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Pedro Calmon
1ª edição — outubro de 2023 — CEDET
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Sob responsabilidade do editor, não foi adotado o Novo Acordo Ortográfico de 1990.
Editor:
Felipe Denardi
Preparação de texto:
Ulisses Trevisan Palhavan
Capa:
José Luiz Gozzo Sobrinho
Diagramação:
Maurício Amaral
Revisão de provas:
Natalia Ruggiero
Flávia Theodoro
Juliana Coralli
Victor Figueiredo
Os direitos desta edição pertencem ao
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Conselho editorial:
Adelice Godoy
César Kyn d’Ávila
Silvio Grimaldo de Camargo
I: NOVEMBRO DE 1889
REALISMO...
... E MUDANÇA
II: A ADESÃO DAS PROVÍNCIAS
NO DIA SEGUINTE
EM SÃO PAULO
NA BAHIA
NO NORTE
NO SUL
NO RIO GRANDE
A BANDEIRA
O RECONHECIMENTO
III: A DITADURA
OS MINISTROS
PRIMEIRAS DIFICULDADES
GENERALÍSSIMO
DITADURA E DEMOCRACIA
MÃO FÉRREA
A CRISE FINANCEIRA
IV: A ORGANIZAÇÃO DO REGIME
NOVAS LEIS
ENCILHAMENTO
REESTRUTURAÇÃO
A CONSTITUINTE
A CONSTITUIÇÃO
V: O GOLPE DE ESTADO
DISSOLUÇÃO
LUCENA
DEFINIÇÕES
NOS ESTADOS
O CONFLITO DOS PODERES
O GOVERNO CONTRA O CONGRESSO
O LEVANTE INICIAL
DOIS ALMIRANTES
VI: O MARECHAL DE FERRO
FLORIANO
DERRUBADA
O PROCESSO...
DE NORTE A SUL
PARANÁ E MATO GROSSO
SEBASTIANISMO
AGITAÇÕES
CONTROVÉRSIA
DITADURA
VII: O SUL EM ARMAS
FORÇAS INCONCILIÁVEIS
A LUTA
RESTAURAÇÃO?
ILUSÃO AMERICANA
ROMPIMENTO
TURBILHÃO
O ENCONTRO DECISIVO
GUMERCINDO
AVENTURA DE WANDENKOLK
VIII: REVOLUÇÃO DA MARINHA
ANTECEDENTES DA INSURREIÇÃO
CONSULTA À NAÇÃO
INTERVENÇÃO ESTRANGEIRA
O FRACASSO DA REVOLTA
CHOQUE DE IDÉIAS
CONQUISTA DO DESTERRO
DO RIO NEGRO A BAGÉ
AÇÃO DE CUSTÓDIO
IX: A JORNADA REVOLUCIONÁRIA
NO PLANALTO PARANAENSE
A RESISTÊNCIA DA LAPA
X: FIM DA LUTA
A REVOLUÇÃO CONDENADA
O COMBATE DE 9 DE FEVEREIRO
PLANOS E INSUCESSOS
A CAPITULAÇÃO
CONDUTA PORTUGUESA
REPRESSÃO DESATINADA
XI: O PRESIDENTE PACIFICADOR
CANDIDATO CIVIL
ENIGMA
ANTÍTESE
A ANISTIA
O FIM DE GUMERCINDO
APARÍCIO SARAIVA
COMO ACABOU SALDANHA
XII: QUATRIÊNIO TEMPESTUOSO
A PAZ INTERNA
RESPOSTA JACOBINA
MANUEL VITORINO
O FANÁTICO E O MEIO
CANUDOS
XIII: BRASIL BÁRBARO
ARTUR OSCAR
DEPOSIÇÃO DO GOVERNADOR?
A QUARTA EXPEDIÇÃO
A DURA GUERRA
ÊXITO INCOMPLETO
REFORÇOS
EPÍLOGO...
FOGO E SANGUE
A GRAVE LIÇÃO
XV: DESORDEM E AUTORIDADE
EXTREMOS CRIMINOSOS
O ATENTADO
RESPONSÁVEIS
INTOLERÂNCIA
A TRANQÜILA SUCESSÃO
XVI: O GOVERNO DE CAMPOS SALES
RIO BRANCO
LITÍGIO DAS MISSÕES
A ILHA DA TRINDADE
QUESTÃO DO AMAPÁ
XVIII: PLENITUDE DO PRESIDENCIALISMO
REGENERAÇÃO FINANCEIRA
CÓDIGO CIVIL
UNANIMIDADE
A DISSIDÊNCIA
OUTRO PAULISTA
XIX: DIPLOMACIA
A BORRACHA
A “LINHA VERDE”
PROTESTO E DEMARCAÇÃO
AVENTURA
PLÁCIDO DE CASTRO
A AÇÃO BRASILEIRA
TRATADO DE PETRÓPOLIS
XXI: O GOVERNO DE RODRIGUES ALVES
GENTE ANTIGA
VIDA NOVA
O PREFEITO PASSOS
OSWALDO CRUZ
CONTRA A VACINA
A REVOLTA DE TRAVASSOS
VENCEU O PROGRESSO
XXII: CIVILIZAÇÃO MODERNA
NOVAS CIDADES
O NOVO RIO
XXIII: ÉPOCA DE PROGRESSO
O BLOCO
SUCESSOS DE MATO GROSSO
CONVÊNIO DE TAUBATÉ
A FORTE DIPLOMACIA
QUESTÕES TERMINAIS
PAN‑AMERICANISMO
XXIV: A ADMINISTRAÇÃO DE AFONSO PENA
HISTÓRIA REPETIDA
O FULGOR DA ESPADA
NILO PEÇANHA
RUI BARBOSA
SIGNIFICADO DA LUTA
XXVI: O PERÍODO INQUIETO
RECOMEÇA A DESORDEM
AMOTINAM‑SE OS MARINHEIROS
“SALVAÇÕES”
NO ESTADO DO RIO
ALI E ACOLÁ
BOMBARDEIO...
AS CONSEQÜÊNCIAS
RIO GRANDE E SÃO PAULO
CEARÁ E O PE. CÍCERO
CONSEQÜÊNCIAS
XXVII: CAUDILHO E OLIGARQUIA
RESISTÊNCIA TRIUNFANTE
PRUDÊNCIA E FIRMEZA
O FIM DE UM CHEFE
XXVIII: O EPISÓDIO DO CONTESTADO
REALIDADE UNIVERSAL
NEUTRALIDADE E INDIGNAÇÃO
MARCHA PARA A INTERVENÇÃO
EM GUERRA
POLÍTICA PATRIÓTICA
ÚLTIMA EPIDEMIA
AS AGITAÇÕES SINDICAIS
XXX: UM PRESIDENTE DO NORTE
REAÇÃO REPUBLICANA
O FATOR MILITAR
A CAUSA REGIONAL
5 DE JULHO
O CENTENÁRIO
XXXII: INTRANSIGÊNCIA E REPRESSÃO
GOVERNO INABALÁVEL
DESMONTE
A REBELIÃO NO SUL
REVIRAVOLTA
NOVAMENTE A SEDIÇÃO
SUBLEVAÇÃO EM SÃO PAULO
XXXIII: INTRANQÜILIDADE
REVOLUÇÃO VOLANTE
COLUNA‑FANTASMA
ESTADO DE SÍTIO
REFORMA CONSTITUCIONAL
XXXIV: EPÍLOGO DA “REPÚBLICA VELHA”
WASHINGTON LUÍS
ESTRADAS E MOEDA
A VOLTA DOS PARTIDOS
ENTRE MINAS E O SUL
CANDIDATO GAÚCHO
ALIANÇA LIBERAL
CRISE GENERALIZADA
PARAÍBA EM FOGO
PARA O PRÉLIO DAS ARMAS
O TERRÍVEL IMPREVISTO
XXXV: A REVOLUÇÃO DE 1930
DE SUL A NORTE
EM MINAS GERAIS
NO NORDESTE
PROPORÇÕES DA LUTA
A QUEDA DA LEGALIDADE
XXXVI: A NOVA REPÚBLICA
DITADURA... E PROGRAMA
PLENOS PODERES
GRUPOS E CORRENTES
O CASO PAULISTA
O POVO NAS RUAS
SEPARAÇÃO DE FORÇAS
CÓDIGO ELEITORAL
XXXVII: O MOVIMENTO CONSTITUCIONALISTA
9 DE JULHO
HISTÓRIA REPETIDA
A DURA RESISTÊNCIA
CONSEQÜÊNCIAS
A VOLTA À LEI
A CONSTITUINTE DE 1933
XXXVIII: A TERCEIRA CONSTITUIÇÃO
O NOVO DIPLOMA
SOCIAL‑DEMOCRACIA
PRESIDENTE CONSTITUCIONAL
ENTRE AS EXTREMAS
1935
MAIS FORTE O GOVERNO
A ATMOSFERA INTERNACIONAL
XXXIX: O ESTADO NOVO
POSIÇÃO INTERNACIONAL
NEUTRALIDADE E ESCUSA
COMPROMISSOS CONTINENTAIS
CONDIÇÕES MILITARES
EM FAVOR DA AMÉRICA
DEPOIS DE PEARL HARBOR
A GUERRA INCLEMENTE
O ATAQUE INOPINADO
O TRAMPOLIM DE NATAL
SILENCIOU A POLÍTICA
MOBILIZAÇÃO E COMPROMISSOS
BRASILEIROS NA EUROPA
O CONTINGENTE EXPEDICIONÁRIO
A MARCHA DA F. E. B.
XLI: RECONSTITUCIONALIZAÇÃO
OUTRA ERA
OS PARTIDOS
OUTUBRO DE 1945
GOVERNO DUTRA
1950
1954
O GOVERNO DE CAFÉ FILHO
TRANSIÇÃO
O DESENVOLVIMENTO
MUDANÇA
XLII: A VIDA ECONÔMICA
CORRENTES HUMANAS
TRANSPORTES
AVIAÇÃO
PRODUÇÃO
O CAFÉ
AÇÚCAR E FUMO
ALGODÃO
BORRACHA
CACAU
CRIAÇÃO DA INDÚSTRIA
SIDERURGIA
ENERGIA E COMBUSTÍVEL
XLIII: PANORAMA DA CULTURA BRASILEIRA
O PROBLEMA INTELECTUAL
POESIA
ESCRITORES
SERTÕES
A ACADEMIA
MACHADO E SEU TEMPO
A GRANDE INSATISFAÇÃO
GERAÇÃO DE 1922
FILÓLOGOS
TEATRO
HISTÓRIA
DIREITO
MEDICINA
CIÊNCIAS NATURAIS
MARCHA DAS IDÉIAS
FARIAS BRITO
O PROBLEMA SOCIAL
PESQUISA
ENGENHEIROS
ARQUITETOS
ARTES: PINTORES
ESCULTORES
EDUCAÇÃO
CORRENTES MODERNAS
NOTA
BIBLIOGRAFIA
NOTAS DE RODAPÉ
APRESENTAÇÃO: PEDRO CALMON NÃO MERECIA,
NÃO MERECE E NÃO MERECERÁ NUNCA O DESPREZO
Toda pesquisa histórica anda sempre às voltas com a linha difusa entre
resgatar a experiência daqueles que viveram os fatos, interpelar seu sentido e
reconhecer nessa experiência seu caráter inconcluso. A historiografia examina
o ponto do contato da palavra com a realidade concreta do objeto examinado.
É um instrumento privilegiado de decifração do mundo. Encontrar o
verdadeiro sentido das palavras contidas em um texto é tarefa que se impõe a
qualquer historiador que deseja transformar em compreensão histórica o seu
estado inicial de incompreensão semântica. Historiar é uma atividade
intelectual, composta por tudo o que um historiador pode aprender: leituras e
convivências, por idas e vindas entre os documentos, alocação de seus
interesses intelectuais, um esforço de imaginação em fazer reviver o tempo
estudado. Qualquer historiador, para produzir bons significados sobre um
tempo irreversível, precisa de uma atenção constantemente voltada para os
múltiplos objetos que exprimem os vestígios esparsos do passado.
Sendo o Brasil uma realidade viva e humana, que sofre influências de toda a
sorte, não é anacrônico tentar compreendê-lo em uma perspectiva histórica
que dialogue com os dias que correm. Conhecer seus muitos eventos que
continuam presentes na agenda atual é uma forma de combinar as abordagens
cronológica e analítica. Se muitos são os eventos, contextos políticos e
culturais que assinalam esses mais de cinco séculos de existência nacional,
alguns traços insistem, teimosamente, em comparecer na agenda local. O
caminho da autoafirmação do pensamento brasileiro já está aberto, carecendo
apenas dos que continuem o trabalho dos desbravadores. É o caminho
palmilhado por Pedro Calmon, historiador de apurada pesquisa, dos maiores
e mais primorosos em língua portuguesa.
Devo a Pedro Calmon um dos estímulos mais decisivos para que a minha
formação cultural se processasse iluminada pelas luzes da história brasileira.
Pedro Calmon Moniz de Bittencourt, um típico baiano de exportação,1 não foi
somente um intelectual erudito, mas homem de ação e de muitas sugestões.
Foi Deputado Estadual e Federal, Reitor e Ministro. Como escritor, lega uma
obra notável, estruturada em três grandes áreas: literatura histórica, história e
direito.2 No primeiro grupo, incluem-se os mais divulgados dos seus livros,
por exemplo, O Rei Cavaleiro e a Vida de Castro Alves. Fazem parte da
segunda categoria os cinco volumes da História Geral do Brasil, os três da
História Social do Brasil e a sua grande obra História do Brasil. Na área do
direito, estão reunidos o Curso de Direito Constitucional e Curso de Teoria
Geral do Estado.
Thomas Giulliano16
E um dia, povoada a terra...
— Olavo Bilac, O caçador de esmeraldas
I: NOVEMBRO DE 1889
REALISMO...
... E MUDANÇA
A história dos três primeiros anos da república compreende a organização legal, a cisão,
o choque das forças, cuja aglutinação pusera abaixo o trono, e cuja separação obedecia à
ordem natural das coisas.
II: A ADESÃO DAS PROVÍNCIAS
NO DIA SEGUINTE
Depois dos atos inaugurais, qual a instituição da república federativa pelo decreto
número um, a nomeação do ministério e dos primeiros governadores (Bahia, Minas
Gerais, Rio de Janeiro), a “Proclamação do governo provisório”,24 providências que
contentassem a Marinha (indulto de desertores, abolição de castigos corporais) — era
preciso ver o que ia pelas províncias, com a passagem do poder às novas autoridades.
EM SÃO PAULO
De posse da repartição dos telégrafos, o Tenente Vinhais (que na redação de O País era o
encarregado dos telegramas) se comunicou com as províncias, a anunciar a vitória da
revolução. Esses despachos derrubaram os governos locais, como um sopro derruba
castelo de cartas. Incruentamente...
Em São Paulo foi que se soube de véspera (graças à correspondência de Glicério com
Campos Sales) do golpe que seria desfechado na manhã de 15 de novembro. Prevenido, o
clube republicano (fadado a exercer papel preponderante na política nacional durante o
decênio) tomou a dianteira aos acontecimentos. Às nove da noite de 15 começou a
encher-se de povo a Rua de São Bento. Os mais entusiastas queriam assaltar o palácio. Foi
voto vencedor o de Gabriel Piza,27 para que se esperasse o dia seguinte, quando,
suficientemente informado, o presidente, General Couto de Magalhães, o abandonaria.
Dissolveu-se a multidão, depois de um discurso de Américo de Campos (veterano das
agitações liberais de 1868). A 16, tudo transcorreu numa ordem correta: perante a câmara
municipal se empossou o triunvirato, composto de Prudente de Morais, Rangel Pestana e
Américo Brasiliense; entre alas respeitosas, Couto de Magalhães, calmo, polido, sem
gestos, deixou o palácio;28 e a população não teve mais dúvidas sobre a solidez da
república quando, no dia 18, insistindo no “fato consumado”, na impossibilidade da
“restauração”, o Conselheiro Antônio Prado a concitou a acatar o poder instituído.29
NA BAHIA
NO NORTE
NO SUL
NO RIO GRANDE
Era mais poderoso, no Rio Grande do Sul, o partido liberal, graças a Gaspar Silveira
Martins, chefe incontestável da província. Aí também o Partido Republicano tinha, com a
unidade de doutrina, a rigidez do comando: Júlio de Castilhos. Surpreendido em viagem
para a corte, Gaspar não pôde contrapor-se aos acontecimentos. A sua ausência facultou a
ação rápida dos jovens propagandistas a quem o órgão do partido, A Federação, servia de
porta-voz e centro da reunião. Foi na redação da sua gazeta que se reuniram — ainda a 15
de novembro — Castilhos, Ramiro Barcelos, o Visconde de Pelotas: e decidiram que
assumisse este o governo — pela autoridade da sua alta patente38 — ficando o primeiro
como secretário do Estado. Sem apoio político — os gasparistas atacando rudemente
Castilhos, defendido com veemência pelos republicanos —, Pelotas preferiu recusar.
Deodoro nomeou Castilhos, que declinou, indicando o General Júlio Anacleto Falcão da
Frota. A crise não parou aí. Opondo-se o governo do Estado à criação dos bancos
emissores com monopólio bancário (de que trataremos), dissentiu de Deodoro; e
demitiu-se. Em 6 de maio de 90 entrou em exercício o Vice-governador Francisco da Silva
Tavares. Com ele rompeu o republicanismo castilhista, cindindo o partido: e a dissidência
não tardou em aliar-se aos gasparistas, para enfrentar o Congresso unânime eleito pelo
governo, e a sua Constituição positivista.
No bojo desta tempestade estremeciam as forças que iam pôr à prova o regime.
Por toda parte, pois, a tropa, ou o grupo republicano, selou a surpresa dos espíritos com
a ocupação do governo, e o franqueou aos novos, aos políticos sem experiência, que se
jactavam do triunfo no meio do cataclismo, em verdade esmagados pela responsabilidade
inesperada.
O governo provisório teve o cuidado de destacar para a direção dos Estados pessoas de
sua confiança, e, consciente da sua solidez, envolveu o país na rede propícia de serenidade
e força, que foi o seu clima.39 Mas o sortilégio dos decretos acabou quando as paixões
retomaram o curso: passada a perplexidade do primeiro momento, enevoou-se o ar,
encheu-se com as sombras graves de uma borrasca inaudita.
A BANDEIRA
Iludir-se-ia quem, pelo letreiro do pavilhão, imaginasse que o positivismo dava a lei.41
O RECONHECIMENTO
Precipitou-se a Argentina — com visível sensação de alívio (pois isto abolia o “sistema”
do império, abrindo-lhe a oportunidade de novo acerto, para a fronteira disputada)42 —
logo em 3 de dezembro. Reconheceu festivamente o governo de fato. Voltou-se a Europa
para os Estados Unidos: deles dependia a atitude uniforme das potências.43 Os
democratas, no Senado, propuseram o reconhecimento, razão suficiente para se oporem
os conservadores (Shermann e Ewarts), lembrando a figura venerável do imperador
deposto e a conveniência de se aguardar a normalização do regime, pelo voto da
Assembléia Constituinte. Venceu a habilidade do nosso representante, Salvador de
Mendonça, junto da natural predileção do governo de Washington pela forma
republicana, cuja sorte tanto lhe interessaria em 1893: e a 29 de janeiro de 90 formalmente
a reconheceu. Ingleses e portugueses tinham outros escrúpulos: a ordem monárquica,
ameaçada pelo incremento da propaganda revolucionária. Que se esperasse a
Constituinte, declarou o governo de Lisboa, mais receoso dos republicanos locais do que
dos brasileiros — naquele ano da coroação do Rei Dom Carlos, a vésperas da insurreição
do Porto. Datou de 18 de setembro o reconhecimento, bem depois da França (20 de
junho) e do próprio império alemão (26 de agosto de 90).
III: A DITADURA
OS MINISTROS
A ditadura não teve a unidade de uma doutrina, mas a debilidade de uma aliança.
PRIMEIRAS DIFICULDADES
GENERALÍSSIMO
No dia 15 — explosão do nervosismo que lavrava na tropa — houve uma cena bizarra:
oficiais e populares correram ao Itamaraty e prestaram ruidosa homenagem ao fundador
da república. Um dos oradores, o major de engenheiros Serzedelo Correia, na ênfase do
discurso lhe impôs o título de “generalíssimo”.49 Ao Tenente-coronel Ministro da Guerra
outro orador pediu que se aclamasse “brigadeiro”. Terceiro porta-voz pelo mesmo modo
promoveu a vice-almirante o Ministro da Marinha. Eles agradeceram e aceitaram. As
respectivas patentes foram redigidas em seguida: e a 25 de maio o “generalíssimo”
rematou essa extravagância conferindo aos demais ministros (os mais civilistas do
mundo) as honras de “general de brigada”. O chefe de polícia, Sampaio Ferraz, benfazejo
na sua ação contra as maltas de “capoeiras” que desassossegavam a cidade, ganhou os
galões de “coronel”...50 O cesarismo hipotético que tais demasias consagravam, dando-lhe
indisfarçável amenidade, marcava entretanto o caráter marcial da revolução: e a vestia de
cores fictícias.
DITADURA E DEMOCRACIA
Para definir a divergência entre os membros do governo basta atentar nas suas tendências,
autoritárias e democráticas. Queria Rui abreviar o período experimental da ditadura,
convocando a Constituinte. Demétrio Ribeiro e seu secretário, Aníbal Falcão, defendiam a
“ditadura forte”. O Diário oficial de 14 de dezembro publicou os discursos que lhe
dirigiram alguns discípulos de Benjamin, militares de terra e mar, e a sua resposta.
Pregavam a dilatação do governo pessoal; e ele exigia ditadura, não parlamentarismo. Rui,
vigilante nos zelos liberais, era sensível às ponderações da imprensa do Rio e de São Paulo,
que reclamava a Assembléia, para legitimar o poder.52 Venceu, com o decreto de 21 de
dezembro, que a convocou.53 Neste dia a Tribuna liberal (de oposição ao regime),
registrou o acerto: “O positivismo perdeu a partida que com o republicanismo estava a
jogar dentro do gabinete”.
Afirmou Rui, quatro anos mais tarde: “A verdade é, porém, que nas reformas políticas,
as que deram à revolução o seu caráter e os seus moldes permanentes, a opinião de
Benjamin Constant nunca teve preponderância, nem iniciativa: foi apenas um elemento,
ponderoso, sim, mas coordenado, paralelo, igual entre iguais, no meio dos votos que
compunham o Conselho da Ditadura”. Aliás... “Benjamin Constant era um discípulo
refratário ao jugo de sua escola, e nem conhecia a política de Comte”.54 Esta, o Apostolado
positivista esquematizou nas “Bases de uma Constituição política ditatorial para a
República Brasileira” — em 31 de janeiro de 189055 —, que não chegaram a influenciar a
Constituinte, estampando entretanto a distância, na do Rio Grande do Sul, a imagem
diluída da doutrina.56 Ultrapassado o momento em que o positivismo poderia imprimir
nas instituições o selo sectário — com o ditador central e a sua assembléia dócil —, cuidou
o governo de adaptar-se às novas circunstâncias.
MÃO FÉRREA
A CRISE FINANCEIRA
Ressentia-se a animação dos negócios — que vinha dos últimos meses da monarquia —
de meio circulante, elasticidade da moeda, crédito fácil. E, a menos que se continuasse o
sistema do lastro-ouro, que mantinha o câmbio (em invejável paridade) mas restringia a
vida econômica, forçoso era emitir, ou deixar emitir. Que os bancos pudessem fazê-lo
sobre apólices... No “relatório” referente a esse tempestuoso ano de 1890, justificou-se
com a angústia dos banqueiros, que recorriam ao papel do Tesouro, sem poder voltar à
circulação metálica, com as novas empresas que proliferavam à sombra da especulação
entusiasta, com as próprias tendências do momento, que lhe pareceu o melhor para as
estimular, a exemplo do que sucedera nos Estados Unidos. Explicou: “No regime firmado
pelo decreto de 17 de janeiro, a apólice resgata-se a si mesma pelo seu emprego no
depósito dos bancos: e este, além do papel inerte de garantia, exerce a função dinâmica de
consumir a apólice depositada, reduzindo progressivamente a dívida nacional”.59 Os seus
companheiros de gabinete e a oposição — que crescia, alarmista — não viram com esta
simplicidade a inovação. Bradaram que se entrava pelo atalho da aventura, em que as
inflações arruinariam o erário e o trabalho. Clamaram pela destituição do ministro.
Exigiram Demétrio, Campos Sales, Aristides Lobo, Wandenkolk, que o ministério se
reunisse, para lhe tomar contas. Chegou a renunciar, em carta que Aristides entregaria a
Deodoro. Este bateu o pé, imperioso; e na sessão de 30 de janeiro, em que se julgava seria
Rui demitido, a sua obstinação triunfou; e todos concordaram em aprovar o que estava
feito.60
Voltara Quintino da sua embaixada ao Prata. Em contraste com as festas que lhe
fizeram, protestou-se azedamente: o tratado de Montevidéu (25 de janeiro de 90) não
convinha ao Brasil... A celeuma criada pela imprensa retumbou no seio do governo, que,
tendo aprovado a viagem, se via na contingência de recusar-lhe os resultados.63 A
Comissão Especial do Congresso, encarregada de examinar o acordo, opinaria por sua
rejeição e a volta ao arbitramento (parecer aprovado na sessão de 10 de agosto de 1891,
142 votos contra 5).
IV: A ORGANIZAÇÃO DO REGIME
NOVAS LEIS
ENCILHAMENTO
REESTRUTURAÇÃO
“O regime presidencial não suscitou, nunca, nenhum debate geral. Ele apareceu um dia,
em um projeto de Constituição decretado pelo governo provisório. Ninguém o discutiu.
Foi aceito, por assim dizer, em silêncio”.75
Presidente do partido liberal, chefe da ala federalista, da qual se destacara Rui para fazer
a república, podia o Conselheiro Saraiva orientar os espíritos precavidos. Tinha uma larga
experiência ao serviço do Parlamento e da administração. Veio senador pela Bahia. Foi
recebido hostilmente; não achou confortável o novo meio, estalando de intolerância;
voltou, desiludido, para o seu refúgio rural — renunciando à cadeira. Com Silva Jardim,
quem errou foi a sua própria gente. Surpreendido em 15 de novembro pelo golpe, que se
cansara de anunciar, sem que para ele o convidassem, ficou fora das posições. Não logrou
eleger-se constituinte. “A situação parece pertencer aos ex-monarquistas... Creio que sou
o último republicano”, confidenciou a um adversário.76 Bom para demolir, não o julgaram
apropriado para compartir da vitória. Pagou pelo intrépido revolucionismo da
propaganda, em que se distanciara da filosófica prudência dos mentores do partido, como
Saldanha Marinho, Quintino, Aristides Lobo... Viajou para a Europa. Atraiu-o, em
Nápoles, a majestade fumegante do Vesúvio. Galgou a montanha verde-negra; afoitou-se,
até perto da cratera; e lá desapareceu — a 1o de julho de 1891 — no seio do vulcão.77
Esse fim alegórico do mais ardente dos precursores da república serviu de comentário e
contraste à fria evolução da política brasileira.
A CONSTITUINTE
A CONSTITUIÇÃO
Para a instalação da Assembléia a 15 de novembro de 1890, “sem um grito, sem um
viva”,80 armou-se, no pátio interno do Palácio de São Cristóvão, um vasto e modesto
recinto, de madeira. Não a acusassem de dispersar-se em discussões vãs! Presidida por um
autêntico representante do republicanismo paulista, Prudente de Morais — severo e
pontual —, os seus trabalhos correram breves e tranqüilos. Antes de mais nada se conveio
em restringir-lhe a competência “ao objeto e termos de sua convocação”.81 Proibia-se-lhe
qualquer interferência no governo (razão do descrédito da primeira constituinte imperial)
e a discussão de dois pontos pacíficos: república e federação.82 Esta adesão inabalável ao
“fato consumado” varreu as possíveis resistências abrigadas na desilusão ou na reação da
“velha guarda”; e foi num ambiente de urgência e acordo que correram os debates.83 O
liberalismo oficial estampara-se no projeto. Chefiada por Castilhos, a bancada sul-rio-
grandense se destacou, tanto pela prévia divulgação do programa doutrinário (afinal, um
sistema!) como pela energia com que o apresentou. Defendia sobretudo a autonomia dos
estados e a universalidade do voto. Manteve-se o presidencialismo. Em vão pediu o
Senador Saraiva, para o moderar, que fosse de dois anos o mandato do presidente...84
Ficou sendo de quatro (não seis, como propusera a comissão). Aos ministros impedia-se
de participar da discussão legislativa; seriam o presidente e os senadores eleitos pelo povo,
não como quisera Rui, por um colégio eleitoral reduzido e pelas Assembléias estaduais;
reforçou-se a economia dos estados dando-se-lhes a propriedade de terras e minas, e
novas fontes de receita; especificaram-se os direitos individuais...85 Caíram certas
disposições extremadas, como a obrigatória precedência do casamento civil, a expulsão
dos jesuítas... Mas não havia relações com a Igreja!86 Equilibravam-se, nos “freios e
contrapesos” (como nos Estados Unidos) os poderes; e afinal a clareza, a síntese, a
limpidez verbal da Constituição — promulgada em 24 de fevereiro de 1891 — lhe
garantiam uma duração razoável. Estabilizava a autoridade, franqueara aos estados vida
própria, proclamara as liberdades democráticas. Tanto fosse cumprida!
V: O GOLPE DE ESTADO
DISSOLUÇÃO
LUCENA
Magoado com os homens que a seu lado tinham feito a revolução, atirou-se Deodoro nos
braços de um veterano do ancien régime. Incumbiu o Barão de Lucena de recompor o
gabinete.
Eram amigos desde que, presidindo o Rio Grande, e por incumbência de Cotegipe,
Lucena dele se aproximara, apreciando-lhe os brios militares e os assomos do
temperamento indomável. Desembargador, sofrera uma remoção injusta, no último
governo liberal, e a república o encontrou predisposto a aceitá-la, tanto porque abatera os
adversários, cuja causa afinal se confundira com a da Coroa, como por estar à sua frente o
velho soldado. Este o nomeou juiz da Fazenda no Rio de Janeiro e, em setembro de 1890,
governador de seu estado, Pernambuco. De regresso ao Rio, hospedou-se no Itamaraty; e
desde logo o lúcido magistrado passou a ser o seu conselheiro íntimo. Interveio
amistosamente, mas sem resultado, para evitar a demissão do ministério; e só lhe sucedeu
porque Deodoro, exausto, disse que, se recusasse, também iria embora...92 Exerceu
cumulativamente as pastas da Justiça (até 22 de maio) e das Obras Públicas (até 4 de
julho) e ficou na da Fazenda (a partir desta última data). Chamou para os outros postos
do gabinete Tristão de Alencar Araripe (Exterior e Fazenda), o jurisconsulto João
Barbalho (Interior e Instrução), e o Desembargador Antônio Luís Afonso de Carvalho
(Justiça), formando governo distante do Congresso e da influência que os estados
disputavam, estranho ao fervor republicano e sem interesse de lisonjeá-lo, mais perto
agora do império — que parecia ressurgir, com os antigos servidores — do que dos
entusiasmos jacobinos, que respondiam ao agravo com exaltado ressentimento...
DEFINIÇÕES
Nos incidentes que antecederam à votação estão delineados os sucessos que, por um
decênio, abalaram e dirigiram a nação. Prudente levantou-se, com a bancada paulista,
contra Deodoro. Constou que, se vingasse tal candidatura, o exército, indignado, fecharia
a Assembléia. A Armada — protestou o Almirante Custódio de Melo — defenderia a
representação nacional! Estudantes,93 o povo, a gente que, em 89, recebera o novo regime
ao som da Marselhesa, ficavam contra a ditadura, cercada de baionetas... Conviria a
medida de forças? Falou mais alto a ponderação dos que temiam arriscar num desafio a
sorte do seu partido, senão a firmeza das instituições. Campos Sales e Bernardino de
Campos viram claro, tanto mais que o candidato à vice-presidência seria o Marechal
Floriano Peixoto, impotente então para deter as iras de Deodoro, porém
desenganadamente seu herdeiro. Valia a pena esperar. Tentaram convencer Prudente da
necessidade de sua desistência. Foi mais forte a obstinação, algo fatalista, com que resistiu.
Diria Campos Sales, nas reminiscências, que desse “primeiro erro” decorreram os
demais, que ensangüentaram e talaram o país durante demoradas desordens:94 disse certo.
Esta intransigência acabou de afastar Deodoro da Assembléia, com a qual jamais se
conciliou; e produziu o pretexto, no fim do ano, para o golpe de Estado. Abandonaram os
paulistas a intervenção apaziguadora; e a votação correu apertada, vencendo Deodoro por
129 votos contra 97. Mas Floriano, apresentado pela oposição, derrotou Wandenkolk
(sustentado pelos deodoristas) por 153 contra 57. O irremediável da contenda declarou-se
no dia seguinte, por ocasião da solene posse de ambos. O Congresso recebeu friamente o
pai da república; e prorrompeu em aclamações ao vice-presidente, sagrado — em face do
velho camarada, numa desfeita estridente — o “homem do dia”.95
Notou o cronista:
Eu comparei tudo — e comparei ainda o presidente e o vice-presidente. Aquele proferia as palavras do compromisso
com a voz clara e vibrante, que reboou na vasta sala. Desceu depois com o mesmo aprumo, e saiu. A entrada do vice-
presidente teve igual cerimonial, diferiu logo nas palmas das tribunas, que foram cálidas e numerosas, ao contrário das
que saudaram a chegada do primeiro magistrado. O Marechal Floriano caminhou para a mesa, cabeça baixa, passo
curto e vagaroso, e quando teve de proferir as palavras do compromisso, fê-lo em voz surda e mal ouvida. Tal era o
contraste das duas naturezas.96
NOS ESTADOS
O governo, ou antes, Lucena, interveio por toda parte, naquele período de eleição de
assembléias e governadores. “Faz-se em todo o país guerra aos republicanos históricos
(escreveu, em abril, José Tomás da Porciúncula a Silva Jardim) e principalmente aos que
não votaram no Congresso no nome de Deodoro para presidente da república; essa guerra
é sistemática em São Paulo, Minas, Espírito Santo e Ceará, sobretudo”.97 Em São Paulo,
Jorge Tibiriçá (envolvido na atitude da bancada, favorável a Prudente) foi substituído, em
6 de março, por Américo Brasiliense. Prudente telegrafou-lhe, de Piracicaba: “Parabéns
pela vossa demissão. Caiu convosco o partido republicano. Acompanham-vos os aplausos
de toda a opinião desinteressada”.98 “Os republicanos ainda não governaram o país; o
governo está nas mãos dos velhos barões da monarquia, decrépitos e inúteis como ela” —
protestava, na Constituinte baiana, Cosme Moreira.99 E Xavier da Silveira: “Atropelam-se
nas regiões governamentais os ex-validos da monarquia”.100
Criticou-o alguém: “No Rio Grande do Sul souberam aproveitar a situação com
habilidade rara. Votemos desde já a Constituição sem emendas, como foi apresentada,
dizia-se; o que se votar hoje pode revogar-se amanhã; o que importa é constituir desde já
o Estado, para pô-lo a coberto da intervenção federal iminente”.102
A doutrina do governo era que o veto só podia ser apreciado na sessão legislativa seguinte.
A oposição queria recusá-lo imediatamente. Eletrizara-se a atmosfera com o dissídio; e
Prudente de Morais precipitou-lhe o desfecho. O Senado rejeitou o veto; e, sem perder
tempo, remeteu a matéria à câmara, que procederia do mesmo modo... Surpreendeu-os o
decreto de 3 de novembro — em que, invocando altas razões do bem público, Deodoro
dissolveu o Congresso, declarando que seriam em maio seguinte as eleições para a nova
legislatura.
O LEVANTE INICIAL
A dissidência (Barros Cassal, Demétrio Ribeiro, Assis Brasil), forte com os federalistas
(correligionários de Silveira Martins, suprema expressão eleitoral da província,
engrandecido com o exílio e o infortúnio) promovera o levante das guarnições de Rio
Grande e Bagé; e pela manhã de 12 de novembro, o povo na rua, exigiu em Porto Alegre a
renúncia de Castilhos. O pretexto do motim era a sua definição tardia contra o golpe de
Estado. Em verdade, destituía-o porque carecia das simpatias federais (seus amigos
contrários, no Rio, à ditadura) que o seu silêncio parecia requestar.109 Os adversários
escolheram o momento para abater o jovem chefe do mais enfibrado partido com que no
Sul contava a república: e foi singular a reação. Desdenhando uma resistência dramática,
declarou-se apeado do poder, entregando-o à anarquia...110 Aclamado o General Barreto
Leite, limitou-se a devolvê-lo a um triunvirato (General Rocha Osório, Cassal e Assis
Brasil), que não esquentou lugar. Faltava-lhe a confiança da situação que ia inaugurar-se
com Floriano: a sua sorte condicionava-se à “salvação do regime”, logicamente
identificado com a facção castilhista.
DOIS ALMIRANTES
FLORIANO
Seria excessivo pedir àquele frio soldado, que servira silenciosamente às antigas
instituições, que adotara sem ênfase o novo regime, que colaborara com o governo
provisório como Ministro da Guerra e primara pela omissão enquanto herdeiro do poder,
uma atitude de respeito passivo pela lei, que não convencia. Vira forjar-se a Constituição
ao arbítrio de opiniões individuais, no círculo fechado do governo; e assistira à sua
aprovação por uma assembléia livre de fazer o que entendesse, mas distante do povo.
Desagravara-a sem risco, beneficiário hábil de uma revolução que arquitetou na sombra,
sem lhe correr os perigos: e, pois, estava de pé essa constitucional república, abandonada
por seu fundador (gritavam os vencedores de 23 de novembro), não lhe parecia razoável
entregar o comando à desordem dos partidos ou à anarquia das ruas. Modelou-se nele o
“homem forte”. Era da raça misteriosa dos heróis de poucas palavras, de aparência
inerme, pensamento dissimulado, intrepidez calma, insondáveis energias reveladas pelo
ataque, pela provocação, pelo desafio. Se tivesse sucumbido antes dessa hora histórica, se
não tivesse sobrevivido ao primeiro governo da república, maltratado pelos monarquistas,
como perjuro, suspeitado pelos deodoristas, como insincero, o seu perfil desluzido
atravessaria a crônica política sem características originais, caudatário taciturno do
cesarismo triunfante... O poder transformou-o: assim “modesto e vulgar” como o
retrataria Quintino117 — “esquivo, indiferente, impassível”.118 Era, no rigor da expressão, o
chefe.
DERRUBADA
O PROCESSO...
Vemos o presidente da república enviar emissários para todos os estados, sob o pretexto de colher informações exatas
e imparciais dos acontecimentos que ali se desenrolam, e coincidir a deposição dos governadores com a chegada
desses emissários, alguns dos quais se têm colocado franca e ostensivamente à frente do movimento sedicioso. Vemos
na Bahia o representante do presidente da república, para desfazer suspeitas que se levantavam contra sua missão,
protestar em termos claros e peremptórios que não tem o intuito de assumir o governo do Estado e, logo em seguida,
apoderar-se deste governo, que só deixou por força do manifesto da guarnição, ante cuja atitude decidida e enérgica
teve de recuar, teve de ceder, o Marechal Floriano Peixoto.
E para a maioria: “O Marechal Deodoro deu um golpe de Estado; vós tendes dado mais
de dez; o Marechal Deodoro dissolveu o Congresso Federal, vós tendes dissolvido o
Congresso de quase todos os estados, tão indissolúveis como este”.122
DE NORTE A SUL
Meses antes o governo, José Maria de Albuquerque à frente, formara três batalhões de
polícia. Quando o Brigadeiro Ourique Jaques, representando Floriano, foi a 18 de
dezembro notificar o Barão de Contendas de que devia largar o poder, defrontou, no
Campo das Princesas, com essa força. Talvez tudo acabasse bem se um incidente não
deflagrasse a batalha. Um cavalariano, que derrubara algumas pessoas, foi abatido a tiro; e
os soldados de ambos os lados, julgando que era isso o sinal do combate, romperam o
fogo, que durou meia hora.124 Cessou com a retirada do governador, a fuga de seus
correligionários, a “legalidade” triunfante.
Governava a Bahia José Gonçalves da Silva.125 Capitaneada por César Zama, depois de
um comício a oposição o intimou a resignar. O 9º de infantaria, comandado pelo Coronel
Moreira César — guardemos o nome — foi alinhar-se em face da secretaria do Estado,
onde permanecera o governador. E o General Tude Neiva, para evitar o choque, o
convenceu a transferir as funções ao sucessor legal. Era o presidente do Senado, Luís
Viana, que recusou. Aconselhado por César Zama, o general assumiu a responsabilidade
da situação.126 Correu um mês de indefinível mal-estar, acéfalo o Estado, o comandante
militar sem autoridade para organizar o governo, os políticos, reagrupados, a reafirmarem
— com digna teimosia — que José Gonçalves continuava investido do mandato.
Transigiu-se. Convocou Viana o Senado, demitiu-se da presidência, para que fosse eleito
o almirante reformado Joaquim Leal Ferreira, e este — neutro e venerando — foi
empossado como governador interino (23 de dezembro). Preservaram-se assim os
quadros políticos — intactos com a manobra — e escapou a Bahia a um conflito
semelhante ao do Ceará e de Pernambuco.
Também em Minas, à intervenção demolidora faltou brecha por onde entrar. Cesário
Alvim infundia respeito; e como repugnasse a intromissão desabusada da União na
autonomia do Estado, o que melhor ocorreu à dissidência foi um esboço de separação,
criando, núcleo da revolta... o Estado de Minas do Sul. Transparecia o jogo federal, nesse
episódio mofino. Sentiu Alvim o dilema, entre conflagração e demissão; e passou o cargo
ao vice-presidente. Pedia-se paz. E como na Bahia, a paz se consumou com a eleição pela
Assembléia estadual de figura antiga, que aliava a probidade à prudência, o “conselheiro”
Afonso Pena.127
SEBASTIANISMO
Com o seu espírito belicoso, levantou a luva que Rui atirara aos decaídos de 15 de
novembro: em editorial, apelou para o “sebastianismo”.
AGITAÇÕES
O que ia pelos estados se refletiu no Rio de Janeiro, onde Deodoro — quisesse ou não —
era o centro da conspiração contra a “legalidade”.
Pela letra fria da magna carta, pois o presidente renunciara antes de dois anos de
exercício, cumpria-lhe ordenar as eleições, para a sucessão...
CONTROVÉRSIA
A controvérsia agitou a imprensa. Em carta a Pardal Mallet resumiu-a Rui (que defendera
a fórmula norte-americana da eleição indireta e da sucessão pelo vice-presidente,
qualquer que fosse a época em que ocorresse a vaga): far-se-ia a reforma constitucional,
esclarecendo a dúvida, ou nova eleição; absurdo seria apelar para a hermenêutica do
Congresso, como desejava o governo.134 Ponderava este que houvera equívoco de redação
no artigo 42: devia ler-se, “no caso de vaga, por qualquer causa, da presidência e vice-
presidência”, e não, “da presidência ou vice-presidência”.135 Quem arbitraria a contenda?
O Supremo Tribunal (que, intimidado, se eximiria de falar) ou o Congresso (cujo voto era
de antemão conhecido). Floriano entregou a questão ao Congresso, que, em junho,
decidiu ser legítima a continuação no cargo até o fim do quatriênio. Resolveu errado?
Sim, bradaram os deodoristas; não, gritaram os florianistas. Na realidade — embora
faccioso — interpretara a obscuridade. A comissão legislativa, que lhe dera parecer na
Constituinte, ao referir-se à necessidade de nova eleição, cuidara da ausência de
presidente e vice-presidente, quando seria inadmissível governar “durante uma longa
interinidade” alguém não eleito “na previsão de vir a ocupar tão elevado posto” — como o
vice-presidente do Senado, os presidentes da câmara e do Supremo Tribunal. Lá estava o
projeto do governo provisório, que ao vice-presidente atribuía a sucessão — pelo resto do
período. O artigo 42 poderia entender-se como obrigando a eleição se faltasse também o
vice-presidente.136 Não repugnava esta idéia à índole do regime, que outra não é a prática
vigente nos Estados Unidos: com a vantagem de evitar as perturbações incalculáveis dos
pleitos extemporâneos. Assim não julgava a reação, tão exacerbada agora, no combate ao
governo, como os outros, no ano anterior, a Lucena e Deodoro.
Clamou-se que o seu dever era restituir a soberania ao povo, para que elegesse o
presidente.
DITADURA
Estava-se em ditadura.
FORÇAS INCONCILIÁVEIS
A LUTA
RESTAURAÇÃO?
Há exagero no qualificativo.
Fundado em abril de 1891 por Rodolfo Dantas, núcleo acadêmico da reação, que durara,
nessa fase de experiência, até a queda de Deodoro, vendido nos primeiros dias da
ditadura, passou em maio de 93 à direção de Rui.152 Desejou este fazê-lo o novo Diário de
Notícias, com que arietara e derrubara o império; e a partir de maio (data de “traços de
um roteiro”) flagelou as arbitrariedades em curso. Substituía a seu modo o Congresso,
onde a maioria obediente imobilizava o inconformismo da oposição.153 Esse combate
doutrinário à violência oficial produziu, em 1893, o efeito dos ataques a Ouro Preto em
89: atiçou a rebelião, que só podia vir do mar para a terra — com o desgosto das forças
navais. Tinham abatido Deodoro, que descambara para a ditadura; deviam insurgir-se
contra Floriano, que a continuava... Há duplicidade de sentido na carta de Rui ao Jornal
do Comércio, em 6 de março: que no montante da intolerância “as baionetas podem ser
tão inúteis como contra a água do mar”.154 A Armada falaria por último!
ILUSÃO AMERICANA
ROMPIMENTO
Foi a recomendação inútil que o General João Batista Teles enviou de Bagé, a Floriano,
em 2 de novembro (de 1892).159
TURBILHÃO
Entraram Gumercindo e Vasco Martins pelo Aceguá, com 600 homens. Juntou-se-lhes,
com três mil, o velho General Joca Tavares — que assumiu o comando — para tomar,
após fraca resistência, Dom Pedrito (23 de fevereiro) e ameaçar Santana do Livramento e
Alegrete. De Bagé saiu o General João Batista em auxílio de Santana e a libertou (17 de
março). Caiu Alegrete (19 de março). A meia légua, na restinga de Jararaca, os
revolucionários destroçaram a coluna que partira de Cacequi com mil homens e
prenderam, ferido, o seu comandante, Coronel Santos Filho (27 de março).160
Licenciou-se do Senado para cingir a espada; entrou em São Borja, repelindo a força de
Dinarte Dornelles (29 de março), organizou na costa de Botuí (2 de abril) a “divisão do
Norte”, comandada pelo General Francisco Rodrigues de Lima, somando, com a coluna
de Uruguaiana, do General Hipólito Ribeiro, seis mil homens161 das três armas; e a 3 de
maio se chocou com o inimigo nas margens do arroio Inhanduí.162
O ENCONTRO DECISIVO
GUMERCINDO
Iniciara Gumercindo, com meio milhar de homens, a marcha através do Rio Grande, que
o levaria, de arremesso, pelos serros de Santa Catarina e campos do Paraná...
Aparício, este seria El General: os blancos dele fizeram, com literatura e bronze, um
herói da pátria.169
AVENTURA DE WANDENKOLK
Fora declarado “pirata” pelo governo. Mas era o presidente do Clube Naval — eleito em
acinte a Floriano, como expressão arrogante da classe; e foi ela que moralmente se sentou
a seu lado, no banco dos réus. A causa de Wandenkolk converteu-se num desaire para a
Marinha, cujo estado de espírito pressagiava a exasperação e o levante.
ANTECEDENTES DA INSURREIÇÃO
Deodoro não agüentara o repelão dos marinheiros porque a má política, com o erro da
dissolução, alienara o apoio de todos os grupos. Fundador do regime, não pudera
solidificá-lo; chefe constitucional, rompera com a lei; decepcionado, doente, confessara-se
sem fé... Floriano, não. Apoderara-se do “princípio”, criara a mística, manejara a
propaganda, cujo tema era a república em perigo, o sebastianismo à porta; servido pelos
fatos, lá estava, fleumático, inquebrantável nas reservas do heroísmo sem gestos. Tinha
por si a mocidade militar; esse fanatismo jacobino176 que se tornara a força das ruas; a
maioria do exército, convencida de que o parlamentarismo de Gaspar, no Rio Grande, a
reação, no Rio de Janeiro, a revolta da Esquadra significavam... a restauração. E
mobilizara a guarda nacional.177
CONSULTA À NAÇÃO
Opor-se-ia Rui à revocatória mediante essa “consulta”? Não; pois se fartou de dizer no
Jornal do Brasil (e repetiria nas Cartas de Inglaterra) que se contentava com o governo
representativo — transigindo portanto com a forma parlamentar, dos gasparistas — e o
“regime jurídico da liberdade”.178
O apelo à nação, que dissesse as instituições que preferia, estava, por outro lado, nas
confidências do partido monárquico, que não deixariam de orientar (e explicam) atitudes
surpreendentes, como a de Saldanha.
Jacobinos, às armas!
INTERVENÇÃO ESTRANGEIRA
É certo que tudo isso não evitaria um grave abalo se a esquadra aterrorizasse a cidade com
os grossos canhões, e lavrasse a desordem. Floriano tinha, porém, o adequado elemento
de proteção, que era a diplomacia. Dirigia-a o secretário-geral do ministério, Visconde de
Cabo Frio.181 Rebeldes, com poderosos recursos, ameaçavam a cidade aberta, onde a
autoridade, mundialmente reconhecida, se identificava com o patrimônio e a vida dos
cidadãos... Carlos de Carvalho (e o marechal chamou-o por isto para Ministro das
Relações Exteriores, cargo que exerceu por 17 dias), publicou no Jornal do Comércio, de
11 de setembro, um artigo severo: “Defesa da cidade pelo direito internacional”. O
governo, prendendo-se à argumentação, insinuou às forças navais estrangeiras presentes
no Rio (ingleses, italianos, portugueses, alemães, franceses) que se opusessem às
operações contra a capital, pelos prejuízos que causariam a seus nacionais. A 16 de
setembro começou a “intervenção” (como diz Nabuco) com o apelo daqueles
comandantes para que Custódio se “abstivesse” “de toda operação” cujo alvo fosse o Rio
de Janeiro.182 De início, pois, ficava com o objetivo frustrado. Podia bloquear, mas não
canhonear a cidade ou investi-la, num ataque pesado... Interpunha-se a frota
internacional! Era apelo. Tornou-se ultimatum (30 de setembro) — quando o governo
inglês ordenou a seus representantes em Lisboa, Paris, Roma, Berlim, Haia e Washington,
pedissem instruções para os navios surtos no Rio de Janeiro, a fim de “se oporem por
todos os meios, de mútuo acordo e chegando mesmo ao emprego da força, ao
bombardeamento da cidade”.183 O Foreign Office antecipou-se à atitude que assumiram
os Estados Unidos.
Vale dizer que, para impedir a intromissão européia, e reforçar a sua posição no
continente, o State Department passou de espectador a aliado. Ordenou as três
providências que mais interessavam ao marechal: permissão para a venda de navios ao
governo, aumento da sua flotilha no Rio e ordens ao novo comandante (destituído o
primeiro, por ter trocado cumprimentos com Custódio) para garantir o desembarque de
mercadorias transportadas em barcos norte-americanos, o que importava a suspensão do
bloqueio — nem que fosse preciso empregar a força. Os Estados Unidos intervinham...
Realmente, às três belonaves que em dezembro ali estavam, se juntaram em janeiro, sob o
comando do Almirante Benham, dois cruzadores pesados.
Entre a Marinha insurreta e a capital interpôs-se essa muralha de aço; porque a agressão
para os lados de terra quebraria o compromisso de não a hostilizar!187
O FRACASSO DA REVOLTA
Depois do ultimatum a cena ficou mais longe; a cidade respirou; e Floriano tratou de
retirar aos insurretos os meios de manutenção.
CHOQUE DE IDÉIAS
CONQUISTA DO DESTERRO
O projeto das novas operações envolvia, com junção de forças, o socorro federalista.
Não havia em terra elementos sérios de resistência. Canhões que das velhas fortalezas
responderam à artilharia moderna da esquadra, contavam-se três: o resto era de alma lisa,
dos tempos coloniais, peças inservíveis adormecidas nos parapeitos da época de Dom João
194
V... Serra Martins, comandante do distrito, na suposição de que o República não
pudesse aportar no Desterro devido ao seu calado, saiu com uma pequena força a tiroteá-
lo na enseada de Canasvieiras. Mas o navio, deixando esse fundeadouro, varou a barra e se
apresentou, imune, em frente à cidade. Reuniu-se o Conselho de Guerra, dominado pela
figura veneranda do Marechal Barão de Batovi, que se declarou adversário de Floriano, e
recomendou a rendição. Serra Martins em vão se opôs; e acabou consentindo em mandar
a bordo uma comissão, que registou, em ata, a entrega da praça (30 de setembro). O que
se seguiu foi um movimento geral de adesão a Lorena, que a 14 de outubro se investiu
na... presidência provisória da república. Nomeou Ministro da Guerra o Dr. Aníbal Elói
Cardoso. Desterro passava a ser a capital interina do país! A revolução tinha enfim o seu
núcleo administrativo, um porto e uma direção! De pouco serviu; ou antes, foi pior.
A segunda invasão federalista de Joca Tavares foi precipitada em agosto pela intimação
das autoridades uruguaias (sob pressão diplomática do Brasil) para que o general exilado
deixasse a região fronteiriça. Com as poderosas forças que de novo reuniu (Coronéis Joca
Tavares, Cabeda, Pina, Estácio Azambuja), procurou localizar as que o Marechal Isidoro
Fernandes de Oliveira — comandante do exército estacionado em Bagé — expedira para o
Rio Negro, em cobertura da fronteira (e das comunicações desta com Pelotas e o Rio
Grande). Numa hábil convergência de destacamentos entusiastas conseguiu cercá-las nos
acampamentos de Santa Rosa perto daquele rio, onde, após uma série de sangrentas
sortidas, capitulou a tropa governista, com o Marechal Isidoro e a sua oficialidade. Foi isto
a 28 de novembro (de 93). Manchou a vitória o sacrifício dos prisioneiros, terrível
carniçaria de nefastas conseqüências para a revolução.
E a Armada?
AÇÃO DE CUSTÓDIO
NO PLANALTO PARANAENSE
Para defender o Paraná, expedira Floriano o General Francisco de Paula Argolo, que,
desde o primeiro momento — em Curitiba —, percebeu a gravidade da situação. Não
havia armamento, a guarnição era reduzida, para equipar os provisórios — que o
Governador Vicente Machado fazia recrutar — só lhe mandavam velhas espingardas,
Chassepot e Minié (estas de espoleta); para os canhões faltava munição...201 Com louvável,
mas baldada atividade, tratou de organizar em Paranaguá e Antonina uma defesa
qualquer; e, com 400 homens, foi para o Rio Negro, ao encontro da vanguarda federalista.
Julgava poder atacá-la em combinação com o contingente de Artur Oscar, que devia
transpor o Pelotas, e a Divisão do Norte, de Rodrigues de Lima, ao encalço de
Gumercindo entre o Vale do Itajaí e os limites do Paraná. Operaria, outrossim, com o
apoio no destacamento concentrado em Tijucas, sob o comando do Tenente-coronel
Ismael do Lago.
Dissiparam-se-lhe as esperanças quando soube que Artur Oscar chegara com uma
semana de atraso ao litoral, por onde escapara a coluna de Salgado; que Lima e Pinheiro
tinham retrocedido de Itajaí;202 e em Tijucas a força, constringida em impiedoso cerco
(pouco mais de 600 homens) acabaria rendendo-se.203 Com medo de ser aprisionado no
Rio Negro, 400 contra 4 mil, voltou Argolo — depois de alguns tiros de artilharia — para
Curitiba.
O primeiro, tomando a direção do contingente que Argolo levara ao Rio Negro, fez
finca-pé na Lapa, donde não saiu mais: pois com a eliminação desse obstáculo os
revolucionários entrariam por São Paulo.
Daí aos lindes de São Paulo, era um pulo... Porém tinham de passar sobre aquele reduto
isolado: e, neste, a honra das armas manteve de pé a resistência inabalável.
A RESISTÊNCIA DA LAPA
Extinguiu-se com ele a flama que animava a luta.207 Esmagada nas tenazes do cerco,
cortadas as comunicações com o exterior, sem alimentos nem munições para a
prolongação indefinida daquele espetáculo de heróica teimosia, a praça rendeu-se no dia
11, com a promessa de respeitarem os vencedores vidas e bens dos vencidos. Em verdade,
sacrificara a revolução as suas possibilidades nessa demora fatigante, presa às dobras desse
terreno ensangüentado por um episódio solitário de honra militar, enquanto tudo a
solicitava para os caminhos do Norte; e quando dali se despegou, mal consolada com os
troféus do êxito caro, era tarde. As suas vanguardas alcançaram Castro e Jaguariaíva.
Surpreendeu-as a notícia de que 5.800 homens estavam a desembocar na passagem de
Itararé: e de medo a chocar-se com eles, retrocederam — não mais para os ondulados
campos de Curitiba, porém, em retirada franca, para a serra catarinense, e o Rio Grande.
X: FIM DA LUTA
A REVOLUÇÃO CONDENADA
E Saldanha?
O COMBATE DE 9 DE FEVEREIRO
PLANOS E INSUCESSOS
O combate, e esta confissão, explicam o seu plano, que era ocupar uma base de
reabastecimento, criar aí a convergência de recursos, e, com os que lhe fossem do Sul,
irromper pela capital federal. Apoderar-se-ia de Niterói com 400 marinheiros? O fracasso
seria inevitável; nem lhe chegaram os sonhados contingentes do Sul. Na realidade o
desembarque de 9 de fevereiro lhe extinguiu as ilusões de uma vantagem qualquer sobre
os florianistas. Provou-lhes o poderio bélico, a superioridade numérica, a firmeza. E já se
anunciava a chegada da esquadra governamental, sob o respeitável comando do
Almirante Jerônimo Gonçalves,213 com armamento suficiente para engarrafar os navios
que se deixassem ficar à espera...
A CAPITULAÇÃO
E pedia-lhe asilo a bordo das corvetas, para umas setenta pessoas. Castilho acedeu a este
pedido. A proposta de rendição tinha por cláusula principal a retirada da oficialidade para
o estrangeiro, com garantia de vida a inferiores e praças.
Na manhã seguinte, ainda calado o governo sobre as suas condições, ordenou Saldanha
que fossem inutilizados os armamentos de bordo e de terra, e, com surpresa de Castilho e
da marinhagem portuguesa,220 recolheu, com quantos o desejaram, à Mindelo e à Afonso
de Albuquerque — para cima de quinhentas pessoas apinhadas num espaço que mal
chegava para a tripulação... À hora dada — três da tarde —, as fortalezas desmascararam
as baterias num canhoneio simultâneo, a que não contestaram os navios, desertos, e as
duas ilhas, despovoadas. O silêncio confirmava o fim do episódio — que assim, através de
humanitário asilo, antes que houvesse um grande desfecho, terminou atropeladamente, a
evasão misturada ao mais curioso problema diplomático.
CONDUTA PORTUGUESA
Realmente, não assentira o marechal nos termos da capitulação e exigia a entrega dos
refugiados. Para isto dispunha da autoridade da vitória, do domínio do porto, da força de
terra e mar. O próprio presidente do Conselho de Portugal, Hintze Ribeiro, conveio na
entrega. Castilho, firmado nos princípios da honra, negou: o seu dever era levar a
salvamento os que se tinham abrigado sob a proteção da sua bandeira. Com exímia
dignidade — e desconforto — apesar da intimação, para que aguardasse a solução do
litígio, navegou com eles barra afora, em direção do Prata. Afrontou um instante o perigo
de uma catástrofe: se se pusessem a canhonear os seus pequenos navios de madeira. E
arrostou duas ordens de protestos: dos asilados, que lhe não perdoaram a decisão do seu
governo, de — para atender ao do Brasil — proibir o desembarque em Montevidéu ou
Buenos Aires, a fim de serem conduzidos a Lisboa; e de Floriano, que, indignado, rompeu
relações diplomáticas com Portugal. É que, dizia el-Rei Dom Carlos, com dois países
jamais poderia estar mal, a Inglaterra e o Brasil...221 Mas eram tão precárias as
acomodações de bordo que o desespero dos oficiais de Saldanha foi mais forte do que a
palavra: a maioria escapou, em lanchas ou a nado, para retomar a liberdade nas praias
uruguaias e argentinas.
REPRESSÃO DESATINADA
Eliminada nas águas do Rio de Janeiro a revolta, reconquistados pela legalidade o Paraná
e Santa Catarina, o capítulo final da guerra civil foi maculado por uma série de torpes
excessos, em que sobrelevou a ferocidade de alguns militares ébrios de intolerância e
paixão.
Não os justificou a reciprocidade das violências, porque a luta cessara no mar; e os seus
ecos em terra esmoreciam na distância.
No Paraná a repressão, sem atingir aquelas proporções, foi também cruel. Fez o
arrolamento dos suspeitos o secretário do General Everton Quadros, Alferes
Comissionado Joaquim Freire. Atribui-se-lhe a ordem infame para que o Barão do Serro
Azul, um irmão, quatro amigos — pertencentes ao comércio de Curitiba — fossem
passados pelas armas, de surpresa, na Serra de Paranaguá. O barão não fora
revolucionário: limitara-se a intervir em favor da praça, para a resguardar da pilhagem, e
ficara em casa, sem nada temer, quando reentraram as forças governistas. Acreditava que
o não incomodassem; e propalava a sua inocência. Foi porém recolhido preso; disseram-
lhe que iria defender-se no Rio de Janeiro; e o embarcaram no comboio, noite alta. A
viagem disfarçou a armadilha: pois no quilômetro 65 parou o trem, os soldados fizeram
que descesse, e, na beira do abismo, o abateram, a tiro e coices de fuzil, lançando o corpo
encosta abaixo daquele paredão de montanha... Na cidade alguns, como Francisco Braga,
foram fuzilados no cemitério, ao pé da cova aberta... Em Paranaguá tiveram a mesma
sorte o Major Colônia, o Tenente Pedro Nolasco.227 Os principais federalistas salvaram-se,
emigrando para Buenos Aires.
XI: O PRESIDENTE PACIFICADOR
CANDIDATO CIVIL
ENIGMA
Não deu um passo para “turbar” ou perturbar a legalidade, que salvara a seu modo; nem
para a proteger — em 15 de novembro de 1894.234 Omitiu-se, numa atitude perigosa, cujas
reservas não confiou a ninguém. Cessado o seu período, ausentou-se. E nada aconteceu...
O certo é que, resistindo à tentação de proclamar-se ditador, sul-americanamente, ao som
das fanfarras, preferiu recolher-se, sem frases, à humildade de sua casa; e quando se
julgava que ia surgir, com o uniforme de gala, numa apoteose de armas e flores, levado
pela multidão, à porta do Congresso, fechada para o civil casmurro — desapareceu.
Os médicos (cuja opinião a política não ouvira) poderiam esclarecer: sofria. Não tinha
saúde para continuar. Esgotara nos dias nervosos e nas noites insones da guerra civil as
energias indomáveis; e retirou-se para os ares silvestres — na estação da Divisa, a tentar a
cura tardia.
ANTÍTESE
O fato é que, de carro de aluguel, foi Prudente prestar o juramento ao Senado, onde
cálidos aplausos o festejaram; e chegou ao Itamaraty sem ninguém para lhe tomar à
entrada o chapéu. Aberto, abandonado, sem guarda nem funcionários, fora o palácio
invadido pelos curiosos.235 Já ali estava, com os novos ministros, perplexo, quando se
apresentou Cassiano do Nascimento, Ministro da Justiça de Floriano. Com um rápido
discurso disse que o marechal lhe transmitia o poder.
A ANISTIA
O FIM DE GUMERCINDO
Em três colunas repassaram os federalistas a fronteira do Paraná com Santa Catarina: por
Porto União (Gumercindo), Palmas (Juca Tigre) e caminho de Curitibanos (Aparício).
Mas a Divisão do Norte, que retirara do Vale de Itajaí para a Vacaria, depois de bater na
Serra de Tijucas um contingente do Coronel Salgado, apressadamente se deslocara para
Oeste, juntara-se, na colônia militar de Chapecó, ao destacamento do Coronel José
Bernardino Bormann,242 fizera retroceder no Chopim a vanguarda de Tigre (José Serafim
de Castilho), que se perdeu na floresta do Iguaçu, e forçou Gumercindo e Aparício
(reunidos em Campos Novos) a transpor a nado o Pelotas.243 No Jacuí — em Passo Fundo
— a cavalaria rebelde derrotou ainda uma coluna legalista; e se lançou à Divisão em 27 de
junho, entre Umbu e Melo. Foi a batalha do Pulador, a maior deste período. Depois de
seis horas de fogo, feridos o General Lima — comandante da Divisão do Norte — e
Aparício Saraiva, reencetaram os rebeldes desenganadamente a retirada. Acelerou-a a
convicção de que, perdida a guerra, só no estrangeiro achariam asilo. Desceu Gumercindo
— reforçado pela coluna missioneira de Dinarte Dorneles — pela estrada de Ijuí a São
Borja (paralelamente ao Uruguai); e no planalto de Carovi, em 10 de agosto de 94 —
quando se adiantou, só, para observar os movimentos do adversário, foi reconhecido por
um soldado que estivera na Lapa, prisioneiro.244 Este levou a arma à cara, e derrubou-o
com certeiro tiro.245 Morreu na carreta onde o recolheram; foi respeitosamente sepultado
pelos companheiros, num pequeno cemitério à beira do caminho.
APARÍCIO SARAIVA
Desapareceu o caudilho quando refluía para a fronteira, que lhe fora a origem e o abrigo, a
revolução federalista.
O sacrifício do almirante foi a liquidação oportuna de uma luta já absurda; apenas, para
ele, o seu fim lógico. “As folhas de todos os matizes deram-lhe o apelido de Coriolano”.251
Finou-se Floriano no seu retiro da Estação da Divisa, até onde o entusiasmo dos
correligionários fora levar-lhe, a vésperas de morrer, uma espada de ouro. Proferiu
palavras de presságio, que correspondiam à inquietação dos manifestantes. Cético,
registou Capistrano de Abreu: “Ainda depois de morto publicaram um discurso,
autêntico ou não, grito de alarma contra o primeiro presidente eleito pelo povo”.252
A PAZ INTERNA
As suas intenções eram claras: mandara substituir nos postos da fronteira os irregulares
pela tropa de linha; ordenara a transferência do quartel-general de Porto Alegre para
Pelotas, separando-o do centro político, em que predominava Castilhos, destituíra os
ministros no Uruguai e na Argentina, Vitorino Monteiro e Fernando Abbot; prometia
ampla segurança aos que, desarmadamente, voltassem aos lares. Galvão entendeu-se
confidencialmente, ainda no Rio, com o Dr. Francisco Tavares, que escreveu ao irmão,
Joca Tavares: o essencial seria esclarecer que os federalistas continuavam lutando, não
contra o governo federal, porém contra o castilhismo. Na hipótese de uma resposta
satisfatória, encontrar-se-iam, para um acordo... O velho caudilho afirmou que combatia
a situação estadual, não a república, até porque a discórdia girava em torno da
“inconstitucionalidade” do regime rio-grandense. E assim prevenido das facilidades que
encontraria, o general recebeu em Pelotas o chefe revolucionário e desta conferência
resultou — em 10 de julho de 95 — o convênio da paz. Tavares e o próprio Galvão
sustentaram que deveria modificar-se a Constituição do Rio Grande... “indubitavelmente
contrária à lei federal”.255
Não podia restituir-lhe a ordem com os obstáculos que a maioria lhe apresentava.
Travou-se no Congresso, surda, complicada, rancorosa, a luta contra a anistia, em que se
uniam — opostos ao presidente — os castilhistas, justamente indignados com a referência
feita no acordo à sua Constituição, Glicério, que achava isto atentatório à autonomia dos
estados, o “jacobinismo” das ruas. Em 19 de setembro, fatigado, Prudente positivou que
confirmaria a anistia, ou resignaria. O projeto do Senado, que a concedia amplamente,
caiu na câmara (relator, Medeiros e Albuquerque). Dez minutos depois Glicério
apresentava outro, com restrições.257 Prevaleceu. Em 21 de outubro foi afinal decretada,
excetuados do benefício os militares, que só voltariam ao serviço ativo depois de dois
anos.
RESPOSTA JACOBINA
MANUEL VITORINO
A precária saúde do presidente obrigou-o, porém, a afastar-se das funções. E a licença, por
prazo imprevisível,260 alterou subitamente a fisionomia do governo. Assumiu-o (a 11 de
novembro de 96) o Vice-presidente Manuel Vitorino Pereira, parlamentar de outra
formação, que, não pertencendo às mesmas origens republicanas, era, com os seus dotes
cintilantes de orador e jornalista, um autêntico condutor de massas. A antítese de
Deodoro e Floriano repetia-se neste caso. Frio e calado, Prudente, o Biriba, como o
alcunhavam,261 perdia em expansões o que ganhava em austeridade, no exagero de seus
silêncios. Sem compromissos com o passado, culto e imaginoso, tinha Vitorino a intuição
do momento, a sensibilidade do tribuno que afina com a exaltação dos auditórios, a
simpatia dos jacobinos, incompatíveis com a nova situação. Tornou-se o salvador, o
homem que reergueria a república, tão enferma quanto o seu presidente... “Escancarou
todas as janelas do novo palácio ao ruído exterior”.262
Vitorino, certo, como toda gente, de que exerceria o poder até o fim do quatriênio — tão
pessimistas eram as notícias do presidente —, quis inicialmente consolidar a autoridade.
O melhor teria sido a renúncia de Prudente: dar-lhe-ia a segurança de agir, imprimindo
ao governo orientação própria. Bernardino de Campos (intérprete da política paulista)
não deixou que se encaminhasse tal apelo. Levar-lhe-ia, sim, os nomes que desejasse, para
recompor o ministério. Gravemente doente, irritadiço e contrariado, Prudente começou
recusando; e só conveio na aprovação de novos ministros quando Bernardino, seu amigo,
assentiu em ocupar a pasta da Fazenda: neste, ele confiava!263 Vitorino nomeou em 20 de
novembro os ministros da Fazenda (Bernardino), da Viação (Joaquim Murtinho), da
Marinha (Almirante José Alves Barbosa); e em janeiro os da Justiça (Amaro Cavalcanti) e
da Guerra (General Argolo). Organizou assim o seu governo.
O FANÁTICO E O MEIO
Tanto dele se falou, desde 1891, que ninguém estranhou o novo alarde sebastianista:264
com a circunstância, agora verídica, de acreditar na volta del-rei o “monge” que
pastoreava, pelos caminhos remotos de Itapicuru, Chorrochó, Cumbe, Monte Santo,
legiões de peregrinos. A propaganda florianista colara à insurreição da esquadra o rótulo
satírico, que cabia — isto sim — à dos “jagunços”. Extraordinária coincidência de reações
irresponsáveis, em psicologias primárias contaminadas de crenças apocalípticas, o
autêntico sebastianismo, jacente nas adormecidas recordações populares — herança tri-
secular cultivada nas lendas e tristezas da raça —, despertou afinal, onde sempre existira.
Não era nas ruas da capital, entre conspiradores retóricos, muito menos nos
acampamentos da guerra civil: mas nos estirões desertos do interior, lá, onde a ignorância
rústica misturava religião e fábula, nas nevroses místicas, e à falta do missionário, o beato
podia ser o chefe.
No dia em que para essas maltas de vaqueiros crédulos surgisse um “santo”, vestido de
santidade, com as santas insígnias da romaria, encamisolado num burel, rosário ao cinto,
barba nazarena, a falar do fim do mundo e dos exércitos invisíveis de Dom Sebastião,
nesse dia de encontro dos simples com o “monge” aconteceria o inevitável. Milhares de
fanáticos atrás do “apóstolo”, que arvorava uma cruz, reunindo em círculo o povo. Esses
romeiros a pervagarem por descampados e feiras, assustando o comércio, indignando os
padres, que não podiam detê-los. A palavra do “conselheiro”, imperiosa, consoladora,
absoluta. E a ação repressiva, sacrificada pela imprudência, a brutalidade, aliada à
estupidez... Inutilmente! O sujeito que sublevou os “sertões” era um maníaco inofensivo
que, cabelos caídos sobre os ombros, barba longa, vestido de um camisolão azul, munido
de dois breviários, falando em indicar às almas a salvação urgente, viera do Ceará,
perambulara por várias regiões da Bahia e se estabelecera à beira do Vaza-Barris, com
uma multidão de fiéis, a levantar, no meio de um vilarejo de palhoças, a sua igreja do Bom
Jesus.
CANUDOS
Entre os papéis que lhe acharam, havia uma profecia, aliás corrente na imprensa, pois
visionários europeus a anunciavam — de que o mundo acabaria em 1900; e estas
significativas palavras: “Em verdade vos digo, quando as nações brigam com as nações, o
Brasil com o Brasil, a Inglaterra com a Inglaterra, a Prússia com a Prússia, das ondas do
mar Dom Sebastião sairá com todo o seu exército”.267
O fato é que as desordens nacionais tinham naquele cérebro enfermo batido a chispa do
messianismo:268 e, vexado pela autoridade, para ele, a República, odiou — como se odeia
um símbolo de maldade — tudo o que à República se referia. Atribuiu às mudanças
políticas os pecados, a Igreja separada do Estado, o casamento civil, a substituição do
signo monárquico,269 que tinha cruz, pelo novo sem ela... Por último, a revolução, cujos
ecos chegaram ao seu deserto, parecia confirmar o vaticínio. “O Brasil contra o Brasil”.
Por esse tempo — ainda em 93 —, porque a sua gente queimara certos editais da câmara
que anunciavam as taxas recentemente lançadas, lhe foi ao encalço uma expedição
policial. Encontraram-se, no lugar chamado Masseté, destacamento e romeiros. Estes
enfrentaram os soldados, que, aturdidos, retiraram, deixando alguns mortos. O governo
cometera o erro inicial. Tratara o ajuntamento dos fanáticos como uma reunião de
celerados: e atirara-lhe em cima a força. E era (ia resmungar aquela multidão de fanáticos)
a fraqueza... Oitenta homens enviados para dispersar a beataria de Canudos não passaram
da estação de Serrinha. Seria temeridade atacá-los com pouca tropa.270 Os capuchinhos,
Frei João Evangelista de Monte Marciano e Frei Caetano de São Léo, de ordem do
arcebispo-primaz, tentaram melhor combate: a santa missão. Foi em vão que disseram
palavras amenas ao Conselheiro, rodeado de clavinoteiros rancorosos, e já com uma idéia
heróica na sua ingênua rebeldia: “No tempo da monarquia (explicou aos frades) deixei-
me prender, porque reconhecia o governo; hoje não, porque não reconheço a
República”.271
Fracassou a persuasão aflita dos missionários: Canudos era uma praça de guerra!
EXPEDIÇÕES DESTROÇADAS
Receoso de que fossem até lá, o juiz de direito de Juazeiro, Arlindo Leoni, pediu ao
governador do Estado as providências necessárias. Sem recursos adequados, requisitou o
governador auxílio federal: cem homens às ordens do Tenente Manuel da Silva Pires
Ferreira. Afinal, seguiria contra aquela “nossa Vendéia” (pois a idéia de revolta se ligava
naturalmente ao “símile” romântico, cheirava à restauração...)272 a tropa de linha. “É
muita coisa para tal homem”, sorriu Machado de Assis.273 Partindo de Juazeiro a 7 de
novembro de 96, a coluna chegou a Uauá, exausta, no dia 20. Aprestava-se para, na
manhã imediata, rumar para Canudos, quando foi surpreendida pelo mais imprevisto dos
acontecimentos. Em romaria, de cruzes arvoradas, como se peregrinasse, penitentemente,
pelos campos, uma multidão de fanáticos se aproximara, cantando rezas; e de súbito, com
uma cólera terrível, de facão e bacamarte, arrasadoramente, assaltou o povoado
adormecido. Despertados pelo estrondo do ataque, os soldados entreabriram as janelas, e,
a coberto do fogo, descarregaram as Mannlichers. Rolou por quatro horas a espingardaria:
e por fim, quando, dizimados, retiraram os assaltantes,274 verificou o Tenente Pires
Ferreira que seria absurdo prosseguir. Seria lançar-se à morte certa. Voltou a tropa em
desalinho, mal refeita do assombro, apavorada... Já não se podia contemporizar com o
Conselheiro. O Major Febrônio de Brito foi incumbido de dar cabo dele com 600 homens
(metade exército, metade polícia) — que atacariam de enfiada, costeando a Serra do
Cambaio.
