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Table of Contents

Dedicatória

Agradecimentos

Introdução

Parte I Introdução à Medicina Legal

1 - ESTRUTURA DO APARELHO ESTATAL PARA A MANUTENÇÃO DA ORDEM ENTRE AS PESSOAS

2 - A PERÍCIA MEDICO-LEGAL

3 - O PERITO MÉDICO-LEGISTA

4 - O LAUDO MÉDICO LEGAL

Parte II Perícia no vivo

5 - EXAME DE LESÕES CORPORAIS

6 - EXAME COMPLEMENTAR

7 - JUIZADOS ESPECIAIS CÍVEIS E CRIMINAIS

8 - EXAME AD CAUTELAM

9 - SEXOLOGIA FORENSE

10 - EXAME MÉDICO-LEGAL PARA VERIFICAÇÃO DE EMBRIAGUEZ

11 - PRÁTICA DE PSIQUIATRIA FORENSE

Parte III Perícia no morto

12 - NECROSCOPIA

13 - A DECLARAÇÃO DE ÓBITO (DO)

Parte IV Perícia de laboratório

14 - GENÉTICA FORENSE

REFERÊNCIAS
Chu-En-Lay Paes Leme
MEDICINA LEGAL PRÁTICA COMPREENSÍVEL

1ª Edição

Barra do Garças-MT

Edição do autor

2010
© by Chu-En-Lay Paes Leme

Capa: Yan-Rhao Alencar Paes Leme

Projeto gráfico: Marcia Lezita

Revisão: Divina Maria de Queiroz e Eurípedes Amaro dos Santos

Impressão e Acabamento: Scala Gráfica e Editora

Colaboradores:

Aluisio Trindade Filho


* Médico Legista do Instituto de Medicina Legal Leonídio Ribeiro, Brasília-DF

* Ex-diretor Adjunto do Instituto de Pesquisa de DNA Forense da Polícia Civil do Distrito Federal

* Especialista em Genética Médica pela Universidade de Brasília – UnB

Maria Christina da Silva Sá


* Médica Legista lotada no setor de Psicopatologia Forense do Instituto de Medicina Legal
Leonídio Ribeiro, Brasília-DF

* Especialista em Medicina Legal e em Psiquiatria pela Associação Médica Brasileira

* Especialista em Medicina do Trabalho pela Universidade de Brasília – UnB

* Preceptora de Psiquiatria Forense da Residência Médica do Hospital São Vicente de Paulo da


Secretaria de Estado de Saúde do Distrito Federal, Brasília-DF

* Médica lotada na Gerência de Saúde Mental da Secretaria de Estado de Saúde do Distrito


Federal, Brasília-DF

Venilton Francisco Melo Sá


* Médico Legista lotado no setor de Psicopatologia Forense do Instituto de Medicina Legal
Leonídio Ribeiro, Brasília-DF

* Especialista em Medicina Legal pela Associação Médica Brasileira

* Médico lotado na Gerência de Saúde Mental da Secretaria de Estado de Saúde do Distrito


Federal, Brasília-DF
Dedicatória

À memória de meus pais, Sebastiana de Sousa Martins e Luiz Dias Paes Leme, a minha
gratidão pelo prumo que me deram e minha saudade.

À Márcia, minha companheira, e aos nossos filhos, Kim-Rhao e Yan-Rhao, pela


oportunidade de sermos cúmplices na jornada de nossas vidas. Essa oportunidade é a minha
aventura maior, cheia de sonhos, preocupações, alegrias e felicidade.

Aos colegas médicos-legistas plantonistas que, anonimamente, mesmo acuados muitos


deles, por baixa remuneração, sucateamento das instalações físicas e dos equipamentos, falta
de material e de pessoal – um retrato do abandono por parte dos governantes – continuam,
bem ou mal, realizando as perícias solicitadas, e, apesar de toda adversidade, são os
responsáveis pelo funcionamento da Medicina Legal no nosso país.

Ao cadáver, companheiro resignado de muitas horas do meu tempo, que, com o seu
silêncio, tanto diz e me ensina sobre a vida. Obrigado!
Agradecimentos

Aos colegas, Drs. Wanderley Souza da Silva, diretor do IML de São Luís-MA, e José Ribamar
Moraes, médico-legista do IML de São Luís-MA, que tiveram a delicadeza de sugerir o meu
nome para participar como um dos professores do Curso de Formação para médico-legista,
ministrado pela Academia de Polícia do Estado do Maranhão, nos meses de junho a agosto de
2008, na cidade de São Luís, atividade que me honrou e que me despertou para outros
horizontes.

Ao me preparar para atender o conteúdo que iria abordar e, durante o convívio com os
colegas que estavam fazendo o curso, surgiu-me a nítida percepção da distância que separa a
doutrina da prática médico-legal. Isto acendeu em mim a possibilidade de escrever algo em que
pudesse tentar colaborar para diminuir tal distância. Esse pensamento ganhou vida e, movido
por ele, me propus a começar a escrever este texto.

Aos colegas, Drs. Venilton Francisco Melo Sá, Maria Christina da Silva Sá e Aluisio Trindade
Filho, que prontamente aceitaram colaborar com esta empreitada e se dispuseram a
abrilhantá-la, escrevendo capítulos para os quais eu não poderia contribuir por absoluta falta
de domínio do seu conteúdo.

Ao Dr. Malthus Fonseca Galvão, Diretor do IML de Brasília-DF, por ter cedido, do seu
arquivo pessoal, algumas ilustrações fotográficas que foram utilizadas no presente texto.

Aos colegas, Drs. Joaquim José Marques da Silva e José Jorge Gonçalves Anchieta, que,
como alunos do curso de formação para médico-legista, em São Luís-MA e já como causídicos,
justificaram, para mim, o porquê do conteúdo do terceiro quesito do laudo de lesão corporal,
que está abrigado no art. 61 do CP.

Ao Dr. Décio Ernesto de Azevedo Marinho, do IML de Goiânia-GO; ao Dr. Jorge Caramuru,
do IML de Cuiabá-MT; ao Dr. Edmilson Mendes Coutinho, do IML de Brasília-DF; ao Dr. Antonio
Pedro Jardim e ao Administrador Sr. Humberto Rautenberg, do IML de Cabo Frio-RJ; aos Drs.
José Eduardo Velludo e José Arnaldo Damião Melki, do IML de Ribeirão Preto-SP; ao Dr.
Francisco Hugo Leandro, do IML de Fortaleza-CE; à Dra. Rita de Cássia Monteiro de Carvalho, do
IML de Salvador-BA que, generosamente, me receberam e me franquearam o acesso aos laudos
médico-legais daquelas instituições.

À Dra. Débora Maria Vargas Lima e à Dra. Helena Hubert Silva, do IML de Porto Alegre-RS
que, gentilmente, me enviaram cópias de alguns laudos lá realizados.

Com a colaboração desses colegas, foi possível ter uma visão de como estamos, hoje,
elaborando os nossos laudos, no Brasil e, partindo dessa realidade, achei que poderia, de
alguma forma, ser útil, este modesto relato de como fazer a perícia médico-legal.
Sumário

PARTE I - INTRODUÇÃO À MEDICINA LEGAL

Capítulo 1
Estrutura do Aparelho Estatal para a Manutenção da Ordem entre as Pessoas.

Capítulo 2
A Perícia Médico Legal.

• Corpo de Delito.

• O que é o exame direto de corpo de delito?

• O que é o exame indireto do corpo de delito?

Capítulo 3
O Perito Médico-Legista.

• As partes envolvidas na Perícia Médico Legal.

Capítulo 4
O Laudo Médico-Legal.

• Quesitos Oficiais Para Serem Respondidos nas Principais Perícias Médico-Legais.

PARTE II - PERÍCIA NO VIVO

Capítulo 5
Exame de Lesões Corporais.

Agentes Vulnerantes.

Instrumentos:

1. Contundentes.

Rubefação, Escoriação, Edema Traumático, Equimose, Hematoma, Lesões Contusas


Fechadas, Lesões Contusas Abertas.

2. Cortantes.

3. Perfurantes.

4. Cortocontundentes.

5. Perfurocortantes.

6. Perfurocontundentes.
Tiro Encostado.

Câmara da mina de Hoffman, Sinal de Benassi, Sinal de Wekgaertner.

Tiro a curta distância.

Tiro a distância.

Ferida de saída do projétil de arma de fogo.

Meios Vulnerantes.

1. Meios Físicos.

• Energia Térmica.
Termonoses, Queimaduras, Geladuras.
• Energia Elétrica.
Energia Elétrica Cósmica (Natural), Energia Elétrica Artificial.

Energia Radioativa.

2. Meios Químicos.

• Cáusticos.
• Venenos.

3. Meio Físico-Químico.

4. Meio Biodinâmico.

5. Meio Bioquímico.

6. Meio Misto.

Avaliação da repercussão temporária ou permanente da ofensa produzida pelo agressor no


organismo da vítima.

Perigo de vida.

Incapacidade para as ocupações habituais por mais de 30 (trinta) dias.

Debilidade permanente de membro, sentido ou função, ou aceleração de parto.

Incapacidade permanente para o trabalho.

Enfermidade incurável.

Perda ou inutilização de membro, sentido ou função.

Deformidade permanente.
Aborto.

Mapas para ilustrar a localização das lesões no corpo humano.

Concausas.

Laudo do Exame de Lesões Corporais.

Capítulo 6
Exame Complementar.

Laudo Complementar do Exame de Lesão Corporal.

Prazo médio de cura das fraturas simples.

Exemplo de Laudo de Lesão Corporal.

Capítulo 7
Juizados Especiais Cíveis e Criminais.

Capítulo 8
Exame ad cautelam.

Exemplos de Laudos de Exame de Lesão Corporal.

Capítulo 9
Sexologia Forense.

Legislação.

Nos crimes sexuais o que a lei espera que a perícia esclareça?

1. Se houve conjunção carnal, e ou outro ato libidinoso, praticados contra a vontade da vítima.

1a. Faz parte dos elementos do crime de estupro a conjunção carnal involuntária. Este é um dos
vestígios a ser encontrado.

O que é a conjunção carnal?

Quais são os vestígios da conjunção carnal?

Rotura himenal, presença de espermatozoide na vagina, presença de DNA de origem


masculina, presença de fosfatase ácida prostática, presença do PSA no conteúdo vaginal,
gravidez.

1b. É, também, elemento do crime de estupro a prática de outro ato libidinoso, involuntário.

O que é outro ato libidinoso?

2. O outro elemento do crime de estupro é o emprego de violência.


3. Avaliar se, do emprego dessa violência, resultou para a vítima lesão-corporal de natureza
grave, ou se ela é menor de 18 e maior de 14 anos.

4. É também elemento do crime de estupro a grave ameaça.

5. Faz parte da perícia informar se a vítima da prática libidinosa criminosa é vulnerável (crime
qualificado).

6. Faz parte da perícia informar se, da prática libidinosa criminosa, resultou, para a vítima,
gravidez.

7. Se o agressor transmitiu à vítima doença sexualmente transmissível (DST).

Laudo do Exame de Práticas Libidinosas.

Quesitos Para o Exame de Práticas Libidinosas.

Oficina para treinamento na execução do exame e elaboração do Laudo Médico-Legal nos


crimes sexuais.

Capítulo 10
Exame Médico-Legal para a verificação de embriaguez.

Legislação.

• Embriaguez, o que é?

• Formas de embriaguez.

• Classificação da embriaguez.

• Grau de embriaguez.

• Alterações provocadas pela intoxicação alcoólica aguda.

Laudo do Exame de Embriaguez.

O álcool e o Código de Trânsito Brasileiro.

Legislação, margens de tolerância de álcool por litro de sangue.

Capítulo 11
Prática de Psiquiatria Forense.

Apresentação.

1. História da Psiquiatria Forense.

2. Introdução.

3. Linguagem Jurídica.
Doença mental, perturbação da saúde mental, desenvolvimento mental incompleto,
desenvolvimento mental retardado, intervalo lúcido, exame toxicológico, exame de
dependência toxicológica, responsabilidade e imputabilidade, capacidade de
entendimento, capacidade de autodeterminação, periculosidade, medida de segurança,
medida sócioeducativa.

4. Perícia Psiquiátrica.

• Quem solicita a perícia.

• Quando se solicita a perícia.

• Características do laudo psiquiátrico.

5. Doença Mental.

Exemplo de laudo de:

• Caso de doença mental guardando nexo causal com o delito.

• Caso de doença mental sem nexo causal com o delito.

6. Perturbação da Saúde Mental.

Exemplo de laudo de caso de transtorno de personalidade semi-imputável.

Pedofilia.

Exemplo de laudo de caso de cessação de periculosidade de um pedófilo.

7. Desenvolvimento Mental Incompleto.

8. Desenvolvimento Mental Retardado.

9. Dependência de Droga.

Exemplo de laudo de:

• Caso de não dependente de droga.

• Caso de dependente de droga.

10. Simulação de Doença Mental.

Exemplo de laudo de caso de simulação de doença mental.


PARTE III - PERÍCIA NO MORTO

Autópsia (lições da sua mesa) poesia.

Capítulo 12
Necroscopia.

Mecanismos que provocam a morte.

Comprovação da morte.

1. Fenômenos Cadavéricos Consecutivos.

Resfriamento do corpo, evaporação tegumentar, rigidez cadavérica, livores da hipóstase.

2. Fenômenos Cadavéricos Transformativos Destrutivos.

Putrefação, fase da coloração, fase gasosa, fase coliquativa, fase de esqueletização,


maceração.

3. Fenômenos Cadavéricos Transformativos Conservadores.

Mumificação, saponificação.

Estimativa do tempo de morte.

Exame do cadáver.

Necropsia facultativa.

Necropsia obrigatória.

Necropsia médico-legal.

Finalidade, legislação, são elementos do crime de homicídio.

Estrutura do Laudo de Necropsia.

a) Preâmbulo.

b) Quesitos.

c) Histórico.

d) Descrição.

• Apresentação do corpo.

• Identificação do corpo.

• Sinais de morte.
• Estimativa da data provável do óbito.

• Exame externo.

• Exame interno.

• Cavidade craniana.

• Cavidades torácica e abdominal.

e) Discussão ou Comentários.

f) Conclusão.

g) Resposta aos Quesitos.

• Necropsia em cadáveres vítimas de asfixia.

• Alterações externas observadas.

• Alterações internas observadas.

• Lesões observadas em vítima de enforcamento.

• Lesões observadas em vítima de estrangulamento.

• Lesões observadas em vítima de esganadura.

• Lesões observadas em vítima de obstrução mecânica das vias aéreas.

• Lesões observadas em vítimas de asfixia por compressão torácica.

• Lesões observadas em vítimas de soterramento.

• Lesões observadas em vítimas de afogamento.

• Lesões observadas em vítima de sufocação.

Exemplos de Laudo de Necropsia.

Capítulo 13
A Declaração de Óbito (DO).

Óbitos decorrentes de causas internas, quem deve emitir a DO?

Lembretes importantes.

Óbitos decorrentes de causas externas, quem deve emitir a DO?

Legislação.
Como Preencher o campo 49 do bloco VI da DO?

Como preencher a DO?

Exemplo de como preencher o campo 49 do bloco VI da DO.

PARTE IV - PERÍCIA DE LABORATÓRIO

Capítulo 14
Genética Forense.

Legislação.

Introdução.

Perspectiva histórica.

DNA - estrutura, função e modo de herança.

Metodologia de análise do DNA com fins forenses.

Formalidades.

Cuidados com a coleta e preservação.

O que e como coletar.

Procedimentos laboratoriais.

Quantificação.

Amplificação.

Eletroforese.

Leitura dos resultados.

Origem das perícias.

Exame na esfera criminal.

Tipos de Análises.

Vínculo genético.

Identidade entre amostras.

Interpretação dos resultados.

Análise de vínculo genético de paternidade.

Índice de paternidade.
Probabilidade de Paternidade.

Probabilidade de Exclusão.

Análise em Identidade entre amostra.

Banco de dados de Frequência Alélica e Frequência Alélica Mínima.

Banco de dados de DNA Criminal.

Marcadores não autossômicos.

DNA Mitocondrial (mDNA).

Cromossomo Y.

Cromossomo X.

Mutação.

Mistura.

Modelos de Laudos de Exame de DNA.

REFERÊNCIAS.
Introdução

A Medicina Legal é ciência e arte que está em franco desenvolvimento com o advento de
modernas tecnologias e o aporte de novos conhecimentos que constantemente lhe são
incorporados. Isso permite que se adquira mais e mais segurança e entendimento de como
realizar, com melhor acurácia, o trabalho dentro desse imenso campo de ação.

Diariamente os médicos-legistas são incitados pelas inúmeras requisições de perícias


solicitadas pelas autoridades competentes, a lhes dar uma resposta clara, objetiva, concreta,
técnica e que seja útil à justiça.

Cada perícia, pelas suas particularidades, se constitui numa tarefa diferente da anterior,
representa um quebra-cabeça novo a ser montado, o que torna a Medicina Legal uma atividade
desafiadora e, por isso, apaixonante.

O autor iniciou o seu contato com essa ciência, em 1982, e por concurso público ingressou,
em 1984, como perito médico-legista no IML Leonídio Ribeiro de Brasília-DF.

Ali teve a oportunidade, o privilégio, a sorte de integrar a escala de plantão do Professor


Hermes Rodrigues de Alcântara, que, no dia a dia, edificou a sua condição de Mestre. Um
exemplo de integridade, de competência, de dignidade, de honradez, de companheirismo, de
amor à Medicina Legal. Esse convívio se estendeu até 1987, quando ele se aposentou e, é claro
que, com o seu exemplo, influenciou todos os legistas daquela instituição.

Ao ingressar como legista, o autor, após concluir o Curso de Formação para Médico-
Legista, ter estudado livros-texto sobre Medicina Legal, para sua surpresa, não sabia fazer uma
só perícia, por mais simples que fosse. Percebeu, então, que há uma distância considerável
entre a doutrina e a prática dessa ciência.

Diante das dificuldades para realizar suas perícias, passou a ter um contato maior com o
Código Penal, com o Código de Processo Penal e com os textos de Medicina Legal. Iniciou,
também, a discutir nos plantões, com os colegas, os pontos que geravam dúvidas na realização
do trabalho. Por isso é grato a eles que, com paciência e tolerância, contribuíram para melhorar
o seu entendimento de como conduzir a perícia.

A sua gratidão aos colegas: Abelardo de Brito, Ricardo Miguel Mechica, Maria Leonor Khun,
Hélcio Miziara, Euler Vidigal, Aluisio Trindade Filho, Balbino Gonçalves dos Santos, Paulo
Mendes Diniz, Elói Michelis, Flávio Luiz Fag-giane, Ignácio John, Luís Carlos Galli, Baelon Pereira
Alves, Ricardo Cortes de Oliveira, Carlos Henrique Azevedo, Erasmo Tokarski, José Eduardo Reis,
Eneida Maria Fontes, Edwilson da Silva Costa, Eduardo Vasconcelos, Hildeci Rezende, José
Ribamar Malheiros, Mírcio Antônio Alves, Simão Hatakeyama, Anelino José de Rezende, Áurea
Cherulli, Carlúcio Moura Leão, Cristiane Alves Costa, Alexandre Cavalcante, Alexandre Riciardi,
Arquimedes T. da Silva, Edmilson Mendes Coutinho, Joel de Souza Matos, José Flávio Bezerra,
José Ribamar Machado Filho, Margarida Serejo Machado, Marcelo de Magalhães Alves, Ricardo
César Frade Nogueira, Roberto Ferreira Wanderley, Ronaldo Antônio da Silva, Venilton
Francisco Melo Sá, Maria Christina da Silva Sá, Luiz Carlos Garcez Novais, Elvis Adriano Oliveira,
Francisco Antônio de Moraes Neto, Hyung Il Pak, Paulo César D. Oliveira, João Paulo Molina,
Lúcio Henrique da Silva Fonseca, Manoel Santos Modelli, Marise Helena Frigine, Nivaldo Pereira
Alves, Monique Pereira Medeiros, Vilson de Matos Lima, Volnei Paulino Ferreira Mendes,
Walbert Linhares, Roberto Moreira da Silva, Simone C. Rosa, Sérgio de Castro Cunha Júnior,
Samuel Teixeira Gomes Ferreira, Rodolfo de Paula Gomes, Malthus Fonseca Galvão, Luciana
Satie Gurgel, José Gerardo Pierre Filho, José Damião Júnior, Francisco Antônio da Costa,
Cristofer Diego Beraldi Martins e Ana Lúcia Silva Neto.

E de Barra do Garças-MT, a sua gratidão aos colegas: Kleide Coelho de Lima, João Bosco
Martins Morbeck, José Maria Alves Vilar, João Batista Sá, Valdo de Sousa e Primo Deliberali.

Durante os plantões, de forma generosa, alguns colegas o chamavam para ver e, por vezes,
opinar sobre aqueles casos mais difíceis; isso lhe propiciou o contato com perícias de maior
complexidade, o que contribuiu para enriquecer a sua experiência.

Além disso, o autor foi contemporâneo de uma fase criativa, de uma onda inovadora no
IML do Distrito Federal, quando os legistas implementaram mudanças no seu funcionamento e
lhe deram uma envergadura, para alçar vôos de maior alcance.

Cita a criação do Laboratório de Antropologia Forense, no final da década de 80, cuja


iniciativa se deveu ao esforço e à determinação dos Drs.: José Eduardo Reis, Aluisio Trindade
Filho e Balbino Gonçalves dos Santos, que, com recursos do próprio bolso, montaram, deram
vida e nome ao projeto que, atualmente, ocupa um lugar de importância no cenário nacional e
que está sob a direção do Dr. Ricardo César Frade Nogueira. Participou com o Dr. Ricardo
Cortes de Oliveira, também patologista, da criação do Laboratório de Patologia Forense, no ano
de 1994 e que está, hoje, sob a direção da Dra. Áurea Cherulli, médica-legista e patologista. A
instalação do Laboratório de Toxicologia Forense, durante a gestão do Dr. José Eduardo Reis, e
que teve a colaboração e o comprometimento dos Drs. Edwilson da Silva Costa e Eduardo
Vasconcelos, sendo, hoje, dirigido pelo Dr. Nivaldo Pereira Alves. A divisão das perícias no vivo
e no morto, com equipes próprias para cada uma delas, implementadas na gestão da Dra.
Cristiane Alves Costa, que também informatizou o IML com a digitação do laudo feita pelo
próprio legista, o que resultou na sua liberação no mesmo dia em que era realizada a perícia.
Com tais mudanças, o IML passou a desfrutar de um conceito excelente dentro do complexo da
Polícia Civil do Distrito Federal.

Relata esses fatos porque o tempo passa e, se não anotados, serão esquecidos, e o que se
esquece não tem vida, perde-se, é como se nunca houvesse existido. A realidade, hoje
disponível, alicerça-se no que se fez no passado e operar a mudança requer: sonhos, coragem,
determinação, desprendimento, colaboração, empenho, boa vontade e generosidade.

O autor não é professor de Medicina Legal. É um médico-legista plantonista, como muitos


outros, que, ao longo de 26 anos, exerce seu trabalho nas salas de exame do IML, realizando
perícias no vivo e no morto. Desde o primeiro dia, deparou-se com as suas limitações para
desempenhar, com desembaraço, tal função; mas, durante todo esse tempo, tem se esforçado
para compreender como fazer, com segurança, cada exame solicitado. Para isso observou que é
necessário romper com as formas viciosas, superficiais, automáticas, mecânicas de realizar a
perícia. É imperioso dar nascimento, no lugar do médico-perito que cada um abriga dentro de
si, ao perito médico-legista, cuja visão alcança o que a lei espera do seu trabalho, que é
absolutamente diverso do daquele. Enquanto este novo ser não se forma, a atividade dentro do
IML, ao invés de prazerosa, apaixonante, é um verdadeiro martírio, porque é feita envolta em
dúvidas, incertezas e angústias.

Muitas são as dificuldades e dúvidas. Algumas delas: Qual é o papel da perícia? Qual é a
função do perito? O que cabe a ele fazer? Os quesitos propostos orientam a perícia? O que a lei
espera que o perito atenda? Como fundamentar com clareza e lógica o laudo? Com qual
linguagem deve-se redigi-lo? O que é preciso para planejar cada exame? Como atender a uma
requisição de exame malfeita?

O autor, após os anos de vivência dentro do IML, com a colaboração de muitos colegas,
adquiriu, a seu juízo, e pode estar equivocado, um pouco de entendimento de como conduzir
as suas perícias.

Visitou alguns Institutos de Medicina Legal para verificar de que maneira os laudos estão
sendo elaborados, hoje, no nosso país. Esteve no IML das seguintes cidades: Goiânia-GO;
Cuiabá-MT; Brasília-DF ; Cabo Frio-RJ; Ribeirão Preto-SP; Fortaleza-CE; Salvador-BA e recebeu
laudos elaborados no IML de Porto Alegre-RS.

Após a constatação de como os laudos estão sendo elaborados, achou que seria útil relatar
o seu ponto de vista construído nos anos em que atua como perito médico-legista.

Por essa razão, nasceu a idéia de produzir este texto, no formato de um manual, que não
tem a pretensão de ser um livro de Medicina Legal, pois já há muitos e bons que atendem a
este propósito; porém que fosse um apanhado, com enfoque prático, mais voltado para os
exames na esfera criminal, que pudesse contemplar a rotina do dia a dia do IML, aqueles casos
corriqueiros que constituem o grande volume do trabalho. Não privilegiou, aqui, as perícias de
maior complexidade, porém se preocupou em fazer uma abordagem da perícia na qual a
distância entre a doutrina e a prática fosse menor e de fácil entendimento.

O texto, mesmo com suas limitações, almeja colaborar para que o iniciante no campo
médico-legal possa tornar-se um perito médico-legista, ao compreender o que fazer, por que
fazer e como fazer a perícia. Objetiva, também, e este é um sonho a ser realizado por todos os
que desempenham a atividade de médico-legista, propor, pelo menos para início da sua
realização, uma sugestão de padronização da atividade pericial que abrangesse o seu
entendimento, a sua condução, a redação dos laudos, a uniformização dos quesitos oficiais e a
maneira de respondê-los.

O autor é ciente de que não é detentor da verdade e se propõe apenas a expor o seu
entendimento, o seu ponto de vista, a respeito da prática pericial. Reconhece que há inúmeros
colegas com mais conhecimentos, mais competência, mais experiência, mais capacidade
técnica que ele e os admira. No entanto, julgou oportuna a publicação deste modesto texto, na
esperança de que ele venha a ser útil aos estudantes de Medicina e de Direito, aos médicos que
possam ser nomeados para atuarem eventualmente como peritos ad hoc, aos médicos que se
iniciam, ou mesmo, exercem a Medicina Legal e a todos os operadores do Direito Penal. Sabe
da sua limitação e agradece sugestões ou críticas que possam aprimorá-lo.
Parte I
Introdução à Medicina Legal
1 - ESTRUTURA DO APARELHO ESTATAL PARA A MANUTENÇÃO DA
ORDEM ENTRE AS PESSOAS

Cabe ao Estado manter a harmonia de convivência das pessoas em sociedade e, para esse
fim, ao longo dos anos, busca aperfeiçoar a forma de cumprir esse objetivo. Estabelece, então,
por meio do Poder Legislativo, leis que regem a dita convivência e impõe sanções aos seus
infratores.

Instituiu o Poder Judiciário para julgar e punir os transgressores da norma legal; no


entanto, este Poder não foi constituído com a função de investigar a materialidade do delito,
nem a sua autoria. Necessário se fez recorrer à criação de outra instituição: o Ministério
Público, a quem cabe a função de, uma vez reunidas as evidências da prática da infração,
oferecer ao Judiciário a denúncia, conforme estabelece o art. 127 da Constituição Federal:

O Ministério Público é instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado,


incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e
individuais indisponíveis.

O Código de Processo Penal, em seu art. 257, orienta:

Ao Ministério Público cabe: promover, privativamente, a ação penal pública, na forma


estabelecida neste Código e fiscalizar a execução da lei.

Foi necessário, ainda, criar a Polícia Civil, sob a direção do delegado de polícia a quem, na
maioria das vezes, cabe abrir o inquérito policial para investigar se houve ou não a infração ao
dispositivo legal e, em havendo, encontrar o infrator, iniciando os passos que culminarão na
aplicação da lei, conforme dispõe o art. 4º do CPP que assim disciplina:

A polícia judiciária será exercida pelas autoridades policiais no território de suas


respectivas circunscrições e terá por fim a apuração das infrações penais e da sua autoria.

Aqui, de novo, esbarrou-se em mais uma dificuldade: como constatar tecnicamente que
alguém cometeu uma infração?

Dentro do diploma legal, no qual os delitos estão tipificados e, considerando as suas


particularidades, diversos são os campos do conhecimento que devem ser empregados na
produção da prova material de que ocorreu a infração à lei estabelecida. Para atender à
complexidade que envolve esse trabalho surgiu a perícia, cabendo a ela demonstrar,
tecnicamente, que houve a prática do delito. A confissão do acusado não supre essa
demonstração, conforme estabelece o art. 158 do CPP que disciplina:
Quando a infração deixar vestígios, será indispensável o exame de corpo de delito, direto
ou indireto, não podendo supri-lo a confissão do acusado.

A perícia é o início de todo o processo apurativo da infração, nos casos em que existam
seus vestígios, sendo necessário, por meio dela, demonstrá-los. Esta tarefa não pode ser
transferida a outra instituição, ela é da competência exclusiva da perícia.

O perito, na sua solidão, deve ter consciência de que o seu trabalho é relevante. Ele é a
base para que a justiça seja feita, razão pela qual tem o dever de fazê-lo da melhor forma, com
competência, com independência e com imparcialidade.

As infrações que são da responsabilidade do Estado apurar e, quando cabível, aplicar as


penas, com os atenuantes, os agravantes e os qualificadores estão anotadas no Código Penal
que no seu Art. 1º disciplina:

Não há crime sem lei anterior que o defina. Não há pena sem prévia cominação legal.

Sobre a definição do crime ainda orienta:

Relação de causalidade
Art. 13. O resultado, de que depende a existência do crime, somente é imputável a quem lhe

deu causa. Considera-se causa a ação ou omissão sem a qual o resultado não teria ocorrido.

Art. 14. Diz-se o crime:

Crime consumado
I - consumado, quando nele se reúnem todos os elementos de sua definição legal;

Tentativa
II - tentado, quando, iniciada a execução, não se consuma por circunstâncias alheias à vontade
do agente.

Crime impossível
Art. 17. Não se pune a tentativa quando, por ineficácia absoluta do meio ou por absoluta
impropriedade do objeto, é impossível consumar-se o crime.

Art. 18. Diz-se o crime:

Crime doloso
I - doloso, quando o agente quis o resultado ou assumiu o risco de produzi-lo;

Crime culposo
II - culposo, quando o agente deu causa ao resultado por imprudência, negligência ou imperícia.

Parágrafo único. Salvo os casos expressos em lei, ninguém pode ser punido por fato previsto
como crime, senão quando o pratica dolosamente.
Dessa maneira, o Código Penal contém os artigos que tipificam os crimes, bem como as
penas correspondentes a cada crime, sendo, portanto, um instrumento de cabeceira para a
atuação do perito que, antes de iniciar o exame, deverá ser informado sobre qual infração
ocorreu, conhecer quais são os elementos que a caracterizam, para, só assim, com segurança,
saber o que procurar.

A ação do Judiciário, do Ministério Público, da Polícia Civil e da Perícia, durante a apuração


da infração e de todo o desenrolar do processo penal, até o seu término, está disciplinada no
Código de Processo Penal, que é a cartilha que orienta como cada uma dessas instituições
procede, enquanto o trabalho é feito. Todas elas estão subordinadas às normas contidas no
citado Código, conforme orienta o art. 1º do CPP que desta maneira reza:

O processo penal reger-se-á, em todo território brasileiro, por este Código.

Ninguém poderá fugir dele, inventar procedimentos ou atropelar sua ordenação sob pena
de tornar nulo o ato. É, então, importante que o perito tenha conhecimento dessas orientações
para compreender como cada instituição pode atuar e não se sujeitar a desvios que possam ser
praticados à revelia da lei. Tal entendimento é imprescindível para executar seu trabalho com
maior lucidez, sabendo o que fazer, como fazer e por que fazer.
2 - A PERÍCIA MEDICO-LEGAL

Artigo 158 do Código de Processo Penal:

Quando a infração deixar vestígios, será indispensável o exame de corpo de delito, direto ou
indireto, não podendo supri-lo a confissão de acusado.

Este artigo é o norte da perícia. Ele sintetiza, num axioma, qual é o seu papel. Define, de
maneira inequívoca, que a incumbência da perícia é examinar o corpo de delito, sendo este
exame indispensável, mesmo diante da confissão do acusado. Condiciona a sua ação apenas às
situações em que a infração deixa vestígios. Diz que os vestígios, produzidos pela infração,
constituem, representam, configuram, o corpo de delito. Na ausência de vestígios do delito,
como é óbvio, não há como realizar a perícia, porque não há o que examinar.

A perícia é a instituição especializada em encontrar vestígios que obrigatoriamente


estejam relacionados com a infração, porque só eles têm interesse legal e representam a razão
de ser da perícia. Além disso, é sua atribuição estabelecer claramente o nexo causal entre os
vestígios encontrados e o delito, porque só assim produzirá a prova material da ocorrência do
crime. A perícia é o instrumento capaz de, tecnicamente, por meio do exame de corpo de
delito, demonstrar que houve a infração à norma legal, sendo esta demonstração
indispensável, porque ela é a base para iniciar o processo apurativo do delito e, até, para a
aplicação da pena.

CORPO DE DELITO
O que é objeto do exame pericial?

A matéria-prima sobre a qual se faz o exame pericial é o corpo de delito.

Mas o que é o corpo de delito?

– “É o conjunto de vestígios deixados pelo fato criminoso”. (CROCE, 1998, p. 15).

– “É o conjunto de elementos, sensíveis, denunciadores do fato criminoso”. (HÉRCULES, 2005,


p. 13).

– “É o conjunto de elementos sensíveis do dano causado pelo fato delituoso e a base de todo
procedimento processual”. (FRANÇA, 1998, p. 8).

– “Corresponde ao conjunto de elementos físicos, materiais, contidos, explicitamente, na


definição do crime, isto é, no modelo legal”. (TUCCI citado por NUCCI, 2009, p. 367).
– São os vestígios deixados pela infração.

Dessa maneira, o corpo de delito é constituído pelos vestígios materiais deixados pela
infração e que representam alterações visíveis, perceptíveis, avaliáveis, quantificáveis que se
prestam concretamente para serem examinados.

Se a infração não deixar vestígio, logicamente, não há como se formar o corpo de delito.
Neste caso não há o que examinar. É importante alertar que vestígio que não foi produzido pela
infração, embora presente, deverá ser anotado e referido que não tem nexo causal com a
infração, o que lhe retira, obviamente, relevância pericial, porque não se relaciona ao delito, e,
por isso, não interessa à lei.

Este artigo, o 158 do CPP, tem sido objeto de interpretação equivocada por parte de
doutrinadores do Direito e da Medicina Legal no que tange a corpo de delito. Há uma confusão
sobre o que pode ser direto ou indireto, se o corpo de delito, ou se o seu exame. Essas
interpretações equivocadas estão repetidas, reproduzidas e mantidas vivas, há muito tempo,
em vários textos, e, inexplicavelmente, não corrigidas, nem contestadas, o que é espantoso.

O corpo de delito é a razão de ser da perícia. Ele é a matéria-prima, a base que o perito
utiliza para realizar o seu exame. Assim, sendo, não pode haver dúvidas sobre o que é o corpo
de delito e como deve ser examinado, sob risco de o perito se perder na condução do seu
trabalho.

O autor percebeu o equívoco na interpretação do artigo em foco e, por prudência, solicitou


a sua interpretação à professora de Português Maria Celeste Saad Guirra, formada em Letras e
Mestre em Letras e Linguística, transcrevendo-a na íntegra a seguir:

Artigo 158 do Código de Processo Penal:

Quando a infração deixar vestígios, será indispensável o exame de corpo de delito, direto ou
indireto, não podendo supri-lo a confissão do acusado.

Convidada, como linguista, a interpretar o artigo acima, sobretudo em relação à análise do


termo “direto ou indireto” – diante da dúvida de ele referir-se a exame, ou a corpo de delito–
respondo com os recursos fornecidos pela sintaxe da Língua Portuguesa.

O termo exame é o núcleo de um sujeito que tem por predicado será indispensável (numa
ordem direta, a oração seria: o exame de corpo de delito, direto ou indireto, será
indispensável) e se deixa caracterizar por outros termos, ou seja, “de corpo de delito, direto ou
indireto”. Assim sendo, os modificadores “direto ou indireto” referem-se a exame, palavra
núcleo, isto é, central do sujeito.

A sintaxe nos diz que as funções (subjetiva, de complementação, de adjunção) têm um


núcleo em torno do qual podem girar outros termos que, por sua vez, têm outras funções, no
caso em discussão, trata-se de uma função de adjunção, isto é, de adjunto adnominal, cujo
papel é caracterizar.
Uma análise mais atenta vai nos mostrar que a preposição “de” que liga corpo a exame,
assim como delito a corpo, já nos indica qual termo é subordinante e qual é subordinado: de
corpo subordina-se a exame e de delito subordina-se a corpo, termos seguidos de direto ou
indireto, separados por meio de uma vírgula. Esta, na verdade, é mais que uma simples vírgula;
é uma marca que o redator deixa no texto para orientar o leitor. O termo exame é
caracterizado pelos termos de corpo de delito, direto ou indireto, e a vírgula que separa delito
de direto ou indireto nos mostra a coordenação que existe entre eles. Ora, se de corpo de
delito refere-se a exame, também o fazem os termos direto ou indireto.

Reforçando a nossa argumentação está o fato de que o termo exame poderia vir
caracterizado de várias outras maneiras, por exemplo, “exame de segunda época”, que, por sua
vez, ainda poderia ser modificado pela expressão: oral ou escrito (exame de segunda época,
oral ou escrito). Seria o caso de nos perguntarmos: os modificadores “oral ou escrito” referem-
se a exame ou a segunda época?

Outras dessas pistas é o pronome “o” (no texto, representado por lo) que acompanha o
verbo suprir (não podendo supri-lo). Não podendo suprir o quê? O exame ou o corpo de delito?
Está claro que substitui a expressão “exame de corpo de delito”, numa marca clara da coesão
do texto.

Sendo o corpo de delito o resultado deixado pelos vestígios da infração, ele só pode ser
concreto, perceptível e avaliável, prestando-se, assim, a ser examinado. Não tem como o corpo
de delito ser direto ou indireto. O que o artigo em pauta admite, como demonstrado, de forma
eloquente, pela sua interpretação, é que o exame de corpo de delito, este sim, pode ser direto
ou indireto. Ele não se reporta a corpo de delito direto, nem a corpo de delito indireto. Os
autores que o fazem é por equívoco na interpretação desse artigo do CPP. Convém lembrar
que, em nenhuma outra parte do Código, há referência a exame de corpo de delito, direto ou
indireto, só neste artigo.

Há referências, na bibliografia, a corpo de delito direto e a corpo de delito indireto (grifo


do autor), conforme confirmam as afirmações:

– “Assim, a apropriação indébita, embora crime material, nem sempre deixa vestígios. Diante
disso, não é indispensável o laudo de exame de corpo de delito direto.”(STF, RT 235/610, TJSP,
RT 376/202 citado por JESUS, 2007, p. 164).

– “O STF já considerou corpo de delito indireto o laudo assinado por um só perito, corroborado
por testemunhas.” (RTJ 65/816,Idem)

– “O crime de contrabando ou descaminho não deixa vestígios, não se exigindo corpo de delito
direto.”(STF, RTJ 61/81, Idem)

Boletim de socorro do hospital

– “Não substitui o exame feito por dois legistas. Isso porque o exame de corpo de delito
indireto não pode ser admitido quando é possível a realização do exame direto”( BATISTA,
1976, p. 103,Idem).
– “A prova do emprego de chave falsa, que qualifica o furto (CP, art. 155, § 4º, III), segundo o
STF, é admitida por outros meios de prova, além do exame de corpo de delito direto, inclusive
prova testemunhal.” (RTJ 63/836, citado por JESUS, 2007, p. 168)

– “É certo que o corpo de delito direto pode ser suprido pelo indireto, que se realiza por
intermédio da prova testemunhal. Duas são, porém, as condições imprescindíveis: a) é
indispensável que os vestígios tenham desaparecido; b) a prova testemunhal deve ser uniforme
e categórica, de forma a excluir qualquer possibilidade de dúvida quanto à existência dos
vestígios” ( FRAGOSO, citado por JESUS, 2007, p.169)

– “No eito de todo o exposto, nos crimes que deixam vestígios, e, enquanto estes permanecem,
deve ser proscrita a infelizmente difundida e errônea conduta de alguns peritos – a quem cabe
constatar pessoalmente à vista do corpus delicti ou corpus criminis os fatos de natureza
permanente e pertinentes ao processo – de valerem-se de informações como as colhidas em
fichas ou boletim hospitalar (que é corpo de delito indireto), pois tal procedimento contamina
de nulidade o feito, o qual, por isso, não merece ab initio sequer prosperar.” (CROCE, op. cit.).

Cabe aos peritos, incumbidos que são, de examinar o corpo de delito, fazê-lo como orienta
o artigo que disciplina essa atividade.

O médico-legista, no caso da Medicina Legal, deverá fazer o exame direto ou o exame


indireto do corpo de delito. É isso que determina o texto do artigo.

O que é o exame direto de corpo de delito?


O exame direto de corpo de delito é a perícia feita pelo médico-legista, pessoalmente, na
vítima, em busca dos vestígios deixados, nela, pelo fato criminoso. Os exames diretos
representam a grande maioria das perícias realizadas na Medicina Legal. Quanto a essa forma
de executar o exame não há dúvidas nem questiona-mentos. Sobre ela há uma unanimidade de
entendimento entre os peritos e os doutrinadores da prática pericial.

O que é o exame indireto de corpo de delito?


O exame indireto de corpo de delito está mergulhado num cenário de trevas, de dúvidas,
de certa confusão. Há pouca clareza em se saber o que é esse exame indireto, como é
configurado o corpo de delito, para que o seu exame seja indireto, e como realizar o exame.

É importante relembrar mais uma vez que não há referência no CPP a corpo de delito
direto, nem a corpo de delito indireto. Esses termos não existem e, se não existem, não devem
ser empregados, porque geram confusão. Eles são fruto de uma interpretação errada do
português utilizado pelo legislador para dar a orientação contida no artigo 158. O que o Código
determina é que o exame de corpo de delito, este sim, pode ser direto ou indireto. Esta
confusão deverá ser resolvida, de uma vez por todas, para que a perícia saiba com certeza o
que examinar e como examinar.

Chama-se corpo de delito direto quando realizado pelos peritos sobre vestígios de infração
existentes, e corpo de delito indireto quando, não existindo esses vestígios materiais, a prova é
suprida pela informação testemunhal. A denominação de corpo de delito indireto não deixa de
ser imprópria, pois o corpo de delito existe ou não existe, e não existindo, constitui apenas um
fato testemunhado.(FRANÇA, 1998, p. 8).

É direto o corpo de delito objeto da atividade pericial. Chama-se, indevida-mente, de corpo


de delito indireto a substituição do exame objetivo pela prova testemunhal, subjetiva.
Indevidamente, pois não há corpo, embora exista o delito, porque faltam os sinais, os vestígios,
os elementos materiais. O mesmo código determina, como princípio geral, a exclusividade dos
peritos oficiais para os exames técnicos. (HÉRCULES, 2005, p. 14).

Como se nota, há várias referências a corpo de delito indireto e, mesmo discordando dessa
qualificação, a justificativa da discordância se prende à ausência dos vestígios da infração,
quando, supostamente, o corpo de delito é indireto, isto

é, o corpo de delito indireto é impróprio, porque ele não apresenta os vestígios do delito.
Ora, se o delito não deixa vestígio, é óbvio que não se forma o corpo de delito, que
conceitualmente só pode ser formado pelos vestígios da infração, além do que o termo: corpo
de delito indireto é impróprio porque ele não existe, é um termo criado em decorrência de um
erro de interpretação do artigo 158 do CPP. Em nenhum artigo do CPP há referência a ele.

Para o exame de corpo de delito ser indireto, o perito não poderá examinar diretamente a
vítima, apresentando os vestígios da infração.

Em que circunstância isso se impõe?


Sempre que, por qualquer razão, não for possível o exame direto da vítima.

Uma situação em que isso ocorre é quando ela, após sofrer a violência e, apresentando as
lesões resultantes desse ato, que são os vestígios da infração, procura atendimento médico e,
ao ser atendida, suas lesões são anotadas no seu prontuário, ficando nele disponíveis. Ela não
procura a polícia, porém o delegado toma ciência do fato e, não a encontrando, solicita o
exame baseado no seu prontuário. Nesses casos, a única maneira de realizar a perícia é pelo
prontuário médico, no qual os vestígios das lesões estão consignados (configurando esses
vestígios, sem a menor dúvida, o corpo de delito) e disponíveis para serem examinados. Faz-se,
com a consulta a essas anotações, o exame indireto de corpo de delito. É indireto porque o
perito não examina diretamente a vítima, mas os vestígios do corpo de delito que foram
anotados no seu prontuário médico.

Esse procedimento menos usual é, vez por outra, solicitado pela autoridade constituída, na
forma de exame indireto de corpo de delito. Por vezes, erroneamente é solicitado como: Laudo
indireto de corpo de delito. O que pode ser indireto é apenas o exame, o laudo não tem como
ser indireto, uma vez que é um documento técnico.

É bom lembrar, ainda, que as informações contidas no prontuário médico, nos casos em
que a vítima necessitou de procedimentos médicos para salvar a sua vida, são corriqueiramente
consultadas pelo perito e anotadas no laudo pericial, para fundamentarem se a lesão produziu
perigo de vida. O perito também utiliza pareceres de especialistas, informações do prontuário
médico, para documentar a presença de algum fator que agrava a lesão e embasar
tecnicamente o laudo.

O perito, para cumprir com a sua função, deve lançar mão de todos os recursos
disponíveis, sendo a consulta ao prontuário médico, um deles. Esse procedimento é legítimo e,
em algumas circunstâncias, o único meio disponível para a execução do exame e elaboração do
laudo pericial. Negá-lo é uma tentativa de anular, ou tornar sem importância um documento
técnico da envergadura do prontuário médico sedimentado ao longo da história da medicina.

Toma-se o caso de uma vítima que apresenta uma equimose na órbita direita, após ser
agredida, e que procura atendimento médico. Ao ser atendida, o médico anota a lesão no seu
prontuário. Ela, porém, só vai à delegacia de polícia 30 dias depois do fato e presta queixa da
agressão sofrida. O delegado solicita o exame de corpo de delito e a encaminha ao IML, onde
comparece, levando cópia do seu prontuário médico devidamente assinada e contendo o nome
e o CRM do médico atendente. O perito médico-legista a examina pessoalmente e, como era de
se esperar, não há mais nenhum vestígio da lesão porque ele desapareceu após 20 dias. Neste
caso:

1 - O perito relata que não há vestígio de lesão e conclui que a pessoa não foi agredida?

2 - O perito relata que, na data atual, não tem elementos para afirmar ou negar que há 30 dias
a pessoa foi agredida?

3 - O perito relata que no momento do exame a vítima não apresenta mais os vestígios da
lesão, porém trouxe prontuário médico no qual a lesão está descrita, e utiliza esta informação
para afirmar que há 30 dias ela foi agredida?

O autor segue este último caminho, ao conduzir uma perícia com tal configuração. Este,
também, é um exame indireto de corpo de delito, porque se baseia nas informações anotadas
no prontuário médico para, nele, encontrar os vestígios da infração. É uma perícia possível de
ser realizada, sendo útil na apuração da infração, pois a materializa.

Constitui exame indireto de corpo de delito a análise de uma fotografia tirada de uma
lesão que a pessoa agredida apresentava; o exame de uma radiografia, evidenciando uma
fratura de costela que o perito não tem como identificar, a não ser por meio desse exame. Ao
examinar a radiografia, o perito não está examinando pessoalmente a vítima, e, sim, um
vestígio do delito materializado no filme revelado, que permanecerá ali, mesmo após a
cicatrização da lesão.

Artigo 159 do Código de Processo Penal:

Os exames de corpo de delito e as outras perícias serão realizados por perito oficial, portador de
diploma de curso superior.

§ 1º Na falta de perito oficial, o exame será realizado por duas pessoas idôneas, portadoras de
diploma de curso superior preferentemente na área específica, dentre as que tiverem
habilitação técnica relacionada com a natureza do exame.
§ 2º Os peritos não oficiais prestarão o compromisso de bem e fielmente desempenhar o cargo.
(Redação da Lei nº 11.690, de 09 de junho de 2008).

Este artigo estabelece uma condicional: só o perito está credenciado a realizar o exame de
corpo de delito. Esta tarefa é privativa do perito, que é um técnico com conhecimentos
necessários, indispensáveis, para a realização desse exame.

O artigo 167 do Código de Processo Penal disciplina:

Não sendo possível o exame de corpo de delito, por haverem desaparecido os vestígios, a prova
testemunhal poderá suprir-lhe a falta.

Este artigo ensina duas coisas:

A – O exame de corpo de delito só cabe se os vestígios que o configuram estiverem presentes.

B – A prova testemunhal não é exame de corpo de delito, mas apenas outra forma, diversa
daquela, de informar sobre a existência de um delito.

No entanto, a interpretação desse artigo encontra-se também equivocada, conforme se vê


na seguinte conclusão: “É certo que o corpo de delito direto pode ser suprido pelo indireto, que
se realiza por intermédio da prova testemunhal...” (FRAGOSO, citado por JESUS, 2007, p. 169).

Ao fazer essa afirmação, o doutrinador busca, no texto do artigo, encontrar uma explicação
para a interpretação inadequada do artigo 158 do CPP no qual inadvertidamente alguém fez
referência a que o corpo de delito pode ser direto ou indireto, criando uma confusão sobre o
conceito de corpo de delito. Por não haver possibilidade de ele ser indireto, quis explicá-lo
como sendo o corpo de delito indireto o resultado de uma infração que não deixa vestígio ou
cujos vestígios tenham desaparecido e seu exame realizado pela prova testemunhal. Esta
afirmação é inadequada pelas seguintes razões:primeira– se não há mais os vestígios da
infração, o corpo de delito desapareceu, não sendo possível o seu exame;segunda - não há
corpo de delito indireto; terceira– o corpo de delito só pode ser examinado pelo perito, nunca
pela testemunha. Ora, o corpo de delito é objeto de exame pericial, que é privativo do perito.
testemunha, não sendo perito, não está habilitada para fazê-lo.

As provas comumente utilizadas no processo judicial são: subjetivas e objetivas. Dentre as


provas subjetivas, encontra-se a prova testemunhal, que é o relato de quem presenciou a
ocorrência do delito, sendo este relato útil para, em determinadas circunstâncias, a justiça
firmar suas convicções.

Já entre as provas objetivas, encontra-se a prova técnica, que tem por função examinar o
corpo de delito e demonstrar, num documento, que houve a infração, sendo necessário para a
sua execução que o perito seja um técnico habilitado e com conhecimentos pertinentes que o
credenciam para realizar a tarefa.
O artigo citado não faz referência a que a prova testemunhal seja um exame de corpo de
delito indireto, dedução que não tem suporte nesse artigo. Aqui, de novo, houve equívoco por
parte de quem assim deduziu.

O artigo 159 condiciona que o exame de corpo de delito é privativo do perito; cabe
perguntar: a testemunha é um perito? Se não é, como ela poderá realizar o exame de corpo de
delito, mesmo erroneamente referido como corpo de delito indireto? Ela está qualificada para
essa tarefa? Claro que não.

A testemunha relata o que presenciou, ela só, e apenas, presta depoimento, o qual não
tem como se transformar num exame pericial. Já o perito descreve, num laudo técnico, o que
examinou. Não há, pois, como confundir o papel desempenhado por cada um desses agentes
na produção da prova. “Daí se deduz logo que há evidente diferença entre peritos e
testemunhas. A testemunha, em geral, não é um técnico e não vê com função oficial. O perito
deve ser sempre técnico no assunto a esclarecer e a sua atuação se forra de função
oficial.”(FÁVERO, 1980, p. 40).

Artigo 161 do Código de Processo Penal:

O exame de corpo de delito poderá ser feito em qualquer dia e a qualquer hora.

Esta orientação disciplina que a perícia poderá ser realizada em qualquer dia e a qualquer
hora. Claro, desde que existam as condições necessárias à realização do exame, para que não
haja prejuízo nem comprometimento da sua qualidade técnica. Há que se ter o local adequado
para a realização da perícia.

O atual Código de Ética Médica diz, no seu art. 95, que é vedado ao médico:

Realizar exames médico-legais de corpo de delito em seres humanos no interior de prédios ou


dependências de delegacia de polícia, unidades militares, casas de detenção e presídios.

O exame pericial não é uma urgência médica. Isso deve ser entendido pelas autoridades
que o requisitam. O exame pericial é uma atividade de cunho técnico, com características
especiais e que no caso de uma necropsia não pode jamais ser refeita. A responsabilidade pela
execução do exame e elaboração do laudo é toda do perito, que responde civil e criminalmente
por ele. Qualquer pressão sobre o perito deve ser rechaçada, em nome de um trabalho de boa
qualidade técnica e imparcial. Quem conduz a perícia é o perito. Para isso ele deve saber o que
fazer, como fazer, por que fazer e quando fazer. Há perícias que se revestem de características
especiais e que precisam ser consideradas, como nos exames dos crimes sexuais e exame de
embriaguez, que devem ser realizados o mais cedo possível, pois seus vestígios desaparecem
rapidamente.

“A perícia médico-legal precisa demonstrar, para que se possa admitir a hipótese, a existência
de nexo causal entre a ação do agente e o resultado desta ação.”(RT, 457/334, citado por
ALCÂNTARA, 2006, p. 16).
“Somente o exame de corpo de delito poderá comprovar a materialidade do crime de lesões
corporais.” (RT, 457/445,Idem).
3 - O PERITO MÉDICO-LEGISTA

Artigo 159 do Código de Processo Penal:

O exame de corpo de delito e outras perícias serão realizados por perito oficial, portador de

diploma de curso superior.

§ 1º Na falta de perito oficial, o exame será realizado por 2 (duas) pessoas idôneas, portadoras
de diploma de curso superior preferencialmente na área específica,dentre as que tiverem
habilitação técnica relacionada com a natureza do exame.

§ 2º Os peritos não oficiais prestarão o compromisso de bem e fielmente desempenhar o


encargo.

§ 3º Serão facultadas ao Ministério Público, ao assistente de acusação, ao ofendido, ao


querelante e ao acusado a formulação de quesitos e indicação de assistente técnico.

§ 4º O assistente técnico atuará a partir de sua admissão pelo juiz e após a conclusão dos
exames e elaboração do laudo pelos peritos oficiais, sendo as partes intimadas desta decisão.

§ 5º Durante o curso do processo judicial, é permitido às partes, quanto à perícia:

I - requerer a oitiva dos peritos para esclarecerem a prova ou para responderem a quesitos,
desde que o mandado de intimação e os quesitos ou questões a serem esclarecidas sejam
encaminhados com antecedência mínima de 10 (dez) dias, podendo apresentar as respostas em
laudo complementar;

II - indicar assistentes técnicos que poderão apresentar pareceres em prazo a ser fixado pelo juiz
ou ser inquiridos em audiência.

§ 6º Havendo requerimento das partes, o material probatório que serviu de base à perícia será
disponibilizado no ambiente do órgão oficial, que manterá sempre sua guarda, e na presença de
perito oficial, para exame pelos assistentes, salvo se for impossível a sua conservação.

§ 7º Tratando-se de perícia complexa que abranja mais de uma área de conhecimento


especializado, poder-se-á designar a atuação de mais de um perito oficial, e a parte indicar mais
de um assistente técnico.

(Redação da Lei nº 11.690, de 09 de junho de 2008)

Houve, com esta nova redação, a possibilidade, nos processos criminais, da indicação do
assistente técnico que irá avaliar e se manifestar sobre o laudo emitido pelo perito oficial. É
necessário que os peritos oficiais tenham consciência dessa mudança e se preparem para
elaborar, da melhor forma, os seus laudos, de tal sorte que possam defendê-los durante o
trâmite da ação penal.

Este artigo disciplina que o exame de corpo de delito é atividade privativa do perito. Só ele
pode realizá-lo. Para isso, deve ter os conhecimentos necessários para o seu desempenho. Deve
saber como fazê-lo e como redigi-lo, de tal maneira que seja útil e cumpra a sua finalidade, que
é demonstrar que ocorreu a infração. Disciplina, ainda, que a perícia será feita por um só perito.

Porém o perito, além dos conhecimentos técnicos, precisa ter outras qualidades, sendo o
caráter a principal de todas, pois representa a essência do que cada um é. Do caráter emanam
a ética, a honra e a dignidade, que são atributos indispensáveis para se fazer um trabalho
imparcial e confiável.

Nos dias atuais, assistimos ao desmanche dos valores do indivíduo, de tal sorte que eles,
que no passado recente, eram o esteio da vida de nossos pais e avós, hoje, aparentemente, não
representam nada para uma porção significativa das pessoas. No entanto, o caráter é
característica que se tem, ou não se tem, e aquele que não o tem jamais terá ética, honra e
dignidade. O comportamento dos indivíduos estampa, em cores vivas, no dia a dia, o que cada
um é. Basta olhar.

O perito precisa ter, ainda, prudência, bom senso, cautela e deve gostar do que faz. Só
assim poderá realizar-se neste extraordinário campo de atividade.

Artigo 160 do Código de Processo Penal:

Os peritos elaborarão o laudo pericial, onde descreverão minuciosamente o que examinarem, e


responderão aos quesitos formulados.

Parágrafo único. O laudo pericial será elaborado no prazo máximo de dez dias, podendo este
prazo ser prorrogado, em casos excepcionais, a requerimento dos peritos.

Este artigo ensina qual é o papel do perito e o que deve fazer. Cabe a ele examinar
minuciosamente o corpo de delito, descrever o que observar e, por último, responder aos
quesitos.

Para executar o seu trabalho o perito precisa ter presente o corpo de delito, que é a
matéria-prima a ser examinada e os quesitos a serem respondidos. Simples assim. Fica
entendido que toda autoridade requisitante de exames periciais tem o dever de formular os
quesitos, cada vez que o caso não seja contemplado com os quesitos oficiais, ou ensejar
esclarecimentos adicionais.

Se a autoridade não o fizer, o perito invocará o artigo 160 do CPP e solicitará que eles
sejam formulados, pois, sem eles, não é possível fazer o exame pericial. A atividade pericial é
formal, por isso, os quesitos devem ser bem formulados e lógicos. Havendo deficiência dos
quesitos, ou das suas respostas, e contradição entre elas, ocorrerá a nulidade do ato, conforme
estabelece o artigo 564 do Código de Processo Penal, que assim reza:
A nulidade ocorrerá nos seguintes casos:

I e II – sem interesse pericial;

III – por falta das fórmulas ou dos termos seguintes:

a) sem interesse pericial;

b) o exame de corpo de delito nos crimes que deixam vestígios, ressalvando o artigo 167;

c); d); e); f); g); h); i); j); k); l); m); n); o); p); – sem interesse pericial;

IV – por omissão de formalidade que constitua elemento essencial do ato.

Parágrafo único. Ocorrerá ainda a nulidade, por deficiência dos quesitos ou das suas
respostas, e contradição entre elas.

Os quesitos representam o motivo da realização da perícia. Ela é feita justamente para dar
conteúdo e fundamentação às suas respostas e oferecer à justiça os elementos necessários
para a formação das suas convicções, a respeito de como o delito ocorreu.

O perito precisa saber conduzir a perícia. Para isso, antes de iniciá-la, deve ter sempre
presente:

1 – O que aconteceu?

2 – Quando aconteceu? (evento recente ou evento não recente).

Só assim saberá o que procurar e como procurar, dependendo da data do evento. O perito
deve saber ver e saber relatar o que vê, além disso, é imperioso saber fundamentar o seu
laudo, com lógica, prudência e com conteúdo técnico. O perito faz ciência. Não faz ficção
científica. Não cabem no laudo, suposições, imaginações, hipóteses.

Conforme orienta o artigo 160 do CPP, o perito tem até 10 (dez) dias para elaborar o laudo
e entregá-lo à autoridade requisitante. Se não for possível cumprir esse prazo, ele pode
requerer a sua prorrogação.

É corrente na rotina diária a solicitação, por parte da autoridade policial, do exame da


vítima de crime em que o agressor tenha sido preso em flagrante (tentativa de homicídio, Lei
Maria da Penha, etc.).

O fato de esse exame ser requisitado com urgência e executado de imediato, não altera o
prazo que o perito tem para elaboração e entrega do laudo que está especificado no artigo 160
do CPP, que é de até dez dias. Não há outro artigo do CPP que disciplina um prazo menor para
elaboração e entrega do laudo, mesmo diante do prazo estipulado pelo artigo 10 do CPP para a
conclusão do inquérito policial, quando o indiciado for preso em flagrante. Este artigo assim
orienta:
O inquérito deverá terminar no prazo de dez dias, se o indiciado tiver sido preso em flagrante,
ou estiver preso preventivamente, contado o prazo, nesta hipótese, a partir do dia em que se
executar a ordem de prisão, ou no prazo de trinta dias, quando estiver solto, mediante fiança ou
sem ela.

§ 1º A autoridade fará minucioso relatório do que tiver sido apurado e enviará os autos ao juiz
competente.

O artigo estabelece o prazo de dez dias para o término do inquérito, quando o réu tiver
sido preso em flagrante, no entanto, não estabeleceu um prazo menor do que dez dias para
elaboração do laudo pericial da vítima e sua entrega à autoridade policial. Dessa forma, muitos
inquéritos são encaminhados ao Ministério Público sem o laudo pericial.

– Oportunidade da juntada do laudo de exame de corpo de delito

Até as alegações (TJSP, RT 548/310), ao longo da instrução criminal, sendo inaplicável o


disposto no artigo 525 do CPP (STF, RHC 59.560, DJU 19. 3. 82, p. 2233; HC 78. 719, DJU 25. 6.
99, RT 771/526, citado por JESUS, 2007, p.164).

Código de Processo Penal


Art. 176. A autoridade e as partes poderão formular quesitos até o ato da diligência.

Art. 181. No caso de inobservância de formalidade, ou no caso de omissões, obscuridades ou


contradições, a autoridade judiciária mandará suprir a formalidade, complementar ou
esclarecer o laudo.

Parágrafo único. A autoridade poderá também ordenar que se proceda a novo exame, por
outros peritos, se julgar conveniente.

Art. 162. A autópsia será feita pelo menos seis horas depois do óbito, salvo se os peritos, pela
evidência dos sinais de morte, julgarem que possa ser feita antes daquele prazo, o que
declararão no auto.

Parágrafo único. Nos casos de morte violenta, bastará o simples exame externo do cadáver,
quando não houver infração penal que apurar, ou quando as lesões externas permitirem
precisar a causa da morte e não houver necessidade de exame interno para a verificação de
alguma circunstância relevante.

Art. 164. Os cadáveres serão sempre fotografados na posição em que forem encontrados, bem
como, na medida do possível, todas as lesões externas e vestígios deixados no local do crime.

Art. 165. Para representar as lesões encontradas no cadáver, os peritos, quando possível,
juntarão ao laudo do exame provas fotográficas, esquemas ou desenhos, devidamente
rubricados.

Art. 163. Em caso de exumação para exame cadavérico, a autoridade providenciará para que,
em dia e hora previamente marcados, se realize a diligência, da qual se lavrará auto
circunstanciado.
Parágrafo único. O administrador de cemitério público ou particular indicará o lugar da
sepultura, sob pena de desobediência. No caso de recusa ou de falta de quem indique a
sepultura, ou de encontrar-se o cadáver em lugar não destinado a inumações, a autoridade
procederá às pesquisas necessárias, o que tudo constará do auto.

Art. 166. Havendo dúvida sobre a identidade do cadáver exumado, proceder-se-á ao


reconhecimento pelo Instituto de Identificação e Estatística ou repartição congênere ou pela
inquirição de testemunhas, lavrando-se auto de reconhecimento e de identidade, no qual se
descreverá o cadáver, com todos os sinais e informações.

Parágrafo único. Em qualquer caso, serão arrecadados e autenticados todos os objetos


encontrados, que possam ser úteis para a identificação do cadáver.

Art. 170. Nas perícias de laboratório, os peritos guardarão material suficiente para a
eventualidade de nova perícia. Sempre que conveniente, os laudos serão ilustrados com provas
fotográficas, ou microfotográficas, desenhos ou esquemas.

Art. 175. Serão sujeitos a exame os instrumentos empregados para a prática da infração, a fim
de se lhes verificar a natureza e a eficiência.

Art. 177. No exame por precatória, a nomeação dos peritos far-se-á no juiz deprecado.
Havendo, porém, no caso de ação privada, acordo das partes, essa nomeação poderá ser feita
pelo juiz deprecante.

Parágrafo único. Os quesitos do juiz e das partes serão transcritos na precatória.

Art. 178. No caso de art. 159, o exame será requisitado pela autoridade ao diretor da
repartição, juntando-se ao processo o laudo assinado pelos peritos.

Art. 179. No caso do § 1º do art. 159, o escrivão lavrará o auto respectivo, que será assinado
pelos peitos e, se presente ao exame, também pela autoridade.

Parágrafo único. No caso do art. 160, parágrafo único, o laudo, que poderá ser datilografado,
será subscrito e rubricado em suas folhas por todos os peritos.

Art. 180. Se houver divergência entre os peritos, serão consignadas no auto do exame as
declarações e respostas de um e de outro, ou cada um redigirá separadamente o seu, e a
autoridade nomeará um terceiro; se este divergir de ambos, a autoridade poderá proceder a
outro exame por outros peritos.

O Código de Processo Penal, com esses artigos, baliza os procedimentos que o perito deve
adotar durante a realização de suas perícias. Ele responde civil e criminalmente pelo laudo
elaborado.

Código de Processo Civil


Art. 147. O perito que, por dolo ou culpa, prestar informações inverídicas, responderá pelos
prejuízos que causar à parte, ficará inabilitado por 2 (dois) anos, a funcionar em outras perícias
e incorrerá na sanção que a lei penal estabelecer.
Código Penal
Art. 342. Fazer afirmação falsa, ou negar ou calar a verdade, como testemunha, perito,
contador, tradutor ou intérprete em processo judicial, ou administrativo, inquérito policial, ou
em juízo arbitral:

Pena – reclusão, de 1 (um) a 3 (três) anos, e multa.

§ 1º As penas aumentam-se de um sexto a um terço, se o crime é praticado mediante suborno


ou se cometido com o fim de obter prova destinada a produzir efeito em processo penal, ou em
processo civil em que for parte entidade da administração pública direta ou indireta.

§ 2º O fato deixa de ser punível se, antes da sentença no processo em que ocorreu o ilícito, o
agente se retrata ou declara a verdade.

Perícia falsa é aquela em que o perito:

1 – afirma uma inverdade, ou

2 – nega a verdade, ou

3 – cala-se sobre a verdade.

“Findo o exame de corpo de delito, as conclusões técnico-científicas far-se-ão criteriadas na


experiência, na competência e no equilíbrio dos peritos” (CROCE, 1998, p. 17).

“Não basta a autoridade dos peritos para legitimar suas conclusões, urge que eles as
fundamentem, propiciando o controle da erronia ou acerto de seu raciocínio.” (RF, 156/436,
citado por ALCÂNTARA, 2006, p.16).

Art. 182 CPP. O juiz não ficará adstrito ao laudo, podendo aceitá-lo ou rejeitá-lo, no todo ou em
parte.

Embora o juiz tenha essa prerrogativa, isso em nada poderá influir no comportamento o
perito, que deverá, sempre, se empenhar em fazer, da melhor forma possível, os seus exames,
produzindo laudos de boa qualidade e que possam ser úteis à justiça, com o que irá edificando
o seu conceito.

Código de Ética Médica


Documentos Médicos

É vedado ao médico:

Art. 88. Negar, ao paciente, acesso a seu prontuário, deixar de lhe fornecer cópia quando
solicitada, bem como deixar de lhe dar explicações necessárias à sua compreensão, salvo
quando ocasionarem riscos ao próprio paciente ou a terceiros.

Art. 89. Liberar cópias do prontuário sob a sua guarda, salvo quando autorizado, por escrito,
pelo paciente, para atender ordem judicial ou para a sua própria defesa.
§ 1º Quando requisitado judicialmente o prontuário será disponibilizado ao perito médico
nomeado pelo juiz.

Auditoria e Perícia Médica

É vedado ao médico

Art. 92. Assinar laudos periciais, auditoriais ou de verificação médico-legal quando não tenha
realizado pessoalmente o exame.

AS PARTES ENVOLVIDAS NA PERÍCIA MEDICO-LEGAL


A oportuna analogia criada pelo Dr. José Alberto Florêncio Pereira, do Núcleo de Apoio
Logístico do IML de São Paulo, que foi apresentada no III Curso de Capacitação e
Aperfeiçoamento em Medicina Legal, promovido pela SENASP, no período de 29 de outubro a
02 de novembro de 2007, em Palmas – Tocantins:

O CLIENTE – A MATÉRIA-PRIMA – A FÁBRICA

O cliente é a autoridade que solicita o produto à fábrica; a matéria-prima é o que a fábrica


utiliza para fazer o produto, e a fábrica é o IML onde o produto é fabricado.

Essa analogia é de uma felicidade inigualável para estabelecer a relação entre as partes e
se presta a colaborar, de forma expressiva, para o entendimento do seu funcionamento.

O cliente é quem tem o poder de solicitar o produto à fábrica. É ele: a autoridade policial
civil ou federal, o Ministério Público, a autoridade judicial, o chefe de repartição, o oficial de dia
das unidades militares, apenas estes.

O cliente, antes de solicitar o produto à fábrica, deve saber o que quer, pois a fábrica
atende especificamente o seu pedido. Não pode haver dúvida nessa solicitação, sob o risco de
não se entender o que se quer, e o produto fabricado não ter utilidade, por erro no pedido, na
sua origem. A culpa não é da fábrica, quando isso ocorre e, sim, do cliente que não soube fazer
o seu pedido.

O cliente deve se preocupar em fazer da melhor forma a sua solicitação. Caracterizar com
detalhes o fato acontecido, quando ocorreu e o que é necessário esclarecer. Deve saber
formular os quesitos, que, em tese, são as dúvidas que quer dirimir, utilizando o produto. Um
pedido rico em informações facilita enormemente a fabricação do produto adequado.

O cliente deve saber interpretar o produto, deve entendê-lo, conhecê-lo, familiarizar-se


com ele, pois, só assim, poderá utilizá-lo da maneira mais eficiente.

A matéria-prima é o corpo de delito. É ela que será examinada para a elaboração do


produto. Embora seja com ela que a fábrica tem contato direto, ela não é o seu cliente. O corpo
de delito, que é a matéria-prima normalmente examinada na fábrica, apresenta os vestígios do
ato delituoso. No caso da Medicina Legal, esses vestígios estão presentes no corpo de uma
pessoa, que é a vítima do crime. Essa pessoa não é um paciente porque não é objeto da ação
médico-legal cuidar da sua saúde e, sim, periciá-la, em busca de vestígios deixados nela pela
infração. A matéria-prima é, pelas suas características, um(a) periciando(a) ou examinando(a).
Esta é a denominação adequada. Os termos devem representar o que são, caso contrário,
geram confusão.

A fábrica é o IML ou, onde não houver, ela é o médico-legista. O produto que a fábrica
produz é o laudo médico-legal. Há várias linhas de produção. De acordo com a solicitação do
cliente e o exame da matéria-prima, será produzido um produto específico. A fábrica não
requisita produto a ela mesma. Apenas atende ao que o cliente pede. Se não houver pedido,
nada é produzido. A fábrica só recebe a matéria-prima após ter em seu poder a requisição do
cliente, encaminhando-a para ser examinada.O produto da fábrica se destina a um público
específico que são os clientes.

O seu produto, embora confeccionado dentro de um contexto de termos técnicos, deve


ser acessível ao cliente; sua redação deve ser feita numa linguagem que cumpra esse mister. O
laudo médico-legal é um produto formal elaborado por profissional técnico e sua redação se faz
na terceira pessoa, como é redigida qualquer peça técnica.

A fábrica se empenhará em produzir um produto de ótima qualidade. Para atingir tal


objetivo é necessário fazer controle de qualidade, razão pela qual seus operários precisam ser
bem qualificados e bem treinados. Cada um saberá exata-mente o que fazer, por que fazer e
como fazer. Se houver dúvida na fabricação, o produto conterá imperfeições e, se entregue ao
cliente, será descaracterizado, desconsiderado e não terá nenhuma serventia.

O cliente não tem opção de escolher outra fábrica, e a fábrica não tem opção de atender
outros clientes. Um é refém do outro. Essa realidade cria a necessidade de um entendimento
continuado entre as partes, para encontrarem a maneira mais produtiva de se relacionar em
prol da aplicação mais eficiente da justiça
4 - O LAUDO MÉDICO LEGAL

O laudo médico-legal é o produto que a fábrica produz. Ele se destina ao cliente e deve
conter as informações indispensáveis para cumprir a sua finalidade. Além disso, é uma peça
técnica, probatória da materialidade de uma infração, cuja redação deve ser lógica, clara,
fundamentada, acessível ao cliente requisitante e ao entendimento judicial e que seja capaz de
resistir aos questionamentos que, por ventura, venha a sofrer.

O perito médico-legista atua na produção do laudo e pode ser solicitado a esclarecer


dúvidas ocasionais surgidas ao longo do caminho do processo, a seu respeito, em audiência
com o juiz e até durante o julgamento, por ocasião do júri popular. Este é o oficio do perito e
essas situações são inerentes ao desempenho de suas funções. Ele deve estar preparado para
essa realidade.

O laudo médico-legal é uma peça formal. Sua estrutura compreende as seguintes partes:

a) Preâmbulo, b) Quesitos, c) Histórico, d) Descrição, e) Discussão ou Comentários, f)


Conclusão, g) Respostas aos quesitos.

PREAMBULO
Parte introdutória da qual constam: a hora, o dia, o mês, o ano, a cidade em que a perícia é
realizada, o nome da autoridade requisitante do exame, o legista incumbido de realizá-lo, o
nome do diretor do IML que designou o perito, o nome do exame solicitado, a identificação
do(a) periciando(a).

QUESITOS
Para cada modalidade de delito há os quesitos oficiais a serem respondidos no final da
perícia. Esses quesitos é que são anotados nesta parte do laudo, de acordo com o crime que
motivou o exame.

HISTÓRICO
Anotar o que a vítima relata sobre o que ocorreu, como ocorreu e quando ocorreu.
Transcrever suas próprias palavras. Este histórico serve, em parte, para orientar a perícia. O
perito deve fazer o nexo causal entre o que encontrar no exame, com o histórico. Aqui o perito
precisa identificar, com segurança, que delito foi praticado, para saber quais são os seus
vestígios e como irá conduzir a perícia para encontrá-los.

DESCRIÇÃO
Esta parte é a mais importante do laudo. Nela devem ser anotadas todas as alterações
observadas; no caso de lesões, anotar suas características, suas dimensões, suas quantidades,
sua localização e sua repercussão no funcionamento do organismo da vítima.
DISCUSSÃO OU COMENTÁRIOS
Neste espaço, fazer o nexo causal entre os achados do exame e o delito que se está
apurando. Referir aspectos relevantes e que contribuam para a conclusão e as respostas aos
quesitos. Caracterizar as lesões que produzem sequelas e enquadrá-las nos termos relatados no
texto dos quesitos, que, no caso de lesões corporais, foram retirados integralmente dos
parágrafos 1º e 2º do art. 129 do Código Penal, de sorte que o julgador tenha segurança para
decidir sobre a gravidade da lesão.

Anotar aqui os relatórios médicos, que fornecem sustentação para o perito fundamentar
situações agravantes ou atenuantes da lesão.

Informar se solicitou exame complementar para responder quesitos que, no momento,


não tem elementos para fazer. Informar a data para retorno da vítima para o exame
complementar e fundamentar o que se fará, de modo que a autoridade requisitante da perícia
tenha claro o que se fez e o que se fará nesse exame. O perito, ao fazer a perícia, deve conduzi-
la com clareza, informando todos os seus passos.

CONCLUSÃO
Nesta parte, o perito, de forma sintética, deve dizer que alteração ocorreu e se esta deixou
sequelas. Quando as alterações forem importantes e não estejam cicatrizadas, referir que estão
em evolução e que se solicitou exame complementar, para avaliação posterior.

Informar que não tem elementos para afirmar ou negar que houve a infração, quando não
dispõe de elementos para fazê-lo, quando os vestígios tenham desaparecido e a perícia é
realizada dias após o delito.

Informar aguardar quando depende de exame laboratorial ou a juntada de documentos


médicos para a sua comprovação.

RESPOSTA AOS QUESITOS


Responder de forma afirmativa quando a alteração encontrada guardar relação com o
delito que se está investigando. Responder com a negativa, quando não encontrou alteração
que possa ser relacionada ao delito que motivou a perícia. Responder: sem elementos, quando,
após o exame, o perito não tem segurança para afirmar ou negar vestígio de alteração
relacionada à infração. Responder: prejudicado, quando não foi possível realizar o exame, ou
quando a resposta ao quesito anterior prejudica a resposta seguinte.

Ficar atento ao 1º quesito, pois é o quesito que obrigatoriamente está ligado (tem nexo
causal) ao delito. Sempre que se responde sim a este quesito se está estabelecendo o nexo
causal dos vestígios encontrados com a infração que se está apurando.

Responder: aguardar, quando o perito colheu material para exame laboratorial e depende
do seu resultado para decidir se há ou não vestígio do crime.

O primeiro quesito deve imperiosamente perguntar se há vestígio material do delito que


motivou o exame da vítima, e os quesitos que se seguem ao primeiro devem fornecer os
elementos que caracterizam a gravidade desse delito. Ter sempre presente que os vestígios que
não foram produzidos pelo delito carecem de relevância para a lei, por essa razão, não têm
importância pericial e nunca deverão ser utilizados para efetuar a resposta afirmativa ao
primeiro quesito de qualquer perícia que se faça. Quem assim procede é fonte geradora de
injustiças porque materializa crimes com vestígios que não foram produzidos pela infração.

Quando ao primeiro quesito se responde: Não, ou Sem elementos ou Prejudicado, os


demais quesitos devem ser respondidos com o termo: Prejudicado. Isto porque a perícia não foi
capaz de encontrar vestígio do delito, fato este que torna irrelevantes as respostas aos quesitos
que se seguem ao primeiro.

O perito responde aos quesitos com os seguintes termos:

SIM – Quando tem convicção de que ocorreu o que o quesito pergunta.

NÃO – Quando tem convicção de que não ocorreu o que o quesito pergunta.

SEM ELEMENTOS – Quando não tem convicção para responder nem sim, nem não ao que o
quesito pergunta.

PREJUDICADO – Quando a pergunta que o quesito faz não se aplica àquela situação, ou quando
a resposta anterior prejudica a resposta do quesito seguinte.

Exemplo:

1º) Quesito: Houve ofensa à integridade corporal ou à saúde do(a) periciando(a)?

Resposta – NÃO.

2º) Qual o meio ou instrumento que a produziu?

Resposta – PREJUDICADO.

Isto porque não houve a lesão, conforme indica a resposta ao primeiro quesito. Se não houve a
lesão, significa que nenhum agente vulnerante foi utilizado, logo, a pergunta contida no 2º
quesito, pedindo que se indique qual meio, ou instrumento foi empregado, para ofender a
vítima, fica, logicamente, com sua resposta prejudicada.

O termo PREJUDICADO não é sinônimo de SEM ELEMENTOS. O perito tem o dever de saber
o significado dos termos empregados para responder aos quesitos. Não pode haver dúvidas
porque, caso contrário, ao invés de esclarecer, irá confundir.

AGUARDAR – Termo que caracteriza a situação em que o perito colhe material para
realização de exame laboratorial, para encontrar vestígio do delito, ou quando solicita exame
complementar, para que a vítima traga documentos do atendimento médico, informando
possíveis lesões, ou exames que revelem vestígio do delito, ou para reavaliá-la e decidir se da
lesão resultou alguma sequela. O perito deverá, no tópico Discussão,fundamentar com lógica e
clareza os procedimentos que adotou e o que irá esclarecer com eles.
Concluído o laudo pericial, o perito tem o prazo de até dez dias para entregá-lo à
autoridade requisitante da perícia. Ele só poderá reter o laudo, por prazo superior ao
estabelecido em lei, se pedir por escrito sua prorrogação, justificando-a. É seu dever cumprir o
que indica o art. 160 do CPP. Se o laudo encontra-se em aberto, aguardando, por exemplo, um
exame laboratorial para se ter elementos de convicção e definir se há vestígio da infração, o
perito deverá encaminhá-lo, à autoridade requisitante do exame, com as pendências anotadas,
e nele informará o que se solicitou e dirá que aguarda o resultado do exame laboratorial para,
então, fazer a conclusão da perícia e responder aos quesitos. Isso porque, ao pedir ao cliente
solicitante prorrogação do prazo superior aos dez dias concedidos pela lei, para conclusão e
envio do laudo, o perito informará de quantos dias necessita para concluí-lo. Na maioria das
vezes, ele não tem certeza de quando o exame laboratorial solicitado será concluído.

Findo o prazo prorrogado, o cliente irá solicitar o envio do laudo. Se o exame laboratorial
não tiver, por qualquer razão, sido feito, o perito irá, de novo, pedir mais tantos dias para
conclusão da perícia. Devido a isso é prudente enviar o laudo com o que foi possível apurar no
primeiro exame, informando, nele, as pendências em aberto e o que se providenciou para a sua
conclusão. Se, antes de receber o resultado do exame laboratorial solicitado, o cliente pedir o
envio do laudo concluído, o perito informará que o resultado do exame laboratorial não chegou
às suas mãos e que, por esse motivo, não pôde concluir a perícia. Solicitar que aguarde. A
execução do exame laboratorial não depende do perito e, sim, do laboratório e é lá que está
ocorrendo a demora. Assim sendo, a autoridade requisitante da perícia deve ser informada
dessa situação.
QUESITOS OFICIAIS PARA SEREM RESPONDIDOS NAS
PRINCIPAIS PERÍCIAS MÉDICO-LEGAIS

QUESITOS PARA EXAME DE LESÃO CORPORAL


1º) Há ofensa à integridade corporal ou à saúde do(a) periciando(a)?

2º) Qual o instrumento ou meio que a produziu?

3º) A ofensa foi produzida com o emprego de veneno, fogo, explosivo, tortura ou outro meio
insidioso ou cruel, ou de que podia resultar perigo comum? (resposta especificada)

4º) Resultou perigo de vida?

5º) Resultou incapacidade para as ocupações habituais, por mais de 30 (trinta) dias?

6º) Resultou debilidade permanente de membro, sentido ou função, ou aceleração de parto?


(resposta especificada)

7º) Resultou incapacidade permanente para o trabalho, ou enfermidade incurável, ou perda ou


inutilização de membro, sentido ou função, ou deformidade permanente, ou aborto? (resposta
especificada)

QUESITOS PARA EXAME COMPLEMENTAR DE LESÃO CORPORAL


1º) Resultou incapacidade para as ocupações habituais por mais de 30 (trinta) dias?

2º) Resultou debilidade permanente de membro, sentido ou função, ou aceleração de parto?


(resposta especificada)

3º) Resultou incapacidade permanente para o trabalho, ou enfermidade incurável, ou perda ou


inutilização de membro, sentido ou função, ou deformidade permanente, ou aborto? (resposta
especificada).

QUESITOS PARA EXAME DE PRÁTICAS LIBIDINOSAS


1º) Houve conjunção carnal que possa ser relacionada ao delito?

2º) Houve outro ato libidinoso que possa ser relacionado ao delito?

3º) Houve violência para essa prática?

4º) Qual o meio dessa violência?


5º) Da violência resultou para a vítima: incapacidade para as ocupações habituais por mais de
30 dias, ou perigo de vida, ou debilidade permanente de membro, sentido ou função, ou
aceleração de parto, ou incapacidade permanente para o trabalho, ou enfermidade incurável,
ou perda ou inutilização de membro, sentido ou função, ou deformidade permanente, ou
aborto? (resposta especificada)

6º) Tem a vítima idade menor de 18 e maior de 14 anos?

7º) É a vítima menor de 14 anos?

8º) Tem a vítima enfermidade ou deficiência mental?

9º) A vítima, por qualquer outra causa, não pode oferecer resistência?

