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Lingua Portuguesa
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Sumário:
1. Conceitos fundamentais: língua, linguagem e fala. Norma e variações da língua
(diacrónicas, diastráticas, diafásicas e diatópicas).
2. Estrutura e natureza da gramática tradicional: Fonética, morfologia, sintaxe e
semântica.
3. Os sons e as letras.
4. A ortografia (conceito e breve referência ao Acordo Ortográfico em discussão)
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2. Língua
Em Linguística Geral: O termo língua (langue) surge, antes de mais, oposto a fala
(parole), segundo F. Saussure, representando uma das dicotomias mais importantes da história da
linguística. A língua é uma entidade social e colectiva cuja actualização individual se opera pela
fala. Por outras palavras, a língua é um sistema de signos com uma gramática própria, que é
partilhado por uma comunidade de falantes.
Em Fonética: órgão musculoso que constitui um articulador activo e que intervém na
produção dos sons da fala.
Outras acepções: o termo língua entra em inúmeros pares dicotómicos, como língua
natural/ língua artificial, língua materna/ língua estrangeira, língua viva/ língua morta, e em
expressões como língua franca, língua oficial, línguas em contacto, família de línguas e tipologia
de línguas.
3. Fala
Em linguística geral: o termo fala (parole) opõe-se a língua (langue), segundo F. Saussure,
constituindo uma das oposições mais célebres da história da linguística moderna. A fala é a
realização individual da língua, que é uma entidade social e colectiva. A fala é a manifestação
externa, visível da língua, influenciável por factores fisiológicos, psicológicos, contextuais, ao
passo que a língua é um código, regulado por uma gramática. A forma como cada indivíduo
actualiza, usa, emprega esse código constitui a fala. Chomsky revisitou a oposição língua/ fala
substituindo-a pelo par competência/ performance.
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Cf. BORREGANA, A. (2005), Gramática da Língua Portuguesa, 9ª Ed., Lisboa, Texto Editores, p.19.
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guns factores de diversidade: o nível socio-económico, determinado pelo meio social onde vive
um indivíduo; o grau de educação; a idade e o sexo. A variação social não compromete a
compreensão entre indivíduos, como poderia acontecer na variação regional; o uso de certas
variantes pode indicar qual o nível socio-económico de uma pessoa, e há a possibilidade de alguém
oriundo de um grupo menos favorecido atingir o padrão de maior prestígio.
5. Gramática
Termo muito frequente em linguística e didáctica das línguas que encerra várias acepções,
tendo surgido por isso expressões lexicalizadas como gramática interiorizada e pares de opostos
como gramática prescritiva/ gramática descritiva, gramática/ vocabulário, gramática tradicional/
gramática generativa. Sendo efectivamente muitas as acepções possíveis para o termo gramática,
apresentaremos e definiremos as quatro acepções mais utilizadas em linguística e didáctica das
línguas:
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pelo falante) e fala (performance ou actualização dessa competência linguística); entre modo
escrito e modo falado da língua, com primado do oral sobre o escrito; entre sincronia (estudo da
língua num determinado tempo-espaço) e diacronia (estudo da língua ao longo do tempo),
compreendendo a mudança linguística como parte do processo natural de evolução e vitalidade
das línguas. Nesta acepção de gramática adopta-se o uso que é feito pelos falantes da língua como
critério e não a regra cristalizada nas gramáticas escolares. Há também uma separação muito clara
entre objectivos de descrição gramatical e juízos avaliativos de ordem socio-cultural ou estética,
pelo que todos os textos e discursos são passíveis de serem estudados e analisados e não apenas o
texto literário. Esta noção está associada a uma visão mais moderna e científica do estudo da
linguagem, pelo que a ela se têm vinculado algumas correntes da linguística, sendo por isso
possível encontrar expressões como gramática de valências ou gramática generativa.
6. Partes da gramática
6.1. Sintaxe
Estudo do modo como as palavras se podem organizar entre si para formarem frases. É a
componente da gramática que se ocupa da descrição do conhecimento sintáctico intuitivo e
interiorizado, traduzível pela capacidade que os falantes têm de decidir se uma frase é gramatical
(bem formada segundo as regras da língua) ou agramatical (não aceitável, não permitida pelas
regras da língua). Este conhecimento é responsável pela criatividade linguística, isto é, a
capacidade de produzir e compreender um número ilimitado de frases nunca antes produzidas
usando um número limitado de elementos: o léxico e as regras (…) Em sintaxe para além das
regras de formação da frase simples, estuda-se também a formação de frases complexas e o modo
como elas se articulam entre si.
A sintaxe foi sempre uma dimensão privilegiada pela gramática tradicional, de tradição
greco-latina, e pela didáctica das línguas, que desenvolveu uma terminologia e metalinguagem
nem sempre coincidentes com as adoptadas pelas várias correntes da linguística moderna que se
têm debruçado sobre a componente sintáctica das línguas.
6.2. Morfologia
Disciplina da linguística que descreve e analisa os processos e regras de formação e de
criação de palavras, a sua estrutura interna, a composição e a organização dos seus constituintes.
A morfologia tem a palavra como objecto de estudo, sendo que a palavra encontra no morfema a
sua unidade mínima de análise.
6.3. Semântica
Disciplina da linguística que se ocupa do estudo do significado das expressões linguísticas
(sejam elas fonemas, morfemas, palavras, sintagmas, frases) bem como das relações de significado
que essas expressões estabelecem entre si e com o mundo.
A semântica tem sido dividida em dois planos, de acordo com a unidade em análise: a
semântica da palavra e a semântica da frase. A semântica da palavra estuda as relações de
significado entre pares de palavras ou entre morfemas. São objecto de estudo as relações de
sinonímia, antonímia, hiperonímia, hiponímia, ambiguidade lexical, polissemia, homonímia,
metáfora e metonímia. A semântica da frase interessa-se por questões de ambiguidade estrutural,
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anomalias na disposição das palavras na frase, por relações de paráfrase, contradição, implicação
semântica e pressuposição.
6.4.1. Alfabeto
Sistema de escrita de uma língua natural em que, teoricamente, a um grafema corresponde
um único fonema. Na verdade, este é o princípio subjacente à construção de todos os alfabetos,
embora várias razões contribuam para o não cumprimento desta correspondência perfeita entre
símbolos e sons, normalmente relacionadas com a permanente evolução das línguas na sua
modalidade oral.
A razão da expansão dos alfabetos prende-se com o facto de estes terem provado ser
sistemas de escrita muito económicos e avançados, quando comparados, por exemplo, com os
sistemas de escrita silábicos (como o silabário do Etíope básico, o japonês moderno) ou
logográficos (como o chinês e também o japonês), uma vez que permitem representar toda a
realidade sonora da língua utilizando um número reduzido de símbolos.
São inúmeros os alfabetos conhecidos, sendo os mais antigos os alfabetos fenícios e os mais
correntes os alfabetos grego, o latino, o cirílico e o árabe.
O alfabeto fenício, datado do século XI a. C., representava o semítico ocidental, língua
muito próxima do hebraico, e era composto por 22 caracteres apenas consonânticos. Trata-se do
primeiro sistema de escrita fonético, embora apenas representativo de consoantes. As vogais eram
assinaladas através das matres lectionis (em latim “mães da leitura”), i.e. símbolos consonânticos
usados para assinalar a presença de vogais.
Através da sua expansão comercial, os fenícios estendem a sua escrita para fora das
fronteiras da Palestina, tendo sido a língua de inscrição do hebraico antigo, que persiste até hoje
na seita dos Samaritanos, que ainda a utilizam em cerimónias litúrgicas. Do alfabeto fenício
descenderam inúmeros alfabetos, como o aramaico, o arábico e o siríaco.
O alfabeto grego terá aparecido por volta do século VIII a. C. e baseava-se no alfabeto
consonântico fenício, com quem os povos gregos haviam contactado também. O alfabeto grego,
dividido em quatro tipos diferentes, foi o primeiro a apresentar símbolos para representar sons
consonânticos e sons vocálicos, rompendo com a tendência de representação apenas de sons
consonânticos.
O alfabeto latino é de todos o mais difundido, devido à expansão do império romano e,
consequentemente, do latim, tendo sido aplicado à maioria das línguas da europa ocidental, como
o português, o espanhol, o inglês, o francês, o alemão, o holandês, o italiano, etc. Contudo, a grande
dependência da ortografia etimológica latina coloca maiores ou menores problemas em todos os
alfabetos modernos de raiz latina, uma vez que aquele não possui muitas vezes os sons que as
novas línguas integraram, o que torna, por exemplo, difícil a aprendizagem da ortografia nas
actuais línguas europeias, sobretudo no caso do inglês. Mesmo em português não existe
correspondência directa entre o alfabeto e a fonologia da língua. Assim, o português possui um
sistema fonológico de 19 consoantes representadas por 18 consoantes ortográficas e de 9 vogais
orais representadas por apenas 5 vogais ortográficas, o que provoca necessariamente problemas
na correspondência unívoca da língua.
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Paralelamente ao alfabeto latino surgiram, na Europa, outros alfabetos fonéticos contendo
caracteres consonânticos e vocálicos, como a escrita ogham dos celtas da Irlanda e da Bretanha,
no século II, ou a escrita rúnica dos povos germânicos, no século III. Contudo, com a crescente
difusão do Cristianismo na Idade Média, o alfabeto latino acabou por suplantar as escritas ogham
e rúnica.
O alfabeto cirílico, baseado no alfabeto grego mas com introdução de novos caracteres, foi
aplicado, no século IX, às línguas eslavas, como o russo, o ucraniano, o búlgaro e o servo-croata.
Nos finais do século XIX, com o aparecimento da linguística como ciência, surgiu a
necessidade de criar um alfabeto suficientemente capaz de descrever todas as línguas do mundo e
com uma correspondência unívoca entre símbolo e som. É assim que o britânico Henry Smith cria,
em 1886, o IPA - International Phonetic Alphabet, um sistema que tem sido periodicamente
revisto mas que através de um conjunto suficientemente vasto de caracteres consonânticos,
vocálicos e de diacríticos constitui o sistema de transcrição mais difundido na comunidade
científica de linguistas modernos.