OS MELINDRES DA AUTONOMIA
Luís Viana representa nesta fase da história republicana o princípio (a que Castilhos, no
Rio Grande, dera a rigidez de um dogma) do direito que tinham os estados de se
governarem por suas próprias autoridades. A “política dos governadores”, definida no fim
do período de Prudente de Morais e consolidada, ou antes, fixada em sistema no de
Campos Sales, inaugurou-se como fórmula conciliatória dos melindres da autonomia
com o intervencionismo da União, sob as inspirações, e segundo as necessidades dessa
resistência. Teve, em 1896, o sentido de imposição, da periferia ao centro, de vez que o
Rio Grande e a Bahia não se submetiam à vontade presidencial. Acabaram torcendo-a.
Compreende-se que assim fosse. No caso gaúcho, os embaraços criados ao apaziguamento
(apetecido pela oposição vencida e castigada) levara o nome de fidelidade à república.
Somara-se ao florianismo impenitente, enrolando-se na sua bandeira; enquanto vivessem
os heróis das últimas batalhas (e os seus mentores civis), ninguém abalaria o poderio
castilhista. Na Bahia, onde carecera o regime de entusiasmos propiciatórios, pois se fizera
à sua revelia, a reação tomou outra forma. A da autonomia vibrante e severa.
Com a cisão do grupo que, desde 1891, dirigia o estado, organizara-se em 1895, com
José Gonçalves, o Barão de Geremoabo,275 Manuel Vitorino, poderosa oposição, que se
apoiou à fração do Partido Republicano Federal, presidido por Glicério, contra Prudente
de Morais. O governador ficou com o presidente da república.
No seu diário, indicou Inocêncio Munhoz de Araújo Góis, que conhecia os segredos do
governo do estado: “A soldadesca diz que vai impor ao M. César276 a deposição do Viana
[...]. Parece que tudo é movido pelo Glicério descontente pela entrada na chapa federal do
Dr. Seabra e Castro Rebelo”.277 Podia ter ajuntado: e a reeleição de Rui Barbosa para o
Senado. Escrevera bravamente a Severino Vieira (12 de outubro de 1896), que o advertira
dos desejos do “partido”: “Eu não me sentiria bem no governo da Bahia se
concorrêssemos para a exclusão do Rui, porque se me afiguraria nosso estado humilhado
sob a pressão de uma política de ódios estranha a ela”.278
MAJOR FEBRÔNIO
Se tivesse mais cem homens, teria varrido os fanáticos de Uauá, dissera o Tenente Pires
Ferreira (e repete Viana na mensagem ao presidente da república). O General Sólon
Ribeiro, comandante do distrito, achou entretanto que o Major Febrônio não levava tropa
suficiente, e o fez voltar de Cansansão para Queimadas. Esse regresso à base, retardando
lamentavelmente a expulsão dos jagunços, encheu de indignação o governador.
Desentenderam-se, Viana e Sólon; nem podiam deixar de desentender-se o general
autoritário (impregnado da mística republicana) e o hábil político intransigente na defesa
da autonomia do estado. Telegrafou este a Manuel Vitorino (no exercício da presidência
da república): requisitara forças do exército para suprirem a momentânea deficiência da
polícia, mas... se isto importasse “fazer comandante do distrito árbitro das operações”,
poderia retirá-las!279 Sólon foi substituído no comando. O Major Febrônio —
considerando-se invencível com a sua coluna bem abastecida e forte de 600 homens —
arremeteu para o “covil dos perversos” (como, em telegrama a Viana, qualificara o Arraial
do Conselheiro). Encontrou-se porém numa das regiões de mais escabroso acesso daquele
sertão. Nem teve tempo de reconhecê-la, porque os fanáticos lhe cercaram a tropa, e quase
a exterminaram. Era a menos de légua de Canudos. Defendeu-se formando-a em
quadrado; infligiu numerosas baixas (cerca de setecentas, alegou-se, com exagero); e com
60 feridos e contusos, retirou para Monte Santo. Salvou as suas armas; e a honra militar.
Mas proclamando a superioridade numérica de um inimigo irredutível...280
MOREIRA CÉSAR
Lauro Müller tivera a idéia de chamar Moreira César, cuja presença em Santa Catarina era
intolerável para os seus amigos. Sugeriu ao Ministro da Guerra o telegrama patético em
que, apelando para o seu fervor republicano, o concitou a vir com o seu batalhão defender
o regime...281 Com a sua fina malícia libertava o Estado do incômodo “restaurador” da
república — responsável pelas execuções de Anhatomirim — e antepunha ao fanatismo
de um lado, o do outro. Defrontar-se-iam, nas “caatingas” do Nordeste, essas duas formas
de loucura — simplificadas na mesma exasperação.
Com o 7º, e 9º, que se lhe juntou, com a polícia da Bahia, alas do 33º e do 16º, um
esquadrão do 9º de cavalaria e uma bateria de artilharia ligeira,283 partiu Moreira César
com a promessa de não deixar pedra sobre pedra, na cidadela maldita. Atirou-se para o
desconhecido,284 isto é, para o desastre. Fez de Queimadas e Monte Santo base de
operações; mal deu tempo à engenharia para definir os relevos da região; traçou a rota
entre o Cumbe e a estrada velha de Massacará, para evitar as rampas do Cambaio, e
alcançou o morro da Favela,285 de onde os quatro Krupps podiam metralhar o arraial.
Iludiu-se com a fraca oposição, não percebeu a tática dos jagunços, de esperar,
emboscados nas anfratuosidades do terreno, o ataque estonteado, e julgou que os levaria
de vencida, num arremesso. No mesmo dia, ao sol da uma da tarde, depois de alguns tiros
de peça, ordenou a mais simples das formas de batalha: a descida, em linhas paralelas, de
toda a brigada, e o assalto convergente, a descoberto, frontal. Responderam à artilharia os
sinos da igreja nova. Convocavam à resistência. No ímpeto do avanço escorregou a
infantaria ladeira abaixo, transpôs o Vaza-Barris, linha de água entre o enladeirado da
Fazenda Velha nos socalcos da Favela e as trincheiras de Canudos, e, batidas de chapa pela
desordenada fuzilaria, entrou de baioneta calada pelo dédalo dos arruados, onde se diluiu
a luta em mil episódios esparsos. Das seteiras da igreja partia, mortífera, a espingardaria.
Moreira César mandou que a polícia e a cavalaria a tomassem: e esses contingentes,
dizimados, não passaram das ribanceiras do rio. Compreendeu que fracassava o ataque, e,
esporeando o cavalo, disse que ia dar brio àquela gente. Lançou-se às balas. Uma varou-
lhe o ventre. Ampararam-no, para não desmontar. Recomendou que chamassem o
Coronel Tamarindo, para assumir o comando. “Canudos está vencido...” — murmurou. E
levado para o alto, numa padiola, assistiu, indignado, à catástrofe. Os soldados recuavam,
corriam, fugiam, caçados pelos sertanejos que lhes desfechavam às espaldas os clavinotes,
as lazarinas, os rifles: e os sinos tocavam, gementes, as ave-marias. Improvisara-se na
Favela um acampamento, desmoralizado pela derrota; e apesar das ordens de Moreira
César, que continuava a querer que atacassem, convieram os oficiais que era indispensável
retirar, para Monte Santo. Bradou: “Estou morto; mas lavro meu protesto contra esse ato
de cobardia”.286 Ao amanhecer, começou essa marcha penosa, a que os feridos juntavam o
lamento, a artilharia e a sua guarnição à retaguarda, os fanáticos, reanimados e insistentes,
escoando-se pelos flancos da coluna, a acertarem naquela vasta linha ondulante e
aterrada... A agonia de Moreira César foi sombreada de desespero: morreu entre o silêncio
compungido dos companheiros, que já não sabiam como salvar o seu corpo da
profanação do inimigo. Carregaram-no algum tempo, a ombros: e por fim, quando a
marcha aflita se desfez em debandada, e cada um tratou de despojar-se do que levava, para
melhor se evadir, o largaram à beira do caminho, como um fardo...
REPRESÁLIA
Este estado de exaltação vinha de longe, e crescera, em agosto de 96, com as arruaças de
São Paulo e do Rio, a propósito do protocolo italiano.
Começou em São Paulo, com a folha de Eduardo Prado e Afonso Arinos (Comércio de
São Paulo), o banquete a 15 de outubro, aniversário do Príncipe do Grão-Pará, o
manifesto a 15 de novembro, assinado em primeiro lugar por João Mendes de Almeida.290
Os “conselheiros” movimentaram-se, deitaram manifesto a 16 de janeiro de 97 (Ouro
Preto, Lafayette, Andrade Figueira, João Alfredo, Carlos Afonso, diretores do “centro
monárquico”) e, com a ajuda de Gentil de Castro,291 fizeram seus jornais — Liberdade
(dirigido por Cândido de Oliveira)292 e Gazeta da tarde. Gentil de Castro atraiu os fogos
da imprensa inimiga, principalmente d’A República, de Glicério e Alcindo Guanabara,
que o acusou de fornecer armas aos jagunços. Chamou Alcindo a juízo. Este, perante o
magistrado, aplaudido pelos correligionários, sustentou a acusação. O incidente foi fatal
ao capitalista: porque, em 8 de março, ao se saber do desastre de Moreira César, com os
pormenores de heroísmo e martírio da sua coluna, maltas jacobinas, encabeçadas por
velhos florianistas, lhe incendiaram as oficinas. No dia seguinte ainda o procuravam.
Foram achá-lo na estação de São Francisco Xavier, quando tomava o trem de Petrópolis.
Acompanhavam-no alguns amigos, entre eles Ouro Preto e o filho.293 Acossado pelos
“mazorqueiros”, Gentil de Castro descarregou inutilmente o revólver: foi derrubado a
tiro, na plataforma do vagão... Na cidade a revolta acalmou, com a presença do Ministro
da Justiça, Amaro Cavalcanti, com o que sobrava de autoridade ao governo, sem forças
para conter a multidão... Referiu-se Rui Barbosa à “mera aparição pessoal de um ministro
de coragem, que bastou para fazer refluir na Rua do Ouvidor a onda sangüinária”.294 Em
São Paulo, as autoridades assistiram, complacentes, ao empastelamento do Comércio.295
A 4 de março, sem aviso, mostrando com a volta inesperada a sua incompatibilidade com
o substituto, reassumiu Prudente de Morais o poder. Como em 1894: sem ninguém para o
receber. Entrando sozinho no palácio, mandou dizer laconicamente a Manuel Vitorino,
então em veraneio na Tijuca, que já estava restabelecido. E governava.
Entre eles a distância aumentava. Um dos motivos íntimos do desgosto de Prudente fora
com certeza a transferência, com um baile famoso, da sede do governo, do Itamaraty (que
passava a Ministério do Exterior) para o Palácio do Catete (adquirido, conforme o desejo
de Manuel Vitorino, ao Conselheiro Mayrink).298 Esta festa inaugural, que parecia
conciliar o regime e a sociedade, nos esplendores do luxo, primeira, retumbante, depois
do baile a vésperas da queda do império, contrastava com a solidão triste do enfermo, no
seu repouso das Paineiras. Atestava, num confronto de temperamentos, a oposição do
vice-presidente, voltado para as belezas da vida, ao presidente metido asceticamente no
seu silêncio amargo...299 Refletia nos sucessos públicos o antagonismo, em cujas paralelas
se reproduzia o caso de Deodoro e Floriano, vice-presidente, ídolo das ruas, o outro
encerrado na desconsolada austeridade... O jacobinismo enovelou-se na popularidade de
Vitorino, contra o homem da “anistia”, o poder civil amolecido pela tolerância, o
presidente omisso... E este, até 5 de novembro, quando um fato terrível o libertou dessa
atmosfera deprimente, oscilou entre atos de força e uma timidez grave, com a desordem
— solta desde 8 de março — pelas ruas da cidade.
A VITÓRIA DO GOVERNO
Não vacilou o presidente em mandar contra Canudos uma expedição poderosa. Mas tudo
contribuiu para cultivar o desassossego público: a irritação dos políticos contrariados pelo
retorno do presidente, a demora dos preparativos bélicos, o rescaldo das agitações
habituais, a que a impunidade dera audácias crescentes, a cisão do grupo governante.
Glicério separava-se do presidente. Mas as bancadas do Congresso, que até aí lhe
obedeciam, começavam a rebelar-se, preferindo o presidente a Glicério. A de Pernambuco
iniciou a dissidência, em 14 de maio de 97, opondo-se à escolha, pelo chefe do partido,
das comissões permanentes da câmara.300 Dizia-lhe “não”. Glicério invocou, pela primeira
vez (declarou da tribuna) a qualidade de “chefe do Partido Republicano Federal”. A
definição firme de Prudente daria com ele em terra.
A oportunidade foi a sedição da Escola Militar, que tanto serviu para reafirmar a
autoridade como para destruir o líder.
Fez mais: fechou a Escola do Ceará, solidária com a do Rio, e extinguiu (golpeando o
florianismo) os batalhões patrióticos que, nos entusiasmos de 8 de março, se tinham
recomposto, para defender... a república.
Os velhos adversários da ditadura (e dos seus homens, que dirigiam a maioria) não
podiam deixar passar o ensejo de varrer-lhe a ameaça e os remanescentes. O autor da
manobra foi José Joaquim Seabra, que o Governador Luís Viana fizera eleger,
contrariando Glicério, e, na câmara, conservava a desenvoltura de livre atirador.303
Incorporou-se no grupo parlamentar que esteve no palácio, a cumprimentar o presidente;
e à saída (narrou mais tarde o Deputado Castro Rebelo) segredou ao colega de bancada
que no dia seguinte apresentaria moção de apoio ao governo. Espantado, perguntou-lhe o
interlocutor: se o presidente sabia disto. Segredou-lhe Seabra: ao cumprimentá-lo, dissera
que ia apresentar a moção; e Prudente, num aperto de mão, concordara, com estas
palavras, “aprovo e agradeço”. O mistério deste acordo frio, entre o oposicionista,
disposto a surpreender Glicério com um grito de aplauso ao governo que fustigara o
jacobinismo, e este, incompatível com o seu líder, foi a arma triunfante de Seabra. Na hora
aprazada, com surpresa de todos (a começar por Artur Rios, presidente da câmara e seu
companheiro de bancada), desfechou a moção gratulatória. Exasperado, saltou Glicério a
opor-se. Teve frases sentimentais de elogio à Escola Militar. Correu a votação: como era
de esperar, mas com um quorum em que apontava o fracasso de Glicério, a casa a
derrubou, 86 votos contra 60. O resultado satisfazia a Seabra: graças à oposição da
maioria, o governo perdia o aplauso caloroso do Congresso — proposto pela minoria... E
mandou por um colega este fulminante recado a Artur Rios: demitir-se imediatamente.
Perplexo, hesitou Rios; quis saber — se Prudente estava a par daquilo... Que sim,
confidenciou-lhe Castro Rebelo. E Rios demitiu-se...
De fato, no outro dia publicava o Jornal do Comércio uma vária lacônica, elaborada na
presidência da república, informando que Glicério não interpretava o pensamento do
governo...
Fora a desforra dos vencidos de 1889, resumiria Alcindo Guanabara...305 Mais certo é
dizer que foi a substituição do grupo, que pretendia governar o governo, pelo poder
pessoal, assentado em base firme, por definição, o presidencialismo.
Campos Sales, candidato pela ala que ficara com o presidente (os governadores),
suprimiu do rótulo o qualificativo; e protestou que representava o “Partido Republicano”.
Ambiguamente caracterizava, na carência ideológica, a condição de “histórico”; na
realidade, o tal “partido”, como “força” em que se uniam os adeptos do regime, orgânico
na monarquia, agora não era mais do que a cooperação dos seus funcionários eletivos.
Ligava-os o sistema; a solidariedade era das peças de uma máquina. Somente esta
prevalecia: a máquina do poder, “verdadeiro motor do Estado”,306 e sua presença.
ARTUR OSCAR
Disto foi encarregado outro general republicano, Artur Oscar, que comandava o distrito
de Pernambuco. Para tão forte inimigo organizou um corpo de exército de seis brigadas,
em duas colunas, sob o comando dos Generais João da Silva Barbosa (para atacar por
Monte Santo) e Cláudio do Amaral Savaget (por Sergipe e Geremoabo).307
Tolos boatos exageravam os recursos dos fanáticos; nem faltava quem dissesse estarem
com eles hábeis capitães, revolucionários antigos, até personalidades civis...309
Desconfiava-se da sinceridade do governador da Bahia.
DEPOSIÇÃO DO GOVERNADOR?
Era ridícula a notícia daquele suposto monarquismo. Que interesse teria o governador
baiano de trabalhar contra si próprio, demolindo o sistema político de que era um dos
chefes? A sua entrevista à Gazeta de Notícias — em 24 de julho de 1897 — é um
desmentido altivo.311 No banquete que celebrou a vitória final do exército — em honra de
Artur Oscar —, repetiu a sua grande frase: “A Bahia era republicana porque queria ser. Se
não o quisesse, quem a obrigaria?”.312
O poder central devia fazer desses rijos governos os pilares do “presidencialismo”, não
os agentes da oligarquia a ele hostil.
A QUARTA EXPEDIÇÃO
Careciam, as tropas que se deslocaram para Queimadas e Monte Santo, de abastecimento
organizado. Devorados os recursos locais, tinham de esperar a meia ração por morosos
comboios, naqueles arraiais esgotados: e que os engenheiros estudassem os roteiros da
avançada. Esperaram impacientemente. Arriscavam-se a chegar depois de Savaget, que, de
Aracaju, apressado, rompia para o vale do Vaza-Barris. O Coronel de Engenheiros
Siqueira de Meneses traçou com os sapadores a estrada que, à direita, pelo Rosário e
Angico, permitiria a passagem da artilharia, até os cimos da Favela. Graças a isto Artur
Oscar, com três brigadas, os canhões (um deles a matadeira, Withworth de 32, para
demolir a igreja nova) e a distância, escoltada pelo 5º de polícia baiana a bagagem,
alcançou o altiplano donde podia ver Canudos. Saudou-o com as primeiras granadas.
Combinara com Savaget o assalto geral, a 27 de junho.
A DURA GUERRA
Certa de que, a cavaleiro do arraial, seria fácil deslizar pelas ladeiras, num arranco,
destruindo e tomando tudo, viu-se em breve a coluna de Artur Oscar — colhida na mais
deplorável das ansiedades. Entrincheirados em volta, nos fojos, nas rugas do morro, nos
carrascais que lhe vestem as escarpas, os fanáticos puseram-se a fuzilá-la, num assédio314
que tinha a insídia de uma armadilha.
Os soldados batiam-se com um adversário fabuloso, denunciado apenas pela fumaça das
descargas, tão cosido à terra, que dificilmente as balas das Mannlicher, destocando-os,
alcançavam um ou outro, que sobressaía das pontas de pedra, das moitas requeimadas, do
mato escasso, sombreado a espaços pela rama solitária do icozeiro... Ia faltando munição.
Esgotada a das cartucheiras, devia aguardar-se o comboio, que ficara para trás, retardado.
O emissário voltou; a retaguarda fora cortada, e atacado o comboio. Defendera-o o 5º da
Bahia, formado de sertanejos do São Francisco315 — caboclos contra caboclos. Era preciso
livrá-lo com uma brigada completa. O Coronel Serra Martins encarregou-se disto.
O fato é que a primeira coluna passara de sitiante a sitiada. Teve de chamar a 2ª em seu
socorro: ou Artur Oscar acabaria como Moreira César. Savaget, para o salvar, renunciou a
assaltar Canudos pelo norte, justificação da sua caminhada de Sergipe para Geremoabo,
dos sacrifícios de Cocorobó e Trabubu. Fez apressadamente a marcha de flanco; e chegou
a tempo. Esta junção foi providencial para ambas as colunas que, separadamente, seriam
imoladas — desabastecidas, exaustas, os melhores oficiais vítimas do seu destemor — tal
como sucedera à expedição que iam vingar...316
ÊXITO INCOMPLETO
Com o reforço, reanimou-se Artur Oscar; e o Coronel Thompson Flores, com o 7º, num
arrojo belo, mas inútil, se precipitou, encostas abaixo, a conquistar Canudos, que lá jazia,
no vale, o casario esfarinhado pelo canhoneio, mas as duas igrejas sempre de pé,
caladamente... Não andou muito. Tombou fulminado; e retrocederam em desordem, os
remanescentes da castigada força. Este episódio mostrava a invulnerabilidade do arraial, a
menos que se abatesse sobre ele toda a Divisão. Atacou a 18 de julho, reconfortada pela
chegada do comboio de víveres, remuniciada a artilharia para um bombardeio triturante.
Atiraram-se à ação quatro brigadas, a ala de cavalaria, o 5º da Bahia, dois canhões Krupp:
e o resto (sob o comando de Savaget) permaneceu de sobreaviso, na Favela. Os batalhões
transpuseram a pé enxuto o Vaza-Barris, rechaçaram a resistência dispersa pelos flancos,
invadiram impetuosamente o arraial, até a igreja nova. Verificou-se aí o erro do assalto a
peito aberto, sem a prévia debilitação do inimigo, que, desaparecendo como força
organizada, se convertia num enxame de caçadores emboscados nas ruínas dos
quarteirões de adobe. Os comandantes Teles, Tupi Caldas, Dantas Barreto, isolados na
praça da igreja, queriam reforços, para varrer dali os jagunços, que continuavam a atirar.
Mas não havia reservas; todos lutavam, em grupos, atropeladamente, por inspiração
própria; e, dos esconderijos, os fanáticos começavam a visar os oficiais. Caiu Carlos Teles,
e, em redor, capitães, tenentes, alferes... No fim, havia fora de combate 67 oficiais, dos
quais 27 mortos.317
REFORÇOS
Telegrafou Artur Oscar, pedindo ao Ministro da Guerra cinco mil homens. Aquele
subúrbio de Canudos foi resguardado por uma linha de fossos, perpendicular ao Vaza-
Barris, rente ao “cemitério velho”, a que se chamou — sombria reminiscência, “linha
negra”. E como outrora nos pântanos paraguaios, sofreu diariamente o tiroteio das
guerrilhas que a experimentavam. Num desses choques morreu Pajeú, famoso jagunço,
que dirigira o assalto ao comboio, na retaguarda da 1ª coluna (24 de julho).
Cerca de seiscentos feridos tinham de ser transportados para Monte Santo, entre eles
Savaget, Teles, Serra Martins. A imprevidência somara-se à desorganização, para compor
a fisionomia infeliz de uma luta em que, por vezes, os soldados, doentes, famintos,
andrajosos, se confundiam, ao longo dos caminhos, com os “tabaréus” a quem
combatiam. Assemelhava-os a miséria. A 27 de julho partiu, enorme, o comboio dos
feridos. Não existia um serviço qualquer de enfermaria e assistência; e os poucos médicos
mal tentavam os curativos urgentes. Naquele dia saíram da Bahia vinte e quatro
estudantes de medicina, que se tinham oferecido para os hospitais de sangue, dispostos a
tudo, no ímpeto da sua abnegação. Prestaram generoso auxílio à tropa, desde que a ela se
juntaram, a 5 de agosto.320
EPÍLOGO...
Foi o epílogo.
FOGO E SANGUE
Uma bandeira branca apontou entre os escombros: dois sertanejos apareceram. Um era
Antônio Beato: entregava-se. O General Silva Barbosa concitou-o a ir buscar os outros.
Beato voltou, mas com trezentas mulheres, crianças e velhos, bocas sedentas, estômagos
vazios, farrapos humanos de que se libertavam os combatentes, num ardil irônico... Em
verdade, a resistência desmaiava. Homens válidos, clavinoteiros cansados de brigar,
esfalfados, imprestáveis, também largaram as tocas, abandonaram os companheiros, e se
foram meter, calados, no acampamento...326 Para reduzir os demais, nada melhor do que o
incêndio, mas uma vasta “queimada”, de querosene e dinamite, que devorasse tudo... Em
4 e 5 de outubro voaram em estilhas os restos de Canudos, que submergiu num oceano de
chamas. No fim, disparando os derradeiros tiros, do fosso, ao pé dos destroços da igreja,
um velho, dois jagunços, uma criança, sustentaram ainda a luta com as cinco mil
baionetas que corriam sobre eles, desatando as suas ondas de prata em redor da fogueira
imensa...327
A cidade está desfeita em brasas...
Uma e outra, depois, foram caindo as casas...328
No dia seguinte, para que nada ficasse da povoação, as ruínas da igreja foram
despedaçadas a explosões de dinamite. E, escavando-se no pavimento do santuário, que
fora o casebre onde o Conselheiro recolhera, para rezar e morrer, acharam o corpo ainda
incorrupto. À volta desse troféu meditaram os vencedores. Fotografaram-no, para a
comprovação de que já não vivia o terrível personagem; e, sob as vistas do médico Dr.
Curio, lhe cortaram a cabeça — de longos cabelos e barbas grisalhas — para o estudo
sábio dos psiquiatras da Faculdade.329
A GRAVE LIÇÃO
Assim terminou a mais extraordinária das guerras, que teve todavia uma vantagem.
Sacudindo o país, revelou, na sua realidade, os sertões. O livro, que produziu, deu corpo a
uma idéia, que tinha o relevo lancinante de um remorso: a idéia de que o Brasil pagava a
dívida contraída com a terra e a gente, por ter tardado tanto em descobrir-lhes as
angústias, a paisagem, os rumos. Canudos foi um acidente, na história de uma civilização
que ocupa devagar, e aos arrancos, a sua área continental. O Conselheiro recrutara as suas
romarias na ignorância e no isolamento de regiões abandonadas. A rebeldia formara-se-
lhe na incompreensão da autoridade e na tropelia dos seus agentes: gerara-se de
ressentimento e desengano. A sua pobre cabeça de semilouco desatinara-se com as
notícias deformadas da crise política, as inovações, as bizarrias, os ridículos: e o
sebastianismo vetusto, de que foi o apóstolo bronco, se lhe reduziu a um misto de reação
— contra as profanações — e reminiscências — apocalípticas e vulgares. Trataram-no
como ao inimigo da república, que lhe jogou em cima as suas melhores forças. Perto de
três mil baixas numeraram a enormidade deste erro, que, penitenciando-se Euclides da
Cunha chamou de crime,330 “monstruoso pesadelo” — disse o poeta,331 Afonso Arinos —
em 1897 — preferiu classificar de ensinamento,332 e Nina Rodrigues reduziu a termos de
ciência.333 Tê-lo-iam destruído sem nada disto. Se em vez de tropa mandassem justiça,
medicina, religião, escola. Tem-se a impressão amarga de que todo aquele aparato bélico
desenvolvia as linhas plásticas de um exercício no mais pitoresco dos combates simulados,
para a instrução dos quadros: e todavia custou um preço inaudito. Quanto à população de
Canudos, sumiu-se nas ruínas ou acabou a ferro e fogo. Resultado deplorável: não
apareceram prisioneiros. Ninguém que desse à vitória um resquício de generosidade.
Ébrios de vingança, os soldados liquidaram a faca, degolando, os que lhes caíram nas
mãos. Os jagunços não temiam as balas; numa superstição conhecida, tinham como
condenação aviltante morrer a arma branca. Então a coragem se lhes desfalecia: e aqueles
admiráveis guerreiros combaliam, em atitudes espavoridas... Indicaram à ferocidade dos
vencedores a espécie de suplício, a que nenhum escapou.
Há um ressaibo de comédia, na literatura com que Artur Oscar selou estas atrocidades,
proclamando:
Vencidos os inimigos vós lhes ordenáveis que levantassem um viva à república e eles o levantavam à monarquia, e, ato
contínuo, atiravam-se às fogueiras que incendiavam a cidadela, convencidos de que tinham cumprido o seu dever de
fiéis defensores da monarquia. É que ambos, vós e eles, sois brasileiros e ambos extremados em seus ideais políticos.
Não se enganassem: o sangue honrava esses ideais... políticos! Nesta distorção dos fatos
vibra, com os exageros finais, o jacobinismo de 1893, excitado na campanha federalista,
extremado em março de 97. A sua vítima derradeira seria o expoente desse próprio
exército atraiçoado por tantos equívocos. Porque no Rio continuava a ecoar, entre
explosões de demagogia, aquela metralha de ódio. Somente um acontecimento fulminante
poderia atalhá-la: ocorreu em 5 de novembro de 1897.
Levantou-se, num protesto severo, a mocidade, pela voz dos acadêmicos de direito da
Bahia: que era feito dos prisioneiros de Canudos?335
EXTREMOS CRIMINOSOS
O ATENTADO
Na manhã desse dia, governo, exército, povo, acorreram ao arsenal de guerra para receber
o General Silva Barbosa e o primeiro contingente das forças que regressavam de Canudos.
O presidente esteve a bordo, em companhia do Ministro da Guerra, Marechal Carlos
Machado Bittencourt. Desembarcou à uma da tarde. Um grupo de populares —
hostilmente — entrou a vivar Floriano, os bravos de Canudos, Manuel Vitorino... Do
outro lado, palmas saudaram o presidente. Junto ao portão de Minerva, que dá entrada ao
arsenal, subitamente arremete um soldado (era Marcelino Bispo!), engatilhando a
garrucha que levava na mão direita e ajeitando-a com a esquerda. Instintivamente,
Prudente afasta a arma com a cartola, que empunhava; e em vez da detonação, há o
estalido seco do tiro falhado. Logo o Coronel Mendes de Morais derruba com uma
pranchada de espada o criminoso; caem-lhe em cima, para o dominar, o ministro, dois ou
três oficiais; e mãos amigas impelem o presidente para a carruagem, afastando-o do local.
Estrugem aplausos, movimenta-se, curiosa e aterrorizada, a multidão, e algo de espantoso
ocorre, em cinco minutos de uma luta confusa, dos militares que subjugam o anspeçada, e
deste que se debate sob os seus punhos. Arrebatam-lhe o sabre. Recorre a uma faca que
trazia oculta. Com golpes mortais prostra o Marechal Bittencourt; fere o Coronel Morais;
atinge o Alferes Oscar de Oliveira; o Alferes João Manuel Garcia, que procurava tomar-
lhe o punhal, ficou com a mão em sangue... Quando o imobilizaram, e arrastaram dali,
para o cárcere no arsenal, jazia morto o Ministro da Guerra. Uma onda de consternação
se propagou, sem demora, pela cidade.
RESPONSÁVEIS
INTOLERÂNCIA
Não faltou quem murmurasse que o suicídio aproveitava aos políticos. Insinuou-se que
fora envenenado; garrotearam um cadáver... Seria inútil a supressão do criminoso, depois
da confissão, prolixa ou maliciosa, de quem o induzira ao crime. A repressão descambara
em perseguição.349 Um senador e três deputados foram mandados para o presídio de
Fernando de Noronha. O próprio Pinheiro Machado não escapou à prisão.
Interceptaram-lhe um telegrama, em que o capataz de sua estância prevenira, que a tropa
seguia... Referia-se à de muares, despachada para Sorocaba.350 Foi o Supremo Tribunal
quem pôs cobro à prepotência, concedendo — em 16 de abril de 98 — a ordem de
habeas‑corpus, que impetrou Rui, em favor dos congressistas desterrados (João Cordeiro,
Alcindo Guanabara, Barbosa Lima, Major Tomás Cavalcanti). Defendera Rui a tese, de
que, com a cessação do sítio, não podiam continuar presos os não processados (26 de
março). Por um voto, o tribunal denegou a ordem, que veio a conceder vinte dias mais
tarde, quando, com os mesmos argumentos, outros advogados a pleitearam.351 Fixou a
doutrina de que, fora do estado de sítio, não lhe persistem as conseqüências.352
A TRANQÜILA SUCESSÃO
Prudente liquidara o Partido Republicano Federal. A sua sucessão serviu para desbaratar a
organização que Glicério fundara e perdera, entre duas crises, da consolidação (com
Floriano) e do civilismo (com Prudente). Candidato natural era o presidente de São
Paulo, Campos Sales. Ficara ao lado de Prudente; reunia a “velha guarda”, da
“propaganda”; e o seu título, de “histórico”, o colocava, figura patriarcal do regime, acima
dos conflitos partidários. Ao vir ao Rio em princípios de junho de 97, na esperança de
conciliar os conterrâneos desavindos, sentiu que o seu nome apaziguaria o país.356
Severino Vieira, leader no Senado, vangloriou-se de ter anunciado a São Paulo esta
candidatura.357 Campos Sales preferiu informar que foi Bernardino de Campos quem lha
comunicou, em 18 de junho. Glicério e Pinheiro trataram de opor-lhe uma fórmula de
luta. Levantaram, para a presidência e a vice-presidência, os nomes de Castilhos e Lauro
Sodré. Os governadores da Bahia, de Minas, de São Paulo, de Pernambuco,358 pilares do
sistema, ficaram com Campos Sales e Rosa e Silva — este representando o Norte. Foram
indicados pela convenção do Partido Republicano, de 19 de outubro de 1897.
Há uma frase a propósito dos dois presidentes civis: Prudente pacificou, Campos Sales
restaurou as finanças. Complete-se: este saneamento começou na presidência do primeiro
e foi realizado pelo sucessor, que teve o mérito de executar o mais difícil e impopular dos
programas, o equilíbrio das despesas com economia drástica e satisfação pontual das
dívidas; honradamente. Compreende-se a gravidade da situação pelo acúmulo dos
compromissos, pela desvalorização e aumento do meio circulante, lançado no exterior o
descrédito dessas finanças periclitantes ligadas à descontinuidade administrativa, às
decepções da aventura inflacionista, às leis contraditórias, às conseqüências naturais da
guerra civil. Floriano gastara mais do que permitiam os recursos do Tesouro,
sobrecarregando-o de letras e emissões, naquele transe de defesa da república: e a taxa
cambial exprimiu, com o declínio desastroso, a desvalia do mil-réis na bolsa internacional.
Mas poderia apelar-se para o surto econômico... O vencimento das letras contra o erário
nacional não consentia que se esperasse por essa eclosão de riquezas jacentes. Os
banqueiros exigiam: e não havia com que pagar!
ERA NOVA
OPOSIÇÃO
Aí, o presidencialismo...
RIO BRANCO
A ILHA DA TRINDADE
Em janeiro de 1895 o almirantado inglês, sem qualquer aviso, como se as duas pequenas
ilhas não pertencessem a ninguém, fez ocupar a Trindade e a Martim Vaz: declarou-as
incorporadas no império britânico.
QUESTÃO DO AMAPÁ
A Questão do Amapá complicou-se, menos pela irritação dos negociadores do que pela
ação direta.
Pois o Tratado de Utrecht dera por fronteira Norte o Iapoc (ou seja, o Oiapoque) ou de
Vicente Pinzon, agora se dissentia sobre qual fosse este curso de água, se o verídico
Oiapoque, cujo delta espraia além do Cabo Orange, como afirmavam os brasileiros, se o
Araguari, dois graus de latitude ao Sul, abaixo portanto do Cabo Norte, onde a Fortaleza
de Macapá era um padrão de soberania — como sustentavam os franceses. A letra do
tratado, no artigo 8, tinha transparente clareza: destinara-se exatamente a isolar a bacia
amazônica das Guianas estrangeiras. Mas os franceses nunca se haviam conformado com
isto.
REGENERAÇÃO FINANCEIRA
O quatriênio de Campos Sales foi feliz na execução do programa financeiro, bem sucedido
na política externa, malsinado nos assuntos interiores e, de resto, autoritário e
oportunista, como um período de recuperação do vigor e da influência do governo,
impopular, mas respeitado.
O motivo inicial dessa impopularidade foi o cumprimento inflexível das leis de 1898,
que instituíam o imposto de consumo, com a selagem das mercadorias, e mandavam
cobrar 10% em ouro dos direitos de importação.395 Mostrou-se o presidente insensível ao
apelo da Associação Comercial e, em verdade, das classes conservadoras, para que adiasse
a cobrança. Sustentou, contra a oposição da imprensa, seu Ministro da Fazenda, Joaquim
Murtinho, e enfrentou altivamente a tempestade de protestos. Respondera a uma
reclamação viva: “Não posso obrigar ninguém a ser patriota; mas hei de fazer cumprir a
lei”.396
CÓDIGO CIVIL
Aquietado o país, devia ter a sua legislação recomposta. Campos Sales, que em 1890
incumbira Coelho Rodrigues de organizar o projeto do Código Civil, voltou ao assunto,
desta vez por intermédio de um jurista autêntico, que era o seu Ministro da Justiça,
Epitácio Pessoa.400 Este (em 25 de janeiro de 1899) convidou para elaborar o trabalho um
digno continuador da obra paciente dos nossos maiores civilistas, seu colega do Recife,
Clóvis Beviláqua.401 Em sete meses cumpriu a ingente tarefa, que, revista por uma junta de
doutos, foi em junho de 1901 submetida à comissão especial da Câmara dos Deputados,
presidida por J. J. Seabra. Nela colaboraram outros especialistas (e assim, com a sua
resistência às inovações, Andrade Figueira, representante inabalável das tradições liberais
da velha jurisprudência): e de modo a estar o projeto pronto em janeiro de 1902. Não lhe
faltaram críticas à linguagem. Rui Barbosa antecipara a advertência, quando, no seu
jornal, em 1899, estranhou a nomeação de Clóvis: carecia de “vernaculidade, a casta
correção de escrever”.402 Ocorreu a Seabra encomendar a um gramático a policiadora
leitura. Confiou-a ao baiano Ernesto Carneiro Ribeiro. Mas, com a audiência ao filólogo,
desviou para o intrincado prélio gramatical o debate que devera cingir-se aos institutos
jurídicos.
Em três dias saiu-lhe Rui ao encontro, com o parecer sobre a redação (3 de abril de
1902), em que, maciçamente, alinhou todos os seus reparos, abrindo, com isto, a mais
candente das controvérsias sobre regras da linguagem. Defendeu-se Carneiro,403 e teve a
Réplica, outro monumento dessa miúda erudição.404
Sob o seu peso jazeu o projeto, à espera de que as paixões se desvanecessem, o espírito
das leis predominasse sobre o das letras, e num ambiente calmo os entendidos se
conciliassem, menos a respeito da escrita do que do Código.
UNANIMIDADE
Adquiriu a política, com as eleições de 1899, a estabilidade desejada por Campos Sales —
e era pouco menos do que a unanimidade em torno dele.
Ainda desta feita Pinheiro e Castilhos agiram com fria habilidade: em vez de romperem
com o presidente, que respeitava, no reconhecimento de poderes, a “vontade dos estados”,
deram-lhe uma solidariedade tranqüilizadora. Por três vezes (disse-se) Pinheiro obstou a
que explodisse a revolta.410 Devia temê-la. O que mais queria o castilhismo, Campos Sales
concedera — na lógica do seu “sistema”: a política dos governadores. Apontavam-se as
colunas desse regime: os partidos republicanos de São Paulo, de Minas Gerais, do Rio
Grande, fechados, organizados, hierarquizados, máquinas dóceis na mão forte do chefe. O
Mineiro teve o irônico apelido de Tarasca: articulava as “maiorias locais”, obedientes à
direção unitária, do governador todo-poderoso.411 Pinheiro tornou-se no Senado o
advogado dessa situação — que confundia com a própria forma federal. Não esquecessem
que se afastara de Prudente e repelira a “paz de Pelotas” para não permitir que
impusessem ao seu estado a revisão constitucional. Era o noli me tangere, a belicosa
sensibilidade da autonomia, a que consagrara a espada de general honorário... A
dissidência paulista facilitou-lhe a adesão ao presidente.
A DISSIDÊNCIA
Meses antes se reagrupara no Rio Grande a oposição, para soltar também o seu grito
revisionista: mas pelo parlamentarismo.416
OUTRO PAULISTA
Não custou a Campos Sales fazer sucessor o probo conterrâneo que presidia São Paulo,
Conselheiro Rodrigues Alves. As bancadas de Pernambuco e do Maranhão (que o
hostilizavam) contentaram-se em adotar, para a vice-presidência, um nome do Norte: o
paraense Justo Chermont. Nilo Peçanha, no estado do Rio, sustentou o de Quintino
Bocaiúva para presidente: porém desesperançadamente, numa homenagem sentimental
ao patriarca da “propaganda”. Com o presidente de Minas Gerais, Silviano Brandão,
como companheiro de chapa, Rodrigues Alves foi eleito quase unanimemente. Faleceu
Silviano antes da posse (26 de setembro de 1902), e, para o substituir na vice-presidência
da república, o situacionismo mineiro indicou outro político da velha guarda: o
Conselheiro Afonso Pena. Da união dos dois grandes estados resultava de pronto o
equilíbrio inabalável do governo, a que a austeridade desses estadistas de moral rígida e
natural gravidade emprestou uma nova importância.
XIX: DIPLOMACIA
SOB O SIGNO DA PAZ
A diplomacia de Campos Sales (no ministério, o jovem mineiro Olinto de Magalhães) foi
feliz e vistosa.
É verdade que não compareceu o Brasil à Conferência da Paz que, a convite do czar da
Rússia, se reuniu em 1899 em Haia. Mas por uma razão simples:417 único país latino-
americano a receber a convocação, que versava o tema do desarmamento, lutaria, se
comparecesse, com o duplo equívoco de assumir compromissos que não alcançavam os
vizinhos, portanto intempestivos, e de reduzir forças... que procurava recuperar. O
descalabro da Marinha, subseqüente à revolta, a ineficiência do exército, provada no ano
anterior, a necessidade de reaparelhar-se, para pôr em pé de defesa os seus humildes
recursos, aconselhavam o contrário, isto é, a ausência de congressos internacionais que
lhe dessem deveres sem garantias, platonicamente.
Pouco antes o Presidente Júlio Roca (veterano do Paraguai, com suficiente autoridade,
no seu país, para dar um rumo inesperado à sua política externa) se entrevistara no
Estreito de Magalhães com Arrázuriz, presidente do Chile: e esse aperto de mãos dissipara
a ameaça de um conflito entre as repúblicas limítrofes, desavindas na sua fronteira andina.
Com o mesmo propósito de paz veio Roca, com uma flotilha de três navios, ao Rio de
Janeiro (agosto de 1899), onde foi acolhido com entusiasmo e franqueza, exatamente
como em Buenos Aires seria recebido, dois meses depois, o Presidente Campos Sales, ao
lhe retribuir, com equivalente cerimonial, a visita.418 A vantagem foi desacreditar a balela,
de que uma prevenção incorrigível dividia os dois povos, desencorajando a hipótese de
uma guerra nesta parte do mundo,419 os contendores se agrupavam em “blocos”. Deu a
ambas as nações a idéia amável de suas afinidades — elas que, desde o fim da campanha
do Paraguai, pareciam apostadas exatamente em mostrar as suas diferenças.
A QUESTÃO DA GUIANA
A vitória na querela do Amapá, com o laudo arbitral do governo suíço, coroou a ação
calma da chancelaria brasileira. Este êxito aconselhou a liquidação, por processo análogo,
das dúvidas — mais difíceis de esclarecer — existentes com a Guiana Inglesa.
A contenda teve de ser decidida sem mais protelações, quando no tribunal arbitral, que,
por exigência dos Estados Unidos,425 julgara a questão de limites entre a Venezuela e a
Inglaterra, o jurisconsulto Martens, exorbitando no alcance do pleito, se referiu à
fronteira com o Brasil pelo... Tacutu (3 de outubro de 1899). Com o seu espírito de
previdência, antecipara-se a diplomacia brasileira ao desfecho dessa contenda dizendo-se
nela interessado: e prontamente protestou contra a conclusão abusiva, em pleito a que não
concorrera, exigindo, por conseguinte, o arbitramento adequado. Negociou-o o Ministro
do Exterior, General Dionísio Cerqueira (com a sua sensibilidade de explorador exaustivo
dos confins amazônicos), e este acerto se concretizou no Tratado de Londres, de 6 de
novembro de 1901.
SENTENÇA ARBITRAL
A chancelaria brasileira tinha ganho, pouco antes, o seu mais ruidoso triunfo: o Acre.
A BORRACHA
A “LINHA VERDE”
Mas a ação hábil da chancelaria teve a sua base na insurreição acreana, movimento
espontâneo dos sertanistas, num surto indomável de resistência em que sobrelevam
algumas figuras de caudilhos. O maior chamou-se Plácido de Castro.
A revolução, dando veemência ao uti possidetis, impeliu o governo para a sua vitória
diplomática.
PROTESTO E DEMARCAÇÃO
AVENTURA
Antigo diplomata, que trocara a elegância da carreira por uma vida boêmia em Buenos
Aires e no Rio de Janeiro, onde se arruinara, explorando uma casa de jogo, surgiu Gálvez
em Belém com boas apresentações e sem dinheiro. Queria empregar-se na redação de um
jornal. O governador do Amazonas nomeou-o amanuense da Assembléia. Conseguiu
melhor, um lugar no consulado boliviano em Belém, para traduzir papéis. Não admira
que o cônsul lhe aproveitasse os conhecimentos. Espantoso foi que lhe desse a traduzir a
minuta de uma negociação, em que a comissão demarcadora, chefiada por Paravicini,
propunha, por intermédio do cônsul norte-americano, nada mais, nada menos do que a
entrega do Acre... aos Estados Unidos. O documento, assinado por Paravicini e pelo
Cônsul Luís Trucco, constituía uma proposta de tratado, em que a Bolívia daria aos
Estados Unidos, por sua intervenção, o abatimento de 50% sobre a borracha exportada, e,
na hipótese de guerra, o território...433 Evidentemente careciam os proponentes de
autoridade para tais aberturas, nem a tinha o funcionário yankee ali estabelecido. Mas
tudo conspirava para dar excepcional importância à idéia. Estava-se em 1899. Em plena
dollar policy, triunfante nas Antilhas com a guerra de Cuba, a expandir-se pelo Pacífico
com a ocupação das Filipinas, proclamando-se que Teodoro Roosevelt seguia as lições
imperialistas do Capitão Mahan. A América do Norte, mais interessada do que nenhum
outro na borracha brasileira, poderia interessar-se por aqueles disputados domínios...
Havia o exemplo sul-africano. Não sofrerá Portugal o vexame do “protocolo” britânico,
com a Chartered, a British South Africa Company que se meteu entre Angola e
Moçambique, para lhe tomar aquele sertão imenso? Talvez em Washington não se tivesse
ainda pensado nisso. Porém em La Paz — como prova a cessão de 1901, ao
Anglo‑Bolivian Syndicate, se considerou essa possibilidade. Não sabemos se Paravicini
agia por conta própria. Gálvez é que não teve dúvidas. Apoderou-se do segredo e correu a
Manaus. O Governador Ramalho Júnior também acreditou. Foi a fortuna do aventureiro.
Convenceu o governador a antecipar-se, com um golpe teatral. Precisava de recursos.
Recebeu 600 contos de réis. Queria armamento. Teve tudo. À fantasia de Paravicini
respondeu com outra espécie de sonho: um Estado independente, na selva, de que fosse
fundador e herói, como Houston, no Texas, como Kruger, no Transvaal, como o
personagem de opereta que pretendera criar, no Amapá, a sua monarquia... E meteu-se a
fundo na floresta.434
Depois desse fracasso, dir-se-ia perdido o território abaixo da linha Cunha Gomes, e o
governo brasileiro conformado com a situação, quando a denúncia de Gálvez, sobre a
possível participação de terceira potência, tomou outra forma. Não se tratava, em verdade,
de cessão aos Estados Unidos, mas de um negócio em que entravam grossos capitais
anglo-americanos, apoiado nas futuras compras da U.
S. Rubber Co., inspirado pelo ministro boliviano Félix Avelino Aramayo: o pacto
firmado em Londres, a 11 de junho de 1901, com o magnata Whitridge, em nome do The
Bolivian Syndicate of New York. A empresa ficaria com o monopólio da zona acreana,
exercendo aí os direitos fiscais e de polícia, que têm na África e na Ásia as chartered
companies. A marcar o prestígio da organização, para a sua presidência entrou um primo
do Presidente Teodoro Roosevelt... Divulgou-se a notícia que a Bolívia transferira ao
capital internacional436 a responsabilidade do Acre. A imprensa vozeou o seu protesto.
Coincidiu com outro motivo de enfurecida irritação dos seringueiros: a ordem dada pelo
novo comissário boliviano de Puerto Acre, Lino Romero, para que, sob pena de perda das
propriedades, as levassem a registo na sua repartição pelo prazo de seis meses, a partir de
1o de maio de 1902.437 O Governador Silvério Héri autorizou Rodrigo de Carvalho a
instalar em Caquetá um posto fiscal, que justificaria nova concentração armada, sobre o
rio, teatro das batalhas previstas. E Rodrigo, que era rio-grandense-do-sul, lembrou-se de
um antigo oficial federalista, seu conterrâneo, talhado para chefiar a insurreição.
Comunicou-lhe as suas intenções; e ofereceu o comando.438 Chamava-se José Plácido de
Castro.
PLÁCIDO DE CASTRO
Apesar de um passado de provações, combates e viagens, que lhe tinham enrijado a fibra
militar, não passava Plácido de um moço de 28 anos, metido nos seringais do Purus a
executar modestamente os seus trabalhos de agrimensor. Interrompera os estudos na
escola de cadetes de Porto Alegre, por incompatibilidade com a situação local; engajado
contra a vontade no exército legalista se bandeara para a revolução; subira a major;
exilara-se, e tentara a vida de pequeno funcionário, no Rio de Janeiro. Atraía-o a ação;
mudou-se para aquela fronteira, desconhecido, laborioso, pacífico. Na realidade, vibrava
com a causa de seus patrícios, inteirara-se das suas possibilidades de luta e acariciava o
sonho de os dirigir, numa guerra disciplinada. Aceitou o comando. Autoritário e astuto,
possuía as qualidades indispensáveis para a conjuntura: a primeira, a confiança em si
mesmo. Como o problema básico da campanha era a obediência, formulou condições.
Queria ser atendido como chefe; e passaria pelas armas quem faltasse ao compromisso.
Precisava reconhecer o rio até as origens, ponderando os recursos bolivianos. Subiu-o
dissimuladamente, sem que desconfiassem dos seus planos. Em seguida, propagou a
revolta, até reunir dois mil homens, com os seus “rifles” e a sua formidável vontade de
brigar.439 E a 6 de agosto investiu o Arraial de Xapuri, que não resistiu. No dia imediato,
proclamou enfaticamente o Estado Independente do Acre.
A luta começou mal, batido Plácido, com pouco mais de sessenta companheiros, em
Volta da Represa (18 de setembro). Retorna, cerca o povoado, força-o a capitular em 5 de
outubro de 1901. A rendição é honrosa,441 contagia de desânimo os bolivianos
concentrados em Puerto Alonso. Este teria de cair: caiu após demorado sítio, em 24 de
janeiro de 1903.442
A AÇÃO BRASILEIRA
O infortúnio de suas armas encheu a Bolívia de indignação, e o Presidente Pando
anunciou que marcharia em pessoa para o teatro dos acontecimentos, com fortes recursos
de gente e material. Rio Branco assumira a 3 de dezembro de 1902 a pasta das Relações
Exteriores. Tivera tempo para se inteirar do perigo que constituía a concessão feita ao
Bolivian Syndicate, do estado de irritação dos brasileiros, com a luta desigual que se feria
no Acre, a necessidade de opor-lhe, com a firmeza que lembrasse a forte diplomacia do
império, os seus embargos. A 24 de janeiro de 1903, no mesmo dia em que os bolivianos,
cercados, se rendiam a Plácido de Castro, expediu uma circular telegráfica, em que
profligou o negócio feito pela Bolívia com o Sindicato de Nova York, “monstruosidade
legal”, “semelhante às concessões da África e indigna do nosso continente”. Terminava,
gravemente: “O Sr. Pando, presidente da Bolívia, propõe-se marchar contra os súditos
brasileiros do Acre. O presidente do Brasil decidiu concentrar tropas nos estados
limítrofes do Amazonas e Mato Grosso”.443
Abriu-se em julho a negociação direta, já não mais do tratado de 1867, porém — como
era óbvio — em atenção ao “manifesto direito” da posse.
Para começar, declarou Rio Branco não conhecer o mapa da “linha verde”, de 1860,
sobre o qual se tratara em 1867, com a sua oblíqua do Madeira às nascentes do Javari: o
mais antigo que encontrou foi de 1873, e pouco valia, porque esboçado como
interpretação, não como norma ou diretiva do pacto... Sem a carta, que atestava a
intenção dos dois governos quanto ao traçado geodésico, podia criticar os antecessores
(“em suma, e é o que importa saber, o governo brasileiro desde fins de 1867 apontou a
opinião que mais favorecia à Bolívia”) e concluir, como concluía Rui falando ao Senado,
em setembro de 1900 — que a linha, em vez de ser a oblíqua ao Equador (estuário Beni-
Mamoré às origens do Javari, seja, de 10º, 20’ a 7º), era simplesmente o paralelo (10º, 20’),
ou “linha Cunha Gomes”, de que resultava ficarem no Brasil as cabeceiras do Juruá, os
mais ricos trechos do Purus e do Acre...
O fundamento real da causa brasileira lá estava, não nas peças históricas, que os
acontecimentos deixavam longe, mas na ocupação do território discutido, donde os
pioneiros jamais sairiam. Tinham a prioridade da chegada, o direito da propriedade, o
valor da posse; e o sentimento nacional, em que a escudavam. A lei não devia ser dos
títulos, mas dos fatos. Isto proclamara Rui em 1900: bastava o uti possidetis.446 Quem
tomasse a terra contestada era — como na Guiana — o dono. Ou continuaria a luta.
TRATADO DE PETRÓPOLIS
GENTE ANTIGA
Oriundo embora da velha política, Rodrigues Alves era um espírito arejado pelas
aspirações do progresso, que levara ao governo paulista. Diferençava-se dos conterrâneos
que o antecederam, o financista e o pacificador, pelo senso, ou antes, pela bravura
(tipicamente paulista) das realizações. Tinham eles desbravado o caminho, com o
apaziguamento e a reabilitação do crédito. Cansara-se a nação da anarquia política
(dissipada com as místicas revolucionárias) e da voraz administração fiscal, que
arrecadava sem construir, para pagar. Exigia melhoramentos civilizados, obras nobres e
inadiáveis, desenvolvimento. “O advento desta era não está longe”.452 O ministério
refletiu-lhe a intenção — de sacudir o país com um forte sopro de prosperidade — a que
acrescia, oportuna, a indiferença pelas questiúnculas e quizílias do passado, jacobinos e
monárquicos, florianistas e sebastianistas, república de colete encarnado e azedos
reacionários deplorando-lhe as misérias... Compunham-no um engenheiro, Lauro Müller,
um político, J. J. Seabra, um financeiro clássico, Leopoldo de Bulhões, um veterano (e
dissidente) da “consolidação”, o General Argolo, o Almirante Júlio de Noronha, que
projetava reorganizar a Marinha,453 e, o maior de todos, o Barão do Rio Branco.
Impregnado de tradição imperial, dizia Rio Branco (carta de Berlim, 8 de agosto de
1902): “Eu não poderia desempenhar as funções do cargo como entendo que devem ser
desempenhadas, e como o foram por Uruguai, meu pai, Maranguape, Sinimbu, Abrantes,
Abaeté, Cotegipe e outros ministros”.454 Estabelecia a continuidade moral, comparando a
diplomacia burocrática (Visconde de Cabo Frio) com a dos “estadistas”. Invocava-os. O
barão deu ao governo do conselheiro o toque histórico (os positivistas diriam que era
monárquico) que, em verdade, se reduziu ao repúdio das paixões e excentricidades de dez
anos antes. Começou pela substituição, na correspondência do ministério, de Capital
Federal por Rio de Janeiro, tirando-lhe o tratamento de vós e o galicismo, saúde e
fraternidade...455 Protestou Miguel Lemos, sem eco, contra a eliminação dessa fórmula,
que tinha a seus olhos importância fulgurante. Voltara aos conselhos do governo senão o
antigo regime, pelo menos o seu estilo, com o sistema — o claro sistema brasileiro de que
o barão fora o geógrafo e o funcionário. Circunstância conclusiva: o povo respeitou-o,
chegou a amá-lo, admirando a distância o homem superior, que servia imperialmente a
república, desprezando-lhe a vulgaridade. Habituou-se a isolar o Itamaraty, com o seu
velho espírito, da Rua do Ouvidor, com a sua oposição boêmia. Era razoável que se
inaugurasse, no Largo da Glória (produto de antiga subscrição popular), o monumento
do Visconde do Rio Branco. Dava razão às gerações extintas. O caso do Acre justificou a
escolha e os métodos do segundo Rio Branco.
VIDA NOVA
O PREFEITO PASSOS
O Engenheiro Passos, afamado ferroviário, aceitou a prefeitura com a condição de a
exercer com plenos poderes, numa espécie de ditadura justificada pela eficiência. O
decreto de 29 de dezembro de 1902, que reorganizou o Distrito Federal, adiando as
eleições, deu-lhe essas faculdades. Nomeado no dia seguinte, imediatamente instituiu a
comissão da Carta Cadastral, para projetar o alargamento das antigas e a abertura das
novas artérias, racionalizando a circulação, de modo a ligar confortavelmente o norte, o
centro e o sul da cidade. Lauro Müller, atirando-se às obras do porto, lançou a fórmula:
“Fazer engenharia”.457 A Praça Mauá (chamada assim pelo monumento que,
significativamente, aí levantou o Clube de Engenharia, do pioneiro da indústria) serviria
de núcleo à irradiação das avenidas, de um lado a das docas, que ia ter à Praia Formosa,
do outro, de mar a mar, até a tangente do Passeio Público, a Avenida Central. Dali
seguiria a Beira‑Mar, acompanhando as curvas suaves da baía. Traçadas as linhas
periféricas, importava desafogar o centro,458 retificando e alargando as ruas, de jeito a aliar
a utilidade, do trânsito, ao decoro dos aspectos. Foi o que o prefeito promoveu com uma
pressa afoita, de quem não se detinha diante de nenhum obstáculo para despejar os
recalcitrantes, derrubar as construções condenadas (e 550 foram demolidas para a
abertura da avenida), alinhar os logradouros espaçosos, vesti-los de arquitetura adequada.
Tornou-se-lhe anedótica a atividade, autoritária, fulminante, irresistível. Apelidaram-no
de “bota-abaixo”. Para acabar com os quiosques que enfeavam as praças, antes do
desfecho do litígio com o concessionário mandou derrubá-los. Venceu, antecipando-se à
justiça, o pleito com os proprietários. Destelhava-lhes as casas, ordenava a destruição dos
pardieiros, assistindo, impávido, à remoção dos entulhos... Curioso é que revelou a
paisagem à cidade, voltando-a para a sua natureza rutilante: desvendou-lhe a Guanabara,
distorceu-a, da posição oposta ao mar para a sua contemplação, valorizou-lhe o
“ambiente”, velado no dédalo das velhas ruas que lhe davam as costas. O Rio diferente, a
“cidade maravilhosa”,459 data desta formidável iniciativa — encorajada pelo honrado
apoio de Rodrigues Alves.
OSWALDO CRUZ
Era pouco, remodelar. Faltava sanear. Convidado o Dr. Sales Guerra para dirigir a Saúde
Pública, indicou um jovem bacteriologista, mal conhecido, que estagiara três anos no
Instituto Pasteur, de Paris, e geria, em Manguinhos, o incipiente Instituto Soroterápico:
Oswaldo Gonçalves Cruz. Foi a revelação de um homem de luta, acrescido da fé dos
apóstolos. Aceitou, porque podia vencer: venceu, porque cumpriu o seu programa. O
governo surpreendeu o Rio com aqueles dois realizadores: Passos — rompendo avenidas
— e Cruz — exterminando mosquitos. Custasse o que custasse!
Na realidade o higienista não propunha método próprio, que devesse ensaiar numa
população farta de experiências. Convencera-se de que a febre amarela desapareceria, se
acabasse o transmissor.460 Inspirara-se no sistema norte-americano de profilaxia, graças ao
qual o exército de desembarque tivera tão escassas perdas nas zonas insalubres de Cuba —
o de Finlay e Gorgas —; e queria aplicá-lo com o mesmo rigor. Afrontando o ceticismo
acadêmico (dos que ainda criam na etiologia da peste ligada às alterações do solo, às
emanações miasmáticas, contágio e clima),461 definiu Cruz em quatro pontos a campanha:
eliminar o inseto, remover os focos, isolar os doentes, imunizar pela vacina específica a
cidade.462
Para o vulgo, sem excluir grandes personagens, a primeira condição era irônica (e Bilac
dedicou-lhe uma sátira engraçada),463 a segunda curiosa; a última — a vacina — um
atentado. Os positivistas manifestaram a sua repulsa. Com razões científicas, morais,
religiosas — se opunham à “monstruosidade”: a violência justificava a resistência...
Resistiu ele ao ataque nos numerosos tons, de ridículo, censura, oposição e revolta, mas
exasperada revolta que lhe pôs em perigo a vida. Libertou o Rio da epidemia — contra o
Rio.
CONTRA A VACINA
A REVOLTA DE TRAVASSOS
A revolta que nesse dia explodiu tinha como dirigentes Lauro, Barbosa Lima, Alfredo
Varela, General Silvestre Travassos, Major Gomes de Castro... Interpretou-a Rui (dois
dias depois, no Senado): “É um movimento deliberado a se apoderar imediatamente do
governo, substituindo-o por uma junta governativa de três membros, dois dos quais serão
o General Olímpio da Silveira, com a chefia, e o General Travassos”.467
VENCEU O PROGRESSO
Amainada a tempestade, viu-se que o progresso por pouco não pusera abaixo o governo,
mas, com este preço, pagava os sacrifícios, que tinha anunciado. A cidade transformara-
se. A revolta popular valera-se da pedraria das demolições para agredir a autoridade: foi
antes de surgir, do entulho dos bairros destruídos, a beleza larga das avenidas alagadas de
luz.
NOVAS CIDADES
A idéia da “cidade moderna” foi das poucas que vieram da periferia para o centro.
Explica-se o prodígio amazônico pela alta da borracha, a cujo consumo atendia o Brasil
com 98%: permitira a governos engenhosos (Eduardo Ribeiro) substituir a cidade
humilde (de A jangada de Júlio Verne) por uma capital de belas ruas e arquitetura faceira,
servida de transportes elétricos. O exemplo mineiro particulariza-se na reação municipal
(com sede em Barbacena) à centralização em Ouro Preto, fora das grandes linhas de
circulação da província: foi possível, porque, com a ruptura da tradição, o deslocamento
da influência (de Ouro Preto para Barbacena), a coragem de homens empreendedores
(Presidentes Afonso Pena, Bias Fortes), os desesperados protestos da cidade prejudicada
não puderam alterar a decisão tomada. Deram-lhe um traço dramático, de heroísmo
administrativo. O fato é que a comissão incumbida da mudança (chefia de Aarão Reis) se
fixou no Arraial do Curral del‑
O NOVO RIO
Propalou-se que era a mais iluminada capital do mundo... De fato sofreu uma completa
mudança, de fisionomia, circulação, costumes e mentalidade, cujo símbolo achamos no
deslocamento da elegância carioca da Rua do Ouvidor para a Avenida Central. Oh, como
sonharam outrora a repleta, estreita, medíocre Ouvidor487 os provincianos que a
consideravam a artéria vital da política, do pensamento, da pátria, com o luxo, o comício,
a redação dos grandes jornais, a futilidade, a civilização... “O Brasil era o Rio; o Rio, a Rua
do Ouvidor”.488 E isto passa. Passou como as arruaças contra Oswaldo Cruz e as sedições
militares: a Idade Nova transferiu-se para a desafogada Avenida, apropriada a outra
espécie de tráfego: o automóvel. É de 1906 esta maravilha (doze automóveis de aluguel).489
Concorreu vitoriosamente com o tílburi — até aí o carro barato à mão da freguesia — em
1911; eliminou-o em 1917.490 A sua buzina desperta a modorra burguesa: Fon‑Fon é o
título da revista mundana, de 1907. Veste-se a Avenida com todos os estilos
arquitetônicos: parece um mostruário acadêmico, a deslumbrar um povo estonteado,491
contente de ver no mesmo quarteirão o helênico, o renascente, o farfalhante “1900”, a
placidez clássica da Escola de Belas-Artes (Morales de los Ríos), o teatral, das Exposições
(Palácio Monroe)... Pereira Passos fez o Teatro Municipal como a Ópera parisiense, de
Garnier, em ponto menor: e esse belo decalque encheu de orgulho a platéia fina, em 1909,
quando, entre os bronzes e os mármores do monumento, o governo ouviu da cultura (foi
orador Olavo Bilac) o elogio do seu arrojo.492 Chalets, vilas normandas, palacetes
torreados de um duvidoso gosto de balneário concluem em 1918, quando Frontin abriu a
Avenida Atlântica — a moldura praieira de Copacabana, dotada, quatro anos depois, do
seu hotel palace, modelo do gênero. O corso de automóveis preconizado pelo cronista
Figueiredo Pimentel (1909), Flamengo afora, a refeição galante no fim de Botafogo
(Pavilhão Mourisco), depois no Assírio (debaixo do Municipal), a volta das praias alvas, o
obrigatório desfile da avenida, desatam em ostentação e graça a antiga timidez social,
agarrada aos cafés e às esquinas do Rio histórico: e o desfiguram. Pois acabara a febre
amarela, romperam-se as avenidas, alongava-se à luz a cidade renovada, viessem visitá-la
os estrangeiros ilustres! Vieram (como hóspedes do Barão do Rio Branco, que dava às
obras do Prefeito Passos o competente rendimento cívico) Ferrero, Clemenceau, Tagore,
Ferri, Anatole France, Doumer... Cantou Rubén Darío (1906): “En Rio de Janeiro iba yo a
proseguir... / Ya no existe allá fiebre amarilla. Me alegro!”.493
Havia o pitoresco da natureza a que o progresso opunha a sua réplica: e uma febril
imitação da Europa (até 1919) a que se seguiu (com a máquina e o sport, sobretudo o
cinema) a da América... O Rio civilizara‑se!
O BLOCO
A sucessão de Rodrigues Alves foi disputada por três correntes formadas na lógica desse
regime de pessoas e não de partidos: de Pinheiro Machado, chefe das combinações; do
presidente, inclinado para Bernardino de Campos; de Rui Barbosa. Vendo que não seria
aceito pelo governo, resolveu Pinheiro ganhar a batalha política dividindo São Paulo:
lançou com estrondo Campos Sales. Os estudantes, a oposição paulista, acolheram com
entusiasmo a indicação, que estava longe de reunir as forças necessárias. Julgava-se em
Minas que devia ser mineiro o candidato; na Bahia o Governador José Marcelino,
rompendo hostilidades, se precipitara, apresentando Rui. Houve, na confusão, um
consenso: o repúdio da candidatura patrocinada pelo presidente. Negava-se-lhe o direito
de intervir. Rodrigues Alves sentiu formar-se à sua volta o vazio. São Paulo, cindido pela
manobra de Pinheiro, que atirara contra Bernardino de Campos o antigo chefe do estado;
Minas, com a autoridade de sua numerosa bancada, e já aí com disposições de
reivindicação, obedecia à palavra de ordem do seu presidente, Francisco Sales;494 a Rui,
como resultante do entrechoque dos grupos desavindos, só lhe restava o silêncio.
A fórmula foi feliz: com a vantagem de eleger, fora do círculo “histórico”, quebrando-o,
um sério homem público que juntava à condição de neo-republicano a simplicidade,
digamos, a proverbial prudência, dos velhos mineiros. Não vinha da ideologia de
bandeirola vermelha na lança gaúcha, da ortodoxia da “propaganda”, ou da “oligarquia”
econômica de determinada região. Procedia da “escola” dos chefes municipais, da
experiência “liberal” de Dantas e Ouro Preto, da resistência de Minas às intromissões do
poder central, da oposição a Campos Sales e Murtinho, cuja política financeira paralisara
a marcha do país. Era naturalmente contra a superstição dos partidos, candidato do bloco
(título traduzido do francês, bloc des gauches...), em contraste com o antecessor, produto
da convenção, na linha sucessória dos presidentes paulistas, além disto crismado como
renovador dos processos, nesse regime lerdo e carunchado.
A “política” funcionava...
Manobrou Ponce a fim de isolar a força federal, cujo comandante, o Coronel Carneiro
da Fontoura, decidiu, nessa emergência, manter-se neutro; e, à notícia de que a brigada
contra ele enviada pelo governo da república, sob a chefia do General Dantas Barreto —
incumbido de garantir o governo do estado —, já estava em Corumbá, apressou o ataque.
Lançou-o com tal vigor, que Pais de Barros — a 1o de julho — fugiu de Cuiabá. No dia
imediato o chefe revolucionário fez a sua entrada triunfal. Cinco dias depois uma escolta,
que seguia o trilho do governador deposto, o surpreendeu na mata de Coxipó: e matou-
o.499 Duplo desbarato sofrerá com isto a política de Rodrigues Alves: fracassara no socorro
à autoridade; e foi impotente para vingá-la. De fato, Dantas Barreto, que, se tivesse
chegado a tempo, atuaria como agente da União para pacificar o estado, nele intervindo,
se contentou em observar o sucedido, de que deu ampla notícia num livro denso.500 O
Congresso, a quem o presidente “sugerira” decretasse a intervenção, desandou em
considerações protelatórias, a que juntou Rui, no Senado, a opinião convincente. A
batalha política foi ganha pelo Senador Azeredo, ali o principal amigo de Ponce.
Intervenção justificar-se-ia, mas para restabelecer a ordem: e esta fora restaurada.
Assumira o governo acéfalo com a eliminação do titular, o 1º vice-presidente. Quanto aos
crimes, conhecesse-os a justiça... Em conseqüência, foi arquivado o pedido de intervenção
— com muitas palavras de elogio ao direito de revolta, razão velha dos povos cansados de
sofrer!501
Neste episódio vibra tardiamente a nota romântica das insurreições populares do ciclo
que se encerrara com os motins de 1904.
CONVÊNIO DE TAUBATÉ
No campo econômico outra revolução rebentara: manipulada, porém, pelo governo. O
Convênio de Taubaté, firmado em 26 de fevereiro de 1906 pelos presidentes de São Paulo,
Minas Gerais e Rio de Janeiro (Tibiriçá, Francisco Sales, Nilo Peçanha). Valorizava o café.
Atribuindo a crise à oferta livre, resolveram sustentar-lhe o preço pela retenção dos
stocks, de modo a ir a exportação respondendo ao consumo: e onerada da sobretaxa de
três francos por saca, bastante para pagar juros e amortização do capital indispensável ao
custeio dessa manobra.503 Uma novidade que abalou a economia liberal: intervinha o
Estado na lavoura e no comércio, limitando-os estatisticamente; de forma empírica, é
certo, mas já em nome do princípio inédito da extensão do poder público à fazenda, ao
armazém, ao negócio... Aquilo era espantoso: e simples. Só mais tarde se chamaria
dirigismo.504 Tinha um precedente: a ação do governo russo contra a especulação alemã
do trigo...505 O estado de São Paulo (com garantia federal) levantou na Europa o
empréstimo de 15 milhões esterlinos: e “estabilizou” a cotação do café. Teria sido um
desastre, se as safras subseqüentes não fossem pequenas, reduzidas pelas geadas...506 Mas o
estado assumira uma posição ousada de defesa do “principal produto”: e dela não
desistiria.
A FORTE DIPLOMACIA
QUESTÕES TERMINAIS
Originou-se a pendência com o Peru da invasão daqueles rios pelos caucheros — em 1902
— lá estabelecidos como em terra conquistada. Protestando, recusou-lhe o Itamaraty a
participação nas negociações com a Bolívia — em que não cabia terceiro; e assinado o
Tratado de Petrópolis, exigiu a retirada dos invasores. Só conheceria as suas razões depois
disto. Condescendia na arbitragem: contanto que precedida da exibição dos títulos de
domínio...510 Vários batalhões foram então remetidos para a remota região;511 e como as
armas estrangeiras eram importadas através do Amazonas, Rio Branco decidiu interceptá-
las, embora esta violência pudesse precipitar a luta. Mandou que fosse desembarcado o
material bélico do vapor que o levava para Iquitos — alegando tratar-se, não de represália,
mas de segurança; e assim — indo ao encontro da guerra para a evitar — forçou a
conversação amigável. Realmente secionara a artéria vital da resistência em tais confins.
Concordou-se no Rio (o Ministro Hernán Velarde e Rio Branco) em eliminar o dissídio
pelo retorno puro e simples à convenção de 1851 (a fronteira declinando do Javari para o
paralelo 11) com a provisória neutralização da zona disputada. Mas só se firmou em 1909
o tratado final. A demora deve-se ao Itamaraty, interessado em esperar o desfecho da
questão do Peru com a Bolívia, arbitrada pela Argentina.512 Acertou entretanto com o
Equador (6 de maio de 1901) reavivar a linha ajustada em 1851 em Lima (na dependência,
é certo, do resultado do seu litígio com o Peru);513 definiu a da Guiana Holandesa (5 de
maio de 1906), cerrando-lhe, pelo espigão do Tumucumaque, a bacia amazônica;
esclareceu com a Colômbia (21 de abril de 1907) a divisória pelo Apoporis–Capuru–Serro
Caparro e Rio Regro, até a pedra do Cucuí, famosa pelo desterro de 1892; e culminou
emocionalmente a política afetuosa com o Uruguai, instalando-o no condomínio da
Lagoa dos Patos e do Jaguarão.514 Com o Chile apertou laços cordiais (mais vivos com a
recíproca visita de navios de guerra, acolhidos entusiasticamente lá e aqui). Contou na
Argentina com a compreensão generosa de Saenz Peña (na coerência de sentimentos de
Mitre e Roca): e, se esbarrou em 1908 com a hostilidade amarga de Estanislau Zeballos, no
incidente do “telegrama nº nove” — a que aludiremos — não foi dele a culpa. Era
desavença antiga desdobrando-se em tardios alarmes...
Nos últimos anos do império desejara o governo brasileiro ter o primeiro cardeal da
América do Sul. Suspensa a negociação com o advento da república — filosoficamente
distante da Igreja — retomou-a Rio Branco. Conseguiu de Pio X a púrpura para Dom
Joaquim Arcoverde, arcebispo do Rio de Janeiro. Nada faltava ao prelado para esta
dignidade, sequer, com a tradição de família, a imponente presença, a que o prestígio do
seu governo eclesiástico dava grandeza principesca. Rio Branco fez-lhe aparatoso
acolhimento, para marcar a alegria do Estado por essa elevação; e contribuiu para lhe
construírem o palácio — em lugar da antiga residência arquiepiscopal da Conceição — na
Glória, onde fora o Ministério de Estrangeiros. O chapéu cardinalício era um argumento
de superioridade: “Primeira vez que essa alta distinção recai em um prelado da América
Latina” (diz a mensagem presidencial de 1906); e amáveis relações com a Santa Sé. Incluía
o Brasil no Sacro Colégio — em nome de uma parte da Cristandade, até aí ausente das
pompas romanas: recomendava-a à atenção universal.
Para os que criam, como Sílvio Romero, no perigo alemão, a visita aos portos do Sul
daquele navio do Kaiser constituía um sintoma. Houve unanimidade de protestos, porém,
ao se saber que, em Itajaí, por ter desertado um marinheiro, o comandante pusera em
terra um pelotão, para o capturar. Violou a soberania! O desembarque — esclareceu-se —
não fora para prender ninguém, somente para tomar informações... Mas o clamor da
imprensa induziu o Itamaraty a pedir três navios de guerra, que obrigassem a Panther a
entregar o desertor, se realmente o levasse a bordo. Ao ministro alemão, que lhe falou do
risco disto, respondeu Rio Branco (certo da solidariedade americana): “Pois que seja a
guerra, se desgraçadamente for necessário!”.517 Não foi; o governo de Berlim deu plenas
satisfações; não houvera prisão em terra, pelos marujos da canhoneira; e tudo acabou em
cortesias. Mas realçava o apoio dos Estados Unidos; popularizava-os. Por que em 1899
desistira o governo francês de mandar força para o Amapá?518 Por que quatro anos antes
tão facilmente terminou a usurpação inglesa da Trindade? Tinha razão o chanceler: o seu
embaixador em Washington defendia “às maravilhas a política americanista” — em cuja
honra a Conferência se realizou com efusivo otimismo.519 Reluzente e breve.
