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Moacir José da Silva

Itamar Flávio da Silveira


(Organizadores)

Coleção História e Conhecimento.

HISTÓRIA ECONÔMICA
MODERNA E
CONTEMPORÂNEA

Maringá, EDUEM, 2010.


SOBRE OS AUTORES ................................................................... 3

APRESENTAÇÃO DA COLEÇÃO .................................................. 4

APRESENTAÇÃO DO LIVRO ........................................................ 7

CAPÍTULO 1. DIÁLOGOS SOBRE HISTÓRIA E ECONOMIA:


JUAN DE MARIANA E A ORIGEM DA ESCOLA AUSTRÍACA* ............. 10

CAPÍTULO 2. O MERCANTILISMO ............................................. 28

CAPÍTULO 3. A HISTÓRIA ECONÔMICA DA REVOLUÇÃO


FRANCESA SOB A PERSPECTIVA DA ESCOLA FISIOCRÁTICA ........ 44

CAPÍTULO 4. ENSAIO METODOLÓGICO FOCALIZANDO A


CONTRIBUIÇÃO DE RONALD MAX HARTWELL SOBRE A
REVOLUÇÃO INDUSTRIAL INGLESA .................................................... 62

CAPÍTULO 5. FUNDAMENTOS DO NACIONALISMO


ECONÔMICO: REVISITANDO AS IDEIAS DE LIST E MACIEL DA
COSTA ..................................................................................................... 83

CAPÍTULO 6. O TAYLORISMO E A QUESTÃO DO TRABALHO


NA CONTEMPORANEIDADE .................................................................. 98

CAPÍTULO 7. A GLOBALIZAÇÃO DOS MERCADOS ............... 125

2
SOBRE OS AUTORES

• Jesus Huerta de Soto

Professor de Economia Política na Universidade Rei Juan Carlos,


em Madri, Espanha. Mestre em Administração pela Stanford University,
EUA. Graduado e Doutor em Economia e Direito pela Universidade
Complutense de Madri.

• Itamar Flávio da Silveira

Professor de História Econômica do Departamento de História da


Universidade Estadual de Maringá (UEM). Graduado em História (UEM).
Mestre em Educação (UEM).

• Moacir José da Silva

Professor de História Econômica do Departamento de História da


Universidade Estadual de Maringá (UEM). Graduado em História (UEM).
Mestre em Economia (UEM). Doutor em Engenharia de Produção (UFSC).
Pós-Doutor em Administração (USP).

• Neilaine Ramos Rocha


Professora Colaboradora do Departamento de História da Universidade
Estadual de Maringá (UEM). Graduada e Mestre em História (UEM).

• Suelem Halim de Nardo Carvalho


Professora Colaboradora do Departamento de História da Universidade
Estadual de Maringá (UEM). Graduada e Mestre em História (UEM).

• Luis Fernando Pessoa Alexandre


Professor Colaborador do Departamento de História da
Universidade Estadual de Maringá. Graduado e Mestre em História (UEM).

3
APRESENTAÇÃO DA COLEÇÃO

A coleção História e Conhecimento é composta de 42


títulos, que serão utilizados como material didático pelos alunos
matriculados no Curso de Licenciatura em História, Modalidade a
Distância, da Universidade Estadual de Maringá, no âmbito do sistema da
Universidade Aberta do Brasil (UAB), que está sob a responsabilidade da
Diretoria de Educação a Distância (DED) da Coordenação de
Aperfeiçoamento de Pessoal do Ensino Superior (CAPES).
A utilização desta coleção pode se estender às demais
instituições de Ensino Superior que integram a UAB, fato que tornará ainda
mais relevante o seu papel na formação de docentes e pesquisadores, não
só em História mas também em outras áreas na Educação a Distância, em
todo o território nacional. A produção dos 42 livros, a qual ficou sob a
responsabilidade da Universidade Estadual de Maringá, teve 38 títulos a
cargo do Departamento de História (DHI); 2 do Departamento de Teoria e
Prática da Educação (DTP); 1 do Departamento de Fundamentos da
Educação (DFE); e 1 do Departamento de Letras (DLE).
O início do ano de 2009 marcou o começo do processo de
organização, produção e publicação desta coleção, cuja conclusão está
prevista para 2012, seguindo o cronograma de recursos e os trâmites
gerais do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE). Num
primeiro momento, serão impressos 294 exemplares de cada livro para
atender à demanda de material didático dos que ingressaram no Curso de
Graduação em História a Distância, da UEM, no âmbito da UAB.
O traço teórico geral que perpassa cada um dos livros desta
coleção é o compromisso com uma reconstrução aberta,
despreconceituosa e responsável do passado. A diversidade e a riqueza
dos acontecimentos da História fazem com que essa reconstrução não
seja capaz de legar previsões e regras fixas e absolutas para o futuro. No
entanto, durante a recriação do passado, ao historiador é dado muitas

