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INOVAÇÃO E

TECNOLOGIA EM
ALIMENTAÇÃO

Jeison Fernando Schmitz


Alimentos funcionais e
as perspectivas de inovação
Objetivos de aprendizagem
Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados:

„„ Definir alimentos funcionais, seu histórico e suas perspectivas.


„„ Relacionar a importância dos alimentos funcionais na prevenção de
doenças.
„„ Desenvolver produtos alimentícios inovadores com propriedades
funcionais.

Introdução
Desde antigamente, atributos medicinais eram atribuídos aos alimentos,
uma crença normalmente repassada entre as gerações. Mesmo desconhe-
cendo a palavra, essa transmissão de informação se refere aos alimentos
funcionais, que, além de propriedades nutritivas, apresentam compostos
bioativos responsáveis por influenciar as funções fisiológicas humanas,
o que promove benefícios para a saúde.
A interação entre o alimento funcional e a gastronomia é conhecida
como gastronomia funcional, aliando a saudabilidade ao sabor e prazer
que aquela refeição proporcionará, bem como atuando principalmente
no resultado que a utilização dos alimentos funcionais terá no organismo
dos consumidores, respeitando as diferenças biológicas de cada indivíduo.
Neste capítulo, você vai aprender sobre o conceito de alimentos
funcionais e compostos bioativos, conhecendo seu histórico, legislações
e perspectivas para a indústria de alimentos. Ainda, entenderá a impor-
tância dos alimentos funcionais para a saúde humana, principalmente na
prevenção de algumas doenças, e reconhecerá produtos inovadores no
mercado de alimentos, com a alegação de alimentos funcionais.
2 Alimentos funcionais e as perspectivas de inovação

1 Histórico, conceitos básicos e mercado


Há mais de 2.500 anos, o grego Hipócrates, com sua famosa frase “Faça do
seu alimento seu medicamento”, já sugeria que o alimento tem propriedades
terapêuticas. Porém, a terminologia “alimento funcional” é mais recente,
originária do Japão na década de 1980. Em virtude do interesse em explorar
as potencialidades dos alimentos em prevenir algumas doenças, os alimentos
funcionais se assemelhavam aos convencionais, porém, além de suas caracte-
rísticas nutricionais já conhecidas, demonstravam algum benefício fisiológico
e/ou minimizavam o risco de doenças crônicas não transmissíveis (DCNT)
(GIUNTINI, 2018; SOUZA; MARTÍNEZ, 2017).
Ainda no Japão, em 1991, de maneira pioneira, foi definida a expressão
FOSHU ( foods for specied health use) para regulamentar os alimentos para uso
específico de saúde. Aprovados pelo Ministério da Saúde e Previdência Social
do Japão, esses alimentos apresentam um selo em suas embalagens, por serem
comprovadamente capazes de produzir um efeito específico sobre a saúde pelo
fato de conterem determinados compostos bioativos (SOUZA; MARTÍNEZ,
2017; VIZZOTTO; KROLOW; TEIXEIRA, 2010). Na Europa, entre os anos
de 1998 e 1999, foi criado o Functional Food Science in Europe — FUFOSE
(Projeto Ciência dos Alimentos Funcionais na Europa), que relacionou as
alegações de alimentos funcionais a evidências científicas, classificando as
alegações em dois tipos: melhora da função e redução de risco. E, nos Estados
Unidos, foi a partir dos anos 1990 que os alimentos funcionais se tornaram
mais conhecidos pela criação do programa Designer Food Program (Programa
de Alimentos Projetados), que financiava pesquisas sobre os componentes
fitoquímicos presentes nos alimentos. Atualmente, os norte-americanos não
dispõem de nenhuma legislação específica para esses alimentos, porém a Food
and Drug Admistration (FDA) orienta os consumidores por meio das seguintes
categorias de alegação (GIUNTINI, 2018; SOUZA; MARTÍNEZ, 2017):

