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Relatório Parcial
Período da bolsa: de agosto/2017 a julho/2018
INTRODUÇÃO ................................................................................. 1
2. METODOLOGIA ........................................................................... 10
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.......................................... 19
INTRODUÇÃO
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Acreditamos que a cerâmica possa ajudar na compreensão dos processos dos rituais
funerários realizados no sítio, não apenas na tentativa de identificar elementos diferenciadores,
mas com o objetivo de buscar alguma relação da cerâmica com os indivíduos enterrados. Para
essa compreensão, dentre as cerâmicas fragmentadas e os vasilhames inteiros presentes nos
contextos funerários de três dos quatro cemitérios escavados no sítio Justino (VERGNE, 2004),
foram escolhidas as vasilhas cerâmicas inteiras como objeto de estudo.
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1. REVISÃO DA LITERATURA
Para melhor inserção do leitor ao contexto desta pesquisa, este capítulo será dividido
em três partes. Primeiro apresentaremos o debate acerca da Arqueologia Funerária, seguindo
pelos estudos realizados anteriormente na região do São Francisco e, posteriormente, pesquisas
realizadas e seus resultados sobre o Sítio Justino.
A dificuldade que se encontra ao analisar uma estrutura funerária está justamente nos
elementos que esta oferece, pois, assim como podem servir apenas para separar o indivíduo do
mundo dos vivos e prepará-lo para o esquecimento, as representações funerárias podem não ter
sido, necessariamente, vividas por este em determinado grupo, pois durante a construção do
ritual, dá-se ao morto uma nova identidade (ancestral a ser relembrado e venerado ou ainda
presente entre os vivos de alguma maneira), e os materiais arqueológicos destas representações
são espelhos de diferentes relações sociais, sejam elas realizadas em vida, em morte ou
referente às relações com ancestrais (BARRETO, 2008; PEARSON, 1999).
Desde a chegada dos europeus na região Nordeste, notou-se uma grande diversidade
de povos indígenas além dos Tupi que dominavam o litoral, porém os “Tapuias” (designação
para não-Tupi) não receberam a mesma atenção por serem andantes, possuírem uma
diversidade de línguas, e pelo fato destas se mostrarem muito difíceis para aprender e/ou
compreender (DANTAS et al, 1992). Pesquisadores acreditam que estes povos que ocupavam
o sertão teriam sido expulsos do litoral pelos Tupi e posteriormente limitados a Oeste por
populações do tronco linguístico Jê (MÉTRAUX, 1927 apud DANTAS et al, 1992).
No que se refere ao rio São Francisco, como já dito, a maioria dos dados arqueológicos
são provenientes dos salvamentos arqueológicos realizados para as construções das usinas
hidrelétricas de Sobradinho em 1970; Itaparica em1980, cujo as pesquisas resultaram no
estabelecimento e estudo da chamada Tradição (lítica) Itaparica; e, mais recentemente, de
Xingó na década de 1990 (LUNA, 2006). Estudos anteriores ao salvamento arqueológico da
década de 1980 foram realizados na Grupa do Padre, localizada em Itaparica na década de 1930
por Carlos Estevão e novamente em 1960 por Calderón, que, por sua vez, também estudou
diversos sítios cerâmicos no litoral, na região da mata e na região semiárida da Bahia e
Pernambuco que resultaram no estabelecimento da tradição Aratu, identificada em 24 sítios do
litoral Baiano, em Sergipe e Pernambuco (LUNA, 2006).
Como resultado desse grande salvamento, um dos trabalhos publicados foi de Carvalho
(2007), que apresentou sua tese de doutorado com os estudos realizados nos sepultamentos do
sítio Justino, bem como do sítio São José II, outra necrópole localizada na mesma região, para
compreender os aspectos das populações que ocuparam o local, utilizando métodos da
bioarqueologia – para determinação de sexo e idade, bem como identificação de patologias e
anomalias nos esqueletos – estudos tafonômicos e análise do mobiliário funerário.