Com efeito, o auxílio da grande democracia não bastava: tinha o Brasil de aparelhar-se
para os encargos dessa posição cara, que Rio Branco lhe assegurava com a sua diplomacia
sistemática; precisava de Marinha, Exército, indústria de guerra; sobretudo espírito
marcial.
Eleito presidente, quis Pena, numa longa viagem marítima, conhecer as necessidades dos
estados, visitando-os. Inaugurou o costume da excursão dos candidatos, não para cortejar
o eleitorado, mas para ver com os seus olhos as condições do país: e com isto o
impressionou. Escolheu os auxiliares fora das imposições partidárias, tendo o cuidado de
declarar, no banquete, em Belo Horizonte, que lhe propiciou a definição, que a política
seria feita por ele.520 É como se acrescentássemos: deixara de lado Pinheiro, com a sua
tutela e a sua pureza “republicana”... Separaram-se antes da posse do presidente, naquele 7
de setembro de 1906 — quando em Belo Horizonte, com Pinheiro Machado, se uniram os
principais vultos da situação mineira para festejar a ascensão de João Pinheiro ao governo
do estado. O chefe rio-grandense falou (pensando no programa de João Pinheiro) da
arregimentação dos responsáveis pelo regime num grande partido nacional. Esquecia-se,
nesse apelo aos propagandistas e apóstolos da república, da condição de antigo
monarquista do Conselheiro Afonso Pena: e este, ou porque lhe tomasse o discurso como
um desafio, ou porque na verdade repudiasse a idéia de um partido (acaudilhado pelo
senador gaúcho) acima da sua autoridade, não perdeu o ensejo de explicar, veemente, os
presidentes colocam-se por sobre os grupos, obedientes apenas à sua consciência...
Cruzavam espadas: de uma banda a tese do partido (de Glicério), a limitar o dirigente; da
outra, a sua independência (de Prudente a Rodrigues Alves). Venceu evidentemente a
teoria presidencial. A pasta da Fazenda foi para o mineiro David Campista, um dos
talentos do Congresso,521 a da Justiça para o rio-grandense-do-norte Tavares de Lira, de
invejável cultura, a da Viação — preponderante, pelos projetos de grandes obras — para o
jovem baiano Miguel Calmon.522 Continuou no Itamaraty Rio Branco; coube o Ministério
da Guerra ao Marechal Hermes, disciplinado comandante de 1904; o da Marinha ficou
com um veterano de 93, Alexandrino de Alencar. À roda do conselheiro os colaboradores
moços, estalando de entusiasmos arrogantes, tiveram por alcunha a mais amável das
ironias: “Jardim da infância”. Exultava, com a sua compostura veneranda de antigo
Ministro da Coroa, entre doutores adolescentes... Um deles, o primeiro do grupo, se
avantajava pela palavra fascinante, no prestígio raro de uma carreira triunfal: Carlos
Peixoto.523 Os outros eram Campista, Gastão da Cunha, João Luís Alves, Estêvão Lobo,
João Pandiá Calógeras, Miguel Calmon, os gaúchos Pedro Moacir e James Darcy.524
Reunidos formavam menos um jardim do que um acampamento espartano: temperavam
nas suas tertúlias as armas que derrubariam Pinheiro; o seu alvo era, desenganadamente,
o “caudilho”. A esperança: João Pinheiro.
A administração de Afonso Pena levou avante o plano de obras de Rodrigues Alves, mas
num ritmo em que, pela primeira vez, se encontra a visão global da economia brasileira.
Deixou de considerar os problemas no quadro regional e os encarou em conjunto, a
começar pela viação, destinada a cobrir, com a rede de trilhos, as linhas vivas da unidade
do país. Devia-se ligar à bacia do Prata o São Francisco, pela combinação das estradas do
Rio a São Paulo (Central do Brasil), São Paulo–Rio Grande,525 Passo Fundo ao Uruguai; e
levar a Central a Pirapora, porto fluvial do Nordeste. Completada a comunicação do Rio a
Vitória, cogitava-se de prolongar a da Bahia, tanto para o Espírito Santo como para
Pernambuco (Great Western), aumentada com o trecho de Timbó–Propriá: o circuito
litorâneo. Outras linhas conjugadas serviriam ao Rio Grande do Norte, ao Maranhão (São
Luís–Caxias), ao Ceará (Sobral e Baturité), a Minas Gerais (Sabará–Santana dos Ferros,
Oeste de Minas), a São Paulo (Faxina–Itararé e Paranapanema)... Sem a Noroeste, de
Bauru a Corumbá, a integridade nacional continuaria à mercê da situação do Prata. Urgia
prender o Mato Grosso à civilização costeira pela ferrovia que alcançasse, o mais cedo
possível, a Bolívia: a Grande Leste–Oeste.526 Preconizada nos planos de Honório Bicalho
(1881), Bulhões (1882), André Rebouças (1890), indicada como obra inadiável pelo Clube
de Engenharia em 1904, iniciada no ano seguinte, deu-lhe o Ministro Calmon o ímpeto
decisivo. Rasgava o itinerário de penetração destinado a retificar os rumos do
povoamento histórico, atirando para a fronteira esse vínculo de aço.
A PAZ DE HAIA
Efetuara-se por esse tempo na Haia a conferência internacional promovida pelo czar, em
que os plenipotenciários conversaram, com exuberância de teses, sobre a paz permanente.
Conseguira Rio Branco que Rui Barbosa, na chefia da delegação brasileira, levasse a tão
alto congresso (o primeiro desta natureza a que o Brasil comparecia) a lealdade das nossas
intenções. O realce que ali teve o Brasil deve-se à eloqüência do embaixador, que se impôs
como figura excepcional; e a sua firmeza — opondo-se a tudo que fosse hegemonia e
prepotência, descobre, na penumbra, a decisão formidável de Rio Branco. Não é lícito
separá-los, senão no que há de pessoal no desempenho: cumpriu Rui as instruções
quotidianas do Itamaraty, vigilante na reivindicação de um lugar digno para o Brasil,
irritado com a humilhação que se lhe pretendia infligir, qualificado como potência de
quinta categoria na organização do Tribunal de Presas, ainda mais indignado com a
atribuição à América Latina de um único posto na corte em que as grandes nações de
primeira classe tinham cada qual a sua cadeira...532 Rui ficou só, na recusa da composição
do Tribunal de Presas; mas dirigiu a revolta das nações pequenas, encabeçando as sul-
americanas, contra a segunda iniqüidade. Rio Branco telegrafou-lhe: “O Brasil não pode
ser desse número [...]. Agora que não mais podemos ocultar a nossa divergência, cumpre-
nos tomar aí francamente a defesa do nosso direito e do das demais nações americanas”.533
Fez isto soberbamente, abalando a assembléia com a sua dialética,534 deixando-a prevenida
do seu “veto” — que seria o veto irredutível à desigualdade jurídica dos estados. Com esta
atitude impediu (e foi o Brasil que impediu) se formasse a corte com privilegiados e
satélites, ao sabor dos impérios... A Conferência limitou-se a sugerir o tribunal, deixando
de lado a questão da nomeação dos juízes e respectivo rodízio. Reconheceria Gabriel
Hanotaux: “A la conférence de la Haye, ce sont les représentants des républiques
sudaméricaines et notamment du Brésil qui [...] ont positivement pris la tête de la pensée
humaine”.535 E Léon Bourgois: que podendo aliar-se aos grandes, preferiu ficar... “o igual
de Nicarágua, o igual de Honduras, o igual de Sião”.536 Não importava: o essencial era essa
confiança nos princípios, esse público repúdio dos “consórcios” de força, em prejuízo da
ordem universal!537
Dito isto no Riderzaal, na verdade quem menos acreditava na sua sinceridade, por parte
dos Estados poderosos, era o Brasil, despido de estrutura militar que lhe merecesse o
nome, a tentar refazer a esquadra, sem dinheiro para maiores iniciativas.
Por ocasião do incidente com o Peru (1904) expusera o General Argolo a penúria em
que, desorganizadamente, se desmanchava o exército. Mal se reerguera da decadência em
que a guerra de Canudos o surpreendeu (quando o Marechal Bittencourt lhe dera um
esboço de serviço de intendência) e já a inquietação política, a escassez de material, a falta
de tudo como que lhe apagava o entusiasmo recalcitrante. Reação análoga — contra esse
estado de coisas — enervou a Marinha na administração do Almirante Alexandrino.
Exagerou Rio Branco — quanto à Marinha. Aconselhou a encomenda, não de cruzadores
médios, do plano de Júlio de Noronha, mas de dreadnoughts, os maiores do mundo... O
excesso era bem dele, na propensão pelo brilho das armas (que historiara no passado),
pelo fulgor das aparências, em quadros decalcados da vanglória das nações européias...
Tinha um fundo de sabedoria: a ordem armada, ou, na fraqueza do pacifismo prematuro,
a humilhação e a decomposição — dos países indefesos. Podia lembrar o caso da Panther
— com os nacionalistas medrosos de outra irrupção imperialista.538
Mas os argumentos pairavam no ar, com a nevrose de uma guerra geral, suspensa,
iminente, incalculável.
VOZES GUERREIRAS
Paz e justiça. Tem este sentido, embelezado pela espontaneidade, o tratado de maio de
1909, em que o Brasil deu ao Uruguai o condomínio da Lagoa Mirim e do Jaguarão
(reformando, neste pormenor, os tratados de 1851), com a livre navegação do Rio de São
Gonçalo, da Lagoa dos Patos, da Barra do Rio Grande.542 Rodó fixou, num traço
apologético, a alta figura do barão: “La originalidad, acaso única, de una obra de
engrandecimiento nacional realizada, no ya fuera de las torpes violencias de la guerra,
sino aparte también de las bajas astucias de la política ladina y artera”: “Un honor insigne
para la civilización americana”.543 Conta, nas suas Memórias, Ramón J. Cárcano como
facilmente (em 1911) conveio ele em desistir do terceiro dreadnought encomendado à
Inglaterra, suspendendo uma pequena corrida armamentista: com superior filosofia.
Estava na sua compreensão do “sistema” continental, que era, no Itamaraty de 1912, a
política exterior do Brasil. Faltou-lhe a base da ordem interna; o bombardeio da Bahia fez
baquear o seu coração cansado; patrioticamente humilhado, sem poder conciliar-se com a
estupidez do atentado, começou por exigir, sob pena de demitir-se, a reposição da
autoridade deposta. “Se o senhor sair, eu também renuncio”, disse-lhe, emocionado, o
marechal. Seria segunda catástrofe, a retirada do chanceler.544 Pareceu aquietar-se;
adoeceu; e num breve declínio do organismo pujante, no próprio ministério, que se
tornara o seu lar, no seu gabinete do Itamaraty, entre mapas, papéis e livros, junto à vasta
mesa de trabalho, morreu a 10 de fevereiro de 1912.
HISTÓRIA REPETIDA
“Quem fazia política, era ele”... Com esta frase marcou Pena a linha pessoal do sistema,
extremada — como acontecera com Rodrigues Alves — na escolha do sucessor. Não seria
problema, se vivesse João Pinheiro. O presidente mineiro sobrepujara o panorama dos
partidos com a individualidade imantada de ação e doutrina: poucos homens se
impuseram tão depressa ao país. A sua fisionomia lembrava a de Castilhos; o positivismo
progressista e a energia de comando dele faziam um chefe; mas vestia a firmeza dessas
qualidades com as maneiras suaves de sua gente, de quem tinha a obstinação e a modéstia.
Ele próprio, numa imagem rústica, traçou o paralelo de gaúchos e mineiros, comparando
a impaciência do cavalo à perseverança do burro...545 Sem afoiteza, sem ênfase, sem
provocação, seguia pachorrentamente o seu caminho. Do Palácio da Liberdade ao do
Catete546 parecia curto, na crista calva das “alterosas” montanhas natais... Vítima de
moléstia que não perdoa, morreu a 25 de outubro de 1908. Deixou desorientada a política
— contra Pinheiro Machado. Carlos Peixoto e o seu grupo, ao desabrigo, socorreram-se
de David Campista. O presidente por ele se declarou em dezembro. O Ministro da
Fazenda seria o candidato. Cometia a imprudência do antecessor, com Bernardino de
Campos. De mais não precisava o adversário para o abater, dissolvendo, no fragor dessa
liquidação, o “jardim da infância”.
Romperia Rui Barbosa o combate por conta própria: negava ao presidente o direito de
apresentar sucessor. Lembrou Rio Branco. Pinheiro parecia concordar com Campista. De
fato, tudo faria para arrebatar a Carlos Peixoto a chefia da política. Venceu-o, com a
candidatura do Ministro da Guerra.
O FULGOR DA ESPADA
O presidente é que não tinha mais saúde para os grandes abalos. Profundo desgosto
minava-lhe as energias desde que, em novembro último, perdera o filho Álvaro, seu oficial
de gabinete. Faleceu subitamente a 14 de junho, vítima — bradou a oposição — de
“traumatismo moral”.558
NILO PEÇANHA
RUI BARBOSA
Rui alvitrara o nome de Rio Branco. Foi em vão. Concentrou em torno de sua rebeldia os
baianos, os paulistas, a juventude das academias, as multidões, ávidas de protesto,
predispostas à reação. Chamou-se civilista, esta resistência, contra o militarismo.
Candidato proclamado pela convenção de 22 de agosto, tornou-se Rui o arauto da
regeneração civil da república, que em 1889 ajudara a fundar, com as espadas. Eram
exagerados os termos. O exército ficara à margem da contenda; e com o marechal se
alistavam civilíssimos expoentes da política diuturna. Mas os movimentos eleitorais se
fazem menos com programas do que com insígnias, e a antítese serviu. Sacudiu,
emocionou, dividiu a nação, que, entre agosto e março,560 viveu a experiência (somente
renovada em 1921) de uma campanha sem exemplo. Envolvendo, pela primeira vez, a tese
da consulta ao povo, estabelecia o dilema do presidencialismo autoritário, arrimado às
armas, e do liberalismo republicano, com as promessas constitucionais. A agitação
“civilista” tem a expressão difusa de uma revolta de consciências, contra a estrutura e o
automatismo de um regime que se elaborava no mistério dos conchavos e não na luz dos
debates. Nela se desdobrara a tentativa de dar autenticidade à opinião, vigor e sinceridade
ao voto, verdade e direção à política, fora do personalismo solitário. Rui era o único que
podia sublevar o país com o verbo doutrinário. Porque à incomparável virtuosidade
oratória unia a tradição dos combates incessantes em defesa da Lei, da Justiça, das
Liberdades. Não o acusassem de demagogo, pois à demagogia se opusera em 1893 e em
1897; não o dissessem republicano insincero, pois fora um dos organizadores do sistema;
nem era lícito classificá-lo entre reacionários ou oportunistas, porque em cada episódio
vivido estava uma batalha contra as paixões azedadas pelo ressentimento. A mocidade
consagrou-o patrono do seu idealismo. As populações saíram à praça para saudá-lo. O
país — sem acreditar na sua vitória — comoveu-se com a sua palavra.
SIGNIFICADO DA LUTA
Lançada por Pinheiro, Glicério, Azeredo, a candidatura do marechal, Rui, antes de mais
nada, tirou-lhe a conseqüência: “Quero o exército grande, forte, exemplar, não o queria
pesando sobre o governo do país. A nação governa; o exército, como os demais órgãos do
país, obedece”.561 Desta premissa deduziu a objurgatória, que foi crescendo à medida que
progredia a campanha. “Que me importa a mim, senhores, o espantalho? Não nasci
cortesão. Não o fui do trono; não quis ser da ditadura; da própria nação não o sou; não o
serei das baionetas”.562 O civilismo era a antítese, a revolução branca do voto, a
regeneração, pelo povo. Evidentemente estava de antemão vencido pela “máquina”.
Começou a viagem eleitoral por São Paulo (16 de dezembro), cujas multidões
galvanizou com a eloqüência; foi à Bahia (14 de janeiro), onde leu a Plataforma, com o seu
programa revisionista;563 e a Minas Gerais (17 de fevereiro), calorosamente recebido em
Juiz de Fora, Ouro Preto, Belo Horizonte. Estavam com ele as elites letradas, a juventude
escolar, as minorias locais a braços com as “oligarquias”. Tirados os votos inverificáveis
do interior, onde a eleição se fazia ao sabor do governo, a de 1º de março pode ser
considerada vitoriosa para o civilismo. Mas o Congresso “reconheceu” os candidatos da
maioria; e empossou-se o marechal a 15 de novembro de 1910. Rui, que lhe contestou a
legitimidade, dizendo-se esbulhado, continuou em oposição. Seguiu, inabalável, a linha de
sua doutrina. Se preferisse ser hábil, teria vibrado nos adversários o golpe decisivo.
Bastava dar mão forte à política anti-pinheirista que cresceu junto à presidência, no meio
militar em que ela se situou, e ajudá-la, na guerra a Pinheiro — tão fraco em 1910 como
em 1908, confinado agora (por Mário Hermes) na defensiva a que Carlos Peixoto o
reduzira.
RECOMEÇA A DESORDEM
Naquela noite, ao voltar Batista das Neves do jantar a bordo do navio francês Duguay
Trouin, a maruja, como enlouquecida, a ele se atirou. O oficial de serviço, 2º Tenente
Álvaro Alberto, deteve-a de espada em punho, esgrimiu com as baionetas que o
acometeram, abateu um dos atacantes e recebeu no peito três golpes. Munido da baioneta
que arrebatara a um grumete, e com um marinheiro fiel ao lado, o comandante exortou a
chusma alucinada a retroceder. Ordenou ainda ao tenente ferido que tomasse a lancha,
que o levaria ao hospital. Adotou Álvaro Alberto outro alvitre. Com as forças a se
extinguirem, ordenou que a lancha aproasse para o São Paulo: daria o alarme à esquadra.
Evitou com isto que se repetisse nos outros navios a selvageria ocorrida no Minas
Gerais.565 Os revoltosos a este tempo se tinham apoderado do paiol de munições; e a tiros
e coronhadas mataram Batista das Neves. Outros oficiais, despertados pelo tumulto, e à
medida que saíam dos camarotes, foram também assassinados. Abandonados aos
marinheiros o São Paulo, o Barroso, o Bahia, passaram eles — intercomunicando-se por
meio de radiogramas e sinais — a exigir do governo — que, na realidade, não sabia o que
fazer — o perdão prévio, a abolição dos castigos, a satisfação de suas queixas... E puseram-
se a atirar, com as peças menores, para Villegaignon e cercanias.566 Ao amanhecer 24 de
novembro esse espetáculo imprevisto estarrecia a população.
AMOTINAM‑SE OS MARINHEIROS
Titãs metálicos na enseada tranqüila, as mais poderosas máquinas bélicas do país eram
como joguetes nas mãos irresponsáveis de tripulações ébrias de vingança, conscientes da
sua força... Lançar os torpedeiros contra as grandes belonaves seria acabar com o poder
naval do país. Pinheiro Machado aconselhou os meios suasórios. Não empregou a palavra;
poderia dizê-la: psiquiatricamente. O marechal anuiu. E o deputado Comandante José
Carlos de Carvalho foi encarregado de parlamentar. Bem recebido nos dois couraçados,
trouxe-lhes a intimação: anistia antecipada, ou fogo. Reunidos os leaders da situação e da
oposição, concordaram: e, com discurso de Rui, no Senado, em defesa do projeto e cheio
de clemência para os sublevados — o Congresso votou a anistia — com a enormidade de
ser condicional. Parecia menos uma lei do que um acordo. “Art. 1º. É concedida anistia
aos insurretos de posse dos navios da Armada nacional se os mesmos, dentro do prazo
que lhes foi concedido pelo governo, se submeterem às autoridades constituídas”. Antes
de se lhes conhecer o crime; sem notícias ainda da sua extensão; endosso do Congresso à
negociação entabulada pelo Executivo... O Ministro Almirante Batista Leão chegou a
assinar esta ordem terrível (25 de novembro): “Hostilize com a máxima energia, metendo-
os a pique sem medir sacrifícios”. Não foi necessário.567 Apesar de tudo, o preço da
acomodação era vantajoso: rendiam-se os amotinados, deixando intactos os navios, e a
cidade... Oposição e situação despejaram as iras sobre os castigos, ainda habituais na
esquadra: justificavam a seu modo o levante, com as “conseqüências irresistíveis”, “almas”
a revelarem “virtudes que honram a nossa gente e a nossa raça”...568
“SALVAÇÕES”
NO ESTADO DO RIO
Começou a seqüência das “salvações” no estado do Rio, onde governo e oposição tinham
criado, meses antes, dualidade de câmaras e atas eleitorais. O candidato do Governador
Backer (que ficara com Rui Barbosa na campanha civilista e, por isto, devia ser
desmontado) era Edwiges de Queirós. O do grupo apoiado pelo poder central, Oliveira
Botelho. O Supremo Tribunal concedeu habeas‑corpus à Assembléia que pretendia
reconhecer o primeiro, para que pudesse funcionar: reconhecia-a. Iniciava-se, aberrante, a
doutrina da intervenção do Judiciário, sobrepondo-se ao Congresso, nos conflitos
políticos, mediante habeas‑corpus que, apesar de sua formal imparcialidade, se
transformavam num recurso de força, condicionado às paixões que aparentemente
rechaçavam.571 A corrupção do regime atingia, por intermédio das inextricáveis questões
de dualidade dos poderes locais, a alta corte: e do seu voto variável iria depender a solução
de outros, e irritantes problemas partidários. Desprestigiou-a: pois o presidente da
república, sem atenção à sentença, agiu mais eficazmente. Aproveitou-se do estado de
sítio, conseqüente à revolta dos fuzileiros, mandou que o Ministro da Justiça comunicasse
ao Governador Backer que a guarnição de Niterói passaria a policiar as repartições
federais, e a este título ocupou ela, a 30 de dezembro, os palácios do governo e da
Assembléia. Só entrariam Oliveira Botelho e os amigos... Legitimou-se a violência, com o
decreto, igualmente espantoso, de 3 de janeiro de 1911, que os reconhecia (e por
conseguinte, o governador) pela razão de que o Senado já assim o entendera e a resolução
andava com parecer favorável, pela respectiva comissão da câmara...572
ALI E ACOLÁ
A desordem como que deslizou do Norte para o Sul com a navegação costeira,
viajando... As salvas da flotilha em Manaus deram o sinal à exasperação das ruas, à
política de braços armas e sedições dramáticas. Farto dos monopólios concedidos pelo
intendente Antônio José de Lemos (o homem invencível do Pará), o povo de Belém,
numa assuada memorável, quebrou os quiosques...574 O governador bandeou-se com a
revolta, contra o intendente. Encerrou-se o ciclo de dominação do “velho Lemos”.
No Recife as coisas correram brutalmente, desde que, lançado pelo partido federal
conservador Dantas Barreto, este deixou a pasta da Guerra. Soldados do exército e da
polícia engajaram-se em continuados motins; debalde Rosa e Silva — que correu a
candidatar-se contra o general — apelou para a neutralidade do presidente da república;
Estácio Coimbra, que, como presidente da câmara, assumira o governo, solicitou em vão
garantias federais; e numa atmosfera de violência, exacerbada pela eliminação da
autoridade em dias sucessivos de tiroteios e arruaças, se realizou, em 9 de novembro, a
eleição. Completou-a a interferência direta da força armada, que assegurou à parte da
Assembléia hostil ao rosismo tranqüilidade para reconhecer o seu candidato, sem ser
perturbada pelos antagonistas... A intervenção pedida por Estácio para poder governar foi
desfechada contra ele. Dantas Barreto — varridos os adversários, os mais em evidência
obrigados à fuga, para salvar a pele — empossou-se a 19 de dezembro de 1911.
BOMBARDEIO...
Dito e feito. À uma e meia da tarde de dez de janeiro, o General Sotero mandou que a
artilharia do Forte de São Marcelo acertasse algumas granadas na Praça do Palácio...
Constava que haviam sido concatenados preparativos cautelosos para esse ataque, numa
série de providências ostensivas, a mais significativa, a renovação da bateria da velha
fortaleza, bocas voltadas para o alto casario que, em presépio antigo e profuso, se desata
pelas colinas da Bahia. Por outro lado, concentrara o governador numerosos contingentes
policiais, apetrechados fartamente, nas repartições do estado. Respirava-se a luta. Não se
contava com o canhoneio.
AS CONSEQÜÊNCIAS
Salvou-se o Rio Grande, por artes de Pinheiro, como se salvara São Paulo, por sua
própria energia, da calamidade a que o Ceará não pôde eximir-se: o candidato, produzido
pela agitação, nela mergulhado; contra a desordem na capital, a sertaneja; a revolta
respondendo à ilegalidade. Ali se sublevou, às ordens de um apóstolo rústico, a população
fanática. Houvera, em 1897, um Conselheiro. A este, em 1912, chamavam Padrinho.
Deposto por um motim popular o venerando Governador Nogueira Accioli (22 de janeiro
de 1912),590 dois candidatos militares lhe disputaram a sucessão, Bezerril Fontenelle,
bafejado pelo pinheirismo, e Franco Rabelo, pelo Catete. Tentou apaziguar as correntes o
Coronel Tomás Cavalcanti. Feriu-o uma bomba lançada na sala da conferência. Os
ânimos ferviam. Franco Rabelo foi eleito e reconhecido pela minoria da Assembléia (doze
deputados)591 — já de acordo com os acciolistas. Os demais deputados não compareceram
por falta de garantias... Durou pouco a aliança insincera da situação nova com a antiga.
Sob o olhar complacente da polícia ainda uma vez magotes de desordeiros aterrorizavam
Fortaleza, pondo fogo às casas da família Accioli e de seus amigos. No saque das
residências depredadas até pianos de cauda desapareceram... À violência respondeu a
barbárie, na revolução de Juazeiro do Pe. Cícero. Agüentar-se-ia Rabelo apesar de tudo, se
contasse com o centro. Mas cometeu a temeridade de acompanhar Dantas Barreto na sua
definição contra Pinheiro; e este, do alto do seu poderio, o fulminou. Emissários da
oposição refugiada no Cariri combinaram com os políticos do estado, que no Rio se
apoiavam a Pinheiro, a conflagração sertaneja, vasta e incontível. Para derrocar o
governador, tinham o cangaceiro.
É uma figura diferente, que em 1914 sobe rudemente à cena política, eclipsando a
memória triste do jagunço, seu antecessor, no sebastianismo torvo das caatingas.592
Lembra-o na analogia do comando místico, substituído o “monge” infeliz de Canudos,
cearense como ele, pelo vigário destituído de ordens que era ali o chefe político, o “beato”
humaníssimo, o “santo”.593 O seu título é outro: o “Padrinho”. Padrinho dos peregrinos
que acorriam à vila fascinados por sua fama, pelos “milagres” que ele atestava; e dos
bandoleiros que lá se albergavam, da pobre gente sem outra proteção, de quantos lhe
obedeciam na capital do “cangaço”, Juazeiro.
CONSEQÜÊNCIAS
Indignado, respondeu Dantas, que a convenção para tal fim devera ser nacional, não de
um partido; porém se do PRC, pelo menos os delegados tinham de ser indicados pelos
governadores...602 Nesta réplica cruzam os ferros caudilho e oligarquia, o poder que
centraliza e o poder regional que o repele, o personalismo presidencial e a província
resistente. A reação dinamita o pinheirismo, que se reforça com o apoio dócil do marechal
(“abrigado à sombra do PRC ”, diz ele, num discurso indiscreto)603 mas se desmantela com
a impossibilidade da candidatura do seu mentor. A atitude de Dantas é secundada pela
política fluminense (e Nilo Peçanha). Consultado sobre o nome de Pinheiro, Oliveira
Botelho, governador do estado do Rio, recusa-se a aceitá-lo. Cientes deste passo,
Francisco Sales (com os mineiros) e Cincinato Braga (com os paulistas) trataram de
aproximar os dois estados, dirigidos por Bueno Brandão e Rodrigues Alves. Em Ouro
Fino, Cincinato e Bueno combinaram (chamou-se de Pacto de Ouro Fino o acordo, de 21
de abril de 1913) que se consultariam antes de tomar uma decisão.604 Fracassa a manobra
de Pinheiro de dividir São Paulo, apresentando Campos Sales (que faleceu em 28 de
janeiro); a idéia de Nilo, de reunir os municípios em convenção, em vez dos delegados
partidários, produz a reunião formidável de 27 de julho, que sufraga o nome de Rui
Barbosa, e, ao mesmo tempo, o Partido Republicano Liberal, por ele criado605 — com a
mesma plataforma revisionista de 1910; e à vista do impasse Sabino Barroso lembra ao
governador de Minas o seu conterrâneo Venceslau Brás, vice-presidente, de reputação
intacta, porque sabiamente se isolara, na sua paz rural, de Itajubá. Não havia melhor
solução. O humorista gracejou: este (o de Venceslau) foi o caso único de promoção por
abandono de emprego...606 Pinheiro ainda quis acomodar, insinuando a candidatura de
Borges de Medeiros.607 O diretório situacionista de São Paulo dispunha-se a aceitar a
fórmula Rui-Glicério. Então Rodrigues Alves vibrou o golpe.
À revelia dos correligionários, cortando-lhes as combinações, telegrafou, decisivo, ao seu
colega de Minas: concordava com Venceslau. “Eis como se faz no Brasil um presidente da
república pelo arbítrio de um só homem”.608 A frase de Rui é injusta. Na realidade foi feito
pela coligação espontânea dos dirigentes estaduais contra dois adversários diferentes, o
temível homem forte e o gênio perigoso. Ambos os ameaçavam, um pela prática, o outro
pela teoria. O primeiro, humilhava-os; o segundo, com a rebelião do povo, o ódio às
oligarquias — os aniquilaria. Venceslau simbolizava a continuação legal, segura e hábil,
dentro do clássico bom senso mineiro...
PRUDÊNCIA E FIRMEZA
O FIM DE UM CHEFE
Àquele tempo pregava-se aos quatro ventos a eliminação de Pinheiro, contra quem,
pesadamente, caíam as acusações mais cruéis. Parlamentares, na sua tribuna, a imprensa
em linguagem desabrida, nos comícios oradores rancorosos, o indigitavam ao castigo. E
ele, sobranceiro, falando a estudantes que iam festejá-lo, citava César; que não esconderia
a face na toga, porém a descobriria, a olhar de frente os que o investissem... Um presságio
flutuava nesta retórica: era como se previsse o atentado nos degraus do palácio legislativo,
o seu vulto esguio de vencedor da guerra mais alto e imperioso no encontro com os
conspiradores assustados, e para lhe assistirem a serena coragem os “padres conscritos”, e
a república... Não acertou com o retrato de Brutus. Foi um pobre sujeito, fanático e
irresponsável, que o atacou silenciosamente, pelas costas, movido por um instinto
sombrio de vingança cívica, de exasperação indefinível... Chamava-se Manço de Paiva. Na
tarde de 8 de setembro de 1915 entrava Pinheiro no Hotel dos Estrangeiros para visitar
Rubião Meira, indigitado candidato ao governo de São Paulo. Ao subir as escadas
acompanhado de Bueno de Andrade e Cardoso de Almeida, aquele desconhecido, que lhe
seguira os passos, cravou-lhe duas vezes nas costas o punhal barato. “Canalha!...
Apunhalaram-me”, foram as suas últimas palavras; e tombou morto, sem tempo sequer
para divisar nas feições do assassino a imagem do ódio ou da loucura.
No final desse período difícil uma desordem grave encheu de apreensões o Sul do país.
Foi o banditismo (com a política de permeio) que tomara conta da região contestada entre
o Paraná e Santa Catarina, e, desafiando as expedições punitivas, enfrentava, mortífero, o
exército... Sem poderem acabar com aquilo, e declinando de qualquer responsabilidade na
rebelião obscura, ambos os governos, de Santa Catarina e do Paraná, pediram a
intervenção federal.
Correra o problema de limites pelo foro próprio, o Supremo Tribunal, mediante a ação
proposta pelo governo catarinense, em 1901. O acórdão de 6 de julho de 1904, 5 votos
contra 4, deu-lhe razão, mandando que passasse para a sua jurisdição o território abaixo
dos rios Saí (litoral), Negro e Iguaçu.616 A decepção dos paranaenses foi profunda, pois
consideravam suas as terras do Oeste, senhoreadas outrora pelas colônias militares de
Chopim e Chapecó, com os campos de Palmas, Santana, Irani. Rejeitou-lhes o Supremo
ambos os embargos, fundados em que a executória carecia de lei, que a fizesse cumprir;
mas o juiz federal em Curitiba (João Batista da Costa Carvalho) aceitou esta preliminar,
para suspender a aplicação da sentença.
MONGES E BANDIDOS
O seu sacrifício (como o de Moreira César, em 1897) alarmou a nação. Assaltado, com
58 praças, nos campos de Irani, João Gualberto tentou defender-se manejando a sua
metralhadora Maxim, que falhou; foi prostrado a golpes de facão; e ali ficou, morto, com
vários companheiros. E outros tantos fanáticos: entre estes, o “monge”. Desmoralizada
pelo inopinado da derrota, debandou a tropa...619 Para vingá-la requeria-se grande força.
O governo federal, intervindo, nomeou para o comando o General Setembrino de
Carvalho (que a 12 de setembro de 1914 assumiu em Curitiba a inspetoria da Região
Militar que abrangia os dois estados). Organizou — conforme os preceitos da guerra —
uma expedição das três armas, que somou sete mil homens, tendo por eixo de manobras a
cidade do Rio Negro: e dividiu-a em destacamentos, remetidos para todos os sítios onde
se acastelavam, nos seus “redutos”, os bandoleiros.620 À viva força, ou persuasivamente, o
exército chamou à obediência ou limpou de fanáticos aquele sertão e, em marcha
convergente — cortadas as possibilidades de fuga — alcançou o núcleo principal, ao norte
de Perdizes, “reduto de Santa Maria”.621 Este, o Canudos do Contestado. Tratava-se de
uma posição quase inexpugnável, a cavaleiro do vale, entre espessas florestas e taquarais
impenetráveis formando, sob a umbela do arvoredo, complicado sistema defensivo...
Debalde — em 8 de fevereiro — uma coluna tentou tomá-la, a rajadas de metralhadora e
ponta de baioneta. Voltou, com numerosas perdas. Era aconselhável dividir a tropa, para
que o ataque fosse pelo Sul e pelo Norte. Da coluna do Norte se encarregou o Capitão
Tertuliano Potiguara: e com tal ímpeto, que invadiu o “reduto”, e aí se manteve, até que,
prevenida por mensageiros, que se escoaram na mata, também entrou em ação a coluna
do Sul, esmagando as últimas resistências. A tomada de “Santa Maria” — a 5 de abril de
1915 — pôs termo à campanha, que custou ao exército doze oficiais e para cima de 300
soldados.622
O ACORDO
Dirimiu a pendência de limites o acordo a que o Presidente Venceslau Brás ligou o nome,
chamando à conversação os governadores. Foi celebrado no Rio de Janeiro, a 20 de
outubro de 1916. Santa Catarina ficava com 25.510 quilômetros quadrados, e o Paraná
com 20.310. O traço fronteiriço, eqüidistante do Iguaçu e do Uruguai, passando por Rio
Negro, e União da Vitória, deixava em território paranaense Palmas e Clevelândia.
REALIDADE UNIVERSAL
NEUTRALIDADE E INDIGNAÇÃO
Logo a 4 de agosto, notificado pelo embaixador alemão do estado de guerra do seu país
com a França e a Rússia, decretou o governo o cumprimento rigoroso das regras de
neutralidade.623 Estendeu-as, por atos sucessivos, às relações com os que se foram
metendo na luta.624 Mas as condicionava às circunstâncias do comércio marítimo,
subordinado ao bloqueio das esquadras aliadas, que dele excluía a Alemanha; e à
inclinação das populações, atraídas para a causa “democrática”. Começou essa
manifestação — crescente e inestimável — das preferências populares quando, a despeito
de seu status de nação neutral, desde 1839, os exércitos do Kaiser invadiram a Bélgica e,
de roldão, se lançaram sobre Paris. Além da inversão do direito internacional (diria Rui,
dois anos depois), o que perigava era o próprio núcleo de cultura e tradição onde pulsava
o coração do humanismo, nesta civilização ferida de morte... A batalha do Marne,
rebatendo a ofensiva, mudou-lhe o curso. A França resistia; e a Inglaterra, senhoreando os
oceanos, deles varrera os corsários. Lutava-se por uma forma de existência, entre as
democracias e a Kulturkampf, o direito da força, as conclusões radicais a que o
germanismo chegara através dos marechais e dos professores.625 Não era difícil a opção
para um povo educado nas fórmulas liberais, e, como o nosso, sobretudo sensível ao apelo
das vítimas, à causa dos fracos, às atrocidades desencadeadas pela conquista...
Improvisaram-se, no Rio e nas capitais dos estados, “ligas pró-aliados”. Recém-chegado
da Europa, onde pudera medir a extensão daquelas ameaças, Miguel Calmon fizera na
Bahia um discurso previdente, que chamou As lições da guerra (1915). Os militares que
redigiam A Defesa Nacional telegrafaram-lhe, que viera cooperar na propaganda do
serviço obrigatório, “a fim de poupar o Brasil das tribulações futuras”.626 Outro não foi o
sentido da Liga de Defesa Nacional, que, com Pedro Lessa, fundou em 7 de setembro de
1916, tendo por intérprete peregrino quem, desde outubro de 1915, falando aos
estudantes de São Paulo, se fizera o arauto da mobilização: Olavo Bilac.627 Instituído em
1908 o sistema do sorteio ficara até aí letra morta, à espera de que o aceitassem.
Obrigatório... para quê? Para rejuvenescer, infundir vida nova à pátria, clamou o poeta —
levando, profético, à mocidade das escolas, o grito de alerta.628 Festejando-o, o exército lhe
oferecera (15 de novembro de 1915) um banquete: associava-se à inteligência, para
persuadir e arregimentar. Não parou mais: falou à Marinha, celebrou liricamente, no dia
da bandeira, o símbolo nacional; foi a Minas, onde Afonso Arinos dera, em 1915, “o
primeiro grito de alarma”, ao Rio Grande, ao Paraná; fez, em transportes de eloqüência, a
propaganda das armas: e a 10 de dezembro de 1916 a inauguração do sorteio — em todas
as regiões militares — foi uma cerimônia comovente. A Liga cumpria o objetivo: e
floresceram os “tiros de guerra”, com a inscrição em massa do voluntariado entusiasta...
Rui Barbosa teve parte grande nessa excitação: por ele, desmascararia o Brasil desde o
primeiro instante o apoio aos aliados, vociferando, do alto de sua torre espiritual, o
protesto contra a agressão e a estupidez dos tiranos! A “Nação armada”.629
EM GUERRA
Foi com essa fria lógica que o brasileiro encarou a entrada na guerra do seu país,
desprevenido para uma colaboração ativa, sem elementos agressivos para isto,
contentando-se em preparar, no interior, as forças “de observação”, em aviar, para o
patrulhamento do Atlântico, uma divisão naval, e em expedir, para o serviço dos
hospitais, uma juvenil missão médica.636
Batalhões de voluntários dos estados desfilaram numa parada reluzente pelas avenidas
cariocas. As outras nações viriam conosco, vaticinou Rui, saudando no Teatro Lírico (18
de setembro) os atiradores baianos:637 e virando a página, chamou-lhes a atenção para “o
exemplo moscovita”.
O movimento cívico da Liga era dúplice: militava, para os riscos da guerra, mas educava,
para os deveres da paz. “O Brasil ainda não está feito, como pátria completa... Como fazê-
lo?” (discursava Bilac em Niterói, a 15 de novembro do mesmo ano).639 “São quatrocentos
anos de vida”, lembrara aos paulistas (2 de abril de 1917).640
POLÍTICA PATRIÓTICA
ÚLTIMA EPIDEMIA
Mostrara a guerra que carecíamos de defesa armada. Provou a “gripe” que não tínhamos
defesa sanitária. Foi a de 1918 a última epidemia a lembrar, com o caráter calamitoso, as
pestes que tão funda lembrança deixaram no espírito popular: com a novidade de apanhar
de surpresa o Rio de Janeiro convencido de que, com a extinção da febre amarela, não lhe
conheceria mais os horrores. Reconheceu-os — ao desembarcar no porto, vindo de
África, o primeiro grupo doente da influenza, que se declarara em vários sítios da Europa
e ferira, em Dacar, a expedição brasileira. Era em setembro.642 Logo a Diretoria da Saúde
explicou que a natureza universal da moléstia zombava das medidas profiláticas, não
havendo o que fazer, se chegasse. Chegou.
AS AGITAÇÕES SINDICAIS
O “após-guerra” (no Brasil e no resto do mundo) caracterizou-se pela eclosão das grandes
greves, que selaram, em 1919, a sorte de uma política: a de indiferença pela questão social.
Assessoraram Rui naquela oração, a mais fraca da campanha, diz Evaristo de Morais, este
(com José Agostinho dos Reis e Caio Monteiro de Barros) e o industrial Jorge Street, por
sinal o único citado, pois na verdade foi o seu pensamento conciliatório que prevaleceu na
tímida conversão do chefe do liberalismo brasileiro. Ouçamos o depoimento de Evaristo
de Morais:
Freqüentemente acode-me ao espírito a lembrança da longa conversa em que eu, o saudoso José Agostinho dos Reis e
Caio Monteiro de Barros ministramos a ele os dados concretos, os comprovantes, que deveriam servir para a feitura
da conferência, vinte e quatro horas depois. Ele pasmava, diante dos quadros, que lhe apresentávamos, de misérias,
sofrimentos, vexames e explorações, a que estão sujeitas algumas classes trabalhistas, parecendo-lhe incomportável a
situação por nós descrita. E Deus sabe quanto e quanto lhe custou, abandonando os princípios do seu velho
liberalismo econômico, sugerir, de público, providências legislativas de cunho intervencionista! Por aí se vê até que
ponto ia a quase geral despreocupação dos nossos homens públicos, perante os vários problemas que o socialismo
procurava resolver.651
Falando em seguida aos “operários baianos” (15 de abril), não insistiu Rui em iniciativas
assistenciais, ou nas promessas da intervenção protetora: limitou-se a honrar o trabalho,
operário que também era, com meio século de dura fadiga.654 Desafiou, isto sim, o
conservantismo inabalável (anti-revisionista, antes de tudo) cujo quartel-general era a seu
ver a situação rio-grandense.
Do Rio Grande (quem o imaginaria em 1919?) havia de sair dez anos depois o ímpeto
revolucionário que retomou o pensamento ali ousadamente exposto. Espaços iguais
separam a evolução social-democrática de Rui Barbosa (1909–19) e a evolução política da
república (1919–29). Apenas a “revisão”, inviável àquela época, teria de fazer-se em 1930
por força das armas e não pelo prestígio da palavra.
EPITÁCIO PESSOA
Foi inútil a pregação do “apóstolo”. De tal forma que ele próprio reconhecia, a 17 de
julho, o resultado da eleição, e pedia para o novo governo uma expectativa pacífica.
Seria assim, se a sementeira dos problemas partidários (e a frustração ideológica) não lhe
atulhassem de obstáculos o caminho. A começar pelo ruísmo baiano.
NA VELHA BAHIA
Como o caso da Bahia sombreou os primeiros tempos do novo governo, é preciso explicá-
lo. Seabra foi o primeiro, o mais forte antagonista de Rui, na campanha presidencial que
acabava de encerrar-se. A prova desta malquerença deu-a Rui no violento discurso
proferido no Politeama Baiano, em que castigou com o seu mais contundente vocabulário
o conterrâneo e desafeto. O Governador Antônio Moniz manteve-se fiel a Seabra. Eleito
sob os seus auspícios, não teve dúvida em apoiá-lo para a sua sucessão. Forte e agressiva,
mais agressiva e forte depois da volta de Rui à Bahia em abril de 1919, a oposição regional,
aglutinada desde 1916, dispôs-se a enfrentá-lo nos comícios abertos. O primeiro, a 25 de
março, terminou estupidamente, dispersado a tiro, pelos correligionários de Seabra.657 O
sangue aí derramado dividiu irreparavelmente as forças.658 Foram às urnas, levando a
coligação oposicionista o nome do juiz federal Paulo Fontes. Acorreu Rui ao seu apelo,
para prestigiar-lhe a causa na capital, no Recôncavo, nos sertões. Aos que lhe tinham
destruído a candidatura antepôs o espírito popular; fulminava, nessa ronda inesperada, os
adversários; chegou-se a pensar que os bateria no pleito. Seria ignorar o poder da
máquina; e a fatalidade de uma eleição apenas fiscalizada, ou real, nos grandes centros,
mas à mercê dos chefes locais nos seus redutos intocáveis... Ganhou Seabra. Sublevaram-
se os sertões, tendo na capital o seu megafone: o jornal de Simões Filho, A Tarde.
Qual a verdade daquela guerra simulada, que, segundo o noticiário estridente, mobilizou
cinco a seis mil clavinoteiros, a cuja frente voaram, a “redimir o Estado”, os coronéis —
com os seus cabras? Quem os armara, como se planejou o movimento, que possibilidade
tinha de sucesso, descendo, maciço, sobre a capital, assombrada e indecisa? Exagerava-se,
é certo, a dimensão do levante sertanejo, cuja direção assumiu, nas Lavras Diamantinas, o
Coronel Horácio de Matos, chefe de Mucujê, com o seu batalhão de garimpeiros. O fato é
que a força policial não pôde com ele; e impotente para restabelecer a ordem, ou temendo
que a alterasse às portas do palácio a amotinação das ruas, o governador requisitou (17 de
fevereiro de 1920) a intervenção federal.659 No dia imediato quem a pediu foi a oposição,
pela voz de um amigo, o presidente do Tribunal, Bráulio Xavier. Epitácio — prudente —
tentou conciliar. Quis habilmente conciliar em sacrifício de Seabra, mas atraindo Rui. Se
renunciasse o primeiro, eleger-se-ia, em compensação, pessoa dele (lembrou Torquato
Moreira), que pacificaria, só com isto, o Estado. Seabra recusou; insistiu; aceitava o
presidente do Senado estadual, Frederico Costa; discordou a oposição... À vista da
divergência, fez o presidente da república o que lhe cumpria. Interveio por intermédio do
comandante da região (General Cardoso de Aguiar). Protestou Rui, com a fertilidade do
seu saber jurídico; justificou-se Epitácio, com exuberância de razões.660 Interveio forçado,
para restaurar a legalidade; restaurou-a. Permitiu que Seabra se empossasse pela segunda
vez no governo da Bahia.
Autoritário, sabendo o que queria, tinha a fibra dos duros homens de sua raça, com a
sua valentia e a sua perseverança. Como não subira acomodando interesses, mas, ao
contrário, sobrepujando-os, não se prendia a ninguém. Espantara a timidez política
pondo nas pastas militares ministros civis, Calógeras e Raul Soares. Como no pacífico
reinado de Dom Pedro II... Parecia uma provocação: pela primeira vez na república se
ousava isto. Logo reconheceu o exército o austero Calógeras como um dos melhores
ministros que o serviram. Renovou as instalações, mandando construir uma rede de
quartéis, adquiriu copioso material, incrementou as indústrias de guerra, organizou a
aviação, com a competente Escola...661 A administração, notável nos assuntos militares, foi
empreendedora na viação (1.200 quilômetros de vias férreas) e pioneira no combate às
secas, ponto essencial do seu programa. Vindo do Nordeste, identificado com as suas
angústias, quis Epitácio ser o salvador da sua desafortunada gente: e — entregando o
comando das obras ao engenheiro Arrojado Lisboa — mandou atacar a construção de
açudes. Com rapidez, técnica estrangeira, enorme quantidade de material importado, se
abriram naquela região perto de 500 quilômetros de estradas de ferro, 205 açudes, 220
poços... Só não previu a suspensão dos trabalhos, com perda de parte do equipamento,
por quem lhe sucedesse.662 Nem desatendeu ao café paulista. Usou com largueza o crédito
externo, 50 milhões de dólares, mais 9 para a liquidação da valorização do café, ainda 25
para a eletrificação da Central, que não chegou a começar... Agradeceu-lhe São Paulo o
socorro ao café. Politicamente, respaldou-o.
REAÇÃO REPUBLICANA
O FATOR MILITAR
Desbordou o desgosto explosivo das classes armadas. Em junho (de 1921) assumira-lhes o
comando simbólico, que tanto valia a sua elevação à presidência do Clube Militar, o
venerando Marechal Hermes. Podia ser candidato à sucessão de Epitácio. Pondo de lado
os velhos ressentimentos, Rui Barbosa fez da evocação de Deodoro o traço comum, das
aspirações regeneradoras, e falou à oficialidade do Clube, numa reconciliação comovente.
Chegou a acariciar a hipótese da revolução que fosse outro Quinze de Novembro!
Escreveu a Nilo Peçanha: “Considero o concurso delas (forças armadas) imprescindível
neste momento, pois tenho a situação atual do país como mais grave do que em 1889, e
vejo nesse elemento a força única de estabilidade e reorganização que resta ao povo”.666
Desiludiu-se, ao surgir a candidatura de Nilo (estranho àquela... “reorganização”);
retrocedeu às bandeiras da estrita legalidade — que já não flutuavam sobre a exaltação das
patentes jovens. Explorou-lhes a intransigência o conluio de que resultou — inesperada
provocação — a “carta falsa” de Bernardes.667 É um episódio singular, o do mistificador,
que tendo imitado a letra do candidato numa carta cheia de insultos ao exército
(inverossímil na sua grosseria), conseguiu transformá-la no estopim da insurreição.
Absurda e contestada — produziu o seu efeito ao ser ardentemente debatida na
assembléia do Clube Militar (a 21 de dezembro).668 Decidiu esta que — com desmentido e
tudo era... verdadeira. E entregou-a ao “juízo do país”.
A CAUSA REGIONAL
5 DE JULHO
Os políticos não iam tão longe, que preparassem na caserna o movimento. Alguns
conheciam-lhe a trama; a maioria a receava. O mais interessado em contorná-lo era, no
Sul, o governante que iniciara a resistência. Nilo não se envolvera na conspiração: temia
que afetasse a política fluminense:673 Seabra preservava a da Bahia. Rui apoiou, no Senado,
a decretação do sítio. O golpe de 5 de julho foi apenas militar. Parecia inevitável, desde
que o Clube, surdo aos desmentidos, insistira em considerar autêntica a injuriosa carta
atribuída a Bernardes; naquela coerência ia da desconfiança ao desafio. Preso o presidente
e fechada a sede, abrira-se-lhe o dilema, do silêncio disciplinado — vitória do governo —
ou da violência, que o derrubasse. As altas patentes pediam calma; mas não podiam
demover tenentes e cadetes, diferentemente informados sobre a crise, e nela mergulhados
com a veemência flamante do idealismo.
Pelo seu jornal, Borges de Medeiros condenou logo a revolução. Era “pela ordem”.678
Esta declaração formal esfriou no extremo Sul a agitação prometida. Repercussão isolada
do levante de 5 de julho foi o da guarnição de Campo Grande, no Mato Grosso, às ordens
do General Clodoaldo da Fonseca. Esbarrou nas barrancas do Paraná com a expedição
mista, da polícia paulista e da força federal do Coronel Tertuliano Potiguara;679 soube que
havia paz no resto do país; e capitulou.
O CENTENÁRIO
GOVERNO INABALÁVEL
Presidente, após tão áspera luta, representou Bernardes a autoridade resoluta, exercendo-
a com o pleno poder de polícia. Não criara a situação: herdara-a, com o problema político,
da inconformidade, agravado pela questão militar, da repressão. Poderia experimentar o
velho remédio da anistia, segredo da “paz imperial” e feliz manobra de Prudente de
Morais para a restauração da ordem civil.681 Não o achou oportuno, quando corria,
apaixonando a opinião, o processo dos revoltosos; julgou que a suavidade lhe seria
tomada como terror ou recuo; foi inabalável. Não o ajudou, por outro lado, o ambiente,
em que à agressividade da imprensa se unia a desconfiança das classes armadas. O seu
ministério tinha valores evidentes, João Luís Alves na Justiça (jurista que declarara
legítima a Constituição positivista do Rio Grande, incapaz de atirar contra a magistratura
o governo), Miguel Calmon na Agricultura, Félix Pacheco no Exterior, Oliveira Botelho
na Fazenda, Alexandrino na Marinha, Setembrino na Guerra.
DESMONTE
No estado do Rio abriu-se o conflito, entre os nilistas, que elegeram presidente Raul
Fernandes, e os bernardistas, que diziam ter elegido Feliciano Sodré. Competindo o
reconhecimento à assembléia, surgiu a dualidade desta, com a reunião dos candidatos
oposicionistas em outro local, para decidirem que eleito fora Sodré, e não Fernandes.
Tumultuada a política fluminense, socorreu-se o presidente proclamado pela assembléia
legítima do habeas‑corpus, que por seis contra cinco votos, lhe deu o Supremo Tribunal
(31 de dezembro de 22). Empossou-se perante o Tribunal do Estado, e, em palácio,
recebeu o governo das mãos do antecessor, Raul Veiga. Faltou-lhe a aprovação do Catete.
Não trataram com ele os funcionários; lavrou pelo interior a desordem; a polícia começou
a ausentar-se. Para pôr cobro à situação, desfechou o presidente da república a
intervenção, nomeando interventor Aurelino Leal,682 que restabeleceu a normalidade
administrativa no estado.
Esses sucessos reforçaram a posição de Nilo Peçanha como chefe ostensivo da oposição
a Bernardes.
A REBELIÃO NO SUL
Talvez não se registrassem os fatos que, por oito meses, abalaram o Rio Grande, se Borges
de Medeiros, atento às condições do país, aproveitasse o ensejo para sair da cena,
apresentando à sucessão um nome de concórdia. Os correligionários mais lúcidos por isto
esperavam; deixaram correr o tempo, enquanto o seu silêncio parecia indicar que
meditava sobre a renúncia. Puro engano: três meses antes da eleição, e porque urgisse
lançar o candidato governista, não houve jeito senão proclamar o nome do velho Borges,
em torno do qual se uniu o partido — a defrontar, com a pujança que lhe dava a simpatia
federal, o de Assis Brasil, escolhido pela Aliança Libertadora. Este título significava tudo:
movimento, convocação, liga para o que desse e viesse, menos para eleger do que para
libertar...
A eleição visivelmente não favoreceu Borges, que, para se reeleger precisava de três
quartas partes do eleitorado; mas não seria a assembléia, unânime, quem isto dissesse.
Esboçou-se um acordo, sob a forma de um tribunal para a apuração (como em 1922
sugerira ele a Nilo Peçanha). Fracassou porque Assis Brasil queria que se lhe conferissem
outros poderes. E estourou a rebelião.
Não era arrogante, mas sincero. Foi essa vigorosa resistência à intimidação que levou os
revolucionários (persuadidos por Setembrino) a aceitar o pacto, que se chamou de Pedras
Altas, porque foi assinado na estância desse nome, de Assis Brasil. Constituiu, à primeira
vista, a vitória de Borges, que ficaria no governo, reeleito (com os duvidosos dois terços da
votação); mas importava, retardada, a vitória da oposição, pois devia ele, ao mesmo
tempo, empreender a reforma constitucional, que proibiria a reeleição do presidente do
estado, e, bem assim, faria eletivos o vice-presidente e os prefeitos, para que o Rio Grande
— abandonada a Constituição castilhista — uniformizasse pelas demais do país a sua
organização política. Terminava, com o pacto de Pedras Altas, a rebelião de serra acima;
mas igualmente a ditadura positivista, que Gaspar e Joca Tavares não tinham conseguido
abalar. Cumpria-se a previsão de Pinheiro (com quem começara a cair o regime, a que
dera a energia do seu raro espírito de chefe). Desajudado do governo central, investido
pela oposição, que tanto sabia discutir como brigar nos “entreveros” gauchescos, sacudido
pelo infortúnio político, desde que moralmente se comprometera em 1922 com a
sublevação, contra a candidatura oficial — não podia sobreviver às condições que até aí o
tinham justificado. Devia desaparecer com a transformação da república. Em verdade na
de 1923 se entronca a revolução de 1930 — com a contradição de ser ganha a primeira
pelos homens que amparavam a estrutura conservadora, e por eles desfechada a segunda,
contra o continuísmo e a rotina oligárquica — na esfera federal.
O tenente-coronel dos provisórios de São Borja seria, sete anos depois, o candidato da
aliança contra o Catete.
REVIRAVOLTA
NOVAMENTE A SEDIÇÃO
Entre 5 e 8 de julho travaram-se combates de rua, troou a artilharia, rastilhou a luta pelos
quarteirões centrais,692 fracassou o assalto ao palácio, não conseguiram os rebeldes
manter-se na repartição dos correios e telégrafos, aos arredores chegaram os primeiros
escalões legalistas. E a notícia das providências esmagadoras do governo federal!
Malograram as articulações com o Sul, o Norte, o Oeste, ou as reduziram, em Mato
Grosso, em Sergipe, na Amazônia, a revoltas locais, prontamente circunscritas.693 No
Congresso Nacional as bancadas — sob a chefia ágil de Antônio Carlos, leader mineiro —
hipotecaram solidariedade a Bernardes, dando-lhe de imediato o sítio para a capital, os
estados do Rio e São Paulo. Fato expressivo: o dividido Rio Grande uniu-se nesse apoio
sem reservas ao presidente que ajudara os libertadores sem destruir o castilhismo; e
quando, solitária, a voz de Bergamini se alçou num “viva a revolução”, a réplica de
Antônio Carlos recordou a de Ouro Preto ao Pe. João Manuel, no último episódio
parlamentar do império... Os contingentes mais agressivos mandados à linha de fogo
foram os batalhões policiais do Rio Grande, da Bahia, de Minas, do Espírito Santo:
cerraram o círculo da aliança situacionista... Exército e Armada corresponderam às
esperanças do governo. Acorreu a Santos (sob o comando do Almirante José Maria
Penido) uma divisão naval, que incluía o Minas Gerais. Dela destacou um contingente de
fuzileiros com duas peças (comandante, Helvécio Coelho Rodrigues) que, subindo a serra
pela estrada de ferro, intacta, varou a cidade, até o palácio presidencial; e fez ali pé
firme.694 Ficou até que os rebeldes, alvejando o edifício, com granadas de 105, forçaram
Carlos de Campos a retirar-se — no dia 8.695 A 9, assumiu a chefia das forças legais o
General Eduardo Sócrates. A sua estratégia não parecia complicada: limitava-se ao cerco.
Tomadas as saídas, com superioridade numérica (15 contra 3 mil) entraria pelo sulco do
canhoneio... Permaneceu na cidade o Prefeito Firmiano Pinto, devotado, com bravura, ao
socorro da população. Ajudaram-no o presidente da Associação Comercial, José Carlos de
Macedo Soares,696 a caridade do Arcebispo Dom Duarte Leopoldo, a Liga Nacionalista.
Não fosse isto, e São Paulo sofreria danos incalculáveis. O General Isidoro (ditador por 18
dias) teve a habilidade de prestigiar o esforço civil, que, afinal, lhe aquietava a retaguarda;
mas se convenceu de que perdera a partida. A revolução não passara das forças armadas
ao povo, sem papel nesse duelo militar. Pudera atrair o operariado (que para tanto
recebera, no Rio, promessas e conselhos).697 Temeu — ou temeram — o caráter
subitamente social, senão extremista, da revolução que não tinha tal programa. Evitou-o.
O próprio Bergamini, a invocar, na câmara, os abusos policiais, dizia que era um motim...
Desacreditava-se, antes da imolação, o movimento, que, podendo abalar o país, ia acabar
(ao que se cria) numa capitulação inglória. Não acabou. Porque era mais do que uma
quartelada; era a revolução, em que alguns oficiais intransigentes entravam de corpo e
alma.
Brigariam, como os de Copacabana, até o fim! Compunham-se as forças rebeldes do 4º e
5º de caçadores, 4, 5 e 6 de infantaria, dois batalhões da polícia, o seu regimento de
cavalaria e o corpo-escola, o 2º de artilharia de montanha com uma bateria, o 4º montada,
com duas. Como todas as unidades se apresentavam desfalcadas, somava tudo três mil
homens. Os legais (desembarcados em Santos, transportados pela Central, despachados
do Sul, pela São Paulo–Rio Grande) distribuíram-se em leque, fazendo eixo no Tietê: a
brigada do General Carlos Arlindo (com a porção legalista da polícia de São Paulo, os
navais, polícias do estado do Rio e do Espírito Santo, quatro batalhões de caçadores, duas
baterias) vinda de Santos, em São Caetano, sobre Vila Mariana e o Ipiranga; a brigada do
General Tertuliano Potiguara, a mais agressiva, em ordem de avanço sobre o bairro da
Mooca (dois regimentos de infantaria, a polícia gaúcha, o apoio da artilharia divisionária);
a do General Florindo Ramos (10º de caçadores, 12° regimento de infantaria, a polícia de
Minas, protegida da mesma artilharia) sobre Brás e Belenzinho; a do General Pantaleão
Teles (o 5º de infantaria, dois batalhões de caçadores e cobertura da artilharia
divisionária) sobre os trilhos da Central; a do General João Gomes (15º de cavalaria, dois
regimentos de infantaria, uma bateria do 9º) sobre Vila Maria e Santana.698 Do Sul se
deslocou — sob o comando do General Azevedo Costa — forte coluna formada de
elementos do Paraná e batalhões patrióticos organizados por Fernando Prestes,
Washington Luís, Ataliba Leonel, que, ocupando Sorocaba e Itu, poderia, se apressasse o
passo, cortar a retirada aos rebeldes, tanto pela Sorocabana como pela Paulista.699
Não quis Miguel Costa, com a polícia, abandonar a cidade, para se atirar à duvidosa
arrancada, ao Vale do Paraíba. Sobreveio a ofensiva. A 15 caiu mortalmente ferido, à
frente dos seus homens, o Capitão Joaquim Távora, depois de Isidoro o grande nome do
movimento: a sua perda foi para ele uma catástrofe. Esboçou-se a 17 uma tentativa de
armistício, de que seria intermediário o General Abílio: falhou porque Isidoro exigia a
renúncia de Bernardes...700 A 26, sob a ameaça de cem canhões, estarrecida a cidade com a
intimação lançada em boletins por aviões do exército, do bombardeio sem misericórdia —
desejou Isidoro saber as intenções do General Sócrates. Peremptório, respondeu: rendição
ou arrasamento... Já aí tinha de defender-se em duas frentes: contra o adversário — que
lhe disputava as trincheiras, entrando, com crescente resolução, os bairros da periferia, e o
terror do povo, a quem se prometia a inclemência de um canhoneio cego... Começou sem
alvo razoável, para quebrar a resistência, ignorando-se que proporções atingiria...701
Isidoro não esperou mais. A 28, nos trens da Paulista, com armas e bagagens, embarcou
silenciosamente a tropa, e partiu, para Bauru, a Noroeste, a etapa imprevista da revolução
de julho, os sertões brasileiros.
XXXIII: INTRANQÜILIDADE
REVOLUÇÃO VOLANTE
Com cerca de 800 homens, a coluna que abandonou São Paulo em direção a Botucatu,
Bauru, Três Lagoas, tanto podia meter-se por Mato Grosso, para se juntar a outros
núcleos rebeldes, como, descendo o Paraná, procurar as prometidas articulações com o
Rio Grande. O Coronel João Francisco defendia este último plano, o General Isidoro o
primeiro. Prevaleceu a necessidade da descida do rio com o desastre de Três Lagoas —
onde a expedição perdeu, atacando forças muito superiores, metade do seu efetivo.702
Frustrada a invasão de Mato Grosso, em dois pequenos vapores caiu sobre o porto de
Guaíra — que a guarnição (Capitão Dilermando de Assis) teve de abandonar703 — e foi
estabelecer-se em Foz do Iguaçu, a retaguarda protegida pela fronteira internacional.
Contavam os revolucionários com um generalizado movimento no Rio Grande, que lhes
abriria os rumos da vitória. Explodiu realmente, no vasto círculo que ia de Santo Ângelo a
Alegrete, seguindo a linha do Rio Uruguai (29 de outubro de 24).704 Vencida em Alegrete
a primeira investida, a força insurreta foi unir-se em Uruguaiana ao contingente civil do
General Honório de Lemos — veterano das lutas federalistas705 — e sofreu, nas alturas de
Guaçu-Boi, tremendo revés. Comandava as forças adversárias Flores da Cunha. O
insucesso da rebelião condenou-lhe os chefes (Honório e Zeca Neto) a uma campanha
inconseqüente, entre as Serras de Caverá e Camaquã, a saída pelo Jaguarão e, por fim, a
emigração salvadora, para o Uruguai, em Iceguá.706 Parte da Coluna, cortada do grosso da
tropa, asilara-se na Argentina. Deslocou-se o eixo da luta para a zona das missões, onde
avultou, pela autoridade que soube impor, com a patente de capitão e o renome de
matemático, Luís Carlos Prestes. Revoltando o batalhão de ferroviários de Santo Ângelo,
ligara-se ao 3º de cavalaria de São Luís e ao 2º regimento de São Borja, contava com a
queda de Itaqui (ao ímpeto do destacamento do Capitão Benévolo e do Tenente Siqueira
Campos) e esperava o auxílio das forças da fronteira. Sucederam-se, porém, os reveses,
destroçado o grupo de Benévolo e morto o seu comandante em Itaqui, forçada a
concentração defensiva em São Luís, desbaratada a investida a Tuperecetã (Tenente João
Alberto), sem esperança de melhores resultados ao Sul, a insistir o General Isidoro — por
mensageiro que lhe enviou de Foz do Iguaçu — para que fosse ao seu encontro, a fim de
reunirem as forças para operações consideráveis.
Formou-se assim a “Coluna Prestes” — e, com mil homens do exército e outros tantos
civis, rumou para o Norte. Abriu a viva força o seu caminho através do Ijuí, infletiu-o
para as margens do Uruguai depois do sangrento combate de Ramada, perto de
Palmeira,707 perdeu na travessia do Rio Pardo um de seus oficiais, Portela Fagundes
(substituído pelo Capitão Osvaldo Cordeiro de Farias), varou a floresta catarinense, para
Foz de Iguaçu.
COLUNA‑FANTASMA
ESTADO DE SÍTIO
REFORMA CONSTITUCIONAL
WASHINGTON LUÍS
Como acontecera com a de Venceslau, a sucessão de Bernardes foi fácil. Decidira-se este
por Washington Luís, que o sustentara nas incertezas de 1922, e somente transigiu quanto
ao vice-presidente, que viria do Norte (possivelmente o Ministro da Agricultura, Miguel
Calmon),719 mas acabou vindo de Minas — Melo Viana. É que o presidente do estado
esboçara a sua oposição ao nome paulista; chegara a crer que fosse, em segredo, o
candidato de Bernardes (bastante poderoso, em 1925, para fazer o sucessor);720 e
apaziguou-se, contentando-se com a vice-presidência. Volvia-se à fórmula de 1902,
Rodrigues Alves e Afonso Pena; de 1918, Rodrigues Alves e Delfim Moreira. Até aí, tudo
corria normalmente. Apresentado candidato pelo PRP, num banquete em Santos, em
seguida pelo situacionismo de Minas, Washington Luís foi proclamado — sem
competidor — na habitual convenção, presidida pelo Senador Azeredo; e viajou pelos
estados, curioso de suas necessidades. Assumiu o governo em 15 de novembro de 1926,
num ambiente de expectativas benévolas, justificadas por seus créditos de administrador,
sua firmeza de probo estadista, sua notória lealdade servida por uma energia exemplar. Os
psicólogos reparavam que a um homem forte — inflexível nas suas diretivas — substituía
outro homem forte...
ESTRADAS E MOEDA
E conspirava-se...
Voto secreto, democracia de verdade, exigiam os novos partidos: e, pela primeira vez,
cartazes de propaganda e caravanas passearam por São Paulo um movimento,
aparentemente de mera agitação intelectual, mas que não iludia ninguém sobre as
tempestades que anunciava.
A Melo Viana sucedera, em Minas Gerais, Antônio Carlos, para cujo lugar de líder da
maioria foi o paulista Júlio Prestes.
Vinham das fontes municipais, da tradição ortodoxa desse regime, que, como veremos,
demoliram sem piedade, solidários com a sua interpretação habitual e comprometidos
com os seus episódios recentes. Ambos tinham apoiado a legalidade contra os levantes
militares, tinham sustentado a intransigência dos três últimos presidentes, estavam com
serena coerência na história da reação. Apenas (e foi a sua revelação no governo estadual)
essa sistemática não lhes moldara o caráter, que em Antônio Carlos propendia para uma
conciliação vistosa, com as massas (voto secreto, em Minas!) e em Getúlio Vargas para
uma útil conciliação, com os antagonistas. Quis este dar descanso ao Rio Grande, fatigado
das cavalgatas guerreiras; aquele, sacudir o país, farto da melancolia de uma política
desligada do povo... Confraternizariam na hora em que o Catete os convidasse a unir os
gaúchos e comover as multidões... contra o Catete.
Começou Vargas a sua carreira de pacificador constituindo, sem ouvir o velho Borges, o
secretariado, cujo vulto principal, Osvaldo Aranha, era da geração nova. Sustentara em
1923, armas na mão, o governo. Ferido em combate, o tributo pago ao borgismo lhe dera
autoridade para pregar a concórdia, em nome de projetos amplos. Reivindicava para o
Estado o seu quinhão de influência na direção nacional. Aranha e Vargas, quando
estudantes, não haviam escapado ao ambiente emocional da política, que sempre os
fascinara. Quando Afonso Pena, em 1906, visitou Porto Alegre, o intérprete dos
acadêmicos de direito o saudou profligando (para elogiar Pinheiro) a tese condenável da
imposição do sucessor pelo antecessor. Negava ao presidente o direito de sagrar o
herdeiro... Este orador incisivo foi Getúlio Vargas. Aranha, ruísta exaltado durante o
curso jurídico do Rio de Janeiro, opusera-se com fúria a Pinheiro. Enquadrado depois no
oficialismo da terra natal por força das circunstâncias (seguindo a sorte da família e a
imposição do meio, no seu município de Itaqui), jamais seria um devoto dos dogmas de
Castilho. Junto a Vargas, completavam-se. Só um clima de eqüidade diluiria os rancores
que duravam cem anos.727 Esse governo enveredou espertamente pela experiência do
apaziguamento; deu aos adversários a esperança de que tomariam o poder, não a repelões
de violência, mas a golpes eleitorais; concitou-os à colaboração. Disto resultou logo que
Assis Brasil se afastasse do grupo revolucionário, dos exilados. Nos acampamentos
maragatos a antiga flâmula vermelha foi substituída pela nova bandeira, eleitoral:728
candidaturas, em vez de espadas e lanças... Se era possível aquietar o Rio Grande, fácil
seria unificá-lo, para a conquista federal. Pensavam com lógica: fracassara até aí uma
candidatura rio-grandense, porque a divisão interna, cortando em zonas o estado, não a
tornaria nunca expressão de todo ele — com a sua força. Só se um fato mágico (e o nome
gaúcho à presidência teria este valor) empolgasse, convencesse, arrastasse aquela gente
ressentida e brava...
CANDIDATO GAÚCHO
Antônio Carlos não podia ser posto de lado. Competia-lhe, tacitamente, a sucessão.
Ficou com Júlio Prestes — insistindo na tentativa malograda de Rodrigues Alves com
Bernardino, de Pena com Campista: a continuidade, no mesmo estado.
Em verdade Prestes não era o nome por quem Washington se batesse, arriscando, na
partida, o regime. Foi o candidato imprevisto, desde que o falecimento de Carlos de
Campos apresentara ao presidente o dilema de elaborar a nova situação paulista ou a ela
se submeter. Assumindo o Vice-presidente Fernando Prestes o governo, seria certa a
candidatura de Álvaro de Carvalho,730 que Washington não desejava. Para evitá-la, propôs
o líder, filho do vice-presidente, o que importava resolver momentaneamente a crise
estadual, mas sem desmanchar a que se lhe seguiria: a crise federal. A política de São
Paulo não abriu mão de Prestes. Empossado em 14 de julho de 1927, já era candidato em
junho de 28, quando principiou Antônio Carlos a articular-se... “contra a imposição do
Catete”. O Catete não se pronunciara. Estaria de vez com São Paulo, contra Minas, mas
quando Minas aliciasse na federação (Pernambuco, Paraíba, Rio Grande, principalmente
no próprio São Paulo, com os democráticos) a coorte oposicionista. Antônio Carlos
tornou-se o chefe dessa resistência: mas cauteloso e sutil.
Foi esta conversa preliminar no Hotel Glória que fez a Aliança Liberal.
ALIANÇA LIBERAL
CRISE GENERALIZADA
Mas o governo, longe de ser tímido, era vigoroso. Imbuíra-se da idéia de que transigir
seria desmoralizar-se; e, com a firmeza da sua decisão de 1922, quando se declarara ao
lado de Bernardes, afirmou Washington o seu apoio a Júlio Prestes.
Faiscou uma frase irônica — ao perguntarem a João Neves quem chefiaria, afinal, a
revolução. O general café. Assis Chateaubriand chegara a esta conclusão: o primeiro
inimigo da ordem instituída era o general café; ou fosse a ruína agrícola abraçada à
decepção nacional...742 Em 25 de novembro levou o líder da Aliança à câmara — em forma
de análise e denúncia — o problema: e a catilinária a consolidou.743 Em 2 de dezembro leu
Vargas na Esplanada do Castelo — em meio de denso povo — a sua “plataforma”.744
Começava pela anistia, pedia o voto secreto e a direção das mesas eleitorais pela justiça
togada, estendia a mão ao operariado (rompendo o limite da campanha liberal) e concluía
satisfatoriamente, apelando para o esquecimento benigno de ódios e prevenções...
Assoberbada pela intervenção das galerias e pela violência dos debates, resolveu a
maioria — na semana do Natal — não dar número à câmara. Os oposicionistas
replicaram-lhe, indo para as escadarias externas, onde, dia após dia, entretiveram o
entusiasmo dos circunstantes. Foi ao cabo de um desses comícios que uma cena terrível
enlutou o Congresso. Em breve conflito entre deputados tombou morto o ardoroso
“prestista” Sousa Filho, da bancada pernambucana.745 Encerrou-se assim o ano político de
1929. Velado no Rio por indizível angústia e assinalado nos estados por uma exasperação
sintomática. Alcançou o clímax em Minas (onde Melo Viana e Carvalho Brito, chefes da
dissidência em favor de Júlio Prestes, escaparam de morrer num tiroteio em Montes
Claros), no Rio Grande do Norte, no Espírito Santo, no Recife, na Paraíba... Sobretudo na
Paraíba, onde a luta se afeiçoou às condições locais, com a insurreição de José Pereira na
cidade de Princesa.
PARAÍBA EM FOGO
O TERRÍVEL IMPREVISTO
DE SUL A NORTE
EM MINAS GERAIS
À hora marcada reinava em Belo Horizonte a doce paz das tardes sertanejas. O 12º de
infantaria, cujo quartel, em posição dominante, parecia invulnerável como um castelo-
forte, respirava a mesma suave quietação: tanto que o comandante, Coronel José Joaquim
de Andrade (interinamente na chefia da região) se recolhia àquela hora à casa. Com igual
despreocupação os oficiais, encerrados os trabalhos do dia, andavam, dispersos, pela
cidade. O plano primitivo (Odilon Braga) consistia em aproveitar a calma vespertina para
de súbito, em caminhões, que se precipitariam pelos portões abertos, arrojar na praça a
polícia mineira: tomaria de assalto, sem dar tempo à reação, o único núcleo federal de
Belo Horizonte. Como em Porto Alegre... Cristiano Machado receou o insucesso,
morticínio, o preço da temeridade: e preferiu atrair o comandante, convencê-lo, deter os
oficiais, e, por seu intermédio, conquistar sem sangue o objetivo. Não foi assim que o
Coronel Andrade repeliu a proposta, e porque o quisessem prender à entrada da
residência, mandou que o soldado que lhe dirigia o automóvel desse o alarma. Espocaram
tiros. Chegou o aviso ao 12º; a sua primeira viatura, com oficiais e praças, que voltavam
atropeladamente ao quartel, foi interceptada pelo fogo da polícia; e o Major Pedro
Leonardo de Campos assumiu ali o comando geral, o Capitão Josué Freire o do
regimento. Tinham 385 homens (seu reduzido efetivo) para sustentar o cerco, durante
cinco dias de fuzilaria impiedosa.770 Só se rendeu o regimento — admirável na resistência
rija — por falta de água e víveres, isolado na colina, varejado de metralha, sem saber o que
lá fora ocorria (pois ficara privado da radiotelegrafia, com o corte dos fios elétricos),
ilhado na cidade em pé de guerra...