4
vezes descobrir avisos, intuições e conselhos valorosos para que não se
repitam os erros de outrora.
No transcorrer da leitura desta coleção percebemos que os
livros refletem várias matrizes interpretativas da História, oportunizando ao
aluno o contato com um inestimável universo teórico, extremamente
valioso para a formação da sua identidade intelectual. A qualidade e a
seriedade da construção do universo de conhecimento desta coleção pode
ser tributada ao empenho mais direto por parte de cerca de 30
organizadores e autores, que se dedicaram em pesquisas institucionais ou
até mesmo em dissertações de mestrado ou em teses de doutorado nas
áreas específicas dos livros que se propuseram a produzir.
Esta coleção traz um conhecimento que certamente marcará
positivamente a formação de novos professores de História, historiadores e
cientistas em geral, por meio da Educação a Distância, o qual foi fruto do
empenho de pesquisadores que viveram circunstâncias, recursos,
oportunidades e concepções diferentes, temporal e espacialmente.
Como corolário disso, seria justo iniciar os agradecimentos
citando todos aqueles que não poderiam ser nominados nos limites de
uma apresentação como esta. Rogamos que se sintam agradecidos todos
aqueles que direta, indireta ou mesmo longinquamente, quiçá os mais
distantes ainda, contribuíram para a elaboração deste rico rol de livros.
Além do agradecimento, registramos também o
reconhecimento pelo papel da Reitoria da UEM e de suas Pró-Reitorias,
que têm contribuído não apenas para o êxito desta coleção mas também
para o de toda a estrutura da Educação a Distância da qual ela faz parte.
Agradecemos especialmente aos professores do
Departamento de História do Centro de Ciências Humanas da UEM pelo
zelo, pela presteza e pela atenção com que têm se dedicado, inclusive
modificando suas rotinas de trabalho para tornar possível a maioria dos
livros desta coleção.
Agradecemos à Diretoria de Educação a Distância (DED) da
Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal do Ensino Superior
(CAPES), e ao Ministério da Educação (MEC) como um todo,

5
especialmente pela gestão dos recursos e pelo empenho nas tramitações
para a realização deste trabalho.
Outrossim, agradecemos particularmente à Equipe do
NEAD-UEM: Pró-Reitoria de Ensino, Coordenação Pedagógica e equipe
técnica.
Despedimo-nos atenciosamente, desejando a todos uma
boa e prazerosa leitura.

Moacir José da Silva


Organizador da coleção

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APRESENTAÇÃO DO LIVRO

É com satisfação que entregamos nas mãos dos leitores este livro
de História Econômica Moderna e Contemporânea. Aqueles que
acompanharem pacienciosamente suas linhas, não hesitarão em admitir o
seu esforço geral para reconstruir o passado sem nele depositar ideologias
e preconceitos dos dias atuais.

O leitor de hoje pode lançar a sua atenção para cada um dos


capítulos que se seguem ciente de que neles a história econômica não foi
simplificada na forma de uma encarnação do homem econômico que age
puramente por motivos também econômicos. Antes, aqui são vistas as
instituições, as regras jurídicas, as políticas governamentais, o surgimento
de novas tecnologias, as famílias, etc. a partir de indivíduos, agrupados ou
não, agindo concretamente de acordo com seus julgamentos, sejam eles
econômicos ou não, egoístas ou altruístas. Os fatos mostram que a história
econômica não é feita no sentido estrito pelo egoísmo econômico dos
indivíduos. A obra filosófica de Adam Smith lança luz meridiana para que
se possa compreender que os interesses egoístas individuais concernem
muito mais do que à esfera das atividades puramente econômicas, ao
mundo de tradições, costumes, valores morais e instituições que formam o
ambiente com o qual o homem interage e se adapta de maneira
essencialmente dinâmica e subjetiva agrupando-se para criar e transformar
suas instituições e normas sociais.

Não se chegará ao final deste livro sem que nele se perceba o rigor
e a profundidade metodológica utilizada para não subtrair em nenhum
ínfimo a vitalidade e riqueza de acontecimentos da história econômica.
Para derrubar os muros dos velhos preconceitos, visitar o âmago profundo
de vertentes teóricas da história econômica, examinar revoluções e
pesquisar as mudanças na produtividade do trabalho, isolando as
influências das opiniões políticas ou paixões ideológicas do nosso tempo,
7
este livro recorreu-se fortemente ao refúgio seguro da história das ideias.
Entender o modo como os homens do passado julgavam a si próprios por
meio de suas próprias ideias foi, para este livro, uma verdade essencial. A
história da ideias foi aqui uma fonte de pesquisa segura para entender a
motivação da ação dos homens do ponto de vista de suas auto-
concepções. Mais do que isso, a história das ideias descontamina o
historiador dos seus engajamentos filosóficos e ideológicos; e não foi por
outra razão que ela foi essencial para que esse livro pudesse vir à baila.

Este livro só foi possível devido aos esforços do professores que


nele participaram em relação aos quais a nossa consideração extrapolam
as convenções do mundo estritamente acadêmico.

Corroborando para retirar a história econômica dos esquematismos


teóricos e das generalizações abstratas, e reconstruí-la livremente, este
livro foi divido em sete capítulos.

O primeiro capítulo retoma um debate que hoje pertence ao cenário


internacional acerca da origem de uma das escolas que mais têm
influenciado as pesquisas de história econômica, a Escola Austríaca de
História, a Economia Política Clássica da atualidade. Ele focaliza a riqueza
de detalhes e os argumentos com os quais os autores da ordem
dominicana, especialmente Juan de Mariana, escreveram a pré-história da
Escola Austríaca de Mises-Hayek.

O capítulo 2 retoma o tema do mercantilismo, não como um


fenômeno inserido no esquema filosófico da transição do feudalismo para
o capitalismo, mas como prática de um grupo de indivíduos da aristocracia
manufatureira em defesa de seus privilégios. Aqui as questões históricas
são tomadas por meio da sua expressão no debate entre Thomas Mun e
Adam Smith.