10º) Do crime resultou gravidez?

11º) O agente transmitiu para a vítima doença sexualmente transmissível?

QUESITOS PARA EXAME DE EMBRIAGUEZ


1º) O(A) periciando(a) está embriagado(a)?

2º) Qual a espécie de embriaguez?

3º) No estado em que se encontra, põe em risco a segurança própria ou a alheia?

4º) Ele(a) se embriaga habitualmente?

5º) Em caso afirmativo, quanto tempo necessita para a necessária desintoxicação?

QUESITOS PARA EXAME DE NECROPSIA


1º quesito: Houve morte?

2º quesito: Qual a causa da morte?

3º quesito: Qual o instrumento ou meio que produziu a morte?

4º quesito: A morte foi produzida com o emprego de veneno, fogo, explosivo, asfixia, tortura ou
outro meio insidioso ou cruel ? (resposta especificada)
Parte II
Perícia no vivo
5 - EXAME DE LESÕES CORPORAIS

Como qualquer perícia esta também está regida pelo artigo 158 do CPP, que orienta:

Quando a infração deixar vestígios, será indispensável o exame de corpo de delito, direto ou
indireto, não podendo supri-lo a confissão do acusado.

Isso porque o perito deverá conduzir a perícia, com o objetivo de encontrar, no corpo de
delito, os vestígios que estejam relacionados à prática da infração, fazendo, dessa maneira, o
nexo causal entre os vestígios e o crime que se investiga

CÓDIGO PENAL
DOS CRIMES CONTRA AS PESSOAS

Capítulo II

DAS LESÕES CORPORAIS

Lesão corporal
Art. 129. Ofender a integridade corporal ou a saúde de outrem:

Pena – detenção, de 3 (três) meses a 1 (um) ano.

Lesão corporal de natureza grave


§ 1º Se resulta:

I – incapacidade para as ocupações habituais por mais de 30 (trinta) dias;

II – perigo de vida;

III – debilidade permanente de membro, sentido ou função;

IV – aceleração de parto:

Pena – reclusão, de 1 (um) a 5 (cinco) anos.

§ 2º Se resulta:

I – incapacidade permanente para o trabalho;

II – enfermidade incurável;

III – perda ou inutilização de membro, sentido ou função;


IV – deformidade permanente;

V – aborto:

Pena – reclusão, de 2 (dois) a 8 (oito) anos.

Lesão corporal culposa

§ 6º Se a lesão é culposa:

Pena – detenção, de 2 (dois) meses a 1 (um) ano.

Aumento da pena

§ 7º Aumenta-se a pena de um terço, se ocorrer qualquer das hipóteses do art. 121, § 4º que
diz: Se o crime resulta de inobservância de regra técnica de profissão, arte ou ofício, ou se o
agente deixa de prestar imediato socorro à vítima, não procura diminuir as conseqüências do
seu ato, ou foge para evitar prisão em flagrante. Sendo o crime doloso a pena é aumentada de
1/3 (um terço) se é praticado contra pessoa menor de 14 (quatorze) ou maior de 60 (sessenta)
anos.

Rixa
Art. 137. Participar de rixa, salvo para separar os contendores:

Pena – detenção, de 15 (quinze) dias a 2 (dois) meses, ou multa.

Parágrafo único. Se ocorre morte ou lesão corporal de natureza grave, aplica-se, pelo fato de
participação na rixa, a pena de detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos.

Art. 175 do CPP: Serão sujeitos a exame os instrumentos empregados para a prática da
infração, a fim de se lhes verificar a natureza e a eficiência.

São elementos do crime de lesão corporal:

A – ofensa à integridade corporal ou à saúde da vítima;

B – o instrumento ou meio vulnerante que foi empregado para produzir a ofensa;

C – a repercussão, temporária ou permanente, desta ofensa no organismo da vítima.

A perícia tem por finalidade examinar o corpo de delito para demonstrar tecnicamente,
num documento, que houve ofensa à integridade corporal ou à saúde da vítima, indicar qual
instrumento ou meio vulnerante foi empregado para produzi-la e, por fim, determinar a
repercussão da ofensa no funcionamento do organismo da pessoa ofendida.

Assim, a perícia tem o papel de estabelecer o nexo causal entre os vestígios da infração
encontrados na vítima e o crime que se está investigando.
O perito para:
A – avaliar se ocorreu ofensa à integridade corporal ou à saúde da vítima e

B – qual instrumento ou meio foi empregado para produzir a ofensa, deverá saber identificar
as características das lesões e a maneira como elas são produzidas. Para isso deverá conhecer
os agentes vulnerantes, ou seja, os agentes capazes de produzi-las.

AGENTES VULNERANTES
Os agentes vulnerantes são as energias capazes de produzir ofensa à integridade corporal
ou à saúde da vítima.

Mecanismos de suas ações e as lesões por eles produzidas.

Os agentes vulnerantes podem ser: Instrumentos e Meios

Os instrumentos vulnerantes podem ser:

1 – Contundentes
Estes agem por mecanismo de pressão sobre o corpo da vítima. São agentes mecânicos, sólidos,
rombos, líquidos, gasosos ou explosivos. As lesões por eles produzidas podem ser abertas ou
fechadas, superficiais ou profundas.

As lesões fechadas superficiais são:


A rubefação – é a vermelhidão produzida, por exemplo, por um tapa de mão aberta na face,
sendo esta lesão fugaz, desaparecendo em poucas horas após a sua ocorrência. Essa
modalidade de ofensa preenche os requisitos do princípio de insignificância.

A escoriação – é a destruição da epiderme pela ação tangencial do instrumento contundente


sobre a pele, deixando exposta parte da derme. Nesse local, há extravasa-mento de serosidade
para o exterior, a partir dos vasos sanguíneos localizados nas papilas dérmicas. A serosidade
que se deposita no local é inicialmente líquida, depois densa e, posteriormente, ressecada,
originando uma crosta acastanhada que, com o tempo, torna-se escura e, em alguns dias, se
desprende, deixando uma mancha rósea ou branca e que, depois de meses, retorna à
pigmentação normal, sem deixar cicatriz.

O edema traumático – é o aumento de volume cutâneo no local lesionado, normal-mente


sobre uma estrutura sólida subjacente, e se deve ao aumento do líquido extracelular nessa
área, provocado pelo trauma.

A equimose – é o acúmulo de sangue entre as malhas do tecido lesionado, resultante de micro-


hemorragia secundária à lesão de vasos da área. Este sangue fica aprisionado na malha do
tecido, não se desfazendo, mesmo após seccionar o local lesado. Ela adquire a forma do
instrumento que a produziu. A equimose é inicialmente de cor rubra, devido ao
extravasamento de sangue que é responsável por essa cor, porém, com o passar do tempo, o
sangue sofre modificação química que incide sobre a hemoglobina ali depositada, o que
promove uma alteração gradativa da sua cor, sendo esta observação descrita por Legrand du
Saulle, citado por ALCÂNTARA (2006, p. 55), que estabeleceu o espectro equimótico assim
caracterizado:

Cor avermelhada – do 1º ao 3º dia.

Cor azulada – do 4º ao 6º dia.

Cor esverdeada – do 7º ao 12º dia.

Cor amarelada – do 13º ao 21º dia, após o que desaparece

A equimose, também, ocorre profundamente nos tecidos e órgãos. Ela pode se formar na
parte esponjosa de ossos, sendo denominada equimose óssea, característica importantíssima
para definir reação produzida em vida, sendo observada com emprego de foco de luz atrás do
osso e sua observação direta, como uma mancha escura na forma da impregnação hemorrágica
ali depositada, ou pelo exame histopatológico da área comprometida onde se observa vestígio
microscópico da hemorragia. Ela está presente também nas linhas de fratura óssea, conferindo
uma cor escura, ao longo da linha de fratura, pelo depósito de sangue na área, indicando
reação produzida em vida.

O hematoma – é uma coleção sanguínea, em forma de um lago, no interior dos tecidos, ou em


espaços internos preexistentes, secundária ao rompimento dos vasos sanguíneos, após a ação
do agente contundente. Essa coleção, se aberta, drena o seu conteúdo e se torna vazia. O
hematoma pode se localizar em qualquer parte do corpo e, por isso, dependendo da nobreza
do local atingido, pode levar ao óbito.

É clássica a formação do hematoma em torno do túnel por onde o projétil de arma de fogo
atravessa os tecidos do corpo humano, sendo um caminho a ser seguido, para encontrá-lo,
quando se aloja no seu interior. Indica reação produzida em vida.Lesões contusas fechadas
profundas –são as luxações, as fraturas ósseas, as róturas viscerais, os esmagamentos de parte
do corpo.

Lesões contusas abertas – são referidas como feridas contusas. O instrumento


contundente age por pressão, esmagando a pele e os tecidos subjacentes, rompendo sua
resistência e produzindo uma solução de continuidade, cujos bordos são irregulares,
anfractuosos, seu fundo mostra fibras teciduais esgarçadas, suas margens apresentam, na
superfície, escoriação e, na parede, equimose. As bordas da ferida não se coaptam quando são
reaproximadas.

Os instrumentos contundentes produzem lesões ou feridas contusas. Nunca referi-las


como lesões ou feridas contundentes, porque contundente é apenas o instrumento.

2 – Cortantes
Estes instrumentos normalmente são alongados e delgados e têm um gume afiado. Agem
por deslizamento e pressão, seccionando os tecidos, fazendo uma ferida, cujos bordos e
vertentes são regulares, lisos e que se coaptam quando reaproximados. Suas margens não
mostram escoriação nem equimose, seu fundo não apresenta trabéculas.
As lesões produzidas por ação de instrumentos cortantes são referidas como feridas incisas
e não como feridas cortantes. porque cortantes são apenas os instrumentos que têm a
propriedade de cortar.

O Professor Hermes Rodrigues de Alcântara, nos plantões, de forma brincalhona, dizia: “Se
você passar a ferida, dita cortante, em alguém e ela cortar a pessoa, o termo está correto,
porém se ela não cortar, jamais poderá ser dita ferida cortante, por impropriedade de ação;
será, pois, ferida incisa.” (Informação verbal)

São exemplos de instrumentos cortantes: gilete, navalha, faca, lâmina de bisturi, caco de
vidro, etc.

3 – Perfurantes
Estes instrumentos são cilíndricos, finos, ou cônicos, com o comprimento predominando
sobre o seu diâmetro. Agem por pressão num ponto do corpo, perfurando a pele e afastando os
tecidos subjacentes, à medida que os penetra.

Os mais finos produzem feridas punctórias e os mais grossos, feridas ovaladas. São
exemplos de instrumentos perfurantes: agulha, prego, estilete, etc.

4 – Cortocontundentes
Estes instrumentos são alongados, têm um gume e são pesados. Agem cortando e
pressionando pelo peso e pela energia empregada no seu manejo. Produzem feridas abertas,
minimamente de bordos irregulares, com vertentes contendo equimose. Se houver um osso
abaixo dos tecidos superficiais atingidos, há corte e fratura dele.

Os instrumentos cortocontundentes produzem feridas cortocontusas. São exemplos desses


instrumentos: o facão, o machado, a foice, os dentes, a enxada, a motosserra, etc.

5 – Perfurocortantes
Estes instrumentos possuem largura estreita, espessura fina, uma ponta e um gume, ou
dois. Agem por pressão, seccionando a pele e os tecidos, penetrando profundamente, fazendo
uma ferida em fundo cego, ou transfixando o corpo. A ferida é de dimensão externa reduzida e
de extensão interna profunda. Ela apresenta os bordos com características semelhantes à
ferida incisa produzida pelo instrumento cortante.

O perito deve, ao descrever essa ferida, indicar sua localização, sua característica, sua
dimensão, seu trajeto, os órgãos que lesionou, que danos produziu e determinar sua gravidade.

Os instrumentos perfurocortantes produzem feridas perfuroincisas. São exemplos desses


agentes: a faca peixeira, o canivete, a espada, o punhal, etc.

6 – Perfurocontundentes
Estes instrumentos, na sua grande maioria, são acionados pelas armas de fogo. São
cilíndricos, em forma de pequena ogiva, medindo alguns centímetros de comprimento por um
diâmetro – calibre – referido em centésimos de polegadas ( 22, 32, 38, 44, etc.), ou em
milésimos de polegadas ( 220, 320, 380, etc.), ou em milímetros ( 6mm, 6,35mm, 7,65mm,
8,35mm, 9mm), sendo esse diâmetro correspondente ao calibre da arma de fogo. Há, ainda, os
instrumentos esféricos que normalmente são múltiplos, emitidos por um só disparo. A munição
pode conter um só projétil – caso da cápsula – ou múltiplos – caso do cartucho.

Eles agem de forma diversa, ao produzir a lesão, na dependência da distância entre a


“boca de fogo” (extremidade distal do cano da arma de fogo) e o alvo.

Tiro encostado
É aquele provocado quando a boca de fogo está apoiada no alvo.

No disparo com a boca de fogo encostada no alvo – neste caso, o corpo humano – além do
projétil que atinge a pele, rompendo-a e penetrando nos tecidos subjacentes, há também a
penetração dos gases originados na câmara de explosão da cápsula, que acompanham o
projétil através do cano da arma e, junto com ele, penetram no corpo pela abertura feita na
pele e que fica em continuidade com o cano da arma pressionado sobre essa superfície. Esses
gases incandescentes, misturados à fumaça e contendo restos de pólvora incombusta, devido à
sua ação expansiva, abrem abaixo da pele, uma cratera e parte deles retorna para fora,
lacerando a abertura feita pelo agente perfurocontundente, produzindo uma ferida de bordos
estrelados, evertidos, com esfumaçamento e queimadura das suas vertentes, chamada câmara

de mina, descrita por Hoffmann (Fig. 01), citado por ALCÂNTARA (2006, p. 58).

Figura 1, IML–DF. Câmera de mina de Hoffmann.


Se sob a pele encontra-se uma superfície óssea, no periósteo ao redor da ferida de entrada
do projétil, ocorre deposição de fumaça e de pólvora incombusta, fazendo uma impregnação
de cor escura, que foi descrita por Benassi, formando o sinal de Benassi, (Idem), e que
caracteriza tiro encostado (Fig. 02).

Figura 2, IML–DF Sinal de Benassi. (área de cor escura em torno da ferida de entrada
Na pele, ao redor do orifício aberto pelo projétil, vê-se um halo de queimadura que
desenha a boca do cano da arma de fogo, ali apoiado, que é o sinal de Werkga-ertner, (Idem)
(Fig. 03), melhor evidenciado na pele que recobre partes moles.

Se o disparo for efetuado com o cano da arma apoiado sobre o abdome, por exemplo, a
ferida será circular, apresentando a cratera abaixo da pele e, além dela, o Sinal de
Werkgaertner. Nesta circunstância não se faz a ferida estrelada, de bordos evertidos, porque os
gases penetram nos tecidos moles da região, sendo a sua energia absorvida e não encontram
resistência suficiente para parte deles retornar para a superfície.

Figura 3, IML–DF Halo em torno da ferida (impressão do cano da arma). Sinal de Werk-
gaertner.
Tiro a curta distância
Esta é a ferida com mais riqueza de elementos. Apresenta o orifício de entrada do projétil
de arma de fogo, de forma circular, contendo zona de contusão e de enxugo e em torno dele a
queimadura feita pelos gases incandescentes, o esfumaçamento provocado pela deposição da
fumaça da pólvora e a tatuagem produzida pela penetração de resíduos da pólvora incombusta
na pele. Esses elementos saem junto com o projétil através do cano da arma, após o disparo da
cápsula, e dependendo da distância em que se encontra o alvo eles o atingem fazendo esta
lesão característica. A ferida é de forma circular se o disparo é efetuado perpendicular ao alvo,
apresenta zona de contusão e de enxugo ao seu redor, exibindo em torno esfumaçamento,
queimadura e tatuagem (Fig. 04). A boca de fogo, para formar esta ferida com suas
características, deve encontrar-se numa distância de poucos centímetros até 75 centímetros
afastada do alvo.

Figura 4, IML–DF Tatuagem em torno da ferida de entrada do projétil de arma de fogo.


Tiro a distância
Aquele que acontece quando a boca de fogo encontra-se afastada além de 75 centímetros
do alvo. Neste caso, apenas o projétil o atinge. Se perpendicular ao alvo, faz uma ferida circular,
que apresenta ao seu redor, superficialmente, orla de enxugo e, na parede, orla de contusão
(Fig. 05).

Figura 5, IML–DF Ferida com orla de contusão e de enxugo.

É importante lembrar que, tanto no tiro a curta distância, como no tiro a distância, o
projétil pode atingir o alvo, perpendicularmente, ou inclinado, ou mesmo só tangencialmente.
Atentar para a forma da ferida de entrada do agente, em cada uma dessas circunstâncias, para
saber identificar o seu possível trajeto. Ferida ovalada, com um dos polos mostrando
arrancamento da epiderme e o polo oposto apresentando forma em bizel, indica que o projétil
penetrou inclinado, no sentido do arrancamento da epiderme, indo para a área em bizel.
Ferida de saída
O projétil que transfixa o corpo faz uma ferida de saída, normalmente maior que a de
entrada, podendo ser irregular, devido à modificação e deformidade que sofre ao longo do seu
trajeto, enquanto atravessa o corpo. Sua borda é evertida e apresenta contusão (Fig. 06).

Figura 6, IML–DF Ferida de saída de projétil de arma de fogo.

O projétil, ao transfixar os tecidos, forma um hematoma no seu trajeto. Para encontrá-lo,


na ausência do auxílio da radiografia, basta seguir o hematoma. Este é uma reação ocorrida em
vida.

É dever do perito descrever as características da ferida de entrada do projétil de arma de


fogo e informar, no seu laudo, se ela é compatível com tiro encostado, a curta distância ou a
distância. É seu dever, também, descrever o trajeto descrito pelo projétil, no corpo da vítima, o
que lesou e a gravidade das lesões por ele produzidas. Essas informações são relevantes para se
entender a dinâmica do delito.
Instrumentos rombos, cilíndricos, longos, com diâmetro medindo de 5 a 10 milímetros,
podem produzir ferida perfurocontusa que apresenta forma circular, com orla de contusão. O
instrumento sai pelo próprio local de penetração, evertendo os bordos da ferida.

Os meios vulnerantes podem ser:

1. MEIOS FÍSICOS

1.1. Energia térmica


Suas modalidades são: a termonose, as queimaduras e as geladuras.

1.1.1. Termonoses
São, principalmente, provocadas pela ação do calor do sol, e hoje também pela intermação
( calor artificial). Estão mais relacionados com acidentes rotineiros ou com a infortunística do
trabalho. Podem produzir lesões de intensidade variada na dependência do grau de exposição.

1.1.2. Queimaduras
Ocorrem pela ação direta do calor, por chama, líquido, sólido ou gás, quentes, sobre o
corpo ou indiretamente pela ação da irradiação. As queimaduras são classificadas em quatro
graus por Hoffmann e Lussena, citados por ALCÂNTARA (2006, p. 62).

1º grau – eritema

2º grau – flictena

3º grau – escarificação

4º grau – carbonização

No eritema, há a vermelhidão da pele provocada pela dilatação dos vasos sanguíneos que
irrigam a derme. Não há lesão da epiderme. Esta alteração é fugaz e desaparece em horas ou
dias.

Na flictena, há vesicação com formação de bolhas sobre a camada germinativa da


epiderme, contendo exsudato de cor límpida ou amarelo-citrina. Habitualmente essas bolhas se
rompem, porém a epiderme se refaz sem deixar cicatriz.

Na escarificação,a lesão compromete a epiderme, alcançando as dermes: papilar e


reticular superficial, promovendo necrose desses tecidos, o que resulta em ferida aberta, cuja
cicatrização se faz da periferia para o centro, porém, frequentemente, deixa como sequela uma
cicatriz retrátil, irregular, inelástica, com deformidade local.

Na carbonização,há queimadura superficial e profunda dos tecidos, com re-tração


muscular exuberante, fratura dos ossos, explosão da calota craniana pela ação expansiva dos
vapores originados pelo cozimento do encéfalo. Há redução da estatura do indivíduo. As
vísceras pélvicas frequentemente estão preservadas pela proteção dos ossos pélvicos.
Nos carbonizados, a perícia experimenta alguns desafios; o principal deles é saber se a
vítima foi queimada enquanto estava viva, ou quando já estava morta. Procurar vestígios de
ação de outros mecanismos que possam ter produzido a morte, como projéteis de arma de
fogo, ação de instrumentos contundentes, perfurocortantes, etc.

O principal mecanismo de morte nos incêndios é por inalação do monóxido de carbono,


associada à respiração de fumaça e seus produtos tóxicos, lesando a árvore respiratória com
produção de insuficiência respiratória e óbito.

Sempre que possível, deve-se colher sangue para exame de dosagem do monóxido de
carbono e examinar a laringe e a traqueia, em busca de deposição de fuligem, indicativa de que
a vítima respirou no ambiente do incêndio.

Queimaduras de 2º e de 3º graus podem determinar o óbito, dependendo da ex-tensão da


área corporal acometida. Pulaski e Tennison, citado por GALVÃO (2008, p. 74) estabeleceu a
regra dos nove para as regiões corporais, tendo em conta crianças e adultos, com os seguintes
critérios para cálculo da superfície queimada:

Queimaduras do segundo e do terceiro graus que comprometem 50% ou mais da área


corporal são consideradas graves.

O óbito pode decorrer dos distúrbios hidroeletrolíticos devido à perda de líquidos através
das áreas desnudas; e ou ocasionado pela infecção bacteriana dessas áreas desprotegidas, com
evolução para septicemia; e ou pela toxemia secundária à absorção dos produtos da área
necrosada; e ou pela embolia disseminada; e ou pela insuficiência renal por nefrose tubular
aguda; e ou em decorrência de pneumonia como complicação do confinamento ao leito.

A perícia tem por objetivo, nas queimaduras dolosas, atender aos parágrafos 1º e 2º do
artigo 129 do Código Penal, bem como o qualificador do crime abrigado no artigo 61, inciso II,
letra d. do mesmo Código.
Nas perícias de vítimas de queimaduras dolosas, o perito deve informar se houve perigo de
vida; se resultou incapacidade para exercer as atividades habituais por mais de 30 dias; se
resultou debilidade permanente de membro, sentido ou função; se resultou incapacidade
permanente para o trabalho, ou enfermidade in-curável, ou perda ou inutilização de membro,
sentido ou função, ou deformidade permanente, ou aceleração de parto ou aborto.

Ao responder ao 3º quesito do laudo de lesão corporal, ou ao 4º quesito do laudo de


necropsia, nas perícias de crimes dolosos, em que o agressor os praticou com o emprego de
fogo, responder afirmativamente a este quesito. Essa informação é importante porque qualifica
o crime e aumenta a pena aplicada ao agressor. Uma pequena percentagem das lesões
provocadas pelas queimaduras, pode, após algum tempo, originar câncer de pele (úlcera de
Marjoli, melanoma).

Nos acidentes, mesmo quando ocorrem incêndios, e, nos suicídios, com o emprego de
fogo, este quesito torna-se irrelevante, pois não há o agressor e deverá ser respondido com o
termo: Prejudicado.

1.1.3. Geladuras
É a baixa da temperatura corporal secundária à exposição ao frio. Pode provocar lesões
localizadas e sistêmicas. Em determinadas circunstâncias, como idade, estado geral do
indivíduo, alcoolismo, etc. e o tempo de exposição, pode ocorrer o óbito. A principal causa de
exposição ao frio é acidental, podendo também ser devida à escassez econômica. Há a
criminosa, como o abandono de incapaz.

A sua perícia é de difícil constatação, tendo em conta a natureza das lesões provocadas nos
órgãos e tecidos, por não serem patognomônicas. Aqui, ganham relevância os achados
encontrados na perícia do ambiente onde se achava a vítima. Esses achados devem ser
correlacionados com as lesões observadas, para conclusão do exame pericial.

1.2. Energia Elétrica

1.2.1. Energia elétrica cósmica (natural)


É a energia originada nas descargas elétricas provocadas pelos raios e pelos relâmpagos.
Produzem lesões que podem determinar a morte (fulminação), ou apenas lesões localizadas
(fulguração). A lesão característica deixada na pele é a de aspecto arboriforme devido à
paralisia vascular e que recebe o nome de Sinal de Litchtenberg, citado por ALCÂNTARA (2006,
p. 64). Está localizada na pele da área de entrada da energia elétrica no corpo da vítima. Pode
ter uma lesão de saída, normalmente situada no pé, ponto de contato com o chão, fazendo o
aterramento para, a partir daí, a energia se difundir no solo. Há casos em que nenhuma lesão
importante é observada e outros em que elas são perceptíveis e de extensão variada, indo de
chamuscamento do cabelo, carbonização de parte do corpo, contusões superficiais e
profundas, manchas metálicas, fraturas e até amputações.

1.2.2. Energia elétrica artificial


É a energia produzida por geradores e destinada às atividades humanas na vida cotidiana,
em casa, no lazer, no trabalho, nas indústrias, etc.
Ela pode provocar lesões chamadas de eletroplessão, sendo fatais ou não. Alguns autores
referem-se à eletrocussão quando produz a morte e à eletroplessão quando isso não ocorre.

A lesão de entrada da eletricidade artificial se faz pelo contato do condutor da energia com
o corpo da vítima. Neste local forma-se uma lesão chamada marca de Jellineck, citado por
ALCÂNTARA (2006, p. 63), cuja característica é ser esbranquiçada, endurecida, mumificada, com
o centro deprimido, bordos elevados, por vezes, no formato do condutor: fio, pino de tomada,
etc. Pode ocorrer metalização por deposição de partículas de fusão do metal, fazendo uma
tatuagem superficial na área de contato do eletroduto. Outra lesão encontrada é a queimadura,
que pode ser do 1º, do 2º e até do 3º grau, provocada pela transformação da energia elétrica
em térmica, que é o efeito Joule.

O mecanismo de morte pela ação da energia elétrica, natural ou artificial, é explicado pelas
teorias:

Cardíaca – fibrilação ventricular; cerebral – hemorragia intracraniana e lesão encefálica;


pulmonar – pela asfixia secundária à tetanização dos músculos respira-tórios, ao edema agudo
pulmonar e à apneia.

A perícia é solicitada, tendo como principal causa os acidentes, sendo pouco provável a
apuração de homicídio. Aqui, além das alterações encontradas, ou não, no cadáver, é
importante a perícia do local onde ocorreu o fato.

Nos casos de perícia no vivo, colher a história e associar com os achados do exame pericial
para emissão do laudo médico-legal.

1.3. Energia Radioativa


É a radiação ionizante que apresenta duas formas:

– Onda eletromagnética (raios-x, raios gama) = são os fótons.

– Radiação de partículas (alfa, beta, prótons, deuteron, meson).

A radiação por onda eletromagnética é largamente utilizada na medicina para fazer


diagnósticos (caso dos raios-x) e para tratar câncer (radioterapia). É realizada por aparelhos que
permitem dirigir a aplicação da radiação para o alvo e dosar a quantidade da sua aplicação.
Sabe-se que este tipo de exposição tem efeito cumulativo.

A radiação é a transferência física da energia de seu sítio de origem para o alvo biológico,
induzindo ionização de seus átomos. Dessa maneira, provoca alteração por efeito direto sobre
os átomos-alvo, sendo todos os átomos, moléculas, enzimas, proteínas, RNA, vulneráveis;
todavia o principal alvo é o DNA no qual a radiação produz danos no cromossomo.

Já na alteração por efeito indireto, ela exerce sua ação, produzindo radiólise da água
intracelular, com formação de radicais livres que interagem com átomos e moléculas críticos,
particularmente o DNA, para provocar modificações químicas e efeito deletério. As
modificações são dependentes da dose da irradiação. Na exposição total do corpo (ampla
exposição), há a ocorrência da síndrome aguda da radiação com a presença de náusea, vômito,
diarreia, dermatite, alteração do sistema nervoso, confusão mental, leucopenia. O óbito ocorre,
dentro de horas, até 14 dias após a exposição.

Efeitos tardios da radiação: mutações celulares que, em mulheres grávidas, provocam


anomalias fetais intrauterinas; elas ainda produzem a morte, ou má-formação e ou retardo
mental e surgimento de câncer, antes dos 20 anos (linfoma e leucemia). Mulheres desenvolvem
câncer de mama. Mulheres e homens apresentam: mieloma múltiplo, câncer do trato digestivo,
do trato urinário, da glândula salivar, do sistema nervoso, dos ossos, do pulmão.

A perícia é solicitada para avaliar principalmente acidentes. Há cada vez mais aparelhos
utilizando essa forma de energia, bem como usinas nucleares para a produção de eletricidade,
abrindo possibilidades para a ocorrência de acidentes radioativos.

2. MEIO QUÍMICO
São as energias de ordem química que, em contato com o organismo, provocam lesões
externas ou internas. São representadas pelos cáusticos e venenos.

2. 1. Cáusticos
São substâncias químicas com propriedades desidratantes e coagulantes – os ácidos e
liquefativas – as bases. Quando em contato com a pele, produzem lesões com características
próprias, que variam de úlcera revestida por crosta negra e dura (ácido sulfúrico) a úlceras
úmidas, revestidas por material translúcido, mole (potassa, soda). A lesão é destrutiva e
depende da quantidade do produto utilizado e do tempo em que ele ficou em contato com o
corpo da vítima. Ao cicatrizar, normal-mente produz sequela, representada por deformidade
permanente. Se ingeridos, produzem lesões nas mucosas, ocasionando sequelas importantes
no trato digestivo.

A perícia é solicitada para esclarecer crimes passionais, tentativa de suicídio ou contato


acidental.

2.2. Venenos
São substâncias químicas que, na dependência da sua dose, produzem lesões graves,
podendo determinar o óbito da pessoa.

Os venenos penetram no organismo pelas vias: gastrointestinal, respiratória, subcutânea,


intramuscular, venosa e arterial e, ainda, pelas mucosas e pela pele. São absorvidos, passam
pelo fígado, atuam sistemicamente e são eliminados pelo sistema urinário, gastrointestinal,
respiratório e pela pele. Frequentemente levam ao óbito.

A perícia é solicitada para esclarecer possível crime, ou suicídio, ou acidente. (O gás sarin
foi utilizado no metrô de Tókio, num ataque terrorista.) O objetivo do exame é demonstrar que
o óbito foi produzido pelo emprego de veneno; deve-se, pois, informar qual veneno foi usado e
os demais comemorativos envolvidos na ocorrência; apontar para a causa mais provável, se
homicídio, ou suicídio, ou acidente.
O crime de homicídio perpetrado com o emprego de veneno é qualificado no artigo 121 §
2º, inciso III do CP e está inserido no 4º quesito do laudo de necropsia. É dever do perito, nessas
circunstâncias, responder afirmativamente ao quesito, pois esta resposta é do interesse da lei.

O suicídio, embora praticado com o emprego de veneno, não motiva a resposta afirmativa
a esse quesito porque não há o homicida, logo, é impossível qualificar a sua ação. Não há a
quem punir, portanto, a sua resposta está prejudicada.

3. MEIO FÍSICO-QUÍMICO
São as asfixias. A asfixia é a interrupção mecânica da passagem do ar para dentro dos
alvéolos pulmonares, provocando a interrupção da hematose.

O mecanismo que leva à asfixia pode ser:

a) impedimento à entrada do ar pelos orifícios: nasais e oral (sufocação);

b) penetração de sólido ou líquido no interior da árvore respiratória obstruindo-a (afogamento,


aspiração de sólido ou conteúdo alimentar presentes na faringe);

c) constrição do pescoço com obliteração da traqueia, impedindo a passagem do ar


(enforcamento, estrangulamento, esganadura);

d) compressão torácica com anulação da sua função de fole, não permitindo a entrada do ar
nos pulmões (soterramento, acidente de trânsito, com a vítima presa nas ferragens e o tórax
comprimido).

As asfixias podem decorrer de acidentes, de suicídio ou de homicídio.

Quando o agressor comete o crime de homicídio com o emprego de asfixia, o cri-me é


qualificado, como o disposto no 4º quesito do laudo de necropsia, e o perito tem o dever de
respondê-lo afirmativamente, porque esta resposta tem interesse legal.

Como é lógico, nos acidentes e nos suicídios, nos quais o óbito é decorrente de asfixia, a
resposta a este quesito não tem interesse legal, porque não há o homicida, portanto, não é
possível qualificar a sua ação. A resposta ao quesito, nessas circunstâncias, está prejudicada.

4. MEIO BIODINÂMICO
Na sua forma pura é secundária a uma alteração endógena, que modifica o equilíbrio
circulatório, com perda da pressão arterial, incapacidade da irrigação dos órgãos, levando à
síndrome do choque e, se não revertida, provoca a morte.

Não tem interesse médico-legal, pois a sua etiologia exógena sempre é secundária a outras
energias vulnerantes, principalmente as mecânicas.

5. MEIO BIOQUÍMICO
É representado por alterações secundárias à falta de ingestão de alimentos, levando à
inanição, com todos os seus comemorativos.
Tem interesse médico-legal quando provocada para punir, ou por omissão, ou sevícias.
Pode, também, ocorrer na forma de protesto, como na greve de fome.

6. MEIO MISTO
São modificações sofridas pelo organismo, devido à ação de energias biodinâmicas e
bioquímicas, que determinam um quadro de fadiga.

A fadiga é secundária ao esforço físico continuado, intenso, de tal ordem que rompe o
equilíbrio do organismo, alterando suas funções e produzindo perturbações
cardiorrespiratórias, musculares e psíquicas.

Não tem interesse médico-legal; é principalmente ligado à infortunística.

C – Avaliação da repercussão temporária ou permanente da ofensa produzida pelo


agressor no organismo da vítima.
O texto, a seguir, tem por objetivo oferecer ao perito os elementos para o entendimento
de como realizar esta avaliação.

Como já referido, anteriormente, as situações que interessam à lei, porque aumentam a


pena aplicada ao agressor, e, por isso, devem ser esclarecidas pela perícia, estão textualmente
descritas nos § 1º e § 2º do art. 129 do CP. São elas:

Perigo de vida
O perito precisa ter segurança para avaliar este quesito. O perigo de vida é caracterizado
por uma modificação importante, provocada no equilíbrio do organismo do lesionado,
produzida pela ação vulnerante que, se não corrigida, fatalmente irá determinar o óbito. O
atendimento médico normalmente muda o prognóstico da repercussão da lesão, na vítima,
impedindo a sua morte, o que não exclui o perigo de vida, que existiu concretamente. O perito,
para avaliar a gravidade da ação vulnerante, deve abstrair o atendimento médico e colocar a
vítima lesionada, sem a possibilidade dessa atenção.Ela iria sobreviver? Se sim, não houve
perigo de vida. Se não, houve o perigo de vida.

Recordar que, na perícia no vivo, este quesito é respondido afirmativamente, sempre que
a vítima, lesionada gravemente, sobreviveu porque recebeu atendimento médico. Já a perícia
no morto é feita quando a lesão sozinha produziu o óbito, ou mesmo com o atendimento
médico, não foi possível evitá-lo. O atendimento médico, para mudar o prognóstico das lesões
provocadas pela ofensa, deve corrigir as alterações por ela produzidas, que sejam incompatíveis
com a vida. Drenar o tórax com hemotórax e pneumotórax produzidos pela agressão; realizar
laparotomia para esplenectomia e sutura hepática por lacerações traumáticas; proceder
craniotomia para drenagem de hematoma intracraniano traumático, etc.

O perito deve, no laudo, fundamentar a ocorrência do perigo de vida, de forma clara e


explicativa, para, só depois, responder ao quesito, afirmativamente, quando for pertinente esta
resposta.
Incapacidade para as ocupações habituais por mais de 30 (trinta) dias
O perito considera esta incapacidade, produzida pela ação vulnerante, como sendo uma
limitação, um desconforto, para a realização de qualquer atividade da vítima, como lazer,
andar, alimentar, dormir, trabalhar, etc, e que perdure por mais do que trinta dias, a contar da
data do delito.

Quando a lesão é de certa monta, como uma luxação, uma fratura, uma laparotomia com
rafias de vísceras, etc, o perito, no primeiro exame, se realizado antes de trinta dias da
agressão, responde a este quesito com o termo: aguardar e deve orientar para que o(a)
periciando(a) retorne para exame complementar, logo após trinta dias da agressão, época em
que terá os elementos para responder sim ou não.

O artigo 168 do CPP, segundo parágrafo, orienta que o exame complementar, para responder a
este quesito específico, seja realizado logo que decorra o prazo de trinta dias, contado da data
do crime. A solicitação para este exame complementar é determinada pela autoridade policial
ou judiciária, de ofício, ou de requerimento do Ministério Público, do ofendido ou do acusado,
ou de seu defensor.

Porém, o perito é quem conduz a perícia; cabe a ele orientar o retorno da vítima para
poder cumprir o prazo do exame.

Debilidade permanente de membro, sentido ou função, ou aceleração de parto


O perito deve acompanhar o(a) periciando(a) por meio de exames complementares e
aguardar a resolução definitiva da lesão provocada pelo agressor e que tenha comprometido
membro, sentido ou função, para avaliar se resultou, neles, sequela que represente alguma
debilidade, e que esta seja permanente. O perito precisa enquadrar a sequela dentro do texto
do artigo 129 do CP, fundamentando a sua argumentação, de modo que o julgador possa ter os
elementos para classificar a gravidade da lesão.

Membros são os apêndices do corpo (membros superiores e inferiores).

Sentido é a visão, a audição, o olfato, o paladar, o tato.

Função é o desempenho de um órgão, aparelho ou sistema.

Exemplos de debilidades:

De membro - fratura de joelho que cicatriza e deixa como sequela limitação dos movimentos da
articulação, caracterizando debilidade permanente daquele membro inferior.

De sentido - perfuração traumática do olho esquerdo com perda do seu conteúdo e cegueira,
caracterizando debilidade permanente da visão.

De função - trauma na região oral, com fratura completa dos dentes molares direitos. A
ausência desses dentes determina sequela que representa debilidade permanente da função
mastigatória.
Aceleração de parto - É a antecipação do parto por ação da energia vulnerante. A mulher deve
estar grávida; esta é uma concausa fisiológica preexistente.

Incapacidade permanente para o trabalho


Esta incapacidade permanente é para qualquer trabalho, não se restringe ao trabalho que
a vítima exercia antes da lesão. O perito deve avaliar a sequela produzida pela ação vulnerante
e informar se ela deixou a vítima permanentemente sem condições de executar qualquer
trabalho, fundamentando este desfecho.

Exemplo: uma vítima é agredida com o agente golpeando-a com um instrumento


contundente no crânio e provocando lesão cranioencefálica grave. Foi operada para drenagem
de hematoma intracraniano e permaneceu em coma na UTI. Após sua recuperação,
apresentou, como sequela definitiva, perda da capacidade cognitiva. O perito deve informar, no
laudo, que essa perda representa uma sequela que a incapacita permanentemente para o
trabalho. O papel do perito é identificar se resultou sequela e enquadrá-la, nos termos
existentes no texto dos parágrafos primeiro e segundo do artigo 129 do Código Penal, para que
o juiz tenha os elementos necessários para formar a sua convicção quanto à natureza da
gravidade da lesão e cominar a pena adequada.

Enfermidade incurável
A enfermidade incurável é uma patologia que a vítima passou a apresentar, como
resultado da agressão sofrida e que não tenha cura.

Exemplo: epilepsia, após traumatismo cranioencefálico; hemiplegia, após traumatismo


cranioencefálico, etc.

O perito descreverá as lesões observadas, resultantes da ação vulnerante, a sua resolução


e avaliará a presença de sequela. Se a sequela, por exemplo, for uma epilepsia, pós TCE, ele, no
tópico Discussão, do laudo de lesão corporal irá informar que esta epilepsia representa uma
enfermidade incurável, fundamentando, assim, a conclusão do laudo e a resposta ao quesito
pertinente. Procedendo assim, ele dá lógica ao laudo, oferece ao julgador o entendimento do
que ocorreu e o porquê da resposta afirmativa sobre a existência da enfermidade incurável,
justificando-a.

Perda ou inutilização de membro, sentido ou função


Aqui a ação vulnerante é de tal ordem que deixa como sequela a perda, ou inutilização de
membro, sentido, ou função.

A perda se caracteriza quando o agente vulnerante provoca a separação do membro do


corpo. Já a inutilização, quando o agente vulnerante não o separa do corpo, porém produz uma
lesão que o torna, mesmo presente, inútil.

Exemplo: uma agressão feita com o emprego de uma foice que golpeou o braço direito,
decepando-o. Esta ação produziu como sequela: a separação desse membro do corpo. Esta
sequela representa perda do membro superior direito.
Uma agressão com arma de fogo cujo projétil atinge a parte lateral esquerda do pescoço,
no sentido da frente para trás, lesando o plexo braquial, o que provoca perda total dos
movimentos do membro superior esquerdo. O membro, neste caso, está presente, porém não
exerce nenhum movimento, o que o torna inútil. O perito deverá informar que a lesão do plexo
braquial deixou como sequela: inutilização do membro superior esquerdo.

Agressão a faca, com orquiectomia bilateral em crime passional. O perito deverá informar
que a retirada dos testículos pelo agressor ocasionou uma sequela representada pela perda da
função reprodutiva, além de deformidade permanente.

Deformidade permanente
A deformidade permanente é uma sequela produzida pela ação vulnerante, que, após a
sua cicatrização, deixa como resultado uma alteração estética, em repouso, ou em movimento,
que representa perda do aspecto habitual do ofendido.

O artigo 5º da Constituição Federal diz:

Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos
brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à
igualdade, à segurança e à propriedade

Assim, a lei tutela a aparência da pessoa, independente de raça, sexo, idade, condição
social, atividade profissional, ou qualquer outro atributo que pudesse privilegiar um, ou outro
indivíduo. Ao perito médico-legista interessa avaliar se a lesão produziu uma deformidade
permanente na vítima, qualquer que seja ela.

Exemplo: vítima agredida a faca, com perfuração abdominal e secção de alças intestinais.
Foi submetida à laparotomia com rafia de alças intestinais, lavagem da cavidade abdominal e
fechamento da parede abdominal, com instalação de drenos. Complicou com peritonite. Foi
reoperada, e a ferida cirúrgica cicatrizou, por segunda intenção, formando cicatriz grosseira,
extensa, com produção de deformidade permanente. Embora a cicatriz fique escondida pelas
vestes, a vítima terá oportunidade de mostrar-se sem camisa, na sua intimidade ou em
balneários, expondo-a. A deformidade é a perda do seu aspecto habitual e que lhe cause
constrangimento.

O perito não deve apenas descrever a cicatriz grosseira, é sua função classificá-la como
uma sequela que representa uma deformidade permanente, para fundamentar o seu laudo.
Embora a cicatriz grosseira tenha sido secundária ao ato cirúrgico, foi este ato que salvou a vida
da vítima, e a deformidade resultante tem nexo causal com a agressão. A vítima só foi operada
porque sofreu a agressão.

Aborto
É a morte fetal secundária à interrupção da gravidez, em qualquer fase da gestação,
provocada pela ação da energia vulnerante. O produto da gestação eventualmente pode ser
expulso vivo, porém morrerá, a seguir, devido à imaturidade orgânica incompatível com a vida
extrauterina.
Mapas para ilustrar a localização das lesões no corpo humano
É importante que o perito conheça as concausas, pois elas, se presentes, influirão na gravidade
da lesão.

CONCAUSAS
Concausas são situações que modificam para maior a repercussão da lesão no organismo
da vítima.

Elas podem ser:

1. PREEXISTENTES e estas se dividem em:

1.1. fisiológicas – são alterações fisiológicas que, se presentes no momento da ação do


agente vulnerante, agravam a sua repercussão. Exemplo: a vítima está com a bexiga repleta de
urina, é atingida por um chute no baixo ventre e ocorre a ruptura da víscera distendida, o que
agrava a lesão. Se a bexiga estivesse vazia não se romperia.

1.2. patológica – quando a vítima é portadora de patologia prévia, o que torna mais grave a
lesão produzida pelo mecanismo vulnerante. Exemplo: a vítima é portadora de osteoporose e é
agredida com chute na coxa que provoca facilmente fratura do fêmur. A osteoporose, ao
enfraquecer o osso, facilita a sua fratura, o que agrava a lesão.

Vítima portadora de hemofilia é agredida a golpe de canivete, fazendo ferida superficial,


que provoca sangramento profuso importante, requerendo socorro médico para coibi-lo.

2. SUPERVENIENTES – são situações patológicas que se instalam após a ação do agente


vulnerante, agravando a lesão. Exemplo: a vítima é agredida a faca, com perfuração abdominal
e lesão de alças intestinais, é operada, porém a situação se complica com peritonite. A
peritonite é uma concausa superveniente.

É lógico que as concausas, para agravarem a repercussão da ação vulnerante, são sempre
dependentes da ocorrência dessa ação. Aquelas têm nexo causal com estas. Não ocorrendo a
lesão, a pessoa tem o seu estado de saúde mantido. A vítima de uma agressão física irá
experimentar toda a gravidade da lesão que lhe foi impingida, tendo ela concausa ou não. Não
lhe interessa se o agressor sabia ou não do seu estado de higidez. O que lhe importa é a
extensão do dano sofrido, imposto pelo agressor. A lei tutela o bem-estar da pessoa humana. O
infrator deve responder pela natureza e repercussão das lesões por ele provocadas na vítima. É
este o foco da lei.

O perito, após conhecer as características das lesões provocadas pela ação dos agentes
vulnerantes, sabendo reconhecer essas lesões, identificar os agentes e ser capaz de avaliar a
repercussão das lesões, temporária ou permanente, no funcionamento do organismo da vítima,
está obviamente preparado para realizar a perícia médico-legal.
O trabalho pericial é relatado no laudo médico-legal.

LAUDO DO EXAME DELESÕES CORPORAIS


O laudo do exame de lesão corporal é formal e sua estrutura segue o modelo que
compreende as seguintes partes: a) Preâmbulo; b) Quesitos; c) Histórico; d) Descrição; e)
Discussão ou Comentários; f) Conclusão; g) Resposta aos Quesitos.

a) PREÂMBULO

Parte em que constam: a hora, o dia, o mês, o ano e a cidade em que a perícia é realizada; o
nome da autoridade requisitante do exame; o nome do legista incumbido de realizar o exame;
o nome do diretor do IML que designou o perito; o exame solicitado e a identificação da vítima.

b) QUESITOS

Os quesitos oficiais, propostos para serem respondidos, no Exame de Lesão Corporal, são os
seguintes:

QUESITOS DE LESÃO CORPORAL


1º) Há ofensa à integridade corporal ou à saúde do(a) periciando(a)?

2º) Qual o instrumento ou meio que a produziu?

3º) A ofensa foi produzida com o emprego de veneno, fogo, explosivo, tortura ou

outro meio insidioso ou cruel, ou de que podia resultar perigo comum? (resposta especificada)

4º) Resultou perigo de vida?

5º) Resultou incapacidade para as ocupações habituais, por mais de 30 (trinta) dias?

6º) Resultou debilidade permanente de membro, sentido ou função, ou aceleração de parto?


(resposta especificada)

7º) Resultou incapacidade permanente para o trabalho, ou enfermidade incurável, ou perda ou


inutilização de membro, sentido ou função, ou deformidade permanente, ou aborto? (resposta
especificada).

Essa ordenação na distribuição dos quesitos foi sugerida pelo Professor Her mes Rodrigues
de Alcântara, e é adotada no IML de Brasília-DF; ao ordenar os quesitos 5º, 6º e 7º nessa
sequência, o fez para que eles coincidissem com os quesitos 1º, 2º e 3º do laudo de exame
complementar, que deverão ser respondidos nos retornos da vítima, para exame, enquanto as
lesões estão evoluindo e cicatrizando, para o perito reunir os elementos e definir se resultou ou
não em sequelas. Isso favorece a condução das perícias, porque o perito, ao responder aos 5º,
6º e 7º quesitos com o termo: AGUARDAR, saberá que eles são justamente os três quesitos do
laudo de exame complementar, que serão respondidos nos retornos da vítima às perícias
subsequentes.

Os sete quesitos, pela lógica que norteia o seu conteúdo e a sua ordenação, atendem ao
que a lei espera que seja esclarecido pela perícia. Assim, orientam os passos a serem seguidos
para a realização do exame, iniciando pela pergunta maior que o perito deverá responder: Há
ofensa à integridade corporal ou à saúde do(a) periciando(a)? Em havendo vestígio desta
ofensa, qual o instrumento ou meio a produziu?

Observar que os quesitos do 4º ao 7º foram ipsis literis extraídos do texto dos parágrafos
1º e 2º do artigo 129 do Código Penal e têm a finalidade de, com suas respostas, o perito
oferecer os elementos indispensáveis para o julgador classificar a natureza das lesões e aplicar
as penas pertinentes, indicadas no artigo referido.

Já o 3º quesito foi extraído do Código Penal. Capítulo III – Da Aplicação da Pena.


Circunstâncias agravantes.

Artigo 61. São circunstâncias que sempre agravam a pena, quando não constituem ou qua-
lificam o crime:

I – a reincidência;

II – ter o agente cometido o crime:

a); b); c); sem interesse pericial.

d) com o emprego de veneno, fogo, explosivo, tortura ou outro meio insidioso ou cruel, ou de
que podia resultar perigo comum.

Código de Processo Penal


Art. 387. O juiz, ao proferir sentença condenatória:

I – mencionará as circunstâncias agravantes ou atenuantes definidas no Código Penal, e cuja


existência reconhecer;

II; III; IV; V; VI; sem interesse pericial.

É importante notar que o teor desse quesito oferece informações indispensáveis para a
aplicação da pena ao agressor, porque é um agravante do crime. No enunciado, como se vê,
não há referência à asfixia, no entanto, este termo – asfixia –, está presente em todos os
modelos de quesitos propostos para o exame de lesão corporal existentes nos Institutos de
Medicina Legal do país. Se o perito responder que houve o emprego de asfixia, o julgador não
terá como aumentar a pena, pois ela não está prevista na lei. Por essa razão, é necessário fazer
a correção do enunciado do quesito, como o proposto pelo autor.

Os quesitos devem atender ao que a lei disciplina. Só assim cumprem sua finalidade.
Este quesito só se aplica quando houver o agressor e a vítima. Aqui o legislador
estabeleceu critérios para saber se, ao cometer o crime, o agente empregou, intencionalmente,
qualquer desses expedientes, para ofender a integridade corporal da vítima, o que agrava e
qualifica o delito. A perícia deverá, quando pertinente, informar se isso ocorreu.

É rotina os peritos responderem sempre “não” ao 3º quesito do laudo de lesão corporal,


nas perícias de vítimas de acidentes quaisquer que sejam. Ao agir assim, tratam ocorrências
diversas, como se fossem a mesma coisa, agem de forma automática. Perdem a lei de vista. O
acidente não é um crime, se o for, não é acidente. A lei disciplina que, se o crime for praticado
intencionalmente, com o emprego de qualquer das modalidades referidas na letra d, inciso II do
artigo 61 do CP, o qualificará. O quesito só se aplica quando houver a prática de um crime, ou
seja, deve haver o agressor e o agredido, porque com ele a lei objetiva qualificar a ação do
agente que cometeu o delito e aumentar a sua pena. Não há como aplicá-lo na ocorrência de
um acidente. Há, ainda, uma impropriedade doutrinária, ao responder sempre negativamente
ao terceiro quesito do laudo de lesão corporal e ao quarto quesito do laudo de necropsia, nos
exames de vítimas acidentadas. Não se vê nenhuma resposta “sim” a esses quesitos nos laudos
de tais perícias.

Ora, só se pode responder “não”, quando houver a possibilidade de responder “sim” à


pergunta. No caso de um acidente, quando é que o perito poderá responder “sim” ao quesito?
Há possibilidade de isso ocorrer? Claro que não. Por essa lógica, é imprópria a resposta sempre
negativa a esse quesito, que deverá ser respondido com o termo: PREJUDICADO, uma vez que
ele não se aplica às perícias decorrentes de acidentes. A lei não qualifica nenhum acidente.

O perito não acusa, não defende, não julga, apenas examina o corpo de delito, descreve o
que encontra, faz o nexo causal entre os vestígios observados e o delito, fundamenta com
técnica, com lógica e com bom senso a perícia e responde com clareza e inteligência aos
quesitos.

Dessa maneira, não é atribuição do perito, no seu laudo, julgar as lesões encontradas. Não
é seu papel dizer se elas são de natureza leve ou grave. Cabe a ele responder com competência
e clareza aos quesitos e oferecer ao julgador os elementos indispensáveis para ele formar sua
convicção sobre a natureza das lesões, para aplicar a pena adequada, porque é só dele essa
incumbência.

c) Histórico
Aqui o perito solicita que a vítima lhe relate o que ocorreu, como ocorreu e quando ocorreu.
Transcreve, com as palavras proferidas pela vítima, esse relato. Dessa forma, terá ideia do
crime que se investiga e do que procurar durante a realização do exame. Quando cabível, fará
correlação do que encontrar, no exame, com o histórico.

d) Descrição
Esta é a parte mais importante do exame. Aqui o perito deverá descrever as lesões observadas,
suas dimensões, suas características, suas localizações. Deverá avaliar as limitações impostas
pelas lesões no organismo da vítima, se produziram perigo de vida, se alguma lesão está em
evolução, se há relatório médico descrevendo algum procedimento.
e) Discussão ou comentários
Nesta parte do laudo o perito irá opinar sobre o que encontrou no exame, se alguma lesão
deverá ser reavaliada, em trinta dias após o delito, para responder se resultou incapacidade
para as ocupações habituais por mais de 30 dias, se a vítima fará cirurgia para corrigir alguma
lesão. Quando cabível, informará que aguarda a evolução da lesão para confirmar se resultou
sequela permanente, se solicitou parecer de especialista para avaliar alguma lesão, se aguarda
relatório médico para avaliar a gravidade de alguma lesão. Quando a lesão estiver cicatrizada e
produziu sequela, dirá qual sequela a vítima apresenta: se debilidade permanente de membros,
sentido ou função, ou se deformidade permanente, etc. Transcrever neste tópico o relatório
médico que informa sobre o procedimento efetuado, por exemplo, uma transfusão de sangue
para corrigir hemorragia severa, o que concretamente caracteriza perigo de vida, etc. Ao
solicitar exame complementar, informar o que irá avaliar no retorno do(a) periciando(a). O
laudo deverá ser o mais esclarecedor possível, de tal maneira que a autoridade, ao recebê-lo,
saiba o que o perito está fazendo. Vestígio de lesão, que não foi produzida pela infração deverá
ser descrito e referido que não tem nexo causal com o delito.

f) CONCLUSÃO
De forma objetiva, clara e sintética o perito deverá concluir a sua perícia, informando a
natureza das lesões encontradas e se delas resultou alguma sequela. Não deverá se estender na
conclusão, repetindo o que já descreveu nos tópicos anteriores do laudo. Se, por ventura, o
perito está aguardando um documento, ou o resultado de um exame, para finalizar a perícia,
deverá concluí-la, temporariamente, com o termo: Aguardar. Se a perícia é realizada dias após
o evento e as lesões já desapareceram, informar que não tem elementos para caracterizar que
ocorreu a lesão.

g) Resposta aos quesitos


1º) Houve ofensa à integridade corporal ou à saúde do(a) periciando(a)?

Resposta: SIM.Isto quando, após o término do exame, o perito encontrou vestígios de lesões
que possam ser relacionados ao delito. Estará, assim, fazendo o nexo causal entre esses
vestígios e a infração. A resposta afirmativa só caberá se a lesão encontrada for produzida pela
ação criminosa. As lesões que não guardam relação com o delito, não interessam à lei, elas
deverão ser relatadas no tópico: Descrição e não poderão servir como subsídio para o perito
equivocadamente utilizá-las para responder Sim à pergunta contida no 1º quesito que não é
uma pergunta genérica, com abrangência difusa. O que ela indaga especificamente é o que a lei
espera que o perito esclareça: o agressor ofendeu a integridade física, ou a saúde da vítima? É
isso que só a perícia poderá esclarecer, e o perito jamais deverá ignorar o teor desta pergunta,
sob pena de perder o foco do exame, gerar equívocos e produzir um laudo que não se presta à
justiça.

Resposta: NÃO. Quando, após o término do exame, o perito não encontrou nenhum vestígio
de lesão que possa ser relacionado ao delito.

Resposta: SEM ELEMENTOS. Quando, após o término do exame, o perito não foi capaz de ter
os elementos de convicção para dizer Sim, nem para dizer Não. Isso ocorre, quando os vestígios
do ato delituoso tenham desaparecido pelo lapso de tempo transcorrido entre o evento e a
apresentação da vítima para o exame, e a lesão não tenha produzido vestígio permanente.

Resposta: PREJUDICADO. Quando, por qualquer razão, a perícia não pôde ser realizada.
Ocorre quando a vítima, por exemplo, se nega a fazer o exame, ou quando o perito é solicitado
a realizar uma perícia em vítima internada e, quando chega ao hospital, ela tenha sido
transferida.

Resposta: AGUARDAR. Quando o perito aguarda o resultado de um exame, ou de um


parecer, ou de uma radiografia, ou o prontuário médico, para reunir elementos e poder
concluir a perícia.

2º) Qual o instrumento ou meio que a produziu?

Resposta:Instrumento contundente. Ou instrumento cortante. Ou instrumento


perfurocontundente. Ou meio químico. Ou meio físico (fogo), etc., conforme for o instrumento,
ou o meio empregado para produzir a ofensa à vítima.

Resposta: PREJUDICADO. Quando responder ao primeiro quesito: NÃO, ou SEM ELEMENTOS,


ou PREJUDICADO. Isto porque a perícia não foi capaz de afirmar que houve ofensa à integridade
corporal, ou à saúde da vítima; neste caso, não é possível dizer que houve a ação de um
instrumento, ou meio, porque não foi evidenciada nenhuma lesão, o que torna a pergunta sem
sentido, razão pela qual sua resposta está PREJUDICADA.

3º) A ofensa foi produzida com o emprego de veneno, fogo, explosivo, tortura ou outro meio
insidioso ou cruel, ou de que podia resultar perigo comum? (resposta especificada).

Resposta: Veneno, ou Fogo, ou Explosivo, ou Crueldade, etc., conforme for o caso. O perito
deverá fundamentar, no corpo do laudo, a resposta a ser dada ao quesito, quando for
pertinente. Não olvidar jamais que este quesito se destina a avaliar a ação do agente que
cometeu um crime, pois se, ao cometê-lo, empregou qualquer desses expedientes elencados
no quesito, isso qualifica o crime e aumenta a pena aplicada ao agressor. A resposta afirmativa
ou negativa a este quesito só deverá ser empregada quando houver ocorrido um crime. Deverá,
para isso, haver o agressor e o agredido. Se não houver o agressor, não tem interesse legal uma
resposta específica, como nos casos de acidentes e lesões autoproduzidas.

Resposta: PREJUDICADO.Quando ao primeiro quesito responder: NÃO, ou SEM ELEMENTOS,


ou PREJUDICADO, ou quando a lesão, encontrada na vítima, for provocada por um acidente.

4º) Houve perigo de vida?

Resposta: SIM. Quando a ofensa produziu concretamente perigo de vida, sendo o óbito
evitado pelo atendimento médico. O perito descreverá as lesões provocadas pela ação do
agressor, informará todos os procedimentos médicos realizados para salvar a vida da vítima;
anotará nome e CRM do médico atendente e dirá no tópico: Discussão que as lesões ocorridas
no organismo da vítima produziram perigo de vida, quando isso for evidente.
Resposta: NÃO.Quando a lesão não produziu perigo de vida.

Resposta: PREJUDICADO.Quando responder: NÃO, ou SEM ELEMENTOS, ou PREJUDICADO, ao


primeiro quesito.

5º) Resultou incapacidade para as ocupações habituais por mais de 30 (trinta) dias?

Resposta: SIM. Quando a ofensa provocou essa incapacidade. O perito deverá avaliar a vítima,
logo após tinta dias da ocorrência do fato, para constatar, pessoalmente, que ela ficou
impossibilitada de executar suas atividades habituais por esse lapso de tempo.

Resposta: NÃO. Quando a ofensa não provocou a incapacidade.

Resposta: PREJUDICADO. Quando responder: NÃO, ou SEM ELEMENTOS, ou PREJUDICADO


ao primeiro quesito.

6º) Resultou debilidade permanente de membro, sentido ou função, ou aceleração de parto?


(resposta especificada)

Resposta: SIM. Quando a ofensa deixou como sequela uma debilidade, que seja permanente,
de membro, sentido ou função. Por exemplo, uma fratura de joelho que cicatrizou e resultou
limitação dos movimentos de flexão e de extensão, produzindo concretamente debilidade
permanente do membro inferior acometido. As sequelas deverão ser bem caracterizadas e
referidas nos termos existentes no corpo do enunciado do quesito, para que a autoridade
judiciária saiba como avaliar a gravidade da lesão.

Resposta: NÃO. Quando a ofensa não produziu nenhuma sequela que possa ser referida como
uma debilidade permanente de membro, sentido ou função.

Resposta: PREJUDICADO. Quando responder: NÃO, ou SEM ELEMENTOS, ou PREJUDICADO,


ao primeiro quesito.

A aceleração de parto deverá ser respondida afirmativamente, quando a vítima for mulher e
estiver grávida, sendo o parto antecipado pela ação do agente vulnerante. O produto da
gravidez deverá nascer vivo e sobreviver. Caso morra, logo após o parto, trata-se de aborto.

7º) Resultou incapacidade permanente para o trabalho, ou enfermidade incurável, ou perda, ou


inutilização de membro, sentido ou função, ou deformidade permanente, ou aborto? (resposta
especificada)

Resposta: SIM. Quando a ofensa, depois da sua cicatrização total, deixou como sequela
qualquer dos resultados listados no corpo do quesito. Esta resposta só é possível após retornos
da vítima a exames complementares, durante a evolução da lesão. Exemplo: vítima de agressão
com chute na coxa direita com fratura do fêmur. Foi operada para realização de osteossíntese,
permaneceu em tratamento ortopédico e fisioterápico por quatro meses. Comparece para
exame complementar, apresentando encurtamento de 7 centímetros do membro inferior
direito. Este encurtamento provoca marcha claudicante. Antes da agressão sua marcha era
normal. Ela apresenta, hoje, modificação da sua aparência habitual, ao deambular, o que
caracteriza deformidade permanente. Neste caso, em particular, resultou ainda em
incapacidade para as ocupações habituais por mais de trinta dias e debilidade permanente do
membro inferior direito.

Resposta: NÃO. Quando a ofensa não produziu nenhum dos resultados listados.

Resposta: PREJUDICADO. Quando responder: NÃO, ou SEM ELEMENTOS, ou PREJUDICADO


ao primeiro quesito.A resposta, se resultou em aborto deverá ser afirmada, quando a vítima for
mulher, estiver grávida e a ofensa tenha provocado interrupção da gravidez e óbito do produto
da gravidez.

Como responder aos quesitos numa perícia sem comprovação de que ocorreu ofensa à vítima.
Exemplo: o caso em que, após o exame, o médico-legista não é capaz de afirmar que houve
ofensa à integridade física, ou à saúde da vítima e responderá ao primeiro quesito com um
destes termos: Não, ou Sem Elementos, ou Prejudicado.

Todos os demais quesitos serão assim respondidos:

1º) Houve ofensa à integridade corporal ou à saúde do(a) periciando(a)?

Resposta: NÃO, ou SEM ELEMENTOS, ou PREJUDICADO.

2º) Qual o instrumento ou meio que a produziu?

Resposta: PREJUDICADO.

3º) A ofensa foi produzida com o emprego de veneno, fogo, explosivo ou tortura

ou outro meio insidioso ou cruel ou que podia resultar perigo comum? (resposta especificada).

Resposta: PREJUDICADO.

4º) Resultou perigo de vida?

Resposta: PREJUDICADO.

5º) Resultou incapacidade para as ocupações habituais por mais de 30 (trinta) dias?

Resposta: PREJUDICADO.

6º) Resultou debilidade permanente de membro, sentido ou função, ou aceleração de parto?


(resposta especificada).

Resposta: PREJUDICADO.

7º) Resultou incapacidade permanente para o trabalho, ou enfermidade incurável, ou perda ou


inutilização de membro, sentido ou função, ou deformidade permanente, ou aborto? (resposta
especificada).

Resposta: PREJUDICADO.
Não havendo a comprovação de que ocorreu a ofensa à vítima, as perguntas contidas nos
quesitos do 2º ao 7º ficam sem sentido, porque esses quesitos visam identificar qual
instrumento ou meio agiu e se produziu alguma alteração que agrave a lesão, para aplicar a
pena adequada. Não sendo possível afirmar que ocorreu a ofensa, a resposta a esses quesitos
está PREJUDICADA.
6 - EXAME COMPLEMENTAR
O exame complementar em Medicina Legal é simplesmente o retorno da vítima para novo
exame no qual se objetiva complementar a primeira perícia, naquilo que ficou pendente,
dependendo do transcurso de um tempo previsto em lei, ou aguardando a cicatrização de uma
lesão, para avaliar a ocorrência de possível sequela que possa agravar a pena aplicada ao
agressor.

O exame complementar está disciplinado pelo artigo: 168 do CPP que assim orienta:

Em caso de lesões corporais, se o primeiro exame pericial tiver sido incompleto, proceder-se-á a
exame complementar por determinação da autoridade policial ou judiciária, de ofício, ou a
requerimento do Ministério Público, do ofendido ou do acusado, ou de seu defensor.

§ 1º No exame complementar, os peritos terão presente o auto de corpo de delito, a fim de


suprir-lhe a deficiência ou retificá-lo.

§ 2º Se o exame tiver por fim precisar a classificação do delito no art. 129, § 1º, n. I, do Código
Penal, deverá ser feito logo que decorra o prazo de trinta dias, contado da data do crime.

§ 3º A falta de exame complementar poderá ser suprida pela prova testemunhal.

Art. 181 do CPP.

No caso de inobservância de formalidade, ou no caso de omissões, obscuridades ou


contradições, a autoridade judiciária mandará suprir a formalidade, complementar ou
esclarecer o laudo.

Parágrafo único. A autoridade poderá também ordenar que se proceda a novo exame, por
outros peritos, se julgar conveniente.

O exame complementar faz parte da rotina de muitas das perícias realizadas. Sempre que
o ofendido apresentar, no primeiro atendimento, logo após o delito, lesões cuja recuperação
seja superior a trinta dias, o perito, ao confeccionar o laudo, irá responder a alguns quesitos,
com o termo: Aguardar Retorno. Isto porque naquele momento não é possível respondê-los
afirmativa ou negativamente.

Os quesitos oficiais propostos para o laudo de lesões corporais apresentam os seguintes:

5º) Resultou incapacidade para as ocupações habituais por mais de 30 (trinta) dias?

6º) Resultou debilidade permanente de membro, sentido ou função, ou aceleração de parto?


(resposta especificada)
7º) Resultou incapacidade permanente para o trabalho, ou enfermidade incurável, ou perda ou
inutilização de membro, sentido ou função, ou deformidade permanente, ou aborto? (resposta
especificada)

É evidente que, no primeiro exame, o perito não tem as condições necessárias para responder a
esses quesitos, quando as lesões apresentadas são severas e de recuperação demorada. A
prudência sinaliza que a vítima deverá retornar para exame complementar, logo que transcorra
o prazo de trinta dias da agressão, a fim de que o perito possa reunir os elementos de
segurança para efetuar a resposta adequada ao quesito. No primeiro retorno há condição de
avaliar se a vítima ficou impossibilitada, ou não, por mais de trinta dias, de executar suas
atividades habituais. Mesmo assim, se a lesão ainda está em evolução, o perito solicitará outro
exame complementar, numa data mais afastada, às vezes até 01 (um) ano após o delito, para
avaliar sua completa recuperação e se resultou em alguma sequela.

LAUDO COMPLEMENTAR DE LESÃO CORPORAL


O laudo de exame complementar também é formal e sua estrutura é a seguinte:

a) Preâmbulo; b) Quesitos; c) Histórico; d) Descrição; e) Discussão ou Comentários; f)


Conclusão; g) Resposta aos Quesitos.

a) Preâmbulo
Parte em que constam: a hora, o dia, o mês, o ano e a cidade em que se realiza a perícia, nome
da autoridade requisitante do exame, nome do perito médico-legista encarregado de executar
a perícia, nome do diretor do IML que o designou, identificação da vítima.

b) Quesitos
Os quesitos propostos para o exame complementar de lesões corporais são os seguintes:

Exame Complementar de Lesões Corporais

1º) Resultou incapacidade para as ocupações habituais por mais de 30 (trinta) dias?

2º) Resultou debilidade permanente de membro, sentido ou função, ou aceleração de parto?


(resposta especificada)

3º) Resultou incapacidade permanente para o trabalho, ou enfermidade incurável, ou perda ou


inutilização de membro, sentido ou função, ou deformidade permanente, ou aborto? (resposta
especificada).

Por uma questão de facilidade, os quesitos do laudo de lesão corporal e os do exame


complementar de lesão corporal, no IML de Brasília, têm uma correspondência proposital,
havendo uma sequência lógica na sua distribuição, para simplificar as suas respostas.

Os quesitos: 5º; 6º e 7º do laudo de lesão corporal são justamente os quesitos: 1º; 2º e 3º do


laudo de exame complementar de lesão corporal, uma vez que este último exame é realizado,
objetivando responder a esses quesitos, que, normalmente, ficam em aberto, no primeiro
exame, nos casos de traumas mais severos.

c) Histórico
Informar que o(a) periciando(a) retorna para exame complementar na data atual.

d) Descrição
O perito anotará as alterações observadas durante o exame da vítima. Descreverá se ela
deambula normalmente, ou não. Informará se está recuperada e executando suas atividades
habituais. Se as lesões descritas no laudo anterior estão recuperadas ou não. Caso as lesões
estejam cicatrizadas, avaliar se resultou em alguma sequela.

e) Discussão ou Comentários
O perito deverá, neste tópico do laudo, informar se a vítima está executando suas atividades
habituais, ou não. Caso não esteja, dizer que ela ficou mais de 30 (trinta) dias sem executá-las.
No caso de cicatrização de uma lesão anteriormente referida, informar se deixou sequela; caso
isso tenha ocorrido, classificá-la nos termos existentes no texto do quesito pertinente. Na
hipótese de a lesão não ter cicatrizado e a vítima permanecer em tratamento médico ou
fisioterápico, solicitar novo exame complementar, em data posterior, informando o que
avaliará no seu retorno.

A fundamentação da resposta aos quesitos do exame complementar deverá estar neste


tópico do laudo e isso deverá ser informado, logo após a resposta afirmativa, ou negativa ao
quesito.

f) Conclusão
Dizer, de forma direta, se a lesão está ou não cicatrizada; se estiver cicatrizada, dizer se resultou
ou não em alguma sequela. Caso não esteja, informar que a lesão está em evolução e que se
solicitou novo exame complementar.

g) Resposta aos Quesitos


1º) Resultou incapacidade para as ocupações habituais por mais de 30 (trinta) dias?

Resposta: Sim. (Veja Discussão). Caso isso tenha ocorrido.

Não. (Veja Discussão). Caso isso não tenha ocorrido.

2º) Resultou debilidade permanente de membro, sentido ou função, ou aceleração de parto?


(resposta especificada).

Resposta: Sim. (Veja Discussão). Caso isso tenha ocorrido.

Não. (Veja Discussão). Caso isso não tenha ocorrido.

Aguardar Exame Complementar. Quando a lesão ainda está em evolução.


3º) Resultou incapacidade permanente para o trabalho, ou enfermidade incurável, ou perda ou
inutilização de membro, sentido ou função, ou deformidade permanente, ou aborto? (resposta
especificada).

Resposta: Sim. (Veja Discussão). Caso isto tenha ocorrido.

Não. (Veja Discussão). Caso isso não tenha ocorrido

Aguardar Exame Complementar. Quando a lesão ainda está em evolução.


Prazo médio de cura das fraturas simples.
EXEMPLO DE LAUDO DE LESÃO CORPORAL

a) Histórico
O periciando(a) informa que foi agredido(a) a paulada, no tornozelo, há 10 dias. Foi operado(a)
no Hospital Ortopédico São Luiz, nesta cidade.

b) Descrição
Apresenta o membro inferior direito enfaixado. Deambula com auxílio de muletas axilares.
Removida a faixa, observa-se cicatriz de ferida cirúrgica longitudinal, medindo 15 centímetros,
localizada na face externa do tornozelo direito, com sinais de pontos cirúrgicos recém-
retirados. Trouxe relatório médico assinado pelo Dr. Marco Antonio, CRM-MT n. 111, que
informa fratura, após sofrer agressão, do maléolo externo do tornozelo direito, que foi
corrigida cirurgicamente com emprego de pinos metálicos para realizar a osteossíntese. Está
em tratamento ambulatorial. Trouxe radiografia do tornozelo direito que revela fratura do
maléolo externo.

c) Discussão
Periciando(a) em tratamento médico, a lesão está em evolução. Solicita-se exame
complementar daqui a 22 dias para avaliar se ficou impossibilitado para as atividades habituais
por mais de trinta dias.

d) Conclusão
Lesão contusa em evolução. Solicitado exame complementar.

e) Resposta aos Quesitos


1º) Houve ofensa à integridade corporal ou à saúde do(a) periciando(a)?

Resposta: SIM.

2º) Qual o meio ou instrumento que a produziu?

Resposta: INSTRUMENTO CONTUNDENTE.

3º) A ofensa foi produzida com o emprego de veneno, fogo, explosivo, tortura ou

outro meio insidioso, ou cruel, ou que podia resultar perigo comum?

Resposta: NÃO.

4º) Resultou perigo de vida?

Resposta: NÃO.

5º) Resultou incapacidade para as ocupações habituais por mais de 30 (trinta) dias?
Resposta: AGUARDAR EXAME COMPLEMENTAR.

6º) Resultou debilidade permanente de membro, sentido ou função, ou aceleração de parto?


(resposta especificada)

Resposta: AGUARDAR EXAME COMPLEMENTAR.

7º) Resultou incapacidade permanente para o trabalho, ou enfermidade incurável, ou perda ou


inutilização de membro, sentido ou função, ou deformidade permanente, ou aborto? (resposta
especificada)

Resposta: AGUARDAR EXAME COMPLEMENTAR.


PERÍCIA REALIZADA NO 32º DIA APÓS O DELITO

1º exame complementar

a) Histórico
Retorna para exame complementar na data atual, conforme o solicitado.

b) Descrição
Deambula com auxílio de muletas axilares. Não consegue apoiar o pé direito no chão.
Apresenta moderado edema no tornozelo direito.

c) Discussão
O periciando(a) ficou mais de trinta dias sem executar suas atividades habituais. A lesão está
em evolução. Solicitado novo exame complementar no 6º mês após o delito, para avaliar a
recuperação do membro inferior direito e se resultará sequela.

d) Conclusão
Lesão contusa em evolução. Solicitado novo exame complementar.

e) Resposta aos Quesitos


1º) Resultou incapacidade para as ocupações habituais por mais de 30 (trinta) dias?

Resposta: SIM. VEJA DISCUSSÃO.

2º) Resultou debilidade permanente de membro, sentido ou função, ou aceleração de parto?


(resposta especificada)

Resposta: AGUARDAR EXAME COMPLEMENTAR.

3º) Resultou incapacidade permanente para o trabalho, ou enfermidade incurável, ou perda, ou


inutilização de membro, sentido ou função, ou deformidade permanente, ou aborto? (resposta
especificada)

Resposta: AGUARDAR EXAME COMPLEMENTAR.


PERÍCIA REALIZADA SEIS MESES APÓS O DELITO

2º exame complementar

a) Histórico
O periciando retorna para exame complementar na data atual, conforme o solicitado.

b) Descrição
Deambula normalmente. A lesão está cicatrizada. Apresenta limitação dos movimentos do
tornozelo direito, com diminuição da amplitude da extensão e da flexão do pé direito.

c) Discussão
A limitação dos movimentos do tornozelo direito representa uma sequela que determina
debilidade permanente do membro inferior direito.

d) Conclusão
Lesão contusa cicatrizada com produção de sequela.

e) Resposta aos Quesitos


1º) Resultou incapacidade para as ocupações habituais por mais de 30 (trinta) dias?

Resposta: SIM. VEJA EXAME COMPLEMENTAR ANTERIOR.

2º) Resultou debilidade permanente de membro, sentido ou função, ou aceleração de parto?


(resposta especificada)

Resposta: SIM. VEJA DISCUSSÃO.

3º) Resultou incapacidade permanente para o trabalho, ou enfermidade incurável, ou perda ou


inutilização de membro, sentido ou função, ou deformidade permanente, ou aborto? (resposta
especificada)

Resposta: NÃO.
7 - JUIZADOS ESPECIAIS CÍVEIS E CRIMINAIS

Lei N. 9.099 de 26 de setembro de 1995

Capítulo I - DISPOSIÇÕES GERAIS

Artigo 2º. O processo orientar-se-á pelos critérios da oralidade, simplicidade, informalidade,


economia processual e celeridade, buscando, sempre que possível, a conciliação ou a transação.

Capítulo III - DOS JUIZADOS ESPECIAIS CRIMINAIS

Artigo 60. O Juizado Especial Criminal, promovido por juízes togados ou togados e leigos,

tem competência para a conciliação, o julgamento e a execução das infrações penais de menor

potencial ofensivo, respeitadas as regras de conexão e continência.

Parágrafo único. Na reunião de processos, perante o juízo comum ou o tribunal do júri,


decorrentes da aplicação das regras de conexão e continência, observar-se-ão os institutos da
transação penal e da composição dos danos civis.

Artigo 61. Consideram-se infrações penais de menor potencial ofensivo, para os efeitos desta
Lei, as contravenções penais e os crimes a que a lei comine pena máxima não superior a 2 (dois)
anos, cumulada ou não com multa.

Enquadra-se aqui o caput do artigo 129 do CP.

Artigo 62. O processo perante o Juizado Especial orientar-se-á pelos critérios da oralidade,
informalidade, economia processual e celeridade, objetivando, sempre que possível, a
reparação dos danos sofridos pela vítima e a aplicação de pena não privativa de liberdade.

Seção II - Da Fase Preliminar

Artigo 69. A autoridade policial que tomar conhecimento da ocorrência lavrará termo
circunstanciado e o encaminhará imediatamente ao Juizado, com o autor do fato e a vítima,
providenciando-se as requisições dos exames periciais necessários.

Parágrafo único. Ao autor do fato que, após a lavratura do termo, for imediatamente
encaminhado ao juizado ou assumir o compromisso de a ele comparecer, não se imporá prisão
em flagrante, nem se exigirá fiança. Em caso de violência doméstica, o juiz poderá determinar,
como medida de cautela, seu afastamento do lar, domicílio ou local de convivência com a
vítima.
Artigo 41 da Lei n. 11.340 de 7 de agosto de 2006.

“Aos crimes praticados com violência doméstica e familiar contra a mulher, independentemente
da pena prevista, não se aplica a Lei n. 9.099 de 26/09/1995”.

Seção III - Do Procedimento Sumaríssimo

Artigo 77. Na ação penal de iniciativa pública, quando não houver aplicação de pena, pela
ausência do autor do fato, ou pela não-ocorrência da hipótese prevista no art. 76 desta Lei, o
Ministério Público oferecerá ao juiz, de imediato, denúncia oral, se não houver necessidade de
diligências imprescindíveis.

§ 1º Para o oferecimento da denúncia, que será elaborada com base no termo de ocorrência
referida no art. 69 desta Lei, com dispensa do inquérito policial, prescindir-se-á do exame de
corpo de delito quando a materialidade do crime estiver aferida por boletim médico ou prova
equivalente.

Seção VI - Disposições Finais

Artigo 88. Além das hipóteses do Código Penal e da legislação especial, dependerá de
representação a ação penal relativa aos crimes de lesões corporais leves e lesões culposas.

Conforme reza o art. 69 da citada Lei, as perícias solicitadas, para apuração de crimes de
pequeno poder ofensivo, são encaminhadas ao IML, pela autoridade policial e ali realizadas.

Os peritos terão presentes as particularidades dos Juizados Especiais e farão seu trabalho,
objetivando atendê-las. As lesões apresentadas pela vítima deverão ser leves, sem repercussão
maior no funcionamento do seu organismo.

A informação pericial será feita em formulário informal, no qual consta a hora do


atendimento e a data, o nome da vítima, sua identificação e a lesão encontrada com menção ao
meio ou instrumento que a produziu.

De acordo com o art. 77 da mesma Lei, nas ocorrências com dispensa do inquérito policial,
o boletim médico é suficiente para aferir a materialidade do crime, dispensando o exame
pericial.

Se, durante o exame, o perito encontrar uma lesão que resulte em qualquer das situações
apresentadas nos § 1º e § 2º do art. 129 do Código Penal, fará referência a elas e providenciará
a elaboração do laudo de lesão corporal, uma vez que devido à gravidade da lesão, o Juizado
Especial Criminal não tem atribuição para julgá-la.
8 - EXAME AD CAUTELAM

Este exame é solicitado pela autoridade policial civil ou federal, rotineiramente, de forma
automática, sempre que prende, ou detém alguém, para apurar a sua participação num crime,
ou por força de um mandado de prisão. Após a sua oitiva, em caso de prisão em flagrante, ou
não, e ele é encaminhado ao presídio, antes da sua transferência, ele é conduzido ao IML para
ser submetido ao exame ad cautelam. O objetivo de tal procedimento é resguardar a
autoridade de que não usou de violência, ao fazer o seu interrogatório, enquanto o preso
esteve sob a sua custódia. No passado, talvez houvesse o emprego de violência, para se obter
do acusado as informações desejadas. Hoje, tal prática está em desuso. Há muito rigor na
coibição dessa forma de atuação. Sabe-se que a polícia civil e federal não empregam a violência
durante a realização dos seus interrogatórios.

Depara-se, então, com uma situação inusitada: se o detido não foi submetido à violência,
isso significa que não sofreu nenhuma lesão, ou seja, não foi agredido. Ora, se não foi agredido,
ele foi vítima de qual infração prevista no CP? O Código de Processo Penal, no seu art. 158,
determina que, se a infração deixar vestígio, será indispensável o exame de corpo de delito,
direto ou indireto, não podendo supri-lo a confissão do acusado. Obriga-se a realização da
perícia, apenas e só, quando a infração deixar vestígio. Se não ocorreu, por parte da autoridade,
nenhuma infração à lei, isso significa que não se formou o corpo de delito e este não existindo,
o que ela quer que se examine?

Examinar alguém que não apresenta vestígio de ofensa à sua integridade corporal, ou à
sua saúde não está previsto no CPP, mesmo porque não tem sentido. Além disso, conforme
disciplina esse mesmo Código, no seu art. 160, toda perícia é realizada para, ao final, responder
aos quesitos formulados. Nas perícias nas quais não se forma o corpo de delito, que é a
matéria-prima que o perito examina, quais são os quesitos que ele deverá responder? Eles não
existem. Nenhuma autoridade se deu ao trabalho de formulá-los.

Esta entidade: exame ad cautelam, não está disciplinada no CPP. A sua requisição por
parte da autoridade não tem abrigo nesse Código, o que a torna carente de suporte legal. O
exame “cautelar” tem uma conotação puramente preventiva, de salvo-conduto, para a
autoridade policial. Não existe exame preventivo em Medicina Legal, nem perícia preventiva. O
policial que conduz o preso ao IML é o mesmo que o conduz ao presídio. Entre o exame
realizado no IML e o trajeto até o presídio, muita coisa pode acontecer. Para ser isenta de
qualquer dúvida, a entrega do preso para a autoridade dirigente do presídio deveria ser feita no
IML, logo após o exame “cautelar”.

Lembrar que a prática de, sistematicamente, solicitar o exame ad cautelam,é apenas do


interesse da autoridade policial, com o que supostamente fica resguardada de qualquer
suspeita do uso de violência contra o detido. Ela é dispendiosa porque envolve um aparato de
pessoal, tanto policial quanto pericial, viatura, consumo de combustível, de material de
expediente, de tempo, etc. Representa um ônus a mais para o Estado custear. Há de se
perguntar: quantos laudos de exame ad cautelam fo-ram anexados ao inquérito policial? Ou
utilizados no curso do processo penal?

É imperioso ressaltar que, se o detido apresentar vestígio, ou histórico, de que sofreu


violência, no momento da sua prisão, ou quando esteve na delegacia de polícia, o exame de
corpo de delito é obrigatório e indispensável, além de ser um direito seu. Logicamente esses
casos estão previstos na lei. Aqui, investiga-se o crime de lesão corporal, ou de tortura que
estão previstos no Código Penal, e para estes existem os quesitos que serão respondidos ao
final do exame.

