ou várias zonas bem delimitadas de alteração
da coloração normal da região macular. Esta atrofia pode afetar o EPR e às vezes atingir tam­
bém a coriocapilar. Usualmente temos drusas ao redor desta área.
Edema macular: é o espessamento da retina neurossensorial macular observado na bio-
microscopia de mácula. Podem ser observadas na região, em algumas ocasiões, as cavidades
císticas intrarretinianas que este edema pode causar. É causado por patologias variadas, como a
retinopatia diabética, oclusões venosas, síndrome de Irvine-Gass, retinose pigmentar e uveítes.
Buraco macular (Fig. 3): formado geralmente por uma tração tangencial vitreomacular,
acomete todas as camadas da retina central. A classificação de Gass é muito útil na correlação
clínica com os achados oftalmoscópicos. São divididos em grau I - que é visto na biomicrosco-
pia de fundo como um ponto ou um pequeno anel amarelado; grau II - buraco macular visível
e completo que possui menos de 400 micra de diâmetro; grau III - buraco macular com mais

Fig. 3 Buraco macular.


Semiologia Básica da Retina 241

de 400 micra, porém sem descolamento da hialoide posterior e grau IV - buraco macular com
mais de 400 micra com descolamento da hialoide posterior.
Membrana epirretiniana (Fig. 4): membrana que aparece sobre a limitante interna e tem
como principais componentes a proliferação de astrócitos nesta região. Aparece geralmente
como uma área mais brilhante com linhas que representam dobras da limitante interna e tortuo­
sidade vascular secundária à tração no local. Podem ser idiopáticas ou secundárias a trauma,
uveítes, oclusões vasculares, cirurgias intraoculares e roturas retinianas.
Lesões coriorretinianas ou retinocoroidianas: são encontradas em processos inflamatórios
e/ou infecciosos do complexo retina-coroide. Geralmente apresentam-se como lesões esbran­
quiçadas, com edema de retina ao seu redor, mal definidas e podem ou não estar associadas
a outras alterações como vitreíte e vasculite. Quando cicatrizadas aparecem como uma área
de atrofia do EPR e da coroide afetada com graus variáveis de hipertrofia do EPR (pigmenta­
ção) neste setor. Elas recebem a denominação de acordo com o principal sítio de inflamação:
retinocoroidite - quando temos um processo retiniano que afeta também a coroide, como,
por exemplo, toxoplasmose, herpes e toxocaríase. Coriorretinite: quando o processo inicial é
coróideo e afeta secundariamente a retina, como, por exemplo, histoplasmose, sífilis e tuber­
culose.

Fig. 4 Membrana epirretiniana macular associada à lesão de


coriorretinite temporal.

ALTERAÇÕES DA PAPILA
Papila de Bergmeister: surge de células que constituem o epitélio primitivo da papila e forma­
vam uma proteção de tecido glial ao redor do terço posterior do sistema hialóideo. Ela apare­
ce na oftalmoscopia como um tênue tecido sobre a papila e pode estar associada à ausência
de escavação fisiológica e alças vasculares na papila.
Neovasos: são vasos anômalos, geralmente mais finos e tortuosos, encontrados em tufos
ou isolados, localizados no plano logo acima da papila ou já invadindo significativamente a ca­
vidade vítrea. Refletem uma isquemia grave de regiões extensas da retina. Encontramos prin­
cipalmente na retinopatia diabética, oclusões venosas e vasculopatias oclusivas periféricas.
Papila oblíqua: aparece como se o nervo fosse mais longo na horizontal do que vertical­
mente. Pode estar associada a uma crescente inferonasal e neste setor, o EPR, pode apresentar
uma hipocoloração em relação ao restante do fundo.
Hipoplasia de papila: suspeitamos de hipoplasia de papila quando o disco aparece menor,
pálido e cercado parcial ou totalmente por um anel branco-amarelado de pigmentação variá­
242 Semiologia Básica em Oftalmologia

vel. Histologicamente, podemos encontrar uma diminuição da camada de fibras nervosas e do


número de células ganglionares.
Coloboma de papila: comumente são congênitos e ocorrem por falha de fechamento da
fissura embrionária. Podem estar isolados ou associados a colobomas retinocoróideos (áreas
esbranquiçadas ou amareladas com as bordas pigmentadas, localizadas inferior ou inferona-
salmente à papila) e podem se estender até o segmento anterior provocando um coloboma
de íris. Essa anormalidade está presente em pessoas normais ou em algumas anormalidades
cromossômicas ou doenças multissistêmicas, como a síndrome de Goldenhar, síndrome de
Aicardi e trissomia do 13.
Fosseta de papila (Fig. 5): aparece como uma depressão oval ou arredondada dentro do
nervo óptico. Em 50% dos casos está localizada temporalmente na cabeça do nervo óptico.
Pode estar associada a anormalidades coriorretinianas setoriais e descolamento seroso da
mácula.
Drusas de papila: também chamadas de corpos hialinos, são concreções acelulares de ori­
gem desconhecida e geralmente calcificadas. São observadas inicialmente como elevação da
camada de fibras nervosas da papila “borrando” as suas bordas, e com o passar do tempo vão
aparecer pequenas lesões amareladas na superfície do disco ou em suas bordas.
Atrofia de papila (Fig. 6): palidez total ou setorial de papila geralmente associada a um
processo inflamatório ou isquêmico.
Edema de papila: borramento das bordas da cabeça do nervo óptico geralmente associada
a processos inflamatórios (p. ex., neurites desmielinizantes e neurorretinites) ou a processos
isquêmicos (p. ex., neuropatia óptica isquêmica anterior arterítica ou não arterítica).
Papiledema: nomenclatura utilizada para o edema de papila secundário a um processo de
hipertensão intracraniana. É geralmente bilateral e não reduz ou reduz levemente a acuidade

Fig. 5 Fosseta de papila.

Fig. 6 Atrofia de papila.


Semiologia Básica da Retina 243

visual nas suas fases iniciais. Exceção feita à síndrome de Foster-Kennedy na qual a localização
do tumor intracraniano leva a uma compressão no nervo óptico do lado do tumor e a uma
atrofia de papila e baixa acuidade no lado acometido deixando apenas o outro lado com ede­
ma de papila e baixa acuidade.

ALTERAÇÕES DO VÍTREO
Persistência do vítreo primário hiperplásico
Forma anterior: geralmente unilateral, sendo descoberta precocemente devido à presença de
leucocoria. Pode estar associada à catarata, glaucoma, hemorragia intraocular e microftalmia.
Quando há membrana retrolenticular tracionando os processos ciliares pode levar à atrofia do
globo ocular.
Forma posterior: aqui há a persistência da artéria hialoide, podendo haver grande persis­
tência de tecido saindo do disco óptico até a região retrocristaliniana ou apenas uma pequena
elevação. Algumas vezes esta forma está associada a dobras e descolamento da retina.
Liquefação vítrea: há evidências de que o vítreo já apresente alguma liquefação aos 4 anos
de idade, que atinge 20% em torno dos 18 anos. Após os 80 anos mais de 50% do vítreo está
liquefeito. Seu mecanismo é pouco compreendido, mas sabemos que pode ser liquefeito com
uso de enzimas como a condroitinase e a plasmina. Também pode ser ocasionado por trauma
mecânico, trauma térmico, como na crioterapia, diatermia ou fotocoagulação. Trauma quími­
co como na hemossiderose, quadros degenerativos, como miopia, processos inflamatórios,
r

irradiação e algumas doenças do tecido conjuntivo. E normalmente visível como formação de


lacunas opticamente vazias, contendo líquido claro.
Colapso vítreo ou sinérese vítrea: fenômeno relacionado com a idade. Consiste na contra­
ção do corpo vítreo, que é manifestada pela condensação de fibras vítreas deixando-as mais
visíveis ao exame, sendo possível em alguns casos confundir com a hialoide posterior.
Descolamento do vítreo posterior: ocorre quando há separação do colágeno tipo II do
córtex vítreo do colágeno tipo IV da membrana limitante interna. Pode ser total ou parcial e é
um evento comum e relacionado com a idade. Tende a ser mais precoce nos míopes e no sexo
feminino. Pode ser observado através da oftalmoscopia ou da biomicroscopia, como opacida­
des vítreas de formatos diversos. Algumas vezes pode-se notar a presença do anel de Weiss,
que aparecem como pequeno tecido brancacento no córtex vítreo posterior na área próxima
à papila e mácula.
Durante o exame biomicroscópico do vítreo posterior a movimentação do olho do pacien­
te primeiro para baixo e depois novamente para frente ajuda a estudarmos melhor o córtex
vítreo posterior.
Vitreosquise: é a separação do córtex vítreo posterior em duas camadas. Ocorre no dia­
bético com a proliferação neovascular nas lamelas de colágeno do córtex vítreo, quando este
ainda está aderido. A tração pode romper alguns neovasos causando hemorragia entre as ca­
madas do vítreo, fazendo, assim, uma vitreosquise hemorrágica.
Hialoses asteroides: são observadas múltiplas opacidades branco-amareladas no vítreo.
Muitas vezes dificultando a observação das estruturas retinianas, no entanto não costumam
244 | Semiologia Básica em Oftalmologia

atrapalhar a visão. As opacidades estão mais presentes nos vítreos anterior e central. Com a
movimentação do olho movem-se juntamente com o vítreo, voltando à posição inicial com a
parada do movimento. Não se depositam com o repouso. Os corpos asteroides parecem for­
mados de complexos lipídicos, especialmente fosfolípides associados a cálcio e fósforo.
Sínquise cintilante: apresenta-se como múltiplos depósitos de cristais ou ésteres de co­
lesterol, sendo mais brilhantes que na hialose. Pode ser observada na cavidade vítrea, como
também no segmento anterior e mesmo no espaço sub-retiniano. Ao exame oftalmoscópico
observa-se que os cristais ocorrem no vítreo degenerado e liquefeito e frequentemente depo-
sitam-se na cavidade vítrea inferior. Como na hialose, o quadro não costuma alterar a visão.
Opacidades vítreas: são classificadas de acordo com o tamanho, características e posição.
Opacidades finas: células, debris, exsudatos e fibrina. As células são predominantemente
linfócitos, células plasmáticas e macrófagos.
Opacidades grosseiras: grandes e irregulares são mais observadas em lesões mais agressi­
vas do segmento posterior. São compostas por células, macrófagos e fibrina.
Opacidades em cordão: observadas nas uveítes graves e de longa duração. São vistas com
as finas e grosseiras, sendo consequentes à alteração do corpo vítreo.
Snowballs: estão suspensas na periferia inferior, como pequenas bolas de neve ou algodão.
Snowbanking: é um acúmulo de massa fibroglial sobre a pars plana e adjacente à retina. Ge­
ralmente restrita à periferia, mas por ser móvel, pode estar mais posterior se o vítreo estiver
descolado. Pode persistir por semanas, mesmo após a resolução da uveíte.
Hemorragia vítrea: quando recente não é difícil de ser diagnosticada por seu aspecto aver­
melhado, quanto mais antiga a coloração ocre mais difícil a diferenciação de outras causas de
turvação vítrea. Deve-se sempre estar atento às possíveis causas, como neovasos, roturas re-
tinianas junto a vasos ou colapso vítreo. De acordo com sua localização em relação ao córtex
vítreo posterior é classificada em três grupos:
Hemorragia sub-hialoide: ocorre em olhos com descolamento do vítreo posterior geral­
mente por tração vascular. O sangue está bem delimitado no espaço sub-hialoide, podendo
fazer imagem de nível, quando o paciente estiver sentado.
Hemorragia intravítrea: pode ocorrer em olhos com ou sem descolamento do vítreo pos­
terior, o sangue tende a coagular ao longo das fibras vítreas formando múltiplas camadas que
podem se estender do vítreo posterior ao anterior. Apresentará diferentes graus de intensida­
de de acordo com a quantidade de sangue derramada no vítreo.
Hemorragias sub-hialoide e intravítrea combinadas: apresentam sinais em graus variáveis.
Podendo começar como sub-hialoide e espalhar-se pelo vítreo.

ALTERAÇÕES DA RETINA PERIFÉRICA


Dobras meridionais: aparecem em 20% da população, geralmente no quadrante nasal superior.
São alterações do tecido retiniano consequentes à proliferação de células gliais. Aparecem
como pregas elevadas orientadas radialmente a partir da ora serrata e podem se estender
posteriormente de 0,6 a 6 mm. Podem ocorrer roturas na margem posterior da dobra, mas o
descolamento de retina é raro.
Semiologia Básica da Retina 245

Degeneração cistoide típica ou microcística: é a degeneração periférica benigna mais fre­


quente. Aparece como uma área de espessamento da retina estendendo-se em torno de 0,5
diâmetro de disco da ora serrata podendo estender-se até o equador. Aparece como uma área
desfocada de múltiplos cistos. Normalmente bilateral, tende a aumentar com a idade. Pode
estar associada à formação de buracos retinianos, porém são limitados à retina interna e não
são risco para descolamento de retina.
Degeneração cistoide periférica reticular: menos comum que a cistoide típica, ocorre em
13 a 18% dos adultos, podendo ser bilateral. Também aparece como área desfocada, podendo
ser irregular, com um padrão reticular. Pode ser confundida com degeneração lattice. Também
não é de risco para perda visual, devendo ser observada.
Branco com e sem pressão: são vistos na oftalmoscopia binocular indireta. Quando se ob­
serva o fundo de olho com depressão escleral a área introfletida tem aparência laranja-averme-
Ihada, já no branco com pressão torna-se branca. A mesma área sem a depressão tem aspecto
cinza-translúcido. Geralmente o branco sem pressão está associado a maior risco de descola­
mento do vítreo posterior. Roturas retinianas podem desenvolver-se ao longo de sua margem
posterior, no entanto sua incidência é baixa.
Degeneração pavimentosa ou atrofia coriorretiniana primária: ocorre em aproximadamen­
te 27% dos pacientes acima de 20 anos de idade, podendo ser bilateral. Aparece como peque­
nas áreas, medindo até 1 diâmetro de papila, despigmentadas, planas e frequentemente cir­
cundadas por hiperplasia do epitélio pigmentar retiniano. Podem ser vistos vasos coroidianos
dentro das lesões. Não há risco aumentado de roturas nas lesões, devendo ter apenas controle
clínico.
Degeneração pigmentar senil periférica ou degeneração tapetocoroidal periférica: apa-
r

rece como uma pigmentação granular entre a ora serrata e o equador. E bastante comum,
atingindo 20% da população com mais de 40 anos de idade. Normalmente bilateral, pode ter
aparência reticular ou em espículas ósseas, podendo ser confundida com retinose pigmentar.
Pode estar acompanhada de drusas retinianas periféricas. Normalmente é um achado de exa­
me e não requer tratamento, apenas acompanhamento periódico.
Lattice: é encontrada em até 10% da população, em sua forma típica é uma degeneração
bem demarcada, circunferencial com adelgaçamento da retina e anomalias do vítreo adjacen­
te. A presença de finas linhas brancas, tipo espinha de peixe, contínuas com os vasos sanguí­
neos e alterações pigmentares é patognomônica, mas existem muitas variáveis. Usualmente, é
anterior ao equador, quando posterior ao equador tende a ser maior que o usual e associada
a aderências mais extensas. Como há tendência a ocorrerem roturas na margem posterior da
lesão, onde o vítreo é mais aderido, devem ser acompanhadas com critério.
Pacientes com sintomas de floaters e fotopsias, com história familiar de descolamento de
retina, com procedimentos cirúrgicos oculares agendados requerem maior atenção.
Snailtrack: é uma variação da degeneração lattice, sem o aspecto de espinha de peixe. A
lesão apresenta-se com pontos branco-amarelados brilhantes em seu interior, dando a impres­
são do rastro de lesma. Requer os mesmos cuidados da degeneração tipo lattice.
Retinosquise degenerativa: condição pouco frequente e geralmente bilateral. Ocorre nor­
malmente no quadrante temporal inferior, algumas vezes atingindo a região equatorial. Em­
bora seja assintomática no campo visual observa-se um escotoma absoluto, e seu risco de
246 Semiologia Básica em Oftalmologia

progressão é inferior a 10%. Na sua apresentação típica parece ser uma forma avançada de
degeneração cistoide.
A forma bolhosa ou reticular aparece como um domo fino e translúcido de tecido retinia-
no, que é fixo à movimentação ocular. Há uma associação com vasos escleróticos ou de apa­
rência branca na sua superfície, dando uma aparência de padrão reticular.
Hiperplasia congênita do epitélio pigmentar retiniano: aparece como mancha escura, de
tamanho variável, circundada por halo hipopigmentar. Pode estar presente uma área de atrofia
r

coriorretiniana no centro da lesão e simular cicatriz. E uma condição benigna.


Tufos de tração vitreorretiniana: são acúmulos de células gliais proliferadas na face da re­
tina causando uma elevação, geralmente benignos, embora possam estar associados a roturas
retinianas quando acontece liquefação e descolamento do vítreo.
Buracos retinianos atróficos: são buracos redondos, sem tração vitreorretiniana atingindo
até 2 diâmetros de disco. Devem-se a um afmamento progressivo da retina que pode ser se­
cundário à insuficiência vascular. A incidência de descolamento de retina é inferior a 7%.
Buraco retiniano operculado: o pedaço de retina flutuando aparece próximo ao buraco,
aderido ao vítreo. Como a tração não está mais presente, o risco de descolamento de retina é
menor. Merecendo maior atenção quando há tração próxima ao buraco, história de descola­
mento de retina no olho contralateral ou previsão de cirurgia oftalmológica.
Rotura retiniana linear: pode ter aspecto em ferradura (Fig. 7), como há persistência da
tração já que o vítreo continua aderido ao flap há risco maior de descolamento de retina, so­
bretudo quando há liquefação vítrea. E mais frequente com a idade, em pacientes vítimas de
trauma, míopes e com degeneração lattice. Seu risco de evoluir para descolamento de retina é
de 30%, devendo ser tratada.
Rotura gigante: é assim chamada a rotura que envolve mais de 90° da zona oral da retina.
r

E mais frequente em homens e geralmente está associada à alta miopia, seu tratamento requer
cuidado e o risco de ocorrer no outro olho é de 12%.
Diálise retiniana: é uma rotura que ocorre junto a ora serrata e com menos de 90° de ta­
manho. Geralmente em jovens sem nenhuma particularidade. E em sua maioria assintomática
e o quadrante temporal inferior é o mais envolvido. Por ser muito periférica necessita de de­
pressão escleral ou lentes de 3 espelhos para ser observada.
Descolamento de retina: é observado à oftalmoscopia como uma elevação da retina, po-
r

dendo ter linhas brancas na sua parte externa devido ao seu pregueamento (Fig. 8). E sempre
muito importante procurar por roturas retinianas, trações e alterações associadas.

Fig. 7 Rotura em ferradura.


Semiologia Básica da Retina 247

Fig.8 Descolamento de retina atingindo a região macular.

Descolamento de retina seroso: causado pela exsudação de fluido através do epitélio pig­
mentar da retina, como na coroidopatia serosa central.
Descolamento de retina regmatogênico (Fig. 9): causado por rotura, buraco ou diálise reti-
nianos, com a passagem do vítreo liquefeito para o espaço sub-retiniano, provocando, assim,
o descolamento.
Descolamento de retina tracional: é causado por tração vitreorretiniana, como na retino-
patia diabética. Podem estar associadas roturas da retina, configurando assim um descolamen­
to misto.
Proliferação vitreorretiniana: ocorre pela proliferação e contração de membranas celulares
não vasculares na superfície da retina e vítreo após o descolamento da retina. As células do
epitélio pigmentar retiniano são dispersas para o vítreo e podem, na presença de fatores de
crescimento, causar a proliferação vitreorretiniana.
Drusas de periferia: são depósitos localizados entre a membrana basal do epitélio pigmen­
tar retiniano e a membrana de Bruch.
Drusas duras: depósitos amarelados na retina profunda, têm margens bem definidas e
geralmente pequenas (menores que 63 p) são depósitos de material hialino nas camadas cola-
genosas interna e externa da membrana de Bruch. Podem estar associadas à hipopigmentação
do EPR adjacente.
Drusas moles: são maiores que 63 p, têm margens mal definidas e podem se unir tornan-
do-se confluentes e simulando um descolamento seroso do EPR. Estão mais diretamente rela­
cionadas com o risco de desenvolvimento da degeneração macular relacionada com a idade.
Drusas cuticulares ou drusas da lâmina basal: são múltiplos pontos amarelos finos e con­
sistem de um espessamento hialino da lâmina basal do EPR. Estão presentes em jovens.

Fig. 9 Descolamento de retina regmatogênico.


248 Semiologia Básica em Oftalmologia

Drusas calcificadas: são pontos amarelo-brilhantes, normalmente associados a atrofia do


EPR. São drusas de longo tempo que sofreram calcificação.

BIBLIOGRAFIA
Ambujamra S etal. Retina e Vítreo: Clínica e Cirúrgica. São Paulo: Roca, 2000.
Oréfice F. Uveíte Clínica & Cirúrgica. 2â ed. Rio de Janeiro: Cultura Médica, 2005.
Ryan SJ. Retina. 3rded.Vol. 1. St. Louis: Mosby, 2001.
Siqueira RC, Oréfice F. Mapeamento de Retina: Oftalmoscopia Binocular Indireta e Biomicroscopia do Segmento Posterior.
Rio de Janeiro: RioMed, 2000.

L i t e r a t u r a S u g e r i d a

1. Ryan SJ. Retina. 3rd ed. Vol. 1. St. Louis: Mosby, 2001.
Semiologia Básica do
Glaucoma

KENJI SAKATA • LISANDRO SAKATA

INTRODUÇÃO
O glaucoma consiste em um grupo de doenças que apresentam como característica comum a
lesão glaucomatosa do disco óptico, associada à perda progressiva do campo visual. A lesão
das fibras nervosas pelo glaucoma representa um processo irreversível. O processo da neu-
ropatia óptica glaucomatosa leva à perda progressiva da visão periférica, poupando a visão
central até os estágios mais avançados da doença. Dessa maneira, a maioria dos pacientes não
relata nenhuma sintomatologia nas fases iniciais do glaucoma. Devido a essas características,
o glaucoma é uma doença cujo diagnóstico precoce e controle adequado são fatores essen­
ciais para o bom prognóstico do paciente.
Nas últimas décadas, novas tecnologias foram desenvolvidas para a avaliação do paciente
com glaucoma. Esses instrumentos apresentam grande potencial para avaliação estrutural do
disco óptico e camada de fibras nervosas, assim como para avaliação funcional do campo vi­
sual. Entretanto, apesar dessas novas tecnologias serem úteis em determinados aspectos da
avaliação do paciente com glaucoma, os seus aparelhos vêm apresentando constantes modifi­
cações com o intuito de melhorar suas respectivas performances, e até o presente momento,
nenhuma destas tecnologias se mostrou superior ao exame clínico realizado por oftalmologis­
tas qualificados. Assim, essas novas tecnologias ainda são consideradas exames complemen­
tares, e a propedêutica oftalmológica básica, quando realizada apropriadamente, é suficiente
para um adequado controle da maioria dos pacientes com glaucoma. Entretanto, é importante
ressaltar que além de equipamentos adequados, um treinamento oftalmológico de qualidade
e uma descrição apropriada dos achados clínicos no prontuário são fatores essenciais para a
boa prática da oftalmologia.
Este capítulo tem como objetivo principal revisar os pontos mais importantes a serem in­
vestigados durante o exame de pacientes com glaucoma e/ou suspeita de glaucoma, enfocan-

249
250 Semiologia Básica em Oftalmologia

do nos exames pertencentes à semiologia básica de qualquer oftalmologista generalista. As


técnicas para realização destes exames básicos e a maneira como os resultados precisam ser
incorporados ao raciocínio clínico do oftalmologista são descritas a seguir.

EPIDEMIOLOGIA DO GLAUCOMA*2
1
A epidemiologia é uma ciência médica fundamental. O conhecimento de quem pode desenvol­
ver uma determinada doença e em que circunstâncias são essenciais à prática diária da medi­
cina. Inúmeros estudos epidemiológicos foram realizados para verificar a prevalência do glau-
coma em diferentes populações do mundo. Considerando apenas os estudos que utilizaram
critérios diagnósticos semelhantes aos propostos pela International Society of for Geographical
and Epidemiological Ophthalmology (ISGEO), observou-se que a prevalência do glaucoma aumen­
ta com a idade e parece variar consideravelmente entre os diversos grupos étnicos. O glauco­
ma primário de ângulo aberto (GPAA) parece mais comum e mais agressivo em indivíduos da
raça negra quando comparado com todas as outras raças, enquanto o glaucoma primário de
ângulo fechado (GPAF) parece mais comum em pacientes de origem asiática (particularmente
chineses). Ainda, estima-se que pacientes com GPAF parecem evoluir para a cegueira em uma
frequência duas vezes mais alta do que pacientes com GPAA.
Um estudo epidemiológico avaliou 1.636 indivíduos acima de 40 anos de uma população
da Região Sul do Brasil (taxa de participação de 76,5%), e observou uma prevalência de todos
os tipos de glaucoma de 3,4% (intervalo de confiança [IC] 95%; 2,5 a 4,3). A prevalência do GPAA
foi de 2,4% (IC 95%; 1,7 a 3,2), uma taxa semelhante às observadas em populações da Europa
e de hispânicos residindo nos EUA. Entre os 40 casos de GPAA, 60% (24) foram classificados
como glaucoma de pressão normal, visto que esses pacientes não apresentaram PIO acima de
21 mmHg em pelo menos três ocasiões diferentes. A prevalência do GPAF observada neste
estudo foi de 0,7% (IC 95%; 0,3 a 1,1), uma taxa maior que as observadas na Europa e em his­
pânicos residindo nos EUA. Dez entre os 12 casos de GPAF (83%) não apresentavam sinais ou
sintomas de fechamento angular agudo, ou seja, representavam casos de GPAF assintomático.
O diagnóstico prévio da doença foi relatado por apenas 12% (6/52) dos pacientes com
glaucoma primário. Cegueira unilateral, definida como acuidade visual corrigida menor que
20/400, foi observada em 10 casos (5 GPAA, 2 GPAF, 3 glaucomas secundários). Não houve dife­
rença entre as taxas de prevalência do GPAA entre homens e mulheres, entretanto o GPAF foi
mais comum em mulheres. Com relação à raça, o glaucoma primário (GPAA + GPAF) foi mais
comum em indivíduos não brancos - maioria da raça negra e mulatos - do que em indivíduos
brancos, apesar de a diferença não ter sido estatisticamente significante (4,5%; IC 95%, 2,5 a
6,5 v. 2,9%; IC 95%, 1,9 a 3,9; respectivamente). Ainda, indivíduos não brancos apresentaram
taxas de cegueira unilateral mais alta do que os indivíduos brancos (p = 0,017). Assim, o glau­
coma primário na população do sul do Brasil parece mais comum e mais agressivo em indiví­
duos da raça negra e mulatos quando comparada com indivíduos da raça branca. Entretanto,
é importante ressaltar que os indivíduos negros que migraram para as Regiões Norte e Sul do
Brasil vieram de diferentes partes da África. Assim, como a prevalência do glaucoma varia sig-
nificativamente entre as populações negras de diferente origens, as taxas de prevalência ob­
servadas neste estudo podem não ser representativas da população brasileira como um todo,
Semiologia Básica do Glaucoma 251

e futuros estudos realizados em outras regiões do nosso país são necessários para verificar o
perfil epidemiológico do glaucoma no Brasil.

ANAMNESE
A avaliação de um paciente com glaucoma e/ou suspeita de glaucoma começa com uma ana-
mnese apropriada. O estabelecimento de uma boa relação médico-paciente é particularmente
importante no acompanhamento de uma doença crônica como o glaucoma.
Os dados demográficos fornecem informações importantes para enquadrar o paciente no
perfil epidemiológico do glaucoma, auxiliando no levantamento de hipóteses diagnósticas e
nos fatores de risco que ajudarão na tomada da conduta frente ao paciente. Dessa maneira,
quando examinando indivíduos idosos, o oftalmologista tem que estar ciente de que está exa­
minando um paciente com alto risco de apresentar o glaucoma. Por outro lado, quando o glau­
coma é diagnosticado em um paciente relativamente jovem, o oftalmologista deve considerar
que o paciente provavelmente estará exposto ao processo da lesão glaucomatosa por mais
tempo, e o controle da doença deve ser mais rigoroso. Assim, os dados demográficos devem
ser incorporados no raciocínio clínico frente a um paciente com glaucoma.
Ao realizar a anamnese de um paciente com glaucoma e/ou suspeita de glaucoma, é impor­
tante ter em mente que o glaucoma é uma doença que pode ser considerada assintomática, ao
menos até os seus estágios mais avançados. E isso parece verdade até mesmo para os casos
de GPAF, visto que vários estudos epidemiológicos observaram que a maioria desses pacientes
também não apresenta sintomas, ou seja, não apresenta crise de fechamento angular agudo.
Entretanto, alguns pacientes com glaucoma (particularmente glaucoma avançado) e com
uma percepção mais desenvolvida, podem reportar sintomas relacionados à perda da visão
periférica, relatando queixas características, como, por exemplo, tropeços, “esbarrar em ob­
jetos”, dificuldade em descer ou subir escadas, ou em achar objetos (paciente relata ter que
procurar canetas e outros objetos que caíram no chão ou que se encontram em cima da mesa).
Quando estas queixas são de início recente, o oftalmologista deve suspeitar de uma possível
progressão da lesão glaucomatosa e realizar uma investigação minuciosa sobre o controle da
doença. Ao mesmo tempo, nos casos que apresentam um ângulo iridocorneano estreito, os
pacientes podem reportar episódios de dor ocular associados à diminuição da acuidade visual
por um período relativamente longo, que ocorrem geralmente à noite. Nesses casos, o oftal­
mologista deve desconfiar da ocorrência de crises de fechamento angular intermitente (ou
subaguda). Após explorar as queixas do paciente apropriadamente e excluir possíveis diagnós­
ticos diferenciais, o oftalmologista deve procurar por sinais biomicroscópicos característicos
de crises de fechamento angular, assim como avaliar o ângulo iridocorneano a fim de investi­
gar a presença de um ângulo oclusível ou de uma possível progressão das sinequias anteriores
periféricas. É importante mencionar que nenhum estudo comprovou prospectivamente que
os sintomas relatados pelos pacientes apresentam alguma associação à progressão da lesão
glaucomatosa e/ou progressão do processo de fechamento angular. Entretanto, quando os sin­
tomas são apropriadamente explorados na anamnese, e o oftalmologista considera-os compa­
tíveis com uma possível progressão da doença, uma investigação clínica mais minuciosa se faz
Semiologia Básica em Oftalmologia

pertinente. O diagnóstico de progressão da doença somente pode ser confirmado baseando-


se em dados obtidos através do exame clínico (fundoscopia, périmétria, gonioscopia).
Apesar de o padrão de herança e dos genes envolvidos com o desenvolvimento do glau-
coma ainda não estar completamente compreendido até o momento, a presença de história
familiar para o glaucoma deve ser questionada. Frente a uma história familiar positiva para
o glaucoma, o oftalmologista deve procurar obter a maior quantidade de informações possí­
veis sobre o familiar com glaucoma, questionando os seus níveis de pressão intraocular (PIO),
tratamento que o familiar foi submetido (clínico ou cirúrgico), e sobre a presença de compro­
metimento visual relacionado com o glaucoma. Estes dados servirão não só para corroborar
ou contestar a história familiar positiva, como também para avaliar o quão agressivo é o glau­
coma naquela respectiva família. É importante comentar que os parentes de pacientes com o
diagnóstico confirmado de glaucoma correm maior risco de apresentarem a doença do que
indivíduos sem história familiar positiva, assim os oftalmologistas devem encorajá-los a serem
examinados. Este método pode representar uma estratégia efetiva para diminuir o número de
casos de glaucoma não diagnosticado, particularmente em países com limitados recursos para
a saúde pública.
A história oftalmológica pregressa também representa uma importante parte da anamne-
se, na qual o clínico deve questionar sobre traumas oculares, cirurgias oculares prévias, e uso
de corticoïdes e/ou outras medicações. Por sua vez, um levantamento da história mórbida pre­
gressa sistêmica pode evidenciar informações úteis para levantar possíveis diagnósticos dife­
renciais (p. ex., doenças neurológicas ou vasculares), hipóteses sobre a etiologia do glaucoma,
presença de fatores de risco para progressão do glaucoma (p. ex., enxaqueca ou síndrome de
Raynaud bem como glaucoma de pressão normal), e potenciais contraindicações absolutas e
relativas para determinados tratamentos antiglaucomatosos. A inter-relação da história oftal­
mológica pregressa e da história mórbida pregressa sistêmica com o glaucoma é um tema am­
plo, e este capítulo não tem a pretensão de abordar este tópico em toda sua extensão. Alguns
pontos sobre a história mórbida sistêmica e contraindicações para determinados medicamen­
tos são abordados a seguir, mas uma leitura mais abrangente do tópico em livros especializa­
dos é altamente recomendada a fim de garantir a prática de uma boa medicina.
Com relação a doenças do sistema respiratório, a presença de doenças obstrutivas crôni­
cas e/ou asma representa contraindicações absolutas para o uso de colírios betabloqueadores.
Anormalidades cardíacas (p. ex., arritmias cardíacas, particularmente, bloqueios de condução
e bradicardia sinusal) também podem representar contraindicações absolutas para o uso de
betabloqueadores e/ou agentes alfa-agonistas. O oftalmologista também deve questionar so­
bre a presença de hipertensão arterial sistêmica, seu tratamento e controle da pressão arterial
sistêmica. Vários estudos prévios observaram uma correlação positiva entre a PIO e os níveis
da pressão arterial sistêmica, assim como outros estudos observaram que a hipotensão arte­
rial noturna reduz o fluxo sanguíneo ao nervo óptico. Dessa maneira, níveis de pressão arterial
descontrolados podem ter um impacto negativo no controle da PIO, mas, por outro lado, um
tratamento que leve à hipotensão sistêmica noturna também pode contribuir para o processo
da neuropatia óptica glaucomatosa. O uso de inibidores de anidrase carbônica é contraindi-
cado em pacientes com anemia falciforme, visto que este fármaco pode levar à falcização das
hemáceas. Alguns estudos observaram que o tratamento com betabloqueadores pode levar
a uma diminuição dos níveis de HDL (bom colesterol), contudo, em portadores de infarto do
Semiologia Básica do Glaucoma

miocárdio, os benefícios proporcionados pelos betabloqueadores parecem superar suas even­


tuais desvantagens.
A história positiva para diabetes exige uma avaliação direcionada para a presença de pro­
cessos de neovascularização na retina, íris e ângulo iridocorneano. O uso de betabloqueadores
representa uma contraindicação em pacientes com diabetes tipo I em uso de insulina, pois
os betabloqueadores podem mascarar os sintomas de hipoglicemia e prolongar uma crise
hipoglicêmica. Ainda com relação ao sistema endócrino, o oftalmologista deve questionar o
paciente para a presença de doenças relacionadas com a tireoide e de tumores pituitários. Al­
terações renais, como cálculos renais e insuficiência renal, representam uma contraindicação
para o uso de inibidores da anidrase carbônica sistêmicos.
As medicações utilizadas pelos pacientes podem representar informações importantes na
avaliação e conduta do glaucoma. Assim, o uso de corticosteroides tópicos pode levar à hiper­
tensão ocular, e de antidepressivos tricíclicos ou do topiramato (utilizado para o tratamento
de convulsões e enxaquecas) pode levar a uma crise de fechamento angular agudo.
r

E importante ressaltar que a gravidez deve ser questionada em todas as mulheres em ida­
de fértil, visto que muitos dos medicamentos utilizados no tratamento para o glaucoma não
são apropriados para o uso durante a gestação. Um outro aspecto que não foi abordado nes­
te capítulo é o glaucoma congênito. Os sinais e sintomas do glaucoma congênito devem ser
prontamente identificados pelo pediatra e/ou oftalmologista generalista, pois o diagnóstico
precoce, particularmente neste tipo de glaucoma, representa um fator essencial para o bom
prognóstico visual. Uma vez identificado o característico quadro clínico do glaucoma congê­
nito (epífora, blefaroespasmo, buftalmo, edema de córnea, estrias Haab), o paciente deve ser
imediatamente encaminhado a um serviço especializado no tratamento desta doença, que é
primariamente cirúrgico.
Um último aspecto importante a ser abordado durante a anamnese, particularmente em
nosso país, concerne à avaliação do perfil socioeconômico do paciente e seu impacto no
acompanhamento e aderência ao tratamento indicado. O tratamento do glaucoma pode ser
considerado oneroso em grande parte dos casos, e o bom-senso do oftalmologista em consi­
derar o aspecto socioeconômico de cada paciente na decisão da conduta frente a cada caso,
pode definir o bom ou mau prognóstico.