O terceiro capítulo reporta-se ao tema da revolução francesa sob a


ótica da escola fisiocrática; nele vemos que os resultados do monopólio
colbertista fez brotar em cada indivíduo em específico as paixões e ódios
que eclodiram naquela Revolução.

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O quarto capítulo é um ensaio metodológico focalizando a
contribuição de Ronald Max Hartwell concernente ao tema da Revolução
Industrial Inglesa. Ele contextualiza a originalidade daquele historiador
econômico e os argumentos com os quais ele buscou mostrar, com base
em Adam Smith, a causa essencial, a mola mestra, do surto industrial
inglês do século XVIII, especialmente em contraposição à influência do
historicismo alemão dentre historiadores e economistas.

O quinto capítulo é um aprofundamento dos fundamentos o


Nacionalismo Econômico e de suas bases teóricas de argumentação tal
como apresentadas por Georg Friedrich List e Maciel da Costa.

O sexto capítulo versa sobre o gerenciamento científico do trabalho,


por meio da contribuição de Frederic Winslow Taylor, que ajuda na
compreensão da revolução da produtividade enfatizando a questão do
trabalho na história econômica na contemporaneidade.

O sétimo capítulo é uma reflexão sobre os conceitos de


globalização dos mercados e suas consequências para o bem-estar
humano para a população dos países pobres. O olhar estatístico é utilizado
para examinar a validade dos conceitos que tem atribuído a ela uma
espécie de efeito devastador mundial.

Novamente reiteramos o agradecimento aos participantes e


desejamos a todos boa leitura!

Moacir José da Silva

Itamar Flávio da Silveira

Organizadores

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CAPÍTULO 4. ENSAIO METODOLÓGICO FOCALIZANDO A
CONTRIBUIÇÃO DE RONALD MAX HARTWELL SOBRE A
REVOLUÇÃO INDUSTRIAL INGLESA

Moacir José da Silva

Apresentação: Hartwell como Historiador Econômico

Em 14 de março de 2009 mais uma vez, o


lapso de uma vida coloria com tom gris o início da
primavera. A vida de Ronald Max Hartwell perdia,
por assim dizer, a sua forma física. Queiram visitar
seus obituários, aqui e acolá o que se encontra é
um historiador otimista com seu tempo, estimado
pelos familiares e dono de um cabedal intelectual
descomunal. Higgs (2009), seu co-autor e conviva, assinalou com traços
fortes a sua integridade pessoal e intelectual.

Não escaparia, nem mesmo a mais pequenina olhadela para a


galeria dos gigantes do pensamento universal, o fato de que muitos
daqueles bardos tiveram características pessoais marcantes. Blanc (1847)
nos conta como a ânsia pelo conhecimento fez de um mero jardineiro
analfabeto, o grande Quesnay (1986), a maior expressão da Escola
Fisiocrática, ao lado de Turgot (1986). A Oratória de Demóstenes foi
marcada profundamente pelo seu jeito veemente a apaixonado; Adam
Smith tem sido descrito como talentoso; Locke, como reflexivo, e David
Hume, sonhador. Hartwell foi arguto, controverso, otimista, dinâmico e
obstinado pelo tema da industrialização. Certamente cada ser humano
registra a sua passagem por esse mundo de uma maneira única, peculiar;
Hartwell teve, no entanto o privilégio de marcá-la pela grande influência
que exerceu na movimentação de ideias e na construção do conhecimento
histórico.
Aqueles que conheceram um pouco da vida de Hartwell, não
hesitariam em admitir que se trata de um nome que teria muitas facetas
para ser examinado; contudo, neste capítulo foi escolhido um tema
acompanhado por ele durante mais de 60 anos, a industrialização e, em
especial, a Revolução Industrial inglesa. Ele dedicou sua vida ao estudo do
fenômeno da industrialização, razão pela qual logrou ser preciso e rigoroso
o bastante para marcar profundamente a historiografia sobre o assunto.

Hartwell nasceu em Red Range, Austrália, em 1921. Já em


1948, aos 27 anos de idade, concluiu seu doutorado pela Universidade de
Oxford com pesquisa sobre a indústria britânica de tecidos1. Nos anos 60-
70 ele já havia logrado forte notoriedade intelectual especialmente com as
publicações de O Aumento do Padrão de Vida na Inglaterra, 1800-18502
(1961), As Causas da Revolução Industrial na Inglaterra (1967)3, A
Revolução Industrial na Inglaterra (1968)4 e A Revolução Industrial e o
Crescimento Econômico5. (1971)6 Dedicar-se por tanto tempo de modo
geral ao mesmo tema, tornou-o profundo e original o suficiente para que
pudesse ocupar um lugar ímpar dentre a historiografia sobre a Revolução
Industrial. Este texto se propõe a examinar as ideias de Ronald Max
Hartwell reavivando a sua originalidade no tema que foi quiçá o motivador
de sua própria vida intelectual.