EXEMPLOS DE LAUDOS DE EXAME DE LESÃO CORPORAL

Caso nº 01
Exame de lesão corporal solicitado pelo Dr. Fábio, delegado de polícia, por meio do Ofício
nº 111, da Delegacia Municipal, em virtude de a vítima ter sido agredida.

Exame realizado na data: 10/06/2008, às 11h 30. Médico-legista: Dr. Chu-En-Lay Paes
Leme. Nome da vítima: K.C.B.F.

a) Histórico:
A vítima informa que foi agredida no dia 07/06/2008, por volta das 3 horas. (Ver a foto da

vítima ilustrando as lesões)


b) Descrição das lesões
Apresenta escoriação linear, parcialmente revestida por crosta de cor escura, medindo 2,5
centímetros, oblíqua, sendo sua parte superior medial e a inferior lateral, localizada na região
frontal esquerda. Outra, semelhante, medindo 3 milímetros, localizada na pálpebra superior
esquerda.

c) Discussão ou Comentários
As características das lesões são compatíveis com a data do evento.

d) Conclusão
Lesões contusas.

e) Resposta aos quesitos


1º) Houve ofensa à integridade corporal ou à saúde da pericianda?

Resposta: Sim.

2º) Qual instrumento ou meio que a produziu?

Resposta: Instrumento contundente.

3º) A ofensa foi produzida com o emprego de veneno, fogo, explosivo, tortura ou

outro meio insidioso ou cruel, ou de que pudesse resultar perigo comum?

Resposta: Não.

4º) Resultou perigo de vida?

Resposta: Não.

5º) Resultou incapacidade para as ocupações habituais por mais de 30 (trinta) dias?

Resposta: Não.

6º) Resultou debilidade permanente de membro, sentido ou função, ou aceleração de parto?

Resposta: Não.

7º) Resultou incapacidade permanente para o trabalho, ou enfermidade incurável, ou perda ou


inutilização de membro, sentido ou função, ou deformidade permanente, ou aborto?

Resposta: Não.
Caso nº 02
Exame de lesão corporal solicitado pelo Dr. Romero, delegado de polícia, pelo ofício nº
XXX, da Delegacia Municipal, em virtude de a vítima ter sido agredida.

Exame realizado na data: 27/05/2008, às 18 horas. Médico-legista: Dr. Chu-En-Lay Paes


Leme. Nome da vítima: V.F.S.

a) Histórico
A vítima informa que foi agredida pelo próprio pai, no dia 26/05/2008, a golpes de canivete.

b) Descrição das lesões


Apresenta curativo oclusivo, localizado no membro superior esquerdo, interessando: ombro,
braço e terço superior e médio do antebraço. Após sua remoção, vê-se ferida incisa superficial,
suturada, longitudinal, medindo 24 centímetros, localizada na face lateral do ombro e do braço
esquerdos. Outra, oblíqua, medindo 9,0 centímetros, também suturada, localizada na face
lateral do antebraço esquerdo, no seu terço superior.

c) Discussão ou Comentários
Solicitou-se exame complementar em 27/06/2008, para avaliar recuperação do membro
superior esquerdo, se resultou incapacidade para as ocupações habituais por mais de 30 dias, e
se resultou deformidade.

d) Conclusão
Ferida incisa superficial, em evolução. Foi solicitado exame complementar.

e) Resposta aos quesitos


1º) Houve ofensa à integridade corporal ou à saúde da pericianda?

Resposta: Sim.

2º) Qual instrumento ou meio que a produziu?

Resposta: Instrumento cortante.

3º) A ofensa foi produzida com o emprego de veneno, fogo, explosivo, tortura ou outro meio
insidioso ou cruel, ou que pudesse resultar perigo comum?

Resposta: Não.

4º) Resultou perigo de vida?

Resposta: Não.

5º) Resultou incapacidade para as ocupações habituais por mais de 30 (trinta) dias?
Resposta: Aguardar exame complementar.

6º) Resultou debilidade permanente de membro, sentido ou função, ou aceleração de parto?

Resposta: Aguardar exame complementar.

7º) Resultou incapacidade permanente para o trabalho, ou enfermidade incurável, ou perda ou


inutilização de membro, sentido ou função, ou deformidade permanente, ou aborto?

Resposta: Aguardar exame complementar.

EXAME COMPLEMENTAR
Data do exame: 07/07/2008, às 16 horas.

a) Histórico
A pericianda retorna para exame complementar na data atual, conforme solicitação prévia.

b) Descrição das lesões


Apresenta cicatriz queloidiana, grosseira, elevada, irregular, localizada em todo o trajeto da
ferida incisa.

c) Discussão ou Comentários
A ferida cicatrizada mostrou-se irregular, grosseira, produzindo uma sequela que caracteriza
deformidade permanente. A pericianda não ficou mais de trinta dias sem executar suas
atividades habituais. (Ver fotografia da vítima ilustrando as lesões)
d) Conclusão
Ferida incisa cicatrizada, com produção de sequela.

e) Resposta aos quesitos do laudo de exame complementar


1º) Resultou incapacidade para as ocupações habituais por mais de 30 (trinta) dias?

Resposta: Não.

2º) Resultou debilidade permanente de membro, sentido ou função, ou aceleração de parto?

Resposta: Não.

3º) Resultou incapacidade permanente para o trabalho, ou enfermidade incurável, ou perda ou


inutilização de membro, sentido ou função, ou deformidade permanente, ou aborto?

Resposta: Sim. Veja Discussão.


Caso nº 03
Exame de lesão corporal solicitado pelo Dr. Ricardo, delegado de polícia, pelo ofício n. XXX, da
Delegacia Municipal, em virtude de a vítima ter sido agredida.

Exame realizado na data: 17/06/2008, às 17 horas. Médico-legista: Dr. Chu-En-Lay Paes Leme.
Nome da vítima: J.B.F.

a) Histórico
A vítima informa que foi agredido no dia 01/06/2008, com soco na boca. Diz que perdeu dois
dentes. (Ver a fotografia da vítima ilustrando as lesões)

b) Descrição
Apresenta lesão contusa em regressão localizada no lábio inferior e na arcada dentária
superior, com avulsão dos dentes 11 e 21.

c) Discussão ou Comentários
A perda dos dentes 11 e 21 produz sequela representada por debilidade permanente das
funções: fonética (emissão das consoantes linguodentais) e mastigatória, além de produzir
deformidade permanente (dano estético). Tanto a debilidade permanente da função fonética
quanto a deformidade permanente são passíveis de correção, com o emprego de prótese
dentária que não corrige a debilidade da função mastigatória.

d) Conclusão
Lesões contusas com produção de sequela.

e) Resposta aos quesitos


1º) Houve ofensa à integridade corporal ou à saúde do periciando?

Resposta: Sim.
2º) Qual instrumento ou meio que a produziu?

Resposta: Instrumento contundente.

3º) A ofensa foi produzida com o emprego de veneno, fogo, explosivo, tortura ou outro meio
insidioso ou cruel, ou que pudesse resultar perigo comum?

Resposta: Não.

4º) Houve perigo de vida?

Resposta: Não.

5º) Resultou incapacidade para as ocupações habituais por mais de 30 (trinta) dias?

Resposta: Não.

6º) Resultou debilidade permanente de membro, sentido ou função, ou aceleração de parto?

Resposta: Sim. Veja Discussão.

7º) Resultou incapacidade permanente para o trabalho, ou enfermidade incurável, ou perda ou


inutilização de membro, sentido ou função, ou deformidade permanente, ou aborto?

Resposta: Sim. Veja Discussão.


Caso nº 04
Como conduzir uma perícia quando no primeiro exame não é possível definir se há ou
não vestígio do delito.

Exame de lesão corporal solicitado pelo Dr. XXXX. Delegado de polícia, pelo ofício n.º XXX,
da Delegacia Municipal, em virtude de a vítima ter sofrido acidente de trânsito.

Exame realizado na data: 10/06/2008, às 17h10. Médico Legista: Chu-En-Lay Paes Leme. Nome
da vítima: E.F.

a) Histórico
Informa o periciando que sofreu acidente de trânsito, uma colisão de veículos, no dia
27/05/2008, por volta das 22 horas. Refere que fraturou o antebraço esquerdo e que fez
cirurgia.

b) Descrição
Periciando apresenta o membro superior esquerdo imobilizado em meia tala gessada. Não
apresenta outra lesão. Não trouxe relatório médico ou radiografia para comprovar a lesão.(ver,
abaixo, fotografia ilustrando como o periciando compareceu para exame).

c) Discussão ou Comentários
Solicitou-se ao periciando exame complementar no dia 01/07/2008, e que compareça trazendo
radiografia do membro superior esquerdo ou relatório médico informando sobre a lesão e o
procedimento adotado. Só assim o perito terá elementos para avaliar se houve trauma.

d) Conclusão
Aguardar retorno do periciando na data indicada.
e) Resposta aos Quesitos

1º) Houve ofensa à integridade corporal ou a saúde do periciando?

Resposta: Aguardar. Veja Conclusão.

2º) Qual instrumento ou meio que a produziu?

Resposta: Aguardar. Veja Conclusão.

3º) A ofensa foi produzida com o emprego de veneno, fogo, explosivo, tortura ou outro meio
insidioso ou cruel, ou que pudesse resultar perigo comum?

Resposta: Aguardar. Veja Conclusão.

4º) Houve perigo de vida?

Resposta: Aguardar. Veja Conclusão.

5º) Resultou incapacidade para as ocupações habituais por mais de (30) trinta dias?

Resposta: Aguardar. Veja Conclusão.

6º) Resultou debilidade permanente de membro, sentido ou função, ou aceleração de parto?

Resposta: Aguardar. Veja Conclusão.

7º) Resultou incapacidade permanente para o trabalho, ou enfermidade incurável, ou perda ou


inutilização de membro, sentido ou função, deformidade permanente, ou aborto?

Resposta: Aguardar. Veja Conclusão.

Observação: O laudo deverá ser enviado à autoridade requisitante do exame com essa redação,
dentro do prazo de até 10 (dez) dias, conforme disciplina a lei. (Art. 160 do CPP). O perito está
informando como conduziu o exame e o que aguarda para a sua conclusão.

Essa forma de conduzir o laudo deverá ser aplicada para qualquer perícia que dependa de
exame de laboratório ou da juntada de documento que possa conter as informações
necessárias para definição de que ocorreu ou não o delito.

Se o perito descumprir o prazo legal estará cometendo o crime de prevaricação, Art. 319
do CP que assim reza:

Retardar ou deixar de praticar, indevidamente, ato de ofício, ou praticá-lo contra disposição


expressa de lei, para satisfazer interesse ou sentimento pessoal:

Pena – detenção de 3 (três) meses a 1 (um) ano, e multa.


PRIMEIRO EXAME COMPLEMENTAR
Data do exame: 01/07/2008

a) Histórico
O periciando retorna para exame complementar na data atual conforme solicitação anterior.

b) Descrição
O periciando continua com o membro superior esquerdo imobilizado em meia tala gessada.

Trouxe radiografia do punho esquerdo datada de 10/06/2008 que mostra fratura da


extremidade distal do rádio esquerdo, corrigida com instalação de pinos metálicos. Está em
tratamento ambulatorial.

c) Discussão ou Comentários
O periciando sofreu fratura do rádio esquerdo que foi corrigida cirurgicamente. Ficou mais de
trinta dias sem executar suas atividades habituais. Solicita-se exame complementar na data:
10/11/2008, para avaliar a recuperação do punho esquerdo.

A Conclusão do Laudo anterior é: Lesão contusa em evolução. As Respostas aos seus Quesitos
são:

1º Sim; 2º Instrumento contundente; 3º Prejudicado; 4º Não; 5º Aguardar; 6º Aguardar; 7º


Aguardar.

d) Conclusão do exame complementar atual


Lesão contusa em evolução.

e) Resposta aos Quesitos


1º) Resultou incapacidade para as ocupações habituais por mais de 30 (trinta) dia?

Resposta: Sim. Veja Discussão.

2º) Resultou debilidade permanente de membro, sentido ou função ou aceleração de parto?

Resposta: Aguardar. Veja Discussão.

3º) Resultou incapacidade permanente para o trabalho, ou enfermidade incurável, ou perda ou


inutilização de membro, sentido ou função, ou deformidade permanente, ou aborto?

Resposta: Aguardar. Veja Discussão.


SEGUNDO EXAME COMPLEMENTAR
Data do exame: 10/11/2008

a) Histórico
O periciando comparece para exame nesta data conforme solicitação anterior.

b) Descrição
O periciando apresenta o membro superior esquerdo sem a imobilização. Vê-se cicatriz de
ferida cirúrgica linear, apagada, longitudinal, medindo 10 (dez) centímetros, localizada na face
lateral do terço distal do antebraço esquerdo. Os movimentos do punho esquerdo estão
preservados.

c) Discussão
Sem comentários.

d) Conclusão
Lesão contusa cicatrizada sem apresentar sequelas.

e) Resposta aos Quesitos

1º) Sim. Veja laudo anterior.

2º) Não.

3º) Não.
9 - SEXOLOGIA FORENSE

A Sexologia Forense contempla as práticas libidinosas que são de interesse judicial. Neste
capítulo abordar-se-ão os crimes contra a dignidade sexual, enfatizando o trabalho pericial cuja
atribuição é descobrir os vestígios materiais desses crimes, para a produção da prova técnica de
que ocorreu a infração. A perícia é solicitada pela autoridade competente, quando há suspeita
de que um delito sexual tenha sido praticado. O trabalho do perito consiste em encontrar os
sinais deixados pelo crime na vítima.

Como qualquer perícia, na esfera criminal, esta está subordinada ao artigo 158 do Código
de Processo Penal que instrui:

Quando a infração deixar vestígios, será indispensável o exame de corpo de delito, direto ou
indireto, não podendo supri-lo a confissão do acusado.

A insistência do autor em sempre frisar este artigo tem a finalidade de realçar a sua
inestimável importância na compreensão do papel da perícia, que é o de examinar o corpo de
delito, em busca dos vestígios que o caracterizam e fazer o nexo causal entre eles e a infração
que se está investigando.

O artigo 160 do mesmo Código ensina como fazer o laudo, ao disciplinar:

Os peritos elaborarão o laudo pericial, onde descreverão minuciosamente o que


examinarem, e responderão aos quesitos formulados.

Parágrafo único. O laudo pericial será elaborado no prazo máximo de dez dias, podendo
este prazo ser prorrogado, em casos especiais, a requerimento dos peritos.

O foco da perícia é encontrar, na vítima, os vestígios do crime suspeito, descrevendo-os no


laudo e, a seguir, responder aos quesitos formulados, para materializar, tecnicamente, que
ocorreu a infração. Os quesitos devem ser coerentes e umbilical-mente ligados aos elementos
que tipificam cada um dos crimes sexuais.

Quesitos mal formulados impedem que o perito faça o nexo causal entre o que encontrou
no exame e o delito em investigação.

LEGISLAÇÃO, CÓDIGO PENAL


TÍTULO VI, DOS CRIMES CONTRA A DIGNIDADE SEXUAL

Capítulo I, DOS CRIMES CONTRA A LIBERDADE SEXUAL


Estupro
Artigo 213. Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a ter conjunção carnal
ou a praticar ou permitir que com ele se pratique outro ato libidinoso:

Pena – reclusão, de 6 (seis) a 10 (dez) anos.

§1º Se da conduta resulta lesão corporal de natureza grave ou se a vítima é menor de 18

(dezoito) ou maior de 14 (catorze) anos:

Pena – reclusão, de 8 (oito) a 12 (doze) anos.

§2º Se da conduta resulta a morte:

Pena – reclusão, de 12 (doze) a 30 (trinta) anos.

Estupro de Vulnerável
Artigo 217-A. Ter conjunção carnal ou praticar outro ato libidinoso com menor de 14 (catorze)
anos:

Pena – reclusão, de 8 (oito) a 15 (quinze) anos.

§ 1º Incorre na mesma pena quem pratica as ações descritas no caput com alguém que, por
enfermidade ou deficiência mental, não tem o necessário discernimento para a prática do ato,
ou que, por qualquer outra causa, não pode oferecer resistência.

§ 3º Se da conduta resulta lesão corporal de natureza grave:

Pena – reclusão, de 10 (dez) a 20 (vinte) anos.

§ 4º Se da conduta resulta morte:

Pena – reclusão, de 12 (doze) a 30 (trinta) anos.

DOS CRIMES SEXUAIS, CONTRA VULNERÁVEL

Artigo 218. Induzir alguém menor de 14 (catorze) anos a satisfazer a lascívia de outrem:

Pena – reclusão, de 2 (dois) a 5 (cinco) anos.

Violação sexual mediante fraude


Artigo 215. Ter conjunção carnal ou praticar outro ato libidinoso com alguém, mediante fraude
ou outro meio que impeça ou dificulte a livre manifestação da vontade da vítima:

Pena – reclusão, de 2 (dois) a 6 (seis) anos.


Capítulo VII, DISPOSIÇÕES GERAIS

Aumento de pena
Artigo 234-A. Nos crimes previstos neste Título a pena é aumentada:

III – de metade, se do crime resultar gravidez; e

IV – de um sexto até a metade, se o agente transmite à vítima doença sexualmente


transmissível de que sabe ou deveria saber ser portador.

Artigo 234-B. Os processos em que se apuram crimes definidos neste Título correrão em segredo
de justiça.

O crime de estupro está tipificado no artigo 213 do CP. Sua redação é simples e clara.

São elementos desse crime:

a) a prática de conjunção carnal e ou de outro ato libidinoso, involuntários;

b) o emprego de violência; ou

c) de grave ameaça para obter este resultado.

A requisição do exame de práticas libidinosas delituosas, pela autoridade competente deve


ser completa e conter:

• o crime que se investiga;

• a data em que esse crime foi praticado; e

• o exame de corpo de delito que se solicita.

Como em qualquer perícia, antes de iniciá-la, o perito deverá saber:

1 – que crime ocorreu?

2 – quando ocorreu?

Primeiro, para saber que tipo de vestígio tal infração deixa e, assim, saber o que procurar.

Segundo, para planejar a sua perícia, de forma simples, clara e segura, sabendo o que fazer
e como fazer. Se é crime recente ou não.

Os vestígios dos crimes sexuais não são permanentes. Se presentes, eles subsistem por
poucos dias e, gradativamente, desaparecem. A data da ocorrência do delito deverá ser
conhecida, para planejamento do que fazer durante a condução do exame.

A perícia executada logo após o cometimento da infração é conduzida com reais chances
de encontrar seus vestígios. A busca dos elementos que configuram o crime é sua meta.
Já numa perícia, feita dias após o crime, a chance de encontrar os vestígios é pequena, se
não impossível. Se realizada 6 (seis) dias ou mais, depois do evento delituoso, os principais
vestígios da conjunção carnal, exceto a rotura himenal recente, que dura 10 (dez) dias, ou de
outra prática libidinosa, foram dissipados, não sendo mais possível identificá-los. O perito,
nesta situação, não colherá material para pesquisá-los.

A data do evento é, pois, fundamental para que se saiba como conduzir cada perícia que se
faça.

É frequente a autoridade que requisita a perícia deixar de informar o crime que a motivou.
Solicita apenas: exame de conjunção carnal. Ora, a conjunção carnal isoladamente não é crime.
O perito nunca deverá examinar o corpo de delito, desconhecendo qual infração ocorreu, sob
pena de não saber o que fazer, ou pior, executar uma perícia sem a possibilidade de
estabelecer o nexo causal entre o que encontrou com um delito, pois o desconhece. Ele tem o
dever de solicitar à autoridade requisitante do exame que informe o crime que motivou o
exame pericial, bem como quando ele aconteceu, informações indispensáveis para que o perito
inicie o trabalho sabendo o que procurar, como procurar e para que procurar. É necessário que
o perito se empenhe em colaborar para que as requisições de exames sejam melhor
elaboradas, para que a perícia cumpra seu objetivo.

Nos crimes sexuais o que a lei espera que a perícia esclareça?


Para a correta aplicação da lei, a perícia tem a atribuição de esclarecer os seguintes
aspectos:

1º) se houve conjunção carnal, e ou outro ato libidinoso, praticados contra a vontade da
vítima;
2º) se o agressor conseguiu este intento com o emprego de violência;

3º) se dessa violência resultou para a vítima lesão corporal de natureza grave, ou se a vítima é
menor de 18 (dezoito), ou maior de 14 (catorze) anos;

4º) se houve emprego de grave ameaça para impedir a reação da vítima;

5º) se a vítima é tipificada como vulnerável;

6º) se do crime resultou gravidez; e

7º) se o agente transmitiu à vítima doença sexualmente transmissível.

Estes tópicos, do 1º ao 7º, serão abordados individualmente, na tentativa de fornecer ao perito


os elementos necessários para o entendimento de como realizar a perícia.

1a - Faz parte dos elementos do crime de estupro a conjunção carnal involuntária.


Este é um dos vestígios a ser encontrado.
Realiza-se, pois, o exame da vítima, resguardando o seu pudor, em sala adequada, com
iluminação de boa qualidade, em mesa ginecológica, com os materiais necessários à pesquisa
dos sinais da conjunção carnal delituosa. Ter sempre presente, na sala, uma ajudante. Caso
contrário, ter, em lugar reservado, um ou uma acompanhante da vítima, enquanto realiza o seu
exame, de tal sorte que, em hipótese alguma, o perito fique a sós com ela. Não se deve
esquecer deste pormenor, para segurança do perito. No IML de Brasília, ocorreu de uma
pericianda acusar o perito de tê-la molestado sexualmente durante o seu exame. O colega se
deparou com inúmeros dissabores, até provar sua inocência, num processo que durou anos.

O que é a conjunção carnal?


É a penetração do pênis na vagina, total ou parcialmente, podendo ocorrer ou não a
ejaculação.

A penetração do pênis na vagina, via de regra, deixa vestígios. São justamente esses
vestígios que o perito deverá procurar, para ter elementos de convicção e embasamento
técnico para afirmar que houve conjunção carnal. Porém a sua atribuição vai além. Cabe a ele
focar o seu trabalho na procura dos sinais deixados pela conjunção carnal criminosa, porque é
isso que interessa à lei e é por esse motivo que existe a perícia. Essa lucidez é que guiará seus
passos na execução do exame. É temeroso realizá-lo na escuridão, valorizando, no laudo,
vestígio de qualquer conjunção carnal, criminosa ou não, pois, agindo assim, provavelmente irá
se perder e, ao invés de esclarecer, irá, com o seu laudo, provocar o cometimento de injustiça.
Quem age dessa maneira não é perito médico-legista.

Quais são os vestígios deixados pela penetração do pênis na vagina e que caracterizam a
ocorrência da conjunção carnal? São eles:

1 – Rotura himenal
A rotura himenal, na sua esmagadora maioria, é feita com o pênis, sendo o seu encontro
indicativo de que houve conjunção carnal. A sua presença só tem relevância na investigação de
delito praticado há até 10 (dez) dias. As roturas, ditas recentes, podem ter nexo causal com
crimes praticados nesse período.

A recente é aquela que, depois de provocada, leva até 10 (dez) dias para cicatrizar, lapso
de tempo utilizado no IML de Brasília – DF, embasado no Livro do Professor Hermes R.
Alcântara (op.cit.). Nesse intervalo, as bordas himenais rotas, inicialmente, mostram-se
edemaciadas, avermelhadas e sangrantes; depois, recobrem-se de fibrina e leucócitos, ficam
espessas e brancas; posteriormente, tornam-se róseas, contendo tecido de granulação e,
finalmente, cicatrizam-se.

Uma rotura himenal cicatrizada não oferece condições de se precisar quando ocorreu;
sabe-se apenas que foi há mais de 10 (dez) dias. Não é possível o perito, por mais capaz que
seja, estabelecer nexo causal entre ela e um crime praticado em data superior a 10 (dez) dias.

É comum o perito se perder na condução da perícia, e o encontro de uma simples rotura


himenal, cicatrizada, ser utilizada para que ele, mecanicamente, responda que houve conjunção
carnal, independente da data em que o delito aconteceu. Dessa maneira, se examina a vítima
para saber se ela já teve conjunção carnal na sua vida (fato sem nenhum interesse legal) e não
se ela tem vestígio de conjunção carnal criminosa que motivou a sua ida ao IML.

É dever do perito sempre fazer o nexo causal entre o vestígio encontrado – neste particular
a rotura himenal – e o delito que motivou a perícia.

2 – Presença de espermatozoide na vagina


Este é um vestígio importante da evidência de que houve conjunção carnal.

Ele só pode ser encontrado, se o agressor não for azoospérmico, se não usou preservativo
e que tenha ejaculado na vagina.

Porém até quando este vestígio permanece na vagina da vítima?

O texto que faz referência a uma data é o do Professor Hércules (2007, p. 559), o qual
informa que até quatro dias após a deposição dos espermatozóides, na vagina, a sua presença
ainda é detectável em exames laboratoriais.

A coleta do conteúdo vaginal poderá ser feita com espátula de madeira ou de plástico; o
material deverá ser estendido em lâmina de vidro e examinado a fresco, em microscópio
óptico, com aumento de até 400 vezes, ou após fixar esse esfregaço, corar a lâmina, com
técnica rápida, ou convencional, montá-la e examiná-la em microscópio.

Pode-se utilizar suabe para a coleta do conteúdo vaginal. Enviá-lo ao laboratório onde a
pesquisa de espermatozoide será procedida. O material deverá ser identificado com o nome da
vítima, o nº do exame, a data da coleta, o material coletado e enviado ao laboratório por meio
de pedido que contenha as informações que motivaram a perícia, o exame solicitado e o nome
do perito que o solicita. O modelo de pedido de exame deverá ser utilizado para exame de
DNA, dosagem de PSA, no conteúdo vaginal, ou em qualquer outra secreção recolhida da vítima
e que precise ser examinada no laboratório.

Aqui, também, é dever do perito, de forma lógica, fazer o nexo causal entre o encontro do
espermatozoide e o crime em apuração.

Pelo exposto, isso só é possível em delitos ocorridos em até 4 (quatro) dias antes do
exame. Em perícia de eventos ocorridos em data superior a quatro dias, não se colhe o
conteúdo vaginal para pesquisa de espermatozoide, dosagem de PSA, ou

exame de DNA, pois não há como vinculá-los ao delito.

3 – Presença de DNA, que não da vítima, de origem masculina no conteúdo vaginal


O encontro de DNA diferente do da vítima, de origem masculina no conteúdo vaginal, é
vestígio concreto de que houve conjunção carnal. Ele normalmente é extraído de
espermatozoides ali depositados.

O exame de DNA permite estabelecer, de forma inquestionável, o nexo causal entre o


vestígio e o agressor, quando este é encontrado. Eventualmente o DNA de origem masculina
presente no conteúdo vaginal pode ser do parceiro consentido da vítima. Por isto deve-se
colher esta informação e consigná-la no histórico do laudo.

Num futuro próximo, a elucidação de crimes sexuais será executada, rotineiramente, com
o emprego desta técnica, que torna a perícia mais simples e segura. Até lá, muitas são as
limitações que os peritos irão encontrar, no dia a dia, ao periciar as vítimas de crimes sexuais.

Essa metodologia já vem sendo utilizada rotineiramente em muitas das instituições


públicas brasileiras voltadas para a Segurança Pública, permitindo à perícia não só demonstrar a
materialidade do crime, como oferecer provas para a identificação da sua autoria.

O exame de DNA extraído do conteúdo vaginal das vítimas de crimes sexuais, mesmo sem
encontrar o agressor, está sendo utilizado para criar um banco de dados que contenha o DNA
do criminoso, que, quando for encontrado se saberá quais vítimas atacou.

Coletar 2 (dois) suabes da superfície interna da bochecha da vítima para ex-tração do seu
DNA. Este DNA obtido da vítima será confrontado com os DNAs extraídos do conteúdo vaginal;
se houver mais de um, isso permite ao geneticista, identificar qual é o da vítima; o DNA
diferente será do agressor.

4 – Presença de fosfatase ácida prostática e ou do PSA (Antígeno Prostático


Específico) no conteúdo vaginal
Ambos só poderão ser pesquisados, com sucesso, se ocorrer a ejaculação e o agressor não
utilizar preservativo. Lembrar que o PSA e a fosfatase ácida prostática estão presentes no
conteúdo ejaculado, mesmo sendo o agressor azoospérmico. A fosfatase ácida prostática é
pouco específica e sua determinação é menos utilizada. Já o PSA é bastante específico e o seu
encontro, no conteúdo vaginal, é indicativo de que houve a prática de conjunção carnal. Muitos
dos indivíduos submetidos à retirada transuretral de parte da próstata (RTU) apresentam
ejaculação retrógrada (para o interior da bexiga), não produzindo vestígio laboratorial da
prática libidinosa.

A concentração do PSA no líquido seminal é de 0,2 a 5,5X 10 a 6º potência ng/ml, o que


representa um milhão de vezes superior à encontrada no soro masculino, no qual é de até 4
ng/ml em indivíduos normais.

Aqui, também, a pesquisa deverá ser feita até 4 (quatro) dias após o evento delituoso. A
dosagem do PSA nas secreções recolhidas, tanto do conteúdo vaginal como da região anal, tem
se mostrado mais sensível do que a pesquisa de espermatozoide. Galvão (2008, p. 259)
observou que a dosagem do PSA foi positiva em 37,50% , enquanto a pesquisa de
espermatozoide foi positiva em 19,02% no material do conteúdo vaginal e a dosagem do PSA
foi positiva em 29,9%, enquanto a pesquisa de espermatozoide foi positiva em 6,19% no
material da secreção anal, encaminhados de perícias de estupro realizadas no IML Nina
Rodrigues da Bahia e que foram utilizados na sua pesquisa.

Coleta-se o conteúdo vaginal com suabe, normalmente dois suabes, ficando uma amostra
para contraprova; o material é encaminhado ao laboratório onde é mergulhado em 1,0 ou 1,5
ml de soro fisiológico, ou água destilada para extração do PSA, que é transferido para esse
líquido. Dessa solução utiliza-se parte para a dosagem do PSA, empregando-se técnicas, tais
como: imunocromatografia, quimiluminescência, enzimaimunoensaio, radioimunoensaio.

O perito deverá fazer o nexo causal entre o encontro desse vestígio com o cri-me que se
está apurando.

5 – Gravidez
A gravidez, via de regra, é o resultado de uma conjunção carnal. É, pois, um vestígio de que
ela ocorreu. Há relatos de ocorrência de gravidez (exceto aquelas produzidas em laboratório)
sem penetração do pênis na vagina. Esses casos são exceções.

Cabe, aqui, também, ao perito fazer o nexo causal entre esse vestígio e o crime em
elucidação.

O exame de DNA recolhido do produto da gravidez pode ser confrontado com o DNA do
suposto agressor, quando este for encontrado, e se presta a estabelecer o nexo causal entre ele
e o delito praticado.

Esses são vestígios concretos de que houve conjunção carnal e serão pesquisados na
perícia de estupro na qual haja suspeita da prática de conjunção carnal. Basta o encontro de um
só deles para caracterizar que houve essa prática.

O perito, no entanto, fará o nexo causal entre o vestígio encontrado e o delito em


apuração. Só interessa à lei os vestígios da infração. Esta é precisamente a atribuição da perícia.
Se o perito não for capaz de fazer esse nexo causal, informará a dificuldade ou impossibilidade
no seu laudo. Deverá ser honesto e consciente das suas limitações, jamais inconsequente,
afirmando o que não pode defender, nem provar, ou pior, utilizando um vestígio que não tem
relação com a infração, para afirmar que houve conjunção carnal criminosa, porque, ao
responder sim ao quesito, estará automaticamente estabelecendo o nexo causal entre o
vestígio e o crime. Agindo assim, o perito contribuirá para o cometimento de injustiças.

1b - É, também, elemento do crime de estupro a prática de outro ato libidinoso,


involuntário.

O que é o outro ato libidinoso?


É qualquer prática libidinosa que não emprega a conjunção carnal. Dependendo de como
ela é realizada, pode, ou não, deixar vestígios.

Antes de iniciar o seu exame o perito precisa saber:

1) O que ocorreu?

2) Como ocorreu?

3) Quando ocorreu?
Sabendo esses detalhes, o perito terá presentes os possíveis vestígios que resultaram da
prática libidinosa, o que orientará os passos do exame.

A condução da perícia dependerá das práticas empregadas para a realização do ato


libidinoso. Se este consistiu de felação, ou se de coito interfêmura, ou se de masturbação, ou se
de coito anal, ou se de bolinagem, etc., o perito examinará cada local do corpo da vítima,
buscando encontrar os vestígios que o ato possa aí ter deixado. Se ocorrer ejaculação sobre o
corpo, ou sobre as vestes da vítima, irá recolher o material suspeito para a realização de
exames laboratoriais. Solicita-se pesquisa de espermatozoide, exame de DNA, dosagem do PSA.
Se o exame for positivo, comprova-se tecnicamente vestígio do ato libidinoso.

Coletar suabe bucal da vítima para identificação do seu DNA.

Encontrado o provável agressor, coleta-se dele suabe bucal, para extração do seu DNA e
confronto com o DNA extraído do material depositado sobre o corpo, ou sobre as vestes da
vítima.

Esses vestígios, depositados no corpo da vítima, permanecem disponíveis até ela se lavar.
Os depositados sobre as vestes, se não forem lavadas, duram mais tempo.

O exame de coito anal delituoso é frequentemente requisitado ao IML. A perícia é


realizada em sala adequada, bem iluminada, com mobiliário, equipamentos e materiais para a
coleta de possíveis vestígios do ato libidinoso. A vítima tomará a posição genupeitoral sobre
mesa própria para o seu exame. O perito procurará, na região perianal e anal, sinais deixados aí
pela penetração do pênis, tais como: escoriação, equimose, rubefação, edema traumático,
laceração da mucosa, com sangramento ou com tecido de granulação, dependendo da data do
fato, sendo eles vestígios do coito anal. Em eventos recentes, colher-se-á conteúdo dessas
regiões e da ampola retal para pesquisa de espermatozoides, exame de DNA e dosagem do
PSA. O encontro de qualquer desses vestígios caracteriza a presença do ato libidinoso.

Durante o exame, para sua segurança, o perito deverá ter, na sala, uma auxiliar e, quando
não for possível, um acompanhante da vítima, de tal sorte que não fique a sós com ela, com
isso prevenindo futuros dissabores.

2 – O outro elemento do crime de estupro é o emprego de violência.


A violência tipificada na lei é aquela que, quando empregada, impede ou impossibilita a
vítima de reagir. Ela pode ser: física ou psíquica.

A violência física é caracterizada pelo emprego da força do agressor para intimidar, ou


conter a vítima, agredindo-a, machucando-a, ou imobilizando-a de tal maneira que, vencida,
não consegue evitar a prática libidinosa.

Essa violência voltada contra a vítima deixa marcas significativas, possíveis de serem
verificadas durante seu exame. Não confundir tais marcas com uma simples escoriação, ou uma
equimose por chupão. Esses pequenos traumas, logicamente, não são suficientes para contê-la,
ou intimidá-la.
O perito, à luz do art. 213 do CP, deverá quantificar a intensidade dessa violência aplicada
pelo agressor, sabendo avaliar seus vestígios, para poder afirmar se houve, ou não, o seu
emprego na consecução do crime de estupro. O olhar do perito precisa estar em sintonia com o
texto da lei.

A violência que interessa à lei é relatada na descrição do laudo de prática libidinosa; ela
tem uma magnitude específica que cabe à perícia interpretar. Nunca confundir essa violência
com vestígio de lesão corporal, que não é elemento do crime de estupro. É falta de
compreensão do texto da lei solicitar ou realizar, junto com a perícia de crimes sexuais, o
exame de lesão corporal, que é outro laudo e se destina a atender o art. 129 do CP, no intuito
de, nele, documentar a violência que tipifica o crime de estupro.

Como a autoridade que recebe o laudo de prática libidinosa criminosa terá elementos para
saber se houve o emprego de violência para a consumação do delito, tendo em mãos o laudo
de lesão corporal? É papel de quem fazer nexo causal entre os vestígios do emprego da
violência e o crime? Este papel é da competência exclusiva do perito, e ele o fará de forma
clara, detalhada, coerente, num único documento médico-legal.

A violência psíquica acontece, quando, intencionalmente, o agressor anula a capacidade da


vítima de resistir, com o emprego de sonífero, de hipnose, de bebida alcoólica, etc. para, então,
praticar o crime.

3 – Avaliar se, do emprego dessa violência, resultou para a vítima lesão corporal de
natureza grave, ou se ela é menor de 18 (dezoito) e maior de 14 (catorze) anos.
As lesões corporais de natureza grave estão tipificadas nos § 1º e § 2º do artigo 129 do CP,
e as avaliações dessas situações foram abordadas no tópico Exame de Lesão Corporal – item:
Repercussão temporária ou permanente da ação do agente vulnerante no funcionamento do
organismo da vítima.

A verificação da idade da vítima será feita por meio de seus documentos, ou de exame
pericial para determinação da sua idade.

Se presente qualquer dessas situações, a pena aplicada ao agressor é aumentada,


conforme a lei estabelece. Daí a sua importância pericial.

4 – É também elemento do crime de estupro a grave ameaça.


A grave ameaça é o pavor infundido na vítima pelo agressor, com o emprego de uma arma
– faca, revólver, barra de ferro, pedra, etc. – prometendo matá-la, ou ameaçando matar um
ente querido seu, se ela não ceder. Essa forma de coação é a mais eficiente. Ela não deixa, na
vítima, nenhum vestígio.

A vítima, no entanto, comparece para exame, trazendo no seu comportamento o drama


que viveu.

5 – Faz parte da perícia informar se a vítima da prática libidinosa criminosa é


vulnerável (Crime qualificado).
A vítima é tipificada pela lei como vulnerável, se:
a) for menor de 14 anos; ou

b) for portadora de enfermidade, ou deficiência mental, e que por isso não tenha o
necessário discernimento para a prática do ato; ou

c) não puder, por qualquer outra causa, oferecer resistência.

A lei tutela a pessoa que, por várias razões, não pode decidir sobre a prática do ato
libidinoso. Considera o cometimento desse ato contra ela um crime qualificado e, por isso
comina uma pena maior ao infrator. A lei estabelece o limite de idade, menor de 14 anos, para
abrigar a vítima nesta situação, porque considera que ela não pode responder por si mesma.
Em igualdade de condição encontra-se aquela que, por enfermidade, ou deficiência mental,
também não pode decidir por si mesma. A mudança na redação da nova lei retira a atenuante
da lei anterior, em que o agressor, para ser punido com o rigor necessário, deveria saber, antes
da prática do delito, da situação mental da vítima.

No item (c) encontram-se aquelas vítimas que apresentam deficiência física, como:
paralisias, imobilizações, ou estão em coma em UTI, etc., encontrando-se, dessa maneira,
impossibilitadas de oferecer resistência ao agressor, que disso se aproveita para cometer o
crime.

6 – Faz parte da perícia informar se, da prática libidinosa criminosa, resultou, para a
vítima, gravidez.
O perito deverá informar se do crime resultou, para a vítima, gravidez, situação que
aumenta de metade a pena aplicada ao agressor, conforme estabelece a lei atual. Ela deve ser
do sexo feminino, estar em idade fértil, e a infração consistir de conjunção carnal. Se o exame
for realizado, logo após o delito, é prudente verificar se ela não está grávida nesse instante.
Para afastar gravidez preexistente, o perito deverá colher material para dosar o beta HCG. Se
negativo, repeti-lo 25 dias após o primeiro exame. Se este for positivo, resultou gravidez. Se
negativo, não resultou.

Nos exames de crimes ocorridos há algum tempo e a vítima encontra-se grávida, o perito
deverá fazer o nexo causal entre a gravidez, que é um vestígio de conjunção carnal, com o
delito em apuração. Se o provável agressor for encontrado, o exame de seu DNA confrontado
com o do produto da gravidez elucidará o caso.

7 – Se o agressor transmitiu à vítima doença sexualmente transmissível (DST).


O perito deverá informar se a transmissão ocorreu, porque se sim a pena é aumentada de
um sexto até a metade, conforme estabelece a nova lei.

A sua constatação pericial é de execução complexa. As principais dificuldades são:

a) É necessário examinar a vítima, logo após o delito, para afastar DST preexistente. Para isto o
perito deverá examinar sua região inguinal, genital, anal e oral em busca de lesões venéreas.
Colher sangue para exame de: hepatite B, HIV, sífilis. Colher conteúdo vaginal para pesquisa de:
gonococos, trichomonas, vaginose bacteriana, herpes simples, HPV.
Considerar, ainda, que algumas DST ficam latentes por um período de tempo indeterminado.
Quando se manifestam não é possível determinar em que época ocorreu a contaminação. Caso
do HPV, do HIV, do Herpes simples.

b) Cada uma das DSTs tem o seu período de incubação. Há que se solicitar vários exames
complementares, obedecendo ao período de incubação de cada uma delas. Para isso é
necessário que a vítima retorne inúmeras vezes ao IML.

Senão vejamos:

*Sífilis – tempo de incubação: de 1 (uma) semana a 3 (três) meses. Exame complementar no


fim do terceiro mês.

*Cancro mole – tempo de incubação: de 1 (um) a 14 (catorze) dias. Exame complementar


após o 14º dia.

*Herpes simplex – tempo de incubação: de 1 (um) a 26 (vinte e seis) dias. Exame


complementar após o 26º dia.

*Gonorréia –tempo de incubação: de 2 (dois) a 14 (catorze) dias. Exame complementar após


o 14º dia.

*HPV – tempo de incubação: de semana a anos. Exame complementar, quando?

*Lifogranuloma venéreo – tempo de incubação: de 3 (três) a 30 (trinta) dias. Exame


complementar após o 30º dia.

*AIDS – tempo de incubação: de 6 (seis) semanas a 3 (três) meses, quando positiva o anti-HIV.
Tempo para aparecimento de sintomas: de 3 (três) a 10 (dez) ou mais anos, após a
contaminação pelo HIV. Exame complementar após o 90º dia.

*Hepatite B – tempo de incubação: de 1 (um) a 6 (seis) meses. Exame complementar após o 6º


mês.

*Granuloma inguinal – tempo de incubação: de 3 (três) dias a 6 (seis) meses. Exame


complementar após o 6º mês.

* Tricomoníase –tempo de incubação: de 10 (dez) a 30 (trinta) dias. Exame complementar


após o 30º dia.

* Vaginose bacteriana –tempo de incubação: de 2 (dois) a 21 (vinte e um) dias. Exame


complementar após o 21º dia.

Pelo exposto, verifica-se que é tecnicamente, por vezes, impossível estabelecer o liame de
causalidade entre a contaminação venérea e a prática libidinosa criminosa que a determinou. O
legislador, com a intenção de punir, com maior rigor, o agressor, que, ao praticar o delito
transmite à vítima uma DST, estabeleceu esse critério na lei. Porém a sua constatação pericial é
de difícil comprovação e de execução demorada, exigindo inúmeras idas da vítima ao IML, o
que torna o exame quase impossível de ser realizado.

c) A realização de tantos exames laboratoriais, em datas diferentes, tem um custo operacional


alto, exige equipamentos e reagentes modernos e técnicos bem preparados para executá-los.
Onde esses exames serão realizados? Quem está qualificado para fazê-los? Quem bancará a
conta?

Estas são perguntas cujas respostas não são conhecidas e é o primeiro entrave que impede
o perito de realizar a perícia para atender ao dispositivo estabelecido na nova lei. Enquanto a
questão não for resolvida, a perícia não terá elementos para responder à pergunta.

O perito deve sempre saber que a sua função é realizar a perícia para encontrar vestígios
de um delito específico na vítima.

Deve fazer o nexo causal entre o vestígio e o delito. Assim, inicia o seu exame, sabendo o
crime ocorrido e sua data, e o que procurar. Essas informações são robustecidas quando se
colhe o histórico do fato – ocasião em que se procura que a vítima dê informações sobre o que
aconteceu, como aconteceu e quando aconteceu.

Sabendo o que a perícia deve esclarecer e como proceder para, tecnicamente, oferecer
esses esclarecimentos, o perito está apto a realizar o exame de práticas libidinosas criminosas.

LAUDO DO EXAME DE PRÁTICAS LIBIDINOSAS


A perícia do crime de estupro é simples. O laudo do exame de prática libidinosa deve
seguir a parte formal dos laudos médico-legais e conter:a) Preâmbulo; b) Quesitos; c) Histórico;
d) Descrição; e) Discussão ou Comentários; f) Conclusão e g) Resposta aos quesitos.

a) Preâmbulo
Indicar: a hora, o dia, o mês, o ano e a cidade onde a perícia será realizada, o nome da
autoridade requisitante do exame, o nome do perito encarregado de fazê-la, o nome do diretor
do IML que designou o perito, o exame solicitado, a identificação da vítima.

b) Quesitos
O autor, considerando a nova redação dada aos delitos de práticas libidinosas, para atender o
que a lei necessita saber para ter convicção de que ocorreu o crime e cominar a pena adequada
ao agressor, propõe os seguintes quesitos:

Quesitos para exame de práticas libidinosas


1º) Houve conjunção carnal que possa ser relacionada ao delito?

2º) Houve outro ato libidinoso que possa ser relacionado ao delito?

3º) Houve violência para essa prática?

4º) Qual o meio dessa violência?


5º) Da violência resultou para a vítima: incapacidade para as ocupações habituais por mais de
30 dias, ou perigo de vida, ou debilidade permanente de membro, sentido ou função, ou
aceleração de parto, ou incapacidade permanente para o trabalho, ou enfermidade incurável,
ou perda ou inutilização de membro, sentido ou função, ou deformidade permanente, ou
aborto? (resposta especificada)

6º) Tem a vítima idade menor de 18 e maior de 14 anos?

7º) É a vítima menor de 14 anos?

8º) Tem a vítima enfermidade ou deficiência mental?

9º) A vítima, por qualquer outra causa, não pode oferecer resistência?

10º) Do crime resultou gravidez?

11º) O agente transmitiu para a vítima doença sexualmente transmissível?

Cada um desses quesitos atende ao que está estabelecido na nova lei e as suas respostas
irão oferecer, à justiça, os elementos técnicos necessários para que o julgador forme sua
convicção e possa aplicar a pena o mais adequadamente possível. Os quesitos devem favorecer
a realização do exame e colaborar para que o perito compreenda com clareza o que deve fazer.

A maioria dos Institutos de Medicina Legal, dos vários estados brasileiros, na data atual,
mês de junho de 2010, está realizando os exames de vítimas de crimes sexuais, utilizando os
quesitos antigos, elaborados para atender à legislação anterior, que foi revogada em agosto de
2009. Eles não atendem à atual lei. Pergunta-se: qual é a utilidade desses laudos para a
comprovação da ocorrência do delito diante da lei vigente? É uma situação curiosa esta.
Ninguém está preocupado com isso? Quem deverá fazer a adequação dos quesitos para
atender à legislação vigente? Será o Judiciário? O Ministério Público? A Polícia Civil? A Perícia
Médico-Legal? A Associação Brasileira de Medicina Legal?

O Estado de Mato Grosso, desde o mês de outubro de 2009, já adotou os quesitos para
exame de práticas libidinosas, de acordo com a Lei n. 12.015. Um trabalho executado por:
peritos, representados pelo diretor do IML de Cuiabá, delegados de polícia, a Superintendência
da Politec e o Secretário de Justiça e Segurança Pública.

O autor acrescentou nas redações, do primeiro e do segundo quesitos, as palavras: que


possa ser relacionada ao delito. Fez isto intencionalmente, considerando a quantidade enorme
de perícias que são realizadas de maneira automática, sem que o perito tenha presente o
óbvio, que é procurar, única e exclusivamente, vestígio da infração que motivou a ação pericial.
Muitos respondem mecanicamente à letra, não à lei, buscam qualquer vestígio de prática
libidinosa para, ao encontrá-lo, responderem afirmativamente ao quesito. Ao agirem assim,
não são peritos médico legistas, pois muitos dos delitos são materializados, utilizando vestígio
de prática libidinosa consentida, ou seja, não criminosa. Com essa redação o autor pretende
colaborar para que o perito, ao responder o 1º e o 2º quesito, faça-o, vinculando a resposta ao
crime que se está investigando, porque é isso que a lei espera que a perícia esclareça.
O autor separou o quesito de conjunção carnal do de outra prática libidinosa, porque há
perícia em que a vítima diz que com ela se praticou coito anal e conjunção carnal. No momento
do exame, o perito pode concluir que houve vestígio de outra prática libidinosa, como, por
exemplo, coito anal; no entanto, não se tem elementos para afirmar se houve conjunção carnal,
quando depende da realização de exame laboratorial, para essa confirmação. Quando isso
ocorrer, responderá ao 1º quesito: Aguardar e ao 2º: Sim. Por essa razão, para facilitar as suas
respostas, separaram-se os dois quesitos. Há, pois, uma lógica no encadeamento dos quesitos,
o que facilita a perícia.

A autoridade, ao solicitar o exame de práticas libidinosas, deve informar o crime (ou


suspeita de crime) de que a pessoa foi vítima, e quando ele ocorreu. O exame é voltado para
encontrar, no crime de estupro, vestígios de práticas libidinosas delituosas, vestígios de
violência, ou de grave ameaça. Um dos pontos importantes do exame é saber se houve práticas
libidinosas delituosas. Por isso estes são o 1º e o 2º quesitos.

O perito nunca deve perder o foco do seu papel. Compete a ele fazer o quê? Ele deve saber
que o crime é de estupro e que, por conta desse crime, a vítima procurou a polícia, razão pela
qual foi encaminhada ao IML. Ele irá periciá-la, procurando, nela, vestígios do crime. Esse é o
papel da perícia.

A prática libidinosa consentida não é crime; por isso, nenhuma pessoa será encaminhada
ao IML para ser periciada por essa razão.

Se o perito perder o delito de vista, imediatamente ele deixa de ser perito médico-legista e
o que fizer jamais será um trabalho médico-legal. Esta é a encruzilhada onde os peritos se
perdem, se confundem, não sabem o que fazer. O exame de práticas libidinosas, neste cenário,
ganha uma complexidade difícil de conduzir. Passa a ser um tabu.

Se ao 1º quesito: Houve conjunção carnal que possa ser relacionada ao delito? o perito
responde: Sim, ele está dizendo ao solicitante do exame (delegado de polícia – leigo) que
encontrou um dos elementos do crime de estupro na sua perícia: a conjunção carnal. Houve
conjunção carnal. Para o delegado de polícia este é um indicativo de que houve o delito. Ele
estabelece o nexo causal com o crime, porque sim para ele é igual à presença de vestígio de
conjunção carnal criminosa, porque é um crime que ele está investigando. A partir daí, tomará
as providências legais que o caso requer.

O perito deve saber até onde pode ir. Deve ter consciência das dificuldades de fazer
afirmações ou negações. Deve saber o alcance do seu trabalho e o que deter-mina, na vida dos
envolvidos, no delito, vítima e provável réu.

c) Histórico
Neste tópico o perito procurará que a vítima lhe narre o que aconteceu, como aconteceu, onde
aconteceu e quando aconteceu. Se for do sexo feminino e houve a prática de conjunção carnal,
perguntar sempre quando foi sua última conjunção carnal consentida (esta deixa vestígios). Se
nesta usou preservativo, ou não. Se usa anticoncepcional. Quando foi sua última menstruação
(possibilidade de engravidar em consequência do estupro). Se houve prática de outro ato
libidinoso, perguntar em que consistiu, como foi realizado, se ocorreu ejaculação, onde
ejaculou, se a vítima se lavou depois do delito.

d) Descrição
Pesar e medir a vítima. Informar a sua idade. Verificar seu estado nutricional e de
desenvolvimento físico (diferença de porte entre ela e o agressor). Informar se há alguma
deficiência física. Verificar e anotar seu desenvolvimento mental. Verificar se há presença de
vestígio do emprego de violência efetiva. Se, do sexo feminino, examinar a região genital,
descrevendo-a. Seu desenvolvimento e características. O vestíbulo. O hímen, anotando sua
forma, sua orla e sua borda. Se há rotura, dizer se é recente ou não. Se a prática consistiu de
outro ato libidinoso, verificar se há vestígio dela, no local onde ela ocorreu, tal como presença
de equimose, laceração, depósito de material suspeito de ser sêmen; se presente, colher
amostra para exame.

e) Discussão ou Comentários
Em perícia conduzida algum tempo após o delito, os possíveis vestígios das práticas libidinosas
já desapareceram e não podem mais ser encontrados. In-formar tal situação. O perito não tem,
nessa circunstância, elementos para determinar se houve a prática libidinosa.

Quando o crime é recente – menos que quatro dias – e o perito colhe conteúdo vaginal e ou
perianal, ou da ampola retal, para pesquisa de espermatozoide, exame de DNA, dosagem do
PSA, informar, neste tópico do laudo, a conduta. Coletar suabe oral da vítima para identificação
do seu DNA. Se antes do estupro praticou conjunção carnal consentida com seu parceiro, colher
suabe oral do parceiro para identificação do seu DNA.

Informar que fez a coleta do conteúdo vaginal e ou da região perianal e ou da ampola retal e
que solicitou tais exames laboratoriais. Identificar o material coletado, fazer o pedido ao
laboratório corretamente.

Informar que aguarda os resultados dos exames para a conclusão do laudo e responder aos
quesitos.

Se crime recente, encaminhar a vítima, para atendimento médico especializado.


(Prevenção de DST, HIV, Pílula do dia seguinte, etc.).

Neste tópico o perito deverá fazer o nexo causal entre o encontro dos possíveis vestígios e
o delito em apuração. Aqui é onde o perito fundamenta o seu laudo, in-forma o que fez, as
limitações encontradas e como conduzirá a perícia.

f) Conclusão
A conclusão do laudo será sintética e esclarecedora, da seguinte forma:

Presença ou Ausência de vestígio de prática libidinosa (só interessa se for delituosa). Ou Sem
Elementos para afirmar ou negar que houve prática libidinosa (os vestígios desapareceram). Ou
Exame prejudicado. Quando, por qualquer razão, não foi possível realizar o exame (como na
recusa da vítima em fazê-lo). Ou Aguardar. Quando foi solicitado exame laboratorial para
pesquisar vestígio de prática libidinosa.
g) Resposta aos quesitos
Os quesitos são respondidos com as seguintes palavras:

Sim.

Não.

Sem Elementos.

Prejudicado.

Aguardar.

O perito deve saber o significado pericial de cada uma dessas palavras, para empregá-las
corretamente ao responder aos quesitos.

A resposta: Sim – é usada quando o perito tem convicção de que ocorreu o que o quesito
pergunta.

A resposta: Não – quando o perito tem convicção de que não ocorreu o que o quesito
pergunta.

A reposta: Sem Elementos – quando o perito não tem convicção para responder nem sim
nem não ao que o quesito pergunta.

A resposta: Prejudicado – quando a pergunta que o quesito faz não se aplica àquela
situação.

A resposta: Aguardar– quando o perito aguarda ou a realização de exame laboratorial que


revele, ou não, algum vestígio, ou a juntada de documento médico que esclareça a ocorrência
de lesão, etc.

Como responder aos quesitos do exame de práticas libidinosas:

Se aos 1º e 2º quesitos respondeu: Não, Sem Elementos ou Prejudicado, estas respostas


prejudicam as respostas de todos os demais quesitos, do 3º ao 11º que deverão ser
respondidos com a palavra – Prejudicado.

Os últimos quesitos são desdobramentos das respostas afirmativas aos dois primeiros. Se
houve prática libidinosa delituosa, é indispensável respondê-los, pois podem qualificar o crime,
além de oferecer elementos para cominar aumento da pena.

Não havendo a prática libidinosa, não há o principal elemento do crime de estupro; assim,
não há por que responder aos demais quesitos.

1º) Houve conjunção carnal que possa ser relacionada ao delito?

Resposta: SIM.
O perito está informando que encontrou vestígios de conjunção carnal deli-tuosa. Só interessa
à perícia encontrar vestígio da infração que motivou o encaminhamento da vítima ao perito,
porque o seu trabalho é todo voltado para encontrar única e exclusivamente: vestígio da
infração, conforme disciplina o artigo 158 do CPP. Se o perito encontrar vestígio de conjunção
carnal que não seja delituosa, jamais poderá utilizar esse vestígio para responder: SIM, ao
quesito. Seria uma heresia proceder dessa forma, porque estaria utilizando um vestígio de
prática libidinosa consentida, que não caracteriza crime, para materializar a ocorrência de um
crime. O laudo médico-legal emitido, sem estabelecer o nexo causal com o delito, é peça que
não se presta a nada. É frágil, é criticável e pode fazer o perito passar vergonha.

Resposta: PREJUDICADO. Quando a vítima for do sexo masculino.

2º) Houve outro ato libidinoso que possa ser relacionado ao delito?

Resposta: SIM. Se há vestígio desse ato e há nexo causal entre ele e o delito.

Sendo a resposta: SIM, oferecida ou ao 1º e ou ao 2º quesito, isso indica que se encontrou


vestígio da infração. A partir da evidência, o perito deverá responder os demais quesitos,
objetivamente, pois, assim, oferecerá elementos para a melhor aplicação da pena ao infrator.

3º) Houve violência para essa prática?

Resposta: SIM. Se houve o emprego de violência por parte do agressor para conseguir realizar a
prática libidinosa.

Resposta: NÃO. Se não houve o emprego de violência para essa prática.

4º) Qual o meio dessa violência?

Resposta: Meio físico, emprego de contenção, espancamento, tentativa de asfixia, etc.

Resposta: Violência psíquica. Quando há evidência do seu emprego para re-tirar da vítima sua
capacidade de consentir. (boa-noite-cinderela, embriaguez provocada pelo agressor, etc.).

Essas respostas serão dadas, se ao quesito anterior respondeu: SIM.

Resposta: PREJUDICADO. Se ao quesito anterior respondeu: NÃO.

5º) Da violência resultou para a vítima: incapacidade para as ocupações habituais por mais de
30 (trinta) dias, ou perigo de vida, ou debilidade permanente de membro, sentido ou função,
ou aceleração de parto, ou incapacidade permanente para o trabalho, ou enfermidade
incurável, ou perda ou inutilização de membro, sentido ou função, ou deformidade
permanente, ou aborto? (resposta especificada)

Resposta: NÃO. Se ao 2º e ao 3º quesito respondeu: SIM, mas o emprego da violência não


resultou lesão corporal de natureza grave.
Resposta: SIM. Quando do emprego da violência resultar qualquer das situações elencadas no
corpo do quesito e fundamentar.

Resposta: PREJUDICADO. Se ao 3º quesito respondeu: NÃO.

6º) Tem a vítima idade menor de 18 e maior de 14 anos?

Resposta: SIM. Quando a idade da vítima for maior de 14 e menor de 18 anos.

Resposta: NÃO. Quando a idade da vítima não for menor que 18, nem maior que 14 anos.

7º) É a vítima menor que 14 anos?

Resposta: SIM. Quando sua idade for menor que 14 anos (crime contra vulnerável).

Resposta: NÃO. Quando sua idade não for menor que 14 anos.

8º) Tem a vítima enfermidade ou deficiência mental?

Resposta: SIM. Quando a vítima apresenta essa patologia (crime contra vulnerável).

Resposta: NÃO. Quando a vítima não apresenta essa patologia.

9º) A vítima, por qualquer outra causa, não pode oferecer resistência?

Resposta: SIM. Quando existe uma causa que a impediu de oferecer resistência, como ser
portadora de paralisia, estar imobilizada por aparelho ortopédico, ser portadora de tetraplegia,
estar em coma em UTI, etc. (crime contra vulnerável).

Resposta: NÃO. Quando não existe nenhuma causa que a impeça de oferecer resistência.

Resposta: SEM ELEMENTOS: Quando informa que não ofereceu resistência porque foi
ameaçada com o emprego de arma de fogo, ou de uma faca (grave ameaça).

Nesta situação não se encontra vestígio do emprego da grave ameaça, sendo prudente
responder a este quesito com a forma sugerida acima.

10º) Do crime resultou gravidez?

Resposta: AGUARDAR EXAME COMPLEMENTAR.

O perito, no momento do exame, não tem condições de responder a este que-sito. Deverá
colher material para dosagem do beta HCG. Se o resultado for positivo, significa que a vítima
está grávida e a gravidez não tem relação com o presente delito. Nessa situação, responderá a
este quesito: NÃO.

Se negativo, deverá repeti-lo após 25 dias do primeiro exame. Se o resultado for positivo,
significa que resultou em gravidez. Responderá ao quesito: SIM.
Se o resultado for negativo, significa que não resultou em gravidez. Responderá ao quesito:
NÃO.

Resposta: PREJUDICADO. Quando a vítima for do sexo masculino.

11º) O agente transmitiu para a vítima Doença Sexualmente Transmissível?

Resposta: SEM ELEMENTOS.

Observação: O IML não dispõe de recursos laboratoriais e de pessoal para investigar essa
situação.

Exemplo de resposta aos quesitos de prática libidinosa quando, após a realização do


exame, não se encontrou vestígio dessa prática, e aos 1º e 2º quesitos, não foi possível
responder: SIM.

1º) Houve conjunção carnal que possa ser relacionada ao delito?

Resposta: NÃO.

2º) Houve outro ato libidinoso que possa ser relacionado ao delito?

Resposta: NÃO.

3º) Houve violência para essa prática?

Resposta: PREJUDICADO.

4º) Qual o meio dessa violência?

Resposta: PREJUDICADO.

5º) Da violência resultou para a vítima: incapacidade para as ocupações habituais por mais de
trinta dias, ou perigo de vida, ou debilidade permanente de membro, sentido ou função, ou
aceleração de parto, ou incapacidade permanente para o trabalho, ou enfermidade incurável,
ou perda ou inutilização de membro, sentido ou função, ou deformidade permanente, ou
aborto? (resposta especificada).

Resposta: PREJUDICADO.

6º) Tem a vítima idade menor de 18 e maior de 14 anos?

Resposta: PREJUDICADO.

7º) Tem a vítima idade menor de 14 anos?

Resposta: PREJUDICADO.

8º) Tem a vítima enfermidade ou deficiência mental?


Resposta: PREJUDICADO.

9º) A vítima, por qualquer outra causa, não pode oferecer resistência?

Resposta: PREJUDICADO.

10º) Do crime resultou gravidez?

Resposta: PREJUDICADO.

11º) O agente transmitiu para a vítima Doença Sexualmente Transmissível?

Resposta: PREJUDICADO.

Quando não for possível encontrar vestígio de prática libidinosa delituosa, e os quesitos 1º
e 2º forem respondidos negativamente, os demais quesitos, do 3º ao 11º, não se aplicam a essa
situação e suas respostas tornam-se prejudicadas, porque perdem interesse legal. Lembrar que
os quesitos que se seguem ao 1º e ao 2º só têm relevância quando houver vestígio de prática
libidinosa delituosa, porque, com as suas respostas eles podem oferecer elementos para
aumentar a pena aplicada ao agressor.

OFICINA PARA TREINAMENTO NA EXECUSSÃO DO EXAME E ELABORAÇÃO DO LAUDO


MÉDICO-LEGAL NOS CRIMES SEXUAIS
O autor apresentará uma oficina na qual serão disponibilizadas várias ocorrências
diferentes, enfocando perícias na área dos crimes sexuais, para que o interessado possa
exercitar-se na elaboração do laudo pericial e adquirir segurança para realizar o exame.

Apresenta, em primeiro lugar, uma perícia de lesão corporal, com o objetivo de


demonstrar quais são os vestígios que interessam ao perito encontrar e valorizar. Recordar que
só têm relevância para a perícia os vestígios que foram produzidos pelo ato delituoso.

HISTÓRICO
Adulto masculino de 25 anos informando que foi agredido com tapas no rosto, hoje, de
manhã. Diz que há oito dias caiu da bicicleta e machucou-se.Exame realizado às 17h50.

DESCRIÇÃO
Apresenta escoriações em placas recobertas por crostas escuras que estão começando a se
desprender. Estão localizadas nos cotovelos, nos joelhos e na região frontal direita.

O exame da face não revela qualquer vestígio de lesão corporal recente.

Solicita-se fazer:
DISCUSSÃO

CONCLUSÃO

RESPONDER AOS QUESITOS DE LESÃO CORPORAL

QUESITOS DE LESÃO CORPORAL

1º) Há ofensa à integridade corporal ou à saúde do(a) periciando(a)?

2º) Qual o instrumento ou meio que a produziu?

3º) A ofensa foi produzida com o emprego de veneno, fogo, explosivo, tortura ou outro meio
insidioso ou cruel, ou de que podia resultar perigo comum? (resposta especificada)

4º) Resultou perigo de vida?

5º) Resultou incapacidade para as ocupações habituais, por mais de 30 (trinta) dias?

6º) Resultou debilidade permanente de membro, sentido ou função, ou aceleração de parto?


(resposta especificada)

7º) Resultou incapacidade permanente para o trabalho, ou enfermidade incurável, ou perda ou


inutilização de membro, sentido ou função, ou deformidade permanente, ou aborto? (resposta
especificada)

DISCUSSÃO
As escoriações descritas apresentam evolução cicatricial compatível com a data da queda
da bicicleta, fato ocorrido há oito dias. Não guardam relação com o evento atual que motivou a
ida do periciando ao IML O periciando não apresenta sinais de lesão corporal recente que possa
ser relacionada com o delito em apuração.

CONCLUSÃO
Ausência de sinais de lesões corporais recentes.

RESPOSTA AOS QUESITOS


1º) Não.

2º ao 7º) Prejudicado.

O que motivou a ida do periciando ao IML? A agressão de que diz ter sido vítima. Apenas
vestígio provocado por esse evento interessa à perícia. O periciando não apresenta nenhuma
lesão que pudesse ser relacionada à agressão. Ele apresenta lesões corporais (escoriações) já
em resolução, que foram produzidas pela queda da bicicleta, ocorrida há oito dias e que, por
isso, não têm interesse pericial. Nem todo vestígio encontrado na perícia deverá ser valorizado,
apenas o que foi deixado pela infração, pois só este poderá tecnicamente ser utilizado para
materializar a sua ocorrência.
O autor irá numerar os casos, relatando o Histórico e a Descrição de cada um deles,
deixando a Discussão, a Conclusão e a Resposta aos Quesitos em aberto, para que cada
interessado faça, por conta própria, a sua redação.

No final, ele irá relatar como conduziu cada caso. Irá utilizar os quesitos para exame de
práticas libidinosas, já de acordo com a nova legislação, que são os seguintes:

QUESITOS PARA EXAME DE PRÁTICAS LIBIDINOSAS

1º) Houve conjunção carnal que possa ser relacionada ao delito?

2º) Houve outro ato libidinoso que possa ser relacionado ao delito?

3º) Houve violência para essa prática?

4º) Qual o meio dessa violência?

5º) Da violência resultou para a vítima: incapacidade para as ocupações habituais por mais de
30 dias, ou perigo de vida, ou debilidade permanente de membro, sentido ou função, ou
aceleração de parto, ou incapacidade permanente para o trabalho, ou enfermidade incurável,
ou perda ou inutilização de membro, sentido ou função, ou deformidade permanente, ou
aborto? (resposta especificada)

6º) Tem a vítima idade menor de 18 e maior de 14 anos?

7º) É a vítima menor de 14 anos?

8º) Tem a vítima enfermidade ou deficiência mental?

9º) A vítima, por qualquer outra causa, não pode oferecer resistência?

10º) Do crime resultou gravidez?

11º) O agente transmitiu para a vítima doença sexualmente transmissível?

Caso 1

HISTÓRICO: A vítima informa que foi estuprada, ontem, às 22 horas. O agressor a agrediu com
socos e tentou estrangulá-la. Diz que não faz sexo há mais de 1 mês. Última menstruação há
cinco dias. Exame realizado às 8 horas. Refere que não usa anticoncepcional. Informa que
houve prática de conjunção carnal.

DESCRIÇÃO: Pericianda com desenvolvimento físico e mental normal. Tem 21 anos de idade.
Mede 160 centímetros e pesa 55 quilogramas. Está lúcida. Apresenta: equimoses azuladas
extensas na face anterior do pescoço, edema traumático na região frontal e occipital,
escoriações em regiões dorsais e nas nádegas. O examedo introito vaginal revela rotura
himenal cicatrizada em 9 horas. Colhido conteúdo vaginal para pesquisa de espermatozoides
que foi positiva.Beta HCG negativo no dia da perícia e 35 dias após.

DISCUSSÃO:

CONCLUSÃO:

RESPOSTA AOS QUESITOS:

Caso 2

HISTÓRICO: A vítima informa que foi estuprada às 02 horas de hoje. Diz que manteve relação
sexual com o namorado, ontem, às 23 horas. Não usou preservativo. Usa anticoncepcional oral.
A pessoa a ameaçou com um revólver e teve com ela conjunção carnal. O fato ocorreu numa
rua deserta, a relação sexual se deu com ela deitada na calçada. Informa que sua última
menstruação foi há seis dias.

DESCRIÇÃO: Pericianda com desenvolvimento físico e mental normal. Tem 17 anos. Mede 170
centímetros e pesa 70 quilogramas. Presença de escoriação em placa, recente, pequena, em
ambas as nádegas. O exame da região genital revela hímen com rotura cicatrizada em 03 horas.
Encaminhada para atendimento médico especializado (Prevenção de Doença Sexualmente
Transmissível e de gravidez). O exame do conteúdo vaginal foi positivo para presença de
espermatozoides e para a presença de DNA da vítima e de outra pessoa . O namorado é casado
e se negou a oferecer material seu, para exame de DNA.

DISCUSSÃO:

CONCLUSÃO:

RESPOSTA AOS QUESITOS:

Caso 3

HISTÓRICO: A pericianda fugiu com o namorado por 3 dias. Retornou para casa. A mãe deu
queixa na Delegacia. A Delegada suspeita de abuso sexual. Solicitou o exame de conjunção
carnal. A pericianda informa que não fez nada com o namorado. Diz que tem 13 anos de idade.
Refere que não quer fazer o exame.

DESCRIÇÃO: A pericianda tem desenvolvimento, físico e mental, normal. Tem 13 anos de


idade. Recusou-se a fazer o exame da região genital.

DISCUSSÃO:

CONCLUSÃO:

RESPOSTA AOS QUESITOS:


Caso 4

HISTÓRICO: A pericianda fugiu com o namorado por 3 dias. Retornou para casa. A mãe deu
queixa na Delegacia. A Delegada suspeita de abuso sexual. Solicitou o exame de conjunção
carnal. Última menstruação há 30 dias. Diz que nunca fez sexo.

DESCRIÇÃO: Pericianda com desenvolvimento físico e mental, normal. Tem 13 anos de idade.
Pesa 44 quilogramas e mede 155 centímetros. Apresenta ausência de sinais de violência efetiva.
O exame da vulva e do introito vaginal revela hímen íntegro. Ausência de vestígio de outro ato
libidinoso.

DISCUSSÃO:

CONCLUSÃO:

RESPOSTA AOS QUESITOS:

Caso 5

HISTÓRICO: O periciando foi flagrado tendo coito anal, ontem, às 21 horas, com um garoto de
18 anos. Solicitado exame de prática libidinosa. Exame realizado às 8 horas.

DESCRIÇÃO: Periciando masculino tem 17 anos. Apresenta desenvolvimento físico normal. Ao


exame observa-se deficiência mental moderada. Ausência de sinais de violência efetiva. O
exame da região anal e perianal revela laceração longitudinal recente, sangrante, na mucosa
anal.

DISCUSSÃO:

CONCLUSÃO:

RESPOSTA AOS QUESITOS:

Caso 6

HISTÓRICO: Adolescente masculino, encaminhado para exame dia 06/06/08 às 15 horas,


porque a mãe suspeita que ele teve, no dia 05/06/08, coito anal com um vizinho adulto, pois
ficou na casa dele até às 23 horas. Informa que não praticou nenhum ato libidinoso com o
vizinho.

DESCRIÇÃO: Periciando em bom estado geral. Tem desenvolvimento, físico e mental, próprio
para a idade. Tem 13 anos de idade, mede 156 centímetros. Não apresenta sinais de violência
efetiva. O exame da região perianal e anal não revela vestígios de traumas recentes. Colhido
conteúdo da região anal e da ampola retal que foi negativo para: presença de espermatozoides
e dosagem do PSA.
DISCUSSÃO:

CONCLUSÃO:

RESPOSTA AOS QUESITOS:

Caso 7

HISTÓRICO: Vítima de estupro ocorrido, hoje, às 9 horas, quando estava sozinha em casa.
Informa última menstruação há 5 dias. Não faz sexo há 4 meses. Não usa anticoncepcional.
Exame realizado às 16 horas.

DESCRIÇÃO: Pericianda com 25 anos de idade é tetraplégica, está acamada. O exame da


região genital revela hímen com rotura cicatrizada em 5 horas. Foi colhido conteúdo vaginal
para pesquisa de espermatozoides, que foi negativa, porém a dosagem do PSA foi positiva.
Dosagem do beta HCG foi negativa no dia do exame e 25 dias depois.

DISCUSSÃO:

CONCLUSÃO:

RESPOSTA AOS QUESITOS:

Caso 8

HISTÓRICO: A vítima informa que foi para a casa de um amigo escondida da mãe, às 20 horas
de hoje e lá ele lhe deu vodka para beber. Diz que ficou tonta e não se lembra de nada que
aconteceu. Retornou para casa após três horas. Estava embriagada. Há suspeita de estupro.
Última menstruação há 28 dias. Não usa anticoncepcional.

DESCRIÇÃO: Apresenta: desenvolvimento físico e mental normais. Tem 14 anos. Mede 161
centímetros e pesa 43 quilogramas. Apresenta hálito etílico, taquicardia, sonolência, reflexos
alterados, atenção diminuída, restos de vômito em torno da boca. Diz que não se lembra de
nada. O exame da região genital revela rotura himenal sangrante em 4 horas. Ausência de
vestígios de outro ato libidinoso. Beta HCG negativo 25 dias após a primeira perícia.

DISCUSSÃO:

CONCLUSÃO:

RESPOSTA AOS QUESITOS:

Caso 9
HISTÓRICO: Pericianda encaminhada para exame no dia 12/11/97, alegando que foi obrigada
a manter conjunção carnal, com o agressor, no dia 01/11/97, sob ameaça de revólver. Diz que
nunca fez sexo. Informa sua última menstruação há 15 dias. Não usa contraceptivo.

DESCRIÇÃO: Pericianda com 22 anos de idade. Pesa 65 quilogramas e mede 173 centímetros.
Apresenta: desenvolvimento físico e mental normais. Ausência de sinais de violência efetiva. O
exame genital revela hímen com orla estreita, óstio amplo, borda franjeada, sem rotura. É do
tipo complacente. Ausência de vestígio de outro ato libidinoso. BetaHCG negativo no dia da
perícia e 25 dias após.

DISCUSSÃO:

CONCLUSÃO:

RESPOSTA AOS QUESITOS:

Caso 10

HISTÓRICO: A vítima informa que foi abordada, ontem, às 22 horas, por dois homens armados
com faca, que a levaram para um terreno baldio e lá foi obrigada a manter relação sexual com
os dois, inclusive coito anal. Diz que sua última relação sexual foi há 40 dias. Sua última
menstruação ocorreu há 15 dias. Não usa contraceptivo. Comparece para exame às 08 horas.

DESCRIÇÃO: Pericianda com 17 anos. Pesa 58 quilogramas e mede 160 centímetros.


Apresenta: desenvolvimento físico e mental normais, ausência de sinais de violência efetiva. O
exame da região genital revela hímen com rotura cicatrizada em 09 horas. O exame da região
perianal e anal revela equimose avermelhada perianal, laceração longitudinal, sangrante, em 6
horas, na mucosa do canal anal.

DISCUSSÃO:

CONCLUSÃO:

RESPOSTA AOS QUESITOS:

Caso 11

HISTÓRICO: Criança do sexo feminino, relatando que o seu padrasto, ao estar sozinho com ela
em casa, ficou nu, tirou a sua roupa, deixando-a só de calcinha, abraçou-a e ficou se esfregando
nela. Percebeu que saiu um líquido do seu pênis e que este ficou sobre sua calcinha.

DESCRIÇÃO: Pericianda com 10 anos de idade, medindo 142 centímetros, pesando 37


quilogramas. Bom estado nutricional. Desenvolvimento físico normal. Desenvolvimento mental
normal. Ausência de sinais do emprego de violência efetiva. O exame da região oral, mãos, raiz
das coxas, vestibular, perineal, perianal e anal não apresenta alterações. O hímen está integro.
Chegou vestida na calcinha. O exame da calcinha revela, na sua face anterior, mancha
endurecida, medindo 4,0x5,0 centímetros, de cor clara. Esta mancha foi embebida em soro
fisiológico que foi drenado para recipiente, num volume de 20 mililitros. Foi centrifugado e
feito esfregaço em lâmina de vidro, o qual foi corado, examinado para pesquisa de
espermatozoide que foi positiva. A dosagem do PSA foi positiva nesse liquido centrifugado.

DISCUSSÃO:

CONCLUSÃO:

RESPOSTA AOS QUESITOS:

Caso 12

HISTÓRICO: Menor do sexo feminino, diz que está grávida do seu padrasto, que mantém sexo
com ela há um ano.

DESCRIÇÃO: Pericianda com 11 anos de idade. Mede 148 centímetros, pesa 50 quilogramas.
Apresenta: desenvolvimento físico e mental próprios para a idade, ausência de sinais de
violência efetiva. Apresenta volume abdominal aumentado, com fundo do útero palpado acima
da cicatriz umbilical. Batimentos Cardiofetais de 144 batimentos por minuto, audíveis com
sonar. Trouxe ecografia que mostra gravidez de feto feminino no curso do 6º mês. Apresenta
hímen complacente. Apresenta, na vulva, Condiloma Acuminado.

DISCUSSÃO:

CONCLUSÃO:

RESPOSTA AOS QUESITOS:

Redação da Discussão, Conclusão e da Resposta aos quesitos dos exames anteriormente


relatados.

Na sequência o autor apresenta como redigiu cada uma das perícias enumeradas acima. Os
quesitos aqui empregados são aqueles sugeridos para o exame de práticas libidinosas, de
acordo com a nova legislação em vigor, desde o dia 10 de agosto de 2009 (Lei n. 12.015).

Caso 1

DISCUSSÃO: A vítima apresenta vestígios do emprego de violência física, com tentativa de


esganadura e traumas cranianos. A presença de espermatozoides no conteúdo vaginal indica
conjunção carnal recente. É possível estabelecer nexo causal entre esse vestígio e o delito.

CONCLUSÃO: Presença de vestígios de conjunção carnal recente.


RESPOSTA AOS QUESITOS:

1º) Sim. 7º) Não.

2º) Não. 8º) Não.

3º) Sim. 9º) Não.

4º) Meio Físico. 10º) Não.

5º) Não. 11º) Sem Elementos.

6º) Não.

Caso 2

DISCUSSÃO: As escoriações nas nádegas foram produzidas durante o ato sexual e não
caracterizam emprego de violência para conter a vítima. O exame laboratorial revela a presença
de espermatozoides e de DNA de outra pessoa no conteúdo vaginal. O namorado não forneceu
amostra para exame de seu DNA. Diante disso, o perito não tem elementos para afirmar de
quem são os vestígios da conjunção carnal verificada. Se do namorado ou se do agressor.

CONCLUSÃO: O perito não tem elementos para afirmar ou negar que houve conjunção carnal
delituosa no presente exame.

RESPOSTA AOS QUESITOS:

1º) Sem elementos

2º) Não. Do 3º ao 11º) Prejudicado.

Caso 3

DISCUSSÃO:A pericianda recusou-se a fazer a perícia.

CONCLUSÃO: Exame prejudicado.

RESPOSTA AOS QUESITOS:

1º ao 11º) Prejudicado.

Caso 4

DISCUSSÃO: O hímen íntegro é indicativo de que não houve conjunção carnal e não há vestígio
de outro ato libidinoso.

CONCLUSÃO: Ausência de vestígio de prática libidinosa.


RESPOSTA AOS QUESITOS:

1º e 2º) Não.

3º ao 11º) Prejudicado.

Caso 5

DISCUSSÃO: O periciando apresenta deficiência mental. As lesões da região anal indicam


vestígios de coito anal recente.

CONCLUSÃO: Vestígios de ato libidinoso recente.

RESPOSTA AOS QUESITOS:

1º) Prejudicado. 7º) Não.

2º) Sim. 8º) Sim.

3º) Não. 9º) Não.

4º) Prejudicado. 10º) Prejudicado.

5º) Prejudicado. 11º) Sem Elementos.

6º) Sim.

Caso 6

DISCUSSÃO: Não foram encontrados vestígios de atos libidinosos.

CONCLUSÃO: Ausência de vestígios de ato libidinoso.

RESPOSTA AOS QUESITOS:

1º) Prejudicado.

2º) Não.

3º ao 11º) Prejudicado.

Caso 7

DISCUSSÃO: A pesquisa de espermatozoides no conteúdo vaginal foi negativa, mas a dosagem


do PSA foi positiva, caracterizando vestígios de conjunção carnal recente. É tetraplégica, o que
a impediu de oferecer resistência.

CONCLUSÃO: Presença de vestígios de conjunção carnal recente.


RESPOSTA AOS QUESITOS:

1º) Sim. 7º) Não.

2º) Não. 8º) Não.

3º) Não. 9º) Sim. Tetraplegia.

4º e 5º) Prejudicado 10º) Não.

6º) Não. 11º) Sem Elementos.

Caso 8

DISCUSSÃO: Pericianda apresentando-se embriagada, o que a impediu de resistir,


caracterizando violência psíquica. A rotura himenal ainda com sangramento é vestígio de
conjunção carnal recente.

CONCLUSÃO: Presença de vestígio de conjunção carnal recente.

RESPOSTA AOS QUESITOS:

1º) Sim. 2º) Não.

3º) Sim. 4º) Violência Psíquica.

5º) Não. 6º) Sim.

7º) Não. 8º) Não.

9º) Não. 10º) Não.

11º) Sem Elementos.

Caso 9

DISCUSSÃO: Considerando o tempo transcorrido entre o evento e o exame atual, o perito não
tem como identificar, hoje, possíveis vestígios de conjunção carnal que pudessem existir no dia
em que aconteceu o fato, pois, nesse lapso de tempo, eles desapareceram. A pericianda é
portadora de hímen complacente, que permite a conjunção carnal sem se romper. Não se tem,
pois, elementos para afirmar ou negar que há onze dias houve conjunção carnal.

CONCLUSÃO: Sem Elementos para afirmar ou negar que houve prática libidinosa na data do
evento.
RESPOSTA AOS QUESITOS:

1º e 2º) Sem Elementos.

Do 3º ao 11º) Prejudicado.

Caso 10

DISCUSSÃO: Presença de vestígios de coito anal recente, que pode ter nexo causal com o
delito. Colhido conteúdo vaginal para pesquisa de espermatozoide, dosagem do PSA e exame
de DNA, para verificar se há vestígio de conjunção carnal recente. Colhido suabe oral da
pericianda para identificação do seu DNA. Solicitou-se dosagem de Beta HCG na urina, que foi
negativa. Repetir, caso haja atraso menstrual. Foi encaminhada para apoio ginecológico (pílula
do dia seguinte e prevenção de Doenças Sexualmente Transmissíveis). Aguardar o resultado do
exame laboratorial para conclusão da perícia. Solicitou-se exame complementar em 35 dias.

CONCLUSÃO: Presença de vestígio de coito anal recente. Aguardar o resultado dos exames
solicitados para constatação de conjunção carnal.

Resposta aos quesitos:

1º) Aguardar 2º) Sim.

3º) Não. 4° e 5º) Prejudicado.

6º) Sim. 7º) Não.

8º) Não. 9º) Sem Elementos.

10º) Aguardar. 11º) Sem Elementos.

RESULTADO DOS EXAMES LABORATORIAIS


A pesquisa de espermatozoide foi positiva. A dosagem do PSA foi positiva. A dosagem de Beta
HCG foi negativa. Feita nova dosagem do Beta HCG, que foi negativa, 35 dias após o evento.

CONTINUAÇÃO DO LAUDO Nº ... REFERENTE A ...

DISCUSSÃO: A pesquisa de espermatozoide, no conteúdo vaginal, foi positiva. A dosagem do


PSA, também, foi positiva. A dosagem do Beta HCG foi negativa, 35 dias após o evento,
indicando que não resultou em gravidez. Exame de DNA em andamento.

A presença de espermatozoide e do PSA no conteúdo vaginal é vestígio de conjunção


carnal recente e é possível fazer o nexo causal com o delito.

CONCLUSÃO: Presença de vestígio de conjunção carnal recente.


RESPOSTA AOS QUESITOS PENDENTES

(respondidos com o termo: Aguardar)

1º) Sim.

10º) Não.