NO NORDESTE
PROPORÇÕES DA LUTA
A QUEDA DA LEGALIDADE
Em redor dele, depois de 8 de outubro, quando caíra o 12º de Belo Horizonte, era geral o
desânimo, a contrastar com a sua tranqüilidade fatalista. Nem um instante mostrou
receio, desalentou-se em atitudes dúbias ou concordou com o derrotismo que o cercava: a
sua autoridade parecia crescer com os imaginários batalhões, a deserção dos
governadores, os progressos visíveis da revolução. Dispunha dos efetivos militares seguro
de que era realmente, como se lê na Constituição, o chefe das forças armadas. Ao
deputado (Cordeiro de Miranda) que lhe objetou que um batalhão saía para aderir,
respondeu: “Cumpro o meu dever, o batalhão cumpra o seu”. Confiava na 2ª e na 4ª
região; fazia ouvidos moucos às vacilações da 1ª, no Rio de Janeiro, onde lavrava,
evidente, a conspiração. Era compreensível que alguns generais, desgostosos com a
política oficial, e pessimistas em face do seu insucesso, desejassem evitar que o país se
dividisse em dois exércitos que se destroem, como os Estados Unidos ao tempo de
Lincoln. Um deles, porventura o de maior renome, Tasso Fragoso, acreditava na derrota
do governo.777 Consultado antes por Lindolfo Collor, dissera repugnar-lhe tomar armas
contra a legalidade; mas lhe faltava entusiasmo para ajudá-la. Destacaram-se, à frente do
movimento na capital, os Generais João de Deus Mena Barreto e Leite de Castro,
comandante da artilharia de costa. Juntou-se-lhes o Coronel Bertoldo Klinger. Nada
parecia mais fácil do que, em dado instante, se recusarem os quartéis a obedecer ao
governo, e, por intermédio de uma junta, destituí-lo, para as confabulações da paz. Base
popular para tanto não faltava, com o espírito das ruas empolgado pela causa
revolucionária, as famílias alarmadas com a convocação dos reservistas, dominada a
cidade pelos boatos mais desfavoráveis ao presidente — inabalável, na firmeza da sua
autoridade. O Ministro da Guerra desconfiou do General Leite de Castro e mandou-o, à
inspeção de tropas, para o interior fluminense. Mena Barreto, a 23, deu o sinal do levante,
combinado, já então, entre as unidades próximas. Nesse dia o Cardeal Dom Sebastião
Leme falou ao presidente. Chegara o tempo de conciliar... Polida, mas severamente,
contestou que o governo tinha suficientes elementos para debelar a revolução.
Na mesma noite se recolhia Mena Barreto ao Forte de Copacabana (onde pouco depois
chegava Tasso Fragoso) e Leite de Castro — voltando de Campos — à Fortaleza de Santa
Cruz. Subscrita pelos dois primeiros, e pelo Coronel Klinger, a ordem de operações,778 e
transmitida aos demais corpos da região militar, só então o Ministro da Guerra conheceu
a realidade das coisas. Era tarde para a reação. Achava-se praticamente destituído o
governo quando — a horas mortas de 23 para 24 de outubro, reuniu Washington Luís, no
Guanabara, o ministério.
O seu pensamento era invariável: resistir. Ao amanhecer verificou-se que não seria mais
possível. Revoltara-se todo o exército. Às oito e meia apresentou-se ao Forte de
Copacabana o General Malan d’Angrogne: foi encarregado de assumir o comando do 3º
de infantaria (à Praia Vermelha) e da Fortaleza de São João. No quartel do 3º, entregou
Malan ao Coronel José Pessoa o comando do regimento, em marcha sobre o palácio
presidencial. Às nove horas troou a artilharia dos fortes: era o sinal da revolução. Em vôo
baixo, um avião do Campo dos Afonsos deixou cair sobre o de Copacabana a mensagem
de adesão da Vila Militar. Aderiu a polícia... Tomada a praia de Botafogo pelo 3º,
engrossado com numerosos civis munidos de armas de guerra, avançou a coluna até a
esquina da Rua Farani. Conduz esta ao Guanabara. Tasso Fragoso e Mena Barreto
puseram-se à dianteira, e, de cambulhada, soldadesca e povo rumaram para os portões do
palácio — a intimar o presidente. A guarda, fuzis ensarilhados, repousava nos pátios.
Parecia adormecida a grande casa, fechados os batentes, as janelas cerradas... Ficaram de
fora, ao longo dos gradis, os populares brandindo as suas armas e o 3º de infantaria,
enquanto os generais — forçando a entrada — iam entender-se com o General Teixeira de
Freitas, chefe da casa militar do presidente. Pediam para falar-lhe. Esperaram algum
tempo, impacientes: e porque o presidente não os chamasse, atravessaram várias salas, até
o encontrarem, com os ministros, no seu gabinete de trabalho.779 A cena foi aí ríspida e
breve. Ao dizer Tasso Fragoso que o que mais o preocupava era a sua vida, respondeu:
“Pois é a única coisa que não me preocupa”. “Se V. Ex.ª não quer submeter-se”, insistiu,
“ficará responsável pelo que lhe suceder”. E os generais se retiraram. “Podem bombardear
à vontade!”, exclamara Washington, momentos antes, quando constou que esta era a
ameaça.780 Não sairia... Ocorreu aos generais chamar o cardeal. O seu palácio prestava-se
para asilo. Chegou solicitamente Dom Sebastião, com Monsenhor Costa Rêgo. Mudaram
de idéia. O Coronel José Pessoa opinava por uma fortaleza. Dispunha-se a levá-lo
preso...781 Da rua subiam os gritos da multidão: qualquer imprudência poderia desvairá-la.
Persuadido — às cinco da tarde desceu Washington Luís, ao lado do cardeal, dignamente,
sem ter jamais desmanchado a calma imponência dos seus gestos austeros, a escadaria do
palácio. Num automóvel, com o prelado, Tasso Fragoso, e alguns militares à volta, como
para o protegerem, foi transportado para o Forte de Copacabana.
Dirigiria o país até a reorganização? Por que não “com elementos que inspirem
confiança ao Presidente Getúlio?”.782
Ao fazer-se a república, havia, preparada para servi-la, uma elite de bacharéis e militares
positivistas. Abrira-se, entre estes e aqueles, o leal conflito de idéias, em cujo calor se
distorceu a estrutura do regime, com o presidencialismo autoritário e a federação
indecisa. Mas o inesperado sucesso da inconformidade encontrou, em 1930, dividido o
pensamento brasileiro em tendências divergentes, sem que as coordenasse, disciplinando-
as, a teoria da crise. Foi o que reconheceu três anos depois, na sua mensagem à
Constituinte, o chefe do Estado: “Movimento geral de opinião, não possuía, para guiar-lhe
a ação reconstrutora, princípios orientadores, nem postulados ideológicos definidos e
propagados”.
PLENOS PODERES
Nenhum outro presidente enfeixara ainda, nas mãos civis, maior soma de poderes do
que Getúlio Vargas.
Duas sugestões de Levi Carneiro foram recusadas pelo presidente: o recurso dos atos dos
interventores dos estados789 para um conselho de antigos presidentes (Venceslau,
Epitácio, Bernardes) e a competência, que teriam os ministros, de lavrar nomeações
interinas.790 Suprimiu Vargas estas restrições: os recursos, subiriam a ele. “Pairava acima
dos partidos políticos até então circunscritos aos âmbitos estaduais [...]. A visão estreita
dos regionalismos estéreis, que tanto sacrificou estados e regiões do Brasil em benefício de
outros, havia de estar fora dos anseios”.791
Afastada por enquanto a fórmula dileta da propaganda, que era justiça e representação,
tinha de reformar o país.
GRUPOS E CORRENTES
Inclinou-se o ditador para a questão social, que invocara (com rara presciência) em Porto
Alegre, a 4 de outubro.792 Criou em 26 de novembro (entregando-o a um de seus mais
ilustres colaboradores, Lindolfo Collor) o Ministério do Trabalho. O da Educação (com
Francisco Campos) daria impulso à cultura, entorpecida e desalentada. A revolução
respondia, com isto, e desde logo, à República Velha, que uma feita rotulara de questão de
polícia a inquietação operária. Sobrepondo-se entretanto aos partidos dispersados e às
correntes novas, que se preparavam para substituí-los, surgira um grupo jovem de
triunfadores que limitava o seu poderio — e a sua prudência: o outubrista. Passou à
história com o apelido impróprio de tenentismo:793 porque nele se amalgamavam os
intransigentes do movimento, tanto a oficialidade moça, que o preconizara em 1922 e o
desfechara em 1930, como os correligionários civis, credores da fidelidade que lhes devia
o governo.
O CASO PAULISTA
Merece maior análise o caso paulista, exatamente porque aí se chocaram as forças civis,
arregimentadas pelo Partido Democrático, e a política de 1930. Com sagacidade poupara
Vargas a autonomia de Minas Gerais, respeitando o seu velho presidente, Olegário
Maciel. Representava, aos olhos da revolução, seu quociente decisivo. Se do mesmo modo
fosse tratado São Paulo, isto é, se o confiasse Vargas à gente que lá se apossou do poder a
24 de outubro, formando o secretariado logo reconhecido pelo comandante da região,
General Hastínfilo de Moura — disporia de forte núcleo liberal a que se apoiasse, para a
recomposição da ordem. Cedeu, porém, à reivindicação das jovens patentes, unidas aos
ortodoxos da revolução de base, que pretendiam reformar o país arredando os homens do
passado e as suas idéias. Para eles, democráticos e republicanos se confundiam...
Estrondosamente acolhido em São Paulo a 29 de outubro, estabeleceu Vargas uma
fórmula de transição: João Alberto seria o seu delegado, mas em harmonia com o
secretariado democrático. Acabou nomeando-o interventor. Para a secretaria de
Segurança, então criada, foi o Coronel Miguel Costa. Saíram, em conseqüência, os
democráticos. Romperam a 24 de março de 1931.794 A 28 de abril, impediu o Coronel
Costa que uma revolta armada depusesse o interventor. E o General Isidoro Dias Lopes,
que comandava a Região Militar, deixou o cargo, para que nele se investisse o General
Góis Monteiro. Dissentiram por fim João Alberto e Miguel Costa. Resignatário, indicou o
primeiro (com os outubristas do Rio de Janeiro) o jurista Plínio Barreto. Opôs-se o outro.
Recaiu a nomeação no presidente do Tribunal de Justiça, o íntegro magistrado Laudo de
Camargo. Teve de largar a interventoria por intimativa da Legião Revolucionária,
reagrupada, em setembro, e foi nomeado o Coronel Manuel Rabelo. A volta do
“tenentismo” sacudiu o governo provisório, do qual se retirou Whitaker (substituído por
Osvaldo Aranha), entrando Maurício Cardoso — do Rio Grande — para a pasta da
Justiça. O assalto sofrido pelo Diário Carioca, no Rio de Janeiro, pôs por terra o equilíbrio
tentado: demitiram-se os ministros gaúchos da Justiça e do Trabalho, o chefe de polícia
(Luzardo), João Neves, advogado do Banco do Brasil. A 2 de março — para limitar a área
do conflito irreparável, que aliava São Paulo e o Rio Grande — designou o ditador para
governar São Paulo um velho diplomata, o embaixador Pedro de Toledo.
SEPARAÇÃO DE FORÇAS
Nada mais simples, argüia a “frente única” (como em São Paulo, os partidos
conciliados): testemunhasse o chefe do governo a sua intenção apaziguadora,
principalmente a sinceridade, de restaurar no país a Lei, organizando um ministério que a
afiançasse!
CÓDIGO ELEITORAL
Decretado a 23 de fevereiro de 1932, o Código Eleitoral devia firmar pelo voto secreto,
pela justiça, pela proporcionalidade — base da organização partidária — sem esquecer o
sufrágio feminino, a verdade da representação... quando a houvesse.
Nesse sistema, pregado (e agora realizado) por Assis Brasil, presidente da comissão
elaboradora, o teórico da Democracia Representativa alcançou a meta que há quarenta
anos perseguia — contra a intransigência do velho regime. Reconheceu, ao traçar-lhe as
linhas mestras, que só o voto secreto evitaria “a arregimentação de rebanhos eleitorais,
desfilando publicamente diante do chefe, ou dos seus caixeiros de eleições, de quem
recebem a ração de opinião que têm de deitar na urna”.799 Na vigência daquela honrada lei
teriam os pleitos a cota de veracidade que sempre lhes faltara. Pela obrigatoriedade, pelo
sigilo, pela apuração, sobretudo pela tutela judicial desse processo, a fim de que não
continuasse a proclamação dos eleitos a depender de maiorias facciosas, pesaria a vontade
do povo; encarregar-se-ia de dar sentido e forma à revolução... frustrada. Os sucessos de
São Paulo forçaram o governo a criar, em 14 de maio, a comissão incumbida de redigir a
Constituição. E anunciou as eleições para 3 de maio de 1933.
9 DE JULHO
HISTÓRIA REPETIDA
A DURA RESISTÊNCIA
CONSEQÜÊNCIAS
A CONSTITUINTE DE 1933
Não seria por falta desse trabalho prévio que se extraviasse (como em 1823) o
Parlamento em debates estéreis. Começou a funcionar a 15 de novembro de 1933. Lembra
o de 1891 no afã (poderíamos dizer, na ansiedade) de reestruturar o regime; mas
assustado, como a primeira Constituinte — pela ameaça enervante do desbarate. O papel
que em 1891 exercera Prudente — com a austeridade lacônica — desempenhou em 1933
o seu presidente Antônio Carlos — com a plasticidade e a prudência do temperamento
frio. Prudente tinha a severidade majestosa, entretanto melancólica, dos apóstolos
civilistas. Encarnara as virtudes republicanas, ao serviço de uma legislação dogmática.
Irônico, cético, amável, o Andrada (com equivalente sucesso) era a sua antítese. Não
oferecia ao adversário a rigidez daquela ortodoxia; dominava-o pela malícia, pela
serenidade, pela tolerância. O primeiro foi o presidente ideal da câmara disciplinada. O
outro, o presidente providencial da câmara insegura e dividida que, a qualquer instante,
podia ser dissolvida pelas forças que desafiava e ofendia...
O NOVO DIPLOMA
Apoiou-se o governo à sólida maioria de que dispunha na Constituinte. Mas não se pode
dizer que fosse dele a Constituição — promulgada em 16 de julho de 1934. Traduz a
mentalidade conservadora que, rotulando-se de progressista, de fato agarrada aos
princípios liberais da república, se opôs às linhas revolucionárias do anteprojeto.
Recomendara este o unicameralismo (em vez de Senado e câmara, a Assembléia Nacional
); a eleição, por ela, do presidente; a instituição de um conselho de 35 membros; a unidade
do processo judiciário e, em parte, da magistratura; amplas garantias sociais. Enumerara
os casos de “socialização” de empresas, a adjudicação aos posseiros da terra produtiva (em
cinco anos de ocupação incontestada), a ressalva da propriedade domiciliar
impenhorável, a restrição da herança à “linha direta ou entre cônjuges”, liberdade
sindical, expropriação do latifúndio, assistência aos pobres, salário mínimo...805 Novidade
que prevaleceu: a par do habeas‑corpus, para proteger direito líquido e certo, o mandado
de segurança (no México, juicio de amparo)...
SOCIAL‑DEMOCRACIA
Torcera-se outrossim — e foi mais grave — a força repressiva do Executivo (artigo 175),
dando ao Legislativo (como na Constituição de 1891) o poder intransferível de decretar o
estado de sítio “na emergência de insurreição armada”, a menos que ocorresse em período
de recesso parlamentar. Dependeria, nesta hipótese, de “aquiescência prévia da Seção
Permanente do Estado” (artigo 175, §7). Noutras palavras: mal consolidada a legalidade,
atava o governo com o fio problemático de um constitucionalismo desconfiado, rígido e
complexo. Imobilizava-o, com uma disposição inoperante, ao mesmo tempo em que a
Assembléia — satisfeita com a vitória acadêmica — confirmava no posto o homem forte
que tanto receio lhe causara.
Arrimou-se ele aos democráticos. Ministro do Exterior, José Carlos de Macedo Soares
disse em Campinas (referindo-se ao governo de Armando Sales):
Conquistamos dia a dia os ideais de São Paulo. Em primeiro lugar, o governo paulista da nossa casa. Depois
impusemos confiança na nossa lealdade, no nosso patriotismo brasileiro e resolvemos o problema militar. Enquanto
isto restabelecia-se com o concurso poderoso, ativo, calculado, e eficiente da bancada paulista na Assembléia Nacional
Constituinte a ordem jurídica e legal da pátria, as reivindicações católicas, as conquistas femininas e as proletárias.
Quisemos o voto livre. Quisemos o aperfeiçoamento das instituições, o progresso social, o equilíbrio dos poderes do
Estado, a segurança da liberdade e das franquias dos cidadãos. Temos hoje tudo alcançado.812
Mas por breve tempo. Menos pelo esforço demolidor das minorias do que pela
impaciência e pelo ressentimento dos fatores ideológicos postos à margem, nesse triunfo
plácido da juridicidade conservadora.
ENTRE AS EXTREMAS
Até aí jogara o governo com os elementos partidários. Mas havia, subjacente, o dissídio
dos princípios. Não esqueçamos que em 1939 se aliaram, recentes ou sistemáticos, os
inimigos do situacionismo, abrangendo a Aliança todos os descontentes. Apartara-se a ala
extremada de Luís Carlos Prestes, para formar, no exílio, contra eles, e ela, o Partido
Comunista. Com os políticos, compelido ao retrocesso (queixavam-se os socialistas) pela
reação liberal, organizara Vargas um regime incolor, que deixava de fora as soluções
proletaristas esboçadas em 1931. A Constituição democrática era um viático de união;
empedernia-se na sua legalidade rígida, concebida segundo a prudência clássica de uma
sociedade cansada de aventuras ditatoriais, temerosa de abalos econômicos. Enfeixara a
harmonia... monótona, da ordem inatual — gritavam os da esquerda ou da direita,
invocando as competentes filosofias, os respectivos símbolos, a linguagem específica.
Às esquerdas combatiam agora os integralistas813 — sob a chefia do escritor Plínio
Salgado — com o seu nacionalismo corporativista e militarizado, a que não faltava a
sugestão fascista e nazista das insígnias, dos desfiles, do ritual, da mística. Seguindo-se à
liquidação, em outubro de 1932, do movimento paulista, e um pouco a sua síntese,814
representou, em abril de 1933, o segundo desafio ao retorno liberal democrático.815
Podia escusar-se, alegando que tanto em 1935 como em 1938 foram eles que se
aventuraram; sublevando-se, lavraram a sua sentença...
1935
Conta um autor que, ao findar 1934, se decidiu “nas conferências secretas da Grande Ásia
e da América Latina”, desferir a revolução, em vez de protelá-la com a tática das “frentes
populares” — no Nordeste brasileiro.816 Propugnaram a solução imediatista Manuilisky e
os delegados brasileiros: golpe, em lugar de infiltração... Informa o mesmo autor que “a
preparação do movimento” ficou a cargo do alemão Artur Ewert, aliás Berger.817 Fundara-
se entretanto (estranha àquele programa) a Aliança Nacional Libertadora, com figuras
ligadas ao governo — como o prefeito do Distrito Federal, Pedro Ernesto — e jovens
socialistas.818 Outro movimento, sob o rótulo de Aliança Popular por Pão, Terra e
Liberdade, surgiu, ou esboçou-se, a 22 de agosto. Mas a revolta de novembro não foi feita
pelos civis, arrolados posteriormente como co-responsáveis, nem tiveram eles qualquer
papel no seu brutal desenvolvimento. Limitou-se, em Natal, no Recife, no Rio de Janeiro,
aos quartéis. Marcada para 27, um erro de comunicação a antecipou para 23, no Rio
Grande do Norte. “Às sete e meia da noite de 23 de novembro de 1935 soldados do 21º
Batalhão de Caçadores, membros da Guarda-Civil demitidos, populares filiados
secretamente ao Partido Comunista, deflagraram um movimento insurrecional”.819
O Corpo Policial Militar resistiu dezenove horas. Sem direção sistemática, ocultas as autoridades, espavorido o povo,
Natal foi presa fácil. O tiroteio durou toda a noite de 23 para 24. A 25 instalou-se o “Comitê Popular Revolucionário”,
que — à notícia da aproximação de tropas da Paraíba e de Pernambuco, desapareceu na manhã de 27.820
Viu-se que não seria possível resistir à desordem (e às agressões previstas), na vigência da
Lei que enfraquecia deliberadamente o poder. Estado de sítio, só se o aprovasse o
Legislativo... Pois que viesse (pediu o exército) o seu sucedâneo, o estado de... guerra.
O golpe de 1937 estava implícito no eclipse da Lei, que a sua defesa justificara.
Mas começou Armando Sales a perder a direção da política paulista com a escolha do
seu substituto no governo (quando, para concorrer ao pleito, teve de desincompatibilizar-
se em dezembro de 1936). Eleito foi Cardoso de Melo Neto.
1937
ESTADO NOVO
Quem acompanhar desde os primeiros dias a ação de Vargas, verificará que desprezara o
concurso dos partidos (como os PP.RR. tradicionais) para equilibrar — manipulando-os —
estados e grupos, sem perder de vista, fora destes, a massa operária.
A CARTA OUTORGADA
LINHAS DOUTRINÁRIAS
No realismo de 1937 “a doutrina não tinha para o chefe do movimento e os seus íntimos
colaboradores a menor importância”,834 isto é, a dos livros, exposta na Carta de 10 de
novembro. Serviu ela (corrigindo o erro de 1930, da supressão, pura e simples, da
legalidade constituída) de suporte à ditadura, informada por um complexo de
pensamentos históricos e exóticos, que, estes sim, configuram o estado‑novismo.
Não faziam questão do corporativismo italiano, estampado, ipsis litteris, no artigo 138
da Carta de 10 de novembro (tradução da Declaração 3ª da Carta del Lavoro).837 Nem da
solução dada por Pilsudski à crise polonesa. Queriam o poder enérgico, com a faculdade
de refundir a estrutura administrativa, temivelmente armado de decretos‑leis. Sem
Congresso, e com o Judiciário submisso. Explicou um exegeta (Azevedo Amaral):
escapava-se em todo caso à... “ação arbitrária do poder”.838 Não seria arbitrário, senão
supervisor. Também o dissera Manoílesco: no seu equilíbrio, “organização contra
liberdade”.839 Os adeptos só viram a primeira parte da fórmula; os demais, a segunda.
Organização; contra a liberdade. Os eruditos aplicar-lhe-iam o conceito fascista, “Estado
ético”; para Vargas (acima desse desencontro acadêmico) era o “Estado de fato”, que
continuava — unindo a revolução de 1930 (com a frustração de 1932) ao clima de 1937.
Parecia um caso de antecipação. O Brasil tivera muito cedo o “homem providencial”. O
seu tempo não fora a quadra conturbada de 1932; mas a de 1937. Dependeria dessa
atmosfera internacional; duraria enquanto ela durasse.
CONTRA OS EXTREMOS
Mas Vargas não mudara. Ou antes, fixando-se na “terceira posição”, que escolhera em
1930 (com Lindolfo Collor), o seu trabalhismo era ainda conservador. Se o fascismo o
tivesse seduzido, cumpriria as disposições da Carta subscrita sem prévio debate a 10 de
novembro, e entraria, de olhos fechados, pelo corporativismo do tipo italiano. Mas não
gostava da imitação estrangeira. A sua forma era pessoal, intrínseca, nacionalista. Quem
se desse à arte de interpretar-lhe, à luz da biografia, a conduta reservada e hábil, acharia o
seu segredo no castilhismo rio-grandense, sem a sistemática positivista. O seu senso do
governo consistia, saltando sobre os embaraços categóricos, em firmar a autoridade, como
um poder criador e orgânico, na sua função de disciplinar a sociedade... O Estado Novo
acrescentou-lhe a força publicitária (em vez da abstração democrática, o culto do chefe) e
a tônica, do “espírito do tempo”, invocado naquele trecho da proclamação de 10 de
novembro: “A Constituição estava evidentemente antedatada em relação ao espírito do
tempo”. Era contra os “moldes clássicos do liberalismo e do sistema representativo”,
contra o Congresso como “aparelho inadequado e dispendioso” (“conservá-lo seria
evidentemente obra do espírito acomodatício e displicente”), contra “os velhos partidos,
como os novos em que os velhos se transformaram sob novos rótulos”. Aí ainda não
entrava o integralismo... Dir-se-ia sobrevivente; e salvo. Pura ilusão! O decreto-lei de 2 de
dezembro dissolveu “todos os partidos”, e diretamente o abrangeu no parágrafo 2º: “As
milícias cívicas e organizações auxiliares”. Nada “de uniformes, estandartes, distintivos e
outros símbolos”. Até a promulgação da lei eleitoral, não se reorganizariam os partidos;
ou antes, abolia-se a política.
LEGISLAÇÃO SOCIAL
É preciso dizer (pois não havia pressa nas prometidas transformações) que só foi
regulada a sindicalização em 5 de julho de 1939. “In gran parte le linee della nostra
organizzazione” (diz outro autor), no seu corporativismo avançado... “Italia primero,
Alemania y Portugal marcharon hacia el fortalecimiento del poder ejecutivo y del Estado;
y el mismo fenómeno se presentó en el Brasil”.846 “Y se coloca en los sistemas
autocráticos”.847
POSIÇÃO INTERNACIONAL
No interior manteve-se o Estado Novo, com a disciplinada garantia do exército.
Beneficiou-se externamente da conjuntura mundial.
Como não é possível dissociá-lo dos fatos internacionais, devemos dizer — definindo
aquela “atmosfera”: refletiu a moda das ditaduras ideológicas; mas sem se desprender
(com a defensiva prudência do seu instinto de duração) da solidariedade americana.
Por que, em 1926 — data que serve de ponto de partida à história desse retraimento
desconfiado e otimista — se retirara o Brasil da Sociedade das Nações? O motivo
conhecido, digamos, acidental, foi o desejo que levavam os “grandes” governos de
reinstalar a Alemanha (em conseqüência dos acordos de Locarno) na organização
universal de paz, retirando do seu lugar não-permanente o país latino-americano, que
passaria a segundo plano. Não se tratava (é certo) de uma forma específica de desatenção
à América, cuja ausência (dos Estados Unidos) era em Genebra mais sensível do que a
presença (dos Estados de sua múltipla latinidade). Cogitava-se, isto sim, de estabelecer
com urgência o sistema de cooperação européia, de que era peça obrigatória a Alemanha
social-democrática... O Presidente Bernardes, num assomo de sua autoridade inflexível,
concordou com o Embaixador Afrânio de Melo Franco: não cederia aos apelos ingleses e
franceses; recusaria o sacrifício; vetava a candidatura alemã! É imaginar a importância que
teve esse arrojo, o veto... à política equilibrista das nações que ditavam a ordem no
mundo! Contente com o apoio nacional à retumbante recusa ao desprestígio e à
diminuição, o presidente se valeu da oportunidade, e, já então contrariando o
embaixador, mandou que declarasse desligado o Brasil da assembléia que, em 1919,
ajudara a fundar.848 Pareceu exagerado; mas foi lógico esse gesto do governo forte,
endereçado à crise internacional. A Liga tinha os dias contados. Ludibriara “a nobre causa
da paz”, disse em 1933 F. D. Roosevelt.849 Não logrou resolver nenhum dos decisivos
problemas antes da convulsão do Extremo Oriente, das ditaduras agressivas e dos passos
iniciais da segunda conflagração: “forum” de admiráveis esperanças, não resistiu às
imposições brutais da guerra, que a dissolveu.
A de 1939 derivou dos antecedentes que, de novo, dividiram em dois campos a Europa.
Esperava-se... desde que terminara a outra. À medida que libertaram as mãos poderosas,
os ditadores arregimentaram ruidosamente as suas coortes, para a marcha que ninguém
sabia onde acabava. Desavindos, podia acreditar-se num apaziguamento receoso. Juntos,
os seus estandartes passeariam pela Europa... Depois de muito ceder, resolveram a
Inglaterra e a França impedir (consumada a aliança teuto-soviética) a eliminação do
“corredor polonês” pelas tropas hitleristas.850 A 1º de setembro de 1939 os exércitos
alemães transpuseram a fronteira da Polônia. A 3, obedientes ao compromisso de lhe
defenderem a integridade, a França e a Grã-Bretanha se alistaram ao lado da nação
invadida; declararam guerra ao Reich. Os soviéticos entraram na Polônia — com o
consentimento de Hitler — a 17... Era a segunda grande guerra, mais ampla, demorada e
devastadora do que a primeira.
NEUTRALIDADE E ESCUSA
Nele porém se meteria — sem embargo das idéias — se fosse atacada a América.
COMPROMISSOS CONTINENTAIS
Como em 1917!
CONDIÇÕES MILITARES
O Exército do Brasil não estava aparelhado para a emergência; nem a esquadra, para
proteger as vastas águas territoriais da pátria. Em 1938, encomendara o governo às usinas
Krupp oito milhões esterlinos de boa artilharia. O bloqueio aliado impediu a viagem
(embora em barcos brasileiros) dessa maquinaria, de que chegou ao Brasil uma parcela
mínima.856 Para rearmar-se, devia o exército apelar (como os demais do continente!) para
os Estados Unidos. Giraram os entendimentos em torno do que reputavam eles essencial
à polícia aéreo-marítima do Atlântico: as bases nordestinas. O governo de Vargas foi
simultaneamente solícito e prudente. Não teve dúvida em permitir o uso e a construção
dos campos de pouso; mas sem que a concessão se assemelhasse a uma retirada de
soberania.857 Em março de 1941 (bem antes portanto da Declaração do Atlântico, de
Roosevelt e Churchill, que é de 14 de agosto),858 podiam os Estados Unidos cuidar da
instalação das bases de Natal, Belém e Recife.859
EM FAVOR DA AMÉRICA
A GUERRA INCLEMENTE
O rompimento foi — nem podia deixar de ser — a segunda etapa, na marcha para a
guerra. A primeira, consubstanciara-se no acordo sobre as bases... Improvável seria um
ataque frontal. Pretendendo intimidar ou punir o Brasil, teriam os nazistas de lançar mão
do seu cardume de submersíveis, que tanto dano causavam às frotas inglesas. Foi o que se
deu. De 15 a 17 de agosto de 1942 cinco barcos brasileiros foram postos no fundo perto da
costa de Sergipe (Baependi, Itagiba, Araraquara, Aníbal Benévolo, Arará). Desapareceu
com um deles o 8º Grupo de Artilharia, destinado a Natal... Elevou-se a 607 o número das
vítimas. Sem aviso prévio, desferido traiçoeiramente, não contra navios do tráfego
transoceânico, mas da linha de cabotagem que fraca ou nenhuma influência poderia ter
nos sucessos militares e econômicos da Europa — o golpe sacudiu, nas suas fibras mais
sonoras, a sensibilidade do povo. Ofendeu-o, como uma provocação humilhante. Atirou-
o, automaticamente, à guerra que lhe era imposta.
O ATAQUE INOPINADO
Sobre as razões da agressão há o relato do historiador da Armada americana que
consultou os papéis da Chancelaria do III Reich: “Decidiu Hitler”, conta Morison,
em conferência com o Almirante Raeder, em 15 de junho de 1942, lançar verdadeira blitz de U‑boats contra o Brasil.
Um grupo de oito submarinos de 500 e dois de 700 toneladas foi em princípios de julho despachado dos portos
franceses. Num ponto pré-determinado, ao largo da costa nordeste do Brasil, encontraram eles a vaca leiteira, U -460, e
se reabasteceram; tomaram então posições perto da costa brasileira.864 A primeira semana de agosto era um momento
favorável para operarem no Atlântico Sul, porque o Comboio As-4, escoltado por navios da Task Force 3 e carregando
tanques General Sherman, que mais tarde figuraram na vitória de El Alamein, estava então passando ao longo daquela
costa. O comboio fez escala de 40 horas no Recife. Sabiam os alemães desses movimentos; uma de suas irradiações
para o Brasil o confirmou e ameaçou destruí-lo. Mas aparentemente nenhum submarino procurou tomar posição de
ataque. Os dez U‑boats executaram então a sua missão contra a navegação brasileira, e fizeram outro poderoso
inimigo para o seu país. Entre 14 e 17 de agosto cinco navios da Marinha mercante brasileira, com uma tonelagem
total, bruta, de 14.822, foram torpedeados e afundados não longe do litoral. Um deles transportava cerca de 300
homens do exército brasileiro, muitos dos quais se afogaram. Um avião do Esquadrão VP -83 localizou e atacou um
dos U‑boats, que escapou.865
É a primeira revelação que temos das ordens a que obedeceu o estúpido assalto. A
indignação das multidões não permitiu que o governo protelasse ou atenuasse a réplica.
Às rumorosas manifestações, encabeçadas pelos estudantes, de 18 de agosto,866 se seguiu,
em 22 de agosto, o reconhecimento do estado de guerra que a Alemanha e a Itália
impuseram ao Brasil.
O TRAMPOLIM DE NATAL
Cessaram as atividades as empresas aeronáuticas que se serviam das instalações de Natal:
a Air France, a Lati, a Condor. Apresentou-se, substituindo-as, a Pan American Airways,
com o seu Airport Development Project: contratou com o governo brasileiro a construção
de campos de pouso (supervisionados pelo United States Army Engineer Corps)868 — que,
finda a conflagração, passariam à propriedade do Brasil. Por esse tempo o Almirante Ari
Parreiras construía para a Marinha a Base Naval, em Refoles. Em agosto de 1942 estava
em condições de receber os dois primeiros caça-submarinos.869 Fizeram os norte-
americanos os vastos aeroportos de Belém, Fortaleza, Recife, Bahia e Natal. Lembra
Morison:
A 1o de abril de 1942 o Tenente Comandante Sperry Clark chegou a Natal com os Catalinas de base terrestre (PBY -5
As) para substituir o Esquadrão VP -52. Depois da chegada da segunda secção desse Esquadrão, VP -83, a 13 de junho,
podia patrulhar toda a costa do Brasil simultaneamente; mas muitos dos 475 oficiais e soldados do esquadrão se
empregaram na construção da base durante o verão e o fim de 1942.870
Surgiu assim o campo de Parnamirim (ao lado do aeroporto militar brasileiro), com
casas, estaleiros, cais de atracação e subida para os aviões anfíbios, armazéns, hospitais, cassinos, com higiene,
claridade, fartura de alegria e de entusiasmo. Era a Rampa da Limpa onde ficavam as patrulhas dos hidroaviões da
Marinha, os Catalinas tão populares como os imensos B -29, bombardeadores de Tóquio, guardados nos ninhos altos
de Parnamirim Field. Da Rampa, além dos 24 PBY de patrulha, corriam erguendo vôo para o salto atlântico os clippers
de 75 passageiros.
SILENCIOU A POLÍTICA
A política silenciou.
Calado doze anos, um homem do passado, Júlio Prestes, escreveu (a Altino Arantes)
estas lúcidas frases:
Louvei a atitude do governo que sinceramente esteve à altura do momento, e pus à disposição da nossa pátria tudo o
que represento. E o que eu represento (o que nós representamos) é não só o velho PRP, mas o Brasil, todo o Brasil,
liberal e democrático, desde a Independência, da Abolição e da República, com toda obra construtiva da
nacionalidade, com o seu progresso, grandeza e felicidade por mais de um século, com mais de 40 anos de vida
republicana.
Fortaleci com o meu gesto o chefe do governo, bem o sei, e nem foi outro o fim que tive em vista. Fortaleci-o para
fortalecer o Brasil; seja o Brasil o que for, mas seja brasileiro. Para defendê-lo não cogitaremos de quem seja o seu
governo e nem da sua forma de governo. Não seria digno de nós explorar o estado de guerra de nossa pátria em
proveito da política partidária. Depois da luta e da vitória cada um (se porventura houver algum ainda com as idéias
de hoje) que tome o caminho que quiser.872
MOBILIZAÇÃO E COMPROMISSOS
A mobilização gradual das Forças Armadas foi pelo presidente da república autorizada em
29 de agosto, na véspera da oficial declaração de guerra (30 de agosto de 1942). Tropeçava
num obstáculo material: o armamento. Cessadas as entregas das fábricas Krupp, dependia
agora dos americanos o equipamento pesado. O mais que obteve o exército foi o
necessário à instrução de meia divisão mista. A própria força expedicionária recebeu na
Itália as modernas armas de que carecia. Deriva desse problema (e da convicção de que a
integridade do país não estava em risco) o moroso processo do aumento dos efetivos —
que chegaram a 180 mil homens. A colaboração com os aliados nos campos de batalha foi
idéia que correu paralela a esse esforço preventivo: na realidade não a tinham solicitado —
pois o que menos lhes faltava era gente, nos fronts do Ocidente ou do Oriente — nem dela
fizeram depender os acordos de defesa mútua. Anunciou-a Vargas no almoço que as
Forças Armadas lhe ofereceram em 24 de dezembro de 1942. Havia necessidade de
preparar os quadros para o seu eficiente desempenho na luta, onde e como as condições o
indicassem. Mas na sua entrevista com o Presidente Franklin Roosevelt em Natal (28 de
janeiro de 1943) — tal como a narrou Vargas em reunião de ministros — o que se decidiu
foi que não convinha, no momento, o embarque do corpo expedicionário, justificável
apenas se o exigissem circunstâncias supervenientes. Em agosto o Ministro General Dutra
visitou os Estados Unidos. Dos entendimentos aí estabelecidos resultou a organização —
com as cautelas pedidas pelo caráter secreto dos preparativos militares — da Divisão que
em junho do ano seguinte levou à Europa a bandeira do Brasil.
BRASILEIROS NA EUROPA
A Força Expedicionária Brasileira (F. E. B.), totalizou cinco escalões, com 25.334 homens,
sob o comando-em-chefe do General João Batista Mascarenhas de Morais.
O CONTINGENTE EXPEDICIONÁRIO
Verificou-se, em 1944, que não eram suficientes os efetivos aliados em luta na Itália. Parte
destes, em operações nos Apeninos, tivera de ser distraída para o Sul da França; e apesar
da queda, em Roma, do regime fascista, o recrudescimento da resistência na zona
industrial, entre o Tirreno e o Adriático, exigiu uma adequada concentração de forças.
Receava-se até a contra-ofensiva, a descer o inimigo das montanhas em que se acastelara,
mal afrouxasse a pressão que o continha. O problema consistia em cortar obliquamente o
maciço central, transpondo-o de cota em cota, donde a artilharia fechava as vias de acesso,
para atingir os férteis campos e as cidades do Norte. Por esse relevo labiríntico o 5º
exército devia lançar-se em progressão vagarosa, escoando-se pelas rampas graníticas sob
o fogo em lançante do adversário tremendamente armado, que se dissimulava nas
alturas.873 Percebe-se disto o que representou para a Força Expedicionária Brasileira a
marcha de Camaiore (18 de novembro) e Monte Prano (26 de novembro de 1944) às
cercanias — na estrada de Bolonha, a velha — do triângulo de Monte Castelo,
Castelnuovo e Montese — etapa do avanço de primavera.
Na luta, que durou sete meses, tiveram os brasileiros duas mil baixas.874 Para os seus 451
mortos, ficou em Pistoia o cemitério, com as insígnias que comemoram a passagem de
suas armas pelas cristas dos Apeninos: o campo santo. E nada mais.875
A MARCHA DA F. E. B.
Divide-se a marcha da F. E. B. sobre a “linha gótica” em dois períodos separados pela pausa
do inverno. No primeiro, castigada pelos frios de novembro, movimentou-se o
Destacamento do General Zenóbio para Fornaci, Galicano-Barga (18 de outubro),
Porretta Terme (2 de novembro), vizinhanças de Monte Castelo, a que quis atirar-se em
dezembro.876 Solicitara porém o General Clark ao Marechal Alexander (25 de outubro) a
ordem de suspender a ofensiva, dada a impossibilidade de continuá-la, sobretudo no setor
de Bolonha, guardado pelas três melhores divisões da Wehrmacht.877 Devia esperar nos
acampamentos de inverno pelo adequado apoio aéreo e pela 10ª Divisão de Montanha,
arduamente treinada para essa espécie de combate. Foi nessa oportunidade que Churchill
passou em revista os batalhões brasileiros, a cujo desfile se refere como a “imponente
espetáculo”.878
Foi um dos pormenores simbólicos do fim da guerra, essa rendição em massa, regida
com austeridade pelas corretas normas da cortesia militar.
De regresso à pátria, recebeu, nas avenidas cariocas, a consagração do povo. Não custou
pouco ao Brasil a sua decidida cooperação com as armas aliadas.
Cálculos gerais estimam os gastos de guerra em doze bilhões de cruzeiros, dois milhões
esterlinos e dois milhões de marcos alemães, das encomendas não entregues. Fora as
perdas humanas, lamentava-se o desaparecimento de 37 barcos, indispensáveis ao tráfico
de longo curso.882 Mas, como na guerra passada, não houve indenizações ou
compensações que cobrissem esses sacrifícios. A nação entrara por lealdade no conflito,
de que saiu com desinteresse. Evidentemente não é esta a linguagem atual da política
externa: mas, em verdade, uma constante da diplomacia brasileira. Consolava-a o
prestígio irrecusável que lhe coube nas conferências de paz. E a sua influência, para que
cedo voltassem os antigos beligerantes a um clima discreto de compreensão e paz, sem
quinhão de partilha, sem lucros materiais, sem ganância particular, sem tesouros alheios.
XLI: RECONSTITUCIONALIZAÇÃO
OUTRA ERA
Começou a cair o Estado Novo (é o que se sabe) ao regressar o General Góis Monteiro
— em outubro de 1944 — de uma missão ao Uruguai. Dissera ambiguamente que viera
acabar com ele...883 O Ministro da Guerra, voltando a 23 do mesmo mês da sua viagem ao
teatro de operações, usara uma linguagem franca: estava-se no tempo (confidenciou ao
presidente) de reconstitucionalizar o país.884 Não tardaria a vitória dos aliados; e o exército
achava que, entre os imperativos da paz, figuravam os da Lei.
OS PARTIDOS
OUTUBRO DE 1945
Surpreendido por essa mudança nas primeiras horas daquele dia, o Ministro da Guerra
quis demitir-se. Os generais porém (e entre eles, Dutra) o convenceram de que, em vez de
deixar sumariamente a pasta, devia resistir, pois ao seu aceno o exército se levantaria.
Telegrafou então aos comandos: “Em vista nomeação novo chefe de polícia demito-me e
vou tomar atitude”.890 Concordaram, por seus chefes, a Marinha e a Aeronáutica. Às 16
horas (informada a cidade pelos vespertinos da nomeação do novo chefe de polícia) partiu
o General Álcio Souto para o quartel do Derby, a fazer sair os carros de combate, e os
Generais Dutra e Canrobert Pereira da Costa foram advertir as unidades de São
Cristóvão. Ao cair da tarde desfilaram lentamente, em direção ao palácio presidencial, as
colunas blindadas. Às 19 horas Dutra e Vargas tiveram ainda um breve encontro. Explica-
se. Da véspera marcara-lhe o presidente uma audiência para aquela hora; outra, uma hora
mais tarde, para o General Góis. Compareceu o primeiro a palácio, já o governo
materialmente extinto; e Vargas, como se ignorasse a descida dos tanques do General
Álcio, ponderou que não era caso para tanto; daria a chefia de polícia a quem ele
indicasse; também o Ministério da Guerra. Era tarde. Do Quartel-General considerou-se
consumada a deposição. Foram incumbidos de notificá-la o Ministro Agamenon e o
General Cordeiro de Farias. Ato contínuo, presentes os dois candidatos, se conveio em
entregar a chefia da nação ao presidente do Supremo Tribunal Federal, Ministro José
Linhares.
GOVERNO DUTRA
1950
Boatejava-se a hipótese do veto militar — vibrado pelos generais de 1945 — à sua volta.
O presidente do Partido Social Progressista — cuja iniciativa está na raiz desses
acontecimentos — foi buscá-lo a São Borja, para a campanha que desimpedidamente
circulou pelos estados, sem sombra de coação. Ao contrário, os três candidatos fizeram
livremente a sua propaganda, complicada (e aliada) nos estados com a sucessão local.
Companheiro de chapa de Vargas, surgiu — homem do Norte — João Café Filho. Seu
adversário de 1935, ainda mal conciliado com ele,895 veterano dos movimentos populares
dos últimos vinte anos, era agora figura de proa do partido de Ademar de Barros. A
honesta imparcialidade do governo garantiu, em todas as fases, a jornada eleitoral. As
forças oposicionistas estavam certas de que ganharia o brigadeiro. As do governo não
tinham dúvida de que venceria Cristiano Machado. Vargas foi nessa consulta ao povo o
elemento fascinante e adventício, que invocava as reivindicações sociais. Subverteu as
previsões o fato perturbador das alianças regionais, em que o populismo se inclinou para
os candidatos que, em troca, podiam favorecê-lo nos votos para a presidência e a vice-
presidência. Juntou a sua sorte à dos partidos litigantes, mais interessados no dissídio
estreito da província do que nos negócios altos da federação. “Se for eleito a 3 de outubro,
no ato da posse, o povo subirá comigo as escadas do Catete. E comigo ficará no
governo”.896
1954
O exército (dizia-se) manteria a ordem. À sua frente estava o Ministro, General Zenóbio
da Costa. Pronunciaram-se, porém, os brigadeiros da Aeronáutica; e anunciou-se que
muitos generais tinham subscrito um manifesto que varria a idéia de sua solidariedade
com o governo. Deliberou o ministério noite adentro, de 23 para 24 de agosto. O
afastamento voluntário (e transitório) do presidente teria a vantagem de tranqüilizar o
país, sem os extremos do choque previsto. Salvaria Vargas, resolvido a não sair dali vivo,
em meio de familiares e amigos que prometiam acompanhá-lo nesse lance de desespero...
Os preparativos de defesa do palácio — com trincheiras pelo parque — indicavam que
seria assim. Resignou-se, por fim, o presidente, à ponderada opinião dos ministros. Eram
quatro e meia da manhã. Pelo rádio, conheceram as populações (enervadas por toda uma
noite de noticiário falado) a sua calma anuência à necessidade de licenciar-se. Às oito e
meia — ouviram emocionadamente que, revogando com um gesto sem testemunhas a
renúncia forçada, se suicidara com uma bala no coração.
Transformou-se, como num passe de mágica, o quadro político. Nenhuma comoção desta
natureza tivera no Brasil tal desfecho. Longe de ser, como há nove anos, o epílogo de um
processo de deterioração de instituições frágeis, era o sintoma de grave convulsão social,
em que o homem abatido — alvo, na véspera, do mais vivo combate — se nimbou da
auréola do martírio. Projetou-se dolorosamente na sensibilidade popular, através da carta
testamentária que deixara. Saíram do Catete, aberto dramaticamente à visita pública, os
seus funerais, com a retumbância e a espontaneidade das grandes manifestações coletivas.
Eletrizou o povo, o supremo protesto da morte de Vargas! Como força política, à sua
presença, de 1937 e de 1950, sucedeu a sua ausência... Os que em agosto, contra ele,
moviam vitoriosamente a opinião, sentiram nas eleições de outubro (realizadas nesse
clima triste) o efeito daquele luto. Arvorou-se nos estandartes da propaganda, correu os
comícios das capitais e do interior, tarjou fartamente o populismo.
TRANSIÇÃO
Viajara pelos Estados Unidos e pela Europa. Quinto presidente mineiro (depois de Pena,
Venceslau, Delfim e Bernardes), entrou a dirigir a república com propósitos conciliatórios
(o primeiro, a dispensa do estado de sítio) e um largo programa de desenvolvimento —
que pressupunha a normalidade funcional do regime numa de suas conjunturas mais
tormentosas.
O DESENVOLVIMENTO
O governo que começou em 1956 tinha externamente em seu benefício o sólido legado
americanista (com a contrapartida dos compromissos de defesa)897 que o protegia das
inquietações extracontinentais. Serenados os ânimos restava-lhe — inadiável encargo —
atender às finanças subvertidas pelo desequilíbrio orçamentário, estampado no déficit da
ordem de 50 bilhões de cruzeiros, e, mais além, na esfera da produção e do consumo, às
queixas do povo, atormentado pela carestia da vida, resultante normal da inflação. Contê-
la — com a dureza dos últimos ministros da Fazenda — segundo o pensamento clássico,
de que o emissionismo, submergindo o crédito, deteriora as instituições — foi a sua
preocupação inicial. Ao cabo do primeiro exercício reduziu-se o déficit. Mas uma nação
com o ímpeto vital do Brasil não limita as aspirações (voltando à severa quadra de
Murtinho) à balança de contas. Tem de responder ao tempo, na corrida às fontes de
riqueza; a sua força orgânica desprende-se do domínio do espaço; o seu roteiro é o das
áreas novas. Nunca foi tão gritante o contraste entre os embaraços do Tesouro (agravados
imoderadamente pelo custo crescente do funcionalismo) e as perspectivas econômicas. À
medida que no estrangeiro se avolumam as desconfianças do futuro, aumenta a atração
brasileira dos capitais migratórios. Nação essencialmente agrícola do fim do século
passado, passou à categoria das que podem, querem armar com o próprio ferro, com o
próprio combustível — a máquina da independência. O mercado interior absorve-lhe a
produção industrial. Ganha o sentido do Oeste, a movimentação do progresso. As regiões
vazias (reparara o General Gamelin) são, na América, outras tantas colônias, à mão do
mais racional dos... imperialismos, que é a ocupação pela pátria. O deslocamento
desordenado das bandeiras dera-lhe os limites. Urgia alcançá-los pelo povoamento,
impelido pelas circunstâncias cumulativas do pioneirismo, do lucro, do desenvolvimento
escalonado em etapas administrativas. A luta do homem com a imensidade (signo da
formação brasileira) subordina-se a projetos técnicos: toma a consciência dos itinerários.
As “oposições de velocidade e lentidão” (de que fala Roger Bastide)898 convertem-se em
marcha. Como há cem anos — a estrada arrasta o colono: mas não é o pesado comboio; é
a rodovia, com o caminhão. Onde não chega a estrada, vai o aeroplano.
MUDANÇA
O caso de Goiânia lembra o de Belo Horizonte, mais recuadamente, Teresina e Aracaju.
CORRENTES HUMANAS
O surto econômico (tomado o ano de 1888 por divisória, entre rotina e desenvolvimento),
não segue um plano suscetível de reduzir-se a fórmulas simples. Tem, como tivera antes, o
caráter explosivo dos ciclos, em que espontam as novas riquezas; acompanha o sinuoso
rumo das lavouras itinerantes — em busca de novos solos.
Com o aumento anual de um milhão e quinhentos mil indivíduos, em 1958, tem o país
cerca de 62 milhões de almas.
TRANSPORTES
Planos gerais de viação não faltaram, desde o de 1874, do engenheiro João Ramos de
Queirós, até os recentes (de 1932 e 34), tentando cobrir o país com uma rede nacional de
caminhos de ferro. Cederia o lineamento teórico à conjuntura, desarticulando-se em
soluções parciais, que obedecem à tríplice consideração das ligações dos troncos, da
produtividade das zonas novas, do desenvolvimento. Grande época desse
desenvolvimento foi a de 1906 a 10, quando se fizeram a Madeira–Mamoré e a São Luís a
Caxias; alcançou a Noroeste o Mato Grosso; concluiu-se a São Paulo–Rio Grande (unindo
o Rio de Janeiro aos pampas), iniciada em 1895, vendida em 1907 à Brasil Railway; os
trens da Leopoldina foram de Niterói a Vitória. Construíram-se naquele período 2.225
quilômetros; no quatriênio seguinte, 5.180.
AVIAÇÃO
Como que um desígnio oculto fadara o Brasil a ser um país de aeronautas. Bartolomeu de
Gusmão inventou o aeróstato, Santos Dumont o aeroplano... Evidenciou-se, na década
seguinte à Primeira Guerra Mundial, a necessidade de empregá-lo na intercomunicação
brasileira. Apareceram as empresas: no Rio Grande, a Varig, em seguida a Condor,
nacionalizada em Cruzeiro do Sul, em 1930 a Nirba, a Vasp em 1934, a Panair, a
Aerovias... E o heróico Correio Aéreo Militar (maio de 1931). Sem a rapidez desse
transporte, que, em 1928, pôs a fronteira a poucas horas do centro, não teriam ocorrido os
fatos de 1930 — tecidos no colóquio itinerante dos líderes — com a precisão e a
pontualidade previstas. Pela primeira vez um movimento político utilizou a facilidade,
quase a ubiqüidade, de conversas em que se encontraram os responsáveis por três estados
distantes. O avião — para destacar o seu aspecto nacional, ou seja, a interiorização dos
processos culturais pela multiplicação de aeródromos e a chegada aos mais remotos
rincões do passageiro, da máquina, do costume, da moda, do livro, da notícia, portanto da
civilização, com o bem e o mal que a civilização carrega — acelerou, pitoresca e
inesperadamente, a vida nacional. Começou a suprimir-lhe a noção do espaço, presente
em todos os momentos da nossa evolução; valorizou-lhe o tempo. Habituamo-nos a
considerar o povoamento a conquista do espaço, num tempo que corre preguiçoso,
aliando duas idéias básicas da formação americana, a grandeza (que pressupõe
impaciência) e a juventude (que pode esperar). A velocidade criou outra consciência: a
antecipação, que devora as metas, como o avião as distâncias. Sem ele, não se escreveria o
capítulo mais recente da história do país: o desenvolvimento, com a criação
surpreendente de núcleos sociais longe das vias terrestres de acesso, como pontos de
convergência a elas propostos. É o caso — entre muitos — do Brasil Central.
Estes números bastam — como prova de que é um sistema instalado em cheio nos
hábitos brasileiros.
PRODUÇÃO
Pela tabela das exportações podemos seguir a evolução dos produtos com a sua
diversificada influência no desenvolvimento do país.
O CAFÉ
O convênio de Taubaté (1906) valorizou sem limitar. Este, o erro da política de retenção
dos stocks e preço alto, boa para o país produtor, enquanto “controlasse” o mercado,
absurda quando (estimulada pelas cotações crescentes) se apresentasse a concorrência,
derrubando no excesso da oferta todos os cálculos. Assim aconteceu em 1929. Guardar
para as safras magras, segundo o critério bíblico, era simples. Outros fatores,910 porém,
incidem nas lavouras tropicais; o mais grave, a inconstância meteorológica. Julgava-se que
a um ano farto se seguiria um de escassez. Se invariável o ritmo, o sistema de Taubaté não
sofreria objeções. Na hipótese da superprodução, com o “enjôo” das praças compradoras,
cairia por terra, com os seus complementos de financiamento e crédito. No princípio,
tudo correu às maravilhas. 1890 foi o boom paulista. A saca de café valia 100 mil-réis!911
Seguira-se a depressão... Exportávamos dez milhões de sacas em 1899 (quase o dobro de
89), onze em 1905,912 em 1920 quatorze, em 1928 um pouco menos,913 o que vale dizer que
as remessas mantiveram uniformidade, sem embargo do aumento do consumo. Em
quatro anos foi resgatado o empréstimo de quinze milhões esterlinos garantido pela
União (base do convênio) e podia São Paulo levantar mais sete e meio milhões
(liquidáveis até 1923) para continuar a manobra. Em 1917 o governo federal entrou, com
lucro, no mercado, para armazenar três milhões de sacas; e em 1920 (tomando 25 mil
contos no país e quatro milhões de libras em Londres) repetia a intervenção defensiva,
confiada, em 1922, a um instituto permanente. Reverteu dois anos depois à administração
paulista.914 Proteger o café era socorrer a nação, a quem dava dois terços do ouro de sua
balança comercial. Estremeceram, a nação e o seu principal negócio, com o crack da bolsa
de Nova York. Acumularam-se duas grandes colheitas. Isto (23.324.000 sacas!) quando
havia stocks sem colocação915 e se propunha, para remediar a pletora, a eliminação dos
saldos... Desandou o preço; e o governo...916 Triunfante a revolução em que a crise tivera a
sua parte (o “general café”...), o Ministro José Maria Whitaker, representando o
pensamento conservador de São Paulo, empreendeu a defesa pelo equilíbrio estatístico.917
Adquiriu a União 17.500.000 sacas. A taxa de dez, depois de quinze shillings, financiou a
redução e — em monstruosas fogueiras — a queima do excedente. Só não era selvagem,
essa operação simplista, porque era universal,918 num estranho tempo em que se
destruíam, com o mesmo propósito de equilíbrio, videiras na França, rebanhos na
Austrália, máquinas na Inglaterra... Proibiu-se o plantio. O que tinha de artificial a
política limitativa estourou, em forma de corrida às terras roxas, mal o restabelecimento
econômico dos Estados Unidos — a que se seguiu a alta, peculiar à expectativa de guerra
— repercutiu no mercado brasileiro.919 Seria utópico impedir a multiplicação das fazendas
ao espraiar a “onda verde” pelos solos propícios, como, em 1870, à roda de Ribeirão
Preto.920 Nem se restringiu ao norte do Paraná. Atirou-se a Goiás e Mato Grosso.921 Com o
séquito de civilização itinerante, o fenômeno de cidades improvisadas, em que correm as
avenidas pelos roçados da véspera, numa rápida montagem de instalações precárias, a
lembrar a Califórnia dos “pioneers” — com o trabalho barato dos trabalhadores
deslocados das zonas pobres do Nordeste pelas modernas rodovias... Pelo roteiro do café
— como no século passado — continuaram a brotar núcleos prósperos, que amiúdam as
malhas da rede de circulação, para lá dos caminhos tradicionais do Sul e do Oeste: numa
conquista metódica de vales e planaltos, em direção à despovoada e imensa fronteira.
Permanecia com a qualidade original, de bandeirante. Nova crise feriu o café em 1957 e
comprometeu-lhe a posição mundial em 1958. Até então, tivera o Brasil a liderança da
exportação (em 1957, 42% da importação norte-americana e 32% da européia).922 Dela
tirou (naquele ano) 61% do volume global de divisas provenientes das vendas externas. É
como se disséssemos (confirmando) que sobre essa coluna repousa o suprimento nacional
de moeda estrangeira, ou seja, o câmbio. Enquanto os máximos produtores fossem os
países latino-americanos (a Colômbia, já com 20% da importação norte-americana), não
se modificariam os dados do problema. A partir porém de 1950, os territórios africanos
começaram a produzir café em ampla escala. Em 1946 os Estados Unidos lá adquiriam
420 mil sacas; em 1957, 3.200.000, ou seja, de 2% a 15% do seu consumo. Por sua vez o
Mercado Comum Europeu comprou na África 34% da sua importação (em 1957). Esses
nove milhões e 100 mil sacas derramadas nas linhas de distribuição contribuíram — como
um fator explosivo — para o caráter depressivo da economia cafeeira na América Latina.
Não constituem, porém, a razão fundamental da angústia que a assoberbou. Origina-se da
complexidade das relações internacionais nesta época de choque das mentalidades agrária
e industrial, do nacionalismo econômico, baseado na auto-suficiência, da interrupção dos
processos clássicos de intercâmbio no dirigismo, na valorização, na planificação daquela
economia perturbada.
AÇÚCAR E FUMO
Limitação análoga sofreu o fumo, cabedal tão estimável outrora, e que ultimamente
conserva nas estatísticas uma constância melancólica. Em 1821, 2,5, continua a manter
esta percentagem sobre a exportação do Brasil cem anos depois.925
ALGODÃO
BORRACHA
A borracha amazônica foi fulminada, em 1911, por uma catástrofe, prevista com o
desdobramento das plantações asiáticas: a depreciação.928 O produto nativo seria
esmagado pelo cultivado, proveniente das primeiras mudas levadas do Amazonas em
1876. Dia viria em que, saturado o mercado, se contentasse com a goma da Malaia e das
Índias Holandesas; mas por preços que não pagavam o custo da borracha paraense.
Aquilo foi inopinado; e terrível.929 Caindo verticalmente a procura, logo se imobilizou a
rede econômica que envolvia, desde o seringueiro, no seu barranco, até o exportador de
Manaus e do Pará, abrangendo o “aviador”, o comércio volante, o latifundiário, os
pioneiros que voltavam do seu trabalho com verdadeiras fortunas, dissipadas com
estrondo nos desperdícios da capital. A lendária opulência de Manaus de dez anos antes,
com o teatro semelhante aos melhores do continente, o luxo e os hábitos de cidade rica,
como por milagre se dissolveu numa tristeza de terra devastada: acabou, no país, o delírio
da borracha. Deixara um vestígio memorável no mapa do grande vale, com as povoações
semeadas até às divisas da Bolívia e do Peru, a ocupação dos remotos afluentes, o
devassamento do Acre. Criara civilização; integrara no conjunto nacional o extremo
Norte; dera algum tempo o contrapeso à desmarcada evolução econômica do Sul, quando
(como em 1910) o café e a borracha se equivaliam na balança comercial.
Julgou Henry Ford que podia, plantando seringais às margens do Tapajós, abastecer a
indústria norte-americana com um produto barato, e superior ao dos ingleses da Ásia.
Fracassou-lhe o empreendimento (e deu de graça culturas e benfeitorias ao governo
brasileiro) pela impropriedade do solo, manifesta na baixa produção...930 Dir-se-ia que só
a floresta remuneraria o rude trabalho dos caucheros. Com a Segunda Guerra Mundial
(fechados os mercados orientais) a valorização entusiasmou de novo os caçadores da
goma: mas, cessada a febre da procura, ainda uma vez a queda das cotações os desanimou
e dispersou.
CACAU
Passou o Brasil a grande exportador de cacau graças à expansão desta cultura no sul da
Bahia, tendo por centro Ilhéus, velha capitania que em alguns anos (1893 a 1900) se
transformou numa das zonas florentes do país. Em 1891, da Bahia saíam 3.028
toneladas.931 Seis anos depois, 7.632; em 1906, 23.537; ao começar a primeira grande
guerra, 41.545; em 1923, 62.492.932 Atingindo o dobro dez anos mais tarde, em 1939 a
exportação alcançou 141.838 toneladas, em 1957, 109.700.
CRIAÇÃO DA INDÚSTRIA
O que até aí se debatera (a partir de 1843) foi a proteção tarifária, que deixasse viver a
manufatura sem desafiar a represália do competidor estrangeiro, que, em troca do
artefato, nos comprava a matéria-prima. Livre-cambista era o império. A república
principiou industrial na febre do “encilhamento”, e segundo o claro pensamento de Rui
Barbosa: que, pelo menos, se impedisse a importação dos “similares”... Prosperaram as
tecelagens; e as usinas de açúcar. Mas seria temerário insistir no isolamento industrial do
país (sem capital para mecanizar-se, nem mercado interno para o produto, que lhe ficaria
muito caro) no “clima” liberal de 1900. Bastava o tratado norte-americano de 1890, com a
cláusula benévola da livre entrada do café (desprezado o açúcar, que, sem o favor da
“exclusividade”, não concorreria com o de Cuba)933 — para que não ousassem desfechar o
sonhado protecionismo os cautos políticos, hesitantes entre a lavoura, dona do poder, e as
belas teorias de reabilitação econômica. Joaquim Murtinho não tergiversou: pôs-se
decididamente contra a indústria; para salvar o câmbio. Mataria a iniciativa, contanto que
resgatasse as dívidas. A república não precisava desenvolver-se; precisava pagar. O
problema não era biológico, de crescimento, mas contábil, de caixa. Satisfazendo aos
compromissos na City consolidaria o crédito, embora travasse o progresso (palavra
equívoca) e continuasse o Brasil a receber, pelo vapor da carreira, o seu equipamento de
subsistência. Dos sapatos ingleses à manteiga dinamarquesa, dos fósforos suecos às telhas
francesas, do pinho-de-riga às ferragens alemãs, do linho de Manchester aos queijos
flamengos, dos livros portugueses aos móveis de Paris. Reluziam, como reações
esporádicas, as campanhas de associações instrutivas, como outrora a Auxiliadora da
Indústria Nacional (1825),934 com o seu periódico (1833–60), e, no começo do século, o
Centro Industrial do Brasil, capaz de resumir, em 1907, num livro oportuno, a economia
do país.935
Na câmara vozes atrevidas, como a de João Luís Alves, em 1905, propuseram a proteção
industrial.
Saía mais barato no Brasil o tabuado da Finlândia do que o do Paraná; nem era
admissível que se espezinhasse a pobreza do consumidor, com o preço protegido do
fabricante, porque nacional... Sobreveio a guerra.937 Na mensagem de 1915, o Presidente
Venceslau Brás adotou, como plano de governo, o reajustamento a este imperativo:
industrializar é sobreviver.
Lição de audácia, foi a fábrica que Delmiro Gouveia suspendeu aos rochedos de Paulo
Afonso — a de Pedras — para captar-lhe a energia hidrelétrica. O pioneiro nordestino
impunha o exemplo simples, de sua previsão, ao pé das forças inexploradas da natureza.
Indicou a corrida às fontes vitais do futuro — nos mais inóspitos recantos do país.
Simultaneamente se aparelham as indústrias de base ou de transformação nas cidades
mais populosas; delineia-se em São Paulo, centro da grande metamorfose, o parque
industrial denso e vigoroso.
As cifras exprimem sem nitidez o surto, melhor fixado no cotejo dos valores entre a
indústria e a lavoura. Em 1926 (transposto o período internacional crítico) ficava a
agricultura com 8.500 mil contos, e a indústria dava dezessete milhões, saídos de 49.418
estabelecimentos, com 781 mil operários. Vencido o decênio, o recenseamento de 1950 a
apresenta com 92.350 estabelecimentos, 1.279.184 trabalhadores, produção de 118.605
milhões. A produção industrial subiu de 76% no setênio (1949–50 a 1957).
Com os seus distúrbios, a questão social, a irrupção pela terra vazia, os deslocamentos de
população, más finanças, em contraste com o desenvolvimento, a curva evolutiva do
capitalismo.
São índices deste capitalismo aguado na inflação, os números relativos à renda nacional
(soma de rendas individuais) que de 34, em 1939, subiu a 225, em 1951,940 enquanto a
população, de 27.404.000 no censo de 1920, ia além de 52 milhões no de 1950.941 Crescera
de 25% a produção agrícola. Duplicou a industrial. A distribuição geográfica mostra o
desequilíbrio acentuado, desde que, na balança comercial, o café suplantou o açúcar, e a
imigração intensiva ocupou, ao Sul, as zonas temperadas. Quanto à renda, para 125, do
Sul (incluindo São Paulo e Rio de Janeiro), o resto do país apresenta somente 45.942 Ali,
pois, a produção per capita é doze vezes maior...
SIDERURGIA
A segunda guerra foi para a economia latino-americana mais benéfica do que a primeira.
Já agora podia o Brasil pedir aos Estados Unidos que o ajudassem a montar a siderurgia
(em vez de vender-lhes apenas o minério).943 Não se tratava de encorajar a manufatura,
porém de distribuir a força hidroelétrica, necessária ao mecanismo industrial (de 1,2
milhões de cavalos-vapor em 1939 a 2,7 em 1949). No caso da metalurgia o
beneficiamento não interfere na exportação (Companhia do Vale do Rio Doce) do ferro
de Minas Gerais. O melhor que se fez — na conduta nacionalista preconizada pelo
Presidente Bernardes (oposto ao privilégio da Itabira Iron) — foi transferir para a
autarquia federal o transporte e a exportação pelo porto de Vitória. A Companhia Mista
Siderúrgica Nacional foi instituída em 9 de abril de 1941 (o Import and Export Bank
emprestou, para tanto, 45 milhões de dólares em maquinismos). A sua grande usina de
Volta Redonda começou a funcionar cinco anos depois.944 Outras usinas gigantescas —
com a ajuda do capital estrangeiro — se instalaram na região ferrífera. Em 1956, a
produção total de gusa foi de 861 mil toneladas, em 1957, de 958 mil, a de aço, de 1.253
mil em 1957, a de laminados, de 977 mil.
Petróleo, aí está!
ENERGIA E COMBUSTÍVEL
O nacionalismo suspicaz (“o petróleo é nosso”) dele se apoderou, com uma justificativa
ressentida: a insistente indiferença dos trusts pelas possibilidades do subsolo brasileiro.
Entra pelos olhos que se não descontinua, na Amazônia, o aspecto geofísico que
uniformiza as Guianas (e a Venezuela). Nem era crível que surgindo acolá, e no Peru, na
Bolívia, no Chaco paraguaio, respeitasse a fronteira, espécie de fosso mágico entre a
abundância e a esterilidade. Gracejou-se: como se o petróleo só falasse espanhol...
Monteiro Lobato (desde 1931 metido a incorporador de empreendimentos petrolíferos)
protestou contra o ceticismo passivo e os relatórios negativos. Vociferou, anatematizou,
bateu-se.945 Na Bahia, Oscar Cordeiro foi mais feliz: molhou as mãos na lagoa do Lobato,
que cheira a nafta, e desafiou a incredulidade do poder público.946 Lá estava, em veios
superficiais, manchando a água, como naqueles sítios da Ásia Menor, onde os peregrinos
da Idade Média o colhiam, passando, para a luz das candeias... “Umas certas minas que
há, naquelas partes, em que nasce um óleo, que se chama narafe, de que se lá aproveitam
para muitas mezinhas”.947
Não sacudiu a opinião de naturalistas, fortes nas suas razões mineralógicas. Deixando de
lado as descobertas carboníferas feitas no Recôncavo em 1815,948 não admitiam a hipótese
de fraturar-se junto do mar a camada arqueana, para dar espaço ao lençol de petróleo...
Acertara o autor de Urupês: o problema consistia em experimentar; furando, achar-se-ia.
O PROBLEMA INTELECTUAL
Ao fazer, em 1904, o retrospecto das letras, observou Sílvio Romero que as gerações
precedentes não tinham sido ultrapassadas: só o número de poetas crescera...951
Seria absurdo pretender que a confusão que se generalizara, com a crise das instituições,
no seu tríplice aspecto, político, econômico, social, poupasse o terreno pacífico dos estilos:
e os artistas continuassem a fantasiar a vida como os antecessores, do romantismo.
Tinham de ser polêmicos, naturalistas, céticos: exatamente nessa dispersão de tendências
está a fecundidade do período. Não há forças concêntricas, senão linhas divergentes; uma
luta simbólica de utopias, cujo denominador comum é, finalmente, a adivinhação
dialética de um Brasil primordial, digno de ser interpretado pelos egressos do Parnaso,
parisienses de convicção, que faziam da Livraria Garnier (escreveu Ferrero) o estuário da
cultura universal.952
Disse Olavo Bilac, em 1907, que a sua geração acabou com o isolamento desdenhoso dos
homens de letras, para que sentissem o “problema social”, ou simplesmente a vida.953
POESIA
Chefia a escola Cruz e Sousa, nessa fascinante “experiência mística” que lhe serve de
roteiro,957 a paisagem interna clareada de sonho, escurecida de terror, abismada na alma...
Os grandes nomes são Bernardino Lopes (Brasões, 1895), o surpreendente Alphonsus de
Guimaraens,958 semi-oculto na sombra eclesiástica de Mariana (Setenário das Dores de
Nossa Senhora, Dona Mística, 1899; Kiriale, 1902), Francisco Mangabeira (Hostiário,
1898), em êxtase heróico (Tragédia épica, 1900), perto de Castro Alves;959 Egas Moniz, que
misturou cores e música em primores poéticos;960 Mário Pederneiras (Agonia, 1900;
Rondas noturnas, 1901), Félix Pacheco (Via crucis, 1900), Silveira Neto (Luar de inverno,
1895), Emílio de Meneses (Poemas da morte, 1901), Nestor Vítor, Emiliano Perneta,
Zeferino Freire, ainda Augusto de Lima, Pereira da Silva, Artur de Sales, Olegário
Mariano, o poeta das Cigarras... Fora das escolas, Augusto dos Anjos.961 A rajada do
modernismo encontrou de pé as suas rendilhadas construções.
ESCRITORES
Este, nos grandes livros urbanos, A capital federal, 1895; A conquista, 1897; Fogo‑fátuo,
1929, biografou a geração disputando o lugar ao sol — na cidade que mudava —; também
lhe ensina a elegância vibrátil da ironia. Depois abusaria do exótico, caiando com alvuras
de Partenon a prosa ática. Pagou o tributo ao ressaibo parnasiano do helenismo, flutuante
na retórica de Bilac (que, em Santos, comparava ao Pireu968 o porto atulhado de café), de
Gilberto Amado, que, na Chave de Salomão, comparou à Acrópole os morros do Rio,969
até de Monteiro Lobato...970 “Quando Demódoco, sentado de encontro a uma das colunas
do Palácio de Alcino”.971 A respeito do nosso agreste Sílvio Romero: “Autóctone, como os
que, na Grécia, eram chamados eupátridas”.972 Isto, de Neto, retinia; e cantava. Aliás, se o
amor do vocábulo era insígnia parnasiana, Euclides da Cunha, que o exagerou, e por sinal
no mais brasileiro dos livros, estava dentro da escola...
SERTÕES
Euclides não foi de todo original, dir-se-á, recordando Sarmiento, até Teodoro Sampaio,
que descrevera o Vale do São Francisco com luxo de termos científicos. Mas é insuperável
no tríptico de Canudos: a geografia humana, a imagem social do jagunço, e a apologia da
sua imolação. Pela primeira vez o “espírito científico” metia-se num monumento
literário.976 Com a vivacidade do libelo, falou a sua queixa da desorganização republicana,
do exército de que egressara... Não se exija a serena justiça histórica, ao escritor
empenhado em aproximações formidáveis (ou temáticas): a “Ilíada sertaneja”, espécie de
Vendéia com os pobres heróis desconcertantes... O livro tem rutilante propósito de
acusação (cívica) e protesto (humano), cuja pompa verbal, com as sugestivas pinceladas
de ciência, na sua prosa de engenheiro, sensibilizou as elites espantadas. “O sucesso só foi
comparável ao de O cortiço, de Aluísio Azevedo, e ao de Canaã de Graça Aranha”.977
Emendamos, em face das edições (a 12ª com errata do autor): foi superior. Objete-se a
extravagância do vocabulário, com o preciosismo (crítica de Veríssimo),978 agreste como
se escrito a cipó (reparou Nabuco). Tratava-se do retrato rústico do Brasil, conclui
Afrânio Peixoto. Daí os discípulos: e a nova dimensão que deu ao país: os sertões. Inferno
verde, de Alberto Rangel (1906), Terra do Sol, de Gustavo Barroso, Rondônia, de
Roquette-Pinto, Maria Bonita e Fruta do mato, de Afrânio, a humilde verdade do Norte
(Luzia‑
‑Homem, de Domingos Olímpio, 1903), das coxilhas (Ruínas vivas, de Alcides Maya,
1910, Contos gauchescos, de Simões Lopes Neto), a candura praieira ( Jana e Joel, de
Xavier Marques), impõem o caboclismo. A insistência, ainda era romântica.
Oriundo do Vale do Paraíba, emergindo das depauperadas glebas do café, onde “cidades
mortas” testemunhavam a volubilidade do progresso, o intérprete revolucionário da
realidade rural antepôs ao gigante, de Gonçalves Dias, ao herói caboclo de Alencar, ao
jagunço de Euclides, o... Jeca. “Nada o desperta”. Era o caturra opilado e sorna, dobrado
sobre si mesmo, na desesperança irremediável do seu cansaço e da sua paciência,
esquecido dos governos, isolado na melancolia do panorama, marginal calado da
civilização que silvava, com o trem de ferro, no seu horizonte interior... Rui Barbosa (em
hora de redescoberta da “questão operária”) emprestou à imagem uma importância
nacional.980 Lobato tornou-se um renovador, a vésperas da eclosão modernista de 1922...,
que não o conquistou.
A ACADEMIA
“O vosso desejo é conservar, no meio da federação política, a unidade literária”, definiu
Machado de Assis, no discurso inaugural da Academia Brasileira, em 20 de julho de 1897.