„„ conteúdo de nutrientes: caracterizando o nível de nutrientes, utilizando


expressões como “boa fonte de”, “livre de”, “alto teor de”, entre outras;
„„ saúde: descrevendo o papel de determinado nutriente sobre a redução
do risco de uma determinada doença, como “o cálcio pode reduzir o
risco de osteoporose”;
„„ estrutura ou funcionalidade: descrevendo a função de determinado
nutriente na manutenção da estrutura funcional de humanos, por exem-
plo, “o cálcio é importante para o desenvolvimento de ossos fortes”.
Alimentos funcionais e as perspectivas de inovação 3

No Brasil, a Secretaria de Vigilância Sanitária sempre foi precavida,


posicionando-se contra a aprovação de diversos produtos alimentícios com
pedidos de registros desde o início da década de 1990. Após diversas pes-
quisas e contribuições de instituições, em 1998 foi aprovada a regulamenta-
ção técnica para análise de novos alimentos e ingredientes, incluindo nesse
grupo “alimentos com alegações de propriedades funcionais e ou de saúde”.
E, no dia 30 de abril de 1999, foi publicada a Resolução nº. 18, que estabelece
as diretrizes básicas para análise e comprovação de propriedades funcionais
e/ou de saúde alegadas em rotulagem de alimentos. Ainda em 1999, constituiu-
-se a Comissão Técnico-Científica de Assessoramento em Alimentos Funcio-
nais e Novos Alimentos (CTCAF), que, ao longo de cinco anos, colaborou em
decisões sobre o assunto, com a realização de eventos e a criação de informes
técnicos (GIUNTINI, 2018; SOUZA; MARTÍNEZ, 2017).
Não há um consenso mundial sobre o conceito de alimento funcional, pois
cada país tem uma regulamentação específica, com critérios para aprovação.
Para os europeus, por exemplo, é considerado alimento funcional apenas aquele
consumido de modo habitual na alimentação, excluindo aqueles consumidos
em formas farmacêuticas, como cápsulas ou comprimidos. Já para o Interna-
tional Life Sciences Institute of North America (ILSI), um alimento funcional
fornece benefícios à saúde, além de sua nutrição básica, em decorrência de
seus compostos bioativos. Nos Estados Unidos, não existe reconhecimento
legal para um alimento funcional, mas a American Dietetic Association (ADA)
inclui no rol de alimentos funcionais os alimentos fortificados e modificados,
por suas propriedades funcionais relativas às ações metabólicas ou fisiológicas
promovidas por alguma substância, com efeitos potencialmente benéficos para
a saúde (GIUNTINI, 2018; CAÑAS; BRAIBANTE, 2019).
E, no Brasil, não há uma definição sobre a expressão “alimento funcional”,
mas, por meio da Resolução Anvisa/MS n.º 18, em 1999, definiu a alegação
de propriedade funcional, relacionada ao papel metabólico ou fisiológico que
algum componente tem sobre as funções normais do organismo, e a alegação de
propriedade de saúde, que implica a existência de uma relação entre o alimento
ou algum componente com alguma doença ou condição relacionada à saúde,
sem alegar propriedades de cura ou prevenção (BRASIL, 1999). Para entender
um pouco melhor esses aspectos, veja o esquema apresentado na Figura 1.
4 Alimentos funcionais e as perspectivas de inovação

“As fibras alimentares


Alegação de
auxiliam o
propriedade
funcionamento do
funcional
Propriedades intestino.”
funcionais
“As fibras alimentares
Alegação de
Alimento funcional auxiliam na redução
propriedade de
da absorção de
Propriedades saúde
colesterol.”
nutricionais

Figura 1. Alegações de propriedade funcional.