Caso 11

DISCUSSÃO: A presença de espermatozoides e dosagem do PSA positiva no material extraído


da calcinha da menor são vestígios de que houve ato libidinoso. Pela lei, está tipificada como
vulnerável (tem 10 anos de idade).

CONCLUSÃO: Presença de vestígio de Ato Libidinoso.

RESPOSTA AOS QUESITOS:

1º) Não. 2º) Sim.

3º) Não. 4º e 5º) Prejudicado.

6º) Não. 7º) Sim.

8º) Não. 9º) Não.

10º) Não. 11º) Não.

Caso 12

DISCUSSÃO: A pericianda tem 11 anos de idade e está grávida, indicando que houve
conjunção carnal.. O hímen complacente permite a conjunção carnal, sem se romper.
Apresenta Condiloma Acuminado, na região vulvar, que é uma Doença Sexualmente
Transmissível (DST). É tipificada pela lei como vulnerável (tem 11 anos).

CONCLUSÃO: Presença de vestígio de Conjunção Carnal. O agressor transmitiu DST à vítima.

RESPOSTA AOS QUESITOS:

1º) Sim. 2º) Não.

3º) Não. 4º e 5º) Prejudicado.

6º) Não. 7º) Sim.

8º) Não. 9º) Não.

10º) Sim. 11º) Sim.


10 - EXAME MÉDICO-LEGAL PARA VERIFICAÇÃO DE EMBRIAGUEZ

A constatação pericial do estado de embriaguez interessa às seguintes legislações:

a) Lei das Contravenções Penais.

b) Agravantes, atenuantes ou isenção da pena em crimes previstos no Código Penal e no Código


Penal Militar.

c) Consolidação das Leis do Trabalho para dispensa do empregado por justa causa.

d) Código de Trânsito Brasileiro.

O exame de dosagem da alcoolemia objetiva quantificar o teor alcoólico no sangue de


pessoas envolvidas em infrações de trânsito, para aplicar as sanções estabelecidas no Código de
Trânsito Brasileiro.

Legislação
Código Penal - Da Imputabilidade Penal

Art. 28. Não excluem a imputabilidade penal:

I – a emoção ou a paixão;

Embriaguez
II – a embriaguez, voluntária ou culposa, pelo álcool ou substância de efeitos análogos.

§ 1º É isento de pena o agente que, por embriaguez completa, proveniente de caso fortuito
ou força maior, era, ao tempo da ação ou da omissão, inteiramente incapaz de entender o
caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento.

§ 2º A pena pode ser reduzida de um a dois terços, se o agente, por embriaguez,


proveniente de caso fortuito ou força maior, não possuía, ao tempo da ação ou da omissão, a
plena capacidade de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse
entendimento.

Da Aplicação da Pena Circunstâncias agravantes


Art. 61. São circunstâncias que sempre agravam a pena, quando não constituem ou qualificam
o crime:

II – ter o agente cometido o crime:


l) em estado de embriaguez preordenada.

Código Penal Militar


Art. 49. Não é igualmente imputável o agente que, por embriaguez completa proveniente de
caso fortuito ou força maior, era, ao tempo da ação ou da omissão, inteiramente incapaz de
entender o caráter criminoso do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento.

Parágrafo único. A pena pode ser reduzida de um a dois terços, se o agente por embriaguez
proveniente de caso fortuito ou força maior, não possuía, ao tempo da ação ou da omissão, a
plena capacidade de entender o caráter criminoso do fato ou de determinar-se de acordo com
esse entendimento.

Art. 70. São circunstâncias que sempre agravam a pena, quando não integrantes ou
qualificadoras do crime:

II – ter o agente cometido o crime:

a) depois de embriagar-se, salvo se a embriaguez decorre de caso fortuito, engano ou força


maior.

Art. 202. Embriagar-se o militar, quando em serviço, ou apresentar-se embriagado para prestá-
lo:

Pena – detenção, de seis meses a dois anos.

Art. 279. Dirigir veículo motorizado, sob administração militar na via pública, encontrando-se
em estado de embriaguez, por bebida alcoólica, ou qualquer outro inebriante:

Pena – detenção, de três meses a um ano.

Lei das Contravenções Penais


Embriaguez

Artigo 62. Apresentar-se publicamente em estado de embriaguez, de modo que cause escândalo
ou ponha em perigo a segurança própria ou alheia.

Pena – prisão simples, de 15 (quinze) dias a 3 (três) meses, ou multa.

Parágrafo único – Se habitual a embriaguez, o contraventor é internado em casa de custódia e


tratamento.

Consolidação das Leis do Trabalho


Artigo 468. Constituem justa causa para rescisão do contrato de trabalho pelo empregador:
f) embriaguez habitual ou em serviço;

As autoridades competentes para requisitar o exame de embriaguez ao Instituto de Medicina


Legal são: autoridade policial civil, militar e administrativa. O empregador privado deverá
solicitá-lo por meio da autoridade policial civil.

Embriaguez, o que é?
É um conjunto de manifestações psíquicas, neurológicas e somáticas, secundárias à
ingestão aguda etílica, suficiente para produzir alterações do comportamento do indivíduo.

A embriaguez é, pois, uma alteração clínica, com manifestações variadas, comprometendo


o estado físico, neurológico e psíquico da pessoa.

A sua constatação é prisioneira do exame clínico do suspeito de estar embriagado. Só por


meio desse exame é que se pode fazer o diagnóstico de embriaguez.

Esse exame é uma perícia médico-legal, porque requer conhecimentos específicos para
realizá-lo.

Algumas variáveis interferem na manifestação clínica da embriaguez, isto porque há de se


considerar as particularidades de cada organismo. Deve-se atentar para a tolerância das
pessoas à ingestão de bebida alcoólica. Algumas ingerem uma quantidade considerável sem se
embriagar, enquanto outras, com pequena dose, já se embriagam.

“São fatores que se relacionam com esta tolerância: o peso, a idade, o hábito de beber,
estados emotivos, estafa, sono, convalescença, ritmo de ingestão da bebida, vacuidade ou
plenitude do estômago”. (FRANÇA, 2005, p.17).

Como se vê, a manifestação clínica da embriaguez depende mais da tolerância individual à


ingestão etílica do que da dose ingerida. É justamente esta particularidade que realça a
importância inquestionável do exame clínico, para aferir a presença ou a ausência da
embriaguez.

Formas de embriaguez
A embriaguez pode ser: fisiológica e patológica.

A embriaguez fisiológica, segundo Legrand de Saulle e Krafft-Ebing, citado por ALCÂNTARA


(2006, p. 193) pode apresentar-se compreendendo três períodos:

a) Período de excitação: presença de euforia, vivacidade, loquacidade, animação,


gracejamento, desinibição.

b) Período de confusão: turbulência, agressividade, irritabilidade, ataxia, perturbações


sensitivas.
c) Período sonolento: desequilíbrio, sono profundo, sudorese profusa, relaxa-mento dos
esfíncteres, vômitos, coma.

A embriaguez patológica acontece quando o indivíduo ingere pequena quantidade de


álcool e apresenta uma reação paradoxal, manifestando delírios e alucinações.

Vibert (Idem) a classifica em:

a) Agressiva e violenta: com tendência ao crime, à agressividade;

b) Excito-motora: com acesso de raiva, agitação;

c) Convulsiva: impulsos destruidores violentos;

d) Delirante: com tendência à autoacusação.

Classificação da embriaguez
A embriaguez, quanto ao estado anterior à ingestão do álcool, levando em conta a vontade
do indivíduo, pode ser:

a) Embriaguez voluntária ou preordenada: o agente bebe com a intenção de se colocar


em condições de praticar o crime;

b) Embriaguez culposa: o agente bebe demais, imprudentemente, sem conhecer os efeitos


que o álcool lhe produz;

c) Embriaguez preterdolosa: o agente não quer o resultado, porém ingere o álcool, para
embriagar-se e assim assume o risco de produzi-lo;

d) Embriaguez fortuita: é a ingestão de bebida alcoólica ocasional, em momentos especiais,


sem predeterminação;

e)Embriaguez por força maior: quando o agente é levado pelo ambiente em que se
encontra a embriagar-se, tendo a sua resistência vencida pelas circunstâncias;

f) Embriaguez acidental: quando por engano ingere, sem saber, bebida com alto teor
alcoólico;

g)Embriaguez habitual: o agente encontra-se dependente do álcool.

Grau de Embriaguez
A embriaguez, quanto ao grau, pode ser: incompleta ou completa, dependendo dos
sintomas e dos sinais apresentados pela pessoa que ingeriu a bebida alcoólica.

Na embriaguez incompleta o ébrio perde a autocrítica, pode ficar triste, melancólico,


irrequieto, buliçoso, loquaz ou tornar-se eufórico, desinibido, insolente, inconveniente, a
memória embotada, o raciocínio lento, a atenção comprometida, os reflexos comprometidos, a
marcha levemente alterada, a frequência cardíaca acima de 100 batimentos por minuto, o
hálito etílico presente, as conjuntivas hiperemiadas.

Na embriaguez completa o ébrio torna-se confuso, violento, irritável, inconsequente, ou


deprimido, com o pensamento lento e desarticulado, a fala é arrastada, desconexa, apresenta-
se desorientado, a memória embotada, a marcha é cambaleante, os reflexos alterados, a
higiene comprometida, mostra-se sonolento, apresenta hálito etílico, fascies etílica, congesta,
conjuntivas hiperemiadas, taquicardia.

Alterações provocadas pela intoxicação alcoólica aguda


As alterações comprometem o complexo neuropsicossomático do etilista. As
manifestações somáticas são: presença do hálito etílico, taquicardia, sudorese, conjuntivas
hiperemiadas, fascies congesta.

As manifestações neurológicas são: alterações do equilíbrio, da marcha, da


coordenação motora, alterações dos reflexos, da articulação da palavra, da sensibilidade, da
percepção sensitivo-motora.

As manifestações psíquicas são: comprometimento da atenção, da consciência, da


memória, da orientação, do pensamento, do humor, da afetividade, do senso crítico, da
linguagem.

Após a ingestão e absorção do álcool etílico, começa o seu metabolismo e,


aproximadamente, depois de 1 (uma) hora e 30 (trinta) minutos, inicia a sua curva de
eliminação que se completa em torno da 7ª hora subsequente.

A autoridade requisitante do exame pericial, para verificação de embriaguez, deve


conhecer esse tempo de eliminação do álcool do organismo, que coincide com o
desaparecimento de todos os sinais da embriaguez, e nunca solicitar o exame depois da 6º hora
da detenção do suspeito de estar embriagado, porque o seu exame será normal. Não se
justifica requisitar o exame depois desse tempo.

LAUDO DO EXAME DE EMBRIAGUEZ


A perícia, para verificar embriaguez etílica, é feita, obedecendo à parte formal do
procedimento para elaboração do laudo médico-legal que deve conter:

a) Preâmbulo; b) Quesitos; c) Histórico; d) Descrição; e) Discussão ou Comentários; f)


Conclusão; g) Resposta aos quesitos.

a) Preâmbulo – indicar: a hora, o dia, o mês, o ano e a cidade onde será realizada a perícia;
nome da autoridade requisitante do exame; nome do perito médico-legista encarregado da
realização do exame; nome do diretor do IML que designou o perito para fazer a perícia; o
exame solicitado; a identificação da pessoa a ser examinada.
b) Quesitos
Os quesitos oficiais propostos para o exame de embriaguez são:

1º) O(A) periciando(a) está embriagado(a)?

2º) Qual a espécie de embriaguez?

3º) No estado em que se encontra, põe em risco a segurança própria ou a alheia?

4º) Ele(a) se embriaga habitualmente?

5º) Em caso afirmativo, quanto tempo necessita para a necessária desintoxicação?

c) Histórico
Consignar as circunstâncias que motivaram a realização da perícia; a hora em que foi
abordado inicialmente. Na entrevista, solicitar que a pessoa a ser examinada relate o que
ocorreu, como ocorreu e quando ocorreu.

(Perícia realizada após a 7ª hora da ocorrência do fato, com toda certeza, não encontrará
mais nenhum vestígio da embriaguez cujos sintomas, como o álcool, são voláteis e, após esse
lapso de tempo, desaparecem).

d) Descrição
O perito, para não se perder, deve ter um roteiro para descrever as alterações encontradas
durante a realização do exame pericial. Sugere-se o seguinte roteiro:

e) Discussão ou Comentários
Referir circunstâncias que possam ter importância na realização do exame. Dificuldade
para conclusão definitiva. Se a perícia foi realizada após a 7ª hora da ocorrência do fato,
informar a impossibilidade de encontrar os vestígios da embriaguez. Se a pessoa se negou a
fazer o exame, informar esta negativa.

f) Conclusão
Afirmar, ou negar que a pessoa está embriagada. Ou Exame Prejudicado, quando a pessoa
se negou a fazer o exame.

Nos casos em que os vestígios observados não dão segurança para o perito ter certeza da
ebriedade, concluir que ele não está embriagado. (Na dúvida não prejudicar o suspeito).
g) Respostas aos quesitos
Se ao 1º quesito responder: NÃO, ou PREJUDICADO, a resposta aos demais quesitos, do 2º
ao 5º, fica prejudicada e deverá ser respondida com a palavra: PREJUDICADO. Ora, se a pessoa
não está embriagada, tornam-se sem sentido as perguntas contidas nos quesitos que se
seguem ao primeiro.

1º) O(A) periciando(a) está embriagado(a)?

Resposta: SIM. Se a pessoa está embriagada.

2º) Qual a espécie de embriaguez?

Resposta: Fisiológica. Se esta é a espécie da embriaguez. Ou Patológica. Se esta é a espécie da


embriaguez.

3º) No estado em que se encontra, põe em risco a segurança própria ou a alheia?

Resposta: SIM. Se a pessoa neste estado põe em risco a sua segurança ou a alheia. Ou NÃO. Se
isto não acontece.

4º) Ele(a) se embriaga habitualmente?

Resposta: SIM. Se as características apresentadas pela pessoa são de episódios frequentes de


embriaguez.

Resposta: NÃO. Se isso não ocorre.

Resposta: SEM ELEMENTOS. Se o perito não tem certeza para afirmar ou negar esta condição.

5º) Em caso afirmativo, quanto tempo necessita para a necessária desintoxicação?

Resposta: TANTOS DIAS (uma semana, dez dias, ETC.), se ao 4º respondeu:

Sim.

Resposta: PREJUDICADO, se ao 4º respondeu: Não. Ou Sem Elementos.

Para o diagnóstico da embriaguez é indispensável o exame clínico, pois só por meio dele é
que se afere o comportamento do embriagado. É justamente esse comportamento, por ser
variada a sua apresentação, que interessa à lei.

A embriaguez, assim, com todos os seus comemorativos, só poderá ser verificada à luz do
exame clínico. Não existe outra maneira de fazê-lo.

O ÁLCOOL E O CÓDIGO DE TRÂNSITO BRASILEIRO


Legislação
Código de Trânsito Brasileiro
Alterações produzidas pela Lei Nº 11.705, de 19 de julho de 2008

Capítulo XV, DAS INFRAÇÕES

Artigo 165. Dirigir sob a influência de álcool ou de qualquer substância psicoativa que determine
dependência:

Infração – gravíssima;

Penalidade – multa (cinco vezes) e suspensão do direito de dirigir por 12 (doze) meses;

Medida Administrativa – retenção do veículo até a apresentação de condutor habilitado e


recolhimento do documento de habilitação.

Parágrafo único – A embriaguez também poderá ser apurada na forma do art. 277.

Capítulo XVII, DAS MEDIDAS ADMINISTRATIVAS

Artigo 269. A autoridade de trânsito ou seus agentes, na esfera das competências estabelecidas
neste Código e dentro de sua circunscrição, deverá adotar medidas administrativas:

IX – realização de teste de dosagem de alcoolemia ou perícia de substância entorpecente ou que


determine dependência física ou psíquica;

Artigo 276. Qualquer concentração de álcool por litro de sangue sujeita o condutor às
penalidades previstas no art. 165 deste Código.

Parágrafo único. Órgão do Poder Executivo federal disciplinará as margens de tolerância para
casos específicos.

Margens de tolerância de álcool por litro de sangue, estabelecidas pelo Decreto Nº


6.488 de 19 de junho de 2008, mesma data da Lei Nº. 11.705.
Artigo 1º.Qualquer concentração de álcool por litro de sangue sujeita o condutor às penalidades
administrativas do art. 165 da Lei nº 9.503, de 23 de setembro de 1997 – por dirigir sob a
influência de álcool.

§ 1º As margens de tolerância de álcool no sangue para casos específicos serão definidas em


resolução do Conselho Nacional de Trânsito – CONTRAN, nos termos de proposta formulada
pelo Ministério de Estado da Saúde.

§ 2º Enquanto não editado o ato de que trata o § 1º, a margem de tolerância será de duas
decigramas por litro de sangue para todos os casos.“A redação correta seria dois decigramas”.

§ 3º Na hipótese do § 2º, caso a aferição da quantidade de álcool no sangue seja feito (o correto
seria: feita) por meio de teste em aparelho de ar alveolar pulmonar (etilômetro), a margem de
tolerância será de um décimo de miligrama por litro de ar expelido dos pulmões.
Artigo 2º. Para os fins criminais de que trata o art. 306 da Lei nº 9.503, de 1997, a equivalência
entre os distintos testes de alcoolemia é a seguinte:

I – exame de sangue: concentração igual ou superior a seis decigramas de álcool por litro de
sangue; ou

II – teste em aparelho de ar alveolar pulmonar (etilômetro): concentração de álcool igual ou


superior a três décimos de miligrama por litro de ar expelido dos pulmões.

Código Brasileiro de Trânsito

Artigo 277. Todo condutor de veículo automotor, envolvido em acidente de trânsito ou que for
alvo de fiscalização de trânsito, sob suspeita de haver excedido os limites previstos no artigo
anterior, será submetido a testes de alcoolemia, exames clínicos, perícia, ou outro exame que
por meios técnicos ou científicos, em aparelhos homologados pelo CONTRAN, permitam
certificar seu estado.

§ 2º A infração prevista no art. 165 deste Código poderá ser caracterizada pelo agente de
trânsito mediante a obtenção de outras provas em direito admitidas, acerca dos notórios sinais
de embriaguez, excitação ou torpor apresentados pelo condutor.

§ 3º Serão aplicadas as penalidades e medidas administrativas estabelecidas no art. 165 deste


Código ao condutor que se recusar a se submeter a qualquer dos procedimentos previstos no
caput deste artigo.

Capítulo XIX, DOS CRIMES DE TRÂNSITO

Seção I, Disposições Gerais

Artigo 291.Aos crimes cometidos na direção de veículos automotores, previstos neste Código,
aplicam-se as normas gerais do Código Penal e do Código de Processo Penal, se este Capítulo
não dispuser de modo diverso, bem como a Lei nº 9.099, de 26 de setembro de 1995, no que
couber.

§ 1º Aplica-se aos crimes de trânsito de lesão corporal culposa o disposto nos arts. 74, 76 e 88
da Lei nº 9.099, de 26 de setembro de 1995, exceto se o agente estiver:

I – sob a influência de álcool ou qualquer outra substância psicoativa que determine


dependência;

§ 2º Nas hipóteses previstas no § 1º deste artigo, deverá ser instaurado inquérito policial para a
investigação da infração penal.

Artigo 296. Se o réu for reincidente na prática de crime previsto neste Código, o juiz aplicará a
penalidade de suspensão da permissão ou habilitação para dirigir veículo automotor, sem
prejuízo das demais sanções penais cabíveis.
Seção II, Dos Crimes em Espécie

Artigo 306. Conduzir veículo automotor, na via pública, estando com concentração de álcool por
litro de sangue igual ou superior a 6 (seis) decigramas, ou sob a influência de qualquer outra
substância psicoativa que determine dependência:

Penas – detenção, de seis meses a três anos, multa e suspensão ou proibição de se obter a
permissão ou a habilitação para dirigir veículo automotor.

Parágrafo único. O Poder Executivo federal estipulará a equivalência entre distintos testes de
alcoolemia, para efeito de caracterização do crime tipificado neste artigo. (Ver artigo 2º do
Decreto Nº. 6.488, de 19 de junho de 2008, anteriormente descrito, que trata dessa
equivalência.)

Artigo 310. Permitir, confiar ou entregar a direção de veículo automotor a pessoa não
habilitada, com habilitação cassada ou com o direito de dirigir suspenso, ou, ainda, a quem, por
seu estado de saúde, física ou mental, ou por embriaguez, não esteja em condições de conduzi-
lo com segurança:

Pena – detenção, de seis meses a um ano, ou multa.

O artigo 165 do Código de Trânsito Brasileiro considera infração gravíssima dirigir sob influência
de álcool, ou de qualquer outra substância psicoativa que determine dependência, e apresenta
punição ao infrator. No seu parágrafo único diz: a embriaguez também poderá ser apurada na
forma do art. 277.

O artigo 276 reza que qualquer concentração de álcool por litro de sangue sujeita o condutor às
penalidades previstas no art. 165 deste Código.

O texto do artigo 277 refere que: “Todo condutor de veículo automotor, envolvido em acidente
de trânsito ou que for alvo de fiscalização de trânsito, sob suspeita de haver excedido os limites
previstos no artigo anterior será submetido a teste de alcoolemia, exames clínicos, perícia, ou
outro exame que por meios técnicos ou científicos, em aparelhos homologados pelo CONTRAN,
permitam certificar seu estado.”

§ 2º A infração prevista no artigo 165 deste Código poderá ser caracterizada pelo agente de
trânsito mediante a obtenção de outras provas em direito admitidas, acerca dos notórios sinais
de embriaguez, excitação ou torpor apresentados pelo condutor.

O artigo 306 disciplina que: conduzir veículo automotor, na via pública, estando com
concentração de álcool por litro de sangue igual ou superior a 6 (seis) decigramas, ou sob a
influência de qualquer outra substância psicoativa que determine dependência caracteriza
crime de trânsito e deverá ser apurado através de inquérito policial.

Conforme o observado, o Código de Trânsito Brasileiro estabelece cifras de alcoolemia


para punir o condutor que está sob influência do álcool. O parágrafo único do artigo 276 diz
que: o órgão do Poder Executivo federal disciplinará as margens de tolerância para casos
específicos. (Redação dada pela Lei nº 11.705, de 19 de junho de 2008).

Essa margem de tolerância está estabelecida, provisoriamente, pelo Decreto nº 6.488, de


19 de junho de 2008, em cujo parágrafo 2º, do seu artigo 1º, refere que será de dois
decigramas por litro de sangue para todos os casos, tendo equivalência para aferição no ar
alveolar pulmonar correspondente a 1 (um) décimo de miligrama por litro de ar expelido dos
pulmões. Até esse limite não há punição para o condutor de veículo automotor.

Dosagens entre 2 (dois) e 6 (seis) decigramas de álcool por litro de sangue, ou equivalência
de 1 (um) a 3 (três) décimos de miligrama por litro de ar expelido dos pulmões, tipifica infração
de trânsito, conforme o artigo 165 do CTB.

Cifra igual ou superior a 6 (seis) decigramas de álcool por litro de sangue, ou equivalência
igual ou superior a 3 (três) décimos de miligrama por litro de ar expelido dos pulmões,
caracteriza crime de trânsito, conforme estabelece o artigo 306 do CTB.

Quando a lei condiciona que a sanção ao infrator fica subordinada especificamente a uma
cifra de alcoolemia, logicamente, só a determinação dessa cifra permite a sua aplicação. Não há
nenhum outro modo de procedimento que possa substituí-la.

A lei, ao disciplinar dessa maneira, considera apenas a dosagem do teor alcoólico, no


organismo do condutor, como único instrumento capaz de produzir a informação técnica
necessária à aplicação da pena.

O exame clínico, para verificação da embriaguez, não substitui a determinação da


alcoolemia por ser este exame, uma avaliação puramente clínica, no qual não é possível
estabelecer quanto de álcool o embriagado tem por litro de sangue, condição esta imperativa
para a aplicação da pena nos delitos de trânsito.

Fica claro que, nas infrações de trânsito, o diagnóstico de embriaguez do condutor tem
pequena relevância, possibilitando apenas a aplicação das sanções previstas no art. 165 do
Código de Trânsito Brasileiro, que estabelece, apenas, procedimentos administrativos. A lei
atual não define que é crime dirigir veículo automotor em estado de embriaguez, razão pela
qual não comina pena a quem assim age.

O exame de dosagem da alcoolemia é um procedimento laboratorial, que pode ser aferido


em aparelhos móveis, utilizados pelos agentes de trânsito, no momento da ocorrência do fato.
Esses agentes não são médicos-legistas. A determinação da alcoolemia não é um exame
médico-legal.

É necessário estabelecer esse divisor de águas para que os procedimentos, envolvendo


delito de trânsito, fiquem claros. Que não pairem dúvidas sobre o que é a embriaguez e quando
é indicado o seu exame, bem como o que é a alcoolemia e quando é indispensável a sua
aferição.
Como já referido, o exame de embriaguez é clínico, voltado para avaliar as alterações, que
a intoxicação alcoólica, promove no complexo neuropsicossomático do ébrio, cuja importância
da sua verificação está disciplinada em lei pertinente. A realização desse exame é feita por
médico-legista.

A aferição da alcoolemia é um exame laboratorial. A cifra do teor alcoólico no sangue é


necessária para tipificar o delito e oferecer subsídios para aplicar a sanção ao infrator, nas
infrações de trânsito, conforme condiciona a atual lei de trânsito.

Resolução nº 81, de 19 de novembro de 1998, CONTRAN/ MINISTÉRIO DA JUSTIÇA. Publicada


no DOU de 20/11/98, p. 24/25.

Artigo 2º.É obrigatória a realização do exame de alcoolemia para as vítimas fatais de trânsito.
11 - PRÁTICA DE PSIQUIATRIA FORENSE
Maria Christina da Silva Sá

Colaborador: Venilton Francisco Melo Sá

Apresentação
Encanta-nos a ideia de escrever sobre esta matéria, pois se trata de um assunto instigante
ligado a um trabalho que realizamos com prazer. Consideramos a psiquiatria forense excitante,
por assumir o desafio de deslindar questões complexas, aparentemente subjetivas, e por ter
grande valor para a comunidade, visto que contribui fortemente para que se estabeleça a paz
social, papel de todo cidadão. O psiquiatra forense é um técnico, que procura elucidar o estado
mental do indivíduo, visando conhecer as condições em que se processou o fato delituoso em
estudo. Imergimos na vida de cada indivíduo, que se coloca à nossa frente, na condição de
periciando, na tentativa de enxergar através da água turva que envolve todo momento de
crime. Em que pese o conteúdo dramático que permeia essa especialidade, é possível extrair
beleza de cada biografia revelada que, infelizmente, na maioria das vezes, por falha na
educação, evoluiu para a delinquência. Nós, peritos, temos o privilégio de aprender com o
sofrimento de outros seres humanos e o dever de nos portar de forma adequada.

A psiquiatria forense, psicopatologia forense ou psiquiatria legal surgiu da necessidade de


se dosar a pena, não mais pela extensão do dano causado à vítima, mas, sim, de acordo com a
intenção de praticá-lo. Situa-se entre a psiquiatria e a medicina legal e entre a medicina e o
direito, posição que por si mesma suscita moderação, equilíbrio e neutralidade.

A proposta deste trabalho não é ensinar medicina legal nem psiquiatria clínica, mas
oferecer algumas dicas práticas sobre perícias criminais, atividade que realizamos há alguns
anos no Instituto de Medicina Legal Leonídio Ribeiro, no Distrito Federal. Dessa forma,
escreveremos de maneira clara e sucinta para alcançar nosso objetivo, que é facilitar a prática
pericial dos colegas que estão pouco familiarizados com a questão.

Para simplificar a leitura do texto, usaremos apenas o gênero masculino quando nos
referirmos ao perito e ao examinando, embora existam, em menor número, tanto periciandas
como peritas. Outra observação é que, apesar de não haver regra sem exceção, especialmente
em medicina, não nos reportaremos a todo instante a este fato, evitando os “de costume”, “em
geral”, “quase sempre”, “na maioria das vezes”.... Entenda-se o que for descrito como o que
ocorre mais comumente.

Qualquer assunto fica mais bem compreendido quando mergulhamos em sua história.
1. História da Psiquiatria Forense
Na antiguidade, acreditava-se que os distúrbios mentais eram devidos à intervenção de
divindades ou à influência sobrenatural, não havendo, portanto, interesse para que os médicos
colaborassem com o direito. A psiquiatria forense nasceu no momento em que se recorreu aos
médicos para a avaliação do estado mental do indivíduo que cometera crime. No início do
século XIX, passou-se a avaliar o delito não só de acordo com a extensão do dano, mas também
considerando-se a liberdade de ação do acusado.

Na Grécia antiga, os doentes mentais eram classificados em demoníacos, energúmenos ou


possuídos, de acordo com os atos praticados e as palavras proferidas. Eram “cuidados” por
padres-médicos que associavam sacrifícios de purificação a banhos, dietas especiais e ervas.
Entretanto, em 460 a.C., Hipócrates insurgia-se contra as práticas religiosas e classificava as
doenças mentais em: mania, melancolia, hipocondria e delírios febris. Na mesma época,
Aristóteles lançou os alicerces da psiquiatria forense, ao reconhecer que os animais, as crianças,
os idiotas, os loucos e os possessos não podiam ser responsabilizados pelos seus atos.

Na Idade Média, a incipiente psiquiatria, assim como todas as outras ciências e artes,
sofreu um retrocesso, voltando a prevalecerem as ideias místico-religiosas, com a maioria dos
pacientes sendo submetida a grandes martírios com o objetivo de se castigar o demônio
encarnado.

No início da Renascença, constitui-se, em Roma, o Tribunal de Rota, sendo Paulo Zacchia


nomeado o primeiro perito oficial, cabendo-lhe a emissão de sábios pareceres acatados pelos
magistrados. Considerado o pai da psiquiatria forense, escreveu em seu livro “Questões
Médico-Legais”, datado de 1637, que o médico era o único capaz e com competência para
avaliar o estado mental de um indivíduo. Frederico, o Grande, decretou a abolição das torturas
e difundiu as normas do processo penal. A França, já no século XVII, reservava alguns lugares
nos hospitais gerais para tratamento, ainda que sumário, dos enfermos mentais.

Embora Paulo Zacchia seja considerado o pai da psiquiatria forense, cabe a Krafft-Ebing a
articulação precisa do achado médico com o discurso jurídico, expondo a matéria de maneira
esquemática. Até final do século XVIII, os alienados eram confinados em asilos e os alienados
criminosos eram encarcerados nas prisões comuns. Foi Pinel e seu aluno Esquirol, no início do
século XIX, que implantaram a nova mentalidade de libertar os loucos dos grilhões, reclamando
tratamento especial para o insano mental.

Foi apenas no século XIX que surgiu, na Itália, a Escola Positivista, fundada por Lombroso,
médico-legista e psiquiatra, pai da criminologia. Inicialmente, defendia a ideia biológica do
crime (criminoso nato). Mais tarde, porém, enfatizou outros fatores como a educação
deficiente e a condição social. Freud, com seus estudos sobre a psicologia, também teve grande
influência na medicina, no direito e na criminologia, quando afirmava que fatores inconscientes
eram responsáveis pela conduta humana.

No início do século XX, na Alemanha, Von Liszt, estudioso da psicologia criminal, criou o
aforismo: “É responsável o homem mentalmente são e mentalmente desenvolvido”. Em 1901,
Roche publicou o primeiro tratado de psiquiatria forense que começava a ter metodologia
específica.

A Medicina Legal brasileira começou seguindo a orientação intelectual portuguesa. Apesar


de a instituição do seu ensino oficial, em nosso país, ter-se iniciado em 1832, na Bahia,
restringia-se apenas à traumatologia, à toxicologia e à tanatologia. A primeira publicação
brasileira sobre medicina legal é de 1914, de autoria de Manuel Vieira da Silva, seguido por
Souza Lima, que escreveu o grande “Tratado de Medicina Legal”, e mais: Nina Rodrigues
(sistematizador da medicina legal brasileira), Afrânio Peixoto, Oscar Freire, Diógenes Sampaio,
Alcântara Machado, Leonídio Ribeiro e outros.

No Brasil, o primeiro manicômio judiciário foi fundado, no Rio de Janeiro, em maio de


1921, tendo como primeiro diretor o psiquiatra Heitor Carrilho, sistematizador da
psicopatologia forense brasileira. Em seu estudo, tinha como foco a perícia psiquiátrica e o
papel do perito. O segundo foi no Rio Grande do Sul, em 1925, dirigido por Jacinto Godoy. A
primeira fase da psiquiatria forense brasileira, que durou até 1961, foi produtiva e contou com
a publicação de vários trabalhos, especialmente, por Oswaldo Domingues de Moraes.

Após esse período, sucedeu-se um declínio na atividade científica, na área forense, época
que coincidiu com o avanço dos estudos no campo de tratamento medicamentoso dos doentes
mentais. Os psiquiatras forenses inclinavam-se a não se identificar como tal.

A partir de 1995, em meio à luta antimanicomial, a especialidade ressurgiu graças ao


empenho de Álvaro Rubim de Pinho, então presidente da Associação Brasileira de
Psiquiatria/ABP. Atualmente, tem havido uma migração de psiquiatras para essa seara por
fatores diversos. Hoje, é com orgulho que dizemos que atuamos na área forense.

2. Introdução
Neste item, teremos a definição de alguns termos muito usados pelos médicos-legistas,
sem os quais haveria prejuízo na compreensão do conteúdo que virá adiante.

Processo é o conjunto de providências que devem ser tomadas para se verificar e sanar
uma lesão de direito. Quando os fatos não deixam vestígios (injúria, desacato), a comprovação
depende da prova testemunhal. Se resultarem vestígios, o exame pericial e seu registro devem
ser feitos.

Perícia é o exame desses elementos materiais feito por técnico qualificado (perito) para
atender a autoridade. É direta, quando se examina a pessoa e indireta, quando se baseia em
registros. Ela prevalece, mesmo que se oponha a depoimentos testemunhais. O juiz não ficará
adstrito ao laudo; porém, se o rejeitar, deve justificar suas razões. Ocorrendo discrepância de
opiniões entre dois laudos, o juiz poderá designar um terceiro. Caso haja uma terceira posição,
a autoridade determinará que seja realizado novo exame. O julgador poderá pedir
esclarecimentos por escrito, ou convocar o perito para audiência. O compromisso deste com a
verdade constitui dever ético e obrigação legal.
Corpo de delito é um conjunto de elementos materiais perceptíveis aos nossos sentidos,
resultantes da infração penal. Quando a infração deixar vestígios, será indispensável o exame
de corpo de delito (pode ser procedido em pessoas, coisas ou animais). A dor por si só não é
lesão corporal.

Perito oficial é um funcionário público, concursado, pago pelo governo, requisito este
para a imparcialidade. Quando não houver perito oficial, o exame poderá ser feito por pessoas
devidamente habilitadas (de preferência com curso superior), cujo reconhecimento tem
amparo na própria lei que cuida das profissões e atividades fiscalizadas por órgãos regionais e
nacionais. Para emitir sua opinião acerca de um fato, o perito pode proceder a todas as
indagações que julgar necessárias, colher material para exames complementares e deve expor
sua opinião científica livre de interferências. Embora não trabalhe em segredo, não deve
divulgar a quem não é de direito. A Lei nº 11.690/2008, do Código de Processo Penal, revogou a
exigência de dois peritos, inclusive em perícias criminais, sendo necessário apenas um. O
compromisso do perito oficial está implícito na função que exerce para o Estado. Os peritos não
oficiais deverão prestar compromisso (por escrito) à autoridade que os nomeou. Embora nosso
trabalho seja de busca, e recorramos à indagação minuciosa, cabe ao delegado e à sua equipe
de investigação descobrir a autoria do crime.

Psiquiatra forense é o médico que exerce a psiquiatria forense, que é um ramo tanto da
psiquiatria como da medicina legal e que trata da aplicação dos conhecimentos médicos
psiquiátricos a serviço da Justiça. Como nos referimos anterior-mente, a necessidade desse
especialista surgiu no início do século XIX, quando se passou a avaliar a culpabilidade (dolo e
culpa), considerando os fatores subjetivos da liberdade de ação do autor. Ele atua nos casos em
que houver dúvida sobre a integridade ou a saúde mental do indivíduo em qualquer área do
Direito (penal, cível, trabalhista, administrativo...), buscando esclarecer à Justiça se o acusado é
ou não portador de um transtorno mental, e se existe nexo entre a enfermidade e o fato em
questão. Uma das adversidades que se observa no exercício da psiquiatria forense é que nós,
médicos, pouco entendemos de leis, e os juristas experimentam a mesma dificuldade com
relação à psiquiatria.

Relação perito-periciando: essa relação é bem diferente da relação médico-paciente.


Não somos responsáveis pelo tratamento do periciando e, em nenhuma hipótese, devemos
intervir na terapêutica instituída. Por outro lado, não há por parte do perito a obrigatoriedade
do sigilo; ao contrário, deve ser fiel a todos os dados obtidos, declarando-os em seu laudo. O
que existe é o segredo de justiça, que impede a divulgação dos fatos, fora do âmbito jurídico.
Ao contrário do médico assistente, o perito deve ter em mente que sempre haverá interesses a
serem defendidos por parte do periciando, seja ele vítima ou acusado, que interferirão na
veracidade de suas declarações. Por mais absurda que possa ser a versão oferecida, não cabe
ao perito confrontar o examinado e, sim, assentar suas observações no corpo do laudo.

Laudo psiquiátrico é o documento médico-legal resultante da perícia. Nele, o perito


oficial, ou nomeado pelo juiz, consigna detalhadamente o resultado de suas observações e
interpreta os achados do ponto de vista psiquiátrico-forense, de maneira a tornar
compreensível para a autoridade requisitante aquilo que ela supõe, mas de que necessita se
convencer.

3. Linguagem Jurídica
Para que a perícia seja esclarecedora para a Justiça, é necessário que o perito transforme a
linguagem médica na jurídica. Alguns termos têm significado diferente, e até aparentemente
contraditório, visto pela ótica de outros psiquiatras.

Doença mental, na linguagem forense, é a designação usada em substituição ao termo


alienação mental, e equivale às seguintes entidades nosográficas: todas as psicoses
(esquizofrênica, afetiva, puerperal, infecciosa, senil, tóxica, decorrente de traumatismo...),
demência em grau avançado e a dependência severa de álcool, ou de outras drogas. Quebrado
o vínculo com a realidade, a doença mental solapa do indivíduo o entendimento e o livre
arbítrio, bases da imputabilidade penal.

A perturbação da saúde mental compreende inúmeras entidades médicas que se


situam entre a doença e a normalidade. Nessa zona habitam os indivíduos fronteiriços que
apresentam um comprometimento maior ou menor (não total) da razão e do livre arbítrio. Essa
categoria abrange o transtorno de personalidade, transtorno depressivo não psicótico,
transtorno obsessivo-compulsivo, pânico, parafilias, dependência de álcool ou drogas em grau
moderado.

Desenvolvimento mental incompleto,para a Justiça, engloba: a) o menor de idade,


porque não tem o corpo nem a mente totalmente desenvolvidos; b) o surdo-mudo de
nascença, pois, sem as sensações auditivas (que permitem perceber as nuanças dos significados
das palavras), a aquisição de ideias e valores fica extremamente prejudicada, não permitindo
que tal indivíduo possua discernimento completo sobre os fatos, mesmo que tenha recebido
educação especializada; c) o silvícola não aculturado, até que se adapte à nova identidade
social. A cegueira não configura desenvolvimento mental incompleto, uma vez que, tendo
íntegros os outros sentidos, pode suprir aquele que lhe falta. Ao contrário da surdo-mudez,
quanto mais precoce a cegueira, mais apto estará o indivíduo para se tornar independente.

O Desenvolvimento mental retardado compreende os casos de distúrbios


quantitativos da inteligência, nos quais o desenvolvimento psíquico foi interrompido, em
alguma fase, antes de se completar, ou seja, antes dos dezoito anos (se surgir após os dezoito
será demência e não retardo). No entanto, este termo não pode ser aplicado aos menores de
dezoito anos (incluídos no desenvolvimento mental incompleto), mesmo que apresentem
desempenho cognitivo atrasado.

O Intervalo lúcido pressupõe, na linguagem jurídica, não apenas uma tranquilidade


superficial, ou uma remissão passageira dos sintomas, na qual a enfermidade se atenua sem
desaparecer; tampouco é necessário que ocorra a remissão definitiva da doença, pois, dessa
forma, caracterizaria a cura. Significa o desaparecimento total dos sinais da doença, durante um
intervalo nunca inferior a dois meses, separando duas crises da mesma síndrome, no qual o
indivíduo retoma sua capacidade de entender e se determinar.

Exame toxicológico é o exame realizado pelo legista de plantão, no momento em que o


indivíduo é preso, portando droga, ou pelo legista responsável pela necropsia, quando a causa
da morte não está evidente, para saber se houve uso de substância tóxica. Consta de um exame
clínico sumário no qual se anotam os sinais percebidos e os sintomas referidos pelo periciando
e colhe-se urina (no caso do vivo) ou sangue (no caso do morto) para pesquisa em laboratório,
não importando se o examinando é ou não dependente.

Exame de dependência toxicológica é o exame realizado pelo psiquiatra, com a


finalidade de esclarecer à autoridade se o indivíduo possui um comprometimento
biopsicossocial decorrente do seu envolvimento com substâncias licitas ou ilícitas, de maneira
que o impeça de agir livremente, não importando se ele fez ou não uso da substância pouco
antes do exame.

Responsabilidade e imputabilidade são termos muitas vezes usados como sinônimos,


entretanto têm significados diferentes:

Responsabilidade é o ato de violar um preceito normativo que pode dar origem a sanções
de diversas naturezas. Dizer que um sujeito é responsável por deter-minado ilícito penal,
baseado em provas, é da competência do juiz.

Imputabilidade é a aptidão, avaliada pelo médico, que o indivíduo possui para realizar um
ato com pleno discernimento. É imputável todo homem mentalmente desenvolvido e são, cuja
consciência não se ache perturbada; aquele que detém as condições psíquicas necessárias para
que um crime lhe seja atribuído, pois é capaz de entender e de se determinar, de acordo com
esse entendimento. A imputabilidade é condição essencial à responsabilidade.

São semi-imputáveis os retardados leves e os que sofrem de algumas formas de


perturbação da saúde mental. Os silvícolas e surdos-mudos são avaliados caso a caso.

São inimputáveis os menores de 18 anos, os doentes mentais, os retardados mentais


moderados, graves e profundos, e os que cometerem crime sob efeito de substância utilizada
por caso fortuito (o agente não conhece o teor do que está usando), ou por força maior
(quando o agente é coagido a usar substância tóxica). O uso voluntário de qualquer substância
tóxica não exclui a imputabilidade do criminoso, tal qual a emoção ou a paixão. Importa ao
perito a condição mental anterior ao consumo voluntário de qualquer substância.

Capacidade de entendimento é a possibilidade que o indivíduo tem de conhecer a


natureza, as condições e consequências do seu ato e supõe certo grau de experiência,
maturidade, educação, e equilíbrio das funções mentais.

Capacidade de autodeterminação é a capacidade de escolher entre praticar ou não o


ato, o que requer serenidade, reflexão e distância de qualquer condição patológica que possa
escravizar o indivíduo, impulsionando-o para o delito.
Periculosidade é o conjunto de circunstâncias que indicam a possibilidade de alguém
praticar ou tornar a praticar um crime. É determinada pela observação da curva vital; da idade
que iniciou a prática delituosa; da morfologia do crime; do ajuste à vida frenocomial; das
possíveis intercorrências psiquiátricas na fase da execução da medida de segurança; do estado
psíquico no momento do exame (crítica que faz do ato que praticou, planos para o futuro,
sentimentos superiores que cultiva); e do meio que irá recebê-lo (considerar a situação
socioeconômica, ligação afetiva com a família e o interesse em acolhê-lo). Qualquer indivíduo,
dependendo das circunstâncias, pode cometer um ilícito penal; cabe ao perito definir se a
periculosidade está ou não vinculada a transtorno mental.

Medida de segurança é aplicada ao indivíduo cujo ato delituoso não lhe pode ser
imputado, por ser portador de transtorno mental, com a finalidade de tratar o infrator e
proteger a sociedade dos seus atos insanos. Não consiste em pena privativa de liberdade e, sim,
em internação em hospital de custódia e tratamento, ou equivalente (medida de segurança
detentiva), ou em tratamento ambulatorial (medida de segurança restritiva). No Distrito
Federal, quando internados, permanecem na Ala de Tratamento Psiquiátrico/ATP, situada nas
dependências do Presídio Feminino; não existe manicômio/hospital-prisão em nossa cidade. A
medida de segurança não deve ultrapassar o limite de tempo da pena cominada para aquele
tipo de crime. Na prática, nem sempre isso é observado.

Medida socioeducativa é aplicada aos maiores de doze e menores de dezoito anos que
cometem ato infracional. Tem como objetivo “reeducá-los” e também proteger a sociedade.
Varia, desde uma advertência do juiz ao menor e a seu responsável, até uma internação em
local fechado. No Distrito Federal, quando inter-nados, permanecem no CAJE (Centro de
Atendimento Juvenil Especializado). Algumas vezes o perito atua avaliando a sanidade mental
do adolescente. Os menores de doze anos estão sujeitos a medidas protetivas.

Código Penal Brasileiro


Art. 26 – É isento de pena o agente que, por doença mental ou desenvolvimento mental
incompleto ou retardado, era, ao tempo da ação ou da omissão, inteiramente incapaz de
entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento.
(Redação dada pela Lei nº 7.209,de 11.7.1984)

Parágrafo único - A pena pode ser reduzida de um a dois terços, se o agente, em virtude de
perturbação de saúde mental ou por desenvolvimento mental incompleto ou retardado, não era
inteiramente capaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse
entendimento. (Redação dada pela Lei nº 7.209,de 11.7.1984).

4. Perícia Psiquiátrica
Perícia psiquiátrica é a avaliação médica focada nos aspectos que abrangem a integridade
mental da pessoa envolvida em um determinado fato. O perito terá acesso aos autos e
entregará o laudo até quarenta e cinco dias, se a perícia for criminal e até trinta dias, se não for
criminal, período que pode ser prorrogado, se necessário. Poderá valer-se de testemunhas e
enriquecer o laudo com as mais diversas provas que venham a contribuir com o esclarecimento
da verdade. A maior parte das perícias psiquiátricas é retrospectiva, baseia-se na análise de
fatos e conjunturas passados. É denominada indireta, quando relacionada a alguém que não
possa se submeter ao exame direto, por falecimento, ou por razões outras que o impeçam,
valendo-se o perito de pesquisas em prontuários, relatórios médicos, entrevistas, exame
grafotécnico, etc.

Quem solicita a perícia


Só o juiz tem competência para determinar a realização de uma perícia psiquiátrica em
alguém, baseado na suposição de que determinado indivíduo é portador de transtorno mental.
Essa tese pode ser levantada: a) pelo próprio acusado, pela família, ou pela Defesa; b) pelo
Ministério Público, considerando as características do crime e comportamento do criminoso,
logo após praticá-lo; c) pelo próprio juiz que, no momento da audiência, percebe alteração de
comportamento no depoente.

A autoridade policial – delegado – apenas poderá solicitar perícia psiquiátrica da vítima.


Exemplos:

a) mulher maior de catorze anos induzida a praticar ato sexual, cuja mãe afirma ser
portadora de desenvolvimento mental incompleto e atrasado (menor de dezoito), ou retardado
(maior de dezoito);

b) indivíduo querelante que assiduamente frequenta a delegacia noticiando delitos


cometidos por vizinhos, com indício de ser doente mental;

c) pessoa falecida, cuja causa jurídica da morte violenta (acidente, suicídio ou homicídio)
ainda não foi determinada por meio de outras provas – o levantamento do perfil mental da
vítima pode ajudar no direcionamento da investigação.

Outro médico legista (não psiquiatra) poderá solicitar uma avaliação psiquiátrica da vítima
para fundamentar laudo de lesão corporal ou de conjunção carnal.

Exemplos:

a) indivíduo que após trauma craniano decorrente de agressão ou acidente de trabalho


alega sintomas psíquicos, independentemente do tempo transcorrido do evento – compete ao
psiquiatra forense esclarecer se existe transtorno mental e estabelecer nexo causal com o
trauma;

b) mulher vítima de crime sexual, quando há dúvida sobre sua sanidade mental – cabe ao
psiquiatra forense definir se a vítima é portadora de transtorno mental e se possui capa-cidade
de consentir que com ela se pratique ato sexual.

Quando se solicita a perícia


As perícias médicas podem ser solicitadas em qualquer fase do processo.

Ainda na fase de inquérito, quando o delegado que procede ao interrogatório percebe que
o suspeito não goza de saúde mental. É indispensável que tenha a autorização do juiz.
Exemplos:
a) psicótico que após matar de forma violenta, sem motivo aparente, permanece no local do
crime certo de que agiu corretamente em cumprimento à ordem alucinatória;

b) suspeito que aparentemente apresenta déficit cognitivo e não consegue prestar as


informações necessárias. Obviamente há casos de simulação sobre os quais trataremos mais
adiante.

Lembramos que, se não houver a autorização do juiz, o perito não realizará a perícia,
devolverá os autos para que se cumpra a exigência da Lei.

Na fase processual, quando for levantada por qualquer das partes a ocorrência de
transtorno mental, caso o pedido seja julgado procedente pelo juiz daquela Vara Criminal.
Observamos que a maioria dos que declaram sofrer de distúrbio psiquiátrico o fazem,
acreditando que conseguirão benefícios, tais como, cumprir medida de segurança internados
em uma clínica, ou em regime ambulatorial.

Ou mesmo após o julgamento, quando, no decorrer do cumprimento da pena, o detento


começa a apresentar sinais de transtorno mental, observados, a princípio, por outros internos,
que relatam aos técnicos penitenciários que, por sua vez, comunicam ao diretor do presídio,
que noticia ao juiz da Vara das Execuções Penais/VEP. O perito deve esclarecer se existe
transtorno mental, se este sobreveio à execução da pena e a que espécie de tratamento
necessita ser submetido o detento.

Devemos ter em mente que padecer de transtorno mental é exceção. Estimamos que 90%
dos indivíduos que são examinados no setor de psicopatologia do IMLLR gozam de saúde
mental ou, se padecem de algum distúrbio, ele não guarda nexo com o crime.

Características do laudo psiquiátrico


O laudo psiquiátrico é a concretização (escrita) da perícia que, por sua vez, consiste no ato
de avaliar as funções psíquicas de um indivíduo. Ao contrário dos demais exames de corpo de
delito no vivo, ou no morto, o laudo psiquiátrico não segue um protocolo, não tem um modelo
predeterminado a ser seguido. Cada laudo tem seu desenho, dependendo do motivo que o
gerou, dos elementos que serviram de subsídio para a conclusão e do modo de escrever do
perito.

O primeiro passo dado por nós é a leitura dos autos, para nos inteirarmos da matéria sobre
a qual iremos opinar. Em seguida, após nos apresentarmos ao examinando, informamos a ele
da desobrigação do sigilo médico no ato pericial e que todas as suas declarações poderão ser
utilizadas, não havendo espaço para segredos revelados. Esclarecemos, ainda, acerca do direito
de não se submeter à perícia. No caso de recusa, comunicamos por escrito à Vara a razão pela
qual a perícia não foi realizada.

Nas perícias criminais, seguimos o roteiro abaixo, sem que necessariamente todos os itens
constem em todos os laudos.
1. Cabeçalho

2. Identificação

3. História criminal

a) Denúncia

b) Versão do examinando ao perito

4. Anamnese

a) Antecedentes familiares

b) Curva de vida

c) História da doença

5. Exame mental

6. Inspeção física

7. Entrevistas complementares

8. Exames complementares

9. Outros documentos médicos

10. Discussão

11. Conclusão

12. Respostas aos quesitos

Todo laudo deve conter o cabeçalho no qual consta: a autoridade que solicitou, o número
do documento que o gerou, o nome do perito que o realizará por designação do diretor do
Instituto e seu compromisso de descrever fielmente o que foi observado.

“Aos ... dias do mês de ... do ano de ..., na cidade de Brasília, a fim de atender à requisição do
PROCESSO nº ... da ... VARA CRIMINAL ESPECIAL DE BRASÍLIA, datado de ..., protocolo nº ..., o(a)
infra-assinado(a) médico-legista Dr.... foi designado(a) pelo (a) Dr...., diretor(a) do INSTITUTO
DE MEDICINA LEGAL LEONÍDIO RIBEIRO, para proceder a exame na pessoa abaixo identificada e
responder aos quesitos formulados a seguir, descrevendo com verdade e com todas as
circunstâncias o que encontrou, descobriu ou observou.”

É também obrigatória a inclusão da Identificação que deverá ser a mais completa possível.

É raro, mas ocorre de um indivíduo apresentar, no momento da prisão, nomes falsos e


dados pessoais intencionalmente incorretos. Nesses casos, podemos contar com o apoio do
Instituto de Identificação e do departamento de fotografia do IML.
A partir daí, o perito tem plena liberdade de escolher como irá descrever suas observações.

A História Criminal vem logo no início do laudo, para facilitar a compreensão de quem o
leia, fora do contexto do processo.

Na Denúncia, limitamo-nos a resumir a versão do crime oferecida pelo Ministério Público,


uma das primeiras peças dos autos. Caso não seja enviada, cabe ao perito solicitá-la à Vara.
Transcrevemos apenas o tipo de crime, a data, o horário, o local em que ocorreu e o artigo da
Lei infringido. Alguns peritos transcrevem-na literalmente.

“Lê-se às folhas... dos autos que no dia ..., por volta de ... horas, nas imediações da quadra...,
em frente ao bar..., o denunciado tentou matar a vítima... não logrando êxito por circunstâncias
alheias à sua vontade. Estando incurso nas penas do artigo 121 do Código Penal Brasileiro”.

A Versão do examinando ao perito difere da que ele forneceu à delegacia, mais


próxima da realidade e de seu relato no Tribunal. No momento da prisão em flagrante, não
houve tempo de elaborar uma história diferente que o favoreça. Quando depõe em juízo, sua
versão tem outra forma, em virtude da utilização de mecanismos psíquicos de defesa e das
orientações dos advogados. É importante para o perito a observação de que, no interrogatório
inicial, o suspeito se valeu do direito constitucional de permanecer calado.

A mais distante da verdade é a história contada ao perito. Até que a determinação do juiz
seja encaminhada ao Departamento de Polícia Técnica e agendada no IML, já se passaram
alguns meses, e o indivíduo teve tempo suficiente para elaborar uma versão bem distante da
real. Porém, isso não deve assustar o perito. Afinal, não somos nós que vamos deslindar o
crime, muito menos julgá-lo. A importância de nos inteirarmos de todas as versões consiste em
compreender a capacidade que o indivíduo possui de criar alternativas para se defender, que
podem ser indicativos de doença ou de saúde mental. Esse item transcrevemos entre aspas,
copiamos o discurso do examinando tal qual foi proferido. Tal opção possibilita captar com mais
fidelidade a linguagem, o curso do pensamento, a forma que o examinando usa para se
expressar. Embora seja descrita no início do Laudo, costumamos colher sua versão do crime no
meio do exame, quando o arguimos sobre os antecedentes criminais; o objetivo é encontrá-lo
menos defensivo.

Nos Antecedentes Familiares, pesquisamos especialmente os fatores que se


assemelhem ao comportamento do periciando. Casos de uso de drogas, doença mental na
família, tentativas de suicídio, homicídios, etc.

Na Curva de Vida, perguntamos a respeito das condições de gestação, nascimento,


desenvolvimento psicomotor, trajetória acadêmica e laboral, relacionamentos sexuais e
vínculos afetivos, envolvimentos anteriores com a Justiça e histórico patológico, ao longo da
vida, que finda com o possível tratamento psiquiátrico, explorado a seguir.
História da doença
Procuramos colher, da maneira mais completa possível, tal como na prática clínica, a
história da doença. Nem todos terão uma história da doença. O periciando, na ânsia de
mostrar-se doente, acreditando que se livrará da pena, ou que cumprirá medida de segurança
em local diverso do presídio, pode mencionar, de maneira inconsistente, internações e
atendimentos emergenciais e ambulatoriais que nunca ocorreram, sem fornecer o período,
nome da instituição, médico que o assistiu, medicação que usou, para que possamos conferir.
Cabe ao perito checar a realidade das informações. Não precisamos sair aleatoriamente
pesquisando nas instituições de saúde se constam atendimentos a determinada pessoa. Nos
casos de insanidade mental, as evidências são abundantes.

Exame Mental é o registro do estado psíquico do indivíduo no momento da perícia, o


relato do que foi observado pelo examinador no instante da avaliação. Aqui não cabem queixas
nem alusão a situações passadas. Torna-se mais interessante e objetivo, quando descrito de
maneira fenomenológica, exemplificando cada alteração constatada, de forma que permita ao
leitor construir uma imagem mental aproximada do que se passou naquele intervalo de tempo.

Não existe um modelo único nem uma sequência obrigatória, contudo, fica mais bem
compreendido quando iniciamos pelas funções psíquicas mais elementares e finalizamos com
as mais complexas. Não há necessidade de nos reportarmos a todos os itens, preferimos
consignar só os dados positivos pelo risco de a narrativa tornar-se enfadonha. Nosso relato é
tanto mais rico quanto for nossa capacidade de encontrar adjetivos adequados para exprimir
nossas impressões; não precisamos nos limitar a termos científicos.

Os exemplos abaixo são apenas sugestões. A divisão que se segue é apenas didática. É
fundamental ter em mente que o psiquismo é único, que todas as funções estão interligadas.
Exemplo: um distúrbio da representação é expresso pela mímica, pelo pensamento, que se
exterioriza, pela postura e pelo discurso, que depende da motricidade e da fala, que está
associada à linguagem...

1. Como chegou para a entrevista: desacompanhado, acompanhado por um vizinho,


conduzido pela esposa, trazido em cadeira de rodas pelo filho, escoltado por policiais...

2. Como aguardou a chamada na sala de espera: em silêncio, falando alto, andando de um


lado para outro, fumando ininterruptamente, discutindo com a mãe...

3. Como entrou no consultório: caminhando em direção à cadeira indicada, cambaleando


sem noção de espaço, com dificuldade pelo uso de muletas, apoiando-se nas paredes,
refletindo falta de equilíbrio ou atitude histeriforme...

4. Apresentação: cabelos, unhas, estado de conservação e limpeza das vestes, adequação do


vestuário à situação, ao clima, à condição socioeconômica, se a aparência é esmerada,
infantilizada, desleixada, bizarra, efeminada, masculinizada, sedutora, se exala mau cheiro...

5. Postura que adotou diante da entrevista: cooperativo, descompromissado, contido,


indiferente, desconfiado, hostil, desafiador, agressivo, negativista, manipulador...
6. Nível de consciência: hipervigil, vigil (lúcido), sonolento, obnubilado, torporoso,
comatoso...

7. Orientação: com relação a si (onde e quando nasceu), ao tempo, ao espaço, às pessoas que
o cercam (quem é essa senhora que o trouxe?), à situação político-econômica do local onde
vive (qual o nome do presidente do Brasil?)...

8. Atenção e concentração: atento, desatento, concentrado, distraído...

9. Humor: estável/eutímico, rebaixado/hipotímico/triste, exaltado/hipertímico/eufórico,


disfórico/ irritado, lábil, ansioso, apático, pueril...

10. Afeto: modulado, constrito, embotado, incongruente, incontinente, ambivalente...

11. Motricidade: imóvel, inquieto por efeito de medicação, agitado, com flexibilidade cérea,
realizando movimentos estereotipados (repetitivos)...

12. Memória de fixação e de evocação: preservada, comprometida, seletiva...

A falta de memória genuína provoca uma angústia no indivíduo que inutilmente se esforça para
se recordar dos fatos inquiridos. Registramos se a hipomnésia nos parecer intencional.

Volição: hiperbúlico, impulsivo, hiperativo...

13. Pensamento
Quanto à forma - como o paciente associa suas ideias: organizado, coerente, incoerente,
desagregado, empobrecido, concreto/sem abstração, frouxo, in-consistente, esvaziado, prolixo,
digressivo, tangencial, verborreico, com fuga de ideias,...

Quanto ao curso - velocidade com que expressa suas ideias: lentificado, adequado, acelerado...

Quanto ao conteúdo – sobre o que pensa: querelante, obsessivo, delirante (citar frases
ilustrativas), ideias de autorreferência, roubo do pensamento...

14. Discurso (reflete o pensamento): espontâneo, pontual, hesitante, impostado,


perseverante, efusivo, rico em contradições, responde com pararrespostas...

15. Fala (como articula as palavras): afásico, disfásico, disártrico, mussitação, fala pastosa...

16. Voz (som das palavras): tom de voz alto, baixo, disfônico, voz nasalada, embargada...

17. Linguagem: rebuscada, vulgar, permeada de gírias, com ecolalia...

18. Sensopercepção: presença de ilusões e alucinações (visuais, auditivas, táteis, olfativas)

19. Inteligência: abaixo da média, mediana, privilegiada...

20. Raciocínio: lógico, claro, árido...


21. Juízo crítico de realidade: abolido (percepção inteiramente distorcida), comprometido,
preservado.

22. Juízo ético – verificar se a articulação dos conceitos enquadra-se no padrão social vigente,
se apresenta ideias edificantes, que análise faz dos seus atos...

23. Pragmatismo – relacionado com a volição - planos imediatos e futuros: mantido, ausente,
congruente com suas limitações, ou com suas capacidades...

E outros achados psicopatológicos que houver.

Fica a critério do perito decidir quem vai convocar para as Entrevistas Complementares
(por telefone, ou por meio de intimação). Iniciamos pelas pessoas mais próximas do
examinando. Dependendo do caso, poderemos intimar pais, irmãos, companheiras, filhos,
amigos, vizinhos, chefes, colegas... São feitas as mesmas considerações sobre a desobrigação
do sigilo médico. Esse fato não nos impede de utilizar estratégias para saber indiretamente o
que desejamos, confrontando contradições nos relatos.

“Meu marido só se preocupa em usar drogas, ele é muito viciado, precisa mesmo é de um
tratamento numa clínica”. “Ele é muito carinhoso comigo, cuidadoso com os filhos, não deixa
faltar nada dentro de casa”. “É responsável no trabalho, o chefe dele adora ele, tudo que ele faz
é bem feito”.

Caso a pessoa intimada não possa, ou não queira comparecer ao IML, e nós acharmos o
seu comparecimento relevante, vamos até sua residência (costumamos ser bem recebidos).
Quando necessário, recorremos a outros setores da Polícia e à Vara solicitante que nos auxiliam
a localizar as pessoas.

Os Exames Complementares que mais contribuem com a perícia são os realizados mais
próximos à data do delito. Cada tipo de perícia exige exames diversos: a) psicometria (realizada
pela psicologia forense) para comprovar e graduar retardo mental; b) exame de imagem
cerebral na suspeita de quadro orgânico (fazemos constar no Laudo a data em que foi feito, o
nome da instituição que emitiu o resultado e o nome e CRM do médico responsável); c) exame
toxicológico de urina (citamos o resultado do exame que foi realizado por ocasião da prisão, ou
o solicitamos, no momento da nossa avaliação, apenas para comprovar o uso de droga na
prisão); a detecção de metabólitos de substâncias tóxicas não significa que o indivíduo é
dependente, apenas comprova o uso.

“O Parecer Psicológico nº... realizado neste IML em .... revelou um potencial cognitivo de...”

“A ressonância magnética de crânio realizada no dia... na Clínica... pelo dr... evidenciou sinais
de...”

“O Exame Toxicológico nº .... realizado neste IML em amostra de urina colhida do periciando no
dia... detectou a presença de metabólitos de...”
Os Relatórios dos Médicos que assistem, ou já assistiram o periciando nos instruem
quanto à origem e evolução do quadro clínico. Muitas vezes, quando é do interesse do
periciando, já foram apresentados em juízo e já constam nos autos do processo. Quando isso
não ocorre, cabe ao perito solicitar, por escrito, ao colega. No pedido deverão constar os
pontos a serem esclarecidos (início do tratamento, diagnóstico, medicamentos prescritos,
evolução, estado psíquico do paciente à época do delito...).

“Conforme relatório fornecido no dia..., pelo doutor ..., CRM ..., o paciente fez tratamento
ambulatorial no período de... com prescrição de... evoluiu... a hipótese diagnóstica foi....”.

Nem sempre a opinião do médico assistente coincide com a do perito. Quando isso ocorre,
cabe no laudo uma discussão sobre essa divergência. Esse cuidado pode evitar que, no futuro,
ambos sejam convocados para esclarecimentos.

Especialmente nos hospitais da rede pública, enfrentamos dificuldade de obter o relatório


solicitado por meio de ofício. Diante dessa situação, compete ao perito ir até a instituição,
munido da cópia do ofício, e proceder à pesquisa direta no prontuário, tarefa nem sempre fácil,
pela necessidade de ordenar temporalmente as anotações e decifrar as letras dos colegas.
Quando o médico assistente escreve de forma legível, também está contribuindo com a
promoção da Justiça.

Uma Discussão é pertinente sempre que houver dissonância entre os vários elementos
do laudo descritos acima. Nesse espaço, baseados na literatura, nos empenhamos em dirimir as
dúvidas surgidas pelas divergências. A citação da literatura robustece nossa convicção.
Evitamos a linguagem rebuscada. O papel do médico é esclarecer, não escrever difícil. Caso o
juiz entenda que o laudo não foi esclarecedor, solicita complementação por meio de
aditamento, ou de nova quesitação. Se ainda assim persistirem dúvidas, determina que seja
realizada nova perícia por outro psiquiatra.

Escrevemos o Diagnóstico por extenso e citamos o código da Classificação Internacional


de Doenças/CID. Não esmiuçamos o diagnóstico; o que interessa para a Justiça é a
denominação jurídica contida na conclusão.

“Esquizofrenia. F 20 – CID 10.”

“Retardo mental moderado. F 71 – CID 10”

A Conclusão, sem dúvida alguma, é o ápice da perícia. Deve estar consonante tudo o que
foi escrito no corpo do Laudo. Não é hora de romancear, nem de repetir o que já foi dito. De
forma extremamente objetiva, deve conter todas as respostas aos quesitos.

*Transformar o diagnóstico médico em linguagem jurídica – doença mental, perturbação da


saúde mental, desenvolvimento mental incompleto e desenvolvimento mental retardado.

*Dizer de que forma essa condição afetou suas capacidades de entendimento e


autodeterminação à época do delito em questão – se era imputável, semi-imputável ou
inimputável.
*Informar a quais medidas terapêuticas o periciado (não é mais periciando porque a perícia já
foi encerrada) necessita se submeter.

*Manifestar-se a respeito da periculosidade.

“Trata-se de periciado portador de doença mental, condição que, à época do delito,


comprometia inteiramente suas capacidades de entendimento e autodeterminação, tornando-o
inimputável. Necessita de tratamento médico, no momento em regime de internação. Sua
periculosidade está vinculada ao transtorno mental.”

“Trata-se de periciado portador de desenvolvimento mental retardado em grau leve, condição


que, à época do delito, comprometia parcialmente suas capacidades de entendimento e
autodeterminação, tornando-o semi-imputável. Necessita de acompanhamento
psicopedagógico por tempo indeterminado. Sua periculosidade está vinculada ao transtorno
mental.

“Trata-se de periciado portador de perturbação da saúde mental, condição que, à época do


delito, não alterava sua capacidade de entendimento; porém, comprometia parcialmente sua
capacidade de autodeterminação, tornando-o semi-imputável. Necessita de tratamento médico
e psicológico, no momento em regime ambulatorial. Sua periculosidade está vinculada ao
transtorno mental.

“Trata-se de periciado eupsíquico, que à época do delito era inteiramente capaz de entender o
caráter criminoso do fato e de determinar-se de acordo com esse entendimento. Era, portanto,
imputável. Sua periculosidade não está vinculada a transtorno mental."

O perito não é obrigado a chegar a uma conclusão que atenda inteiramente à demanda da
Justiça. Há casos em que, por mais que nos empenhemos, não conseguimos determinar o
estado psíquico do periciando à época do delito. Formulamos uma discussão informando que
os dados analisados não foram suficientes para concluirmos a respeito da imputabilidade, no
momento do crime. As inferências estão completamente descartadas.

Respostas aos quesitos


Todos os quesitos formulados pelo Juízo, pelo Ministério Público e pela Defesa devem ser
respondidos. Quando transcrevemos os quesitos para nosso laudo, respondemos sucintamente
(sim, não, sem elementos ou prejudicado). Sim, quando for afirmativa; Não, quando for
negativa; Sem elementos, quando não alcançamos um convencimento sobre determinada
questão; Prejudicado, quando a pergunta não procede. Quando escrevemos apenas as
respostas, citamos as folhas do Processo em que se encontram e respondemos de forma mais
completa.

1º) Era o periciando, à data do delito, portador de doença mental?

Resposta 1: Sim. Resposta 2: Era portador de doença mental.

2º) Era o periciando, na data do fato descrito na denúncia, portador de desenvolvimento


mental retardado?
Resposta 1: Não. Resposta 2: Não era portador de desenvolvimento mental retardado.

3º) Pode o perito afirmar que, em liberdade, o acusado voltará a delinquir?

Resposta 1: Sem elementos. Resposta 2: Não é possível afirmar que em liberdade o periciado
volte a delinquir.

4º) Em função da dependência de drogas, era o periciando inteiramente incapaz de entender o


caráter criminoso do fato?

Resposta 1: Prejudicado. Resposta 2: O periciado não é dependente de drogas.

Neste ponto cabe uma observação acerca do grande número e da falta de objetividade dos
quesitos formulados pelos juristas.

Primeiro exemplo:
1º) Relatem os senhores peritos a quais exames (clínicos, laboratoriais, psicológicos e
complementares) se submeteu o periciando.

2º) Dos exames, o que foi observado?

3º) O paciente, para a realização da perícia, foi internado? Justifique, se negativa a resposta, o
porquê da não internação.

4º) O paciente é dependente de drogas? Se afirmativo, quais?

5º) O paciente padece de alcoolismo? Se afirmativo, qual espécie, e qual o nível ou estágio?

6º) O paciente padece de alguma doença mental, de desenvolvimento mental incompleto, de


neurose reativa ou endógena (psiconeurose ou bioneurose), ou de alguma espécie de psicose?
Em caso afirmativo, esclarecer o tipo e a sintomatologia, justificando.

7º) Se afirmativa a resposta aos quesitos nº 4, 5 ou 6, de que maneira e até que ponto esta
causa de alteração da imputabilidade tem influência em sua: a)consciência,? b)vontade?
c)personalidade? d)conduta social? e)autocrítica? f)senso ético?

8º) O paciente era, à data de 2 de maio de 2009, inteiramente incapaz de entender o caráter
criminoso do fato: a)por vício decorrente de uso de substância capaz de determinar
dependência física e/ou psíquica? b)por doença mental? c)por desenvolvimento mental
incompleto? d)por desenvolvimento mental retardado?

9º) O paciente era, à data de 2 de maio de 2009, inteiramente incapaz de determinar-se de


acordo com este entendimento: a)por vício decorrente de uso de substância capaz de
determinar dependência física e/ou psíquica? b)por doença mental? c)por desenvolvimento
mental incompleto? d)por desenvolvimento mental retardado?

10º) O paciente, na data de 2 de maio de 2009, não possuía a plena capacidade de entender o
caráter criminoso do fato: a)por vício decorrente de uso de substância capaz de determinar
dependência física e/ou psíquica? b)por perturbação da saúde mental? c)por desenvolvimento
mental incompleto? d)por desenvolvimento mental retardado?

11º) O paciente, na data de 2 de maio de 2009, não possuía a plena capacidade de determinar-
se de acordo com o entendimento do caráter criminoso do fato: a)por vício decorrente de uso de
substância capaz de determinar dependência física e/ou psíquica? b)por perturbação da saúde
mental? c)por desenvolvimento mental incompleto? d)por desenvolvimento mental retardado?

12º) O paciente apresenta alteração de natureza psicopatológica?

13º) Em caso positivo, qual a natureza dessas manifestações?

14º) No caso de ser viciado, está curado?

15º) O paciente apresenta periculosidade?

16º) O paciente necessita de tratamento médico especializado destinado à sua recuperação em


face do quadro clínico que apresenta?

17º) O quadro clínico do paciente recomenda tratamento sob regime de internação hospitalar,
ou extra-hospitalar, com assistência de serviço social competente?

18º) Esclareça o senhor perito tudo mais que, a seu juízo, possa ser útil à elucidação dos fatos
ou possa influir no julgamento da causa, ou ainda que lhe afigure importante, devendo todos as
respostas acima serem justificadas.

Segundo exemplo:
1) O acusado apresenta sinais de quem usa substâncias entorpecentes?

2) Pode mencionar qual o tipo de substância entorpecente usado pelo paciente?

3) O paciente é viciado?

4) O paciente apresenta transtorno revelado de outra dependência psíquica?

5) Relatem os senhores Peritos a quais exames foi submetido o paciente?

6) Foram realizados exames de sangue, neurológicos e outros (Por quê)?

7) É possível afirmar com segurança a dependência toxicológica apenas com entrevistas?

8) O que foi observado nos exames?

9) Foi necessária a internação do paciente para realizar a perícia?

10) O paciente é dependente de drogas? Se afirmativo qual(ais)??

11) Se afirmativo o quesito anterior, avaliar fundamentadamente de qual maneira e até que
ponto esta dependência tem influência do periciando?
12) O paciente era, ao tempo do fato descrito na denúncia, inteiramente incapaz de entender o
caráter do fato em razão de sua dependência?

13) O paciente era, ao tempo do fato descrito na denúncia, embora capaz de entender o caráter
criminoso do fato, inteiramente incapaz de determinar-se de acordo com esse entendimento?

14) O paciente possuía, ao tempo do fato descrito na denúncia, capacidade plena de entender o
caráter criminoso?

15) Caso negativo o quesito anterior, avaliar fundamentadamente qual o grau de


comprometimento da plenitude da capacidade de entendimento?

16) O comprometimento da plena capacidade de entendimento do caráter criminoso do fato


decorreu de? a) estar sob o efeito de substância entorpecente ou que cause dependência física
ou psíquica? b) dependência?

17) O periciando tinha diminuída sua capacidade de autodeterminação, mas apenas no que se
refere ao uso pessoal que faz da droga. Quanto aos demais aspectos de sua vida, o periciando
tinha capacidade de autodeterminação preservada?

18) O periciando apresenta grau moderado a grave de comprometimento da plenitude de


capacidade de determinação, mas apenas em relação ao uso pessoal que faz da droga?

19) Sendo o paciente dependente, o seu quadro clínico ou a natureza de suas manifestações
psicopatológicas exigem internação hospitalar?

20) Caso exigível a internação, qual o regime recomendável e qual o prazo mínimo necessário
para tratamento?

21) Em caso de dependência, estaria a mesma impelindo o paciente a práticas criminosas para
poder sustentar o vício? De que forma? Até que ponto? Justificar cada resposta.

22) Além dos procedimentos adotados existem outros exames possíveis? Quais?

23) Esclareça o Senhor Perito tudo que se fizer necessário e útil à elucidação dos fatos ou que
possa influir no julgamento da causa, ou ainda que lhes afigure importante.

A nosso ver, esses quesitos poderiam resumir-se a quatro:

No caso de Incidente de Insanidade Mental

1º) O periciando é portador de doença mental, perturbação da saúde mental, desenvolvimento


mental incompleto ou retardado? Qual?

2º) Em virtude desse transtorno mental, tinha o periciando, à época do delito, comprometidas
parcial ou inteiramente suas capacidades de entendimento e autodeterminação?

3º) O periciando apresenta periculosidade vinculada a transtorno mental?


4º) Qual o tipo e regime de tratamento mais indicado e por quanto tempo?

No caso Incidente de Dependência Toxicológica

1º) O periciando é dependente de substância química? Qual?

2º) Em caso afirmativo, esta dependência comprometia, à época do delito, parcial ou


inteiramente, suas capacidades de entendimento e autodeterminação?

3º) O periciando apresenta periculosidade vinculada a dependência química?

4º) Qual o tipo e regime de tratamento mais indicado e por quanto tempo?

5. Doença Mental
Como dissemos anteriormente, para a Justiça, é considerado doente mental o psicótico, o
demente em grau avançado e o dependente químico grave.

O indivíduo psicótico chega para Exame de Insanidade Mental, após cometer, desde um
crime de ameaça até um homicídio praticado com muita violência. Rara-mente está relacionado
com crimes sexuais ou roubos (assaltos). Os delitos não são premeditados, ocorrem em
circunstâncias inesperadas, em decorrência de vivências delirante-alucinatórias. O doente não
foge do local porque entende que agiu corretamente. Volta-se contra desconhecidos com os
quais nunca teve desentendimento, ou, paradoxalmente, contra familiares próximos, como
mãe, esposa ou filho. Já no ato da prisão em flagrante, e, posteriormente, na delegacia, leigos
em medicina o percebem insano.

Na perícia chama-nos a atenção o barulho que faz no interior da viatura e na sala de


espera. Ao entrar no consultório, observamos as vestes em precário estado de higiene, ou em
desacordo com o clima. A postura é de revolta contra toda a situação e, o mais significativo,
não admite que esteja doente.

A entrevista é caótica, não conseguimos dar a ela um seguimento coerente, os fatos são
relatados de forma fragmentada, desagregada ou evasiva.

É possível que chegue para exame com remissão parcial dos sintomas, por já estar sendo
medicado na prisão.

Não devemos confrontar suas crenças, pelo risco de sermos agredidos; a presença da
escolta em nada o intimida. Caso a agitação seja incompatível com o exame, encaminhamos o
periciando para ser medicado em um serviço de emergência e marcamos o exame para outra
data.

Entrevistas com familiares podem nos ajudar a esclarecer o curso da doença, e a pesquisa
em prontuários pode nos revelar sua condição psíquica, em data mais próxima do evento.

É uma perícia fácil porque muitas evidências comprovam sua doença.


Interessa ao juiz saber como se encontrava, à época do delito, suas capacidades de
entendimento (cognição) e autodeterminação (volição). O entendimento estará inteiramente
comprometido, não por déficit intelectivo, mas pelo fato de o doente mental interpretar os
fatos de maneira deturpada. A capacidade de determinar-se adequadamente, de acordo com
esse entendimento, obviamente, também estará seriamente comprometida.

A Lei manda que esse doente seja sentenciado com uma medida de segurança e internado
em manicômio ou similar para se submeter compulsoriamente a tratamento. Posteriormente,
uma vez por ano (ou a critério do magistrado), será levado ao IML para Exame de Cessação de
Periculosidade, no qual analisaremos todos os pontos descritos no tópico periculosidade. Nessa
ocasião, retornará com o comportamento abrandado pela medicação e tentará dissimular os
sinais de sua enfermidade, pois acredita que só obterá a liberdade se “passar no exame do
IML”.

Caso de doença mental guardando nexo causal com o delito:


1 - IDENTIFICAÇÃO xxxx

2 - HISTÓRIA CRIMINAL

a) DENÚNCIA

Lê-se às folhas 02 a 04 dos autos que no dia xxxx, em torno de xxxx, na Quadra xxx, Avenida
xxxx, em frente ao supermercado xxxx, xxxx/DF, o denunciado efetuou golpes com canivete
contra dois policiais militares, chegando a atingir um deles na mão esquerda, após tentar
subtrair para si salgados e sucos na Lanchonete xxxx. Está incurso nas penas dos artigos 121 e
157 do CPB.

Os dados descritos a seguir foram colhidos do próprio periciando em entrevista realizada


neste IMLLR, no dia xxxx, depois de advertido de que suas declarações não estarão sujeitas a
sigilo médico e cientificado a respeito do direito de permanecer em silêncio diante de qualquer
pergunta.

b) VERSÃO DO EXAMINANDO

“Eu passei lá perto da lanchonete, pedi um suco, o cara não quis me dar. Eu simples-mente
fui embora. Não sei o que aconteceu lá, eles chamaram a Polícia. Chegou e prendeu eu. Eu não
queria vir preso não, mas não teve jeito não. Ele falou: ‘Encosta aí!’ e já foi me derrubando e me
pisando lá. Não vou mentir não, eles achou um canivete no meu bolso que era para eu picar
meu fumo de rolo.”

3 - ANAMNESE

a) ANTECEDENTES FAMILIARES

Não conheceu o pai. Não sabe a idade da mãe. “Ela tem um problema de deficiência, toma
remédio controlado, não consegue trabalhar. Ela arrumou um padrasto lá que não gostava de
mim. Eu saí de casa, fiquei andando de um lugar para outro. Tem mais ou menos um mês, ela
foi lá no CDP. Eu conversei com ela, mas ela estava chorando”. Possui dois meios-irmãos mais
jovens por parte de mãe. “Um trabalha na delegacia em xxxx, não sei o que é que ele faz não; o
outro mexe com obra”. Faz referência a um tio materno que abusa de álcool. Desconhece casos
de uso de drogas ilícitas entre os familiares.

b) CURVA DE VIDA

Ignora as condições de gestação, nascimento e desenvolvimento neuropsicomotor. Acredita


que iniciou a vida acadêmica aos sete anos de idade. “O professor ensinou a matemática tudo
errada. Não tinha amigo não, era meio isolado, os caras da minha idade não queriam conversa
comigo, eles me chamavam de bobo. Fiz até a sétima, mas não lembro mais de nada. Tomei
uma pancada na cabeça, depois desse dia, não consegui concentrar mais em nada. Os caras
jogou eu de uma serra e ainda chutaram minha cabeça. Não fiquei internado não (por conta do
traumatismo craniano), fui só tomar ponto no queixo. Tinha uns treze anos”. Não recorda se
sofreu punição por indisciplina na escola nem com que idade interrompeu os estudos.

Não prestou o serviço militar obrigatório. “Assinei só um papel lá, não sei como é que foi
não. Parece que eu fui liberado porque morava num distrito lá”.

Diz que começou a trabalhar com seis anos de idade ajudando o avô no garimpo. “Já
trabalhei demais na minha vida. Trabalhei carregando terra, areia, era chapa de caminhão.
Serviço bruto é comigo mesmo. Trabalhei fichado no Aeroporto de xxxx em tudo quanto era tipo
de serviço: fazia massa, carregava cimento... Fiquei lá quase um ano. O último (emprego) foi
fazendo tijolo e telha em xxxx. Saí de lá porque tive um surto de ficar gritando. A Polícia me
pegou, me levou para um lugar lá, me deram uma injeção, o patrão não quis eu mais não”.

Revela que vive em Brasília desde outubro/09. “Eu não mudei para cá não, vim só escrever
uma carta para o Presidente. A Revista Mundo Cristão. Peguei uma informação no Palácio da
Alvorada. Escrevi quinze páginas explicando a revista. É espírita. A revista já é resumido. Tinha
certeza que ele não ia receber a revista. Depois que saiu essa revista, já saiu muito jornal que os
caras estava lendo lá no Presídio...”.

Nega prisões anteriores, no entanto, admite que já teve envolvimento com a Polícia. “Tinha
uns negócio de briga com meu irmão. Minha mãe foi e chamou a Polícia e pegou eu. Nem
encostei a mão em ninguém”.

Afirma que nunca namorou, nunca viveu com companheira, tampouco manteve contato
sexual. “Por último agora estava na casa de um irmão meu que é casado já. Ele falou para eu
procurar um lugar porque a casa dele é pequena. Foi o tempo que essa revista caiu na minha
mão. Só fabricou noventa e quatro (exemplares) na França. Cada uma custava cem mil reais. Foi
um cara do Sedex que chegou caçando um endereço de uma dona. Só que não foi a dona que
fez o pedido dessa revista e ela não quis a revista. O menino foi e entregou na minha mão. Na
capa da revista tem a Nossa Senhora do Palácio, é vermerada, colicronada...”.
Nega a prática de atividades de lazer. “Não tinha diversão, não. Era só serviço. De vez em
quando, dia de domingo, soltava papagaio lá. Morei com meu avô até os doze anos, o velho só
queria que eu trabalhasse. Quando não tinha chuva, eu ia para o garimpo; quando vinha a
chuva, eu voltava para a cidade. Meus amigos mais era os garimpeiros. Nós jogava um baralho,
coisa assim.”

Com relação aos hábitos tóxicos, conta: “Eu fumo é toda hora. Isso é desde os doze anos.
Estou aqui já doido para fumar um cigarro. Nunca gostei de beber não, quando bebo um
pouquinho o estômago fica ruim, eu não gosto não. Maconha, só experimentei com doze anos.
Fiquei tonto, só fiz foi dormir, não quis mais não”.