Saiu da iniciativa de Lúcio de Mendonça na redação da Revista Brasileira...981 A
circunstância de se juntarem novos e antigos para a fundação de uma sociedade com o
número e o estilo da Academia Francesa, testemunhava a evolução rápida de que o
espírito se beneficiara, entre o desalinho de 1891, a dispersão de 93, a “anistia” de 97. O
governo perdoara a rebelião; no seu clima indulgente também se apagavam as
incompatibilidades intelectuais, três anos antes extremadas e rancorosas. O secretário-
geral era Nabuco, pretendendo criar um salão, de expoentes; pioneiros da idéia Medeiros
e Albuquerque, Lúcio de Mendonça; uniam-se, sob a presidência neutra de Machado, os
irreverentes Artur Azevedo, Guimarães Passos, os jovens Rodrigo Otávio, Graça Aranha
(ainda sem livro), Magalhães de Azeredo; monarquistas como Taunay, Afonso Celso,
Laet, Eduardo Prado, Loreto; a crítica de Sílvio Romero, Veríssimo, Araripe Júnior; a
imprensa com Patrocínio, Alcindo Guanabara; a diplomacia de Oliveira Lima, Salvador
de Mendonça, Domício da Gama; a poesia com Bilac, Raimundo Correia, Alberto de
Oliveira, Luís Guimarães, Murat; a prosa de Aluísio Azevedo, Garcia Redondo, Valentim
Magalhães; acima das espécies literárias, encarnando o verbo tribunício, Nabuco, Rui...982
O velho Pereira da Silva era ali um nome desbotado, da história imperial.
Confraternizavam as escolas, na defesa da língua, dos direitos da inteligência...
Coincidiam-lhes as aspirações com o programa de todas as academias: escolha dos
“melhores” (replicou Nabuco: “grands seigneurs de todos os partidos”),983 expurgo do
idioma em dicionário e gramática, nessa luta solene dos doutos contra a fala corrupta e a
ruína da tradição... Não o cumpriria de repente. Precisava de tempo. Persistiu; e
continuou.
Pela pureza vernácula, bastava então a polêmica em torno do Código Civil (a golpes de
réplica e tréplica). Em 1904, tinham a palavra os filólogos.
“Somente poderia surgir no meio de uma elite mental e política. Essa elite existia”.987
No folhetim, França Júnior, Constâncio Alves, Eduardo Ramos, Laet, Bilac, Nuno de
Andrade, Medeiros e Albuquerque, Afonso Celso; na crítica, Veríssimo,988 Araripe, João
Ribeiro, Osório Duque-Estrada, Gonzaga Duque (mestre de estética), Ronald de
Carvalho, cuja História da literatura, em 1917, inicia outro período... Romanceiam a vida
carioca Adolfo Caminha,989 Afrânio Peixoto,990 João do Rio (que divide com Melo Morais
Filho a interpretação dos seus “mistérios”), Lima Barreto, subversivo — com revérberos
anárquicos no desgosto irônico...991 A propósito de Eduardo Prado, definiu Eça o panfleto
— de que foi “um incomparável mestre”.992 Brilham na imprensa — depois de Quintino,
Ferreira de Araújo, Rodolfo Dantas, Manuel Vitorino — Leão Veloso, Patrocínio (que
morreu a escrever o seu artigo de fundo), Alcindo Guanabara, João do Rio, Alves de
Sousa, Castro Meneses, Gilberto Amado, Humberto de Campos, Costa Rego, Assis
Chateaubriand, J. E. de Macedo Soares... Com o sistema presidencial perdera a tribuna
política o velho prestígio, de palco das grandes cenas da vida pública, quando a
dominavam os expoentes dos partidos, com a autoridade, a destreza, a paixão, até o
virtuosismo da eloqüência intimativa ou sentimental. Alguns foram oradores medíocres.
Mas a eficácia da palavra — que não o seu fulgor — os sagrou, na primeira linha do
debate parlamentar. Sem esta vantagem (que tiveram Zacarias, Cotegipe, Gaspar Martins,
Ferreira Viana, na sucessão de Vasconcelos, Antônio Carlos, Nunes Machado, Honório)
— conquistaram no Congresso republicano copiosos aplausos homens do porte de
Manuel Vitorino e Lopes Trovão, David Campista e Junqueira Aires, Pedro Moacir e
Germano Hasslocher, Barbosa Lima e Irineu Machado, Gastão da Cunha e Francisco Sá,
Epitácio Pessoa, Otávio e João Mangabeira, para citar apenas alguns. Rui Barbosa ocupa
na política, no Senado, nas letras e na atenção dos contemporâneos e dos pósteros um
lugar indisputável. Modelo de frase grandiosa, em cujas orações flui na sua pureza clássica
a língua vernácula, estilizada com a elegância e a dignidade que lhe dera Vieira, são
antológicos todos os discursos em que o mais combativo dos liberais do seu tempo atacou
as deformações e pregou as esperanças do regime de opinião, justiça e verdade. Vesse
imenso espólio verbal os estudiosos da língua portuguesa (como os latinos nas obras de
Cícero) vão garimpar as riquezas do vocabulário numeroso e da boa gramática. São, aliás,
os documentos que ficam: como aquelas estátuas lavradas na eterna pedra, em contraste
com o barro dos esboços que saem provisórios e quebradiços das mãos apressadas do
artista...
A GRANDE INSATISFAÇÃO
GERAÇÃO DE 1922
A irreverente geração da semana, de São Paulo, admitiu tudo o que assustava a pacatez
nacional: Paulicéia desvairada, 1922; A escrava que não é Isaura, 1925; Losango cáqui,
1926; Macunaíma, 1928, de Mário de Andrade; o Manifesto do Pau‑Brasil, de Oswald de
Andrade; o Verde‑amarelo, de Menotti del Picchia; Movimento antropofágico (1928);
Martim Cererê, Borrões de verde e amarelo, Vamos caçar papagaios, de Cassiano Ricardo;
a música de Villa-Lobos, a pintura de Di Cavalcanti, a poesia de Manuel Bandeira
(Libertinagem, 1930), de Drummond de Andrade; contos de Alcântara Machado (Pathé
Baby, 1926), romances de Plínio Salgado (1926 e 1931)... Pertencem a esse período fértil
— em que eclodiu a revolução de 1930 — o Canto do brasileiro, de Augusto Frederico
Schmidt, 1928,997 os paisagistas do Brasil de verdade, dramaticamente desenhado na sua
humildade longínqua, esquecido nas terras do açúcar (José Américo de Almeida, com o
“primeiro grande romance do Nordeste”,998 A bagaceira, 1928), terras secas (Rachel de
Queirós, O Quinze), ásperas e ricas de tormento humano (Graciliano Ramos, Caetés;
1933, São Bernardo, 1934), vistas de dentro (Amando Fontes, Os corumbas, 1933), entre o
rio e a mata (Jorge Amado, Cacau, 1983) ou espraiadas na Amazônia (Peregrino Júnior,
Pussanga, 1929; os volumes de Raimundo de Morais, Gastão Cruls...), terras de heroísmo
e canavial, do ciclo do bangüê, criado por José Lins do Rego (de Menino de engenho,
1932, a Cangaceiros, 1953), folclore (Gustavo Barroso, mestre do gênero, Ao som da viola,
1921; Luís da Câmara Cascudo, que o opulentou com a sua série de livros informativos,
Renato Almeida), desatados horizontes, desde o Rio Grande (Apolinário Porto Alegre,
Roque Callage, Darci Azambuja, Viana Moog, Érico Veríssimo, a par de José Lins, o mais
popular dos novelistas contemporâneos)...
Mão entra no âmbito desta história o panorama atual da literatura, com a variedade da
produção artística, o fermento de idéias e, à margem da ficção, as memórias, em cuja
melancolia evocativa os homens de letras involuntariamente se encontram com os
historiadores. Alguma coisa, porém, deve dizer-se do desânimo da velha poética,999 da
reanimação do romance realista e social, da contribuição da indústria do livro para essa
bibliografia crescente e... nacional.
FILÓLOGOS
Falamos do vernáculo. Transposta a época dos gramáticos, chegou a dos filólogos. À fase
polêmica da redação do Código Civil, em que o purismo arcaizante e copioso se apegou
aos clássicos (tantas vezes confundindo-os com os “antigos”), devia seguir-se a da
gramática histórica, de Manuel Said Ali, dos Dicionários (Laudelino Freire), entre estes,
primeiro da espécie, o Etimológico (Rio, 1933) de Antenor Nascentes, das edições críticas,
em que o expurgo e a análise textual valorizam (como no caso da edição das poesias de
Casimiro de Abreu, por Sousa da Silveira) os primores literários do passado. Estes últimos
estudos, que careciam da sistemática dos cursos próprios (essenciais às Faculdades de
Filosofia), com eles progrediram, e têm hoje cultores abalizados, cujos livros sobre a
história da língua, as suas galas e diferenciações na área do império, os brasileirismos, os
problemas dialetais, a expressão regional, a complexidade e o esplendor do português
velho e novo, passam as fronteiras do Brasil.
TEATRO
HISTÓRIA
A cultura alemã transformou os estudos jurídicos, com Tobias, os estudos médicos, com
Francisco de Castro, os históricos, com Capistrano de Abreu e João Ribeiro... Trocando o
positivismo pelo realismo histórico, primeiro a traduzir Ratzel, seguindo as diretivas de
Ranke, abandonou Capistrano o gosto literário da narração, para mergulhar
beneditinamente nas fontes, joeirar a documentação, reeditar os textos, sem cuja crítica já
se não escreveria a formação brasileira. Com o seu companheiro na biblioteca, Vale
Cabral (a quem se deve a exposição de documentos de 1882),1001 contentou-se com a
revelação dos grandes testemunhos, cartas jesuíticas, Antonil, Cardim, Frei Vicente, os
códices da Inquisição; e achou melhor rever do que substituir a História de Varnhagen.1002
Rodolfo Garcia, à altura do mestre, continuou-lhe esta última tarefa.1003 Imbuído da
pedagogia germânica, repudiou João Ribeiro o processo arcaico1004 e saiu, em 1900, com o
primeiro manual em que a sistematizarão supera a cronologia, a nominata, a ênfase... Em
1907 alinhou Capistrano — navegando essas águas Capítulos da história colonial, em que
acentuava, com o traço satírico, a sábia originalidade.1005 Despreza o consagrado, desenha
sumariamente a geografia, define as linhas do fenômeno brasileiro desdenhando
símbolos, reivindicando valores esquecidos, sem medo às conclusões céticas, aos
preconceitos irônicos (contra Tiradentes, o bandeirante...). As questões de limites deram
pressa à indagação dessas origens no inventário de manuscritos e mapas em que se afanou
— e afamou — a equipe de Rio Branco. Mobilizou o centenário de Anchieta, em São
Paulo, por inspiração de Eduardo Prado (patriota inabalável, travestido de sibarita nas
suas aparentes contradições),1006 talvez, diz José Veríssimo, na nossa literatura o único
escritor reacionário1007 — o grupo acadêmico de advogados do Brasil velho, com o
missionário e o bandeirante; a patrulha dos “400 anos”...1008 E em 1898 o livro filial de
Joaquim Nabuco — em honra do “estadista do império” — reaproximou as gerações
separadas pela ebulição republicana. Punha-se perspectiva na crítica; retornavam os
calmos julgamentos. E os conselheiros e barões (Rodrigues Alves, Pena, Rio Branco; Rui,
aliás, nunca deixou de ser conselheiro...). Nesta atmosfera de recomposição (e
historicismo) foram inaugurados os monumentos de Osório, Caxias, Maná, Dom Pedro II,
em Petrópolis... Desagravou Oliveira Lima (1908) a espessa figura de Dom João VI, reviveu
Alberto Rangel a de Dom Pedro I (1914), celebrou o Instituto Histórico o seu primeiro
congresso (1914). Fez época, em 1900, o otimismo de Afonso Celso, Por que me ufano do
meu país. Contribuição às festas do 4º centenário, era, na sua capa de apologia, retificação;
e protesto. A estrangeirice da moda, que lavrara parasitariamente na inteligência das
elites, não tinha por que se envergonhar do passado. Ao contrário, sobravam-lhe razões
para dele se desvanecer, no passado, nas realidades, no porvir (e a visão poética do escritor
se espalha pelos potenciais econômicos). Essa consolada satisfação vinha a tempo, que, do
outro lado, os desenganos (e pode estabelecer-se o paralelo, das decepções públicas e da
reação intelectual, nos vários climas contemporâneos, a começar pela Espanha de 1898)
— inspiraram a literatura amarga, que vai do pessimismo de Manuel Bonfim ao
antiufanismo1009 de V. Licínio Cardoso, ao “retrato”, de Paulo Prado,1010 atravessando o
científico realismo de Afrânio Peixoto (Minha terra e minha gente, 1916). Que o
brasileiro é um subnutrido... De um a outro extremo (exaltação e depressão) não faltou
espaço à síntese político-social, ao revisionismo, à atividade torrencial de Calógeras
(formação, minas, diplomacia), de Basílio de Magalhães (expansão geográfica, 1915),
sobretudo de Afonso d’Escragnolle Taunay, que Capistrano saudava, em 1931, como
batonier dos historiadores. Deve-se-lhe a minuciosa restauração dos movimentos
sertanistas (11 volumes da História das bandeiras paulistas), mal conhecidos, ou nublados
na indecisão das tradições recolhidas por Pedro Taques e Frei Gaspar, a maciça História
do café (15 tomos), a da Cidade de São Paulo, a reivindicação da prioridade aerostática de
Bartolomeu Lourenço, a geografia das bandeiras. Coligiu Rocha Pombo, em dez volumes,
a História do Brasil, tarefa que o situa entre os admiráveis trabalhadores do seu tempo. A
nova História (haurida dos arquivos) abebera-se nas monografias de Studart, Alfredo de
Carvalho, Aurélio Porto, Alberto Lamego. Tobias Monteiro (que em Pesquisas e
depoimentos estreara a reportagem histórica), começou a História do império, rica de
inéditos, que parou na Confederação do Equador; Alberto de Faria renovou, com a de
Mauá, o método das biografias reparadoras (1926); Alcântara Machado exaltou “vida e
glória do bandeirante”;1011 com as Figuras do império preparou Batista Pereira o terreno à
história sem preconceitos (panegírico ou ressentimento) do passado regime. Vieram os
livros em que ressaltam qualidades e defeitos de ambos os imperadores,1012 a resposta da
biografia à indiferença,1013 memórias em que se dilui,1014 miniaturada, a crônica da política
e do espírito...
Deu-lhe ajuda o Estado, que se não desinteressou dos monumentos históricos, aliás
preservados por disposição constitucional.1018
Nenhum dos núcleos da civilização brasileira deixou de ter, com o cronista, a auréola,
poética do livro.1019 Com o material dispersivo desse amor à terra pequena, base da
fidelidade à terra, maior, poderíamos compor outra história, que escapa à resumida e
geral, entretanto por ela assimilada, nas interferências cíclicas da vida municipal nos
acontecimentos do país.
DIREITO
O direito romano tem os seus didatas, Filinto Bastos, Abelardo Lobo, Bulhões Carvalho.
Analisam a Constituição João Barbalho, Aristides Milton, Amaro Cavalcanti, Alfredo
Varela, Felisbelo Freire, Aurelino Leal, Pedro Lessa, Carlos Maximiliano; tão
freqüentemente lhe esmiuçou Rui Barbosa letra e espírito, que a coletânea destes
comentários rendeu cinco volumes.1028 O direito público, ensinado por Viveiros de
Castro, a economia por Almeida Nogueira, a teoria do Estado por Queirós Lima,1029 o
direito internacional privado por Rodrigo Otávio,1030 o das gentes por Sá Viana, Clóvis,
Hildebrando Accioli,1031 o comparado por Cândido de Oliveira,1032 o penal militar por
Esmeraldino Bandeira, a filosofia, no positivismo sociológico de Pedro Lessa,1033
solidificam a base das recentes construções. A partir de 1930, fertiliza em outras espécies,
com o direito do trabalho (Oliveira Viana, Evaristo de Morais, Cesarino Júnior), o novo
estatismo (Francisco Campos), formas e reformas constitucionais (Levi Carneiro, João
Mangabeira, Araújo Castro, Pontes de Miranda), a floração contemporânea de textos e
manuais.
MEDICINA
Divide-se a história da medicina em duas fases, antes e depois de Oswaldo Cruz. É como
se disséssemos, antes e depois do ensino prático, em substituição do retórico, de que se
queixavam — criticando-lhe a facúndia — as gerações anteriores à revolução científica.
Mas páginas irônicas sobre a antiga faculdade (em que Pacífico Pereira, idealizador das
policlínicas,1034 Silva Lima, Manuel Vitorino, Alfredo Brito, foram figuras excepcionais)
descreve Afrânio Peixoto os desvios daquela cultura, teórica e francesa.1035 Francisco de
Castro trouxe-lhe os alemães. Está para a medicina como Tobias para o direito. Discípulo
de Torres Homem, e mestre de Nina Rodrigues, Miguel Couto, Austregésilo, Miguel
Pereira, Aloísio de Castro, o seu Tratado de clínica propedêutica (1896) é também um
padrão de linguagem.1036 Nessas lições ciência e eloqüência se associam amavelmente.
Tem-se a impressão de que Rui (cliente e amigo de Castro) se versasse os mesmos temas o
faria naquele estilo clássico. Morreu prematuramente (em 1901), este a quem a admiração
dos estudantes — aludindo também à “barba à Cristo” — sagrara como “divino mestre”.
Nove anos depois, o ideal da reforma empolgava a Academia.1037 O Instituto de
Manguinhos — impondo-a — lá estava, na sua estrutura fabulosa de mesquita
marroquina. Deu-se prédio à velha Faculdade, na Praia Vermelha, em 1917 (diretor,
Aloísio de Castro). A mudança das precárias dependências da Santa Casa para o bonito
edifício equivalia a um arejamento redentor. Formara-se em torno de Oswaldo Cruz a
mentalidade da pesquisa, a serviço das necessidades públicas. Carlos Chagas (sucessor de
Cruz em Manguinhos, glorificado em 1909 com a descoberta do que modestamente
chamou Tripanosoma Cruzi) comandou depois dele o movimento. Merece o nome.
Reuniu Alcides de Godói, o tisiólogo Cardoso Fontes, Henrique Aragão, Artur Neiva,
Ezequiel Dias, Rocha Lima, Adolfo Lutz. Inaugurou este, no Instituto Bacteriológico, a
Zoologia Médica,1038 Gaspar Viana cuidou da Patologia Tropical, Pirajá da Silva (1908) do
“schistosomum Mansoni”. Do seu instituto saiu Vital Brasil (1899) para fundar o de
Butantã. O Biológico, de São Paulo, criado por Henrique da Rocha Lima,1039 o
Agronômico, de Campinas, coroam a série das iniciativas responsáveis pela proteção
sanitária, oficial e eficaz. Distanciavam-se do tempo em que Rodolfo Teófilo (no Ceará) se
batia sozinho contra a varíola; em que a pesquisa fisiológica se fazia, no Rio, em casa dos
irmãos Osório de Almeida (1915); em que Miguel Couto, príncipe da clínica, começava a
associá-la ao laboratório1040 e Álvaro Alvim era pregoeiro e vítima dos raios x. Então
Juliano Moreira reformava com as teorias de Kraepelin a Psiquiatria, e, com Henrique
Roxo, Afrânio Peixoto rejuvenescia o velho Hospício;1041 Austregésilo (seguido de
Deolindo Couto) sistematizava a Neurologia; Roquette-Pinto (desde a tese de formatura
em 1906) especializava a Antropologia;1042 atualizava-se a medicina Legal com Nina
Rodrigues e seus discípulos, Oscar Freire, Diógenes Sampaio, Afrânio Peixoto, em São
Paulo Alcântara Machado, Flamínio Favero; a moderna cirurgia, com Eduardo Chapot-
Prévost, Augusto Brandão Filho, em São Paulo Vieira de Carvalho... Nas campanhas de
saúde pública adquiriu a ciência brasileira fama internacional. Caracteriza-a — diria
Mignel Couto — a amplitude do combate aos flagelos, neste país em que se
desmoralizaram as epidemias.1043 Assim a febre amarela, jugulada por Oswaldo Cruz, cujo
último arranco, em 1928, foi dominado por Clementino Fraga, a bubônica, a tuberculose
(com a abreugrafia, de Manuel de Abreu, e a difusão do preventivo, por Arlindo de Assis),
a malária, graças aos processos americanos, extirpável nas zonas rurais (campanha
dirigida por Mário Pinotti), o gambia (ameaça africana trazida pela aviação, que entraria a
Amazônia, não fora o trabalho valoroso de Manuel Ferreira), a doença de Chagas, a
leishmaniose...
Recebendo, em 1916, Aloísio de Castro, na homenagem que lhe fez a Faculdade, bradou
Miguel Pereira, o Brasil era um vasto hospital.1044 Careciam o impaludado sertanejo, o
trabalhador subnutrido das cidades pobres, de medicina, higiene, educação.1045 Era isto
entre a pregação eufórica de Bilac (às armas!) e o retrato de Jeca (o caipira) cruamente
debuxado por Lobato. Entretanto esse brasileiro existia, como um complicado caso de
raças entrecruzadas refutando os preconceitos da antropologia clássica: plasmado pelo
meio físico na sua esconsa rijeza, resistente, apesar de tudo (sentenciara Euclides) um
forte... Preocupara-se o século XIX com o selvagem, de Gonçalves Dias, Magalhães,
Alencar, as suas línguas, o seu fabulário. Presidira o imperador a esses estudos: pois o
caboclo da poesia continuava a ser a imagem lírica da nação, a despeito da distância, ou
por isto mesmo. Nina Rodrigues “descobrira” o negro.1046 Coligam-,se, para examiná-lo, a
Etnografia e a Criminologia. Estabelece-se a tese da solidez do tipo, moldado na mistura
das etnias conciliadas. Explica-se o homem na sua moldura, pelas contingências
ambientes, pela herança, pelas deformações revistas em fácil diagnose. Percebe-se por que,
em 1897, concluiu Afrânio Peixoto a tese de formatura com uma página vingativa, sobre
Canudos.1047 Da compreensão otimista do “melting pot”1048 ressalta, enérgica, a idéia
brasileira, de que, ao contrário das cediças teorias, não era a qualidade humana o déficit
da civilização: mas o atraso do Estado em assisti-la. O povo serve. Fizera até demais, nas
condições pretéritas da sua formação, da formação heróica do país. Pedia que o
ajudassem, que o esclarecessem, que o orientassem!
CIÊNCIAS NATURAIS
“A Constituição do Brasil deve ser, antes de tudo, brasileira, que não há tipo algum
concretizado ou ideal, para as instituições que nos convêm”, objetou Assis Brasil,
definindo o “Governo Presidencial” (1896). Na “Democracia Representativa” (1893)
apostolizara a regeneração pelo voto.1054 Da mesma província, onde a defesa do
parlamentarismo armara os seus paladinos (Silveira Martins), saíra a palavra ortodoxa,
sobre a verdade presidencialista. Justificou Euclides da Cunha com o clima e o solo
(ecologicamente) os sertões em revolta; e a essa visão de miséria, engastada em barbárie,
acudiu — noutra esfera de análise — Alberto Torres,1055 que “os vícios da nossa retórica
não nos deixaram ver as realidades”.1056
Eduardo Prado (com a primazia da crítica aos bacharéis) comparou o povo com o grupo
sertanejo alheio à cena, que, sem malícia, Pedro Américo pôs na sua tela do Ipiranga, à
margem do... grito.1057 Volveu Sílvio Romero a atacar “politicões e literatos”,1058 o biombo
de estrangeirice que escondia das capitais frívolas a verdade nacional... Teuto‑sergipana,
essa filosofia, ironizou Laet; contra a galo‑fluminense, replicou Sílvio... Tudo exótico!
Entre uns e outros, o desacordo consistiria em planos de análise: partindo das ciências
biossociais queria Sílvio provar, na incultura, a coexistência de estados inferiores; Alberto
Torres definiu: “O grande problema nosso era unicamente a organização”. O Príncipe
Dom Luís de Orléans e Bragança — que deve ser citado entre os pensadores do período —
notou argutamente: “O principal erro da monarquia foi preferir, para firmar nisto a
autoridade, as idéias abstratas aos fundamentos naturais que os ensinamentos do passado
lhe pudessem indicar”.1059 O realismo (contra o idealismo e a problemática) fez escola com
Oliveira Viana,1060 cujo ensaio de 1920 — Introdução ao Livro do Recenseamento —
reinaugura os estudos sociológicos. Esboçando a evolução do povo, exagerou por certo,
dissentindo do mestre, a influência racial;1061 investiu (1924) contra o idealismo, estribilho
reformista, de base, não de forma;1062 equacionou os problemas da política objetiva.1063
Rompeu caminho a dialética proletarista com “a solução, mais em voga naquele tempo,
do, então chamado socialismo possibilista, gênero Benoit Malon”,1064 diz Evaristo de
Morais. Podia juntar aos nomes conhecidos o de Euclides da Cunha, no seu período de
São José do Rio Pardo, a saudar o século com graves meditações socialistas. À margem,
embora no rumo da “questão social”, Graça Aranha, Ronald de Carvalho, Gilberto
Amado, Jackson de Figueiredo, Azevedo Amaral, Licínio Cardoso, Batista Pereira,
Monteiro Lobato, abalaram o velho muro da república positivista e americana, “muro de
lamentações” da filosofia inconciliável com a rotina e a conformidade. Aí coragem de
pensar é projeto de ação; ou — literariamente — movimento.
FARIAS BRITO
A reação espiritual veio do Ceará — terra de misticismo e austeridade — com Farias Brito.
Cansava-se a inteligência moça da insipidez do monismo, do evolucionismo, do
haeckelismo sociológico, caros a Tobias, e dos autores correntes, Buchner, Nordau,
Spencer,1065 Le Dantec... Que acontecia alhures? Unamuno descobrira Kierkegaard;
nacionalistas e socialistas batiam-se em Paris; “la faillite de la science”, dissera Brunetière
(1896), quase em resposta a Renan; aparecem Barrès, Daudet... O pensador cearense teve a
originalidade de filosofar entre polemistas. Destacou-se pelo imprevisto da linguagem.
Interrogava “segredos da consciência”;1066 opunha a ordem moral à “incerteza e
fragilidade” da vida; trabalhava numa filosofia da esperança...1067 A finalidade do mundo
(1894) era manifesto, virtuoso e erudito, reacionário; na Base física do espírito (1912),
com o Mundo interior (1914), se rebelava, mais perto de Bergson e William James, contra
a “anarquia a que se acha reduzido o mundo moderno”.
Essa transcendência andava na cruzada do Pe. Júlio Maria, a missionar pelas províncias
e pelas academias (1902); prendia-se à reivindicação paulista da origem apostólica1068
(1896); regozijava-se da oração católica de Rui Barbosa no Colégio Anchieta (1903); ia
armar o ativismo de Jackson de Figueiredo (já na época de Bloy e Péguy, Psichari e
Maurras). “Catolicizar o Brasil”.1069 Jackson voltava a Pascal; e retirando Farias Brito (com
Rocha Pombo e Nestor Vítor) da misantropia ressentida, jogou-o na arena.1070 Chamou-
lhe (1918), à doutrina modesta, “profissão de fé espiritualista”.1071 Prevenira Pedro Lessa,
contra o “regresso a uma vã supremacia do espiritualismo”.1072 Para o Pe. Leonel Franca
(cuja História da filosofia é também de 1918) era “ideal de restauração católica”;1073 e na
Crise do mundo moderno a expôs panoramicamente.
Seria inútil “diante do estado social do Brasil”,1074 meditava em 1916 Gilberto Amado,
que, em 1922, falou da transição da fase caótica à organizada,1075 do empirismo ao sistema.
Estava-se na época ruísta do liberalismo jurídico, em que reluzia a promessa de
representação e justiça de Assis Brasil,1076 programa estereotipado e sumário, das revoltas
cívico-militares (essencialmente políticas) de 1922–24.1077
O PROBLEMA SOCIAL
PESQUISA
Antes das Faculdades de Filosofia (1935) e do Conselho Nacional de Pesquisas (1952) não
se pode falar no país de um movimento coordenado e universitário de investigação
científica. Temos de anotar as conquistas nesse terreno obtidas por sábios e instituições
isoladas (é o caso de Manguinhos para as ciências biológicas, da Escola Politécnica para as
ciências físicas,1086 do Museu Nacional para as naturais, do Departamento da Produção
Mineral, do Ministério da Agricultura), sem que tivesse o descoordenado progresso da
pesquisa um centro de propulsão. A disciplina nesta matéria devia ser sobretudo a dos
programas desenvolvidos — graças à sistemática dos cursos de formação e alta
especialidade — naquelas faculdades recentes, abertas ao ensino com a oportuna ajuda de
professores de renome internacional, assim em São Paulo como no Rio de Janeiro. O
Conselho Nacional de Pesquisas revitalizou, com a sua orientação, os planos de trabalho
que reclamam o amparo do poder público (sobre todos, os referentes à física nuclear); e
graças a tal impulso os institutos tecnológicos e as universidades cuidam de acompanhar o
surto mundial das ciências aplicadas à transformação industrial e às novas necessidades
da vida. Este é o capítulo mais novo da cultura brasileira: responde, corresponde ao
desafio do tempo.
ENGENHEIROS
ARQUITETOS
ARTES: PINTORES
Depois dos grandes nomes da Imperial Academia a geração que lhes sucedeu
(impregnada, em Paris, dos estilos coetâneos) oscilou entre a exatidão clássica e a crua luz
tropical, desenho e cor, o artifício da composição e a verdade da paisagem. Continuam
Pedro Américo e Vítor Meireles (e através deles os mestres românticos) na pintura
histórica de Firmino Monteiro1094 — o mais primoroso —, Aurélio de Figueiredo (irmão
do primeiro), Benedito Calisto, documental e culto, como Oscar Pereira da Silva. Os
retratos de Décio Vilares e Petit, os murais de Zeferino da Costa (tetos da Candelária),
Pedro Peres, Parreiras, Visconti — que na decoração do Teatro Municipal lembra Puvis
de Chavannes,1095 a finura acadêmica de Henrique Bernardelli, medalha de bronze da
Exposição Universal de 1889, Belmiro de Almeida, discípulo de Lefebvre, Manuel
Madruga e Lucílio de Albuquerque, marcam o período em que a arte se liberta do
exotismo,1096 banha-se no sol dos pátrios panoramas com João Batista da Costa e Antônio
Parreiras, emancipa-se, à procura da terra (Almeida Júnior) e dos seus modestos aspectos.
É magistral essa pintura no academismo de Rodolfo Amoedo (outro talento polido nos
ateliers franceses) que assinala a maturidade de expressão em harmonia com os cânones
escolares. Devemos citar ainda José Maria de Medeiros, Rafael Frederico, Pedro
Alexandrino (mestre de “natureza morta”), Antônio Vale, Luís Christophe, Pinto
Bandeira, Rodolfo Chambelland, impressionista, Malagutti, simbolista, no limiar da “arte
moderna”, Carlos Osvald... Ilustrador, desenhista de história, paciente intérprete da
tradição revivida nas casas, nos móveis, nos trajos, Wasth Rodrigues.1097
ESCULTORES
EDUCAÇÃO
CORRENTES MODERNAS
Este é o caminho longo e áspero percorrido até aqui pela Pátria Brasileira.
NOTA
Ao final de sua obra, Pedro Calmon propunha em apêndice a Constituição dos Estados
Unidos do Brasil (a Constituição de 1946). Nesta edição, seria oportuno acrescentar
também a Constituição da República Federativa do Brasil, de 1988. Entretanto, pareceu-
nos desnecessário deixar esta versão impressa mais volumosa e mais custosa com dois
textos a que o leitor pode hoje ter acesso facilmente, no site do Planalto, pelos seguintes
links:
https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao46.htm
https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm
BIBLIOGRAFIA
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NOTAS DE RODAPÉ
1 É a forma como Afrânio Peixoto chamava os filhos da Bahia que cedo se transferiram para o Rio de Janeiro.
2 A história foi a sua vocação, e o direito, sua realização profissional. Se a maioria dos seus livros é constituída de
obras de história, ou de literatura histórica, também, entre a extensa bibliografia, encontram-se numerosos e alentados
trabalhos sobre Direito, tais como Direito de propriedade, Reforma Constitucional da Bahia, A Federação e o Brasil,
Intervenção Federal, O desquite, Estado e o direito n’Os Lusíadas, Curso de Direito Constitucional Brasileiro, Curso de
Direito Público, Curso de Teoria Geral do Estado, História das idéias políticas.
3 Fez sua formação escolar no Colégio Antônio Vieira e depois no Ginásio Baiano, ambos em Salvador-ba.
4 No Conselho Federal de Cultura, quando Gilberto Freyre afirmava não ser católico, cortou Calmon: “Mas tem todas
as virtudes para sê-lo”.
5 Descendente de Francisco Calmon du Pin e Almeida, seu tetravô, ascendente de Miguel Calmon du Pin e Almeida,
Marquês de Abrantes, as raízes paternas de Pedro Calmon Moniz de Bittencourt remontam à província de Cahors, na
França, donde partiu para Portugal Bertrand Calmon, o primeiro deste sobrenome, cujo filho, já lusitano, João Calmon,
chegou à Bahia em 1655. O seu ramo materno, pelo casamento de seu pai, Pedro Calmon Freire de Bittencourt com
Maria Romana Moniz de Aragão Calmon de Bittencourt, sua prima, se prende a Egas Moniz.
6 Considero importante dar o destaque ao fato de que seus dois outros livros de ficção, O Thezouro de Belchior e
Malês: a insurreição das senzalas também se enraízam em sua terra natal. Em sua predominante produção de historiador,
do primeiro livro até a publicação póstuma Introdução e notas ao catálogo genealógico das principais famílias, de Frei
Antônio de Santa Maria Jaboatão, vários de seus outros livros também estão ligados à história de sua província: A
conquista: História das bandeiras baianas, O crime de Antônio Vieira, O Marquês de Abrantes, História da Casa da
Torre, A bala de ouro, História da Literatura Baiana, Castro Alves: O homem e a obra.
7 Sobrinho homônimo do Marquês de Abrantes, foi engenheiro e político brasileiro, correligionário de Rui Barbosa,
Ministro da Viação e Obras Públicas (1906–1909) e, posteriormente, Ministro da Agricultura, Indústria e Comércio
(1922–1926).
8 Ao mesmo tempo, para completar seu salário e colaborar com a família em Salvador, trabalhava à noite, na redação
da Gazeta de Notícias.
9 Essa Bahia onde, no espaço de 35 anos, fundaram-se duas academias, a dos Esquecidos (1725) e a dos Renascidos
(1759), nas quais figuram, na primeira, poetas menores e maiores, como Gonçalo Soares da França, satírico e repentista,
na linha de Gregório de Matos, João de Brito e Lima, sisudo e seco, com seus Poema Festivo e Poema Panegírico,
memorialistas como Inácio Barbosa Machado, autor dos Fatos Políticos e Militares, e historiadores como Sebastião da
Rocha Pita, autor da História da América Portuguesa; na segunda, figuram o poeta Ferrão Castello Branco, Pedro
Facques, com sua Nobiliarquia Paulistana, Frei Antônio de Santa Maria Jaboatão, com o Novo Orbe Seráfico, D. José de
Milares, com a História Militar do Brasil, José Antônio Caldas, com a Notícia Geral da Capitania da Bahia.
10 Estão entre eles: A bala de ouro, Brasil e América, Brasília, Catedral do Brasil, Castro Alves: O homem e a obra,
Compêndio de História da Literatura Brasileira, A conquista, O crime de Antônio Vieira, Espírito da Sociedade Colonial,
O Estado e o Direito n’Os Lusíadas, Estados Unidos de Leste a Oeste, Figuras de Azulejo, Franklin Dória, Barão de
Loreto, Gomes Carneiro, o General da República, História da Bahia, História da Casa da Torre, História da Civilização,
História da Civilização Brasileira, História da Faculdade Nacional de Direito, História da Fundação da Bahia, História da
Independência do Brasil, História da Literatura Baiana, História das idéias políticas, História de Pedro ii (5 volumes),
História Diplomática do Brasil, História do Brasil (7 volumes), História do Brasil na Poesia do Povo, História do
Ministério da Justiça, História Social do Brasil (3 volumes), José de Anchieta, o santo do Brasil, Malês, a insurreição das
senzalas, Espírito da Sociedade Imperial.
11 De acordo com Pedro Calmon Filho, também professor da Faculdade de Direito da ufrj, seu pai sempre quis ser
enterrado como professor, que foi o título que ele mais prezou em vida.
12 Segundo consta no livro Pedro Calmon: Vida e glória, organizado por Edivaldo Boaventura, não há conta do
número de estudantes baianos que Pedro Calmon acolheu no Rio de Janeiro e aos quais forneceu fosse uma palavra de
orientação, fosse uma providência junto a órgãos públicos, fosse, ainda, apoio material.
13 Entre dezenas de condecorações, tinha a Grã-Cruz das Ordens da Santa Sé, de Santiago, de Cristo, Educação
Pública e Infante D. Henrique, de Portugal; de San Martin, da Argentina; de Boyacá da Colômbia; de Rubén Dario, da
Nicarágua; da Espanha, da China Nacionalista, do México e do Paraguai; Grande Oficial do Chile, do Peru, da Alemanha,
da Suécia, da Grécia, da Itália e do Irã; Ordem do Mérito e ordens do Exército, Marinha e Aeronáutica do Brasil; e
comendador da Legião de Honra, da França.
16 Thomas Giulliano é pós-graduado em Literatura Brasileira pela pucrs, pós-graduado em História e Cultura Afro-
brasileira e Indígena pela uninter, graduado em História (licenciatura) pela pucrs, coordenador do livro Desconstruindo
Paulo Freire, autor dos livros Desconstruindo (ainda mais) Paulo Freire, O sofisma do Império e Machado de Assis:
escravidão e política, editor e consultor historiográfico do Clube Rebouças. Historiador agraciado com a Medalha da
Ordem do Mérito do Livro, fornecida pela Biblioteca Nacional — ne.
17 Sílvio Romero e Artur Guimarães, Estudos sociais: O Brasil na primeira década do século xx. Lisboa: 1911, p. 16.
18 Eduardo Prado, com o pseudônimo de Frederico de S., Fastos da Ditadura Militar no Brasil, começou a criticar
essa concentração. Lisboa: 1890, p. 12.
19 M. A. Azevedo Machado, Histórico da proclamação dos Estados Unidos do Brasil: Apontamentos e notícias. Rio:
1889, p. 40, 2ª ed.
22 Evaristo de Morais, Da monarquia para a república. Rio: 1936, p. 166. Documento em Arquivo do Distrito Federal.
Rio: 1954, v, p. 349. Completo noticiário em M. E. de Campos Porto, Apontamentos para a história da república dos
Estados Unidos do Brasil. Rio: 1890, pp. 39 e ss.
24 Lauro Sodré, A proclamação da república. Rio: 1939, p. 72. Disse Rui que, chamado por Benjamin Constant, no dia
15, para ver Deodoro, já encontrou adotada a forma republicana; e o ministério foi no dia seguinte apresentado por
Quintino, discurso no Clube Militar, 1921, Discursos e conferências. Rio: 1933, p. 454. Francisco Glicério (dizia em 1944
Altino Arantes, no discurso que lhe consagrou) fora dos primeiros a convencer o marechal da necessidade de declarar
logo a república. Quintino o precedera: aliás não tinha outra expressão a sua presença, a cavalo, ao lado dele, no desfile
das forças que acabavam de derrubar o governo. O Diário de Notícias (de Rui) esclareceu: “A fria ditadura da espada,
após a vitória, transformava-se em modéstia, sumia-se, nada queria fazer, nada proclamar de definitivo, nada reservar
para si [...]. Foi então preciso que os civis, os jornalistas e os pensadores apontassem às espadas os pontos que era forçoso
continuar a defender; que pegassem nos braços dos generais para obrigá-los a ter fora da bainha o aço vitorioso”, in M. E.
de Campos Porto, Apontamentos para a história da república, p. 127.
25 Diário de Rebouças: “15 de novembro, 12h. Com Taunay no Senado tentando organizar a contra-revolução. 2,5.
Com Taunay, Dr. Araújo Góis e Rodolfo Dantas, em tentativas de organizar a contra-revolução”, André Rebouças, Diário
e notas autobiográficas, texto anotado por Ana Flora e Inácio José Veríssimo. Rio: 1938, pp. 349–350.
26 Rui Barbosa reivindicou a autoria do nome, evocando a fórmula que lançara em discurso na Bahia, em 1888, Visita
à Terra Natal, 1893, Obras, xx, t. i. Rio: 1948, p. 12. De sua lavra, o decreto nº 1, de 15 de novembro. Repetiu, em 1897:
“Fui eu quem primeiro pronunciou o dilema: República ou anarquia”, Obras. Rio: 1952, xxiv, t. i, p. 61.
27 Carta de Gabriel Piza a Rio Branco, 1911, em Cruz Costa, O positivismo na república, São Paulo: 1956, p. 174.
28 Amador Florence, in Revista do Instituto Histórico e Geográfico de São Paulo, xxxiii, p. 61; Miranda de Azevedo,
Revista do Instituto Histórico e Geográfico de São Paulo, vi, p. 672.
30 Acontecimentos de 17 de novembro, relatados por Antônio Olinto, em Revista do Arquivo Público Mineiro. Belo
Horizonte, 1927, ano xxi, fasc. i, p. 161.
31 Brás do Amaral, História da Bahia do império à república. Bahia: 1923, pp. 331–2. Na Folhinha do Arcebispado da
Bahia para o ano de 1890, Bahia: 1889 (Tip. de J. G. Tourinho), se tem curiosa reportagem dos acontecimentos (resumiu-
os Antônio Osmar Gomes, O mensageiro da fé, Bahia: dezembro de 1949), em que se diz que Almeida Couto recebeu
telegrama de Deodoro pedindo que continuasse na presidência; que ao meio-dia de 16 houve a reunião em palácio que
terminou com o repúdio da revolução; que se mandou a Deodoro telegrama reafirmando aguardar o povo baiano “com
firmeza e tranqüilidade as deliberações dos poderes legalmente constituídos”; que se telegrafou para o Jornal do Comércio
do Rio “contra a ditadura militar”, e neste sentido ainda a 16, se pronunciou unanimemente a câmara municipal... À uma
da tarde de 17 o Coronel Buys e Virgílio Damásio proclamaram a adesão à república em frente ao 16º de infantaria (Forte
de São Pedro). Leia-se Antônio Moniz, A Bahia e os seus governadores na república. Bahia: 1923, pp. 8 e ss.
32 Brás do Amaral, op. cit., p. 334. “O povo assistiu a tudo isto mudo e indiferente...”. “A república não tinha
popularidade”. Do mesmo autor, “Memória histórica da proclamação da república na Bahia”, in Revista do Instituto
Geográfico e Histórico da Bahia. Bahia: 1905, nº 30, pp. 36–60; Otaviano Muniz Barreto, Conferência. Bahia: 1940, p. 17;
Afonso Rui, História política e administrativa da Cidade do Salvador. Bahia: 1949, p. 614. Manuel Vitorino, em carta a
Rui Barbosa, 28 de novembro de 89, conta que o Coronel Buys “firmou a república na Bahia e [...] de acordo comigo, foi
ele quem salvou a ordem pública ameaçada pelas declarações do Comando das Armas”, transcrita por Odival Cassiano
Gomes, Manuel Vitorino Pereira, o cirurgião e o médico. Rio: 1953, p. 12. Foi este indicado por Quintino e Aristides
Lobo, v. Manifesto político: O Dr. Manuel Vitorino, vice‑presidente da república, à nação. São Paulo: 1898.
33 Sebastião de Vasconcelos Galvão, Dicionário corográfico, histórico e estatístico de Pernambuco. Rio: 1922, ii, p.
68; Sousa Bandeira, Evocações e outros escritos. Rio: 1920, p. 170. Quanto ao Maranhão, Jerônimo de Viveiros, Benedito
Leite. 1957, p. 20. O 1º governador nomeado, Dr. Tavares Júnior, foi recebido ao som da Marselhesa, em 17 de dezembro.
37 Generoso Ponce Filho, Generoso Ponce, um chefe. Rio: 1952, pp. 61–82.
38 V. manifesto de Castilhos, de 12 de fevereiro de 1890, in Otelo Rosa, Júlio de Castilhos. Porto Alegre: 1928, p. 285.
39 Em Niterói o conselheiro Carlos Afonso, baldados os esforços para mandar à luta o corpo policial, entregou o
governo ao oficial que em nome de Deodoro se apresentou para comandar a força, Tenente-coronel Fonseca e Silva.
Antônio Figueira de Almeida, História fluminense. Rio: 1930, p. 209. Quintino substituiu-o pelo Dr. Francisco Portela.
No Paraná o comandante das armas Coronel Cardoso Júnior foi substituir o Contra-almirante José Marques Guimarães.
Romário Martins, História do Paraná. Curitiba: 1937, p. 493. O comandante das armas assumiu o governo das Alagoas
para o transferir ao comendador Tibúrcio Valeriano de Araújo. Sendo porém a província do generalíssimo, a um irmão
deste, Pedro Paulino da Fonseca, coube o alto posto. Craveiro Costa, História das Alagoas. São Paulo: p. 161.
40 Diário oficial, 24 de novembro de 89. V. resposta de Teixeira Mendes a Eduardo Prado, in Ivan Lins, Benjamin
Constant. Rio: 1936, p. 140. Prado, A bandeira nacional, Paris: 1903, impugnara as asserções do chefe positivista, para
estranhar o mau gosto, o lema sectário e os erros astronômicos. Teixeira Mendes defendeu sisudamente o seu desenho.
Mas de fato era poética a idéia de representar os estados segundo o aspecto do céu na manhã histórica, sem ter em
consideração, como na bandeira norte-americana, a igualdade deles; e o dístico a filiava indiscretamente a determinada
corrente militante. Pierre Laffitte, tomara-o como epígrafe para o Cours Philosophique. Paris: 1859. Em setembro de 92
cogitou o Congresso de suprimi-lo, porém a reação levantada o desencorajou, Custódio de Melo, O governo provisório,
etc. i, pp. 12–4. Permaneceu. Conta M. Paulo Filho, Correio da manhã, Rio, 8 de março de 1953: foi Manuel Miranda que
em 1908 criou a “festa da bandeira”. Em 18 de novembro desse ano grande comissão, em que figuravam Lauro Sodré,
Alípio Bandeira, Bilac, apelou para que se comemorasse condignamente o pavilhão pátrio. Assim se fez, e se faz.
41 O positivismo pôs-se fora da realidade (e do momento) combatendo o ensino militar regulamentado na respectiva
escola (12 de abril de 1890), a própria existência do exército... Sobre a continuidade dessa atitude (mas de 1897 por
diante), leia-se Cruz Costa, O positivismo na república. São Paulo: 1956. O primeiro período republicano marca, com
expressiva rapidez, o predomínio teórico, a desilusão e a oposição da seita, em face do regime que tanto lhe devia.
44 Rui Barbosa, relatório do Ministro da Fazenda, 1890: “Mas em um grupo de homens de educação política e
tendências diferentes, sem plano de administração preestabelecido [...] nenhum laço de solidariedade real podia existir”.
Obras completas. Rio: 1949, vol. xviii, t. ii, p. 31.
45 Refere-se Rui ao apelo, que Deodoro atendeu, para não ser enviada ordem telegráfica de fuzilamento, a propósito
de praças amotinados no Desterro, Finanças e política da república. Rio: 1892, pp. 376–7. Medeiros e Albuquerque,
Minha vida, Rio: 1933, p. 152, alude porém ao boato de que seriam fuzilados alguns soldados do 2º de artilharia; gostaria
de assistir; e Aristides Lobo, de quem era secretário, lhe recriminou a curiosidade... São fatos conexos. Sobre a quartelada
monarquista do Desterro — pois os soldados desfilaram com a “bandeira antiga”, Gustavo Barroso, citando carta do
Major Santos Dias, O Cruzeiro. Rio: 19 de janeiro de 1957.
46 O episódio vem explicado nas memórias de Medeiros e Albuquerque, ibid., p. 175. Rui refutou energicamente em
1919 a balela de que pedira o fuzilamento de Gaspar Martins, Campanha presidencial. Rio: 1919, p. 20.
47 Rocha Pombo, História do Brasil. Rio–Porto, x, p. 272 (documentos para a história do primeiro período da
república). Publicou as Atas do governo provisório, Dunshee de Abranches, Rio: 1907.
48 Adquirido por 630 contos em 23 de dezembro de 89, o Itamaraty foi sede do governo até 1897, v. Gustavo Barroso,
História do Palácio Itamaraty. Rio: 1956, p. 28.
49 Generalíssimo foi o título que Carlos iv de Espanha deu a seu ministro Godoy (valido e todo-poderoso) na guerra a
Portugal de 1801.
50 V. Max Leclerc, Cartas do Brasil, trad. Sérgio Milliet. São Paulo: 1942, pp. 98–9; Francisco de S., ou Eduardo
Prado, Fastos da ditadura militar no Brasil, pp. 68 e 356.
51 Carta de Capistrano de Abreu a Rio Branco, Correspondência, ed. do Instituto Nacional do Livro. Rio: 1954, i, p.
127.
52 O conselheiro Manuel Francisco Correia, escrevendo para o Correio paulistano, a 21 de novembro de 89, pedia a
Constituinte que desse ordem ao país. Revista do Instituto Histórico, 1911, vol. lxxiii, ii, p. 27.
53 Esta verdade, vide João Camilo de Oliveira Torres, O positivismo no Brasil, Rio: 1943, pp. 210–2 (mostrando que o
positivismo não influenciou a Constituinte), proclamou-a Rui Barbosa na conferência de 1893, feita na Bahia em
benefício do Asilo de Nossa Senhora de Lourdes de Feira de Santana, Obras, Rio: 1948, xx, t. i, p. 63: “O decreto de 7 de
janeiro, a Constituição de 24 de fevereiro não são conquistas do positivismo. Não!”. Certo é que, a 15 de novembro, como
recorda Medeiros e Albuquerque, Minha vida, p. 147, Teixeira Mendes pedia aos vencedores da jornada: “Proclamem a
ditadura! Proclamem a ditadura!”. Seria a “ditadura positivista, como fórmula permanente de governo”; e não vingou.
Sobre o antipositivismo de Rui, v. Miguel Reale, in Anais do 1º Congresso Brasileiro de Filosofia. São Paulo: 1950, i, pp.
68–9; e a influência positivista, na síntese de Ivan Lins, nos mesmos Anais, i, pp. 197–8. Elucida o pensamento de
Demétrio a réplica de Aníbal Falcão a Alberto Torres, agosto de 89, in Fórmula da civilização brasileira. Rio: 1934, p. 188.
54 Conferência em benefício das órfãs de Nossa Senhora de Lourdes, Obras, 1893, xx, t. i, p. 65.
56 Miguel Lemos, prefaciando a tradução de A ditadura republicana, de Jorge Lagarrigue, 1897: “Seja-nos lícito
apontar-lhes, como um antecedente profícuo e animador, a Constituição política que vigora no Rio Grande do Sul”, O
ideal republicano de Benjamin Constant, citado, p. 11. No Manifesto à nação de 1923, entretanto, o situacionismo gaúcho
replicou: “A sociologia não é propriedade de seita, e dizer sectária a Constituição de 14 de julho equivale a negar a
universalidade de leis sociais por todo o mundo aceitas”. Rui estigmatizou (1919): “Nesse parto radical do comtismo [...]
esta Constituição está de todo em todo fora da Constituição Federal”, Campanha residencial, Rio: 1919, p. 156. A
Comissão de Justiça da Câmara, pelo voto de João Luís Alves, em 1907, reconhecera que não a ofendia... Veja-se nota
TAL, à p. TAL.
57 R. Magalhães Júnior, Deodoro. São Paulo: 1957, ii, p. 195.
58 Dunshee de Abranches, Atas e atos do governo provisório. Rio: 1907, p. 15. Seriam três os bancos emissores, um
na Bahia atendendo ao Norte, um no Rio para a zona central e o terceiro no Rio Grande do Sul, com o capital total de 450
mil contos realizado em prestações não inferiores a 10% convertidas em apólices do Estado inalienáveis. Os juros delas
(devidos pela União) seriam de menos 2,5 a fim de serem pagos apenas durante sete anos... Emprestariam os bancos à
lavoura a juros não superiores a 6% e comissão de 0,5%, concorrendo o governo com as importâncias deles recebidas a
título da redução dos juros das apólices (2,5%).
59 Relatório do Ministro da Fazenda, in Rui Barbosa, Obras completas, xviii, t. ii, p. 132. O primo de Rui, Ferreira
Jacobina, em carta íntima, de 29 de janeiro de 1890, mostrava a temeridade “do seu passo sobre os bancos”, que ia
produzir crise grave no governo, Rui Barbosa, mocidade e exílio, cartas (coligidas por Américo Lacombe), São Paulo, p.
156. Seria... “uma transformação do Brasil em sociedade anônima”, criticou Max Leclerc, Cartas do Brasil, trad. S. Milliet,
p. 111. Foi atacando o decreto de 17 de janeiro que a imprensa, a Gazeta de Notícias à frente, iniciou o combate político,
abafado nos primeiros dias da ditadura. Deodoro teria dito: “Não entendo nada dessas questões de política e finanças e
preciso instruir-me com a leitura dos jornais. Deixai-os que falem”, Max Leclerc, ibid., p. 127. Leia-se em justificativa de
Rui a síntese de Humberto Bastos, A economia brasileira e o mundo moderno. São Paulo: 1948, p. 168.
60 V. Atas e atos do governo provisório, pp. 93 e 94, em que Rui defendeu o decreto de 17 de janeiro. Deodoro havia
de aplaudir trechos como este: “Pois quê?! Ele, orador, Ministro da República, poderia ver coroar a obra do Visconde de
Ouro Preto, concedendo o curso forçado que sempre combateu?”.
61 Rui incompatibilizou-se de vez com o Ministro da Agricultura, Demétrio, na reunião de 30 de janeiro, cf. Atas e
atos, p. 99.
63 Os antecedentes da Questão de missões estão esclarecidos pelas Memórias, de Vicente G. Quesada, que, em 1884,
fez as aberturas com o governo imperial de que resultou o plano de divisão por mútuo acordo do território em litígio e
arbitramento posterior quanto às indenizações subseqüentes à partilha, Mis memorias diplomáticas, Buenos Aires: 1907,
p. 312. Não se tratava de dividir ao meio, porém segundo “una línea divisoria conveniente sometida a la aprobación de
ambos gobiernos”. A diplomacia imperial negociou em Buenos Aires o tratado de 7 de setembro de 1889, ali assinado (a
idéia do governo argentino era a divisão sem arbitragem, como o General Roca recomendara ao plenipotenciário
Quesada, op. cit., p. 307) e confirmado no Rio de Janeiro por ato de 4 de novembro, ou seja, onze dias antes da queda da
monarquia. O gabinete de Ouro Preto se ufanou deste desfecho, Afonso Celso, O Visconde de Ouro Preto, Porto Alegre,
p. 56. O conflito transformava-se num processo arbitral a ser dirimido pelo presidente dos Estados Unidos. O imperador,
revela Quesada, mostrou-se contente com isto. A solução entrava na ordem americanista da diplomacia brasileira
(simbolizada pela adesão do império à Primeira Conferência Pan-Americana, em Washington, para a qual foram
credenciados o Conselheiro Lafayette e Salvador de Mendonça). É imaginar a surpresa que representou a nova orientação
do governo da república desfazendo o pactuado, para propor que se convertesse no corte amigável da região contestada
em partes iguais... Ao erro político (que era rever o acordo consumado) se somava o jurídico (de antepor ao arbitramento
definitivo o entendimento direto já superado, de fato problemático). O que em 1884 fora possível, em 1890 era
inaceitável. Eduardo Prado (Frederico de S.), Fastos da ditadura militar no Brasil, pp. 124–5, citou trechos da imprensa
argentina, ressaltando o extraordinário, o inesperado daquilo... Rio Branco acentua que a instâncias do ministro
argentino no Rio acedeu o governo provisório, donde o tratado de Montevidéu, que causou no Brasil “o mais profundo
sentimento de dor...”, Exposição de Motivos submetida ao Presidente Cleveland, 1894, Obras do Barão do Rio Branco.
Rio: ed. do Ministério das Relações Exteriores, 1945, i, p. 237. O tratado ficou secreto até a devida apreciação pelo
Parlamento, Quintino Bocaiúva, Relatório apresentado ao Generalíssimo. Rio: 1891, p. 35.
64 “Nem mesmo contra o clero me animavam prevenções inimigas”, Rui Barbosa, discurso de 1895, “Visita à Terra
Natal”, Obras. Rio: 1944, xx, t. i, pp. 49 e ss.
65 Carta manuscrita de Dom Antônio, arq. da Casa de Rui Barbosa. Separação sem hostilidade. Indignar-se-ia porém
o episcopado contra a “laicidade” da Constituição Federal, motivo de queixa permanente, como em 1900 afirmou em
pastoral comemorativa do Centenário do Descobrimento.
66 Discurso de Rui, Senado Federal, 20 de novembro de 1912, comentado por Teixeira Mendes, Ainda a verdade
histórica acerca da instituição da liberdade espiritual no Brasil. V. também Cruz Costa, O positivismo na república. São
Paulo: 1956, p. 130. Rui, na oração que fez no Senado a 6 de novembro de 97 — necrológio do Marechal Bittencourt —,
invocou este sentimento: “Outro não foi o daqueles que, como eu, fizeram essa reforma...”. O bispo do Pará pedira-lhe:
“Não seja a França de Gambetta o modelo do Brasil, mas a União Americana”, Luís Viana Filho, A vida de Rui Barbosa.
Rio: 1949, p. 212.
69 Dec. 996-a, de 7 de novembro de 1890, referendado por Rui Barbosa. Retomava o fio a várias iniciativas neste
sentido, como a de Manuel Alves Branco, 1845, Ruben Rosa, As contas do Brasil. Rio: 1943, p. 33. Mas o Tribunal de
Contas não figurou no projeto de Constituição do governo provisório. Surgiu na Constituição de 1891 como “emenda
aditiva” da comissão dos 21. Foi instalado em 16 de janeiro de 93, sob a presidência do antigo Senador Manuel Francisco
Correia, sendo Ministro da Fazenda Inocêncio Serzedelo Correia, R. Rosa, ibid., pp. 105 e ss.
70 Visconde de Taunay, O encilhamento. Rio: 1893, 1ª ed.; São Paulo: 1923, 2ª ed. O vocábulo deriva das apostas de
hipódromo, que se faziam no lugar do... encilhamento dos cavalos. Era o jogo elegante e febril da moda.
71 Almirante Custódio José de Melo, O governo provisório e a Revolução de 1893. São Paulo: 1938, i, p. 31. “A
importância das primeiras entradas que faziam os possuidores de ações dessas fantásticas empresas era imediatamente
distribuída entre os incorporadores, a título de direito de incorporação, aos advogados administrativos e aos
concessionários”.
73 V. Visconde de Ouro Preto, O advento da ditadura militar no Brasil. Paris: 1891, pp. 4–5.
74 Visconde de Taunay, Dom Pedro ii. São Paulo: 1933, pp. 103–4, publicação na Gazeta de Notícias, 8 de agosto de
1890. Que os republicanos faziam bem em repelir “qualquer conchavo” com “os políticos do passado regime”.
76 Carlos de Laet, O frade estrangeiro e outros escritos. Rio: 1954, p. 158 (artigo de 9 de julho de 1926).
78 A comissão dos 5 compôs-se de Saldanha Marinho, Américo Brasiliense, Santos Werneck, Rangel Pestana e
Magalhães Castro. Os três projetos que produziu foram unificados no texto que Rui Barbosa, relator do governo, em
reuniões diárias na sua casa (entrevista ao Comércio de São Paulo, 1903, também in Revista do Instituto Histórico e
Geográfico Brasileiro, lxxiii, p. 11) refundiu, em harmonia com os colegas, lendo depois para Deodoro o trabalho refeito.
Felisbelo Freire, História constitucional da república dos Estados Unidos do Brasil, Rio: 1904, divulga em colunas
paralelas esses projetos (negando a Rui a “autoria”). Tavares de Lira, Organização política e administrativa do Brasil, São
Paulo: 1941, pp. 140–240, estabelece o cotejo dos três documentos (comissão dos cinco, governo e Constituição de 1891).
Melhor impressão da parte que cabe a Rui nessa ilustre tarefa nos dá o volume xvii de suas Obras completas (edição da
Casa de Rui Barbosa, Rio: 1946, com prefácio em que lhe analisamos a contribuição indiscutível).
79 Palavras de Rui Barbosa: “Autor da Constituição republicana”, O habeas‑corpus. Bahia: 1892, p. 25. “Profissional
que o concebeu”, O artigo 6º da Constituição e a intervenção de 1920 na Bahia. Rio: 1920, p. 15. “Quando em 1890 [...]
organizava a Constituição atual”, Discurso do Jubileu, 1918.
80 Visconde de Taunay, artigo de 6 de outubro de 1893, O grande imperador. São Paulo: 1932, p. 80.
82 Artigo 17 do Regimento da Constituinte. Consagrava o artigo do projeto do governo provisório cristalizado no 90,
§4º da Const. de 91.
85 Carlos Maximiliano, Comentários à Constituição brasileira. Rio: 1929, p. 90, 3ª ed., cataloga as modificações
introduzidas no projeto. Sobre a ação castilhista, Vítor Russomano, História constitucional do Rio Grande do Sul. Pelotas:
1932, p. 215.
86 V. Verdades históricas. Niterói: 1902, p. 22 (o episcopado ao clero e aos fiéis, de janeiro de 1900).
89 Amaro Cavalcanti, cf. Anais da Constituinte, i, p. 160: era o “texto da Constituição norte-americana completado
com algumas disposições das Constituições suíça e argentina”.
90 Rui Barbosa pediu nove vezes exoneração..., Fernando Néri, Rui Barbosa. Rio: 1932, pp. 62–3. Vice-chefe do
Estado, chegou a sua oportunidade de pedir a Deodoro que não se demitisse, em 6 de maio de 1890, Rui, Finanças e
política, p. 388.
91 Altino Arantes, Francisco Glicério (discurso, 1942, p. 10), cita um trecho de carta íntima que proclama a grande
probidade de Glicério, ferido então pelas calúnias da imprensa antagonista... Narrou-lhe um amigo de Rui que ao falecer
Glicério, em 1917, foi ele ao Senado disposto a fazer-lhe o elogio, dizendo: “Mostrarei à nação quem foi Glicério”; e aludia
à sua resistência a tudo o que parecesse menos honrado. Rui não falou, por ter Azeredo designado previamente outro
orador.
93 Visconde de Taunay, Império e república. São Paulo: 1933, p. 20. Um dos leaders antideodoristas era Aníbal
Falcão que (escreveu a Patrocínio), estava certo de vencer... V. Luís Aníbal Falcão, pref. à Fórmula de civilização
brasileira, de Aníbal Falcão. Rio: 1934, p. 58.
95 V. a queixa do Barão de Lucena a Cesário Alvim, Tobias Monteiro, Pesquisas e depoimentos. Rio: 1913, p. 334.
Disse Lucena que enquanto a mesa da Assembléia ia em comissão receber o vice-presidente, ficara Deodoro sozinho... É
curioso que, consultado este pelo irmão Pedro Paulino sobre o nome do candidato à vice-presidência (em 6 de fevereiro),
respondeu significativamente: “Não tenho nem devo ter candidato a coisa alguma no Congresso: eleja ele à sua livre
vontade, o presidente e o vice-presidente da república” (fac-símile publicado por Leôncio Correia, A verdade histórica
sobre o 15 de novembro. Rio: 1939).
97 Carta de Petrópolis, 23 de abril de 1891, Martim Francisco, “Revivendo”, in Revista do Instituto Histórico de São
Paulo. São Paulo: 1936, xxxi, pp. 409–410.
98 João Sampaio, in Prudente de Morais: O primeiro centenário. São Paulo: 1942, p. 204.
99 Anais da Assembléia Constituinte do Estado Federado da Bahia, 27 de junho de 1891. Bahia: 1895, iii, p. 107.
100 Gastão Pereira da Silva, Xavier da Silveira e a república de 89. Rio: 1941, p. 169.
101 Pontos originais da Constituição rio-grandense de 1891: artigo 9, permitia a eleição indefinida do presidente do
Estado (por três quartas partes do eleitorado); artigo 10, escolhia ele livremente o vice-presidente, seu substituto no caso
de impedimento, renúncia ou morte; ficava habilitado a recrutar para a força pública, mediante sorteio ou engajamento
(nº 10 do artigo 20); os projetos legislativos seriam submetidos ao parecer das municipalidades (artigo 32) dependendo do
presidente a sua modificação de acordo com essas emendas e observações; escapavam à atribuição da Assembléia as
medidas de natureza administrativa, que seriam de competência do Executivo; o mandato Legislativo poderia ser cassado
por maioria de eleitores..., v. Vítor Russomano, História constitucional do Rio Grande do Sul, pp. 262 e ss.; Fay de
Azevedo, Democracia e Parlamentarismo. Porto Alegre: 1934, p. 162. Em 1906, o Deputado Antenor Maciel propôs à
câmara uma indicação, que declarasse inexistente a Constituição castilhista. A comissão respectiva, pelo parecer de João
Luís Alves, achou-a concordante com a forma republicana; e arquivou a Indicação, João Luís Alves, Trabalhos
parlamentares. Rio: 1923, pp. 7–12.
102 Capistrano de Abreu, Ensaios e estudos. Rio: 1938, 3ª série, pp. 143–4, (artigo in A Notícia, de 1o de janeiro de
1900).
103 Campos Sales, op. cit., p. 85. A informação é de Quintino Bocaiúva em entrevista de 1906, colhida pelo jornalista
Raul Fernandes, cujo nome Campos Sales não cita, cf. Antônio Gontijo de Carvalho, Raul Fernandes, um servidor do
Brasil. Rio: 1956, p. 62. Leia-se também Antônio Joaquim Ribas, Perfil biográfico do Dr. Manuel Ferraz de Campos Sales.
Rio: 1896.
104 Que a intenção do Congresso era afastar Deodoro mediante o impeachment, diz Lucena em carta a Cesário
Alvim (“com o fim de denunciar o presidente”) e indicam Soriano de Sousa, Princípios gerais de direito político e
constitucional, p. 330, e Moreira da Silva, discurso de 1898 citado por João Barbalho, op. cit., p. 291.
105 Tobias Monteiro, ibid., p. 340. Para a compreensão do episódio esta missiva tem especial valor, pois em face dela
é imensa a responsabilidade de Floriano nos antecedentes do golpe de Estado. Contra a vontade de Deodoro, que
desconfiava do colega, sabendo-o do outro lado, Lucena o procurou, para pedir fosse no dia seguinte presidir o Senado (a
fim de obstar à insistência de Prudente em pôr na ordem do dia o veto ao projeto sobre crimes de responsabilidade do
presidente) e sondá-lo acerca da crise. Floriano tranqüilizou-o com a apatia (em vez de dissuadi-lo com a autoridade) e
lhe deixou a impressão de que veria de braços cruzados o desfecho da contenda, quando, em verdade, nele se apoiava a
maioria para resistir a Deodoro, e estavam nas suas mãos os fios do movimento que o derrubaria, vinte e três dias depois.
O vice-presidente não mexeu uma palha para impedir que o presidente arrebentasse com o governo, no desatino da
ilegalidade que, para ambos, tinha caráter “salvacionista”. Deodoro... salvava a autoridade, Floriano... a república.
106 V. telegramas in Custódio José de Melo, O governo provisório e a revolução, i, pp. 131–142. Lauro Sodré foi o
único a protestar, e ia ser deposto por um destacamento enviado do Rio. O contragolpe de 23 de novembro manteve-o
(entrevista do General Lauro Sodré a A noite, Rio, 1o de novembro de 1939). Ao manifesto paulista se referiu Floriano, na
sua mensagem de 18 de dezembro de 91.
107 A conspiração iniciou-se em casa do senador general José Simeão de Oliveira, por deliberação inicial de Amaro
Cavalcanti (cf. relato deste, José Augusto, Seridó, 1954, i, p. 229).
108 Euclides da Cunha, Contrastes e confrontos. Porto: 1923, p. 17, 6ª ed. — Sobre os sucessos entre o golpe de
Estado e a revolta naval, v. o diário de José Carlos de Carvalho, O livro de minha vida. Rio: 1912, pp. 100–138.
109 No manifesto que publicou no dia seguinte à deposição, explicou Castilhos que se limitara a responder a Deodoro
(que lhe comunicara o golpe de Estado de 3 de novembro) “que proveria por todos os modos à conservação da ordem
pública”. O seu telegrama foi lacônico: “Porto Alegre, 4. Ordem pública será plenamente mantida aqui. Júlio de
Castilhos”. Lucena acusou o Ministro da Guerra, General Frota, de ter auxiliado o levante, Neto Campelo, op. cit., p. 190.
110 Otelo Rosa, Júlio de Castilhos. Porto Alegre: 1928, p. 144. Pormenores do episódio, v. Gustavo Moritz,
Acontecimentos políticos do Rio Grande do Sul. Porto Alegre: 1939, pp. 202 e ss.
111 Pela primeira vez um movimento operário se articulava com a revolução política, pois a “greve” foi promovida
pelo deputado Tenente José Augusto Vinhais, cujo prestígio era grande entre os trabalhadores da Central, Custódio José
de Melo, op. cit., i, p. 95.
112 V. Gastão Penalva, Rajada de glórias, pp. 365 e ss. (“Saldanha Sedutor”), Rio; a projeção de sua influência, no
Breviário de educação moral, cívica, social e militar da jovem Marinha, edição do centenário do almirante, Rio: 1946;
publicação do Ministério da Marinha, Centenário do Almirante Saldanha, 1846–1946, Rio: 1947; Dídio Costa, Saldanha,
Rio: 1942; José Eduardo de Macedo Soares, O Contra‑almirante Luís Filipe Saldanha da Gama, Rio: 1906; Almirante A.
Thompson, Guerra civil do Brasil, Rio: 1934; Godofredo Tinoco, A vida amorosa do Almirante Saldanha, Campos: 1956.
113 Lembra Salvador de Mendonça, Situação internacional do Brasil, p. 112, que a retirada de Lafayette e Saldanha,
em 1889, do Rio, para participarem da Conferência Pan-Americana de Washington, foi por alguns considerada um golpe,
que facilitaria a república... Saldanha teria resistido, com a Marinha.
114 Tobias Barreto, Dias e noites, poesia de 1877. Edição do Estado de Sergipe: 1925, p. 161.
116 “A fim de manter a ordem [...] restabelecer o regime verdadeiramente federativo, conspurcado pelo ato de 3 de
novembro, e consolidar a república”, moção de 23 senadores, sendo o primeiro Campos Sales, na sessão de 21 de janeiro
de 1891, em que Rui renunciou coerente com o princípio da nova lei eleitoral, que proibia aos ministros se candidatarem
aos postos de representação, uma vez que fora eleito quando membro do governo provisório, Obras completas de Rui
Barbosa. Rio: 1947, vol. xix, t. i, p. 183.
117 Quintino Bocaiúva, discurso no Senado, 1895, in Artur Vieira Peixoto, Floriano, ed. do Ministério da Educação e
Saúde. Rio: 1939, i, p. 280.
121 Rui declarou: “Procedeu, com sistema, à derribada geral dos governadores. A revolução [...] estreava dilacerando
a Constituição de alto a baixo com a espada do salvador do regime”, Campanha presidencial, xlvi, t. i, pp. 8–9.
123 Descreveu os acontecimentos Farias Brito, em artigo uma semana depois, cf. Jônatas Serrano, Farias Brito, o
homem e a obra. São Paulo: 1939, p. 80.
124 Júlio Belo, Memórias de um senhor de engenho. Rio: 1938, p. 107; Félix Cavalcanti, Memórias de um Cavalcanti.
São Paulo: 1940, p. 147.
125 Manuel Vitorino deixara o governo em abril de 1890, desprestigiado pelo apoio que o comandante das armas,
general Hermes, dava à oposição (v. carta a Rui comunicando a renúncia, in Ordival Cassiano Gomes, Manuel Vitorino
Pereira, p. 25). Assumiu o irmão de Deodoro, que, gravemente doente, passou o cargo, em outubro, ao Vice-governador
Virgílio Damásio; e como este fosse para a Constituinte federal, o substituiu o Dr. José Gonçalves, confirmado por eleição
da Constituinte do Estado, a 2 de julho de 91, Brás do Amaral, História da Bahia do império à república, p. 357. V.
também João Gonçalves Tourinho, História da sedição na Bahia. Bahia: 1893.
127 Afonso Arinos, Um estadista da república. Rio: 1955, x, p. 229. Sobre as deposições, v. Custódio José de Melo,
ibid., pp. 165–6; Hélio Lobo, Um varão da república — Fernando Lobo. São Paulo: 1937, pp. 92–120.
128 Enéas Marques, Generoso Marques, pp. 29–41; Romário Martins, História do Paraná, pp. 499–500.
130 O Brasil, Rio: 12 de dezembro de 1891. Nas coleções deste jornal, a notícia da reunião monárquica de 10. Leia-se,
Biblioteca do Jornal do Brasil, Dom Pedro ii. Rio: 1892 (coleção de artigos).
131 Rui saíra-se com a palavra no telegrama a Latino Coelho, de 18 de dezembro da 89, quando atacava as
recriminações de Ouro Preto. V. deste o Advento da ditadura militar no Brasil. Paris: 1890, pp. 4–5. Laet dela se ufanou
no editorial de O Brasil, de 10 de dezembro de 91. “Fora o sebastianismo”, bradou o Diário de Notícias, de 18 do mesmo
mês... O Visconde de Taunay, em artigo de 6 de julho de 91, sob este título, defendeu-o, O Grande Imperador, São Paulo:
1932, p. 53.
132 Sobre a Laje e o Alferes Florimundo, v. a deliciosa crônica de Martim Francisco, “Ele falou”, in Revivendo,
Revista do Instituto Histórico de São Paulo, xxxi, p. 345.
133 Silvino comandou na revolta da esquadra (1893) a canhoneira Guanabara, e, preso no Recife em janeiro de 1894,
foi ali fuzilado por ordem do comandante do distrito, e expressa recomendação de Floriano.
134 Rui Barbosa, Correspondência. São Paulo: 1932, pp. 46–53. No Inventário da Legalidade”, Jornal do Brasil, 17 de
julho de 1893, voltou Rui a opinar, porém acremente: o Congresso presenteara o vice-presidente com os 3 anos e 3 meses
da sucessão de Deodoro, Comentários à Constituição Federal Brasileira, coligidos por Homero Pires, São Paulo: 1933, iii,
p. 149. V. também discurso de 1919, Campanha presidencial. Rio: 1956, ii, p. 145. A tese florianista está in Campos Sales,
Discursos. Rio: 1902, i, p. 151.
135 Carta de Ferreira Viana Filho a Antônio José de Melo in Custódio, op. cit., i, p. 245.
136 A comissão que legitimou no Congresso o mandato de Floriano, insistiu na denúncia do equívoco: “O emprego
da conjuntiva ou em vez da copulativa e foi sem dúvida um erro de impressão, facílimo de escapar aos mais escrupulosos
revisores” (Parecer nº 15 — 1892). Não foi erro (opinamos) porém inadvertência. Em verdade, o grande argumento
florianista seria o do artigo 41, §1º, que dá ao vice-presidente a sucessão em caso de falta do presidente, esclarecendo:
“Eleito simultaneamente com ele”, declarando o artigo 43, §4, que “o primeiro período presidencial terminará a 15 de
novembro de 1894”. Se o pensamento foi que um e outro assumissem na mesma ocasião as funções “simultaneamente”,
que a sucessão estivesse desta forma regulada (caso de falta), que “o primeiro período” acabasse em determinado dia, a
fortiori não especulava a Constituinte com a eleição de presidente enquanto pudesse suceder-lhe o companheiro de
investidura. Na hipótese contrária seria inevitável o desequilíbrio: continuaria vice-presidente Floriano com outro
presidente eleito em vez de Deodoro; o período deste seria de quatro anos, e o dele terminaria improrrogavelmente em
1894; e jamais se verificaria a simultaneidade de eleições de presidente e vice-presidente, conforme o §1º do artigo 41 da
Constituição! Em síntese: o problema jurídico não oferecia maior complexidade se não o envenenasse a paixão política,
que arvorou em símbolo a “usurpação”, tachando de ilegal o governo que não extremou o seu escrúpulo a ponto de
convocar imediatamente novas eleições.