Assim, alimento funcional pode ser considerado um alimento ou bebida


com alegações de causar algum benefício à saúde, comprovado cientifica-
mente e aprovado pela autoridade responsável. Já os compostos bioativos
são componentes não nutrientes, encontrados em pequenas quantidades nos
alimentos, capazes de influenciar o organismo humano e promover efeitos
metabólicos e fisiológicos benéficos para a saúde. Os compostos bioativos
não são indispensáveis para o funcionamento das células, como os macro-
nutrientes, mas atuam otimizando e corrigindo diversas funções, inclusive
reduzindo o risco do desenvolvimento de DCNT, como o câncer e problemas
cardiovasculares (GIUNTINI, 2018; CAÑAS; BRAIBANTE, 2019; SOUZA;
MARTÍNEZ, 2017).
Os alimentos funcionais devem ser consumidos regularmente para que os
benefícios esperados sejam alcançados, e não de forma esporádica. Como a
maior parte dos compostos bioativos estudados está presente em frutas, vegetais
e cerais integrais, o ideal é incluir esses alimentos na alimentação habitual.
Estudos sobre a relação entre a ingestão de alimentos funcionais e doenças
crônicas têm aumentado significativamente, o que faz aumentar o interesse
das indústrias de alimentos por produtos com alegações de propriedades fun-
cionais e/ou de saúde. Ainda, o envelhecimento da população, as mudanças no
enfoque das diretrizes alimentares, o crescimento de doenças crônicas e o fato
de o consumidor estar cada vez mais interessado em sua saúde são alguns dos
diversos fatores que favorecem a expansão do mercado mundial de alimentos
funcionais (GIUNTINI, 2018; SOUZA; MARTÍNEZ, 2017).
Alimentos funcionais e as perspectivas de inovação 5

Para que um alimento seja funcional, a sua alegação de propriedade funcional deve
ser comprovada cientificamente. Portanto, devemos ter cuidado com os diversos
alimentos citados na mídia como funcionais, como o óleo de coco, indicado para
melhorar a saúde cardiovascular, contudo para o qual não há nenhuma evidência
científica, incluindo-se, na verdade, a sugestão de sua substituição por óleos vegetais
com lipídeos insaturados.

É notória a preocupação dos governos com a relação alimentação-saúde


pela implantação de projetos e programas de longo prazo, visando à mudança
de hábitos alimentares e à sensibilização da indústria alimentícia para a cria-
ção de produtos com algum diferencial. Porém, como o consumidor final
é o responsável pela aceitação ou não de um novo alimento funcional no
mercado, cabe aos órgãos governamentais difundir informações essenciais e
à indústria de alimentos disponibilizar um produto que seja sensorialmente
aceitável (SOUZA; MARTÍNEZ, 2017). Entretanto, alguns alimentos ricos
em compostos bioativos não têm um consumo elevado pela população, por
questões de acesso (como a raiz da chicória que é rica em uma fibra alimentar
chamada inulina), alta perecibilidade (como os peixes ricos em ômega 3) e a
cultura alimentar de cada região, o que torna interessante que sejam extraídos
e utilizados em outros alimentos consumidos popularmente. Porém, para que
um alimento funcional seja promissor no mercado, seus benefícios devem
ser devidamente comprovados e de domínio público, o que somente pode ser
alcançado por meio de um trabalho multidisciplinar entre indústria, academia
e governo.

No contexto apresentado, o segmento de iogurte funcional é um dos mercados mais


promissores no que tange aos alimentos funcionais, com diversas marcas que lançaram
no mercado mundial iogurtes com probiótico, como o Activia da Danone. Além da
adição de probiótico, algumas indústrias de produtos lácteos criaram iogurtes com
ingredientes que reduzem o colesterol.
6 Alimentos funcionais e as perspectivas de inovação

Até recentemente, a expressão “alimento funcional” era exclusiva aos


profissionais da área da saúde, como os nutricionistas. Entretanto, com a re-
percussão midiática, o assunto ganhou notoriedade entre a sociedade, tendo se
destacado em restaurantes pelo mundo com clientes que buscam uma associação
entre o prazer da gastronomia e uma melhor qualidade de vida por meio de
alimentos funcionais. Com isso, no início do século XXI, surgiu a expressão
“gastronomia funcional”, cujo objetivo consiste em elaborar preparações
culinárias pela adição de alimentos funcionais, otimizando seus valores nutri-
cionais e promovendo a qualidade de vida por meio dos aspectos funcionais.
O uso de alimentos funcionais na gastronomia pode se dar, por exemplo,
por uma simples especiaria como a cúrcuma, que atua como antibactericida,
ou pela adição de biomassa de banana-verde, que auxilia no funcionamento
do intestino, a uma feijoada.