Nega passado cirúrgico e convulsivo. Informa que faz tratamento psiquiátrico desde os
vinte e um anos de idade.

c) HISTÓRIA CLÍNICA

“No começo estourou assim, do nada, uma carga de espírito veio em mim. O poder do bem-
te-vi foi revelado. Eu fui e coloquei o boné, aí a Polícia me pegou. O ano passado eu estive no
Sanatório. Fiquei uns dois meses lá porque eu estava meio fraco, não me alimentava porque
ninguém me aceitava em casa. Fiquei lá para dar uma recuperada. No começo tomei Haldol,
Amplictil, Lítio, Rivotril, Neozine e tomava injeção de Decanoato, quatro ampolas de quinze em
quinze dias. Ficava lá no xxxx. Quando eu vim para cá acabou os remédios, eu fiquei sem eles.
Estou sentindo meu corpo ruim demais, um mal-estar muito grande. Estou tomando uns
remédios lá, mas é os remédios é errado. Eu penso, penso, e não penso nada. Não durmo, fico
andando de um lado para outro, converso demais. Os caras diz que eu sou doido, vejo a hora
eles me dar uma surra lá dentro”.

4. EXAME MENTAL

Periciando chega ao Instituto escoltado por policiais. Apresenta-se em boa condição de


higiene corporal, trajando vestes apropriadas, sem esmero pela aparência. Não tem noção a
que se destina a perícia. Consciência vigil. Humor exaltado. Afeto inadequado. Não parece
experimentar alucinações no momento do exame. Apresenta tremores compatíveis com o uso
atual de psicotrópicos. Pensamento de curso acelerado e conteúdo delirante. “Eu tenho um chip
aqui no pescoço. A alma do bem-te-vi desceu em mim. As polícia foi e deu um sossega-leão na
minha espinha. Eu taquei fogo no barraco, o bem-te-vi estava na área, o poder de São Jorge foi
revelado. Quem está rastreando esse chip é o batalhão de xxxx. Tudo que eu penso ele sabe,
esse primo meu que é polícia, sai lá no computador dele, o nome dele é xxxx... O pensamento
meu é melhorar esse mundo. Tem os Racionais também que está comigo, tem o Moisés, tem
muita coisa. O Comando Vermelho ia lá direto me ver, eu morava lá no morro, na favela...” Juízo
crítico de realidade e pragmatismo comprometidos. “Quero ir embora para minha cidade, tocar
a vida”.

5. OUTROS DOCUMENTOS MÉDICOS


O relatório contido à folha 155 dos autos, emitido em 18.02.10 pela Assistente Social xxxxx
revela que o paciente está inscrito no CAPS de xxxx desde 2005. À época apresentava-se
delirante. Foi prescrito Haldol Decanoato, Haldol, Biperideno e Clorpromazina. Manteve baixa
adesão ao tratamento com frequência irregular ao Serviço. O último atendimento ocorreu em
setembro/09 quando foi encaminhado para internação psiquiátrica. Há menção ao uso de
drogas ilícitas.

Consta nos autos um encaminhamento do Hospital xxxx (Fundação Hospitalar de xxxx) ao


CAPS datado de 24.09.09 no qual a psiquiatra Dra. xxxx informa no relatório de alta que o
paciente necessita de acompanhamento psiquiátrico, psicológico e social, devendo fazer uso
contínuo de Clorpromazina 300mg/dia, Ácido Valpróico 1500mg/dia e Diazepam se necessário.

O relatório emitido em 09.02.10 pela Dra. xxxx, psiquiatra do Hospital xxxx/DF (onde foi
atendido conforme GAE xxxxx do dia xxxx), recomenda sua internação em local protegido e
sugere a prescrição de Haloperidol, Prometazina e Neozine.

6. DIAGNÓSTICO

Psicose não especificada. F 29 - CID 10.

7. CONCLUSÃO

Trata-se de periciado portador de doença mental que, à época do delito, comprometia


inteiramente suas capacidades de entendimento e autodeterminação, tornando-o inimputável.
Necessita de tratamento psiquiátrico em regime de internação, no momento, em local de onde
não possa evadir-se. Apresenta periculosidade vinculada ao transtorno mental.

8. RESPOSTAS AOS QUESITOS:

a) DO JUÍZO

1º) Era inteiramente incapaz de entender o caráter criminoso do fato e de determinar-se


adequadamente em virtude de doença mental.

2º) Era inteiramente incapaz de entender o caráter criminoso do fato e de determinar-se


adequadamente em virtude de doença mental.

b) DO MINISTÉRIO PÚBLICO

1º) Era inteiramente incapaz de entender o caráter criminoso do fato em virtude de doença
mental.

2º) Era inteiramente incapaz de determinar-se adequadamente em virtude de doença


mental.

3º) Era inteiramente incapaz de entender o caráter criminoso do fato em virtude de doença
mental.
4º) Era inteiramente incapaz de determinar-se adequadamente em virtude de doença
mental.

5º) Entrevista e exame clínico.

6º) Nada a acrescentar.

c) DA DEFESA

1º) Era inteiramente incapaz de entender o caráter criminoso do fato em virtude de doença
mental.

2º) Era inteiramente incapaz de determinar-se adequadamente em virtude de doença


mental.

3º) Era inteiramente incapaz de entender o caráter criminoso do fato em virtude de doença
mental.

4º) Era inteiramente incapaz de determinar-se adequadamente em virtude de doença


mental.

5º) Entrevista e exame clínico.

6º) Nada a acrescentar.

Caso de doença mental sem nexo causal com o delito:


1. IDENTIFICAÇÃO XXXX

2. HISTÓRIA CRIMINAL

Lê-se nos autos que no dia xxxx, no Aeroporto Juscelino Kubitschek, em Brasília/DF, a
denunciada trazia consigo três “pacotes” de cocaína, pretendendo transportar a droga para o
exterior em vôo da xxxx para xxxx. Está incursa nas penas do artigo 33 da Lei 11.343/06.

3. ENTREVISTAS COM A PERICIANDA EM XXXX E XXXX

Depois de informada de que suas declarações não estarão sujeitas a sigilo médico e
cientificada sobre seu direito de permanecer calada diante de qualquer pergunta, a pericianda
relata o que se segue:

“Nasci na Itália. Fiquei presa no Brasil por tráfico de droga. Já tinha vindo aqui antes. Tinha
passado uma semana com um menino no carnaval e depois voltei na quaresma (época do
delito). Eu não sabia que levava droga. Acho que foi esse menino que colocou (em sua bolsa)
porque eu fiquei com outra pessoa. Não gosto de ter um parceiro só, sou liberal. Tenho passa-
porte internacional. Estudei até o terceiro ano e me especializei em inglês de atendimento ao
público, mas trabalho em barco, é tradição de família. Fora da temporada de pesca trabalho
como garçonete em hotéis. Minha morada fixa é na casa da minha mãe, mas eu alugo aqui,
alugo lá... Não gosto de ficar só em um lugar. Meu namorado fixo está em Florença, esse
menino (com quem estava no Rio de Janeiro) é angolano, conheci na França. Fico com ele
quando brigo com meu namorado. Tive um problema (judicial) uma vez que entrou polícia na
casa do meu namorado, máfia internacional de roubo por internet, mas não fiquei presa. Há
oito anos faço tratamento psiquiátrico, tenho depressão e mania. A primeira vez foi com dezoito
anos, depressão profunda, tentei suicídio. Tinha rompido minha relação com meu primeiro
namorado. Tomei medicamento calmante para dormir, tudo junto com uísque. Não fiquei
internada, fui ao hospital fazer lavagem gástrica e minha família cuidou de mim. A primeira
crise de mania foi com vinte anos. Eu estava grávida e meu segundo namorado rompeu comigo.
Fiz o aborto porque sou Rh negativo. Não sei contar quantas crises depressivas já tive. É um ano
sim, um ano não... Quando estou deprimida não faço nada, fico na casa da minha mãe como se
estivesse presa, não encontro o sentido da minha vida. A crise dura de quatro a cinco meses.
Não gosto de usar medicamento, quero sair sozinha da crise porque os remédios viciam. Só
interno quando estou maníaca, tenho oito ingressos no hospital. Fico de uma a duas semanas
internada. Quando passa a alucinação, tenho vergonha das coisas que eu faço quando estou
maníaca: bebo, brigo, quebro coisas; às vezes agrido, tiro a roupa, tenho ataque de ira. A última
vez (crise maníaca) foi em fevereiro de 2008. Meu medicamento (estabilizante do humor) tem
que ser contínuo. Agora estou tomando Valproato 750 e Fluoxetina 20. Só não tomo quando
consumo droga, não mesclo remédio com droga. Tinha parado (a medicação) dia 28 de abril
quando cheguei da França. O psiquiatra acha que eu não tomo porque cada vez que eu saio de
casa, minha mãe diz que eu não estou usando. Ela me quer direto dentro de casa porque eu
tenho essa enfermidade. Tenho dois tios que têm problema. Um nunca trabalhou, vive com a
mãe, e outro está aposentado porque não trabalhava direito. Minha mãe trabalha em limpeza
numa escola. Tenho duas irmãs (por parte de mãe), são de outros pais. Uma de vinte e três que
está terminando faculdade e outra de quatro anos. Resolvi vir para cá porque tinha acabado de
fazer teste para dirigir carro e não passei. Gastei dois mil euros e não consegui, foi a terceira vez
que eu tentei e não passei. Acredito que foi porque vinha um pedestre e eu não parei, e outra
vez, o instrutor me mandou pegar a primeira à direita e não deu tempo de eu virar o carro.
Queria a carteira porque viajo muito e avião está muito caro. Pedi ao meu namorado dinheiro
para fazer mais aulas e ele não me deu, aí nós brigamos. Estava no Rio, só estava fazendo
escala em Brasília. Só passei nove dias (no Brasil), já tinha comprado a passagem de volta. Vim
só curtir férias. Acho que não estava perturbada (à época do delito). É meu caráter estar de um
lugar para outro, gosto de viver a vida. Não tenho marido, não tenho filho, não tenho trabalho
fixo, não tenho nada a perder. Uso cocaína, maconha e álcool desde os dezessete, mas a
cocaína é só nas férias. Minha mãe acha que eu fico maníaca quando uso cocaína. Eu cheiro
pouco, um grama dá para dois dias. Quando estou trabalhando no barco, não uso droga. Depois
de ter pegado o peixe e vendido, bebo uísque e fumo (tabaco) com meu tio e meu primo.
Maconha me dá enjôo no barco, uso quando estou tranquila na casa do meu namorado ou de
meus amigos assistindo televisão. Na noite anterior (ao delito) não usei cocaína. Fumei
maconha e dormi porque não gosto de dormir no avião. Acordei, tomei banho, peguei minha
mala, peguei o táxi e fui para o aeroporto. Eu realmente não sabia que estava com essa droga
dentro da bolsa. A cadeia é melhor do que eu pensava. Só está ruim porque não tenho dinheiro.
Não tenho absorvente, sabonete, papel higiênico, creme para o corpo. O que eu quero é casar-
me com um homem que tenha dinheiro. Eu procuro um cara perfeito, se não conseguir, vou
continuar pescando.”

No momento, nega queixas de ordem física ou psíquica.

4. EXAME MENTAL

Pericianda chega ao Instituto escoltada por policiais. Apresenta-se em boas condições de


higiene corporal, trajando vestes apropriadas, com aparência simples. Mostra-se cooperativa
com a entrevista. Mantém postura descontraída e responde às perguntas com objetividade.
Consciência lúcida. Globalmente orientada. Sem distúrbios da atenção, memória ou
motricidade. Pensamento organizado sem alteração de curso ou de conteúdo. Não verbaliza
ideias delirantes nem parece experimentar alucinação de qualquer natureza. Inteligência
mediana. Raciocínio claro. Juízo crítico de realidade preservado. Pragmatismo mantido.

5. INSPEÇÃO FÍSICA

Pericianda em bom estado geral, tem compleição normolínea com sobrepeso. Eupnéica,
hidratada, normocorada, acianótica, anictérica, sem edemas ou dismorfias. À ectoscopia não
observamos estigmas de interesse médico-legal. Fala, marcha, equilíbrio e coordenação sem
anormalidades.

6. RELATÓRIOS MÉDICOS

Constam nos autos vários documentos médicos emitidos na Itália que comprovam que
desde os dezoito anos a examinanda teve vários atendimentos e internações psiquiátricas, em
decorrência de episódios depressivos e maníacos. O diagnóstico formulado foi de transtorno
afetivo bipolar. O mais recente, assinado pela Dra. xxxx, datado de 04.06.09 (um mês após o
delito). Informa que a examinanda tem sido acompanhada naquele Serviço desde 2002, de
forma ir-regular, devido à baixa adesão por parte da paciente. Conta com oito internações
psiquiátricas, tendo sido a última em abril de 2008, por apresentar episódio maníaco com
sintomas psicóticos. Durante as crises de mania, costuma manifestar agressividade, desinibição
sexual, delírio, abandono do cuidado pessoal e fugas do domicílio sem rumo predeterminado. O
último atendimento ocorreu em 04.03.09, encontrando-se na ocasião “relativamente
estabilizada e realizando o tratamento prescrito: Depakene”. Não compareceu à consulta
agendada para 13.05.09.

O relatório emitido em xxxx pelo médico do Presídio, Dr. xxxx CRMDF xxxx, revela que a
interna vem sendo acompanhada pela psiquiatria e pela clínica médica, desde 05.06.09,
fazendo uso regular de Depakene 500mg/dia, Fluoxetina 20mg/dia e Hidroclorotiazida
25mg/dia. Apresenta boa evolução clínica em que pese haver eclodido “surto psicótico em julho
de 2009 (dois meses após o delito), no qual foi prontamente atendida e melhorou
rapidamente”.

7. CONCLUSÃO
Trata-se de periciada portadora de doença mental que evolui por surtos e caracteriza-se
pela ocorrência de intervalos lúcidos nos períodos intercríticos. Por estar nesta condição à época
do crime, possuía total capacidade de entendimento e autodeterminação. Não existiu nexo
causal entre a enfermidade e o delito. Era, portanto, imputável. Necessita de acompanhamento
médico, por tempo indeterminado, no momento, em regime ambulatorial.

8. RESPOSTAS AOS QUESITOS DO MINISTÉRIO PÚBLICO

1º) É portadora de doença mental.

2º) Transtorno afetivo bipolar.

3º) Não é portadora de desenvolvimento mental incompleto.

4º) Não é portadora de desenvolvimento mental retardado.

5º) Conforme relatório médico emitido em 06.10.09, tem prescrição de antidepressivo,


estabilizador do humor e diurético.

6º) Era inteiramente capaz de entender o caráter ilícito do fato.

7º) Era inteiramente capaz de determinar-se de acordo com o entendimento do caráter


ilícito do fato.

8º) Não é portadora de desenvolvimento mental incompleto.

9º) Não é portadora de desenvolvimento mental incompleto.

10º) Não é portadora de desenvolvimento mental retardado.

11º) Não compreendi o quesito.

12º) Não é portadora de perturbação da saúde mental.

13º) Não é portadora de perturbação da saúde mental.

14º) Não é portadora de perturbação da saúde mental.

15º) Sua doença mental precede à ação descrita na denúncia.

16º) No momento é capaz de compreender a acusação, recordar dos fatos e condutas que
praticou e auxiliar sua defesa.

9. RESPOSTAS AOS QUESITOS DA DEFESA

1º) Era portadora de doença mental - Transtorno afetivo bipolar.


2º) Segundo a examinanda, havia suspendido o uso da medicação. Sua enfermidade requer
uso contínuo do estabilizador do humor.

3º) Possuía total capacidade de entendimento.

4°) Há histórico de uso de drogas ilícitas.

5°) Não é portadora de dependência química.

6º) Não é portadora de dependência química.

7º) Possuía total capacidade de entendimento.

8º) Possuía total capacidade de autodeterminação.

9º) É portadora de doença mental - Transtorno afetivo bipolar.

10º) De acordo com os autos, constam registros médicos de adoecimento psíquico a partir
do ano de 2000.

6. Perturbação da Saúde Mental


São inúmeros os diagnósticos abrangidos sob essa denominação, e os delitos praticados
variam enormemente.

Os crimes relacionados aos transtornos neuróticos são praticados por mulheres: omissão
de cuidados ao filho recém-nascido, por depressão pós-parto grave, sem sintomas psicóticos;
agressão física e injúrias proferidas durante episódio dissociativo; pequenos furtos cometidos
por cleptomaníaca...

Por serem crimes considerados de baixo potencial ofensivo, as acusadas quando vêm à
perícia estão em liberdade condicional. Colaboram com o trabalho pericial e empenham-se em
parecer “incapazes”. Trazem toda a sorte de exames, rela-tórios, receitas e caixas de remédios
para comprovarem a perturbação.

“Trata-se de periciada portadora de perturbação da saúde mental, condição que não altera
seu entendimento; todavia, compromete parcialmente sua capacidade de determinar-se de
acordo com esse entendimento, tornando-a semi-imputável. Necessita de tratamento médico e
psicológico, no momento, em regime ambulatorial e do auxílio da família no sentido de aderir às
medidas terapêuticas propostas.”

Nem toda perturbação da saúde mental torna o indivíduo semi-imputável; é necessário


que haja um grau de desorganização mental suficiente para comprometer sua liberdade de
ação. É preciso ainda que a enfermidade guarde nexo causal com o crime. Uma mulher pode
estar deprimida e contratar alguém para matar o marido com quem vive em conflito; outra que
sofre de TOC pode dar um desfalque na empresa onde trabalha; ambas serão imputáveis.

Os crimes mais graves contra a vida, ou de natureza sexual, são cometidos por homens:
atentado público ao pudor reiteradamente repetido por exibicionista; estupro contra criança
praticado por pedófilo; homicídio cometido por indivíduo portador de transtorno de
personalidade dissocial.

O transtorno de personalidade dissocial é motivo de polêmica entre os psiquiatras


forenses do mundo inteiro. Há quem os considere imputáveis (plena capa-cidade de
entendimento e autodeterminação) e quem compreenda que são semi-imputáveis por não
possuírem controle eficiente dos impulsos.

Esse indivíduo chega escoltado por policiais e não se importa em disfarçar sua hostilidade
para com o perito. Sua postura é descompromissada ou desafiadora, mostra-se pouco
cooperativo com a entrevista, desqualifica o trabalho pericial e apresenta um senso ético
distorcido.

Na entrevista com familiares é descrito como “rebelde, briguento, mentiroso,


manipulador” desde criança. O esforço dos pais para orientá-los corretamente em nada
contribuiu para a mudança de comportamento desejada.

De maneira superficial, a psicologia entende que a personalidade de um indivíduo é


formada pelo temperamento, características inatas, e pelo caráter, que resulta do aprendizado
adquirido na educação formal (escolar) e informal (o que a criança copia dos adultos com os
quais convive).

O parecer psicológico é fundamental para nos indicar o nível de desestruturação da


personalidade. Nos casos leves opinamos pela imputabilidade; nos casos graves, pela semi-
imputabilidade. A nosso ver, são as perícias mais complexas.

Caso de transtorno de personalidade semi-imputável:


1. IDENTIFICAÇÃO XXXX

2. HISTÓRIA CRIMINAL

Consta nos autos que no dia xxxx entre 19h50 e 20h00, no interior de um ônibus coletivo da
empresa Viação xxxx, que se encontrava na altura da lanchonete xxxx, Quadra xxx, sentido
sul/norte, Asa xxxx/DF, o denunciado subtraiu para si, mediante grave ameaça empreendida
com uso de arma de fogo contra o cobrador xxxx, a quantia de duzentos e oitenta reais
pertencentes à Empresa.

No dia xxxx (no mês seguinte), por volta de 12h45, na agência Empresa de Correios e
Telégrafos localizada na Avenida xxxx, o denunciado subtraiu, mediante grave ameaça
empreendida com uso de arma de fogo, um colete de proteção balística que se encontrava na
posse de xxxx.

No dia xxxx (dez dias depois), por volta das 23h30, na parada de ônibus situada na Quadra
xxxx, o denunciado, mediante grave ameaça empreendida com uso de arma de fogo ,subtraiu
vários objetos pertencentes a xxxx, xxxx, xxxx e xxxx.
No dia xxxx (um mês depois) fazendo uso de colete de proteção balística anteriormente
roubado, efetuou disparos de arma de fogo contra vigilantes do carro-forte do Banco xxxx,
causando a morte de um deles. Em seguida, utilizando-se de identidade falsa, na
Rodoferroviária, comprou passagem para xxxx, permaneceu algumas horas no local de destino
e retornou a Brasília/DF.

No dia xxxx (duas semanas depois), por volta das 06h30, na Rodoviária do Plano Piloto,
constrangeu o taxista xxxx a tolerar que saísse do veículo sem pagar a corrida. Diante da
resistência da vítima efetuou disparos de arma de fogo, causando-lhe a morte.

Submeteu-se a duas avaliações psiquiátricas anteriores (Laudos xxxx/09 e xxxx/09) que


concluíram ser o periciando portador de perturbação da saúde mental, ficando em aberto o
diagnóstico nosológico.

3. ENTREVISTA COM O PERICIANDO EM XXXX

“Não tenho nada não. Não sinto nada não. Estou tentando ler a Bíblia, dizem que é bom
pra dormir. Tem um povo lá que faz muito barulho. A comida é um lixo, mas desce. Não vou
fazer nada não (avaliação psicológica). Eu meti a faca em mim mesmo (referindo-se às cicatrizes
do membro superior esquerdo). Você está achando que eu sou um bandido, perigoso, matador.
Sou um bandido. Pronto. Não tenho família, moça, não tenho p... nenhuma. Sou totalmente
psicopata. Vou logo acabar com isso (entrevista). O que me dar prazer é ver o sangue escorrer.
Sempre gostei da morte. Não sei dizer quantos matei, mas matei muitos. Isso é perda de
tempo, já falei que não tenho problema nenhum. Estou f... mesmo. Eu tinha: matar um milhão
de pessoas. Eu subia o cerrado sempre, o problema é que sempre aparecia um idiota para me
incomodar. Aparecia alguém dos quintos dos infernos. Sou um cara ruim, sou um cara mau.
Desde criança. Já comecei matando passarinho, depois fui matando gato, depois os cachorros.
Vamos deixar o que está no papel, porque posso pegar mais cadeia (com relação a outros
crimes). Estou algemado, sendo carregado por esses camaradas. Eu tava tentando me matar,
mas os outros presos falaram que eu tinha era que matar os outros. Meu objetivo é outro, é ter
paciência, não ficar mais daquele jeito (agressivo no cárcere). Só pra eles me quebrar na p...? Eu
queria estar em cima do cerrado, à noite para ver a lua, sozinho. Como eu fui me meter nessa
situação? Já fumei muita maconha quando tava na cela com outros presos. Acho que eu tentei
mudar, ser bom sem ser. Sempre trabalhei de ajudante de obra. Quando eu era criança morava
no Gama, tinha um padrasto, tinha mãe, tinha tudo. Eu passava todo dia pela mata para
comprar leite. Quando eu estou voltando, eu vi uma pessoa de olho frio. Nunca quis namorada.
Sempre fui apaixonado pela morte. Sempre gostei de matar. É uma mulher bonita, meio vulto.
Eu não podia ficar muito tempo sem matar. Minha mãe sempre me expulsava de casa por causa
disso. A gente brigou (referindo-se ao padrasto), eu meti a faca nele. Ele agredia, só que um dia
eu falei: isso vai ter que acabar! Maldita hora que minha mãe resolveu me criar. Passei a
infância sendo menino de rua. Dormia de baixo de bloco, de ponte. Já pedi dinheiro, já engraxei
sapato, já roubei. Se eu não tivesse algemado aqui todo mundo ia ficar doido. Uma pessoa
normal não gosta de matar e eu gosto. Sempre que alguma coisa vai acontecer ouço um
passarinho em cima da minha cela. Sempre gostei de mata, de ficar sozinho. Sempre gostei de
ficar na bica da xxxx. Geralmente quando me acontecia alguma coisa ruim, uma coruja vinha
me avisar, alguma coisa acontecia. Eu comprei uns filmes e pensei como ia conseguir uma arma
com um real. O que vocês não sabem é melhor não saber porque vai me prejudicar. Vocês
querem f... comigo. Eu consegui a arma, tomei do cara. Fui fazer um assalto. Minha mãe gritava
muito, ela bebe demais. Eu fui morar de aluguel e comecei a comprar uns filmes de assalto e fui
fazendo assalto. Comprava filmes de Bruce Lee. Seu xxxx me vendia três por dez. Teve um
(roubo que praticou) que o cara morreu, mas eu não tava nem aí, f...-se. Fui assaltar um carro-
forte. Quase que eu consigo, mas o carinha começou a atirar em mim.”

4. EXAME MENTAL

Periciando chega ao Instituto conduzido por policiais civis, algemado pelos punhos e
tornozelos. Apresenta-se em boas condições de higiene corporal, trajando vestes apropriadas.
Mostra-se extremamente hostil, a presença da escolta em nada o intimida. Pouco cooperativo
com a entrevista, chega a sorrir demonstrando prazer em responder às perguntas de forma
agressiva. Consciência psíquica lúcida. Humor ansioso, mexe as pernas ininterruptamente.
Pensamento coerente. Não verbaliza ideias delirantes nem parece experimentar alucinações no
momento deste exame. Raciocínio claro. Juízo crítico de realidade preservado e ético
rebaixado.

5. ENTREVISTA COM A MÃE NO DIA XXXX REALIZADA EM SUA RESIDÊNCIA

“O pai do xxxx era doente, louco da cabeça. Vivia mais era nas clínicas lá em xxxx. Ficava
todo amarrado. Quando não estava internado, corria para os matos. Me separei dele e vim com
outro para cá. Trouxe o xxxx com cinco e a xxxx, essa que fez catorze agora, que está grávida.
Vim com outro marido que morreu de cirrose, ele bebia. Tive três filhos com ele. Tive outro
marido, que foi até visitar ele (na prisão). Eles se davam bem. Ele (terceiro companheiro) teve
que ir para onde está a família dele. O xxxx começou a andar com um ano e pouco e a falar com
quase dois. O xxxx me dava trabalho desde pequeno. Com cinco anos ele começou a sumir para
o córrego. Se escondia, desaparecia mais os amigos, não queria voltar para casa. Passava era
de dois dias eu procurando ele, teve uma vez que passei uma semana sem achar ele. Foi para a
escola com dez anos. Aprendia fácil, mas todo ano ele não passava porque rasgava os cadernos.
Penso que ele só sabe ler e escrever pouco. A professora ia lá em casa reclamar dele quase todo
dia. Ele era nervoso, não tinha paciência, metia a cadeira na cabeça dos outros, furava os
colegas de lápis. Não gostava que ninguém reclamasse, se vingava nos moleques. Quando eu
dizia que ia bater nele, ele ficava com ódio, fechava as mãos e ficava com a cara feia, mudava a
feição. Só dei uma pisa nele. Foi quando ele matou seis pintos meus de pau. Ele tinha essa
mania/Matava tudo quanto era gato e cachorro da rua. Quebrava garrafa e arrochava nos
bichos. Matou um cachorro meu com barbante. Teve outra, a bichina estava grávida, ele
amarrou ela de cabeça para baixo e matou. Já teve vezes de ele se cortar com lâmina ou então
caco de garrafa. Quando estava com raiva, ele saía para correr, voltava suadinho. O que ele
gostava mesmo era de se trancar naquele quarto e passar três dias ouvindo essas fitas de
negócio de morte, de gente abrindo os corpos dos outros. A estante está lotada. Fazia tudo
(urinava e defecava) dentro de uma vasilha, quando saía, rumava no mato. Aqui em casa é só
um vão. Nós divide com lençol. Só o quarto dele tinha porta. Ele fechava de corrente. Comigo ele
sempre foi carinhoso, estava sempre do meu lado. Quando eu estava doente, ele cozinhava e o
primeiro prato era o meu. Também nunca agrediu os irmãos. Ele estava morando de aluguel
tinha uns seis meses. Saiu daqui porque não aguentava o barulho dos meninos. Xingava:
‘Desgraça, tenho vontade de matar vocês!’. Ficava agoniado quando via as coisas faltando
dentro de casa. Às vezes queria um doce, não tinha, ele dava murro na parede. Nunca teve
preguiça para trabalhar. Sempre estava fazendo um bico. Ajudante de pedreiro, descarregando
caminhão, capinava um lote. Era controlado com o dinheiro dele, o sonho dele era morar só. Me
ajudava a pegar sobra de verdura no mercado. Às vezes dava uma crise nele, dizia que tinha um
homem querendo pegar ele. ‘Alguém quer me matar, tem alguém me chamando debaixo da
cama’. Se abraçava mais essa menina (irmã de doze anos). Quando ele tinha treze anos, um
menino atirou uma bola de gude no estilingue e pegou na cabeça dele que entrou. Acho que
ainda está lá dentro. Fez um buraco, saiu muito sangue, mas ele não quis ir no hospital. Ele já
foi atendido no Hospital xxxx, no Hxxxx e no Hxxx. A primeira vez que ele passou mal (convulsão)
foi com nove anos. Acho que dava de semana em semana. Ele estava quieto, começava a
tremer, saía espuma de sangue da boca dele, se mijava todo. Uma vez caiu na pista correndo.
Quando tomava remédio parava de cair. Não sei o nome não. Não sei se ele está tomando
agora não. Nunca mexeu com droga, meu filho não tem vício nenhum. Não gostava de amizade
com ninguém, nem falava com vizinho. Só namorou uma menina, tinha uns quinze anos. Diz que
não quer ter mulher para sofrer. Nunca vi ele pegar nada de ninguém. Fiquei sabendo quando a
Polícia veio aqui. Na minha casa ele nunca trouxe coisa dos outros. Essa é a segunda vez que ele
foi preso. A outra foi com treze ou catorze anos, acho que foi negócio de briga. O que eu sei
desse (crime em questão) é que ele pediu uma carona, disse que não tinha dinheiro e na hora de
descer, o taxista travou a porta de trás e já foi batendo nele. Dentro da minha casa ele nunca
possuiu arma. Quando disseram que meu filho tinha um revólver, eu não acreditei. Só fui ver ele
uma vez (na prisão) porque minha identidade estragou e eles não querem tirar outra porque eu
não tenho o registro de nascimento. Ele me abraçou do mesmo jeito, calado. Só disse para eu
não ir mais para não passar humilhação. Eu tenho para mim que meu filho não vai viver muito
não.”

6. EXAMES COMPLEMENTARES

O Eletroencefalograma realizado no Hospital xxxx no dia 28.07.09 não evidenciou


anormalidades.

O Parecer Psicológico nº xxxx/09, cuja cópia segue anexa, revelou satisfatório contato com
a realidade, embora apresente falta de contensão dos impulsos, controle emocional deficitário e
utilização inadequada do potencial intelectivo, características que lhe conferem alto grau de
periculosidade.

7. PESQUISA EM PRONTUÁRIO

Estivemos no Hxxx e verificamos que havia registro de um atendimento na emergência, no


dia xxxx do corrente ano, cuja GAE não foi localizada. No Hxxxx não foram encontrados GAE
nem prontuário relativos ao periciando.

8. DIAGNÓSTICO
Transtorno de personalidade dissocial. F 60.2 - CID 10.

9. CONCLUSÃO

Trata-se de periciado portador de perturbação da saúde mental, condição que não altera
seu entendimento, porém compromete parcialmente sua capacidade de autodeterminação.
Necessita de acompanhamento psicossocial, por tempo indeterminado, em regime de
internação em local de onde não possa evadir-se. O uso de psicofármaco poderá abrandar seu
comportamento violento de origem caracterológica. A periculosidade está vinculada ao
transtorno mental e o prognóstico é sombrio.

10. RESPOSTAS AOS QUESITOS

a) DO MINISTÉRIO PÚBLICO

1. Entrevistas, exame clínico e exames complementares.

2. Não é portador de doença mental.

3. Não apresenta desenvolvimento mental incompleto ou retardado.

4. Possuía plena capacidade de entendimento.

5. Era parcialmente capaz de determinar-se de acordo com esse entendimento.

6. Era portador de perturbação da saúde mental.

7. Possuía plena capacidade de entendimento.

8. Era parcialmente capaz de determinar-se de acordo com esse entendimento.

9. Sua periculosidade está vinculada ao transtorno mental.

10. Necessita de internação em local de onde não possa evadir-se.

b) DA DEFESA

1. Entrevistas, exame clínico e exames complementares.

2. Não é portador de doença mental, porém padece de perturbação da saúde mental.

3. Não apresenta desenvolvimento mental incompleto ou retardado.

4. Não era inteiramente incapaz de entender o caráter criminoso do fato nem de


determinar-se de acordo com esse entendimento.

5. A perturbação da saúde mental compromete parcialmente sua capacidade de


autodeterminação.
6. A perturbação da saúde mental comprometia parcialmente sua capacidade de
autodeterminação.

7. Sua periculosidade está vinculada ao transtorno mental.

8. Necessita de internação em local de onde não possa evadir-se.

9. Não é possível prever quando e até mesmo se haverá remissão do quadro clínico.

Pedofilia
Como fizemos com o transtorno de personalidade dissocial, consideramos importante
discorrer sobre pedofilia, assunto que tem sido alvo de interesse e equívoco, por ser divulgado
pela mídia como sinônimo de abuso sexual infantil, ou mesmo, como um tipo de crime. “Mais
um caso de pedofilia foi descoberto...”

Pedofilia é a preferência sexual por crianças, pré-púberes, ou no início da puberdade,


praticada, em geral, por homens, frequentemente frustrados em conseguir contatos sexuais
apropriados.

Pode ocorrer na forma leve: o indivíduo é afligido pelo imaginário, mas nunca o pôs em
ação; moderada: o imaginário é ocasionalmente transformado em ação e o funcionamento
social pode estar comprometido; ou severa: os impulsos são repetidamente postos em ação e
outros funcionamentos estão prejudicados pela perversão. A satisfação erótica pode ser obtida
apenas com a visualização e disseminação de fotos e cenas de conteúdo pedófilo, observação
de criança despida, exibição dos genitais para a criança, masturbação na frente da criança, ou
logo que ela saia; tocar, acariciar a criança; obrigar que a criança o masturbe ou pratique
felação; penetração nos orifícios da criança com objetos, com os dedos, ou com o pênis; ferir
gravemente ou matar a criança. Os crimes praticados pelos pedófilos vão desde “fotografar
criança ou adolescente em cena pornográfica ou de sexo explícito” até o “homicídio”.

Oitenta e sete por cento dos casos de abuso sexual contra crianças são praticados dentro
da própria família (incesto) e não consistem atos de pedofilia.

O pedófilo é mais conhecido dos psiquiatras forenses do que dos clínicos. Não há um perfil
único que o caracterize, contudo, alguns sinais podem distingui-lo do que chamaremos de
abusador doméstico.
Na avaliação psicológica de um pedófilo, os testes podem revelar: imaturidade afetiva em
descompasso com a idade cronológica e o potencial cognitivo; labilidade emocional; pouco
controle dos impulsos; predomínio da energia instinitiva; sentimento de vergonha, angústia;
introjeção negativa da figura humana adulta; projeções ligadas ao mundo da criança;
interpretações infantis para as questões propostas pelo psicólogo forense.

A hediondez de um crime sexual não é proporcional ao grau de patologia mental do


criminoso.

É inimputávelo portador de:

a) Psicose(doença mental) - o crime tem caráter abrupto, incompreensível, bizarro, voltado


para criança de seu convívio. Não existe culpa porque entende a conduta como correta frente à
sua atividade delirante.

b) Demência em grau avançado(doença mental) - associada à total falta de crítica com


relação aos seus atos; raramente ocorrem, pela debilidade física.

c) Retardo mental moderado ou grave(desenvolvimento mental retardado) - pelo evidente


déficit cognitivo que apresenta (QI < 50). Experimenta grande dificuldade de conter seus
impulsos e não entende sua ação como delituosa.

É semi-imputávelo portador de:

a) Retardo mental leve (desenvolvimento mental retardado) - entende parcial-mente o


caráter ilícito do fato (QI entre 50 e 69) e costuma negar que o praticou.

b) Pedófilo (perturbação da saúde mental) - tem preservado o entendimento, porém a


volição está comprometida por conta da obsessão incontrolável e da compulsão para aliviar a
ansiedade que precede o ato delituoso.É imputável(sua periculosidade não está vinculada a
transtorno mental):

a) Indivíduo que possui inteligência abaixo da média populacional, sem que o baixo
rendimento cognitivo configure retardo mental (QI entre 70 e 89).

b) Indivíduo que, embora tenha um caráter malformado (falha educacional), com a escala
de valores destoante das regras sociais, não preenche os critérios adotados para caracterizar
nenhum distúrbio mental.

* Produtor, disseminador de filmes, traficante de crianças para prostituição, motivado pelo


ganho financeiro.

* Pai, avô, tio, padrasto que abusa de criança sob várias alegações falsas. Algumas vezes
atribui à bebida ou à droga que, com muita frequência, consome. Mais uma vez, importa para o
perito definir qual seu estado psíquico anterior ao uso voluntário da substância. Esse indivíduo
costuma espancar as crianças com a desculpa de “educá-las”; na realidade, com o objetivo de
saciar seu impulso agressivo.

Caso de cessação de periculosidade de um pedófilo


1. IDENTIFICAÇÃO XXXX

2. HISTÓRIA CRIMINAL

Periciando com vasta lista de crimes sexuais praticados contra menores. É conhecido do
nosso Serviço por haver se submetido a várias perícias psiquiátricas nas quais foi considerado
periculoso, advindo daí sua prolongada internação na ATP.

3. ENTREVISTA COM O PERICIANDO EM XXXX

“Estou preso desde o dia quinze de dezembro de 98. Que eu me recorde, nesse período que
eu estou preso vim (no IML) em 2001 e no dia xxxx de 2006. Já estive aqui em 99, no início do
processo, e em outras épocas anteriores. A primeira vez que eu fui para Papuda foi em 1992.
Essa é a segunda (prisão). Da primeira vez eu fiquei dois anos, dez meses e quatro dias, depois
fui transferido para uma clínica, xxxx, onde fiquei em torno de cinco meses. Sempre atentado
violento ao pudor. A princípio, eu não enxergava o meu problema. Eu imaginava que o
problema estivesse nos outros. Estive internado em clínicas várias vezes. Tive laudos de dupla
personalidade e de ausência porque eu sou epiléptico. Percebi bem próximo de 91 para 92. Esse
problema começou na minha adolescência. Eu não me sinto como pedófilo. Eu sei que não é
algo normal, mas me comparando com a televisão (crimes sexuais divulgados pela mídia),
jamais cheguei a tanto. Nunca usei a força. Praticava sexo oral. Quando chegava em casa, me
sentia mal com o que tinha acontecido (culpa pelo delito cometido). Era mais forte do que eu (o
desejo de manter contato sexual com crianças). Nunca consegui ter uma vida hétero, sinto um
sentimento muito grande de rejeição (por parte de mulheres adultas). Algumas vezes eu
mantinha uma aproximação, mas me continha. Cheguei a procurar um grupo de apoio na UNB,
só que na época estavam com as vagas preenchidas. Fiquei sete anos e meio trabalhando na
faxina (na prisão). Hoje eu estudo supletivo de quinta a oitava e faço artesanato, baús com
palitos de picolé. Recebo visitas muito dificilmente, só da minha mãe. Pedi para que fosse
encaminhado para uma clínica, mas se eu for direto para rua, procurarei me manter
(financeiramente) através de algum serviço da VEC (hoje VEP). Sinto uma grande necessidade
de manter um acompanhamento (psicológico) na rua, quero saber lidar com essa situação. Às
vezes, quando assisto novela, sinto uma atração para prestar a atenção nos meninos. Tenho
uma necessidade de uma amizade com meninos. Com a convivência na rua, talvez eu tenha
uma recaída. Quando eu era criança fiz vários acompanhamentos. Fui violentado dos quatro
aos sete anos por um vizinho, parou quando nos mudamos. No xxxx também aconteceu a
mesma coisa quando eu tinha dez, doze anos. Os laudos que eu fazia acusavam que eu não
tinha uma compatibilidade mental com a minha idade cronológica. Tomo remédio apenas para
pressão: Captopril e outro que eu não sei o nome. Deveria tomar um remédio para epilepsia,
mas há mais de um ano cortaram porque levantou-se a suspeita de eu estar comercializando
medicamento lá dentro. Isso porque eu estava deixando para tomar o Gardenal da manhã na
hora do almoço quando retornava da aula.”
4. EXAME MENTAL

Periciando chega ao Instituto escoltado por policiais civis. Apresenta-se em boas condições
de higiene corporal, trajando vestes apropriadas, sem esmero pela aparência. Mostra-se
cooperativo com a entrevista, respondendo às perguntas com excesso de detalhes. Pensamento
lentificado e prolixo. Globalmente orientado. Sem distúrbios da atenção, memória ou
motricidade. Não verbaliza ideias delirantes nem parece experimentar alucinações de qualquer
natureza. Raciocínio claro. Juízo crítico de realidade preservado. Pragmatismo mantido.
“Gostaria de poder obter a minha liberdade de imediato e procurar um apoio psicológico
independente da Justiça. Pretendo procurar o Serviço de Psicodrama de Brasília onde existe uma
possibilidade de fazer um pagamento mínimo. Não que eu vá cometer (novamente o delito),
mas para que eu possa me conhecer, para que eu não caia nessa tentação de novo. Com certeza
teria uma ajuda (financeira) da minha madrinha. Eu não posso dizer que não vou mais fazer
nada errado porque eu já saí e retornei para o Sistema. Mas, eu já perdi a minha saúde e a
minha moral. Lá dentro (da prisão) a gente é desprezado, discriminado pelo meu problema.
Espero ser uma pessoa digna de poder ir para rua.” Apresenta tumoração em região axilar
esquerda compatível com adenomegalia.

5. RELATÓRIO SOCIAL DA VEP

O relatório emitido pela Psicóloga xxxx no dia 17.09.08 sugere que o sentenciado seja
internado em uma das três instituições citadas que possuem convênio com o SUS em SP ou MG
(Instituto xxxx, Clínica xxxx ou Sanatório xxxx).

6. CONCLUSÃO

Trata-se de periciado portador de perturbação da saúde mental incurável no atual estágio


da medicina. Necessita de efetivo tratamento médico e psicológico. A finalidade da psicoterapia
seria fortalecer estratégias para se manter abstêmio do contato sexual inadequado.Embora o
uso de psicofármacos não tenha impacto cognitivo, ajudaria a controlar o impulso/compulsão
que caracteriza a pedofilia. Essas medidas terapêuticas poderão ser oferecidas em outra
estrutura que não a prisional, desde que o examinado não tenha acesso a menores.

8. Desenvolvimento Mental Incompleto


É inimputável o menor de idade até dezessete anos, onze meses e vinte e nove dias (passa
a ser imputável o indivíduo que praticar delito, a partir do primeiro mi-nuto do dia do
aniversário de dezoito anos, caso não padeça de transtorno psiquiátrico). Se um menor de
dezoito praticar um ato infracional que leve alguém a óbito, será inimputável mesmo que a
morte só ocorra quando o agressor já for maior de idade.

A criança (até doze anos), ou adolescente, que vem encaminhado pela Vara da Infância e
da Juventude, para exame, comete diversos tipos de atos infracionais: dano ao patrimônio
público, furto, roubo, lesão corporal, homicídio, estupro... Quando se trata de menor, o
diagnóstico formulado é de distúrbio de conduta - F 91 CID 10. Só se fala em transtorno de
personalidade a partir dos dezoito anos completos.
Chega escoltado por agentes da Delegacia da Criança e do Adolescente/DCA ou do CAJE,
outras vezes, acompanhado por familiar, com determinação judicial, para que procedamos ao
exame psicológico e psiquiátrico. O objetivo da avaliação é informar à Justiça se o infrator
padece de desenvolvimento mental atrasado, se é portador de outro transtorno mental, o grau
de periculosidade e qual o tipo de tratamento (medida socioeducativa) mais adequado.

Ao exame mostra-se agressivo, irreverente, descortês. Quando acompanhado pela mãe, ou


outro responsável, não hesita em desmenti-los. Por trás desse comportamento desafiador,
pode apresentar um histórico de abandono e maus-tratos, evasão escolar e transgressão a
normas, desde muito cedo.

O Laudo basicamente não difere do de um adulto e a conclusão poderá ser:

“Trata-se de criança (ou adolescente) portadora de desenvolvimento mental incompleto,


condição que a torna inimputável. Necessita de acompanhamento psiquiátrico (nos casos mais
graves), psicológico e social que poderá ser oferecido em regime (ambulatorial ou) de
internação em instituição apropriada, devido à sua alta periculosidade.”

O indivíduo surdo-mudo pode figurar como vítima de abuso sexual. Por outro lado, pode se
envolver em pequenos furtos, servir de “mula” para traficantes, ou praticar lesão corporal
contra pessoas do seu convívio, por interpretação defeituosa da comunicação. Mesmo para a
pessoa familiarizada com a linguagem labial, a compreensão pode ser imperfeita porque a
entonação, que modifica o sentido das palavras, não está ao seu alcance.

Essas perícias são pouco frequentes e, quando ocorrem, são intermediadas por pessoas
que dominam a linguagem brasileira de sinais/LIBRAS. Somos atendidos com presteza, ao
solicitarmos um professor do Centro Educacional da Audição e Linguagem/CEAL. O trabalho
requer certa improvisação, pois grande parte desses periciandos não é alfabetizada e
desconhece a linguagem de sinais.

A surdo-mudez poderá torná-lo semi-imputável ou inimputável, dependendo do grau de


comprometimento psíquico. Se for maior de idade, ser-lhe-á imposta uma medida de segurança
ambulatorial, ou em regime de internação (na ATP).

No caso em que aparece como vítima de crime sexual, a perícia é solicitada pelo delegado.
Compete-nos informar se o periciando possui capacidade de consentir que com ele se pratique
ato sexual e qual o dano psíquico causado pelo abuso que sofreu.

Com relação ao silvícola não aculturado, jamais tivemos um caso real.

9. Desenvolvimento Mental Retardado


Os crimes praticados por portadores de desenvolvimento mental retardado geralmente
são de baixo potencial ofensivo (pequenos furtos, porte ou armazenamento de droga para
alguém...), mas podem ser de natureza sexual, ou contra a vida. Por eles serem facilmente
influenciáveis, podem ser utilizados como cúmplices em qualquer tipo de delito. Quanto mais
grave a enfermidade, menor a incidência criminal, em parte pela limitação física que acomete
esses indivíduos.
Insistimos, só falamos em desenvolvimento mental retardado, se o sujeito for maior de
dezoito anos. Como vimos, o menor de idade tem sempre desenvolvimento mental incompleto,
que pode ser normal ou atrasado (Transtorno do desenvolvimento psicológico F 80 – CID 10).

O periciando que apresentar inteligência abaixo da média populacional (QI entre 70 e 90) é
imputável, o retardado leve (QI de 50 a 69) é semi-imputável e o retardado moderado e grave
(QI abaixo de 50) é inimputável. Nas perícias criminais é essencial definir o grau de
comprometimento cognitivo pela psicometria, a menos que seja muito evidente ao exame
clínico.

Dependendo da gravidade do retardo, os dados da anamnese são complementados, ou


fornecidos na íntegra por familiares. No exame mental, observamos alteração das funções
mentais em intensidade variada. Quanto mais severa a deficiência, mais fácil a perícia. Tanto o
indivíduo que possui inteligência abaixo da média quanto o retardado leve podem tentar
maximizar suas limitações, com a intenção de livrar-se da pena. Ocorre que, de qualquer forma,
o primeiro não terá redução da pena e o segundo, dependendo do grau de periculosidade, terá
a pena reduzida de um a dois terços, ou cumprirá medida de segurança. Descreveremos na
Inspeção Física os estigmas físicos associados ao retardo mental.

Trata-se de periciado portador de desenvolvimento mental retardado em grau moderado,


condição que compromete inteiramente suas capacidades de entendimento e
autodeterminação, tornando-o inimputável. Necessita de tratamento médico, de
acompanhamento psicopedagógico e do apoio dos familiares por tempo indeterminado. Sua
periculosidade está vinculada ao transtorno mental.”

Mulheres com desenvolvimento mental retardado também figuram como vítima em


crimes sexuais. Para que o sujeito acusado de manter relação sexual, sem violência, com maior
de catorze anos, seja indiciado por crime de estupro, é preciso que o perito refira-se à
capacidade de consentimento da vítima e esclareça se seu transtorno mental pode ser
percebido por leigo em medicina.

“Trata-se de periciada portadora de desenvolvimento mental retardado grave, condição


que a torna inteiramente incapaz de consentir que com ela se pratique ato sexual. Sua
debilidade pode ser percebida por leigo em medicina.”

Quando a vítima de abuso sexual é criança ou adulta, com retardo, e o crime não deixou
vestígios (ao ser examinada pela sexologia forense), antes de indiciar o acusado por crime de
estupro, o delegado, algumas vezes, pergunta se “é possível que a pericianda esteja inventando
o fato”. Possível é, mas nunca dispomos de elementos para responder a esta questão, nem
cabe a nós elucidar se o delito realmente ocorreu.

10. Dependência de Drogas


O exame de dependência toxicológica é solicitado sempre que há dúvida se o indivíduo
flagrado, trazendo consigo, guardando ou comercializando drogas ilícitas, é ou não dependente
químico. Esta condição é aventada pelo próprio acusado que, no ato da prisão, alega,
independentemente da quantidade apreendida, que a droga é para seu uso. Essa afirmação
deve-se ao fato de a Lei 11.343/06 ter trazido a despenalização ao “crime” de possuir drogas
para consumo próprio.

Estimamos que, em nosso Serviço, apenas cerca de cinco por cento dos indivíduos
submetidos a exame de dependência toxicológica sejam dependentes químicos. Os demais são
apenas usuários, às vezes, nem isso.

O que na clínica chamaríamos de dependente leve, na prática pericial, será um usuário


nocivo, diagnóstico que não altera sua imputabilidade. Mantém uma relação estreita com a
droga, porém não desenvolveu as duas condições que são os pilares da dependência química:
tolerância e abstinência. O uso pode ser diário, mas o indivíduo exerce um controle em relação
à quantidade, local, horário em que deseja consumir. Nunca se submeteu a tratamento
especializado, embora, possa ter estado internado em instituição religiosa (sem assistência
médica), destinada à recuperação de “dependentes”. O relato dessas pessoas é circunstancial
no que concerne ao tempo de uso, à quantidade, à frequência e aos efeitos da droga que
utiliza, em total dissonância com o exame clínico. Estão preservados os lazeres, o convívio com
amigos, algum tipo de atividade remunerada, ainda que ilegal. Não houve necessidade de
atendimento médico, quando interrompeu compulsoriamente, ou diminuiu drasticamente o
consumo da substância, na prisão; os sintomas referidos não são compatíveis com a abstinência
da droga utilizada. Por exemplo: o examinando diz que usava grande quantidade de merla, por
longo período, no entanto, refere que perdeu peso, depois que chegou ao presídio.

O relato do periciando, ou de familiares, não é suficiente para afirmarmos que ele seja
realmente usuário de droga; é necessário que tenhamos exame laboratorial, comprovando a
existência de metabolitos no sangue, ou na urina. Do contrário, diremos apenas “Refere uso
de...”

O fato de estar sob efeito de droga, no momento do crime, em nada altera sua
imputabilidade, a menos que tenha sido por caso fortuito, ou força maior.

Consideramos dependente moderado aquele que apresenta significativo prejuízo


funcional. Envolve-se em furtos e roubos que muitas vezes não têm o desfecho esperado. Em
função do estado de saúde debilitado, é facilmente contido pela vítima ou transeuntes. A
família se desfez, o trabalho honesto há muito se perdeu, as atividades prazerosas limitam-se
às ligadas ao consumo da droga. É possível constatar os efeitos danosos no corpo, tanto por
meio de exames bioquímicos e de imagem, como por meio do exame clínico. Já se observam
sinais de comprometimento das funções mentais (memória, atenção, raciocínio...) e
neurológicas (equilíbrio, coordenação...). O mais importante: são consideráveis os registros
médicos de internações em instituições de saúde, motivadas por distúrbio de comportamento e
atendimentos em pronto-socorros, por overdose, ou síndrome de abstinência. Inúmeras foram
as tentativas de tratamento médico malsucedidas. Por ocasião da prisão, quando o consumo da
droga é drasticamente reduzido ou interrompido, a crise que se segue requer atendimento
médico e os sintomas descritos são compatíveis com a ausência da referida droga. O relato da
mãe é comovente; muitas vezes é ela quem busca auxílio da Justiça. Prefere o filho preso, única
forma de mantê-lo vivo, fora do alcance dos traficantes.

Quando um periciado é considerado dependente químico, em grau moderado, equivale a


dizer que ele tem uma perturbação da saúde mental que não altera seu entendimento, porém,
compromete parcialmente sua autodeterminação. É, portanto, semi-imputável e necessita de
tratamento médico e acompanhamento psicossocial, em regime de internação em local de
onde não possa evadir-se. Infelizmente, no Distrito Federal não existe hospital de custódia, e
esse indivíduo vai se somar aos tantos outros que estão presos, sem o devido tratamento.

A dependência grave é mais conhecida do psiquiatra clínico. Tamanha é a fragilidade física


e a desorganização psíquica desse indivíduo que praticamente não se envolve em crimes.
Completamente escravizado pela droga, tem a volição inteiramente comprometida. Todas as
suas ações limitam-se à aquisição da droga, não raramente, injetável. Restringe-se a cometer
furtos de objetos para trocar nas bocas de fumo e a se prostituir com o único objetivo que rege
sua vida, conseguir a droga. Mesmo estando preso, há meses, teoricamente sem usar drogas,
seu aspecto denuncia um estado geral precário. Emagrecido, trêmulo, extremamente ansioso,
com associação frouxa das ideias, costuma minimizar, ou mesmo, negar o hábito tóxico. A esse
indivíduo cabe a inimputabilidade. Sua condição clínica exige inter-nação em hospital onde
exista vigilância constante, sem a qual, facilmente, buscará pela droga.

É importante não confundir um estado de intoxicação com um transtorno psicótico. A


psicose induzida por drogas, como vimos, anteriormente, também é considerada uma doença
mental e torna o indivíduo inimputável; contudo, a intoxicação voluntária não altera sua
imputabilidade. Quando, na pesquisa em prontuário, o perito constata a ocorrência de um
atendimento emergencial, ou uma breve internação, nas vésperas do crime, deve atentar para
a diferença de uma internação mais prolongada para tratar uma psicose tóxica. O psiquiatra do
pronto-socorro, diante de uma intoxicação aguda por droga excitante do sistema nervoso,
como a cocaína, pode interrogar uma psicose naniatiforme. No entanto, dois ou três dias
depois, o paciente recebeu alta assintomático. Fica claro para o perito que a agitação que
motivou a internação não se deveu a uma psicose que não se reverteria completamente nesse
curto espaço de tempo, mas, sim, a uma intoxicação aguda.

Caso de não dependente de droga


1. IDENTIFICAÇÃO XXXX

2. DENÚNCIA

Lê-se às folhas 02 a 04 dos autos que no dia 25.02.10, o denunciado vendeu para o usuário
xxxx uma porção de crack e mantinha em depósito em sua residência sete porções da mesma
substância perfazendo um total de dois gramas e vinte centigramas. Está incurso nas penas do
artigo 33 da Lei 11.343/2006.

Os dados descritos a seguir foram fornecidos pelo próprio periciando em entrevista


realizada neste IML no dia xxxx depois de cientificado de que suas informações não estarão
sujeitas a sigilo médico e alertado quanto ao direito de permanecer calado diante de qualquer
pergunta que lhe for dirigida.

3. VERSÃO DO ACUSADO

“Eles me pegaram na porta da minha casa fumando. Passou um cara, eles disseram que eu
vendi droga para esse cara, sendo que eu nem tinha visto ele passar porque eu estava
alucinado. Sempre fui de usar, nunca fui de vender não”.

4. ANTECEDENTES FAMILIARES

Não chegou a conhecer o pai. “Ele morreu do coração quando eu estava na barriga da
minha mãe”. Mãe viva com sessenta anos, pensionista, goza de boa saúde. O periciando é o
caçula de cinco filhos, quatro homens e uma mulher. Todos os irmãos estão vivos. “Tem um que
é perturbado da cabeça, se trata no HPAP. Quando falta o remédio ele tira roupa e sai a pé.
Tem outro que foi preso roubando, 157, esse usa droga. Tem outro também que é mudo e
surdo. Quem cuidou de nós foi uma irmã mais velha que é de outro pai”. Desconhece caso de
suicídio e homicídio entre os familiares.

b) CURVA DE VIDA

Nasceu de parto natural, a termo, no Hospital Regional de xxxx. Ignora condições de


desenvolvimento psicomotor. Acredita que não foi acometido pelas viroses comuns da infância.

Iniciou a vida acadêmica com cinco anos de idade. Nega punição por indisciplina na escola.
Refere várias reprovações, mas não se recorda em que séries. “Fiz até a quarta, fiquei no meio.
Parei com dezessete anos”.

Nunca exerceu atividade laborativa formal. Conta que começou a trabalhar com dezesseis
anos como ajudante de serralheiro. “Passei uns três meses e saí porque estava mexendo com
droga. Vigiava carro também”.

Não sabe informar quando se tornou púbere. Primeira relação sexual com dezessete anos.
Nega contato homossexual. Nunca morou com companheira nem tem filhos. “Sempre morei
com a minha mãe”.

Fuma cigarros de tabaco desde os catorze anos, atualmente meia carteira por dia. Nega
consumo de álcool. Afirma que começou a cheirar thinner e cola aos treze anos. “Com catorze
anos passei para merla. Depois que eu completei meus dezessete, parei o thinner e a merla e fui
para o crack. Parei porque estou preso. Enquanto tem, eu estou usando. Fumo dez reais e vou
atrás de mais dinheiro para comprar mais. Fico assustado, agoniado (enquanto está
intoxicado). Fico sem usar só um dia, quando não tenho dinheiro. No meio da semana uso
quando chego em casa, dentro de meu quarto. Quando chega umas seis horas da tarde, que eu
vejo que já tenho dinheiro, passo no lugar que vende e vou para casa. A última vez que eu usei
foi no dia que fui preso. Quando parei (por ocasião da prisão), senti abstinência, agonia de
querer usar e não ter. Fico pensando nela, tenho que fumar um cigarro (de tabaco) para
esquecer e conversar com um colega. Agora não sinto mais não. Nunca precisei roubar nem
tirar coisa de casa, só vendo coisa minha. Roupa, calçado que minha mãe me dá. Nega
atendimento em pronto-socorro por uso excessivo de droga. Diz que permaneceu dois meses em
uma instituição evangélica destinada a recuperação de dependente químicos. “Foi no ano
passado, na xxxx em xxxx/ DF”.

Descreve-se como uma pessoa sociável e trabalhadora. “Sou tranquilo, gosto mais de estar
na rua, tenho muitos amigos. Trabalho todo dia, só paro no domingo. Fico em casa dormindo e
assistindo televisão, no domingo tenho tempo para relaxar, para me alimentar. Quando estou
vigiando carro ali no sol, me sinto batalhador”.

Refere envolvimentos anteriores com a Polícia. “Na DCA eu fui uma vez que eu briguei com
meu irmão. De maior, eu fui só duas vezes na 25ª (DP) por causa que eles me pegaram na rua
com crack, mas no mesmo dia me soltaram”.

Nega passado cirúrgico, convulsivo e traumático com perda de consciência. Nega trata-
mento psiquiátrico. Assegura que nunca usou medicação controlada.

c) HISTÓRIA CLÍNICA

“Me considero viciado porque tem muito tempo que uso e não consigo parar. Parei só
quando estava na clínica (instituição religiosa), depois me envolvi de novo (afirma que nunca
usou na prisão). Cheguei na cadeia estava só o osso.”

5. EXAME MENTAL

Periciando chega ao Instituto escoltado por policiais. Aguarda a chamada com adequação.
Apresenta-se em boas condições de higiene corporal, trajando vestes apropriadas com
aparência simples. Diz não ter noção a que se destina a perícia. Mostra-se cooperativo com o
trabalho pericial. Consciência lúcida. Globalmente orientado. Humor eutímico. Pensamento
coerente, sem alteração de curso, ou de conteúdo. Não verbaliza ideias delirantes nem parece
experimentar alucinações de qualquer natureza. Inteligência mediana. Juízo crítico de realidade
preservado. Pragmatismo mantido, entretanto, não expressa planos concretos para o futuro.
“Imagino parar de usar isso aí e arrumar um emprego para mim trabalhar. Correr atrás”.

6. INSPEÇÃO FÍSICA

Periciando em bom estado geral, tem compleição física normolínea. Eupnéico,


normocorado, hidratado, acianótico, anictérico, sem edemas ou dismorfias. À ectoscopia
observamos cicatriz ovalada em região deltoideana esquerda compatível com queimadura, que
atribui a acidente na infância. Ausência de outros estigmas de interesse médico-legal. Fala,
marcha, equilíbrio e coordenação sem anormalidades.

7. ENTREVISTA COM A IRMÃ XXXX NO DIA XXXX

“Na época de escola nunca foi dedicado, tinha falta de interesse. Repetiu de ano várias
vezes, minha mãe era chamada porque ele aprontava, matava aula. Por volta dos onze doze
anos, começou a andar com amigos estranhos e a cheirar cola. Já não era tão dedicado, passou
para o desinteresse total. Nem completou direito a terceira série. Largou o colégio e foi vigiar
carro. Com a Polícia teve alguns episódios que eu só ficava sabendo depois. Em 2009 a Polícia
levou ele, depois soltaram, não sei o que ele fez. No começo desse ano, a Polícia achou duas
pedras com ele, mas ele só passou uma noite na delegacia. De ficar preso mesmo, a primeira
vez foi essa. Dessa vez agora, pegaram ele na frente da minha casa. As pessoas (compradores)
não iam dentro da casa da minha mãe. Tem uma quadra, a gente desconfia que era lá que ele
vendia (droga). Na verdade eu não quero me comprometer para não ter retaliação. De noite
ninguém dormia. Era gente chamando ele na porta, carro, bicicleta... Algumas vezes ele ficava
lá fora esperando, outras vezes ele estava lá dentro, os compradores chamavam ele. Anoiteceu,
começava o inferno. Ninguém consegue dormir por causa da confusão, do barulho. Nos últimos
tempos entrava dentro de casa sete horas da manhã. Passava a noite usando e vendendo. De
dia era mais disfarçado, mas de noite era demais. Depois da cola veio o thinner, com quinze veio
a maconha. Em 2008 ele vendeu o botijão de gás lá de casa, foi a única vez, depois disso nunca
mais tirou nada. O crack foi o último, percebi em 2009. Tinha algum lugar que ele guardava.
Levantava meio-dia, uma hora. À tarde também era entrando e saindo de dentro de casa. Antes
de 2009 era normal, depois começou a ficar agressivo. Nunca trabalhou fichado, a preguiça é
mortal. Fazia só um bico, ajudava num churrasquinho de vez em quando. Ao mesmo tempo que
ele vendia, usava. Nunca chegou a bater em ninguém dentro de casa não. Teve dia de chegar
drogado e quebrar as coisas dentro de casa. Em hospital ele só foi quando machucou o braço e
quando foi atropelado. Com psiquiatra ele nunca tratou. Em setembro de 2009 ele ficou menos
de um mês na xxxx em xxxx, mas lá é evangélico, não tem remédio não. Saiu porque começou a
se desentender lá dentro, ficar agressivo com o pessoal, acabou sendo expulso. Ele falava que
tinha parado uns dias, umas semanas, mas eu não acreditava porque ele sempre mentiu muito.
Ele sabia do risco, da consequência, só que não acreditava que acontecesse, ele mesmo falava
que nunca seria preso”.

8. CONCLUSÃO

Trata-se de periciado com histórico de uso de múltiplas drogas, que apresenta falha na
estruturação do caráter, condições que à época do delito, não comprometiam suas capacidades
de entendimento e autodeterminação. Era, portanto, imputável.

9. RESPOSTAS AOS QUESITOS DO MINISTÉRIO PÚBLICO

1) Entrevistas e exame clínico.

2) Sem elementos para afirmar que o periciado é usuário de drogas.

3) Não é dependente de drogas.

4) Não é dependente de drogas.

5) Era inteiramente capaz de entender o caráter criminoso do fato.

6) Era inteiramente capaz de determinar-se de acordo com esse entendimento.

7) Possuía plena capacidade de entendimento.


8) Possuía plena capacidade de entendimento.

9) Possuía plena capacidade de autodeterminação.

10) Possuía plena capacidade de autodeterminação.

11) Não foi realizado exame toxicológico por ocasião da prisão, todavia, este fato em nada
altera nossa conclusão.

A Defesa adotou os mesmos quesitos do Ministério Público.

Caso de dependente de drogas


1. IDENTIFICAÇÃO XXXX

2. HISTÓRIA CRIMINAL

Lê-se às folhas 11 a 13 dos autos que no dia xxxx, por volta das 07h00, o denunciado foi
preso nas dependências da Universidade de Brasília, próximo ao estacionamento do ICC Norte,
tentando subtrair parte da fiação elétrica pública. Estando incurso nas penas dos artigos 155 c/c
14 do CPB.

3. ANAMNESE

Os dados descritos a seguir foram colhidos do próprio periciando em entrevista realizada


neste IMLLR, no dia xxxx, depois de advertido de que suas declarações não estarão sujeitas a
sigilo médico e cientificado a respeito do direito de permanecer em silêncio diante de qualquer
pergunta.

a) ANTECEDENTES FAMILIARES

Pai vivo com sessenta e quatro anos, garçom, sofre de doença cardíaca. Mãe viva com
sessenta e cinco anos, do lar. “Minha mãe tem cisticercose, se queima direto, constantemente
ela desmaia. Eles ficaram separados de 86 pra agora, 98 (a perícia foi realizada no curso do ano
de 2006). Estão juntos de novo.” O periciando é o terceiro de uma prole de cinco filhos, três
homens e duas mulheres. Todos são sadios. “O mais novo foi preso uma vez por causa de um
furto numa loja lá em Goiânia.” Os demais levam vida equilibrada. Possui uma meia-irmã mais
nova por parte de pai, que também goza de boa saúde. Desconhece caso de doença mental
assim como de abuso de substâncias tóxicas entre os familiares.

b) CURVA DE VIDA

Ignora as condições de gestação, nascimento e desenvolvimento psicomotor. “Eu bem


novinho já me sentia mal com negócio de hospital. Disseram que foi cesária, depois que foi
normal mesmo...” Mudou-se de Goiás para Brasília com oito anos de idade juntamente com a
família. Não sabe o motivo da migração.
Iniciou vida escolar com nove anos. “Tô tentando ser aprovado pra sexta. Tô estudando
não. Perdi meu diploma escolar. Fui usar droga, deixei a bolsa no meio do cerrado, cataram lá.
Eu quase passei pra quinta. Já estudei quatro vezes na quinta série. Não consegui passar por
causa de cem pontos. Quando eu tava estudando, fui preso lá na UNB. Eu tive uma suspensão lá
por causa de um tiro de linguinha que eu dei na bunda da professora. Dificuldade ainda tô
tendo, dificuldade de aprender. Eu pedia a um e outro na rua livro pra estudar, guardava
tudinho, queimou tudinho lá. O fogo pegou, não sei como foi não. Deixei a vela lá e tava
cozinhando. Eles tão me caluniando aí, não sabem de que eu sou capaz.”

Não prestou o serviço militar obrigatório. “Fui dispensado, excesso de contingente.”

Diz que começou a trabalhar com doze anos, como vendedor em uma banca de jornais.“Já
trabalhei bastante já. Depois fiquei só entregando panfleto. Depois fui vigiar carro. Depois fiquei
empacotando compra no Jumbo, quando tinha o Jumbo. Depois carregava carrinho cheio de
tijolo, mexia massa, fazia andaime, quebrava parede... Eu quero saber se tem um jeito de eu
receber um dinheiro pra comprar um remédio pra ver se tira essa sequela que fica rangendo na
cabeça e essa dor da coluna que fica tremendo assim. Se chama polivitamínico. Meu pai foi na
farmácia e não quis comprar. Quero ver se recebo um dinheiro de seu xxxx que tá dizendo que é
tio da minha irmã. Meu cunhado que é sobrinho dele, chama xxxx. Ele queria me prender,
aqueles ignorantes! Quebrei só um espelho na casa dele. Saiba pelo menos ser um mentiroso de
bom temperamento! Tirando minha mãe, minha família toda é burra. Meu pai é muito é burro,
cabeçudo, carrancudo velho. Trabalhei também carregando metalão, fazendo carga nos
caminhão. Trabalhei também levantando o muro do colégio que eu estudava. Trabalhei
também roçando mato na fazenda da finada minha tia. Quase que eu tinha era matado meu
primo lá com um facão. O cara vem me xingar...”

Assegura que nunca namorou, nunca morou com companheira nem tem filhos. “Tudo tá
difícil. Namorar, trabalhar... Minha família que só quer me levar naquele HPAP que dá é três
injeção por dia. Não sei porque eu ainda tô preso, o que é que o juiz quer comigo? Se eu
continuar nesse caminho, vou terminar na caixa prego. Sem mulher, sem profissão...”

Conta que começou a fumar com catorze anos. “Beber foi com quinze. Trabalhava de
servente, o cara me chamou pra tomar uma... Mas nunca matei ninguém. Roubar, não vou
dizer, já fiz muito descuido por aí. Nunca usei droga não. Só maconha desde os dezoito anos.
Merla não fumo não. Pó, já cheirei mas não sou usuário disso aí não. Parei a maconha com
vinte e oito anos. Olha a minha cor morena... Parei porque meu pai começou a me xingar de pé-
inchado, vagabundo, bandido. Veio na mente de querer matar ele. Ele é muito é descarado! Se
fosse outro, já tinha matado ele. Não vou ficar sendo abusado porque sou pobre. É verdade
mesmo, cheirava cola. Que eu saiba, é só isso. Fui viciado até vinte e oito anos. Agora não sou
mais. A última vez que eu usei maconha foi na rua que eu achei um pacotinho na rua. Na
cadeia? Quero saber de cadeia não, tia.”

Descreve-se como uma pessoa pacata. “Eu gosto de andar de ônibus, andar no Parque da
Cidade, de ver parque de diversão. Gosto de ficar na praça da xxxx, de vez em quando compro
um pastel. Tenho vários amigos. Tinha umas más amizades, mas não quero mais não. A gente
bebia num terminalzinho que tem lá. Gosto de balinha de hortelã, até sorvete com pipoca e
dropes de caramelo misturado, gosto de tudo.”

Refere outros envolvimentos com a Polícia. “Foi por causa de furto da Só Frango e da UNB.
Era por causa de arrombar o mercado, quebrando carro dos outros, roubando no Carrefour,
roubando no Conjunto Nacional... Trocava (o produto do furto) por outra coisa, droga não.”

Sobre seus antecedentes patológicos, afirma: “Tenho asma, sou diabético, epiléptico,
doença no sangue e dor na coluna por causa que eu tive meningite. O médico disse que eu
tenho que operar uma hérnia que eu tenho aqui (região genital). Não quero mais ser internado
naquele HAPAP não. Fui internado várias e várias vezes. Era problema mental mesmo, ficava
nervoso em casa, agressivo. Uma vez foi porque botei fogo na minha casa e a outra foi porque
subi numa torre de alta tensão. Só fui uma vez na xxxx. Fui porque eu quis, tava meio
encabulado. Foi chamar a Polícia, não devo nada a Polícia não.”

c) HISTÓRIA DA DOENÇA ATUAL

“Não sinto nada não. As dor da coluna já passou. Tomo todo dia os remédios: Haldol,
Carbamazepina, Fenergam e Diazepam. Sinto mais tranquilo, fica balançando o corpo lá. Nem
minha mãe nem meu pai quer me visitar não. Ele é um vagabundo safado. Não me diz nem
onde mora. Se morrer, não quero saber se vai enterrar, quando vai enterrar. Não é pai não, é
moleque.”

4. EXAME MENTAL

Periciando chega ao Instituto escoltado por policiais civis. Apresenta-se em regulares


condições de higiene corporal, trajando vestes apropriadas, com aparência desleixada. Não tem
noção a que se destina a perícia. Sua postura é inquieta, embora permaneça sentado na cadeira
indicada. Mostra-se pouco cooperativo com a entrevista, fornecendo respostas inconsistentes.
Seu discurso é tangencial. A todo momento tentamos trazê-lo de volta ao tema central, o que
torna o trabalho pericial desgastante. Consciência vigil. Parcialmente orientado com relação a
si, ao tempo e ao espaço. Atenção, memórias, motricidade e cognição comprometidas. Humor
instável: ora dócil, ora hostil falando em tom de voz elevado e ameaçador. Pensamento algo
desorganizado, de curso acelerado e conteúdo frouxo. Não verbaliza ideias delirantes
sistematizadas nem parece experimentar alucinações de qualquer natureza. Raciocínio árido.
Juízo crítico rebaixado. Não apresenta planos elaborados para o futuro. “Quero entrar num
curso de eletricista, pedreiro e mecânico pra trabalhar. Aquela ATP lá parece um castelo de
terror.”

5. INSPEÇÃO FÍSICA

Periciando em regular estado geral, tem compleição normolínea. Fácies edemaciadas,


escleróticas ictéricas, mucosas desidratadas e hipocoradas. À ectoscopia observamos: 1.
deformidade em quinto quirodáctilo direito, que atribui a agressão com facão; 2. tatuagem mal
definida de “crânio saindo uma cobra de dentro” na região deltoideana direita; 3. tatuagem de
“coração” na região escapular direita; 4. cicatrizes multiformes em face e corpo que atribui a
pequenos acidentes. Manchas castanho-escuras nas falanges distais do primeiro e segundo
quirodáctilos de ambas as mãos, compatíveis com queimadura de cigarros, próprias do fumante
inveterado. Ausência de outros estigmas de interesse médico-legal.

6. EXAME COMPLEMENTAR

Não foi localizado em nosso arquivo exame toxicológico referente ao periciando (não se
colheu urina por ocasião do exame cautelar por não se tratar de crime diretamente relacionado
a drogas).

7. OUTROS SUBSÍDIOS

Constam nos autos cópias de laudos, relatórios, atestados, receitas e prontuários relativos
ao periciado que comprovam seu comprometimento psíquico desde a adolescência quando
começou a apresentar sérios distúrbios de comportamento associados ao abuso de álcool e
drogas ilícitas. Sua história é pontilhada por atos delituosos cometidos dentro e fora do âmbito
familiar. Conta com várias internações psiquiátricas compulsórias em momentos de agudização
de quadro psicótico crônico vez que nos períodos intercríticos não aderia ao tratamento nem
abandonava os hábitos tóxicos.

8. DIAGNÓSTICO

Dependência de múltiplas drogas. F 19.2 - CID 10.

9. CONCLUSÃO

Trata-se de periciado dependente de drogas em grau avançado, condição equivalente a


doença mental. À época do delito em questão, suas capacidades de entendimento e
autodeterminação encontravam-se inteiramente comprometidas. Era, portanto inimputável.

10. RESPOSTAS AOS QUESITOS:

a) DO MINISTÉRIO PÚBLICO

1. O réu era, ao tempo da ação criminosa, maio de 2005, portador de doença mental?

RESPOSTA: Sim.

2. Em caso positivo, qual a doença?

RESPOSTA: Vide Diagnóstico.

3. Em caso negativo: apresentava ele desenvolvimento mental incompleto ou retardado?

RESPOSTA: Prejudicado.

4. Em virtude da doença mental ou do desenvolvimento mental incompleto ou retardado,


era ele inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato que ele cometeu?
RESPOSTA: Sim.

5. Se era capaz de entender, estava, contudo, inteiramente incapacitado de determinar-se


de acordo com esse entendimento?

RESPOSTA: Prejudicado.

6. Negativo o primeiro quesito, era o agente, à época do fato, portador de perturbação da


saúde mental?

RESPOSTA: Prejudicado.

7. Em virtude dessa perturbação, tinha ele a plena capacidade de entendimento da ilicitude


do fato ou de autodeterminação?

RESPOSTA: Prejudicado.

8. Negativos o primeiro, o quarto, o quinto e o sexto quesitos, e afirmativo o terceiro, em


virtude do desenvolvimento mental incompleto ou retardado, tinha ele, à época da ação
criminosa, a plena capacidade de entendimento da ilicitude do fato ou de autodeterminar-se?

RESPOSTA: Prejudicado.

9. O agente é, atualmente, portador de doença mental adquirida após a época do


cometimento da ação criminosa?

RESPOSTA: Não.

10. Positivo o quesito anterior, qual a doença mental?

RESPOSTA: Prejudicado.

11. Há outros esclarecimentos que os peritos julguem pertinentes? Quais?

RESPOSTA: Nada a acrescentar.

b) DA DEFESA

1. Caso o acusado tivesse discernimento de sua conduta delituosa, ao tempo do crime, teria
ele condições para evitá-la?

RESPOSTA: Prejudicado.

2. O acusado tem conhecimento de como portar-se perante a prática dos atos processuais?

RESPOSTA: No momento apresenta o juízo crítico rebaixado.

3. Caso seja imposta alguma pena ao acusado, teria ele o discernimento para entender as
consequências dessa pena?
RESPOSTA: No momento, não.

4. O acusado estaria apto a reintegrar-se perante a sociedade?

RESPOSTA: Não.

10. Simulação de Doença Mental


Simular é o ato de aparentar algo que não existe. A fraude é um meio de defesa próprio
dos indivíduos psiquicamente fracos.

Simulação de enfermidade ou patomínia clínica é o processo psicológico caracterizado pela


decisão consciente de demonstrar, por meio da imitação, um trans-torno patológico, com a
intenção de enganar outrem.

Simulação de doença mental é a reprodução voluntária mediante a linguagem, a mímica,


atitudes e ações de um estado psicopatológico inexistente. Só se deve considerar simulação a
que ocorre de forma consciente; os histéricos enganam-se a si mesmos, de forma inconsciente
e involuntária.

Quando um indivíduo tenta acobertar-se sob uma enfermidade mental, há sempre uma
paixão a satisfazer, ou um interesse a servir. A ideia pode surgir dele próprio, de familiares,
amigos, advogados, companheiros de reclusão. Pessoas que estiveram em manicômio, ou
hospital psiquiátrico aproveitam a experiência para simular melhor o transtorno.

Na esfera jurídica, observa-se o simulador no âmbito trabalhista (ex: buscar indenização


simulando psicose após acidente de trabalho); cível (ex: dissimulação de doença para evitar
interdição); e penal (para obter eximente ou atenuante da responsabilidade por seu delito,
geralmente grave, ou na esperança de uma transferência para um local com maior chance de
fuga).

a) Simulação verdadeira, total ou propriamente dita: o indivíduo não alienado finge o


padecimento de enfermidade mental, de acordo com os conhecimentos intuitivos ou concretos
que possui acerca dos doentes mentais.

b) Sobressimulação, supersimulação ou parassimulação: um doente mental co-pia sintomas e


condutas de outros. Não consegue apresentar uma forma clínica bem definida: em geral, são
crises de sua enfermidade acrescida de falsos delírios ou alucinações. A intenção é livrar-se da
repressão penal, ignorando que sua própria doença é suficiente para eximi-lo da pena.

c) Metassimulação, simulação residual ou perseverança: atitude consciente de prolongar


sintomas de um transtorno mental verdadeiro de que se recuperou recentemente para
continuar recebendo auxílio-doença, carinho dos familiares, ou até para não abandonar o
hospital, pela falta de recurso financeiro e afetivo.

d) Pré-simulação, simulação anterior ou preventiva: algum tempo antes de come-ter um crime


planejado, o indivíduo apresenta atos extravagantes, absurdos e incoerentes, para, após a
execução, alegar insanidade mental, contando com o testemunho dos que presenciaram e
conseguiram as vantagens pretendidas.

e) Dissimulação ou simulação invertida: tentativa de um indivíduo ocultar sua enfermidade


mental porque realmente não se sente doente, para evitar a perda da capacidade civil, para se
ver livre da internação e levar a cabo seus propósitos de cometer o suicídio, para obter drogas,
para vingar-se do seu perseguidor imaginário, etc.

Simular não é tarefa fácil. A duração depende não só da vontade do indivíduo, mas da
rapidez com que é descoberta. Se prolongada, acarreta sobrecarga física e psíquica insuportável
que acaba por fatigar o simulador. Predominam as de duração breve, menos de um mês.

O conceito errôneo que o público faz da doença mental leva os simuladores a aparentar
sintomas díspares e a criar quadros psíquicos que não correspondem a nenhuma modalidade
nosográfica da psiquiatria. Creem que qualquer tipo de transtorno mental deve apresentar
quadro rico em incoerências e atos estranhos.

Formas de simulação mais frequentes:

Amnésia: o agente “perde” a memória, não tem consciência do ocorrido, revelando vaga
lembrança do fato delituoso, recordando apenas o que é útil à sua defesa - “a partir desse
momento deu um branco”. O autêntico amnésico tem como verdadeiro tormento a lacuna da
memória que procura recuperar a todo custo.

Psicose: A simulação de uma doença mental é facilmente percebida pelo perito por se
apresentar de forma complexa, bizarra e caricatural, chegando a ser cômica. O simulador
mistura queixas inconsistentes de alucinações (raríssimas vezes um psicótico admite que esteja
alucinando), com uma aparência infantilizada, simulando distúrbio da fala, incapacidade de
manter a boca fechada, sialorreia, etc.

Epilepsia: uma das formas preferidas de simulação, já que não exige permanência, terminada a
crise. Ao simulador é impossível imitar o grito anunciatório, o estupor, as alterações pupilares, a
cianose facial.

Depressão: o simulador queixa-se de desânimo, abatimento e desinteresse por tudo que lhe
trazia satisfação. Entretanto, o isolamento, o choro e a tentativa de suicídio ocorrem em uma
cena banal, discordante da situação. Provoca autolesões sem gravidade.

Mutismo: o indivíduo encerra-se num obstinado silêncio, supondo que, dessa forma, seu
verdadeiro estado de saúde não venha a ser descoberto. Apesar de não falar, obedece às
ordens do examinador, demonstrando que sua percepção está íntegra. A mímica ativa o olhar
que acompanha os movimentos do perito e a postura atenta acabam por denunciá-lo.

Para que o perito chegue à conclusão de que se trata de simulação, inicialmente deve
conquistar a confiança do examinando, com tato e bondade, pois o aparente convencimento do
perito corresponde à alegria interior e ao relaxamento do examinando. Ao mesmo tempo, o
perito precisa estar atento para:
1. Características do delito: a enfermidade tem que se harmonizar com o crime praticado e
com a conduta do infrator imediatamente após o crime. São característicos dos doentes
mentais os delitos de motivação e conteúdo psicopatológico, cuja trama é absurda.

2. Cronologia: suspeitar da “enfermidade” que aparece depois do cometimento de delito


geralmente grave, especialmente quando o indivíduo conhece a marcha desfavorável do
processo. Não descartar a possibilidade de uma reação psicogênica ao cárcere.

3. Anamnese: uma análise criteriosa costuma desvendar a existência de qualquer transtorno


mental. Ao descrever sua história, o simulador incorre em várias contradições. O diálogo é
entrecortado, costuma refletir a respeito do que vai dizer, antes de falar, e as respostas são
evasivas.

4. Exame mental: a expressão, a mímica, o olhar, a atitude, os movimentos, enfim, a


aparência do examinando é de suma importância. O brilho do olhar do delirante X olhar atento
do simulador; a astenia do deprimido X falta de colaboração do simulador; a excitação
ininterrupta do maníaco X vestimentas artificialmente alteradas do simulador; o delírio do
esquizofrênico fortalecido pelas alucinações, acompanhado do conteúdo afetivo inerente à sua
crença (é típico o tom reservado com que o doente se refere à perseguição da qual está sendo
vítima) X o relato espontâneo e indiferente de uma trama desorganizada do simulador.

5. Exame Somático: é impossível para o simulador reproduzir a hipotermia das extremidades,


a hipotensão e a bradicardia do deprimido; a halitose do obnubilado; o baixo peso do
dependente de cocaína...

6. Exames Complementares: os testes psicológicos nos dão o perfil do periciando. A


bioquímica do sangue, função hepática e renal, EEG, CT, IRM descartam ou confirmam um
substrato orgânico.

7. Provas Específicas: a) mostra-se um objeto de uso cotidiano e pede-se ao periciando que o


identifique, ou pergunta-se de que cor é o mar, a neve, o sangue... Qualquer pessoa responde
satisfatoriamente, o simulador diz que não sabe, ou responde errado; b) pede-se que interprete
provérbio simples e realize operações matemáticas compatíveis com seu grau de instrução, o
simulador, da mesma forma, dá uma resposta absurda; c) comenta-se com um colega,
assegurando-se de que o periciando está ouvindo, que está convencido da realidade de sua
doença, mas estranhando a falta de determinado sintoma inventado, o simulador passa a exibi-
lo.