INSPEÇÃO GERAL E BIOMICROSCOPIA


A inspeção geral do paciente deve seguir as orientações descritas em capítulos anteriores, ava­
liando, por exemplo, o estado geral do paciente, condições físicas e cognitivas para realizar o
tratamento prescrito, sinais sugestivos de anormalidades do tecido conjuntivo (síndrome de
Marfan), presença de anormalidades da pele (hemangiomas, etc.), e presença de exoftalmia. A
seguir a aferição da acuidade visual, e avaliação dos reflexos pupilares, particularmente impor­
tante para verificar a presença de defeitos pupilares aferentes, cuja presença indica disfunção
da condução óptica das vias aferentes.
O exame da biomicroscopia também deve seguir as orientações descritas em capítulos
anteriores, em que todas as estruturas do segmento anterior do olho devem ser examinadas
254 Semiologia Básica em Oftalmologia

cuidadosamente. Alguns importantes aspectos do exame biomicroscópico em pacientes com


glaucoma ou suspeita de glaucoma são descritos a seguir.
A avaliação da profundidade da câmara anterior fornece uma estimativa do grau de aber­
tura angular, e pode levantar a suspeita da presença de um ângulo iridocorneano estreito. Com
esse objetivo, a avaliação da profundidade da câmara anterior na região periférica da câmara
anterior pode fornecer informações adicionais àquelas obtidas na avaliação da região central.
De fato, a avaliação da profundidade da câmara anterior periférica pode ser considerada mais
objetiva do que a avaliação na região central, pois uma câmara de profundidade normal na
região central não exclui a presença de um ângulo iridocorneano estreito.
O método de van Herrick avalia a profundidade da câmara anterior periférica comparan-
do-a com a espessura da córnea periférica, e representa um exame que pode ser realizado em
qualquer lâmpada de fenda. Para realizar esse exame, a coluna de iluminação deve estar posi­
cionada a um ângulo de 60° do eixo do microscópio. A fenda de luz mais estreita possível, com
a máxima intensidade luminosa, é então direcionada perpendicularmente à superfície ocular
na região temporal do limbo, com a magnificação ajustada para 16x. A fenda é posicionada no
ponto mais periférico da córnea, onde seja possível ter uma visão clara da câmara anterior e da
periferia da íris. A profundidade da câmara anterior é comparada com a espessura da córnea
na região avaliada (Figs. 1A-E).
No ano de 2000, Foster et a i propuseram uma modificação na classificação do método
de van Herrick, em que a profundidade da câmara anterior periférica é classificada de acordo
com a porcentagem da espessura da córnea periférica em sete categorias: 0, 5, 15, 25, 40, 75 e
> 100% (Figs. 1 A-D). Segundo esse estudo realizado em uma população asiática, o grau igual
ou menor do que 5% foi capaz de identificar os casos com o ângulo iridocorneano oclusível
com uma sensibilidade de 91% e uma especificidade de 93%. Assim, o método de van Herrick
pode auxiliar o oftalmologista a identificar os casos suspeitos de terem um ângulo estreito, e
r

esses pacientes devem ser obrigatoriamente submetidos à gonioscopia. E importante ressaltar


que o método de van Herrick não substitui a gonioscopia, que deve ser realizada em todos os
pacientes com glaucoma e/ou suspeita de glaucoma (exame-padrão para avaliação do ângulo
iridocorneano).
O exame da córnea em pacientes com glaucoma deve procurar avaliar sinais sugestivos de
doenças relacionadas com o desenvolvimento do glaucoma. Assim, o oftalmologista deve veri­
ficar a presença de sinais de inflamação (precipitados ceráticos), de pigmentos no endotélio da
córnea (síndrome de dispersão pigmentar), anormalidades do endotélio corneano (síndrome
de Chandler, distrofia polimórfica posterior, etc.). A presença de edema corneano pode afetar
exames de tonometria, levando a uma hipoestimação da PIO. Ainda no exame da superfície
ocular, o achado de ingurgitamento dos vasos sanguíneos episclerais é sugestivo de anormali­
dades na drenagem venosa (p. ex., síndrome de Sturge-Weber).
Durante a avaliação da câmara anterior, procura-se a presença de sinais de inflamação (cé­
lulas e flare), sangue na câmara anterior, e a presença de células fantasmas (hemácias degene­
radas de coloração cáqui secundárias à hemorragia vítrea prévia associada à rotura da hialoide
anterior). Quando a íris é avaliada à biomicroscopia, alguns importantes aspectos relacionados
com o glaucoma merecem atenção especial. Episódios de fechamento angular agudo prévio
podem deixar sequelas na íris, tais como áreas de atrofia da íris, pupila em média, midríase
pouco reativa à luz, sinequias anteriores e sinequias posteriores. Defeitos de transilumina-
Semiologia Básica do Glaucoma

Figs. 1 (A-E) Avaliação da profundidade da câmara anterior periférica através do


método de van Herrick modificado. A profundidade da câmara anterior periférica é
comparada com a espessura da córnea periférica (A > 100%, B = 75%, C = 50%, D = 10%,
E = 5%). A Figura D ilustra a profundidade da câmara anterior de um paciente suspeito
de apresentar um ângulo iridocorneano oclusível. (Utilizado com autorização de Foster
e ta l. Br J Ophthalmol, 2000; 84: 186-92.)

ção da íris (geralmente defeitos radiais na sua meia periferia) podem ser observados através
da retroiluminação em pacientes com síndrome de dispersão pigmentar, devido à disrupção
mecânica da íris secundária ao atrito do epitélio pigmentar posterior da íris com a zônula. A
presença de rubeose irídica (presença de neovasos) na borda pupilar sugere a presença de pro­
cesso isquêmico ocular, geralmente secundário ao diabetes e/ou obstrução de vasos da retina,
que pode levar ao desenvolvimento de uma agressiva forma do glaucoma - glaucoma neovas-
cular. Ainda na borda pupilar da íris, em pacientes com síndrome pseudoesfoliativa, é possí­
vel detectar a presença de material pseudoesfoliativo, que tem uma aparência descrita como
semelhante a “cinza de cigarro”. Esse material pseudoesfoliativo também pode ser detectado
na superfície da cápsula anterior do cristalino, mais facilmente observado quando as pupilas
estão dilatadas. Um outro aspecto importante na avaliação do cristalino à biomicroscopia é a
sua posição relativa no segmento anterior, presença de facodonese e de glaukonijlecken - áreas
256 Semiologia Básica em Oftalmologia

de isquemia do epitélio subcapsular do cristalino secundário a crises de fechamento angular


agudo.

TONOMETRIA
A PIO é reconhecida como o principal fator de risco para o desenvolvimento do glaucoma.
Contudo, é importante ressaltar que a neuropatia óptica glaucomatosa pode desenvolver-se
em pacientes que apresentam níveis de PIO considerados dentro do limite da normalidade,
assim como alguns pacientes que apresentam níveis elevados de PIO não chegam a desenvol­
ver a doença. Apesar das características anatômicas/fisiológicas individuais que predisporiam
a uma maior suscetibilidade ao dano glaucomatoso não serem bem compreendidas, existem
estudos recentes sobre a cabeça do nervo óptico como uma estrutura biomecânica, caracteri­
zada pelas propriedades do tecido conjuntivo das várias estruturas anatômicas que o formam
(lâmina cribrosa, esclera peripapilar). Segundo tais estudos, níveis suficientemente elevados
da PIO podem provocar deformações temporárias e/ou permanentes na estrutura biomecânica
da cabeça do nervo óptico, em particular em um deslocamento posterior da lâmina cribrosa e
da esclera peripapilar. As variações anatômicas das estruturas que formam a cabeça do nervo
óptico em cada indivíduo determinariam o grau de suscetibilidade destas deformações. Uma
vez estabelecidas, essas lesões permanentes predisporiam as fibras nervosas no nível da ca­
beça do nervo óptico à lesão glaucomatosa, por mecanismos mecânico e/ou vascular. Neste
contexto, o desenvolvimento da lesão glaucomatosa dependeria de dois fatores principais: da
suscetibilidade individual de cada paciente e do nível da PIO.
Assim, além de ser um importante parâmetro para o diagnóstico do glaucoma, a PIO re­
presenta o único parâmetro passível de tratamento. O acompanhamento da eficácia do trata­
mento antiglaucomatoso se baseia, primariamente, nos níveis da PIO. Assim, após confirmar
o diagnóstico da doença, inicia-se um tratamento com o objetivo de reduzir a PIO a um de­
terminado nível que se acredita ser suficiente para impedir a progressão da neuropatia óptica
glaucomatosa. Estudos multicêntricos prévios sugeriram os níveis de redução pressórica re­
comendados em cada um dos estágios do processo glaucomatoso. Dessa maneira, se um pa­
ciente que teve sua PIO reduzida a um determinado nível se apresenta estável dos pontos de
vista estrutural (disco óptico) e funcional (campo visual), o oftalmologista tem a confirmação
de que o nível de redução pressórica é suficiente para este paciente, e continua a prescrever
o mesmo tratamento antiglaucomatoso. Por outro lado, quando um paciente que teve sua PIO
reduzida a um determinado nível apresenta progressão da neuropatia óptica glaucomatosa
(diagnosticado pela aparência do disco óptico ou exames de campo visual), o oftalmologista
percebe que a redução da PIO não foi suficiente para impedir a progressão da doença neste
paciente, e tratamentos adicionais se fazem necessários.
Uma vez revisado o papel da PIO no diagnóstico e acompanhamento do paciente com
glaucoma, compreende-se a importância em se realizar o exame de tonometria de maneira
adequada, pois uma boa técnica é essencial para a obtenção de estimativas confiáveis da PIO.
Os exames de tonometria estimam a PIO baseados na força necessária para deformar a córnea.
Atualmente, existem diversos tonômetros comercialmente disponíveis para aferição da PIO.
Semiologia Básica do Glaucoma

Cada um apresenta pontos positivos e negativos, mas o tonômetro de referência para aferição
da PIO continua sendo o de aplanação de Goldmann.
A tonometria de Goldmann é realizada após a instilação de 1 gota de colírio anestésico. A
seguir, segue a instilação de 1 gota de fluoresceína, removendo qualquer excesso de corante
para uma correta visibilização das miras do tonômetro. A luz azul de cobalto é então direcio­
nada para a ponta do tonômetro, com total abertura da fenda. Pede-se ao paciente para man­
ter os olhos na posição primária do olhar, e bem abertos. Com o leitor do tonômetro ajustado
para 10 mmHg, a ponta do tonômetro deve ser posicionada próxima a parte central da córnea
(com o examinador avaliando esta proximidade sem utilizar as oculares da lâmpada de fenda),
para então tocar gentilmente a córnea (com o examinador observando através das oculares
da lâmpada de fenda). Preferencialmente, o paciente deve manter os olhos abertos, mas se o
examinador precisar manter as pálpebras abertas, deve-se ter cuidado em evitar pressão sobre
o globo. A posição da ponta do tonômetro é cuidadosamente ajustada até que as duas miras
formem dois semicírculos de igual tamanho. O examinador então ajusta o leitor do tonômetro
até que as partes internas das duas miras se encontrem, escolhendo a posição onde as bor­
das internas das miras se encontram no ponto médio da flutuação do pulso ocular. Quando a
técnica é utilizada corretamente, as miras do tonômetro têm a aparência ilustrada na Figura
2C. Então, a coluna da lâmpada de fenda juntamente com a ponta do tonômetro são afastadas
para longe do olho, e o examinador pode ler a PIO indicada no leitor do tonômetro.
A tonometria de aplanação de Goldmann está sujeita a alguns erros na determinação da
PIO. A falta de fluoresceína pode levar à subestimação da PIO, enquanto o excesso de fluores­
ceína leva à hiperestimação da PIO. O posicionamento incorreto da ponta do tonômetro na
córnea pode levar à formação de semicírculos assimétricos, resultando na hiperestimação da
PIO. Irregularidades da córnea e astigmatismo contrarregra elevados também podem afetar a
precisão da aferição da PIO. Ainda, medidas prolongadas ou repetidas da PIO podem levar à
leitura com valores reduzidos.
r

E importante ressaltar que o tonômetro de Goldmann foi calibrado para uma espessura
da córnea central de 520 micra, medida com paquímetro óptico. Por esse motivo, os níveis

A B C
Figs. 2 (A-C) Ilustração da aparência das miras do tonômetro de Goldmann em três
situações. Em A há uma aplanação insuficiente da córnea, resultando em um valor no
leitor do tonômetro inferior a PIO real. Em B há uma aplanação excessiva da córnea,
resultando em uma leitura no tonômetro superior a PIO real. Em C a aplanação da córnea
está adequada, resultando no encontro correto das margens internas das duas miras e
estimação apropriada da PIO. (Cortesia do Professor Ivan Goldberg, Austrália.)
258 Semiologia Básica em Oftalmologia

de PIO obtidos através deste tonômetro podem estar subestimados em olhos que apresentam
uma espessura corneana mais fina, e hiperestimados em olhos que apresentam uma córnea
mais espessa. Dessa maneira, a determinação da espessura corneana central é altamente reco­
mendável em pacientes com glaucoma e/ou hipertensão ocular, particularmente em pacientes
que apresentam glaucoma avançado (onde um paciente com a PIO falsamente bem controlada
por causa de uma córnea fina pode resultar na progressão da doença e possível perda da visão
central), e antes de iniciar o tratamento em pacientes com hipertensão ocular (evitar o ônus de
um tratamento desnecessário). Um último ponto a ser considerado é a variação da PIO durante
as 24 h. No acompanhamento de pacientes com glaucoma é desejável obter o maior número
de medidas da PIO, na tentativa de melhor caracterizar o perfil pressórico de cada paciente,
identificando o pico e a flutuação da PIO durante o dia. Susanna et ai sugeriram que o teste
de sobrecarga hídrica pode representar uma maneira prática para se obter mais informações
sobre a PIO, avaliando como o sistema de drenagem ocular de um determinado paciente res­
ponde ao aumento da PIO provocado pela sobrecarga hídrica.

GONIOSCOPIA *lo
A gonioscopia é um exame que fornece informações importantes sobre a parede externa do
sistema de drenagem ocular, podendo corroborar ou confirmar algumas hipóteses diagnósti­
cas levantadas durante o restante do exame oftalmológico. Assim, o grau de pigmentação do
trabeculado filtrante pode corroborar com o diagnóstico de síndrome da dispersão pigmentar,
assim como a presença de uma ciclodiálise ou a verificação da oclusão do óstio da trabeculec-
tomia por um coágulo de sangue determinam a conduta a ser tomada em cada caso. Entretan­
to, o principal objetivo deste exame é o de avaliar o grau de abertura do ângulo iridocorneano.
Estudos epidemiológicos prévios sugerem que a forma assintomática do glaucoma de ângu­
lo fechado é a apresentação mais comum dessa doença e, também, que a prevalência do GPAF
em populações não asiáticas pode ser mais frequente do que inicialmente se acreditava. Nesta
doença agressiva, a anormalidade primária é representada pelo processo de fechamento angular,
que pode obstruir o trabeculado filtrante levando ao aumento da PIO, e consequentemente, ao
desenvolvimento da neuropatia óptica glaucomatosa. Uma das particularidades do GPAF é que,
se o fechamento angular for tratado antes do estabelecimento da lesão ao trabeculado filtrante,
todo o processo da lesão glaucomatosa pode ser evitado. Assim, a gonioscopia deve ser realiza­
da em todos os pacientes com glaucoma e/ou suspeita de glaucoma. Um paciente com glaucoma
não pode ser tratado adequadamente sem levar em consideração os resultados deste exame,
pois a não identificação de um ângulo oclusível impede o tratamento da anormalidade primária
que leva ao desenvolvimento da doença, o que pode comprometer o prognóstico do paciente.
A gonioscopia pode ser considerada como um exame de difícil aprendizado que exige ex­
periência e habilidade do examinador. Entretanto, é um exame que pode ser realizado rapida­
mente por um oftalmologista com domínio da técnica. Como a gonioscopia é um exame que
exige contato com o globo, deve-se ter cuidado em evitar a indentação acidental do ângulo
e também evitar o uso de luz em excesso durante o exame. Qualquer um desses dois fatores
(indentação acidental e excesso de luminosidade levando à miose) pode levar à observação de
um ângulo falsamente aberto.
Semiologia Básica do Glaucoma

O primeiro passo para realizar uma boa gonioscopia é saber reconhecer as estruturas
anatômicas presentes no ângulo iridocorneano. Partindo da parte mais anterior (córnea) para
a posterior, as estruturas que formam o ângulo iridocorneano são: linha de Schwalbe, trabecu-
lado anterior (não pigmentado), trabeculado posterior (pigmentado), esporão escleral e banda
do corpo ciliar (Fig. 3).

Fig. 3 Imagem de um ângulo iridocorneano do olho de um


cadáver humano mostrando (da parte mais anterior para a
posterior): leve pigmentação logo acima da altura da linha de
Schwalbe (lado esquerdo da figura),trabeculado com pigmentação
moderada, esporão escleral (parte branca entre o trabeculado e
a banda do corpo ciliar) e banda do corpo ciliar. Observam-se
também alguns processos irianos até a altura do esporão escleral,
sendo que alguns alcançam até o início do trabeculado
pigmentado (ao centro da figura). (Cortesia do Dr. Christopher
Girkin. Foto obtida no laboratório da Universidade do Alabama
em Birmingham, EUA.)

Basicamente, o exame de gonioscopia deve ter como objetivo responder a quatro per­
guntas:
1. Existe contato entre a íris com o trabeculado filtrante?
2. Se não se observa contato íris-trabeculado, existe evidência de contato prévio (presença de
sinequias anteriores periféricas ou imprint)?
3. Se existe contato íris-trabeculado, esse contato é reversível ou permanente?
4. Se o contato íris-trabeculado é permanente, qual a extensão do fechamento angular sine-
quial (altura, localização das sinequias anteriores periféricas).

Existem basicamente dois tipos de lentes para a realização da gonioscopia indireta: lente
de indentação de 4 espelhos (tipos Susmann ou Posner) e lente de não indentação de Gold-
mann. A melhor lente a ser utilizada ainda é um tema controverso, sendo que muitos espe­
cialistas consideram obrigatória a realização da gonioscopia de indentação com lente de 4
espelhos. Cabe lembrar que a lente de não indentação de Goldmann permite um exame mais
estável, proporcionando melhor visibilização das estruturas do ângulo iridocorneano, o que é
bastante interessante do ponto de vista de aprendizado da técnica da gonioscopia.
O exame gonioscópico é realizado após uma efetiva anestesia do olho. O paciente deve
estar confortavelmente posicionado, e uma breve explicação sobre o exame pode garantir a
cooperação do paciente durante o exame. Se necessário, deve ser utilizado um apoio para o
braço do examinador para garantir a estabilidade da lente de gonioscopia durante o exame,
diminuindo a possibilidade de indentação acidental. Durante o exame do olho direito, a colu­
na da lâmpada de fenda deve estar ligeiramente deslocada para a direita, assim como durante
o exame do olho esquerdo, a coluna deve estar deslocada para a esquerda. Dessa maneira,
impede-se que a coluna da lâmpada de fenda atrapalhe o posicionamento da lente durante a
maior parte do exame. As luzes da sala devem estar apagadas, e o paciente orientado a manter
a fixação na posição primária do olhar. O examinador posiciona a lente na parte central da cór­
nea, e, utilizando uma estreita fenda de luz com altura de 1 mm, inicia a avaliação do ângulo
260 Semiologia Básica em Oftalmologia

iridocorneano, preferencialmente na região inferior do olho (menor espelho colocado supe­


riormente). O primeiro passo consiste na identificação da linha de Schwalbe (local de transição
entre a córnea e a esclera), utilizando a fenda mais estreita possível, sob alta magnificação (au­
mento de 16x). A linha de Schwalbe é identificada na altura onde o feixe de luz acompanhan­
do o epitélio corneano se encontra com o feixe de luz acompanhando o endotélio corneano.
Uma vez que a linha de Schwalbe é identificada, a informação mais importante que o
examinador deve verificar é se existe contato da íris com o trabeculado. Se o contato entre
estas duas estruturas está presente, procura-se determinar qual o seu ponto de contato mais
anterior na parede do seio camerular (p. ex., contato no nível da linha de Schwalbe). Durante
essa parte do exame, a alteração do posicionamento da lente de gonioscopia deve se limitar
a pequenos movimentos necessários para se conseguir vencer uma eventual convexidade da
íris, pois a movimentação da lente pode alterar a configuração natural do ângulo. E deve-se
evitar que o feixe de luz incida sobre a pupila, o que levaria à alteração da configuração do
ângulo pela miose.
O grau de abertura do ângulo pode se dar através de classificações descritas na literatura
(Scheie, Shaffer, Spaeth). Cada classificação apresenta suas qualidades e limitações. A classifi­
cação de Scheie baseia-se na estrutura anatômica visível durante o exame de gonioscopia, mas
a estrutura que se encontra visível pode variar consideravelmente dependendo da direção do
olhar do paciente e da posição/inclinação da lente. As classificações de Shaffer e Spaeth defi­
nem o grau de abertura angular baseadas no ângulo formado entre a íris periférica e a parede
do seio camerular, mas a precisão na determinação deste ângulo é altamente dependente da
experiência do examinador. A classificação de Spaeth ainda inclui a determinação do perfil e
o nível de inserção da íris.
Uma vez avaliado o grau de abertura do ângulo iridocorneano em toda a circunferência
do olho (360°), o próximo passo nos pacientes com ângulos estreito ou fechado é a realização
do exame de gonioscopia dinâmica. Neste momento, a largura da fenda e a intensidade do
feixe luminoso podem ser aumentadas ao máximo, pois esta parte do exame tem como obje­
tivo diferenciar o fechamento angular aposicional (temporário) do fechamento por sinequias
anteriores periféricas (permanente). A presença de sinequias anteriores periféricas pode ser
verificada com a lente de Goldmann, através da técnica da gonioscopia de manipulação (des­
crita adiante). Entretanto, em alguns olhos, essa técnica não é capaz de diferenciar aposição
de sinequia. Nestes casos, a gonioscopia de indentação propriamente dita com a lente de 4
espelhos se faz mandatória.
Na gonioscopia de manipulação, o examinador deve pedir ao paciente para olhar em dire­
ção ao espelho da lente sendo utilizado para visibilizar o ângulo. Dessa maneira, o espelho da
lente é posicionado em uma localização que permite vencer qualquer eventual convexidade da
íris e, ao mesmo tempo, a borda da lente próxima ao espelho sendo observada é posicionada
na região central da córnea. O examinador pode então pressionar esta borda contra o olho do
paciente (“indentação” da parte central da córnea) para deslocar a íris posteriormente. A len­
te de 4 espelhos utilizada na gonioscopia de indentação apresenta uma área de contato com
diâmetro menor do que o da córnea. Assim, quando essa lente é pressionada contra o olho do
paciente, a íris é facilmente deslocada para trás.
Através da gonioscopia dinâmica, o examinador é capaz de verificar a eventual presença
de quaisquer sinequias anteriores periféricas, assim como sua localização, extensão e altura.
Semiologia Básica do Glaucoma 261

Os achados gonioscópicos podem ser descritos utilizando-se um goniograma, como o ilustra­


do na Figura 4. É importante lembrar que na gonioscopia indireta, o ângulo iridocorneano é
visibilizado através de espelhos. Assim, quando o examinador observa o espelho superior, ele
está examinando o ângulo inferior. Entretanto, a imagem não é invertida, ou seja, as estruturas
observadas no lado temporal do espelho colocado na região superior correspondem às estru­
turas do ângulo temporal-inferior, e não nasal-inferior.
A necessidade de realização de iridotomia a laser periférica deve ser avaliada caso a caso,
mas normalmente o diagnóstico de um ângulo oclusível é realizado quando o trabeculado
filtrante não é visível em 180° ou 270° da circunferência do ângulo iridocorneano, e/ou de­
finitivamente quando se observam sinequias anteriores periféricas secundárias ao processo
de fechamento angular. É importante ressaltar que a gonioscopia deve ser repetida após a
iridotomia, pois este procedimento elimina apenas o componente de bloqueio pupilar. Outros
mecanismos de fechamento angular podem estar presentes, contribuindo para a persistência
de um ângulo oclusível mesmo após a iridotomia (p. ex., íris em plateau).

Gonioscopia de não indentação

Fig. 4 Ilustração de um goniograma do olho direito descre­ Gonioscopia de indentação


vendo os achados de um ângulo estreito, onde apenas a linha de
Schwalbe é visível nos 4 quadrantes do olho. O segundo gonio­
grama (abaixo) descreve os achados da gonioscopia de indenta­
ção, onde se verifica que o ângulo abre até a altura do esporão
escleral nos 4 quadrantes. Entretanto, verifica-se a presença de
sinequias anteriores periféricas até a altura do trabeculado poste­
rior, localizadas às 3 h e entre às 10 e 11 h. (LS - linha de Schwalbe;
EE - esporão escleral; TA - trabeculado anterior.)

FUNDOSCOPIA
A avaliação do disco óptico e da camada de fibras nervosas é o exame mais importante para a
detecção do glaucoma. As anormalidades estruturais do disco óptico geralmente precedem os
defeitos funcionais detectados através dos exames de perimetria automatizada e, dessa ma­
neira, a avaliação do disco óptico se faz bastante útil para detectar casos de glaucoma inicial.
Entretanto, em razão da grande variabilidade do aspecto do disco óptico em indivíduos sem
glaucoma, a diferenciação entre um disco óptico patológico do normal pode ser uma tarefa di­
fícil em alguns casos. A capacidade de detecção dos sinais da neuropatia óptica glaucomatosa
depende do nível de conhecimento e experiência do examinador, e a performance diagnóstica
262 Semiologia Básica em Oftalmologia

pode ser aprimorada com o uso de uma avaliação meticulosa e sistemática do disco óptico e
da camada de fibras nervosas.
Susanna e Vessani descreveram um método sistemático de avaliação do disco óptico, ini­
cialmente idealizado por Susanna, Medeiros e Weinreb, sendo a leitura deste artigo altamente
recomendada. Este método de abordagem diagnóstica da neuropatia óptica glaucomatosa
inclui 5 passos:
1. Observar o anel escleral e identificar os limites do disco óptico, avaliando o tamanho do
disco óptico.
2. Identificar o tamanho da rima nervosa.
3. Avaliar a camada de fibras nervosas.
4. Examinar a região ao redor do disco para avaliar a presença de atrofia peripapilar.
5. Procurar por hemorragias do disco óptico.