O Sítio Justino foi encontrado em 1990 pela equipe do PAX (Projeto Arqueológico de
Xingó) num terraço localizado na confluência de um riacho com o rio São Francisco, situado
na fazenda Cabeça de Nego, no município de Canindé de São Francisco, Sergipe (VERGNE,
2004) como mostra a figura 1. Entre os anos 1991 e 1994, o sítio foi escavado em sua totalidade.
As escavações chegaram a 6,40 metros de ocupações ininterruptas, até o embasamento rochoso,
sendo o sítio arqueológico com maior intervenção na área de Xingó (DANTAS & LIMA, 2014;
FAGUNDES, 2010; LUNA, 2006; VERGNE, 2004). Importante informar que atualmente,
devido à construção da barragem, o sítio Justino – como tantos outros – se encontra submerso.
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Figura 1 Localização da área de Xingó com ênfase no sítio Justino (OLIVEIRA, 2017)
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possuem vasilhames completos, sendo o primeiro de um indivíduo feminino com idade superior
a 35 anos e o segundo pertencente a um sepultamento duplo (VERGNE, 2004, 2005). Ambos
serão abordados posteriormente no decorrer deste trabalho.
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(sepultamentos com mais de um indivíduo enterrado), um mobiliário funerário mais simples e
pouco diversificado (VERGNE, 2004).
A partir do cemitério B, passa a haver também uma diferenciação entre sexo, sendo os
sepultamentos masculinos os possuidores de um mobiliário funerário mais rico do que os
sepultamentos femininos, mesmo entre indivíduos de mesma faixa etária, até entre indivíduos
com idade superior a 35 anos (VERGNE, 2004). Diferentemente do conjunto B, o cemitério A
apresenta uma diferenciação social mais relacionada à faixa etária dos indivíduos. Os
sepultamentos infantis apresentam enxovais muito simples quando comparados com os dos
adultos, que por sua vez, mesmo possuindo maior requinte e os chamados “elementos
diferenciadores”, possuem enxovais menos elaborados do que àqueles pertencentes a
indivíduos com mais de 35 anos (ibidem). Uma característica comum a todos os cemitérios é
que os sepultamentos conjuntos e os enterramentos secundários possuem mobiliário funerário
mais simples que os demais (VERGNE, 2004).
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2. METODOLOGIA
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3. RESULTADOS PRELIMINARES E DISCUSSÃO
Uma das etapas deste trabalho, consistiu na separação da deposição dos vasilhames
cerâmicos completos nos sepultamentos. Primeiramente levamos em conta apenas suas
localizações em relação aos esqueletos, porém procuramos também levar em consideração
algumas características dessas vasilhas, como dimensões e acabamentos. As diferentes
deposições dos vasilhames serão abordadas a seguir, para que posteriormente possamos discutir
e interpretar os dados obtidos.
Quatro vasilhames cerâmicos foram utilizados como urnas funerárias para a deposição
individual de indivíduos no cemitério B: os esqueletos de números 164 e 165 de indivíduos
infantis, o esqueleto 166 de um indivíduo com mais de 35 anos de sexo indeterminado e o
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Esse trabalho foi realizado em conjunto com outros discentes da graduação e pós-graduação que fazem parte
dos projetos de pesquisa dos profs. do DARQ Daniela Klökler e Fernando Almeida.
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esqueleto 167 pertencente a um indivíduo adulto de sexo indeterminado (DANTAS & LIMA,
2014; VERGNE, 2004).
A terceira vasilha cerâmica utilizada como urna está relacionada a um indivíduo com
mais de 35 anos, o esqueleto 166 (VERGNE, 2004). O esqueleto encontra-se incompleto e
parcialmente articulado envolto em sedimento argiloso, dentro de um vasilhame semiesférico,
de contorno simples e de superfície alisada (DANTAS & LIMA, 2014:78). Essa, difere um
pouco das urnas associadas aos enterramentos infantis, pois possui altura um pouco menor -
com 13 centímetros – e 31 centímetros de diâmetro da boca, mas também sugere ter sido
utilizada para a cocção de alimentos com contato muito próximo do fogo (ibidem).