6.4.2. Ortografia
Sistema de símbolos e regras gráficas de combinação e distribuição desses símbolos
utilizadas na escrita de uma dada língua e que foram definidas e convencionadas como uma norma
de representação da oralidade da língua.
Em ortografia são tratados os seguintes problemas e questões:
• Alfabeto e suas combinações possíveis enquanto grafemas (<ç>, <s>, <c>) e dígrafos (-
rr-, -ss-, ch-, lh-nh)
• Tipos de acento gráfico (acento agudo, acento grave, acento circunflexo, til) e regras de
acentuação gráfica
• Emprego do hífen e do apóstrofo
• Regras de utilização de certas consoantes (como a utilização ou supressão do <h>, de <b>
na sequência <bt> em subtil) e de certas sequências de consoantes na escrita (como o uso de <g>
ou <j>, de <s> ou <z>, ou de <x>)
• Regras de divisão silábica e de translineação
• Regras de utilização de maiúsculas e minúsculas
A ortografia é uma forma normalizada de registo escrito de uma língua. A ortografia partiu
do princípio da transcrição fonológica das línguas em que a um grafema corresponderia um som.
Porém, a ortografia da maior parte das línguas europeias baseia-se na pronúncia que essas línguas
tinham na Idade Média ou resulta da restauração do étimo latino das palavras, o que explica, por
exemplo, a presença, no português contemporâneo, de grafemas que não se pronunciam: "actuar",
"óptimo", "dialecto", mas que se pronunciavam em latim. Na verdade, o conservadorismo
manifestado pela ortografia deve-se sobretudo a duas razões: por um lado, as línguas evoluem
ininterrupta e rapidamente; por outro lado, os hábitos ortográficos são muito difíceis de serem
alterados, até porque constituem factores de unidade linguística ao permitirem que comunidades
com diferentes variantes dialectais se compreendam mutuamente pela escrita.
A língua portuguesa possui duas normas ortográficas, a portuguesa e a brasileira. Apesar
de se ter tentado implantar vários acordos ortográficos que regularizassem as diferenças na escrita
entre os dois países, a verdade é que razões de diversas ordens contribuíram para este afastamento
que se mantém até hoje. A primeira grande reforma ortográfica foi adoptada em Portugal em 1911,
mas não foi extensiva ao Brasil. Em 1945 realizou-se em Lisboa a Convenção Ortográfica Luso-
Brasileira, tendo, porém, sido adoptada apenas em Portugal. Em 1986, reúnem-se no Rio de Janeiro
representantes de Portugal, do Brasil e pela primeira vez dos novos países lusófonos saídos da
descolonização portuguesa. Este acordo ficou novamente inviabilizado pela reacção polémica
ocorrida contra ele sobretudo em Portugal. Actualmente vigora em Portugal o acordo ortográfico
da língua portuguesa realizado em 1990.
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6.4.3. Acordo ortográfico
Nos seus primeiros séculos de existência, a língua portuguesa tinha uma ortografia muito
variável. Este facto ficava a dever-se a dois factores, de importância naturalmente variável ao
longo do tempo: por um lado, o estatuto secundário do português em relação ao latim fazia com
que o ensino da língua vernácula fosse comparativamente descurado e os próprios gramáticos não
se ocupassem muito dela; por outro, não havia uma entidade reguladora que promovesse a
uniformização da escrita. De resto, as disparidades ortográficas são um fenómeno normal dos
processos de formação das línguas.
De qualquer forma, já renascentistas como João de Barros e Duarte Nunes de Leão - numa
época em que o latim ia perdendo o seu estatuto privilegiado e, ao mesmo tempo, o português
surgia como um dos elementos definidores da consciência nacional - constatavam as inconstâncias
da grafia e se preocupavam com elas.
Foi ao longo do século XIX que surgiram vários projectos de reforma ortográfica, mas
nenhum chegou a ser posto em prática. Entretanto, era óbvio que a própria evolução da sociedade
(com a institucionalização do ensino e a divulgação da imprensa) ia propiciando uma redução da
variação ortográfica.
Mas o próprio empenho do Estado na regularização da ortografia - o factor que poderia
fazer a diferença, impondo institucionalmente uma norma, nomeadamente através do ensino
público - tardou a manifestar-se. Foi somente em 1911 que foi decretada uma reforma, como
resultado do trabalho de uma comissão integrada por Carolina Michaëlis de Vasconcelos, Aniceto
Gonçalves Viana, Adolfo Coelho, José Leite de Vasconcelos, Cândido de Figueiredo e outros
estudiosos de grande craveira.
Contudo, não foi considerada a evolução autónoma do português no Brasil nem os hábitos
de escrita que aí se tinham consagrado. Os esforços conjugados das Academias portuguesa e
brasileira deram lugar à assinatura de um acordo em 1931. Como, porém, as divergências
permaneciam, foi assinada a Convenção Ortográfica Luso-Brasileira em 1945. Ainda assim, o
Brasil continuou largamente a reger-se por um vocabulário anterior. Em 1971 foi possível
proceder-se a uma reforma de âmbito limitado, incidindo fundamentalmente sobre a acentuação,
que foi simplificada.
Depois do processo de Descolonização, cinco novos Estados surgiram como negociadores.
O movimento de uniformização da ortografia portuguesa contou com eles no passo seguinte, em
1990. Nessa altura foi celebrado um acordo entre a Academia das Ciências de Lisboa, a Academia
Brasileira de Letras e representantes dos países africanos de língua portuguesa, acordo que deveria
ser ratificado pelas autoridades oficiais dos sete países lusófonos. Todavia, o acordo suscitou
grande polémica entre os linguistas e na população em geral2. [Para vigorar, tem de estar ratificado
por um mínimo de três dos oito países, o que foi alcançado em 2006 com São Tomé e Príncipe,
Cabo Verde e Brasil, seguidos de Portugal, em Maio].
2
Extraído (e adaptado) de: Diciopédia X [DVD-ROM]. Porto: Porto Editora, 2006. ISBN: 978-972-0-65262-1
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História da Ortografia do Português3
Nesta página, pretende-se dar a conhecer uma breve cronologia das reformas ortográficas
efectuadas na língua portuguesa.
Séc. XVI até ao séc. XX - em Portugal e no Brasil a escrita praticada era de cariz etimológico
(procurava-se a raiz latina ou grega para escrever as palavras).
1907 – A Academia Brasileira de Letras – começa a simplificar a escrita nas suas publicações.
1910 – Implantação da República em Portugal – foi nomeada uma Comissão para estabelecer uma
ortografia simplificada e uniforme para ser usada nas publicações oficiais e no ensino.
1911 – Primeira Reforma Ortográfica – tentativa de uniformizar e simplificar a escrita de algumas
formas gráficas, mas que não foi extensiva ao Brasil.
1915 – A Academia Brasileira de Letras resolve harmonizar a ortografia com a portuguesa.
1919 – A Academia Brasileira de Letras revoga a sua resolução de 1915.
1924 – A Academia de Ciências de Lisboa e a Academia Brasileira de Letras começaram a
procurar uma grafia comum.
1929 – A Academia Brasileira de Letras lança um novo sistema gráfico.
1931 – Foi aprovado o primeiro Acordo Ortográfico entre o Brasil e Portugal, que visava suprimir
as diferenças, unificar e simplificar a língua portuguesa, contudo não foi posto em prática.
1938 - Foram sanadas as dúvidas quanto à acentuação de palavras.
1943 – Foi redigido na primeira Convenção ortográfica entre Brasil e Portugal o Formulário
Ortográfico de 1943
1945 – Acordo Ortográfico – tornou-se lei em Portugal, mas no Brasil não foi ratificado pelo
Governo, os brasileiros continuaram a regular-se pela ortografia anterior do Vocabulário de 1943.
1971 – Foram promulgadas alterações no Brasil, reduzindo as divergências ortográficas com
Portugal.
1973 - Foram promulgadas alterações em Portugal, reduzindo as divergências ortográficas com o
Brasil.
1975 - A Academia das Ciências de Lisboa e a Academia Brasileira de Letras elaboraram novo
projecto de acordo que não foi aprovado oficialmente.
1986 - O presidente José Sarney do Brasil promoveu um encontro dos sete países de língua
portuguesa - Angola, Brasil, Cabo Verde, Guiné-Bissau, Moçambique, Portugal e São Tomé e
Príncipe, no Rio de Janeiro. Foi apresentado o Memorando Sobre o Acordo Ortográfico da Língua
Portuguesa.
1990 - A Academia das Ciências de Lisboa convocou novo encontro juntando uma Nota
Explicativa do Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa – as duas academias elaboram a base do
«Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa». O documento entraria em vigor (de acordo com o 3º
artigo do mesmo) no dia «1 de Janeiro de 1994, após depositados todos os instrumentos de
ratificação de todos os Estados junto do Governo português».
1996 – O último acordo foi apenas ratificado por Portugal, Brasil, e Cabo Verde.
2004 - Os ministros da Educação da CPLP reuniram-se em Fortaleza, no Brasil para propor a
entrada em vigor do Acordo Ortográfico, mesmo sem a ratificação de todos os membros.
3
Extraído, em 25.09.2008, de: http://www.portaldalinguaportuguesa.org/?action=acordo-historia
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II. Ficha de trabalho (consolidação de conteúdos)
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Sumário: Ortografia. Revisão teórica e prática das regras de:
- Pontuação
- Acentuação
- Utilização de maiúsculas
- Divisão silábica e translineação
1. Importância da pontuação
Conta-se que um senhor, muito rico e de poucas letras, pressentindo a proximidade da
morte, pediu a alguém que lhe desse um papel e lápis para, nos derradeiros momentos de vida,
redigir o seu testamento. Foram estas as suas palavras, sem qualquer sinal de pontuação:
deixo os meus bens ao meu sobrinho não a minha irmã jamais será paga
a conta do alfaiate nada aos pobres
A questão que se coloca é: a quem deixou ele, afinal, os seus bens? Cada um dos citados
apresentou a sua leitura, de forma a reivindicar a herança. Assim, veio o sobrinho que fez a seguinte
interpretação:
Deixo os meus bens ao meu sobrinho. Não a minha irmã. Jamais será paga a conta do
alfaiate. Nada aos pobres.