O primeiro ponto a ser examinado é o tamanho do disco óptico, um parâmetro que apre­
senta uma considerável variabilidade entre a população. O tamanho do disco apresenta uma
relação direta com o tamanho da escavação e da rima nervosa. Um olho com um disco óptico
grande tende a apresentar uma escavação grande, e um olho com um disco óptico pequeno
tende a apresentar uma escavação pequena. Dessa maneira, indivíduos sem glaucoma, mas
com um disco óptico grande, podem ser erroneamente classificados como glaucomatosos. Por
outro lado, indivíduos com glaucoma, mas com um disco pequeno, podem ser erroneamente
classificados como normais.
Vista sua relevância na avaliação do disco óptico, entende-se que o oftalmologista precisa
estimar o tamanho do disco óptico utilizando os exames pertencentes à semiologia básica. Na
oftalmoscopia direta, o círculo de luz projetado na retina pela abertura pequena (5o) do oftal-
moscópio da Welch-Allyn tem um diâmetro aproximado de 1,5 mm e uma área de 1,8 mm2.
Como o diâmetro médio do disco óptico é de 1,8 mm no sentido vertical e de 1,7 mm no sen­
tido horizontal, o tamanho do disco óptico pode ser estimado em normal, pequeno ou grande
baseando-se na comparação deste círculo de luz projetado na retina com o disco óptico. Na
biomicroscopia de fundo, o tamanho do disco pode ser estimado ajustando o tamanho da fen­
da vertical com o tamanho do diâmetro vertical do disco óptico. A medida obtida na lâmpada
de fenda é então corrigida pelo poder da lente utilizada. Assim, esse valor é multiplicado por
1 quando se utiliza uma lente de 60D, por 1,1 quando se utiliza uma lente de 78D e por 1,3
r

quando se utiliza uma lente de 90D. E importante ressaltar que todas estas estimativas podem
ser influenciadas pelo comprimento axial do olho.
O próximo passo consiste na avaliação do tamanho, distribuição e coloração da rima neu-
ral. Os limites da rima neural são definidos pela borda do disco óptico e o local de angulação
dos vasos sanguíneos. Em olhos normais, a região inferior apresenta a maior espessura da rima
neural, seguida das regiões superior, nasal e temporal. Essa distribuição característica da rima
neural nos diferentes quadrantes do disco é chamada de padrão ISNT. No glaucoma inicial, a
perda da rima ocorre preferencialmente nas porções inferotemporal e superotemporal, o que
leva à quebra do padrão ISNT. A quebra da regra ISNT deve alertar o oftalmologista da suspeita
de glaucoma, mas é importante ressaltar que a ausência desta aparência-padrão da rima neu-
Semiologia Básica do Glaucoma 263

ral não representa, por si só, um sinal patognomônico de glaucoma. Por último, a coloração
da rima também é uma importante parte do exame, pois, quando a palidez de rima neural é
mais evidente do que a escavação, o diagnóstico de neuropatia óptica não glaucomatosa se
faz mais provável.
Por suas características anatômicas, a camada de fibras nervosas apresenta uma aparência
de estriações, mais visíveis nas regiões temporal inferior e temporal superior ao disco óptico
(onde a camada de fibras nervosas é mais espessa). A avaliação qualitativa da camada de fibras
nervosas pode ser feita através da fundoscopia, preferencialmente utilizando lentes de 78 D
ou 90D no exame de biomicroscopia de fundo. Para obter uma melhor visibilização da camada
de fibras nervosas, utiliza-se a luz red-free (verde) da lâmpada de fenda, e a magnificação da
lâmpada de fenda é reduzida (6x ou 10x) para permitir a avaliação de uma ampla área ao redor
do disco óptico. O oftalmologista deve avaliar a integridade das estriações da camada de fibras
nervosas, procurando por defeitos difusos ou localizados (Figs. 5 e 6). A avaliação da nitidez
dos vasos sanguíneos peripapilares também pode auxiliar a detecção de defeitos na camada
de fibras nervosas. Uma camada de fibras nervosas normal faz com que os vasos sanguíneos
peripapilares tenham uma aparência borrada, pouco nítida. Entretanto, quando ocorre uma
diminuição difusa dessa camada de fibras, os vasos peripapilares passam a apresentar uma

Fig. 5 Fotos do disco óptico com aparência normal e com neuropatia óptica
glaucomatosa avançada. À esquerda, observam-se um disco de tamanho normal, as
rimas apresentam boa coloração respeitando a regra ISNT, notam-se as estriações da
camada de fibras nervosas diminuindo a nitidez dos vasos sanguíneos peripapilares. À
direita, observa-se um disco de tamanho normal, apresentando uma importante perda
das rimas neurais e quebra da regra ISNT (escavação concêntrica), com presença de notch
às 6 h. A camada de fibras nervosas está diminuída difusamente, não sendo possível
observar suas típicas estriações, e os vasos peripapilares se apresentam bem nítidos.
(Cortesia do Dr. Christopher Girkin. Foto obtida no Centro de Imagens do Disco Óptico
da Universidade do Alabama em Birmingham, EUA.)
264 Semiologia Básica em Oftalmologia

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Fig.6 Disco óptico e exame de campo visual de um paciente com glaucoma moderado.
O disco óptico apresenta tamanho normal, com um aumento da escavação vertical,
particularmente da rima inferior às 6 h, onde o vaso sanguíneo está defletindo próximo
a borda do disco. Na mesma região, observa-se um defeito localizado da camada de fibras
nervosas. O exame de campo visual apresenta um defeito na região nasal superior tanto
no total quanto no pattern deviation p/of, consistente com a aparência do disco óptico.
Os índices de confiabilidade são aceitáveis, o PSD e o GHT indicam que os resultados do
exame se encontram fora dos limites da normalidade. (Cortesia de Dr. Christopher Girkin.
Foto obtida no Centro de Imagens do Disco Óptico da Universidade do Alabama em
Birmingham, EUA.)

nítida cor avermelhada. Defeitos assimétricos da camada de fibras entre as regiões superior
e inferior ao disco óptico podem ser detectados mediante a comparação da visibilidade dos
r

vasos peripapilares nessas duas regiões. E importante ressaltar que a presença de um defeito
na camada de fibras nervosas não é patognomônico da neuropatia óptica glaucomatosa, po­
dendo ocorrer em atrofias ópticas secundárias a cicatrizes coriorretinianas, drusas de disco
óptico e neuropatias isquêmicas.
Os últimos dois aspectos do exame do disco óptico com glaucoma dizem respeito à pre­
sença de atrofias peripapilares e hemorragias de disco. A atrofia peripapilar representa a de­
generação do tecido coriorretiniano ao redor do disco óptico, podendo ser classificada em
atrofia peripapilar tipo alfa ou beta. A atrofia peripapilar relacionada com o processo glauco-
matoso é a tipo beta, onde uma atrofia pronunciada do epitélio pigmentar da retina e da ca­
mada coriocapilar deixa visíveis os grandes vasos da coroide e a esclera. A atrofia peripapilar
representa um sinal de segunda ordem na detecção do glaucoma, mas a sua associação com
outros sinais sugestivos de glaucoma aumenta o nível de suspeita da presença da doença. O
Semiologia Básica do Glaucoma

oftalmologista deve tomar cuidado em diferenciar atrofia peripapilar de crescente miópica,


presente em pacientes com alta miopia e da crescente inferior, presente em pacientes com
disco inclinado.
A hemorragia de disco é um importante sinal na conduta do paciente com glaucoma, pois
sua presença pode indicar progressão do processo glaucomatoso. Essas hemorragias podem
ocorrer em qualquer tipo de glaucoma, e sua detecção depende de um exame cuidadoso.
Geralmente, elas assumem uma forma de “chama de vela” (quando localizadas na margem do
disco) ou uma forma circular (quando localizadas no nível da lâmina cribrosa). As hemorragias
de disco são transitórias, visto que o sangue é reabsorvido em um prazo de 1 a 6 meses, e
podem ser recorrentes, o que pode representar um processo glaucomatoso com progressão
mais rápida quando comparado aos casos com episódios isolados de hemorragia de disco.
r

E importante ressaltar que o exame do disco óptico não é importante somente para a de­
tecção do glaucoma, mas a avaliação prospectiva do disco óptico de um paciente representa
um parâmetro imprescindível para o monitoramento do processo da lesão glaucomatosa e,
consequentemente, para a verificação da eficácia do tratamento adotado. Assim, apesar de
não fazer parte dos exames da semiologia básica, uma fotografia estereoscópica do disco
óptico no exame inicial e, consecutivamente, durante acompanhamento do paciente, é um
procedimento altamente recomendável. Se fotos não são possíveis, desenhos ou descrições
detalhadas do disco óptico devem ser realizados.

EXAMES DE CAMPIMETRIA
Exame de perimetria automatizada
Apesar de não fazer parte dos exames pertencentes à semiologia básica de qualquer oftalmo­
logista generalista, o paciente com glaucoma não pode ser avaliado adequadamente sem o
exame de campo visual, que irá identificar e quantificar qualquer eventual defeito funcional
causado pelo dano estrutural do glaucoma no disco óptico. Apesar de os defeitos funcionais
usualmente aparecerem depois dos defeitos estruturais no disco óptico, o exame de campo
visual representa um importante exame para a detecção/confirmação da presença da doença e
também para o acompanhamento do processo da lesão glaucomatosa. Este subcapítulo tem a
intenção de realizar uma revisão sumária de alguns dos importantes aspectos na interpretação
deste exame.
O atual exame de referência para avaliação do campo visual é a perimetria automatizada
branco-branco, onde estímulos luminosos são apresentados em um fundo branco. O aparelho
mais comumente utilizado para realizar a campimetria branco no branco é o perímetro da
Humphrey (Carl-Zeiss Meditec, Dublin, CA). Este aparelho permite testar o campo visual utili­
zando diversas estratégias e programas, sendo que a forma mais comumente utilizada atual­
mente é a estratégia Swedish Interactive Threshold Algorithm (SITA) Standard, 24-2. Na maioria
dos casos, essa estratégia permite a avaliação do campo visual em um tempo menor do que
a estratégia Full-Threshold. Existem várias outras técnicas de perimetria (perimetria seletiva) e
estratégias que podem ser utilizadas para avaliação funcional no glaucoma, em particular para
detecção precoce de defeitos glaucomatosos como também para a avaliação/acompanhamen­
266 Semiologia Básica em Oftalmologia

to de casos com glaucoma avançado. Essas técnicas serão discutidas em um outro volume
desta série.
Após solicitar o teste de campo visual, o oftalmologista precisa estar ciente de que o
exame apresenta uma curva de aprendizado e, geralmente, os resultados do(s) primeiro(s)
exame(s) não são representativos do statiis funcional do paciente. O aparelho de campo visual
apresenta um programa para avaliar a confiabilidade do exame, testando a presença de perdas
de fixação, respostas falso-positivas e falso-negativas (que devem ter uma frequência menor
que 30%). Entretanto, índices aceitáveis de confiabilidade não garantem a consistência dos re­
sultados do exame. Assim, tão logo seja possível, um segundo e, eventualmente, um terceiro
exame devem ser solicitados, objetivando estabelecer o status funcional basal do paciente.
Novos exames são então solicitados periodicamente (a frequência depende de cada caso), para
que seja possível investigar se a doença esta progredindo ou se se encontra estável do ponto
de vista funcional.
A progressão da lesão glaucomatosa geralmente é detectada pela piora dos limiares de
sensibilidade de pontos previamente anormais, e pelo aparecimento de novos pontos anor­
mais nas regiões próximas a defeitos preexistentes. Assim, a avaliação prospectiva dos exames
de campo visual deve observar não somente o aparecimento de novos pontos com sensibili­
dade anormais, mas também a profundidade do defeito (verificando os valores dos limiares de
sensibilidade em decibéis).
Recentemente, o desenvolvimento de novos programas para detecção da progressão do
glaucoma tornaram-se comercialmente disponíveis nos campímetros automatizados. Heijl e
Begntson descreveram algoritmos como o glaucoma rogression analysis e o visual Field índex que
têm como objetivo auxiliar o oftalmologista na detecção da progressão da lesão glaucomato­
sa.
r

E importante ressaltar que a perimetria automatizada é um exame subjetivo e, portanto,


pode apresentar uma variabilidade entre os exames bastante significativa. Assim, a presença
de progressão da doença através destes exames precisa ser confirmada em exames subsequen­
tes, e também, quando possível, relacionada com os outros achados do exame clínico (aparên­
cia do disco óptico, níveis de PIO).

Exame de campimetria manual


O perímetro manual de Goldmann é um aparelho em que estímulos luminosos de intensidades
e tamanhos variáveis são apresentados por um examinador para avaliar uma ampla área do
campo visual (atingindo até 90° de extensão), enquanto na perimetria automatizada, os estí­
mulos são apresentados por um programa de computador em locais predeterminados, e usu­
almente se restringe a examinar os 30° centrais da visão. A perimetria de Goldmann pode ser
utilizada para pesquisa dos campos visuais central ou periférico, e assim, a perimetria manual
pode ser considerada superior à campimetria computadorizada na avaliação de disfunções das
vias ópticas. Entretanto, a perimetria manual apresenta como principais desvantagens o maior
tempo de exame e difícil domínio da técnica (altamente dependente da habilidade do exa­
minador). Portanto, atualmente, o exame de campimetria manual raramente é utilizado para
avaliação de um paciente glaucomatoso, mas representa um importante exame para investigar
Semiologia Básica do Glaucoma 267

possíveis diagnósticos diferenciais do glaucoma. Este subcapítulo tem a intenção de revisar


brevemente alguns aspectos da périmétria manual.
O exame da périmétria manual de Goldmann permite a avaliação do campo visual de duas
maneiras: dinâmica ou estática. O exame dinâmico pode ser realizado de maneira mais rápida
que o exame estático, e permite localizar lesões neurais com acometimento da retina ao cór­
tex visual, além de possibilitar o acompanhamento dessas patologias.
Os defeitos detectados pela campimetria manual podem ser classificados em homônimos
ou heterônimos, congruentes ou incongruentes, ou altitudinais.
As hemianopsias homônimas são defeitos causados por lesões da via óptica pós-quiasmá-
tica, que caracteristicamente acometem o mesmo lado do campo visual, podendo ser à direita
ou à esquerda, completa ou parcial, sendo esta última mais frequente. As hemianopsias hete-
rônimas são defeitos que acometem lados opostos do campo visual, podendo ser, portanto,
bitemporais ou binasais. As hemianopsias bitemporais têm como principal etiologia os tumo­
res de hipófise, particularmente, os prolactinomas com acometimento do quiasma óptico.
As hemianopsias binasais podem surgir secundárias à compressão das porções temporais do
quiasma óptico por aneurisma ou calcificação da artéria carótida interna.
Defeitos congruentes são definidos nos casos em que os defeitos do campo visual de am­
bos os olho acometem os mesmos locais (defeitos dos dois olhos podem ser sobrepostos um
ao outro). Quando os defeitos do campo visual de cada olho não podem ser sobrepostos um
ao outro, diz-se que o defeito é incongruente. Os defeitos de campo visual são, caracteristi­
camente, mais congruentes quanto mais posterior for o acometimento da via óptica. Assim,
lesões localizadas no corpo geniculado lateral ou trato óptico, tendem a ser incongruentes e
comprometem a fixação central. Por outro lado, lesões que acometem radiações ópticas ou
córtex visual são congruentes e, em geral, preservam a fixação central.
As hemianopsias altitudinais são definidas nos casos em que o meridiano horizontal se­
para a metade do campo visual com visão da outra metade sem visão. Esses defeitos podem
ser superiores ou inferiores, uni ou bilaterais, podendo ser, neste último caso, simétricos ou
cruzados. Meningites, neunte óptica isquêmica ou traumatismo cranioencefálico podem ser
causas de hemianopsias altitudinais.

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Semiologia Básica do
Estrabismo

ANA TEREZA RAMOS MOREIRA

INTRODUÇÃO
A semiologia do estrabismo será descrita neste capítulo seguindo o objetivo deste livro, ou
seja, será explorada para que possa ser realizada em um consultório básico de oftalmologia,
com a aparelhagem indispensável para uso do oftalmologista geral.

ANAMNESE
Ao iniciar a consulta oftalmológica é fundamental buscarmos informações relacionadas com a
doença do paciente que possam ser relevantes ao diagnóstico, tratamento e prognóstico dela.
Quando o paciente é criança, o familiar ou responsável que o acompanhe ao médico fornece­
rá os dados referentes ao problema oftalmológico desta, buscando informações direcionadas
a fatores que possam ser importantes em relação ao desvio ocular existente. O médico deve
questionar o paciente ou o seu acompanhante sobre:

GESTAÇÃO E PERÍODO NEONATAL: informações relacionadas com a duração da gestação, inter-


corrências gestacionais e o parto. O índice de Apgar, no primeiro e quinto minutos de vida,
que a criança recebeu é uma forma de sabermos se houve sofrimento do bebê ao nascer.
DESENVOLVIMENTO NEUROPSICOMOTOR (DNPM): o conhecimento sobre o desenvolvimento
global da criança é muito importante para o tipo de tratamento a ser proposto. Quando existe
atraso do DNPM, podemos ter maior risco de hipercorreção cirúrgica do estrabismo conver­
gente, portanto, devemos avaliar cuidadosamente tais crianças.

271
Semiologia Básica em Oftalmologia

ANTECEDENTES HEREDITÁRIOS: o estrabismo possui herança plurifatorial, portanto, a existên­


cia de estrabismo na família poderá auxiliar no diagnóstico.
IDADE DO INÍCIO DO DESVIO OCULAR: a criança que nasce estrábica ou que desenvolva preco­
cemente o estrabismo apresentará alterações sensoriais acentuadas, o que dificilmente ocor­
rerá no estrabismo de início tardio, após os primeiros anos de vida. Nestas, quanto antes for
restaurado o paralelismo ocular, maior a chance de preservar a sensorialidade adquirida antes
de a criança tornar-se estrábica.
FORMA DE INÍCIO: súbito ou insidioso.
FREQUÊNCIA DO DESVIO: intermitente ou permanente.
MONOCULAR OU ALTERNANTE: quando monocular, ambliopia deve estar presente no olho des­
viado.
TRATAMENTO CLÍNICO OU CIRÚRGICO PRÉVIO: oclusão, exercícios ortópticos, prescrição óptica
ou cirurgia prévia são informações importantes e que podem auxiliar na decisão de qual o me­
lhor tratamento para este paciente.

INSPEÇÃO
■ Presença de ptose, hipertelorismo, epicanto ou telecanto.
■ Assimetria facial ou fácies compatível com síndromes.
■ Presença de estrabismo.
■ Direção do desvio: convergente, divergente ou vertical.
■ Nistagmo.
■ Torcicolo.

ACUIDADE VISUAL
A medida da acuidade visual deve ser realizada com o paciente utilizando a melhor corre­
ção óptica e de forma monocular. Em crianças pré-verbais podemos utilizar a técnica do olhar
preferencial. Na presença de ambliopia em crianças, o tratamento deve ser indicado, uma vez
que o restabelecimento da acuidade visual favorece a estabilidade do resultado cirúrgico, além
de garantir visão útil em ambos os olhos.

REFRAÇÃO
A refração no paciente estrábico deve ser realizada utilizando-se cicloplegia. Entre os medi­
camentos cicloplégicos, a atropina a 0,5 ou a \% e o ciclopentolato a \% são os que possuem
maior poder de paralisação do músculo ciliar, sendo que a cicloplegia obtida com uso da atro­
pina tem durabilidade muito maior que o ciclopentolato, e de acordo com a literatura, não
existe vantagem no uso da mesma.
Semiologia Básica do Estrabismo

MOVIMENTOS OCULARES
POSIÇÃO PRIMÁRIA DO OLHAR (PPO): considera-se um indivíduo em PPO quando o eixo visual
esta direcionado ao infinito, na intersecção do plano horizontal com o sagital, estando sua
cabeça ereta.
POSIÇÕES SECUNDÁRIAS ETERCIÁRIAS: quando o olho dirige-se diretamente para o lado direito
ou o esquerdo, para cima ou para baixo, denomina-se dextrodução, levodução, supradução ou
infradução, e estas são as posições secundárias do olhar. As terciárias são as oblíquas, supra-
dextrodução, supralevodução, infradextrodução ou infralevodução.
VERSÕES: são movimentos binoculares na mesma direção e no mesmo sentido, supraversão,
infraversão, dextro e levoversão. Quando o sentido é oblíquo, temos supradextroversão, su-
pralevoversão, infradextroversão e infralevoversão. Quando ocorre movimento torcional bino­
cular, denomina-se dextrocicloversão se o extremo superior do meridiano vertical das córneas
dirige-se para a direita, e levocicloversão se o fazem para a esquerda. Avaliamos as versões
pedindo ao paciente que fixe um pequeno objeto com um dos olhos e movimentamos o obje­
to em todas as posições do olhar, sempre observando o que acontece com o outro olho. Caso
um dos olhos não acompanhe o outro em uma posição diagnóstica, passamos ao estudo das
ducções.
DUCÇÕES: são movimentos monoculares a partir da posição primária. Podem ser movimentos
verticais (supradução ou infradução), horizontais (dextrodução ou levodução) ou ainda torcio-
nais (intorsão ou inciclodução e extorção ou exciclodução).
Ducção ativa: é realizada por meio da inervação dos músculos oculares do paciente. Com
um olho ocluído pedimos que ele fixe o objeto em todas as posições do olhar.
Ducção passiva: quando na ducção ativa o olho não acompanha o objeto em determinada
direção, podemos estar diante de uma paralisia muscular ou uma restrição mecânica ao movi­
mento. Para diferenciar entre uma e outra, passamos ao estudo das ducções passivas. O exa­
minador instila anestésico tópico no olho do paciente e com o auxílio de uma pinça denteada
tenta levar o globo ocular para a posição que este não alcançou sob a força ativa. Se o olho for
deslocado para a posição desejada, significa que existe paralisia muscular. Caso o olho não vá
para a posição desejada, existe restrição mecânica ao movimento e indica-se a realização do
teste de forças geradas, o qual será descrito posteriormente.
Vergências: são movimentos binoculares de mesma direção mas com sentido oposto:

CONVERGÊNCIA: quando os olhos dirigem-se medialmente. A convergência voluntária é consi­


derada normal quando se mantém até a distância correspondente a distância interpupilar do
paciente, que fixa um objeto próximo à base do nariz.
DIVERGÊNCIA: quando a direção binocular é lateral.
DIVERGÊNCIA VERTICAL POSITIVA OU NEGATIVA: o movimento é vertical e positivo se o olho
direito sobe e/ou o esquerdo desce; e negativa caso ocorra o contrário. Caso os extremos ver­
ticais das córneas dirijam-se medialmente, estamos frente a inciclovergência, e o contrário,
exciclovergência.
VERGÊNCIA ACOMODATIVA: é a convergência estimulada pela acomodação, ou seja, a relação
convergência acomodativa por unidade de acomodação (CA/A).
274 Semiologia Básica em Oftalmologia

VERGÊNCIA FUSIONAL: é o movimento estimulado pelo reflexo de fusão colocando os olhos em


ortotropia, evitando a diplopia.
■ Convergência e Divergência fusionai: é possível quantificar estas duas vergências utilizan­
do a barra de prismas até que se obtenha a rotura da fusão. Para pesquisar a convergência
fusionai, pedimos ao paciente que fixe um objeto a 6 m ou 33 cm e antepomos a barra de
prismas com a base temporal e valores crescentes até que o indivíduo refira diplopia. Para
a pesquisa da divergência fusionai, fazemos o mesmo mas com os prismas de base nasal.
Para a vergência vertical, a base é direcionada para cima ou para baixo.
• Amplitude normal
- Convergência fusionai
Longe - 15 dp
Perto - 20 a 25 dp
- Divergência fusionai
Longe - 8 dp
Perto - 12 dp
- Vergência vertical - 3 a 6 dp

TERMINOLOGIA
ORTOTROPIA E ORTOFORIA: quando os eixos visuais de ambos os olhos encontram-se fixando o
mesmo objeto, estamos diante de um paciente em ortotropia. Se ao ocluirmos um olho este
não se mover, dizemos que este paciente é ortofórico.
ESOFORIA (E): desvio latente convergente.
EXOFORIA (X): desvio latente divergente.
ESOTROPIA (ET): desvio convergente permanente.
EXOTROPIA (XT): desvio divergente permanente.
ESOTROPIA INTERMITENTE (E(T)): desvio convergente intermitente.
EXOTROPIA INTERMITENTE (X(T)): desvio divergente intermitente.

Estes termos são empregados quando estamos examinando o paciente fixando um ponto a
distância. Se o desvio for medido no olhar para perto, em geral 33 cm, acrescenta-se o sinal (‘).

POSIÇÕES DIAGNÓSTICAS
A avaliação do desvio ocular deve ser realizada não apenas na posição primária do olhar, mas
também nas posições secundárias e terciárias. Esta avaliação é feita binocularmente, estudan­
do as parelhas musculares (músculos conjugados) que agem conjuntamente, permitindo o
deslocamento dos olhos em determinada direção (Fig. 1).
■ Dextroversão: músculos reto lateral direito e reto medial esquerdo.
■ Levoversão: músculos reto lateral esquerdo e reto medial direito.
■ Supraversão: músculos retos superior direito e esquerdo.
■ Infraversão: músculos retos inferior direito e esquerdo.
Semiologia Básica do Estrabismo

Fig. 1 Posições diagnósticas da musculatura extraocular.

■ Supradextroversão: músculos reto superior direito e oblíquo inferior esquerdo.


■ Infradextroversão: músculos reto inferior direito e oblíquo superior esquerdo.
■ Supralevoversão: músculos reto superior esquerdo e oblíquo inferior direito.
■ Infralevoversão: músculos reto inferior esquerdo e oblíquo superior direito.

LEIS DA INERVAÇÃO MOTORA


Lei de Hering correspondência motora
Os influxos nervosos enviados aos músculos extraoculares para a realização de um movimento
em determinada direção são simétricos para os dois olhos.

Lei de Sherring inervação recíproca


Quando um olho realiza um movimento em determinada direção, os músculos agonistas con­
traem e os antagonistas relaxam.

COMITÂNCIA E INCOMITÂNCIA
Quando o desvio é igual em todas as posições do olhar, fixo com um ou com outro olho, é
denominado de comitante. Se existe diferença na magnitude do desvio ao fixar um objeto si­
tuado a distância e próximo, estamos frente a um desvio ocular com incomitância longe-perto.
No estrabismo paralítico ou parético, quando o paciente fixa com o olho afetado, (desvio
secundário) o desvio é maior do que quando ele fixa com o olho são (desvio primário). Quando
o indivíduo olha para o campo de ação do músculo afetado, o desvio aumenta consideravel­
mente. Isto é denominado incomitância, e se explica pela lei de Hering, onde a magnitude do
impulso nervoso enviado aos músculos conjugados é simétrica.
276 Semiologia Básica em Oftalmologia

AVALIAÇÃO DO DESVIO OCULAR


Para a avaliação motora do estrabismo, todo consultório oftalmológico deve possuir uma cai­
xa e/ou barra de prismas, ponto de fixação a distância, objeto de fixação para perto e lanterna.

Teste de Hirschberg
r r

E o teste baseado no reflexo luminoso em ambas as córneas. E um teste de fácil execução e


de grande utilidade no diagnóstico diferencial entre o pseudoestrabismo e o estrabismo. Uti­
lizado com frequência em crianças pequenas, que não colaboram com outros testes e ainda
em pacientes que não possuam boa acuidade visual. Para executá-lo basta uma lanterna. Se o
paciente estiver fixando a luz com ambas as fóveas, teoricamente deve ser ortotrópico. Entre­
tanto, como as fóveas não se localizam exatamente no polo posterior do olho, normalmente
percebemos o deslocamento do reflexo corneai, denominado de ângulo kappa. Quando o ân­
gulo kappa é positivo, o deslocamento do reflexo luminoso é medial, caso contrário o ângulo
kappa é dito negativo. Na maioria das vezes ele é deslocado medialmente.
Quando o reflexo é central em um olho e deslocado lateralmente no outro, este paciente
apresenta estrabismo convergente. Se o reflexo luminoso estiver desviado medialmente em
um dos olhos, o estrabismo é divergente (Figs. 2A-D).

Normal

15° ET

30° ET

Figs. 2 (A-D) Teste de Hirschberg.


Semiologia Básica do Estrabismo 277

Podemos quantificar o valor do desvio considerando posição do reflexo luminoso no olho


do paciente:
■ Na borda pupilar - 15o.
■ Entre a borda pupilar e o limbo - 30°.
■ No limbo -4 5 ° .

Teste de Krinsky
É o teste de Hirschberg associado ao prisma, sendo posicionado frente ao olho desviado des­
locando o reflexo luminoso para o centro. Utilizam-se prismas de valores crescentes, sendo o
valor do desvio ocular igual ao do prisma que centralizou o reflexo luminoso na pupila (Fig. 3).

Fig.3 Teste de Krinsky.

Teste de cobertura ou c o v e r t e s t

É o teste mais importante na semiologia motora do estrabismo. Para a realização deste teste
é necessário que o paciente possua capacidade de compreensão suficiente que lhe permita
entender o exame. O paciente deve ter reflexo de fixação central normal em ambos os olhos
e acuidade visual que lhe permita a percepção de objetos utilizados na fixação. O controle
da acomodação por meio da correção total da ametropia existente é fundamental para que o
teste seja bem executado. Para tanto é importante a realização prévia de refração sob ciclople-
gia e prescrição óptica total da ametropia. O teste deve ser realizado com objetos de fixação
pequenos e com detalhes, tanto a 5 ou 6 m assim como a 33 cm.

C o v e r u n c o v e r t e s t ou teste de cobertura simples


Para a execução deste teste, utilizamos um oclusor especial ou a própria mão do examinador
para ocluir o eixo visual do olho dominante do paciente que está fixando um objeto a distân­
cia ou a 33 cm. Observa-se o que ocorre com o outro olho. Caso ele esteja desviado, ocorrerá
rapidamente um movimento de fixação na direção do objeto. Pode acontecer de não existir
nenhum movimento ao ocluir-se um dos olhos. Se isso ocorrer, passamos a ocluir o olho con-
tralateral. Se novamente não houver movimento, conclui-se que o paciente é ortotrópico e
ortofórico. Caso haja movimento, este olho estava desviado. Dependendo da direção do mo-
r

vimento classificamos o desvio. E um método qualitativo de avaliação do desvio ocular (Fig.


4A a D).
O cover test pode fornecer informação relativa à possível presença de ambliopia. Se ao
ocluirmos o olho fixador de uma criança ela não conseguir fixar com o olho desviado ou ma­
nifestar reação negativa, como, por exemplo, choro, concluímos que a visão deste olho está
alterada, podendo haver ambliopia. Se, ao contrário, ao ocluirmos o olho fixador ela fixar com
278 | Semiologia Básica em Oftalmologia

C 3 í >

A B

c D
Figs. 4 (A-D) Cover/ Uncover Test: (A) ortotropia, ortoforia; (B) esotropia; (C) exotropia
e (D) hipertropia.

o olho antes desviado, e à desoclusão ela persistir fixando com este olho, é provável que a
visão seja semelhante em ambos os olhos.

C o v e r t e s t com prismas
Uma vez definida a presença de estrabismo, passamos ao teste que nos permitirá medir o
desvio, sendo, portanto, quantitativo. 0 teste é realizado com a colocação de prismas frente
ao olho desviado, com a base do prisma na direção oposta do desvio. Oclui-se este olho e a
seguir o contralateral, realizando o cover test alternado com prisma. Quando o valor do prisma
utilizado coincidir com o valor do desvio, não haverá nenhum movimento de refixação. Caso
o paciente ainda movimente o olho, muda-se o prisma até que isso não mais aconteça. O cover
test alternado com prismas é um método dissociante, pois rompe totalmente a fusão e permite
que se conheça o desvio real, sem a interferência de eventual reflexo anômalo de fusão.

C o v e r u n c o v e r t e s t simultâneo com prismas


r

E o teste usado para conhecer a magnitude do desvio em condições normais de vida e,


portanto, utilizado para o planejamento de eventual correção cirúrgica do estrabismo. Uma
vez diagnosticado o desvio ocular, coloca-se o prisma diante do olho desviado ao mesmo tem­
Semiologia Básica do Estrabismo 279

po que se oclui o olho fixador. Se o prisma for de valor igual ao do desvio, não haverá movi­
mento de fixação do olho atrás do prisma.

PSEUDOESOTROPIA
A presença de algumas características faciais pode simular estrabismo convergente. O epican-
to e o ângulo kappa negativo são os fatores que mais frequentemente causam a falsa impres­
são de estrabismo.

ESOTROPIA
É o tipo de estrabismo mais comum em nosso meio. Pode ser latente, intermitente ou perma­
nente Entre os diversos tipos de esotropia, algumas possuem características semiológicas que
as identificam.

Esotropias congênitas, precoce ou infantil ou síndrome de ciancia


O termo congênito não é bem empregado nestes casos, uma vez que o desvio aparece a partir
dos primeiros meses de vida da criança e não ao nascimento. São características deste estra­
bismo:
■ Esotropia de grande ângulo de desvio.
■ Limitação da abdução.
■ Fixação em adução denominada de fixação cruzada.
■ Nistagmo sacádico na tentativa de abdução.
■ Torcicolo com cabeça girada e inclinada para o lado do olho fixador.
■ Associação frequente com desvio vertical dissociado (DVD) e nistagmo latente (NL).
■ Pequena hipermetropia.
■ Incidência familiar baixa.
A presença de ambliopia não é comum devido à fixação cruzada, sendo que para fixar
objeto em campo visual esquerdo, a criança utiliza o olho direito aduzido, e vice-versa.
Após a cirurgia, quando realizada precocemente, poderá surgir hiperfunção dos músculos
oblíquos não percebidas no pré-operatório, assim como a DVD. Quando isso ocorrer, há ne­
cessidade de reoperar o paciente.

Esotropia comitante adquirida


Frequentemente, inicia-se ao final do primeiro ano de vida, mas pode surgir mais precocemen­
te, porém raramente antes do sexto mês de vida, e após os 3 anos de idade. O início pode ser
súbito ou insidioso, de forma intermitente para posteriormente tornar-se permanente.
A incidência de ambliopia é maior que na síndrome de Ciancia, podendo haver dominância
intensa do olho fixador.
O desvio geralmente não ultrapassa 50 dioptrias prismáticas e frequentemente há associa­
ção de disfunção dos músculos oblíquos causando anisotropia alfabética.
280 Semiologia Básica em Oftalmologia

É importante a realização de refração sob cicloplegia e a correção total do erro refrativo,


assim como o tratamento de eventual ambliopia. A seguir, indica-se o tratamento cirúrgico.

Esotropia acomodativa
O início deste desvio é em geral os 2 anos de idade, mas pode variar. Começa de forma inter­
mitente ao olhar para perto, e torna-se permanente quando não tratada.
Ocorre em indivíduos hipermetropes e também naqueles que possuam relação CA/A ele­
vada, sejam hipermetropes leves ou não hipermetropes.
Os hipermetropes quando não corrigidos necessitam acomodar tanto ao fixar para lon­
ge quanto para perto. Em decorrência da sincinesia acomodação/convergência, quando eles
acomodam, também convergem. Se o reflexo de fusão não for normal, não haverá controle
da tendência à convergência acentuada, e a esotropia ocorrerá. Quando o reflexo de fusão é
normal, a divergência fusionai impede que ocorra o desvio convergente.
Um indivíduo emetrope, ortofórico e com distância interpupilar de 60 mm necessita aco­
modar 3 dioptrias e convergir 18 dioptrias prismáticas. Cada pessoa converge uma quantida­
de por unidade de acomodação, e existem indivíduos que convergem demasiadamente por
unidade de acomodação, levando à superconvergência no olhar para perto. Se existir boa
amplitude fusionai, poderá haver compensação da convergência exagerada, por meio da di­
vergência fusionai, levando os olhos à ortotropia, embora possa haver sintomas decorrentes
da esoforia resultante. Se houver associação de hipermetropia com relação CA/A elevada, o
problema se agrava.

ESOTROPIA PARCIALMENTE ACOMODATIVA: são pacientes com esotropia essencial, com relação
CA/A alta e/ou hipermetropia. O desvio é básico nestes pacientes, mas aumenta ao utilizar a
acomodação, sendo que se eles são hipermetropes, haverá aumento do desvio para longe e
para perto. Caso exista apenas CA/A elevada, o desvio aumentará apenas para perto.
ESOTROPIA PSEUDOACOMODATIVA: ocorre quando existe microtropia e componente acomoda-
tivo. Diferente da esotropia acomodativa verdadeira, aqui não existe visão binocular normal.

EXOTROPIA
E o desvio divergente dos eixos visuais ao fixar um objeto. Podem ser intermitentes ou permanentes
de acordo com a frequência de aparecimento. Existe diferença marcante em relação às condições
sensoriais de uma e de outra. Outra maneira de classificação dos exodesvios é relacionada à magni­
tude do desvio dependendo da distância do objeto fixado, podendo ser exodesvio básico, quando
não há diferença longe/perto, excesso de divergência, quando o desvio é maior para longe que para
perto, e insuficiência de convergência, quando é maior para perto que para longe.