Historiador e Economista por formação, Hartwell, no entanto


autodenominava-se historiador econômico. Suas pesquisas sobre a
Revolução Industrial foram marcadas, por um lado, pela busca da sua
mola mestra, da sua causa essencial e, por outro, por não aceitar
explicações esquemáticas ou filosóficas baseadas em generalizações
teóricas. Um historiador econômico em busca de uma reconstrução exata
do passado, tal foi ele. Vejamos como ele próprio se concebia; diz ele:

Eu não sou nenhum dos dois, nem um economista, nem um


filósofo, mas um historiador econômico, um historiador que
estuda as atividades econômicas e as instituições no passado,
e que, ao fazer isso, usa a economia como uma ferramenta de
análise. Meus objetivos não são teóricos, nem filosóficos; eles
consistem em entender e explicar o passado, para recriá-lo de
modo convincente e preciso, para descrever o que e por que
aconteceu. Eu não sou um teórico usando a história para fazer
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teoria, porque eu não acredito que o método histórico seja
logicamente capaz de produzir generalizações inatacáveis.
Explicando o passado, eu não faço abstrações da realidade,
excluindo o que não seja econômico. Eu não me refiro a uma
atividade em particular ou segmento de comportamento
humano, isolado artificialmente, mas a atividade econômica em
relação à atividade humana como um todo. Eu não considero
‘outras coisas constantes’, nem deixo de fora ‘forças
perturbadoras’ que conduzam a desvios das expectativas
teóricas para o curso dos eventos. (HARTWELL, 1985, p. 80-
81. Tradução nossa.).

Afeito a leitura de grandes clássicos como Hume (1986), Adam


Smith (1993) e Ricardo (1993), Hartwell procurou mostrar os limites do
historicismo de Sombart (2001) e Schmoller (1905) opondo-se às suas
influências nos historiadores e economistas. Mesmo tendo vivido no
período da Guerra Fria, onde as opiniões políticas eram bastante
acirradas, ele não cedeu à noção de estudar o passado com a finalidade
de fazer propaganda de opiniões políticas e ideológicas. Hartwell (1985)
entendeu que o objeto da história econômica não pode ser tratado como
leis inspiradas na natureza, tal como se fosse possível pesquisar os
indivíduos e suas ações reais a partir de métodos extraídos das ciências
naturais. Presente, passado e futuro não tiveram para ele uma evolução
linear de causa e efeito de modo que o estudo do tempo passado pudesse
preparar os homens para agir num futuro que não existe e que ele não
pode saber como irá pensar quando ele chegar; diz ele:

Por que estudar, sobretudo a história econômica? A primeira e


insatisfatória resposta é que a história econômica é um tema
prático, oferecendo direção para o futuro baseada no estudo
científico do passado. A História Econômica usa a experiência
acumulada do passado, cientificamente analisado, como uma
fonte de regras para melhorar o futuro. Este modo de ver a
história econômica é o ponto de vista historicista, alegando a
existência e a possibilidade de se descobrir leis da história, e a
consequente habilidade de se predizer o futuro. A objeção
contra esse ponto de vista foi proclamada há muito tempo atrás
por D. Hume, que assinalou ‘se o conhecimento humano está
se desenvolvendo, então nós não podemos antecipar hoje o
que nós devemos saber amanhã’. (HARTWELL, 1985, p. 82.
Tradução nossa.).

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Modo geral, Hartwell figurou dentre os grandes liberais clássicos do
século XX procurando interpretar a história econômica à luz da economia
política clássica e neste sentido ele ajudou a construir de alguma forma a
Escola Austríaca de História. Longe de haurir a obra de Hartwell, este texto
revisita a sua originalidade frente aos economistas neoclássicos, aos
historiadores britânicos, bem como seu esforço por retomar o pensamento
de Adam Smith. Prossigamos, pois, este intento de hoje.

A ORIGINALIDADE DE HARTWELL NA HISTORIOGRAFIA


SOBRE A REVOLUÇÃO INDUSTRIAL

Naturalmente seria um trabalho árduo delimitar a peculiaridade de


um autor como foi Hartwell; e isso não só porque se trata de um autor de
mais de uma centena de trabalhos, mas principalmente por se tratar de um
pesquisador que de fato ocupou um lugar tão proeminente quanto original
na historiografia econômica em geral e, como corolário, na da Revolução
Industrial em específico.

Hartwell e o Historicismo dos Economistas Neoclássicos

No início dos anos 70, Hartwell esteve dentre os historiadores que


passaram a rejeitar as teorias que ele reuniu sob a denominação de
“escola histórica de economia”. Para ele, o historicismo econômico valeu-
se da história econômica para defender a chamada teoria do
desenvolvimento econômico, na qual ele incluiu especialmente Marshall
(1920) dentre outros autores neoclássicos.

A influência do historicismo sobre os economistas resultara em


modelagens de fatores causais da Revolução Industrial enquanto variáveis
explicativas do crescimento econômico; assim, diz Hartwell (1985):

65
Dessa forma, por exemplo, as explicações da revolução
industrial têm consistido principalmente de sugestões de um
grande número de variáveis, algumas vezes de relações entre
variáveis, e usualmente de atribuir a descontinuidade crucial
aos efeitos agregados de variações autônomas de uma
variável importante. (HARTWELL, 1967, p. 56. Tradução
nossa.).

Para Hartwell uma tendência explicativa para a Revolução


Industrial, limitou-se a defini-la como um evento multicausal para o qual
concorreram variáveis infindáveis que constituíram o chamado crescimento
econômico. A ideia de uma modelagem de acumulação do capital
construída a partir da relação de variáveis determinantes ou determinadas,
para Hartwell trouxe sérios prejuízos para o entendimento da Revolução
Industrial. Em Hartwell, as pesquisas envolvendo um rol quase que infinito
de fatores causais segundo uma modelagem de crescimento econômico
pouco contribuíram para o entendimento da interconexão dos eventos e da
estrutura econômica que de fato deu origem e razão de ser a Revolução
Industrial; o resultado, segundo ele, foram conclusões confusas que na
maioria das vezes misturaram causas e consequências e conduziram os
pesquisadores a explicações ecléticas e esquemáticas da Revolução
Industrial desprovidas de poder explicativo sobre os traços essenciais da
estrutura de uma economia que logrou promover e sustentar mudanças tão
radicais.

