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Introdução
Como se sabe o léxico de uma língua é o conjunto de palavras criadas e assimiladas pelo
homem que o utiliza para interagir com a sociedade. É através dele que se evidenciam características
próprias dos falantes, visto que cada indivíduo imprime as suas características na língua devido a
diferentes fatores que propiciam a variação linguística. Tais fatores podem ser chamados de variáveis
que podem ser de sexo, de nível de escolaridade, de faixa etária, de classe social, de lugar.
Este estudo focaliza a questão da variação lexical do homem amazonense, orientado pelos
pressupostos teóricos fornecidos pela Dialetologia e pela Geolinguística e levando em conta variáveis
sociolinguísticas como idade e gênero.
1 Referencial Teórico
De acordo com CALVET (2002, p. 143) “o objeto de estudo da lingüística não é apenas a
língua ou as línguas, mas a comunidade social sob seu aspecto lingüístico”. É necessário conceber a
abordagem dos fatos da língua como um vasto continuum, que vai do analógico ao digital, das relações
sociais à minudência dos fatos lingüísticos.
Na verdade, as línguas mudam todos os dias, elas evoluem e tais mudanças estão relacionadas
tanto à variação diacrônica (do grego dia + kronos = ao longo de, através de + tempo) quanto à
variação sincrônica (do grego sy'n = simultaneidade). Assim, numa mesma língua podemos perceber a
coexistência de formas diferentes para um mesmo significado, como por exemplo, as lexias lago,
riacho, rio estreito, cabeceira, lagos, entre outras para designar igarapé (carta léxica I do ALAM).
1
(covert prestige, Labov, 1972).
2788
Podemos ter ainda as variáveis geográficas, na qual a mesma língua pode ser pronunciada
diferentemente, ou ter um léxico diferente em diferentes pontos do território.
Desse modo, no Brasil, o mesmo tubérculo pode ser chamado de aipim na Bahia, macaxeira,
no Acre e mandioca em São Paulo, por exemplo. Entende-se por variável o conjunto constituído pelos
diferentes modos de realizar a mesma coisa (um fonema, um signo) e por variante cada uma das
formas de realizar a mesma coisa, como nos exemplos descritos.
A palavra léxico, segundo J. Dubois (1993, p. 364), “designa o conjunto das unidades que
formam a língua de uma comunidade, de uma atividade humana, de um locutor”.
Mattoso Câmara (1999, p. 157) entende léxico como
Tomando por base as definições acima, pode-se concluir que o vocabulário de uma pessoa é
apenas parte de seu léxico. Desse modo, o vocabulário está para o léxico assim como a fala está para a
língua.
De acordo com Ferreira & Cardoso (1994, p. 11), “em uma língua histórica, existem três tipos
fundamentais de diferenças internas: 1) diferenças de espaço geográfico ou diferenças diatópicas; 2.
diferenças entre os distintos estratos socioculturais de uma mesma comunidade idiomática, ou
diferenças diastráticas; 3. diferenças entre os tipos de modalidade expressiva, de estilos distintos,
segundo as circunstâncias em que se realizam os atos de fala ou diferenças diafásicas”.
E a esses três tipos acrescentam-se as diferenças etárias, geracionais, assim definidas:
1) variação diagenérica - trata-se da variação relacionada ao gênero (masculino e/ou
feminino) do informante;
2) variação diageracional - diz respeito à variação relacionada à faixa etária do informante.
Assim, as variações lingüísticas são as diferentes manifestações e realizações da língua
decorrentes de fatores de natureza histórica, regional, social ou situacional.
Nesse trabalho serão consideradas as variações diageracionais e diagenéricas.
Por ser um estudo de base dialectológica e sociolingüística cabe, aqui definir e distinguir essas
duas ciências:
De um lado, temos a Dialectologia que analisa a relação existente entre a língua e o espaço
geográfico e, de outro, a Sociolingüística estuda a relação entre a língua e a sociedade.
Como diz Silva-Corvalán (1988, p. 8):
A dialetologia é uma disciplina com larga tradição, com uma medotologia bem
estabelecida e uma rica e valiosa literatura. É indiscutível que a dialetologia trouxe
contribuições de importância à sociolingüística e à lingüística geral.