Exotropia permanente
Nestes pacientes, o desvio divergente está presente o tempo todo. Raramente é congênito,
surgindo pouco tempo depois do nascimento. Possui alteração profunda da sensorialidade,
Semiologia Básica do Estrabismo 281

apresentando profunda dissociação binocular com supressão intensa que não responde a tra­
tamento.
Há que se tomar cuidado para não confundir a hiperfunção verdadeira dos oblíquos com a
pseudo-hiperfunção destes músculos, causada pela inelasticidade do músculo reto lateral, que
provoca elevação ou depressão do globo ocular na tentativa de adução.

Exotropia intermitente
É caracterizada por apresentar visão binocular normal quando em ortotropia. A exotropia
intermitente verdadeira tem que ser diferenciada da pseudoexotropia, onde o que ocorre é
um desvio que simula em alguns momentos estar em ortotropia, mas na realidade o paciente
apresenta microexotropia. Para diferencia-la utilizamos o cover uncover test e também explo­
ramos a capacidade de estereopsia do paciente, onde o exotrópico intermitente verdadeiro
apresenta estereopsia melhor que 50” ao teste de Titmus, enquanto a microexotropia revela
baixa estereoscopia ou ausência desta.
Na exotropia intermitente ocorre supressão nos momentos de desvio. Uma queixa muito
comum é o fechar um olho quando exposto à luz solar, ou ao flash das câmeras fotográficas.

ESTRABISMOS PARALÍTICOS
Paralisia é a perda total da força de um músculo, enquanto paresia é a perda parcial desta for­
ça. Em condições normais, de acordo com a lei de Hering, os estímulos inervacionais direcio­
nados aos músculos conjugados são simétricos, havendo, portanto, perfeita coordenação na
ação desses músculos. Se um dos músculos no entanto perdeu sua força, ou parte dela, reagirá
menos ao estímulo inervacional resultando na perda do paralelismo ocular. Como já definimos
anteriormente, quando o paciente fixa com o olho parético ou paralítico, ocorre desvio maior
do que quando ele fixa com o olho são. Esta é uma característica do estrabismo paralítico e
parético, em que o desvio secundário é maior que o desvio primário.
A diplopia é uma queixa comum nestes desvios, e para amenizar este problema o portador
r

da paralisia ocular busca uma posição no seu campo visual em que ela desapareça. E o cha­
mado torcicolo compensatório, em que o paciente evita fixar o objeto no campo de ação do
músculo parético, fazendo-o no campo oposto à ação do referido músculo.
No diagnóstico das paralisias oculomotoras, além do estudo das versões, ducções ativas
e passivas descritas anteriormente, é importante também realizar o teste das forças geradas,
que será descrito a seguir.
Teste das forças geradas: está indicada sua realização sempre que o teste de ducção pas­
siva for positivo. Após instilar anestésico tópico no olho a ser examinado, pede-se que o pa­
ciente dirija o olhar para posição oposta àquela que o olho não ia. Com uma pinça denteada
fixamos o olho nesta posição e solicitamos que o paciente olhe rapidamente para o lado opos­
to. Podem acontecer três fatos:
1. O examinador sente força intensa na pinça, gerada pelo músculo examinado, sugerindo
restrição mecânica ao movimento com força muscular preservada.
282 Semiologia Básica em Oftalmologia

2. 0 examinador sente força na pinça, mas de menor intensidade que a esperada, sugerindo
restrição associada à paresia muscular.
3. O examinador não sente nenhuma força na pinça, sugerindo restrição mecânica associada
à paralisia muscular.

ANISOTROPIAS ALFABÉTICAS
São incomitâncias no eixo vertical que se manifestam no olhar para cima ou para baixo. Elas
ocorrem por disfunção dos músculos oblíquos e também por outro fator desconhecido. Quan­
do provocado por ação exagerada dos oblíquos inferiores, ao olhar para cima há divergência,
e a ação abdutora destes músculos supera a ação adutora dos retos superiores, causando a
anisotropia em “V ” ou “Y ”. Nos casos onde a hiperfunção é dos oblíquos superiores, ocorre
divergência no olhar para baixo, com anisotropia em “A” ou “À” por superação da ação abdu­
tora dos oblíquos superiores sob a ação adutora dos retos inferiores. Outras vezes a ação dos
músculos oblíquos é normal, ou pouco hiperfuncionante e a anisotropia se manifesta intensa­
mente. A razão para que isso ocorra é desconhecida.
As versões verticais extremas são as posições ideais para se medir as anisotropias alfabéti­
cas. Considera-se o tratamento cirúrgico para as anisotropias em “A” maiores que 10 dp e que
15 dp para as anisotropias em “V ”.

SÍNDROMES ESPECIAIS
Síndrome de Mõbius
Está presente ao nascimento e apesar da patogenia não estar esclarecida, algumas vezes está
relacionada com o uso do misoprostol, comercialmente conhecido como Cytotec®, utilizado
para abortamento. Tem as seguintes características:
■ Paralisia periférica do nervo facial, muitas vezes bilateral. Fácies inexpressiva com boca en­
treaberta, dificuldade de sucção, olhos que não se cerram e sinal de Bell presente.
■ Paralisia dos retos laterais.
■ Hipotrofia da musculatura da língua, dificuldade da fala.
■ Frequentes alterações ósseas e musculares nas extremidades distais dos membros superio­
res e inferiores.
■ Pode haver esotropia de ângulos pequeno ou grande, podendo também existir ortotropia.
Raramente se observam exotropia e fibrose dos retos inferiores.

Síndrome de Duane
Na maioria das vezes é de ocorrência esporádica, mas pode ter história familiar com herança
autossômica dominante.
■ Limitação ou ausência de abdução.
■ Adução normal ou limitada, com variável intensidade.
■ Retração do globo ocular com redução da fenda palpebral à adução e aumento na abdução.
■ Upshoot e clownshoot, ou elevação e depressão do globo ocular na tentativa de adução.
Semiologia Básica do Estrabismo 283

Classificação de Huber
r

Duane I: abdução muito limitada com adução menos afetada, em graus variáveis. E o tipo
mais frequente, seguida dos tipos II e III.
Duane II: abdução normal ou pouco reduzida e adução marcadamente limitada.
Duane III: adução e abdução fortemente limitadas.
Pode haver desvios convergente ou divergente, mas também pode ocorrer ortotropia.
Nos casos em que há desvio e visão binocular, devem-se ao torcicolo que o indivíduo adota
buscando fusão.

Síndrome de Brown
Também denominada síndrome da bainha do oblíquo superior, caracteriza-se por limitação
de elevação em adução, sendo que a elevação em abdução pode ser normal ou discretamente
limitada. 0 músculo oblíquo superior na maioria das vezes é normal em sua posição diagnósti-
r

ca, mas pode estar hiperfuncionante ou, mais raramente, hipofuncionante. E adquirida e pode
ocorrer de modos espontâneo, traumático, ou por processo inflamatório. Há casos intermi­
tentes, e nestes, ao forçar a elevação em adução, ouve-se um ruído típico, e o olho consegue
r

elevar. E a chamada clicking syndrome.


Pode ser uni ou bilateral, e a limitação de elevação é variável. 0 paciente algumas vezes
desenvolve torcicolo para manter a binocularidade. Existe anisotropia alfabética em “Y ”, com
divergência em supraversão. Em adução pode haver alargamento da rima palpebral.
Diagnóstico diferencial é mandatório com a paralisia do músculo oblíquo inferior, sendo
que na síndrome de Brown encontramos anisotropia alfabética em “V ” ou “Y ”, enquanto na
paralisia de oblíquo inferior a anisotropia é em “A”. O teste de ducção passiva é normal na pa­
ralisia do oblíquo inferior e fortemente positivo na síndrome de Brown.

Fibrose generalizada de Brown


Fibrose congênita de toda a musculatura extraocular, inclusive do músculo levantador da pál­
pebra superior. É um estrabismo com alta incidência familiar. Em geral os músculos retos infe­
riores são mais afetados e associados à blefaroptose existente, obrigando o indivíduo a adotar
torcicolo com o mento elevado, posição bastante incômoda. A convergência na tentativa de
supraversão é um sinal característico desta síndrome. 0 quadro clínico é variável, sendo que
os músculos horizontais podem estar normais. Algumas vezes se observa exotropia.

TESTES PERIOPERATÓRIOS
O estudo da motricidade ocular deixou de ser realizado apenas no pré-operatório, devendo
ser também estudada no perioperatório da cirurgia do estrabismo.
Teste do equilíbrio das forças elásticas ou Spring back balance forces. Este teste avalia o grau
de elasticidade relativa dos músculos agonista-antagonistas. Com o paciente sob anestesia ge­
ral ou tópica, traciona-se o olho para uma posição extrema e o mantém dessa forma por 30 s, a
seguir solta-o. Faz-se o mesmo depois em posição oposta e analisa-se a velocidade do retorno
284 Semiologia Básica em Oftalmologia

do olho e a sua posição final de repouso na órbita. A posição final deve ser a meia-distância
das posições extremas em que o olho foi liberado.

TESTE DE QUERÉ
O objetivo deste teste também é a análise da elasticidade, buscando a presença de contratura
muscular. Após a desinserção muscular da esclera, traciona-se o músculo por meio dos fios
de sutura até o meio da córnea utilizando-se força de 50 a 60 g, estando o globo na posição
primária do olhar (fixo por uma pinça). Se a elasticidade for normal, o músculo deve alcançar
o centro da córnea; caso não consiga, o músculo está tenso ou curto; se ultrapassar o centro
corneano, trata-se de um músculo frouxo.

BIBLIOGRAFIA
Bicas H & Nóbrega, J. Porque usar ciclopentolato para o exame refratométrico em estrábicos. Rev Bras Oftalmol, 1974;
33:543.
Prieto-Diaz J & Souza-Dias C. Estrabismo. 3a ed. La Plata, Jorge D. Poch, 1996.
Souza-Dias C. Coleção de Manuais Básicos CBO - Estrabismo. Rio de Janeiro: Cultura Médica, 1999.
Yamame R. Semiologia Ocular. 2â ed. Rio de Janeiro: Cultura Médica, 2003.
Wright, K. Pediatric Ophthalmology and Strabismus. St. Louis: Mosby, 1995.

L i t e r a t u r a S u g e r i d a

1. Estrabismo. 3a ed. Prieto-Diaz J & Souza-Dias C. La Plata, Jorge D. Poch, 1996.


Semiologia Básica em
Oftalmopediatria

CARLOS AUGUSTO MOREIRA

0 exame oftalmológico das crianças desde o nascimento até os 12 anos tem grande impor­
tância para seu futuro visual, possui peculiaridades e dificuldades que devem ser conhecidas.
O oftalmopediatra deve ter um comportamento tranquilo, paciência e progressivamente
ganhar a confiança das crianças de baixa idade. Até o avental e roupa branca podem ser subs­
tituídos por vestimentas comuns, pois não é infrequente que os pequenos pacientes possam já
ter associado a indumentária característica com algum profissional da medicina que lhe tenha
causado dor e desconforto com injeções, palpações e outras atitudes consideradas por eles
como agressivas.
r

E lógico que serão os pais ou um responsável que relatarão o problema oftalmológico da


criança.
A criança deve ser observada desde o começo da consulta e para isso o melhor é tê-la
sentada no colo da mãe de frente para o médico. Entre o médico e a criança deve haver uma
distância que lhe dê segurança, assim como o aconchego da mãe lhe dará confiança e tran­
quilidade.
Acreditamos que crianças entre 1 e 4 anos, que iniciam a consulta chorando e com aversão
ao médico dificilmente serão adequadamente examinadas.
Os bebês deverão ter seu rosto descoberto e, ao colo, ter a face voltada para o médico.

ANAMNESE: deve revelar a enfermidade, o início, as queixas bem como os principais sinais e
sintomas notados na criança. Condições de nascimento e desenvolvimento, as doenças fami­
liares e genéticas dos correlatos próximos.

Informações sobre os olhos: se estão vermelhos, com secreções, edemas localizados, pos­
sível corpo estranho, lacrimejamento, pior pela manhã ou à tarde.
Prurido, dor ocular, fotofobia devem ser inquiridos.

285
286 Semiologia Básica em Oftalmologia

Deve-se ter conhecimento de eventuais traumatismos.


Mancha nas pálpebras, nas conjuntivas, na córnea podem dar orientação ao oftalmologista.
Caso a pupila apresente reflexo esbranquiçado é informação importante.
Verificar a presença de nistagmo e estrabismo. Qual olho desvia e se o desvio é permanen­
te. O tremor (nistagmo) aparece quando a criança fixa para ver um objeto ou é permanente?
Avaliar o comportamento em relação a visão. Desvia dos móveis ao andar ou engatinhar
e busca no chão ou na mão da mãe objetos pequenos ou o comportamento é de quem tem
baixa visão?
Como foram a gestação e o parto? Fez os exames profiláticos para doenças oculares? É
criança prematura e neste caso saber o peso ao nascer e informar se ficou dias na incubadora
sob oxigenação.
Informar se o problema é congênito ou se se manifestou após o nascimento.
Caso tenha outras doenças sistêmicas, tais como diabetes, doenças renal, infecciosa, tu-
moral, metabólica, devem ser relatadas.
Caso tenha processo infeccioso informar sobre eventual contágio. Contato com outras
pessoas com conjuntivite. Informar sobre doenças eruptiva ou virai.
Os problemas genéticos na família devem ser conhecidos pelo médico.
A anamnese das crianças de baixa idade e principalmente pré-verbais depende muito da
cultura e interesse dos pais ou responsáveis. Devemos estar sempre alertas para a situação de
desconhecimento ou mesmo ocultamento por parte dos acompanhantes.

O EXAME DA CRIANÇA: o oftalmopediatra deve conhecer a importância do exame do reflexo


vermelho da pupila e manejar com desenvoltura o oftalmoscópio direto e binocular. Ter uma
lanterna com luz suficiente, mas não muito intensa para iluminar os olhos da criança e obser­
var problemas de lacrimejamento, posição dos olhos, movimentos oculares e das pálpebras,
sinais de inflamação e secreção em olho externo, tamanho e lesões visíveis nas córneas, brilho
refletido nas córneas (método de Hischberg) para desvios oculares, enfim, tudo que possa ser
visto sem tocar na criança. Durante esse tempo o médico estará falando com a mãe e a criança,
sempre em voz suave e amistosa. Ainda poderá avaliar a visão da criança pelo seu comporta­
mento, fazendo surgir em seu campo visual objetos de interesse infantil.

A oclusão alternada dos olhos poderá dar informação se um dos olhos tem pior visão ou
estrabismo.
Após este inicio de consulta pedimos para nossa atendente ou auxiliar instilar colírio ciclo-
plégico em dose adequada segundo a idade para fazermos exame retinoscópico com as réguas
de lentes e o fundo de olho com o oftalmoscópio.
Em caso de necessidade absoluta poderemos fazer exame sob narcose, preferentemente
em centro cirúrgico com anestesista, em que é possível atendimento cardiorrespiratório de
emergência.
Recomendamos o centro cirúrgico por prudência e portanto desaconselhamos a prática de
uso de soníferos ou tranquilizantes em crianças de baixa idade se não houver acesso e possi­
bilidade de uso de aparelhamento adequado em uma emergência.
Semiologia Básica em Oftalmopediatria | 287

Material necessário ao exame que deve estar à mão:


■ Lanterna.
■ Oftalmoscópio direto.
■ Oftalmoscópio indireto binocular.
■ Retinoscópio.
■ Réguas com lentes positivas e negativas.
■ Caixa de lentes.
■ Caixa de prismas.
■ Tonômetros de aplanação de Perkins ou Tonopen.
■ Blefarostatos pequenos.
■ Blefarostato de Desmarres.
■ Fluoresceína em bastonete.
■ Colírio anestésico.
■ Colírio de ciclopentolato de baixa concentração.
■ Colírio de fenilefrina de baixa concentração.
■ Lâmpada de fenda.

MEDIDA DA VISÃO EM CRIANÇAS


Devemos inicialmente lembrar que crianças de 3 meses já conseguem ver e seguir objetos
coloridos ou iluminados apresentados à sua frente e movidos do centro para a periferia do
campo visual.
Após 3,5 anos podemos utilizar as tabelas de Snellen, os anéis de Landolt ou de reconhe­
cimento de objetos de Allen para testar a visão à distância de 20 pés. O teste deve ser realiza­
do em olhos separadamente. Caso não tenha condições de ver a letra de maior tamanho que
corresponde a 20/400, poderemos deslocar a criança, aproximando-a da tela até que distinga
a posição da letra E e anotarmos a visão que tem pela distância em pés no numerador e 400
no denominador. Por exemplo 5/400 se conseguir ver o “E” a 5 pés, o que corresponde a uma
distância de aproximadamente 1,5 m. Caso não tenha condições de ver na tela, avaliamos sua
visão mostrando a mão com alguns dedos levantados e instamos a criança a contá-los, e ano­
tamos como sua acuidade visual a maior distância que ela consegue ver.
Caso não tenha distinguido os dedos a curta distância, movemos a mão próximo de seus
olhos e anotamos se tem possibilidade de ver o vulto.
Caso não consiga ver o vulto da mão, verificamos com a luz do oftalmoscópio ou de uma
lanterna se a criança consegue ver a luz. Na impossibilidade de vê-la, consideramos a criança
cega totalmente do olho examinado.
Em caso de nistagmo devemos medir a acuidade visual com os dois olhos abertos e fora
do Greens para poder mover a cabeça livremente. Os portadores de nistagmo têm melhor
acuidade visual quando utilizam a visão binocular e podem buscar a posição de bloqueio do
nistagmo, movendo a cabeça.
Em crianças de baixa idade a medida da acuidade visual é mais difícil e temos de recorrer
a outros métodos para sua avaliação. Por exemplo, o cilindro para nistagmo optocinético.
288 Semiologia Básica em Oftalmologia

Em crianças em idade pré-verbal podemos fazer uso do teste de visão preferencial, apre­
sentando cartões com faixas negras de larguras diferentes que são colocados em uma pequena
janela lateral que existe no anteparo e observando pelo visor vemos a criança mover os olhos
r

para enfocá-los. E um teste pouco preciso, mas eventualmente útil (teste da visão preferencial
de Teller).
O teste comportamental também nos dá uma avaliação grosseira, mas de utilidade. Por
exemplo, observa-se se a criança olha para a mãe, se olha para a mamadeira, se observa no
chão pequenos objetos, isso após 1 ano, quando já consegue engatinhar ou andar. Este teste
deve ser realizado no consultório ou em sua residência, e a mãe ou o responsável pela criança
o observador principal.
Entre 3 e 8 meses devemos observar a movimentação dos olhos. Quando a criança tem o
olhar parado e não busca olhar para a mãe, mamadeira, etc., pode haver retardo mental.
O aparecimento do nistagmo aproximadamente no terceiro ou quarto mês nos dá suspeita
de intensa redução visual. Esse nistagmo é arrítmico e com amplitude variável.
O sinal digito-ocular de Fransceschetti é característico das crianças quase cegas (Fig. 1).
A criança massageia o olho com o dedo interposto entre a órbita e o globo. Temos visto nas
crianças portadoras de tétrade de Sabin com grandes lesões oculares causadas pela toxoplas-
mose congênita.

Fig. 1 Sinal digito-ocular de Franceschetti. Hepatoesple-


nomegalia.

QUANDO UMA CRIANÇA DEVE SER CONSULTADA POR


OFTALMOLOGISTA
RECÉM-NASCIDOS: já ao nascer devemos realizar atendimento oftalmológico. Alguns deles são
exigidos por lei.
Semiologia Básica em Oftalmopediatria 289

A profilaxia da oftalmia neonatorum deve ser realizada já ao nascer com a limpeza da área
palpebral e instilação de colírio antisséptico (povidine) e pomada oftálmica antibiótica que
cubra infecções por gonococo e estafilococo. O método de Credê com a instilação de colírio
à base de nitrato de prata a \% ou 2% está em certo desuso em virtude da irritação ocular que
pode causar e a conjuntivite química que eventualmente pode ser confundida com a gonoco-
cia ocular e neste caso fazer uso de método substitutivo.
No decorrer das 4 semanas seguintes devemos fazer o exame do “olhinho”. Para isso é ne­
cessário observar a pupila com o oftalmoscópio direto à distância de cerca de 20 cm e verificar
com atenção o reflexo vermelho do fundo de olho o que garantirá a transparência da córnea,
do cristalino e do vítreo. Por vezes teremos necessidade de usar um pequeno blefarostato pre­
cedido de 1 gota de colírio anestésico ou mesmo usar um midriático em baixa concentração
(nota: para separar as pálpebras, podemos usar clipe para papel com sua extremidade curvada
como o blefarostato palpebral) (Fig. 2).
No caso de catarata congênita, a pupila não mostra a transparência vermelha e iluminan­
do obliquamente com o próprio oftalmoscópio veremos a cor esbranquiçada da opacidade do
r

cristalino (Figs. 3 a 5). E fundamental, neste caso, dilatar a pupila e examinar mais detalhada­
mente com o oftalmoscópio ou com recursos da biomicroscopia para verificar se a catarata é
total ou parcial. No caso de catarata total, esta deverá ser operada nos 3 ou 4 primeiros meses
de vida para ser evitada a ambliopia por privação que de outra forma causará redução visual
importante e irredutível.
Neste mesmo exame deve ser verificada a presença de glaucoma congênito que deverá ser
tratado cirurgicamente. O glaucoma congênito tem como características clínicas o aumento

Fig. 2 Cirurgia de catarata na infância. Meios transparentes


normalizados. Pós-operatório de 48 h.

Fig. 3 Catarata total na infância. Aspecto de catarata zonular.


290 Semiologia Básica em Oftalmologia

Fig. 4 Catarata parcial na infância. Núcleo opaco com reflexo


vermelho na periferia.

Fig. 5 Catarata rubeólica total. Hipoplasia de íris, microftalmia,


cílios alongados.

do diâmetro da córnea, córnea turva pelo edema, lacrimejamento e fotofobia. A pressão in­
traocular está aumentada e existem alterações nas estruturas do ângulo da câmara anterior. A
cirurgia se impõe nesses casos.
O retinoblastoma com seu potencial de gravidade para a vista e vida dos pequenos pacien­
tes deve ser pesquisado com o oftalmoscópio binocular e sob midríase.

RETINOPATIA DA PREMATURIDADE: existe com certa frequência em prematuros de baixo peso,


abaixo de 1.250 g os prematuros devem ter sua retina periférica examinada. O exame deve ser
realizado entre 4 e 6 semanas de vida em ambiente adequado, com oftalmoscópio indireto
binocular, com depressão escleral, sob midríase e realizado por profissional experiente. Caso
seja constatada a isquemia periférica, principalmente no setor temporal, já com a linha de
demarcação, encaminhar com urgência para o tratamento, especialmente a fotocoagulação da
área isquêmica. Atualmente estão sendo experimentados fatores antiangiogênicos injetados
no vítreo.

A retinopatia da prematuridade é uma das grandes causas de cegueira em prematuros que


nascem com peso abaixo de 1.500 g. Atualmente, com a sobrevivência de prematuros de mui­
to baixo peso (abaixo de 1.000 g), há uma tendência de aumento dos casos desta patologia.
A imaturidade da vascularização na periferia da retina é provavelmente a principal causa
da doença, entretanto, outros fatores, como a oxigenoterapia intensa, devem contribuir como
fatores complementares (Meta et a i, Gonzales et ai e Moraes et ai).
Semiologia Básica em Oftalmopediatria | 291

E uma doença vasoproliferativa em que a vasculogênese normal é interrompida e a retina


imatura apresenta transformação e proliferação celular. Em alguns casos a doença evolui com
hemorragia que é seguida por processo fibrótico cicatricial e descolamento de retina, em ou­
tros casos a retinopatia involui espontaneamente não deixando lesões ou levando a alterações
cicatriciais leves.

CLASSIFICAÇÃO
Em 1984, o Commitefor the Classification of Retinopathy o f Prematurity fez nova classificação da
RP baseado na localização, extensão e estágios.
A retina foi dividida em três zonas:
■ Zona 1- área da papila e 30° ao seu redor ou o dobro do raio da papila à mácula.
■ Zona 2 - limite da zona 1 até a ora serrata nasal e equador temporal.
■ Zona 3 - limite da zona 2 até a ora serrata temporal.
A extensão da doença é descrita de acordo com as horas do relógio.
Os estágios compreendem às formas ativa e cicatricial da doença.
Os estágios da forma ativa são classificados em:

ESTÁGIO 1 - linha de demarcação correspondente ao limite da retina vascularizada com a não


vascularizada, com sua coloração esbranquiçada no mesmo plano da retina.
ESTÁGIO 2 - linha de demarcação espessada e esbranquiçada, elevando-se e deixando o plano
da retina, com comunicações arteriovenosas.
ESTÁGIO 3 - estágio 2 com proliferação fibrovascular extrarretiniana e tufos de neovasos. Este
estágio subdivide-se em leve, moderado e grave, dependendo da quantidade de tecido fibro­
vascular e neovasos observados.
ESTÁGIO 4 - estágio 3 associado a descolamento parcial de retina, subdividido em 4a e 4b, na
dependência do envolvimento ou não da região macular.
ESTÁGIO 5 - descolamento total da retina, subdividido em quatro tipos conforme a abertura
retiniana, chamada funil.
1. Anterior aberto, posterior aberto.
2. Anterior aberto, posterior fechado.
3. Anterior fechado, posterior aberto.
4. Anterior fechado, posterior fechado.

Todos esses estágios, podem ser acompanhados de uma forma descrita como plus.
Classifica-se o plus em graus:
■ Grau 1 - dilatação venosa.
■ Grau 2 - dilatação e tortuosidade venosa e arterial.
■ Grau 3 - marcada dilatação e tortuosidade venosa e arterial, com rigidez pupilar.

O quadro cicatricial é caracterizado pela presença de:


■ Pequenas massas opacas na periferia, sem descolamento de retina (grau 1).
292 Semiologia Básica em Oftalmologia

■ Massas grandes na periferia, com descolamento de retina localizado (grau 2).


■ Massas grandes na periferia da retina, com tração de papila (grau 3).
■ Tecido retrocristaliniano cobrindo parte da pupila (grau 4).
■ Tecido retrocristaliniano cobrindo toda a pupila.

Nota-se nessa classificação complexa que a RP pode evoluir para fases avançadas e quando
pouco ou nada pode ser feito para a recuperação visual.
O diagnóstico diferencial deve ser feito nos estágios 2 e 3 com displasia vitreorretiniana e
nos estágios 4 e 5 com hiperplasia do vítreo primário, tumores e doença de Coats.
O exame da retina dos prematuros de risco (baixo peso) deve ser feito entre a quarta e
quinta semanas de vida e deve ser repetido a cada 2 semanas até a nona semana de vida ex-
trauterina ou até que os vasos da periferia temporal tenham atingido a ora serrata.
A regressão espontânea é a forma mais comum da evolução da RP, em torno de 88%, en­
tretanto, falhas na vascularização da retina periférica podem ser vistas.
Quando se nota RP em estágios 2 ou 3 deve-se agir com fotocoagulação ou crioterapia da
área periférica isquêmica para tentar se evitar a progressão da doença.
Nos estágios mais avançados os recursos da vitrectomia, fotocoagulação e tratamento do
descolamento de retina são muito mais complicados e o prognóstico muito mais sério.
Todos os meios profiláticos usados para evitar o surgimento da RD em prematuros têm
críticas, entretanto, devem ser tentados.
Caso se apresente estrabismo, o que pode ocorrer mais tardiamente, teremos que tomar
as medidas necessárias que estão descritas no capítulo próprio.
A toxoplasmose congênita deve ser pesquisada com exame de fundo de olho que poderá
verificar a lesão de retinocoroidite. Em casos mais graves por contaminação no primeiro tri­
mestre de gravidez há possibilidade de encontrarmos a tétrade de Sabin com micro ou macro­
cefalia, microftalmia e catarata, calcificações encefálicas e exame laboratorial positivo. A mãe
também deverá ser submetida ao exame de sangue (Fig. 6).
As malformações oculares isoladas ou relacionadas com síndromes devem ser detectadas
nesta oportunidade de exame no final do primeiro ou do segundo mês de vida. Lembramos
que as anamneses genética e de grupos de risco poderão ser muito úteis.
Novo exame oftalmológico deverá ser realizado no fim do primeiro ou no decurso do
segundo ano de vida, quando poderemos constatar cataratas evolutivas, glaucomas que se

Fig. 6 Retinocoroidite com lesão macular e mais duas pequenas


lesões-filha cicatrizadas por toxoplasmose congênita.
Semiologia Básica em Oftalmopediatria

iniciaram um pouco mais tarde e que, como os congênitos, são decorrentes de malformações
no ângulo camerular e, também, têm tratamento cirúrgico.

RETINOBLASTOMA
Sinais e sintomas
Os sinais mais comuns são a leucocoria e o estrabismo. 0 estrabismo aparece quando a mácula
é atingida ou quando o tumor envolveu o vítreo ou causou descolamento de retina (Figs. 7 e 8).
Devemos lembrar que o retinoblastoma tem duas formas: exofítica e endofítica. Na forma
exofítica o tumor se desenvolve no sentido da esclera e causa descolamento de retina (Fig. 7).
Vemos então na biomicroscopia ou oftalmoscópio binocular indireto a retina descolada com
seus vasos envolvendo o tumor. Na forma endofítica (Fig. 8), que cresce no sentido do vítreo,
vemos uma massa branca no vítreo, sem vasos na superfície e por vezes fragmentos brancos,
como sementes, dispersos no vítreo e chegando até a câmara anterior onde se depositam na
parte inferior constituindo um pseudo-hipópio.
Podem aparecer fenômenos inflamatórios que podem confundir o diagnóstico principal­
mente com uveíte posterior e, assim, retardar o diagnóstico.
Sinais extraoculares como a proptose acontecem quando o tumor se estender à órbita.
Quando o tumor produzir metástases aparecerão sintomas gerais, tais como anorexia,
vômitos, letargia e palidez.
A redução visual e até a cegueira monocular ou binocular dependem da fase evolutiva do
tumor.
Além das características já citadas, devemos lembrar que a evolução por vezes é rápida.
Quando constatamos o tumor em um dos olhos devemos fazer exame detalhado do olho
contralateral que poderá também estar envolvido e em fase ainda tratável com conservação
do globo e manutenção de visão útil.

Fig. 7 Leucocoria por retinoblastoma exofítico.

Fig. 8 Leucocoria por retinoblastoma endofítico.


294 Semiologia Básica em Oftalmologia

O exame oftalmológico do retinoblastoma se baseia principalmente na oftalmoscopia bi­


nocular indireta, mas devemos realizar biomicroscopia e ecografia que podem ajudar muito
no diagnóstico diferencial.
O retinoblastoma não costuma se desenvolver em caso de microftalmia, nesse último caso
devemos lembrar do diagnóstico diferencial, especialmente com hiperplasia de vítreo primário.
Tumor maligno intraocular mais frequente em crianças. Acarreta grande risco para a vista
e para a vida. Geralmente observado pela mãe pela visualização de “reflexo branco” na pupila
•\

do filho (leucocoria). Deve-se à mutação gênica ou somática. A forma gênica, o tumor, costuma
ser binocular e multicêntrico. Na forma de mutação somática costuma acometer um dos olhos
e ser tumor único. Geralmente acomete ou se torna visível em torno dos 2 anos de idade e
deve ser orientado para tratamento adequado com urgência.
A doença de Coats também deve ser colocada no diagnóstico diferencial. A doença de
Coats é ocular, apresenta alterações vasculares na retina periférica e placas branco-amareladas
na face posterior da retina descolada.
Para maiores detalhes deve ser consultado o volume de oncologia.

Glaucoma congênito e da infância


O glaucoma primário congênito ou da infância pode ser constatado já ao nascimento ou nos
primeiros anos de vida. Deve-se a uma displasia do ângulo da câmara anterior que causa alte­
rações oculares em consequência da elevada pressão ocular.
O glaucoma secundário da infância é associado a processo inflamatório intraocular, neo­
plasias, hamartomatoses, alterações metabólicas ou outras anomalias do olho.
O aumento do globo ocular especialmente com o alargamento da córnea (olho de boi)
aparece quando existe hipertensão ocular antes dos 3 anos de idade.
A sintomatologia característica do glaucoma na infância é uma tríade constituída por
epífora, fotofobia e blefaroespasmo. O diagnóstico depende de cuidadoso exame clínico-of­
talmológico, incluindo medida da pressão intraocular (PIO), medida do diâmetro corneai,
gonioscopia, medida do comprimento axial do globo ocular por ultrassonografia e oftal­
moscopia (Figs. 9 e 10).
O exame do olho externo pode revelar buftalmia com alargamento da córnea com diâme­
tro maior que 12 mm. Edema de córnea está presente em 25% dos pacientes afetados já ao
nascimento e em 60% aos 6 meses de idade. Roturas na membrana de Descemet, chamadas
de estrias de Haab, formam linhas horizontais concêntricas ao limbo e são causadas pela dis­
tensão da córnea.

Fig. 9 Buftalmia com edema de córnea. Fotofobia.


Semiologia Básica em Oftalmopediatria

Fig. 10 Buftalmia, edema de córnea, lacrimejamento, glaucoma


congênito.