HARTWELL, MANTOUX E OS HISTORIADORES BRITÂNICOS

Passando em revista a historiografia sobre a Revolução


Industrial, Hartwell reservou um lugar especial para a tríade Mantoux,
Toynbee e Ashton. Hartwell logrou êxito em compilar estes autores no
contexto da historiografia econômica da Revolução Industrial formada
predominantemente por historiadores britânicos.

Enquanto a maioria desses historiadores tem enfatizado as


mudanças tecnológicas, e quase todos têm dado importância a
acumulação de capital como fator básico, alguns têm
enfatizado o laissez-faire, e quase todos disseram algo sobre a
importância da expansão do comércio (usualmente exterior).
(HARTWELL, 1967, p. 58. Tradução nossa.).

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Hartwell mostrou-se conhecedor profundo da historiografia
econômica da Revolução Industrial, pesquisando detalhadamente os seus
argumentos. Este ramo da historiografia, segundo ele, ao atribuir o grande
peso na expansão do comércio, fugiu do “esquema” de modelagens de
variáveis explicativas tal como na teoria do desenvolvimento econômico.
De acordo com isso, essa linhagem da historiografia apresentou
aprofundamento sobre pontos importantes concernentes às origens da
Revolução Industrial. Hartwell (1961, 1967) resumiu no seguinte quadro o
rol das causas principais da Revolução Industrial segundo esta tendência
de pensamento voltada essencialmente para enumerar uma espécie de rol
das forças que impulsionaram o progresso e, com ele, a Revolução
Industrial:

Quadro 1. Forças propulsoras do progresso


1. Acumulação de capital: aumento das poupanças (oriundo do comércio e
agricultura), baixas taxas de juros, aumento dos investimentos (ex. em
transportes); grande proporção dos reinvestimentos dos lucros industriais;
aumento dos investimentos dos lucros de inflação; melhor mobilização
das poupanças em função de melhoramento de instituições financeiras;
redução de gastos (devido às invenções) por causa do melhoramento dos
transportes.
2. Inovações – Mudanças na Tecnologia e Organização da Agricultura e
Indústria: máquinas novas e melhores; novas fontes de energia;
produção maior e de grande escala (ex. cercamentos e fábricas) com
maior divisão do trabalho; existência de localidades industriais
(economias externas).
3. Abundância de fatores naturais: carvão, ferro e outros minerais
necessários para a industrialização; tamanho favorável da economia
(pequenas distâncias); localização favorável para o comércio e para a
expansão do mercado (América e Ásia); força de trabalho qualificada;
aumento dos retornos do trabalho (em função do aumento absoluto da
população, da maior força de trabalho industrial e da maior produtividade
agrícola); talento empreendedor e inventos para oferta de produtos.
4. Laissez-faire: longo período de mudanças na filosofia, religião, ciência, e
direito, culminando no século XVIII no secularismo, racionalismo e
individualismo econômico; propagandistas da livre empresa e do
respectivo estadista; Adam Smith; mobilidade social.
5. Expansão do Mercado: aumento do comércio exterior; aumento do
consumo doméstico em função de (a) aumento da população e (b)
aumento da renda real; urbanização; melhoramento dos transportes no
quais (a) reduziram os custos e preços; estimularam a demanda e (b)
unificaram e aumentaram o mercado; preços relativos mais baixos dos
produtos industriais, aumento da demanda.
6. Miscelâneas: Guerras continentais que favoreceram a Inglaterra e
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desencorajaram o desenvolvimento continental; ‘a generosidade de Deus’
(o declínio da praga e as boas colheitas nos anos de 1730-1740); o
progresso autônomo do conhecimento; ‘o gênio Inglês’.
Traduzido de HARTWELL, R. M. The causes of the Industrial Revolution in
England. Londres: Methuen, 1967. p. 58-59. Tradução nossa.

O quadro 1 naturalmente mostra fatores da Revolução Industrial


que não se encontram, reunidos tal como se apresentam, em um único
pesquisador. O fato a salientar é que Hartwell não se contentou com a
ideia de explicar a Revolução Industrial a partir de forças que concorrem
para o progresso. Para ele, um entendimento mais profundo daquele
evento requer que se leve em conta o nexo maior existente entre os
acontecimentos, a interconexão entre os acontecimentos, o fato que seja
capaz de influenciar o conjunto dos acontecimentos da indústria têxtil que
se expandiram na Inglaterra tal como nos mostram as figuras 1 e 2.

68
Figura 1 Localização das área de comércio e indústria têxtil na
Inglaterra em 1810.

Figura 2. Localização das principais concentrações da indústria têxtil


na Inglaterra em 1821.