Veio a tia e propôs nova versão:
Deixo os meus bens ao meu sobrinho? Não! A minha irmã! Jamais será paga a conta do
alfaiate. Nada aos pobres.
O alfaiate, porém, não esteve pelos ajustes e apresentou também a sua reivindicação:
Deixo os meus bens ao meu sobrinho? Não! A minha irmã? Jamais! Será paga a conta
do alfaiate. Nada aos pobres
Entre os pobres da terra destacava-se um que havia andado na escola e logo torceu o texto a seu
favor:
Deixo os meus bens ao meu sobrinho? Não! A minha irmã? Jamais! Será paga a conta
do alfaiate? Nada. Aos pobres.
Este episódio ilustra bem a importância da pontuação na escrita. Vejamos, então, quais são
os sinais principais que se usam na nossa língua e qual a sua aplicação.
2. Pontuação
Sistema de sinais gráficos utilizados na escrita com o objectivo de representar as variações
melódicas, entoacionais, rítmicas, emocionais e estilísticas da oralidade. A pontuação é um assunto
que não deve apenas fazer parte da ortografia, mas que se deve analisar também na sintaxe, uma
vez que exprime as fronteiras e as articulações de unidades sintáctico-semânticas, sejam elas
palavras, sintagmas, orações, frases ou parágrafos.
Lindley Cintra e Celso Cunha (1984, Nova Gramática do Português Contemporâneo)
apresentam uma divisão para os sinais de pontuação baseados em distinções de natureza prosódica:
os sinais marcadores de pausas (vírgula, ponto e ponto e vírgula) e os sinais marcadores da
entoação (restantes sinais de pontuação). No entanto, o segundo grupo, como é notado pelos
próprios autores, é impreciso e pouco rigoroso, uma vez que alguns sinais podem ser indicadores
de pausa e entoação ao mesmo tempo e que o travessão, por exemplo, é também um indicador de
início de diálogo ou monólogo.
A pontuação é um sistema que obedece a um código convencionado e, portanto, a um
sistema de regras, embora exista uma certa flexibilidade na sua utilização quando se pretende
assinalar fenómenos expressivos do modo oral da língua.
Em português, usam-se os seguintes sinais de pontuação:
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Ponto final (.) indica o fim de um enunciado ou frase e corresponde a uma pausa longa; é
também utilizado em abreviaturas (Escola Sec.).
Vírgula (,) marca uma pausa de mais curta duração que separa sintagmas ou unidades
frásicas e prosódicas; há porém restrições de natureza convencional no uso da vírgula, que proíbem
por exemplo a sua utilização entre constituintes imediatos (sujeito-verbo-complementos
obrigatórios do verbo).
Ponto e vírgula (;) assinala uma pausa intermédia entre a vírgula e o ponto, servindo para
isolar orações e unidades semânticas maiores, mas sem fechar a ideia da frase ou para substituir a
vírgula em frases muito longas.
Ponto de interrogação (?) colocado no final de frases interrogativas, exprime uma
intenção pragmática de querer saber uma informação ao mesmo tempo que informa que se segue
um contorno entoacional de pergunta.
Ponto de exclamação ou de admiração (!) marca o fim de frases ou enunciados
expressivos e emotivos.
Dois pontos (:) indicam pausa antes de citação, início de monólogo ou diálogo e
enumeração.
Reticências (...) assinalam uma pausa e uma suspensão da curva entoacional
correspondente a uma interrupção do pensamento ou a uma hesitação.
Parênteses curvos (( )) e os parênteses rectos ([ ]) servem para introduzir uma descrição,
explicação ou aparte, sem quebrar a sintaxe da frase em que são inseridos.
Aspas (« ») podem ter uma função semelhante à do travessão, servindo para introduzir
outra voz em discurso directo ou uma citação; servem também para destacar expressões ou
palavras no texto ou para indicar o seu uso especial naquele contexto.
Travessão (–) marca a mudança de voz no texto, podendo introduzir discurso directo, a
voz do próprio narrador ou outra voz; pode também ter uma função parentética.
Mais uma vez aquilo que se considera a lista de sinais de pontuação varia de autor para
autor, levando alguns a confundir sinais de pontuação com sinais ortográficos, o que explica que
se incluam por vezes o hífen e o asterisco entre os sinais de pontuação.
3. Acento
a) Gramática
Sinais gráficos que se associam a vogais para assinalar excepções nas regras da acentuação.
Os acentos gráficos em Português são o acento agudo [´], utilizado para marcar a vogal tónica
aberta numa palavra (ex: lágrima, óptimo), o acento circunflexo [^], utilizado para assinalar a
vogal tónica fechada (ex: você, avô), e o acento grave [`], usado para marcar as vogais subtónicas
abertas resultantes de uma contracção entre palavras (ex: a + a = à; a + aquilo = àquilo). Embora
alguns autores considerem o til (~) como um acento, o til é uma marca de nasalidade não
necessariamente correspondente a uma alteração de acento, que é um parâmetro fonológico.
Em Português, utilizam-se acentos gráficos sempre que a palavra não seja grave, de acordo
com a acentuação verificada na maior parte das palavras portuguesas (ex: explícito/ explicito;
cópia/ copia), ou com função distintiva. Utilizam-se os acentos gráficos para distinguir:
1) palavras homógrafas heterofónicas como <demos> (Pretérito Perfeito do Indicativo) /
<dêmos> (Presente do Conjuntivo); <pode> (Presente do Indicativo) / <pôde> (Pretérito Perfeito
do Indicativo);
2) palavras com vogal tónica fechada em homografia com palavras sem acento próprio,
como <pêlo> e <pelo>; <porquê> e <porque>; <pôr> e <por>;
3) palavras que possuem vogal tónica aberta e que são homógrafas de palavras sem acento
próprio, como <ás> e <as>; <pára> e <para>;
4) terceiras pessoas do singular e do plural das formas verbais do Presente do Indicativo
dos verbos ter e vir e seus compostos: <tem>/ <têm>; <contem>/ <contêm>; <vem>/ <vêm>;
<convem>/ <convêm>.
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O acento gráfico distingue-se do acento fonológico, porque apenas assinala, na ortografia
da palavra, alterações à tendência geral da acentuação portuguesa (que é a de que a maioria das
palavras é acentuada na penúltima sílaba - ex: vinagre, ditongo). Caso não se verifique esta
condição fonológica, assinalam-se na escrita as sílabas tónicas das palavras esdrúxulas (ex: mágoa,
fôlego) e das palavras agudas (ex: trisavô, canapé) através de acentos gráficos.
b) linguística
(…) Todas as sílabas possuem acento, dito acento fonológico, embora exista um espectro
de intensidades possíveis para esses acentos.
Em português as palavras são classificadas em função da posição que a sílaba tónica ocupa,
podendo assim ser:
i) agudas ou oxítonas (quando o acento tónico recai na última sílaba - ex: papel, caracol);
ii) graves ou paroxítonas (quando o acento tónico recai na penúltima sílaba - ex: estéril;
suave);
iii) esdrúxulas ou proparoxítonas (quando o acento tónico recai na antepenúltima sílaba –
ex: físico, acústico) (…).
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FICHA DE TRABALHO (revisão e consolidação dos conteúdos4)
1. Corrija ortograficamente o seguinte texto (procedendo à respectiva pontuação, acentuação,
translineação e reposição das maiúsculas):
para que tem os gatos bigodes
assim como nos utilizamos os dedos para tactear isto é para se-
ntir a forma a dureza a textura o tamanho a temp-
eratura etc de tudo quanto nos rodeia o gato serve
-se dos bigodes para esse efe-
ito é por isso que nunca se deve cortar os bigodes aos gatos
2. Um homem foi condenado à morte. A sentença só tinha duas frases. O rei era bom e deslocou
um dos sinais de pontuação, salvando o homem. Indique como.
Perdão impossível, que cumpra a pena.
5. Acentuação
a. Acentue correctamente as seguintes palavras:
lampada Sequencia silaba
jornal extraordinario acidentalmente
canape velozmente Andre
Josue Quenia Bie
Namibia lapis esferografica
ananas banana pessego
anona orgao pera
comboio sandalia cha
sonambulo pneumatico cafe
a nos rodapé represalia
6. Enumere cinco das situações em que é exigida a utilização das letras maiúsculas:
b. ________________________________________________________________
c. ________________________________________________________________
d. ________________________________________________________________
e. ________________________________________________________________
f. ________________________________________________________________
7. Faça a divisão silábica das seguintes palavras: salvaguarda; óptimo; galhardia; ingenuidade;
vexame; elixir; necessariamente; ilhéu: anticonstitucionalmente;
8. Complete com:
8.1 Há, à ou ah:
_____um filme que não quero perder_____ segunda-feira _____ noite. _____ que alívio, hoje
não tenho nada para fazer! _____ muitos meses que não chovia tanto! Muitas pessoas _____
4
Cf. MOREIRA, Ana Maria Lopes; CARVALHO, Isabel Maria Lima, Trabalhos dirigidos de gramática 1 e 2,
Lisboa, Didáctica Editora, 1991.
IDEM, Trabalhos dirigidos de Português 1 e 2, Lisboa, Didáctica Editora, 1989.
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que trabalham _____ noite. Não _____ nada como estar de férias, _____ dois meses… _____
que bom!
8.2 Atrás/trás/traz/detrás/atrás de
Espero que o cão vá ________eles pois pode perder-se. Lá _______ há um pátio enorme. Que
_______ele debaixo do braço? O que está por _______daquela árvore? Deita as tristezas para
_______ das costas.
8.3 Tem/têm
Eles _______medo de guiar de noite. A Maria _______ uns cabelos lindos! Quem _______
um amigo verdadeiro é rico. Os miúdos nem sempre _______ cuidado nas suas brincadeiras.