Embora o termo “simulação” apareça na CID como entidade nosográfica, em psiquiatria


forense, não é diagnóstico de transtorno mental (doença mental, perturbação da saúde mental,
desenvolvimento mental incompleto ou retardado). O simulador é um indivíduo “normal”,
tenha ele confessado ou não. A simulação não modifica a imputabilidade do periciado. O perito
não deve insinuar a possibilidade de circunstância agravante ou atenuante pelo fato de simular.

Caso de simulação de doença mental


1. IDENTIFICAÇÃO XXXX
2. HISTÓRIA DO DELITO

a) CONDUTA TÍPICA

Lê-se às folhas 52 e 53 dos autos que no período de xxxx a xxxx (durante seis anos) o
indiciado valeu-se de vantagem econômica consistente no recebimento de aposentadoria por
tempo de serviço a que não fazia jus. Estando incurso nas penas dos artigos 171 c/c 71 do CPB.

b) VERSÕES DO ACUSADO E DO FILHO AOS PERITOS

“Graças a Deus não mexo com ninguém.”

“Acho que ele caiu dentro de um poço lá, machucou a cabeça. Apareceu um advogado que
aposentou ele, depois cortaram a aposentadoria dele.”

3. ANAMNESE

Dados colhidos do Sr. xxxx, filho do periciando em entrevista realizada neste IMLLR no dia
xxxx. O periciando diz nada saber sobre sua família e sua vida pregressa.

a) ANTECEDENTES FAMILIARES

Pais falecidos em idade avançada de causa natural desconhecida. O periciando é filho de


uma prole extensa. Não se sabe quantos irmãos possui nem a ordem de nascimento dos
mesmos. Desconhece-se caso de doença mental entre os familiares.

b) CURVA DE VIDA

Ignora as condições de gestação, nascimento e desenvolvimento psicomotor. Nunca


frequentou escola. “Sabe escrever o nome dele e ler alguma coisinha soletrando”. Com relação
às suas atividades laborativas, afirma: “Ele era lavrador. Foi pra Bahia com oito anos, sempre
trabalhou na lavoura. Tem numa faixa de catorze, quinze anos que nós viemos pra cá e ele veio
também. Quando chegou aqui mexia com bar, tem uns oito anos que ele vendeu tudo e foi
morar em xxxx. Tem na faixa de doze anos que ele foi pra lá, não lembro da data certa não. Lá
em xxxx ele não trabalha não.”

Pouco se sabe a respeito da sua vida afetiva. “Deve ter uns quarenta e dois anos que ele
casou. Minha irmã mais velha tá com quarenta anos. Somos nove filhos.” Nunca cultivou
hábitos tóxicos. Não pratica atividades prazerosas. “Ele só fica em casa, não sai pra lugar
nenhum. Fica ali... quando chega uma pessoa, ele conversa... Antes ele era animado, brincava,
tudo.”

Nega outro envolvimento com a Justiça. Sobre seus antecedentes patológicos, diz: “Que eu
saiba ele só tem Chagas e esse problema que caiu no poço.”

Refere traumatismo craniano com perda de consciência há doze anos. Submeteu-se a


cirurgia abdominal há cinco anos. “A Chagas deu estreitamento no esôfago”. Nega passado
convulsivo. Nunca fez tratamento psiquiátrico ou psicológico. Jamais usou medicação
psicotrópica.

c) HISTÓRIA DA DOENÇA

“Eu ando é os outros me levando pros lugar. Sofri um acidente, bati com a cabeça, de-pois
disso eu... Caí dentro de uma cisterna. Eu não lembro das coisas. O que mais me prejudica é eu
não lembrar das coisas. Sou operado. Eu não tenho médico. O médico que me operou foi do
Hospital de Base, foi problema de Chagas. Que eu operei da cabeça foi aqui mesmo em Brasília
no Hospital de Base. Tomo uns comprimidinho que minha pressão é descontrolada.” Queixa-se o
examinando.

“Tem uns doze anos que ele caiu no poço no Lago Azul. Tava fazendo uma massa com meu
cunhado, vacilou, caiu no poço. Levaram ele desmaiado pro hospital. Foi atendido no Hospital
de Base, parece que fizeram raspagem na cabeça dele. Desse tempo pra cá ele se perde, fica
variado, conta coisa com coisa, é repetindo as palavras... Não tem médico tratando dele. Só fez
esse tratamento no Hospital de Base.” Relata-nos o filho.

4. EXAME MENTAL

Periciando chega ao Instituto acompanhado por um filho, devidamente na hora aprazada.


Apresenta-se em boas condições de higiene corporal, trajando vestes apropriadas. Mantém
atitude teatral. Tenta mostrar-se mentalmente insano através de tremores momentâneos,
esquecimentos seletivos e pausas no discurso. Pouco cooperativo com a entrevista, responde às
perguntas de forma vaga, dificultando o trabalho pericial. Insiste para que chamemos o filho
que inicialmente aguarda na sala de espera e sugere que recorramos aos “papéis” que
comprovam sua doença. Diz não ter noção a que se destina a perícia. “Recebi uma carta
mandando eu vir fazer exame. Eu tô aqui obedecendo a intimação. Não sei que lugar é esse.”
Consciência vigil. Globalmente desorientado, não informa sequer seu nome completo.
Entretanto, quando se reporta à aquisição de possível benefício da Previdência, se expressa com
espontaneidade e demonstra ter a orientação preservada. Humor apático. Pensamento de curso
lento e conteúdo pobre. Não verbaliza ideias delirantes nem parece experimentar alucinações.
Raciocínio árido. Juízo crítico preservado. Pragmatismo mantido: “Se eu receber minha
aposentadoria eu vou poder me alimentar mais e descansar mais minha filha que saiu do estudo
pra trabalhar e só ganha duzentos e noventa reais. Se Deus abençoar e vocês me ajudarem,
posso ir fazer uma visita pros meus filhos que moram na Bahia. Meus filhos tudo nasceram lá,
três homens e seis mulheres. A mulher minha tá com um problema no joelho, ela tem sessenta e
dois anos. O médico deu um papel pra ela operar, mas a mulher do INSS falou que se eu
aposentar, ela não aposenta.” Não apresenta alteração de marcha, fala, equilíbrio ou
coordenação motora sugestiva de doença neurológica.

5. AVALIAÇÃO PSICOLÓGICA

O Parecer Psicológico nº xxxx elaborado neste IML, cuja cópia segue anexa, revelou que o
periciando assumiu conduta não colaborativa com o exame, selecionando suas respostas de
forma a assumir papel de enfermo. Acreditando-se incapaz de realizar os testes propostos,
utiliza-se de argumentos repetitivos e fornece respostas com indicativo de proceder de forma
intencional.

6. PESQUISA EM PRONTUÁRIO MÉDICO

Em pesquisa ao prontuário médico nº xxx do Hospital de Base de Brasília, cuja cópia


encontra-se acostada aos autos, verificamos o que se segue: Por volta das 16h30 do dia xxxx
(três anos antes do ilícito), o paciente deu entrada na emergência daquele serviço com quadro
de fratura e afundamento em região parietal esquerda decorrente de queda. Na ocasião estava
consciente, orientado, sem déficits e sem alteração de pupilas. Em virtude de haver vários casos
com maior gravidade aguardando cirurgia, submeteu-se a craniotomia no dia seguinte. O
procedimento foi iniciado às 12h00 e terminou às 13h00. Foi realizada trepanação ao lado da
fratura, retirada dos fragmentos e plástica de dura-máter. Evoluiu bem e recebeu alta no dia
xxxx (no décimo dia de internação) com orientação para prosseguir acompanhamento no
ambulatório de neurocirurgia. Após sua alta não encontramos outra referência ao traumatismo
craniano.

Existem apenas dois registros de atendimentos ambulatoriais, sendo um em xxxx (três anos
depois da neurocirurgia) na cardiologia e outro em xxxx (no ano seguinte), cuja especialidade
está ilegível. Nessas consultas informa-se que é portador de doença de Chagas e queixa-se de
disfagia. O exame radiológico revelou aumento do volume cardíaco e o médico assistente
solicitou endoscopia digestiva para constatar dilatação esofágica.

7. DIAGNÓSTICO

O examinado não preenche os critérios adotados pela Classificação Internação de Doenças


(CID 10) para caracterizar uma doença mental, uma perturbação da saúde mental nem um
desenvolvimento mental incompleto ou retardado.

8. CONCLUSÃO

Trata-se de periciado idoso que não apresenta sequelas psíquicas decorrentes da injúria
cerebral sofrida há treze anos nem outra condição que comprometa suas capacidades de
entendimento e autodeterminação.

9. RESPOSTAS AOS QUESITOS

a) DA DEFESA

1. Conforme depoimentos das testemunhas de defesa, consta que antes de se aposentar. O


acusado sofreu acidente, vindo a cair em uma cisterna de 10m de profundidade. Nesta queda o
acusado sofreu lesão na cabeça. Com esta lesão o acusado continua a ter suas funções mentais
normais? RESPOSTA: Sim.

2. Com esta lesão o acusado tem condições de realizar qualquer tipo de trabalho pra sua
sobrevivência? RESPOSTA: Experimenta as limitações próprias da idade avançada.

3. O acusado tem plenas funções de tempo, espaço e localização? RESPOSTA: Sim.


4. A lesão causou alguma disfunção na memória do acusado? RESPOSTA: Não.

5. O acusado tem condições de realizar as falsificações constantes em sua CTPS? RESPOSTA:


Sem elementos.

b) DO MINISTÉRIO PÚBLICO

1. Ao tempo dos fatos narrados na denúncia, o Acusado era, por motivo de doença mental,
desenvolvimento mental incompleto ou retardado ou algum outro, inteiramente incapaz de
entender o caráter criminoso dos fatos ou de determinar-se de acordo com esse
entendimento? RESPOSTA: Não.

2. O Acusado, ao tempo dos fatos narrados na denúncia, por motivo de perturbação da saúde
mental ou desenvolvimento mental incompleto ou retardado, estava privado da plena
capacidade de entender o caráter criminoso dos fatos ou de determinar-se de acordo com esse
entendimento? RESPOSTA: Não.

3. Caso positiva a resposta ao 1º ou 2º quesito, que doença mental ou perturbação da saúde


mental atingiu o Acusado e qual a natureza do desenvolvimento mental incompleto que ele
portava e em que intensidade isso o impediu de entender o caráter criminoso dos fatos ou de
determinar-se de acordo com esse entendimento? RESPOSTA: Prejudicado.

4. Quais as características dessa patologia mental, incompletude ou retardamento do


desenvolvimento mental do Acusado e de que maneira esses fenômenos atingem o
comportamento humano, naquilo que possa interessar ao objeto da ação penal, descrito na
denúncia e em seu aditamento? RESPOSTA: Prejudicado.

5. Caso o Acusado seja portador de patologia mental, ela sobreveio aos fatos pelos quais foi
denunciado? RESPOSTA: Prejudicado.

6. Na hipótese de o Réu sofrer de patologia mental superveniente aos fatos que deram origem
à ação penal e considerando que ele viesse a ser condenado, essa patologia seria compatível
com o cumprimento, por parte do Réu, de alguma das penas previstas no Código Penal?
RESPOSTA: Prejudicado.

7. Queiram os Srs. Peritos fornecer outros esclarecimentos que julguem necessários. RESPOSTA:
Nada a acrescentar.

Esperamos que este capítulo tenha despertado o interesse dos leitores pela perícia
psiquiátrica e possibilitado a compreensão do papel do psiquiatra forense, que consiste em
vasculhar os bastidores do psiquismo humano sem condenar escolhas que sabe, dependeram
de múltiplos contextos.

Finalizando nosso texto, deixaremos como reflexão o poema de Bracht, transcrito no livro
A defesa tem a palavra,de Lins e Silva (Extraído do Manual de Psiquiatria Forense de Heber
Soares Vargas).
A infanticida Maria Farrar

Maria Farrar, nascida em abril,

sem sinais particulares,

menor de idade, órfã, raquítica,

ao que parece matou um menino

da maneira que se segue,

sentindo-se sem culpa.

Afirma que grávida de dois meses,

no porão da casa de uma dona,

tentou abortar com duas injeções dolorosas,

diz ela, mas sem resultado.

E bebeu pimenta em pó com álcool,

mas o efeito foi apenas de purgante.

Mas vós, por favor, não deveis vos indignar.

Toda criatura precisa da ajuda dos outros.

Seu ventre inchara, agora a olhos vistos,

e ela própria, criança, ainda crescia.

E lhe veio a tal tonteira no meio do ofício das matinas

e suou também de angústia aos pés do altar.

Mas conservou secreto o estado em que se achava,

até que as dores do parto lhe chegaram.

Então tinha acontecido também a ela,

assim feiosa, cair em tentação.

Naquele dia, disse, logo pela manhã,

ao lavar as escadas, sentiu uma pontada

como se fossem alfinetadas na barriga.


Mas ainda consegue ocultar sua moléstia.

E o dia inteirinho, estendendo paninhos,

buscava solução.

Depois lhe vem à mente que tem que dar à luz e logo sente

um aperto no coração. Chegou em casa tarde.

Mas vós, por favor, não vos indigneis.

Toda criatura precisa da ajuda dos outros.

Chamaram-na enquanto ainda dormia.

Tinha caído neve e havia que varrê-la.

Às onze terminou. Um dia bem comprido.

Somente à noite pode parir em paz.

E deu à luz, pelo que disse, a um filho.

Mas ela não era como as outras mães.

Mas vós, por favor, não vos indigneis.

Toda criatura precisa da ajuda dos outros.

Com as últimas forças, ela disse, prosseguindo,

dado que no quarto o frio era mortal,

se arrastou até a privada, e ali,

quando não mais se lembra,

pariu como pode, quase ao amanhecer.

Narra que a essa altura estava transtornadíssima e meio endurecida,

e que o garoto, o segurava a custo,

pois que nevava dentro da latrina.

Entre o quarto e a privada,

o menino prorrompeu em prantos.

E isso a perturbou de tal maneira, ela disse,


que se pôs a socá-lo

às cegas, tanto, sem cessar,

até que ele deixasse de chorar.

Depois conservou o morto no leito,

junto dela, até o fim da noite.

E de manhã o escondeu então no lavatório.

Mas vós, por favor, não deveis vos indignar.

Toda criatura precisa da ajuda dos outros.

Maria Farrar, nascida em abril,

morta no cárcere de Moissen,

menina-mãe condenada,

quer mostrar a todos o quanto somos frágeis.

Vós que paris em leito confortável

e chamais bendito o vosso ventre inchado,

não deveis execrar os fracos e desamparados.

Por obséquio, pois, não vos indigneis.

Toda criatura precisa da ajuda dos outros.


Parte III
Perícia no morto
AUTÓPSIA
(Lições da sua mesa)

Para cá vêm os corpos,

Ainda impregnados da sua história,

Conduzidos pessoalmente pela morte

Que, justa e cuidadosa,

A todos iguala

E a ninguém privilegia.

As diferenças permanecem

Nos que aqui ficam

Enquanto aguardam a sua vez.

Diferenças arraigadas há tanto

Tempo na alma humana

E até hoje não resolvidas.

Elas, feito abismos,

Separam o homem de si,

Dos outros, e de seu destino.

Assim, prisioneiro do próprio espelho,

Onde só a si mesmo se vê,

Não se apercebe que a fila

Lentamente anda.

Lá na frente, no passo seguinte,

Ou no mais distante,

A morte incansável, inexorável:

– O próximo! Fala.

E com golpe certeiro


De invejável perícia,

Separa do corpo a vida,

Da vida a alma,

E da alma a consciência.

O corpo, embora somaticamente morto,

Está constituído por inumeráveis

Átomos, teimosamente vivos.

Assim é entregue à natureza

Para que eles possam,

Como sempre fizeram,

Integrar outros movimentos,

Outras vidas, numa troca

Permanente de matéria-prima.

E a consciência?

Ah, a consciência!

É entregue à própria solidão.

À solidão de confrontar-se

Consigo mesma.

Com o que fez.

Com a herança das escolhas.

Com as intenções que estavam

Em cada pensamento,

Em cada gesto.

Com a crueza do destino

Que cada um se deu.

A hora é de inventariar-se.
Boa sorte!

Será?

Barra do Garças – MT 14/05/1997

O autor empregou a palavra autópsia com a intenção de preservar o seu sentido


etimológico – ver a si mesmo, estudar a si mesmo.
12 - NECROSCOPIA
Este capítulo irá abordar a perícia realizada no cadáver e, para que isso aconteça, será
necessário que ocorra a morte da pessoa, que se dá pela ação de dois mecanismos. São eles:

Mecanismos que produzem a morte


1 – Morte provocada pela ação de mecanismos internos agindo sobre o indivíduo.

2 – Morte provocada pela ação de mecanismos externos agindo sobre o indivíduo.

1 – A morte provocada pela ação de mecanismos internos é aquela que ocorre em


consequência de uma enfermidade, ou patologia, ou senectude que acomete o indivíduo,
levando-o ao óbito. É dita morte de causa natural. Essa morte tem interesse médico-sanitário.

2 – A morte provocada pela ação de mecanismos externos é aquela que ocorre em


consequência da ação de agentes externos sobre o indivíduo, produzindo a sua morte. É dita
morte de causa violenta. São aquelas mortes provocadas por homicídio, suicídio ou acidente e
têm interesse médico-legal.

Comprovação da morte
Para se fazer o exame do cadáver é necessário que não paire dúvidas sobre a ocorrência do
óbito. Deve-se comprovar o óbito. O conceito de morte tem se modificado e hoje alcança o
patamar da morte encefálica, que é a constatação da morte cerebral, sendo esta uma condição
irreversível. O diagnóstico dessa morte é firmado por dois médicos diferentes, após realizarem
exames clínicos e laboratoriais específicos e em intervalos de tempo regulamentados pela
Resolução nº 1.480/97, do Conselho Federal de Medicina, que disciplina que, após essa
constatação, seja preenchido O Termo de Declaração de Morte Encefálica. Uma vez cumprida a
formalidade, é diagnosticado o óbito e, havendo a anuência da família, podem-se retirar
órgãos, do corpo do morto, para serem empregados em transplantes.

No entanto, nas mortes que acontecem fora das UTIs, é necessário, também, firmar o seu
diagnóstico. A constatação dessa morte se baseia, principalmente, na parada das funções:
cerebral, respiratória e circulatória do indivíduo.

O diagnóstico de certeza da morte depende dos fenômenos cadavéricos. Esses fenômenos


são constituídos por transformações contínuas, numa marcha sequencial, que resultam em
modificações do corpo, que só acontecem após a morte. Eles servem, além de demonstrar a
realidade da morte, de parâmetros para se estabelecer, aproximadamente, quando ela ocorreu.
São eles:
1. Fenômenos Cadavéricos Consecutivos
A) Resfriamento corporal – Cessada a vida, os mecanismos que regulam a produção e a
distribuição do calor são interrompidos. Inicia-se, então, o resfriamento do corpo, até igualar a
sua temperatura com a do ambiente onde ele se encontra.

A perda de temperatura ocorre na dependência de alguns fatores.

Fatores próprios do corpo são: a sua temperatura antes do óbito (febre, hipotermia, etc.),
quantidade do panículo adiposo, sua idade, seu estado nutricional.

Fatores externos ao corpo são: a temperatura do local onde se encontra o corpo, a


umidade do ar, a ventilação do ambiente, a proteção do corpo pelas vestes.

Em geral o resfriamento do corpo se faz na ordem de 0,5° a 1,5°C por hora, na


dependência da temperatura ambiente vigente, que varia conforme as estações do ano e as
regiões do país.

A temperatura do cadáver a ser aferida é a retal. Depois de aproximadamente 24 horas do


óbito, a temperatura do cadáver se iguala à do ambiente.

B) Evaporação tegumentar – Cessadas as atividades vitais, o corpo passa a se


desidratar, através da pele e das mucosas. Ocorre perda de peso, na razão de 10 a 18g por quilo
de peso, por dia, segundo Dupont, citado por ALCÂNTARA, 2006, p. 255. A pele torna-se
apergaminhada e há queda da tensão do globo ocular, além de dessecamento dos lábios, da
esclera e da córnea, que se torna opacificada, formando o sinal descrito por Sommer e Larcher,
citado por FAVERO, 1980, p. 542.

C) Rigidez cadavérica – A homeostasia do organismo cessa com a morte. A fibra


muscular estriada perde a capacidade de eliminar os catabólitos. Ocorre acidificação
citoplasmática e modificação química celular, o que ocasiona coagulação da miosina,
resultando no seu enrijecimento, e, consequentemente rigidez muscular.

Segundo a Lei de Nysten-Sommer, citado por CROCE, 1998, p. 353, ela se inicia pela
mandíbula, progredindo para a nuca, tronco, membros superiores e por último para os
membros inferiores. Tem início a partir da segunda para a quarta hora, sendo observada na
mandíbula e na nuca. Da quarta para a sexta hora atinge o tronco e os membros superiores,
completando-se em torno da oitava para a décima hora. Ela se desfaz na mesma ordem com
que se instala e desaparece entre 24 e 48 horas.

A sua intensidade e duração dependem de fatores individuais, como a idade, a nutrição,


enfermidade, etc. e de fatores externos como a temperatura do ambiente onde se encontra o
corpo, umidade do local e das vestes que traja.

D) Livores de hipóstase – Com a morte, cessa a circulação sanguínea, ocasionada pela


parada dos batimentos cardíacos. O sangue estagnado no interior dos vasos sofre a ação da
força da gravidade e se move lentamente para as regiões de declive do corpo e aí se deposita,
inundando toda a trama vascular. Os locais onde o sangue se acumula se tornam de cor
violácea, porém nos pontos de contato do corpo com a superfície onde este repousa, pela
pressão exercida pelo seu peso, aí eles não se formam, sendo essas áreas de tonalidade clara.

A deposição dos livores de hipóstase tem início, a partir da primeira para a segunda hora,
após o óbito, na forma de estrias e pontilhados, que se confluem, para formar placas extensas,
de cor violácea. Tornam-se fixos a partir da oitava para a décima segunda hora, o que significa
que não mudam mais de lugar, mesmo modificando-se a posição do corpo e duram até a sua
putrefação .

Eles têm interesse médico-legal porque revelam a posição em que o corpo permaneceu
após o óbito. Nos óbitos em que o corpo fica suspenso, verticalmente, eles se formam nos
membros inferiores.

Seguramente, tanto os livores de hipóstase quanto a rigidez cadavérica, que são sinais
inequívocos de que ocorreu a morte, estão presentes, a partir da 6ª hora após o óbito, tempo
mínimo estabelecido em lei, para o início da necropsia, com as exceções nela previstas (art. 162
CPP), preocupação que, logicamente, visa impedir que se comece o exame, estando vivo o
indivíduo. Antes do início da necropsia, o médico deve certificar-se da presença da rigidez
cadavérica e dos livores de hipóstase.

2. Fenômenos Cadavéricos Transformativos Destrutivos


A) Putrefação – A putrefação é uma transformação que o corpo sofre, a partir,
normalmente, da vigésima quarta hora. Ela é desencadeada pela ação dos agentes microbianos
internos, associados à autólise celular, o que promove uma modificação acentuada do corpo.
As alterações decorrentes da putrefação seguem uma sequência gradual e que constituem
quatro fases. São elas:

Fase de coloração – Ela inicia precocemente dentro do tubo digestivo, por conter rica
flora bacteriana que, após a morte, torna-se ativa e sem controle, promovendo a formação de
gases que se combinam com a hemoglobina, resultando na sulfometahemoglobina, que é de
cor esverdeada. O ceco está logo abaixo da parede abdominal, na fossa ilíaca direita, lugar no
qual este fenômeno primeiro aparece e é referido como mancha verde abdominal, sendo visível
a partir da 24ª para a 36ª hora após a morte.

Essa reação é generalizada, ocorrendo no interior dos vasos sanguíneos, que apresentam
cor esverdeada, chamando a atenção os vasos da pele, os quais se tornam de cor verde-escura,
visíveis e desenhando seus trajetos, numa trama arboriforme, chamada Circulação Póstuma de
Brouardel, citado por ALCÂNTARA, 2006, p. 261 ( Fig. 07 ), que foi quem a descreveu. Essa
Circulação é observada em torno da 48ª para a 72ª hora após o óbito.
Figura 7, IML de Barra do Garças – MT. Circulação póstuma de Brouardel.

O período de coloração se completa no final de uma semana quando todo o tegumento se


torna de cor enegrecida.

Fase gasosa – Esta fase tem início a partir da 24ª hora. Os gases originados no interior do
corpo vão invadindo os tecidos, progressivamente, distendendo-os. O corpo assume aspecto
gigantesco. Crescem: o rosto, o pescoço, o abdome, os órgãos genitais masculinos. Os olhos
estão protusos, os lábios aumentados, a língua volumosa e procidente. Os membros superiores
estão volumosos e semifletidos, dando ao corpo a atitude de boxeador. A pele apresenta
bolhas cheias de líquido claro que, gradativamente, comprometem todo o tegumento. Essa fase
atinge o seu ápice em torno do 5º para o 6º dia e dura em média duas semanas.

As vísceras estão autolisadas, distendidas por gases e amolecidas, o que altera a sua
arquitetura. Não são adequadas para a realização de exames histopatológicos.

Nesta fase as cavidades corpóreas são revestidas por serosas avermelhadas e apresentam
volume pequeno de líquido de cor vinhosa, originado da rotura de pequenos vasos sanguíneos
por destruição da sua parede. As vísceras também têm tonalidade avermelhada. O sangue, nas
regiões de declive do corpo, pode se difundir em torno dos vasos, ocasionando acúmulo,
devido à rotura deles.

Não confundir com hemorragia intravitam. A cavidade craniana apresenta encéfalo com
leptomenge avermelhada, acúmulos sanguíneos ocasionais, extra e subdural, secundários à
putrefação. Não confundir com hemorragia produzida em vida.

Fase coliquativa– Esta fase inicia-se em torno da 2ª para a 3ª semana, no corpo ainda
distendido por gases, mas que começa a se desfazer paulatinamente, pela dissolução dos
tecidos que, gradativamente, se transformam numa massa pútrida, úmida, fétida, viscosa e que
se desmancha progressivamente. O corpo perde volume pela autólise, pela ação das bactérias,
da fauna cadavérica e da evolação gasosa. Co-meça a exposição paulatina dos ossos pela
destruição dos tecidos moles que os recobre. Esta fase dura alguns meses na dependência das
condições ambientais.

Fase de esqueletização – Esta fase coincide com a progressão da fase coliquativa; tem
início entre o 1º e o 2º mês e se caracteriza pela exposição dos ossos, finalmente culminando
com a destruição dos seus ligamentos. Isso ocorre durante meses. Em cadáveres expostos, ela
pode se completar ao final do sexto mês. Os ossos, devido a sua estrutura, resistem por anos a
fio.

B) Maceração – A maceração acomete o corpo que está mergulhado em líquido. Quando


alguém que nasceu vivo morre e o seu corpo fica submerso, irá sofrer o processo de
putrefação, cujo ritmo de destruição será determinado pela ação da flora bacteriana nele
existente e pela embebição de líquido nos tecidos superficiais.

A maceração de que se tratará aqui é aquela que acomete o feto morto, retido
intrauterinamente, com idade gestacional a partir do 5º mês. O meio interno uterino é
asséptico, o que não permite a participação de bactérias nesse processo. A morte do feto
normalmente é precedida por sofrimento fetal, com eliminação de mecônio para a cavidade
amniótica, cujo líquido torna-se de cor esverdeada. Nesse ambiente o feto morto não
apresenta rigidez cadavérica, nem livores de hipóstase. O cordão umbilical, que, normalmente,
é de cor branca perolada, brilhante, torna-se de cor esverdeada pela impregnação meconial,
além de tornar-se de volume diminuído e fosco, por perda de líquido. As modificações que
ocorrem, no feto, são, basicamente, produzidas pela autólise celular. A maceração apresenta
três graus:

Primeiro grau – Vai até o terceiro dia. O feto mostra-se flácido, a pele tem cor vermelho-
acinzentada, está enrugada e apresenta bolhas, contendo serosidade de cor vinhosa. Essas
bolhas, gradativamente, comprometem todo o tegumento e se rompem com facilidade,
expondo o tecido subjacente.

Segundo grau – Vai do terceiro até o oitavo dia. As bolhas se rompem e liberam, para a
cavidade amniótica, o seu conteúdo sanguinolento, o que confere cor pardacenta ao líquido
amniótico. O feto apresenta cor avermelhada . As cavidades corpóreas revelam vísceras
amolecidas, de cor vinhosa. Nota-se a presença de líquido sanguinolento de volume moderado
dentro dessas cavidades.

Terceiro grau – Vai do oitavo dia em diante. O feto apresenta a superfície corporal de cor
vinhosa e a pele destacada. Os ossos cranianos estão frouxamente aderidos uns aos outros,
sobrepondo-se, quando manipulados, devido à redução do volume intracraniano secundário à
autólise cerebral. O abdome mostra-se achatado sobre a mesa. Os órgãos internos estão
friáveis, com volume menor e têm cor vermelha intensa. O feto tem o seu volume corporal
diminuído.

3. Fenômenos Cadavéricos Transformativos Conservadores


A) Mumificação – É um processo que acontece devido à desidratação acentuada e rápida
do corpo do morto. Ela ocorre em locais de clima quente e seco, com ventilação importante.
Neste caso a ação da flora bacteriana é intensamente reduzida, o que impede a putrefação. O
corpo perde aceleradamente líquido, desidratando-se, a pele torna-se seca, enrijecida, com
aspecto coriáceo e de cor escura. Os músculos e as vísceras tornam-se de volume diminuído e
com consistência firme. O corpo tem seu peso bastante reduzido.

B) Saponificação – É também chamada de adipocera. Trata-se de um processo em que as


partes moles do corpo adquirem consistência de cera, ou de queijo, ou de sabão, exalando odor
rançoso. O ambiente adequado para essa transformação é aquele úmido, pouco ventilado e no
qual o corpo fica imerso, principalmente em solo argiloso.

As gorduras sofrem uma ação química mediada por enzimas bacterianas para liberação dos
ácidos graxos, que se transformam em sabão. Essa transformação ocorre dentro de alguns
meses. O corpo mostra-se preservado, sendo possível a identificação do indivíduo, pois
conserva os traços da sua fisionomia. A pele intacta permite verificar a existência de possíveis
lesões traumáticas.
Estimativa do tempo de morte.
Esta é apenas uma estimativa aproximada de tempo em que as alterações acontecem.
Logicamente muitas variáveis irão interferir, acelerando ou retardando a marcha de
modificações que o corpo sofre. As modificações estarão na dependência da estação do ano, da
umidade, da temperatura e da ventilação do local, do grau de exposição aos raios solares, da
ação da fauna cadavérica, da ação de animais, se o corpo está parcialmente, ou totalmente
imerso em líquido, ou se parcialmente ou totalmente soterrado, etc.

Exame do cadáver
O exame do cadáver é feito por meio de uma técnica chamada: necropsia que pode ser:
facultativa, ou obrigatória.

Necropsia facultativa
A necropsia é facultativa quando a morte é decorrente de causa interna, dita natural,
porque é secundária a enfermidades, doenças, estados mórbidos, patologias. A sua realização
depende da autorização dos parentes do morto, a quem este, por direito, pertence. O médico
não pode executá-la sem essa autorização. O interesse pela feitura do exame, na maioria das
vezes, é do médico assistente, principalmente quando o atendimento realizado não foi capaz
de elucidar o diagnóstico. Nessa situação a necropsia seria a última oportunidade de esclarecer
o quadro mórbido, e esse conhecimento ser empregado para o tratamento de pacientes que
pudessem apresentar enfermidade semelhante. Aqui o exame cumpre o papel de contribuir
com os avanços da medicina.

A necropsia facultativa é, via de regra, solicitada pelas várias clínicas dos hospitais e,
quando autorizadas, executadas pelo serviço de patologia desses hospitais.

Estão em fase de instalação, no país, os Serviços de Verificação de Óbito (SVO), cuja


atribuição é a de realizar a necropsia; quando o indivíduo morre fora do hospital, a morte é
sabidamente de causa interna (doenças, enfermidades) e que não estava em tratamento
médico, ou fazendo uso de medicamento para enfermidade previamente diagnosticada.

O Ministério da Saúde tem a atribuição de investigar as enfermidades e propor políticas


públicas para a melhoria da saúde da população. É sua responsabilidade investigar as causas de
morte, para conhecê-las e se planejar. A criação do SVO, logicamente, é responsabilidade desse
Ministério. Nas situações em que o óbito ocorre em casa, ou fora dela, em decorrência de causa
natural ainda não conhecida, o corpo deverá ser encaminhado ao SVO. No Brasil não existe
legislação que normatiza o funcionamento do SVO. Não há a autoridade sanitária constituída
com o poder de requisitar o exame de necropsia e encaminhar o corpo para ser examinado.
Estranha mente, fugindo totalmente das suas atribuições, surge, para substituir o Ministério da
Saúde, na sua omissão, a figura do delegado de polícia, autoridade encarregada de investigar
crimes, para ele, que não é autoridade sanitária, e que nem ao menos lida na área da saúde,
solicitar o exame de necropsia, encaminhando o corpo ao SVO.

Há que se perguntar: qual é o interesse do delegado de polícia na realização desse exame?


O que ele fará com o laudo anatomopatológico emitido pelo patologista? A única coisa que se
sabe é que, por esse artifício, a necropsia, assim requisitada, passa a ser obrigatória. Só dessa
maneira, a família terá a Declaração de Óbito e poderá sepultar o morto.

Cabe, aqui, dizer que a necropsia, para cumprir com o seu objetivo, que é esclarecer a
patologia responsável pelo óbito, só poderá ser feita pelo médico patologista, especialista
preparado para realizá-la. A necropsia conduzida por médico de outra especialidade, na maioria
das vezes, não é capaz de elucidar nenhum quadro mórbido. É necessário que os governantes
compreendam a importância do SVO, e se cerquem de profissionais comprometidos com a
criação de serviços de excelência, sem improvisações, que atendam a sua finalidade, para a
produção de informações confiáveis e que possam gerar diagnósticos claros e colaborar para a
produção de políticas de saúde que sejam eficientes e beneficiem a população.

O Serviço de Verificação de Óbito, pela importância das informações que gera, deveria ter
a mesma envergadura de um Instituto de Medicina Legal. Ter vida e alma próprias. Ter sede
própria. Ser independente. Ter quadro de pessoal constituído por: recepcionistas, agentes
administrativos, técnicos de necropsia, técnicos de histopatologia, médicos patologistas. Ter
viaturas para a remoção de cadáveres, motoristas, sala de necropsia aparelhada, câmaras
refrigeradas para conservação de corpos, laboratório de histopatologia. Só dessa maneira o
SVO estará constituído com as condições necessárias para cumprir com a sua finalidade. É
surpreendente a capacidade que os gestores têm de demonstrar descaso pela organização e
estruturação dos serviços que devem ser criados. Vê-se amiúde o emprego das improvisações,
dos remendos, dos jeitinhos, das negociatas, nessas empreitadas, e a eclosão de serviços mal
pensados, mal planejados, mal elaborados, mal executados. Por essa razão, funcionam de
qualquer maneira. São incapazes de cumprir o seu objetivo. Até quando?

Necropsia obrigatória
A necropsia é obrigatória, quando a morte foi produzida em decorrência da ação de causa
externa (morte de causa violenta). Cabe ao Estado, nesta circunstância, verificar qual foi o
mecanismo que a provocou. Para isso, determina que seja realizada a necropsia. Caso tenha
sido um homicídio, buscar-se-á o agressor e, de acordo com a lei, ele será punido.

É de relevante valor o trabalho da perícia, cuja atribuição é produzir a prova técnica,


esclarecendo como a morte ocorreu. O documento médico-legal é indispensável para que a
ação penal aconteça.

A necropsia também é obrigatória nos casos de ocorrência de doenças epidêmicas, ocasião


em que cumpre o objetivo de esclarecer o diagnóstico e oferecer as informações para que o
Ministério da Saúde promova medidas de controle sanitário e interrompa a epidemia, sendo
essa ação do interesse da população. Aqui, a autoridade sanitária irá determinar que se faça a
necropsia. Esta só terá utilidade, se feita por médico patologista, especialista preparado para a
realização, com sucesso, desse trabalho.
Necropsia médico-legal

Finalidade
A necropsia médico-legal é requisitada pela autoridade competente, quando a morte foi
provocada, ou há suspeita de que tenha sido provocada, por ação de causa externa (morte de
causa violenta). O seu objetivo é determinar a causa da morte, a sua data, o instrumento, ou
meio que a provocou, a sua causa jurídica e a identificação do morto.

O exame de necropsia compreende o estudo externo e interno do cadáver, podendo ser


necessários para sua elucidação, o exame microscópio dos tecidos, o exame toxicológico de
líquidos, conteúdos e tecidos do corpo, exame bioquímico do sangue extraído do corpo, exame
de DNA, exame odontolegal, exame radiológico, etc.

Legislação, Código Penal

Titulo I, DOS CRIMES CONTRA A PESSOA

Capítulo I, DOS CRIMES CONTRA A VIDA

Homicídio simples

Art. 121. Matar alguém:

Pena – reclusão, de 6 (seis) a 20 (vinte) anos.

Caso de diminuição da pena

§ 1º Se o agente comete o crime impelido por motivo de relevante valor social ou moral, ou
sob o domínio de violenta emoção, logo em seguida a injusta provocação da vítima, o juiz pode
reduzir a pena de um sexto a um terço.

Homicídio qualificado

§2º Se o homicídio é cometido:

I – mediante paga ou promessa de recompensa, ou por outro motivo torpe;

II – por motivo fútil;

II – com o emprego de veneno, fogo, explosivo, asfixia, tortura ou outro meio insidioso ou
cruel, ou de que possa resultar perigo comum;

IV – à traição, de emboscada, ou mediante dissimulação ou outro recurso que dificulte ou


torna impossível a defesa do ofendido;

V – para assegurar a execução, a ocultação, a impunidade ou vantagem de outro crime:

Pena – reclusão, 12 (doze) a 30 (trinta) anos.

Homicídio culposo
§ 3º Se o homicídio é culposo:

Pena – detenção, de 1 (um) a 3 (três) anos.

Aumento da pena

§4º No homicídio culposo, a pena é aumentada de 1/3 (um terço), se o crime resulta de
inobservância de regra técnica de profissão, arte ou ofício, ou se o agente deixa de prestar
imediato socorro à vítima, não procura diminuir as consequências do seu ato, ou foge para
evitar prisão em flagrante. Sendo doloso o homicídio, a pena é aumentada de 1/3 (um terço) se
o crime é praticado contra pessoa menor de 14 (quatorze) ou maior de 60 (sessenta) anos.

§5º Na hipótese de homicídio culposo, o juiz poderá deixar de aplicar a pena, se as


consequências da infração atingirem o próprio agente de forma tão grave que a sanção penal
se torne desnecessária.

Código de Processo Penal


Capítulo II, DO EXAME DE CORPO DE DELITO, E DAS PERÍCIAS EM GERAL

Art. 162. A autópsia será feita pelo menos seis horas depois do óbito, salvo se os peritos, pela
evidência dos sinais de morte, julgarem que possa ser feita antes daquele prazo, o que
declararão no auto.

Parágrafo único. Nos casos de morte violenta, bastará o simples exame externo do cadáver,
quando não houver infração penal que apurar, ou quando as lesões externas permitirem
precisar a causa da morte e não houver necessidade de exame interno para a verificação de
alguma circunstância relevante.

Art. 165. Para representar as lesões encontradas no cadáver, os peritos, quando possível,
juntarão ao laudo do exame provas fotográficas, esquemas ou desenhos, devidamente
rubricados.

Art. 170. Nas perícias de laboratório, os peritos guardarão material suficiente para a
eventualidade de nova perícia. Sempre que conveniente, os laudos serão ilustrados com provas
fotográficas, ou microfotográficas, desenhos ou esquemas.

Art. 181. No caso de inobservância de formalidade, ou no caso de omissões, obscuridades ou


contradições, a autoridade judiciária mandará suprir a formalidade, complementar ou
esclarecer o laudo.

Parágrafo único. A autoridade poderá também ordenar que se proceda a novo exame, por
outros peritos, se julgar conveniente.

Código Nacional de Saúde


(Decreto nº. 49.974-A, de 21 de janeiro de 1961)
Art. 13. Em caso de óbito suspeito de ter sido causado por doença transmissível, a autoridade
sanitária competente promoverá o exame cadavérico, podendo realizar viscerotomia, a
necropsia e tomar outras medidas que se fizerem necessárias à elucidação do diagnóstico.

Art. 16. Quando necessário, a autoridade sanitária requisitará auxílio de autoridade policial
para execução integral das medidas referentes à profilaxia das doenças transmissíveis.

São elementos do crime de homicídio:


A) a morte da vítima produzida pela ação do agressor;

B) o meio ou o instrumento utilizado para provocar a morte;

C) cometer o crime, com dolo, empregando maneiras, meios ou substâncias que o qualificam.

São os pontos que a lei espera que a perícia esclareça. Esses elementos são os vestígios
que constituem o corpo de delito, são eles que devem ser pesquisados para a produção da
prova técnica de que ocorreu o delito.

A) A morte da vítima produzida pela ação do agressor.

A perícia tem a atribuição de examinar o cadáver, procurando, nele, os vestígios que


provocaram o óbito. É sua incumbência, caso a morte tenha sido provocada de forma violenta,
determinar se foi homicídio, suicídio ou acidente, porque é isso que interessa à lei. O exame
cadavérico deverá ser minucioso e o perito procurará os vestígios que produziram a morte,
estabelecendo o nexo causal entre eles e o óbito. Muitos deles são de causa violenta, porém
tratam-se ou de acidente, ou de suicídio. O perito deverá ser capaz de estabelecer a diferença
entre os vestígios que tenham produzido cada uma dessas mortes. O art. 121 do CP trata
especificamente de homicídio e comina pena a quem o comete. A perícia produz a prova
material de que houve vestígio da prática do crime. O laudo médico-legal é a peça
indispensável para essa caracterização. Sem ele a ação penal torna-se prejudicada. Daí o valor
de um laudo tecnicamente bem feito.

Em algumas mortes suspeitas de terem sido produzidas por ação de mecanismo externo
(morte violenta), durante o exame do corpo, o perito não encontra vestígios do emprego de
violência, sendo algumas delas, na verdade, decorrentes de causa interna (morte natural). O
perito deverá ser capaz de chegar a essa conclusão e afastar a possibilidade de morte violenta.

B) O meio ou o instrumento utilizado para provocar a morte.

Os agentes vulnerantes foram estudados no capítulo de Lesões Corporais. As mortes


violentas são provocadas com o emprego desses agentes. Cabe ao perito examinar o cadáver,
procurando nele os vestígios das lesões que venha a apresentar, enumerar sua quantidade,
suas localizações, suas características, para identificar o meio ou o instrumento que as
produziu. Deverá se manifestar sobre como as lesões foram produzidas, qual meio ou
instrumento foi empregado, a gravidade das lesões, quais delas poderiam provocar o óbito,
individualmente, o que facilita inferir a possibilidade de ser um homicídio, sobre o resultado
que o agressor queria obter. As características das lesões, suas localizações e o agente
vulnerante empregado, podem ajudar a elucidar se foram produzidas em decorrência de
homicídio, suicídio ou acidente.

C) Cometer o crime, com dolo, empregando maneiras, meios ou substâncias que o qualificam.

O art. 121 do CP, em seu § 2º incisos I, II, III, IV e V, especifica quando o homicídio é
qualificado. Interessa à perícia conhecer o teor do inciso III. Aqui claramente a lei estabelece
que, se o crime for cometido com o emprego de: veneno, fogo, explosivo, asfixia, tortura, ou
outro meio insidioso, ou cruel, ou de que resultasse perigo comum, a pena é aumentada. O
perito deverá estar atento para esse texto, porque duas condições são indispensáveis para que
o homicídio seja tipi-ficado como qualificado: 1º- que haja dolo, ou seja, que o agressor tenha
escolhido cometer o crime, utilizando-se de qualquer das maneiras especificadas no artigo; 2º-
que exista o morto e que exista o assassino. Isso porque a lei intencionalmente quis punir com
maior rigor quem assim cometesse o crime.

O inciso III foi empregado como o 4º quesito do laudo de necropsia, com o objetivo de
incitar o perito a se manifestar a respeito da pergunta. Embora conste como quesito oficial, ele
só se aplica se a perícia concluir que foi homicídio. Isso porque a lei instituiu pena maior ao
agressor, quando comete o crime, utilizando-se dos expedientes, aqui relacionados.

É comum observar uma forma automática de responder a este quesito. O perito,


mecanicamente, responde à letra e não à lei. A resposta afirmativa ou negativa só é possível,
única e exclusivamente, em se tratando de homicídio. Há que haver o morto e o matador. Nos
casos em que não há o assassino, o quesito não se aplica, ou seja, a pergunta fica sem sentido,
pois não há como qualificar a ação de alguém que não existe. A resposta a essa pergunta está
prejudicada.

Se uma pessoa decide suicidar-se, ingerindo veneno, por exemplo, é lógico que a causa da
sua morte será envenenamento, porém onde está o assassino? Qual a importância em
responder automaticamente à letra? Muitos peritos, num exame de suicídio cometido dessa
maneira, respondem: SIM, veneno, a este quesito. Ao agir assim, o perito abandona a lei,
porque esta resposta não pode qualificar a ação do suicida, que está morto e, por isso, fora do
alcance da lei. Não há como lhe cominar qualquer pena. Nessas situações o perito deverá ser
coerente e ciente do seu papel e responderá ao quesito com o termo: PREJUDICADO, uma vez
que a pergunta não se aplica ao caso. É necessário que o perito mantenha seus olhos sempre
voltados para o que a lei espera que a perícia esclareça. Por essa razão, o perito é médico-
legista.É comum, nos óbitos por acidente, o perito, mecanicamente, responder ao 4º quesito
oficial do laudo de necropsia, com o termo: NÃO. Sempre: NÃO. Doutrinariamente, só cabe a
resposta: NÃO, quando couber, em situação de acidente, a resposta: SIM, isto porque o NÃO é
para diferenciar do SIM. A pergunta que se faz é a seguinte: num acidente quando é que será
possível responder: SIM a este quesito? Nunca. Lembrar que só se deve responder: SIM,
quando o assassino, de forma dolosa, utilizou qualquer das situações previstas para cometer o
crime. Obviamente a resposta adequada, em acidentes, para o quesito será: PREJUDICADO. Ou
seja, a pergunta não se aplica nestes casos.
ESTRUTURA DO LAUDO DE NECROPSIA
O laudo de necropsia tem a estrutura formal dos laudos médico-legais. Apresenta os
seguintes tópicos:

a) Preâmbulo; b) Quesitos; c) Histórico; d) Descrição; e) Discussão ou Comentários; e)


Conclusão; f) Resposta aos quesitos.

Como conduzir a necropsia


O perito deverá iniciar o laudo de necropsia, preenchendo o Preâmbulo e, a partir daí,
cumprindo todos os passos que lhe dão a estrutura formal até chegar à Resposta aos quesitos,
da seguinte forma:

a) Preâmbulo
Dele devem constar: a hora, o dia, o mês, o ano e a cidade onde a perícia é realizada; o
nome da autoridade requisitante do exame; o nome do médico-legista incumbido de realizar o
exame; o nome do diretor do IML que designou o perito; o exame solicitado e a identificação da
vítima.

b) Quesitos
Os quesitos oficiais propostos para o exame de necropsia são os seguintes:

1º) Houve morte?

2º) Qual a causa da morte?

3º) Qual o instrumento ou meio que produziu a morte?

4º) A morte foi produzida com o emprego de veneno, fogo, explosivo, asfixia, tortura ou outro
meio insidioso ou cruel ? (resposta especificada).

c) Histórico
Colher as informações que possam indicar como ocorreu o óbito, local da sua ocorrência, a
sua data, se a vítima foi socorrida, se foi internada, se foi operada. Anotar qualquer informação
relevante que possa orientar a necropsia. Quando possível, fazer contato com o perito criminal
que fez o exame do local do crime para obter algum dado importante para a condução do
exame.

d) Descrição
A descrição do laudo de necropsia é mais abrangente. Ela deve obedecer à seguinte
sequência:

Apresentação do corpo
O perito deverá iniciar a descrição, relatando como o corpo se apresenta para o exame,
quais vestes está trajando, estado das vestes, se estão rasgadas, se estão sujas (especificar qual
é a substância), se mostram sinais de perfurações, descrevê-las e localizá-las, se o corpo está
sujo de terra ou de sangue, etc.
Identificação do corpo
Informar se o cadáver é de adulto ou de criança, qual o seu sexo, sua cor, sua idade, seu
peso, sua estatura, biótipo, cor dos olhos, cor e tipo dos seus cabelos, sua barba (se masculino),
conservação dos dentes, sinais particulares, tatuagens, defeitos físicos, etc. Se o corpo está
acompanhado de seus documentos de identidade, anotar seu número e órgão que o expediu.

Sinais de morte
Informar se o corpo apresenta rigidez cadavérica, se esta é inicial, ou completa, ou se está
em resolução. Informar se apresenta livores de hipóstase, se estes são iniciais, ou se estão
estabelecidos, ou se já estão fixos. Informar se o corpo apresenta mancha verde abdominal,
Circulação Póstuma de Brouardel, ou está na fase gasosa da putrefação, etc. Estes são sinais de
certeza de que ocorreu a morte e devem estar presentes no corpo a ser necropsiado. A rigidez
cadavérica e os livores de hipóstase estão presentes após seis horas do óbito, prazo
estabelecido no art. 162 do CPP, para início do exame. Quando a necropsia for executada antes
de decorridas seis horas do óbito, o perito deverá relatar que não está cumprindo o dispositivo
legal, mas que o corpo apresenta algum dos sinais de certeza de morte.

Estimativa da data provável do óbito


Pela presença dos fenômenos cadavéricos, o perito deverá informar a hora, quando
possível, e a data aproximada em que ocorreu o óbito.

Exame externo
O perito deverá realizar o exame externo do corpo, fazendo uma inspeção geral do
cadáver. Descrever o que observar nesse exame. Verificar se apresenta palidez cutânea e de
mucosas (se presentes, suspeitar de sangramento interno); a presença de cianose labial e de
leitos ungueais, de pletora facial, ingurgitamento das veias jugulares, fascies de sofrimento (se
presentes, suspeitar de infarto do miocárdio); drenagem de líquido avermelhado da boca e dos
orifícios nasais, edema de membros inferiores, face congesta (se presentes, suspeitar de edema
agudo de pulmão); pele de tonalidade amarelada, brilhante, edemaciada, mucosas amareladas
(se presentes, suspeitar de septicemia, falência de múltiplos órgãos); se a pele está inelástica,
dessecada, e as mucosas opacificadas (suspeitar de desidratação). Verificar se da boca e dos
orifícios nasais drena líquido de cor rósea, ou esverdeada, ou escura, ou branca, ou azulada,
exalando odor químico desagradável (suspeitar de envenenamento).

Pesquisar a presença de lesões traumáticas. Iniciar pelo polo cefálico, seguindo para o
pescoço, tronco, membros superiores e membros inferiores, descrevendo-as, caracterizando-
as, medindo-as, localizando-as. É de bom alvitre começar descrevendo, por exemplo: as
escoriações, depois as equimoses, os edemas traumáticos, as feridas contusas, as feridas
perfurocontusas, as feridas perfuroincisas, as fraturas ósseas, etc., ordenando-as. Ao descrever
uma ferida perfurocontusa, o perito deverá informar todas as suas características, se apresenta
apenas zona de contusão e de enxugo, ou se, além destas, apresenta zona de esfumaçamento,
de tatuagem e de queimadura, ou se apresenta ferida de entrada ampla com bordos evertidos,
esgarçados, tipo buraco de mina. É atribuição da perícia, informar, em se tratando de ferida de
entrada de projétil de arma de fogo, se a ferida tem características de disparo a distância, ou a
curta distância, ou com a boca de fogo encostada no alvo.
É importante, ainda, descrever o seu trajeto no corpo, o que contribui para entender a
dinâmica de como o crime foi praticado. Descrever quais órgãos lesou, quais projéteis de arma
de fogo poderiam, isoladamente, produzir o óbito. Isso porque, se foram efetuados cinco
disparos e todos eles atingiram a vítima e cada um deles poderia, isoladamente, provocar o
óbito, fica claro que a intenção do agressor era obter, como resultado, a morte da vítima. É
difícil para o agressor, neste caso, alegar legítima defesa. Descrever as feridas de saída de
projétil de arma de fogo, quando transfixam o corpo, observando suas características, suas
dimensões, suas bordas, suas localizações e a correspondência com as feridas de entrada de
projétil de arma de fogo que as produziram.

As feridas perfuroincisas deverão ser bem caracterizadas, informando suas medidas, suas
localizações, seus trajetos, quais órgãos foram lesados, sua gravidade, quais poderiam,
isoladamente, produzir o óbito.

Se houve atendimento médico-hospitalar à vítima, descrever as lesões decorrentes desse


atendimento, tais como: punções venosas, drenagens de tórax, cicatriz de ferida cirúrgica,
informando sua localização, sua característica, sua dimensão.

Nos casos de suspeita de overdose em usuário de drogas, verificar a face anterior dos
antebraços, a prega anterior dos cotovelos, os trajetos venosos dos membros superiores e
inferiores, em busca de cicatrizes de lesões puntiformes, provocadas por picadas de agulhas.
Verificar a integridade do septo nasal.

As lesões contusas profundas, como fratura de ossos, podendo ser fechadas ou expostas,
devem ser descritas, localizadas, caracterizadas. Esmagamentos corporais, por ação de agente
contundente, devem ser descritos e caracterizados, informando a sua gravidade.

Exame interno
O perito deverá abrir a cavidade que apresentar suspeita de conter lesão interna, tendo
como guia, a presença das lesões externas.

Cavidade craniana
A cavidade craniana é aberta, começando pela feitura de uma incisão, indo de um processo
mastoideo, passando pelo alto da abóbada craniana e alcançando o outro processo mastoideo,
seccionando o couro cabeludo, no sentido da direita para a esquerda, ou vice-versa. O couro
cabeludo é rebatido, anteriormente, descolando-o do periósteo, até a região supraorbitária, e,
posterior-mente, até a região occipital. Faz-se uma inspeção da calota craniana exposta. Caso
haja fratura óssea, deve-se descrevê-la, localizá-la e medi-la. Se houver ferida de entrada de
projétil de arma de fogo, deve-se descrevê-la, caracterizá-la e medi-la.

A ferida de entrada de projétil de arma de fogo, no crânio, apresenta uma característica


própria, porque adquire a forma de um cone cuja base é interna e o ápice externo, isto porque
a abertura externa é menor que a abertura interna na tábua óssea que é dupla. O projétil
penetra na tábua óssea externa e, após atravessar a parte esponjosa do osso, arranca a tábua
óssea interna, fazendo, nela, uma abertura mais ampla. A ferida de saída de projétil de arma de
fogo do crânio apresenta característica inversa. Adquire a forma de um cone cuja base é
externa e o ápice é in-terno, porque é produzida da mesma maneira que a ferida de entrada. O
projétil faz ferida menor na tábua óssea interna e, após atravessar a camada esponjosa, arranca
a tábua óssea externa, fazendo, nela, uma ferida maior. Nos casos em que o disparo da arma de
fogo foi efetuado com a boca de fogo encostada na pele do crânio, há a deposição de fumaça,
fuligem e impregnação de cor escura na tábua óssea externa, em torno da ferida, que é
característica de tiro encostado. Essa impregnação foi descrita por Benassi e recebe o nome de
sinal de Benassi (op. cit.).

É procedida a abertura da cavidade craniana, seccionando os ossos cranianos, com serra,


ou com serrote, no sentido anteroposterior, passando alguns centímetros acima dos meatos
acústicos, interessando os ossos: frontais, parietais, temporais e o occipital. Retira-se a abóbada
craniana e verifica-se se há hemorragia extradural. Abre-se e retira-se a dura-máter, expõe-se o
encéfalo, observa-se a sua integridade e se há hemorragia subdural. Retira-se o encéfalo
cuidadosamente, secionando os nervos cranianos, a partir dos polos frontais, descolando-os
das fossas cranianas anteriores e os polos temporais das fossas médias até a cela túrcica.
Secciona-se a tenda do cerebelo, traciona-se delicadamente o encéfalo para trás, expondo-se o
tronco cerebral e o secciona dentro do canal medular, retirando o encéfalo, integralmente,
inclusive com a ponte e parte do bulbo.

Se houver hemorragia em topografia da base do encéfalo, na ausência de trauma craniano,


deve-se examinar cuidadosamente o polígono de Willis, a artéria cerebral anterior, média e
posterior, bilateralmente, a artéria basilar, em busca de aneurisma roto. Lavam-se esses vasos,
examinando-os. O aneurisma é uma formação sacular, localizada no trajeto vascular, que, neste
caso, estará rota. Retira-se a dura-máter da base do crânio e se expõem as fossas cerebrais
anteriores, médias e posteriores. Examina-se a integridade dos ossos da base craniana. Se
houver fraturas, deve-se descrevê-las. Não confundir os sulcos dos vasos sanguíneos ali
observados com fratura. O encéfalo deverá ser examinado em busca de alterações. O edema
cerebral é caracterizado pelo aumento do seu volume e a sua consequente compres-são contra
a calota craniana, que é uma caixa rígida. Como resultado dessa compressão, é possível notar
achatamento importante dos giros cerebrais, apagamento dos sulcos intergirais, herniamento
das amígdalas cerebelares pelo forame magno. As amígdalas cerebelares mostram, ao seu
redor, um sulco feito pelos bordos do forame magno através do qual elas se herniaram.
Quando se secciona o encéfalo, no caso de edema cerebral, observa-se, ainda, colabamento
dos ventrículos laterais.

Separa-se o cerebelo do encéfalo, seccionando o tronco cerebral, logo abaixo dos


hemisférios cerebrais. Abre-se a parte posterior do cerebelo, longitudinalmente, entre os
hemisférios cerebelares, separando-os delicadamente, expondo o quarto ventrículo.
Seccionam-se os hemisférios cerebelares, em busca de alterações, tais como hemorragia
parenquimatosa, abscessos, áreas de amolecimento por insuficiência circulatória.

Seccionam-se os hemisférios cerebrais, repousando o encéfalo, com sua parte superior


voltada para a mesa, estando a base voltada para cima; inicia-se o primeiro corte, logo à frente
dos bulbos olfatórios, na topografia dos polos frontais; o segundo corte faz-se com a lâmina,
passando rente aos lobos temporais. O terceiro corte faz-se com a lâmina passando sobre o
quiasma óptico. O quarto corte faz-se com a lâmina passando pelos corpos mamilares, o quinto
passando no centro do pedúnculo cerebral, o sexto passando sobre o corpo caloso, o sétimo ao
nível do terço médio dos polos occipitais. Verifica-se, nas superfícies de corte, a presença de
hemorragia parenquimatosa ou intraventriculares, formações de abscessos, áreas de necrose
por isquemia e nos casos de concussão cerebral, vê-se micro-hemorragias perivasculares
parenquimatosas.

Cavidades: torácica e abdominal.


Faz-se a abertura das cavidades: torácicas e abdominal, realizando uma incisão biacromio-
furculo-pubiana, secionando a pele. Observar a cor do sangue que flui dos vasos seccionados;
se estiver de cor vermelho-escura, pesquisar a possibilidade de hipóxia. Nos casos de
envenenamento por monóxido de carbono, a sua cor é vermelho-clara, que também está
presente nos músculos. Rebate-se, lateralmente, a musculatura torácica, expondo o gradil
costal anterior. Com o costótomo seccionam-se os arcos costais lateralmente. Com o bisturi
realiza-se o descolamento da borda anterior do diafragma, da sua inserção no gradil costal, e
faz-se a secção das costelas através dos locais, previamente abertos com o costótomo, indo da
parte inferior lateral até a primeira costela. Separa-se o manúbrio das clavículas e retira-se a
parte anterior do gradil costal, expondo-se as duas cavidades torácicas. Examinam-se essas
cavidades, em busca de alterações. Verificar se há pneumotórax. Se houver hemorragia, medir
o seu volume. Se houver derrames pleurais, deve-se descrever suas características e medir o
seu volume. Examinar o pulmão direito e o pulmão esquerdo. Verificar se estão distendidos ou
atelectasiados. Verificar se a sua superfície está íntegra ou não e se a sua cor é uniforme, ou
não. Observar a presença de petéquias, ou de áreas maiores de hemorragia (mancha de
Paltauf), na pleura visceral. As primeiras são observadas nos casos de asfixias e as segundas,
nos casos de afogamento. Verificar áreas distendidas de cor vinhosa, de forma irregular,
podendo ocupar um lobo inteiro, ou todo o pulmão, no qual a pleura apresenta-se lisa,
brilhante, e a consistência é carnosa. Realizar corte nessa área, expondo o parênquima
pulmonar, que perde o aspecto esponjoso e tem cor avermelhada. Penetrar o parênquima com
a ponta do dedo; se ele estiver friável, desfazendo-se com pequena pressão, isso significa que
essa área é de pneumonia. Os alvéolos estão preenchidos por células inflamatórias, o que lhes
confere a consistência friável. A pneumonia verifica-se com a ponta do dedo.

Se os pulmões apresentarem área de cor vinhosa, com a superfície externa ligeiramente


deprimida, adquirindo forma triangular, com seu ápice voltado para o hilo e sua base voltada
para a periferia pulmonar e mostrando consistência elástica, deve-se fazer o seu corte. A
superfície de corte é de cor avermelhada. Pressionar a superfície seccionada, com a ponta do
dedo; se não estiver friável, essa área corres-ponde a infarto pulmonar.

Se os pulmões estiverem distendidos, superfície externa brilhante e úmida, de cor


avermelhada e de consistência pouco esponjosa, sendo que, no exame externo do corpo,
verificou-se drenagem de líquido róseo pela boca e pelas narinas e face congesta, deve-se fazer
o corte dos pulmões. Se a superfície de corte é suculenta, distendida, avermelhada, brilhante,
deixando fluir líquido de cor rósea, trata-se de edema agudo de pulmão.
Quando presentes, descrever as lesões traumáticas produzidas por agentes
perfurocontundentes, relatando o que lesionou. Indicar por meio de qual local penetrou a
cavidade torácica. O mesmo se faz nos casos em que haja lesões perfuroincisas. Procurar
estabelecer a relação entre as lesões internas com as externas, para determinar o trajeto
descrito, no corpo, pelo agente vulnerante. Descrever, quando presente, contusão do
parênquima pulmonar.

Abre-se o saco pericárdico. Observar a presença de hidropericárdio, ou hemopericárdio,


sendo este último, por vezes, responsável por tamponamento cardíaco e óbito. Examinar a
aorta ascendente e torácica. Pesquisar a existência de aneurisma. Examinar o coração,
verificando o seu volume, se está globalmente aumentado de volume e flácido, ou se há
proeminência do ventrículo esquerdo que mostra a sua parede rígida. Examinar as coronárias:
direita e esquerda, bem como o ramo anterior descendente, a circunflexa e os ramos
posteriores, em busca de placas de ateroma. A placa de ateroma é de cor amarelada,
destacando-se no trajeto da artéria, sendo que, habitualmente, apresenta área avermelhada na
gordura que a circunda.

Verificar a veia pulmonar. Fazer a sua abertura em busca de tombos que possam ocluir a
sua luz. Abrir as cavidades cardíacas. Observar a sua amplitude. A espessura da parede
miocárdica. Se as cavidades estiverem dilatadas, com o coração achatando-se sobre a mesa
trata-se de cardiopatia dilatada, que apresenta, ainda, hepatomegalia e esplenomegalia, ambas
congestivas, além de edema de membros inferiores. Se a parede do ventrículo esquerdo estiver
hipertrofiada, com a cavidade ventricular ligeiramente dilatada, os pulmões com edema agudo,
presença de hepatomegalia e esplenomegalia e o corpo apresentar drenagem de líquido róseo
pela boca e pelas narinas, o quadro é de edema agudo de pulmão, devido à insuficiência
cardíaca aguda secundária, entre outras causas, à hipertensão arterial.

Nos casos em que se observa edema agudo de pulmão, sem a presença de insuficiência
ventricular esquerda, ou seja, não há evidência de falência da bomba cardíaca, pensar em
intoxicação exógena (envenenamento). Deve-se examinar o estômago e seu conteúdo. O
veneno, quando ingerido, é absorvido pelo tubo digestivo, pela circulação porta vai ao fígado,
daí, ganha a circulação sanguínea, é eliminado pelos pulmões e rins. Retirar fragmento de
fígado, pulmão, rim e colher sangue, para exame toxicológico. Se o veneno penetrar no
organismo por outras vias, deve-se retirar esses mesmos materiais para exame toxicológico.

Se presente alguma lesão traumática no coração, deve-se descrevê-la, medi-la e localizá-la.

Examinar o mediastino, esôfago, traqueia, aorta. Se encontrar lesão, relatar.

Abre-se a parede abdominal anteriormente, até chegar à cavidade peritoneal.

Verificar se apresenta hemoperitôneo, caso positivo, medir o seu volume. Se apresentar


ascite, relatar as características do líquido encontrado e seu volume. A presença de pus na
cavidade peritoneal é indicativa de peritonite. Examinar o fígado, verificando seu volume,
descrever sua superfície externa, sua borda, se está fina ou romba. Descrever sua cor, se
vermelha ou amarelada (esteatose). Se apresentar lesão traumática, descrevê-la. Examinar o
baço, verificar seu volume. Se apresentar lesão traumática, descrevê-la. Examinar o estômago,
o intestino delgado e grosso, o pâncreas; se forem verificadas lesões traumáticas, relatar.
Examinar os rins e as suprarrenais, a veia cava e a aorta abdominal; se encontrar lesão
traumática, relatar. Verificar se há hematoma retroperitoneal. Examinar os ureteres, a bexiga.
Se for do sexo feminino, verificar se o útero, bem como as trompas uterinas e os ovários estão
presentes. Verificar se há gravidez. Em caso de crime contra pessoa do sexo feminino, examinar
a vagina, o ânus, o períneo, em busca de lesões e de presença de esperma.

Caso tenha sido submetido a cirurgia para corrigir alguma lesão, relatar o que o ato
cirúrgico realizou, bem como as condições do resultado dessa cirurgia. Os projéteis de arma de
fogo que, por ventura, estejam alojados no cadáver, deverão ser retirados. Encaminhá-los à
criminalística, para serem submetidos a exame de balística, caso sejam encontradas as armas
suspeitas de terem sido empregadas para cometer o crime.

Colher sangue do cadáver, quando a morte foi em decorrência de acidente de trânsito,


para exame de dosagem da alcoolemia. Quando retirar fragmentos de vísceras para exame
histopatológico, acondicioná-los em frasco, contendo formol a 10%, num volume 10 vezes
superior ao volume do fragmento a ser examinado.

e) Discussão ou Comentários
Neste tópico, o perito fará a descrição das informações médicas, quando o(a) periciando(a) foi
atendido, antes de acontecer o óbito, de forma concisa, realçando os dados relevantes. Anotar
o nome e o CRM do médico que fez o relatório. Arquivá-lo junto à requisição do exame pericial.
Caso haja algum exame de imagem que ilustra uma lesão importante, relatá-lo e arquivá-lo.
Estabelecer o nexo entre essas informações e os achados da necropsia.

Nos casos em que o óbito tenha sido provocado por projétil de arma de fogo, é dever do
perito caracterizar a ferida de entrada do projétil e se pronunciar, dizendo se as suas
características são de tiro a distância, a curta distância, ou com a boca de fogo encostada no
alvo. Relatar a direção e o trajeto que o projétil descreveu no corpo da vítima. Se mais do que
um projétil atingir o corpo, informar qual deles poderia, isoladamente, produzir o óbito. Neste
tópico o perito deverá estabelecer o nexo causal entre a lesão e o óbito, caracterizando a sua
eficiência. Se os projéteis forem de calibres diferentes, informar que foram empregadas duas
armas de fogo para agredir a vítima, e aventar a possibilidade de haver dois agressores.

Se a vítima apresentar sinais de que estava contida com algum instrumento que a
imobilizasse, e sem poder se defender, foi assassinada; informar que se trata de crime
praticado com o emprego de crueldade.

Se o exame de necropsia constata que o óbito foi causado por enforcamento e que a
vítima deixou anotações, relatando esta sua decisão, trata-se de suicídio. A morte foi provocada
por asfixia. No caso de suicídio, não existe a figura do assassino, porque o agressor e a vítima
são uma só pessoa e está morta. Embora o quarto quesito do laudo de necropsia peça que o
perito se manifeste sobre se a morte foi provocada com o emprego de asfixia, esta pergunta
não se aplica neste caso porque não há como cominar qualquer pena ao agressor, que está
morto, logo, a resposta ao 4º quesito fica prejudicada.
Neste tópico o perito deverá fundamentar a conclusão e as respostas ao laudo de
necropsia.

f) Conclusão
Aqui o perito deverá, de forma concisa, estabelecer a cronologia dos eventos que, partindo de
uma causa básica, produziu alterações no organismo da vítima, culminando com o seu óbito. É
um resumo telegráfico, porém real e lógico, dos eventos que determinaram a sua morte.Iniciar
pelo evento final, indo até à causa básica, que é anotada por último.Exemplo: A morte foi
provocada por choque hipovolêmico secundário à hemorragia interna, produzida pela ação de
instrumento perfuro cortante.

g) Resposta aos quesitos


Após a conclusão do laudo, o perito deverá responder aos quesitos, com o que encerra a
redação da sua perícia.

1º quesito: Houve morte?


A rigor esta pergunta é feita para que o perito responda se da ação do agente vulnerante
resultou a morte. Se há nexo de causalidade entre esta ação e o resultado: morte.

O autor recorda de uma necropsia feita num cadáver de recém-nascido em que se


suspeitava de infanticídio. O corpo apresentava sinais evidentes de maceração, indicando que o
óbito ocorrera dentro da cavidade uterina. Na verdade tratava-se de natimorto. Nesta situação,
é impossível cometer o crime de infanticídio, porque não há como matar o morto. De que
maneira o perito, neste caso, deveria responder à pergunta: Houve morte? A resposta
adequada seria: Não. O bebê, ao nascer, já estava morto. Isso porque a pergunta que a lei
espera que a perícia responda é: o agressor provocou a morte da vítima? Neste caso, não.

Muitos peritos acham a pergunta contida no primeiro quesito redundante, pois se o que se
examina é o cadáver, é lógico que ocorreu a morte.

Porém, do ponto de vista legal, a pergunta é pertinente, e o perito deverá estar atento à
sua resposta. A pergunta não é genérica, de abrangência difusa, sem interesse legal. O artigo
121 do CP tipifica o crime: matar alguém. Indica claramente uma ação empreendida pelo
agressor cujo resultado é a morte de alguém.

No entanto, mesmo nos casos em que a morte resultou de causa interna (morte natural), o
perito costuma responder: Sim, à pergunta. Na resposta ao terceiro quesito, irá esclarecer que
a morte teve uma causa natural. Na prática se responde sempre Sim a este quesito, após o
exame de necropsia.

2º quesito: Qual a causa da morte?


O perito deverá indicar a causa final responsável pelo óbito. O evento final que determinou
a morte.

Exemplo: choque hipovolêmico; septicemia; politraumatismo; tamponamento cardíaco;


hemorragia intracraniana; desidratação; edema agudo de pulmão; etc.
3º quesito: Qual o instrumento ou meio que produziu a morte?
O perito deverá especificar qual instrumento ou meio foi empregado para produzir a
morte.

Exemplo: instrumento perfurocontundente; instrumento contundente; meio físico-químico


(asfixia por constrição do pescoço); meio químico (veneno); meio natural (enfermidade); etc.

4º quesito: A morte foi produzida com o emprego de veneno, fogo, explosivo,asfixia,


tortura ou por outro meio insidioso ou cruel? (resposta especificada)
A pergunta contida neste quesito foi extraída do inciso III, do § 2º do artigo 121 do CP. O
quesito, considerando que visa qualificar a ação do agressor, ao assassinar a vítima,
logicamente só deverá ser respondido de forma afirmativa, ou negativa, ou sem elementos,
quando a necropsia concluir que a vítima foi assassinada. O agente deverá ter a intenção de
praticar o crime, empregando qualquer desses meios. É um homicídio doloso, tipificado como
crime qualificado. Haverá que ter o agressor e a vítima. Ao respondê-lo, o perito estará dando
subsídio para a justiça aplicar uma pena maior ao assassino. Se não houver o agressor, não
interessa à lei a resposta ao quesito, ou seja, ele não se aplica à situação, circunstância em que
sua resposta estará prejudicada.

É comum observar médico-legista respondendo Não, a este quesito, nos casos de morte
natural. Quando se procede assim, o perito perde totalmente de vista a sua função. Deixa de
ser médico-legista, porque está respondendo à letra e não à lei. É de se perguntar: numa
necropsia de morte natural, quando é que se responderá: Sim, a este quesito? NUNCA.
Doutrinariamente só se pode responder: Não, quando em situação semelhante couber a
resposta Sim. Isto porque o não é para diferenciar do sim.

Nos acidentes e nos suicídios, não há a figura do assassino, portanto, o quesito não se
aplica nessas situações e sua resposta será: Prejudicado.

É claro que o perito deverá fundamentar, no tópico Discussão ou Comentários, a sua


resposta, esclarecendo-a e justificando-a.

Exemplo: Responderá a este quarto quesito: Sim, fogo. Se o agressor ateou fogo na vítima,
e ela morreu em consequência desse ato.

Sim, asfixia. Se o agressor estrangulou a vítima, provocando o seu óbito.

Necropsia de cadáveres vítimas de asfixias


O impedimento da entrada do ar no interior dos pulmões interrompe a hematose, que
provoca a anóxia. A anóxia leva à asfixia.

Alterações externas observadas nos cadáveres vítimas de asfixia:


* Cianose – é a cor azulada ou arroxeada, observada nos lábios, nos pavilhões auriculares,
nos leitos ungueais.

* Petéquias– são pontilhados avermelhados, observados na pele da face, do pescoço, do


dorso, nas escleras oculares.
* Livores cadavéricos de cor arroxeada ou escura.

* Escoriações ungueais em volta do pescoço, nas esganaduras e nos estrangulamentos,


quando a vítima tenta retirar as mãos do agressor, ou afrouxar a corda, ou outro instrumento
utilizado pelo agressor para fazer a constrição do pescoço.

* Sulcos profundos, apergaminhados, localizados em volta do pescoço, nos enforcados e


nos estrangulados.

* Protusão da língua no enforcado, no estrangulado.

* Cogumelo de espuma no afogado.

Alterações internas observadas nos cadáveres vítimas de asfixia:


* Sangue escuro, fluido, drenando dos vasos seccionados.

* Equimose retrofaríngea no enforcado,

* Pulmões congestos, apresentando petéquias na pleura visceral, e mancha arroxeada


mais extensa, principalmente na pleura visceral interlobar (Mancha de Paltauf) no afogado.

* Coração congesto com petéquias em epicárdio.

* Músculos de cor vermelho-escura.

* Fígado congesto, de cor escura.

Lesões observadas em vítima de enforcamento


No enforcamento, a vítima utiliza uma corda, ou outro instrumento cilíndrico fino, flexível,
para fazer uma laçada e envolver o pescoço. A outra extremidade é fixada em estrutura firme e
sólida, normalmente localizada acima da sua cabeça. Ela se joga no vazio e fica suspensa por
esse instrumento, que aperta o seu pescoço, utilizando a força exercida pelo peso do próprio
corpo. Ao exame, observa-se, feita pelo instrumento, em volta do pescoço, a presença do sulco
profundo, que apresenta característica particular. Ele é inclinado de baixo para cima. É mais
profundo na sua porção inferior, onde houve maior pressão exercida pelo peso do corpo, daí
caminha para cima tornando-se gradualmente mais superficial, sendo descontínuo na porção
onde se encontra o nó. A pele é apergaminhada, brilhante, dura, no leito do sulco. Se o nó
estiver localizado posteriormente, na nuca, o sulco é profundo na região anterior do pescoço,
inclina-se para trás e para cima, tornando-se gradual-mente mais superficial, até tornar-se
ausente na nuca.

A cabeça está pendida para o lado contrário ao nó. A face é vultuosa, congesta, escura. A
língua está protusa. Os livores cadavéricos estão presentes nos membros inferiores.

A ação do agente vulnarante provoca lesões nas áreas onde exerceu pressão. Ao abrir a
pele, pode-se observar: constrição do músculo esternoclideomastoideo, por vezes, com sua
rotura. Equimose retrofaríngea. Equimose em músculos abaixo do sulco. Equimose em
adventícia da carótida. Lesão transversal da íntima da carótida (sinal de Amussat). Fratura ou
equimose em cartilagens tiroide e anéis da traqueia. Luxação ou fratura da coluna cervical.

Lesões observadas em vítima de estrangulamento


O estrangulamento é praticado com o uso de um instrumento cilíndrico, fino, flexível,
aplicado em volta do pescoço, fazendo uma volta ou mais, sendo à força, para fazer a
constrição do pescoço, exercida em suas extremidades opostas. A aplicação da força pode ser
por outra pessoa, por engenhos mecânicos e, excepcional-mente, pela própria pessoa.

O exame do local da ocorrência do óbito auxilia a identificar a sua possível causa jurídica:
se foi homicídio, acidente, ou suicídio.

A face da vítima de estrangulamento é congesta, cianótica, a língua pode estar procidente.


Presença de petéquias na esclera dos olhos. Cianose labial e dos leitos ungueais.

Observa-se a presença de um, ou dois, ou mais sulcos, contínuos, horizontais, em volta do


pescoço, normalmente abaixo da cartilagem tiroide. São sulcos profundos, notando-se,
frequentemente, sinais de escoriações ungueais ao longo do seu trajeto. Representa a
tentativa, da vítima de retirar a laçada do seu pescoço. Os livores estão localizados no dorso, ou
na face ventral do corpo, pois normalmente a vítima, após a morte, é deixada deitada. Pode-se
observar escoriação ou equimose na face posterior do tronco, nos locais em que o agressor
apoiou-se para aplicar a força nas extremidades do instrumento utilizado para realizar a
constrição do pescoço. Pode-se encontrar tecido (fragmento de pele) do agressor, sob as unhas
da vítima, que, normalmente, tenta lutar para impedir a sua morte. Esse material deverá ser
submetido à exame de DNA.

O sulco tem características semelhantes ao sulco do enforcamento, sendo diferente na sua


disposição, que é horizontal, contínuo e também profundo. A pele, no interior do sulco, é igual
à do enforcamento. Há lesões dos músculos do pescoço, com presença de equimose, constrição
e até sua rotura. Há equimose da adventícia das carótidas, fratura e ou equimose de anéis da
traqueia.

Quando o enforcamento ou o estrangulamento é simulado, para ocultar homicídio, não se


observa no cadáver reação vital a essa tentativa. Não há a presença de cianose facial, labial e
ungueal. Não há face congesta, com petéquias nas escleras oculares. Não há sangue escuro e
fluido, drenando dos vasos sanguíneos seccionados. Não há equimose em músculos, nem em
adventícia de artérias, abaixo do sulco, nem em retrofaringe, nem nas cartilagens tiroide e nem
nos anéis da traqueia. Não há reação vital na linha de fratura do osso hioide, caso esteja
fraturado. Não há petéquias no epicárdio, nem na pleura visceral.

Lesões observadas em vítima de esganadura


Na esganadura, a constrição do pescoço da vítima é feita com o emprego das mãos, ou dos
braços (gravata), ou do pé do agressor. Agindo assim, ele provoca o pinçamento da laringe, ou
sua compressão contra a coluna cervical, ocluindo a passagem do ar para os pulmões, além de
provocar interrupção da passagem do sangue pelos vasos sanguíneos cervicais. Como se vê, a
esganadura pode ser realizada de várias maneiras: o agressor pode atacar pela frente, pelos
lados e por trás. A vítima pode estar em decúbito dorsal, e o agressor sobre ela, utilizando suas
mãos ou o pé para esganá-la. Ou pode estar em decúbito ventral, e o agressor colocado sobre
as suas costas, com o membro superior em volta do seu pescoço, fazendo a constrição, numa
“gravata”.

A face é cianótica, congesta, com petéquias em escleras oculares. A região anterior do


pescoço apresenta as marcas deixadas pelas mãos do agente, podendo ser equimoses
alongadas, desenhando o formato dos dedos, com a extremidade distal, mostrando a
impressão da unha. Esta marca permite reconhecer qual das mãos do agressor foi utilizada para
fazer a esgandura. Se o agressor utilizou o pé, vê-se a marca da planta do pé, em forma de
equimose, ou o desenho da sola do calçado. Normalmente a vítima apresenta escoriações e
equimoses nas costas e no pescoço, resultantes da sua reação contra o agressor. Nos leitos
ungueais dos dedos da vítima, podem-se encontrar fragmentos de tecidos do agressor, que
devem ser pesquisados e submetidos a exame de DNA, para futuro confronto com o DNA do
suspeito, caso seja localizado.

Observa-se equimose em partes moles do pescoço, abaixo da área onde se veem lesões
externas. Pode-se encontrar fratura dos anéis da traqueia e da cartilagem tiroide, equimose em
adventícia das carótidas.

Às vezes a vítima sobrevive à tentativa de esganadura. Nesses casos, apresenta:

* dores de garganta e cervicais;

* dor à deglutição;

* máscara equimótica de Morestin, que é a cor azulada da face devido à micro-hemorragia


perivascular por congestão e estagnação do sangue venoso no polo cefálico;

* rouquidão e dispneia.

O autor teve a oportunidade de examinar vítima de estupro e constatou que o agressor


utilizou a mão para comprimir a face anterior do seu pescoço e deixou, como resultado, lesões
locais e a máscara equimótica de Morestin. Ela pode persistir por mais de trinta dias.

Alterações observadas em vítimas de obstrução mecânica das vias aéreas


Esta forma de asfixia é determinada pela presença de corpo estranho no interior da árvore
respiratória, impedindo a passagem do ar. A oclusão pode estar na cavidade oral e nasal,
concomitantemente. Pode estar na orofaringe, ou na traqueia, ou nos brônquios. O corpo
estranho pode ser originado do meio externo, ou do meio interno, como nos casos de aspiração
do conteúdo gástrico regurgitado para a faringe.

O exame externo revela face congesta com cianose labial dos pavilhões auriculares, dos
leitos ungueais, com petéquias em escleras oculares. O sangue é fluido e escuro. O exame das
vias aéreas revela a presença do corpo estranho no interior da árvore respiratória. Petéquias na
pleura visceral e no epicárdio.
A causa jurídica dessa forma de asfixia, normalmente, é acidental. Pode-se, no entanto, ser
homicida, com o agressor colocando uma rolha de pano, ou outro objeto, na cavidade oral e
nasal da vítima (infanticídio), ou, se a vítima for de porte maior, quando ela estiver
impossibilitada de reagir.

Lesões observadas em vítimas de asfixia por compressão torácica


O tórax funciona como um fole que, ao se expandir e ao se contrair, permite a entrada e a
saída do ar dos pulmões. Esses movimentos podem ser abolidos nas situações em que há
compressão da caixa torácica. Quando isso acontece, ocorre asfixia, pela impossibilidade da
circulação do ar nos pulmões.

A compressão torácica pode ser feita pela queda de um agente físico sobre o tórax, pela
prisão dentro das ferragens de um veículo, agindo na altura do tórax, pela imobilização torácica
feita por atadura, cinto, ou outro meio que o envolva e o comprima.

A causa jurídica dessa modalidade de asfixia, normalmente, é acidental. Raramente pode


ser homicida.

O exame externo revela lesões traumáticas produzidas pelo agente mecânico que
comprimiu o tórax. Pode ser escoriação, equimose, normalmente reproduzindo a forma do
agente. A face é congesta, com presença de cianose cervicofacial, for-mando a máscara
equimótica de Morestin. Presença de equimose em escleras oculares. Cianose de leitos
ungueais. O exame interno revela fratura de arcos costais do esterno. Presença de hemorragia
na cavidade torácica e no mediastino, rotura pulmonar, do fígado e do baço, com hemorragia
intraperitoneal.

Lesões observadas em vítimas de asfixia por soterramento


No soterramento, a vítima sofre compressão torácica exercida pelo peso da terra que caiu
sobre o seu corpo, além de inspirar poeira, partículas maiores e terra, que penetram na árvore
respiratória, chegando até os alvéolos pulmonares. É uma forma mista de asfixia, produzida
pela compressão torácica e pela penetração de tais partículas no interior das vias aéreas,
impedindo a entrada do ar nos pulmões.