Para Dubois (1993, p. 561) “A sociolingüística é uma parte da lingüística cujo domínio se
divide com a etnolingüística, da sociologia, da linguagem, da geografia ling6uística e da dialetologia”.
E continua afirmando que “A sociolingüística tem como tarefa revelar, na medida do possível,
a covariação entre os fenômenos lingüísticos e sociais e , eventualmente estabelecer uma relação de
causa e efeito”.
Assim, a Sociolingüística é a ciência que estuda a língua da perspectiva de sua estreita ligação
com a sociedade onde se origina. Se para certas vertentes da lingüística é possível estudar a língua de
forma autônoma, como entidade abstrata e independente de fatores sociais, para a sociolingüística a
língua existe enquanto interação social, criando-se e transformando-se em função do contexto sócio-
histórico.
A sociolingüística, desenvolvida em grande parte por William Labov (1969, 1972, 1983),
permitiu o estudo científico de fatos lingüísticos excluídos até então do campo dos estudos da
linguagem.
3 Metodologia
semi-alfabetizados e com 1º grau até a 4ª série. Todos são naturais da cidade objeto de estudo e com
boas condições de fonação.
Efetuou-se, primeiramente, o levantamento das ocorrências (basicamente composta de
substantivos e adjetivos) levando-se em consideração somente a lexia de maior freqüência, a qual
aparece registrada nas cartas léxicas como a primeira da legenda. Elaboramos algumas tabelas
contendo:
1. A variação semântico-lexical encontradas nas cartas referentes aos fenômenos da natureza
presentes no ALAM (1 a 13) de acordo com a faixa etária e o gênero do informante;
2. A significação das lexias com a datação, a significação do termo, classe morfológica e a
etimologia de acordo com a versão eletrônica do dicionário Antônio Houaiss, 2008;
3. A freqüência das lexias encontradas nas cartas referentes aos fenômenos da natureza
presentes no ALAM (1 a 13) de acordo com o gênero e as faixas etárias;
4. Uma tabela geral de todos os dados coletados de acordo com o gênero e as faixas etárias dos
informantes.
Após esses levantamentos, cinco gráficos foram elaborados, a fim de dar uma visão melhor dos
dados obtidos.
4.1 Nome da carta seguida da lexia de maior freqüência: As cartas analisadas foram as descritas
abaixo seguidas das lexias de maior freqüência: 1. Igarapé, maior freqüência foi igarapé; 2.
Redemoinho (de água), maior freqüência foi redemoinho de água; 3. Vazante, a de maior freqüência
foi seca; 4. Tipitinga sendo que a forma de maior freqüência foi toldada; 5. Restinga, a forma de
maior freqüência foi várzea; 6. Cipó-timbó, a forma de maior freqüência foi timbo; 7.Cova, a forma de
maior freqüência foi cova; 8.Redemoinho (de vento), a forma de maior freqüência foi redemoinho de
vento; 9. Raio, a forma de maior freqüência foi raio;10. Garoa, mas a forma de maior ocorrência foi
chuvisco; 11. Arco-íris, a forma de maior freqüência foi arco-íris; 12. Orvalho, mas a forma de maior
freqüência foi sereno; 13. Nevoeiro, sendo que a forma de maior freqüência foi neve.