8.4 Se não/senão
Só vejo um _______ a toda esta questão…. _______ quiseres vir, não és obrigado. Eles não
dormiram _______ duas horas esta noite; _______ descansarem de dia, não aguentam.
8.5 Onde/aonde
_______ estás? _______vais? _______ ficaram os teus amigos? _______ julgam eles que vão?
Não sei _______ pus os meus ténis. _______ estiveram ontem à noite? E no sábado _______
foram?
9. Complete com a forma verbal correcta: senta-se/sentasse; disse-se/dissesse; fala-se/falasse;
ama-se/amasse
a) Se eu me __________ cansava-me menos. Ele __________ sempre que pode.
b) Ele prefere que o professor lhe ___________ que o exercício estava correcto. Essa
expressão __________ muito, mas agora já se usa pouco.
c) Em Angola, hoje em dia, ____________ melhor Inglês que Francês. Se se __________
mais nas aulas, aprender-se-ia uma expressão mais correcta. Se ele __________ mais
calmamente, articularia melhor. __________ depressa de mais.
d) Narciso __________ a si próprio. Se __________ o seu próximo seria com certeza melhor.
__________ cada vez mais a facilidade; se se __________ a perfeição, o mundo seria
melhor
10. Separe em cinco colunas, consoante o valor do x - (ch/ss/z/cs/s).
Aproximar - xarope - auxiliar - exame - fixo - exibição - tóxico - enxame - complexo -
texto - próximo - graxa - máximo - Fénix - enxoval - contexto - axila - xenofobia - mexer
- pretexto - repuxo - queixo - saxofone - enxugar - trouxa - sintaxe - exíguo - exercício -
maxilar - exonerar - fluxo - xaile - toxina - léxico - intoxicar.
11. Complete com e e i:
_lucidar; pers_ana; estr_ar; esqu_sito; petról_o; m_litar; d_vidido; bas_ado; pent_ado;
v_zinho; ind_spensável; r_al; cand_eiro; fac_lidade; ef_ciência;folh_ar; pont_agudo;
camp_ão; gêm_o; espern_ar; negoc_ar; ap_adeiro; pát_o; crân_o; cr_atividade.
16
5. Complete com:
5.1 Há, à ou ah:
Há um filme que não quero perder à segunda-feira à noite. Ah! que alívio, hoje não tenho nada
para fazer! Há muitos meses que não chovia tanto! Muitas pessoas há que trabalham à noite.
Não há nada como estar de férias, há dois meses… ah, que bom!
5.2 Atrás/trás/traz/detrás/atrás de
Espero que o cão vá atrás de eles pois pode perder-se. Lá atrás há um pátio enorme. Que traz
ele debaixo do braço? O que está por detrás daquela árvore? Deita as tristezas para trás das
costas.
5.3 Tem/têm
Eles têm medo de guiar de noite. A Maria tem uns cabelos lindos! Quem tem um amigo
verdadeiro é rico. Os miúdos nem sempre têm cuidado nas suas brincadeiras.
5.4 Se não/senão
Só vejo um senão a toda esta questão… Se não quiseres vir, não és obrigado. Eles não
dormiram senão duas horas esta noite; se não descansarem de dia, não aguentam.
5.5 Onde/aonde
Onde estás? Aonde vais? Onde ficaram os teus amigos? Aonde julgam eles que vão? Não sei
onde pus os meus ténis. Onde estiveram ontem à noite? E no sábado aonde foram?
17
Sumário:
5. Morfologia
a. Conceitos de: morfologia, classes de palavras, flexão e categorias gramaticais;
b. Revisão das classes de palavras;
c. Excepções ou irregularidades na flexão dos nomes e substantivos (género,
número e grau);
d. Exercícios de aplicação.
1. Morfologia
Disciplina da linguística que descreve e analisa os processos e regras de formação e de
criação de palavras, a sua estrutura interna, a composição e a organização dos seus constituintes.
A morfologia tem a palavra como objecto de estudo, sendo que a palavra encontra no morfema a
sua unidade mínima de análise.
Uma das grandes questões subjacentes à investigação morfológica é os processos de
formação de palavras. Os processos mais produtivos nas línguas são a flexão, a derivação e a
composição e para cada língua existem regras que regulam a formação de palavras e cuja descrição
também é feita pela morfologia. A flexão é a variação de uma palavra sem que haja alteração da
sua categoria sintáctica. As categorias sintácticas afectadas pela flexão em português são os nomes,
os adjectivos, os verbos e alguns determinantes e pronomes variáveis. Nos nomes e adjectivos, a
flexão é marcada por uma substituição de morfemas no final da palavra que traduz oposições
significativas de masculino/ feminino e singular/plural. O mesmo ocorre em alguns determinantes
e pronomes flexionáveis em género e número, como os possessivos (meu, minha, meus, minhas)
ou os demonstrativos (este, esta, estes, estas). Nos verbos, a variação dos morfemas flexionais
fornece, para o português, informações de Modo, Tempo, Aspecto, Pessoa e Número e distribui-
se por três paradigmas flexionais ou conjugações (em -ar, -er e -ir). A derivação opõe-se à flexão
na medida em que a variação operada pelos morfemas (sufixos ou prefixos) pode conduzir à
alteração da categoria sintáctica da palavra. Assim, a palavra ler (verbo), pode dar origem a uma
rede de outras palavras com ela relacionadas quanto à forma, como reler (verbo), leitura (nome),
leitor (nome), legível (adjectivo), etc. A composição, cria palavras a partir da combinação de outras
palavras, podendo estas manter a sua autonomia formal e acentual (no caso da justaposição - ex:
porta-chaves) ou perdê-las no caso de compostos mais antigos que sofreram alterações fonológicas
profundas (aglutinação - ex.: fidalgo).
As línguas dispõem também de outros processos de criação de novas palavras ou
neologismos, de onde se destacam o empréstimo (incorporação de vocábulos de outras línguas), o
truncamento de uma sequência do final da palavra ("metro", a partir de metropolitano), a sigla,
como "MP", em vez de Ministério Público, a acronímia (palavra formada a partir das iniciais das
entidades ou instituições - ex.: "ONU", por Organização das Nações Unidas) e a amálgama
(combinação de partes de palavras - ex.: "portunhol", resultante de português + espanhol).
Além da renovação das palavras, a morfologia dedica-se também ao estudo de processos
de actualização e de desvalorização das palavras. Os itens que desaparecem ou que, por qualquer
razão, deixam de ser utilizados designam-se por arcaísmos (asinha, soer).
A forma das palavras tem sido objecto de estudo desde Aristóteles, que propôs a
classificação das palavras em "partes do discurso" (nome, adjectivo, verbo, etc.), lançando os
fundamentos da organização da gramática tradicional, legitimada pelos gramáticos latinos Varrão
e Quintiliano e que chegou até aos nossos dias, visível ainda na arquitectura de algumas gramáticas
escolares. A morfologia, na gramática tradicional, tem estado sempre associada à sintaxe, embora
dentro dos limites da palavra (…)5.
5
Cf. Diciopédia X [DVD-ROM]. Porto, Porto Editora, 2006.
18
6. Classes de palavras e categorias gramaticais6
De acordo com a gramática tradicional, existem 10 classes de palavras. Seis que são
variáveis ou flexionáveis e quatro que são invariáveis ou inflexionáveis.
6
Adaptado de: AREAL, Américo, Curso de Português. Questões de Gramática. Noções de Latim, 13ª Ed., Porto, Ed.
ASA, 1998.
BORREGANA, António Afonso, Gramática Universal da Língua Portuguesa, 9ª Ed., Lisboa, Texto Editores, 2005.
7
De acordo com a Nomenclatura Gramatical Portuguesa de 1967, supostamente ainda em vigor em Angola.
19
2.2.4.2 Possessivos: indicam a pessoa gramatical a quem pertence um ser ou ideia,
quem é o seu autor ou qual é a sua origem. Ex.: meu, minha, meus, minhas;
teu, tua, teus, tuas; seu, sua, seus, suas; nosso, nossa, nossos, nossas; seu,
sua, seus, suas.
2.2.4.3 Demonstrativos: designam pessoas, coisas ou estados, situando-os no
espaço ou no tempo, sempre em relação com a situação do emissor ou do
receptor. Ex.: este, esta, estes, estas; esse, essa, esses, essas; aquele, aquela,
aqueles, aquelas; o outro, a outra, os outros, as outras; o mesmo, a mesma,
os mesmos, as mesmas; o, a, os, as; tal, tais; isto, isso, aquilo.
2.2.4.4 Relativos: são pronomes que, como a sua própria etimologia indica (lat.
relativu: referido a algo), referem-se a uma palavra antecedente (substantivo
ou nome), representando-o na oração subordinada, que introduzem. Ex.: o
qual, os quais, a qual, as quais; cujo, cuja, cujos, cujas; quanto, quanta,
quantos, quantas; que, quem, onde.
2.2.4.5 Indefinidos: designam os seres ou ideias de um modo vago e
indeterminado. Ex.: algum, alguma, alguns, algumas; nenhum, nenhuma,
nenhuns, nenhumas; muito, muita, muitos, muitas; todo, toda, todos, todas;
outro, outra, outros, outras; pouco, pouca, poucos, poucas; certo, certa,
certos, certas; vário, vária, vários, várias; tanto, tanta, tantos, tantas;
quanto, quanta, quantos, quantas; qualquer, quaisquer; alguém, ninguém,
tudo, outrem, nada, cada, algo.
2.2.4.6 Interrogativos: servem para introduzir perguntas directas ou indirectas.
Ex.: qual, quais; quanto, quantos, quanta, quantas; que, o que, quem, onde.
2.2.5 Numerais: indicam uma quantidade exacta de pessoas ou coisas e o lugar que elas
ocupam numa determinada série (cf. Tabela dos numerais, em anexo).