A causa jurídica do soterramento, normalmente, é acidental, porém, eventualmente, pode


ser homicida.

O exame externo do cadáver revela as vestes e a superfície corporal impregnadas de areia,


barro, poeira, lama. A boca e os orifícios nasais, contendo grande quantidade desse material.
Podem-se observar escoriações e equimoses na cabeça e no tronco. A face é congesta, com
cianose labial. Presença de equimose em escleras oculares. O exame interno revela sangue
escuro, fluido, drenando dos vasos sanguíneos seccionados. Presença de esmagamento
torácico, fratura de membros. Encontro de terra, ou barro, no interior da árvore respiratória.
No abdome pode-se encontrar rotura hepática e esplênica.
Lesões observadas em vítima de afogamento
No afogamento, a asfixia se dá devido ao fato de a vítima respirar em meio líquido, o qual
inunda a árvore respiratória, impedindo a hematose.

A morte se dá pela asfixia propriamente, quando a vítima submerge no meio líquido,


totalmente, ou quando não consegue retirar os orifícios oral e nasais, de recipiente contendo
líquido e o aspira, inundando a árvore respiratória. Esta última condição acontece quando a
vítima é criança, ou está embriagada, totalmente, ou sofreu uma crise epiléptica, ou padece de
paralisia, o que impede a sua reação. Nessas circunstâncias, a vítima morre por asfixia; é o
chamado afogado azul.

A morte pode ser decorrente de choque vagal, desencadeado pela penetração do líquido
frio na árvore respiratória, o que provoca imediata parada cardiorrespiratória, sendo esta a
responsável pelo óbito. Não há tempo para ocorrer a asfixia; é o chamado afogado branco.

O exame externo no afogado azul revela: cogumelo de espuma branca com leve tonalidade
rósea, presente no orifício oral e nas narinas. Esse achado só é encontrado nos afogados
prontamente retirados da água. A pele apresenta-se apergaminhada, com os folículos pilosos
salientes (pele anserina). A pele palmar e plantar é de aspecto macerado e está enrugada. Os
livores de hipóstase são de tonalidade rósea, devido à absorção de considerável quantidade de
líquido para o interior dos vasos sanguíneos, com sua consequente diluição e modificação da
sua cor. Cianose labial, dos pavilhões auriculares e dos leitos ungueais, de cor azul-clara.

O exame interno revela sangue mais claro, drenando dos vasos sanguíneos seccionados.
Traqueia inundada por espuma e líquido. Pulmões distendidos e comprimidos contra a caixa
torácica. Apresenta cor clara e a superfície de corte deixa fluir líquido de cor rósea. A pleura
visceral apresenta manchas equimóticas maiores que as petéquias; são as chamadas manchas
de Paltaulf, que são mais presentes nas superfícies interlobares. Pode-se encontrar material
próprio do líquido aspirado no interior dos alvéolos pulmonares (plâncton). O estômago pode
estar repleto de líquido. Há congestão visceral generalizada.

No afogado branco faltam os sinais da asfixia.

A morte por afogamento pode ter como causa jurídica: acidente, suicídio, homicídio ou
tortura.

Lesões observadas em vítima de sufocação


Na sufocação, a vítima não consegue inspirar o ar para dentro dos pulmões, devido
obstrução dos orifícios: nasais e oral. Isso se dá vestindo capuz impermeável no polo cefálico da
vítima, ou com a mão espalmada tampando os orifícios nasais e oral, ou comprimindo sua face
contra um travesseiro ou superfície firme de tal sorte que oclua esses orifícios, impedindo a
respiração.

A causa jurídica da sufocação pode ser: homicida, acidental, e mais raramente suicida.

As lesões observadas externamente são caracterizadas por escoriações, equimoses, edema


traumático, na face, em torno da boca e do nariz, e, mesmo fraturas do osso nasal, pela ação
mecânica dessa obstrução. No homicídio, há reação de defesa na vítima lutando contra o
agressor. Há presença de cianose labial, dos pavilhões auriculuares, dos leitos ungueais,
equimose escleras.

Internamente vê-se sangue escuro, fluido, drenando dos vasos seccionados. Equimose na
face interna dos lábios e das bochechas. Petéquias em pleura visceral e no epicárdio.
EXEMPLOS DE LAUDOS DE NECROPSIA

Caso n. 01
Exame de necropsia solicitado pelo Dr. Osmar, delegado de polícia, por meio do ofício n. XXX,
da Delegacia Municipal, em virtude de óbito por provável enforcamento.Exame realizado na
data: 28/12/2008, às 09h15 . Médico-legista Dr. Chu-En-Lay Paes Leme. Nome da vítima: J.P.A.

Histórico:
O corpo foi encontrado, hoje, por volta das 06 horas, enforcado num galho de mangueira, no
quintal da casa da vítima. Deixou uma carta informando sobre sua decisão de se matar.

Descrição:
Apresentação: cadáver trajando apenas um calção de cor vermelha.

Identificação: cadáver de adulto, jovem, masculino, de cor parda. Apresenta tatuagens de


vários motivos localizadas nas seguintes regiões: braço e antebraço esquerdos, perna esquerda,
coxa direita e região escapular direita, que foram ilustradas com fotografias. Está identificado.
RG nº 2143375-5, SSP-MT.

Sinais de morte: apresenta rigidez cadavérica completa. Livores de hipóstase em membros


inferiores, fixos.

Estimativa da data da morte: óbito ocorrido por volta da 01 hora, de hoje (em torno de oito
horas antes deste exame).

Exame externo: apresenta a língua procidente, a face congesta, petéquias em esclera de


ambos os olhos, cianose labial, jugulares ingurgitadas. Presença de três sulcos, profundos,
paralelos entre si, localizados na face anterior e laterais do pescoço, e que mede 04 (quatro)
milímetros de largura cada um. São mais profundos na face esquerda do pescoço. A pele do
fundo do sulco é apergaminhada. Os sulcos dirigem-se para cima e para trás, obliquamente,
tornando-se cada vez mais superficiais, sendo descontínuos na nuca. Ausência de sinais de
lesões de agressão ou defesa.
Exame interno: Dissecada a face lateral esquerda do pescoço, observa-se sangue vermelho
escuro drenando dos vasos seccionados. Equimose em músculos dessa região e na adventícia
da carótida, que, aberta, não apresenta lesão da íntima. Ausência de lesões na traqueia.

Presença de equimose em músculo da face lateral esquerda do pescoço. Sangue vermelho


escuro e fluido.
Equimose em adventícia da carótida.

Discussão ou Comentários
As características observadas na necropsia são compatíveis com enforcamento por tração, feita
pelo peso do corpo. Não há sinais de luta nem de lesões de defesa. A causa jurídica da morte
mais provável é suicídio. Nesta circunstância, embora a morte tenha sido provocada por asfixia,
não se aplica o quarto quesito do laudo de necropsia, uma vez que não há o homicida, a quem a
lei estabelece pena maior quando comete o crime com o seu emprego.

Conclusão
A morte de J.P.A. foi asfixia produzida por enforcamento.

Resposta aos quesitos:


1º) Houve morte? Resposta: Sim.

2º) Qual a causa da morte? Resposta: Asfixia.

3º) Qual o instrumento ou meio que produziu a morte? Resposta: Meio físico-químico
(enforcamento).

4º) A morte foi produzida com o emprego de veneno, fogo, explosivo, asfixia, tortura ou outro
meio insidioso ou cruel? Resposta: Prejudicado. (veja Discussão ou Comentários).

Caso n. 02
Exame de necropsia solicitado pelo Dr. Pedro, delegado de polícia, por meio do ofício n. XXX, da
Delegacia Municipal, em virtude de óbito por provável envenenamento.Exame realizado na
data: 03/03/2009, às 12 horas. Médico-legista Dr. Chu-En-Lay Paes Leme. Nome da vítima:
J.M.Q.

Histórico:
O corpo foi localizado na Fazenda Fazendinha, no Distrito da Voadeira, hoje, por volta das 7
horas, no interior da casa da vítima. Ao lado do corpo, encontrava-se bilhete de despedida,
indicando 01h20. A perícia realizada no local encontrou embalagem de Furadan líquido,
inclusive um copo de vidro, contendo parte do conteúdo da embalagem, próximo ao corpo.
Descrição:
Apresentação: cadáver trajando camiseta azul de malha, calça marrom, cueca verde.

Identificação: cadáver de adulto, do sexo masculino, de cor branca, idoso. Está identificado.

Sinais de morte: apresenta rigidez cadavérica completa. Livores de hipóstase em segmentos


corpóreos posteriores, fixos.

Estimativa da data da morte: óbito ocorrido em torno de 10 (dez) horas antes deste exame.

Exame externo: apresenta drenagem de líquido de cor rósea pela boca. Congestão facial.
Edema de membros inferiores. Ausência de sinais de traumas mecânicos.

Líquido de cor rósea drenando da boca.

Exame interno: Abertas as cavidades: torácicas e abdominal observa-se sangue escuro, fluido,
drenando dos vasos sanguíneos seccionados. Coração aumentado de volume com
proeminência do ventrículo esquerdo. Presença de placa de ateroma, em ramo anterior
descendente da coronária esquerda. Pulmões distendidos, congestos, com superfície de corte,
drenando líquido de cor vinhosa.

A cavidade abdominal apresenta vísceras tópicas. O estômago está distendido. Aberto, está
parcialmente preenchido por restos alimentares, em meio a líquido de cor rósea, que exala
odor químico desagradável.
Conteúdo do estômago contendo líquido de cor rósea (veneno Furadan).

Discussão ou Comentários:
A perícia técnica esteve no local onde o corpo foi encontrado e identificou a presença de frasco
contendo Furadan e um copo sujo com este veneno. Havia, ainda, um bilhete de despedida. Na
necropsia constatou-se líquido de cor rósea, de odor químico desagradável, drenando da boca
e ocupando a cavidade estomacal. Impõe-se o diagnóstico de suicídio com a ingestão de
veneno. Embora a morte tenha sido provocada por envenenamento, o quarto quesito do laudo
de necropsia não se aplica a esta situação, uma vez que não há a figura do homicida. A lei
qualifica apenas o crime de homicídio (art. 121, § 2º, inciso III, do CP).

Conclusão
A causa da morte de J.M.Q. foi intoxicação exógena secundária a envenenamento.

Resposta aos quesitos


1º) Houve morte? Resposta: Sim.

2º) Qual a causa da morte? Resposta: Intoxicação exógena.

3º) Qual o instrumento ou meio que produziu a morte? Resposta: Meio químico (veneno).

4º) A morte foi produzida com o emprego de veneno, fogo, explosivo, asfixia, tortura ou outro
meio insidioso ou cruel? Resposta: Prejudicado (veja Discussão ou Comentários).
Caso n. 03
Exame de necropsia solicitado pelo Dr. J.P.M. delegado de polícia, por meio do ofício n. XXX da
Delegacia Municipal, para apurar crime de homicídio.Exame realizado na data: 07/06/2009, às
08 horas. Médico-legista: Dr. Chu-En-lay Paes Leme. Nome da vítima: G.F.P.

Histórico:
Segundo a guia de requisição de necropsia, o periciando foi atingido por disparo de arma de
fogo, no dia 06/06/2009, provocando a sua morte.

Descrição:
Apresentação: cadáver trajando calça marrom e cueca bege.

Identificação: cadáver de adulto, jovem, do sexo masculino, de cor parda. Mede 170
centímetros e pesa 71 quilogramas. Está identificado. RG. n. 3631914 SSP-GO.Sinais de
morte:apresenta rigidez cadavérica generalizada. Livores de hipóstase em segmentos corpóreos
posteriores, fixos.

Estimativa da data da morte: óbito ocorrido em torno de 12 horas antes deste exame.

Exame externo e interno: apresenta palidez cutânea. Presença de ferida de forma elíptica,
no sentido longitudinal, com bordas apresentando zona de contusão e de enxugo, medindo 1
(um) centímetro no maior eixo, com área de destruição da epiderme em seu polo latero
inferior. Está identificada com a sigla E1 e se localiza na face lateral do terço superior do braço

direito.

Ferida E1 (região do terço superior do braço direito).


Ferida E3 (região da linha axilar média na face lateral direita do tórax)

O projétil penetrou no músculo deltoide, dirigiu-se levemente para cima e para o centro,
transfixou partes moles, interrompendo sua progressão em região subclavicular direita, de
onde foi retirado.

Trajeto percorrido pelo projétil e o local de onde foi retirado.

Outra ferida elíptica, disposta longitudinalmente, medindo 1 (um) centímetro, com bordas
apresentando zona de contusão e de enxugo, com área de destruição da epiderme em seu polo
superior, identificada com a sigla E2. Está localizada na região torácica esquerda, 6 (seis)
centímetros acima do mamilo, discretamente desviada para o centro.
Ferida de entrada do projétil E2, acima do mamilo e ferida de saída do projétil S2 abaixo e
lateralmente ao mamilo.

O projétil penetrou no músculo peitoral, superficialmente, dirigiu-se para baixo,


transfixando partes moles e saiu 2,5 (dois e meio) centímetros abaixo e lateralmente ao
mamilo, fazendo ferida de bordas evertidas, a qual mede 0,5 (meio) centímetro e está
identificada com a sigla S2.
Trajeto percorrido pelo projétil que fez a ferida E2.

Outra ferida elíptica, no sentido transversal, identificada com a sigla E3, apresentando
bordas com zona de contusão e de enxugo, com área de destruição da epiderme no seu polo
posterior, localizada na face lateral do tórax, à esquerda, na topografia da linha axilar média, 14
(catorze) centímetros abaixo do oco axilar. O projétil penetrou na cavidade torácica direita
através do 9º espaço intercostal.

Local por onde o projétil penetrou na cavidade torácica (9º espaço intercostal).

O projétil transfixou o lobo inferior do pulmão direito.


Ferida de entrada do projétil na face lateral do lobo inferior do pulmão direito.

Ferida de saída do projétil na face medial do lobo inferior do pulmão direito.

O projétil interrompeu sua progressão, na altura da face anterior do corpo da 10ª vértebra
torácica, de onde foi retirado.
Local de onde o projétil foi retirado.

O projétil produziu volumoso hemotórax, à direita, num volume de 2 (dois) litros de


sangue. O calibre dos projéteis são compatíveis com 22 centésimos de polegada. Os projéteis
foram encaminhados à criminalística, para futuro confronto balístico.

Discussão ou Comentários
As características das feridas de entrada dos projéteis de arma de fogo são de tiro a
distância. O trajeto do projétil que fez a ferida, identificada com a sigla E1, foi da direita para a
esquerda, levemente de baixo para cima. O do projétil que fez a ferida, identificada com a sigla
E2, foi de cima para baixo, levemente da direita para a esquerda. O do projétil que fez a ferida,
identificada com a sigla E3, foi da direita para a esquerda, na horizontal. Este projétil provocou
as lesões que levaram ao óbito da vítima. O perito não sabe em que circunstância aconteceu o
homicídio, se a vítima tinha como se defender, ou não, razão pela qual não tem elementos para
responder ao 4º quesito.

Conclusão
A causa da morte de G.F.P. foi choque hipovolêmico secundário à hemorragia interna,
provocada por ação de instrumento perfurocontundente.

Resposta aos quesitos

1º) Houve morte?

Resposta: Sim.

2º) Qual a causa da morte?


Resposta: Choque hipovolêmico.

3º) Qual o instrumento ou meio que produziu a morte?

Resposta: Instrumento perfurocontundente.

4º) A morte foi produzida com o emprego de veneno, fogo, explosivo, asfixia, tortura ou
outro meio insidioso ou cruel?

Resposta: Sem elementos

Observação: O autor, nas mortes provocadas com o emprego de instrumentos


perfurocortantes e perfurocontundentes prefere redigir o laudo, realizando a descrição dos
exames externo e interno, num mesmo tópico. Assim, logo após a descrição da ferida externa,
já indica por onde o instrumento que a produziu penetrou no corpo, que vísceras ele lesou e
por onde saiu, ou em que local interrompeu sua progressão. Dessa forma, faz a correlação
entre a lesão externa e as lesões internas, de maneira mais simples e de fácil entendimento,
como no relato da necropsia acima descrita.
13 - A DECLARAÇÃO DE ÓBITO (DO)

Ocorrida a morte natural da pessoa, é imperiosa a emissão da Declaração de Óbito,


documento necessário, para que se tomem as providências decorrentes desse acontecimento.

A DO é o instrumento indispensável para que o Cartório do Registro Civil faça o registro do


óbito e emita a Certidão de Óbito, documento legal, que comprova o término da vida da
pessoa. Ela é utilizada para cumprir todos os procedimentos que se seguem à morte de alguém.
Com ela sepulta-se o corpo, inicia-se inventário, cumpre-se testamento, solicita-se o
recebimento de seguros de vida, quando houver, etc.

A DO contém informações médicas quanto à causa básica da morte. Essas informações são
destinadas ao Serviço de Estatística do Ministério da Saúde e lá geram dados nos quais se
delineia o perfil sanitário da população. Com esses dados, é possível fazer diagnósticos e
planejar ações que visam interromper o curso de epidemias, de situações mórbidas, etc.,
melhorando as condições de saúde da população. A DO é uma das ferramentas importantes
que o Ministério da Saúde utiliza para cumprir essa missão.

O médico, principal profissional encarregado de preencher a DO, tem o dever de conhecer


esse documento, bem como saber o caminho que ele percorre e, principalmente, ter
consciência da importância de preenchê-lo, de forma correta, honesta e responsável, ciente do
alcance das informações nele contidas, mormente no que se refere à causa básica da morte. É
inaceitável que o médico possa, por qualquer razão, inventar, ou, dizendo melhor, falsificar a
causa básica da morte, porque comete um crime (emitir atestado falso) e compromete a
estatística de causa básica de morte, gerando informações deformadas que interferirão nas
políticas de saúde e na qualidade da saúde da população.

Art. 302 do Código Penal:

Dar o médico, no exercício da sua profissão, atestado falso:

Pena – detenção, de 1 (um) mês a 1 (um) ano

O óbito pode ocorrer devido às seguintes causas:

a) causas internas – enfermidades, patologias, etc. (são ditas causas naturais).

b) causas externas – acidentes, homicídios, suicídios, (são ditas causas violentas).

Óbitos decorrentes de causas internas. Quem deve emitir a DO?


Observar as seguintes condições:
1 – Paciente que vai a óbito quando está em tratamento hospitalar.

A DO deverá ser emitida pelo médico que vinha prestando assistência ao paciente, ou, na
sua falta, pelo médico substituto ou plantonista.

2 – Paciente que vai a óbito quando está em tratamento em regime ambulatorial.

A DO deverá ser emitida pelo médico que vinha prestando assistência ao paciente, ou, na
sua falta, por outro médico designado pela instituição que prestava a assistência.

3 – Paciente que vai a óbito quando está em tratamento em regime domiciliar.

A DO deverá ser emitida pelo médico do Programa de Saúde da Família, ou pelo médico do
Programa de Internação Domiciliar, ou outros assemelhados.

4 – Paciente que vai a óbito quando está sem assistência médica.

A DO deverá ser emitida pelo médico do SVO, onde houver, ou se não houver o SVO, por
médico do Serviço Público de Saúde; caso não haja esse serviço público, por qualquer médico
da localidade. Caso não haja médico, por duas pessoas qualificadas que tenham presenciado,
ou verificado a morte. (art. 77, Lei dos Registros Públicos – nº 6.015).

Lembretes importantes:
1 – Quando o paciente chega morto, ou morre assim que dá entrada no serviço de saúde e
o médico afasta a possibilidade de morte de causa violenta, mas não realizou nenhum exame
que possa apontar a causa natural do óbito, preencher o campo VI da DO da seguinte forma:
Óbito Sem Assistência Médica.

2 – Antes de preencher a DO ter um documento que identifique o morto.

3 – Se o falecido é desconhecido, não identificado, solicitar a presença de técnico do


Instituto de Identificação, quando houver este serviço, para colher as suas impressões digitais.
O campo II da DO deverá ser preenchido com o termo: Não identificado. Anexar o máximo de
informações possíveis: estatura, sexo, cor,sinais particulares, vestimentas, presumir sua idade e
fotografar, para auxiliar num futuro reconhecimento. (art. 81, Lei dos Registros Públicos – nº
6.015).

4 – A DO não poderá ser emitida com rasuras.

5 – Não é permitida a emissão de segunda via da DO.

6 – Se cometer erro ao preencher a DO, deve anulá-la e devolvê-la para a Secretaria


Municipal da Saúde, repartição de Vigilância Sanitária.

7 – Se a DO for emitida por: Instituições de Saúde, Instituto de Medicina Legal e SVO, a 2ª


via deve ser entregue aos familiares, para que se faça o registro do óbito no Cartório do
Registro Civil. As 1ª e 2ª vias deverão ficar na Instituição, sendo a 1ª via recolhida pela
Secretaria Municipal de Saúde e a 3ª via, arquivada na Instituição.
8 – O médico não deverá assinar a DO em branco. Deverá assiná-la, sempre, após
preenchê-la.

9 – O médico deverá preencher a DO somente após, pessoalmente, constatar o óbito.

10 – A DO deverá ser emitida, quando a criança nascer viva e morrer logo após o
nascimento, independente do seu tempo de gestação, do seu peso e da sua estatura.

11 – Se for óbito fetal, a DO deverá ser emitida, se a gestação durou vinte ou mais
semanas, ou se o feto tiver peso igual ou superior a quinhentos gramas, ou se medir vinte e
cinco ou mais centímetros de comprimento craniopodálico.

Óbitos decorrentes de causas externas. Quem deve emitir a DO?


Observar as seguintes condições:

1 – Localidade onde há IML, ou que tenha perito médico-legista oficial. Nessas localidades,
a DO será emitida pelo perito médico-legista, a quem a autoridade competente requisita o
exame de necropsia para elucidação da causa da morte e emissão do respectivo laudo médico-
legal.

2 – Localidade onde não há o médico-legista. Nessas localidades, a autoridade competente


(delegado de polícia, promotor público, juiz de direito), nomeia um médico do local para atuar
como perito ad hoc, o qual ficará incumbido de realizar a necropsia, após o que elaborará o
laudo médico-legal e preencherá a DO.

3 – Localidade onde não há médico.Nessas localidades, a DO será emitida por duas pessoas
qualificadas que tenham presenciado ou verificado a morte (art. 77, Lei dos Registros Públicos
nº 6.015).

Nascido Vivo
É a expulsão ou extração completa do corpo da mãe, independentemente da duração da
gravidez, de um produto de concepção que respire, ou apresente qualquer outro sinal de vida,
tais como batimentos do coração, pulsações do cordão umbilical, ou movimentos efetivos dos
músculos de contração voluntária, estando, ou não, cortado o cordão umbilical e estando, ou
não, desprendida a placenta. (BRASIL, Ministério da Saúde, 2007, p. 29).

Óbito Fetal, Morte Fetal ou Perda Fetal


É a morte de um produto de concepção, antes da expulsão do corpo da mãe,
independentemente da duração da gravidez. A morte do feto é caracterizada pela inexistência,
depois da separação, de qualquer sinal descrito para o nascido vivo. (Idem).

Legislação
Lei dos Registros Públicos, nº 6.015

Art. 29. Serão registrados no registro civil de pessoas naturais:

I – os nascimentos;
II – os casamentos;

III – os óbitos;

IV – as emancipações;

V – as interdições;

VI – as sentenças declaratórias de ausências;

VII – as opções de nacionalidade;

VIII – as sentenças que deferirem a legitimação adotiva.

Art. 30. Não serão cobrados emolumentos pelo registro civil de nascimento e pelo assento
de óbito, bem como pela primeira certidão respectiva.

§ 1º Os reconhecidamente pobres estão isentos de pagamento de emolumentos pelas


demais certidões extraídas pelo cartório de registro civil.

§ 2º O estado de pobreza será comprovado por declaração do próprio interessado ou a


rogo, tratando-se de analfabeto, neste caso, acompanhada da assinatura de duas testemunhas.

§ 3º A falsidade da declaração ensejará a responsabilidade civil e criminal do interessado.

§ 3º A. Comprovado o descumprimento, pelos oficiais de Cartórios de Registro Civil, do


disposto no caput deste artigo, aplicar-se-ão as penalidades previstas nos arts. 32 e 33 da Lei nº
8.935, de 18 de novembro de 1994. (Incluído pela Lei nº 9.812, de 1999).

§ 3º B. Esgotadas as penalidades a que se refere o parágrafo anterior e verificando-se novo


descumprimento, aplicar-se-á o disposto no art. 39 da Lei nº 8.935, de 18 de novembro de 1994.

§ 4º É proibida a inserção nas certidões de que trata o § 1º deste artigo de expressões que
indiquem condição de pobreza ou semelhantes. Incluído pela Lei nº 11.789, de 02 de outubro de
2008.

Art. 50. Todo nascimento que ocorrer no território nacional deverá ser dado a registro, no lugar
em que tiver ocorrido o parto ou no lugar da residência dos pais, dentro do prazo de quinze
dias, que será ampliado em até três meses para os lugares distantes mais de trinta quilômetros
da sede do cartório.

§ 1º Quando for diverso o lugar da residência dos pais, observar-se-á a ordem contida nos
itens 1º e 2º do art. 52.

§ 2º Os índios, enquanto não integrados, não estão obrigados a inscrição do nascimento.


Este poderá ser feito em livro próprio do órgão federal de assistência aos índios.

§ 3º Os menores de vinte e um (21) anos e maiores de dezoito (18) anos poderão,


pessoalmente e isentos de multa, requerer o registro de seu nascimento.
§ 4º É facultado aos nascidos anteriormente à obrigatoriedade do registro civil requerer,
isentos de multa, a inscrição de seu nascimento.

§ 5º Aos brasileiros nascidos no estrangeiro se aplicará o disposto neste artigo, ressalvadas


as prescrições legais relativas aos consulados.

Art. 53.No caso de ter a criança nascido morta ou no de ter morrido na ocasião do parto, será,
não obstante, feito o assento com os elementos que couberem e com remissão ao do óbito.

§ 1º No caso de ter a criança nascido morta, será o registro feito no livro “C Auxiliar”, com
os elementos que couberem.

§ 2º No caso de a criança morrer na ocasião do parto, tendo, entretanto, respirado, serão


feitos os dois assentos, o de nascimento e o de óbito, com os elementos cabíveis e com
remissões recíprocas.

Art. 77. Nenhum sepultamento será feito sem certidão, do oficial de registro do lugar do
falecimento, extraída após a lavratura do assento de óbito, em vista do atestado de médico, se
houver no lugar, ou em caso contrário, de duas pessoas qualificadas que tiverem presenciado
ou verificado a morte.

§ 1º Antes de proceder ao assento de óbito de criança de menos de 1 (um) ano, o oficial


verificará se houve registro de nascimento, que, em caso de falta, será previamente feito.

§ 2º A cremação de cadáver somente será feita daquele que houver manifestado a vontade
de ser incinerado ou no interesse da saúde pública e se o atestado de óbito houver sido firmado
por dois médicos ou por 1 (um) médico legista e, no caso de morte violenta, depois de
autorizada pela autoridade judiciária.

Art. 78. Na impossibilidade de ser feito o registro dentro de 24 (vinte e quatro) horas do fale-
cimento, pela distância ou qualquer outro motivo relevante, o assento será lavrado depois, com
a maior urgência, e dentro dos prazos fixados no artigo 50.

Art. 79. São obrigados a fazer declaração de óbitos:

1º) o chefe de família, a respeito de sua mulher, filhos, hóspedes, agregados e fâmulos;

2º) a viúva, a respeito de seu marido, e de cada uma das pessoas indicadas no número
antecedente;

3º) o filho, a respeito do pai ou da mãe; o irmão, a respeito dos irmãos e demais pessoas da
casa, indicadas no n. 1; o parente mais próximo maior e presente;

4º) o administrador, diretor ou gerente de qualquer estabelecimento público ou particular,


a respeito dos que nele faleceram, salvo se estiver presente algum parente em grau acima
indicado;
5º) na falta de pessoa competente, nos termos dos números anteriores, a que tiver
assistido aos últimos momentos do finado, o médico, o sacerdote ou vizinho que do falecimento
tiver notícia;

6º) a autoridade policial, a respeito de pessoas encontradas mortas.

Parágrafo único. A declaração poderá ser feita por meio de preposto, autorizando-o o
declarante em escrito, de que constem os elementos necessários ao assento de óbito.

Art. 80. O assento de óbito deverá conter:

1º) a hora, se possível, dia, mês e ano do falecimento;

2º) o lugar do falecimento, com indicação precisa;

3º) o prenome, nome, sexo, idade, cor, estado, profissão, naturalidade, domicílio e
residência do morto;

4º) se era casado, o nome do cônjuge sobrevivente, mesmo quando desquitado; se viúvo, o
do cônjuge pré-defunto, e o cartório de casamento em ambos os casos;

5º) os nomes, prenomes, profissão, naturalidade e residência dos pais;

6º) se faleceu com testamento conhecido;

7º) se deixou filhos, nome e idade de cada um;

8º) se a morte foi natural ou violenta e a causa conhecida, com o nome dos atestantes;

9º) lugar do sepultamento;

10º) se deixou bens e herdeiros menores ou interditos;

11º) se era eleitor.

Art. 82. Sendo o finado desconhecido, o assento deverá conter declaração de estatura ou
medida, se for possível, cor, sinais aparentes, idade presumida, vestuário e qualquer outra
indicação que possa auxiliar de futuro o seu reconhecimento; e, no caso de ter sido encontrado
morto, serão mencionados esta circunstância e o lugar em que se achava e o da necropsia, se
tiver havido.

Parágrafo único. Neste caso, será extraída a individual datiloscópica, se no local existir esse
serviço.

Art. 82. O assento deverá ser assinado pela pessoa que fizer a comunicação ou por alguém a seu
rogo, se não souber ou não puder assinar.

Art. 83. Quando o assento for posterior ao enterro, faltando atestado de médico ou de duas
pessoas qualificadas, assinarão, com a que fizer a declaração, duas testemunhas que tiverem
assistido ao falecimento ou ao funeral e puderem atestar, por conhecimento próprio ou por
informação que tiverem colhido, a identidade do cadáver.

Art. 84. Os assentos de óbitos de pessoas falecidas a bordo de navio brasileiro serão lavrados de
acordo com as regras estabelecidas para os nascimentos, no que lhes for aplicável, com as
referências constantes do artigo 80, salvo se o enterro for no porto, onde será tomado o
assento.

Art. 85. Os óbitos, verificados em campanha, serão registrados em livro próprio, para esse fim
designado, nas formações sanitárias e corpos de tropas, pelos oficiais da corporação militar
correspondente, autenticado cada assento com a rubrica do respectivo médico chefe, ficando a
cargo da unidade que proceder ao sepultamento o registro, nas condições especificadas, dos
óbitos que se derem no próprio local do combate.

Art. 86. Os óbitos a que se refere o artigo anterior, serão publicados em boletim da corporação e
registrados no registro civil, mediante relações autenticadas, remetidas ao Ministério da Justiça,
contendo os nomes dos mortos, idade, naturalidade, estado civil, designação dos corpos a que
pertenciam, lugar da residência ou de mobilização, dia, mês, ano e lugar do falecimento e do
sepultamento para, à vista dessas relações, se fazerem os assentamentos de conformidade com
o que a respeito está disposto no artigo 66.

Art. 87. O assento de óbito ocorrido em hospital, prisão ou outro qualquer estabelecimento
público será feito, em falta de declaração de parentes, segundo a da respectiva administração,
observadas as disposições dos artigos 81 a 84; e o relativo a pessoa encontrada acidental ou
violentamente morta, segundo a comunicação, ex officio, das autoridades policiais, às quais
incumbe fazê-la logo que tenham conhecimento do fato.

Art. 88. Poderão os Juízes togados admitir justificação para o assento de óbito de pessoas
desaparecidas em naufrágio, inundação, incêndio, terremoto ou qualquer outra catástrofe,
quando estiver provada a sua presença no local do desastre e não for possível encontrar-se o
cadáver para exame.

Parágrafo único. Será também admitida a justificação no caso de desaparecimento em


campanha, provados a impossibilidade de ter sido feito o registro nos termos do artigo 85 e os
fatos que convençam da ocorrência do óbito.

Resolução nº 1.779, de 11 de novembro de 2005, do Conselho Federal de Medicina.

CONSIDERANDO que Declaração de Óbito é parte integrante da assistência médica;

CONSIDERANDO a Declaração de Óbito como fonte imprescindível de dados epidemiológicos;

CONSIDERANDO que a morte natural tem como causa a doença ou lesão que iniciou a sucessão
de eventos mórbidos que diretamente causaram o óbito;

CONSIDERANDO que a morte não-natural é aquela que sobrevém em decorrência de causas


externas violentas;
CONSIDERANDO a necessidade de regulamentar a responsabilidade médica no fornecimento da
Declaração de Óbito;

CONSIDERANDO, finalmente, o decidido em sessão plenária realizada em 11 de novembro de


2005, RESOLVE:

Art. 1º. O preenchimento dos dados constantes na Declaração de Óbito (DO) é de


responsabilidade do médico que atestou a morte.

Código de Ética Médica


Princípios Fundamentais

XIX – O médico se responsabilizará, em caráter pessoal e nunca presumido, pelos seus atos
profissionais, resultantes de relação particular de confiança e executados com diligência,
competência e prudência.

Documentos Médicos

É vedado ao médico:

Art. 83. Atestar óbito quando não o tenha verificado pessoalmente, ou quando não tenha
prestado assistência ao paciente, salvo, no último caso, se o fizer como plantonista, médico
substituto ou em caso de necropsia e verificação médico-legal.

Art. 84. Deixar de atestar óbito de paciente ao qual vinha prestando assistência, exceto quando
houver indícios de morte violenta.

Código Penal
Da Falsidade Documental

Falsidade de atestado médico

Art. 302. Dar o médico, no exercício da sua profissão, atestado falso:

Pena – detenção, de 1 (um) mês a 1 (um) ano.

Parágrafo único. Se o crime é cometido com o fim de lucro, aplica-se também multa.

Código Civil
Art. 6º. A existência da pessoa natural termina com a morte. Presume-se esta, quanto aos
ausentes, nos casos dos arts. 481 e 482.

Art. 9º. Serão inscritos em registro público:

I – Os nascimentos, casamentos e óbitos.

Como preencher o campo 49 do bloco VI da Declaração de Óbito


O campo 49 é o lugar em que o médico irá informar: Causas da morte.
“Este campo é de suma importância, porque fornece valiosa informação para a construção
do perfil epidemiológico da população para os três níveis: Federal, Estadual e
Municipal.”(MATO GROSSO, 2001, p. 28). Este campo é constituído pela Parte I e pela Parte II.

Parte I
O modelo padronizado pela OMS estabelece quatro linhas precedidas pelas letras: “a”, “b”,
“c”, “d”, sendo “a” a primeira linha, “b” a segunda, “c” a terceira e “d” a última. Isso permite
que se informe o evento principal que acometeu a pessoa e que, a partir daí, gerou situações
que agravaram o seu estado de saúde, culminando com uma condição terminal diretamente
responsável pelo óbito.

Padronizou-se cunhar o evento principal, ou desencadeador das modificações que


produziram o óbito de Causa Básica da Morte.

Assim, a causa básica da morte “é a doença ou lesão que iniciou a cadeia de


acontecimentos patológicos que conduziram diretamente à morte, ou as circunstâncias do
acidente ou violência que produziram a lesão fatal”. (BRASIL, Ministério da Saúde, 2007, p. 28).

A causa básica da morte é anotada na linha “d”. Essa causa básica é caracterizada por uma
patologia, ou por uma lesão produzida por agente vulnerante, que desencadeia desequilíbrios
no organismo da pessoa, progressivamente, até determinar a sua morte. Os eventos que se
seguem à causa básica da morte são anotados, numa sequência lógica, nas linhas: “c”, depois
“b” e por último “a”, sendo assinalado, nesta linha, o evento final que determinou a morte.

A causa básica da morte é o evento principal que gera, como consequência, as situações
que serão registradas nas linhas: “c”, “b” e “a”; é a informação principal nessa sequência. Ela é
a que registra a patologia básica, ou a lesão básica que produziu a morte. É ela o alvo da ação
das políticas de saúde para interromper ou prevenir a sua ocorrência.

O médico deve preocupar-se em informar, com exatidão, essa parte da DO,


compreendendo a importância da informação e o seu alcance na elaboração das políticas
públicas de saúde.

Parte II
Nesta parte o médico informará qualquer doença ou lesão que tenha influído
desfavoravelmente, contribuindo, assim, para a morte, e que não esteja relacionada com o
estado patológico que conduziu diretamente ao óbito. As causas registradas nesta parte são
denominadas causas contribuintes.

Quando o óbito ocorrer meses após uma lesão produzida por causa externa, desde que
tenha nexo causal com ela, a DO deverá ser preenchida pelo médico-legista.

Suponha-se uma vítima que foi esfaqueada no abdome, com lesão de alças intestinais e
que foi submetida à cirurgia. Evoluiu com peritonite, necessitando ser operada mais duas vezes,
mesmo assim, não se restabeleceu e foi a óbito, um mês após a agressão, devido à septicemia,
como complicação da peritonite. Há nexo causal entre o esfaqueamento e a produção do óbito.
Trata-se de morte violenta. O médico da instituição não poderá assinar a DO. O caso deverá
gerar um boletim de ocorrência policial, e o corpo será encaminhado ao IML, para o exame de
necropsia, elaboração do laudo médico-legal e preenchimento da DO, pelo médico-legista.

Como Preencher a Declaração de Óbito


Transcrição, a seguir, da orientação de como preencher a DO, contida no Manual do
Sistema de Informação sobre Mortalidade – Ministério da Saúde - adaptado para a realidade de
Mato Grosso e editado, em 2001, pela Secretaria de Estado de Saúde de MT.

Orientações Gerais
A DO deverá ser preenchida para todos os óbitos:

* ocorridos em estabelecimentos de saúde, domiciliares ou outros locais;

* fetais, a partir de 22 semanas de gestação, quando se tem o conhecimento da idade


gestacional, ou com peso igual ou superior a 500 gramas ou estatura igual ou superior a 25 cm.

A DO é composta por 09 blocos de variáveis:

* Bloco I – Cartório

* Bloco II – Identificação

* Bloco III – Residência

* Bloco IV – Ocorrência

* Bloco V – Óbito fetal ou Menor de um Ano

* Bloco VI – Condições e Causas do Óbito

* Bloco VII – Médico

* Bloco VIII – Causas Externas

* Bloco IX – Localidades sem Médico

Este é o cabeçalho da DO onde consta o seu número

Bloco I – Cartório
Este bloco se destina a colher informações sobre o Cartório do Registro Civil onde foi
registrado o falecimento. O preenchimento deste bloco é de exclusividade do Oficial do
Registro Civil.
Campo 1 – Cartório:Colocar o nome do Cartório.

Código:Deixar em branco, pois o código referente ao Cartório será preenchido pelo setor
responsável pelo processamento.

Campo 2 – Registro:Anotar o número que foi dado ao registro.

Campo 3 – Data:Anotar a data em que foi efetuado o registro. O ano deve conter 4 algarismos.

Campo 4 – Município:Colocar o nome do Município onde se localiza o Cartório.

Campo 5 – UF:Colocar a sigla da Unidade da Federação onde se localiza o Cartório.

Campo 6 – Cemitério:Colocar o nome do cemitério onde será feito o sepultamento.

Bloco II – Identificação
Este bloco se destina a colher informações gerais sobre a identidade do falecido ou dos pais,
em caso de óbito fetal ou de menor de um ano.

Campo 7 – Tipo de Óbito: Colocar um “x” na quadrícula correspondente ao tipo de óbito, se


fetal ou não. Este campo é uma das variáveis consideradas fundamentais para o sistema. O não
preenchimento implica na parada do sistema durante a digitação.

Campo 8 – Óbito: Destina-se a colher informações sobre o momento temporal de ocorrência


do evento. Hora: Anotar a hora em que ocorreu o óbito. Este dado é de importância para o
Cartório. Data: Anotar a data em que ocorreu o óbito. O ano deverá conter quatro algarismos.

Campo 9 – RIC: Este campo foi criado prevendo a utilização do Registro de Identificação Civil,
número único para cada cidadão, ainda em implantação nos estados brasileiros.

Campo 10 – Naturalidade: Colocar o nome do município de onde era natural o falecido, com
a sigla da respectiva Unidade da Federação. Em caso de desconhecimento do município, colocar
a sigla do Estado. Se não for conhecido o Estado, deixar em branco ou colocar um traço ( - ).

Campo 11 – Nome do Falecido: A notar o nome completo.


Campo 12 – Nome do Pai: Anotar o nome completo.

Campo 13 – Nome da Mãe: Anotar o nome completo.

Observação: O preenchimento dos campos 12 e 13 é indispensável para o caso de óbito fetal


em que não se fez o Registro de Nascimento devido ter nascido morto. No campo 11 colocará:
Natimorto filho de: xxxxxxxx .Se o falecido não for identificado anotar no campo 11: Não
Identificado.

Campo 14 – Data do Nascimento: Anotar a data do nascimento, ressaltando que o ano


deverá conter quatro algarismos.

Campo 15 – Idade:

Anos Completos:Colocar a idade do falecido em anos completos, quando for igual ou maior
que um ano, ou quando a idade presumida estiver dentro destes limites.

Menores de um ano: Quando a idade do falecido for menor que um ano, este campo deverá
ser preenchido do seguinte modo:

Até 1 ano: Colocar o número de meses completos de vida, se a criança tiver morrido com mais
de um e menos de doze meses.

Até 1 mês:Colocar o número de dias de vida, no caso em que a criança tenha morrido com
mais de um e menos de trinta dias.

Até 1 dia: Colocar o número de horas de vida, se a criança tiver mor-rido com mais de uma e
menos de vinte e quatro horas.

Até 1 hora: Colocar, se possível, o número de minutos de vida, se a criança tiver morrido com
menos de sessenta minutos.

Em caso de desconhecimento da idade do falecido, colocar a idade presumida.

Campo 16 – Sexo: Este campo não deve ser deixado em branco. Assinalar com um “x” a
quadrícula correspondente ao tipo de sexo: M se masculino, F se feminino e I se ignorado, que
só deverá ser preenchido em casos especiais, quando for impossível o conhecimento do sexo.

Campo 17 – Raça/Cor: Assinalar a quadrícula correspondente, com um “x”. Lembrar que esta
variável não admite a alternativa Ignorada. Em caso de o óbito ser de indígena, marcar a
quadrícula 5 e anotar à parte o grupo/povo correspondente. Esta variável não se aplica à óbito
fetal.

Campo 18 – Estado Civil: Assinalar com um “x” a quadrícula correspondente ao estado civil
do falecido.Não deve ser preenchida em caso de óbito fetal e crianças.

Campo 19 – Escolaridade:Este campo não deve ser preenchido em caso de óbito fetal e de
criança menor de 5 anos. A quadrícula correspondente ao grau de escolaridade do falecido
deverá ser assinalada com um “x”, lembrando que este campo se refere ao número de anos de
estudos concluídos.

1) Nenhuma – se não tiver nenhuma escolaridade;

2) De 1 a 3 – se tiver concluído da 1ª à 3ª séries do 1º Grau;

3) De 4 a 7 – se tiver concluído da 4ª à 7ª séries do 1º Grau;

4) De 8 a 11 – se tiver concluído o 1º Grau, ou da 1ª à 3ª séries do 2º Grau;

5) 12 e mais – se tiver estudado além do 2º Grau;

6) Ignorado – se não houver como saber a escolaridade.

Campo 20 – Ocupação habitual e ramo de atividade: Este campo não deve ser reenchido
para óbitos fetais nem para crianças com menos de 5 anos de idade. Ocupação habitual é o tipo
de trabalho que o falecido desenvolveu na maior parte da sua vida produtiva. A informação
deve ser detalhada, de modo a permitir uma boa classificação. Não preencher com ocupações
vagas, como vendedor, operário, etc., mas com o complemento da ocupação: vendedor de
automóveis, operário têxtil, etc.

No caso de o falecido ser aposentado, deve ser colocada a ocupação habitual anterior. Anotar
estudante se o falecido, por ocasião do óbito, apenas estudava e não desenvolvia nenhuma
atividade regularmente remunerada.

O código: correspondente à ocupação, será preenchido pelo setor responsável pelo


processamento dos dados.

Bloco III – Residência


Esse bloco foi desmembrado do Bloco Identificação dos modelos anteriores, uma vez que esta

variável não faz parte do conjunto de identificação pessoal do falecido.

Campo 21 – Logradouro: Anotar o endereço completo, com número e complemento.

O Código: correspondente será preenchido pelo setor responsável pelo processamento dos
dados, se estiver cadastrado.

Campo 22 – CEP: Este campo se refere ao Código de Endereçamento Postal, conforme consta
do Guia Postal Brasileiro, editado pela Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos.

Campo 23 – Bairro/Distrito: Anotar o bairro ou distrito ao qual pertence o logra-douro.


O Código: correspondente será preenchido pelo setor responsável pelo processamento dos
dados, se estiver cadastrado.

Campo 24 – Município de Residência: Colocar o nome do município onde residia


habitualmente o falecido. Em caso de óbito fetal, considerar o município de residência da mãe.

O Código: correspondente será preenchido pelo setor responsável pelo processamento dos
dados, utilizando o padrão do IBGE.

Campo 25 – UF: Anotar a sigla da Unidade da Federação correspondente.

Bloco IV – Ocorrência
Este bloco foi desmembrado do Bloco de Identificação dos modelos anteriores. Destina-se a
colher informações sobre o local (área física, e não geográfica) onde ocorreu o óbito.

Campo 26 – Local de Ocorrência do Óbito: Assinalar com um “x” a quadrícula cor-


respondente:

1) Hospital – se o óbito ocorreu em um Estabelecimento de Saúde que tem por finalidade


básica prestar assistência médica, em regime de internação, possuindo leitos e instalações
apropriadas, com assistência médica permanente de, pelo menos, um médico.

2) Outros Estabelecimentos de Saúde – se o óbito ocorreu em outros estabelecimentos que


prestam atenção à saúde coletiva ou individual, que não sejam Hospitais, como por exemplo
Postos e Centros de Saúde.

3) Domicílio – se o óbito ocorreu em um Domicílio.

4) Via Pública – se o óbito ocorreu em uma via pública.

5) Outros – se o óbito não ocorreu em um Estabelecimento de Saúde, nem em Domicílio, nem


em Via Pública.

6) Ignorado – se não houver como saber onde ocorreu o óbito.

Campo 27 – Estabelecimento: Este campo se refere ao nome do Estabelecimento de Saúde


onde ocorreu o óbito, devendo ser preenchido apenas quando a informação prestada no
Campo 26 (Local de Ocorrência) tiver sido a alternativa 1 – Hospital ou 2 – Outros
Estabelecimentos de Saúde.

O Código: para o estabelecimento será preenchido pelo setor responsável pelo processamento
dos dados, segundo o respectivo Cadastro.
Campo 28 – Endereço de Ocorrência: Este campo deverá ser preenchido quando o óbito tiver
ocorrido fora de um Estabelecimento de Saúde ou de uma residência, ou seja, quando a
informação prestada no Campo 26 (Local de Ocorrência) tiver sido a alternativa 4 – Via Pública
ou 5 – Outros. Preencher com o endereço completo.

Campo 29 – CEP: Este campo se refere ao Código de Endereçamento Postal, conforme consta
do Guia Postal Brasileiro, editado pela Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos.

Campo 30 – Bairro/Distrito: Anotar o bairro ou distrito ao qual pertence o logra-douro.

O Código: correspondente será preenchido pelo setor responsável pelo processamento dos
dados.

Campo 31 – Município de Ocorrência: Colocar o nome do município onde ocorreu o óbito.

O Código: correspondente aos do IBGE e será colocado pelo setor responsável pelo
processamento dos dados.

Campo 32 – UF: Anotar a sigla do Estado correspondente ao município onde ocorreu o óbito.

Bloco V – Óbito Fetal ou Menor de um Ano


Este bloco se destina a colher informações referentes à mãe, no que se refere à idade, grau de
escolaridade, ocupação, gestação, tipo de parto e peso ao nascer. Deve ser obrigatoriamente

preenchido em caso de óbito fetal ou óbito em menor que um ano.

Campo 33 – Idade: Colocar a idade da mãe em anos.

Campo 34 – Escolaridade: A quadrícula correspondente ao grau de escolaridade da mãe


deverá ser assinalada com um “x”, lembrando que este campo se refere ao número de anos de
estudos concluídos:

1) Nenhuma – se não tiver nenhuma escolaridade;

2) De 1 a 3 – se tiver concluído da 1ª à 3ª séries do 1º Grau;

3) De 4 a 7 – se tiver concluído da 4ª à 7ª séries do 1º Grau;

4) De 8 a 11 – se tiver concluído o 1º Grau, ou da 1ª à 3ª séries do 2º Grau;


5) De 12 a mais – se tiver estudado além do 2º Grau;

6) Ignorado – se não houver como saber a escolaridade.

Campo 35 – Ocupação e Ramo de Atividade da Mãe: Este campo se refere ao tipo de


trabalho desenvolvido pela mãe. A informação deve ser detalhada, de modo a permitir uma
boa classificação. No caso de a mãe ser aposentada, deve ser colocada a ocupação habitual
anterior. Anotar estudante, se a mãe apenas estudava e não desenvolvia nenhuma atividade
remunerada.

O Código: correspondente à ocupação será preenchido pelo setor responsável pelo


processamento dos dados.

Campo 36 – Número de Filhos Tidos: Destina-se a informações sobre o número de filhos


tidos, quer vivos, quer mortos, inclusive abortamentos. Esta variável deverá ser preenchida com
dois algarismos para cada tipo. Se não tiver havido filhos, colocar 00 no campo correspondente,
se não houver informações a respeito, colocar 99.

Lembrar que esta variável inclui o nascido morto a que se refere a Declaração.

Campo 37 – Duração da Gestação: Assinalar com um “x” a quadrícula correspondente à


duração da gestação, expressa em semanas.

Campo 38 – Tipo de Gravidez: Assinalar com um “x” a quadrícula correspondente ao tipo de


gravidez. Lembrar que cada alternativa se refere ao número de conceptos para cada tipo, isto é,
um feto, dois, três ou mais

Campo 39 – Tipo de Parto: O tipo de parto deverá ser informado com a colocação de um “x”
na quadrícula correspondente. Ressaltar que a alternativa Vaginal inclui todos os partos por via
baixa, incluindo o fórceps e vácuo-extrator.

Campo 40 – Morte em Relação ao Parto: Assinalar com um “x” a quadrícula cor-


respondente ao óbito em relação ao parto, isto é, se ocorreu antes, durante ou depois.

Campo 41 – Peso ao Nascer: Anotar o peso em gramas (quatro algarismos).

Campo 42 – Número da Declaração de Nascido Vivo: Anotar o número da Declaração de


Nascido Vivo – DN.

Bloco VI – Condições e Causas do Óbito


Este bloco se destina a qualificar as condições e causas que provocaram o óbito. Contempla o
modelo Internacional de Atestado de Óbito adotado pela Organização Mundial de Saúde –
OMS, desde 1948. O preenchimento deste bloco é da responsabilidade exclusiva do médico.

Deverá ser preenchido para qualquer tipo de óbito, fetal e não fetal.

Óbitos Em Mulheres– Os campos 43 e 44 se destinam a ser preenchidos em casos de óbitos em


mulheres na idade considerada fértil, adotada a faixa de 10 a 54 anos.
Campo 43 – A Morte Ocorreu Durante a Gravidez, Parto ou Aborto? Neste campo,
informar com um “x” na quadrícula correspondente, se o óbito ocorreu durante a gravidez,
parto ou aborto, considerando que uma resposta Sim se aplica tanto à gravidez quanto ao parto
ou aborto.

Campo 44 – A Morte Ocorreu Durante o Puerpério? Assinalar com um “x” a quadrícula


correspondente, do seguinte modo:

1) Sim, até 42 dias – se o óbito ocorreu durante os primeiros 42 dias do puerpério.

2) Sim, de 43 dias a 1 ano – se o óbito ocorreu entre o 43º e o 365º dia do puerpério.

3) Não – se a morte não teve relação com os períodos acima.

9) Ignorado – se a informação não pode ser conseguida.

Assistência Médica
Campo 45 – Recebeu Assistência Médica Durante a Doença que Ocasionou a Morte?
Assinalar com um “x” a quadrícula correspondente à alternativa escolhida. Este campo deve ser
preenchido com cuidado: a resposta Sim significa que o falecido, durante a doença que
ocasionou a morte, teve uma assistência médica todo o tempo; a resposta Não implica em que
o falecido não teve assistência médica continuada, podendo tê-la tido apenas por ocasião do
óbito.

Diagnóstico Confirmado Por – este campo se destina a colher informações subsidiárias ao


diagnóstico, para uma melhor confirmação do mesmo. Marcar com um “x” a quadrícula
correspondente à resposta em cada um dos três campos abaixo:

Campo 46 – Exame Complementar? 1 ( ) Sim 2 ( ) Não 3 ( ) Ignorado.

Campo 47 – Cirurgia? 1 ( ) Sim 2 ( ) Não 3 ( ) Ignorado.

Campo 48 – Necropsia? 1 ( ) Sim 2 ( ) Não 3 ( ) Ignorado.

Causas da Morte
Campo 49 – Causas da Morte: Este campo é de suma importância, porque fornece valiosa
informação para a construção do perfil epidemiológico da população. Em princípio, não
deverão ser incluídos sintomas e modos de morrer, como insuficiência cardíaca sem
especificação, insuficiência respiratória sem especificação, parada cardiorrespiratória, falência
de múltiplos órgãos e demais causas que não especificam a causa básica da morte. As referidas
causas somente devem ser aceitas como consequência de uma outra causa que tenha
originado todas as demais.Tradicionalmente, as estatísticas de mortalidade segundo causas de
morte são produzidas atribuindo-se ao óbito uma só causa, chamada causa básica. Como já
mencionado esta causa básica é “a doença ou lesão que iniciou a cadeia de acontecimentos
patológicos que conduziram diretamente à morte, ou as circunstâncias do acidente ou violência
que produziram a lesão fatal”.O médico deve declarar corretamente a causa básica no Atestado
de Óbito e, em vista de recomendação internacional, ela deve ser escrita em último lugar (linha
“d”), na Parte I. Este princípio deve ser sempre seguido pelos médicos ao preencherem o
atestado de óbito, pois, caso contrário, as estatísticas de mortalidade segundo a causa básica
ou primária serão falhas, o que afeta não só a comparabilidade, como pode resultar em um
perfil epidemiológico falso.

A Parte I do Campo 49 apresenta 4 linhas identificadas com as letras: a, b, c d.As causas


decorrentes da causa básica deverão ser anotadas nas linhas colocadas acima da linha “d”, ou
seja: linha “c”, linha “b” e linha “a”.Nos casos de óbitos fetais, não se deve anotar o termo
NATIMORTO, mas sim a causa que provocou o óbito do feto.

A Parte II contém duas linhas. Nesta parte deverão ser anotadas as causas contribuintes para
o óbito, e que não estejam relacionadas com a causa básica.

Tempo aproximado entre o início da doença e a morte – este espaço deverá sempre ser
preenchido. O que se pretende é estabelecer o tempo aproximado entre o início do processo
mórbido e a morte, embora isto nem sempre seja possível, como nos casos de doenças crônicas
ou degenerativas. Quando este tempo não puder ser estabelecido, anotar ignorado.

Exemplo ilustrando o preenchimento destas duas partes do Campo 49


Paciente diabético contraiu febre tifóide. Apresentou perfuração intestinal que evoluiu para
peritonite, sendo o óbito decorrente de septicemia.

Parte I a) Septicemia

b) Peritonite

c) Perfuração Intestinal

d) Febre Tifóide

Parte II Diabetes Mellitus

Bloco VII – Médico


Este bloco se destina a colher informações básicas sobre o médico que assina a Declaração de
Óbito.
Campo 50 – Nome do Médico: Anotar o nome completo do médico que assina (Campo 55) a
DO.

Campo 51 – CRM: Anotar o número de inscrição do médico atestante no Conselho de


Medicina da Unidade da Federação.

Campo 52 – O Médico que Assina Atendeu ao Falecido? Este campo se refere à condição
do médico atestante e deve ser preenchido com um “x” na quadrícula apropriada,
considerando-se o seguinte:

1) Sim – quando o médico que assina a Declaração tiver efetiva-mente atendido ao paciente
durante a doença que ocasionou o óbito, ou à mãe, em caso de óbito fetal;

2) Substituto – quando o médico que assina a DO for plantonista, residente, chefe de equipe,
etc. que não tenha acompanhado o paciente durante a doença, mas apenas por ocasião da
morte;

3) IML – quando o médico pertence ao Instituto Médico Legal;

4) SVO – quando o médico que assina pertence ao Serviço de Verificação de Óbitos;

5) Outro – quando o médico que assina não atendeu ao paciente durante a doença ou por
ocasião da morte, ou à mãe, em caso de óbito fetal. Esta alternativa também deve ser usada
nos casos em que o médico assina o atestado por caridade, questão de humanidade, amizade
ou camaradagem.

Campo 53 – Meio de Contato: Neste campo, deverá ser anotado o meio mais fácil de se
entrar em contato com o médico que assinou a Declaração de Óbito, tal como telefone, fac-
símile, e-mail, ou outro qualquer.

Campo 54 – Data do Atestado: Colocar a data em que o atestado foi assinado, com

o ano contendo quatro algarismos.

Campo 55 – Assinatura: Espaço destinado à assinatura do médico atestante.

Bloco VIII – Causas Externas


Prováveis Circunstâncias de Morte Não Natural (informações de caráter estritamente
epidemiológico).

Este bloco se refere às causas externas de óbito (nos modelos antigos era o Bloco VI). As
informações relativas às mortes violentas e acidentais (não naturais) são de grande importância
epidemiológica e são um complemento ao Bloco VI – Condições e Causas do Óbito.
Correspondem ao Capítulo XX da CID –10: Causas Externas de Morbidade e de Mortalidade.
Campo 56 – Tipo: Assinalar com um “x” a quadrícula correspondente ao tipo de morte
violenta ou circunstância em que se deu a morte não natural. As alternativas são: Acidente,
Suicídio, Homicídio, Outros e Ignorado.

Campo 57 – Acidente de Trabalho: Assinalar com um “x” a quadrícula correspondente à


alternativa, quando o evento que desencadeou o óbito estiver relacionado ao processo de
trabalho.

Campo 58 – Fonte de Informação: Este campo fornece informações complementares para


as mortes ocasionadas por causas externas. Assinalar com um “x” a quadrícula correspondente
à alternativa escolhida.

Campo 59 – Descrição Sumária do Evento, Incluindo o Tipo de Local de Ocorrência:


Deverá ser feita uma descrição sucinta, sem perder a clareza, do tipo de lesão e as prováveis
circunstâncias que a motivaram, bem como o tipo do local (via pública, residência, etc).

Campo 60 – Se a Ocorrência for em Via Pública, Anotar o Endereço: Colocar o nome do


logradouro onde ocorreu o óbito.

Bloco IX – Localidade Sem Médico


Este bloco deverá ser preenchido no caso de óbitos ocorridos em localidades onde não
exista médico. Neste caso, seu preenchimento, ficará a cargo de duas pessoas qualificadas que
tenham presenciado ou verificado a morte, segundo o prescrito na Lei do Registro Civil,
conforme citado abaixo:

Art. 77. Nenhum sepultamento será feito sem certidão, do oficial de registro do lugar do
falecimento, extraída após a lavratura do assento de óbito, em vista do atestado de médico, se
houver no lugar, ou, em caso contrário, de duas pessoas qualificadas que tiverem presenciado

ou verificado a morte.

Campo 61 – Declarante: Deverá conter o nome completo do declarante e sua assinatura.

Campo 62 – Testemunhas: Cada uma das testemunhas deverá assinar numa das linhas,
sendo conveniente a colocação do número de um documento de identidade (RG, CPF, etc.).
Exemplos de como preencher o campo 49 do bloco VI da DO
1) Um indivíduo é alvejado no tórax por projétil de arma de fogo, que penetra a cavidade
torácica, transfixa o pulmão esquerdo, a aorta torácica e penetra na vértebra T7. Produz
volumoso hemotórax à esquerda.

Parte I. a)Choque hipovolêmico

b)Hemorragia aguda

c)Perfuração da aorta torácica

d)Ação de instrumento perfurocontundente.

2) Um indivíduo é agredido a socos e violentos chutes no abdome. Torna-se fraco e pálido.


Evolui para óbito. Na necropsia observa-se palidez generalizada cutaneomucosa. O exame
interno revela volumoso hemoperitôneo, com presença de 3,0 litros de sangue no interior da
cavidade. Presença de lacerações hepáticas.

Parte I. a)Choque hipovolêmico

b)Hemorragia aguda

c)Lacerações hepáticas

d)Ação de instrumento contundente.

3) Um indivíduo é atropelado, fratura os ossos da perna esquerda e o fêmur direito. É internado


e submetido à redução das fraturas e imobilização em apare-lho gessado. Fica acamado. 35 dias
após, apresenta febre, calafrios, dificuldade respiratória e dor torácica. Faz quadro infeccioso
sistêmico e vai a óbito. Na necropsia encontra-se consolidação dos lobos: superior, médio e
inferior do pulmão direito, que, aos cortes, mostra o parênquima de consistência friável, além
de fígado de cor vinhosa, friável; baço aumentado de volume, congesto, friável.

Parte I. a)Septicemia

b)Pneumonia

c)Fratura dos membros inferiores

d)Ação de instrumento contundente.

4) Um indivíduo é atingido no abdome por arma branca, com perfurações de alças intestinais. É
operado para ráfia das lesões. No pós-operatório evolui com peritonite. É reoperado por duas
vezes. Persiste a peritonite. No 15º dia após a agressão faz quadro septicêmico grave e vai a
óbito.

Parte I. a)Septicemia

b)Peritonite
c)Perfuração de alças intestinais

d)Ação de instrumento perfurocortante.

5) Um indivíduo é encontrado morto, com fio elétrico encapado, envolvendo o seu pescoço,
dando duas voltas. Na necropsia observa-se polo cefálico congesto, cianose labial, língua
procidente, petéquias em esclera dos olhos. O pescoço mostra sulco duplo, profundo, contínuo.
O exame interno revela sangue escuro, fluido. Fratura da cartilagem tireoide. Equimose em
músculos do pescoço, hemorragia em adventícia das carótidas.

Parte I. a)Asfixia

b)Constrição mecânica do pescoço

c)Estrangulamento.

Observar que neste caso a causa básica da morte está colocada na linha “c”, porque, após ela,
apenas duas situações aconteceram até produzir o óbito.

6) Um indivíduo é encontrado morto em sua residência onde morava sozinho. Ao lado da cama
onde o corpo repousa, observa-se bilhete informando sobre a decisão de suicidar-se. Ali,
também, vê-se copo, contendo restos de líquido ligeiramente avermelhado, odor químico
desagradável e um frasco de veneno identificado como Furadan, cujo interior contém líquido
semelhante ao encontrado no copo.

O exame externo do corpo revela líquido avermelhado, claro, escorrendo de sua boca. O exame
interno mostra o estômago parcialmente preenchido por líquido de cor avermelhada e odor
semelhante ao já descrito. Os pulmões estão distendidos, congestos, com superfície de corte de
aspecto suculento, parênquima proeminente, úmido, brilhante, deixando fluir líquido
avermelhado.

Parte I. a)Edema agudo de pulmão

b)Intoxicação exógena

c)Envenenamento.

7) Um indivíduo procura atendimento médico por apresentar dor abdominal em barra, no


andar superior. É feita medicação sintomática e mandado para casa. Retorna, dois dias depois,
com as mesmas queixas. É feita radiografia abdominal que não revela alterações. A dosagem de
amilase está nos limites normais. Faz-se medicação sintomática e é enviado para casa. Retorna
após três dias, toxemiado, grave, com dificuldade respiratória e evolui para óbito.O corpo é
encaminhado ao IML. O exame externo revela palidez cutânea. O exame interno mostra
herniamento de alças intestinais, já em necrose, para dentro da cavidade torácica esquerda.
Vê-se solução de continuidade em forma de anel na cúpula diafragmática esquerda, com
diâmetro de quatro centímetros, através da qual ocorreu a passagem da alça para a cavidade
torácica. A revisão do exame externo mostrou pequena cicatriz linear, quase imperceptível, de
três centímetros no hipocôndrio esquerdo. Consultada a família, ela informou que a vítima
sofrera uma agressão por arma branca treze anos atrás e que evoluiu bem sem atendimento
médico.

Parte I. a)Choque tóxico

b)Herniamento com necrose de alças intestinais para o tórax

c)Perfuração da cúpula diafragmática

d)Ação de instrumento perfurocortante.

Neste caso, curiosamente, a morte ocorreu em consequência da perfuração abdominal por


arma branca, fato acontecido treze anos atrás. Há nexo causal entre a agressão e a morte da
vítima.
Parte IV
Perícia de laboratório
14 - GENÉTICA FORENSE
Aluisio Trindade Filho

Legislação
A Genética Forense nos dias atuais presta auxílio aos tribunais tanto na área cível como na
criminal.

Na área cível, contingente que responde pela imensa maioria da demanda são as
investigações de paternidade. No entanto, não raro o suposto pai oferece recusa a submeter-se
à prova pericial. Nesses casos, o que fazer? Essa indagação é também feita por Simas Filho
(2007): “A existência dessa recusa por parte do Réu, configura um paradoxo, pois, se se pode
determinar com segurança a paternidade e a não-paternidade através do ‘exame de DNA’, isso
de nada servirá, se o Requerido se recusar a fazê-lo?”

A matéria é controvertida e suscita discussões jurídicas. De um lado, o demandado invoca


a garantia constitucional, no seu artigo 5°, inciso II, de que “ninguém será obrigado a fazer ou
deixar de fazer alguma coisa se não em virtude de lei”. Do outro lado, se interpõe o direito do
demandante de ter reconhecida a sua paternidade, cujos efeitos são confirmados nos dizeres
de Nelson Calandra, citado por Wilson Jóia (http://www.justitia.com.br/artigos): “...vai permitir
ao filho o uso do patronímico paterno e o direito a prestações destinadas ao suprimento das
necessidades básicas, de natureza alimentar, educacional, enfim, daqueles bens e valores
indispensáveis à preservação da integridade psíquica, física e moral e de seu próprio
desenvolvimento”.

A Decisão do STF (Rel. Min. Marco Aurélio – j. em 10.11.1994 – DJ de 22.11.1996 -


Investigação de Paternidade – Exame DNA – Condução do Réu “debaixo de vara”) discrepa, a
mais não poder, das garantias constitucionais implícitas e explícitas – preservação da dignidade
humana, da intimidade, da intangibilidade do corpo humano, do império da lei e da inexecução
específica da obrigação de fazer – provimento judicial que, em ação de investigação de
paternidade, implique determinação no sentido de o réu ser conduzido ao laboratório,
“debaixo de vara”, para coleta do material indispensável à feitura do exame de DNA. A recusa
resolve-se no plano jurídico-instrumental, consideradas a dogmática, a doutrina e a
jurisprudência, quando voltadas ao deslinde das questões ligadas à prova dos fatos.

O Código Civil (Lei 10.406, de 10.01.2002) orienta:

Art. 231: “Aquele que se nega a submeter-se a exame médico necessário não pode aproveitar-
se de sua recusa”.

Art. 232: “A recusa à perícia médica ordenada pelo juiz poderá suprir a prova que se pretendia
obter com o exame.”
Vale ressaltar que esses dois artigos da legislação civil não se referem apenas aos casos de
investigação de paternidade, mas a todas as situações que justifiquem a realização de uma
perícia médica. É bem verdade, no entanto, que as ações de investigação de paternidade são as
que suscitam maiores debates doutrinários.

STJ Súmula n°301 - 18/10/2004 - DJ 22.11.2004 - Ação Investigatória - Recusa do Suposto Pai –
Exame de DNA – Presunção Juris Tantum de Paternidade.Em ação investigatória, a recusa do
suposto pai a submeter-se ao exame de DNA induz presunção juris tantum de paternidade.

Resp. 692.242 – MG, Rel.: Min. Nancy Andrighi, 3ª Turma, DJ de 12/09/2005. 2. In casu, o Apel
(...) – 1. Apesar da Súmula 301/STJ ter feito referência à presunção juris tantum de paternidade
na hipótese de recusa do investigado em se submeter ao exame de DNA, os precedentes
jurisprudenciais que sustentaram o entendimento sumulado definem que esta circunstância
não desonera o autor de comprovar, minimamente, por meio de provas indiciárias a existência
de relacionamento íntimo entre a mãe e o suposto pai.

LEI Nº 12.004, DE 29 DE JULHO DE 2009.

Art. 1°Esta Lei estabelece a presunção de paternidade no caso de recusa do suposto pai em
submeter-se ao exame de código genético - DNA.

Art. 2°A Lei n°8.560, de 29 de dezembro de 1992, passa a vigorar acrescida do seguinte art. 2°-
A: “Art. 2°-A. Na ação de investigação de paternidade, todos os meios legais, bem como os
moralmente legítimos, serão hábeis para provar a verdade dos fatos.Parágrafo único. A recusa
do réu em se submeter ao exame de código genético – DNA gerará a presunção da paternidade,
a ser apreciada em conjunto com o contexto probatório.”

Como se pode depreender da legislação atual, a recusa do réu em se submeter ao exame


genético em uma demanda de paternidade não lhe garante a esquiva de uma decisão contrária
aos seus interesses. Desde que a investigação aponte outros elementos que torne possível e
provável a hipótese da paternidade pretendida, a presunção de culpa pode ser estabelecida.

Sobre os exames realizados na área criminal, a legislação pertinente é, grosso modo, a


mesma que rege as demais perícias criminais, cujos textos legais já foram adequadamente
abordados em outros capítulos deste livro.

Introdução
A Genética Forense é o ramo da genética voltado para a identificação humana. A
identificação humana aqui tratada pertence ao campo da Medicina Legal e da Criminalística.
Nela se inserem as disputas de filiação cíveis, provavelmente a sua aplicabilidade mais visível,
mas também a vasta gama de casos criminais, envolvendo identificação de criminoso, ou
vítima, de pessoa falecida, confronto entre vestígios de um delito e um suspeito, ou uma
vítima, todos com a finalidade de fornecer provas técnicas robustas para o auxílio do julgador.
Em que pese os casos eventuais do emprego da genética forense em material biológico não
humano, esse aspecto não será aqui tratado.
Perspectiva histórica
Em decorrência dos avanços da ciência, a genética forense é provavelmente a área da
Medicina Legal que mais se modificou nos últimos 100 anos. Por muito tempo sua
aplicabilidade se resumiu às disputas de paternidade cíveis. No princípio era baseada nas
semelhanças físicas observáveis, de forma empírica, entre genitores e descendentes alegados,
com resultados obviamente muito precários, citando-se como exemplo a existência de “sósias”,
pessoas que guardam semelhanças físicas com outras, ainda que não apresentem parentesco.

A primeira grande mudança deveu-se à interpretação das pesquisas realizadas por Gregor
Mendel, na segunda metade do século XIX, que permitiu explicar, com bases científicas, os
princípios da transmissão dos caracteres hereditários. Esses novos conceitos foram
incorporados à prática da Medicina Legal, por meio de provas não sanguíneas e provas
sanguíneas. As primeiras se constituíam na análise de algumas características físicas herdáveis,
das quais se podia identificar um tipo dominante e outro recessivo para cada uma delas,
salientando-se o lóbulo da orelha (livre e preso), redemoinho do cabelo (dextrógiro e levógiro),
braquidactilia (ausente e presente), cor dos olhos (castanhos e claros), sensibilidade gustativa à
feniltioureia (presente e ausente). As provas sanguíneas foram introduzidas no alvorecer do
século passado. Embasada nos postulados mendelianos, por quase 80 anos, foi explorado o
polimorfismo de alguns sistemas proteicos, destacando-se os sistemas eritrocitários ABO, fator
Rh, MNSs, Kell-Celano, Lutheran, Duffy e o leucocitário HLA. Por conta de limitações técnicas,
como necessidade de grande quantidade de material biológico para análise, uso apenas do
sangue como fonte desse material e de não ser possível obter resultado em material
degradado, seu emprego restringe-se quase que exclusivamente às disputas de paternidade
cível.

A segunda grande mudança teve início em meados da década de 1980 e ainda está em
curso, com os avanços alcançados pela engenharia genética que revolucionaram as ciências
forenses, pela incorporação das técnicas de exploração direta do DNA, este muito mais
informativo, além de presente em praticamente todos os líquidos e tecidos biológicos. O
pioneirismo coube a Sir Alec Jeffreys, em Leicester - Inglaterra, na resolução de um caso de
imigração, determinando vínculo genético entre mãe e filho. Um ano após, o mesmo autor
empregou essa técnica e identificou o agressor em um caso de duplo estupro e assassinato.

A partir de então, a Genética Forense avançou na área criminal, permitindo analisar a


maioria dos vestígios biológicos relacionados a uma demanda judicial, mesmo naqueles
contendo diminutas quantidades de material biológico, com a presença de substâncias
contaminantes, ou com o DNA já em processo de degradação. Dessa forma, uma mancha de
sangue, de saliva, ou outro líquido orgânico, deixados em uma cena de crime, espermatozoides
presentes no corpo de uma vítima, ou tecidos de uma pessoa falecida são passíveis de
obtenção do DNA para análise. Com esses avanços, a Genética Forense rompeu a barreira da
análise apenas de Vínculo Genético, tornando tal termo incompleto para designá-la, uma vez
que atualmente, com as metodologias ultrassensíveis de obtenção e análise do DNA em
vestígios biológicos relacionados a crimes, sua área de atuação atingiu novas fronteiras,
permitindo o confronto entre essas amostras e as coletadas dos diversos partícipes de um
delito, no intuito de identificar de quem elas se originaram.
Pelas razões expostas, a Genética Forense atual está assentada fundamental-mente no
manuseio do DNA, constituindo-se, dessa forma, o cerne da discussão deste capítulo.

DNA – estrutura, função e modo de herança


O DNA, abreviação de Desoxyribonucleic Acid (Ácido Desoxirribonucléico) é uma longa
molécula no formato de uma dupla hélice torcida, com as duas hastes compostas de um açúcar
chamado desoxirribose e um grupo fosfato. Unindo as hastes, como os degraus de uma escada,
estão um grupo de quatro moléculas que se pareiam duas a duas, denominadas bases
nitrogenadas. São elas a adenina (A), citosina (C), guanina (G) e timina (T). O DNA humano é
composto de cerca de três bilhões de pares de bases e encontra-se localizado no núcleo das
células, empacotado em diversos níveis, formando um complexo com proteínas denominadas
Histonas.

O DNA é passado de genitor para descendente. Sua função primordial é codificar a


produção das proteínas que compõem cada ser vivo, utilizando-se de sequências específicas
denominadas genes. As diferenças nas sequências dos pares de bases de um mesmo gene
levam à produção de proteínas diferentes, gerando a diversidade entre indivíduos e entre
espécies.

Como já assinalado, o DNA é transmitido hereditariamente. Nas espécies cuja reprodução


se dá pela via sexuada, cada indivíduo tem a metade do seu DNA herdado de um genitor e a
outra metade, do outro. Na espécie humana, o DNA está distribuído em 23 pares de estruturas
denominadas cromossomos, numerados de 1 a 23. De cada par de cromossomos, um deles é
proveniente da mãe e o outro, do pai. Nas células sexuais (ovócito na mulher e espermatozoide
no homem) existe apenas um membro de cada par de cromossomos. Ao ocorrer a fertilização
(união do ovócito com o espermatozoide), os 23 cromossomos fornecidos pela célula da mãe se
unem aos 23 fornecidos pela célula do pai, recompondo os 46 cromossomos originais (23
pares). Os pares de cromossomos numerados de 01 a 22 são ditos autossômicos e o 23°, par
sexual, sendo os cromossomos denominados X e Y.

A Genética Forense, como praticada atualmente, explora basicamente o polimorfismo


existente em determinadas regiões dos cromossomos autossômicos. O DNA contido nesses
cromossomos apresenta um modo de herança dita “bi-parental”, sendo herdado a metade da
mãe e a outra metade do pai. Ao gerar um descendente, apenas o DNA de um dos
cromossomos de cada par é transmitido por cada genitor, com probabilidade de 50% para cada
um. Este é um aspecto fundamental para o entendimento das análises do DNA, com fins
forenses, principalmente no que tange às análises de vínculo genético, discutidas mais adiante.

Para cada gene ou região do DNA, o genoma humano contém duas cópias, uma vinda de
cada genitor. Se as duas cópias forem idênticas, o indivíduo é dito homozigoto naquela região.
Se forem diferentes, diz-se que é heterozigoto.

O DNA dos cromossomos sexuais, assim como o DNA mitocondrial, possuem modos de
herança diferentes e serão discutidos posteriormente.
Metodologias de análise do DNA com fins forenses
Embora a razão primordial de ser do DNA seja exercida pelos genes, nem todo o DNA se
compõe de genes. Existem outras partes do DNA, destituídas de genes e denominadas não
codificantes, foco de intensos estudos, sabendo-se atual-mente que exercem função estrutural.

Dispersas nessas partes do DNA existem algumas regiões, na verdade milhares, com uma
característica peculiar: são formadas de pequenas sequências de pares de bases que se
repetem por várias vezes, uma seguida à outra, constituindo o DNA dito “satélite”. Uma
característica dessas regiões do DNA é que elas variam muito de tamanho de um indivíduo a
outro, ou seja, apresentam muitos tipos diferentes de alelos (formas diferentes de
apresentação de um gene ou região do DNA), a depender da quantidade de vezes que cada
pequena sequência é repetida.

A nomeação dos alelos é feita de acordo com a quantidade de vezes que a sequência de
pares de base se repete, de forma que cada alelo é representado por um número. Por tal
característica, essas regiões do DNA são ditas polimórficas, algumas contendo entre 5 e 10
alelos, outras com até 30, ou mais. Esse polimorfismo resulta de mutações gaméticas
acumuladas ao longo da existência da espécie humana, incluindo as formas de vidas
precursoras do homem moderno. As mutações aqui discutidas são ditas quantitativas e se
caracterizam por adição, ou subtração de uma unidade de repetição, durante a duplicação do
DNA na formação das células germinativas. É a análise desse polimorfismo, ou dessas
diferenças que constitui a base do uso do DNA nas ciências forenses.

No início, a metodologia de exploração consistia, em linhas gerais, em cortar o DNA em


áreas específicas, por meio de enzimas de restrição produzidas por microorganismos, também
conhecidas como “tesouras biológicas”, e analisar o tamanho dos fragmentos produzidos, por
uma técnica denominada RFLP (Restriction Fragment Lenght Polymorphism/Polimorfismo do
Comprimento dos Fragmentos de Restrição). Por ser dependente de uma razoável quantidade
de DNA, bem como da integridade desse mesmo DNA, além de ser uma metodologia lenta e
trabalhosa, quase não é mais usada na área forense.

Essas restrições vieram a ser contornadas com o desenvolvimento da tecnologia da PCR


(Polimerase Chain Reaction/Reação em Cadeia da Polimerase). Idealizada em meados dos anos
1980 pelo químico norte-americano Karen Mullis, a PCR permite a amplificação exponencial de
regiões específicas do DNA, por meio de variações na temperatura a que o DNA genômico é
submetido, constituindo ciclos que se repetem por um número próximo de 30 vezes. Ao final,
as sequências do DNA previamente escolhidas são multiplicadas por um fator de até 109.
Enquanto a metodologia da RFLP requeria cerca de 500 ng (nanogramas) de DNA íntegro para a
obtenção de resultados, na reação de PCR, quantidades tão pequenas quanto 0,5 a 1,0 ng são
tipicamente utilizadas, podendo ser obtido produto de amplificação com 250 pg (picogramas)
ou menos.

A metodologia da PCR se ajustou de forma muito apropriada à amplificação de sequências


repetitivas denominadas STR, (short tandem repeat – repetições curtas em tandem), das quais
as mais usadas apresentam quatro ou cinco bases em cada unidade de repetição (figura 01).
Atualmente o exame consiste na amplificação de várias dessas regiões polimórficas do DNA à
procura de semelhanças ou diferenças entre as várias amostras analisadas. Outros termos
usados para designar as regiões do DNA utilizadas nos exames são “marcador genético” (porção
de DNA que tem sequência e posição dentro do genoma conhecidas) e “loco” (ou locus em
latim - conceituado como local fixo num cromossomo onde está localizado determinado gene
ou marcador genético) ou simplesmente “região”. O STR é um tipo de mar-cador genético.

A tabela 01 apresenta alguns dos STRs autossômicos mais utilizados em genética forense,
bem como o cromossomo no qual se localizam, os alelos que apresentam e as unidades de
repetição de bases. Alguns alelos são representados por números não inteiros, sendo
denominados “alelos intermediários” ou “microvariantes”, por conterem unidades de repetição
incompleta. Um exemplo é o alelo 9.3 do marcador TH01, o qual é composto de nove unidades
de repetição com quatro bases AATG e uma unidade com três bases ATG, por perda de uma
base “A”.

Figura 01 – Exemplos de STR com unidades de repetição contendo 04 e 05 bases e com


diferentes alelos.

Alguns STR apresentam estruturas complexas, com mais de um tipo de unidade de repetição ou
com sequências inespecíficas intercaladas entre as unidades de repetição.
Tabela 01– Alguns dos STRs mais usados nos exames de DNA, localização cromossômica,
alelos e unidade de repetição. C– STR complexo.

A identificação do gênero sexual em amostras questionadas (amostra biológica cujo


fornecedor é desconhecido e que é relevante para a investigação identificar a quem pertence) é
sempre relevante, como em amostras oriundas de crimes sexuais, distinguindo assim o DNA
originado da vítima do proveniente do agressor. Da mesma forma, na identificação de cadáver
ou na análise de amostras coletadas de locais de crime, a identificação do sexo pode ser de
grande relevância para as investigações. Os cromossomos sexuais apresentam um gene
denominado Amelogenina, responsável pela codificação de proteínas do esmalte dentário. Uma
área específica desse gene no cromossomo X tem 06 bases a menos que o Y. Se o DNA é de
origem feminina, apenas o fragmento do cromossomo X será observado. Sendo do sexo
masculino, serão observados os fragmentos do cromossomo X e do Y, separados em razão da
diferença de tamanho entre eles.

A metodologia da PCR também permite analisar o polimorfismo dos SNPs (single


nucleotide polymorphism – polimorfismo de um único nucleotídeo) que resultam de mutações
pontuais no DNA em que uma base é substituída por outra na formação do gameta. Estima-se
que existam milhões de SNPs distribuídos no genoma humano. Uma desvantagem desses
marcadores é que eles são bialélicos, ou seja, possuem apenas dois alelos, razão pela qual mais
marcadores são necessários para se obter um poder de discriminação alto, se comparado aos
STRs. Por outro lado, é possível ainda obter resultado com SNP, quando os STRs falharam
devido a degradação, ou contaminação do DNA.

Formalidades
Como as demais perícias, o exame de DNA necessita cumprir as formalidades que norteiam
uma perícia médico-legal. Dessa forma, o exame, no âmbito de uma instituição oficial de
perícia, só pode ser realizado no curso de uma investigação policial/judicial e solicitado pela
autoridade investigante. Quando se trata de uma investigação cível de
paternidade/maternidade, o Juiz de Direito da Vara de Família é, via de regra, a autoridade
solicitante. Nas demandas criminais, a autoridade policial que investiga a transgressão legal é
quem faz a solicitação, podendo esta ser originada pela autoridade judicial quando já na fase de
processo. O documento que solicita a perícia deve contemplar algumas informações, como
número da ocorrência/inquérito/processo, o objetivo da perícia, a qualificação dos doadores,
os vestígios a serem comparados, a relação, ou provável relação de parentesco entre as partes
envolvidas nas análises.

A coleta de material biológico de qualquer indivíduo deve ser precedida da assinatura de


um “Termo de Doação Voluntária” pelo doador ou, se menor ou incapaz, pelo seu
representante legal. Este termo deve conter o nome da instituição onde foi realizada a coleta, a
data, a qualificação do doador, um texto explicitando que a doação foi feita de forma
voluntária, o material biológico coletado, identificação da pessoa que coletou, assinatura do
doador, da pessoa que coletou e de uma testemunha. Sempre que possível, deve-se anexar
uma fotografia do doador e individual dactiloscópica do polegar direito.