Podem ocorrer redução visual como resultado da atrofia óptica, turvação da córnea, as­
tigmatismo, ambliopia, catarata, subluxação do cristalino, ou descolamento de retina. Crian­
ças com glaucoma requerem um exame pormenorizado sob anestesia geral ou sedação. Com
anestesia profunda a PIO abaixa.
Na gonioscopia podemos verificar a câmara anterior profunda, hipoplasia periférica da
íris, falta do recesso do ângulo e principalmente hiperplasia do pectinado uveal (Fig. 11). Essas
alterações no ângulo camerular são as verdadeiras causas do glaucoma primário na infância.
Caso o edema da córnea impeça a boa visão do ângulo pela gonioscopia é possível a remoção
do epitélio da córnea o que facilitará também o exame de fundo de olho.
O exame de fundo de olho pode ser realizado com o oftalmoscópio direto ou binocular
ou com a biomicroscopia da papila observada pela área central da lente de 4 espelhos usada
durante a gonioscopia.
A escavação glaucomatosa em crianças é semelhante a do adulto e nota-se o aumento da
escavação especialmente pela redução da rima neural nas partes superior e inferior da papila.
O controle da evolução do glaucoma é feito pela medida da PIO, aumento do diâmetro da
córnea, aumento do comprimento axial do globo ocular e ampliação da escavação glaucoma­
tosa. A estereografia ou fotografia da papila podem ajudar nesta avaliação de sua evolução.
Feito o diagnóstico, devemos encaminhar esses pacientes para a cirurgia antiglaucomato-
sa necessária.

Fig. 11 Hiperplasia de pectinado uveal em glaucoma congênito.

Exames de crianças de 1 e 3 anos


Crianças entre 1 e 3 anos podem tornar os exames difíceis, o que nos obriga a realizar os exa­
mes sob narcose. Pessoalmente, acredito que exames sob narcose devem ser realizados em
centros cirúrgicos ou ambientes onde seja possível o recurso de atendimento cardiorrespira-
tório de emergência.
296 Semiologia Básica em Oftalmologia

Os exames de refração em crianças devem ser feitos sob cicloplegia, e os vícios refrativos
elevados e monoculares devem ser atendidos com presteza e revisados periodicamente para
evitar estrabismo e ambliopia.

Leucocorias na infância
O próprio nome significa pupila branca. E frequentemente a mãe que a constata.
Devemos examinar a pupila com iluminação oblíqua, com o oftalmoscópio direto a cerca
de 20 cm de distância do olho, pela biomicroscopia, tentativa de exame de fundo de olho com
o oftalmoscópio binocular e solicitar ecografia para avaliar as estruturas oculares posteriores,
quando os meios, córnea, cristalino ou vítreo são opacos.
As possibilidades de causar leucocorias são:
■ Retinoblastoma.
■ Hiperplasia de vítreo primário.
■ Retinopatia da prematuridade - estágios 4 e 5.
■ Cataratas congênita e da infância.
■ Colobomas de coroide.
■ Uveites.
■ Toxocaríase.
■ Pregas retinianas congênitas.
■ Doença de Coats.
■ Hemorragia no vítreo.
■ Displasia retiniana.
■ Hamartomas.

As causas mais importantes estão grifadas e foram descritas em outras áreas.


Crianças pré-escolares, de 5 a 7 anos, devem fazer exame oftalmológico não só por enfer­
midade já preexistente, mas para adaptá-las às exigências escolares que se iniciam. Defeitos
ópticos, desvios oculares, dificuldades à leitura e visão a distância.

BIBLIOGRAFIA
Erwenne CM etol. Retinoblastoma, In: Retina e Vítreo: Clínica e Cirurgia. São Paulo: Roca, 2000; p. 374-386.
Glaucoma - Basic and Clinicai Science Course Section 10-1997-1998 - American Academy of Ophthalmogy.
Harley RD. Pediatric Ophthalmology - 2nded. Philadelphia: Saunders, 1983.
Pediatric Ophthalmology and Strabismus. Basic and Clinical Science Course, Section 6,1997-1998. American Academy of
Ophthalmology.

Literatura Sugerida
1. Harley RD. Pediatric Ophthalmology, 2nd ed. Philadelphia: Saunders, 1983.
Semiologia Básica em
Neuroftalmologia

MÁRIO LUIZ RIBEIRO MONTEIRO

INTRODUÇÃO
O exame neuroftalmológico representa uma etapa fundamental para o diagnóstico e tratamen­
to das afecções da via óptica e do controle dos movimentos oculares. Na realidade, representa
um exame oftalmológico com ênfase maior em alguns dos seus itens, particularmente a anam-
nese, a avaliação da função visual, o exame de campo visual, a avaliação das reações pupilares
e a fundoscopia. Neste capítulo chamaremos a atenção para os itens mais importantes do exa­
me bem como os principais sinais e sintomas das afecções neuroftalmológicas.

ANAMNESE
Uma história completa e detalhada, ao lado de um exame oftalmológico minucioso, permite,
r

em grande número de casos, uma orientação diagnóstica segura. E de boa norma permitir
que o paciente conte sua história com suas próprias palavras, devendo o examinador anali­
sar quais são os principais sintomas e a cronologia de cada um deles. Durante a narração da
história o examinador deve observar atentamente o comportamento e as reações emocionais
r

do paciente. E necessário conduzir a anamnese fazendo o paciente caracterizar suas queixas,


rejeitando diagnósticos anteriores ou presumidos por ele mesmo. Muitas vezes os pacientes
têm compreensões errôneas quanto à denominação de sintomas que apresentam. Por exem­
plo, a queixa “embaçamento” visual pode querer dizer falta de foco, perda de luminosidade
e até uma falha na visão, dependendo do paciente. O que deve ser valorizado e anotado não
é o nome que o paciente dá à sensação, senão a descrição que faça da mesma. Esta descrição
r

deve ser cobrada ativamente do paciente. E necessário, também, que o examinador, ao redigir
a história clínica, procure utilizar termos simples, evitando termos técnicos ou expressões in-
terpretativas que possam gerar equívocos ou confusões futuras.

297
298 Semiologia Básica em Oftalmologia

Nem sempre é possível o interrogatório do próprio paciente e nestas circunstâncias deve­


mos recolher os dados clínicos fornecidos por parentes e/ou acompanhantes eventuais. Esta
situação se apresenta nos pacientes em coma ou com distúrbios psíquicos, como agitação
psicomotora, confusão mental e demência.

História da doença atual


r

E importante determinar quando se iniciou a doença e o modo de instalação dela. Deve-se de­
terminar qual a queixa principal que motivou a consulta e há quanto tempo ela está presente.
r

E importante uma análise crítica dos sintomas, como no caso da perda visual ou da cefaleia.
Uma perda visual de início súbito, como uma mancha que ocorre ao acordar já pode dar indi­
cações muito fortes de uma neuropatia óptica isquêmica. Por outro lado, a perda visual que
piora progressivamente ao longo de alguns dias e acompanhada de dor ocular à movimenta­
ção ocular sugere fortemente uma neurite óptica.
A idade do paciente é importante. Na infância, são mais frequentes os processos infla­
matórios, na adolescência e no adulto jovem, os processos desmielinizantes e nos indivíduos
idosos as doenças vasculares.
Outro elemento importante é o modo de evolução da doença. O caráter agudo é evidente
nos processos isquêmicos e inflamatórios, bem como em muitas paralisias oculomotoras. O
caráter progressivo é evidente nas neuropatias compressivas e heredodegenerativas. Algumas
doenças evoluem por surtos, ocorrendo remissões espontâneas entre os surtos, como, por
exemplo, a esclerose múltipla ou ocasionalmente a miastenia ocular.
Faremos em seguida uma análise sucinta dos principais sintomas das afecções neuroftal-
mológicas.

P e r d a v i s u a l

E uma das queixas mais importantes. A diminuição da acuidade visual que pode ser uni ou bi­
lateral, de instalação súbita ou progressiva. Um quadro de perda visual súbita e unilateral pode
sugerir uma embolia na artéria central da retina ou uma neuropatia óptica isquêmica. Muitos
pacientes conseguem relatar exatamente o momento do início da perda visual, particularmen­
te nas afecções inflamatórias e isquêmicas. No entanto, outros têm dificuldade para relatar a
evolução após o início da perda. Uma perda visual que progrediu rapidamente em alguns dias
sugere fortemente uma neurite óptica. Já a perda visual que se inicia rapidamente, mas que se
mantém constante nos dias subsequentes leva à suspeita de uma afecção isquêmica.
O médico deve também ter em mente que algumas vezes a descrição de perda súbita da
visão pode ser falsa, decorrente do reconhecimento da perda que anteriormente não era ob­
servada. Alguns pacientes notam o déficit visual ao ocluir um dos olhos às vezes por algum
outro problema (sensação de corpo estranho, conjuntivite, problemas com lentes de contato,
etc.) e, no entanto, relatam a perda visual como sendo abrupta. Dessa forma, o médico deve
estar atento a estas possibilidades quando da anamnese e perguntar como foi que notou a
perda visual, em que a deficiência foi observada.
Os distúrbios da visão podem ser permanentes ou transitórios, simples ou complexos,
negativos ou positivos. Pacientes detectam sintomas positivos (cintilações visuais, manchas
Semiologia Básica em Neuroftalmologia 299

vermelhas no campo de visão) com mais facilidade do que sintomas negativos ou depressões
periféricas do campo visual.
Embaçamento visual é a queixa mais comum de pacientes com alteração da via óptica,
mas infelizmente é aquela que é mais inespecífica. Embaçamento ou perda de definição dos
limites do objeto é produzida por degradação da imagem óptica na retina em alterações re-
fracionais e em opacidades de meios. As causas ópticas devem ser distinguidas de lesões neu-
roftalmológicas. Sintomas associados de perda da visão de cores ou perda de luminosidade
podem auxiliar na distinção. A palavra escotoma implica uma área circunscrita de escuridão
no campo visual. Alguns pacientes, no entanto, referem como visão embaçada em vez de uma
mancha. Escotomas decorrentes de afecções retinianas, particularmente doenças maculares,
são muitas vezes percebidos como uma mancha central na visão. Por outro lado, nas afecções
do nervo óptico na maioria das vezes o escotoma não é percebido de forma clara pelo pacien­
te, a não ser aqueles mais observadores.
Alterações do campo visual (escotomas, hemianopsias, quadrantopsias) podem ser refe­
ridas pelos pacientes com bom nível mental, mas, na maioria dos casos, somente serão evi­
denciados de forma correta apenas durante o exame físico. Mesmo pacientes atentos podem
não perceber um defeito campimétrico periférico, especialmente quando de evolução lenta.
Pacientes com hemianopsia homônima simples podem ter dificuldade na leitura, particu­
larmente nos casos de perda no hemicampo direito, uma vez que não conseguem seguir as
palavras durante a leitura. Pacientes com hemianopsia esquerda, por outro lado, podem ler
melhor as palavras, mas perdem o início do texto quando mudam de uma linha para outra
durante a leitura. Muitos pacientes com hemianopsia homônima de um dos lados, quando
descrevem a perda visual insistem que tiveram perda da visão de um dos olhos. Por exemplo,
o paciente com hemianopsia homônima direita ao ser questionado não raro refere que apre­
senta perda visual no olho direito. O médico deve ter em mente a possibilidade desta confu­
são que pode ser percebida quando perguntamos como é que este via os objetos que estava
olhando. Dessa forma, o relato de que via metade dos objetos (estando com os dois olhos
abertos) deixa claro que estamos diante de uma hemianopsia homônima e não de perda visual
em um dos olhos.

S i n t o m a s d e c o r r e n t e s d e a l t e r a ç õ e s m o t o r a s d o s o l h o s

Diplopia também é uma queixa neuroftalmológica muito frequente. Pode ser horizontal, ver­
tical ou inclinada e pode ser constante ou intermitente. Diplopia francamente intermitente
(alguns dias presente outros completamente ausente) é sugestiva de miastenia gravis com aco­
metimento ocular, mas pode também ocorrer nas descompensações das forias. Além disso, o
oftalmologista deve estar atento para o fato de que pacientes com paralisias parciais podem
r

referir diplopia intermitente que se manifesta dependendo do posicionamento da cabeça. E


frequente que o paciente com diplopia se apresente ao exame fechando voluntariamente um
olho com o objetivo de eliminar a diplopia.
A percepção de visão dupla ocorre quando as imagens dos dois olhos caem em pontos
retinianos não correspondentes. As imagens são, portanto, projetadas em locais diferentes no
r

espaço. E necessário verificar que o paciente perceba o desaparecimento da diplopia quando


fecha um dos olhos. Esta informação é de fundamental importância já que a “diplopia” que
300 Semiologia Básica em Oftalmologia

persiste com apenas um dos olhos (diplopia monocular) está relacionada com alterações do
globo ocular (astigmatismo, catarata nuclear, etc.) e não a transtornos motores dos olhos. De­
vemos lembrar ainda na anamnese que alguns pacientes com diplopia (com as imagens muito
próximas e sobrepostas) por vezes referem “embaçamento” ou embaralhamento visual. A in­
formação de que o “déficit” visual melhora com a oclusão de um dos olhos deve fazer o exa­
minador suspeitar de que se trata de alteração motora e não perda visual propriamente dita.
A diplopia pode ter início abrupto ou insidioso e ser vertical, horizontal ou inclinada. Mui­
tos pacientes têm dificuldade na descrição de se a diplopia tem separação vertical ou horizon­
tal, mas devem ser cobrados a respeito dessa informação. Verificar também se existe alguma
posição compensatória da cabeça. Por exemplo, o relato de diplopia vertical ou inclinada que
aumenta no olhar para baixo e diminui com a inclinação da cabeça ou abaixamento do queixo
sugere fortemente uma paralisia troclear. Por outro lado, uma diplopia vertical que diminui no
olhar para baixo e aparece ou aumenta no olhar para cima ocorre com frequência na orbito-
patia de Graves, por restrição do músculo reto inferior ao movimento do olho para cima. Um
início abrupto de diplopia horizontal com ptose, pupila dilatada e exotropia juntamente com
dor periocular e cefaleia intensas, pode ocorrer por distenção ou sangramento de um aneuris­
ma da artéria comunicante posterior.
Oscilopsia, a percepção falsa do movimento das imagens, é causada pela passagem repe­
tida de objetos e ocorre especialmente em pacientes com nistagmo e também pode ser uma
queixa, embora menos comum. Da mesma forma, alguns pacientes podem referir dificuldade
na movimentação dos olhos em determinada direção, como, por exemplo, na dificuldade de
olhar para cima que ocorre na síndrome de Parinaud e na dificuldade de olhar para um dos
lados que ocorre na paralisia do olhar conjugado horizontal.

D o r e s o c u l a r e f a c i a l

O sintoma de dor obriga o examinador a uma análise exaustiva de todos os seus elementos:
caráter, topografia, irradiação, duração, fatores que agravam e que aliviam a dor.
A dor pode também auxilar na determinação da origem da perda visual, como no glauco­
ma de fechamento angular, que é caracterizado por dor ocular, embaçamento visual com visão
de halos coloridos e vermelhidão ocular. Uma dor ocular com duração de alguns dias, que se
acentua com a movimentação ocular, é muito sugestiva de uma neurite óptica enquanto a
ausência de dor junto com a perda visual é mais indicativa de neuropatia óptica isquêmica.
Dor ocular à movimentação dos olhos também pode ocorrer nas miosites orbitárias, quando
usualmente o paciente refere também diplopia constante ou intermitente. Diplopia acompa­
nhada de dor também pode ocorrer nas paralisias oculomotoras isquêmicas, nos aneurismas
intracranianos ou na síndrome de Tolosa Hunt (oftalmoplegia dolorosa).
Dor referida nas regiões ocular e periocular é também um sintoma frequente em pacientes
com enxaqueca, disfunção da articulação temporomandibular, cefaleia tensional e sinusopa-
tias. Alem disso, o oftalmologista deve ter em mente que alguns pacientes se queixam de dor
facial ou dor ocular não característica, frequentemente bilateral, tendendo a ser constante (em
vez de paroxística) e sem uma causa específica. Tal sintoma mais frequentemente ocorre em
pacientes depressivos ou neuróticos.
Semiologia Básica em Neuroftalmologia | 301

Antecedentes pessoais
Particularmente nas afecções da criança é importante indagar como decorreu a gestação: se
houve perdas sanguíneas frequentes nos primeiros meses; se a gestante fez uso de determina­
dos medicamentos com efeitos teratogênicos; se houve ou não ocorrência de processos infec­
ciosos (rubéola, toxoplasmose), traumatismos maternos, toxemia gravídica. Interrogar sobre
as condições de parto: a termo ou prematuro; ocorrência de anóxia neonatal, presença de cia­
nose ao nascer, necessidade de uso de manobras de reanimação, choro precoce ou demorado.
Indagar sobre a necessidade de internação hospitalar nos primeiros dias de vida, presença de
icterícia neonatal ou crises convulsivas nos primeiros dias de vida.
Na idade adulta, deve ser apurada referência a traumatismos, parasitoses, passado vené­
reo (sífilis), manifestações alérgicas, doenças do sistema nervoso central e dos tratos cardio­
vascular, endócrino, digestivo, respiratório e urinário. Pacientes com quadros neurológicos
prévios, por exemplo, de paralisias ou perdas sensitivas e que se apresentam com perda visual
compatível com neurite óptica podem sugerir fortemente a ocorrência de uma esclerose múl­
tipla. Pacientes com hipertireoidismo podem apresentar diplopia por acometimento dos mús­
culos extraoculares e mesmo perda visual por compressão do nervo óptico pelos músculos
aumentados. Pacientes com diabetes de longa duração, não raro, podem apresentar diplopia
por paralisia de nervos oculomotores. Indagar ainda se o paciente foi operado e a que tipo
de cirurgia se submeteu, se já fez tratamento para doença maligna. Indagar sobre hábitos de
vida, regime alimentar (neuropatias carenciais), vícios (alcoolismo) e intoxicações (metanol,
chumbo, monóxido de carbono, hidrazida, etambutol, arsénicos, manganês). Indagar ainda
sobre a atividade profissional do paciente.

Antecedentes familiares
Apresenta grande importância a indagação sobre o caráter hereditário ou familiar de deter­
minadas doenças: heredodegenerações, como a atrofia óptica dominante ou a doença de Le-
ber, miopatias, determinadas doenças metabólicas. Podemos reconhecer doenças com várias
modalidades de transmissão hereditária (dominante, recessiva, ligada ao sexo, transmissão
materna). É importante verificar se existe consanguinidade dos pais em muitas doenças here­
ditárias.
Em certos casos é necessário o exame de membros da família, como, por exemplo, nos ca­
sos de atrofia óptica dominante, em que há grande variação na penetrância do gene, e alguns
familiares podem ser apenas discretamente afetados.

AVALIAÇÃO DA FUNÇÃO VISUAL


Especial atenção deve ser dada à estimativa da função visual através da medida da acuidade
visual, da visão de cores, sensibilidade ao contraste e da estimativa do campo visual.
302 | Semiologia Básica em Oftalmologia

Acuidade visual
A medida da acuidade visual usualmente é o primeiro item avaliado no exame neuroftalmoló-
gico. Embora as alterações sejam inespecíficas, sofrendo grande influência de erros de refra-
ção e opacidades de meios, é também muito importante nas afecções da via óptica. A estima­
tiva da acuidade visual define o menor ângulo visual que permite ao sistema visual perceber
o estímulo. Para a percepção correta da imagem visual, esta deve ser formada sobre a retina
e transformada em impulsos nervosos, os quais são conduzidos ao cérebro. A focalização de­
pende de vários fatores, em especial a transparência dos meios refrativos e correção do erro
refracional. De preferência a medida deve ser feita pelo médico, tomando o cuidado de cor­
rigir eventuais erros refracionais. A medida da acuidade visual é feita rotineiramente com as
tabelas de optótipos colocadas a distância apropriada.

Visão de cores
A avaliação da visão de cores também pode ter importância em neuroftalmologia, embora seu
uso rotineiro e a interpretação dos resultados sejam mais difíceis quando comparados com a
acuidade visual e o campo visual. Como se têm três diferentes pigmentos nos cones, os seres
humanos com visão de cor normal são chamados tricromatas. Aqueles que são incapazes de
distinguir corretamente as nuances são descritos como deficientes para cor. Eles têm essa de­
ficiência em um ou mais dos três tipos de cones. Muitos deles aprendem a dar nomes de cores
a objetos familiares.
Doenças adquiridas da via óptica comumente causam alteração na percepção de cores. Os
sintomas refletem uma redução no brilho e saturação das cores, mais observado com relação
ao vermelho, embora possa ocorrer para todas as cores. Na terminologia de cores, saturação
se refere à pureza da cor, e dessaturação é o grau no qual a cor é misturada com o branco.
Alguns pacientes caracterizam a sensação como escura, isto é, o vermelho se torna âmbar,
enquanto outros referem que a cor se mostra desbotada ou mais clara, quando o vermelho se
torna mais alaranjado ou amarelado.
Os testes mais comuns para visão de cor são o Ishihara, o de Handy Hard Hitter e o de
Farnsworth-Munsell D-15 e de 100 tons. Muitas afecções da via óptica se manifestam por al­
teração na visão de cores.
As alterações adquiridas na visão de cores tipicamente envolvem a discriminação do ver­
de-vermelho nas doenças do nervo óptico e o azul-amarelho nas doenças da mácula. Existem,
no entanto, inúmeras exceções a esta regra que deve ser usada como um guia e não uma regra
rígida. Algumas doenças maculares são associadas a defeito na discriminação do verde-vermelho,
mas são caracterizadas por alteração na discriminação do azul-amarelo nas fases iniciais. Da
mesma forma, doenças do nervo óptico que envolvem primariamente o feixe papilomacular e
se associam à perda importante de acuidade visual se associam a defeitos no verde-vermelho,
enquanto aqueles que levam a alterações pericentrais, com preservação da acuidade visual, se
caracterizam por alteração no azul-amarelo. Exemplos dessas condições que afetam primeiro
a região pericentral incluem o glaucoma, o papiledema, a atrofia óptica dominante e a neuro-
patia óptica isquêmica.
Semiologia Básica em Neuroftalmologia | 303

Sensibilidade ao contraste
Alterações nas vias ópticas também se traduzem frequentemente por alterações na sensibili­
dade ao contraste que podem ser avaliadas por testes comercialmente disponíveis. A acuida­
de visual define o menor detalhe espacial que pode ser diferenciado para estímulos com alto
contraste, mas não especifica as respostas do sistema visual a objetos de diferentes tamanhos
e contrastes. O grau de visibilidade de uma figura genérica pode também ser alterado, redu-
zindo-se o seu constraste até um limite abaixo do qual ela não é mais reconhecida, indepen­
dentemente do seu tamanho.
Frequentemente, a acuidade de leitura de teste de Snellen pode permanecer sem altera­
ções em casos de disfunção do nervo óptico, apesar das reclamações sobre a diminuição da
claridade. Os pequenos optótipos apresentados, com quase 100% de contraste sobre a carta
de acuidade, são de mais fácil interpretação para os pacientes do que os objetos maiores de
baixo-contraste que dominam nosso ambiente visual. A sensibilidade ao contraste é definida
como a habilidade em discernir visualmente tais graus súbitos de contraste. Existem inúmeros
aparelhos para medida da sensibilidade ao contraste que podem ser úteis em várias afecções
da via óptica, particularmente as neuropatias ópticas. Deve ser lembrado, no entanto, que a
redução da sensibilidade ao contraste pode também ocorrer em inúmeras outras afecções
oculares, sendo, portanto, uma alteração relativamente inespecífica.

O Exame do campo visual


O campo visual pode ser definido como o conjunto de pontos no espaço que o olho, teorica­
mente imóvel, percebe. A perimetria ou exame do campo visual é realizada em um olho de
cada vez e representa a expressão clínica do estado funcional das visas ópticas.
Na representação gráfica, o campo visual é dividido em quatro quadrantes. As medidas
do campo visual são realizadas em relação ao ângulo de visão formado pelo eixo visual e o
limite considerado. As extensões dos campos visuais, superior e nasal estão, respectivamente,
limitadas pelo rebordo orbitário superior e pelo nariz, sendo influenciadas por variações ana­
tômicas. O campo visual é também dividido em campo central (do ponto de fixação até 30°) e
em campo periférico com os limites entre 30° até a periferia. A mancha cega representa uma
área com ausência absoluta de sensibilidade visual e corresponde à projeção espacial da papi­
la. Situa-se no campo temporal, com o centro localizado aproximadamente a 15,5° do ponto
de fixação e 1,5° inferiormente ao meridiano horizontal.
Para que o exame de campo visual seja bem feito, é necessária uma adequada instrução do
paciente com a correspondente compreensão e cooperação dele, além da ausência de fatores
de influência.
O campo visual pode ser feito através de vários métodos, incluindo o teste de confron­
tação, a tela tangente, o perímetro manual de Goldmann e os perímetros computadorizados.
a) Métodos de confrontação: é uma forma simples de avaliar os campos visuais de um pacien­
te. Nesse método, o examinador se posiciona na frente do paciente e compara seu campo
visual com o dele. O método de confrontação permite uma avaliação rápida, prática e fácil
dos campos visuais, que pode ser realizada à beira do leito ou no consultório, tanto em
adultos quanto em crianças. O médico geralmente fica de frente ao paciente a uma distân­
304 Semiologia Básica em Oftalmologia

cia aproximada de 60 cm. Após o paciente ocluir um dos olhos solicita-se que fixe o olho do
examinador que também oclui um dos olhos. Com a mão, o examinador compara os dois
campos (o dele e o do paciente). Em vez de usar a mão como estímulo, pode-se usar outros
objetos, como uma esfera branca na ponta de uma vareta preta. O paciente deve perceber
o objeto de forma semelhante nos quatro quadrantes. Em seguida se pede a ele para con­
tar dedos apresentados em dois quadrantes simultaneamente. Se um dos quadrantes for
ignorado, um defeito discreto pode ser identificado.
b) Tela tangente: trata-se de um método útil em neuroftalmologia, embora seja pouco usado
r

na atualidade. E barato e permite uma avaliação adequada dos 30° centrais de visão. Nele,
apresentam-se estímulos na frente de uma tela preta, que representa um fundo homogê­
neo e permite melhora na discriminação dos objetos, geralmente brancos apresentados ao
paciente. O paciente deverá ficar sentado a 1 ou 2 m da tela, com a cabeça de maneira que
os seus olhos fiquem no nível do centro da tela. Com um olho tampado, ele deverá fixar um
ponto branco situado no centro da tela. Costuma-se usar como estímulo a ser testado uma
bola branca de 1 a 3 mm fixada na ponta de uma vareta fina (de cor preta), que se mova da
periferia para o centro da tela. Assim que o paciente a vê, o examinador assinala o local de
tal forma a mapear o campo de visão. Com prática, o examinador consegue identificar e
desenhar os defeitos que se situam na região dos 30° centrais do campo visual.
c) Perimetria manual de Goldmann: estuda-se o campo visual através de aparelho de cúpula com
iluminação de fundo-padrão, no qual são apresentados manualmente estímulos de diferentes
tamanhos e intensidades. Esses estímulos são apresentados de forma cinética ou estática.
O perímetro é uma cúpula hemisférica que dispõe de controles onde se pode selecionar
o tamanho, brilho e intensidade dos estímulos. O examinador monitora a fixação do pacien­
te através de um telescópio acoplado à cúpula. Com um mecanismo de braços articulados,
o examinador movimenta o estímulo luminoso na cúpula. O paciente perceberá ou não o
estímulo, que será registrado em forma de gráfico, situado em frente ao examinador. O méto­
do é extremamente útil para a localização de defeitos ao longo da via óptica e permite uma
avaliação completa do campo visual. Possui grande versatilidade e pode ser realizado mesmo
em indivíduos idosos ou com afecções neurológicas ou clínicas que reduzam em parte sua
capacidade de concentração. Tem também a vantagem de desenhar todo o campo visual, in­
cluindo o crescente temporal, o que permite uma noção mais exata do defeito campimétrico
r

apresentado. E considerado por muitos como o método ideal de exame do campo visual em
neuroftalmologia. No entanto, sua realização depende de um examinador experiente, com
grande treinamento na sua realização.
d) Perimetria automatizada: neste caso o exame é feito através de aparelhos automatizados
que contam com programas de apresentação dos estímulos, que são preestabelecidos e
programados. Existem diferentes marcas de perímetros automatizados no mercado e va-
r

riadas estratégias de pesquisa. E um instrumento que testa os defeitos de campo visual


usando localizações de luz fixa (estática).
Atualmente, esse é o método mais utilizado, em especial para o diagnóstico e o acompa­
nhamento de pacientes com glaucoma. Entretanto, ele também pode ser útil para o estudo
de outras afecções da via óptica. O exame pode ser difícil em pacientes idosos ou que tenham
dificuldade de concentração. As razões para a maior utilização do perímetro computadorizado
Semiologia Básica em Neuroftalmologia 305

incluem: (1) melhor padronização que facilita a comparação seriada de campos; (2) melhor sen­
sibilidade; (3) avaliação estatística dos dados do exame; (4) estoque e transmissão eletrônica
de dados e (5) redução na influência subjetiva do examinador. Além disso, deve ser lembrada
a falta de técnicos adequadamente treinados na perimetria manual.
Embora os perímetros automáticos sejam muito úteis de maneira geral, apresentam algu­
mas limitações em neuroftalmologia. Os exames são cansativos, particularmente em pacientes
com afecções neurológicas, muitas vezes ocorrem resultados falso-positivos e o exame não
permite uma compreensão total do campo visual, já que usualmente se limita a analisar os 24°
a 30° centrais. Enquanto no glaucoma o exame campimétrico é realizado para verificar a exis­
tência ou não de defeito e a sua eventual progressão, em neuroftalmologia além desses dois
objetivos, muitas vezes necessitamos compreender qual o padrão, ou seja, as características
do defeito de campo visual que geralmente só se consegue quando analisamos simultanea­
mente o campo visual central e o periférico.
Apesar das ressalvas anteriores, quando o paciente é capaz de fazer adequadamente o
exame, é uma técnica muito útil nas lesões dos nervos ópticos, no papiledema, nas lesões
compressivas do quiasma óptico além de outras afecções da via óptica. A interpretação não é
tão intuitiva como a da perimetria manual e exige familiaridade com os programas computa­
dorizados e as suas estratégicas de apresentação.
e) Tipos de defeito de campo visual: os principais tipos de disfunções da percepção no cam­
po visual são:
1. Hemianopsia: literalmente significa “cegueira de metade do campo visual’’. Pode ser uni ou
bilateral: quando unilateral, pode ser temporal, caso em que ocorre perda do campo temporal,
ou nasal, quando há perda do campo nasal. Pode ser ainda denominada hemianopsia
altitudinal quando acomete a metade superior ou a inferior do campo visual (Fig. 1).

Fig. 1 Hemianopsia altitudinal inferior.


306 Semiologia Básica em Oftalmologia

As hemianopsias unilaterais são indicativas de lesões anteriores ao quiasma óptico, ao


passo que as hemianopsias bilaterais indicam acometimento do quiasma óptico ou da via
óptica retroquiasmática. As bilaterais podem ser homônimas ou heterônimas. Hemianopias
homônimas são aquelas nas quais o defeito ocorre do mesmo lado nos dois olhos (Fig. 2), ou
seja, acomete o campo temporal de um dos olhos e o nasal do olho contralateral ou vice-ver­
sa. Hemianopsias heterônimas são aquelas bilaterais que acometem lados opostos nos dois
olhos, geralmente o setor temporal de cada um deles (Fig. 3).
Hemianopsias homônimas são divididas em congruentes, quando o defeito tem a mesma
extensão nos dois olhos e incongruente quando é mais intensa em um olho do que no outro.
2. Quadrantopsia: defeito de campo que literalmente significa “perda de um quadrante
do campo visual” (Fig. 4). Ela pode ocorrer apenas em um olho ou, o que é mais
frequente, em ambos. Assim como nas hemianopsias, quando o defeito é unilateral,
indica lesão anterior ao quiasma óptico. Quadrantopsias bilaterais podem ser
heterônimas ou homônimas e, tal como as hemianopsias, podem ser congruentes ou
incongruentes.

Fig. 2 Hemianopsia homônima direita completa.

Fig. 3 Hemianopsia heterônima bitemporal.


Semiologia Básica em Neuroftalmologia 307

Fig. 4 Quadrantopsia superior direita.

3. Escotoma: defeito de campo visual que corresponde a área não visível dentro de outra
área visível para o estímulo avaliado (Fig. 5). Em outras palavras, corresponde a uma
região do campo visual que não é visível, mas que se encontra circundada por área visível
para o mesmo estímulo. A mancha cega normal que corresponde à região do nervo
óptico, representa um escotoma fisiológico. Esta, por sua vez, pode estar aumentada
em algumas afecções gerando um aumento da mancha cega que pode também ser
designado escotoma cecal.

Fig. 5 Escotoma central.


308 Semiologia Básica em Oftalmologia

Os escotomas geralmente são unilaterais, mas podem também ser bilaterais. Quando são
unilaterais ou bilaterais em regiões não correspondentes em cada um dos olhos são indicati­
vos de lesões pré-quiasmáticas. Os escotomas bilaterais situados em locais correspondentes
(p. ex., no campo visual à direita) nos dois olhos, são denominados escotomas hemianópicos
e indicam lesões retroquiasmáticas.
4. Redução concêntrica do campo visual: situação na qual o campo visual se mostra
reduzido igualmente em toda a periferia, podendo se limitar apenas à visão central.
A redução pode afetar também apenas um setor da periferia do campo visual (p. ex.,
retração temporal superior). Quando falta a metade do campo visual a denominação
usada deve ser hemianopsia. A constrição difusa do campo visual é um achado
relativamente inespecífico, mas ocorre com grande frequência nos pacientes com
papiledema crônico.
f) Importância do defeito campimétrico para localização da lesão ao longo da via óptica.
As lesões ao longo da via óptica podem ser localizadas com grande precisão pelos efeitos
que produzem nos campos visuais. Tais alterações campimétricas podem ser divididas em
alterações pré-quiasmáticas, quiasmáticas e retroquiasmáticas. Lesões anteriores ao quiasma
localizadas nos nervos ópticos usualmente se traduzem por alterações campimétricas unila­
terais. Por outro lado lesões localizadas no quiasma óptico ou em qualquer das estruturas
retroquiasmáticas produzem alterações campimétricas bilaterais.