2.2.5.1 Cardinais: indicam um número de seres. Ex.: 2, 5, 47, etc.
2.2.5.2 Ordinais: indicam um lugar (ou ordem) ocupado por um ser numa sucessão
ou num conjunto ordenado. Ex.: segundo, quinto, quadragésimo sétimo, etc.
2.2.5.3 Multiplicativos: indicam quantas vezes um número é (proporcionalmente)
maior que outro. Ex.: dobro, quíntuplo, etc.
2.2.5.4 Fraccionários: indicam partes ou divisões da unidade ou do todo. Ex.:
metade, quinto, quarenta e sete avos, etc.
2.2.5.5 Colectivos: designam, tal como os nomes colectivos, um conjunto de seres
homogéneos, mas em número rigorosamente exacto. Ex.: par, quinteto, etc.
2.2.6 Verbos: são palavras variáveis que enunciam acções ou exprimem qualidades,
estados ou a existência de seres (ou ideias) susceptíveis de serem considerados no
tempo (presente, pretérito e futuro). (Consultar a 5ª Lição)
2.2.6.1 Advérbios (e locuções adverbiais): São palavras invariáveis que se juntam
a outras (ad verbum: junto duma palavra) para lhes modificar o sentido ou
exprimir as circunstâncias duma acção, qualidade ou estado. Modificam
especialmente a significação de verbos, de adjectivos, e de outros advérbios,
relativamente a determinadas circunstâncias de:
2.2.6.2 Tempo: hoje, ontem, amanhã, antes depois, então, agora, já, nunca,
sempre, jamais, logo, cedo, tarde, ainda, doravante, primeiro, dantes,
antigamente, outrora…
2.2.6.3 Modo: bem, melhor, pior, assim, aliás, depressa, devagar, quase, como,
debalde, sobremaneira, sobretudo, principalmente, felizmente e muitos
outros terminados em -mente.
2.2.6.4 Quantidade: muito, pouco, mais, menos, demasiado, bastante, quanto,
quão, tanto, tão, assaz, quase…
2.2.6.5 Afirmação: sim, decerto, certamente, realmente…
2.2.6.6 Negação: não, nunca, nem, jamais.
20
2.2.6.7 Dúvida: talvez, porventura, acaso, quiçá, possivelmente, provavelmente…
2.2.6.8 Exclusão: só, somente, unicamente, simplesmente, exclusivamente, apenas,
salvo, senão...
2.2.6.9 Inclusão: até, mesmo, também, inclusivamente…
2.2.6.10 Designação: designadamente, respectivamente, nomeadamente,
eis…
2.2.6.11 Interrogativos: onde (de lugar), como (de modo), quando (de
tempo), porque (de causa).
2.2.7 Preposições (e locuções preposicionais): são palavras invariáveis que relacionam
dois termos de uma frase. Chamam-se preposições simples as que são constituídas
por um só vocábulo e locuções prepositivas as que são constituídas por dois ou mais
vocábulos. Ex. a, ante, após, até, com, contra, de, desde, em, entre, para, perante,
por (per), sem, sob, sobre, trás; abaixo de, afim de, a par de, através de, junto a,
em redor de, para cima de, por entre…
2.2.8 Conjunções (e locuções conjuncionais): são vocábulos invariáveis que, como
indica a sua etimologia latina (conjuntio: ligação), relacionam duas orações, ou dois
termos semelhantes da mesma oração. Designam-se locuções quando são
constituídas por expressões com duas ou mais palavras e com significado
equivalente às conjunções simples. Podem estabelecer uma relação de coordenação
e de subordinação.
2.2.8.1 Coordenativas
2.2.8.1.1 Copulativas - Indicam adição: e, também, nem, que; não
só…mas também, tanto…como…
2.2.8.1.2 Disjuntivas - Indicam alternativa: ou; ou...ou, ora…ora, já…já,
quer…quer, seja…seja, seja…ou, nem…nem.
2.2.8.1.3 Adversativas - Indicam oposição: mas, porém, todavia,
entretanto, contudo; não obstante, apesar disso, ainda assim,
mesmo assim, de outra sorte, ao passo, que…
2.2.8.1.4 Conclusivas - Exprimem uma conclusão ou consequência: logo,
pois, portanto; por conseguinte, por consequência, pelo que…
2.2.8.1.5 Explicativas - Servem para explicar ou justificar: pois,
porquanto…
2.2.8.2 Subordinativas
2.2.8.2.1 Integrantes - Introduzem orações completivas integrantes: que
2.2.8.2.2 Condicionais - Introduzem orações condicionais: se, caso; a
não ser que, desde que, no caso de (que), contanto que, excepto
se, salvo se, se não, dado que, a menos que…
2.2.8.2.3 Causais - Introduzem orações causais: porque, pois, porquanto,
que; visto que, pois que, já que; por isso que, uma vez que…
2.2.8.2.4 Finais - Introduzem orações finais: que (=para que); para que,
a fim de que, por que…
2.2.8.2.5 Temporais - Introduzem orações temporais: quando, enquanto,
apenas, mal, como; antes que, depois que, logo que, assim que,
desde que, até que, primeiro que, sempre que, à medida que, ao
passo que…
2.2.8.2.6 Concessivas - Introduzem orações concessivas: embora,
conquanto, que; ainda que, pois que, mesmo que, bem que, se
bem que, por mais que, por menos que, apesar de que, nem
que…
2.2.8.2.7 Consecutivas - Introduzem orações consecutivas: (de tal modo)
que
21
2.2.8.2.8 Comparativas – Estabelecem uma comparação: que, como,
conforme, segundo, consoante, qual, quanto; do que, assim
como, bem como…
2.2.9 Interjeições (e locuções interjectivas): são palavras (ou expressões com sentido
equivalente) invariáveis (às vezes simples gritos ou sons onomatopaicos) que
traduzem, duma forma espontânea ou instintiva, um sentimento súbito, ou de que
nos servimos para chamar, ordenar, proibir, aplaudir, mostrar desagrado,
contentamento, etc.
2.2.9.1 De alegria – Ah! Oh!
2.2.9.2 De dor – Ai! Ui! Ai de mim! Pobre de mim! Valha-me Deus!
2.2.9.3 De aplauso – Bis! Bem! Bravo!
2.2.9.4 De descontentamento - Mau!
2.2.9.5 De desejo – Oh! Oxalá! Deus queira!
2.2.9.6 De espanto (surpresa) – Ah! Chi! Puxa!
2.2.9.7 De saudação – Adeus! Bom dia! Boa noite!
2.2.9.8 De silêncio – Psiu! Silêncio! Caluda!
2.2.9.9 De suspensão – Alto! Basta!
22
TABELA DOS NUMERAIS8
8
Cf. AA.VV., Prontuário da Língua Portuguesa, Porto, Porto Editora, 2006, pp. 108-109.
23
II. Ficha de trabalho (aplicação e consolidação de conteúdos)
Artigos
Adjectivos
Numerais
Pronomes
Verbos
Advérbios
Preposições
Conjunções
Interjeições
2. Observe com atenção os seguintes quadros relativos aos substantivos, adjectivos, numerais e
advérbios:
2.1 Coloque uma cruz no espaço correspondente à(s) respectiva(s) subclasse(s))
Substantivo Próprio Comum Concreto Abstracto Colectivo
(Nome)
Katuvala
Menina
Água
Rebanho
Moda
União Africana
Nuvem
Paz
2.2 Complete o quadro dos numerais:
Cardinais Ordinais Multiplicativos Fraccionários Colectivos
2
quinto
Óctuplo
10 dez avos
dúzia
100
24
2.3 Complete o seguinte quadro relativo a casos de flexão irregular do género e número
dos substantivos:
Singular Plural
Masculino Feminino Masculino Feminino
O indivíduo
A sacerdotisa
O lápis
As águias
A alemã
O espião
Os juízes
O genro
As cadelas
A couve-flor
O vice-presidente
2.4 Complete o seguinte quadro relativo à flexão de grau dos substantivos:
Normal Diminutivo Aumentativo
Chapéu
Homenzinho
ventania
Boca
copázio
Voz
Ribeirinho
Lugarejo
2.5 Complete o seguinte quadro relativo à flexão de grau dos adjectivos:
Comparativo Superlativo absoluto
Normal Inferioridade Igualdade Superioridade Analítico Sintético
Doce
menos cruel
tão bom…
mais bonito…
muito bela
altíssimo
2.6 Classifique os seguintes advérbios, colocando uma cruz nas respectivas quadrículas:
Tempo Lugar Negação/ Dúvida Modo Quantidade Inclusão
Afirmação
Sim/certamente
Entretanto
Algures
Bem/mal
Não/nem/nunca
Também
Talvez/porventura
Mais, menos, quão
25
Sumário:
7. Morfologia (cont.)
a. A classe dos verbos. Conceitos, classificação e conjugações
b. Formas especiais de conjugação: pronominal, pronominal reflexa, pronominal
recíproca, e perifrástica
c. Regência de preposições
d. Exercícios de aplicação
1.1 Conceitos
1.1.1 Verbo
Na gramática tradicional, o verbo é uma palavra de forma variável, ou seja, sujeita a flexão,
que exprime uma acção, um processo ou um estado dentro um certo enquadramento temporal.