138 Max Fleiuss, História administrativa do Brasil. São Paulo, p. 484. “Uma combinação policial arranjou nesta
cidade a farsa de uma sedição”, diria Rui em 1897; a propósito do 10 de abril, Obras, xxiv, t. i, p. 191. Capistrano de
Abreu: “A semibernarda de 10 de abril de 92 que coube toda num bonde, mas serviu para inaugurar a era do estado de
sítio”, Ensaios e estudos, 3ª série, p. 145.
139 O decreto do desterro para o Amazonas (São Joaquim, Cucuí, Tabatinga) atingiu os marechais José Clarindo e
Almeida Barreto, o Coronel Jaques Ourique, Tenentes-Coronéis Taumaturgo, Antônio Adolfo da Fontoura Mena
Barreto, Capitão-tenente José Gonçalves Leite, Capitão Gentil Elói de Figueiredo, José Joaquim Seabra, José do
Patrocínio, Plácido de Abreu, Manuel Lavrador, Artur Fernandes Campos da Paz, Conde de Leopoldina, Antônio
Joaquim Bandeira Júnior, José Elísio dos Reis, José Joaquim Ferreira Júnior, Barão de Moniz de Aragão, Inácio Alves
Correia Carneiro, Almirante Wandenkolk, Alferes Alfredo Martins Pereira, Capitão Felisberto Piá de Andrade, José
Carlos de Carvalho, Coronel Antônio Carlos da Silva Piragibe, Pardal Mallet, Alferes Carlos Jansen Júnior, Sabino Inácio
Nogueira da Gama. Outros seriam presos nas fortalezas de Laje, Villegaignon, Santa Cruz. Os lentes demitidos foram J. J.
Seabra, do Recife, e Campos da Paz, substituto da Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro. V. documentação in Sílvio
Peixoto, Floriano — Memórias e documentos. Rio: 1939, iv, pp. 128 e ss.
140 Rui lembrou a “maior gravidade cívica, a de mais vasto alcance moral que jamais pendeu da justiça brasileira”,
Habeas‑corpus, Bahia: 1892, p. 3. O pedido, de 18 de abril, foi denegado, a 27, contra o voto do Ministro Pisa e Almeida
(Acórdão nº 306). Esta jurisprudência inconstitucional foi revogada pelo Supremo quando, em 16 de abril de 1898,
libertou por habeas‑corpus os parlamentares presos pelo governo de Prudente de Morais, Felisbelo Freire, A Constituição
da república interpretada pelo Supremo Tribunal, Rio: 1913, p. 225. — A novidade da doutrina fez que Rui desse edição
inglesa do memorial, Martial laws: Its Constitution, limits and effects, Rio: 1892; e escrevesse os artigos, ora enfeixados
em volume, Obras, Rio: 1956, vol. xix, t. iii, que lhe constituíram a doutrina, v. g., discursos de 1902, Obras, 1957, xxix, t.
v, pp. 31 e ss.
141 Leôncio Correia, A verdade sobre o 15 de novembro, conf. de A. Tavares de Lira, Rio: 1939, p. 306. Eclipsou-se
momentaneamente a fama do Fundador, em benefício de Benjamin e Floriano. Ambos tiveram monumento antes dele. O
de Deodoro, na Praça Paris, foi inaugurado a 15 de novembro de 1937.
142 O Congresso de Bagé conviera, em 31 de março de 1892, que preliminarmente devia ser substituída a
Constituição do Estado, “comtista”, por outra, calcada nos princípios do governo parlamentar.
143 V. telegrama de Floriano a Castilhos, Custódio, op. cit., i, p. 355. “Este governo não pode prestar seu apoio moral
senão ao Partido Republicano”.
145 Tiveram o apelido de maragatos (e os republicanos, de pica-paus). Pica-paus, porque, com as divisas brancas,
lembravam o pássaro deste nome, Manoelito de Ornellas, “A gênese do gaúcho brasileiro”, Os cadernos de cultura, Rio:
1957, p. 8. E maragatos, de uma colônia leonesa (San José), pois o nome é daquela origem, como aliás notara Romaguera
Corrêa, Vocabulário Sul‑Rio‑Grandense, Porto Alegre: 1897, p. 123. Explica Manoelito de Ornellas (monografia citada)
que seriam de San José, no Uruguai, muitos voluntários de Gumercindo, ou os lembrava o costume de escrever nas fitas
encarnadas dísticos patéticos, como “Viva a liberdade”... Daí o pejorativo maragato, aceito com arrogância pelos
revolucionários. — Sobre o Congresso de Bagé, v. Eurico J. Salis, História de Bagé. Porto Alegre: 1955, p. 238.
146 Foi a força de Joca Tavares que deu o entrevero final na Guerra do Paraguai, sendo dele o depoimento sobre a
ação do seu cabo de cavalaria, José Francisco de Lacerda, em Aquidabanigui, como ficou dito.
147 V. documentos in Custódio, op. cit., i, capítulos 3 e 4. Restaurado o castilhismo, Floriano assegurou-lhe “prestígio
e apoio de que posso dispor” (telegrama ao comandante do distrito militar). O Marechal Falcão da Frota empunhou uma
carabina ao lado dos castilhistas, para depor o “governicho”, Laurênio Lago, Marechal Júlio Anacleto Falcão da Frota, Rio:
1936, p. 11.
148 José Júlio Silveira Martins, Silveira Martins. Rio: 1929, p. 378.
149 “Cristão-novo, republicano mal convertido”, Rui, 1892, in Obras, xix, t. iii, p. 264, Rio: 1956.
150 “Chefe da democracia rio-grandense”, como Quintino Bocaiúva lhe chamara em 1878, Gaspar fora adversário
dos movimentos armados, como a Pelotas respondera em 1886: “Subirmos apoiados nas baionetas do exército? Nunca!”.
Não cedia quanto ao parlamentarismo, v. José Mariano Porto, Apontamentos biográficos de Gaspar da Silveira Martins.
Rio: 1891. Definiu-se em carta escrita à esposa, de Buenos Aires, que lhe resume o credo: “A forma parlamentar,
monárquica ou republicana, me garante a liberdade, contento-me com qualquer delas”, J. J. Silveira Martins, op. cit., p.
380. Mas a revolução não era restauradora, Epaminondas Vilalba, A Revolução Federalista no Rio Grande do Sul, Rio:
1897, p. 12. Neste livro os seus principais documentos.
151 Rui diferia de Gaspar no culto à Constituição de 91, obra sua: enquanto aquele sobrepunha o parlamentarismo à
república, queria este a república realizada. “Quem arruína a Constituição, alui a república”, artigo do Jornal do Brasil, de
30 de julho de 93, Obras completas, Rio: 1949, vol. xx, t. iv, p. 11. Negou nas Cartas de Inglaterra a “superstição
republicana”, que sentira (p. 301 das Obras completas, Rio: 1946, vol. xxiii, t. i). Estava com Benjamin Constant, o francês,
para quem o essencial é menos a forma do governo de que os seus limites, Mélanges de Littérature et de Politique,
prefácio, interpretação de C. Bouglé, e cit. A. E. Sampay, La Crisis del Estado de Derecho liberal‑burgués, Buenos Aires:
1942, p. 180.
152 Obras completas, de Rui Barbosa. Rio: 1949, vol. xx, t. ii, p. 321.
153 V. sobre a volta de Seabra à tribuna, a carta de Alcindo Guanabara a Aníbal Falcão, 21 de setembro de 92, in Luís
Aníbal Falcão, prefácio à Fórmula da civilização brasileira, pp. 62–4: “A decepção não podia ser maior”.
154 Rui Barbosa, Correspondência, coligida por Homero Pires. São Paulo: 1932, p. 57. De Rui, no artigo com que
abriu, pelo Jornal do Brasil, o combate ao florianismo: “Temos o império, mutato nomine, com quase todos os seus
defeitos e sem a sua unidade”. No artigo de 5 de julho de 93 comparava: “Não se confunda, entretanto, por esse lado,
Itamaraty com São Cristóvão. Nos usos imperiais não se tratavam os servidores da Coroa com a sobranceria majestática
usada hoje”, Obras completas. Rio: 1949, xx, t. iii, p. 100. O seu repúdio à idolatria das formas de governo continua na
conferência da Bahia, 24 de maio de 1897, Obras, xxiv, t. i, p. 57. Na Imprensa, 5 de outubro de 98: “Não é menos
inviolável, menos republicano o direito de ser monarquista na república”, Obras, xxv, t. i, 16. Na citada carta ao Jornal do
Comércio, 6 de março de 93, desafiara: “Pois bem: no dia em que, sob pressão dos mandões da multidão, se abrisse um
arrolamento para classificar os brasileiros em monarquistas e republicanos, eu acharia pouco para mim a designação de
monarquista”.
155 Publicado em 4 de dezembro de 1893 em São Paulo, o livro foi apreendido pela polícia. Do 1º milheiro só
circularam 80 exemplares, escreveu o autor, em volume hoje na coleção de Adir Guimarães, Rio. Saiu nova edição em
1895, em que Prado noticia a violência. Advogando a civilização liberal (doutrina de seu artigo, “Destinos políticos do
Brasil”, in Revista de Portugal. Porto: 1889, i, p. 470), estendeu-se em documentar as posições norte-americanas opostas à
América Latina (por isto Carlos Pereyra o traduziu), considera contrária à nossa índole a imitação dos Estados Unidos,
Paris: 1895, p. 225, de que “ilusoriamente” se queixava. Das atividades conspiratórias de Prado (atribuindo-lhe os
fornecimentos de armas feitos da Inglaterra aos insurgentes do Rio Grande, no que aliás acreditava) fala Eça de Queirós,
carta a Oliveira Martins, 17 de abril de 1893, Correspondência, Porto: 1928, p. 237. Mas grande fornecedor de armas aos
revoltosos foi o Conde de Leopoldina. — Anedota que equivale a uma denúncia, foi em 8 de setembro de 1892, a blague
de Medeiros e Albuquerque, publicando toda a primeira página de seu jornal O Fígaro com a notícia de... “A restauração
da monarquia”, lastreada de fantasiosos decretos e invenções quejandas. Sacudia o burguês... Edição fac-similar in Dom
Casmurro, Rio: 14 de junho de 1941.
156 Tratamos em separado (cap. 19) da Questão das missões, para dar coerência à ação, que se não interrompeu com
a mudança de presidentes e ministros, da diplomacia, servida no Rio de Janeiro pelo hábil secretário-geral do ministério,
Visconde de Cabo Frio, e, junto aos árbitros, pelo Barão do Rio Branco, responsável pelo êxito daquelas soluções.
157 Depoimento que ouvimos ao General João Nepomuceno da Costa, 2º tenente e deputado estadual que comandou
a defesa do palácio do governo em 31 de julho. Informa que a guarnição federal, comandada pelo Coronel Serra Martins,
se achava predisposta a intervir contra Machado (o que se opõe à tese de sua neutralidade, cf. Bormann, Dias fratricidas, i,
p. 120). Dado o sangrento encontro de 31, Machado mandou entregar as chaves do palácio a S. Martins e Hercílio Luz
ocupou o governo.
158 Contesta Tavares de Lira o que disse Dunshee de Abranches, quanto à saída de Rodrigues Alves por oposição à
inteligência dada ao artigo constitucional a respeito do período de governo de Floriano, Centenário do Conselheiro
Rodrigues Alves. São Paulo: 1951, i, p. 138; mas Cardoso de Melo Neto, op. cit., ii, p. 54, confirma esta versão. Em verdade
o problema já fora decidido: Rodrigues Alves manifestara opinião favorável à nova eleição, e deixou a pasta em 30 de
abril. A saída de Custódio é narrada por Serzedelo Corrêa (também demitido do ministério), Páginas do passado. Rio:
1959, p. 33, 2ª ed.
159 Discurso de Epitácio, in Laurita Raja Garaglia, Epitácio Pessoa. Rio: 1951, i, pp. 102 e ss. Na Campanha
presidencial, de 1919, referiu-se Rui ao discurso de 23 de maio de 1893, em que Epitácio sustentara que “o Rio Grande do
Sul não tem Constituição”, Obras completas de Rui Barbosa, 1956, xlvi, t. i, p. 85. Telegrama do general João Teles, in
Eurico J. Salis, História de Bagé, p. 247. O General João B. Teles foi, em outubro de 93, substituído pelo Marechal Isidoro
Fernandes de Oliveira, aprisionado pelos federalistas no combate do Rio Negro, como se dirá.
160 Pedro Carvalho, Campanha do Coronel Santos Filho. Porto Alegre: 1897, p. 59.
162 V. ordens do dia in Albino José Ferreira Coutinho, Marcha da Divisão do Norte. Porto Alegre: 1896, pp. 33 e ss.
Em 13 de maio os chefes revolucionários reuniram-se perto da linha limítrofe, e o Coronel Salgado propôs suspender a
luta. A idéia foi refutada pelo Dr. Epaminondas Arruda, pelo Coronel Estácio Azambuja, por Gumercindo: decidiu-se
prosseguir, Artur Ferreira, Cronologia da Revolução Federalista, manuscrito comunicado por Dante de Laytano.
163 “Em nossa opinião o resultado ficou indeciso”, Marechal Setembrino de Carvalho, Memórias. Rio: 1950, p. 55.
Descrição da batalha in José Lavrador, Heróis de noventa e três. Rio: 1933, pp. 65 e ss.
164 Euclides da Cunha, Contrastes e confrontos, pp. 6–7, interpretando, a propósito de Aparício Saraiva, o problema
do caudilhismo.
166 Castilhos Goycochêa, Gumercindo Saraiva na Guerra dos Maragatos. Rio: 1943. Nasceu em 13 de janeiro de 1852,
na paróquia do Arroio Grande, ibid., pp. 85–6. Só falava espanhol. Em 1883 declarou-se oriental, Manuel Fonseca, op.
cit., p. 110.
167 Carta manuscrita do conselheiro Diana ao Tenente-coronel Augusto Álvaro de Carvalho, 4 de agosto de 89,
comunicada por Olinto Sanmartin.
168 Os federais usavam divisas vermelhas, mas os Saraivas, blancos no Uruguai, odiavam o partido colorado e as
usavam brancas, eles e os seus homens, Nepomuceno Saravia Garcia, Memórias de Aparicio Saravia, p. 29. Explica este
autor que a combinação entre os irmãos, Gumercindo e Saraiva, consistia em auxiliarem, no Brasil, a vitória dos
gasparistas, e em seguida, com o peso desse triunfo, derrubarem no Uruguai o governo colorado, que datava de 1865
(com Venâncio Flores e a intervenção de Tamandaré).
169 V. Arturo Gimenez Pastor, La Revolución de 1897. Montevidéu: 1897, p. 60; sobretudo Memórias de Aparicio
Saravia, por seu filho Nepomuceno Saravia Garcia, Montevidéu: 1956, pp. 19 e ss., com documentação do arquivo secreto
do “general”; Luis R. Ponce de León, Aparicio Saravia, Héroe de la libertad electoral. Montevidéu: 1956; Eduardo
Thomas, Compendio de historia nacional. Montevidéu: 1955, p. 412.
170 Murilo Ribeiro Lopes, Rui Barbosa e a Marinha. Rio: 1953, p. 19.
171 V. carta do almirante a Laurentino Lopes Filho, no pontal da Barra e bordo do Júpiter, 12 de julho de 1893, cf.
Murilo Ribeiro Lopes, ibid., p. 26.
173 Custódio, ibid., ii, p. 312. Diz um autor, José Lavrador, Heróis de noventa e três, Rio: 1938, p. 85, que o
movimento devia estourar a 7 de setembro, durante a parada, com a prisão do Marechal Floriano. Assumiria o vice-
presidente do Senado, Prudente de Morais; talvez fosse eleito presidente o senador Rui Barbosa. Custódio, op. cit., ii, p.
299, diz que nem o vice-presidente do Senado nem o presidente da câmara seriam chamados, sim o do Supremo Tribunal
Federal; quanto à candidatura de Rui, achava-a inconveniente. É claro que, vitoriosa a revolta, a presidência (não diz, mas
é óbvio) caberia ao seu chefe, o próprio Custódio. — Rui, na carta que em Buenos Aires mandou a La Nación, afirmava
que o voto de Floriano lhe traduzia a vontade de prolongar o governo além do quatriênio.
174 Subsídios para a história marítima do Brasil. Rio: 1942, iv, p. 509.
176 V. o artigo de Rui, Jornal do Brasil, 24 de maio de 1893, em que define “Jacobinos e republicanos”, Obras
completas, Rio: 1949, xx, t. ii, p. 27.
178 Cartas de Inglaterra, “As minhas conversões”, resposta a Afonso Celso, op. cit. e p. cit.; e discurso na Bahia, 1897.
179 Carta de Boulogne-sur-Mer, 4 de dezembro de 1892, arq. de J. Alfredo, inédita até a publicarmos em A Princesa
Isabel, São Paulo: 1941, p. 297.
180 O comandante Augusto de Castilho revelou que, em conversa com Saldanha, na Ilha das Cobras, a 10 de outubro,
este lhe confiou que na hipótese de ser forçado a entrar na revolta, “arvoraria a bandeira monárquica, com a qual
certamente bandeariam o próprio Custódio de Melo, os revoltosos do Rio Grande do Sul e a grande maioria da população
da cidade e do país do Sul ao Norte”, trecho da defesa de Castilho citado por Capistrano de Abreu, em Gazeta de Notícias,
21 de fevereiro de 1895, Ensaios e estudos, 3ª série, p. 211. É todavia temerário chamar de “monarquista” a Revolta da
Armada, de 1893, com o adminículo (Samuel Flagg Nemis, A Diplomatic History of the United States. Nova York: 1955,
p. 755) da simpatia do Kaiser, dada a hipótese de pretender a Coroa o Príncipe Dom Augusto, filho do Duque de Saxe...
Tal solução “germânica” (Harold E. Davis, The Americas in History. Nova York: 1953, p. 648) era estranha aos planos dos
revolucionários, de que a consulta à nação era a preliminar... saldanhista. Quanto ao grupo “restaurador”, acatava as
instruções da Princesa Isabel, como revela a correspondência de João Alfredo.
181 Grato ao grande funcionário, Floriano recompensou-o com honras de general-de-brigada, Oliveira Lima,
Memórias. Rio: 1937, p. 131.
182 Joaquim Nabuco, A intervenção estrangeira durante a revolta de 1893. São Paulo: 1939, p. 19, 2ª ed.
183 Nabuco, op. cit., p. 22. Sobre a iniciativa do governo de Floriano, ibid., p. 14. “Sumia-se a vitória em lúgubre
derrota”, João Pandiá Calógeras, Formação histórica do Brasil, Rio: 1930, p. 428. Por este tempo chegou às mãos de
Custódio, mandado de terra, grosso livro de direito internacional com a nota de que nele acharia o que ler, a propósito do
seu empenho de ser considerado beligerante pelas nações estrangeiras. Desconfiou-se; foi revistado cautelosamente; e
descobriu-se uma máquina infernal, oculta no bojo do livro, para isto esvaziado... Viu-a Gago Coutinho indo a bordo do
Aquidabã, como emissário do comandante Castilho (e isto nos contou, em conversa, a 25 de maio de 1953). O fato é
referido em Portugal e Brasil: Conflito diplomático, Lisboa: 1894, i, p. 170. — Custódio, respondendo em 2 de outubro ao
ultimatum dos comandantes, condicionou-o à atitude análoga do governo, que devia retirar os canhões assestados, nos
morros. Habilmente, Floriano (que perdia menos do que os rebeldes) se submeteu à exigência.
184 Sérgio Corrêa da Costa, A diplomacia do Marechal, pp. 196–7. Sobre os barcos comprados por intermédio de
Salvador de Mendonça, há curiosa carta de Nova York, 29 de novembro, in Murilo Ribeiro Lopes, op. cit., p. 121. A
respeito da ação ágil do ministro, Oliveira Lima, Memórias. Rio: 1937, pp. 145–6. Um dos navios comprados nos Estados
Unidos foi o Destroyer — que veio sob o comando do famoso navegador Slocum, veterano das aventuras marítimas em
águas brasileiras, e cuja missão, de 1893, descreveu num interessante e amargo fascículo, Voyage of the Destroyer (V. The
Voyages of Joshua Slocum, editado por Walter Magnes Teller. Nova Brunswick: 1958, pp. 172–195).
186 Manuscrito in National Archives, Washington. Rui Barbosa em carta a Custódio, de Buenos Aires, 5 de
novembro de 93, dizia ter aceito corresponder-se com o New York Herald, para “rebater os boatos e tramas” de Salvador
de Mendonça, “caracterizando como monárquico e restaurador o movimento”, Correspondência, coligida por Homero
Pires, São Paulo: 1933, p. 75. V. de Salvador, A situação internacional do Brasil; e documentos coligidos por Aluísio
Napoleão, Rio Branco e as relações entre o Brasil e os Estados Unidos. Rio: 1947.
187 Essa neutralização do Rio, imposta a Custódio por força da diplomacia britânica em união com os Estados
Unidos, se de um lado obstou ao bombardeio, do outro não impediu ao governo a construção de apressadas obras e
artilhamento de praias e morros, servindo de cortina aos seus aprestos. A ação do Almirante Benham foi decisiva,
Nabuco, op. cit., p. 110; Sérgio Corrêa da Costa, ibid., p. 73. Quanto aos ingleses, em verdade os Rothschild, por
intermédio de amigos norte-americanos, chegaram a insinuar ao State Department que convinha deixar restaurar a
monarquia, pois os negócios muito sofriam com as desordens reinantes..., Sérgio Corrêa da Costa, ibid., p. 196. O
ministro da França em Lisboa tivera a iniciativa de pedir a ação coletiva da esquadra para que os navios mercantes não
fossem inspecionados pelos rebeldes, Portugal: Conflito diplomático, i, p. 93, o que os norte-americanos conseguiram
com a ameaça da força.
188 Iniciou-se por equívoco o duelo de artilharia, porque explodiu em Santa Cruz uma barrica de pólvora, o que a
esquadra tomou como começo de fogo, Hastínfilo de Moura, Da Primeira à Segunda República. Rio: 1936, p. 62.
189 A Semana. São Paulo: 1938, i, p. 427. V. a meditação de Ferreira de Araújo, crônica de 22 de outubro de 1893,
nesta coletânea de artigos da Gazeta de Notícias. Descreve o primeiro bombardeio Virgílio Várzea, in Kosmos, Rio: julho
de 1906, nº 7. A visão geral dos sucessos, in Sir William Laird Clowes, Four modem naval campaigns (cap. 4, The
Attempted Revolution in Brazil, Londres: 1902, a quem seguidamente nos reportaremos); Giorgio Molli, La Marina
Antica e Moderna. Gênova: 1906. Graças ao autor de The History of the Royal Navy a revolução brasileira passou aos
cursos de história geral da Marinha. A ele e a outro oficial britânico que a narrou dia a dia, Reginald Rundell Neeld, Diary
of the Revolution at Rio de Janeiro, Brasil..., Portsmouth: 1895.
190 A. C. de Sousa e Silva, O Almirante Saldanha, comandante‑em‑ ‑chefe da Revolta da Armada. Rio: 1940, p. 10.
“Posição inaudita de neutralidade”, disse Rui, em 1895, Obras completas. Rio: 1952, xxii, t. i, p. 239. V. ainda Felisbelo
Freire, História da revolta de 6 de setembro de 1893. Rio: 1896, 2 vols.; Artur Thompson, Guerra Civil do Brasil de 1893–
95. Rio: 1934; Frederico Vilar, As revoluções que eu vi. Rio: 1951, p. 61; Ministério da Marinha, Centenário do Almirante
Saldanha. Rio: 1947.
191 Luís Viana Filho, A vida de Joaquim Nabuco. São Paulo: 1932, p. 201.
192 Sobre as vicissitudes da imprensa antigovernista ou independente, v. Max Fleiuss, A Semana. Rio: 1915, p. 55. Rui
lembraria: “À imprensa não fora permitido murmurar”..., discurso de 1897, Obras completas, xxiv, t. i, p. 26.
194 General José Cândido da Silva Murici, A Revolução de 93, Memórias. Rio: 1946, p. 22. V. correspondência in
Floriano, Memórias e depoimentos. Rio: 1941, vol. vi. Curioso é que (como nos disse o General João Nepomuceno da
Costa, um dos que falaram a Lorena em nome da cidade), ao República também faltavam elementos para uma ação
demorada. Lorena foi franco: ou lhe entregavam no dia seguinte a cidade ou continuaria para Montevidéu, pois não tinha
carvão nem gente de desembarque...
195 J. J. Silveira Martins, op. cit., p. 382, entrevista ao Jornal do Comércio, 1896.
197 Carta de Lorena a Custódio, 26 de novembro de 93, in Murici, op. cit., p. 125. Retirou-se Aníbal Cardoso do
governo provisório com altiva carta a Lorena, em 25 de novembro.
198 Eurico J. Salis, História de Bagé, p. 293. Aí a documentação essencial a esse capítulo decisivo da história da
revolução rio-grandense.
200 V. Alm. Álvaro de Vasconcelos, in Revista do Instituto Histórico Brasileiro. Rio: 1951, vol. 204, p. 245.
Igualmente notável fora a saída do República, e em seguida do Palas e do Marcílio Dias (Comandantes Lorena, Pio
Torelly — cujo barco naufragou em Itajaí, a 23 de outubro de 93, incorporando-se Torelly na coluna que atacou o Paraná
— e Francisco de Matos). — Leia-se Hastínfilo de Moura, Da Primeira à Segunda República, p. 71.
202 A. J. Ferreira Coutinho, op. cit., p. 93 (ordem do dia do General Lima, narrando os êxitos da perseguição até
dezembro de 93). A coluna entrara em Itajaí a 11 de dezembro, quando os federalistas abandonaram, por mar, este porto.
203 O cerco e a capitulação de Tijucas estão descritos nas Memórias, do General Murici, pp. 178 e ss. Comandava a
praça o Coronel Adriano Pimentel, que sucedera a Ismael do Lago, por ser mais antigo. O que sobrou na Lapa faltou ali: a
decisão de resistir. V. Tomás Garcez Paranhos Montenegro, Discursos proferidos na Câmara dos Deputados na sessão de
1894. Bahia: 1894, p. 46. O Coronel Adriano foi indultado por decreto de 14 de novembro de 94.
205 Leia-se, em defesa do general, Coronel Cordolino de Azevedo, O Marechal Pego Júnior e a invasão do Paraná.
Rio: 1944, p. 40. Regressando ao Rio em fevereiro, o general foi preso em março, submetido a Conselho de Guerra,
condenado à morte e afinal absolvido pelo Supremo Tribunal Militar, que o considerou isento de culpa.
207 V. a bibliografia do episódio in Rubens Mário Jobim, Vento Leste nos Campos‑Gerais. Rio: 1953; principalmente
David Carneiro, O Paraná e a Revolução Federalista. São Paulo: 1944; do mesmo autor, O cerco da Lapa e seus heróis.
Rio: 1934; J. B. Magalhães, A consolidação da república. Rio: 1947, Biblioteca do exército; Pedro Calmon, Gomes
Carneiro, o general da república. Rio: 1933; Rubens Mário Jobim, livro citado, e Anais do i Congresso de História da
Revolução de 1894; Romário Martins, História do Paraná, pp. 351 e ss.; Floriano Peixoto, Memórias e depoimentos. Rio:
1941, vol. vi (relatório de Joaquim Lacerda e Líbero Guimarães).
209 William Laird Clowes, Four Modern Naval Campaigns, p. 217 (descrevendo as unidades da frota legal e o seu
armamento).
212 Com mais 500 homens Saldanha teria tomado Niterói, Dunshee de Abranches, ibid., ii, pp. 49–51. Sobre o seu
verdadeiro plano, de vencer a luta com o desembarque dos federalistas no Rio de Janeiro, em vez da sua marcha absurda
através do Paraná e de São Paulo, v. a sua comunicação com Gaspar Martins, Dídio Costa, Saldanha. Rio: 1914, p. 314.
213 V. Subsídios para a história marítima do Brasil, iv, p. 511. Jerônimo Gonçalves, chamado a 21 de setembro para
chefiar as forças navais contra a revolta, foi infeliz, a 25, na tentativa de fazer o Forte de Villegaignon definir-se pela
legalidade, ocasião em que os marinheiros quase o mataram. Seguiu ele para Montevidéu com alguns oficiais a bordo do
vapor inglês Thames, para ali tomar conta do cruzador Tiradentes (21 de outubro de 93). Foi decisiva a ação do ministro
do Brasil no Uruguai, Vitorino Monteiro, para impedir a adesão do Tiradentes, quando ali chegou o República, a 22 de
outubro. No mesmo dia abandonou o navio rebelde as águas uruguaias.
214 Carta de Saldanha a Silveira Martins, de bordo da Mindelo, 14 de abril de 1894, Dunshee de Abranches, A
Revolta da Esquadra e a Revolução Rio‑Grandense. Rio: 1914, i, p. 50.
215 Vicente Ferrer, A execução de Silvino de Macedo. Pernambuco: 1906, p. 19, 2ª ed. Documento publicado por
Mário Melo, Dentro da história. Rio: 1931, p. 93. O fuzilamento foi a 14 de janeiro de 1894. Na revolta de marinheiros de
1910 ainda se recordava a sorte de Silvino. O telegrama de Floriano é o único conhecido, em que autoriza claramente a
execução. Atribui-se à sua cólera, por ter sido Silvino agraciado com a condição de não voltar a sublevar-se.
216 Félix Cavalcanti de A. Melo, Memórias de um Cavalcanti. São Paulo: 1940, p. 156.
217 V. explicação de Alexandrino a Dunshee de Abranches, op. cit., i, nota f. Ao pedir asilo nas corvetas, Saldanha
disse que Custódio o abandonara, Castilho, Conflito diplomático, i, p. 260.
218 Subsídios para a história da Marinha (biografia de Jerônimo Gonçalves), iv, p. 539.
219 A esquadra (“de papelão”, ironizavam os rebeldes) chegou à altura da Praia Vermelha, na barra do Rio de Janeiro,
a 10 de março. Era realmente ineficiente e podia ser destruída pelos navios de Custódio, se outra fosse a sua estratégia. A
pequena armada do Almirante Gonçalves desempenhou o papel moral de testemunhar a divisão que se dera na Marinha,
e, com o afastamento dos navios poderosos (o Aquidabã e o República), selou a sorte da revolta, cortando-lhe a fuga para
o oceano. Gonçalves fizera o seu projeto de ataque, constante da combinação de fogo entre as torpedeiras e as fortalezas.
A rendição poupou este episódio catastrófico.
220 Castilho não ofereceu o asilo, nem poderia fazê-lo, atentas as precárias instalações de bordo. Isto mesmo, em
conversa com o autor, afirmou o Almirante Gago Coutinho (26 de maio de 1953), então tenente, e secretário de Castilho,
que, embora baixado ao hospital, se informou perfeitamente dos acontecimentos finais da revolta. Saldanha declarou
(continua Gago Coutinho) preferir os navios menores, não querendo confiar nas belonaves das outras potências ali
presentes. Castilho positivou que concedera asilo a cerca de 70 pessoas, conforme o apelo de Saldanha. Os demais
entraram de imprevisto.
221 João Franco, Cartas del‑Rei Dom Carlos i. Lisboa: 1924, p. 41. Sobre o rompimento, v. Sérgio Corrêa da Costa, A
diplomacia do Marechal, pp. 101 e ss. Floriano ainda pensou em mandar aprisionar as duas corvetas..., ibid., p. 104.
Todos os pormenores se contêm no arrazoado de Castilho, Portugal e Brasil, Conflito diplomático, O processo no
Conselho de Guerra da Marinha do Capitão‑de‑fragata Augusto de Castilho. Lisboa: 1894, 3 vols. Também Sousa Costa,
Grandes dramas judiciários. Porto: 1944. As relações diplomáticas com Portugal foram reatadas a 16 de março de 1895,
por mediação inglesa, sendo nomeados ministros em Lisboa e no Rio de Janeiro Assis Brasil e o Conde de Paço d’Arcos,
A. G. de Araújo Jorge, Ensaios de história diplomática. Rio: 1912, p. 101. Consolidou-as Tomás Ribeiro, em feliz missão
no Rio de Janeiro, poeta que todos admiravam, como recorda Rodrigo Otávio, nas suas Memórias.
222 William Laird Clowes, op. cit., p. 235 (mostrando a importância do fato para a futura guerra marítima). J. A.
Santos Porto, O combate naval de 16 de abril: Reflexões e documentos. Rio: 1895.
223 V. o eloqüente retrato que dele faz Euclides da Cunha, Os sertões, p. 295, 1ª ed.
226 Diário do Congresso nº 47, de 19 de julho de 96, citado por Osvaldo R. Cabral, ibid., p. 243. Eram o Capitão
Romualdo de Carvalho Barros, o Coronel Luís Gomes Caldeira de Andrade, o Major-Médico Alfredo Paula Freitas. O
autor citado, completando lista organizada por Lucas Boiteux (e publicada por ocasião da trasladação dos despojos, em
1934), dá os nomes conhecidos, das vítimas de Anhatomirim (Santa Cruz). Visitamos a fortaleza em novembro de 1952.
Como não sofreu maiores reparos desde 1894, é visível na parede da sala dos presos, ao nível das baterias, a marca das
descargas, com que muitos foram executados. Vimos o sumidouro em que se presume tenha sido lançado o corpo do
Capitão-de-mar-e-guerra Frederico Guilherme de Lorena. Outras referências: Lucas A. Boiteux, Pequena história
catarinense. Florianópolis: 1920, p. 127; Bormann, Dias fratricidas, iii, p. 244; Jacques Ouriques, O drama do Paraná.
Buenos Aires: 1894; David Carneiro, Os fuzilamentos de 1894 no Paraná, p. 51; Raimundo Meneses, Guimarães Passos e
sua época boêmia. São Paulo: 1952, p. 99 (a propósito do fuzilamento de Carlos de Guimarães Passos, irmão do poeta).
227 Joaquim Freire lançou a culpa no General Everton Quadros (artigo no Diário da tarde, de 22 de julho de 1926),
aliás de acordo com o sentir de J. B. Bormann, Dias fratricidas, iii, p. 158: “Foi (o general) o mandante
inquestionavelmente”. Sobre este miserável episódio, v. Rocha Pombo, História do Brasil, x, p. 398; Bormann, op. cit., iii,
pp. 120 e ss.; Floriano, Memórias e depoimentos, vol. vi (inquérito no Paraná sobre os cúmplices da revolta); David
Carneiro, Os fuzilamentos de 1894 no Paraná. Rio: 1937; Walfrido Pilotto, Assis Cintra e a tragédia do km 65, Refutação.
Curitiba: 1932; Leôncio Correia, O Barão de Serro Azul. Rio: 1942. É de Leôncio a sentença: foi Joaquim Freire quem
ordenou a matança do km 65, Obras de Leôncio Correia, Meu Paraná. Rio: 1954, p. 22.
229 As vozes pela continuação de Floriano não chegaram a formar um movimento, mas constituem o indício de que
se tramava este golpe, José Maria Bello, História da república. Rio: 1952, p. 171.
230 Rodrigo Otávio, Minhas memórias dos outros. Rio: 1934, p. 121, 1ª série.
232 Gabriel Piza, carta comentada por Teixeira Mendes e transcrita por Cruz Costa, O positivismo na república, p.
177.
233 Rodrigo Otávio, ibid., p. 169. Entretanto em julho de 94 cumprimentara Prudente: “Saúdo primeiro magistrado
que saberá felicitar a nação. Floriano Peixoto”. Max Fleiuss, in Prudente de Morais, o primeiro centenário, p. 182.
234 Ouvidos por exaltados companheiros, alguns oficiais florianistas se manifestaram contra o golpe..., Hastínfilo de
Moura, Da Primeira à Segunda República, p. 75.
235 Rodrigo Otávio, ibid., p. 172. O novo Ministro da Marinha, Almirante Elisário Barbosa, neste mesmo 15 de
novembro, falando no Itamaraty a um jornalista, dizia não saber se o palácio dentro em pouco não se converteria em
cárcere, Max Fleiuss, A Semana. Rio: 1915, p. 134. Descreve a posse no Senado, Machado de Assis, A Semana, ii, p. 242
(crônica de 18 de novembro), ed. Jackson.
237 Campos Sales, op. cit., p. 127. Prudente dizia: “Eu sou o Executivo, vós sois o Legislativo”. Comenta Campos
Sales: não teria seguramente outra linguagem o presidente do Supremo Tribunal Federal quando se referisse aos outros
poderes da nação...
238 Caricaturas instantâneas (na Gazeta de Notícias, 1896). Rio: 1939, p. 33, com prefácio de Carlos Süssekind de
Mendonça.
239 V. carta de Glicério a Bernardino de Campos, 18 de maio de 1895, em que aquele é intransigentemente contra
qualquer espécie de anistia, in Cândido Mota Filho, Uma grande vida. São Paulo: 1931, p. 270.
240 Rui Barbosa, O Partido Republicano Conservador (1897), in Obras completas. Rio: 1952, vol. xxiv, t. i, p. 16.
241 “O destino pôs assim, a curta distância uma da outra, a morte de um dos chefes da rebelião de 6 de setembro e a
do chefe do estado que tenazmente a combateu e debelou”, Machado de Assis, A Semana, ii, pp. 417–8.
242 Fundador da colônia de Chapecó (1881), Bormann fora nomeado comandante da guarnição e fronteira de
Palmas em 8 de abril de 1893, Laurênio Lago, Marechal José Bernardino Bormann. Rio: 1944, p. 14.
243 A. J. Ferreira Coutinho, Marcha da Divisão do Norte, p. 198 (ordem do dia 4 de junho de 94, do Coronel Manuel
do Nascimento Vargas); sobre as operações, General J. B. Bormann, Dias fratricidas. Curitiba: 1906, vol. iii; Castilhos
Goycochêa, Gumercindo Saraiva, pp. 66 e ss. E Manuel Fonseca, Gumersindo Saravia, cap. 36.
244 Pedro Carvalho, Campanha do Coronel Santos Filho, p. 209. V. a descrição do fim do caudilho in Ângelo
Dourado, Voluntários da morte. Pelotas: 1896; Nepomuceno Saravia Garcia, op. cit., pp. 31 e ss. Também Bormann, op.
cit., iii, p. 215, e C. Goycochêa, ibid., p. 75.
247 O mesmo autor, filho de Aparício, transcreve cartas do Coronel João Francisco, que confirmam as relações,
mercantis e políticas, do caudilho “blanco” com as autoridades estaduais, com quem, por intermédio dele, se conciliara.
248 João Francisco publicou em 1932, Psicologia dos acontecimentos políticos sul‑rio‑grandenses; e foi o caudilho
que mais longamente viveu. Faleceu em São Paulo, aos 89 anos de idade, em 7 de maio de 1953.
249 Epaminondas Vilalba, A Revolução Federalista, p. 86; Dídio Costa (aí a documentação definitiva), Saldanha, p.
414; Dunshee de Abranches, A Revolta da Armada e a Revolução Rio‑Grandense, ii, p. 189; Ministério da Marinha,
Centenário do Almirante Saldanha, Rio: 1947. — O lanceiro chamava-se Salvador Seixas. Tambeiro, apelido, vem de
tambo, na fronteira rio-grandense, leiteria, ou estábulo.
250 Aliás Saldanha fora avisado por Joca Tavares das negociações de paz, Dunshee de Abranches, A Revolta da
Armada e a Revolução Rio‑ ‑Grandense, ii, p. 181.
251 Machado de Assis, A Semana, ii, p. 412. Inumados em Rivera, os restos mortais do almirante foram transladados
para o vistoso mausoléu do São João Batista, no Rio, em 1908; e por ocasião do centenário (1947) a Marinha lhe
inaugurou o monumento. O seu nome foi posto no navio-escola que tem ultimamente dado a volta ao mundo, com os
nossos guardas-marinhas. Perdeu, para a classe, o sentido revolucionário que poderia dividi-la, para simbolizar o espírito
profissional, a dignidade marinheira, que a unifica.
254 Campos Sales, Da propaganda à presidência, p. 134. Sobre o negociador, v. Laurênio Lago, Marechal Graduado
Inocêncio Galvão de Queirós (1841–1903). Rio: 1941, p. 12; Rodrigo Otávio Filho, conferência, in Prudente de Morais: O
primeiro centenário. São Paulo: 1942, p. 83. Rui, comentando a mensagem de despedida de Prudente limitou-lhe a
responsabilidade da pacificação, para dar parte maior ao general. Este, ao regressar do Sul, dissera-lhe “não ouvira (do
presidente) uma palavra sobre a pacificação. Da sua linguagem ressumbrava apenas o desejo dela”, A Imprensa, 18 de
novembro de 1898, Obras, xxv, t. ii, p. 133. Mas o desejo era transparente.
258 V. Raimundo Meneses, Guimarães Passos e sua época boêmia. São Paulo: 1952, p. 131.
259 Rodrigo Otávio, Minhas memórias dos outros, Rio: 1934, 1ª série, p. 298, transcreve o artigo de jornal em que
Pompéia restaurou os conceitos da sua alocução.
260 Em página memorável, criticou e diagnosticou Francisco de Castro a propósito da doença de Prudente. Davam-
na como “acesso pernicioso”, segundo as teorias de Torres Homem, e eram seus cálculos biliares. Daí a passagem sibilina
da oração de paraninfo, de 1899, em que Castro ironiza e define: “É que no ativo dele (impaludismo) jazem englobados
estados mórbidos de vária casta, desde a septicemia aguda ou crônica até a toxicose urêmica [...] desde o choque
operatório até a pedra na bexiga”. Mestre Aloísio de Castro confirmou, em conversa conosco, esta censura do Pai aos
médicos do presidente. — O presidente foi operado a 29 de outubro; e como a convalescença devesse prolongar-se,
passou o governo a 11 de novembro. V. Ordival Cassiano Gomes, Manuel Vitorino Pereira. Rio: 1957, p. 246; Manuel
Vitorino Pereira: Primeiro centenário de nascimento, câmara municipal, Bahia: 1954.
261 Biriba, apelido dado pelos rio-grandenses aos tropeiros de Sorocaba. Prudente era filho de um destes, e disto se
orgulhava, como aliás Manuel Vitorino, do honrado marceneiro português de quem descendia.
264 V. J. Lúcio d’Azevedo, A evolução do sebastianismo. Lisboa: 1918, p. 158. Citando Euclides da Cunha, o
historiador português inclui o caso de Canudos na crônica das histerias sebastianistas da raça. Cantavam os fanáticos:
“Dom Sebastião já chegou / E traz muito regimento / Acabando com o civil / E fazendo o casamento”.
265 Euclides da Cunha, apoiado em João Brígido, sumariou a biografia lacunosa do beato, Os sertões. Rio: 1933, p.
159, 12ª edição corrigida. Natural de Quixeramobim, de uma família, Maciéis, célebre por suas lutas com os Araújos,
emigrara, casado, e por ter perdido a mulher, raptada por um sargento de polícia, desapareceu do Ceará... Surgiu, barba
crescida, cabelos compridos, envolto no seu arremedo de batina, abordoado ao cajado dos romeiros, no Nordeste baiano.
Diziam que respondera por crime de sangue, que lhe perdoaram, por já estar demente. A primeira notícia dos bandos que
corriam com ele os sertões, nos dá a Folhinha Laemmert, do Rio de Janeiro, em 1887. O arcebispo, em 1882, reprovou
esse surto de fanatismo; e em 87 o presidente da província pediu ao Ministro do Império um lugar para Antônio
Conselheiro no hospital de alienados. Não havia vaga... Retratou-o Durval Vieira de Aguiar, em Descrições práticas da
Bahia, 1882, “baixo, moreno acaboclado”.
266 Lê-se em placa de ferro: “Edificadu em 1893 por a v m m, m m g” (ou seja, por Antônio Vicente Mendes Maciel,
sendo o fundidor mestre Manuel Gonçalo). Estivemos em Canudos em 9 de agosto de 1954. Das ruínas da igreja nova
resta um pouco do alicerce. A “matadeira”, peça Armstrong, foi posta num pedestal de alvenaria, alegoricamente... E nada
mais.
268 Leia-se como documento impressionista Os jagunços, de Afonso Arinos (com o pseudônimo de Olívio de Barros,
São Paulo: 1898), p. 172.
269 “A suprema autoridade temporal era para ele a do imperador”, Olívio de Barros, ibid., p. 172.
270 Machado de Assis, A Semana, i, p. 155: “Telegrama da Bahia refere que o Conselheiro está em Canudos com dois
mil homens perfeitamente armados” (22 de julho de 1894). Um pequeno jornal de São Félix, 20 de maio de 94 (cf.
Euclides da Cunha, Canudos. Rio: 1939, p. 47): “Pessoa vinda de Canudos, hoje império de Belo Monte, garantia [...] têm
chegado grupos de assassinos [...] a fim de fazerem parte do exército garantidor das instituições imperiais”.
271 Relatório do Frei João Evangelista, v. Anais do 1º Congresso de História da Bahia. Bahia: 1950, iv, p. 576.
272 Euclides da Cunha, artigo de 14 de março de 1897, para O Estado de São Paulo (Canudos. Rio: 1939, p. 161). Os
sertões, monumento literário erguido a essa obscura epopéia, é o livro de expiação: pois ele propagara a idéia absurda de
que em Canudos se tinham refugiado as esperanças vendeianas da restauração... V. também Umberto Peregrino, “Os
sertões” como história militar. Rio: 1956.
273 A Semana, ii, p. 358 (6 de dezembro de 96). E também a crônica de 31 de janeiro de 97, ibid., p. 416.
274 Euclides da Cunha, ibid., p. 235. Que os jagunços deixaram 150 mortos contra dez soldados mortos e 16 feridos...
276 O Coronel Moreira César, enviado para comandar a terceira expedição a Canudos sem consulta prévia ao
governador, e, ao que se propalava (sem razão, dadas as relações pessoais que mantinham, desde 1891), capaz de depô-lo.
277 Cit. de Luís Viana Filho, in Jornal do Brasil. Rio: 15 de junho de 1958.
278 Luís Viana Filho, in Jornal do Brasil, 8 de junho de 1958. Do mesmo autor: A vida de Rui Barbosa, pp. 296–7
(edição do centenário).
279 Luís Viana Filho (contestando o que diz Dante de Mello in A verdade sobre “Os Sertões”), Jornal do Brasil, 8 de
junho de 1958.
280 Ata de 19 de janeiro de 1897, redigida em meio ao combate, Tenente Henrique Duque-Estrada de Macedo Soares,
A Guerra de Canudos. Rio: 1902, pp. 12–8. No seu relatório o chefe de polícia, Félix Gaspar, diz que a coluna perdeu
quatro soldados na ação de Tabuleirinho dos Canudos e cinco na retirada, Relatório da Secretaria da Polícia e Segurança
Pública. Bahia: 1897, p. 24.
281 Tradição oral, que nos comunicou, tendo-a ouvido a Lauro Müller, Edmundo da Luz Pinto.
282 O primeiro diagnóstico é porventura de Afrânio Peixoto, Epilepsia e crime. Bahia: 1897, p. 195. Euclides da
Cunha talvez tivesse sob os olhos a afirmativa do jovem psiquiatra, na descrição clínica daquela sintomatologia:
“epiléptico provado”, Os sertões, p. 297. Aí se refere ao caso de Apulco de Castro de 1883, v. Melo Barreto Filho e
Hermeto Lima, História da polícia do Rio de Janeiro. Rio: 1941, iii, p. 122.
283 Leia-se Euclides, ibid., p. 302. Comandou o 7º o Major Rafael Augusto da Cunha Matos, a artilharia o Capitão
José Agostinho Salomão da Rocha, o Capitão Pedreira Franco o esquadrão do 9º, o Coronel Sousa Meneses a ala do 16º, o
Coronel Pedro Nunes Tamarindo o 9º de infantaria.
285 O nome perpetuou-se no Rio de Janeiro, onde, por isto, se chamam favelas os grupos de casebres espalhados, em
desordem, pelos morros, ao sabor da ocupação... (E. Backeuser, in Renascença, Rio: março de 1905). Favela deixou de ser
um topônimo para significar povoado, improvisadamente feito, de materiais de toda espécie, nas elevações que
circundam a cidade — lembrando, pelo miserável aspecto, o arraial dos jagunços.
287 Euclides, op. cit., p. 354. Outra é a descrição de Dantas Barreto, Acidentes de guerra, Recife: 1914, p. 169, 2ª ed.,
história, com enxertos novelescos, da expedição de Moreira César. Após a tomada do arraial, soube-se que o corpo de
Moreira César fora queimado no riacho das Umburamas, ali perto, Dantas Barreto, Destruição de Canudos. Recife: 1912,
p. 295.
288 Pois falamos tanto dos jagunços, nome dos cabras do sertão (mais tarde, cangaceiros), é conveniente elucidarmos
o étimo. Trata-se de arcaísmo português (preservado, como outros, no nosso populário), zagunchos... (“com zagunchos e
fréchas”, Coment. de Afonso Dalbuquerque, i, p. 229)... espécie de azagaia, Fernão Mendes Pinto, Peregrinação, xxxvi,
donde zagunchada, e, em Trás-os-Montes, zaguncho, Cândido de Figueiredo, Dicionário da língua portuguesa, 2ª ed., a
significar muito vivo, esperto... O clavinoteiro seria, analogicamente, com a mudança consonantal, jagunço... Aliás na
região de Geremoabo é ainda de uso popular, brinquedo ou sport infantil, a besta, com o respectivo zaguncho ou flecha.
Fazem-no à moda quinhentista. Nas lutas do São Francisco, Militões e Guerreiros, o partido destes era dos jagunços,
contra marotos (1847). Brás da Costa Rubim, Vocabulário brasileiro. Rio: 1853, p. 39: “Jagunço: valentão, guarda-costas
[...] usado na Bahia”. Sertanejo é termo já de século e meio antes: “Miseráveis sertanejos”, doc. da Junta das Missões, 1738,
in Anais do arquivo público da Bahia, xxix, 1946, p. 173.
289 Liquidou-se a pendência pagando o governo quatro mil contos à legação da Itália, Tobias Monteiro, op. cit., p. 67.
290 Afonso Celso, O Visconde de Ouro Preto. Porto Alegre: 1935, p. 101. “À esperança de apressar o advento
monárquico não foi estranha sua aquisição do Comércio de São Paulo”, diz de Eduardo Prado, fazendo-lhe a biografia em
1901, Capistrano de Abreu, Ensaios e estudos. Rio: 1931, 1ª série, p. 342.
291 Sobre as turbulências de Gentil de Castro no sul da Bahia, de 1883 a 89, v. Silva Campos, Crônica da capitania de
São Jorge dos Ilhéus. Bahia: 1947, pp. 314 e ss. Em 2 de julho de 89 fora ferido num atentado, cf. Cidade do Rio, de 5 desse
mês.
292 Carlos de Laet, O frade estrangeiro e outros escritos. Rio: 1954, p. 160.
293 Afonso Celso, op. cit., p. 107 (e o opúsculo dedicado ao crime publicado neste mesmo volume); Elísio de Araújo,
Através de meio século. São Paulo: 1932, p. 117. V. a descrição da “mazorca”, que fez Rui na conferência de 24 de maio de
97, na Bahia, Obras, xxiv, t. i, pp. 24–5. Gastão da Cunha, em 1903, recordando-a, clamava, nada se encontrara que
mostrasse qualquer cumplicidade com a insurreição de Canudos, Rodrigo M. F. de Andrade, Rio Branco e Gastão da
Cunha. Rio: 1953, p. 103. Havia simpatias vagas... Como nestes versos fluminenses: “Já de Canudos na jornada / Não
planta a flâmula sagrada / O Conselheiro, por um tris, / Nos coqueiros deste país. / [...] / Viva Isabel a redentora! /
Proclamaremos com ardor / Viva o defunto Imperador!” (Azevedo Cruz, Benta Pereira. Campos: 1899, p. 11).
295 V. parecer de Rui sobre a responsabilidade do estado no empastelamento do Comércio de São Paulo, Obras, Rio:
1948, xxv, t. iv, p. 180. “Foi empastelado diante dos olhos do então presidente do estado, o Sr. Campos Sales”, Afonso
Arinos, Notas do dia, p. 248.
296 Elísio de Araújo, op. cit., p. 111 (relatando a sua missão em Minas).
297 Duas cartas inexpressivas foram achadas em Canudos, que nada provam, sobre as ligações dos fanáticos com o
partido monárquico, embora este, segundo se dizia, exultasse com as suas vitórias..., Dantas Barreto, Última expedição a
Canudos. Porto Alegre: 1898, pp. 11–5. Defendeu Rui Barbosa, na conferência da Bahia, 24 de maio de 1897: “Ninguém
logrou até hoje precisar o mais breve indício da mescla restauradora nos sucessos de Canudos”, Obras, xxiv, t. i, p. 68. Em
entrevista dada à Gazeta de Notícias, em 24 de julho, Luís Viana ridicularizou a balela, Interview, Feira de Santana: 1897,
p. 6, e, para refutá-la, a ela se referiu Gastão da Cunha, Discurso de 1903 citado por Rodrigo M. F. de Andrade, op. cit., p.
103. V. o estudo de Pedro Moniz de Aragão, in Revista do Instituto Histórico. Rio: 1958, vol. cclvii, pp. 85 e ss.
298 Construído em belo estilo imperial pelo arquiteto alemão Gustavo Waenhelt, para o Visconde de Nova Friburgo,
o Palácio do Catete data de 1862.
299 Rui, A Imprensa, 21 de novembro de 98. “Apenas nos destoou dos hábitos o Dr. Manuel Vitorino, que não
prescindia da etiqueta e tinha a sua queda pela pompa”, Obras, xxv, t. ii, p. 154. “Projeta-se grande baile no Palácio do
Catete — que fará recordar o baile da Ilha Fiscal”, reprovou Prudente, em carta de 10 de janeiro de 97 ao Senador José
Bernardo, José Augusto, Seridó, Rio: 1954, i, p. 217. Esta carta é precioso documento da irritação do presidente contra o
substituto. V. A Notícia, exprobrando ao presidente a volta sem aviso, Ordival Cassiano Gomes, Manuel Vitorino Pereira,
p. 248.
301 Campos Sales, op. cit., p. 144; Tobias Monteiro, O presidente Campos Sales na Europa, p. 82.
302 O ensino militar foi recomposto em novas bases, separado o preparatório (Realengo, no Rio de Janeiro, e Rio
Pardo) do superior (Praia Vermelha), conforme regimento de 18 de abril de 98.
303 Viana, para permitir a eleição, com os seus amigos, de alguns nomes da oposição, como Seabra, a quem gostaria
de eleger, deixou de apresentar a “chapa” pelo partido, limitando-se a recomendar os preferidos. Assim também foi eleito
Joaquim Macedo de Castro Rebelo, de cujo ilustre filho, Prof. Edgardo de Castro Rebelo, ouvimos os pormenores do
episódio.
304 Campos Sales reproduz o telegrama em que Prudente, considerando que o voto da câmara o hostilizava, o
intimou, com a representação paulista, a “escolher entre o governo, com a ordem, e Glicério, com a anarquia militar”,
ibid., p. 151; ainda Tobias Monteiro, op. cit., p. 75. No País, de 3 de junho, dia da eleição, Quintino, em artigo sem
assinatura, insinuou a eventualidade da intervenção militar... O Jornal do Comércio (inspirado pelo presidente) rebateu-
lhe a ameaça. Os quartéis não se envolveram na contenda. Cindiu-se o que Rui chamou (A Imprensa, 5 de outubro de 98)
a “oligarquia partidária”. Com a derrota de Glicério subiu a minoria perseguida pela ditadura, com as exceções e as
acomodações justificadas, a política dos grandes estados, que passavam a gravitar em torno do Catete. A concentração
republicana, de 1899, não foi mais do que uma tentativa frustrada de galvanizar essas forças desfeitas. O presidencialismo
acabou com o partidarismo.
305 Alcindo Guanabara, A presidência Campos Sales: Política e finanças. Rio: 1902, p. 19.
306 Rui Barbosa, artigo d’A Imprensa, 15 de novembro de 1898, Obras, xxv, t. ii, p. 107.
307 1ª brigada, Coronel Joaquim Manuel de Medeiros, com os 7º, 14 e 40 de infantaria; 2ª, Coronel Inácio Henrique
Gouveia, 16, 25 e 27; 3ª, 5º de artilharia de campanha, 5 a 9 de infantaria, do Coronel Olímpio da Silveira — constituíram
a primeira coluna, do General Silva Barbosa, e a cuja frente ia o comandante-em-chefe, Artur Oscar. A 4ª brigada,
Coronel Carlos Maria da Silva Teles, afamado defensor de Bagé, compreendia o 12, 31 e 33 de infantaria e uma divisão de
artilharia; a 5ª, Coronel Julião Augusto da Serra Martins (que capitulara do Desterro e na Lapa) com o 34, 35 e o 40; e a 6ª,
Coronel Donaciano de Araújo Pantoja, o 26, o 32 e uma divisão de artilharia, sob o comando de Savaget.
309 Max Fleiuss, História administrativa do Brasil, p. 486; Euclides, ibid., p. 367.
311 Interview... concedido sobre a questão de Canudos. Feira de Santana: 1897. Também Rui Barbosa, in A Imprensa,
1o de novembro de 1898, Obras, xxv, t. ii, p. 3.
313 Sobre a coluna de Savaget, H. Duque-Estrada de Macedo Soares, A Guerra de Canudos. Rio: 1902. Em Cocorobó
o total das baixas foi de 178, deixando os jagunços 60 mortos, ibid., p. 96. Chamaram-lhe estes a “coluna talentosa”.
314 V. a descrição de Francisco Mangabeira, A tragédia épica, “O batismo de sangue”. Bahia: 1900, pp. 20–1, e a
síntese de Euclides da Cunha, Canudos, p. 11.
315 Sobre o 5º da Bahia, que sobremodo se destacou, v. Deolindo Amorim, in Revista do Instituto Geográfico e
Histórico da Bahia, 1945, nº 72, pp. 246–7.
319 V. de Francisco Mangabeira, op. cit., “O combate”, p. 104. Euclides, Canudos, p. 16: quatorze horas de luta, e sem
comer nem beber, tanto que a suprema aspiração dos soldados “era encontrar uma bilha de água e um punhado de
farinha!”.
320 Alvim Martins Horcades, Descrição de uma viagem a Canudos. Bahia: 1899, p. 8. Faleceu de febres, em Monte
Santo, o acadêmico Joaquim A. Pedreira. Entre esses vinte e quatro voluntários merecem ser lembrados Alvim Horcades
(autor daquele valente livro), o poeta Francisco Mangabeira, Ivo Soares (que foi general-chefe do Serviço de Saúde do
Exército).
322 Euclides da Cunha, op. cit., p. 574. V. a planta das posições do cerco, pelo Coronel Siqueira de Meneses, in H. D.-
E. de Macedo Soares, ibid., que serviu para os demais “croquis” explicativos da marcha convergente, até o episódio final,
de 5 de outubro de 1897, quando acabou a luta com os últimos jagunços. A partir de 22 de agosto: Relatório do Ministério
da Guerra, apêndice. Rio: Imprensa Nacional, 1898.
323 Pe. Azarias Sobreira, in Revista do Instituto do Ceará. Fortaleza: 1948, lxii, p. 219. Vilanova, que ajudou o Pe.
Cícero, em 1914, a defender-se em Juazeiro, disse ao Pe. Emílio Leite Cabral que pedira licença ao Conselheiro, já
moribundo, para sair de Canudos e ele consentira... Sobre os outros chefetes da jagunçada, v. Euclides, artigo para O
Estado de São Paulo, 19 de agosto de 97, Canudos, pp. 37–9.
324 Euclides, Canudos, p. 91.
325 O primeiro corpo a fincar em Canudos a sua bandeira foi o 5º de polícia da Bahia, Comandante Virgílio Pereira
de Almeida. O oficial que levava o estandarte era o Alferes João Batista Coelho, Anais do arquivo público da Bahia, 1918,
vol. iii, p. 178.
326 Alvim Horcades, op. cit., p. 89, fala dos prisioneiros, além das mulheres, crianças e velhos, cujo número
considerável mostra que Antônio Beato cumpriu a palavra, e não cometeu apenas o logro de aliviar o arraial de gente
inútil, como Euclides supôs.
327 V. a descrição do fim do combate, a dinamite e latas de querosene, do correspondente da Gazeta de Notícias, in
Wolsey (pseudônimo de César Zama). Libelo republicano acompanhado de comentários sobre a campanha de Canudos.
Bahia: 1899, p. 43. A cena terminal dos quatro que continuavam lutando foi primeiro descrita por Dantas Barreto, Última
expedição a Canudos, p. 230, depois por H. D.-E. de Macedo Soares (que repete), e Euclides, ibid., p. 611. Foram contados
647 corpos, e 5.200 casas no arraial, aliás incendiadas e demolidas. Leia-se ainda Major A. Constantino Néri, A quarta
expedição contra Canudos. Pará: 1898; Aristides Milton, “A Campanha de Canudos”, Revista do Instituto Histórico. Rio:
1902.
330 Os sertões, p. 10. Compare-se com a sua ilusão de 7 de agosto de 1897, in Canudos, p. 6.
332 João A. Garcez Fróis, in Arquivos da Universidade da Bahia (Faculdade de Direito). Bahia: 1947, ii, p. 79.
333 Euclides foi incisivo na descrição dos horrores de Canudos. César Zama, com o pseudônimo de Wolsey, acusou:
“Nem um só destes apareceu em parte alguma!”, ibid., p. 51. Rui levou ao Senado, de passagem (a propósito da tentativa
de assassinato do presidente) o libelo. Escreveu, mas não chegou a pronunciar, um discurso em que expunha à nação o
crime, falando dos jagunços que mostravam “no colo o sulco da gravata sinistra”, Obras, xxiv, t. i, p. 301. “Não
apareceram prisioneiros”, Brás do Amaral, História da Bahia do império à república, p. 375. Mais vigoroso, Alvim
Horcades, Descrição de uma viagem a Canudos, diz (p. 89) que o número se elevou a 600, no dia 3, e, a 4, outros se
apresentaram, sendo no fim cerca de 800, ibid., p. 90. E acusa: “Eu vi e assisti a sacrificar-se todos aqueles miseráveis [...].
Em Canudos foram degolados quase todos”, ibid., p. 103. E a acusação ficou de pé. Assim em Manuel Benício (repórter
do Jornal do Comércio), O Rei dos Jagunços. Rio: 1899, p. 394. Com o pseudônimo de Olívio Barros escreveu Afonso
Arinos Os jagunços, São Paulo: 1898, como informa Basílio de Magalhães, História do Brasil, Rio: 1948, p. 373, 2ª ed., e a
que atrás nos reportamos. Também insiste no pormenor, p. 419.
335 Manifesto de 3 de novembro de 97, publicado por Rocha Pombo, op. cit., x, pp. 432–3, da autoria de Metódio
Coelho, Celso Spinola, in Revista da Faculdade de Direito da Bahia. Bahia: 1939, vol. xiv, p. 159.
337 Relatório do delegado Vicente Neiva a propósito do atentado de 5 de novembro, in Rocha Pombo, História do
Brasil, x, p. 436.
339 Ernesto Sena, Rascunhos e perfis. Rio: 1909, p. 17. Palavras de um contemporâneo, envolvido injustamente na
perseguição que se seguiu ao atentado, Fortunato Campos de Medeiros: “O Sr. Diocleciano Mártir, diretor-proprietário
do semanário O Jacobino, sem ouvir os elementos de maior responsabilidade da oposição deliberou organizar [...] o
assassinato do presidente da república!”, Lutas pela pátria. Rio: 1953, p. 19.
340 V. Nina Rodrigues, O regicida Marcelino Bispo (extraído da Revista Brasileira, janeiro de 1899). Bahia: 1899, p. 6.
Condenado, Diocleciano foi indultado pelo Presidente Rodrigues Alves (v. Jornal do Brasil, de 16 de novembro de 1903).
Assistia o presidente ao desfile militar do dia 15 no Quartel-General, quando a mãe do detento lhe rogou esse perdão
(informa-nos, testemunha, o Sr. Heitor Guimarães).
341 V. Ernesto Sena, op. cit., pp. 9–14; Pereira da Silva, Prudente de Morais: O pacificador. Rio, p. 78.
342 Rui, discurso de 10 de novembro, apoiando o projeto de estado de sítio, Obras, xxiv, t. i, p. 203. Descrição in
Pelino Guedes, O Marechal Carlos Machado Bittencourt. Rio: 1898, p. 172.
343 “Execrável justiça das ruas, depois de executar, aplaudida pelo radicalismo, a imprensa monárquica, executou a
imprensa radical”, Rui, A Imprensa, 5 de outubro de 1897, Obras, 1947, xxv, t. i, p. 15.
344 General Honorato Caldas, O Marechal de Ouro. Rio: 1898, pp. 424 e ss.
345 Atentado de 5 de novembro, relatório do Dr. Vicente Neiva. Rio: 1898, p. 67; Rocha Pombo, ibid., x, p. 443. No
Senado, exprobrara Rui a ausência da polícia, não havendo quem acudisse ao presidente, Obras, xxiv, t. i, p. 200.
346 João Barbalho, Constituição Federal Brasileira: Comentários. Rio: 1924, p. 283, 2ª ed. Manuel Vitorino sustentou
que lhe cabiam as imunidades do presidente e dos senadores.
347 Acórdão in Revista de Jurisprudência, Rio: 1898, iv, p. 203, relator Muniz Barreto. Aplaudiu Rui (que aliás
declinara do convite da família do Marechal Bittencourt para acusar judicialmente Glicério e Manuel Vitorino, mandato
que teve J. J. Seabra) a decisão do júri, A Imprensa, 7 de novembro de 1898. De Seabra, com o pseudônimo de Caneca,
Atentado de 5 de novembro, artigos. Rio: 1898.
349 O relatório policial destacou o caso da garrucha de dois canos que não disparara, tendo apenas um dos canos
carregado, porém com tal carga, que detonaria como um petardo, Relatório, cit., e Rui, discurso de 10 de novembro de
1897, Obras, xxiv, t. i, p. 224 e artigo n’A Imprensa, 7 de novembro de 98, Obras, xxv, t. ii, p. 52. “Nesse crime é manifesto
o caráter de uma verdadeira cultura”. V. sobre a perseguição policial, Campos de Medeiros, Lutas pela pátria, p. 23. Aliás
quanto a Campos de Medeiros, jovem de 17 anos, o Tribunal de Apelação negou o habeas‑ ‑corpus impetrado, pois o
estado de sítio autorizava a detenção. Diz Medeiros que foi arrolado entre os acusados para completar o número de vinte,
necessário à qualificação do crime de conspiração. Assim no Código Penal vigente, artigo 115. O habeas‑corpus
concedido pelo Supremo Tribunal em agosto de 98 pôs fim à prisão arbitrária. E o livro de Sant’Ana Néry, De Paris a
Fernando de Noronha, 1898.
351 V. Rui Barbosa, Obras, xxv, t. iv, pp. 181 e ss., e Novos discursos e conferências, col. por Homero Pires. São Paulo:
1933, pp. 154 e ss.
352 V. Rui Barbosa, A lição de dois acórdãos, Obras, xxv, t. iv, pp. 277 e ss. Leia-se também João Barbalho,
Constituição Federal Brasileira, p. 165, 2ª ed., (sobre o acórdão nº 1073, de 16 de abril de 98); Carlos Maximiliano,
Comentários à Constituição brasileira. Rio: 1928, p. 451, 3ª ed.; Carlos de Carvalho, “O estado de sítio” e “Os tribunais de
exceção”, Revista de Jurisprudência, 1898.
353 V. Carlos Sá e outros, Francisco Sá: Reminiscências biográficas. São Paulo: 1938, p. 190.
354 V. Felisberto Freire, A Constituição da república interpretada pelo Supremo Tribunal, 1913, p. 225. Com isto a
corte suprema dava liberdade de criticar o governo durante o estado de sítio. Defendeu Rui eficientemente a boa
doutrina, A Imprensa, 6, 7, 12 e 16 de outubro de 1898.
355 Saíra Rui em defesa do Supremo Tribunal, A Imprensa, 22 de novembro de 98, Obras, xxv, t. ii, p. 163.
Defendendo Prudente, José do Patrocínio atacou na Cidade do Rio o seu antigo patrono, do tempo em que a ditadura
desterrava também os adversários, o que lhe valeu o famoso libelo, A difamação, obra-prima de Rui, a que contestou com
A hipocrisia, Cidade do Rio, 16 de dezembro de 98, v. Osvaldo Orico, Patrocínio. Rio: 1935, p. 223. É índice da irritação
de Prudente o seu bilhete de 15 de agosto de 98 a Patrocínio, em que o concita a exprobrar o fato, da véspera, de se terem
abraçado juízes e réus no Conselho de Guerra, após a absolvição unânime..., O. Orico, ibid., p. 233.
357 Carta a José Marcelino, in Maria Mercedes Lopes de Sousa, Rui Barbosa e José Marcelino. Rio: 1950, p. 67.
Positivo é que Prudente pensava noutro nome: o fluminense José Tomás da Porciúncula, Aníbal Freire, Rosa e Silva. Rio:
1957, p. 12. Dizia: a consciência não o acusava de haver concorrido para a apresentação de Campos Sales.
358 Campos Sales, op. cit., p. 162. Rui, carta a Luís Viana, 4 de outubro de 1900, a este atribuiu magna pars na
candidatura oficial. “Se o meu (voto) fosse ouvido, nem V. Ex.ª teria feito o atual presidente da república”,
Correspondência, p. 129. Disse-se que a oposição premeditava duplicatas de atas eleitorais nos estados a fim de caber ao
Congresso, na apuração, a última palavra: esperava ganhar a partida. “Com a morte do Marechal Bittencourt, todos estes
planos, sérios ou não, desapareceram de uma vez”, Capistrano, Ensaios e estudos, 3ª série, p. 147.
359 Sílvio Romero, Parlamentarismo e presidencialismo na república brasileira, Rio: 1893, p. 7, em carta a Rui
defende o governo de opinião, contra esse personalismo, o regime presidencial, que Medeiros e Albuquerque, O regime
presidencial no Brasil, Rio: 1914, p. 175, consideraria um aborto... E alistava-se no reformismo, ibid., p. 149. Ficaram
convencionais, os partidos..., Alcindo Guanabara, A presidência Campos Sales. Rio: 1902, p. 53.
361 Cândido Mota Filho, Uma grande vida, p. 131. O déficit fora de 37.193 contos em 1895, 37.193 em 1896, 55.798
em 1897. V. Alcindo Guanabara, A presidência Campos Sales, p. 27.
362 Campos Sales, op. cit., p. 174. E Tobias Monteiro, O Presidente Campos Sales na Europa. Rio: 1928, 2ª ed.
364 V. de Murtinho, Relatório da indústria, viação e comércio, 1897, reimpresso na Revista do Instituto Histórico e
Geográfico Brasileiro, 1953, vol. ccxix, pp. 239–65.
366 O equilíbrio do orçamento, “esta foi a real e estupenda vitória do grande ministro”; “seus atos financeiros sobre
redução de meio circulante só produziram desastres”, Cincinato Braga, in Problemas brasileiros. Rio: 1948, p. 309.
367 “Passaram-se as festas ao Sr. Prudente de Morais”, Afonso Arinos, Notas do dia, p. 255.
368 Rodrigo Otávio, Prudente de Morais: O primeiro centenário. São Paulo: 1942, pp. 94–5.
370 Obras, xxv, t. ii, pp. 115–120, artigo de A Imprensa, 16 de novembro de 1898.
371 Campos Sales, op. cit., p. 206. Diz que só abriu exceção ouvindo a “política” no que se referia ao ministro que
representasse a Bahia. O Governador Luís Viana dera três nomes. Escolheu o de Severino Vieira, para a pasta da Viação,
ibid., p. 209. Os outros nomes (completamos o informe) eram Artur Rios e Sátiro Dias. Testemunhando o seu repúdio ao
sistema do “despacho coletivo”, restabelecido por Prudente de Morais, reafirmava, ainda nisto, o radicalismo presidencial,
ibid., p. 218. Não diz, mas se percebe, que para ele reunião de ministros lembrava a unidade do Conselho, do tempo
imperial. Rui Barbosa combateu-lhe logo a supressão das audiências públicas, em que o presidente se mostrou menos
liberal do que o imperador, A Imprensa, 24 de novembro de 1898. “A tribuna parlamentar com este regime perdeu
completamente a sua autoridade”, clamou Rui em 1900, Obras. Rio: 1951, xvii, t. iii, p. 25.
372 Em carta ao Senador José Bernardino, José Augusto, Seridó, i, p. 221, de 19 de março de 1898, definiu Campos
Sales a sua doutrina, reportando-se ao seu ministério (e à sua experiência) do governo provisório: “Nada faria sem a
audiência dos respectivos governadores no que lhes era peculiar”. Leia-se também A. C. de Paula Sales, O idealismo
republicano de Campos Sales. Rio: 1943.
373 Campos Sales, op. cit., p. 237, põe em termos de salvação o método, que enfeixava nas suas mãos o Legislativo.
Escrevendo ao governador de Minas, Silviano Brandão (8 de fevereiro de 1900) achava que se devia sistematicamente
reconhecer quem viesse diplomado pela maioria das juntas apuradoras, ibid., p. 240, isto é, os candidatos dos
governadores, evitada a manobra oposicionista das duplicatas de diplomas e das contestações subversivas. Escrevendo ao
governador da Bahia, considerava esta a única solução — contra o prurido de fraudes e duplicatas — “em obediência à
maioria do voto”..., ibid., p. 242. Rejeitou a proposta do governador da Bahia, para que se fizesse uma reunião, a fim de
assentar as providências relativas à verificação de poderes: era suficiente aquilo, ibid., p. 243.
374 Leia-se, sobre o modo de se fazer no interior uma eleição (a de 1899), Ulisses Lins de Albuquerque, Um sertanejo
e o sertão: Memórias. Rio: 1957, pp. 46–7.
375 Op. cit., p. 248. Formou-se o partido de Concentração. Gracejou Capistrano, artigo n’A Notícia, de 1o de janeiro
de 1900: “A concentração dos dois partidos lembra a fábula do homem grisalho que tinha duas amantes: a velha
arrancava-lhe os cabelos pretos, a moça arrancava-lhe as cãs”. — Com essa política de governadores Campos Sales
inventou Pinheiro Machado, Medeiros e Albuquerque, Minha vida, ii, p. 26.
376 Rui Barbosa, Campanha presidencial, discurso em Juiz de Fora, 2 de março de 1919.
378 Leia-se a curiosa página de Afrânio Peixoto, A esfinge, p. 124, de 1911, em que comenta a “política geográfica’’ e a
“pessoal” do presidente. O sistema aí está descrito irônica e... realisticamente.
379 Mário Rodrigues, Meu libelo. Rio: 1925, p. 46: “Ei-lo a profetizar o descalabro da política dos governadores, que
estabeleceu as oligarquias estaduais”.
380 Carta de Rio Branco ao Barão Homem de Melo, 29 de dezembro de 89, manuscrito no arquivo de David
Carneiro, Curitiba.
381 Álvaro Lins, Rio Branco. Rio: 1945, i, p. 264; Aluísio Napoleão, Rio Branco e as relações entre o Brasil e os
Estados Unidos, pp. 83 e ss.
382 Statement submitted by the United States of Brazil to the President of the United States of America as arbitrator.
Nova York: 1894, 5 vols. Que a Argentina pleiteava o limite pelo Rio Jangada, ibid., i, p. 2. Do advogado adverso,
Estanislau Zeballos, foi o Alegato de la República Argentina sobre la cuestión de límites con el Brasil en el territorio de
Misiones. Washington: 1894, 318 páginas. A memória de Rio Branco é o volume x de suas Obras, Rio: 1945.
383 A cópia apresentada por Rio Branco, Statement, etc., v, map. 7, é autêntica. A contraprova consiste no mapa
impresso por Rodolfo Garcia in Anais da Biblioteca Nacional, Rio: 1938, lii, vol. i. Viu Rio Branco o que fora de Portugal
e, roubado, o Duque de Richelieu comprara em 1824, pertencente em seguida ao arquivo do Ministério de Estrangeiros.
O de Espanha, reproduzido por Garcia, era conhecido dos negociadores, dizendo Oliveira Lima que o General Dionísio
Cerqueira o encontrara em Madri.