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Hartwell pesquisou detida e minuciosamente o tema da Revolução
Industrial, aprofundou detalhadamente cada um de seus pesquisadores,
fazendo a devida distinção dentre suas ideias. O Quadro 2 ilustra de
maneira sinóptica o ponto de vista de Hartwell sobre qual a causa
essencial, naturalmente não excluindo a importância dos outros fatores,
para o entendimento acerca da origem da Revolução Industrial:

Quadro 2. Causa essencial da Revolução Industrial por autor


Toynbee (1937, 1956) Expansão do livre comércio
Cunningham (1968) Aumento da acumulação de capital e
expansão do comércio.
Ashley, (1900) Deane e Cole (1967) Aumento da produtividade na
agricultura.
Mantoux (1983) Expansão do comércio e do crédito.
Bowden (1965) e Gilboy (1932) Expansão da demanda e do consumo
Lipson (1960) e Ashton (1937,1968) Combinação múltipla de fatores com a
predominância das baixas taxas de
juros.

Hartwell expressou sua grande consideração por Mantoux, ele


enfatizou a importância dos dados por ele levantados e a riqueza de
detalhamento de sua obra, mas se opôs a sua tese de que a expansão
comercial per se seria o grande fator causador da Revolução Industrial.
Segundo Hartwell (1967), Mantoux, e grande parte dos historiadores
britânicos de então, interpretou a Revolução Industrial Inglesa à luz do
princípio de Adam Smith de que a divisão do trabalho é limitada pela
extensão do comércio. O fato é que, Hartwell não deixou de observar que
faltou, tanto para Mantoux quanto para os seus seguidores, um melhor
entendimento da obra de Smith e, com isso, do modo como o comércio
pode ampliar ou restringir a divisão do trabalho.

70
Os limites de interpretação de A Riqueza das Nações de Adam
Smith (1993), juntamente com o horizonte eclético da identificação de
fatores causais do progresso, levaram Hartwell a contrapor-se a Mantoux e
a grande parte dos historiadores britânicos; enumerar causas, para
Hartwell, não resolvia necessariamente o problema de encontrar o grande
motivador histórico da Revolução Industrial, a mola mestra de todas as
forças que moveram as atividades econômicas e institucionais do século
XVIII inglês; diz ele:

Os historiadores têm identificado uma série impressionante de


forças promovendo o progresso, mas eles têm sido inábeis
para atingir o entendimento do conjunto da importância relativa
daquelas forças, ou como elas operaram no processo de
mudanças econômicas. (HARTWELL, 1967, p. 64. Tradução
nossa.).

A POLÊMICA HARTWELL-HOBSBAWN E O MARXISMO

No início dos anos 60, Hartwell, na fase inicial de sua carreira no


Nuffield college em Orxford, escreveu um artigo intitulado de O Aumento
do Padrão de Vida na Inglaterra, 1800-18507, onde ele se opôs a
Hobsbawn (1979) e aos historiadores marxistas em geral. Hartwell gerou
grande controvérsia nos meios acadêmicos ao rebater a noção de que a
Revolução Industrial teria deteriorado as condições de vida na Inglaterra.
Em 1970, a polêmica Hartwell-Hobsbawn ocupou o centro das discussões
do Congresso promovido pela Sociedade para a História Econômica na
Universidade de Birmingham8.

Para Hartwell, não seria possível admitir que houvesse uma


queda no padrão de vida uma vez que os dados estatísticos mostravam
claramente o aumento da renda per capita média na Inglaterra e o
surgimento de novos mercados, novos produtos e melhorias de transporte.
Para ele, reafirma Nardinelli (1993), Hobsbawn (2000) fez uso inadequado
das evidências estatísticas muitas vezes generalizando acontecimentos de
mercados ou aspectos específicos da economia que foram tomados como
regra geral.

71
Hartwell não foi adepto do uso de esquemas filosóficos para
a explicação da Revolução Industrial Inglesa; desde o início de sua
formação ele não aceitou o materialismo dialético marxista que situava a
Revolução Industrial Inglesa como uma espécie de fase final da sequência
inevitável dos acontecimentos que conduziriam a transição do feudalismo
para o capitalismo. Em Hartwell, Hobsbawn e os historiadores marxistas
tiveram suas pesquisas orientadas pela ideologia política do socialismo. “A
história pode ser”, afirmava Hartwell “e é usada, para propaganda, para
confirmar doutrina e sustentar ideologia, para a educação de pessoas,
especialmente os jovens, de certo modo.” (HARTWELL, 1985, p. 83)
Imbuídos da obrigação de mostrar que o caminho da história estava rumo
ao socialismo, muitos historiadores não fizeram senão por contextualizar a
Revolução Industrial Inglesa tão somente como parte do percurso. Em
Dobb (1983), por exemplo, a Revolução Industrial é o evento que completa
finalmente a desagregação do feudalismo e simboliza a marcha inexorável
da história rumo ao socialismo.

Do exame da historiografia sobre a Revolução Industrial,


facilmente se infere que coube a Hartwell o mérito de ter fugido das
explicações ideológicas e filosóficas da Revolução Industrial; para ele o
advento da maquinaria não pode ser entendido a partir das leis da dialética
ou de qualquer pressuposto teórico que substitua a ação real dos
indivíduos por algum artifício teórico. A posição tomada por ele no debate
sobre o padrão de vida na Inglaterra de então está intimamente
relacionada com a ausência de qualquer compromisso dele com a
interpretação marxista da história. Em suma, existe uma lei da dialética
inspirada na natureza segundo a qual inevitável e inexoravelmente as
sociedades entram em decomposição gerando a sua autodestruição, o que
resulta numa nova sociedade; de acordo com isso, para completar o
esquema teórico, a Revolução Industrial necessariamente precisa de
alguma forma deteriorar as condições de vida, pois será justamente essa
deterioração, o germe do qual partirá o novo mundo, no caso, o socialismo.
Hartwell, ao contrário, procurou estudar o fenômeno da Revolução
Industrial estabelecendo interconexões entre os fatos sem contudo

72
preordená-los de acordo com conceitos filosóficos ou ideologias políticas
apriorísticas.