Morfologicamente, o verbo varia em modo/tempo e número/pessoa, sendo estas
informações fornecidas através das desinências que terminam as formas verbais, ou seja, os seus
morfemas. Por exemplo, reconhecemos a marca do tempo Pretérito Imperfeito do modo Indicativo
de um verbo de primeira conjugação pela sua terminação -va (amava), que é manifestada pela
terminação -ia nas segunda e terceira conjugações (corria/ dormia). Por outro lado, reconhecemos
a marca de 1.ª pessoa do plural (número) também pela terminação - mos (amamos/ sabemos/
partimos). De acordo com a vogal temática de onde provém a etimologia do verbo, existem três
conjugações: a primeira, com vogal temática <a>, corresponde a verbos com infinitivo terminado
em -ar (levar, viajar, andar); a segunda, com vogal temática <e>, corresponde a verbos com
infinitivo terminado em -er (correr, saber, e o caso irregular de pôr); a terceira com vogal temática
<i>, corresponde a verbos com infinitivo terminado em -ir (dormir, despir, seguir). O verbo varia
assim em:
• pessoa, de acordo com o sujeito da enunciação (1.ª - eu/nós, 2.ª - tu/vós, 3.ª -
ele/ela/eles/elas);
• em número, segundo a quantidade de sujeitos implicados na enunciação (singular - eu,
tu, ele/ela/você e plural - nós, vós, eles/elas/vocês);
• em tempo, conforme o momento em que se dá o facto expresso pelo verbo (presente,
passado e futuro);
• em modo, segundo a atitude do falante em relação ao conteúdo do enunciado (Indicativo,
Conjuntivo, Imperativo, Infinitivo, Condicional);
• em voz, segundo a perspectiva que se tem do acontecer verbal; se a perspectiva é feita a
partir do sujeito/ agente, estamos perante a voz activa (ex: A Joana disse mentiras); se é
feita a partir do objecto directo que sofre a acção, estamos perante a voz passiva (ex:
Mentiras foram ditas pela Joana); se se distancia quer do sujeito, quer do objecto directo,
diluindo-se o sujeito/ agente estamos no caso da voz média (ex: Disseram-se mentiras);
• em aspecto, conforme a forma como decorre a acção verbal, que pode ser acabado (ex:
Acabei de chegar.), frequentativo, habitual e inacabado (ex: Ando a estudar espanhol há
dois anos; Continuo a ir ao cinema às segundas-feiras); além da designada conjugação
perifrástica, o aspecto exprime-se em português também em alguns tempos verbais, como
por exemplo pela oposição Pretérito Perfeito (=acção acabada) vs Pretérito Imperfeito (=
acção inacabada).
O tema verbal é um dos constituintes imediatos do verbo que domina o radical verbal e a vogal
temática e é especificado pela flexão em tempo-modo-aspecto e pessoa-número (ex.: cantava).
O radical verbal é um dos constituintes imediatos do tema verbal, é especificado por uma
vogal temática e pode ser simples ou derivado (ex.: cantava).
A vogal temática é o constituinte temático dos verbos que identifica a que flexão verbal
pertence (ex. cantava). No Português há três vogais temáticas nas formas do infinitivo: -a, -e, -i.
26
Os sufixos de flexão são os sufixos que, no caso dos adjectivos e nomes, especificam
informações de número, e, no caso dos verbos, especificam informações de tempo-modo-aspecto
e pessoa-número. Aos sufixos derivacionais que geram formas verbais dá-se o nome de sufixos de
verbalização (ex.: canta[mos ] = sufixo de primeira do plural). Mas quando um sufixo de flexão
verbal acumula um valor de tempo-modo-aspecto com um valor de pessoa-número, dá-se o nome
de amálgama de tempo-modo-aspecto e pessoa-número. No Português, os sufixos de flexão que
ocorrem nas formas do presente e do pretérito perfeito do indicativo são amálgamas de tempo-
modo-aspecto e pessoa-número (ex.: cantei) .
Por outro lado, na gramática tradicional, o sentido e a construção de verbos levou a
contrapor aos verbos de sentido pleno, os verbos auxiliares, que podem ser de diversas naturezas:
verbos auxiliares de tempos compostos (ter e haver), verbos auxiliares de modo ou verbos modais
(poder, ter de, querer, dever), verbos auxiliares de voz passiva (ser, estar), verbos auxiliares de
aspecto (andar a, estar a, continuar a, deixar de, ficar a, etc.).
Desempenhando a função sintáctica de predicado da oração, constituindo assim o núcleo à
volta do qual se organizam os outros constituintes, os verbos são classificados sintacticamente
segundo o número e o tipo de complementos que seleccionam e que a ele se subordinam.
Assim, temos verbos:
• Transitivos (directos e/ou indirectos), quando seleccionam um complemento directo
(Viste aquele filme?), ou um complemento indirecto (Telefonei à minha namorada) ou ambos os
complementos (Vou oferecer-te um perfume);
• Intransitivos, quando apenas possuem sujeito, não seleccionando nenhum complemento
(Eles partiram; ontem nevou ; aconteceu um imprevisto);
• Preposicionais, quando seleccionam um complemento obrigatório que é introduzido por
uma preposição (Gosto de flores; Fui a Lisboa);
• Predicativos, quando seleccionam um sintagma nominal com função de predicativo do
sujeito (O meu pai é professor);
• Impessoais, quando não possuem sujeito, pelo que apenas se utilizam na 3.ª pessoa do
singular (Chove; há sardinhas assadas);
• Unipessoais, quando a acção é específica de uma determinada espécie (ladrar, balir, miar,
cacarejar).
2. Verbo copulativo: verbo não auxiliar que ocorre numa frase em que existe um
constituinte com a função sintáctica de sujeito e outro com a função sintáctica de predicativo do
sujeito. São eles: ser, estar, ficar, parecer, permanecer, continuar. (ex.: O João está calado.)·
3. Verbo auxiliar: precede um verbo principal ou um verbo copulativo. Este tipo de verbos
não determina o sujeito ou os complementos que ocorrem na frase, apenas selecciona um grupo
verbal cujo núcleo é o verbo principal ou copulativo que o segue. Existem cinco tipos de verbos
auxiliares.
• Auxiliar dos tempos compostos: forma com o verbo principal um tempo composto e exige
que o verbo principal se conjugue no particípio passado. São eles: o verbo ter e, já menos
frequente, o verbo haver. (ex.: O João tem ido ao cinema.)
• Auxiliar da passiva: ocorre em frases passivas e exige que o verbo principal se flexione
no particípio passado. O auxiliar da passiva é o verbo ser. (Ex.: A loja foi encerrada pelo João.)
• Auxiliar temporal: forma, com o verbo principal, um complexo verbal com valor de futuro
e exige que o verbo principal se encontre no infinitivo. São eles: haver de e ir em construções em
que são seguidos de um verbo no infinitivo. (Ex.: Tu vais conseguir essa medalha!)
• Auxiliar aspectual: forma, com o verbo principal, um complexo verbal com um valor
aspectual de tipo durativo, inceptivo ou pontual e exige que o verbo principal se encontre no
infinitivo. São eles: estar a, continuar a, ficar a, andar a, ir a, vir a, seguidos de infinitivo (valor
durativo); começar a, seguidos de infinitivo (valor inceptivo); deixar de, acabar de, seguidos de
infinitivo (valor pontual). (Ex.: O João começou a andar.)
• Auxiliar modal: forma com o verbo principal um complexo verbal com um valor modal
de possibilidade, probabilidade ou obrigatoriedade e exige que o verbo principal se encontre no
27
infinitivo. São eles: poder, seguidos de infinitivo (valor de possibilidade); dever, seguidos de
infinitivo (valor de probabilidade, obrigatoriedade); ter de, seguidos de infinitivo (valor de
obrigatoriedade). (Ex.: O João tem de sair urgentemente.)
Ainda no que respeita à flexão, segundo a gramática tradicional, os verbos podem ser
regulares, quando seguem do paradigma de conjugação normal (andar, correr, partir), ou
irregulares, quando apresentam alterações significativas de radical (ex: sei, sabes, saiba, soube,
saberei). Quando os verbos não se conjugam em todas as suas formas, designam-se por defectivos
(ex: reaver, falir, haver = com significado de existir).
Em sentidos figurados, os verbos impessoais (chover, trovejar), unipessoais (ladrar, miar)
e defectivos (banir, falir, colorir, etc.) podem ser usados em todas as formas verbais, como, por
exemplo, em textos literários (nuvem: "Eu chovi toda a manhã de tristeza" - onde se subentende
"eu chorei...").
1.1.2 Defectivo
Termo que designa o verbo que possui algum tipo de irregularidade ou anomalia na sua
conjugação morfológica, isto é, que não apresenta todas as formas flexionais esperadas. Consoante
o tipo de anomalia, a gramática tradicional costuma distinguir três tipos de verbos defectivos:
• Verbos defectivos pessoais: verbos que apenas se usam em algumas pessoas gramaticais,
como <reaver> (que só se usa nas formas em que o verbo haver tem <v>: reavemos, reaveis,
reavia, reouve, etc.), <colorir>, <abolir>, <falir>, <extorquir>, <retorquir>, etc.
• Verbos defectivos unipessoais: verbos cuja acção é específica de determinada espécie de
animal e que portanto são utilizados apenas na 3.ª pessoa do singular e do plural: "o cão ladra,
uiva, late, rosna", "o cavalo relincha", "as rãs coaxam", etc.
• Verbos defectivos impessoais: verbos que não possuem sujeito, pelo que apenas se
conjugam na 3.ª pessoa do singular, salvo em discurso poético ou literário. São exemplos deste
tipo, os verbos <haver> (ex: havia muitos problemas no país), <prazer> (em desuso), <chover>
(ex: choveu muito esta noite), <amanhecer> (ex: amanheceu às 6h), <anoitecer> (ex: Agora
anoitece mais tarde), <nevar> (ex: neva no Inverno), <trovejar> (ex: trovejou ontem?),
<relampejar>, etc.9
1.1.3 Flexão
Podemos esquematizar a flexão dos verbos da seguinte forma10:
1. Pessoa: 1ª, 2ª e 3ª
2. Número: singular e plural
3. Tempos: presente, pretérito (imperfeito, mais-que-perfeito e perfeito) e futuro (imperfeito
e perfeito);
4. Modos: indicativo, conjuntivo, imperativo, condicional, e infinitivo pessoal
5. Voz: activa e passiva
1.1.4 Classificação
1. Quanto à flexão: regulares e irregulares
2. Quanto à falta de formas pessoais: defectivos (pessoais, unipessoais e impessoais)
3. Quanto ao modo de emprego: principais e auxiliares
1.1.5 Conjugações
Numa primeira acepção, conjugar um verbo é desdobrá-lo em todos os tempos, modos,
pessoas, números e vozes, segundo uma ordem pré-definida.