O doador voluntário se refere àquele que vai ceder seu material para ser utilizado como
amostra de referência, conceituada como uma amostra obtida de uma fonte conhecida, a ser
comparada com outro material biológico qualquer. É o caso das partes envolvidas em um
exame de paternidade, do suspeito, ou da vítima em um caso criminal, do parceiro consentido
de uma vítima de crime sexual. Situação diferente é aquela na qual, no curso de uma perícia, o
perito julga ser conveniente a coleta de eventual material biológico presente no corpo do(a)
periciando(a), constituindo-se este um vestígio ou amostra questionada. É o caso da coleta de
material depositado nas cavidades vaginal, anal, ou bucal, ou de qualquer parte do corpo de
uma vítima de crime sexual, do pênis de um suposto agressor, ou tecidos de um cadáver de
identidade desconhecida. Nessas situações, a coleta encontra-se inserida no contexto de uma
perícia, na qual se coleta material biológico, como outro material qualquer para o
esclarecimento de uma questão pendente, devendo ser feita independente de autorização. O
documento que solicitou a perícia, elaborado por uma autoridade competente a cargo da
investigação, já autoriza a execução de todos os procedimentos técnicos recomendados.

Cuidados com a coleta e preservação


Para um exame de DNA ser realizado em uma amostra biológica, ela deve ser coletada de
maneira apropriada. Esta etapa é de vital importância para a obtenção de um resultado que
expresse a verdade contida naquele material. O manuseio inapropriado nessa fase inicial do
exame pode comprometer irremediavelmente o resultado, por mais que se usem recursos
tecnológicos apropriados e pessoal experimentado nas análises subsequentes.
As seguintes recomendações são de grande relevância quanto à coleta e preservação dos
vestígios (adaptado de John M. Butler em Forensic DNA Typing):

*Uso de gorro, máscara, luva, avental durante a coleta. As luvas devem ser trocadas entre o
manuseio de diferentes itens a serem coletados. Aconselha-se calçar duas luvas de látex de
forma que a externa possa ser instantaneamente removida caso as luvas se sujem e seja
necessário o manuseio com luvas limpas.

* Evitar o contato das mãos nuas com material biológico a ser coletado, bem como tossir,
espirrar ou mesmo conversar próximo a ele.

* Utilizar instrumental cirúrgico limpo, de preferência esterilizado. Agulhas, seringas, lâminas


de bisturi, frascos de coleta devem ser novos e descartáveis.

* Cada vestígio coletado deve ser acondicionado separadamente, ainda que de um mesmo
indivíduo.

* Tecidos moles coletados de cadáver devem ser estocados em recipiente limpo e com tampa,
próprio para coleta. Evitar a imersão ou o embebimento em líquidos, tais como formol, solução
fisiológica, água mesmo se estéril, etc. A maneira mais simples, além de absolutamente
eficiente de se conservar o DNA contido em um material biológico é estocá-lo em freezer(-
20°C). Ressalte-se que o formol degrada o DNA, tornando incerta a sua obtenção.

* Manchas secas de sangue, de sêmen, ou outro tipo de mancha devem ser coletados em swab
descartável, umidificado em água estéril e deixados para secar em local apropriado, antes de
embalados. A umidade favorece a proliferação de microorganismos que irão degradar o DNA. O
acondicionamento dessas amostras deve ser feito em envelope de papel. Invólucro de plástico
retém umidade

* Evitar expor o material coletado a temperaturas elevadas.

* Evitar a exposição ao sol. Os raios ultravioletas degradam o DNA.

* Qualquer item coletado deve ser identificado corretamente, fazendo-se constar data da
coleta, vestígio coletado, número do caso, código da amostra, quando for o caso, e nome do
perito, além de assinatura no lacre. Essas recomendações visam manter de forma apropriada a
cadeia de custódia.

A coleta de tecidos em cadáver está sujeita a alguns riscos e requer a adoção de


procedimentos que garantam a qualidade da amostra. A sala de necropsia, teatro onde
habitualmente se executa a coleta, é um local sujeito a contaminação, tanto das instalações
físicas, quanto dos equipamentos e instrumentos. Além da escolha adequada do tecido a ser
amostrado, procedimentos devem ser adotados, visando minimizar a contaminação por
microorganismos e, mais crucial ainda, evitar a contaminação cruzada, produzida por material
biológico de outro cadáver ou do pessoal encarregado da coleta.
O que e como coletar
O DNA está presente em todas as células nucleadas do organismo, de forma que qualquer
material biológico o contém. A tabela 02 lista algumas das fontes de obtenção do DNA.

É importante lembrar que em qualquer célula de um indivíduo, o perfil de DNA obtido será
o mesmo. O sangue, por suas características físicas, se constitui no material biológico ideal para
a obtenção do DNA que, nesse caso, é obtido dos leucócitos, já que as hemácias, por não
conterem núcleo, não possuem DNA nuclear. Como amostra de referência de um indivíduo, a
escolha é sempre por coletar sangue e/ou células da mucosa bucal. O sangue pode ser coletado
por punção venosa periférica habitual, com seringa estéril, ou outro dispositivo de coleta, na
quantidade de 03 a 05 mililitros, devendo ser em seguida transferido para tubo de coleta
contendo anticoagulante EDTA e, logo que possível, congelado a -20°C. Recomenda-se não
utilizar tubo de vidro e, sim, de polímero sintético, uma vez que pela expansão da água, ao ser
congelada, o tubo de vidro costuma se quebrar e extraviar o material coletado.

Uma alternativa igualmente válida e muito utilizada é a coleta por punção, em uma polpa
digital, com dispositivo apropriado, da qual se obtém uma gota de sangue a qual é transferida
para um cartão especial – cartão FTA ou similar, próprios para conservar a integridade celular e
do DNA. Esses cartões contêm substâncias que protegem o DNA da ação de enzimas nucleases,
com o poder de clivar o DNA, bem como impedem o crescimento bacteriano. Neste caso, o
resfriamento é prescindível, podendo a estocagem ser feita a temperatura ambiente,
permanecendo válidas todas as demais recomendações já feitas.

A coleta de células bucais deve ser feita por esfregaço com swab estéril, em movimentos
de vaievém na parte interna da bochecha, sob pressão moderada, para recolhimento das
células descamativas. A coleta deve ser feita, no mínimo em duplicata, uma de cada bochecha.
O uso de medicamento, ou a ausência de jejum não interferem no processo. No entanto, para a
coleta de células bucais, recomenda-se orientar os doadores a não ingerirem alimentos
imediatamente antes do procedimento, devendo esse aspecto ser observado mais amiúde,
quando se tratar de criança em amamentação, pela frequência com que necessita se alimentar.

As células bucais comportam uma vantagem adicional que é contornar as questões


relativas à transfusão de sangue recente e ao transplante de medula óssea. Um indivíduo
submetido a transfusão recente pode exibir uma mistura de material genético, composta de
DNA de mais de uma fonte, principalmente se ocorreram múltiplas transfusões de sangue total
fresco. Nesses casos, o perfil preponderante reflete sempre o do indivíduo do qual a amostra
foi coletada. Embora publicações na literatura tenham falhado em demonstrar, em indivíduos
que receberam transfusão de sangue, há mais de 24 horas, o perfil genético de quem doou o
sangue para transfusão, a análise de sangue de indivíduos submetidos a transfusão recente
deve ser feita com as devidas cautelas.
Nesses casos, para dirimir eventuais dúvidas, recomenda-se a tipagem genética dos
doadores de sangue para transfusão. Sobre o transplante de medula, se bem-sucedido, a
produção das células das três linhagens sanguíneas do receptor (eritrocitária, leucocitária e
plaquetária) passa a ser feita, a partir de então e por toda a vida, pelo tecido transfundido, de
forma que o perfil de DNA obtido do transplantado será o do doador e não o seu próprio perfil.
O DNA extraído do sangue de alguém submetido a transplante de medula não tem nenhum
valor de prova. Exceto em uma rara eventualidade em que se deseja obter o perfil genético do
doador da medula, por exemplo, para identificação de um cadáver suspeito de ser do doador.

Na identificação de pessoa falecida, com muita frequência, o DNA obtido de amostra


coletada do cadáver é comparada com DNA obtido de amostra ante-mortem deixada pelo
falecido. Os protocolos que norteiam a identificação nos acidentes coletivos costumam sugerir
o DNA obtido de espécimes de biópsias e blocos de parafina existentes em laboratórios de
patologia, ou objetos de uso pessoal, como fronha de travesseiro, pente e escova de cabelo e,
principalmente, escova de dente. A origem desses itens deve ser cuidadosamente
documentada, de forma a garantir a sua idoneidade e a cadeia de custódia, especialmente em
casos de homicídio, pela possibilidade de fraude.

O exame feito em cabelo, ou pelos diversos também é possível, desde que eles contenham
o bulbo (raiz), local onde se encontram as células nucleadas. A coleta feita mediante corte da
haste não tem valor para exame de vínculo genético de paternidade, uma vez que a haste não
contém DNA nuclear, mas apenas o DNA mitocondrial, imprestável para tal análise. Vale
ressaltar que não constitui boa prática coletar cabelo, como material de referência, uma vez
que a etapa de extração do DNA nesse apêndice cutâneo é mais trabalhosa, mais dispendiosa,
demanda mais tempo e apresenta uma probabilidade menor de se obter DNA em quantidade
suficiente para produzir perfis genéticos completos, quando comparados a sangue e células
bucais. Situação distinta é o cabelo ou pelo encontrados em cena de crime, ou no corpo de uma
vítima, ou suspeito. Neste caso, eles se constituem em vestígios biológicos, devendo ter o
mesmo encaminhamento que outro vestígio qualquer, devendo ser submetidos previamente a
exame tricológico, para se saber se são humanos e para pesquisa da presença de bulbo.

No cadáver, material biológico para exame de DNA pode ser coletado, como amostra de
referência, para ser comparada com vestígios de um crime, ou para identificação do falecido. A
tabela 02 reproduz as orientações da ISFG (International Society for Forensic Genetics) para
escolha do material a ser coletado.

Tabela 02 –Coleta de amostra em cadáver


Em que pese essa orientação, estruturas outras como coração, rim, baço, cérebro, útero
podem ser usados para coleta de material para exame. O fígado tende a apresentar resultados
piores, quando comparado a outras vísceras, argumentando-se que a velocidade de degradação
do DNA nesse órgão é mais acelerada, em decorrência da ação de enzimas líticas.

No corpo em decomposição pode-se acrescentar ainda a coleta de cartilagem hialina de


grandes articulações, como joelho, ombro, cotovelo. A cartilagem é menos celularizada que o
músculo, no entanto, a decomposição da cartilagem é mais lenta que a do músculo esquelético,
com reflexo na velocidade da degradação do DNA. Em uma pesquisa controlada, coletamos
amostras de músculo esquelético e cartilagem hialina de grande articulação de uma mesma
região corporal, em uma série de cadáveres, com fins de identificação. Os resultados, tendo
como parâmetros a quantidade e a qualidade do DNA obtidas, demonstraram diferenças
estatisticamente significativas em favor da cartilagem, em comparação ao músculo.

Técnica de coleta para um cadáver em decomposição


Previamente à coleta, deve-se preparar uma mesa auxiliar com superfície limpa. Usar um
pano umedecido em água limpa, contendo água sanitária diluída. Os instrumentos cirúrgicos, se
não puderem ser esterilizados, devem ser cuidadosa-mente limpos com uma escova, gaze ou
um pequeno pano, umedecidos na mesma solução e enxaguados, em seguida, em água, para
evitar a corrosão do metal pelo hipoclorito. O sítio cirúrgico deve ser limpo, com pano
umedecido na mesma solução

Músculo
*Incisar a área escolhida até a bainha aponeurótica

* Remover um retângulo com aproximadamente 01 X 02 cm.

Cartilagem articular do joelho


*Fazer uma incisão longitudinal, de cerca de 15 cm para-patelar medial no joelho, incluindo
pele e tecido subcutâneo.

*Incisar a aponeurose muscular em toda a extensão da incisão.

*Incisar a cápsula articular, expondo a articulação e as superfícies ósseas da epífise distal do


fêmur, patela e epífise proximal da tíbia, as quais se apresentam recobertas pelas cartilagens
hialinas articulares.

*Com uma lâmina de bisturi nova e uma pinça anatômica, remover 02 ou 03 lâminas de
cartilagem na dimensão e formato aproximados de uma unha do dedo indicador.

*Caso outra articulação seja escolhida, executar o mesmo procedimento.

Dentes
*Qualquer dente pode ser escolhido, no entanto, dá-se preferência aos molares, pré-molares
ou caninos, em número de cinco a dez, de forma a perfazer um total aproximado de 10 gramas.
*Devem ser evitados dentes com cáries, restaurações, tratamentos endodônticos, ou outras
modificações artificiais.

*Remover o dente com instrumento apropriado e mergulhá-lo por alguns segundos em um


recipiente contendo água sanitária diluída.

*Limpar o dente com escova, gaze ou um pano limpo.

*Mergulhar o dente em um recipiente contendo álcool absoluto para apressar a desidratação e


retirá-lo após alguns segundos.

*Uma vez seco, acondicioná-lo em recipiente apropriado.

Osso (fêmur)
*Qualquer osso pode ser coletado para obtenção do DNA. A preferência é por osso compacto,
encontrado principalmente nas diáfises dos ossos longos, ad-vindo daí a preferência pelo
fêmur.

*Após os cuidados já descritos para limpeza da pele, fazer uma incisão cutânea no formato da
letra “H” na face anterior da coxa.

 A parte longitudinal da incisão deve ter aproximadamente 20 cm, iniciando-se um pouco


abaixo da prega inguinal e terminando cerca de 05 cm acima do joelho.

 As porções transversais da incisão devem ser feitas nas extremidades proximal e distal da
incisão longitudinal, em uma extensão de um pouco mais da metade da circunferência
da coxa.

*Aprofundar a incisão até atingir o osso, criando um flap medial e um lateral, os quais devem
ser dissecados medial e lateralmente, removendo as inserções musculares, de forma a expor o
fêmur aproximadamente em metade de sua circunferência e em toda extensão da incisão.

*Aconselha-se calçar dois pares de luvas e remover o par externo neste momento.

*Ruginar o osso para remoção do periósteo.

*Com uma lâmina de serra montada em suporte, serrar transversalmente uma ou duas porções
de osso em forma de cunha, na face anterior da parte medial da diáfise, tomando o cuidado
para que a cortical posterior não seja alcançada, de forma a não comprometer a integridade do
eixo do osso, evitando, assim, instabilidade para uma nova coleta e para o transporte do
cadáver, bem como prejuízo para eventuais medições ósseas que se façam necessárias
posteriormente.

* Executar os procedimentos de remoção e limpeza como os descritos para coleta de dente.

Quando se tratar de esqueleto, a limpeza do osso deve ser feita com água corrente, sabão
neutro líquido e bucha de limpeza. Os métodos empregados pela Antropologia Forense que
incluem ferver os ossos para facilitar a remoção de restos de tecidos moles ressecados,
compostos principalmente de tendões, ligamentos e cápsulas articulares, não prejudicam a
obtenção do DNA. Nesses casos, a solução de fervura deve conter apenas água e detergente
líquido neutro, estando formalmente contraindicado o uso de hipoclorito de sódio (água
sanitária). Este produto deve ser usado apenas para rinsagem da amostra coletada, como já
descrito acima. O emprego de verniz preconizado por alguns protocolos da Antropologia para
preservação dos ossos também está contraindicado, pelo seu potencial de interferir na reação
de PCR.

No cadáver carbonizado, o músculo esquelético que sofreu ação das altas temperaturas,
porém não chegou a ficar tostado, adquirindo uma coloração marrom, tem se mostrado uma
fonte muito confiável para obtenção de DNA. Fazendo parte dos esforços de identificação de
vítimas em um incêndio ocorrido em 2004, em um supermercado na cidade de Assunção –
Paraguai, mais de 120 amostras nessas condições foram coletadas e enviadas ao Instituto de
Pesquisa de DNA Forense da Polícia Civil do Distrito Federal. De todas elas foi possível obter
DNA de boa qualidade, cujas análises levaram à identificação de várias das vítimas.

Independente do tecido a ser coletado, deve-se escolher uma região preservada do corpo,
sem ferimentos, ou outras lesões, fugindo, assim, de áreas potencialmente mais contaminadas
e com decomposição mais acelerada.

Nos crimes contra a liberdade sexual, o agressor, via de regra, deixa seu material em
cavidades naturais (vagina, ânus, boca) ou na superfície corporal da vítima, ou ainda em lençóis,
vestimentas, papel higiênico, ou toalha utilizados para asseio. A coleta do material pelo médico
legista dever ser feita no final do exame pericial, quando todos os demais aspectos julgados
importantes para a perícia tiverem sido já abordados.

A coleta na cavidade vaginal deve ser feita com swab estéril, em número mínimo de dois,
friccionando-os contra as paredes do fundo do saco vaginal, devendo-se deixar secar por um
período mínimo de 20 minutos, em lugar seguro e abrigado da luz solar. Em seguida, deve ser
congelado a -20°C. Procedimento semelhante aplica-se para as coletas anal e oral. É importante
salientar que os dois swabs coletados devem ser utilizados exclusivamente para os
procedimentos de extração do DNA. Para a pesquisa de espermatozoide em microscópio deve
ser coletada uma amostra adicional. Qualquer mancha encontrada na superfície corporal que
possa corresponder a esperma ressecado deve ser igualmente coletada com swab umedecido
em água estéril, se possível também em duplicata. Existem modelos de swab cujo estojo
contém meio de cultura gelatinoso para imersão do swab pós-coleta. Esse modelo não deve ser
utilizado, pois o que se pretende é impedir e não incrementar a proliferação de
microorganismos.

Durante o ato sexual pode haver transferência de pelo do agressor para a vítima, de forma
que qualquer pelo encontrado que possa não ser da vítima deverá ser coletado. O
armazenamento neste caso deve ser em envelope de papel branco e devidamente lacrado para
prevenir a sua perda acidental.

A coleta de material biológico pode ser feita ainda nas regiões subungueais de vítimas, ou
supostos agressores, na tentativa de obter DNA da outra pessoa envolvida, quando se suspeita
ter havido luta corporal. Por costumarem apresentar a extremidade livre das unhas maiores,
este procedimento tende a dar melhores resultados quando a coleta é realizada em mulheres.
Remenda-se coletar um swab para cada mão.

A coleta em cenas de crimes está sujeita a outro fluxo, em razão das características
próprias de tal ambiente. Nesses locais, vários são os suportes nos quais se pode encontrar
material biológico passível de análise pela Genética Forense. Manchas de sangue, esperma,
saliva, ou outro fluido corporal podem ser encontrados no assoalho, paredes, teto, tapetes,
interior de automóveis, superfície de móveis, objetos, utensílios, trilhas, etc. Armas brancas
utilizadas para produzir lesões e projéteis de arma de fogo que transfixaram uma vítima
habitualmente contêm sangue. Se o suporte é fixo e não pode ser removido, a mancha deve ser
transferida para algodão ou swab umedecido em água estéril. Naquelas manchas contendo
grande quantidade de sangue ressecado, a coleta pode ser feita, por raspagem, com lâmina de
bisturi nova. Os pequenos suportes, como projéteis, armas brancas, pedaços de papel, objetos,
como copos, talheres, telefones celulares, livros, tocos de cigarros, pedaços de pau devem ser
recolhidos e encaminhados ao laboratório de Genética Forense. De vestes, lençóis, toalhas, ou
outros tecidos, o perito pode identificar as áreas nas quais possivelmente existam manchas de
material biológico e recortá-las para envio ao laboratório.

Uma mancha que se presuma conter sangue, ou esperma deve ser analisada previamente
para se confirmar a sua natureza. No entanto, se a quantidade de material biológico
eventualmente contido no suporte parecer exígua, pode-se prescindir desse exame prévio, uma
vez que tal procedimento pode consumir todo o material, inviabilizado a obtenção do DNA.
Como exemplo, pode-se citar material contido em projéteis de arma de fogo, ou em pequenos
instrumentos lesivos, como pregos, ou outros objetos metálicos, ou mesmo quando a mancha
identificada em um suporte qualquer se tratar apenas de um pequeno ponto.

Uma fonte de material biológico cada vez mais frequente em cenas de crime contra a
liberdade sexual são os preservativos. Estes devem ser cuidadosamente coletados e
acondicionados em invólucro de papel. Deles se pode obter o DNA do agressor na face interna
e da vítima, na face externa.

Procedimentos Laboratoriais
Entre a coleta do material biológico e a análise final do DNA, vários procedimentos
laboratoriais precisam ser realizados. São eles:

Extração, Concentração e Purificação

Conjunto de procedimentos físicos e químicos que promovem a lise da célula e do seu


núcleo, separando o DNA dos restos celulares e de outros elementos.

Existem diversos métodos de extração do DNA. Chelex, FTA e orgânico-fenol/clorofórmio


são os mais empregados. A escolha é influenciada pelo tipo de material biológico a ser
analisado. Em amostras referência de sangue e swab oral o método de lise alcalina com NaOH
0,2 M é eficiente, rápido e de baixo custo. O método orgânico-fenol/clorofórmio,
provavelmente o mais difundido, é utilizado para extração de vestígios, como manchas de
sangue, de esperma, de saliva, pelos, tecidos moles humanos, ossos ou dentes. Produtos
químicos, como SDS (dodesilsulfato), proteinase K e DTT (dithiothreitol) são adicionados à
amostra para romper as membranas celular e nuclear e desnaturar as proteínas que protegem
o DNA. O fenol/clorofórmio, adicionado posteriormente, separa as proteínas do DNA. Após
centrifugação, duas fases são criadas. Os restos celulares depositam-se na fase inferior,
enquanto o DNA se dilui na fase superior (aquosa), sendo removido junto com esta por
pipetagem. O DNA extraído é finalmente precipitado em álcool e novamente suspenso em água
ou TE, estando pronto para a amplificação.

Nos crimes contra a liberdade sexual, as amostras biológicas coletadas costumam conter,
além de espermatozoides, outros tipos de células, frequentemente células epiteliais da vítima.
Em tais casos, é necessário fazer a separação entre o DNA oriundo dos espermatozoides
(“Fração Espermatozoide” ou FE) e aquele proveniente das células outras que não os
espermatozoides (“Fração Não Espermatozoide”, FNE). Para tanto, executa-se uma
metodologia de extração denominada “extração diferencial”. Esse método permite romper
inicialmente as células que não espermatozoides com um tampão específico. Após
centrifugação, o DNA dessas células, sobrenadante no tampão, é removido do microtubo,
permanecendo os espermatozoides íntegros e depositados no fundo do tubo. Posteriormente
eles são lisados pela ação de outro tampão específico. Ao final, o DNA de cada uma das frações
estará contido em um microtubo distinto.

As etapas de Purificação e Concentração vão depender do tipo de amostra, se


presumivelmente contaminada, degradada e/ou com pouco DNA. A presença de inibidores da
PCR no produto extraído e a degradação do DNA, frequentemente encontrados em vestígios
criminais, podem se constituir em obstáculos para o sucesso da amplificação do DNA. Ambos
diminuem a eficiência da PCR, podendo implicar em falha completa da amplificação, ou
amplificação parcial, observando-se resultados apenas nos locos menores, aqueles cujos alelos
apresentam peso molecular mais baixo. Hemoglobina do sangue e músculo, ácido húmico do
solo, íons de cálcio dos ossos, melanina do cabelo, tinturas de vestes, sais em geral, são
exemplos de inibidores que frequentemente desafiam o êxito da PCR. Os inibidores costumam
se unir aos sítios ativos da enzima que promove a amplificação (Taq DNA polimerase),
impedindo seu funcionamento apropriado durante esse processo.

Impedir que inibidores entrem em contato com a amostra é a forma mais eficiente de
prevenir sua ação. Manchas de sangue, ou sêmen impregnados em vestes, contendo tintura
índigo (tecido Jeans) podem ser transferidas para um swab umedecido em água, em vez de
cortar e remover um fragmento do tecido contendo a mancha, exceto se muito pequena, da
ordem de poucos milímetros, pois nesta situação a quantidade transferida para o swab pode
comprometer a amplificação do DNA.

Os procedimentos de concentração e purificação envolvem a centrifugação do material


extraído em um microtubo específico para concentração e/ou purificação (Microcon®,
Centricon® – Millipore; QIAquick PCR Purification Kit – Qiagen; Purelink TM Kit - Invitrogen),
contendo uma membrana semipermeável ou coluna de sílica. A adição de albumina sérica
bovina (BSA) tem sido usada para prevenir ou minimizar os efeitos dos inibidores.
Quantificação
A quantificação é um procedimento realizado, após a extração do DNA, a fim de se saber
se há ou não DNA extraído e, se houver, em que quantidade. Dessa forma, pode-se otimizar as
próximas etapas laboratoriais. A quantificação pode ser realizada por espectofotômetro,
hibridização com sonda e eletroforese em gel de agarose. Atualmente, existe um método mais
sofisticado e preciso, denominado Quantificação em Tempo Real (RT-PCR). A depender da
quantidade de DNA presente no material extraído, a amostra pode ser diluída ou concentrada,
tendo como meta uma variação de 0,5 a 2,0 ng/µl (nanograma por microlitro). A diluição é feita
em geral pela adição de água ultrapura à amostra, na quantidade desejada. A concentração
pode ser facilmente obtida por centrifugação, em centrífuga a vácuo, por alguns minutos.

Além de quantificar, a RT-PCR permite demonstrar a presença ou não de inibidores da PCR,


identificando, dessa forma, se a amostra necessita ser submetida a um processo de purificação.

Para as amostras-referência a etapa da quantificação pode ser negligenciada, uma vez que
o material biológico encontra-se sempre em condições ótimas, produzindo DNA de boa
qualidade e em quantidade previsível.

Amplificação
Consiste na multiplicação in vitro,de cada cópia de sequências de DNA, previamente
escolhidas, em até bilhões de vezes, pela técnica da PCR (Polimerase Chain Reaction - Reação
em Cadeia da Polimerase), executada em um equipamento denominado Termociclador. A sua
alta sensibilidade a torna uma técnica ideal para amostras forenses, muitas vezes degradas e
em pouca quantidade.

Um sistema de PCR típico consiste-se de:

* Água

* Tampão – solução que estabiliza o pH e fornece as condições para a reação de amplificação.

* Primers (iniciadores) – oligonucleotídios sintetizadas laboratorialmente, contendo em média


20 pares de bases, que se pareiam em pontos específicos adjacentes à sequência-alvo que se
deseja amplificar. São construídos dois primers para cada sequência-alvo, um para cada fita do
DNA.

* Desoxirribonucleotídeos trifosfatos (dNTP’s) A,G,C,T – matéria prima da qual se constitui a


nova fita de DNA.

* Taq DNA polimerase – polimerase termoestável obtida da bactéria Thermus Aquaticus,ou


produzida sinteticamente, responsável pela incorporação dos dNTP’s na fita de DNA em
formação.

Os produtos descritos são adequadamente misturados em um microtubo, em quantidades


calculadas, de acordo com o número de amostras a serem amplificadas mais uma ou duas para
compensar o eventual erro de pipetagem, em uma área específica do laboratório, em uma
capela de fluxo laminar. Em cada grupo de amplificação deve-se incluir um controle positivo,
contendo DNA de boa qualidade e com perfil alélico conhecido, cuja finalidade é testar a
eficiência da amplificação. Um controle negativo, contendo a mistura de amplificação e água
estéril, no lugar do DNA, deve ser igualmente preparado, para controle de eventuais
contaminações da mistura de amplificação com DNA estranho.

Etapas da PCR:

1. Desnaturação –Etapa em que ocorre a separação da dupla fita de DNA, a partir da elevação
da temperatura (94 a 96ºC), por aproximadamente 1 minuto.

2. Anelamento –Nessa etapa, a temperatura é diminuída (50 a 60ºC), por aproximadamente 1


minuto, e os primers anelam-se (se unem) às sequências complementares em cada uma das
fitas do DNA.

3. Extensão – Etapa em que é construída uma sequência complementar à sequência-alvo, a


partir da adição de nucleotídeos pela DNA polimerase, a partir da região de anelamento do
primer. Utiliza-se uma temperatura geralmente em torno de 72ºC, por aproximadamente 1
minuto.

Esses ciclos são repetidos, por aproximadamente 30 vezes, ao final dos quais as regiões
específicas de cada molécula de DNA, inicialmente contida na reação, terá sido multiplicada por
até bilhões de vezes. Isto porque a multiplicação (amplificação) é exponencial, de forma que
cada ciclo idealmente duplica a quantidade de DNA existente.

Atualmente a amostra contida em cada microtubo é amplificada para vários marcadores


em uma única reação de amplificação. São os sistemas multiplexes de amplificação, sendo que
os mais usados atualmente amplificam até 16 regiões simultaneamente. Para isso, são
selecionados grupos de marcadores genéticos cujos tamanhos dos alelos entre os marcadores
não se sobreponham. Para cada grupo de marcadores selecionados, um tipo diferente de
molécula fluorescente é adicionada ao par de primers. Existem vários tipos de molécula
fluorescente disponíveis (VIC, FAN, NED, JOE, HEX, ROX, TAMRA), cada uma emitindo luz de um
comprimento de onda diferente, quando excitada por um feixe de laser. Os sistemas
multiplexes de amplificação de marcadores autossômicos mais usados atualmente (Identifiler –
Applied Biosystems, Powerplex 16 – Promega Corporation) amplificam 15 STRs e a região do
dimorfismo sexual Amelogenina.

Eletroforese
É uma técnica de separação de moléculas carregadas eletricamente, com base na diferença
de peso molecular entre elas. No caso do DNA, os fragmentos amplificados pela PCR são
separados de acordo com o seu tamanho. A separação ocorre a partir da migração do DNA
amplificado, que é colocado em um gel, ao qual é aplicada uma diferença de potencial. Os
fragmentos menores, com menor peso molecular, migram com uma velocidade superior à
velocidade de migração das moléculas maiores, com maior peso molecular. Uma vez que a
molécula de DNA é carregada negativamente, a migração se faz do polo negativo para o
positivo.
A eletroforese pode ser realizada em placas, utilizando-se gel de agarose, ou gel de
poliacrilamida, ou em sequenciadores de DNA. Neste último caso, os equipamentos mais
modernos utilizam capilares metálicos, contendo um gel na sua luz e um sistema de varredura a
laser, conferindo mais rapidez e eficiência à eletroforese. Existem equipamentos com até 16
capilares, permitindo igual número de corridas eletroforéticas simultaneamente.

Juntamente com as amostras e os controles positivo e negativo, corre-se uma amostra


denominada “escada alélica”, ou marcador genético de tamanho. Essa amostra é construída em
laboratório por metodologias que envolvem PCR e sequenciamento, e é composta de uma
mistura artificial dos alelos conhecidos na população, de um determinado marcador genético. A
mistura serve como padrão para que o perito, na leitura manual, ou o software, na leitura
automatizada, nomeiem corretamente os alelos das amostras que estão sendo analisadas.

Leitura dos resultados


A depender do método empregado, a leitura pode ser feita por revelação com sais de
prata (semelhante à revelação de fotografia), por autorradiografia, por brometo de etídio, uma
substância intercalante do DNA, ou por fluorescência, com o emprego de leitora a laser. Este
último é o método mais sensível, empregado nos modernos sequenciadores de DNA. Nele, uma
molécula fluorescente é acrescentada ao primer, de forma que, ao passar por uma janela de
detecção do equipamento, um feixe de raio laser excita a fluorescência que emite um feixe de
luz em determinado comprimento de onda, feixe este captado por uma câmera virtual com
filtros especiais para cada tipo de fluorescência. Em seguida o sinal é interpretado por
softwares específicos e o resultado apresentado na forma de picos.

Ao lado dos cuidados com a coleta e preservação do material biológico, a manutenção da


cadeia de custódia, outros aspectos são fundamentais para garantir a qualidade e idoneidade
da prova gerada, como por exemplo:

*codificação alfanumérica de toda amostra biológica, de forma que apenas os peritos do caso
conhecem a sua origem;

*realização de todas as etapas de laboratório por uma equipe;

*realização dos procedimentos laboratoriais em duplicata e por equipes diferentes;

*análise das amostras questionadas e só depois, as amostras-referência;

*leitura dos resultados por no mínimo duas pessoas, separadamente;

*tipagem genética dos membros do laboratório;

*tipagem de indivíduos de outras categorias profissionais que manuseiam vestígios


encaminhados para análise genética.

Origem das perícias


Quanto à origem das perícias, elas podem ser da área cível, ou da área criminal.Exame na
esfera cível – É oriundo quase sempre das Varas de Família, nas demandas de paternidade.
Eventualmente o exame é feito com fins de provar a maternidade. O Juiz de Direito da Vara de
Família é geralmente a autoridade que requisita a perícia, podendo ser realizada:

* Com o trio estabelecido – mãe, filho e suposto pai,

* Com o duo – filho e suposto pai (quando a mãe não está disponível para exame),

* Com o suposto pai falecido – neste caso o exame deve ser feito pela genotipagem dos
parentes consanguíneos do suposto pai, na seguinte ordem de preferência: seus genitores,
filhos biológicos e respectiva genitora, irmãos, outros parentes. Quando o exame for realizado
com os filhos legítimos, ou com os irmãos do suposto pai, deve-se analisar o maior número
possível, para que o genótipo do suposto pai possa ser estimado, ou reconstituído da forma
mais ampla possível.

Na inexistência de parentes, pode-se realizar a exumação do cadáver para coleta de


material (em geral dentes e ossos) para o exame genético.A perícia mediante exumação deve
ser entendida como um procedimento de exceção, devendo ser considerada, após serem
esgotadas todas as possibilidades de realização com os parentes. Isso porque, a depender do
tempo decorrido da morte e das condições da inumação, pode não ser possível a obtenção de
DNA do osso/dente exumado, além dos procedimentos laboratoriais demandarem mais tempo
e serem mais onerosos, bem como o desconforto causado aos familiares do morto nos aspectos
emocional/afetivo.

A exumação nesses casos é determinada pelo Juiz de Direito da Vara de Família e deve
seguir o seguinte rito:

*Estabelecimento de data e hora para a realização – para minimizar o desconforto dos que vão
realizar o procedimento, sempre a céu-aberto, dá-se preferência às primeiras horas da manhã
para o seu início.

*Comunicação de ofício ao administrador do cemitério.

*Comunicação aos familiares do falecido, convidando-os a comparecerem para a correta


identificação da cova, bem como para presenciar o procedimento.

*A exumação deve ser presidida por Oficial de Justiça designado pela autoridade judicial e
acompanhada do administrador do cemitério, quando houver, devendo ser amplamente
documentada com fotografias e/ou filmagens.

*Pela natureza do procedimento, deve ser feita sempre na presença de um Médico-Legista,


podendo ele, ou outro profissional com experiência em genética forense, eventualmente
presente, se encarregar da escolha do material a ser exumado.

*Não há necessidade da remoção de todos os restos mortais. Sugerimos recolher um fêmur e


um conjunto de 05 a 10 dentes, conforme critérios estabelecidos anteriormente.

*Ao final, será lavrado o Auto de Exumação a ser assinado pelos presentes, constando data,
hora e local do fato, pessoas presentes, detalhes do procedimento, material coletado, nome do
profissional encarregado de sua guarda e destino dado a ele, garantindo, assim, a cadeia de
custódia.

Exame na esfera criminal


Realizado em investigações criminais, quando existem vestígios biológicos dele. Pode ser
solicitado, na fase de inquérito, ou de processo. Em geral, o Delegado de Polícia é a autoridade
solicitante. Quando já na fase de processo, a origem pode ser a Autoridade Judiciária, ou o
Ministério Público. A tabela 03 tabula as indicações dos exames realizados pelo Instituto de
Pesquisa de DNA Forense da Polícia Civil de Brasília, no ano de 2003, incluindo dados
estatísticos. Como se pode notar, os crimes contra a liberdade sexual (estupro com conjunção
carnal e com ato libidinoso) representaram a metade dos exames realizados. A literatura em
geral apresenta dados semelhantes.

Tipos de Análises
Quanto ao tipo de análise as perícias em Genética Forense podem ser divididas em dois
grandes grupos: vínculo genético e identidade entre amostras.

Tabela 03 –Indicações dos exames de DNA em casos criminais – IPDNA, 2003.

Vínculo genético
Análise realizada com o objetivo de estabelecer relação de parentesco entre os doadores
das amostras biológicas. Nesse tipo de análise, os perfis genéticos obtidos de cada uma das
amostras é único e diferente dos demais. O que se procura saber é se existe relação de
parentesco entre as pessoas, dado o perfil genético de cada uma delas. Foi esse tipo de análise
que deu origem à Genética Forense, com os exames cíveis de paternidade. Ele continua sendo
feito, principalmente nas demandas de paternidade cível, mas cada vez mais é utilizado na
esfera criminal, salientando-se casos de gravidez, resultante de estupro, aborto, troca de
criança em maternidade, rapto de recém-nascido, identificação de cadáver.

Cabe salientar que gêmeos verdadeiros (monozigóticos) apresentam perfis genéticos


idênticos.
Identidade entre amostras
Neste tipo de análise, o que se procura saber é se o DNA de uma amostra, em geral a
evidência de um crime, é idêntico, ou não, ao de um suspeito, de uma vítima, ou de outro
vestígio relacionado ao mesmo ou a outro crime. Caso as amostras testadas tenham sido
originadas de uma mesma fonte biológica, por exemplo, espermatozoides de uma vítima de
abuso sexual e agressor, os perfis genéticos obtidos serão necessariamente idênticos. Nessa
categoria se situa a maioria das análises em casos criminais.

Interpretação dos resultados


No exame de DNA com fins forenses é realizada invariavelmente uma análise comparativa
entre amostras biológicas coletadas de pessoas vivas, de cadáveres, ou de vestígios
relacionados a um delito. Os resultados podem demonstrar duas situações distintas:
incompatibilidade ou compatibilidade.

Análise de vínculo genético de paternidade


Incompatibilidade (Exclusão) – esta situação ocorre, quando, em alguns marcadores
analisados, os alelos observados no perfil genético do filho e que necessariamente vieram do
pai (excluídos os alelos que vieram da mãe) não estão presentes no perfil do suposto pai. Esses
alelos são denominados “alelos paternos obrigatórios” (APO). Neste caso, fica estabelecida a
condição de inexistência de vínculo genético de paternidade entre o filho e o suposto pai
testado.

Compatibilidade (Não exclusão) – Quando os “alelos paternos obrigatórios” estão


presentes no perfil do suposto pai, em cada uma das regiões do DNA analisadas.

Quando se verifica compatibilidade de vínculo genético, existe a necessidade da realização


de cálculos estatísticos para verificar qual a probabilidade daquele resultado decorrer de um
vínculo genético real entre as pessoas analisadas – no caso suposto pai e filho – (denominada
hipótese da acusação/promotoria “HP”) e a probabilidade do resultado ter ocorrido ao acaso
(denominada hipótese da defesa “HD”). Essas duas hipóteses estão implícitas em qualquer
análise de DNA forense, seja de vínculo genético, seja de identidade entre amostras, pela
comparação entre genótipos de diferentes amostras para verificar se vieram de uma mesma
fonte biológica.

Em exame de paternidade clássico, “HP” diz que: “o DNA da criança, filho daquela mãe,
apresenta o perfil observado em decorrência do vínculo genético real entre filho e suposto pai”,
enquanto que “HD” sustenta que “o DNA da criança, filho daquela mãe, apresenta o perfil
observado em decorrência de vínculo genético com outro homem qualquer não testado, que
por mera coincidência apresenta um perfil genético compatível para ser o pai da criança”.

O resultado obtido com os cálculos estatísticos traduz a robustez da prova produzida e é


crucial para a formação da convicção por parte da autoridade julgadora. Esses cálculos são
realizados com base na probabilidade do suposto pai transmitir o alelo paterno obrigatório ao
filho e na frequência de ocorrência desse alelo na população e diz quantas vezes uma das
hipóteses é mais provável que a outra. Para tanto, é necessária a existência de um Banco de
Dados de frequência alélica que seja representativo da população onde as pessoas estejam
inseridas.

As análises possibilitam a quantificação dos seguintes parâmetros:

*Índice de Paternidade – diz quantas vezes é mais provável de se obter aqueles resultados
devido ao vínculo real entre suposto pai e criança do que em razão de uma mera coincidência.

*Probabilidade de Paternidade – probabilidade de o suposto pai ser efetivamente o pai do


filho alegado. É apresentado sempre em termos percentuais.

*Probabilidade de Exclusão – probabilidade de que um indivíduo falsamente acusado seja


excluído de ser o pai do filho alegado.

Índice de Paternidade (IP)


O Índice de Paternidade é o parâmetro mais usado em Genética Forense para quantificar
as evidências em um exame de paternidade. O IP é uma Razão de Verossimilhança (RV),
definida para esse fim, como a razão entre duas probabilidades mutuamente excludentes, dado
um mesmo conjunto de evidências. O IP será igual à probabilidade do resultado observado
(genótipos das pessoas testadas) admitindo-se que a hipótese da acusação esteja correta,
dividida pela probabilidade de o mesmo resultado ter sido observado, admitindo-se como
correta a hipótese da defesa. Passemos a analisar alguns resultados hipotéticos:

Exemplo:

Para facilitar a compreensão, a frequência de ocorrência na população, para qualquer dos


alelos observados, foi arbitrada em 0,2. Os após encontram-se subscritos.

Na região D8S1179 o alelo paterno obrigatório é o 14. O suposto pai tem este alelo e
também o 11, sendo heterozigoto para esta região. Ao gerar um descendente, o alelo
transmitido por ele poderá ser o 11 ou o 14, com probabilidade de 0,5 (ou 50%) para cada um.
Para um indivíduo qualquer da população, a probabilidade de ser transmitido o alelo 14
(paterno obrigatório) será 0,2.
Na região TH01, o alelo paterno obrigatório é o 9. O suposto pai tem este alelo em
duplicata, sendo homozigoto para esta região. Ao gerar um descendente, o alelo transmitido
por ele será necessariamente o 9, com probabilidade de 1,0.

Como pode ser observado, o IP para o marcador TH01 foi duas vezes maior que para o
D8S1179, mesmo que, em ambas as regiões, a frequência do paterno obrigatório fosse a
mesma. A explicação é que no TH01 o suposto pai é homozigoto, enquanto no D8S1179 ele é
heterozigoto.

O IP total, denominado “Índice de Paternidade Combinado - IPC” é obtido pela


multiplicação do IP de cada região analisada. No caso apresentado, o IPC obtido foi 2,5 X 5,0 =
12,5.

Interpretação do Índice de Paternidade – as evidências genéticas que favorecem a


paternidade são 12,5 vezes mais prováveis de terem ocorrido, devido ao vínculo real entre
suposto pai e criança, do que em razão de um vínculo genético com um homem não testado,
selecionado aleatoriamente na população.

Quando a mãe e o filho são heterozigotos e iguais, não se identifica o alelo paterno
obrigatório. Neste caso, qualquer homem que apresente um ou outro alelo possui um genótipo
compatível para ser o pai da criança. Nessas circunstâncias, a soma das frequências dos dois
alelos será usada para compor o denominador (HD).

A regra da multiplicação pressupõe independência entre os STRs analisados, ou seja, o fato


de um determinado alelo de um STR ter sido transmitido não permite inferência sobre qual
alelo do outro STR será transmitido. Para isso, os marcadores têm de estar localizados em
cromossomos diferentes, ou, se em um mesmo cromossomo, a uma distância suficiente para
permitir taxa de recombinação de 50% entre cromossomos homólogos (membros de um
mesmo par) na divisão meiótica da gametogênese. Essa frequência é obtida, quando a distância
entre os marcadores é de, no mínimo, 50 megabases (50 centi-Morgans – cM). Marcadores
localizados a distâncias menores, em um mesmo cromossomo, apresentam taxas menores de
re-combinação meiótica. Neste caso diz-se que os marcadores estão ligados, tendendo a serem
herdados em bloco, com a extensão da ligação, sendo uma função inversa da distância entre
eles. Quanto menor a distância, mais intensa será a ligação.

A tabela 04 apresenta as fórmulas simplificadas para o cálculo do IP com o trio


estabelecido e, nos casos com ausência da mãe, considerando os genótipos possíveis de cada
uma das pessoas testadas.
Como já mencionado anteriormente, na ausência do suposto pai, o exame pode ser feito,
substituindo-o por seus parentes, na seguinte ordem de preferência:

Tabela 04 – Fórmulas para o cálculo do Índice de Paternidade de acordo com a combinação


dos genótipos possíveis de cada uma das pessoas testadas. Letra maiúscula indica o alelo
observado. Letra minúscula (na fórmula) indica a frequência do alelo correspondente.

1. Genitores do suposto pai (supostos avós) – o uso dos genitores do suposto pai permite
estimar quais alelos ele poderia apresentar no seu perfil genético. Como o genótipo de uma
pessoa em cada marcador é composto de dois alelos, os avós em conjunto apresentam quatro
alelos, um dos quais será herdado pelo neto. Neste caso, no cálculo do IP, o numerador (HP)
será igual à quantidade de vezes que o alelo paterno obrigatório foi observado nos genótipos
dos supostos avós dividido por quatro. O denominador será a frequência de ocorrência do alelo
paterno obrigatório, ou a soma das frequências dos dois alelos presentes no genótipo do filho,
se a mãe e o filho forem heterozigotos e iguais. Exemplo:

Índice de Paternidade
Na região D8S1179, o alelo paterno obrigatório é o 14. Este alelo é observado uma vez no
genótipo da suposta avó e nenhuma vez no genótipo do suposto avô.
Na região TH01, não se identifica o alelo paterno obrigatório, podendo o filho ter herdado do
pai o alelo 6 ou o 9. No genótipo da suposta avó o alelo 9 foi observado duas vezes (ela é
homozigota para o alelo 9), enquanto, no genótipo do suposto avô, o alelo 6 foi observado uma
vez.

Hipótese da defesa - soma das frequências dos alelos 6 e 9 na população.

2. Filhos biológicos com a mãe – neste caso o perfil genético do suposto pai é reconstituído, a
partir dos alelos paterno obrigatórios, identificados nos genótipos dos filhos. Para que os dois
alelos do suposto pai, em cada marcador, possam ser reconstituídos, é necessário que, pelo
menos, dois filhos biológicos sejam analisados. De fato, quanto mais filhos biológicos forem
testados, mais ampla será a reconstituição do genótipo do suposto pai. Mesmo assim, em
alguns marcadores, apenas um alelo do suposto pai poderá ser identificado no genótipo dos
filhos. Nestes casos, o cálculo do IP pode ser feito, atribuindo-se ao alelo não identificado o
valor da frequência de ocorrência do alelo paterno obrigatório, identificado no perfil do filho
em questão. Exemplo:

No marcador D8S1179, foram identificados os alelos 14 e 16 nos genótipos do filho 1 e do


filho 2, respectivamente, que não foram observados no genótipo da genitora deles. Dessa
forma, o genótipo do suposto pai é 14 – 16 para este loco. O cálculo do IP nesta situação é
feito, considerando as regras para o trio estabelecido descritas acima.
No marcador TH01, os filhos 1 e 2 apresentam o alelo 7 como paterno obrigatório, não se
sabendo qual o outro alelo presente no suposto pai neste loco. O cálculo do IP será:

1 pela presença do alelo 7 no genótipo do suposto pai; 0,2 pela frequência do alelo sobre o qual
não se tem informação

Quando apenas um alelo é identificado e este não coincide com o paterno obrigatório, a

fórmula do IP será . O valor do IP será invariavelmente 0,5, independente de


frequência do alelo paterno obrigatório. Um IP menor que 1 significa evidência contra a
paternidade pretendida naquele marcador específico, contribuindo para diminuir o valor do IP
combinado pela multiplicação dos IPs dos diversos locos analisados.

Quando a mãe dos filhos biológicos do suposto pai não pode ser testada, mesmo assim o
exame ainda pode ser feito. Nesses casos, no entanto, o IP obtido costuma alcançar valores
baixos, podendo o resultado ser considerado, para fins práticos, como pouco consistente, ou
mesmo inconclusivo. O mesmo pode ocorrer quando, na presença da mãe, apenas um filho do
suposto pai é testado. Neste último caso, uma eventual exclusão não tem como ser
caracterizada, analisando-se cada marca-dor individualmente, uma vez que, em cada um deles,
apenas um alelo do perfil do suposto pai será identificado, restando o outro, sobre o qual não
se tem informação.

3. Irmãos do suposto pai – o objetivo da análise dos irmãos do suposto pai é reconstituir os
genótipos dos supostos avós. Quanto mais irmãos puderem ser analisados, mais completa será
a reconstituição. Se apenas um irmão puder ser analisado, a reconstituição ficará restrita a um
alelo de cada genitor por marcador, resultando, em geral, em índices de paternidade muito
baixos e não permitindo que se detecte uma exclusão. Uma vez reconstituídos os genótipos dos
supostos avós, os cálculos são executados como se estes tivessem sido testados. A diferença é
que, nos marcadores nos quais em algum genitor apenas um alelo pode ser identificado, ao
alelo não identificado atribui-se o valor da frequência de ocorrência desse alelo na população,
semelhante à reconstituição do genótipo do suposto pai, mediante análise de seus filhos
biológicos.

Qual o Índice de Paternidade ideal? Existe um Índice de Paternidade mínimo para que a
prova genética seja relevante? Esta é uma matéria que suscita discussão. A International
Society for Forensic Genetics (ISFG) não estipula um Índice de Paternidade mínimo para que um
laudo seja emitido. Um índice mínimo de 10.000, resultando em uma Probabilidade de
Paternidade de 99,99%, tem sido a meta proposta e almejada por muitas instituições. Este
índice nem sempre é alcançado, mesmo após esgotados todos os recursos, em termos de
marcadores genéticos disponíveis, citando como exemplo, eventuais casos deficientes de
paternidade nos quais os parentes substituem o suposto pai, quando o exame é feito apenas
com o filho e o suposto pai, em razão de indisponibilidade da mãe, ou na identificação de
cadáver pela análise de ossos muito antigos. Nesses caso, o laudo deve ser emitido, fazendo
constar os valores estatísticos obtidos, podendo conter a ressalva de que o IP ficou abaixo do
valor mínimo almejado pela instituição. Nos casos em que o suposto pai é falecido pode-se
solicitar o envio de parentes adicionais. Na inexistência destes, resta sugerir ao Juiz a exumação
para coleta de material biológico.

Probabilidade de Paternidade (PP)


Como vimos acima, o Índice de Paternidade (IP) leva em consideração apenas as evidências
genéticas. A Probabilidade de Paternidade (PP) é calculada, a partir do IP, considerando
também as evidências não genéticas (probabilidade a priori) de que o indivíduo testado seja
efetivamente o pai de criança, podendo incluir a afirmativa da mãe de ter se relacionado com o
suposto pai, evidências que pudessem sugerir que o suposto pai não poderia ter se relacionado
com a mãe à época da concepção, por estar viajando, ou enfermo. Esta abordagem é calcada
no teorema de Bayes, das probabilidades condicionais e mutuamente excludentes. De forma
pragmática, a maioria dos autores recomenda atribuir iguais valores para as evidências não
genéticas a favor e contra a paternidade alegada. Ou seja, 50% para a Hipótese da Acusação
(HP) e 50% para a Hipótese da Defesa (HD), valorando, assim, de forma equânime, as alegações
feitas pela mãe e pelo suposto pai.A Probabilidade de Paternidade é a probabilidade a
posteriori e resulta da evidência genética multiplicada pela probabilidade a priori.Utilizando
esses pressupostos e, considerando uma probabilidade a priori de 0,5 (50%), a fórmula da
Probabilidade de Paternidade é:

Na prática, o valor obtido é multiplicado por 100, para apresentar o resultado, em termos
percentuais (tabela 5).
A Probabilidade de Paternidade não é um parâmetro de consenso, uma vez que, no seu
cálculo, como se viu, estão incluídos valores arbitrados. Sob este argumento, alguns autores
advogam o uso apenas do Índice de Paternidade, por levar em consideração tão somente as
evidências genéticas.

Tabela 05 – Probabilidades de Paternidade de acordo com o Índice de Paternidade ao nível de


7 ordens de grandezas.

Probabilidade de Exclusão
Digamos que um homem tenha sido falsamente acusado de ser o pai de uma criança. Ao se
submeter ao exame genético, qual é a probabilidade de que ele seja excluído de ser o pai, dado
que, de fato, ele não é o pai? Em outras palavras, a Probabilidade de Exclusão se refere à
probabilidade de que um indivíduo falsamente acusado seja excluído de ser o pai do filho
alegado. Quanto maior o valor obtido, mais confiável é a bateria de marcadores genéticos
utilizada no exame.

Consideremos a mãe e o filho. A análise dos seus respectivos genótipos permite identificar
o alelo paterno obrigatório no filho (APO). A Probabilidade de Exclusão (PE) pode ser definida
como a fração de homens que não apresentem o APO (ou os dois alelos do genótipo do filho,
quando mãe e filho forem heterozigotos e iguais). O cálculo é feito levando-se em consideração
apenas os genótipos de mãe e do filho. Seu valor é obtido pela fórmula:

PE = [1 – (f APO)]²

Onde f APO é a frequência do alelo paterno obrigatório (ou a soma das frequências dos
dois alelos do filho, quando mãe e filho forem heterozigotos iguais).

A Probabilidade de Exclusão Combinada (PEC) é obtida pela multiplicação do inverso das


PEs (1-PE) de cada marcador, subtraindo da unidade o valor obtido.

PEC = {1 – [(1–PE loco1) * (1–PE loco2) *...* (1–PE locoN)]}

Para apresentar o resultado, em termos percentuais, o valor obtido costuma ser


multiplicado por 100.
Análise em Identidade entre amostras
Incompatibilidade (Exclusão) – esta situação é verificada, quando o genótipo das amostras
testadas (vestígio e suspeito, por exemplo) diferem entre si, em um ou mais marcadores. Isso
implica afirmar que as amostras testadas vieram de fontes biológicas diferentes, em outras
palavras, de pessoas diferentes.

Compatibilidade (Não exclusão) – quando os genótipos das amostras testadas são


idênticos em todos os marcadores utilizados. Da mesma forma que em análise de vínculo
genético, aqui também existe a necessidade da realização de cálculos estatísticos, para verificar
qual a probabilidade de o resultado ter sido obtido, em virtude de as amostras testadas terem
vindo de uma mesma fonte biológica (hipótese da acusação/promotoria “HP”) e de terem vindo
de fontes diferentes, que, por mero acaso, apresentam genótipos idênticos (hipótese da defesa
“HD”).

Na hipótese da acusação (HP) de que as amostras vieram de uma mesma fonte biológica, a
probabilidade de identidade entre os genótipos será 1. Isto porque, sempre que uma amostra
biológica, deixada por alguém, em algum lugar, for testada e comparada com uma amostra de
referência dessa mesma pessoa, os genótipos terão de ser necessariamente idênticos,
desconsiderando-se a hipótese de erro laboratorial.

Na hipótese da defesa (HD) de que os genótipos das amostras testadas são idênticos, por
mera coincidência, esta probabilidade é obtida pela verificação da frequência de ocorrência
daquele genótipo na população, de acordo com as frequências alélicas observadas no Banco de
Dados de frequência alélica.

Revendo o que já foi discutido, anteriormente, um indivíduo apresenta dois alelos em cada
região do DNA, podendo ser idênticos ou não. A probabilidade de que dois alelos específicos
componham o seu genótipo em um determinado marca-dor é dado pela equação binomial:

(a+b)² = a² + 2ab + b²

Dessa forma, se o genótipo observado for homozigoto, sua frequência de ocorrência será
dada pela frequência do alelo, elevada ao quadrado. Se heterozigoto, pela multiplicação das
frequências dos alelos, vezes 2.

O resultado é apresentado na forma de uma Razão de Verossimilhança (RV).

Exemplo
A frequência de cada alelo foi arbitrada em 0,2

CSF1PO

Hipótese da defesa - frequência do alelo 10 elevada ao quadrado.

FGA

Hipótese da defesa - frequência do alelo 22 multiplicada pela frequência do alelo 26 ultiplicada


por 2

O cálculo da Razão de Verossimilhança (RV) total é feito pela multiplicação das RVs obtidas
em cada um dos marcadores, obedecidos os mesmos pressupostos descritos para o Índice de
Paternidade.

A RV total neste exemplo foi 25 * 12,5 = 312,5

Interpretação da RV – é 312,5 vezes mais provável que ambas as amostras apresentem os


alelos 22 e 26, se tiverem vindo da mesma fonte biológica, do que se tiverem vindo de fontes
biológicas diferentes (duas pessoas quaisquer escolhidas aleatoriamente na população).
Quanto mais elevada a RV, mais forte será a prova de que o DNA das amostras testadas vieram
da mesma pessoa.

Nesses casos, apenas a Razão de Verossimilhança costuma ser apresentada ao tribunal


como valoração estatística. Isso porque, conforme já explicado, calcular a probabilidade de que
o suspeito deixou seu material na cena do crime envolve arbitrar uma probabilidade a priori de
que o suspeito seja culpado, oferecendo argumento para contestação do laudo, já que,
segundo a lei, todos são inocentes até prova em contrário. Considerando o argumento da
defesa de que o suspeito é inocente, a probabilidade a prioria ssumiria o valor “zero”. A
probabilidade a posteriori de que o material do vestígio analisado foi deixado pelo suspeito,
também assumiria valor “zero”, desqualificando as evidências genéticas desfavoráveis ao
suspeito. Quanto ao valor mínimo a ser obtido para a Razão de Verossimilhança, cabe a mesma
observação feita para o Índice de Paternidade discutido anteriormente, podendo ser ressalvada
no laudo a Razão de Verossimilhança que tenha ficado abaixo do limite almejado pela
instituição.
Banco de Dados de Frequência Alélica e Frequência alélica mínima
Um Banco de Dados de frequência alélica é constituído mediante genotipagem de uma
amostra de indivíduos aleatoriamente selecionados em uma população. O estabelecimento da
frequência de cada alelo é feito por contagem direta de quantas vezes ele foi encontrado nos
indivíduos analisados, levando-se em consideração que cada indivíduo possui dois alelos. Se 50
indivíduos forem testados, 100 alelos serão observados. A frequência de um determinado alelo
nesse banco será o número de vezes que ele foi observado (note que, se um indivíduo é
homozigoto para um determinado alelo, este será contado duas vezes) dividido por 100. A
soma das frequências de todos os alelos de cada marcador será necessariamente 1,0.

Em amostragem populacional, a frequência de um evento raro medida pode diferir


razoavelmente da real frequência de ocorrência desse evento na população estudada. Na
estatística forense, quanto mais raro o alelo mais elevada será a Razão de Verossimilhança.
Para evitar eventuais distorções produzidas por este efeito, uma abordagem mais conservativa
tem sido empregada, mediante a política de atribuir uma frequência alélica mínima. A
frequência alélica mínima substitui a frequência tabulada no Banco de Dados, quando esta for
menor que aquela. Existem fórmulas para efetuar o seu cálculo, baseadas no tamanho do
Banco de Dados de referência. O National Research Council II - EUA (NRC II) de 1996 propôs a
fórmula 5/2N sendo N o número de indivíduos no banco. Uma regra muito comum tem sido
arbitrá-la em 0,03 (3%).

Banco de Dados de DNA Criminal


Um Banco de Dados de DNA Criminal é um banco onde são inseridos perfis genéticos de
amostras testadas, com fins de efetuar consultas para favorecer a investigação criminal, nos
moldes de um banco de dados de individuais dactiloscópicas. Ele pode conter perfis genéticos
apenas de vestígios de crime, ou incluir perfis genéticos de indivíduos. A criação de um banco
que permita a inserção de perfis genéticos de indivíduos para consulta depende de legislação
específica para esse fim. Muitos países já os têm, com abrangência variando desde a restrição
apenas para indivíduos condenados, com trânsito em julgado, por crimes de maior poder lesivo
(homicídio, estupro, latrocínio, sequestro, tráfico de menores, pedofilia) até aqueles detidos
por pequenas infrações. O Brasil ainda não dispõe de um banco dessa natureza, mas iniciativas
estão sendo tomadas para a sua implementação.

Se um determinado perfil genético é comparado com os perfis de um banco de dados e


ocorre uma coincidência, a Razão de Verossimilhança obtida deve ser dividida pelo tamanho do
banco. Isso porque, se o banco possui, por exemplo, 1.000 genótipos diferentes, será mil vezes
mais provável obter uma coincidência aleatória do que se a comparação for feita com apenas
um indivíduo.

Marcadores não Autossômicos


Os marcadores autossômicos se caracterizam por apresentarem herança biparental e
permitirem a individualização de pessoas. Neste tópico discutiremos alguns aspectos da
biologia molecular, modo de herança e interpretação dos marcadores não autossômicos – DNA
mitocondrial e cromossomos sexuais X e Y.
DNA Mitocondrial (mtDNA)
As mitocôndrias são organelas localizadas no citoplasma das células, cuja função mais
relevante é promover a oxidação dos nutrientes para produção de energia pelo ciclo do ácido
cítrico. As mitocôndrias possuem um tipo próprio de DNA, de formato circular, fita dupla,
contendo aproximadamente 16.569 pares de bases. Além de possuir 37 genes, o mtDNA
contém uma região altamente polimórfica, dita região controle, das quais duas sub-regiões,
HV1 (região hipervariable 1) e HV2 (região hipervariable 2) são muitos usadas na genética
forense.

Por ser circular, o DNA mitocondrial é mais resistente à degradação. Além do mais, cada
célula possui dezenas, até milhares de cópias, a depender do seu metabolismo. Por esses
motivos, o mtDNA pode ser obtido mesmo em material cujas análises por STR falharam.

O polimorfismo no mtDNA decorre de mutações pontuais, nas quais uma base é


substituída por outra na gametogênese, ou de inserções/deleções de uma ou mais bases em
determinado ponto da molécula. Dessa forma, a análise do mtDNA é feita por sequenciamento
de bases, com a identificação de cada base da sequência estudada, utilizando igualmente a
metodologia da PCR.

Outra característica do mtDNA é possuir herança apenas materna, sendo um DNA de


origem uniparental. Todas as mitocôndrias originam-se do gameta feminino, uma vez que o
espermatozoide não possui mitocôndria. Por essa razão, o pai não transmite o DNA
mitocondrial aos seus descendentes, de forma que esse tipo de DNA não tem utilidade em um
exame de paternidade.

Por ter herança apenas materna e não sofrer recombinação na meiose, a mãe transmite a
todos os descendentes o mesmo mtDNA. Todo indivíduo que compartilhe uma mesma
linhagem matrilinear apresenta o mesmo tipo de mtDNA, por exemplo, irmãos por parte de
mãe, avó materna, tios maternos, primos, filhos de uma tia materna, ou seja, o DNA
mitocondrial identifica linhagens, mas não indivíduos, como fazem os STRs autossômicos. A
individualização, com base apenas na análise do DNA mitocondrial, fica mais dependente de
outras informações contidas na investigação. Por exemplo, todos os indivíduos que
compartilhem a mesma linhagem matrilinear podem ter deixado seu DNA em um vestígio
analisado.

A análise do mtDNA é feita por comparação com uma sequência padrão, denominada CRS
(Cambridge Referense Sequence) ou sequência de Anderson, em homenagem ao cientista que
sequenciou o DNA mitocondrial pela primeira vez. Começando em um ponto arbitrado da
região-controle, cada base recebe um número, de 1 a 16569. Na posição 263 a CRS tem um “A”
e na posição 16223, um “C”. Uma sequência que tenha um “G” na posição 263 e um “T” na
16223 será lida como 263G; 16223T.

A valoração estatística é feita pela frequência de ocorrência, não de cada diferença


pontual, mas do haplótipo (grupo de polimorfismos estatisticamente associados), em um banco
de dados.
As indicações mais frequentes para análise do mtDNA incluem pelos sem bulbo,
encontrados em local de crime, ossos muito antigos exumados, identificação em desastre
coletivo, análise de vínculo genético, quando são empregados parentes distantes, ou para
complementar os estudos com DNA autossômico, quando este não foi suficiente. Os casos mais
famosos de identificação pelo DNA mitocondrial foram o último Czar da Rússia e membros de
sua família e o segundo homem na hierarquia nazista, Martin Bromam. Em ambos os casos as
análises foram feitas, mais de 50 anos após a morte, a comparação foi realizada com um único
parente distante e o estudo com DNA autossômico não apresentou resultado.

Cromossomo Y
O cromossomo Y possui um gene denominado SRY (sex-determining region Y), responsável
pela diferenciação sexual masculina. Dessa forma, apenas os homens apresentam cromossomo
Y. À semelhança dos autossômicos, vários STRs de interesse forense foram identificados no
cromossomo Y. Os STRs (Y-STR) localizam-se na região do DNA, sem homologia com o
cromossomo X, de forma que não ocorre recombinação na meiose, fazendo com que, da
mesma forma que o DNA mitocondrial, os STRs do cromossomo Y sejam transmitidos aos
descendentes da forma como foram herdados. Os irmãos paternos, avô paterno, tios paternos,
primos, filhos de um tio paterno, todos apresentam o mesmo DNA do cromossomo Y. Os STRs
do cromossomo Y são, portanto, marcadores uniparentais, de linhagem patrilinear. A
metodologia de análise e interpretação dos resultados são semelhantes aos STRs autossômicos.
Sistemas multiplexes de amplificação com até 17 marcadores estão disponíveis para uso. Os
cálculos estatísticos são feitos de forma análoga ao mtDNA, baseando-se na frequência de
ocorrência do haplótipo em um banco de dados e não pela multiplicação das frequências
individuais de cada alelo observado.

Os Y-STRs são particularmente úteis em análise de mistura, contendo muito material


feminino e diminuta quantidade de material masculino, como, por exemplo, nos crimes sexuais
cometidos por indivíduos vasectomizados, ou azoospérmicos, ou se a extração diferencial foi
incompleta, permanecendo células descamativas femininas misturadas a pouca quantidade de
espermatozoide. Isso porque, por competição com os substratos contidos na reação de
amplificação, o DNA feminino será amplificado preferencialmente em relação ao masculino,
impedindo, não raras vezes, de se identificar o perfil genético masculino. Também é útil nos
casos de manchas de sangue, ou saliva, contendo mistura masculina/feminina nas quais a
extração diferencial é inexequível. Nos crimes sexuais perpetrados por mais de um indivíduo, a
estimativa do número de homens envolvidos pode ser feita mais facilmente pelo cromossomo Y
que pela análise dos autossômicos.

Nos casos de paternidade cível, o cromossomo Y pode ser útil, quando a mãe não pode ser
testada, ou quando o suposto pai é falecido e, em sua substituição, os parentes são testados.
Em qualquer das situações, o filho em questão tem de ser do sexo masculino, bem como os
parentes do suposto pai (genitor, irmãos, filhos).

A multiplicação do Índice de Paternidade, obtido com Y-STR, pelo obtido com STR
autossômico é uma prática controvertida. Muitos autores advogam que, sendo originado de um
marcador apenas de linhagem, o índice obtido com Y-STR não pode ser multiplicado pelo índice
obtido com autossômicos, devendo, no laudo, cada um ser apresentado separadamente.

Cromossomo X
O cromossomo X possui um modo de herança muito peculiar. Pelo fato de a mulher ser
diploide (possui dois cromossomos X) e o homem haploide (possui apenas um – o outro
membro do par sexual é o Y), os STRs do cromossomo X (X-STR) se comportam como
marcadores bi-parentais na transmissão materna e uniparentais na paterna. A mulher
transmite os X-STR aos seus descendentes, de forma análoga aos autossômicos, mediante
segregação e recombinação alélica. Dessa forma, cada um de seus filhos herdará um conjunto
de alelos diferente dos demais. Já o homem, possuindo apenas um cromossomo, transmite o
mesmo conjunto de alelos aos descendentes, se do sexo feminino. Os filhos do sexo masculino
recebem do pai o cromossomo Y.

Os X-STR são empregados na genética forense, principalmente nas análises de paternidade


cível, nos casos deficientes nos quais o suposto pai é falecido e seus parentes são testados no
seu lugar. Isso porque, a depender dos parentes disponíveis e dos genótipos obtidos, um Índice
de Paternidade desejável será obtido apenas com a análise dos X-STR, em complementação aos
autossômicos. Os X-STRs também são usados em casos selecionados de duo mãe-filho(a) ou
pai-filha. É importante ter em mente que em exame de paternidade, para que o cromossomo X
forneça informação relevante, o filho questionado deve ser do sexo feminino.

Devido ao modo de herança diferente dos autossômicos, aqui os parentes mais


informativos são a suposta avó, as filhas biológicas (mais de uma) com a respectiva genitora, os
irmãos biológicos, as irmãs biológicas. Por não transmitir o cromossomo X aos filhos do sexo
masculino, o suposto avô não fornece informação genética relevante, exceto para ajudar na
identificação dos alelos da suposta avó, quando as irmãs do suposto pai são testadas. Os filhos
do sexo masculino do suposto pai igualmente não fornecem informação genética nesses casos.

Outras indicações menos frequentes são: evento mutacional em marcadores


autossômicos, identificação de cadáver, quando os STRs autossômicos não foram suficientes,
incesto pai-filha com filho gerado, sendo do sexo feminino, ou identificação de um perfil
genético feminino em uma mistura, contendo material masculino e feminino.

As análises estatísticas dos X-STRs em genética forense são um pouco mais complexas.
Como vimos, a mulher possui dois cromossomos X que se recombinam na formação do gameta.
A recombinação depende da distância que separa os marcadores, sendo tanto menor quanto
mais próximos estejam localizados no cromossomo. Como já discutido antes, o homem porta
apenas um cromossomo X. Esta característica biológica tem um impacto importante no cálculo
do Índice de Paternidade, quando o suposto pai é testado, porque o pai transmite à filha
sempre o mesmo alelo em cada marcador, com uma probabilidade de 1,0 (ou 100%). Por esse
motivo, o IP obtido com os X-STR é sempre mais elevado que com os autossômicos,
considerando frequências alélicas semelhantes e uma bateria com igual quantidade de locos. A
tabela 06 apresenta as fórmulas para o cálculo do IP com o trio mãe-filha-suposto pai e o duo
pai-filha. Como o homem apresenta apenas um único cromossomo X e, portanto, um único
conjunto de alelos para todos os marcadores considerados, a regra da multiplicação dos IPs de
cada loco vai depender da existência ou não de desequilíbrio de ligação (frequência maior de
uma determinada combinação entre alelos de dois marcadores, do que a esperada pelo
produto de suas frequências individuais) entre eles. Caso estejam em equilíbrio, a multiplicação
dos IPs é permitida, uma vez que não haverá desvio entre a frequência haplotípica observada
na população e a frequência obtida pela regra da multiplicação, com base nas frequências
alélicas.

Se a suposta avó é testada no lugar do suposto pai, o cálculo estatístico é semelhante ao


realizado para autossômicos, utilizando o genótipo da suposta avó, no lugar do genótipo do
suposto pai. Nessa situação, o uso de uma bateria composta de vários X-STR deve levar em
consideração a extensão da ligação entre eles, quando das análises estatísticas, só sendo
permitido efetuar o cálculo da multiplicação dos IPs individuais, se os marcadores forem
considerados independentes. Marcadores ligados devem ser considerados como um haplótipo,
de forma que a frequência haplotípica deve ser levada em consideração nos cálculos e não as
frequências alélicas dos locos individualmente.

Tabela 06 – Fórmulas para o cálculo do Índice de Paternidade, de acordo com a combinação


dos genótipos possíveis de cada uma das pessoas testadas.

Por ser um tipo de marcador que permite a individualização de pessoas, os índices obtidos com
os autossômicos podem ser multiplicados sem restrições com os obtidos com X-STRs, gerando
um índice único.

Mutação
A fonte primordial da diversidade biológica são as mutações gaméticas, o que faz com que
um descendente herde um alelo diferente dos alelos presentes no genótipo do genitor. Nos
STRs as mutações ocorrem por adição, ou subtração de uma, ou eventualmente mais de uma
unidade de repetição. A taxa de mutação nos STRs é de aproximadamente uma a cada mil
meioses, por loco, sendo mais observada no pai que na mãe. Considera-se um evento
mutacional paterno, quando, em uma bateria de STRs analisados, um deles apresenta uma
inconsistência: o alelo paterno obrigatório do filho difere dos dois alelos observados no
genótipo do suposto pai, estando presente nos demais STRs analisados. A mutação ocorre
quase sempre em um único loco e por mudança numérica de uma unidade de repetição.
Quando a hipótese de mutação é aceita, um cálculo é feito em separado para aquele loco,
considerando a taxa de mutação paterna no loco e a probabilidade média de exclusão. A taxa
de mutação paterna no loco é encontrada em tabelas; a probabilidade média de exclusão é
obtida pela fórmula “h2(1-(2.h.H2))”, sendo “h” = taxa de heterozigose no loco e “H” = taxa de
homozigose no loco, também encontradas em tabelas. A fórmula é a seguinte:

O valor encontrado, invariavelmente muito baixo, substitui o Índice de Paternidade para


aquele loco. A incorporação desse valor irá diminuir o Índice de Paternidade Combinado
consideravelmente, requerendo muitas vezes a análise adicional de outros marcadores.

Mistura
Mistura de material genético em Genética Forense se refere à presença de material de
mais de um indivíduo em uma amostra biológica. Tipicamente é o que ocorre quando um
estupro é perpetrado por mais de um agressor, ou quando uma vítima de estupro teve relação
anterior e recente com o parceiro consentido.

Uma mistura é detectada quando mais de dois alelos são observados em alguns
marcadores autossômicos. Quando marcadores do cromossomo Y são analisados, a mistura fica
caracterizada pela constatação de mais de um alelo por loco. A quantidade de contribuidores
para a formação de uma mistura nem sempre é fácil de ser estabelecida, sendo tanto mais
difícil quanto maior for o número de pessoas envolvidas. Os cálculos estatísticos podem levar
em consideração mais de uma hipótese, tanto da acusação quanto da defesa, em um mesmo
caso. Por exemplo:

HP – a mistura é composta de material do parceiro consentido e do suspeito

HD – a mistura é composta de material do parceiro consentido e de um indivíduo qualquer da


população.

Ou

HP – a mistura é composta de material do parceiro consentido e do suspeito

HD – a mistura é composta de material de dois indivíduos quaisquer da população.

As análises nesses casos são bastante complexas, exigindo muita experiência do perito.
Para que um indivíduo possa ser incluído como possível contribuidor, todos os seus alelos
devem ser observados na mistura. Para que a mistura seja considerada como composta de
material apenas de duas ou mais pessoas específicas, não podem ser detectados alelos
diferentes daqueles presentes nos seus respectivos genótipos. Do contrário, haverá outro
contribuidor não considerado.
O método mais usado para a realização do cálculo leva em conta o número de indivíduos
que contribuíram para a formação-mistura e os genótipos possíveis para sua composição em
cada loco. Passemos a um exemplo:

No loco CSF1PO, a mistura é composta de 04 alelos (10 – 11 – 12 – 14), os quais coincidem


com os 04 alelos dos suspeitos.

Os genótipos possíveis de duas pessoas quaisquer que permitam formar uma mistura,
contendo os alelos 10, 11, 12 e 14, são os seguintes:

Genótipos possíveis (1) - Um indivíduo 10 – 11 e outro 12 – 14

Genótipos possíveis (2) - Um indivíduo 10 – 12 e outro 11 – 14

Genótipos possíveis (3) - Um indivíduo 10 – 14 e outro 11 – 12

No loco FGA, a mistura é composta de 03 alelos (18 – 22 – 26), os quais coincidem com os
03 alelos dos suspeitos.

Os genótipos possíveis de duas pessoas quaisquer que permitam formar uma mistura,
contendo os alelos 18, 22 e 26, são os seguintes:

Genótipos possíveis (1) - Um indivíduo 18 – 18 e outro 22 – 26

Genótipos possíveis (2) - Um indivíduo 18 – 22 e outro 18 – 26

Genótipos possíveis (3) - Um indivíduo 18 – 22 e outro 22 – 26

Genótipos possíveis (4) - Um indivíduo 18 – 22 e outro 26 – 26

Genótipos possíveis (5) - Um indivíduo 18 – 26 e outro 22 – 22

Genótipos possíveis (6) - Um indivíduo 18 – 26 e outro 22 – 26

A Razão de Verossimilhança obtida manualmente é muito trabalhosa e sujeita a equívocos.


Programas computacionais, alguns disponíveis gratuitamente na inter-net, permitem a
realização dos cálculos com mais segurança e eficiência.

Modelos de Laudos de Exame de DNA


O autor apresenta alguns modelos de laudos, como exemplo.

LAUDO DE EXAME DE DNA DE PATERNIDADE CÍVEL


OBJETIVO DA PERÍCIA
Determinar os perfis genéticos de Maria (mãe), Laura (filha) e Antônio (suposto pai), para,
por intermédio de suas respectivas comparações, estabelecer eventual relação de vínculo
genético de paternidade.

AMOSTRAS ANALISADAS
Das pessoas referidas foram coletadas amostras biológicas para fins do exame proposto,
após assinatura das Declarações de Doação Voluntária.

MÉTODOS
As amostras citadas foram submetidas aos procedimentos de extração de DNA com NaOH
0,2 M e amplificação pelo método da PCR para os marcadores genéticos D8S1179, D21S11,
D7S820, CSF1PO, D3S1358, TH01, D13S317, D16S539, D2S1338, D19S433, vWA, TPOX, D18S51,
D5S818, FGA, Penta-E, Penta-D e Amelogenina. Os produtos de amplificação foram submetidos
a eletroforese capilar e os perfis genéticos obtidos, analisados após revelação por fluorescência.

RESULTADOS
Os resultados da eletroforese revelam que o perfil alélico do “suposto pai” apresenta os
alelos paternos identificados na amostra da “filha”, estabelecendo a condição de
compatibilidade de paternidade.

Valoração Estatística:

Índice de Paternidade¹ - 1.857.358.716

Probabilidade de Paternidade² - 99,99999994%

Probabilidade de Exclusão³ - 99,99999997%.

1. O Índice de Paternidade é verificado por meio da razão entre a probabilidade dos alelos
paternos, observados no perfil genético do filho, serem oriundos do suposto pai, e a
probabilidade de eles serem oriundos de um indivíduo selecionado aleatoriamente na
população.

2. A Probabilidade de Paternidade é calculada de acordo com o Teorema de Bayes, a partir do


Índice de Paternidade. A probabilidade a priori considerada foi de 0,5.

3. A Probabilidade de Exclusão indica a probabilidade de um indivíduo selecionado


aleatoriamente na população ser excluído como pai biológico do filho. Seu cálculo é feito
considerando-se apenas os alelos da mãe e do filho

CONCLUSÃO
Considerando os resultados, conclui-se que Antônio (suposto pai) apresenta um perfil
genético compatível com a condição de paternidade biológica em relação a Laura (filha), com
uma probabilidade de paternidade de 99, 99999994% e uma probabilidade de exclusão de
99,99999997%.
Se os resultados tivessem demonstrado uma exclusão, os tópicos Resultado e Conclusão
poderiam ter a seguinte redação:

RESULTADOS
Os resultados da eletroforese revelam que o perfil alélico do suposto pai não apresenta os
alelos paternos identificados nos locos D21S11, D7S820, CSF1PO, D3S1358, TH01, D2S1338,
vWA, FGA e Penta-E da amostra da filha, estabelecendo a condição de exclusão de paternidade.

CONCLUSÃO
Considerando os resultados, conclui-se pela exclusão de Antônio (suposto pai) como pai
biológico de Laura (filha).

COMENTÁRIOS
A exclusão é um resultado sobre o qual não resta incerteza, prescindindo de análise
estatística. A não exclusão resulta em compatibilidade de paternidade. Uma vez que uma
pessoa selecionada aleatoriamente na população pode ter um perfil igualmente compatível,
mesmo que com uma probabilidade muito pequena, os cálculos estatísticos são necessários
para verificar quantas vezes as evidências genéticas são mais favoráveis à paternidade com o
suposto pai testado, em comparação a outro indivíduo qualquer, não relacionado
geneticamente.

Para configurar uma exclusão, não é necessário que ocorra inconsistência em todos os
marcadores testados. No presente caso, foram analisados 17 marcadores, observando-se
inconsistências em apenas 9. Nos demais marcadores, o suposto pai apresenta os alelos
paternos observados no genótipo da filha por mera coincidência.

LAUDO DE EXAME DE DNA DE CONFRONTO DE AMOSTRAS

OBJETIVO DA PERÍCIA
O presente exame tem por finalidade determinar os padrões de DNA das amostras
biológicas impregnadas em swabs colhidos de XXXXXX, para, por meio de comparação dos
respectivos genótipos obtidos, estabelecer eventual condição de verossimilhança com os
padrões obtidos do suspeito XXXXXX e da vítima XXXXXX.

AMOSTRAS ANALISADAS
Amostras-referência:

As pessoas XXXXXX (R.G. n° X.XXX.XXX, SSP-DF) e XXXXXX (R.G. n° X.XXX.XXX, SSP-DF)


compareceram a este Instituto e, após autorização através das correspondentes “Declarações
de Doação Voluntária”, foram submetidas à coleta de amostras de sangue periférico, em tubos
“Vacutainer”, em volumes de aproximadamente 3,0mL.

Amostra questionada:

Dois swabs com material vaginal coletado da vítima XXXXXX, referentes ao Laudo de
Conjunção Carnal n° XX.XXX/IML, enviados pelo memorando n° XX.XXX/IML. Parte de um
swabfoi utilizada no exame genético.
MÉTODOS
As amostras citadas foram submetidas aos procedimentos de extração, quantificação e
amplificação do DNA pelo método da PCR para os marcadores genéticos D8S1179, D21S11,
D7S820, CSF1PO, D3S1358, TH01, D13S317, D16S539, D2S1338, D19S433, vWA, TPOX, D18S51,
D5S818, FGA e Amelogenina. Os produtos de amplificação foram submetidos a eletroforese
capilar e os perfis genéticos obtidos, analisados, após revelação por fluorescência.

RESULTADOS
Na fração não espermatozoide extraída da amostra questionada foi observada a presença
de material genético proveniente de uma única pessoa, do sexo feminino, cujo padrão alélico
coincide com aquele identificado na amostra de sangue coletada da vítima XXXXXX.

Na fração espermatozoide da mesma amostra foi observada a presença de material


genético proveniente de uma única pessoa, do sexo masculino, cujo padrão alélico coincide
com aquele identificado na amostra de sangue coletada do suspeito XXXXXX. A probabilidade
de se selecionar ao acaso na população masculina uma pessoa não relacionada, apresentando o
mesmo perfil, é de aproximadamente 1 em 9.600.000.000 (um em nove bilhões e seiscentos
milhões).

CONCLUSÃO
O perfil genético identificado na amostra de sangue colhido de XXXXXX (suspeito) é
idêntico, em todos os marcadores analisados, ao material genético proveniente dos
espermatozoides isolados da amostra biológica impregnada no swabde conteúdo vaginal
coletado de XXXXXX, referente ao Laudo de Conjunção Car-nal n° XX.XXX/IML. A chance de se
selecionar ao acaso na população masculina uma pessoa não relacionada, apresentando o
mesmo perfil é de aproximadamente 1 em 9.600.000.000.

COMENTÁRIOS
Nesta perícia o cálculo estatístico envolveu apenas a Razão de Verossimilhança. Não foi
calculada a probabilidade de o suspeito ter efetivamente deixado seus espermatozoides na
vítima. Isso porque, conforme explicado anteriormente, seu cálculo envolve arbitrar uma
probabilidade a prioride o material biológico analisado ter sido deixado pelo suspeito, indo de
encontro a dispositivo legal que diz que todos são inocentes até prova em contrário.

A Razão de Verossimilhança resulta de divisão entre duas probabilidades, sendo


apresentada como uma chance (odds) e não como uma probabilidade.

Considerando que o DNA dos espermatozoides tenha diferido do DNA do suspeito, os


tópicos Resultado e Conclusão poderiam ter a seguinte redação:

RESULTADOS
Na fração não espermatozoide extraída da amostra questionada foi observada a presença
de material genético proveniente de uma única pessoa, do sexo feminino, cujo padrão alélico
coincide com aquele identificado na amostra de sangue coletada da vítima XXXXXX.
Na fração espermatozoide da mesma amostra foi observada a presença de material
genético proveniente de uma única pessoa, do sexo masculino, cujo padrão alélico difere
daquele observado na amostra de sangue coletada do suspeito XXXXXX.

CONCLUSÃO
Considerando os resultados, pode-se concluir que XXXXXX (suspeito) está excluído de
haver contribuído com material genético para a produção da amostra de conteúdo vaginal
coletada de XXXXXX, referente ao Laudo de Conjunção Carnal n° XX.XXX/IML.

Resultado de um caso hipotético de paternidade envolvendo o trio mãe-filha-suposto pai

Alelos paternos obrigatórios sublinhados

IP – 16.971.611

PP – 99,999994

PE – 99,99990
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