Na explicação da Revolução Industrial, Hartwell priorizou as


ações individuais e seus interesses que, convergindo, provocaram
mudanças econômicas e com elas o próprio surto industrial. Para ele, a
maquinaria não representa, como para os historiadores marxistas, uma
espécie de força produtiva que obriga os homens a criarem relações
sociais de produção definidas independentemente de suas vontades.

HARTWELL, ADAM SMITH E A REVOLUÇÃO INDUSTRIAL

Aqueles que examinaram a obra de Hartwell lá encontraram um


esforço intelectual para encontrar a causa principal, a mola mestra que
impulsionou a Revolução Industrial inglesa. A grande originalidade dele
parece ter sido o intento de descobrir a essência daquele grande surto
industrial sem recorrer à ideologias ou conceitos filosóficos apriorísticos
que enquadrassem a Revolução Industrial no esquema do materialismo
dialético ou de qualquer outro postulado filosófico.

Vimos até aqui que Hartwell não aceitou nem o ecletismo dos
historiadores, nem as modelagens dos economistas da teoria do
desenvolvimento econômico e nem mesmo o esquema ideológico
marxista; o que resta saber é qual seria, para Hartwell, a mola propulsora
da Revolução Industrial Inglesa? O conjunto da sua obra sugere que a
resposta dessa indagação repousa em sua interpretação sobre Adam
Smith. Senão vejamos.

Nas suas pesquisas pela causa essencial da Revolução Industrial


na Inglaterra, Hartwell admitiu a importância da acumulação de capital para
as mudanças na economia de então. “A importância da formação de
capital para o progresso”, concluía Hartwell, “tem sido amplamente aceita
por todos os economistas e historiadores desde Adam Smith.”
(HARTWELL, 1967, p. 66). Contudo, ele não aceitou que a Revolução
73
Industrial fosse definida a partir da aceleração da formação de capital.
Para ele, a relação entre acumulação de capital e progresso não foi
satisfatoriamente desenvolvida, nem pela historiografia, nem pelos
economistas. Diz ele mais adiante: “Mais do que isso, existe um ceticismo
de que a acumulação de capital por si só necessariamente produzirá
progresso...” (HARTWELL, 1967, p. 66. Tradução nossa.).

Para Hartwell o nó da questão é entender o modo como a formação


de capital logrou promover o progresso econômico da Revolução
Industrial; para ele a Revolução Industrial não se deve em sentido amplo a
aceleração da acumulação de capital. Após investigar os aspectos
financeiros da acumulação de capital na economia inglesa do século XVIII,
conclui ele que: “Assim, parece ter pouca justificativa teórica ou histórica
assumir que a revolução industrial em Inglaterra foi resultado de uma
notável aceleração na acumulação de capital”. (HARTWELL, 1967, p. 67.
Tradução nossa.).

Hartwell também se opôs à ideia de relacionar a acumulação de


capital com o progresso econômico em termos de “propensão a poupança”
ou mesmo de resultados necessários do volume de capital. Para ele os
dados da história econômica inglesa do século XVII apontam para que o
aumento das poupanças surja mais como resultado do que como causa do
crescimento econômico. Por outro lado, os historiadores, segundo
Hartwell, não lograram consenso em suas pesquisas para mostrar qual a
extensão do capital necessária para a promoção do progresso em geral e,
em específico, para o da economia inglesa do século XVIII.

Hartwell propôs o uso da Economia Política Clássica como ponto


de partida para entender as mudanças econômicas estruturais que
levaram à Revolução Industrial e, de acordo com isso, fez uma retomada
tão singular quanto profunda da grande obra de Adam Smith (1993) A
Riqueza das Nações. “Para Adam Smith”, afirmava Hartwell, o
determinante fundamental do progresso foi a taxa de formação do capital,
e esta taxa foi proporcional à taxa de investimento. (HARTWELL, 1967, p.
65). O ponto essencial para assinalar a singularidade de Hartwell no
contexto da historiografia da revolução industrial foi sem dúvida a sua

74
interpretação profunda da Economia Política Clássica. Ele esteve dentre os
poucos que penetraram no âmago da questão, qual seja, no fator que teria
significância e força para mover as mudanças econômicas como um todo:
a relação entre formação de capital e a taxa de investimentos.