■ Lesões pré-quiasmáticas:
As lesões pré-quiasmáticas causam vários tipos de alterações campimétricas, tais como
os escotomas central, cecocentral ou paracentral; os defeitos altitudinais (defeitos que res­
peitam o meridiano horizontal), a constrição difusa do campo visual e as retrações setoriais
do campo podem também causar cegueira completa de um dos olhos. Cada uma delas tem
grande importância no estudo das diversas neuropatias ópticas com as quais estão associa­
das. Por exemplo, as neurites ópticas frequentemente se manifestam com escotoma central
ou cecocentral. As neuropatias ópticas isquêmicas, por outro lado, usualmente se manifestam
com uma hemianopsia altidudinal inferior. Já o papiledema crônico costuma se manifestar por
retração nasal inferior e constrição difusa do campo visual.

■ Lesões quiasmáticas:
As fibras da metade nasal de cada uma das retinas cruzam-se no quiasma óptico de modo
que as fibras nos tratos ópticos são as da metade temporal de uma retina e da metade nasal
da outra. Lesões que afetam o quiasma óptico, como os tumores da pituitária, expandindo-se
para fora da sela túrcica, causam predominantemente a lesão de fibras de ambas as hemirre-
tinas nasais e produzem hemianopsia heterônima. A característica principal das alterações
quiasmáticas é, portanto, de produzir defeitos de campo bitemporais. Os defeitos podem
ser discretos, quadrantopsias ou mesmo hemianopsias temporais em cada olho. Somente no
nível do quiasma óptico é que podemos ter um defeito bitemporal verdadeiro. No entanto,
é importante lembrar de condições que simulam um defeito bitemporal e que podem causar
confusão diagnóstica. Isso ocorre especialmente nas anomalias de papila, em especial a papila
Semiologia Básica em Neuroftalmologia 309

inclinada. O diferencial pode ser feito porque o defeito não respeita verdadeiramente o meri­
diano vertical.
Os defeitos bitemporais verdadeiros podem ser extremamente assimétricos e devem sem­
pre levar à suspeita de uma afecção quiasmática. Quando a compressão quiasmática se faz de
baixo para cima, como nos adenomas hipofisários, o defeito bitemporal é mais acentuado nas
porções superiores do campo visual de cada um dos olhos. Quando a compressão quiasmá­
tica ocorre de cima para baixo usualmente o defeito campimétrico ocorre no setor temporal
inferior do campo visual. Além dos adenomas hipofisários, as síndromes quiasmáticas podem
ser causadas por craniofaringiomas, meningiomas e aneurismas, além de outras causas mais
raras, como metástase, disgerminomas e mesmo processos inflamatórios e desmielinizantes.
Deve ser lembrado ainda que lesões quiasmáticas mais avançadas podem produzir de­
feitos também nos campos nasais, que pode chegar à cegueira completa de um ou dos dois
olhos. Ou seja, embora as fibras cruzadas sejam aquelas que predominantemente sofrem o
efeito da compressão, as fibras não cruzadas (provenientes da retina temporal e que corres­
pondem ao campo nasal) podem também ser acometidas nos casos mais graves de compres­
são quiasmática.

■ Lesões retroquiasmáticas:
As lesões retroquiasmáticas se caracterizam por hemianopsias homônimas e podem ser
causadas por lesões no trato óptico, no corpo geniculado lateral, nas radiações ópticas ou no
lobo occipital. A acuidade visual é normal nestes pacientes uma vez que apenas um lado do
campo visual é acometido. Quando a hemianopsia homônima é completa não apresenta valor
localizatório e será semelhante na lesão de qualquer das estruturas anteriormente citadas. Já
os defeitos incompletos podem ser congruentes (semelhantes nos dois olhos) ou incongruen­
tes (mais acentuados em um dos olhos) e isso pode auxiliar na localização.
Lesões retroquiasmáticas parciais anteriores, acometendo o trato óptico, são bastante
incongruentes e se manifestam também por atrofia óptica nas fases mais tardias. As causas
compressivas geralmente são as mesmas que acometem o quiasma óptico. Acometimento is-
quêmico no território da artéria coroidal anterior também pode ocasionar disfunção no trato
óptico.
Lesões que acometem o corpo geniculado lateral são bastante incomuns e também po­
dem ocasionar hemianopsias homônimas usualmente incongruentes. O defeito pode acome­
ter a região mediana do campo visual, com preservação relativa dos setores superior e inferior
do campo, embora também possa levar a perdas maiores e até mesmo a uma hemianopsia
homônima completa.
A presença de defeitos campimétricos homônimos superiores e não congruentes geral­
mente localiza a lesão ao lobo temporal contralateral por acometimento das radiações ópticas
nesta região (alça de Meyer). As alterações campimétricas decorrentes de lesões occipitais são
extremamente congruentes. Lesões que preservam a área macular e ocorrem em indivíduos
sem outros sintomas são características de afecções isquêmicas do lobo occipital. As lesões is-
quêmicas são a causa mais comum de hemianopsia occipital. Outras causas incluem malforma­
ções arteriovenosas, traumas, tumores, doença desmielinizante, leucoencefalopatia multifocal
progressiva, doença de Alzheimer, etc.
310 Semiologia Básica em Oftalmologia

AVALIAÇÃO DAS PUPILAS


Também representa uma etapa fundamental do exame neuroftalmológico. Devem ser pesqui­
sadas as formas, tamanho e reatividade para perto e à luz, bem como verificadas as reações
direta e consensual à luz e a presença ou não de defeito pupilar aferente e eferente. A pesquisa
do defeito pupilar aferente ou sinal de Marcus Gunn, indicativo de um defeito pupilar aferente
relativo, é de grande importância nesta avaliação.
O exame das pupilas envolve a análise da função do nervo óptico (sistema aferente) assim
■\

como a do nervo oculomotor e via simpática ocular (eferência). A inspeção, observamos se


as pupilas são isocóricas ou não. Assimetrias no tamanho das pupilas podem ser fisiológicas
quando pequenas (anisocoria central), ou secundárias à lesão do sistema de controle pupilar
eferente.
As reações pupilares à luz devem ser cuidadosamente pesquisadas. A presença de refle­
xo fotomotor indica integridade da porção aferente do arco reflexo pupilar e que envolve os
elementos da retina, nervo óptico, quiasma óptico bem como porção anterior do trato óptico
e do braço eferente do reflexo que envolve o nervo oculomotor. A maneira mais sensível de
se avaliar a presença ou não de um defeito pupilar aferente é através da comparação da rea­
ção pupilar à luz dos dois olhos. Normalmente, ambas as pupilas se contraem quando a luz
é apresentada a um olho. Se um flash de luz é apresentado a um olho e rapidamente movido
para o contralateral, as pupilas devem permanecer aproximadamente do mesmo tamanho ou
se contrair levemente. Esta constrição ocorre porque as pupilas se dilatam quando a luz passa
de um olho para o outro. Se uma lesão interfere com a condução de luz de um olho para o
outro, aquela pupila se dilata quando o foco luminoso se move do olho normal para o anormal.

OFTALMOSCOPIA
O exame fundoscópico é de importância fundamental no exame neuroftalmológico. Pode ser
feito com o oftalmoscópio direto, o indireto ou com a biomicroscopia de fundo de olho. Para
os objetivos do exame neuroftalmológico quatro áreas do fundo de olho são importantes. A
região da média periferia deve ser observada para verificar a presença ou não de anormalida­
des pigmentárias, especialmente em crianças. A região macular deve ser visibilizada não só
para afastar lesões grosseiras, como cicatrizes de coriorretinites, mas também alterações pig­
mentárias sutis, importantes no diagnóstico de afecções maculares que podem confundir com
afecções do restante da via óptica. O disco do nervo óptico é a região de maior importância,
devendo ser observada a cor do disco óptico e se existe ou não edema de papila. Por fim, a
região da camada de fibras nervosas retiniana peripapilar também deve ser examinada.
Edema de papila é uma alteração genérica que ocorre em várias afecções da via óptica.
Pode ser um sinal de hipertensão intracraniana, decorrente de neurite óptica, neuropatia óp­
tica isquêmica, neuropatias compressivas e tóxicas. Deve ser lembrado também que o edema
de papila pode ocorrer em afecções oculares, tais como hipotonia ocular, uveítes e oclusões
vasculares da retina.
A análise da camada de fibras nervosas retiniana (CFNR) é também uma etapa fundamental
na semiologia neuroftalmológica. Pode ser de auxílio da identificação e localização de lesões
Semiologia Básica em Neuroftalmologia 311

da via óptica já que se alterada em lesões anteriores ao corpo geniculado lateral (não se altera
em afecções retrogeniculadas). Alterações na CFNR muitas vezes são mais fáceis de observar
do que a palidez do disco óptico e também servem para valorizar uma palidez papilar duvi­
dosa. Além disso, determinados padrões de perda da CFNR podem auxiliar no diagnóstico da
afecção neuroftalmológica e pode ser útil no controle evolutivo de determinadas afecções. A
CFNR é composta principalmente de axônios das células ganglionares, astrócitos e componen­
tes das células de Müller, estimando-se de 700 mil a 2 milhões de células ganglionares retinia-
nas organizadas em 4 a 6 camadas na mácula e duas na periferia.
A perda da CFNR pode ser difusa ou focal. A perda focal pode ser na forma de fendas ou
de defeitos em cunha na CFNR. A perda completa e difusa é facilmente detectável devido à ex­
posição dos detalhes da retina e da coroide. Uma perda parcial e uniforme das fibras, por ou­
tro lado, é muito difícil de identificar clinicamente, especialmente se for bilateral e simétrica.
Vários padrões podem ser úteis em neuroftalmologia, como, por exemplo, a perda focal
ou difusa que pode ocorrer na neurite óptica desmielinizante, a perda do feixe papilomacular
que ocorre em neuropatias tóxicas, desmielinizantes ou heredodegenerativas, o acometimen­
to preferencial nos feixes superior e inferior que pode ocorrer nas neuropatias traumáticas e
isquêmicas, a perda da CFNR “em banda”, ou seja, preferentemente nos setores temporal e
nasal do disco óptico que pode ocorrer nas afecções do quiasma e do trato óptico, etc.

BIBLIOGRAFIA
Glaser J e Goodwin J. Neuro-ophthalmologic examination: the visual sensory system. Duane's clinical ophthalmology. W.
Tasman and E. Jaeger. Philadelphia: Lippincott Williams & Wilkins, 1999; 2:1-26.
Johnson CA, Keltner JL. Principles and techniques of the examination of the visual sensory system. In Miller NR, Newman
NJ, ed. Walsh and Hoyt's Clinical Neuro-ophthalmology 5th ed., Baltimore: Williams & Wilkings, 1998; Cap 7, p. 153-235.
Lepore FE. The neuro-ophthalmologic case history: elucidating the symptoms. Duane's Clinical Ophthalmology. W. Tas­
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Miller NR, Newman NJ.Topical diagnosis of lesions in the visual sensory pathway. In Miller NR, Newman NJ, ed. Walsh and
Hoyt's Clinical Neuro-ophthalmology 5th ed., Baltimore: Williams & Wilkings, 1998; Cap 7, p. 237-386.

L i t e r a t u r a S u g e r i d a

1. Johnson CA, Keltner JL. Principles and techniques of the examination of the visual sensory system. In Miller NR, Newman
NJ, ed. Walsh and Hoyt's Clinical Neuro-ophthalmology 5th ed., Baltimore: Williams & Wilkings, 1998; Cap 7, p. 153-235.
Semiologia do Candidato ao
Uso de Lentes de Contato

LUCIANE BUGMANN MOREIRA • SALY MOREIRA

Na avaliação inicial do paciente para uso de lentes de contato (LCs), é necessário realizar exa­
me oftalmológico completo com história do paciente para desvendar qualquer patologia que
possa eventualmente afetar a visão e/ou o sucesso da adaptação; saber de suas necessidades
visuais, motivação para o uso de LCs e expectativas.
Em pacientes já usuários de LCs, além do exame oftalmológico completo, deve-se fazer
exame de controle da adaptação.

HISTÓRIA DO PACIENTE
Antes de ouvir a história do paciente, é preciso observar seus dados de identificação que pos­
sam ser de valor na adaptação de LC. O conhecimento de idade, sexo, profissão e hábitos de
vida é importante pela maior incidência de certas patologias sistêmicas e oftalmológicas em
r

determinadas faixas etárias. E interessante conhecer seus hábitos de vida - qual seu passa­
tempo preferido, quais os esportes que pratica, como é o local onde trabalha ou fica durante
a maior parte de seu dia, se faz uso de computador e ar-condicionado - , perguntar sobre an­
tecedentes familiares, se alguém na família usa LCs e se já apresentou algum problema ocular
sério.
O próximo passo é investigar quais são os propósitos que ocasionam a procura de lentes
de contato e quais as necessidades visuais. Muitas pessoas precisam usar LCs por indicação
médica, como em casos de ceratocone, irregularidades corneais pós-cirúrgicas ou pós-trauma,
anisometropia, etc. Outras pessoas querem LC por motivos estéticos. Alguns querem usá-las
ocasionalmente na vida social, outros preferem usá-las diariamente ou até fazer uso contínuo.
Esse conhecimento é importante para o oftalmologista decidir sobre o tipo de LCs mais
apropriado, tipo de uso e os regimes de cuidados.

313
314 Semiologia Básica em Oftalmologia

É necessário também saber se o paciente já foi usuário de LCs e questioná-lo sobre a


adaptação anterior: qual o tipo de LCs que usou, se houve sucesso ou problemas na adaptação
anterior, se houve alguma doença associada - como alergia, lesão de córnea, olhos secos, en­
tre outras - e como manuseava suas lentes.
Em contatologia, uma anamnese direcionada à saúde geral e ocular serve de alicerce para
o sucesso no uso de LC, porque certas doenças sistêmicas e certos medicamentos podem di­
minuir a tolerância às lentes. É importante questionar o paciente sobre doenças sistêmicas,
tais como alergias (conjuntivite, rinite, bronquite e dermatite de contato), diabetes mal con­
trolado com oscilação da refração, artrites, disfunções tireoidianas e hipertensão, bem como
saber sobre menopausa, gravidez, lactação, uso de anticoncepcionais, medicamentos tópicos
e sistêmicos (descongestionantes nasais, psicotrópicos, anorexígenos, ansiolíticos, diuréticos,
anti-histamínicos, betabloqueadores, imunossupressores e outros) que possam dificultar a
adaptação às LCs pela diminuição da produção de lágrimas.
Problemas oculares, como infecções e inflamações, catarata, glaucoma não controlado
(incluindo história familiar), olhos secos, meibomite, blefarite e cirurgias prévias devem ser in­
vestigados. Alterações do filme lacrimal podem ser induzidas pela própria LC quando adapta­
da em pacientes com olho seco assintomático ou com disfunção das glândulas de Meibomius
que altera a camada lipídica do filme lacrimal.
Na anamnese direcionada devem ser abordadas as principais queixas do paciente e o grau
de motivação, pois um paciente com boas expectativas e motivado a iniciar o uso de LCs, pro­
vavelmente obtêm melhores resultados. Quando a indicação de LCs é para proporcionar visão
binocular ou melhorar a acuidade visual em relação à obtida com óculos, o oftalmologista de­
verá motivá-lo sobre os ganhos com o uso das lentes de contato.
A partir dessas informações podemos traçar o perfil do paciente e indicar a melhor lente,
personalizando o atendimento e a adaptação.

Relação médico-paciente
A relação entre médico e paciente, pela sua importância em toda a área médica, não pode ser
ignorada pelo profissional; ele deve estar sempre atento para entender as reações emocionais
do paciente diante do problema ocular que apresenta, lembrando-o que para melhorar a visão
há necessidade de lentes de contato como primeira opção.
O relacionamento entre médico e paciente pode ter um enfoque por meio das percepções
que o próprio profissional tem dessa interação, das dificuldades emocionais detectadas no
paciente e das atitudes que o médico tende a apresentar perante tais dificuldades.
O diagnóstico deve ser comunicado ao paciente e a seus familiares de modo a não cau­
sar grande preocupação e ansiedade, porque é no momento em que o paciente toma conhe­
cimento de sua doença que ele necessita de maior apoio emocional. Não é raro o paciente
sentir revolta com a sua enfermidade e não querer seguir o tratamento, mas o que se tem
visto na maioria dos casos oftalmológicos é que diante de doenças crônicas, como nos porta­
dores de ceratocone, há necessidade de seguimento do tratamento. Quando existe um bom
relacionamento entre médico e paciente, é provável que este tenha maiores benefícios com o
tratamento.
Semiologia do Candidato ao Uso de Lentes de Contato 315

Exame oftalmológico prévio à adaptação de LCs


O exame oftalmológico prévio deve ser completo.

ACUIDADE VISUAL: deve ser medida com e sem correção óptica; olhos direito, esquerdo e am­
bos, para visão distante e de perto.
AVALIAÇÃO DA VISÃO BINOCULAR: fazer teste de cobertura cover test, verificar a motilidade ocu­
lar, acomodação-convergência e dominância ocular.
FORIAS: os métodos de compensação de forias com LCs e prisma geralmente não são satisfató­
rios, entretanto, em pacientes míopes com média e moderada quantidade de exoforia, é pos­
sível hipercorrigir a miopia levemente, e a hipermetropia assim induzida estimularia o reflexo
de convergência acomodativa, determinando um estado mais ortofórico.
TROPIAS: em certos tipos de tropia horizontal, as LCs podem ser benéficas. Por exemplo,
hipermetropia com esotropia acomodativa frequentemente tem uma melhora na proporção
convergência acomodativa/acomodação (CA/A) com LCs. Entretanto, na esotropia não acomo­
dativa deve-se mostrar ao paciente que com o uso de óculos o estrabismo é menos notado.
Nas tropias verticais o benefício obtido com LC é nulo.
ACOMODAÇÃO E CONVERGÊNCIA: os pacientes hipermetropes com óculos necessitam acomo­
dar e convergir mais que os míopes; o contrário ocorre quando estão com lentes de contato.
Isso talvez possa explicar a necessidade de correção adicional para a visão de perto mais cedo
para os présbitas míopes quando comparados com os présbitas hipermetropes.

Pálpebras
Na inspeção, é preciso observar não somente as pálpebras, mas também registrar as dimen­
sões, a forma da fenda palpebral e os movimentos do piscar; olhar com atenção as bordas
palpebrais e os ângulos nasal e temporal, procurando a presença de blefarite crônica, meibo-
mite, triquíase, entrópio e ectrópio ou outro problema que necessite de tratamento antes da
adaptação de LCs.
As dimensões da fenda palpebral e sua relação com o limbo superior têm importância em
contatologia pela repercussão que tem sobre o diâmetro, a curva-base e a centralização das
LCs. A fenda palpebral normalmente mede de 7 a 15 mm no sentido vertical e de 22 a 30 mm
no sentido horizontal. Essas dimensões variam entre os indivíduos e estão ligadas à raça. A
medida da fenda palpebral pode ser feita com o paciente olhando para a orelha do examina­
dor, usando-se uma régua milimetrada.
r

E preciso observar a tensão palpebral; quando a tonicidade palpebral é excessiva, a


pálpebra exerce maior pressão sobre as LCs, podendo produzir mais facilmente lesões corne­
ais e dificultar a troca lacrimal sob a lente.
Pálpebras flácidas são frequentes em pessoas idosas e seguram mal as LCs, dificultando a
centralização. Pálpebras flácidas ou tensas afetam o movimento das LCs, devendo-se, no teste,
decidir qual a melhor opção, lentes rígidas gás-permeável ou hidrofílicas.
Observando-se certo grau de ptose palpebral, deve-se anotar e verificar sua origem (con­
gênita, mecânica, miogênica ou neurogênica). Lente RGP de grande diâmetro e margem espes­
sa, a longo prazo pode causar certo grau de ptose.
316 | Semiologia Básica em Oftalmologia

Também é preciso registrar o diâmetro horizontal da íris visível (diâmetro corneai), que
varia de 11 a 12,50 mm, medindo em média 11,7 mm; o vertical geralmente é 1 mm menor,
importante para adaptação de lente gelatinosa.
O tamanho da pupila interfere na escolha do diâmetro da LC rígida. Deve ser medido com
pupilômetro ou régua milimetrada, em ambiente com iluminação normal e fraca, isto é, em
midríase fisiológica com o paciente fixando a distância. Em geral, o tamanho da pupila pode
ser classificado em pequeno (menor de 3 mm), médio (3 a 6 mm), ou grande (maior que 6 mm).

PADRÃO E RITMO DE PISCAR: os movimentos palpebrais no piscar devem ser observados quanto
à frequência e amplitude. Um piscar parcial não umedece completamente a lente, podendo
causar depósitos e ressecamento. Lesões pontuadas em 3 e 9 h que se coram com fluoresceína
podem ocorrer devido a um piscar incompleto e/ou pouco frequente. O piscar deve ser com­
pleto com uma frequência média de 12 vezes por minuto.

Vias lacrimais
Exame das vias lacrimais é feito para verificar se há boa passagem de lágrima e ausência de
inflamação. Refluxo pela compressão do saco lacrimal pode indicar presença de dacriocistite
crônica, que precisa ser tratada antes da adaptação de LCs.

Refração
Deve-se fazer refração objetiva e subjetiva. A refração é um auxiliar importante na seleção do
r

candidato ao uso de LC. E preciso usar cicloplégico somente quando o paciente tem dificulda­
des para dar informações ou se essas não coincidirem com as encontradas no exame. O grau
dióptrico da LC é determinado pela medida do erro refrativo do paciente. Em contatologia, a
refração deve ser prescrita em cilindro negativo.

Ceratometria - curvatura corneai


Ceratometria é a medida da curvatura da área central anterior da córnea (aproximadamente 3
mm centrais) em dois meridianos primários, um vertical e outro horizontal, perpendiculares
entre si. O meridiano mais plano está sempre localizado 90° distante do meridiano mais curvo.
Essa curvatura é medida com ceratômetro manual ou automático; é extremamente importante
na adaptação de LCs e auxilia a refração na avaliação do astigmatismo. O ceratômetro é utili­
zado também para medir a curva-base da LC rígida através de um dispositivo, o lensco-meter,
que é acoplado ao ceratômetro Bausch & Lomb (Fig. 1) para fixar as LCs. As LCs devem estar
limpas, sua face convexa é aderida ao dispositivo com soro ou glicerina e sua concavidade vol­
tada para a fonte luminosa. A regularidade e nitidez das miras indicam boa qualidade óptica da
superfície das LC. Através do lensco-meter (Fig. 2) acoplado pode ser feita também aferição do
ceratômetro usando-se esferas de aço de curvaturas conhecidas. A ceratometria básica é um
método preciso e suficiente para adaptação de rotina de LC, deve ser realizada com precisão
e ter seus resultados anotados em dioptrias ou milímetros de raio com angulação dos meri-
Semiologia do Candidato ao Uso de Lentes de Contato 317

Fig.1 Ceratômetro modelo Bausch & Lomb.

y
lIM f C O - M I T I r
I f M K O PftfCIfJO N IN STtVM lN l CO

Fig. 2 Lensco-m eter acoplado no ceratômetro permite


aferir a curva-base da lente e o próprio ceratômetro.

dianos. Entretanto, as informações obtidas no exame são limitadas, como, por exemplo, em
pacientes com ceratocone a imagem produzida é pequena e distorcida.
Em casos especiais com córneas deformadas, ceratocone, pós-cirurgia refrativa e pós-trans-
plante de córnea é necessário realizar a topografia ou ceratoscopia computadorizada antes
de iniciar a adaptação de LCs. Através deste exame é possível avaliar a curvatura central e a
periférica da córnea. As cores quentes (vermelho, laranja e amarelo) são as regiões mais curvas
e as cores mais frias (variáveis do azul) são as regiões mais planas. A topografia corneai é útil
para a escolha da primeira LC de teste nos casos mencionados, podendo ainda demonstrar
alterações precoces induzidas pelas LCs com mapas diferenciais e acompanhar a evolução de
doenças ectásicas. O mapa mais usado para adaptação de LC é o axial (color map). Existem pro­
gramas especiais com mapas específicos de adaptação de LC, entretanto são pouco usados,
não levam em conta os movimentos dos olhos e das pálpebras.

Biomicroscopia
A biomicroscopia é um exame indispensável para monitorar a integridade corneai, avaliar o
filme lacrimal, a adaptação das lentes de contato e os problemas relacionados com seu uso.
É realizada na lâmpada de fenda, onde se obtêm cortes ópticos de diferentes larguras, incli­
nações e intensidade, possibilitando observação das estruturas oculares e filme lacrimal com
ampliação e estereoscopia. No mesmo aparelho, por meio de iluminação direta difusa, pode-se re­
alizar inspeção geral da superfície anterior do olho (conjuntiva, córnea, íris e pupila) e das pál­
318 Semiologia Básica em Oftalmologia

pebras (com e sem eversão palpebral). A presença de pinguécula, pterígio e neovasos deve ser
registrada. Para se obter mais detalhes, deve-se usar iluminação direta focal. Nebulosidades,
discretos infiltrados e edema de córnea podem ser detectados com iluminação em dispersão
escleral, que se obtêm quando a iluminação incide sobre o limbo esclerocorneano em ângulo
de 60° ou maior em relação à linha do observador. Para estruturas mais profundas, deve-se
usar a retroiluminação. O filtro azul-cobalto utilizado após instilação de fluoresceína sódica
é fundamental para a observação da relação lente/córnea, mudança lacrimal sob as lentes ou
lesões corneais.
Um filme lacrimal normal é necessário para os usuários de LCs.

Teste para avaliação do filme lacrimal


TEMPO DE ROTURA DO FILME LACRIMAL (B R E A K U P TIM E - B U T ): é o tempo requerido para o fil-
me lacrimal mostrar disrupção ou pontos secos. Levando menos de 10 s, é considerado um
indicador de intolerância à LC. Enquanto se eleva e segura a pálpebra superior, após um piscar
completo, deve-se observar, à lâmpada de fenda com iluminação difusa e luz azul de cobalto,
o aparecimento de pontos secos na córnea corada com fluoresceína, contando-se os segundos
que leva para serem notados (o normal é de 10 a 30 s). O rompimento do filme lacrimal antes
de 10 s indica deficiência de mucina e olho seco. Nesse caso o usuário de lentes deve ser orien­
tado sobre a necessidade do uso de lubrificantes e exames oftalmológicos mais frequentes.
Deve ser observada também a altura do menisco lacrimal entre a conjuntiva bulbar e a borda
palpebral, bem como a presença de clebris na lágrima que podem aderir à lente, formando de­
pósitos e deixando-a menos confortável, podendo originar irritação ocular.
O teste com rosa-bengala é utilizado para corar células epiteliais desvitalizadas sobre a
córnea e a conjuntiva. Esta coloração é observada com luz branca.

TESTE DE SCHIRMER: o teste não é um procedimento de rotina, mas é útil quando há suspeita
de olho seco.
SENSIBILIDADE CORNEAL: pode estar diminuída em usuários de LC, deixando esses pacientes
r

mais propensos à erosão epitelial e infecção. E medida quantitativamente por meio do estesiôme-
tro de Cochet-Bonnet ou tocando a córnea com um pedaço de algodão torcido ou fio de cabelo
e observando o reflexo do piscar.

Avaliação do endotélio da córnea


Pode ser feita à lâmpada de fenda pela biomicroscopia com reflexão especular, mas as altera­
ções do endotélio (córnea guttata, pregas na membrana de Descemet, etc.) hoje são mais bem
diagnosticadas pela microscopia especular.

Microscopia especular de córnea


A microscopia especular é realizada para se obter uma avaliação direta do endotélio e possibi­
litar a observação de diferentes regiões do próprio endotélio, permitindo controlar doenças,
Semiologia do Candidato ao Uso de Lentes de Contato | 319

traumas endoteliais, contagem das células endoteliais em pacientes usuários de LCs, exame
pré-operatório da cirurgia de catarata e exames das córneas doadas para transplante.
O endotélio corneai é formado de uma única camada de células hexagonais com aspecto
de mosaico, e em adultos é composta de 2.500 cels/mm2 a 3.500 cels/mm2, dependendo da
idade, possui 5 jt/, de espessura e 20 /j de diâmetro. As células endoteliais não se regeneram
depois de danificadas. Suas principais funções são a manutenção do estado de deturgecência
necessário para se obter a transparência da córnea e também o transporte de nutrientes do
humor aquoso. Quando há diminuição acentuada da celularidade, ocorre edema corneai. As
lentes de contato fazem edema transitório no início da adaptação e quando em uso contínuo.
Geralmente, com a interrupção do seu uso, o edema desaparece.

Oftalmoscopia
O exame de fundo de olho deve ser feito com atenção para diagnosticar a possibilidade de
doença preexistente na retina. Lesão na região macular pode comprometer a acuidade visual
e o uso de LCs não vai causar melhora visual.

Tonometria
Como em todo o exame oftalmológico de rotina, a pressão intraocular necessita ser medida.

Exame de controle da adaptação em usuários de lentes de contato


O exame de controle da adaptação de LC deve ser mais frequente em usuários que dormem
com as lentes, devido à maior incidência de complicações, devendo os pacientes retornar para
exame oftalmológico de rotina de 6 em 6 meses. Porém, se algum sinal ou sintoma de irritação
ocular ocorrer, como dor e olho vermelho, é preciso retirar a lente de contato imediatamente
e fazer nova consulta.
Em cada visita médica o paciente deve ser examinado com e sem LC, a acuidade visual
deve ser medida com óculos e com LC, e deve-se checar o grau fazendo refração sobre a LC.
Pela biomicroscopia à lâmpada de fenda, é preciso avaliar o desempenho da lente e a adap­
tação; retirar as LCs e fazer novamente biomicroscopia do segmento anterior do olho e da
própria LC, procurando nela irregularidades na superfície e nas bordas, roturas, fissuras, de­
pósitos, etc.

AVALIAÇÃO DA ADAPTAÇÃO: uma adaptação ideal deverá proporcionar boa centralização, leve
movimento ao piscar, conforto e adequada mudança do filme lacrimal sob a lente. Para as len­
tes rígidas gás-permeáveis (RGP), a relação lente/córnea e a mudança lacrimal sob a LC devem
ser observadas à lâmpada de fenda com luz azul-cobalto após instilação de fluoresceína. Essa
relação pode ser em alinhamento apical, com toque apical ou com livramento apical (Figs. 3
A-C). Para se observar melhor a relação lente-córnea corada com fluoresceína, pode-se usar
sobre a ocular do biomicroscópio o filtro amarelo n- 12 (Kodak Wratten filter) em conjunto com
a luz azul-cobalto da lâmpada de fenda.
320 Semiologia Básica em Oftalmologia

Figs. 3 (A-C) A. Adaptação em alinhamento apical. B.


Adaptação com toque apical. C. Adaptação com livramento
apical.

Uma LC frouxa apresenta mobilidade excessiva, ela é percebida pelo usuário causando
desconforto com flutuação da visão. Uma LC apertada, portanto, muito curva, apresenta pou­
ca mobilidade, prejudicando a troca lacrimal e podendo causar hipoxia e edema de córnea. A
lente RGP deve ficar bem centrada ou posicionada levemente superior sem excesso de movi­
mento induzido pela pálpebra. A posição inferior deve ser evitada, mas às vezes, uma ligeira
descentração é tolerável, desde que não interfira na integridade corneai e na visão.
Para as lentes hidrofílicas (LCH), além de se verificar a centralização, movimentação e
estabilização, o aspecto do reflexo retinoscópico e das miras ceratométricas também é de
utilidade na avaliação.

MIRAS CERATOMÉTRICAS: são avaliadas fazendo ceratometria sobre as LCs. Elas devem apre-
sentar-se nítidas antes e depois de piscar. Quando as lentes estão excessivamente planas, as
miras se apresentam nítidas antes de piscar e distorcidas após. Quando estão muito curvas,
elas apresentam-se distorcidas antes de piscar e nítidas após (Figs. 4A-C).
REFLEXO RETINOSCÓPICO: o reflexo retinoscópico feito sobre a LC deve ser nítido e claro, não
deve alterar-se ao piscar. Em uma adaptação frouxa, o reflexo retinoscópico inicialmente é

A*
Claro
B

Figs. 4 (A-C) Avaliação da adaptação de LCH no ceratômetro. A.


LC bem adaptada. B. LC frouxa. C. LC apertada.
Semiologia do Candidato ao Uso de Lentes de Contato 321

nítido, mas torna-se borrado imediatamente após o piscar. Quando a lente está apertada, o
reflexo apresenta-se borrado, mas torna-se nítido após o piscar (Figs. 5A-C).

A acuidade visual com lentes de contato bem adaptadas deve ser estável e não apresentar
flutuações.

Antes de piscar Após piscar Antes de piscar

Figs. 5 (A-C) Avaliação da adaptação de LCH pelo reflexo


retinoscópico. A. LC bem adaptada. B. LC frouxa. C. LC apertada.