9
Cf. Diciopédia X [DVD-ROM]. Porto, Porto Editora, 2006.
10
Adaptado de: AREAL, Américo, Curso de Português. Questões de Gramática. Noções de Latim, 13ª Ed., Porto,
Ed. ASA, 1998, pp. 150-193.
28
Também se dá o nome de conjugação às diferentes categorias em que se podem agrupar os
verbos segundo o seu tema. Por isso se diz que há três conjugações:
1. Primeira conjugação: que engloba todos os verbos de tema em –a (Ex. amar, louvar,
andar…);
2. Segunda conjugação: que engloba todos os verbos de tema em –e (Ex. dever, comer,
valer…);
3. Terceira conjugação que engloba todos os verbos de tema em –i (Ex. partir, pedir,
engolir…).
Por último, aplica-se igualmente esta designação a determinadas combinações particulares
que os verbos podem apresentar. Temos, assim, as conjugações: pronominal, pronominal reflexa,
pronominal recíproca, e perifrástica
a. Conjugação pronominal: é a que se obtém juntando às formas dum verbo transitivo
os pronomes pessoais o, a, os, as. Ex.: Amo-o, ama-lo, ama-o…
b. Conjugação pronominal reflexa: é a que se obtém juntando às formas dum verbo
transitivo os pronomes pessoais me, te, se, nos, vos, para indicar que as acções
expressas por esse verbo recaem sobre o sujeito que as pratica. Ex.: lavo-me, lavas-te,
lava-se…
c. Conjugação pronominal recíproca: é a que se obtém juntando às formas verbais do
plural ou ao gerúndio de um verbo transitivo os pronomes se, nos e vos com a
significação de «um ao outro» ou «uns aos outros». Ex.: Os nubentes beijaram-se;
Estimamo-nos muito; Abraçando-se, fizeram as pazes…
d. Conjugação perifrástica: é a que se obtém pospondo o infinitivo impessoal (precedido
ou não das preposições a, de, para…) ou o gerúndio de qualquer verbo às formas verbais
dum verbo auxiliar, tal como: ter, haver, estar, andar, acabar... Ex.: Tenho de ausentar-
me; Havias de partir cedo; Estou a estudar; Ando a cabular; Acaba de chegar…
Obs. Consultar os modelos das conjugações regulares (na voz activa e voz passiva):
Verbos de tema em –a (ex. amar);
Verbos de tema em –e (ex. comer);
Verbos de tema em –i (ex. partir);
Verbos auxiliares: ter, haver, ser, estar;
Pronominal: levá-lo
Reflexa: lavar-se
29
Falta acrescentar paradigmas das diferentes conjugações atrás indicadas
30
Verbos com preposições
31
dialogar com exercitar-se para munir-se de
dirigir-se a/para exonerar (alguém) de namorar com
discordar de expor-se a necessitar de
discutir sobre exprimir-se perante obedecer a
disparar contra falar/a/com/de/sobre/em/para/por ocupar-se a/de/com
dissertar sobre familiarizar-se com oferecer-se para
dissuadir de fundamentar-se em olhar para/por
divergir de fundir-se com opor-se a
doutorar-se em furtar-se a optar por
duvidar de gostar de oscilar perante
elevar-se a/para gozar com/de pactuar com
elucidar sobre graduar-se em padecer com/de
emanar de habilitar-se a parar com/de
embater em/contra habitar em parecer-se a/com
embebedar-se com haver de participar a/de/em
embeiçar-se por hospedar-se em partir de/para
embrenhar-se em humedecer com penetrar em
emigrar para identificar-se com pensar de/em/por/sobre
empatar com igualar-se a perceber de
encaminhar-se por/para ilustrar com perguntar por/sobre
encarregar-se de implorar a precaver-se contra/de
encolher-se perante importar de predispor-se a
endossar a importar-se de/com preocupar-se com/em
enfadar-se com incorrer em presidir a
enfermar de indagar sobre proceder a/contra/de/segundo
engraçar com indemnizar de/por proteger-se contra/de
ensinar (algo) a indigitar (alguém) para puxar de/contra/para/por
entender de/por indignar-se com/contra raciocinar sobre
enterrar em induzir a/em radicar-se em
entregar (algo) a inquirir sobre reagir a/contra
entreter-se a/com inspirar-se em recair em/sobre
entristecer-se com insurgir-se contra reclamar de/contra/por
envenenar-se com interceder por recomeçar a/com
enveredar por investigar sobre recordar-se de
envergonhar-se de investir em/contra recorrer a/de
enviar a/por ir/de/em/por/para/a/sobre regozijar-se com/de/por
equipar-se de irritar-se com relacionar-se com
equivocar-se em isolar-se de remeter-se a/para
esforçar-se por jogar a/com reprovar a/em
espantar-se com juntar-se com/a resmungar com/contra
especializar-se em lembrar-se de responder a/por
especular sobre libertar-se de rir-se de/para
esperar de/por licenciar-se em salientar-se em/por
espreitar por lidar com ser contra/por/de/para
esquecer-se de livrar-se de suspeitar de
evadir-se de lutar com/contra/por terminar com/em/por
evidenciar-se em/por magicar em zelar por
32
Vozes dos animais
Pedro Dinis
33
II. Ficha de trabalho (aplicação e consolidação de conteúdos)
3. Complete os espaços em branco relativos à regência de preposições e redija uma frase para
cada uma das mesmas.
a) Admirar-se____/_____/_____; b) agradecer _______; c) ausentar-se ______/_______; d)
comungar _______; e) participar _____/_____/______; f) ir__/_____/_____/_____/_____g)
alegrar-se____/_____/_____; h) assistir _______; i) combater ______/_______; j) delegar
_______; l) enviar _____/______;m) rir-se _____/_____/_____ n) ser_______/_____/_____ .
11
Cf. MOREIRA, Ana Maria Lopes; CARVALHO, Isabel Maria Lima, Trabalhos dirigidos de gramática 1, Lisboa,
Didáctica Editora, 1991, p. 95.
34
4. Tente completar, sem consultar o texto original, os espaços em branco do seguinte
excerto do poema lido:
35
Sumário: Sintaxe
1. Conceitos;
2. Revisão das funções sintácticas (sujeito, predicado, predicativo, complemento
directo, complemento indirecto, agente da passiva, complemento; determinativo,
atributo, aposto, vocativo, e complemento circunstancial);
3. A frase: elementos fundamentais e elementos complementares;
4. Exercícios de aplicação.
Conceitos
1. Sintaxe
Definição:
Sintaxe: (Lat. syntaxe<Gr. Sýntaxis, arranjo, disposição), s.f. parte da estrutura gramatical de
uma língua que contém as regras relativas à combinação das palavras em unidades maiores (como as
orações), e as relações existentes entre as palavras dentro dessas unidades; parte da gramática que
estuda estas relações12.
Por outras palavras, é a «área da linguística que estuda as regras, as condições e os princípios
subjacentes à organização estrutural dos constituintes das frases, ou seja, o estudo da ordem dos
constituintes das frases»13.
Estudo do modo como as palavras se podem organizar entre si para formarem frases. É a
componente da gramática que se ocupa da descrição do conhecimento sintáctico intuitivo e
interiorizado, traduzível pela capacidade que os falantes têm de decidir se uma frase é gramatical
(bem formada segundo as regras da língua) ou agramatical (não aceitável, não permitida pelas
regras da língua). Este conhecimento é responsável pela criatividade linguística, isto é, a
capacidade de produzir e compreender um número ilimitado de frases nunca antes produzidas
usando um número limitado de elementos: o léxico14 e as regras. Por outras palavras, sabemos
intuitivamente que as seguintes frases são gramaticais:
i) Amanhã termino este trabalho.
ii) Hoje está a chover.
Sabemos também inconscientemente que as seguintes frases violam alguma regra de boa
formação do Português:
iii) *Muitas houve atrocidades na Civil Espanhola Guerra.
(Houve muitas atrocidades na Guerra Civil Espanhola.)
iv) *Ontem eu vi ele no teatro.
(Ontem eu vi-o no teatro.)
v) *Houveram muitas atrocidades na Guerra Civil Espanhola.
(Houve muitas atrocidades na Guerra Civil Espanhola.)
vi) *A maior parte das pessoas compram revistas.
(A maior parte das pessoas compra revistas)
vii) *O poema de Drummond que eu gostei mais foi 'Procura da poesia'.
(O poema de Drummond de que eu gostei mais foi 'Procura da poesia'.)
12
Definição extraída do Dicionário Universal da Língua Portuguesa, Lisboa, Texto Editora, 1995.
13
Cf. Dicionário de Termos Linguísticos, In; http://www.ait.pt/recursos/dic_term_ling/dtl_pdf/S.pdf
14
Conjunto de vocábulos de uma língua. Cf. IBIDEM.
36
Fazem parte do conhecimento gramatical questões sobre:
Ordem básica das palavras na frase: o Português é uma língua SVO, ou seja, a ordem linear
esperada é Sujeito-Verbo-Objecto. Existem, contudo, casos em que esta ordem não se verifica,
como no exemplo seguinte em que o sujeito "rinocerontes" é pós-verbal: Existem rinocerontes
no Kruger Park, em África do Sul. O exemplo iii) rompe com esta prescrição sintáctica do
Português. Outras línguas possuem outra ordem de palavras: o latim apresenta ordem livre,
porque as relações sintácticas eram dadas não pela posição ocupada pelos constituintes na frase
mas por informações flexionais de caso (ex: - m para acusativo singular). As línguas célticas,
por exemplo, são do tipo VSO (Verbo-Sujeito-Objecto).
Esta frase pode ser entendida de duas formas. Se o constituinte "da Austrália" for
complemento determinativo do nome "notícias", o sintagma é sinónimo de "notícias sobre a
Austrália"; se por outro lado "da Austrália" for entendido como complemento circunstancial de
lugar dependente do verbo "trazer", estamos perante outro tipo de relação gramatical sinónima de
"trouxe notícias a partir de/ vindas da Austrália". Outro exemplo de agramaticalidade no uso das
funções sintácticas é visível em iv), em que o pronome esperado seria "o" (e não "ele"), que é o
pronome pessoal que assume função de objecto directo.