384 V. Hélio Lobo, Rio Branco e o arbitramento com a Argentina. Rio: 1952, p. 74; e Luis Santiago Sanz, La Cuestión
de Misiones, Ensayo de su historia diplomática. Buenos Aires: 1957, p. 81.
385 Araújo Jorge, Introdução às obras do Barão do Rio Branco. Rio: 1945, p. 33.
387 A idéia da mediação portuguesa partiu do próprio Carlos de Carvalho, que o disse a Castro Nunes, Alguns
homens do meu tempo, p. 45.
389 Eduardo Marques Peixoto, Ilha da Trindade, Publicações do Arquivo Nacional. Rio: 1932, vol. xxviii, 667 páginas.
390 T. B. Edgington, The Monroe Doctrine. Boston: 1905, p. 130. Rio Branco e Nabuco a reconheciam “de tão grande
benefício para o Novo Mundo”, F. W. Ganzet, in The Hispanic American Historical Review, agosto de 1944, p. 447.
391 Henri A. Coudreau, Études sur les Guyanes, et l’Amazonie. Paris: 1887, p. 317; e Sant’Ana Néry (seu vigilante
contraditor), De Paris a Fernando de Noronha, p. 4.
392 Mémoire présenté par les États Unis du Brésil au gouvernement de la Confédération Suisse (Berna, 4 de abril de
1899), 5 volumes (vol. iii e iv das Obras do Barão do Rio Branco, Rio: 1945).
393 Joaquim Caetano da Silva, L’Oyapoc et l’Amazone: Question brésilienne et française. Paris: 1861, 2 volumes. De
Homem de Melo, O Oyapoc (aula de história universal, no Colégio Militar). Rio: 1899; e Artur César Ferreira Reis,
Território do Amapá: Perfil histórico. Rio: 1949, p. 104.
394 Conta Rodrigo Otávio, Minhas memórias dos outros, Rio: 1935, nova série, p. 232, que quase não houve, em
Paris, repercussão da sentença, que tanto devia decepcionar o espírito público, porque, providencialmente, todos os
entusiasmos foram concentrados na recepção do Papá Kruger, o presidente boer que se glorificara no Transvaal...
396 Campos Sales, op. cit., p. 270. A índole autoritária reflete-se neste livro de recordações, quando cita, a propósito
da resistência aos turbulentos da imprensa e da tribuna, os “Pensamentos”, de Bismarck, ibid., p. 282. Os monarquistas
hostilizaram-no, e aos antecessores, com os oito tomos da Década republicana (1899–1901), de Ouro Preto e Afonso
Celso, Loreto, Andrade Figueira, Cândido de Oliveira, Laet.
398 F. S. Sousa Reis, “Dívida do Brasil”, Revista do Instituto Histórico Brasileiro, 1º Congresso de História Nacional.
Rio: 1916, iv, p. 620.
400 Campos Sales, op. cit., p. 317. Na mensagem com que convocou a sessão especial do Congresso para este fim, em
1902, historiou os passos dados para a codificação civil. V. também Relatório do Ministério da Justiça, 1901, e Laurita
Pessoa Raja Gabaglia, Epitácio Pessoa, i, pp. 152–4.
401 Clóvis Beviláqua, Código Civil comentado. Rio: 1921, i, p. 20. Este chegou ao Rio a 27 de março de 1899 e em fins
de outubro concluía o vasto trabalho, que o governo submeteu à apreciação isolada de vários jurisconsultos, e afinal à
comissão revisora presidida pelo Ministro da Justiça (29 de março–2 de novembro de 1900).
403 Carneiro Ribeiro, Ligeiras observações sobre as emendas do Dr. Rui Barbosa à redação do projeto. Bahia: 1902.
Leia-se a “consolidação” de Fernando Néri, Rui Barbosa e o Código Civil. Rio: 1931.
404 Réplica, Rio: 1904, 599 páginas, (nova edição da Casa de Rui Barbosa, 2 vols., 1953); a que contestou Carneiro, A
redação do projeto do Código Civil. Bahia: 1905, 891 páginas. Clóvis resume, no Código Civil comentado, a polêmica, em
que se distinguiram, do lado do projeto, filólogos e publicistas. É verdade que o Código não andou, fulminado pelas
objeções de Rui, e foi pena; porém a cultura nacional ganhou uma tal lição de linguagem que desde então a escrita
brasileira se depurou de numerosas imperfeições que a corrompiam. Banhou-se em gramática. Rui começou a estudar o
projeto quanto ao mérito, trabalho que lhe ficou inédito, Fernando Néri, Rui Barbosa, p. 107. O projeto, como diremos,
pôde afinal ser discutido em 1912 no Senado, voltou, emendado, à câmara, ressurgiu a debate em 1915, e foi sancionado a
1o de janeiro de 1916. Atrasara-se.
407 Sertório de Castro, A república que a revolução destruiu. Rio: 1932, p. 163.
408 Ferreira Viana invectivou a arbitrariedade no panfleto A conspiração policial, a que Andrade Figueira, detido,
respondeu com uma carta de emocionado agradecimento, 21 de maio de 1900, cf. Paulo José Pires Brandão, Vultos do
meu caminho. São Paulo: 1935, p. 18. Levado a júri, o Conselheiro Andrade Figueira, depois de afirmar que conspirou,
conspirava, conspiraria sempre, e quem não deixaria de conspirar vendo a pátria em tais extremos — foi unanimemente
absolvido. Rui escreveu-lhe brilhante carta de solidariedade, 12 de março de 1900, Correspondência, p. 127, e Lafayette
Rodrigues Pereira, em 29 de junho, engraçada mensagem, Paulo José Pires Brandão, op. cit., p. 216: “Conspirar? Para quê
e contra quem?”. “O animal está morrendo de inanido: lembra a frase do orador antigo: ‘Um burro a devorar a própria
cauda’”. Na mesma mensagem de 3 de maio de 1900 o presidente aludiu à conjura. Leia-se Cândido de Oliveira Filho,
Curiosidades judiciárias. Rio, 1947, ii, p. 368.
409 Em 15 de agosto de 1897 a Castilhos sucedera no governo rio-grandense seu discípulo Borges de Medeiros, v.
João Pio de Almeida, Borges de Medeiros. Porto Alegre: 1928, p. 19; João Neves, Memórias. Porto Alegre: 1958, i, p. 19.
411 Estêvão de Oliveira, Notas e epístolas. Juiz de Fora: 1911, p. 31. Tarasca, apelido dado ao diretório do prm, numa
evocação satírica do monstro lendário de Tarascon e Beaucaire, que Santa Marta dominara... “Régulos estaduais”, disse-se
na Organização do Centro Republicano Conservador. Rio: 1906, p. 189.
413 V. Silveira Peixoto, A tormenta que Prudente de Morais venceu, pp. 340 e ss.
414 Cândido Mota Filho, in Centenário do Conselheiro Rodrigues Alves. São Paulo: 1951, ii, p. 397.
417 Olinto de Magalhães, Centenário do Presidente Campos Sales. Rio: 1941, p. 142. O convite da chancelaria russa
foi feito aos governos que tinham representantes em São Petersburgo: daí ser o Brasil convocado, mas para um objetivo
que lhe seria desfavorável, qual o de não aumentar, durante certo prazo, as forças armadas, sendo que a exigência não
obrigava os países latino-americanos, ausentes da Conferência. Seria um luxo diplomático o comparecimento, para fins
estranhos ao sistema de convivência, em que estávamos empenhados. — Rui criticou acremente aquela atitude de
abstenção, discurso em Paris, 31 de outubro de 1907, Discursos e conferências, pp. 230–1.
418 V. Brasil‑Argentina (em grande tomo, sobre a viagem de Roca ao Rio), Buenos Aires: 1900; e Cipriano de La
Peña, Crónica ilustrada y documentada de las fiestas de confraternidad brasileiro‑argentinas (viagem de Campos Sales).
Buenos Aires: 1901.
420 Richard Schomburgk, Reisen in British‑Guiana, in den Jahren 1840–1844. Leipzig: 1847.
421 Joaquim Nabuco, O direito do Brasil. São Paulo, 1941, p. 215 (1º volume, reimpresso, dos dezoito que Nabuco
apresentou ao árbitro, o Rei da Itália, na defesa dos limites com a Guiana Inglesa).
423 Obras de Rio Branco. Rio: 1945, vol. ii. A 1ª ed. é de Bruxelas, 1897. — O caso da posse, precedendo ao litígio, foi
decisivo. Veja-se o que sucedeu na Argentina com a região do Rio Negro, ou de “deserto”, fronteiriça do Chile. Antes de
formalizar a pendência, Roca tratou de ocupar a terra: daí a “guerra do deserto”, que venceu.
424 Nabuco defendeu o árbitro, dizendo que a sua parcialidade consistiu em querer contentar as duas partes,
dividindo o “contestado”, Luís Viana Filho, A vida de Joaquim Nabuco, p. 288. Mas Guilherme Ferrero confiou a Graça
Aranha, que ouvira de Buzzatti, professor em Pavia e membro da comissão incumbida de estudar a questão, que o rei
recomendara fosse dada razão aos ingleses, pois “não podia fazer uma cousa desagradável à Inglaterra”.
426 Luís Viana Filho descreve as peripécias da nomeação de Nabuco, sugerida de Londres por Sousa Correia,
encaminhada no Rio por José Carlos Rodrigues e Tobias Monteiro, formalizada pelo Ministro Olinto de Magalhães em
casa daquele, a 3 de março de 1899, op. cit., p. 224.
427 Green Waywood Hackworth, Digest of International Law. Washington: 1940, i, p. 401. Carolina Nabuco, A vida
de Joaquim Nabuco. São Paulo, pp. 412–4, cita A. de Lapradelli e N. Politis, L’Arbitrage anglo‑brésitien de 1904, e a crítica
de Paul Fauchille, Le conflit de limites entre le Brésil et la Grande‑Bretagne et la sentence arbitrale du Roi d’Italie. Paris:
1905.
428 Carta de Nabuco ao Instituto Geográfico e Histórico da Bahia, publicada no nº 30, p. 207 de sua Revista, Bahia:
1905. Mas Paul Fauchille foi incisivo: “Ou lieu de cela la sentence du Roi d’Italie a ouvert à l’Angleterre le système fluvial
de l’Amazone mais a fermé au Brésil celui de l’Essequibo”, op. cit., p. 120.
429 A primeira descrição da borracha, com o uso que dela faziam os indígenas, é de Pedro Mártir de Anghiera na
Historia General y Natural de las Indias, devendo-se porém a La Condamine a sua vulgarização no mundo científico, com
o nome peruano de caúchú (cautchouc). O botânico Aublet, da designação indígena hevé, fez Hevea guayanensis, seu
rótulo científico. Priestley em 1770 inventou (rubber) a aplicação da goma para apagar os traços de lápis, Mac-Intosh
inventou o seu emprego nas roupas impermeáveis, depois que o americano Goodyear lhe deu a notoriedade mundial,
com a “vulcanização” (tratamento pelo enxofre em altas temperaturas), passando a borracha a ser essencial aos meios de
transporte, à condução da eletricidade, às exigências do moderno progresso — matéria-prima de que se tornou faminto o
universo.
430 V. Vicente G. Quesada, Historia diplomática latino‑americana. Buenos Aires: 1920, iii, p. 233. Sobre o mapa da
linha verde e Duarte da Ponte Ribeiro, Castilhos Goycochêa, Fronteira e fronteiros. São Paulo: 1943, pp. 121 e ss. Resume
a controvérsia Cassiano Ricardo, O Tratado de Petrópolis. Rio: 1954, i, pp. 78–9.
431 O General Taumaturgo de Azevedo publicou as suas razões, abrindo a questão, em 1897, Limites entre o Brasil e
a Bolívia, valente opúsculo reeditado em 1953, por motivo do seu centenário de nascimento, pela família.
432 V. Craveiro Costa, A conquista do deserto ocidental. São Paulo: 1940, p. 136.
433 O papel é dado como de 12 de maio de 1899, e o publicou Júlio Rocha, O Acre: Documentos para a história de
sua ocupação pelo Brasil. Lisboa: 1903, p. 25.
434 Leia-se Cláudio de Araújo Lima, Plácido de Castro: Um caudilho contra o imperialismo. São Paulo: 1952, pp. 40 e
ss.; Cassiano Ricardo, op. cit., i, p. 118. Sobre a dollar policy, com o “Roosevelt corollary”, entre a guerra de Cuba e a
abertura do canal do Panamá, v. Pedro Calmon, Brasil e América. Rio: 1943, pp. 92 e ss. (aí a bibliografia essencial). A
Bolívia em épocas passadas (1844, 1858) pretendera desempatar suas divergências com o Brasil na Amazônia
franqueando-lhe a entrada aos norte-americanos, cuja atitude a respeito parecia exposta pelo Tenente Maury, no The
Amazon on the Atlantic Slopes of South America, 1853. Note-se que Eduardo Prado exagerara tais sustos, lembrando a
frase de Grant: os produtos que lhe faltavam, entre estes a borracha, os teriam... “by any means”, Castilhos Goycochêa, O
espírito militar na questão acreana. Rio: 1941, p. 56.
436 “Aramayo rechazaba el imperialismo en su sentido de invasión y ocupación armada, pero lo admitía sin cuidado
en sus formas financieras y contractuales”, Augusto Céspedes, El Dictador Suicida: 40 años de Historia de Bolivia.
Santiago: 1956, p. 23.
437 Carlos Carneiro Leão de Vasconcelos, As terras e propriedades do Acre. Rio: 1905, p. 4.
438 Castilhos Goycochêa, Plácido de Castro, o derradeiro bandeirante. Porto Alegre: 1940, p. 26; Araújo Lima, op. cit.
São Paulo: 1942.
439 V. Pimentel Gomes, A conquista do Acre, ed. da Comp. Melhoramentos de São Paulo. São Paulo, pp. 40 e ss.
440 Obras do Barão do Rio Branco, v, p. 17. Transcreve a ata de independência Océlio de Medeiros, Administração
territorial. Rio: 1946, p. 120.
442 Artur César Ferreira Reis, A questão do Acre. Manaus: 1936, p. 21; Araújo Lima, ibid., pp. 207 e ss.
444 Que Plácido recebeu mal a intervenção, é a tese do Coronel R. Dias de Freitas, Plácido de Castro e a integração do
território do Acre no Brasil, conferência no Clube Militar, 27 de setembro de 1939 (Fortaleza: 1949). Nega R. Dias de
Freitas que tivesse chegado a sitiar Puerto Rico, ibid., p. 36. Em verdade, colocando-se rio acima, podia cortar a
comunicação com a Bolívia, condenando o adversário a uma luta de morte, para a qual tinha este, todavia, superioridade
de material. A legação em La Paz avisara o governo boliviano da decisão do Presidente Rodrigues Alves de mandar
ocupar o território até a solução do litígio. O modus vivendi de 21 de março de 1903 evitou um choque armado de
imprevisíveis conseqüências, C. Goycochêa, O espírito militar na questão acreana, p. 78. A correspondência publicada por
Araújo Lima, op. cit., p. 241, diz que “com dez horas de tardança não teria evitado o assalto a Porto Rico e, por
conseguinte, sério derramamento de sangue”. Aramayo, na publicação (1903) em que justificou a sua ação em Londres,
diz que Pando levaria a melhor, se não fosse detido pelo modus vivendi, Augusto Céspedes, op. cit., p. 26; Elias Sagárnaga,
Recuerdos de la Campaña del Acre de 1903. La Paz: 1903.
445 Diz Rio Branco na carta a Gastão da Cunha, ao ler a Exposição de motivos o diretor da seção José Antônio de
Espinheiro lhe entregara o mapa de Ponte Ribeiro (1860), ou da “linha verde”, que ele, barão, julgava inexistente. Gastão
da Cunha manteve secreta a retificação, tanto que Rui, no Direito do Amazonas ao Acre setentrional, em 1911, voltou ao
assunto, para aludir ironicamente à “história da linha verde”, como a uma invenção graciosa. Ferido pela reiteração do
erro, Olinto de Magalhães (que nos seus relatórios o invocara, e sabia que Rio Branco achara e conhecia o mapa) escreveu
ao barão em 17 de junho de 1911, e ele respondeu em 22 de julho, justificando-se com a conveniência de não dar maior
publicidade à corrigenda, Olinto de Magalhães, op. cit.
447 Rui, Correspondência, p. 138. Preferia o arbitramento, achando demasiadas as concessões à Bolívia.
448 E um ramal de Vila Murtinho a Vila Bela, abandonado depois, com a queda da exploração da borracha,
substituído (protocolo de 25 de novembro de 1937) pela estrada de ferro de Corumbá a Santa Cruz de la Sierra, Relatório
da Comissão Mista, Rio: 1940, p. 7.
449 Obras do Barão do Rio Branco, v, p. 29. A linguagem é ufana: “Expansão territorial, só agora e com a feliz
circunstância de que, para a efetuar, não espoliamos uma nação vizinha e amiga, antes a libertamos de um ônus”. V.
Cassiano Ricardo, O Tratado de Petrópolis. Rio: 1954, 2 vols.
450 V. Araújo Maia, Plácido de Castro. São Paulo: 1952, pp. 355 e ss. Ao Desembargador João Lago devemos
informações complementares do episódio.
451 Inconformado, o governo do Amazonas recorreu incontinenti ao Judiciário (4 de dezembro de 1904), tanto na
justiça como na imprensa, O Acre setentrional, Reivindicação do estado do Amazonas contra a união ante o Supremo
Tribunal Federal. Rio: 1906; A transação do Acre no Tratado de Petrópolis, polêmica de Rui Barbosa, Rio: 1906,
finalmente em dois tomos, O direito do Amazonas ao Acre setentrional, Rio: 1910. No Congresso, Efigênio Sales
propusera o acordo compensador (1916), então recusado por inoportuno, mas retomado em 1921 (iniciativa do
Deputado Aristides Rocha), agora com a aquiescência do governo estadual, de que resultou, em 1926, a desistência da
ação reivindicatória. A União em troca endossara um empréstimo de 40 mil contos. Voltou o caso à balha na Constituinte
de 1933, foi levado ao estudo de uma comissão arbitral e esta avaliou a indenização em mais de 350 mil contos, Ferreira
Reis, A questão do Acre, pp. 26–7.
452 Leopoldo de Bulhões, discurso no banquete que lhe ofereceram as classes conservadoras, 28 de setembro de 1904,
Augusto de Bulhões, Leopoldo de Bulhões, um financista de princípios. Rio: 1954, p. 268.
453 Convertida em lei, 14 de dezembro de 1904, v. Dídio Costa, Noronha, Rio: 1944, p. 327, a reforma foi pleiteada na
câmara pelo deputado fluminense Laurindo Pita, cujo discurso, transcrito nesse livro, mostrava que quase não tínhamos
esquadra. Foi a voz providencial que despertou a consciência política para o problema do reaparelhamento naval.
454 Carta in Revista do Instituto Histórico, vol. cclvii, p. 224 (só publicada em 1958).
455 Álvaro Lins, Rio Branco, p. 397 (e resposta irônica do barão, com o pseudônimo de Nemo, pelo Jornal do
Comércio).
456 V. Gastão Pereira da Silva, Rodrigues Alves e sua época. Rio, pp. 130 e ss.
458 V. Cidade do Rio de Janeiro, plano de Alfred Agache (com o histórico e os mapas demonstrativos), Paris: 1930;
Recenseamento do Rio de Janeiro, Rio: 1907, p. 42.
459 Cantou-se no carnaval de 1904: “Sem igual no mundo inteiro / Cidade maravilhosa / Salve o Rio de Janeiro”. V.
Raimundo A. de Ataíde, Pereira Passos, o reformador do Rio de Janeiro. Rio, p. 214. Coelho Neto, artigo in A Notícia, 29
de outubro de 1908, e A Cidade Maravilhosa, Rio: 1928.
461 Saudando Oswaldo Cruz na sua recepção acadêmica, disse Afrânio Peixoto: “Este poder absoluto da vontade, em
que acreditais, e que exerceis, é a vossa força, e dela vos veio a glória”, Academia Brasileira: Discursos acadêmicos. Rio:
1935, ii, p. 295. “Esse poder da fé”, louvou Aloísio de Castro, Discursos acadêmicos. Rio: 1936, iv, p. 21. “Não torce nem
quebra”, Rui Barbosa, Oswaldo Cruz. Rio: 1917, p. 25.
462 Ver E. Sales Guerra, Oswaldo Cruz. Rio: 1940, pp. 66 e ss.
464 Fócion Serpa, A vida gloriosa de Oswaldo Cruz. Rio: 1937, p. 129.
465 V. discurso de Rui, no Senado, 16 de novembro de 1904, Obras, xxxi, t. i, p. 45. Serve de documento à
incompreensão geral: “O Estado mata, em nome da lei, os grandes criminosos. Mas não pode, em nome da saúde, impor
o suicídio aos inocentes”. Transcreve E. Sales Guerra, Oswaldo Cruz, p. 259, um dos boletins insidiosos: “A verdade
provada pelos fatos é que a vacina propaga a varíola”. O Apostolado positivista adotava a linguagem: “O Código das
torturas foi uma conquista desses médicos [...]. Esse atentado”.
466 Sertório de Castro, op. cit., p. 190 (e aí o resumo, decalcado no noticiário dos jornais, da sublevação das ruas).
467 Obras, xxxi, t. i, p. 58 (referindo-se à denúncia que, às oito da noite, lhe levara o pai de um dos cadetes).
471 Ibid., op. cit., p. 27. “Armas atiradas à rua, quase inutilizadas; soldados em marcha violenta, ainda assombrados”.
“Por sua parte os alunos sem chefe, sem direção, sem saberem que fazer [...] retrocederam para a escola”.
473 Gastão da Cunha, ibid., p. 205. A participação de Afrânio Peixoto, conforme nos comunicou ele, a narramos na
História social do Brasil, iii, p. 241.
474 José Maria dos Santos, A política geral do Brasil. São Paulo: 1930, p. 414.
476 Pedro Dias de Campos, O espírito militar paulista. São Paulo: 1923, p. 155.
477 Correspondência, coligida por Homero Pires. São Paulo: 1932, p. 144.
479 Afonso Arinos de Melo Franco, Um estadista da república. Rio: 1955, i, p. 459.
480 A. C. Ferreira Reis, História do Amazonas, p. 260. De Belém dizia Euclides da Cunha, 30 de dezembro de 1904:
“Nunca São Paulo e o Rio terão as suas avenidas monumentais, largas de 40 metros”, Francisco Venâncio Filho, Euclides
da Cunha e seus amigos, p. 141. Sua impressão de Manaus, ibid., p. 144.
481 V. Nelson de Sena, Geografia de Minas Gerais, ed. da Sociedade de Geografia do Rio de Janeiro, 1922, p. 283; e O
cinqüentenário de Belo Horizonte, conf., Belo Horizonte: 1948. A Constituição estadual autorizara a mudança da capital
de Ouro Preto para outro sítio, o que foi facilitado pelo funcionamento temporário da Assembléia em Barbacena (onde se
criou, em 1894, a comissão construtora da nova cidade, sob a direção do Engenheiro Aarão Reis). O sucessor deste,
Engenheiro Francisco Bicalho, entregou ao governo, em 12 de dezembro de 1897, as primeiras instalações da Cidade de
Minas (como então se chamou). Teve o nome definitivo de Belo Horizonte por lei de 1o de julho de 1901 — como aliás já
determinara o decreto de 12 de abril de 1890 para o primitivo Arraial de Curral del-Rei. O Presidente Afonso Pena
começou e o Presidente Bias Fortes concluiu o empreendimento enorme, de passar a sede do governo da arcaica Vila Rica
para aqueles arejados lugares — donde, no decurso de meio século, brotou uma das maiores cidades do país.
482 V. 1º Centenário do Conselheiro Antônio da Silva Prado. São Paulo: 1946, p. 101, pass.
483 Afonso d’E. Taunay, História da cidade de São Paulo. São Paulo: 1954, p. 254.
484 Aberta por Joaquim Eugênio de Lima, v. Rocha Azevedo Filho, Um pioneiro em São Paulo. São Paulo: 1954.
485 Ao Dr. Coelho Cintra, diretor do Jardim Botânico, diz C. J. Dunlop, coube a glória de ter sido o realizador do
primeiro sistema elétrico definitivo na América do Sul, para a substituição da tração animal, Apontamentos para a
história dos bondes no Rio de Janeiro, Rio: 1953, p. 195. E Noronha Santos, Meios de transportes no Rio de Janeiro. Rio:
1934, i, p. 409. Em Paris experimentara-se a aplicação da eletricidade a essa espécie de transporte. Os bondes
“americanos” foram pela primeira vez utilizados em Cleveland, em 1884.
486 Leia-se o histórico in Amando e Aquiles de Oliveira Fernandes, A indústria de energia elétrica no Brasil. Rio:
1953, pp. 25–6.
494 Sobre o papel decisivo de Francisco Sales na “construção” da candidatura mineira, Daniel de Carvalho, Capítulos
de memórias. Rio: 1957, p. 42; Afonso Arinos, Um estadista da república, ii, pp. 462–3.
495 Sobre as peripécias da candidatura de Rui lançada por José Marcelino e pelo “bloco” por este inspirado, Maria
Mercedes Lopes de Sousa, Rui Barbosa e José Marcelino, Rio: 1950, p. 77. Praticamente foi a situação baiana quem deu a
vitória ao nome mineiro.
496 João Pinheiro, Carlos Peixoto, preferiam Sales; Bias Fortes achava que devia ser Sales ou Afonso Pena; Sales
recusou com firmeza, indicando Pena. V. Caio Nelson de Sena, João Pinheiro da Silva. Belo Horizonte: 1941, p. 92.
Desistira Bernardino a 16 de agosto, v. Tavares Pinhão, Bernardino de Campos. Ribeirão Preto: 1941, p. 96.
497 V. documentos citados por Maria Mercedes Lopes de Sousa, op. cit., pp. 97 e ss. V. também Sertório de Castro,
ibid., pp. 217–9; Ciro Silva, Pinheiro Machado, pp. 128–9. Rui, em carta a Azeredo, 19 de abril de 1905, rebelara-se contra
o lançamento do nome de Campos Sales por Pinheiro, Correspondência, p. 151. Joaquim Murtinho, no discurso dito no
banquete oferecido a Afonso Pena, salientou a vitória da tese de que o presidente não tinha o direito de fazer sucessor (e
em 1929 Lindolfo Collor — discurso de 20 de setembro — recordou estas palavras, Aliança liberal, Rio: 1930, p. 59).
499 Ibid., p. 419. Exclui-se a culpa dos chefes vencedores, porque o crime se deu no imprevisto de uma sortida,
ignorando a escolta de “provisórios” que atirava em Antônio Pais de Barros.
501 Generoso Ponce, ibid., cap. 16, “A intervenção frustrada”. Explicou Rui, respondendo em 1913 a João Luís Alves,
que se opusera ao pedido (constante da mensagem presidencial) para a apuração de responsabilidades mediante
intervenção federal, com a nomeação de interventor, Comentários à Constituição Federal, ed. de H. Pires. São Paulo:
1932, i, p. 194. Pela primeira vez se falava de interventor. V. Ernesto Leme, A intervenção federal nos estados. São Paulo:
1930, p. 201; e Pedro Calmon, A intervenção federal. Rio: 1936, p. 119. Fausto Cardoso, na câmara — o que não deixa de
ser curioso — defendera a intervenção e o interventor, que deveria cumpri-la, Carlos Maximiliano, Comentários à
Constituição brasileira, pp. 196–7.
502 Mário Cabral, Roteiro de Aracaju. Aracaju: 1948, pp. 254–5. V. João Luís Alves, Trabalhos parlamentares. Rio:
1923, p. 58 (parecer da Comissão de Justiça da câmara favorável à intervenção federal, conforme consulta do governo);
Afonso Arinos, op. cit., ii, p. 517.
503 V. documentação in Miguel Calmon, Fatos econômicos. Rio: 1913, p. 370. O plano fora de Alexandre Siciliano.
Sobre o episódio, Afonso d’E. Taunay, Pequena história do café no Brasil. Rio: 1945, pp. 295 e ss.
504 Leia-se René Gonnard, Histoire des doctrines économiques. Paris: 1947, p. 484. Observa Henry William Spiegel,
“with these measures Brazil assumed the role of pioneer in the field of raw material control”, The Brazilian Economy.
Filadélfia: 1949, p. 172. O congresso cafeeiro de países produtores reunido em 1902 em Nova York tinha estabelecido um
“cartel de preços” análogo ao que se criou em Taubaté, Andreas Sprecher von Bernegg, Plantas tropicais e subtropicais na
economia mundial, Rio: 1938, p. 308.
505 Parecer da comissão de finanças da câmara, Serzedelo Correia, 16 de novembro de 1908, Documentos
parlamentares, Valorização do café, Rio: 1915, ii, p. 5.
506 Miguel Calmon, op. cit., p. 175. Realmente os preços subiram em 1911–2 de 238% sobre os de 1907–8, Von
Bernegg, op. cit., p. 308. “Com isto o primeiro negócio da valorização foi bem sucedido”. Justifica-o H. E. Jacob, Biografia
del caffè. Milão: 1936, p. 324.
508 É quando o imperialismo colonial (digamos com Hauser) se integra no nacionalismo. Em 1898 pouco faltou para
ingleses e franceses se baterem no alto Nilo (Fachoda): cederam estes, v. Georges Hardy, La politique coloniale et le
partage de la terre. Paris: 1937, p. 242; L. Genet, L’Europe contemporaine. Paris: 1951, p. 457. O imperador da Alemanha
desembarcou em Tânger (1905) manifestando o seu interesse pelo “controle” marroquino: quase a guerra com a França...
Esta já se aliara à Inglaterra e ia formar com a Rússia a Tríplice Entente, em clara prevenção da luta, antevista e imensa.
509 Leia-se sobre o novo imperialismo americano, Samuel Flagg Bemis, La diplomacia de Estados Unidos en la
América Latina, trad. T. Ortiz. México: 1944, p. 133. Quanto à oposição de teses, em 1904, pan‑ ‑americanismo e
pan‑iberianismo, Dunshee de Abranches, Brazil and the Monroe doctrine. Rio: 1915, p. 62. O Brasil fora o primeiro a
aplaudir a doutrina de Monroe, consagrando-lhe o novo palácio..., John Bassett Moore, Principles of American
Diplomacy. Nova York: 1918, p. 414.
511 Euclides da Cunha, Contrastes e confrontos, p. 415, fala da “feição gravíssima” da “guerra iminente”, achando
errado o envio de tropas para o Purus. As dificuldades militares desse movimento iriam inspirar, como diremos, a
renovação do exército no governo de Afonso Pena. Valia a experiência...
512 Euclides da Cunha escreveu Peru versus Bolívia, Rio: 1939, 2ª ed.
513 Dunshee de Abranches, Rio Branco e a política exterior do Brasil, ii, p. 248.
515 V. Heitor Lira, História diplomática e política internacional. Rio: 1941, pp. 140 e ss.
516 A apologia dessa política foi feita em termos encomiásticos por Artur Orlando, Pan‑Americanismo, Rio: 1906, p.
41: organizaria a vida econômica como em dado momento o Cristianismo organizou a vida religiosa internacional...
517 Álvaro Lins, ibid., p. 517. O desertor apareceu seis meses depois em Buenos Aires. Leia-se também Raul Rio
Branco, Reminiscências do Barão do Rio Branco, Rio: 1942, p. 195.
518 Otávio Brito, O monroísmo e a sua nova fase, citado por João Cabral, Sociedade Brasileira de Direito
Internacional, anuário de 1934– 35, p. 21. Não se esqueça que a Alemanha desgostara os Estados Unidos com a simpatia
pela Espanha na guerra de Cuba, ao tempo em que deles se acercava a Inglaterra, renunciando às intervenções armadas
no continente.
519 A primeira manifestação americanista de Rio Branco foi em 1903, quando o ministro argentino Drago formulou
a doutrina contra a cobrança pela força de dívidas internacionais (caso da agressão à Venezuela): ficava com o
pensamento dos Estados Unidos (telegrama de 18 de março, citado por Álvaro Lins, ibid., p. 490). Era o começo de sua
vitória sobre o Bolivian Syndicate, que aniquilou a peso de dinheiro — com a benevolência do State Department.
520 Sertório de Castro, op. cit., p. 225. V. a retificação de Daniel de Carvalho, Capítulos de memórias, p. 76; e antes,
Diário de Notícias, Rio: 24 de outubro de 1954.
521 Destacou-se Campista na defesa da Caixa de Amortização, “monumental”, Pedro Rache, Homens de Minas, Rio:
1947, p. 124. Sobre o seu perfil parlamentar, v. Antônio Gontijo de Carvalho. Ensaios biográficos. São Paulo: 1951, p. 153.
522 A nomeação do ministro baiano de 27 anos serve de exemplo à independência com que Pena organizou o
gabinete, resistindo à política dos estados que bafejava os respectivos leaders, cf. Maria Mercedes Lopes de Sousa, op. cit.;
e In memoriam, Miguel Calmon: Sua vida e sua obra. Rio: 1936, p. 30 (livro de nossa autoria).
524 Jardim da infância, apelido dado por Augusto de Freitas, discurso na câmara, 20 de maio de 1907. Afonso Arinos,
ibid., ii, p. 481.
525 Sobre a ligação de São Paulo ao Paraná, em 1899, v. Ernesto Sena, O Paraná em estrada de ferro. Capital Federal:
1900, p. 90.
526 V. Euclides da Cunha, A margem da história. Porto: 1922, pp. 130–43; In memoriam, Miguel Calmon, p. 40;
Fernando de Azevedo, Um trem corre para o Oeste. São Paulo: 1950, pp. 308 e ss.
527 V. Roquette-Pinto, Rondônia. São Paulo: 1935, pp. 53 e ss., 3ª ed.; Amílcar de Magalhães, Impressões da
Comissão Rondon (com o histórico das expedições), Rio; Missão Rondon, Apontamentos sobre os trabalhos realizados
pela comissão de linhas telegráficas..., Rio: 1916.
528 Nome proposto por Roquette-Pinto, em 1915 (zona entre os rios Juruena e Madeira), op. cit., p. 17.
529 V. Alfredo Lisboa, “Portos do Brasil”, in Dicionário do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, 1922, i, pp. 560
e ss.
530 Criou a Caixa de Conversão a lei nº 1.565, de 6 de dezembro de 1906. V. a crítica de Leopoldo de Bulhões, in
Augusto de Bulhões, op. cit., p. 354.
531 Combatendo a criação da Caixa, lembrava Bulhões o erro de se aplicar o fundo de garantia do papel-moeda (lei
de 1899) em fundo de resgate, que valorizava indiretamente o meio circulante. Deslastrava as emissões, a que o governo
recorria em face dos seus gastos excessivos que consumiram, além disto, em quatro anos, empréstimos no valor de 60
milhões esterlinos. O custo do progresso!
532 V. Álvaro Lins, Rio Branco, ii, p. 563; Luís Viana Filho, A vida de Rui Barbosa, pp. 337 e ss. Sobre a assembléia da
Haia, E. Lemonon, La Seconde Conférence de la Paix; Bustamante, 2ª Conferencia de la Paz en el Haya. Virgínia Cortes
de Lacerda e Regina Monteiro Leal, Rui Barbosa em Haia. Rio: 1957.
533 Álvaro Lins, ibid., ii, p. 565; Viana Filho, ibid., p. 342; de Rui, A Conferência de Haia, dois autógrafos, ed. da Casa
de Rui Barbosa. Rio: 1952.
534 Sobre o duelo verbal de Rui e Martens, o delegado russo, v. Alberto d’Oliveira, Memórias da vida diplomática.
Paris-Lisboa: 1926, p. 80.
536 Citado por Rodrigo Otávio, Minhas memórias dos outros, nova série, p. 313.
538 Leia-se, de 1914, Fulleton, Problems of Power, pp. 246–7, sobre a possível partilha das influências entre a
Alemanha, a Inglaterra e os Estados Unidos. No prefácio a A. Chéradame, O plano pangermanista desmascarado, Paris:
1917, p. 20, cita Graça Aranha o Discurso do Kaiser, de 1896, lembrando a dimensão mundial do império; e colige as
referências alemãs à América do Sul, de Tannenberg, Sievers, J. Ludwig, Funke, Lange, Libert, etc. Também Charles
Andler, Le Pangermanisme. Paris: 1915, pp. 34–6.
539 Leia-se, Teodorico Lopes e Gentil Torres, Ministros da Guerra do Brasil. Rio: 1946, p. 155.
540 Despacho de Rio Branco, citado por Álvaro Lins, ibid., p. 594.
541 Leia-se a resposta de Rui Barbosa a Zeballos, discurso no Senado, 21 de outubro de 1908 (Boletim da Soc. de Dir.
Bras. de Dir. Int., janeiro–dezembro de 1949).
542 O regozijo uruguaio pelo tratado consubstanciou-se no nome de Rio Branco, dada à Villa Artigas, departamento
de Cerro Largo, no de Avenida Brasil, a uma das artérias de Montevidéu, e no monumento (escultor, Paulo Mañé) que lhe
perpetua a imagem nessa capital. Em janeiro de 1910 a Argentina subscreveu com o Uruguai o protocolo sobre a
jurisdição das águas do Prata, que era da sua parte a colaboração na política do cordial vizinho. Tem esta o símbolo,
quanto ao Brasil, no caso extraordinário da união de Santana do Livramento (1857) e Rivera, único, talvez, de uma
fronteira sem vestígios materiais, a dividir a mesma cidade, como se a regesse delicado acordo de condomínio urbano,
sem alfândega nem polícia, espontâneo.
544 Alberto de Faria, conferência na Academia Brasileira, 30 de agosto de 1930 (V. cap. 26, “O período inquieto”,
nota 15, p. 197).
547 Narra Medeiros e Albuquerque aspectos curiosos da excitação que, em 1908, começava a invadir o exército,
levando alguns grupos a atos de violência, após sessões secretas do Clube Militar..., Minha vida, ii, p. 40.
548 Reminiscências de Lauro Müller, que nos comunicou Edmundo da Luz Pinto.
550 Ibid., p. 189. “Não é mistério para ninguém que Pinheiro Machado resistiu à candidatura do marechal”. Gilberto
Amado, Grão de areia e estudos brasileiros. Rio: 1948, p. 190.
552 Ibid., p. 202. Respondendo ao presidente, e em estrondosa entrevista ao repórter de O País, Bias Fortes lhe negou
o direito de ter candidato. E este pronunciamento destruiu a candidatura de David Campista.
553 Tavares de Lira, Presidente Afonso Pena; Afonso Arinos, Um estadista da república, p. 597; José Vieira, A cadeia
velha.
555 Ibid., p. 600. Por 142 votos a câmara negou a renúncia, que Peixoto declarou irrevogável a 18 de maio.
558 Foi a tese de vários médicos, e David Campista, em resposta a pergunta de Rui, a 18 de junho de 1909: “A
moléstia [...] foi consideravelmente agravada por padecimentos morais”. “Sob a ação de choques morais sucessivos”,
informou na mesma data Miguel Calmon, Rui Barbosa, Correspondência, pp. 210–1. Boa para a campanha eleitoral, a
afirmação foi acolhida com reserva. Espírito temperado nas lutas políticas, não tombaria com a crise que se processava
lentamente. Além disto a proclamação da candidatura do marechal é de 22 de maio e faleceu a 14 de junho. Barbosa Lima
rompera o movimento de desagravo, gritando na câmara (a 15 de junho): “Sucumbiu aos golpes traiçoeiros da perfídia
partidária (apoiados e não apoiados)”, Afonso Arinos, ibid., p. 608.
559 Conta-nos Edmundo da Luz Pinto, que um popular nesta ocasião bradou: “Êta presidente científico!”. Foi o
adjetivo pitoresco que lhe veio à cabeça, na féerie do teatro novo...
560 João Mangabeira, Rui: O estadista da república, p. 125; Luís Viana Filho, op. cit., p. 368.
562 Discurso no Teatro Lírico, Rio: 15 de julho de 1909, F. Néri, ibid., p. 133.
563 Rui Barbosa, Plataforma apresentada na sessão pública no politeama baiano, na noite de 15 de janeiro de 1910.
Continuava presidencialista por não parecer ainda oportuna a revisão neste ponto, ibid., p. 25.
564 V. Rui, O Sr. Rui Barbosa, no Senado, responde às insinuações do Sr. Pinheiro Machado. Rio: 1915, p. 41.
565 Seguimos neste passo a informação que nos deu o Almirante Álvaro Alberto (que ultimamente foi benemérito
presidente do Conselho Nacional de Pesquisas), ferido ao lado do seu comandante.
566 José Carlos de Carvalho, O livro de minha vida. Rio: 1912, p. 360; Dantas Barreto, Conspirações, p. 169; H.
Pereira da Cunha, A revolta na esquadra, 1953.
567 Sobre a atitude de Rui, Luís Delgado, Rui Barbosa. Rio: 1945, p. 73. V. descrição do terror pânico que houve na
cidade, Maurício de Lacerda, discurso de 2 de outubro de 1912, Anais da câmara, xi, pp. 164–5 (sessões de 1–15 de
outubro de 1912); Sertório de Castro, A república que a revolução destruiu, pp. 264–5; Dantas Barreto, op. cit., p. 175. A
ordem em branco, de Batista Leão, é documento do arquivo de Adir Guimarães, Rio.
568 Rui, discurso de 24 de novembro de 1910, in J. C. de Carvalho, O livro de minha vida, p. 392.
569 Sílvio Romero e Artur Guimarães, Estudos sociais. Lisboa: 1911, pp. 27–8. V. Dantas Barreto, op. cit., p. 203;
Edmar Morel, A Revolta da Chibata. Rio: 1959.
570 Leia-se o que de Pinheiro, e sua intimidade, e sua influência diz Gilberto Amado, Mocidade no Rio e primeira
viagem à Europa. Rio: 1956, pp. 116 e ss.
571 O Supremo Tribunal, a propósito da dualidade de câmaras em Sergipe, em 1895, declarara que neste caso,
nitidamente político, competente para o considerar era o Congresso, Carlos Maximiliano, Comentários à Constituição
brasileira. Rio: 1929, p. 171.
573 Carlos Maximiliano, Comentários à Constituição, p. 782. Rui exprobrou a exorbitância chamando-lhe “ditadura
do Executivo”, discurso de recepção no Instituto dos Advogados, 18 de maio de 1911, Discursos e conferências, p. 292.
575 Aníbal Freire, Rosa e Silva, pp. 30 e ss.; José Maria Bello, Memórias. Rio: 1958, p. 72.
576 V. Antônio Moniz, A Bahia e os seus governadores na república. Bahia: 1923, pp. 398 e ss.
577 Antônio Moniz, A Bahia e os seus governadores na república, p. 421; José de Sá, O bombardeio da Bahia e seus
efeitos. Bahia: 1918, p. 366.
578 Alberto de Faria, Revista da Academia Brasileira, xxxiv, 1930, p. 16; Rodrigo Otávio, Minhas memórias dos
outros, nova série, p. 210. Sobre a apoteose dos funerais, Constâncio Alves, Figuras. Rio: 1921, p. 138.
580 Pinheiro reprovara a brutalidade. Quem a ordenara? Falou-se de telegrama, do Catete para o General Sotero,
assinado, com proposital ambigüidade, M. Hermes. Mário Hermes? O fato é que o marechal, conta Setembrino de
Carvalho, Memórias, p. 107, concordou: e ao ser interrogado, disse: “O Forte de São Marcelo já está bombardeando o
palácio”. Do Ministério da Guerra (continua Setembrino) é que não partiu a ordem, ibid., p. 108.
581 V. José de Sá, ibid., p. 420. Até no caso da indenização pelos danos do bombardeio, o Supremo Tribunal,
mudando de jurisprudência, foi contra a União. Responsabilizou-a. Julgara improcedente a ação dos particulares lesados
no bombardeio de Manaus. Entendia agora cabível, pois o da Bahia fora ordenado pelo inspetor da Região, por ordem
do... presidente da república, Hermenegildo de Barros, Memórias do juiz mais antigo do Brasil. Rio: 1942, i, p. 132.
582 Sertório de Castro, op. cit., p. 289; Costa Porto, Pinheiro Machado e seu tempo, p. 168; Pedro Dias de Campos, O
espírito militar paulista, p. 165; Rui Barbosa, Discurso no Senado em resposta às insinuações, p. 42.
583 Rodrigo Soares Júnior, Jorge Tibiriçá e sua época. São Paulo: 1958, ix, p. 502.
585 V. Setembrino de Carvalho, Memórias, p. 100; J. Pio de Almeida, Borges de Medeiros, p. 75; Sertório de Castro,
op. cit., p. 291.
586 Craveiro Costa, História de Alagoas. São Paulo, p. 166. Os Maltas governaram desde 1900, com Euclides, que em
1903 se fez substituir pelo irmão Joaquim Paulo, retornando ao poder em 1906 e reelegendo-se para o triênio, de 9 a 12. O
candidato dos Maltas, Natalício Camboim, num acordo que ficou anedótico (“acordo de Camboim”, sinônimo de
capitulação ingênua), retirou-se, facilitando a eleição tranqüila do Coronel Clodoaldo.
589 V., sobre a conduta de Pinheiro, Gilberto Amado, Mocidade no Rio e primeira viagem à Europa. Rio: 1956, pp.
395 e ss.
591 Anais da Câmara dos Deputados, v, p. 520 (discurso de Agapito dos Santos), sessões de 1–12 de julho de 1912.
592 Sobre a situação da zona de que tratamos, Gustavo Barroso, Almas de lama e de aço. São Paulo: 1930, pp. 25 e ss.;
Irineu Pinheiro, O Cariri. Fortaleza: 1950, p. 190. A sedição foi preparada no Rio, cf. Rodolfo Teófilo, A sedição de
Juazeiro, p. 37, Barroso, ibid., p. 18. Leia-se, de Fran Martins, Mundo perdido, romance. Rio: 1940, pp. 161 e ss.
593 V. Fernandes Távora, O Padre Cícero, in Revista do Instituto do Ceará, 1943, lvii, pp. 268 e ss.
594 Cangaço, grupo, ou ofício de valentões, pode ser derivado de encangar, canga, ou jugo, na acepção de laço entre
eles, para a proeza... Cangaceiro (termo dicionarizado por Cândido de Figueiredo na sua nova edição), este é
brasileirismo. O sentido reponta dos versos de 1914: “Querendo andar no cangaço / Até sou bom cangaceiro” (Leonardo
Mota, Violeiros do Norte. São Paulo: 1925, p. 184). Aparece a palavra em O Cabeleira, de Franklin Távora, p. 198.
Euclides, Os sertões, p. 190 da 22ª ed.: cangaço, complexo de armas.
595 O entrincheiramento de Juazeiro estendeu-se à volta da povoação num raio de três léguas, com o fosso adiante, e
o parapeito à guisa de muro, com as frestas adequadas às espingardas... V., sobre a luta, Irineu Pinheiro, O Juazeiro do
Padre Cícero e a Revolução de 1914. Rio: 1938.
597 Setembrino de Carvalho, Memórias, pp. 122–3; v. Eusébio de Sousa, op. cit., pp. 307–9; Costa Porto, op. cit., p.
175. O sítio foi declarado para o Ceará e preventivamente para a capital federal, onde bom número de oficiais apoiava o
camarada governador.
598 Setembrino, ibid., p. 123. O presidente do Rio Grande do Sul em conceituoso telegrama aplaudiu a intervenção,
Hermes da Fonseca Filho, Pinheiro Machado. Rio, p. 84. Mas o dever do governo federal era manter o governo estadual
que lhe pedisse o auxílio, Carlos Maximiliano, Comentários à Constituição, p. 175.
599 Fernando Magalhães, O centenário da Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro. Rio: 1932, p. 164.
600 Augusto Bulhões, Leopoldo de Bulhões, pp. 404–5: “E tivemos um encilhamento embora em menores proporções
do que o anterior”: palavras do Senador Bulhões, 27 de agosto de 1915. Leia-se também Raul Alves, História política dos
governos da república. Rio: 1927, p. 187.
601 Às afirmações amargas de Bryce no seu livro South America, respondeu Salvador de Mendonça, Situação
internacional do Brasil, p. 57.
604 Respondendo a Pinheiro no ano seguinte, Rui lhe recordou o veto dos dois grandes estados, O Sr. Rui Barbosa,
no Senado, responde às insinuações do Sr. Pinheiro Machado, p. 5; v. também Sertório de Castro, op. cit., pp. 324 e ss.
Habilmente, os mineiros (por sugestão de Bias Fortes) responderam a Pinheiro, que o preferiam na presidência do seu
grande partido...
605 V. Manifesto da Grande Convenção Racional de 26 e 27 de julho de 1913, Rio: 1913; em anexo, Rui Barbosa,
Programa do Partido Republicano Liberal.
606 Raimundo de Meneses, Emílio de Meneses: O último boêmio. São Paulo: 1946, p. 228.
607 “Um homem houve que solveu essa tensa situação: Sabino Barroso”, J. P. Calógeras, Formação histórica do Brasil,
p. 467.
609 Rui Barbosa, Discurso no Senado, em resposta às insinuações de Pinheiro, p. 29: “Esperanças no novo governo”.
611 Rui sustentou a legitimidade do habeas‑corpus, discurso de 28 de janeiro de 1915, in Comentários à Constituição
Federal Brasileira, organizados por Homero Pires, v, p. 514, e ainda noutras sessões do Senado, Revista do Supremo
Tribunal Federal, iii, nº 1.
613 V. as confissões do criminoso, Xavier de Oliveira, O magnicida Manço de Paiva. Rio: 1928, pp. 162–3. Na prisão,
mais tarde, dizia ele a este médico: “Pena é que não apareça um outro doido que mate o Epitácio, já que eu não posso sair
daqui”, ibid., p. 185. Intoxicava-se de leitura de jornais...
614 V. General Abílio de Noronha, Narrando a verdade. São Paulo: 1924, p. 16. O candidato dos sargentos à
presidência da república era o General Dantas Barreto, Maurício de Lacerda, Entre duas revoluções. Rio: 1927, p. 44
(respondendo ao General Abílio). Confirma essa “tentativa de revolução parlamentarista”, Campos de Medeiros, Lutas
pela pátria, p. 65.
615 Pedro Cavalcanti, A presidência Venceslau Brás, 1914–1918. Rio: 1918, p. 7 (e aí a síntese histórica do
quatriênio). Do mesmo autor, O perfil de um grande estadista da república, Dr. Venceslau Brás. Rio: 1956.
616 V. o resumo da questão in Romário Martins, História do Paraná, pp. 508 e ss.; Enéas Marques, Generoso
Marques, pp. 77 e ss. O litígio fora aberto em 1891, quando Santa Catarina propôs que se fixasse a fronteira na linha Rio
Negro–Iguaçu: o projeto foi arquivado no Congresso Nacional. Ambos os estados aceitariam o laudo arbitral de Manuel
Vitorino. Fracassou o acordo porque o presidente do Supremo Tribunal, Olegário de Aquino e Castro, entendeu que a
esta corte faltaria competência para homologá-lo. Daí a ação intentada, e ganha em 1904 por aquele estado, mas com tal
abalo da opinião, que a sentença não chegou a ser executada. Substituiu-a o acordo final de 1916, como diremos, sob os
auspícios do Presidente Venceslau Brás. Sobre a tentativa de emancipação da zona com o nome de Estado das Missões, v.
Cleto da Silva, Acordo Paraná–Santa Catarina. Curitiba: 1920.
617 Como os dois estados requisitaram a intervenção federal, e em verdade o banditismo do Contestado os desafiava
a ambos, não se pôde dizer que atrás dos rebeldes estivessem agentes do governo. Nas Memórias, o General Setembrino
declara não ter achado vestígio disto, op. cit., p. 137. Os adversários dos chefes locais engrossavam as hordas dos
fanáticos, Osvaldo R. Cabral, Santa Catarina, pp. 388–9. Leia-se Brasil Gerson, Pequena história dos fanáticos do
Contestado. Rio: 1955, p. 9.
618 Osvaldo R. Cabral, op. cit., p. 386; Major Ávila da Luz, Os fanáticos: Crimes e aberrações. Florianópolis: 1952, p.
91; Gastão Goulart, Verdades da Revolução Paulista. São Paulo: 1933, pp. 282–3.
620 Setembrino de Carvalho, Memórias, pp. 141 e ss. V. do mesmo general, Relatório, Rio: 1916, e A pacificação do
Contestado, Rio: 1916; Herculano Teixeira d’Assunção, A Campanha do Contestado. Belo Horizonte: 1917, 2 vols.
623 Ministério das Relações Exteriores, Guerra da Europa, Documentos diplomáticos, Atitude do Brasil. Rio: 1917, p.
5.
624 Decretos de 12 e 24 de agosto de 1914 (Grã-Bretanha e Alemanha, Japão e Alemanha), de 10 de março de 1916
(Portugal e Alemanha), de 29 de agosto de 1916 (Itália e Alemanha).
625 V. Pacífico Pereira, Conferências. Bahia: 1915, p. 20. Daquela filosofia truculenta (sic) deu Rui o resumo na
conferência de Buenos Aires, de 1916, A Grande Guerra, ed. de F. Néri. Rio: 1932, p. 34.
626 Miguel Calmon, In memoriam, p. 55; e A Defesa Nacional, Rio: 1o de agosto de 1915. Do outro lado, Dunshee de
Abranches advertia, A ilusão brasileira, Rio: 1917.
627 V. oração in Últimas conferências e discursos, p. 175. Miguel Calmon foi em verdade o criador da Liga. Bilac
dizia ter sido de Afonso Arinos o primeiro grito, pref. a Lendas e tradições brasileiras, de Arinos, Rio: 1917, p. 3.
628 Conferência na Faculdade de Direito de São Paulo, 9 de outubro de 1915, op. cit., p. 121. Para o cotejo de idéias
leia-se Miguel Couto, O ideal da paz e a Defesa Nacional. Rio: 1915.
631 O Embaixador Luís de Sousa Dantas, então subsecretário do Exterior — nos referiu a surpresa que lhe causou a
conferência de Rui, com a qual não contava. É claro que a escrevera no Rio, fora vertida a espanhol pelo Ministro Manuel
Bernardez, e se destinava a assinalar a inconformidade do sentimento jurídico do continente com a neutralidade tímida
dos governos. Rui explicou os fatos no discurso do Teatro Municipal, 17 de setembro de 1916, A Grande Guerra, p. 91, e a
eles voltou nas orações de Petrópolis, em 7 de março de 1917, e de São Paulo, 4 de abril de 1919.
632 V. A Defesa Nacional, de 10 de abril de 1916.
633 Sobre a evolução da atitude dos Estados Unidos, v. nosso Brasil e América, p. 117 (citando Victor Giraud, David
Jayne Hill...). Foi um dos motivos da decisão a política secreta da Alemanha em relação ao México, surpreendida pelo
Intelligence Service: a “Zimmerman Note”. V. também Harley Wolter, The Origins of the Foreign Policy of Woodrow
Wilson. Baltimore: 1932, p. 621; P. S. Martin, Latin America and the War, 1925; L. T. Hill, Diplomatic relations between
the u. s. and Brazil, 1932; Harold E. Davis, The Americas in History, p. 676.
634 V. documentos na citada publicação oficial do ministério, A guerra da Europa, p. 18. A nota de protesto à
Alemanha contra a agressão submarina fora devidamente enérgica, reconheceu-se na Europa (Afonso Celso, recebendo
na Academia Lauro Müller, Discursos acadêmicos, Rio: 1935, iii, p. 234). Rui procurou provar a insegurança da ação do
ministro, na oração de 1919, em São Paulo, Esfola da calúnia, pp. 194–6: aí o histórico destes fatos. Francisco Sá, na
convenção de 25 de fevereiro de 1919, proclamou: “A política da guerra não estava vencedora nem no Congresso, nem no
governo”; foi Rui quem triunfou com ela nas ruas. E Medeiros e Albuquerque na imprensa, Minha vida. Rio: 1934, ii, p.
151.
635 Além do citado livro do Itamaraty, Oto Prazeres, O Brasil na Guerra. Rio: 1918, pp. 61 e ss.
636 Cerca de cem médicos partiram em 18 de agosto de 1918, v. Leonídio Ribeiro, Ensaios e perfis. Rio: 1954, p. 455.
641 Paulo Nogueira Filho, Ideais e lutas de um burguês progressista. São Paulo: 1958, i, p. 75. O programa da Liga
Nacionalista foi retomado em 1926 pelo Partido Democrático, ibid., i, p. 154.
642 Carlos Seidl, A propósito da pandemia de gripe em 1918. Rio: 1919, p. 16. As grandes cidades (Paris, Londres,
Nova York, Madri) não puderam evitar a visita da influenza maligna, chamada “espanhola”, pela publicidade dada aos
seus estragos na Península.
644 Evaristo de Morais Filho, O problema do sindicato único no Brasil. Rio: 1952, p. 201. V. as impressionantes
reminiscências de Joaquim Pimenta, Retalhos do passado, e de Alice Pimenta, Encruzilhada de destinos. Rio: 1957.
646 Domício da Gama, Ministro do Exterior, mostrara a má vontade do Itamaraty, com a vária do Jornal do
Comércio, de 24 de janeiro, em que se propalava que as delegações seriam presididas pelos respectivos chanceleres.
Debalde Rodrigues Alves e Delfim dirigiram a Rui um convite cheio de respeito e — quanto ao primeiro, embebido de
sinceridade. Em resposta que logo teve a sua versão francesa, Rui se negou a aceitar, v. Centenário do Conselheiro
Rodrigues Alves, ii, p. 438, Sertório de Castro, ibid., p.; Rui, Esfola da calúnia. Rio: 1933, pp. 243 e ss.; Campanha
presidencial, Obras, xlvi, t. i, p. 35.
647 Entrevista ao Correio do Povo, Rui, Campanha presidencial, Bahia: 1919, p. 11.
648 Laurita Pessoa Raja Gabaglia, Epitácio Pessoa. Rio: 1951, p. 332.
649 Epitácio Pessoa, Pela verdade. Rio: 1925, p. 43. “Foi idéia que jamais me passou pela mente”. Surpreendeu-o o
telegrama de 25 de fevereiro, em que a mesa da Convenção lhe comunicou a escolha. Deram-lhe na Convenção 139 votos
e a Rui 42, v., deste, Campanha presidencial, Rio: 1919, pp. 23 e ss.
650 V. Campanha presidencial, Obras, xlvi, 1956, 2 tomos. É a fase culminante do orador pela majestade verbal dessas
peças de antologia, por vezes admiravelmente clássicas (exemplo, ibid., pp. 77–8).
651 Evaristo de Morais, prefácio a O trabalho e o salário, de Francisco Frola, Rio: 1937, p. 10. Confirmou-nos
Evaristo, em extensa conversa, a que teve com Rui Barbosa, dando-lhe os livros e as sugestões de 1919.
652 Campanha presidencial, Obras completas, xlvi, t. ii, p. 63.
656 Os cinco grandes, Estados Unidos (por pouco tempo, pois o Senado os desligou da Sociedade das Nações),
Inglaterra, França, Itália e Japão. Os quatro (artigo 194 do Pacto) ficaram sendo o Brasil, a Bélgica, a Espanha e a Grécia.
Permaneceu o Brasil no Conselho até 1926, v. Hildebrando Accioli, Tratado de Derecho Internacional. Rio: 1945, iii, p.
428.
657 No comício, em que figuraram Miguel Calmon, Pedro Lago, Simões Filho, Medeiros Neto, estes dois foram
feridos, e o primeiro de pé, no automóvel que servia de tribuna, na praça do palácio — cruzou os braços à agressão
inopinada. Partiu de um grupo de civis, destacados pela ruidosa solidariedade a Seabra. — Pedro Lago comunicara a Rui a
união das oposições sob a chefia do conselheiro, em fins de dezembro de 1918, Rui, Correspondência, p. 386. Este
verberou o atentado, Campanha presidencial, Obras, xlvi, t. ii, pp. 263–5.
659 Epitácio Pessoa, op. cit., p. 124. Sobre o levante sertanejo, Olímpio Barbosa, Horácio de Matos. Bahia: 1956, pp.
47 e ss.
660 Epitácio Pessoa, Mensagem ao Congresso, 3 de maio de 1920 (e op. cit., pp. 129 e ss.), respondendo à tese de Rui,
de que não era obrigado a atender à requisição do governo do Estado, nele intervindo (O artigo 6º da Constituição, Rio:
1920). V., a respeito da querela, Ernesto Leme, A intervenção federal nos estados. São Paulo: 1926, p. 46, 2ª ed.; Pedro
Calmon, A intervenção federal (tese de concurso). Rio: 1936, p. 43.
661 Teodorico Lopes — Gentil Torres, Ministros da Guerra do Brasil. Rio: 1947, p. 184.
663 Já em 1906 clamara Bilac pelo repatriamento dos restos mortais de Dom Pedro ii e da imperatriz, guardados, com
os da casa de Bragança depois de Dom João iv, em São Vicente de Fora, em Lisboa. Aprovara Rui, Novos discursos e
conferências, pp. 427–9 (na Liga de Defesa Nacional, 15 de dezembro de 1920): e só em vista de críticas insidiosas deixou
de ser o orador, na chegada, v. Pedro Calmon, A Princesa Isabel, p. 346. Jazem hoje os antigos imperantes na catedral de
Petrópolis, em panteão onde também ficarão os Condes d’Eu (1953). — O Presidente Epitácio pediu ao Congresso a
revogação do banimento em mensagem de 3 de maio de 1920. Foi concedido pelo decreto de 3 de setembro. Os restos
mortais do imperador e da imperatriz chegaram a 9 de janeiro de 1921, centenário do “Fico”.
665 V. Raul Alves de Sousa, História política dos governos da república. Rio: 1927, pp. 161 e ss.; José Tolentino, Nilo
Peçanha: Sua vida pública. Petrópolis, pp. 284 e ss.
666 Luís Viana Filho, A vida de Rui Barbosa, p. 424 (edição do Centenário); J. de Castro Nunes, Alguns homens do
meu tempo. São Paulo: 1958, p. 30.
668 Xisto Apulcro, A verdade histórica (Da Convenção de Junho de 1921 à Revolução de 1922). Rio: 1923, p. 175. O
falsário confesso chamava-se Oldemar Lacerda. A manobra de que resultou a divulgação foi atribuída a Irineu Machado.
Conta-nos Afonso Pena Júnior que bem antes fora Bernardes avisado de que corria carta de sua letra com injúrias ao
exército, pela qual o possuidor pedia 30 contos... Seria a carta falsa, em que, apesar da habilidade do imitador, a assinatura
não levava o t cortado, distintivo da firma de Bernardes. Afonso Arinos, ibid., p. 1020.
669 José Maria dos Santos, A política geral do Brasil, p. 452; Jackson de Figueiredo, Reação do bom senso. Rio: 1922.
673 Maurício de Medeiros, Outras revoluções virão... Rio: 1932, p. 88. Que viera um oficial do Rio Grande tomar
contato com os conspiradores, Maurício de Lacerda, Entre duas revoluções. Rio: 1927, p. 143. Descreve pitorescamente
esse “clima” Cap. Pedro Rocha, Revoluções estéreis. São Paulo: 1952, pp. 39 e ss.; Mário Rodrigues, Meu libelo. Rio: 1925,
p. 290, 3ª ed.
674 Rosalina Coelho Lisboa, A seara de Caim. Rio: 1953, p. 282. Fracassou o levante na Escola de Aviação, v. Cap.
Pedro Rocha, Revoluções estéreis, p. 120.
675 Maurício de Lacerda, op. cit., p. 95. “Assim nem as dinamites, nem os homens, nem as greves, nem a
solidariedade mais remota”, pois o agente de ligação... “fazia de propósito as desligações necessárias para impedir a
colaboração”.
676 Rosalina Coelho Lisboa, op. cit., pp. 322–3 (resumindo o noticiário da imprensa).
677 Feridos gravemente, só não morreram Siqueira Campos e Eduardo Gomes. Furioso, Newton Prado arrancou no
hospital as ataduras e repeliu os cuidados médicos. Sucumbiu.
680 Maurício de Medeiros, op. cit., p. 74, conta a decepção de Nilo ao ouvir na avenida, em 15 de novembro, palmas e
vivas ao préstito do presidente que acabava de empossar-se.
681 Moniz Sodré, Defendendo a república, Bahia: 1929, pp. 124 e ss., historiou as relações da Reação Republicana
com a revolução.
683 Flores da Cunha, A Campanha de 1933. Rio: 1943, pp. 19 e ss. A 2ª Brigada do Oeste foi criada por Borges de
Medeiros em 27 de fevereiro de 23 (comandante, Flores), com 4º e 5º corpos (este do comando de Osvaldo Aranha), e os
de São Borja (comandante, Getúlio Vargas), São Luís, Santa Maria, São Gabriel, Caçapava, Uruguaiana, Dom Pedrito, o 6º
e o 7º...
685 A candidatura mais plausível era de Aurelino Leal, a mais falada a de Pedro Lago; mas a rejeição do apoio federal
à de Góis Calmon importaria a saída de Miguel Calmon do ministério, e esta razão pesou no ânimo do presidente, para o
decidir a prestigiá-la. Com a posse do novo governador, contra Seabra, subiu ao governo baiano o ruísmo, despertado em
1917, belicoso em 1919, dominado em 1920, ligado em 22 à sorte da situação central, que continuava assim árbitro da dos
estados.
686 “Solus, totus et unus”, disse Seabra, com pungente ironia. O verso é de Marcial, “solus et unus”, l. 5.
687 Juarez Távora, À guisa de depoimento sobre a Revolução Brasileira de 1924. São Paulo: 1927, i, p. 66.
689 V. Juarez Távora, op. cit., pp. 106 e ss. O golpe contra Setembrino seria a 28 de dezembro de 23, em Ponta Grossa.
Era o Tenente Magalhães Barata “alma do movimento” no Paraná, Távora, ibid., p. 110. O governo soube do plano e
mandou detê-lo em São Paulo. A delação — em torno dos movimentos do tenente — fez fracassar, não só o assalto ao
trem do ministro, sinal do levante, como a revolta do General Isidoro, em julho, pois este, que percorria as guarnições do
Sul, teve de interromper o trabalho e se recolheu a São Paulo com uma impressão incompleta das suas possibilidades.
692 V. Aureliano Leite, Dias de pavor. São Paulo: 1924, pp. 44 e ss.; e o diário de José Carlos de Macedo Soares,
Justiça. Paris: 1925, pp. 25 e ss.
693 Revoltou-se o 26 de caçadores em Belém, 26 a 28 de julho, v. Cândido Costa, O livro do Centenário. Belém: 1924,
pp. 174 e ss.; o 28º com a Força Pública, depôs em Aracaju o governador do estado, Graco Cardoso, movimento logo
abafado pelas forças da Bahia enviadas pelo General Nonato Marçal; o vice-governador do Amazonas foi destituído pela
revolta encabeçada pelo Tenente Alfredo Augusto Ribeiro Júnior, que despachou uma expedição a sublevar o Pará,
dispersada pelos destroyers que, subindo o rio, comboiaram os destacamentos do General João de Deus Mena Barreto,
incumbido de restaurar a ordem em Manaus. Consolidou-a a intervenção federal a cargo do Dr. Alfredo Sá.
694 V. Gerson de Macedo Soares, A ação da Marinha na Revolução Paulista de 1924. Rio: 1932, p. 93.
695 Os Generais Carlos Arlindo e Estanislau Pamplona convenceram o Presidente Carlos de Campos, que até aí
resistira impavidamente, a deixar o palácio, alvo do bombardeio, Assis Cintra, O Presidente Carlos de Campos e a
Revolução de 5 de julho de 1924. São Paulo: 1952, p. 12.
696 Justiça, pp. 60 e ss. O autor relata os seus passos em favor da população, esmiuçando as relações com os chefes
revolucionários, interessados neste propósito. Leia-se Paulo Duarte, Agora nós. São Paulo: 1927, pp. 60 e ss.
698 Abílio de Noronha, Narrando a verdade. São Paulo: 1924, pp. 122–5.
699 Id., O resto da verdade, p. 76; e Aires de Camargo, Patriotas paulistas na coluna Sul. São Paulo: 1925, pp. 78–9.
Sustenta este que, se se retardasse Isidoro na retirada, a coluna do Sul a impediria, cortando-lha.
701 O Ministro Costa Manso (acórdão de 20 de julho de 1934) lembrou a dureza do assédio, “por assim dizer, contra
a cidade e não contra a gente de Isidoro”. O General Abílio de Noronha faz igual censura, op. cit., p. 126. É também de
Góis Monteiro (que pertencia à Brigada Carlos Arlindo), O General Góis depõe..., por Lourival Coutinho, Rio: 1955, p.
10, confirmando o relato de Paulo Duarte, op. cit.
702 Ítalo Landucci, Cenas e episódios da Coluna Prestes e da Revolução de 1924. São Paulo: 1952, p. 16. No 1º volume
do seu livro, Juarez Távora antecipa o índice do 2º, com o roteiro da marcha: infelizmente esse 2º se perdeu, com a
destruição dos originais. Pormenores e documentação, in Lourenço Moreira Lima, A Coluna Prestes. São Paulo: 1945, 2ª
ed.
703 V. Tenente-coronel Dilermando Cândido de Assis, Das barrancas do Alto Paraná. Rio: 1926, p. 33.
704 V., sobre as ligações entre os núcleos rebeldes, João Alberto Lins de Barros, Memórias de um revolucionário. São
Paulo: 1953, pp. 23 e ss.
707 De Barracão, à margem do Uruguai, quase mil homens abandonaram a coluna, internando-se na Argentina, João
Alberto, ibid., p. 67.
708 Juarez Távora, À guisa de depoimento sobre a Revolução de 1924. Rio: 1928, iii, p. 27.
709 “Com o único objetivo de não deixar morrer a revolução pela qual tantos dos nossos companheiros haviam dado
a vida”, João Alberto, op. cit., p. 115. A história dessa longa marcha, in Lourenço Moreira Lima, A Coluna Prestes. São
Paulo: 1945, pp. 112 e ss.
710 João Alberto, ibid., p. 152. Leia-se O General Góis depõe..., pp. 36 e ss.
711 Maurício de Lacerda, José Oiticica, Sarandi Raposo, Evaristo de Morais. V. Everardo Dias, in Revista Brasiliense,
março–abril de 1957.
712 Nelson Tabajara de Oliveira, A Revolução de Isidoro. São Paulo: 1956, p. 40.
713 João Alberto, ibid., p. 171. No encontro do Garças morreram os majores revolucionários Lira e Barros. “Foi esse o
último incômodo que nos deu a coluna de jagunços”. “Aqueles baianos haviam desempenhado bem os seus
compromissos”.
714 Lourenço Moreira Lima, A Coluna Prestes, p. 498.
715 O abuso das disposições, estranhas ao orçamento, nele incluídas ao finalizarem os debates (cauda orçamentária),
fora denunciado no programa revisionista de Rui (1910), que igualmente previa o veto parcial, a definição dos princípios
constitucionais da União.
716 Restringia-se o habeas‑corpus aos casos em que a liberdade de locomoção fosse atingida, retirando-se à justiça a
interpretação extensiva que o liberalizara em meio das lutas políticas, como nas controvérsias de poderes.
717 V. o histórico das idéias reformistas, Oscar Stevenson, A reforma da Constituição Federal. São Paulo: 1926, pp. 63
e ss. As suas etapas foram o programa do partido federalista rio-grandense (refundido em 1917 por Pedro Moacir), a
consolidação do espírito revisionista em 1902, a campanha civilista (e o Partido Republicano Liberal), com a
intransigência de Rui, batendo-se pelo aperfeiçoamento da Lei Magna, contra a resistência do castilhismo, que só a
admitiu depois dos sucessos de 1923.
718 V. Levi Carneiro, Federalismo e judicialismo. Rio: 1930, p. 188, sobre “a reforma, dominada de prevenções
lamentáveis contra o Judiciário” — Acabavam de escrever sobre a reforma constitucional, João Arruda (1923), Castro
Nunes, Araújo Castro, Joaquim Luís Osório (1924).
720 Indo a Ouro Preto, a paraninfar a formatura dos engenheiros de 1925, o Ministro da Agricultura tinha a
impressão de que Melo Viana era o candidato elaborado pelos acontecimentos e bem aceito do presidente.
721 A taxa fixada era ligeiramente inferior à média verificada, v. Barbosa Lima Sobrinho, A verdade sobre a
Revolução de Outubro, p. 19. A Caixa de Estabilização evitaria a alta e a carteira cambial do Banco a baixa do câmbio,
Sertório de Castro, op. cit., p. 511.
722 Refere Maurício de Lacerda, Segunda República, Rio: 1931, p. 34, que foi em 1927 o seu primeiro contato com
Prestes, por intermédio de Juarez Távora e Silo Meireles, ocasião em que a conspiração se instalou de novo no Rio.
723 V. Paulo Duarte, Que é que há? São Paulo: 1931, pp. 50 e ss.
724 Maurício de Lacerda, op. cit., p. 45; Afonso Arinos, Um estadista da república, pp. 1284 e ss.
725 Em 1908 o partido, recomposto por Assis Brasil (com a dissidência republicana, de Abbott), continuando liberal
em matéria econômica (anti-intervencionista), propugnava pela eleição proporcional, pela regeneração da república
através do voto... V., de Assis Brasil, Ditadura, parlamentarismo, democracia. Leia-se J. P. Coelho de Sousa, O
pensamento político de Assis Brasil. Rio: 1958, pp. 48–9; Sousa Docca, História do Rio Grande do Sul, p. 371. O programa
libertador (3 de março de 1928), da autoria de Assis Brasil, acrescentou ao do Partido Republicano Democrático (de 1908)
o voto secreto e obrigatório, representação proporcional... Justiça e representação, o seu lema.
726 Constituiu-se em 21 de setembro de 1927 o Partido Democrático Nacional, sob a presidência de honra de
Antônio Prado, e com o diretório: Deputados Assis Brasil, Paulo Morais Barros, Adolfo Bergamini, Francisco Morato,
Marrey Júnior, Plínio Casado e Batista Luzardo. A oposição unificava-se. Sobre a sua ação, v. o citado livro de Paulo
Nogueira Filho, Ideais e lutas de um burguês progressista, i, cap. 4.
727 “Pelo Rio Grande unido e reconciliado, depois de quase um século de divergências profundas”, João Neves,
discurso de 5 de agosto de 1929, Jornada Liberal. Porto Alegre: 1932, i, p. 7.
729 Discurso na convenção do partido, 20 de setembro de 1929, ao lançar o nome de Vargas, para “conciliar os
cidadãos com o poder”, Aliança Liberal, Documentos da campanha presidencial. Rio: 1930, p. 12.
730 V. Antônio Carlos, pref. à Jornada Liberal, de João Neves, i, p. 14. O que se passava na política paulista (Prestes
em lugar de Álvaro de Carvalho), constitui informação de vários testemunhos.
731 Pouco antes, ignorando as intenções de Antônio Carlos, escrevera Vargas a Washington que permaneceria
fechado a qualquer manifestação sobre o problema presidencial, carta de 10 de maio de 29, Leônidas do Amaral, Os
pródromos da campanha presidencial. São Paulo: 1929, p. 15. — V. Paul Frischauer, Presidente Vargas, p. 231.
732 Carta de Getúlio a Washington, 11 de julho, in op. cit., p. 17. Comunicação de Antônio Carlos, 20 de julho,
falando ainda em possível conciliação, ibid., p. 21.
733 V. telegrama de Estácio Coimbra a Manuel Vilaboim, líder da maioria, citado por João Neves, A Jornada Liberal,
i, p. 49.
735 Governador da Bahia. Vital Soares (advogado e humanista, espírito de escol) pode incluir-se entre os homens
modestos, que jamais pensaram em disputar postos dominantes. Saiu candidato a vice-presidente por imposição da
bancada baiana (dirigida por Simões Filho), que pleiteava para o seu estado este mandato, com a alegação de que já o
tivera Pernambuco, com Estácio Coimbra, no penúltimo quatriênio.
737 Discurso de João Neves, 13 de novembro de 29, ibid., i, p. 242, atribuindo a Vilaboim ter adaptado aos interesses
da maioria a frase, que aludia às fronteiras que o Rio Grande traçara no passado com a pata de seus cavalos e a lança de
seus heróis...
738 Afonso Arinos, op. cit., p. 1325; Virgílio de Melo Franco, Outubro, 1930. Rio: 1931, pp. 152–3. Conta Laurita
Epitácio Pessoa que Epitácio deu os passos que Afrânio de Melo Franco lhe solicitara, esbarrando porém na
intransigência do presidente, op. cit., ii. Leia-se José Maria Bello, Memórias, pp. 189 e ss.