2 Benefícios dos alimentos funcionais


para a saúde
Diabetes melito, doenças cardiovasculares, câncer, obesidade, dislipidemias,
osteoporose e hipertensão são as principais DCNT. Consideradas silenciosas,
por se desenvolverem ao longo da vida e poderem levar a óbito, podem ocorrer
por fatores de risco não modificáveis, como sexo, idade e condição genética,
e modificáveis, como inatividade física, abuso de bebidas alcóolicas, uso do
tabaco e hábitos alimentares inadequados. Portanto, na sociedade mundial
atual, o estudo sobre os alimentos funcionais e seus compostos bioativos é
necessário e potencial para a redução de risco de determinadas DCNT.
Os alimentos funcionais podem ser classificados de acordo com a sua
origem em vegetal ou animal, sendo a maioria do reino vegetal, em razão
da presença dos compostos bioativos. No Quadro 1, você pode conhecer um
pouco sobre os principais grupos de compostos bioativos dos alimentos, suas
ações no organismo humano e algumas fontes alimentares.
Alimentos funcionais e as perspectivas de inovação 7

Quadro 1. Principais compostos bioativos e suas funções no organismo

Composto
Classe Funções Fontes
bioativo

Betacaroteno Atividade antioxidante, Vegetais e frutas de


estimulante para o coloração amarela a ver-
sistema imunológico melha, como cenoura,
e essencial para o abóbora, goiaba e ma-
sistema ocular mão, além de vegetais
folhosos verde-escuros,
como o brócolis

Licopeno Atividade antioxidante, Tomate e derivados,


Carote-
redução dos níveis de goiaba, mamão e
noides
colesterol e do risco de melancia
alguns cânceres, como
o de próstata

Luteína e Atividade antioxidante Folhas verdes, como


zeaxantina e proteção couve, acelga, espinafre
contra doenças e rúcula, além de pequi,
oftalmológicas laranja, nectarina e
milho

Antociani- Atividade antioxidante Amora, açaí, acerola,


dinas (ciani- e anti-inflamatória e batata-doce, berinjela,
dina, mal- redução do risco de cebola-roxa, jabuticaba,
cidina e cânceres jambolão, morango,
delfinidina) repolho-roxo e uva roxa

Flavanóis Atividade antioxidante Chá-verde, cereja,


(catequina, e anti-inflamatória, me- amora, mirtilo, uva roxa
epicatequina lhora do perfil lipídico e e vinho tinto
e redução do risco de do-
Flavonoi- procianidina) enças cardiovasculares
des
Flavanonas Melhora do perfil Frutas cítricas (laranja,
(hesperidina lipídico e redução limão, nectarina e
e naringerina) do risco de doenças tangerina)
cardiovasculares

Flavonóis Atividade antioxidante Brócolis, cebola,


(quercitina e e anti-inflamatória, me- chá-preto, couve, goji
rutina) lhora do perfil lipídico e berry, maçã, morango
redução do risco de do- e uva
enças cardiovasculares

(Continua)
8 Alimentos funcionais e as perspectivas de inovação

(Continuação)

Quadro 1. Principais compostos bioativos e suas funções no organismo

Composto
Classe Funções Fontes
bioativo

Isoflavonoi- Redução do Soja e inhame


des (daidzeín, risco de doenças
genisteína e cardiovasculares,
Flavonoi- gliciteína) cânceres (mama
des e próstata) e
osteoporose. Auxílio
nos sintomas de
menopausa

Probióticos Equilíbrio da flora Leites fermentados,


(bifido- intestinal, prevenção iogurtes e outros
bactérias e de constipação, produtos lácteos
lactobacilos) modulação do enriquecidos
sistema imunológico
e redução do risco de
câncer de cólon