ALTERAÇÕES FISIOLÓGICAS OCULARES RELACIONADAS COM O USO


DE LENTES DE CONTATO E COMO PREVENI-LAS
A lente de contato pode agir como barreira, diminuindo a oxigenação e aumentando a tem­
peratura ocular, retendo restos celulares sob a lente, pois com o rompimento dessas células
epiteliais há liberação de enzimas tóxicas, clebris e produtos solúveis em água, aumentando a
permeabilidade da superfície corneai.
A diminuição do oxigênio faz acúmulo de lactato nos tecidos porque utiliza a glicólise ana-
eróbica, a qual libera 2 mol de ATP por mol de glicose consumido, 18 vezes mais consumo de
glicose que no ciclo de Krebs (aeróbico). Conforme a duração e o aumento da hipoxia, podem
surgir neovasos no estroma.
No epitélio corneano, as lentes de contato agem nas terminações nervosas, diminuindo a
sensibilidade corneai por reduzir a acetilcolina nos neurotransmissores; as causas são a esti­
mulação mecânica crônica e toxicidade. Entretanto, essa condição é reversível. Além das alte­
rações de sensibilidade, há alteração bioquímica que diminui a adenosina trifosfato, depleção
Semiologia Básica em Oftalmologia

do glicogênio, aumento de metabólitos e supressão da mitose das células basais, provocando


esfoliação celular, edema epitelial, diminuição mitótica epitelial e microcistos intraepiteliais.
A má adaptação das lentes de contato rígidas e hidrofílicas pode causar edema de córnea,
que é o resultado de excesso de água no epitélio e/ou no estroma, podendo causar desconfor­
to, redução da visão e predisposição à infecção. Em 20 a 30% dos pacientes usuários de lentes
de contato de uso prolongado é observado o edema; seu tratamento frequentemente é feito
com a retirada da lente, o que suprime a inflamação.
As alterações precoces que podem ocorrer no endotélio corneai pelo uso de lentes de
contato e o aparecimento de células edematosas durante a adaptação são causados pela dimi­
nuição do pH do estroma corneai e hipoxia. É uma situação transitória que não deixa sequelas,
e pode ocorrer também por hipoxia atmosférica, pálpebras fechadas e exposição a C02.
As alterações tardias que ocorrem no endotélio corneai pelo uso de lentes de contato
são polimegatismo (variação no tamanho da célula) e pleomorfismo (variação na forma da
célula); podem ser provenientes de alterações do pH, do uso de lentes de contato de baixa
permeabilidade ao oxigênio atmosférico (DI<) e são mais intensas se a densidade celular tam­
bém estiver baixa. O controle deve ser realizado por meio de exames periódicos e cuidados
especiais, observando-se o número de células. Quando este número está abaixo de 1.800 cels/
mm2, deve-se indicar lente de contato com alta permeabilidade ao 0 2, diminuição do tempo
de uso das lentes.
O uso de lentes de contato também aumenta a probabilidade dos sintomas de olho seco,
podendo ocorrer adesão inadequada da LC ao filme lacrimal, desidratação, hiperosmolari-
dade, diminuição de íons e lactoferrina lacrimal, falta de oxigênio e alteração do pH. Para o
tratamento, se a causa for realmente o uso de lentes de contato gelatinosas, deve-se trocá-las
por LC-RGP ou LCs hidrofílicas de baixo conteúdo aquoso e desaconselhar as lentes de conta­
to gelatinosas ultrafmas. O paciente não deve dormir com as lentes de contato, deve utilizar
lágrimas artificiais e evitar ambientes com ar-condicionado e fumaça.
Do exposto, pode-se deduzir que o uso de LC é um procedimento relativamente seguro,
desde que seu uso seja bem monitorado para não interferir na integridade e transparência da
córnea.

BIBLIOGRAFIA
Moreira SMB, Moreira H, Moreira L. Exame Prévio do Paciente para Uso de Lentes de Contato In: Lente de Contato 3a ed.
Rio de Janeiro: Cultura Médica, 2004; 57-65.
Rodrigues CRC. Relação Médico - Paciente In: Oftalmologia Clínica 2â ed. Rio de Janeiro: Cultura Médica, 2001; 1-8.
Stein HA, Lreeman Ml, Stein RM. CLAO Residents'Contact Lens Curriculum Manual. New York: Kellner/MC Caffery As­
sociates, 1996; 23-36.

Literatura Sugerida
1. Moreira SMB, Moreira H, Moreira L. Exame Prévio do Paciente para Uso de Lentes de Contato In: Lente de Contato 3a ed.
Rio de Janeiro: Cultura Médica, 2004.
Quando os Exames
Complementares são
Indispensáveis
JAYME ARANA

O aparelho ocular, um dos menores órgãos do corpo humano, é sem dúvida um dos mais
complexos e mais ricos em patologias. Ele envolve, praticamente, todos os tecidos e conse­
quentemente está interrelacionado com muitas doenças sistêmicas e de etiologias variadas:
genéticas, infecciosas, inflamatórias, oncológicas, reumatológicas, endócrinas, hematológicas,
cardiovasculares, neurológicas, iatrogênicas, traumas e outras.
0 grande desafio e objetivos do médico são o diagnóstico correto e a melhor conduta para
r

o seu paciente. E preciso ter a consciência de que o erro no diagnóstico acarretará um grande
prejuízo ou dano ao paciente, aos seus familiares e muitas vezes à sociedade: sofrimentos,
despesas financeiras, angústias, piora do quadro e de suas complicações e, eventualmente, até
sua morte, enfim, um efeito multiplicador. Não corresponder às expectativas do paciente, por
falha, dever ser, também, uma frustração para o profissional consciente.
Devido às varias formas de apresentações e a complexidade de alguns quadros, mesmo
com um minucioso exame clínico, utilizando toda a semiologia disponível no seu consultório,
o oftalmologista, muitas vezes, se depara com casos inconclusivos. Nessa situação, após esgo­
tar a propedêutica disponível, é indispensável o uso dos exames complementares.
Em face à espantosa velocidade de crescimento do conhecimento médico e da alta tec­
nologia dos equipamentos especializados, torna-se inviável a um oftalmologista ter e manter
no seu consultório uma multiplicidade de aparelhos necessários para a realização de alguns
exames complementares.
Na prática médica, em especial na oftalmologia, os exames complementares têm a finali­
dade de auxiliar no diagnóstico, muitas vezes na orientação e controle da terapêutica, na sua
evolução e prognóstico. Além disso, é de extrema importância para a documentação e segui­
mento de muitos casos e especialmente daqueles que possam advir algumas implicações le­
gais. Contudo, convém lembrar que é fundamental sempre relacionar os achados dos exames
complementares com a clínica. Em alguns casos devemos nos associar a outras especialidades
para concluir o diagnóstico e acompanhar o tratamento (Fig. 1).
324 Semiologia Básica em Oftalmologia

Devemos estar cientes de que, hoje, o paciente está muito mais informado, cada vez mais
seletivo e exigente com o médico e principalmente consciente das medidas que possam ser
tomadas ante um diagnóstico ou uma conduta errônea.

Fig. 1 Criança do sexo feminino com 5 anos de idade com olho direito vermelho e
doloroso há 20 dias sem diagnóstico. O exame de US mostrou edema subtenoniano,
imagem em "T" e espessamento retinocoróideo: diagnóstico de esclerite posterior. A
seguir os exames complementares associados à clínica concluiu se tratar de artrite
idiopática juvenil.

ULTRASSONOGRAFIA OCULAR E ORBITÁRIA (US)


r

E um procedimento não invasivo que através dos ultrassons (10 MHz) permite a avaliação de
múltiplas alterações nas estruturas do olho e da órbita.
É um exame indispensável quando a turvação de meios impede a visualização do fundo
de olho, como em opacidades corneanas, vítreas, hifema, hipópio, catarata, pupila miótica,
edema e hematoma palpebrais e blefaroespasmo.819,27 É também de grande valia em tumores
intraoculares mesmo quando os meios estão transparentes.
A US é particularmente importante em crianças com buftalmia unilateral, com impossibi­
lidade de se visualizar o fundo de olho, para afastar retinoblastoma.
Este exame é de grande valia no auxílio do diagnóstico diferencial de microftalmia com
nanoftalmia e de exoftalmia unilateral com alta miopia axial, pois permite verificar o diâmetro
anteroposterior do globo e medidas da parede posterior (esclera, coroide e retina).
Na retina podemos encontrar achados ecográficos relacionados com descolamento de re­
tina e avaliar sua mobilidade, retinosquise, doença de Coats, retinoblastoma, malformações
retinianas, retinopatia da prematuridade, hamartomas combinados do epitélio pigmentado e
retina, trações vitreorretinianas (Fig. 4), degeneração macular disciforme e hemorragia orga­
nizada sub-retiniana.
Na coroide os achados ecográficos auxiliam o diagnóstico de coloboma, descolamento
seroso ou hemorrágico de coroide e são muito valiosos para o diagnóstico diferencial de tu­
mores como nevo, melanoma, carcinoma metastático (Fig. 5), hemangioma de coroide e os­
teomas.27 Pacientes com tumor intraocular, mesmo com meios transparentes normais, devem
ser submetidos a exame ultrassonográfico para avaliação das dimensões, análise de sua estru­
tura acústica interna e crescimento do tumor. É importante, também, avaliar a sua espessura,
especialmente quando há hipotonia ocular.
No vítreo podemos encontrar várias alterações ecográficas que podem estar relacionadas
com degeneração, exsudação, hemorragias (Fig. 2), membranas, descolamento posterior de
Quando os Exames Complementares são Indispensáveis

vítreo completo ou incompleto, vitreosquise ou hialodosquise, calcificações, hiatose asteroi-


de/sínquise cintilante, espaço sub-hialóideo, uveítes, corpos estranhos intraoculares (Fig. 3),
cristalino no vítreo, e persistência do vítreo primário hiperplástico.
Pela posição da sonda do ecógrafo podemos obter cortes longitudinal, axial, trasnversal.
Em um corte longitudinal o mais anterior possível, consegue-se avaliar a base vítrea, trações
vitreociliar, vitreorretinianas periféricas, espessamento e descolamento de corpo ciliar, desco­
lamento ciliocoróideo, bem como a face posterior do cristalino. Em alguns casos é possível en­
contrar o descolamento da hialoide anterior, especialmente se esta estiver um pouco espessa.
Este exame é importante também no pré-operatório das cirurgias de vitrectomia, para
avaliar trações vitreorretinianas, proliferação vitreorretiniana, fibroses epirretinianas e mobili­
dade retiniana nos descolamentos de retina.

Fig. 2 Paciente do sexo feminino, 75 anos de idade, com


hemorragia vítrea impedindo visualização do fundo de olho. O US
identifica sua origem na área macular: DMRI exsudativa com HV.

Fig. 3 Paciente de 23 anos de idade com trauma penetrante há 7 dias. O ultrassom


localiza o CEIO associado a endoftalmite: ecos puntiformes de baixa refletividade
em todo o vítreo e espessamento retinocoróideo.

Fig. 4 Paciente do sexo masculino com 68 anos de idade,


facectomizado OD há 14 dias, há 4 dias com dor ocular, reação
inflamatória de câmara anterior, edema conjuntival e visão de
conta-dedos a 1 m. Pelo ultrassom evidencia a endoftalmite e com
pequeno DR tracional indicando portanto a vitrectomia.
Semiologia Básica em Oftalmologia

Fig.5 W.B. do sexo masculino com 53 anos de idade a com lesão elevada sub-
retinana peridiscal, com dispersão pigmentar. No US mostra um melanoma maligno
de coroide com invasão retrobulbar, confirmado pelo exame anatomopatológico.

Os pacientes com catarata, que apresentam dificuldades de avaliação todo o fundo de


olho, devem ser submetidos à ultrassonografia, pois muitas vezes atrás de um cristalino
opacificado podem-se encontrar patologias mais graves do que a própria catarata: desco­
lamentos de retina, tumores intraoculares, processo inflamatório vítreo e lesões coriorreti-
nianas.
No pós-operatório de uma cirurgia intraocular, geralmente de catarata, indica-se a US
se o paciente apresentar suspeita de endoftalmite aguda, especialmente se apresentar nos
primeiros 10 dias: dor ocular, hiperemia, secreção ocular, borramento da visão e sinais de: di­
minuição da AV, edemas de pálpebra, de conjuntiva e de córnea, hiperemia, células na câmara
r

anterior e fibrina, hipópio, inflamação vítrea, retinite e perda do reflexo vermelho. E funda­
mental, pelos sinais ou sintomas iniciais, prontamente solicitar ultrassonografia para con­
cluir o diagnóstico. Assim, iniciar o tratamento para ter um melhor prognóstico. Este exame,
também, auxilia no acompanhamento da endoftalmite. O exame de US mostra ecos vítreos
puntiformes de baixa refletividade, membranas vítreas, pontos de aderências e trações vítreor-
retinianas. Permite medir e comparar espessura retinocoróidea entre os olhos e identificar se
já está iniciando ou se já existe um descolamento de retina por tração vitreorretiniana o que
já indicaria uma vitrectomia. Neste momento o sonografista deve comparar os dois olhos e ao
mesmo tempo aumentar e diminuir o ganho do aparelho para melhor avaliação vítrea. Infeliz-
mente, uma parcela dos pacientes é encaminhada à ultrassonografia em um estágio avançado
da endoftalmite, com acuidade visual muito comprometida e prognóstico visual reservado. Em
um olho amaurótico (sem percepção luminosa), doloroso e com o risco dessa infecção ocular
se disseminar muitas vezes optamos pela evisceração.
Quando os Exames Complementares são Indispensáveis

Nas leucocorias, em especial na infância, um erro traz uma série de condutas equivocadas
e de consequências muito desagradáveis. Este exame associado à clínica é fundamental para
a elucidação no diagnóstico diferencial de: retinoblastoma, doença de Coats, persistência de
vítreo primário hiperplásico, distrofia vitreorretiniana exsudativa familial, retinopatia da pre­
maturidade e leucocorias inflamatórias: toxoplasmose congênita, toxocaríase, cisticercose e
endoftalmite.28
r

E muito útil em casos de trauma ocular contuso, penetrante ou perfurante (após sutura) a
avaliação da integridade das estruturas oculares, tais como hemorragia vítrea, luxação de cris­
talino ou de lente intraocular, descolamento de retina, descolamento de coroide. Na localiza­
ção de corpo estranho intraocular, na suspeita de endoftalmite endógena ou exógena (Fig 4).
Na esclera este exame tem um papel importante na conclusão diagnóstica da esclerite
posterior e avaliação das deformidades de parede (estafilomas e identações).
A ecografia, especialmente quando há turvação de meio, tem um papel fundamental no
diagnóstico diferencial de alterações da cabeça do nervo óptico, como edema, drusa gigante,
aumento da escavação do disco óptico, tumores epipapilares e coloboma (“morning glory”).
Nas patologias orbitárias podem-se avaliar nervo óptico, tumores retrobulbares, tecido
adiposo da órbita, vasos orbitais, músculos extraoculares, o espaço tenoniano e glândula lacri­
mal. Este método está indicado e auxilia a conclusão diagnóstica em quadros como proptose
uni ou bilateral, suspeita de miosite, infiltrações, doença de Graves, esclerite posterior (edema
subtenoniano que gera a imagem em “T”) (Fig. 1), pseudotumor de órbita, varizes orbitárias,
fístula arteriovenosa, tumor orbitário, nervo óptico, celulite orbitária e avaliação de ectasias
de parede posterior: estafiloma e colobomas.27

BIOMICROSCOPIA ULTRASSÓNICA (BUS)


É uma técnica não invasiva que utiliza ultrassom de alta frequência (50 MHz) para obtenção de
imagens do olho humano que se aproximam da resolução obtida com microscopia óptica (30
micra). A BUS mostra in vivo as relações das estruturas oculares do segmento anterior. Com essa
técnica podemos avaliar a conjuntiva, córnea, esclera, câmara anterior, ângulo iridocorneano,
íris, câmara posterior, zônula do cristalino, cápsula anterior e parte do equador do cristalino,
corpo ciliar, coroide anterior, retina periférica e parte do vítreo anterior periférico1824 (Fig 6).
Este exame permite medir a espessura corneana, a profundidade de opacidades corneanas
e com isso orientar o tratamento mais apropriado, especialmente em casos de distrofias ou
leucomas corneanos.
Na pars planite podem-se avaliar o comprometimento vítreo junto ao corpo ciliar, celulari-
dade, membranas aderidas ao corpo ciliar, trações vitreociliares, vitreorretinianas periféricas.
Até mesmo casos de descolamentos da hialoide anterior ou da posterior próxima à base vítrea
podem ser observados neste exame.
Os tumores de íris ou de corpo ciliar [melanomas, melanocitomas (Fig. 26) ou nevo], cisto
epitelial (Fig. 11) podem ser avaliados com excelente resolução, e com isso obter medidas de
suas dimensões e acompanhar a sua evolução (Fig. 10). Melanoma de coroide anterior envol­
vendo ou não o corpo ciliar é condição em que a BUS tem auxiliado muito a conduta a ser
tomada pelo médico (Figs. 7 e 8).
328 Semiologia Básica em Oftalmologia

Fig.6 UBM. Mostra in vivo as relações anatômicas das estruturas:


Córnea
Câmara anterior
Esporão escleral - ponto de referência
íris
Sulco
Ângulo
Corpo ciliar
Processos ciliares
Zônula
Cristalino (cápsula anterior)
Pars plana
Retina periférica
Vítreo anterior

No paciente suspeito ou já com glaucoma, a BUS permite a realização da gonioscopia


ultrassónica no claro e no escuro para determinar o risco do paciente com ângulo estreito
evoluir com um glaucoma de ângulo fechado. Além disso, este exame mostra a configuração
da íris, os processos ciliares, a relação da superfície de contato iridocristalino, sinequias peri­
féricas, medidas do segmento anterior, profundidade da câmara anterior e da posterior, corpo
r

ciliar e a raiz da íris. E fundamental o estudo dos processos ciliares na suspeita de íris em plate-
au para elucidação diagnóstica com o glaucoma de bloqueio pupilar relativo em fácicos24 (Fig. 9).
Este exame é importante para identificar descolamentos de corpo ciliar em paciente sub­
metido à cirurgia filtrante, trauma, justificando assim a hipotonia e a persistente câmara rasa.
Pode-se, ainda, avaliar a bolha filtrante, a posição dos tubos de implante valvulares, iridotomia
e iridectomia.
Nos traumas de segmento anterior, quando os meios estão opacos, pode-se identificar iri-
dodiálise, recessão angular, descolamento de corpo ciliar (Fig. 13), vítreo herniado na câmara
anterior, hemorragia, celularidade na câmara anterior, pequenas variações de posição do cris­
talino. Corpos estranhos podem ser identificados, na esclera, na córnea, na câmara anterior,
na íris, no corpo ciliar, no vítreo anterior junto à base vítrea (Fig. 12). Atividade inflamatória,
hemorragia vítrea periférica anterior, trações vitreociliares, descolamento ou espessamento
de corpo ciliar.
Este exame é indispensável nas complicações do pós-operatório de cirurgias de catarata
com implante de lentes intraoculares. Ele traz valiosas informações na identificação da posi-
Quando os Exames Complementares são Indispensáveis

Fig.7 D.S - 65 anos de idade, do sexo feminino, visão 20/20 com


melanoma periférico inf no OD. No US - não foi possível saber se
havia ou não invasão do corpo ciliar. O OCT mostrou que não havia
comprometimento do corpo ciliar. Foi indicado excisão do tumor.

ção da lente e de seus hápticos ou de fibroses retroirídicas junto à cápsula posterior e reação
inflamatória do vítreo periférico anterior.
A biomicroscopia ultrassónica é importante na indicação e no acompanhamento de pós-ope­
ratório na correção de altas ametropias (lentes fácicas, cirurgia refrativa).7

BIOMETRIA OCULAR ULTRASSÓNICA


Objetiva o preciso cálculo biométrico para implantar a lente intraocular (LIO) e atingir a eme-
tropia ou ametropia residual planejada pós operatória na cirurgia de catarata. Para o preciso
cálculo biométrico é necessário respeitar uma tríade fundamental:
a. A determinação correta do poder corneano - através da ceratometria manual ou exames auto­
matizados, como topografia corneana, Orbscan ou pentacam, todos esses descritos a se-
330 Semiologia Básica em Oftalmologia

Fig. 8 Quadro ecográfico e ultrabiomicroscópico após 6 anos de pós-operatório.

Fig. 9 A UBM é muito importante para o diagnóstico de íris em plateau : ela mostra
anteriorização dos processos ciliares e fechamento do sulco ciliar.

guir. Vale lembrar que a córnea é responsável por 74% do poder dióptrico do olho (43,25D)
de um total de 58,60D (córnea e cristalino).37,38
b. A mensiiração precisa do comprimento axial - através de ecobiômetros ou biômetros ultras­
sónicos. Esses aparelhos trabalham na faixa de 8 a 10 MHz. A medida é realizada do ápice
corneano ou vértice até a membrana limitante interna da retina. Existem aparelhos que rea­
lizam a medida através de sondas que podem estar em contato direto à córnea (biômetros
de contato) ou através de conchas esclerais sem toque corneano (biômetros de imersão).
Vale lembrar que a técnica de imersão é a de escolha; a medida realizada é de maior pre­
cisão, pois não existe a possibilidade de identação corneana com a sonda iatrogênica nem
ceratites de contato.37,38
Quando os Exames Complementares são Indispensáveis 331

Fig. 10 Quadro de melanoma de corpo ciliar.

Fig. 11 Cistos de íris.

c. A escolha criteriosa cia fórmula a ser aplicada - várias fórmulas existem para auxiliar o ci­
rurgião de catarata na escolha precisa do poder dióptico da LIO a ser implantada. Essas
fórmulas necessitam de dados obtidos através da ceratometria e dos valores mensurados
na ecobiometria. A indicação da melhor fórmula a ser utilizada depende do comprimento
axial encontrado. Por exemplo: olhos com comprimento axial menores que 22 mm, Hoffer-
Q ou Holladay 2; olhos com comprimento axial entre 22 mm e 24 mm, Holladay 1 ou 2,
Haigis; olhos com comprimento axial maior de 24 mm, SRK-T.37,38
d. Pelo ultrassom podem-se medir distâncias in vivo. Isso permite obter medidas da profundida­
de da câmara anterior, do cristalino, da córnea e do comprimento axial do olho. Esse método
é útil em casos como, anisometropia, microftalmia, nanoftalmia, e no diagnóstico entre pseu-
doexoftalmia e miopia axial. Esse exame é valioso no acompanhamento do glaucoma congê­
nito, pois pelas medidas axiais do globo é possível determinar a progressão do glaucoma.15
3 3 2 | Semiologia Básica em Oftalmologia

Fig. 12 Apenas com o US não foi possível definir se o CE estava


dentro da parede ou não. A UBM mostra que o corpo estranho
está no vítreo bem próximo à parede e com reação inflamatória.

Fig. 13 J P S - 19 anos, do sexo masculino, com trauma contuso no OD há 2 dias.


A UBM mostra que há espessamento e descolamento do corpo ciliar bem como
hemorragia na câmara anterior e no vítreo.
Quando os Exames Complementares são Indispensáveis

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OCT Image Fundus Image

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OCT Image Fundus Image

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Fig. 14 OCT - mostra um quadro de rotura do EPR OE pós-


avastin:
Elevação neurossensorial macular
Atenuação da depressão da fóvea
EPR retraído e dobrado tornando espesso e hiper-refletivo na
região nasal
Descolamento neurossensorial macular (fluido sub-retiniano)
Área com MNVSR e com componente cicatrizado
Coroide nua e hiper-refletiva na região macular temporal e
região superior

BIOMETRIA ÓPTICA
Os aparelhos de biometria óptica trabalham através da interferometria a laser com feixes de
780 a 855 nm em vez do ultrassom utilizado na biometria ultrassónica. Permite uma excelente
e mais completa medida das estruturas oculares. A precisão obtida nas medidas oculares é es­
pantosa, enquanto a biometria ultrassónica mede espessuras corneanas e comprimento axial
com precisão de 4,8 a 13 micras, a biometria óptica mede com precisão de 0,02 micras! Além
da medida do comprimento axial, profundidade da câmara anterior, espessura do cristalino e
câmara vítrea, consegue-se a medida ceratométrica, espessura corneana e retiniana, medida
branco-a-branco, pupilometria e excentricidade do eixo visual. O comprimento axial é medido
do ápice corneano até o epitélio pigmentar da retina, ou seja, medida 200 micras maior que a
ecobiometria, valor corrigido automaticamente pelo aparelho. Infelizmente, por se tratar de
medidas através de feixes de luz, a transparência dos meios oculares é importante, ou seja,
opacidades corneais significativas, catarata muito maduras ou subcapsulares densas não per­
mitem a obtenção de resultados para se realizar o cálculo biométrico.37,38
334 Semiologia Básica em Oftalmologia

DOPPLER OFTÁLMICO
Este exame associa a ecografia modo B em tempo real à técnica Doppler e permite a análise da
velocidade de fluxo sanguíneo.9 Ele pode ser útil em alguns casos em que a ultrassonografia
não é conclusiva, tais como persistência de vítreo primário hiperplásico, no diagnóstico dife-
r

rencial de descolamento posterior de vítreo incompleto com descolamento de retina. Util na


avaliação do padrão de vascularização interna de tumores e seguimento dos tumores submeti­
dos à irradiação. Pode-se detectar diminuição do fluxo intralesional mesmo antes da diminui­
ção da lesão. Ele tem indicação em casos de fístula carotidocavernosa, de varizes orbitárias e
síndrome isquêmica ocular.

TOMOGRAFIA DE COERÊNCIA ÓPTICA - OCT


O OCT é um exame de alta resolução não invasivo e de não contato, que usa luz próxima ao
infravermelho (820 nm) em um sistema de interferometria, que produz imagens seccionais da
retina ou do segmento anterior em tempo real e de alta resolução que se aproxima da resolu­
ção obtida na microscopia óptica, comparando-se a uma biópsia in vivo.35
Atualmente, os aparelhos com tecnologia Fourier/domain permitem uma aquisição de 26.000
a 40.000 scans/s, enquanto os predecessores time/domain conseguiam 400 scans/s.
Através de cortes ópticos seccionais da estrutura da retina in vivo, por meio de uma fonte
contínua superluminescente de diodo, geram-se imagens com resolução axial de 5 a 8 micra no
Rtvue OCT e, com isso, possibilita-se o estudo das estruturas intrarretinianas, interface vitre-
orretiniana e do complexo epitélio pigmentado, membrana de Bruch e coriocapilar. Este exame
está indicado nas patologias que envolvem o polo posterior e região do disco óptico (glaucoma).
O exame com OCT é indispensável, especialmente naqueles casos não conclusivos pela
biomicroscopia óptica, retinografia e angiografia fluoresceínica: buraco macular, microburaco
externo macular (Fig.17), pseudoburaco macular, edema cistoide de mácula, na retinopatia
diabética, cistos intrarretinianos, membrana epirretiniana, trações vitreomaculares (Fig. 16),
degeneração macular relacionada com a idade, neovascularização coroidiana, integridade das
estruturas das camadas retinianas, coroidopatia serosa central, quantificação de fluidos intrar­
retinianos, descolamento seroso do epitélio pigmentar retiniano e descolamento seroso da
retina neurossensorial. O OCT permite ainda detectar formações polipoidais na vasculopatia
coroidiana polipoidal idiopática12335 (Fig. 15) e medida da espessura coroidiana.
O OCT é particularmente útil no estudo das distrofias retinianas retinosquise juvenil liga­
da ao sexo (Fig. 18), retinose pigmentar e especialmente maculares tais como doenças de Best,
Stargardt e flavimaculatus, distrofia de cones, distrofia viteliforme foveomacular do adulto e
distrofias em padrão e anular concêntrica. Importante, também, são os achados observados
nas lesões viteliformes adquiridas.
Há, também, a possibilidade de avaliação em 3D das alterações tomográficas das camadas
retinianas e do disco óptico. É interessante a análise em 3D das diferentes camadas retinianas
isoladas, como a camada limitante interna ou epitélio pigmentado da retina
Ele é muito importante na quantificação do edema macular, a análise do mapa macular,
especialmente em diabéticos ou em pacientes com oclusão venosa central ou de ramo, e com
Quando os Exames Complementares são Indispensáveis

Fig. 15 Quadro de OCT de vasculopatia polipoidal coroidiana idiopatica:


Atenuação da depressão foveal central
Espessura foveal 314 micra
Pequeno descolamento neurossensorial macular
Elevação irregular da banda de refletividade (do complexo EPR/ coriocapilar) na região
inferior e temporal macular
Descolamentos cônicos do EPR provocados por dilatações terminais (pólipos) da rede
vascular coroidiana na região inferior
Descolamento do EPR macular superior
Pouco de fluidos intrarretinianos na região macular superior (edema e pequenas he­
morragias)

Fig. 16 Secções tomográficas ópticas radias na área macular,


demonstrando de tração vítreomacular.
OD
Espessa membrana (hialoide posterior) hiper-refletiva tracionan-
do a área foveal. Elevação da área foveal
Estrutura das camadas retinianas não preservadas
Descolamento sensorial foveal
Fluidos e cistos na retina neurossensorial

isso auxiliar na conduta, indicação e controle da medicação intraocular. Em lesões coriorreti-


nianas ativas podem-se avaliar as alterações coroido-retinianas, a celularidade vítrea e mem­
branas junto à lesão.
O OCT tem uma grande importância nos casos de degeneração macular atrófica ou úmida.
Especialmente na forma úmida com descolamento do epitélio pigmentado da retina e neovas-
cularização de coroide. Pois, além de demonstrar a extensão das alterações do complexo neo-
vascular, mostra sua localização, o espessamento (fluidos e cistos) retiniano e alterações da
Semiologia Básica em Oftalmologia

Fig. 17 R M M, com 45 anos de idade, do sexo feminino com


visão de 0.7 no OE com quadro de microburaco externo (m icro-
hole ). Não há história de heliofototraumatismo.
Não há achados de trações vítreas na mácula
Espessura central da fóvea: 170 micra (normal)
Ausência de fluidos intrarretinianos
Camadas retinianas neurossensoriais preservadas
Camada de fotorreceptores normal
Presença de m icrohole externo (ou cisto externo) no centro da
depressão foveal

Fig. 18 A L S M com 31 amos de idade, do sexo masculino com retinosquise macular


bilateral.
Ausência da depressão foveal
Espessamento foveal 353 micra no OD e 359 micra no OE
Clivagem da retina neurossensorial macular
Cistos na região da clivagem - cistos maiores na área central
Camada de fotorreceptores normal
Complexo EPR/coriocapilar normal

estrutura das camadas retinianas. Ele é útil, também, no seguimento e respostas às terapias
aplicadas e no diagnóstico de ruptura do EPR macular (Fig.14).
O OCT auxilia na avaliação da diminuição da espessura da retina neurossensorial em pa­
ciente com atrofia retiniana, e também em alguns pacientes que utilizam cloroquina.
Quando os Exames Complementares são Indispensáveis

O OCT tem sido de grande valia na análise de tumores intraoculares: hemangioma de co-
roide, nevo, melanoma de coroide e também em hamartoma combinado de retina e epitélio
pigmentado.
Em pacientes glaucomatosos ou suspeitos é muito importante a verificação da espessura
da camada de fibras nervosas, bem como as dimensões da escavação do disco óptico.
r

ATomografia de Coerência Óptica (OCT) de alta resolução permite, no segmento anterior,


uma excelente visualização estrutural da córnea e do ângulo iridocorneano. Ela auxilia no
acompanhamento da evolução de tumores de íris, porém, nestes casos, é muito importante
associar os achados obtidos na biomicroscopia ultrassónica.
OCT produz imagens de alta resolução que permitem uma excelente visualização e medi­
das da profundidade de implantes (anéis) e de opacidades intracorneanas. Estas medidas de
profundidade são mais acuradas do que as medidas estimadas na lâmpada de fenda.
Para o cirurgião de córnea é indispensável a realização do OCT para a perfeita avaliação
das alterações da estrutura e cicatrizes corneanas em traumas, sequelas de ceratite ou de úl­
cera corneana (nubéculas, leucomas) e especialmente em pacientes submetidos a ceratotomia
radial no passado (profundidade e extensão das incisões) (Fig. 31), transplantes penetrantes
(fibrose e degrau na junção entre a córnea doadora e receptora), ou transplante lamelar an­
terior de córnea (FALK) (Fig. 27) ou transplante do endotélio corneano (DSAEK) (Fig. 28) e im­
plante de anel intraestromal. É importante a localização, profundidade, dimensões de opaci­
dades ou do anel intraestromal e suas distâncias do endotélio e do epitélio corneano (Fig. 29).
Pode ainda ser útil na avaliação qualitativa e quantitativa da cirurgia do Lasik.21 O OCT auxilia
também na análise de alterações e profundidade das opacidades estromais em pacientes sub­
metidos à cirurgia de pterígio (Fig. 32).
O OCT da córnea identifica deformidades e irregulardades corneanas e também fornece
medidas precisas de sua espessura em todos os meridianos (mapa paquimétrico) (Fig. 30)
Nos pacientes com olho seco pode-se avaliar o menisco lacrimal.