4.2 Tabelas sobre a freqüência das lexias encontradas nas cartas referentes aos fenômenos da
natureza presentes no ALAM (1 a 13) de acordo com o gênero e as faixas-etárias:
LEXIAS 1 2 3 TOTAL
M F M F M F M F
1. Igarapé 6 2 6 5 6 3 18 10
2. Redemoinho 4 5 - 3 - 1 04 09
3. Seca 3 2 5 2 5 3 13 07
4. Toldada 1 1 2 - 1 - 04 01
5. Várzea 7 2 5 4 5 2 17 08
6. Timbó 4 - 7 4 7 2 18 06
7. Cova 3 - 4 5 4 3 11 08
8. Redemoinho 5 5 4 9 6 7 15 21
9. Raio 4 5 6 8 3 4 13 17
10. Chuvisco 3 5 2 3 3 3 08 11
11. Arco-íris 4 4 1 5 4 5 09 14
12. Sereno 3 3 4 6 7 3 14 09
13. Neve 1 1 2 4 5 5 08 10
TOTAL 48 35 48 58 56 41 - -
Assim representada no gráfico abaixo:
2791
41
Faixa 3
56
58 Mulher
Faixa 2
48 Homem
35
Faixa 1
48
Homem
20
15
10
0
Igarapé Seca Toldada Várzea Timbó Cova Sereno
Homem 18 13 4 17 18 11 14
seca (13); c) toldada (4); d) várzea (17); e) timbó (18); f) cova (11); g) sereno (14), conforme se
observa no gráfico 3 abaixo:
Mulher
25
20
15
10
M ulher 9 17 14 11 10 21
20
n.º de oc orrênc ias
15
10
0
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6
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m
de
de
Re
Re
F orma s lex ic a is F1 F2 F3
Assim, na soma das lexias temos 152 no masculino e 134 no feminino, perfazendo um total de
286 lexias. A tabela demonstra que os homens realizaram mais as formas analisadas do que as
mulheres. Em relação à faixa etária, temos na faixa 1 um total de 83 realizações, na faixa 2
encontramos 106 lexias e na faixa 3 um total de 97 lexias o que demonstra que a faixa 2 teve maior
freqüência.
Considerações Finais
A abordagem dos aspectos de gênero e faixa etária neste estudo demonstra que a língua é um
fato social, heterogênea e que está sempre recebendo variações no léxico. Ela é dinâmica.
Assim, de acordo com o levantamento nas 13 cartas léxicas do Atlas Lingüístico do Amazonas
– ALAM constatou-se um total de 286 lexias registradas no gênero masculino e feminino sendo 152, e
134, respectivamente, o que representa 3,24% de diferença de um sexo em relação ao outro (18
lexias), demonstrando, desse modo, que os dados são equivalentes. De qualquer modo, mesmo que a
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diferença seja pequena, ficou demonstrado que os homens utilizam mais o vocabulário proposto no
ALAM, no campo semântico O homem e a natureza seja por estarem mais envolvidos nas atividades
de subsistência como caça e pesca ou no exercício de seus trabalhos. Daí, terem apresentado uma
utilização de 7 lexias em relação às mulheres que foi de 6.
Por outro lado, na variação diageracional as mulheres apresentaram uma freqüência maior na
faixa-etária 2 com um total de 58 lexias enquanto o homem apresentou 48 lexias, conforme tabela 4.4
e gráfico 1. Observou-se que as lexias mais utilizadas referem-se aos fenômenos de natureza como
raio, arco-íris, redemoinho (1 e 2), chuvisco e neve.
Em relação às faixas 1 e 3 o maior número de ocorrências foi encontrado no gênero
masculino.
Assim, podemos concluir que no tocante às variações diagenéricas e diageracional pode-se
considerar que o gênero masculino se sobressaiu tanto em relação ao número de ocorrências das lexias
(152) quanto nas faixas etárias 1 e 3, especificamente.
De acordo com o levantamento feito no dicionário eletrônico Houaiss constatou-se a
dicionarização de 12 lexias, com exceção de toldada que não está dicionarizada, mas que tentamos dar
uma significação de acordo com nosso conhecimento da região.
Salientamos que para nossa surpresa a carta semântico-lexical (11) arco-íris não obteve
nenhuma variante, haja vista a difersidade encontrada em outros atlas brasileiros como o Atlas prévio
dos Falares Baianos que registra para essa forma as variantes: arco da velha, arco de boi, arco celeste,
entre outras. Por outro lado, cartas como a 1 – igarapé recebeu 12 variantes: lago, riacho, lago,
afluente, paraná, lagoa, cabeceira, rio estreito, laguinho, poço, estreito, repartimento de cabeceira.
As demais variaram como a carta 10 chuvisco encontramos 10 variantes e a carta 8 – redemoinho (de
vento) com duas variações: redemoinho e furacão.
Por fim, foi importante a pesquisa no ALAM, primeiro por ser o primeiro atlas lingüístico, no
Brasil, a controlar, de forma sistemática, a variável faixa etária. Segundo, porque o mesmo é uma
significativa contribuição para a delimitação das áreas lingüísticas brasileiras, sobretudo por ter sido
elaborado numa região na qual os trabalhos dialetais ainda são pouco explorados.
Referências
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