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Através de correlações dos dados obtidos por Dantas e Lima (2014), podemos inferir
que os vasilhames utilizados como urna funerária no cemitério B eram compostos por
características muito parecidas, sendo todos confeccionados com a mesma técnica, possuindo
mesma forma – com divergências apenas nas bordas e nos lábios, mesmo antiplástico (quartzo
e presença de mica) e tratamentos de superfície. Outrossim, todas as vasilhas foram utilizadas
para cozimento de alimentos, com contato intenso ou não à fonte de calor, no máximo duas
vezes antes de receberem os indivíduos a serem depositados nas covas.
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As vasilhas cerâmicas presentes no sepultamento do esqueleto 33 são ambas feitas com
a técnica do acordelamento, seus antiplásticos são de quartzo e mica, e possuem sua superfície
alisada e sem decorações (DANTAS & LIMA, 2014). O vasilhame pequeno (colocado sobre o
crânio, com 10 centímetros de altura e 31 centímetros de diâmetro) possui marcas de preparo
de alimentos em sua capacidade máxima, com contato direto com a fonte de calor, já a vasilha
maior (com 22 centímetros de altura e 38,5 centímetros de diâmetro da boca), além dessas
características, possui uma crosta de possíveis restos alimentares carbonizados em seu interior,
uma marca interna que indica que o vasilhame tenha sido utilizado para preparo ou
armazenamento de alimento ou bebida com a vasilha inclinada, e ainda há uma fratura em U na
borda que sugere ter sido feita intencionalmente (ibidem).
A partir de todos esses dados, podemos inferir que, além das características
semelhantes das vasilhas, há a similaridade de perfil dos indivíduos em que foram encontradas.
Dois dos três enterramentos com essas características pertenciam a indivíduos masculinos com
idade superior a 35 anos, já o terceiro é adulto, porém seu sexo não pode ser determinado. Além
da possível relação com o sexo masculino, o que precisaria de uma confirmação a partir da
diagnose do sexo deste último, ainda não temos elementos suficientes a esta altura da pesquisa
para inferirmos quais outras características estão vinculadas a esse tipo de deposição.
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Vergne infere como sepultamentos de poucos acompanhamentos os que possuem menor diversidade e
quantidade de material, além daqueles que não possuem em seu mobiliário os considerados elementos
diferenciadores mencionados anteriormente.
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pouca diversidade em formas (basicamente representadas por vasilhames semiesféricos, meia-
calota e globulares, apresentadas na figura 2) (DANTAS & LIMA, 2014). Porém alguns dos
vasilhames apresentam particularidades, como o pequeno vaso que está associado ao
sepultamento 131, de um indivíduo masculino, que possui forma globular e bordas
extrovertidas, possuindo 13 centímetros de altura e 15 centímetros de diâmetro (DANTAS &
LIMA, 2014). Outras particularidades são referentes ao vasilhame associado ao esqueleto 137,
indivíduo de sexo masculino, que possui dois apêndices para preensão em suas laterais, e a um
dos vasilhames relacionados ao esqueleto 119, indivíduo masculino com idade superior a 35
anos, que apresenta dois orifícios circulares para amarração em cada lado de uma rachadura
presente desde a base até sua borda, em uma tentativa de reutilização (DANTAS & LIMA,
2014; VERGNE, 2004).
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Segundo Vergne (2004), foram encontrados em todo o sítio 6 tembetás em amazonita. No cemitério D, onde
2 foram encontrados, estes estavam associados a sepultamentos femininos (160 e 161). Os outros 4 foram
encontrados no cemitério B, associados a um sepultamento de idade e sexo não determinados (142), dois
sepultamentos de indivíduos masculinos (109 e 131) e ao sepultamento 116.
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cerâmicos decorados, um colar de material ósseo, braceletes, tornozeleiras, a única ponta de
projétil encontrada em associação aos esqueletos em todo o sítio e um vasilhame cerâmico de
22,5 centímetros de altura e 43 centímetros de diâmetro sobre seu corpo (DANTAS & LIMA,
2014; VERGNE, 2004).