739 V. Charles A. e Mary R. Beard, The Rise of American Civilization. Nova York: 1940, p. 729. — Contou-nos João
Neves que vinha do Rio Grande com a perspectiva do fracasso (ensombrada a Aliança com a defecção de parte do
situacionismo mineiro, Antônio Carlos pacifista, admitindo Getúlio a hipótese de se retirar da luta, esta em transe de
dissolução) quando, ao passar pelo porto de Santos, Júlio de Mesquita Filho lhe segredou a notícia de que acabava de
estalar o crack da Bolsa norte-americana. A princípio pareceu-lhe sem ligação com o fato interno; mas logo se convenceu
da interdependência, pois a política oficial repousava na solidez econômica de São Paulo, cujo produto máximo sofria o
choque principal do cataclismo. Subvertida a ordem econômica, a política lhe seguiria a sorte. Chegando ao Rio, proferiu
um discurso de efeito, para advertir que a oposição continuava de pé, enquanto lhe mandavam de Minas os dados
necessários à sua grande oração sobre a “degringolada” do plano federal da valorização do café, argumento do novo
período de combate. O “general café...”.
741 Em carta de 12 de outubro o presidente do Instituto, demissionário, Rolim Teles, dava a existência de 6.700.000
sacas representadas por conhecimentos caucionados a 60$000. O fato é que a sobra, com o acúmulo de duas safras
copiosas, chegou a 23 e meio milhões, Ministério das Relações Exteriores, Brasil, 1936. Rio: 1936, p. 141.
742 Aparte de Sousa Filho a João Neves, discurso de 25 de novembro, op. cit., i, p. 292: “O café foi elevado, na
campanha política, à categoria de marechal. É chamado “O marechal café”. — A frase foi simultaneamente lançada por
Assis Chateaubriand e Neves. Lembrava o paradigma clássico, alusivo à retirada de Napoleão da Rússia batido pelo
general... Inverno. “On dit encore en Russie: Ce n’est pas Kutusoff qui a tué ou dispersé les Français, c’est le général
Marosow (la gelée)”, Désirée Lacroix, Histoire de Napoléon. Paris: 1902, p. 477.
744 Getúlio Vargas, A nova política do Brasil. Rio: 1939, i, pp. 19–54. Com a viagem do presidente rio-grandense para
falar às massas, e a leitura da plataforma no Rio, entrou a campanha na sua fase decisiva, para a qual, como dissemos, foi
elemento convincente a derrocada econômico-financeira de outubro de 29, levada à câmara pela oposição em 25 de
novembro.
745 V. Virgílio A. de Melo Franco, op. cit., p. 190. “De todo o cruel e sangrento episódio houve duas vítimas, a saber:
o jovem e ardoroso Deputado Sousa Filho, o qual terminou antes da tarde, segundo o verso melancólico de Petrarca, e o
velho deputado gaúcho, Sr. Simões Lopes”. Depois do seu discurso sobre o café, João Neves só voltou à tribuna em maio
de 30, já aí para criticar o reconhecimento de Júlio Prestes, eleito a 1º de março.
746 Carta de José Pereira, citado por João Neves, A Aliança Liberal, ii, p. 73: “Havemos de provocar a intervenção,
pois estou disposto a ocupar todos os municípios do sul do estado”. Leia-se Ademar Vidal, 1930, História da revolução na
Paraíba. São Paulo: 1933, pp. 98 e ss.; Apolônio Nóbrega, História republicana da Paraíba. João Pessoa: 1950, p. 183.
749 Ausentes os juízes togados, os suplentes, ligados à oposição, diplomaram os candidatos da sua parcialidade...,
Ademar Vidal, ibid., p. 232.
750 João Neves, Por São Paulo e pelo Brasil. São Paulo: 1933, p. 27, 2ª ed.; Barbosa Lima Sobrinho, op. cit., p. 130.
Sobre o modus vivendi negociado por Paim Filho com o presidente, v. Barbosa Lima Sobrinho, ibid., p. 125. Quanto às
idéias indicadas como de pacificação por Getúlio, ibid., p. 124, estão em síntese no discurso de Neves, 21 de maio: anistia,
reforma eleitoral, liberdades espirituais..., A Aliança Liberal, ii, pp. 40–1.
751 É documento dessa impressão o que escreve Rubens do Amaral, A campanha liberal. São Paulo: 1930, p. 143.
753 Leia-se Maurício de Lacerda, Segunda República, p. 127, pass. Prestes imbuiu-se da nova ideologia em contato
com Rodolfo Ghioldi, Jorge Amado, Luís Carlos Prestes. Rio, p. 209.
754 Virgílio A. de Melo Franco, op. cit., p. 238; Rosalina Coelho Lisboa, Seara de Caim, cit.
755 Ademar Vidal, op. cit.; e descrição da fuga in Godofredo Nascentes Tinoco, Tempo bom no setor Leste. Rio:
1931, pp. 24–5.
756 Virgílio A. de Melo Franco, ibid., p. 248. Francisco Campos acertara em Porto Alegre (18 de abril de 30) os
termos em que Minas concordaria com a revolução, se fosse feita simultaneamente no Rio Grande e na Paraíba; Antônio
Carlos deu para isto dois mil contos e a Paraíba mil. Por esta, falou o secretário da Segurança, José Américo de Almeida.
Em 27 de maio, sob a presidência de Antônio Carlos, os chefes mineiros homologaram em Juiz de Fora o compromisso.
Mas, marcada para julho, a revolução foi adiada por achar Antônio Carlos que as articulações não satisfaziam
(radiograma a Aranha, de 21 de junho). Aranha irritadamente respondeu: “Rio Grande submete-se império
circunstâncias [...]. Meu pensamento situação pior que dos negros sofreram escravidão, com menor ridículo”. Nomes e
pormenores no livro de V. de Melo Franco, ibid., pp. 214 e ss.
757 Carta a Olegário Maciel após a visita de Maurício Cardoso, emissário gaúcho.
761 João Neves descreveu o episódio da noite de 26 de julho no Clube do Comércio, acentuando que deste momento
em diante não mais se hesitou, quanto ao “prélio das armas”, sua hipótese de 5 de agosto de 29... V. também Godofredo
N. Tinoco, Tempo bom no setor Leste, p. 88.
763 General Góis Monteiro, A Revolução de 30 e a finalidade política do exército, p. 41. Desde fevereiro, quando se
avistara com Aranha, fora convidado para dirigir a revolução, ibid., p. 41.
765 Quatro dias antes, de Max Fleiuss, no Instituto Histórico, no Rio, ouvimos o boato, de que estouraria a 3 de
outubro... Segredo de polichinelo, provavelmente o governo o considerou exagerado, como das outras vezes. O fato é que,
ainda naquela noite de 3, reinava na capital federal a maior tranqüilidade. V. também Campos de Medeiros, Lutas pela
pátria, p. 82.
766 Leia-se, quanto ao episódio de Passo Fundo, E. Leitão de Carvalho, Na Revolução de 30. Rio: 1933.
769 Comandavam Etchegoyen de Cambará a Jaguariaíva, Miguel Costa e Flores da Cunha em Itararé, na zona litoral,
até a Ribeira, João Alberto, sendo Curitiba o centro de comunicações, J. Alberto, op. cit., p. 244. Sobre os fatos no Paraná,
Coronel A. Miranda, Justitia vanum verbum... São Paulo: 1933, pp. 92 e ss. Leia-se, Revista do Globo — edição especial —
Revolução de Outubro de 1930. Porto Alegre: 1931.
770 Cap. Josué Freire, A odisséia do 12º regimento. Rio: 1933. É este autor quem diz que o quartel seria facilmente
tomado, se investido de surpresa (ibid., p. 69), pois só depois de algum tempo se aprestou para a valorosa defesa.
771 Hastínfilo de Moura, Da Primeira à Segunda República. Rio: 1930, p. 244; Aureliano Leite, Memórias de um
revolucionário, p. 53.
773 Barbosa Lima Sobrinho, op. cit., p. 217. O secretário do Interior, Carneiro Leão, não chegou a ser avisado da
retirada do governador e tentou ainda articular, sem resultado, a resistência, com o 21 de caçadores.
774 V. Hastínfilo de Moura, Da Primeira à Segunda República, p. 213; e exposição in Renato Jardim, Um libelo a
sustentar. Rio: 1933, pp. 160 e ss.
776 Hastínfilo de Moura, ibid., p. 206. Quanto à situação em Minas, diz Hastínfilo que já se achava em Barbacena um
emissário, para propor a cessação da luta, ibid., p. 224.
777 General Tasso Fragoso, “A Revolução de 1930”, in Revista do Instituto Histórico Brasileiro, vol. ccxi, abril–junho
de 1951, p. 31. V. também Afonso de Carvalho, 1ª Bateria, Fogo! Rio: 1931, p. 82.
778 De Bertoldo Klinger, Narrativas autobiográficas. Rio: 1951, vol. v, e vol. vi destas Narrativas, depoimento do
Coronel José Faustino da Silva (que resume os fatos de 2–3 e 24 de outubro). Sobre o que se passava nos arraiais do
governo, Humberto de Campos, Fragmentos de um diário, ed. Jackson. Rio: 1951; Medeiros e Albuquerque, Minha vida.
Rio: 1934, ii, p. 104.
779 General Tasso Fragoso, ibid., p. 13: “Passamos afoitamente a uma sala contígua”.
780 Afonso Celso, discurso na Academia (recepção de Otávio Mangabeira), Discursos acadêmicos, viii, p. 217.
Compara a queda do último presidente da “República Velha” à do último presidente de conselho da monarquia. E Otávio
Mangabeira, depoimento escrito a 16 de novembro de 1930, sob o título As últimas horas da legalidade, o autor, Ministro
do Exterior do governo deposto, então prisioneiro no 1º de cavalaria.
783 Telegrama de Góis Monteiro à junta, aos governadores e ao “General” Távora, in Virgílio A. de Melo Franco,
ibid., p. 362.
784 O caso do Ministério da Justiça é típico. Assumiu-o a 24 de outubro, tendo em vista a necessidade de assegurar a
ordem na cidade, o Dr. Gabriel Bernardes. Teve a intuição de confiar (também sem audiência do governo, inexistente) a
chefia de polícia ao Major Bertoldo Klinger, que, por sinal, ao receber o convite, pediu que o fizesse por escrito... A junta
aquiesceu no fato consumado. Por três dias houve pelo menos alguém a resguardar a ordem jurídica, espontaneamente.
786 Sampaio Dória, A Revolução de 30, preleção. São Paulo: 1930, p. 68.
787 Paulo Duarte, Que é que há? São Paulo: 1931, p. 306.
788 José Maria Bello, História da República. São Paulo: 1956, p. 391.
789 Sobre a instituição e o aparecimento dos interventores no direito pátrio, v. nosso Curso de direito constitucional
brasileiro, 1954, pp. 76–7, 3ª ed.
790 Informações de Levi Carneiro. A Lei de Organização manteve pelo menos na sua integridade o Judiciário, Oscar
da Cunha, O direito judiciário e a revolução. Rio: 1933, p. 68.
791 Getúlio Vargas, A campanha presidencial. Rio: 1951, p. 171 (discurso em Fortaleza).
792 Getúlio Vargas, A nova política, i, p. 73.
793 V. interessante análise de Robert J. Alexander, in The Hispanic American Historical Review, maio de 1956, pp.
229 e ss. (“Brazilian tenentismo”).
794 Aureliano Leite, História da civilização paulista. São Paulo: 1954, pp. 321 e ss.; Paulo Nogueira Filho, Ideais e
lutas, ii, cap. 10; General Klinger, Parada e desfile duma vida de voluntário do Brasil. Rio: 1958, pp. 424 e ss.
795 Alcântara Machado, discurso na Academia Brasileira, 20 de maio de 1933, Discursos acadêmicos. Rio: 1937, viii,
p. 41: “Paulista sou há quatrocentos anos”.
796 O secretariado constituiu-se de nomes ilustres, Valdemar Ferreira, Paulo de Morais Barros, Fonseca Teles,
Francisco Junqueira, Sampaio Vidal, Gofredo Teles, Rodrigues Alves Sobrinho.
797 Documentação fotográfica, in Álbum de família, 1932. São Paulo: Livraria Martins, 1954.
798 Euclides de Figueiredo, História da Revolução Constitucionalista. São Paulo: 1954, pp. 54 e ss.
799 J. P. Coelho de Sousa, O pensamento político de Assis Brasil. Rio: 1958, p. 33.
801 V. Euclides de Figueiredo, op. cit., primeira parte; Manuel Osório, A guerra de São Paulo. São Paulo: 1932;
Herculano C. e Silva, A Revolução Constitucionalista. Rio: 1932; João Neves, Acuso. Rio: 1933. Admar Cruz, Verdades e
bastidores. Rio: 1933; Lísias Rodrigues, Gaviões‑de‑penacho: A luta aérea na guerra paulista. São Paulo: 1934; Agostinho
Ramos, Recordações de 32 em Cachoeira. São Paulo: 1937; Paulo Duarte, Palmares pelo avesso. São Paulo: 1937; Lourival
Coutinho, O General Góis depõe..., cap. 5; Menotti del Picchia, Revolução Paulista; Nossa guerra, de Ellis Júnior;
Aureliano Leite, Martírio e glória de São Paulo...
804 Neurastênico e inconsolável, amargou Santos Dumont as suas meditações sobre o emprego da aviação — a que
dera asas e glória — na guerra fratricida, Aluísio Napoleão, Santos Dumont e a conquista do ar. São Paulo: 1957, p. 229
(com a competente bibliografia).
805 V. defesa do anteprojeto por João Mangabeira, Em torno da Constituição. São Paulo: 1934 (e, in fine), este
trabalho da Comissão, presidida por Afrânio de Melo Franco.
806 Levi Carneiro, Conferências sobre a Constituição. Rio: 1936, pp. 17–8.
807 Abolida em 10 de novembro de 1937, a Constituição de 1934 foi estudada por poucos. V. os citados trabalhos de
Levi Carneiro e Araújo Castro, A nova Constituição brasileira. Rio: 1936, 2ª ed.
808 Evaristo de Morais Filho, O problema do sindicato único no Brasil, pp. 228–9.
810 B. Mirkine-Guetzévitch, As novas tendências do direito constitucional, trad. Cândido Mota Filho, prefácio de
Vicente Rao. São Paulo: 1933, p. 62. A Constituição alemã fora traduzida por Amorim Garcia e amplamente debatida, v.
g., Pontes de Miranda, Os fundamentos atuais do direito constitucional. Rio: 1932; Queirós Lima, Teoria do Estado. Rio:
1936, p. 151, 2ª ed.
811 Pedro Calmon, “O Senado no Sistema Brasileiro”, in Revista jurídica, Faculdade de Direito da Universidade do
Rio de Janeiro, vol. iii, p. 251 (1º semestre, 1935).
812 José Carlos de Macedo Soares, discurso de 19 de setembro de 1934, Discursos. São Paulo: 1937, p. 31.
813 Integralismo fora em Portugal o movimento dirigido por Antônio Sardinha, 1914, cujo programa pode ser lido, v.
g., no prefácio de Ao ritmo da ampulheta. Lisboa: 1925, tradicionalista, nacionalista (p. 27).
814 Miguel Reale, O Estado moderno, pref. à 1ª edição, reproduzido na 3ª. São Paulo: 1935.
815 De Plínio Salgado, Obras completas. São Paulo: 1956; Palavra nova, 1936; A quarta Humanidade, 1936; O que é o
integralismo, 1937; Espírito da burguesia, 1951.
816 Eudocio Ravines, La Gran Estafa. Santiago: 1954, p. 287. Quanto à China, v. Roberto Paybe, Mao Tsé Tung. Nova
York: 1950, p. 135.
818 Sobre a Aliança e o movimento de novembro de 1935, v. Defesa apresentada ao Tribunal de Segurança pelo
Deputado Pedro Lago. Rio: 1937.
819 Luís da Câmara Cascudo, História da cidade de Natal. Natal: 1947, p. 244; também História do Rio Grande do
Norte, p. 224; Coronel Delmiro Pereira de Andrade, Evolução histórica da Paraíba do Norte. Rio: 1946, p. 294.
821 Começa o documento: “Companheiros do Batalhão de Guardas! Luís Carlos Prestes — o único chefe dos
soldados do Brasil — chefia o movimento popular nacional revolucionário! Todo o R. I. em nossas mãos” (Documento in
arquivo do Marechal Eurico Gaspar Dutra).
823 Descrição das ocorrências, in “Aditamento nº 2” ao Boletim diário nº 286, de 11 de dezembro de 1935 (arquivo
do Marechal Dutra).
824 V. nosso Curso de Direito Constitucional, Rio: 1936 (a propósito da comissão especial, relator Salgado Filho, que
deu parecer sobre a emenda número um).
825 Leia-se Samuel Guy Inman, Latin America: Its Place in World Life. Nova York: 1942, p. 316.
826 Gaston Bouthoul, “Les Doctrines Politiques depuis 1914” (in Histoire des Doctrines Politiques, de G. Mosca.
Paris: 1955, p. 395); Lawrence C. Wanlass, Gettel’s History of Political Thought. Nova York, 1953, p. 370. Leia-se também
Cândido Mota Filho, O poder executivo e as ditaduras constitucionais. São Paulo: 1940, cap. 1 (“A crise constitucional”).
829 Conta o General Olímpio Mourão Filho (Manchete, Rio, 11 de novembro de 1958, em retificação à história
narrada pelo General Góis, ibid., p. 298) que o nome de Bela Kuhn, o chefe comunista húngaro, era imaginário, e,
lembrando-se de que Gustavo Barroso dissera que Kuhn era o mesmo que Cohen, apelido judaico, assim o emendou e o
datilógrafo, pensando que o traço da emenda abrangesse também o primeiro nome, copiou o “documento” com a única
assinatura, donde... o plano Cohen. Não havia Cohen; nem plano. Ou melhor: tornou-se uma peça eventual do vasto
plano de elaboração do Estado Novo.
830 Francisco Campos, Os problemas do Brasil e as grandes soluções do novo regime. Rio: 1938, p. 5.
832 Fonte: Constitution de la République de Pologne du 23 avril 1935, avant‑propos de M. Maclaw Makowski.
Varsóvia: 1935, p. 14; v. também Carlos Maximiliano, “Conferência de 1945”, in Comentários à Constituição brasileira.
Rio: 1948, i, p. 418.
835 Alceu Amoroso Lima, Meditação sobre o mundo moderno. Rio: 1942, p. 29 (a propósito do livro de Francisco
Campos).
840 V. Harold D. Lasswell, The Analysis of Political Behaviour. Londres: 1951, p. 138; G. Mosca (e Gaston Bouthoul),
Histoire des Doctrines Politiques. Paris: 1955, p. 399; bibliografia in Juan Beneyto, Historia de las Doctrinas Politicas.
Madri: 1948, p. 463; síntese filosófica: Pitirim A. Sorokim, Las Filosofias Sociales de Nuestra Época de Crisis, trad. E.
Terbon. Madri: 1954, p. 365. A crise internacional agravara-se com a perda de prestígio da Sociedade das Nações, de que
falaremos, o pacto quadripartite, que deslocou a diplomacia para os acordos regionais, a imunidade do ataque fascista à
Etiópia, a guerra civil espanhola, a ação nipônica na Manchúria e no litoral chinês, os preparativos hitleristas da absorção
da Áustria e da Tchecoslováquia, pródromos da guerra de 1939. De parte das grandes potências, houve a omissão norte-
americana, como uma colaboração sistemática à paz; a debilitação da política francesa depois da morte de Barthou (agora
sob a responsabilidade de Laval); o recuo britânico — relativamente à luta ítalo-abissínia — por faltar à energia do
Foreign Office (Eden) o apoio dos antigos aliados. A Itália quisera enfrentar a Alemanha nazista, mas, não contando
também com esse auxílio, acabara fazendo com ela o “eixo”, Roma–Berlim (1o de novembro de 1936). Em 1937...
prevalecia a ameaça enfática dos “ditadores”.
841 Maxime Leroy, Histoire des Idées Sociales en France. Paris: 1954, iii, p. 369.
843 Erymá Carneiro, As autarquias e as sociedades de economia mista no Estado Novo. Rio: 1941, p. 78.
844 Evaristo de Morais Filho, ibid., p. 244, nota (e entrevista no Correio da Manhã, de 19 de abril de 1945).
846 Ennio Renato Capponi, Revista del Lavoro, 1939, cit. de Evaristo de Morais Filho, ibid., p. 245.
847 Mario de la Cueva, citado por Evaristo de Morais Filho, ibid., p. 246.
848 Leia-se Afonso Arinos de Melo Franco, Um estadista da república, iii, cap. 23. O episódio mereceu livro de
Georges Scelle, Une Crise de la Société des Nations. Paris: 1927.
849 Looking Forward, cap. 15. A Argentina saíra da Liga das Nações em 1920 e a ela voltou em 1932 (política de
Saavedra Lamas, nos esforços então generalizados pela paz no mundo e no continente). Em 1936 estruturou-se o pan-
americanismo consultivo e cooperativo, sob a presidência de F. D. Roosevelt, na conferência de Montevidéu.
850 Foi o inesperado “acordo de Munique”, de julho de 1938, que deu a Hitler liberdade de ação para incorporar os
“sudetos da Tchecoslováquia”, inspirando a Churchill a sua frase terrível: “Tinham à escolha a desonra ou a guerra;
preferiram a desonra e terão a guerra”, Histoire Universelle Quillet. Paris: 1955, ii, p. 567. O golpe definitivo no sistema de
alianças (por último, a segurança franco-britânica da integridade polonesa) foi em 23 de agosto de 1939 a assinatura, em
Moscou, do pacto russo-germânico. Hitler poderia atirar-se à Polônia... Seria a segunda grande guerra.
851 Discurso de 20 de outubro de 1939, Getúlio Vargas, A nova política do Brasil, vii, p. 24.
853 Publicado in The Hispanic American Historical Review, maio de 1954, pp. 191–2. Samuel Flagg Bemis (La
Diplomacia de Estados Unidos en la América Latina, trad. Teodoro Ortiz. México: 1944, p. 264), transcreve um artigo de
F. D. Roosevelt, de 1928, em que aquela idéia aparece: “Nossa intervenção isolada nos assuntos internos das outras nações
tem que terminar; com a cooperação das demais teremos mais ordem e menos antipatia neste hemisfério”. E chama a
atenção para o livro de Sumner Welles, Naboth’s Vineyard (pan-americanismo cooperativo).
854 International Conciliation, nº 365, p. 397. V. Saavedra Lamas, La Conferencia Interamericana de Consolidación
de La Paz. Buenos Aires: 1938; Pedro Calmon, Brasil e América, p. 160, 2ª ed. (com informações do Embaixador Osvaldo
Aranha, que propunha a coletivização da doutrina de Monroe, para que fosse encargo comum, e não — unilateralmente
— dos Estados Unidos, em face da segurança continental).
855 General E. Leitão de Carvalho, A Serviço do Brasil na Segunda Guerra Mundial. Rio: 1952, p. 32.
856 O vapor Siqueira Campos com cargas da casa Krupp para o exército foi conduzido pela Marinha inglesa para
Gibraltar e por fim liberado, depois de fastidiosa negociação. Já o Bagé teve de desembarcar em Lisboa o carregamento,
que voltou à origem.
858 A Declaração tem analogia com a de Wilson, de 1917. Só não apelava para o órgão internacional de coordenação,
cujo projeto apareceu na Conferência Interamericana de Chapultepec, março de 1945.
859 Leia-se “O Trampolim de Natal”, pp. 2261 e ss. A sua importância no quadro da guerra foi salientada pelo
Presidente Roosevelt e, nas suas Memórias, por Cordell Hull, que a ligou aos sucessos do Norte da África (El Alamein) e
ao domínio do Mediterrâneo, parte preliminar da campanha da Itália. V. acordo militar, 17 de janeiro de 1941,
Documents on American Foreign Relations. Boston: 1941, iii, p. 149; acordo naval, 11 de maio de 1942, ibid., iv, p. 353.
860 V. Claude G. Bowers, Misión en Chile, 1939–1953. Santiago: 1957, p. 79, pass.
861 Samuel Eliot Morison, The Battle of the Atlantic, 1939–1943. Boston: 1947, p. 379.
862 Conferencias Internacionales Americanas, Suplemento. Washington: 1943, pp. 172 e ss.
863 Sobre as irresoluções norte-americanas (igualmente prudentes), v. Charles A. Beard, A Foreign Police for
America. Nova York: 1940, p. 141; e subseqüente atitude brasileira, Getúlio Vargas, A nova política do Brasil. Rio: 1944, x,
p. 34 (“Cumpriremos até o fim”), pass. — O torpedeamento de navios brasileiros começara, com o do Cabedelo, em que
pereceu toda a guarnição, mas depois do rompimento, a 14 de fevereiro de 1942, v. Júlio Andréa, A Marinha brasileira.
Rio: 1955, p. 332.
864 Vaca leiteira era o apelido dado aos barcos de suprimento no mar, alguns protegidos e abastecidos em sítios
semidesertos, nalguma área do Caribe. O depoimento de Morison, a que não falta a autenticidade das fontes documentais,
explica afinal o caso do torpedeamento injustificável.
865 Samuel Eliot Morison, The Battle of the Atlantic, p. 381 (cf. German Admiralty minutes of the Führer’s
conferences). V. nota 35, na p. 303.
866 Espontâneas, na manhã de 18, as manifestações se iniciaram com os estudantes da Faculdade Nacional de Direito
e seus mestres à frente, no Rio de Janeiro, transformando-se nas avenidas centrais em formidável movimento público de
repúdio à agressão. O presidente abriu os jardins do Palácio Guanabara às massas, que foram ouvir a sua palavra. Os
incisivos discursos proferidos (inclusive pelo Ministro do Exterior, Osvaldo Aranha) já eram de guerra declarada.
867 V. Livro Verde, O Brasil e a Segunda Guerra Mundial, Ministério das Relações Exteriores. Rio: 1944, 2 vols.
868 Samuel Eliot Morison, op. cit., p. 379. Sobre o importante esforço naval e a colaboração aérea do Brasil na defesa
das águas territoriais (e seu permanente patrulhamento), capítulo considerável da história da guerra, Samuel Eliot
Morison, The Atlantic Battle Won. Boston: 1957, pp. 208 e ss.; Contra-Almirante César Augusto Machado da Fonseca, A
Marinha brasileira e a Segunda Guerra Mundial (Subsídios para a história marítima do Brasil). Rio: 1953, xii.
869 Luís da Câmara Cascudo, História da cidade de Natal. Natal: 1947, p. 361.
871 Luís da Câmara Cascudo, op. cit., p. 362. Descrição de Natal durante a guerra, John Gunther, O Dia d, trad.
Cláudio G. Hasslocher. Rio: 1944, pp. 340–1. Refere-se especialmente à importância da base de Natal Cordell Hull, nas
suas Memórias.
872 Carta de 2 de setembro de 1942, in Revista da Academia Paulista de Letras, nº 33, p. 9, março de 1946.
873 Leiam-se depoimentos: Marechal Mascarenhas de Morais, A f.e.b. pelo seu comandante. São Paulo: 1947 (roteiro
de qualquer estudo sério a respeito); General Leitão de Carvalho, A serviço do Brasil na 2º Guerra Mundial. Rio: 1952;
Antônio Henrique de Morais. No teatro do Mediterrâneo, Rio (fase preliminar); Tenente-coronel Otávio Gondim de
Uzeda, Crônicas da Guerra. Alagoas: 1947, pp. 35 e ss.; Depoimento de oficiais da Reserva sobre a f. e. b. São Paulo: 1949;
Major João Batista Peixoto, A Segunda Grande Guerra. Rio: 1951, pp. 87 e ss.; General Delmiro Pereira de Andrade, O 11º
R. I. na 2ª Guerra Mundial. Rio: 1950; Elza Cansanção Medeiros, Nas barbas do Tedesco. Rio: 1955; General Osvaldo
Cordeiro de Farias, Alguns aspectos da ação da f. e. b. Rio: 1949, pp. 11 e ss.; Capitão Newton C. de Almeida, Memórias
diárias da Guerra da Itália. Rio: 1947; Francisco Nelson Rodrigues de Carvalho, Do Terço Velho ao Sampaio.
874 Os escalões sucessivos foram: 2º General Osvaldo Cordeiro de Farias; 3º General Olímpio Falconieri,
desembarcados ambos a 22 de setembro; 4º Coronel Mário Travassos, a 23 de novembro; 5º Tenente-coronel Ibá Jobim
Meireles, 8 de fevereiro do 45; v. Mascarenhas de Morais, op. cit., p. 36.
875 Queremos aludir às referências vagas ou ao silêncio das histórias gerais da 2ª Guerra Mundial, injusto, se não
sintomático da despreocupação dos autores pela “presença” do primeiro país latino-americano nesse episódio da
“libertação” da Itália.
876 Mascarenhas de Morais, ibid., p. 124; Otávio Gondim de Uzeda, ibid., pp. 91 e ss.; Delmiro Pereira de Andrade, O
11º R. I. na 2ª Guerra Mundial, p. 97.
878 Winston Churchill, A Segunda Guerra Mundial, trad. L. Gontijo de Carvalho. São Paulo: 1954, vi, p. 111.
880 The Final Campaign across Northwest Italy, Headquarters iv Corps, u. s. Army, Italy, 1945, p. 80.
881 “Esta outrora terrível Divisão Alemã teve a princípio os brasileiros no Vale Serchio e por fim foi compelida a
entregar-lhes as armas numa das mais renhidas batalhas ocorridas na fase final da campanha na Itália”, The Final
Campaign, etc., p. 81. E do General Truscott, 19 Days from the Apennines to the Alps. Milão: 1945, pp. 72–3.
882 Diz o Almirante Doenitz, Memoirs. Londres: 1959, pp. 239 e 252: “Em 27 de janeiro de 1942, como resultado do
estado de guerra existente entre nós (Alemanha) e os Estados Unidos, o Brasil cortou relações diplomáticas com nosso
país. Até então, nenhum navio brasileiro havia sido posto a pique por qualquer submarino alemão. [...] Entretanto, entre
fevereiro e abril de 1942, os submarinos torpedearam e afundaram sete navios brasileiros conforme tinham todo direito
de fazer e sob as previsões do Direito de Presa, desde que os capitães dos submarinos fossem incapazes de estabelecer sua
identidade neutral. Eles (os navios brasileiros) andavam navegando sem luzes e em ziguezagues, alguns armados e
pintados de cinza e nenhum deles levava bandeira ou qualquer sinal de identidade neutra. [...] De acordo com o Alto
Comando Naval foram expedidas ordens em 16 de maio e pelas quais poderiam ser atacados sem aviso, os navios de
qualquer país sul-americano, à exceção da Argentina e Chile, desde que sabidamente armados. [...] Sem nenhuma
declaração formal achamo-nos pois em estado de guerra com o Brasil, e a 4 de julho os submarinos alemães tiveram
permissão do governo para atacar todos os vasos brasileiros. [...] Após estes resultados muito satisfatórios, transferi os
barcos para o setor sudoeste de Freetown e aqui, também, a boa sorte estava conosco. Os submarinos voltaram a atacar a
rota marítima e afundavam quatro navios. No outro lado dos estreitos entre a África e a América do Sul, o submarino u-
507 (Comandante Tenente Schacht) estava operando. Ali, fora de águas territoriais, ele tinha afundado cinco navios
brasileiros. Assim procedendo, seguia instruções estabelecidas, com o apoio do Ministério do Exterior, pelo Supremo
Quartel-General das Forças Armadas. O governo brasileiro aproveitou o afundamento na ocasião desses navios para
declarar guerra à Alemanha. Embora isso em nada alterasse nossa amizade existente com o Brasil, que já tinha tomado
parte em atos hostis contra nós, foi sem dúvida um erro ter levado o Brasil a uma declaração oficial; politicamente nós
deveríamos ter sido advertidos no sentido de evitar tal procedimento. O Comando das Flotilhas de submarinos,
entretanto, e os capitães dos submarinos, como membros das Forças Armadas, não tiveram opção, senão obedecer às
ordens que lhes tinham sido dadas; não lhes competia pesar e medir suas conseqüências políticas”.
887 Apareceu o termo “trabalhismo” em 1899, no congresso de Plymouth, M. Beer, A History of British Socialism.
Londres: 1948, p. 335.
888 Fora livros de combate (Damonte Taborda, Alejandro Magnet...) não temos literatura histórica que permita
ajuizar com perspectiva e serenidade os sucessos de 1945. Ressalta — característica — a intromissão das massas no
processo político, com o populismo eruptivo e o culto do chefe.
892 O governo Dutra, seleção de José Teixeira de Oliveira. Rio: 1956, p. 102.
895 Passando pelo Rio Grande do Norte, terra do candidato, Getúlio, nos seus discursos, não lhe citou o nome.
896 Getúlio Vargas, A campanha presidencial. Rio: 1951, p. 101 (discurso no Rio, 12 de agosto de 1950).
897 V. a síntese dos atos diplomáticos, José Joaquín Caicedo Castilla, La Conferencia de Petropolis y el Tratado
Interamericano de Assistencia Recíproca firmado en Río de Janeiro en 1947. São Paulo: 1949.
900 Antônio Martins de Azevedo Pimentel, A nova capital federal. Rio: 1894, p. 4.
901 Luís Cruls, Planalto Central do Brasil, introdução de Gastão Cruls. São Paulo: 1957, p. 22.
903 T. de Sousa Lobo, São Paulo na Federação. São Paulo: 1924, p. 189.
905 Vítor Viana, Histórico da formação econômica do Brasil. Rio: 1922, p. 122. De 1890 a 1899, entraram 690.365
italianos (dos quais 430.243 em São Paulo) (v., editado pelo Banco do Brasil, O Estado de São Paulo. Rio: 1954, p. 71). Já
dez anos depois (J. F. Gonçalves Júnior, Serviço de povoamento em 1909. Rio: 1910, p. 10), para 99.017 imigrantes, a
quota italiana era de 13.668, a maioria destinada a São Paulo, e a portuguesa 30.577, a maioria para o Rio de Janeiro.
906 Com a restrição da imigração estrangeira e a abertura da estrada de rodagem Nordeste–Rio, articulada com a
Rio–São Paulo, temos índices expressivos da migração. Em 1950 recebeu São Paulo 100.123 nacionais e apenas 9.421
estrangeiros, em 1952, 252.808 nacionais e 57.512 estrangeiros, O Estado de São Paulo (publicação do Banco do Brasil, p.
77). A população estrangeira desse estado caiu de 929.851 em 1920 para 761.991 em 1940 (ibid., p. 73). Leia-se Castro
Barreto, Estudos brasileiros de população. Rio: 1947, pp. 115 e ss.; Geraldo de Menezes Cortes, Migração e colonização no
Brasil. São Paulo: 1958, p. 54.
907 Geraldo Menezes Cortes, op. cit., p. 63. Aí os quadros estatísticos (censos de 1940 e 1950) que mostram o volume
das migrações internas. “Vemos Alagoas, Sergipe, Paraíba, Minas, Rio Grande do Norte e Espírito Santo numa situação
de franca perda populacional”, ibid., p. 125.
908 Extensão da rede rodoviária: em 1952, federais, 12.315 quilômetros em tráfego, em 1956, 22.940; estaduais,
51.032, 61.092. Veículos em tráfego: automóveis, 338 mil em 1953, 396 mil em 1957, caminhões, 289 mil e 396 mil;
ônibus, 23 mil e 31 mil.
909 V. Henry William Spiegel, The Brazilian Economy. Filadélfia: 1949, p. 123.
913 Ministério das Relações Exteriores, Brasil 1936, p. 154; José Jobim, O Brasil na economia Mundial. Rio: 1939, p.
37; e História das indústrias no Brasil. Rio: 1941, p. 42; Otto Burger, Brasilien. Leipzig: 1926, p. 174.
914 Andreas Sprecher von Bernegg, Plantas tropicais e subtropicais na economia nacional, p. 310.
915 William Ashworth, A Short History of the International Economy. Londres: 1952, p. 200.
916 Ver A. Taunay, Pequena história do café no Brasil. Rio: 1945, p. 426; Brasil, 1936 (Ministério das Relações
Exteriores), p. 154; Von Bernegg, ibid., p. 314; Sousa Costa, Panorama financeiro e econômico da república. Rio: 1940, p.
111.
918 Henri Claude, De la Crise Économique à la Mondiale, cit. de E. Genet, L’Époque Contemporaine. Paris: 1951, p.
741.
919 V. George Soule, David Efron, Norman Twess, Latin America in the Future World. Nova York: 1945, p. 150.
920 V. Luís Amaral, História da agricultura brasileira. São Paulo: 1940, iii, pp. 108 e ss., “O que ocorreu na Noroeste
foi igual na Sorocabana e na Alta Paulista”.
921 Valor, em papel, da exportação: 1920, 860.958 mil contos; 1930, 1.827.577; 1940, 1.595.229; 1944, 3.879.348; 1946,
6.441.463; 1948, 9.018.564; 1949, 11.610.705; 1951, 19.447.884... Em dólares, os quinze e meio milhões de sacas em 1946
produziram 836 milhões; em 1957, 14.300.000 sacas — 846 milhões de dólares. A exportação entretanto conservou
relativa estabilidade, pois sendo de 14.800.000 em 1947, continuava de 14.300.000 dez anos depois. É ilusório falar do
excesso de produção no Brasil, pois esta não se refletiu maciçamente no mercado internacional.
923 V. resumo de Pereira da Costa, in Trabalhos de Conferência Açucareira do Recife. Recife: 1905, p. 32. A odisséia
do engenho central no Maranhão está detidamente descrita por Jerônimo de Viveiros, História do comércio do
Maranhão. São Luís: 1954, ii, pp. 524 e ss. A baixa do açúcar acentuara-se a partir de 1883, Maurício Lamberg, O Brasil,
trad. Luís de Castro. Rio: 1896, p. 79.
924 V. George Thomas Surface, The Story of Sugar. Nova York: 1910, p. 220. O trust americano (1889), a tarifa
preferencial em favor de Cuba, a exigência de um tipo de exportação segundo os últimos aperfeiçoamentos da indústria
do açúcar — o que dela excluía a produção inferior — acabaram por condenar o comércio brasileiro do açúcar a uma área
reduzida, limitando-o, vez por outra, ao consumo interno.
926 José Jobim, O Brasil na economia mundial, pp. 112–3. Basta ver que a área plantada em 1921 era de 479 mil
hectares, e em 1925 ainda não passava de 534 mil..., T. R. Day, Manual do algodão. Rio: 1926, p. 145. V. a tabela de
Spiegel, op. cit., p. 123. O salto foi de 515 toneladas de produção em 1932 para 153.640 em 1936 (O Brasil, 1936, p. 108,
publicação do Itamaraty), 211.437 em 1955.
927 Em 1943, valor do café exportado, 1.738 bilhões, do algodão 2.411 bilhões, Spiegel, ibid., p. 168. Relaciona-se o
aumento com as exigências da importação alemã e japonesa, Spiegel, ibid., p. 180.
928 Miguel Calmon, Fatos econômicos, pp. 191 e ss. Posição em 1932: Malaia 433,8 toneladas; Índia Holandesa 212,2;
Brasil... 8,7. Em 1937, 509,3, 440,3 e... 18,5.
929 Artur Neiva, Daqui e de longe, p. 119. Miguel Calmon previra o colapso para 1915; sobreveio dois anos antes. Mal
tentou o governo uma ilusória proteção da borracha..., Francisco de Assis Iglésias, Caatingas e chapadões. São Paulo:
1951. p. 65. — A catástrofe parecia certa, Carlos de Vasconcelos, Carta da América. Lisboa: 1912, p. 453; John Melby, in
The Hispanic American Review, agosto de 1942.
931 F. Vicente Viana, Memória sobre o estado da Bahia. Bahia: 1893, p. 285.
932 Mário Ferreira Barbosa, Anuário estatístico da Bahia, 1923, p. 36; Teodoro Sampaio, O estado da Bahia. Bahia:
1935, p. 23. Em 1924: 115.302 toneladas, Antônio Peixoto Guedes, Anuário estatístico da Bahia. Bahia: 1936, p. 170;
Brasil, 1943, publicação do Ministério das Relações Exteriores; Id., Brasil, 1956. 5% sobre o valor total da exportação,
rendeu a de cacau 69.700.000 dólares em 1957.
933 V. Rui Barbosa, Política e finanças da república (resposta a Salvador de Mendonça), p. 473.
934 Humberto Bastos, O pensamento industrial no Brasil. São Paulo: 1952, p. 35.
935 Le Brésil, ses richesses naturelles, ses industries. Paris: 1910, 2 tomos (por Vieira Souto).
938 V. panorama dessa progressão in José Jobim, História das indústrias no Brasil. Rio: 1941, pp. 20–1; J. F.
Normano, Evolução econômica do Brasil, trad. T. Q. Barbosa, R. P. Rodrigues e L. B. Teixeira. São Paulo: 1939, pp. 134–5.
939 De 244 mil kWh a potência elétrica em 1940, subiu em 1948 a 1.625 mil, era de 2.800 mil em 1954 e alcançou
3.550 mil em 1957, prevendo-se que atinja 5 milhões em 1960.
940 Pierre van der Meiren, Aspectos da formação e evolução do Brasil, in Jornal do Comércio. Rio: 1953, p. 414. A
produção per capita cresceu de 100 a 138 segundo os mesmos cálculos.
942 Distribuição de energia elétrica (1956), Norte e Nordeste, 598 usinas; Leste (com o Rio de Janeiro), 845; Sul, 777.
943 O contrato com a Itabira (Percival Farquhar) de 1920 não foi por diante devido à oposição do governo mineiro
(Bernardes), que receava se limitasse o concessionário a exportar o minério, v. Epitácio Pessoa, Pela verdade, p. 382,
Daniel de Carvalho, Capítulos de memórias, p. 184. Bernardes estava certo, ao querer assegurar a livre concorrência na
produção siderúrgica e o seu baixo preço, Daniel de Carvalho, ibid., p. 192. Seu sucessor, Raul Soares, negou-se a assinar o
contrato estadual com a Itabira Iron. Foi com a revolução de 1930 que se decidiu separar as questões, siderurgia e
exportação. Arrancam daí os dois empreendimentos, favorecidos pela cooperação norte-americana em 1941: Volta
Redonda e Vale do Rio Doce.
944 V. Conselho Federal do Comércio Exterior, Dez anos de atividade. Rio: 1944, p. 50. O principal técnico brasileiro
na criação da grande siderurgia de Volta Redonda foi o General Edmundo de Macedo Soares. Registando o progresso
industrial do Brasil, em 1957, o Serviço de Comércio Internacional, do Departamento do Comércio dos Estados Unidos,
salientou (junho de 1958) que Volta Redonda já produz 575 mil toneladas de laminados. Novas usinas, a do grupo de
Manesmann, a nipo-brasileira (Usiminas), a da Siderúrgica Paulista, em Piaçagüera, Aços Especiais de Itabira.
945 Leia-se, de Lobato, prefácio a Essad Bey, A luta pelo petróleo, trad. Charley Frankie. São Paulo: 1935; e O
escândalo do petróleo, depoimentos. São Paulo: 1936.
946 Um especialista estrangeiro impugnou o achado, dizendo que a amostra não era do local. Correu em auxílio de
Cordeiro (e da verdade) a técnica brasileira (Sílvio Fróis de Abreu, Augusto Fontenelle, Henry e Othon Leonardos).
947 Antônio Tenreiro, Itinerários da Índia a Portugal por terra. Coimbra: 1923, p. 32, 6ª edição, conforme a 2ª, de
1665, revista e prefaciada por Antônio Baião.
948 Leia-se Inácio Accioli, Memórias históricas e políticas da província da Bahia. Bahia: 1940, vi, p. 141 (edição de
Brás do Amaral). Refere-se aos estudos de Feldner, Martius e Spix.
949 Engenho apontado por Gabriel Soares (1584), desde meado do século xvii da família Moniz, descrito no princípio
do século seguinte por La Barbinnais, foi titular deste nome (Barão de Mataripe), Antônio Moniz Barreto de Aragão,
genro do Visconde da Torre e irmão do Barão de Moniz de Aragão, proprietário desse domínio cujas origens se
confundem com a do açúcar na Bahia.
950 Era 1957 acusou a Petrobrás um aumento de 150% em relação ao ano anterior, subindo a produção, de 90
toneladas (bruto) em 1951, para 1.321 em 1957. Quanto à refinação, a de gasolina, de 58 milhões de litros em 1951 passou
a 2.861 milhões em 1957 (Banco do Brasil, Relatório, 1957, p. 67).
954 Farias Brito. V. Jônatas Serrano, Farias Brito, o homem e a obra. São Paulo: 1939, p. 52.
955 Olavo Bilac, “Profissão de fé”, Poesias. Rio: 1923, p. 10, 10ª ed.
956 Afrânio Peixoto, Noções de história da literatura brasileira. Rio: 1932, p. 252.
957 De Cruz e Sousa, Obras poéticas (edição de Nestor Vítor, 1924, nova edição prefaciada por Andrade Murici,
Instituto do Livro, 1945). Incluem Broquéis, 1893; Evocações, 1898; Faróis, 1900; Últimos sonetos, 1905.
959 Andrade Murici, Panorama do movimento simbolista brasileiro. Rio: 1952, ii, p. 293.
960 Afrânio Peixoto, Ramo de louro. Rio: 1942, pp. 114 e ss. De Egas Moniz (Petion de Villar), Poesias escolhidas.
Lisboa: 1928.
961 Antônio Torres, prefácio de Eu e outras poesias, de Augusto dos Anjos, p. 25, 20ª ed.
964 Afonso Arinos, Histórias e paisagens. Rio: 1921, p. 225. Do mesmo autor, Lendas e tradições brasileiras. Rio:
1917.
967 V. Elói Pontes, A vida exuberante de Olavo Bilac. Rio: 1944, i, p. 231.
969 Gilberto Amado, O grão de areia e estudos brasileiros. Rio: 1948, p. 170.
970 Leia-se Brito Broca, A vida literária no Brasil, 1900. Rio: 1956, p. 106.
971 Coelho Neto, prefácio a Quadros de guerra, de Castro Meneses, Rio: 1917.
973 V. Tristão de Ataíde, Afonso Arinos. Rio: 1924, p. 194; Academia Brasileira, Curso de Romance, conf., 1952.
974 Canaã. Rio: 1902, p. 48. Discute-se a possibilidade ou o absurdo da civilização nos trópicos: Mikau, que sim,
Lentz, que não...
978 V. Cartas de Machado de Assis e Euclides da Cunha, ed. de Renato Travassos. Rio: 1931, p. 67.
980 Rui Barbosa, Conferência no Teatro Lírico, 20 de março de 1919. Desde 1952 em Taubaté se celebra a “Semana de
Monteiro Lobato”, recordado sobretudo por sua literatura infantil e pela “luta do petróleo”.
981 Mário de Alencar, discurso de 1918, Academia Brasileira, Discursos acadêmicos. Rio: 1935, iii, p. 75.
982 V. Fernão Neves (Fernando Néri), A Academia Brasileira de Letras. Rio: 1940, p. 22.
983 Correspondência de Machado de Assis, ed. de F. Néri. Rio: 1932, p. 31. A herança do livreiro Francisco Alves, em
1917, deu à Academia (que só tivera sede fixa em 1904, no Silogeu) substancia econômica, de que resultou o seu período
de influência, por vezes de esplendor. Em 1924 foi o cenário do cisma de Graça Aranha; em 1931 convencionava com a
Academia das Ciências de Lisboa (presidida por Júlio Dantas) a unificação ortográfica da língua portuguesa.
984 Sobre a evolução estética do autor de Quincas Borba, v. Alfredo Pujol, Machado de Assis. Rio: 1934, p. 101. A
opinião contraditória de Veríssimo e Sílvio (deste, Machado de Assis. Rio: 1936, p. 26, 2ª ed.). Saiu-lhe em defesa Lafaiete
Rodrigues Pereira, com o pseudônimo de Labieno, Vinditia. Rio: 1899. Leiam-se Alcides Maya, Machado de Assis —
Algumas notas sobre o “Humour”; Elói Pontes, A vida contraditória de Machado de Assis. Rio: 1939; Afrânio Coutinho,
A filosofia de Machado de Assis. Rio: 1939; Mário Matos, Machado de Assis. São Paulo: 1939; Peregrino Júnior, in Curso
de Romance, conf. na Academia Brasileira. Rio: 1952, p. 56; Raimundo Morais, Machado de Assis. Belém: 1939; Otávio
Mangabeira, Machado de Assis. Rio: 1954; R. Magalhães Jr., Machado de Assis: Desconhecido. São Paulo: 1955; Lúcia
Miguel-Pereira, Machado de Assis. 1955, 5ª ed.; J. Galante de Sousa, Bibliografia de Machado de Assis. Rio: 1955 e Fontes
para o estudo de Machado de Assis. Rio: 1958.
985 Eugênio Gomes, Influências inglesas em Machado de Assis. Bahia: 1939, pp. 12–4.
987 Menotti del Picchia, in Curso de Romance, conf. na Academia Brasileira, p. 20.
989 V. Alfredo Gomes, História literária, in Dicionário do Instituto Histórico. Rio: 1922, i, p. 1508.
991 V. carta de Veríssimo a Lima Barreto, Francisco de Assis Barbosa, A vida de Lima Barreto. Rio: 1952, p. 179.
993 Injusto será historiar a evolução das formas literárias na capital desprezando os núcleos autônomos em que se
desenvolveram, nos estados, alguns individualizados e fortes, como no Ceará, no Recife, na Bahia, no Paraná, no Rio
Grande, em Minas e São Paulo, principalmente em São Paulo donde veio para o Rio de Janeiro (1921 e 1924) a campanha
modernista. De “escola paulista” já falava João Pinto da Silva, Fisionomia dos novos. São Paulo: 1922, p. 175. O estudo
dessas incursões, da província para a corte (a mais substancial, a da “Escola do Recife”) merece atenção adequada. Sobre
grupos regionais, Afrânio Coutinho, Aderbal Jurema, Adonias Filho, Wilson Lousada, Edgard Cavalheiro, Augusto
Meyer, in Literatura no Brasil, direção do primeiro. Rio: 1955, vol. ii.
994 V. João do Rio, Na Conferência da Paz: A nova ação do Brasil. Rio: 1919.
996 João Ribeiro, crônica de 1o de novembro de 1924, Obras, publicação da Academia Brasileira, Os modernos. Rio:
1952, p. 32; Fernão Neves, A Academia Brasileira, p. 94. Leia-se Antecedentes da Semana de Arte Moderna, de Mário da
Silva Brito. São Paulo: 1958.
998 José Lins do Rego, Presença do Nordeste na literatura. Rio: 1957, p. 24.
999 Zeferino Brasil, Teias de luar. Porto Alegre: 1924, p. 24: “A prosa nova, firme e cristalina, / O verso para sempre
destronado”.
1000 Peregrino Júnior, in Curso de Teatro, Academia Brasileira de Letras. Rio: 1954, p. 92.
1001 Anais da Biblioteca Nacional, vol. liv; e José Honório Rodrigues, Alfredo do Vale Cabral. Rio: 1954, vol. lxxv dos
mesmos Anais.
1002 V. José Honório Rodrigues, A pesquisa histórica no Brasil. Rio: 1952, p. 133; e sobre a evolução dos métodos de
Capistrano, também J. H. Rodrigues, prefácio à Correspondência de Capistrano de Abreu. Rio: 1954, i, p. 41. Depois da
fase caótica de Melo Morais, Vale Cabral e Capistrano conciliaram a cultura histórica com o documento, o inédito, o
arquivo, faltando-lhes embora a pesquisa direta nos arquivos portugueses (como fizeram Varnhagen, Gonçalves Dias,
João Francisco Lisboa). Disto se ressente, por exemplo, a sua reconstrução conjetural do texto de Frei Vicente do
Salvador.
1003 Autor do Dicionário de brasileirismos, 1915, publicou Garcia a 3ª edição integral da História de Varnhagen, e,
dirigindo a Biblioteca Nacional, imprimiu e comentou valiosos inéditos.
1004 Alencar Araripe, prefácio à História do Brasil, de João Ribeiro, 1920, p. 10, 9ª ed.
1006 Não esqueçamos que Eduardo Prado é o Jacinto de A cidade e as serras, de Eça de Queirós, e no Brasil o
campeão da política nacionalista e católica (Capistrano de Abreu, Ensaios e estudos. Rio: 1931, i, pp. 343–4). Leia-se
Batista Pereira, “Eduardo Prado”, artigo in Comércio de São Paulo, 1902.
1007 José Veríssimo, História da literatura brasileira. Rio: 1954, p. 330, 2ª ed.
1008 “São 400 anos de vida”, Olavo Bilac, Últimas conferências e discursos. Rio: 1924, p. 57: essa vanglória, dos 400
anos paulistas, foi popularizada pelo discurso de Alcântara Machado, a 20 de maio de 1933, ao entrar para a Academia
Brasileira, Discursos acadêmicos, viii, p. 41.
1009 V. Licínio Cardoso, Figuras e conceitos. Rio: 1921, p. 174. Em 1957 com a Sociedade de Amigos de Afonso
Celso, a que não faltou apoio oficial, recobrou atualidade o otimismo do autor de Oito anos no Parlamento, elevado à
categoria de símbolo das boas previsões — em oposição ao negativismo sistemático.
1011 A literatura das bandeiras alicerçou-se nas coleções que, no governo de Washington Luís, desde 1920, revelaram
São Paulo colonial. Nela se destacam, além dos 11 tomos de Taunay (e resumo, 2 volumes, 1953), Calógeras, Alcântara
Machado, Washington Luís, Carvalho Franco, Ellis Júnior, Basílio de Magalhães, sem esquecer (predecessores)
Capistrano (Capítulos de história colonial, 1907), Diogo de Vasconcelos (História antiga e média de Minas Gerais, 1904 e
1908). Em seguida, Salomão de Vasconcelos (Bandeirismo), Paulo Setúbal, nas suas novelas, Cassiano Ricardo (Marcha
para Oeste, Bandeirologia), Sérgio Buarque de Holanda (Caminhos e fronteiras). Conf. na Rev. do Inst. da Bahia nº 54, 2ª
parte, p. 346 (1928).
1012 À parte os livros amenos, que popularizaram o assunto, de Setúbal, Viriato Correia, monografias e
documentação de Rangel, Assis Cintra, Argeu Guimarães, Amaral Gurgel, citemos: biografia de Dom Pedro i (Pedro
Calmon, O rei cavaleiro, 1933, 4ª ed.) e, apoiada aos arquivos do Castelo d’Eu, antes consultados por poucos (Tobias
Monteiro, Rangel, Heitor Lira), agora no Museu de Petrópolis, integral, A vida de Dom Pedro i, 3 tomos de Otávio
Tarqüínio de Sousa. De Dom Pedro ii elogiado por Afonso Celso, Múcio Teixeira, Taunay, fizemos a biografia (1938); e
nos deu H. Lira, História de Dom Pedro ii, 3 volumes (no mesmo ano). O Instituto Histórico dedicou-lhe, em 1925, um
tomo especial; e sobre aspectos do reinado a bibliografia é considerável (viagens, correspondência, anotações). Rangel
(como João Brígido) reabilitou o Conde d’Eu. Acrescentamos-lhe a biografia da princesa (1941). R. Magalhães Júnior
levou aplaudidamente ao teatro Carlota Joaquina, Vila Rica (Gonzaga e Marília), O imperador galante (Dom Pedro i).
Depois dos monumentos (de Dom Pedro ii, Petrópolis, 1911, Ceará, Bahia, Rio de Janeiro) as honras fúnebres. Foram
repatriados os restos mortais de Dom Pedro ii e da Imperatriz (1921), dos Condes d’Eu (1953); e a Prefeitura de São Paulo
mandou construir, na base do monumento do Ipiranga, o cenotáfio de Dom Pedro i e da Imperatriz Leopoldina.
1013 É o mais florescente dos gêneros, com retratos inteiros dos Nabucos, Andradas, Barbacena, Cairu, Cotegipe,
Sinimbu, Ottoni, Vergueiro, Feijó, Evaristo, Vasconcelos, Uruguai, Abaeté, Abrantes, Penedo, Olinda, Paraná, Mauá,
Tavares Bastos, Ponte Ribeiro; dos imperadores, do Conde d’Eu, da Princesa Isabel; de Caxias, Osório, Tamandaré,
Saldanha; figuras literárias, como os românticos (Gonçalves Dias, Castro Alves, Junqueira Freire, Alencar, Álvares de
Azevedo, Paulo Eiró, Casimiro de Abreu, Manuel de Almeida) e Machado, Bilac, Patrocínio, Pompéia, Arinos, Euclides,
Tobias, Sílvio, Capistrano, Artur Azevedo; e ainda Pinto de Campos, Luís Gama, Ouro Preto, Silveira Martins; a galeria
republicana de Castilhos, Manuel Vitorino, Pinheiro, Lucena, Benjamin, Rio Branco, Deodoro, Floriano, Prudente,
Rodrigues Alves, Campos Sales, José Marcelino, Nilo, Aristides Lobo, Bernardino de Campos, João Pinheiro, Fernando
Lobo, Antônio Prado, Epitácio, Afrânio de Melo Franco, Borges de Medeiros; mais favorecido pela análise e pela difusão,
Rui Barbosa...
1014 Memórias não constituíam gênero próspero no meio brasileiro, em que é tão lastimável a amnésia política... Aí
temos as do Visconde de Nogueira da Gama (1893), Pereira da Silva (1896), Minha formação, de Nabuco (1900), Jaceguai
(1906–17), Cristiano Ottoni (1908), José Carlos de Carvalho (1912), Campos Sales (1908), Dionísio Cerqueira, Ernesto
Matoso, Pires Brandão (Vultos do meu caminho, 1935), Oliveira Lima (1937), Ferreira de Resende (1944); livros de
Dantas Barreto, como Conspirações, 1917. Eduardo Ramos, Júlio Bello, Rodrigo Otávio; póstumas, Visconde de Taunay,
Conselheiro Albino, Custódio de Melo, André Rebouças; ainda Medeiros e Albuquerque, Elísio de Araújo, Graça Aranha,
Humberto de Campos; mais recentes, Setembrino de Carvalho, Memórias, 1952, Gilberto Amado, Luís Edmundo (O Rio
de Janeiro de meu tempo, Memórias), Graciliano Ramos, Ulisses Lins, José Maria Bello, João Neves.
1015 É copiosa a bibliografia centenarista, que começa, em 1896, com Anchieta, em São Paulo, e Antônio Vieira, na
Bahia, produz em 1900 o Livro do Centenário em 3 tomos, dá em 1903 o de Studart, Tricentenário do Ceará, provoca em
1907–8 os de Oliveira Lima e Capistrano, em 1922 lança o Dicionário do Instituto Histórico, os 5 tomos dos Anais da
Independência, e o volume especial da Revista do Instituto; a colônia portuguesa patrocina a monumental História da
colonização portuguesa do Brasil; em 1923 as publicações baianas sobre o 2 de julho, em 1925 resume-se num grosso
tomo do Instituto a apologia do imperador; as assembléias do Instituto de 1931, 38, 49, convidam à série comemorativa
do 4º centenário da Bahia, a coleção paulista de 1954... As celebrações regionais avultam com os congressos de história do
Rio Grande do Sul, de Santa Catarina, da Bahia, do Paraná, de São Paulo, do Recife.
1016 Institutos históricos à imagem do Brasileiro (1838) há, com crescente acervo de trabalhos, em quase todas as
capitais do país, na primeira plana São Paulo, Pernambuco, Bahia, Ceará, Rio Grande, Paraná, Santa Catarina; e arquivos,
além do Nacional (que tão valiosas publicações dá periodicamente) os de São Paulo, sendo que o da cúria inteiramente
catalogado, de Minas Gerais (com a esplêndida coleção de Publicações, desde 1898), da Bahia (cujos Anais formam uma
série de grande importância), de Porto Alegre, de Curitiba. Museus, o Nacional (especializado em antropologia e história
natural), o Histórico (1922, organizado e dirigido por Gustavo Barroso), o de Petrópolis (por Alcindo Sodré, 1938), o
Paulista (que, como aqueles, tem a seu crédito a coleção de Anais, publicados por Afonso Taunay e seu sucessor Sérgio
Buarque de Holanda), o da Bahia recomposto por José Valadares, o de Juiz de Fora (filantropia de Ferreira Lage em honra
do pai, Mariano Procópio), os de Porto Alegre, Recife, Curitiba... O Serviço do Patrimônio (criado pelo Ministro Gustavo
Capanema e dirigido por Rodrigo de Melo Franco de Andrade) tomou a si museus regionais, da Inconfidência, em Ouro
Preto, do Ouro, Sabará, das Missões, São Miguel, dos Diamantes, Diamantina. Tipos de museus especializados: da
república, Itu; de arte sacra, Bahia; a Casa de Rui Barbosa, no Rio (também centro de estudos, sob a direção de Américo
Lacombe).
1017 V. o balanço desta cultura in José Carlos de Macedo Soares, Fontes da história da Igreja Católica no Brasil. São
Paulo: 1954.
1018 Em 1928 a Câmara da Bahia votou a lei de proibição (imposto de 300%) da exportação de antigüidades, e a
criação da inspetoria estadual de monumentos nacionais, idéia ampliada, no âmbito federal, com o serviço do patrimônio
histórico e artístico nacional. Na mesma linha de ação: a lei que mandou conservar o Castelo da Torre (Governo de Góis
Calmon, 1927–8).
1019 Temos em vista: A Terra Goitacá, 8 volumes de Alberto Lamego, a série do Centenário de Petrópolis (1943), as
monografias amazonenses de Ferreira Reis, a História de Natal, de Câmara Cascudo, a obra de Gilberto Freyre
cristalizada em Região e tradição (1941), a história da Cidade do Salvador (Teodoro Sampaio, Afonso Rui, Tales de
Azevedo, Alberto Silva), monografias mineiras (a começar pelas histórias antiga e média de Diogo de Vasconcelos,
memórias do distrito diamantino de Felício dos Santos). História da Campanha da Princesa, em 3 tomos magistrais de
Alfredo Valadão; os livros sobre Conceição do Mato Dentro, Baependi, Ouro Preto, Pouso Alto, Mariana, o Serro,
Diamantina, Juiz de Fora, Belo Horizonte; a biblioteca paulista iniciada por Taunay, Azevedo Marques, Silva Leme, com
suas zonas, Taubaté, Itu, Sorocaba, Campinas, e a torrente de ensaios sobre a evolução de São Paulo; a nordestina, o que
se tem escrito no Paraná, Santa Catarina, Rio Grande, e nos estados do Oeste — cuja nominata está à espera de catálogo
analítico.
1021 Spencer Vampré, Memórias para a história da Academia de São Paulo, 1928, 2 vols.; Almeida Nogueira,
Tradições e reminiscências, 1908, 8 vols.
1023 V. Livro do Centenário dos Cursos Jurídicos. Rio: 1928, 2 vols. (síntese desta cultura).
1024 Clóvis Beviláqua, Código Civil anotado, 1921, vol. i; Lauro Romero, Clóvis Beviláqua. Rio: 1956.
1025 De J. L. Alves, Comentários ao Código Civil Brasileiro, 1923; Paulo de Lacerda, Manual de Código Civil (1º
tomo, 1929); Lacerda de Almeida, Direito das cousas, Direito das obrigações, Sucessões.
1027 João Monteiro, Curso de Processo Civil. São Paulo: 1936, p. 166, 5ª ed.
1028 Edição de Homero Pires, Rui Barbosa, Constituição Federal Brasileira. São Paulo: 1935, 5 tomos.
1029 Explicamos a posição da disciplina no quadro didático, em nossa Teoria geral de Estado. Rio: 1958, 5ª ed., pref.
O livro de Queirós Lima é de 1935.
1030 V. a bibliografia da especialidade, cujo mestre hoje é o Prof. Haroldo Valadão, Rodrigo Otávio, Dicionário de
direito internacional privado. Rio: 1933, p. 403.
1033 Leia-se José Pedro Galvão de Sousa, in Anais do 1º Congresso Brasileiro de Filosofia, i, pp. 142–3. O pensamento
de Pedro Lessa, in Estudos de filosofia do direito, p. 12.
1035 Afrânio Peixoto, Breviário da Bahia. Rio: 1946. E Henriques Guedes de Melo, Reminiscências da vida
acadêmica. Rio: 1932.
1037 Fernando Magalhães, O Centenário da Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro. Rio: 1932, p. 157. Quanto à da
Bahia, Fernando Luz, História da 1ª Cadeira de Clínica Cirúrgica. Bahia: 1934, p. 24; Otávio Torres, Esboço histórico dos
acontecimentos mais importantes da vida da Faculdade de Medicina da Bahia. Bahia: 1946, p. 58; Pacífico Pereira,
Memória sobre a medicina na Bahia, 1923; Gonçalo Moniz, A medicina e sua evolução na Bahia, 1923; A medicina no
Brasil. Rio: 1940 (direção de Leonídio Ribeiro).
1038 Fernando de Azevedo, A cultura brasileira. Rio: 1943, p. 234; Afrânio do Amaral, in O Estado de São Paulo, 24
de janeiro de 1954, p. 100.
1040 Roquette-Pinto, Ensaios brasilianos, p. 104. Em 1896 Adolfo Carlos Lindenberg preconizara os raios x,
Academia Nacional de Medicina, Em comemoração do centenário do ensino médico. Rio: 1908, p. 672.
1041 Pedro Calmon, O Palácio da Praia Vermelha. Rio: 1953 (a propósito do centenário do Hospício).
1042 Que o homem do Brasil precisa ser educado e não substituído..., Roquette-Pinto, Nota sobre os tipos
antropológicos, Arquivos do Museu Nacional. Rio: 1928, xxx. Tese: O exercício da medicina entre os índios da América.
Rio: 1906.
1043 Afrânio Peixoto, Um século de cultura sanitária. São Paulo: 1922, p. 49.
1045 V. a sua repercussão em São Paulo, Paulo Nogueira Filho, Ideais e lutas de um burguês progressista, i, p. 76, ii, p.
630.
1046 Nina Rodrigues, As raças humanas e a responsabilidade penal no Brasil. Bahia: 1894; L’Animisme fétichiste des
nègres de Bahia, Os africanos no Brasil (livro póstumo). São Paulo: 1935, 2ª ed., prefácio de Homero Pires.
1049 De Clóvis Beviláqua, Juristas‑Filósofos. Bahia: 1898, p. 4. Na linha tradicional: Soriano de Sousa, João Mendes
Júnior, Lafaiete Rodrigues Pereira, Lacerda de Almeida, a escola teuto‑sergipana (na sátira de Carlos de Laet, atirada a
Sílvio Romero) contra a galo‑ ‑fluminense (como respondeu Sílvio).
1051 Bibliografia de Almáquio Dinis. Rio: 1953 (organizada por Alfeu Dinis Gonçalves), documentário da corrente
dominante.
1052 Do mestre de filosofia do direito na Bahia, Virgílio de Lemos, Classificação dos conhecimentos humanos e das
ciências jurídicas. Bahia: 1921.
1053 João Camilo de Oliveira Torres, O positivismo no Brasil. Rio: 1943, pp. 241 e ss. Cruz Costa, O positivismo na
república. São Paulo: 1956, pp. 14 e ss.; e Contribuição à história das idéias no Brasil. Rio: 1956, pp. 361 e ss.
1055 Alcides Gentil, As idéias de Alberto Torres. São Paulo: 1938, p. 310. Euclides, Torres, Farias Brito, “três marcos
iniciais decisivos da independência espiritual”, V. Licínio Cardoso, Figuras e conceitos. Rio: 1921, p. 175. A Tobias faltara
originalidade, Antônio Gomez Robledo, La Filosofia en el Brasil. México: 1946, pp. 112–4; A. Sabóia Lima, Alberto Torres
e a sua obra. Rio: 1918, p. 52.
1058 Sílvio Romero, Estudos sociais, p. 16. V. bibliografia in Carlos Süssekind de Mendonça, Sílvio Romero: Sua
formação intelectual, pp. 321–29, e, de Sílvio Rabelo, Itinerário de Sílvio Romero. Rio: 1940. Merecem citados, além da
História da literatura (1888, 1902, agora em 6ª ed.); Parlamentarismo e presidencialismo, 1894; Ensaios de filosofia do
direito, 1895; O Brasil social, 1907; A geografia da politicagem, 1912.
1059 Príncipe Luís de Orléans e Bragança, Sous la Croix du Sud. Paris: 1912, p. 13.
1061 Recenseamento do Brasil, Introdução. Rio: 1922, p. 314. Sobretudo: Populações meridionais do Brasil, 1922,
dolicóides e braquióides...
1062 Resume o seu pensamento in Instituições políticas brasileiras. Rio: 1949, i, pp. 320–4. Quis demonstrar que as
populações não ultrapassaram a solidariedade do clã, com fraco sentimento dos interesses nacionais, na pauta da escola
social de Domolins, Tourville... Dogmatizaria, que se ruma para um único tipo de Estado, o nacional (ibid., i, p. 115) e
pregou o abrasileiramento das estruturas (Problemas do direito sindical. Rio: 1944, p. 12), corifeu que era da organização
corporativa. Foi o grito de Jackson de Figueiredo, em 1920, Correspondência. Rio: 1945, p. 351, 2ª ed.
1064 Evaristo de Morais, prefácio a O trabalho e o salário, de Francisco Frola. Rio: 1937, p. 8.
1065 Humberto de Campos, Memórias inacabadas. Rio: 1935, p. 158. Era o que se lia em 1900. A respeito do que se
lia em 1906, Gilberto Amado, A dança sobre o abismo. Rio: 1952, pp. 172–3.
1066 Farias Brito, Finalidade do mundo, i, pp. 21–2 (nova edição, 3 vols., Rio: 1958).
1067 V. Jônatas Serrano, Farias Brito: O homem e a obra. São Paulo: 1939; Jackson de Figueiredo, Algumas reflexões
sobre a filosofia de Farias Brito, 1919; Nestor Vítor, Farias Brito, 1920. Alceu Amoroso Lima (Tristão de Ataíde), Estudos.
Rio: 1927, 1ª série; e bibliografia coligida na citada obra de J. Serrano; crítica do Pe. Leonel Franca, Noções de história da
filosofia, p. 322 (13ª ed., Rio: 1952); Francisco Elias de Tejada, As doutrinas políticas de Farias Brito, trad. Arlindo Veiga
dos Santos. São Paulo: 1952.
1068 Discurso de Brasílio Machado (Alcântara Machado, Brasílio Machado. Rio: 1937, p. 194), 1896: “Mas eis que
inesperadamente se abre este recinto”.
1070 Jackson de Figueiredo, Algumas reflexões sobre a filosofia de Farias Brito. Rio: 1916; Xavier Marques, Dois
filósofos. Bahia: 1916.
1071 Subtítulo do seu livro de 1916. De Jackson, Pascal e a inquietação moderna, 1924; e a seu respeito, In memoriam,
edição do Centro Dom Vital, Rio: 1929. Também Correspondência. Rio: 1945, p. 348, 2ª ed.: “As idéias, a vida de Farias
Brito são para mim o que mais importa”.
1073 Pe. Leonel Franca, A Igreja, a Reforma e a civilização. Rio: 1923, p. 527. Devemos-lhe primeira tentativa de
história didática das idéias. Jackson, Literatura reacionária. Rio: 1924, p. 29. Refere-se à 2ª edição da História da filosofia
(hoje na 14ª). De Franca, O divórcio, 1937, 3ª ed.; A crise do mundo moderno, 1941, Obras completas, v. Pe. Luís
Gonzaga da Silveira d’Elboux, O Padre Leonel Franca. Rio: 1953. A Jackson sucedeu no Centro Dom Vital Alceu
Amoroso Lima, neotomista como Maritain.
1076 V. a crítica de Oliveira Lima, Memórias, p. 168, em que diz que o livro sobre a democracia federal de Assis Brasil
foi haurido na convivência acadêmica de Castilhos, colega e cunhado.
1077 José Maria dos Santos, A política geral do Brasil. Rio: 1930, p. 456.
1078 Euclides, Da independência à república, 1908; Calógeras, Formação histórica do Brasil, 1920.
1080 Campanha presidencial. Rio: 1919, p. 11; A questão social e a política no Brasil, conferência no Lírico, 20 de
março de 1919, a que aludimos.
1082 Jornal do Comércio, Rio: 22 de fevereiro de 1932 (a propósito do programa do Ministro do Trabalho, Lindolfo
Collor).
1083 “Estou, senhores, com a democracia social”, dissera Rui na citada conferência de 20 de março. Quanto à idéia no
estrangeiro, R. G. Gettell, História das idéias políticas, trad. F. Salgueiro. Lisboa: 1936, p. 548.
1084 Pontes de Miranda, À margem do direito, Rio: 1912, p. 125, augura o federalismo sindicalista.
1085 Alceu Amoroso Lima, Obras, e em especial Meditação sobre o mundo moderno, Rio: 1942.
1086 Merece especial menção Henrique Morize, um dos animadores da Academia Brasileira de Ciências (1916), que
em 1919 ligou o nome ao de Einstein, indo ao Ceará observar o eclipse do Sol, que lhe confirmou a teoria do peso da luz,
base da física nuclear.
1087 Maurício Joppert, citado por Saturnino de Brito Filho, A engenharia no Brasil. Rio: 1949, p. 53.
1090 Ao professor de história da arquitetura Paulo Santos agradecemos as informações constantes do seu discurso do
centenário de Morales de los Rios e da oração paraninfal na Faculdade Nacional de Arquitetura, de 1953.
1091 De Lúcio Costa, Depoimento de um arquiteto carioca, pp. 30–1, e Considerações sobre arte contemporânea
(Cadernos de Cultura), Rio.
1092 Consideraram o edifício do Ministério da Educação paradigma desta nova expressão, Louis Réau, Encyclopédie
de l’art. Paris: 1951; Germain Bazin, Histoire de l’art. Paris: 1954. Em linhas gerais Le Corbusier fizera edifícios análogos
(Maison Suisse, da Cité Universitaire, de Paris), porém nenhum com “a significação plástica estupenda” daquele (Paulo
Santos).
1093 V. Philip L. Goodwin, Brazil Builds, The Museum of Modern Art, Nova York, 1943.
1095 Carlos Rubens, Pequena história das artes plásticas no Brasil. São Paulo: 1941, p. 160.
1096 Laudelino Freire, Um século de pintura. Rio: 1916, p. 514; José Maria dos Reis, História da pintura no Brasil. São
Paulo: 1941, p. 241.
1097 Ilustrador desta História, seu último trabalho, Wasth Rodrigues (falecido em 22 de abril de 1957) merece
referência comovida, entre os mestres.
1098 Carlos Rubens, op. cit., p. 262.
1099 Ernesto Sousa Campos, Educação superior no Brasil. Rio: 1940, p. 298, pass.
1100 Sousa Campos, História da Universidade de São Paulo. São Paulo: 1954, p. 100.
1101 Números atuais no país: ensino primário, 5.768.727 matrículas (1958); médio, 993.877; superior ou
universitário, 84.000. O ensino médio — conforme a mesma estatística — passou de 65 mil em 1932 àquela cifra em 1958.
1102 V. Alceu Amoroso Lima, Quadro sintético da literatura brasileira. Rio: 1956, p. 109. Sem pretender fazer crítica,
mas leve história do movimento geral das letras, também não insistimos em definições didáticas. Contentamo-nos com o
resumo objetivo (inseparável, pelo visto, da sensibilidade do autor) que tem apenas a vantagem de incluir no conjunto da
evolução as correntes intelectuais, de ordinário isoladas nos livros especializados.
1103 Exemplo; conferências da Semana da Arte Moderna, a de Graça Aranha na Academia, em continuação aos
ciclos do Rio, de 1905, de 1910 (v. Brito Broca, A vida literária no Brasil, 1900, p. 137), esplendor e mania de uma
sociedade civilizadamente auditiva. Foi o tempo (coincidente como é óbvio, com iguais hábitos parisienses) das
conferências de viajantes ilustres, embaixadores verbais do Velho Mundo, Ferrero, Anatole France, Ferri, Paul Adam...
Congressos que marcaram época, o afro-brasileiro do Recife. Cursos: os da Academia Brasileira, a começar pelo de
Camões, 1942, romance, teatro, crítica, jornalismo, história, oratória...