MEDIDA DA ACUIDADE VISUAL POTENCIAL - PAM


Este exame é importante para estimar um resultado previsível do potencial da acuidade visual
antes de um procedimento cirúrgico em pacientes com catarata ou com opacidades de cór­
nea ou vítreo. Convém lembrar que este exame pode ter resultados falsos em paciente com
coriorretinopatia serosa central, edema cistoide de mácula, atrofia do epitélio pigmentado
da retina, escotomas centrais, descolamento incipiente de retina, cistos, buracos maculares e
ambliopia.6’ 17

ELETRORRETINOGRAFIA - ERG
E um exame não invasivo que avalia direta e objetivamente a função da retina. E de grande
auxílio na avaliação e no acompanhamento da progressão de distúrbios da visão noturna, dis-
trofias pigmentares, coroideremia e distrofia de cone-bastonete.25
Semiologia Básica em Oftalmologia

Ele é importante no auxílio no diagnóstico diferencial entre doenças da retina periféri­


ca, da mácula ou do nervo óptico e entre causas orgânicas e não orgânicas da perda visual. É
útil na identificação de isquemia retiniana na oclusão da veia central da retina e no diabetes.
Pode-se avaliar a função retiniana em pacientes com opacidades de meios e em olhos com
trauma ou corpos estranhos intraoculares.26
Através do ERG podem-se ter importantes informações de várias doenças retinianas, in­
cluindo, entre outras, cegueira congênita estacionária com miopia, acromatopsia, retinosquise
juvenil ligada ao sexo e amaurose congênita de Leber.25
O ERG focal e o multifocal tem indicações na avaliação de maculopatias, buracos de má­
cula, identificação de toxicidade da retina em pacientes com uso de fármacos retinotóxicos.
Auxilia na determinação da causa da diminuição da acuidade visual sem etiologia aparente e
é de grande valia no estudo da função retiniana central em casos avançados de retinose pig­
mentar.26

ELETRO-OCULOGRAFIA (EOG)
A indicação da EOG é mais apropriada para doenças que presumidamente afetam primaria­
mente o epitélio pigmentar, como a distrofia macular (viteliforme) de Best e várias distrofias
em padrão.13
Ela tem sido aplicada amplamente no estudo de várias doenças retinianas e tem por obje­
tivo analisar a função das camadas externas da retina.

ANGIOGRAFIA FLUORESCEÍNICA (AF)


A angiografia fluoresceínica é uma aplicação clínica do fenômeno físico da luminescência.33 É
um exame invasivo, dinâmico, que se injeta fluoresceina sódica, geralmente na veia antecubi-
tal do paciente, em que o examinador pode observar o trajeto real deste corante desde sua
chegada até sua saída do fundo de olho. É recomendável avisar o paciente das possíveis rea­
ções adversas e das contraindicações do exame.
Trata-se de um dos melhores métodos para avaliar as estruturas do fundo de olho: retina,
disco óptico e coroide. Ele é ideal para avaliar a retina e especialmente no estudo da sua cir­
culação e particularmente dos capilares.
É um exame indispensável em muitas patologias inflamatórias coroidorretinianas, vascu­
lares retinianas, às vezes, para concluir o diagnóstico, outras vezes para avaliar a extensão e o
grau do comprometimento do dano retiniano, especialmente nas retinopatias diabéticas. Ele
pode apontar o prognóstico e até mesmo orientar a terapêutica, especialmente, em pacientes
com retinopatia diabética, vasculites e vasculopatias oclusivas.
Este exame muito contribui na elucidação do diagnóstico de patologias maculares, tais
como teleangiectasias (Figs. 21, 22, 23 e 24), distrofias e degenerações em especial na de­
tecção de membrana neovascular sub-retiniana e tumores de retina (Fig. 20). Tem sido muito
valiosa, também, no diagnóstico de doenças coroidianas inflamatórias e oclusiva (Fig. 19) e
doenças do nervo óptico.
Quando os Exames Complementares são Indispensáveis

Fig. 19 F G S do sexo feminino, com 25 anos de idade, pré-eclâmpsia há 15 dias com


redução visual AOV= 20/200. No exame de fundo de olho observa-se em AO: disco óptico
com bordas nítidas e leve dispersão pigmentar macular. Na AF evidencia uma significativa
hipoperfusão coroidiana submacular e peripapilar. Paciente teve uma coroidopatia
oclusiva das artérias ciliares curtas posteriores pela hipertensão arterial.

ANGIOGRAFIA COM INDOCIANINA VERDE


Este é um exame que consiste na injeção endovenosa do corante indocianina verde na veia
antecubital do paciente para o estudo da circulação coroidiana.
Esta técnica é especialmente indicada na suspeita de vasculopatia coroidiana polipoidal
idiopática (Fig. 25). Assim como é de grande auxílio na identificação de membranas neovascu-
lares sub-retinianas ocultas e de seus vasos nutridores em degeneração macular exsudativa,
ou na localização de rupturas de coroide ocultas por hemorragias sub-retinianas encontradas
em traumas oculares contusos.
340 Semiologia Básica em Oftalmologia

Fig. 20 L P G do sexo masculino, com 31 anos de idade, refere diminuição visual no


OD desde a infância. ODV=20/200 OEV=20/20. Fundo de olho OD: lesão levemente
elevada no polo posterior de cor pouco esverdeada para escuro na base da lesão e com
um tecido branco-acinzentado na superfície anterior, com tortuosidade vascular e
pequena gliose na região temporal do disco óptico. Na AF verifica-se um extravasamento
do corante pelos capilares e edema nesta área.
Quadro de hamartoma combinado de retina e epitélio pigmentar retiniano.

Pode ser empregada para o diagnóstico de tumores de coroide, hemangioma, melanoma


e nevo ou em patologias inflamatórias coroidianas e até mesmo na avaliação de paciente com
coroidorretinopatia serosa récidivante ou atípica.34

RETINOGRAFIA
Tem como objetivo o registro de imagens do fundo de olho. E de grande valia para a docu­
mentação e seguimento, para efeitos legais ou não, de alterações encontradas na retina, na
coroide ou no nervo óptico.
Ela é importante, especialmente, no acompanhamento de lesões pigmentadas coroidorre-
tinianas em casos suspeitos de nevo ou de melanoma de coroide e em casos de lesões coroi-
dorretinianas traumáticas.

ESTEREOFOTOGRAFIA DO DISCO ÓPTICO


A estereofotografia do disco óptico é um exame simples, mas de grande valia na identifi­
cação e acompanhamento de alterações no disco óptico e na retina peridiscal, especial-
Quando os Exames Complementares são Indispensáveis 341

Fig. 21 M J T F, do sexo feminino, com 46 anos de idade, com visão de


20/60 no OD e 20/200 no OE.
Observa-se no FO OE uma exsudação sub-retiniana.
Na AF encontram-se áreas de vazamento retiniano AO, mais no OE e ede­
ma de papila. Quadro sugestivo de sífilis, confirmado pelos exames la­
boratoriais.
342 Semiologia Básica em Oftalmologia

Fig. 22 G O Y com 36 anos de idade, do sexo masculino, com visão de 20/25 no OD e


20/20 no OE. OD sem exsudação visível.
AF OD: telangiectasia retiniana justafoveolar nasal superior com vazamento e edema
retiniano ( grupo 1 B).

mente em pacientes suspeitos ou glaucomatosos. Ela é indispensável no seguimento do


glaucoma. As alterações da escavação do disco óptico precedem os achados de campo
visual no glaucoma.

OFTALMOSCOPIA DE VARREDURA A L A S E R

Este método, também conhecido como scanning laser ophthalmoscope (SLO), permite com o uso
de laser a obtenção, observação e análise de imagens reais, topográficas tridimensionais e de
alto contraste do segmento posterior do olho em um monitor de vídeo.36 Ela permite um es­
tudo quantitativo e objetivo da retina, disco óptico e camada de fibras nervosas para detectar
alterações estruturais precoces do glaucoma, degeneração macular relacionada com a idade,
edema cistoide de mácula, maculopatia diabética, identificação de neovasos na retinopatia
diabética.36

CAMPO VISUAL
O campo visual representa a expressão do estado funcional das vias ópticas, que se inicia nos
fotorreceptores dos cones e bastonetes e termina no córtex visual.20
Quando os Exames Complementares são Indispensáveis 343

Fig. 23 H M P, com 45 anos de idade, sem doenças sistêmicas, com visão de 20/40
no OE.
FO: exsudação lipídica no polo posterior e telangiectasias visíveis retinianas justafove-
olares temporais.
Na AF observam-se teleangiectasias temporais com vazamento e edema retiniano e
que não respeitam a rafe horizontal.

O campo visual é indispensável na avaliação de diversas afecções oculares e neurológicas:


na suspeita de neurite óptica, neuropatias tóxicas ou degenerativas, lesões de vias ópticas, de
r

tumor intracraniano e em traumas cranianos. E um exame de fundamental importância para a


detecção de áreas com diminuição da sensibilidade (escotomas) com características peculia­
res e assim tornando possível diferenciar as alterações relacionadas com glaucoma daquelas
observadas em afecções neurológicas. Ele é indispensável no monitoramento dos pacientes
glaucomatosos através de exames seriados.31
Périmétria branco no branco, ainda é o padrão ouro para diagnóstico e estudo de progres­
são do dano glaucomatoso quanto à avaliação funcional.10
344 Semiologia Básica em Oftalmologia

Fig. 24 MLR, com 55 anos de idade, do sexo feminino. AOV= 20/30.


AF: telangiectasia retiniana com pouco vazamento e edema, mais nas fases tardias,
não respeita a rafe horizontal.
Quadro de teleangiectasia idiopática justafoveal.2

Fig. 25 D G L, sexo feminino e 68 anos de idade. OEV 20/80 com suspeita de


vasculopatia polipoidal no exame de angiografia fluoresceínica.
Na indocianina verde, observam-se os nódulos coroidianos auxiliando a conclusão
diagnóstica do quadro.
Quando os Exames Complementares são Indispensáveis 345

Fig. 26 D M F do sexo feminino e 32 anos de idade, com tumor de corpo ciliar no


OD embora não apresenta-se crescimento durante 2 anos, a paciente decidiu a
retirada. Anatomopatológico: melanocitoma de corpo ciliar

Périmétria azul-amarelo: utiliza um estímulo azul, que preferencialmente estimula os co­


nes azuis, e uma iluminação amarela forte de fundo para adaptar os cones verdes e vermelhos,
além de saturar, simultaneamente, a atividade dos bastonetes. Os defeitos na périmétria azul-ama-
relo predizem de 3 a 5 anos defeitos futuros na périmétria branco no branco.

MEDIDA DA ESPESSURA DA CAMADA DE FIBRAS NERVOSAS (CFN)


Está indicada em pacientes suspeitos ou glaucomatosos. Pode ser medida por diferentes téc­
nicas: oftalmoscopia confocal a laser, a tomografia de coerência óptica (OCT) e a polarimetria
de varredura a laser (GDx e Access VCC)11.
As alterações glaucomatosas nas CFN podem preceder em anos as alterações de campo
visual.32

PAQUIMETRIA CORNEANA
É a medida da espessura da córnea. Ela é indispensável na avaliação pré-operatória de cirur­
gias refrativas, doenças ectásicas, degenerativas e espessamentos corneanos. O acompanha­
mento prospectivo associado à contagem de células endotelias na doença de Fuchs é funda­
mental para determinar a necessidade de transplante corneano ou endotelial. Ela é importante
na semiologia do glaucoma, pois as alterações na espessura corneana acarretam uma falsa
leitura da pressão intraocular hiperestimada em córneas espessas.5,14

CERATOMETRIA E TOPOGRAFIA CORNEANA


A ceratometria é utilizada para medir a curvatura central anterior da córnea em dois meridianos
primários, perpendiculares entre si, um vertical e outro horizontal.30 É um dado indispensável
346 Semiologia Básica em Oftalmologia

Fig. 27 F S, do sexo feminino, com 48 anos de idade, o OCT de córnea mostra o transplante
lamelar anterior (FALK) devido a opacificações secundárias à ceratotomia radial há 30 anos.

Fig. 28 J P B, do sexo masculino, com 71 anos de idade. O OCT mostra


o transplante endotelial cortes radiais às 10h e 14h (DSAEK).

para o cálculo de lente intraocular conforme discutido previamente, para a contatologia e tam­
bém no diagnóstico e no tratamento de algumas patologias que afetam esta estrutura ocular.14
A topografia da córnea permite avaliar qualitativa e quantitativamente a curvatura ante­
rior da córnea de uma forma rápida e capaz de detectar pequenas diferenças de curvatura.30
Com ela podemos obter o mapa ceratométrico que permite identificar irregularidade ou as­
simetria de toda a superfície da córnea e fornecer índices para avaliação da probabilidade de
ectasia ou ceratocone, como Klice-Maeda e Smolek Klice. A análise do exame com anéis de
Quando os Exames Complementares são Indispensáveis 347

Fig. 29 A J R F, com 23 anos de idade do sexo


masculino, paciente com ceratocone. No olho
direito o OCT de córnea mostra um anel intra-
estromal e sua distância até o endotélio e o
epitélio - e lente de contato.

Fig. 30 A J R F, com 23 anos de idade, do sexo mas­


culino - paciente com ceratocone. No olho esquerdo
mapa paquimétrico no OCT.

Plácido também permite calcular, com mais precisão que a ceratometria manual, a curvatura
dos 3,5 mm centrais para o desafiante cálculo biométrico após cirurgia refrativa.13 Podemos
obter o mapa diferencial para verificar mudanças que ocorreram na superfície da córnea no
acompanhamento de doenças ectásicas ou após cirurgias refrativas corneanas ou suspensão
de lentes de contato.2

MICROSCOPIA ESPECULAR ENDOTELIAL


A microscopia especular baseia-se na reflexão de um feixe luminoso sobre endotélio cornea-
no, parte do feixe luminoso reflete e é captado pelo microscópio especular que apresenta
imagem endotelial magnificada e com isso é possível a avaliação direta do mesmo.16 Este
método é importante para avaliar a estimativa da densidade celular endotelial, a variação de
tamanho e forma das células, depósitos na superfície endotelial, alterações na membrana
de Descemet ou edema e mudanças no padrão celular em usuários de lente de contato de
longa data.29,16
Indicações: indispensável no pré-operatório de cirurgia de catarata de pacientes com alte­
rações endoteliais visíveis à biomicroscopia, guttata, história de glaucoma e cirurgia prévia de
segmento anterior. Também em pacientes afácicos candidatos a implante secundário de lente
348 Semiologia Básica em Oftalmologia

OE

Fig. 31 L F R com 42 anos de idade, do sexo masculino - submetido à ceratotomia radial há 21 anos.
O OCT mostra a profundidade das incisões, irregularidades de espessura e curvatura da córnea.

Fig. 32 OS com 68 anos de idade, do sexo masculino OD - após 4 cirurgias de pterígio


recidivados. O OCT mostra a extensão, densidade e profundidades das opacificações
presentes desde a área central até a região limbar nasal.
Quando os Exames Complementares são Indispensáveis 349

intraocular. Em pacientes que tenham apresentado descompensação endotelial corneana após


cirurgia no primeiro olho.4,16
Alterações endoteliais específicas observadas à microscopia especular podem auxiliar no
diagnóstico de distrofias, como polimorfa posterior ou Fuchs.
O exame de microscopia especular é obrigatório no pré-operatório e no acompanhamen­
to pós-operatório de candidatos a implantes fácicos de lentes de câmara anterior para corre­
ção de altas ametropias, uma vez que alterações endoteliais são possíveis complicações com
essa técnica cirúrgica.14,4,16
Avaliação de córneas doadoras e ainda no pós-operatório para o estudo da vitalidade de
córneas transplantadas.4

MICROSCOPIA CONFOCAL DE CÓRNEA


Um perfeito escaneamento da córnea permitirá a observação sequencial da camada epitelial,
plexo neural sub-basal e subepitelial, estroma e endotélio. Na distrofia de Fuchs pode-se en­
contrar achados anormais destas estruturas. Este exame pode ainda auxiliar no diagnóstico de
possíveis quadros de ceratites infecciosas.4

ANÁLISE DE FRENTE DE ONDA


A análise de frente de ondas tem por finalidade medir de modo mais preciso as irregularidades
ópticas do paciente e assim comparar sua qualidade óptica com um modelo ideal, isto é, sem
aberrações.
Alguns pacientes insatisfeitos com o resultado pós-cirurgia refrativa podem queixar-se de
transtornos visuais, tais como halos, glare e diplopia monocular. Nestes casos há indicação do
exame de análise de frente de onda para detecção de aberrações oculares que podem ter sido
induzidas pela cirurgia. Com este exame pode-se avaliar melhor estas queixas do paciente e
com a ablação personalizada pode-se tratar estas aberrações. É indicada para aqueles que
são candidatos à cirurgia refrativa personalizada (guiada pela análise de frente de ondas). A
aberrometria pode ser utilizada, também, em pacientes com queixas de perda de qualidade
de visão ou sintomas visuais: halos, ofuscamento e diplopia monocular. Alguns pacientes com
suspeita de doença ectásica corneana podem apresentar aumento das aberrações.1
A análise de frentes de onda é um exame indispensável para o cirurgião refrativo compre­
ender mais as queixas e sintomas visuais dos pacientes.

ORBSCAN TM II
O Orbscan é um sistema diagnóstico integrado multidimensional com capacidade para análi­
se de mais de 9 mil pontos a cada 1,5 segundo, fornecendo informações sobre elevação das
superfícies anterior e posterior da córnea, espessura corneana (paquimetria) e profundidade
da câmara anterior.30,39 É a associação do resultado obtido através do exame de varredura por
fenda (triangulação) do Orbscan I com a reflexão especular de 10 anéis de Plácido.
350 Semiologia Básica em Oftalmologia

Indicações:
1. Avaliação corneana no pré-operatório para identificação de patologia ectásica.
2. Excluir olhos sem indicação para cirurgia refrativa.
3. Reavaliação de pós-operatórios de cirurgia refrativa, inclusive retratamentos.
4. Investigação na suspeita de ceratocone posterior, ectasia corneana pós-cirúrgica ou póstrau-
ma.
5. Avaliação da profundidade da câmara anterior em pré-operatório de lentes intraoculares
fácicas.
6. Avaliar o mapa paquimétrico.
7. Acompanhamento de pacientes que apresentam doenças ectásicas da córnea: ceratocone,
degeneração pelúcida e ectasia induzida.39

O resultado do exame de Orbscan se dá através de 4 mapas: mapa de elevação anterior,


mapa de elevação posterior, mapa topográfico e mapa paquimétrico. Nos mapas de elevação
são utilizados os Best Fit Sphere (BFS), ou seja, o computador interpreta qual é a esfera (infini­
tas curvaturas) que mais se assemelha a curvatura anterior e posterior corneana, gerando um
mapa de cores que serve para interpretar as regiões mais curvas e planas da superfície anterior
posterior da córnea. Grandes diferenças são sinais de alerta ou diagnóstico de ectasias corneanas.
No mapa paquimétrico, a análise da diferença de espessura entre a região central mais fina e a
periferia também é importante. Diferenças acima de 250 micras entre o ponto mais fino e os
9 mm centrais leva a suspeita de ectasia corneana.39

TOMOGRAFIA COMPUTADORIZADA (TC)


r

E um dos exames mais utilizados e mais importantes no estudo das patologias orbitárias para
identificar as lesões quanto à sua localização, configuração, extensão e relações com estrutu­
ras adjacentes e assim auxiliar o diagnóstico e a conduta. As lesões podem ser extra ou intra-
conais, apicais, anteriores, na fossa lacrimal ou difusas.
A tomografia computadorizada é de grande valia na elucidação de tumores, processos
inflamatórios ou infecciosos orbitários que causem proptose, deslocamentos do olho, limita­
ções de movimentos do olho e em doenças dos seios paranasais
O corte axial é comumente o mais usado e o que melhor demonstra a anatomia da órbita,
e é possível observar com detalhes os músculos reto lateral e medial, o globo ocular, o nervo
óptico, o tendão do músculo oblíquo superior, o canal óptico, as paredes orbitárias, a veia of­
tálmica superior e as fissuras orbitárias inferior e superior.
Os cortes coronais são importantes especialmente para a avaliação do teto e do assoalho
da órbita, assim como na avaliação dos músculos extraoculares, do nervo óptico, tecidos pe-
riópticos e também para analisar a relação de tumores com músculos extraoculares e nervo
óptico.
A tomografia computadorizada de órbita é exame indispensável na avaliação da doença
de Graves, no pseudotumor inflamatório de órbita, na celulite e abscesso orbitário, tumores
Quando os Exames Complementares são Indispensáveis 351

orbitários (cisto dermoide, hemangioma capilar, mucocele orbitária, hemangioma cavernoso,


linfangioma, glioma óptico, meningioma do nervo óptico, osteoma, rabomiossarcoma, schwa-
noma, neurofibroma, linfoma e tumores epiteliais malignos da glândula lacrimal). Traumatis­
mos orbitais (fraturas do assoalho, parede mediai e do teto da órbita, enfisema orbital, trauma
indireto posterior do nervo óptico e corpos estranhos).23

RAIOS X SIMPLES
É um exame complementar que pode ser de grande auxílio, especialmente, em situações de
emergência, quando não há disponibilidade de uma tomografia computadorizada. Ele é útil
para a detecção de fraturas do assoalho da órbita, corpo estranho metálico na órbita, em casos
de suspeita de celulite para verificar se há sinusite associada.23 Entretanto, ele auxilia na ava­
liação de anormalidades das paredes orbitárias, da fossa da glândula lacrimal, do canal óptico
situado na asa menor do esfenoide.

RESSONÂNCIA MAGNÉTICA (RM)


É uma técnica não invasiva, não há radiação ionizante e sem efeitos danosos aos tecidos exa­
minados. Em relação à tomografia computadorizada a RM apresenta uma excelente resolução
anatômica principalmente do ápice orbitário e do nervo óptico, possibilidade de diferenciação
dos tecidos; caracterização de diferentes etapas de hemorragia, detecção de fluxo sanguíneo e
identificação de lesões que contenham melanina.23 Ela é indicada especialmente no estudo das
afecções da via óptica, entretanto, é contra-indicada na suspeita de corpo estranho metálico.
Contudo, o exame de tomografia computadorizada é o método de eleição para as pato­
logias orbitárias.

DACRIOCISTOGRAFIA
Este exame é o mais indicado para o estudo do sistema de drenagem lacrimal. Ele mostra
todos os elementos importantes e necessários para a avaliação funcional e anatômica e com
isso tornam-se possíveis o diagnóstico, prognóstico e avaliação da terapêutica utilizada nas
patologias das vias lacrimais.36

EXAMES LABORATORIAIS E BIÓPSIA


O exame laboratorial é indispensável na investigação da etiologia de processos infecciosos, in­
flamatórios, doenças autoimunes, de todas as estruturas oculares e de seus anexos. É fundamen­
tal na avaliação de pacientes com vasculopatias retinianas (vasculites, oclusões arteriais e veno­
sas, vasculopatias oclusivas periféricas) e também no controle medicamentoso de alguns casos.
Muitos achados oculares podem ser sugestivos de uma determinada patologia, mas po­
dem não ser conclusivos para o diagnóstico. Há quadros de patologias oculares com apresen-
Semiologia Básica em Oftalmologia

tações clínicas semelhantes, mas de etiologia muito diferentes, como acontece nas uveítes, na
qual o risco de fazer tratamento sem uma definição do agente causador, pode levar até a perda
do olho ou complicações sistêmicas desastrosas. Exemplo: tratar uma uveíte com corticoide
sistêmico se a etiologia for sífilis ou tuberculose, ou tratar um paciente com toxoplasmose
usando espiramicina sem o controle semanal do hemograma.
Em pacientes com endoftalmite, úlceras de córnea, ceratites, conjuntivite atípica é neces­
sária a identificação do germe por bacterioscopia, cultura e também o estudo da sensibilidade
ao antibiótico (antibiograma).
A biópsia é indispensável para a definição do diagnóstico de muitas lesões que acometem
as estruturas oculares, que podem ser de etiologia maligna, autoimune ou infecciosa.
Toda lesão suspeita de neoplasia de pálpebra, conjuntiva, córnea, glândula lacrimal, de
músculos extraoculares, ou de tumores para ou retrobulbares deve-se indicar a biópsia. Em
muitos casos é preferível a retirada completa da lesão e com margem de segurança, particular­
mente nas lesões de conjuntiva ou de pálpebra.
Tecnicamente há possibilidade de biópsia de íris, retiniana, coriorretinana, aspiração de
vítreo ou de câmara anterior.

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índice Alfabético

do segmento anterior, 80
do segmento posterior, 87, 111
Acuidade visual, 29, 219
história, 69
medida da, 29
introdução, 69
para perto, 31
lâmpadas de fenda atuais, 71
Alterações
da papila, 241 lentes acessórias, 78
da retina periférica, 244 tipos de iluminação, 73
do vítreo, 243 Biomicroscopia da conjuntiva, 173
maculares, 239 Biomicroscopia ultrassónica, 327
vasculares, 237 Biópsia, 351
Amsler
tabela de, 54 C
Angiografia Caixa
com indocianina verde, 339 de prismas, 45
fluoresceínica, 338 de provas, 44
Aniridia, 218 Camada de fibras nervosas
Anisometropias alfabéticas, 282 medida da espessura da, 345
Atropina Campimetria, 51
sulfato de, 115 exames de, 265
Campímetros, 53
de Goldmann, 55
Biometria Campo visual, 342
ocular ultrassónica, 329 alterações no, 57
óptica, 333 interpretação do, 133
Biomicroscopia básica no glaucoma, 135
em oftalmologia, 69-90 Cataratas
documentação, 88 classificação morfológica das, 218

355
Semiologia Básica em Oftalmologia

congênita, 215 avaliação fundoscópica, 221


infantil, 215 cataratas congênita e infantil, 215
senil, 218 classificação morfológica das cataratas, 218
traumática, 219 coloboma do, 217
Ceratometria, 345 exame, 210
Coma da pupila, 220
distúrbios do, 101 do paciente com catarata senil, 219
Conjuntiva lenticones e lentiglobo, 216
semiologia básica da, 171-180 microesferofaquia, 217
anatomia da, 171 síndrome de Marfan, 214
biomicroscopia da, 173
Consultório básico D
de oftalmologia e anamnese, 1-28
alteração da motricidade, 6 Dacriocistografia, 351
anamnese, 2 Dermatocalase, 158
avaliação laboratorial, 20 Desvio ocular
avaliações anatômicas, 25 avaliação do, 276
centros supranucleares, 25 Documentação, 88
envolvimento ocular nos reflexos Doppler oftálmico, 334
vestibulares, 12
exame das vias ópticas, 5 E
lesão central, 16 Eletro-oculografia, 338
movimentos de seguimento, 14 Eletrorretinografia, 337
nistagmo, 14 Esquiascopia, 220
de origem vestibular, 16 Esotropia, 279
exame do paciente com, 17
Estereofotografia, 340
prova calórica, 13
do disco óptico, 340
reflexos estatocinéticos, 13
Estrabismo
relações entre aparelho visual e sistema
semiologia básica do, 271-284
vestíbulo-coclear
acuidade visual, 272
tratamento, 18, 20
anamnese, 271
Contraste
anisotropias alfabéticas, 282
visão de, 39
avaliação do desvio ocular, 296
Cores
comitância e incomitância, 275
visão de, 31
esotropia, 279
Córnea
estrabismos paralíticos, 281
semiologia básica da, 181-194
anatomia, 181 exotropia, 280
biomicroscopia, 182 introdução, 271
ceratometria, 190 leis da inervação motora, 275
ceratoscopia, 192 movimentos oculares, 273
introdução, 181 posições diagnósticas, 274
Cristalino pseudoesotropia, 279
semiologia básica do, 209-222 refração, 272
afacia, 216 síndromes especiais, 282
alterações de posições, 213 terminologia, 274
anatomia e fisiologia, 209 testes perioperatórios, 283
índice Alfabético

Exames complementares Gonioscopia, 258


quando são indispensáveis, 323-353 GPA, 141, 142
análise de frente de onda, 349
angiografia com indocianina verde, 339 H
angiografia fluoresceínica, 338
Hidrocloridrato
biometria ocular, 329
de ciclopentolato, 116
biometria óptica, 333
de fenilefrina, 115
biomicroscopia ultrassónica, 327
campo visual, 342
I
ceratometria, 345
dacriocistografia, 351 Iluminação
Doppler oftálmico, 334 sistemas de, 71
eletro-oculografia, 338 tipos de, 73
eletrorretinografia, 337 Ishihara
estereofotografia do disco óptico, 340 teste de, 34
medida da acuidade visual, 337
microscopia especular, 347 L
oftalmoscopia de varredura a laser, 342
paquimetria corneana, 345 Lágrima
ressonância magnética, 351 composição química da, 196
retinografia, 340 Lâmpada de fenda, 71
tomografia computadorizada, 350 Leis
tomografia de coerência óptica, 334 da inervação motora, 275
ultrassonografia ocular, 324 Lentes
Exotropia, 280 acessórias, 78
de contato
F semiologia do candidato ao uso de, 313-322
alterações fisiológicas, 321
Filme lacrimal
história, 313
semiologia do, 195-207
Lenticones e lentiglobo, 216
Fundoscopia, 261
Lesão
G central, 16
periférica, 16
Glaucoma
semiologia básica do, 249-269 M
anamnese, 251
biomicroscopia, 253 Marfan
epidemiologia, 250 síndrome de, 214
exames de campimetria, 265 Medida da acuidade visual, 337
fundoscopia, 261 Microesferofaquia, 217
gonioscopia, 258 Microscopia confocal de córnea, 349
inspeção geral, 253 Microscopia especular endotelial, 347
introdução, 249 Mittendorf
tonometria, 256 mancha de, 217
358 Semiologia Básica em Oftalmologia

Motricidade Órbita, 164


alterações da, 6 trauma de, 168
Movimentos voluntários, 14 Orbscan TM, 349

N P

Nervo oculomotor, 26 Paquimetria corneana, 345


Nervo troclear, 27 Perimetria
Neuroftalmologia azul-amarelo, 143
semiologia básica em, 297-311 de frequência dupla, 144
anamnese, 297 Perimetria computadorizada, 131-146
avaliação da função visual, 301 campo visual no glaucoma, 135
avaliação das pupilas, 310 conceitos básicos, 131
introdução, 297 interpretação do campo visual, 133
oftalmoscopia, 310 perimetria azul-amarelo, 143
Nistagmo perimetria de frequência dupla, 144
calórico, 13 programas e estratégias, 132
de origem vestibular, 16 SITA, 140
elétrico, 14 Perímetros, 53
Peters
O anomalias de, 217
Pranchas pseudoisocromáticas, 35
Oftalmologia
testes de, 35
consultório básico de, 1-28
Pressão intraocular, 123
Oftalmopediatria
Prova calórica, 13
semiologia básica em, 285-296
Provas
anamnese, 285
caixa de, 44
classificação, 291
Pupila
medida da visão, 287
semiologia da, 91-104
quando consultar, 288
anatomia, 91
retinoblastoma, 293
dissociação luz-perto, 101
Oftalmoscopia básica
distúrbios no coma, 101
em oftalmologia, 105-121
medicamentos que agem na, 102
anamnese, 106
biomicroscopia do segmento posterior, 111
R
cicloplégicos, 115
descrição do fundo de olho, 117 Reflexos estatocinéticos, 13
dilatação da pupila, 115 Reflexos vestibulares
exame básico, 107 envolvimento ocular nos, 12
história, 105 Refração automatizada, 45
midriáticos, 115 Refrator, 42
oftalmoscopia binocular indireta, 109 de Green, 42
principais usos, 114 Ressonância magnética, 11, 351
princípios básicos, 107 Retina
sedação, 116 avaliação da, 120
técnica de exame, 108 semiologia básica da, 237-248
tipos de iluminação 113 alterações
Olho da papila, 241
fundo de da retina periférica, 244
descrição do, 117 do vítreo, 243
índice Alfabético 359

maculares, 239 T
vasculares, 237
Teste(s)
Retinoblastoma
bicromático, 46
sinais e sintomas, 293
de equalização, 38
Retinografia, 340
Retinoscopia, 46 de ishihara, 34
Rubéola materna, 22 de nomeação de cores, 39
palpebrais específicos, 155
S Tomografia computadorizada, 350
Tomografia de coerência óptica, 334
Sedação, 116
Tonometria, 123-130, 256
Segmento anterior
introdução, 123
biomicroscopia do, 80
Tonômetros, 125-130
Segmento posterior
ORA, 129
biomicroscopia do, 87
Semiologia básica pressão intraocular, 123
da conjuntiva, 171-180 tonômetros, 125
da córnea, 181-194 Topografia corneana, 345
da retina, 237-248
da visão periférica e campimetria, 51-67 U
alterações no campo visual, 57 Ultrassonografia
aparelhos, 53 ocular, 324
definições, 51
orbitária, 324
técnicas, 53 r
Uvea e esclera
das pálpebras, vias lacrimais e órbitas, 147-
semiologia básica de, 223-236
órbita, 164
episclerites e esclerites, 235
trauma de órbita, 168
introdução, 223
testes palpebrais específicos, 155
pan-uveíte, 235
vias lacrimais, 159
uveíte anterior, 225
de tivea e esclera, 223-236
do candidato ao uso de lentes de contato, uveíte intermediária, 229
313-322 uveíte posterior, 231
do cristalino, 209-222
do estrabismo, 271-284 V
do glaucoma, 249-269 Vias lacrimais, 159
em oftalmopediatria, 285-296 sistema lacrimal, 159
em neuroftalmologia, 297-311
Vias ópticas
Semiologia da pupila, 91-104
exame das, 5
Semiologia do filme lacrimal, 195-207
Visão central
composição, 196
avaliação da, 29-49
corantes visuais, 203
acuidade visual, 29
exame do paciente, 197
Visão de contraste, 39
interpretação de resultados, 200
Visão de cores, 31
provas laboratoriais, 206
sinais e sintomas, 201 história, 31
testes clínicos, 203 Visão periférica
Síndrome semiologia básica da, 51
de Vogt-Koyanagi-Harada, 21 Vogt-Koyanagi-Harada
Surdez, 24 síndrome de, 21

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