Prebióticos Fornecimento de Alho, alcachofra, cebola,


(oligossaca- substrato para a chicória, aveia, biomassa
Microbi- rídeos – FOS, microbiota do cólon e de banana-verde, feijão
óticos lactulose modulação do cresci- cozido, batata yacon e
e rafinose; mento de microrga- fécula de mandioca
polissacarí- nismos, mantendo a
deos – inu- saúde da flora intes-
lina e amido tinal, modulação do
resistente) sistema imunológico

Simbióticos Combinação de Iogurtes, bebidas


probióticos com lácteas fermentadas,
prebióticos fármacos e suplementos
alimentares

Fibras Melhora do Vegetais folhosos, frutas


alimentares funcionamento (com casca e bagaço),
intestinal, da atividade legumes, leguminosas
Fibras
hipocolesterolêmica (soja, feijão, lentilha),
alimen-
e atividade cereais integrais (aveia,
tares
hipoglicemiante, centeio, cevada)
redução do risco de
câncer de cólon

(Continua)
Alimentos funcionais e as perspectivas de inovação 9

(Continuação)

Quadro 1. Principais compostos bioativos e suas funções no organismo

Composto
Classe Funções Fontes
bioativo

Ácidos gra- Redução do Azeite de oliva, abacate,


xos monoin- risco de doenças açaí, buriti e oleaginosas
saturados cardiovasculares, (nozes, amêndoas,
redução do LDL e castanhas)
aumento do HDL

Fitoesteróis Atividade Óleos vegetais,


(sitoesterol, hipocolesterolêmica, oleaginosas e
campesterol reduzindo a absorção margarinas enriquecidas
e estigmaes- do colesterol
Ácidos terol) plasmático
graxos e
lipídeos Ômega 3 Redução do Linhaça e peixes
risco de doenças de água fria (atum,
cardiovasculares, arenque, sardinha,
anti-inflamatório, salmão)
anti-hipertensivo e
redução do LDL

Ômega 6 Redução do Azeite de oliva, óleos


risco de doenças vegetais, sementes de
cardiovasculares e gergelim e oleaginosas
redução do LDL

Alicina Antiaterogência, Alho e cebola


antibactericida,
anti-hipertensiva,
antiviral, redução
do risco de câncer
Com- (principalmente de
postos estômago) e dos níveis
sulfora- de colesterol
dos Isotiocianato Antibactericida, Vegetais crucíferos
e indóis desintoxicação (alcaparra, brócolis,
hepática e redução do couve-flor, couve-
risco de carcinogênese -de-bruxelas, couve,
(principalmente de rabanete e repolho)
mama)

Fonte: Adaptado de Giuntini (2018) e Souza e Martínez (2017).


10 Alimentos funcionais e as perspectivas de inovação

Além de verificar a comprovação da eficácia por meio de pesquisas cientí-


ficas, é importante ressaltar para os consumidores que os alimentos funcionais
devem fazer parte de uma alimentação equilibrada. Por exemplo, para que
um alimento funcional que atua na redução da absorção do colesterol tenha o
resultado esperado, sua ingestão deve estar associada a uma alimentação com
baixos teores de gordura saturada e colesterol (SOUZA; MARTÍNEZ, 2017).

Ocasionalmente, os alimentos funcionais são confundidos com os nutracêuticos, porém


são expressões distintas. Os primeiros são alimentos convencionais ou modificados
(enriquecidos/fortificados), enquanto os segundos compreendem produtos isolados
ou purificados de alimentos e são vendidos na forma de fármacos (comprimidos, pós,
cápsulas, pastilhas, etc.).