Hartwell tomou como base para suas reflexões sobre a Revolução


Industrial inglesa especialmente o Livro Segundo de A Riqueza das
Nações, onde Adam Smith (1993) resume da seguinte forma a sua
concepção de crescimento e progresso da riqueza:

A produção anual da terra e do trabalho de um país só pode


aumentar de valor, com o acréscimo do contingente de mão-
de-obra produtiva, ou das forças produtivas dos trabalhadores
já empregados. E evidente que o número de trabalhadores
produtivos de um país nunca pode ser muito aumentado, a não
ser em conseqüência de um aumento do capital ou dos fundos
destinados à sua manutenção. E as forças produtivas do
mesmo número de trabalhadores só podem ser aumentadas
em decorrência quer de algum acréscimo e aperfeiçoamento
das máquinas e instrumentos que facilitam e abreviam o
trabalho, quer de uma divisão e distribuição mais apropriada do
emprego. Em ambos os casos, quase sempre se requer um
capital adicional. Somente através de um capital adicional é
que o empresário de uma fábrica tem condições de prover seus
trabalhadores com máquinas melhores de operar entre eles
uma distribuição de tarefas mais adequada. Quando o serviço
a ser feito comporta operações diversificadas, manter cada
empregado constantemente ocupado em uma função exige
capital muito maior do que quando cada empregado é
sucessivamente utilizado em cada uma das operações,
conforme as necessidades. (SMITH, 1993, p. 344)

Dedicadamente, Hartwell partiu para verificar a anatomia dessa


relação, segundo ele, pouco uniforme, mecânica o cheia de contornos
difíceis de serem compreendidos, entre taxa de investimentos e formação
de capital enquanto molas propulsoras do surto econômico do século XVIII
inglês. Dessa forma, segundo ele, o reinvestimento dos lucros da própria
indústria, do comércio, dos bancos merecem atenção especial para o
entendimento dos eventos que culminaram na Revolução Industrial
inglesa. Ele pensou a taxa de investimento, não como uma variável de
uma modelagem econômica neoclássica, nem como fruto lógico da
expansão do comércio como para grande parte dos historiadores, mas
como contrapartida de condições históricas que implicaram no aumento da
produtividade do trabalho; diz ele:
75
Durante a revolução industrial, a maioria das novas
tecnologias, por exemplo, foram incorporadas em bens de
capital novos ou melhoradas; dessa forma, se não houve um
grande aumento na acumulação per capita, o aumento do
produto per capita deve ter vindo do uso mais produtivo ou
melhor administrado dos equipamentos. (HARTWELL, 1967, p.
68).

Numa palavra, Hartwell se apoiou em Adam Smith para pensar que


se houve progresso é porque houve investimentos da forma mais
vantajosa para a nação. Em sua obra, ele procurou preencher os pontos
lacunares deixados pela noção de que a acumulação de capital resultaria
necessária e mecanicamente em crescimento econômico. Para ele, a
História Econômica deve examinar com precisão e profundidade a
continuidade das instituições, do direito, das famílias e das condições
gerais da sociedade para entender o século XVIII inglês. Neste contexto,
segundo ele, é preciso verificar as flutuações dos investimentos em
relação com a utilização da gama de novos inventos que concorreram e se
complementaram no momento da formação de capital perfazendo as
nuances dos eventos que culminam na Revolução Industrial Inglesa.

76
Ronald Max Hartwell: Cronologia essencial.

Ronald Max Hartwell


(1921-2009)

• 1921. Nasceu em Red Range, Austrália.


• 1950-56. Professor de História Econômica na Universidade de
Nova Gales do Sul, Austrália.
• 1948. Obteve Doutorado na Universidade de Oxford, com trabalho
sobre a indústria britânica de tecidos.
• 1956-77. Professor de História Econômica e Social do Nuffield
college e da Universidade de Oxford.
• 1960-68. Tornou-se editor da Economic History Review.
• 1961. Escreveu The Rising Standard of Living in England, 1800-
1850.
• 1971. Escreveu o livro The Industrial Revolution and Economic
Growth.
• 1977. Professor visitante nas Universidades da Virgínia e de
Chicago, nos EUA.
• 1992-94. Presidente da The Mont Pelerin Society.
• 1995. Escreveu A History of the Mont Pelerin Society.
• 2009. Faleceu em 14 de março.

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80
Notas

1
Um aprofundamento da compreensão acerca das fases iniciais do pensamento
de Hartwell pode ser encontrado em: HARTWELL, R. M. The economic
development of Van Diemen's Land, 1820-1850. Carlton: Melbourne University
Press, 1954.
2
Título original: The Rising Standard of Living in England, 1800-1850
3
Título original: The causes of the Industrial Revolution in England.
4
Título original: The Industrial Revolution in England.
5
Título original: The Industrial Revolution and economic growth.
6
Leituras referentes à fase mais recente do pensamento de Hartwell podem ser
encontradas em: HARTWELL, R. M. A history of the Mont Pelerin society.
Indianápolis: Liberty Fund, 1995. HARTWELL, R. M. et al. Capitalism in context :
essays on economic development and cultural change in honor of R.M.
Hartwell. Chicago: University of Chicago Press, 1994. HARTWELL, R. M.; LANE,
J. Champions of enterprise : Australian entrepreneurship, 1788-1990. Double
Bay, NSW: Focus Books, 1991.
7
Título original: The Rising Standard of Living in England, 1800-1850. Texto
traduzido para o espanhol: HARTWELL, R. M. El aumento del nivel de vida en
Inglaterra. Madrid: Unión Editorial, 1997.
8
Detalhamentos sobre esse debate também podem ser obtidos em: HARTWELL,
R. M. The Long debate on poverty: eight essays on industrialisation and "the
condition of England". Londres: Institute of Economic Affairs, 1972.

81
FONTES E REFERENCIAIS PARA ESTUDOS TEMÁTICOS

Descreva os traços essenciais da originalidade historiográfica de


Hartwell:

Mostre quais os argumentos que deveriam ser buscados em Adam


Smith para, segundo Hartwell, explicar a causa essencial da revolução
Industrial.

82

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