O cemitério C possui três sepultamentos (122, 127 e 149) com vasilhames cerâmicos
completos constatados por Vergne (2004), porém Dantas e Lima (2014) em suas análises,
descreveram e analisaram os vasilhames referentes aos sepultamentos 122, 127 e 147, este
último não sendo descrito com vasilha completa pela autora anteriormente citada.
O sepultamento 147 é referente a uma criança com idade estimada entre 7 e 8 anos que
possui como acompanhamento funerário inúmeros artefatos considerados diferenciadores, além
de um vasilhame completo, chamando a atenção por estarem presentes em um enterramento
infantil, que geralmente são caracterizados por não possuírem muita diversidade de material no
sítio Justino (VERGNE, 2004). A vasilha cerâmica associada a este esqueleto possui 8
centímetros de altura e 19 centímetros de diâmetro, e possui em seu interior fragmentos de ossos
longos de ave e pontos de tinta verde no bojo (DANTAS & LIMA, 2014). Suas características
de produção é a mesma que as outras já mencionadas e, assim como tais, fora utilizada para
preparo de alimento com contato direto com a fonte de calor em sua capacidade máxima
(ibidem).
A partir dos dados analisados, Dantas e Lima (2014) concluíram que – com exceção
de uma – as vasilhas cerâmicas foram levadas ao fogo para preparar alimentos para um número
considerável de pessoas, haja vista suas dimensões e marcas que indicaram seus usos em
capacidade média e máxima. Este preparo provavelmente estaria ligado diretamente ao ritual
funerário, devido ao pouco uso dos recipientes indicado pelas escassas marcas de uso. Nos resta
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saber, com base nestas informações se os vasilhames depositados juntos aos indivíduos foram
confeccionados especificamente para tal ocasião ou foram reaproveitados para adquirirem tal
função.
Com base nos dados processados até o momento, acreditamos que, além dos outros
artefatos presentes nos mobiliários funerários, as vasilhas presentes nos sepultamentos do sítio
Justino podem nos trazer informações sobre os indivíduos com elas enterrados. Vergne (2004),
não relaciona elementos de diferenciação no material cerâmico na maioria das vezes, porém
consideramos que em alguns casos essa distinção não estaria relacionada apenas com seu modo
de confecção, acabamento e/ou decoração, mas poderia estar associada à maneira como foram
posicionadas juntamente aos indivíduos, como os casos das urnas e das vasilhas depositadas
sobre o crânio e abdômen. Em relação às vasilhas que fogem ao “padrão” de forma e uso (e.g.
vasilhame associado ao sepultamento 50 de formato piriforme, vasilhame associado ao
sepultamento 132 que possui marcas de uso intensas), assim como Dantas e Lima (2014),
acreditamos que estas podem estar associadas a diferentes grupos, poderiam corresponder a
produtos adquiridos por trocas, inserção de oleiras de outros grupos e/ou mudanças incorporadas ao
longo do tempo por um mesmo grupo.
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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
DUDAY H.; COURTAUD P.; CRUBEZY É.; SELLIER P.; TILLIER Anne-Marie.
L'Anthropologie de Terrain: Reconnaissance et Interprétation des Gestes Funéraires.
In: Bulletins et Mémoires de la Société d'anthropologie de Paris, Nouvelle Série. Tome 2
fascicule 3-4, 1990. p. 29-49.
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OLIVEIRA, C. A. Abordagens Teóricas dos Grupos Pré-Históricos Ceramistas no
Nordeste. Revista do Museu de Arqueologia de Xingó, n. 1, p. 10-35, dez, 2001.
OLIVEIRA, Lucas. Análise dos Depósitos Rituais do Sítio Justino. Relatório Final
apresentado a COPES, Universidade Federal de Sergipe, São Cristóvão, 2017.
PEARSON, M. P. The Archaeology of Death and Burial. Texas A&M University Press,
College Station, USA, 1992
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