Para a indústria de alimentos, os alimentos funcionais têm deixado de ser


um nicho de mercado e se tornado uma categoria de consumo muito impor-
tante. O corante alimentício, por exemplo, representa a principal utilização dos
carotenoides por essas indústrias, substituindo os corantes artificiais, como
no caso da empresa BASF®, que dispõe de um portfólio de carotenoides para
conferir colorações que vão do amarelo aos tons avermelhados, passíveis de
aplicação em alimentos como margarinas, bebidas e massas alimentícias.
Já os flavonoides, além de utilizados como pigmentos (antocianidinas em
sucos de frutas e vinhos), são empregados como aromatizantes, principalmente
aqueles encontrados na cebola e na maçã.
Alimentos funcionais e as perspectivas de inovação 11

3 Desenvolvimento de produtos com


alegação funcional
Nos últimos anos, os consumidores foram testemunhas do surgimento de
diversos produtos nas prateleiras dos supermercados, principalmente alimen-
tares com a promessa de contribuir na busca por uma vida mais saudável.
E isso a partir da demanda por ingredientes funcionais, pelo uso de ingredientes
e insumos sustentáveis e pelo comportamento atual dos consumidores, que
necessitam de produtos inovadores. Para a indústria de alimentos, há 20 anos a
percepção de inovação era muito mais simplória do que as necessidades atuais,
em geral como a criação de um sabor diferente e o prolongamento da vida útil
dos produtos, enquanto hoje a inovação esperada pelos consumidores consiste
na elaboração de um produto melhor e que promova uma melhor qualidade
de vida. A inovação é a chave do sucesso das empresas de alimentos nos dias
atuais. Com a mudança do perfil de consumo, optando por alimentos mais
saudáveis, as grandes empresas foram pegas de surpresa, e a participação de
seus produtos que figuravam na liderança do segmento alimentício no mer-
cado sofreu um declínio, perdendo espaço para produtos naturais e pequenas
empresas (SILVA, 2014).
A necessidade dos consumidores por alimentos mais saudáveis vem es-
timulando o desenvolvimento de novos produtos com melhores qualidades
nutricionais e ingredientes com alegações funcionais, cenário em que os ali-
mentos funcionais se tornam uma tendência, em breve suprindo o mercado com
uma maior diversidade de alimentos com alegações funcionais possíveis, para
atender aos diversos segmentos existentes de consumidores (idade, condições
de saúde, objetivo almejado, entre outras características). Entre os principais
alimentos funcionais encontrados nos supermercados, podemos citar iogurtes,
leites fermentados, margarinas, cereais e águas minerais. No mercado bra-
sileiro, um segmento com potencial desenvolvimento é o de bebidas prontas
para o consumo e bebidas lácteas, como leites fermentados e iogurtes, aos
quais normalmente são adicionados de probióticos, como visto no Quadro 2.
12 Alimentos funcionais e as perspectivas de inovação

Quadro 2. Produtos lácteos funcionais

Denominação Probiótico
Categoria Marca
de venda adicionado

Yakult Yakult L. casei


Shirota

Nestlé Chamyto L. johnsonii


L. helveticus

Parmalat Leite fermentado L. casei


Leite fermentado
B. lactis
L. acidophilus

Vigor Vigo L. casei


L. acidophilus

Batavo Batavinho L. casei

Batavo Iogurte Biofibras L. lactis


L. acidophilus

Iogurte Parmalat Dietlac L. lactis


L. acidophilus

Danone Activia B. animalis

Fonte: Adaptado de Oliveira et al. (2002).

Entre os alimentos funcionais, um dos que mais vêm ganhando destaque


no desenvolvimento de novos produtos na indústria de alimentos é a biomassa
de banana-verde, rica em amido resistente e que auxilia no controle da glicose
sanguínea. A empresa Fruto das Mãos, por exemplo, criou um nhoque de bio-
massa de banana-verde pronto para o cozimento, e a rede de lojas por franquia
Mundo Verde elaborou uma farinha de banana-verde (Figura 2).
Alimentos funcionais e as perspectivas de inovação 13

Figura 2. Nhoque de biomassa de banana-verde ela-


borado pela empresa Fruto das Mãos.
Fonte: Nhoque... (2020, documento on-line).

Outra tendência de uso de alimentos funcionais na indústria alimentícia e


na gastronomia são as plantas alimentícias não convencionais (PANCs), mais
reconhecidas como daninhas ou “mato”, mas que apresentam uma ampla
utilização na alimentação, normalmente com maiores teores de nutrientes que
as plantas convencionais. Uma das representantes das PANCs mais utilizadas
é a ora-pro-nóbis, que, além do alto teor de proteínas, é rica em fibras e tem
atividade antioxidante. O consumo de suas folhas pode ser in natura ou em
receitas como refogados, omeletes, molhos e bolos. Já na indústria, sua farinha
tem maior uso, podendo ser adicionada a diversas preparações.
A indústria alimentícia precisa ser inovadora em seus produtos funcionais
e, para que isso ocorra de maneira satisfatória, torna-se imprescindível acom-
panhar as tendências do mercado atual de seus consumidores. Como algumas
tendências, podemos citar as seguintes.
14 Alimentos funcionais e as perspectivas de inovação

„„ Cura no alimento: além de nutrir os seus consumidores, o alimento


deverá estar adequado às novas demandas do envelhecimento, corro-
borado com DCNT como a obesidade.
„„ Mesmo produto, mas diferente: a reformulação dos alimentos já exis-
tentes é fundamental, substituindo ingredientes não muito desejáveis,
como açúcares e gorduras trans, e adicionando outros que agreguem
benefícios, como proteínas.
„„ Menos proteína animal: uma forte tendência atual consiste no flexi-
tarianismo, que propõe a redução no consumo de produtos de origem
animal, como a campanha “Segunda sem carne”.

Porém, a indústria de alimentos funcionais também enfrenta algumas


dificuldades, principalmente no que tange ao estabelecimento de novos nichos
de mercados, à dificuldade na obtenção de novos ingredientes em quantidade
industrial e à morosidade na liberação do uso e da reivindicação de alegações
funcionais junto aos órgãos competentes. Ainda assim, a questão essencial da
viabilidade de um alimento funcional reside em sua aceitação consciente de
consumo. Em países da Europa, por exemplo, o mercado de bebidas lácteas
funcionais está saturado e os consumidores têm se deslocado para produtos
como bebidas proteicas e águas funcionais (BALDISSERA et al., 2011).

BALDISSERA, A. C. et al. Alimentos funcionais: uma nova fronteira para o desenvolvimento


de bebidas proteicas a base de soro de leite. Semina: Ciências Agrárias, Londrina, v. 32,
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BRASIL. Ministério da Saúde. Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Resolução
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Disponível em: https://www.gov.br/agricultura/pt-br/assuntos/inspecao/produtos-
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Acesso em: 19 out. 2020.
CANÃS, G. J. S.; BRAIBANTE, M. E. F. A química dos alimentos funcionais. Química Nova
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Alimentos funcionais e as perspectivas de inovação 15

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www.vegin.com.br/nhoque-500g-fruto-das-mao. Acesso em: 19 out. 2020.
OLIVEIRA, M. N. et al. Aspectos tecnológicos de alimentos funcionais contendo probióti-
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https://www.embrapa.br/busca-de-publicacoes/-/publicacao/886048/alimentos-
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Leituras recomendadas
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Sciences Institute do Brasil, 2013. 35 p. Disponível em: https://ilsibrasil.org/publication/
probioticos-prebioticos-e-a-microbiota-intestinal/. Acesso em: 19 out. 2020.
BRASIL. Ministério da Saúde; UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS. Desmistificando
dúvidas sobre alimentação e nutrição: material de apoio para profissionais de saúde.
Brasília: Ministério da Saúde, 2016. 164 p. Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/
publicacoes/desmistificando_duvidas_sobre_alimenta%C3%A7%C3%A3o_nutricao.
pdf. Acesso em: 19 out. 2020.
COSTA, N. M. B.; ROSA, C. O. B. Alimentos funcionais: componentes bioativos e efeitos
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SAVIOLI, G.; CALEFFI, R. Escolhas e impactos: gastronomia funcional. 12. ed. São Paulo:
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ZYLBERGELD, B. Probióticos: um universo em pé de guerra. Humanas Alimentar, São
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16 Alimentos funcionais e as perspectivas de inovação

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