Estrutura dos constituintes: nem todos os tipos de palavras podem ser combinados para
formar unidades maiores, a que se dá o nome de sintagmas. Analisemos os seguintes casos:
xi) *Meus amigos querem viajável.
xii) *Os trabalhadores eleição o novo chefe.
37
Dependências léxico-sintácticas locais: outro domínio do conhecimento sintáctico que nos
permite saber que o verbo esperar seguido de oração completiva introduzida pela conjunção
"que" selecciona o modo conjuntivo do verbo dependente:·
xv) *Espero que sabes o que estás a fazer.
Em sintaxe para além das regras de formação da frase simples, estuda-se também a formação de
frases complexas e o modo como elas se articulam entre si. A sintaxe foi sempre uma
dimensão privilegiada pela gramática tradicional, de tradição greco-latina, e pela didáctica das
línguas, que desenvolveu uma terminologia e directo, complemento circunstancial/ oblíquo,
oração/ frase, etc. Era muitas vezes tratada em associação com a morfologia, sendo a sua distinção
apenas feita pela linguística metalinguagem15 nem sempre coincidentes com as adoptadas pelas
várias correntes da linguística moderna que se têm debruçado sobre a componente sintáctica das
línguas. É este facto que explica as designações equivalentes de complemento directo/ objecto
moderna.
A sintaxe conheceu um tratamento mais descritivista e científico a partir do funcionalismo
de A. Martinet e mais tarde com o programa generativista, fortemente interessado no
funcionamento sintáctico das línguas, pelo que desenvolveu uma metodologia e todo um aparelho
teórico adaptado à descrição sintáctica das regularidades das línguas. 16
2.1 O sujeito é o substantivo (ou um seu equivalente) que designa o ser (ou a ideia) do qual
se faz uma declaração. O sujeito denomina-se:
a. Simples – se é constituído por um só substantivo, palavra ou expressão Simples – se é
constituído por um só substantivo, palavra ou expressão equivalente. Ex. O Instituto
Superior Politécnico foi inaugurado recentemente.
b. Composto – se é constituído por mais de um substantivo, palavra ou expressão
equivalente. Ex. O Hotel Roma e o Hotel Nino constituem as duas principais unidades
hoteleiras do Huambo.
c. Subentendido – quando não vem expresso e apenas se identifica pelas desinências
pessoais do verbo. Ex. Fui a Luanda este fim-de-semana. (Subentende-se: Eu fui)
d. Indeterminado – quando se torna impossível de identificar. Ex. Consome-se
demasiado álcool. (Sabemos que o álcool é consumido, mas não sabemos,
concretamente, por quem).
e. Inexistente – quando o verbo é impessoal. Ex. Choveu muito ontem.
(Para reconhecer quais são as palavras que na oração exercem a função de sujeito, pergunta-
se ao verbo: Quem é que…? Que é que…?)
15
A linguagem ou discurso (técnico) utilizado para analisar uma língua ou uma obra literária.
16
«Sintaxe», In: Diciopédia X [DVD-ROM]. Porto, Porto Editora, 2006.
38
2.2 O predicado é a base da oração. Permite geralmente fazer uma declaração ou uma
interrogação susceptível de ser considerada no tempo (pretérito, presente ou futuro). Exprime uma
acção feita (na voz activa) ou sofrida (na voz passiva) pelo sujeito, a sua existência, qualidade ou
estado do sujeito, uma ordem, pedido, conselho ou desejo. O predicado denomina-se:
a. Verbal – se é constituído por um verbo de significação definida ou por uma locução
verbal. Ex. O jipe caiu no rio; Levou a mal aquele gesto.
b. Nominal – se é constituído por um verbo de significação indefinida e por uma palavra
ou expressão: o predicativo do sujeito ou do complemento directo. Ex. O João parece
bom rapaz (Predicativo do sujeito); O vício faz o homem miserável (Predicativo do
complemento directo).
Designa-se predicativo do sujeito quando se refere ao sujeito, sendo normalmente exigido
pelo verbo ser e certos verbos intransitivos como: viver, parecer, andar, continuar, etc. Designa-se
predicativo do complemento directo quando se refere ao complemento directo. É preciso notar
que, na transformação da voz activa para a passiva, o predicativo do complemento directo passa a
predicativo do sujeito. Ex. Julgaram a acusação improcedente (Voz activa) =A acusação foi
julgada improcedente (Voz passiva).
2.3 O complemento directo é o substantivo (ou seu equivalente) que se junta ao verbo
para lhe completar o sentido, indicando sobre quem ou sobre que coisa recai imediatamente a
acção expressa por esse verbo. Designa o ser ou a ideia que, na voz activa, sofre a acção praticada
pelo sujeito. (Para o identificar, pode fazer-se uma pergunta colocando depois do verbo: Quem?
Que coisa? O quê?)
Ex. O Director inaugurou o Hospital.
2.4 O complemento indirecto é o substantivo (ou seu equivalente) que designa o ser ou a
ideia sobre que recai indirectamente a acção expressa pelo verbo. Esta designação é feita
geralmente pela preposição a. As formas pronominais me, te, se, nos, vos, lhe, lhes, podem,
porém, servir de complemento indirecto sem preposição. (Para o identificar podemos perguntar ao
verbo: A quem? A quê? A que coisa?)
Ex. O professor deu boas notas aos alunos; O professor deu-lhes17 boas notas.
17
Dada a importância e complexidade dos pronomes pessoais, recordamos, em forma de quadro geral, algumas
particularidades da sua flexão e sintaxe.
COMPL. COMPL. INDIRECTO COMPL.
NÚMERO PESSOA SUJEITO DRECTO Sem Com CIRCUNSTANCIAL
preposição preposição
1ª eu me me mim mim, -migo
Singular 2ª tu te te ti ti, -tigo
3ª ele, ela se, o, a lhe si, ele, ela si, -sigo, ele, ela
1ª nós nos nos nós nós, -nosco
Plural 2ª vós vos vos vós vós, -vosco
3ª eles, elas se, os, as lhes si, eles, elas si, -sigo, eles, elas
Quando as formas do pronome pessoal (exercendo a função de complemento directo), o, a, os, as, vêm depois
do verbo, ligadas a ele por hífen, tomam as antigas formas derivadas do latim, lo, la, los, las, se a forma verbal terminar
em -r, -s, ou –z. Ex. Nós vemos-o Nós vemo-lo.
O mesmo se passa depois do advérbio de designação eis e dos pronomes nos e vos. Ex. Eis-a Ei-la; Eles
dão-nos-a Eles dão-no-la.
Quando a forma verbal termina em ditongo nasal, dá-se a nasalização do -l, o qual se transforma em -n. Ex.
Dão-a Dão-na. Fazem-os Fazem-nos.
Cf. BORREGANA, António Afonso, Gramática Universal da Língua Portuguesa, 9ª ed., Lisboa, Texto Editores,
1996, p. 150.
39
2.5 O agente da passiva é o substantivo, palavra ou expressão equivalente que designa o
ser por quem é praticada a acção sofrida pelo sujeito. É, geralmente, regido pela preposição por.
(Para o identificar, pode-se perguntar ao verbo na voz passiva: Por quem? Por quê? De quê?)
Ex. O cão foi atropelado pelo jipe.
2.6 O complemento determinativo é um substantivo (ou seu equivalente) que está ligado
a outro substantivo (ou adjectivo) geralmente pela preposição de para o limitar em extensão. Pode
exprimir posse, espécie, matéria, origem, qualidade, quantidade medida, lugar, tempo, etc.
Ex. A sala de espectáculos da nossa escola é grande.
2.7 O atributo é um adjectivo (ou seu equivalente) que acompanha um substantivo para
exprimir, sem interferência de um verbo, uma qualidade do ser (ou da ideia) nomeado por esse
substantivo ou para o determinar. Note-se que enquanto o predicativo qualifica um substantivo
por intermédio dum verbo, o atributo qualifica-o sem verbo nenhum de permeio.
Ex. O Alberto “cambuta” teve outro filho.
2.8 O aposto é um substantivo (ou seu equivalente) que se junta a outro para determinar
ou caracterizar com maior individualização o ser ou a ideia nomeada.
Ex. Maria, a padeira, sofreu ontem um acidente.
2.9 O complemento circunstancial é uma palavra ou expressão que, não sendo exigida
pelo verbo, determina melhor o seu sentido, juntando-lhe uma referência acessória relativa ao
tempo, lugar, modo, etc. (Para se identificar o complemento circunstancial pode perguntar-se ao
verbo: Onde? Aonde? Quando? Como? Porquê? Para quê? Por meio de quê? Com quê? Com
quem?...)
Ex. Ontem, o meu irmão foi ao hospital.
2.11 A expressão de realce é uma palavra ou pequena expressão que empregamos para
dar mais vida ou ênfase à frase, embora não seja necessária ao sentido da frase.
Ex. Tu lá sabes o que é que dizes…
40
II. Ficha de trabalho (aplicação e consolidação de conteúdos)
41
2. Observe as frases:
a. Não pude estar presente devido à chuva.
b. Ontem, o meu carro não pegou por causa da bateria.
c. Ficas em casa ao domingo, com este sol?
d. Rapidamente, ele construiu esta cadeira para ti com a madeira recuperada.
e. Logo, vou ao campo passear convosco, a pé.
42
Sumário: Sintaxe (Cont.)
5. Conceitos: a frase simples e a frase complexa; a coordenação e a subordinação;
subtipos de coordenação e de subordinação.
6. Revisão dos tipos e formas de frase.
7. Exercícios de aplicação.
1. Coordenação e Subordinação
1.1. Coordenação
Na gramática tradicional, "coordenação" designa o tipo de relação sintáctico-semântica que
permite ligar elementos que possuam a mesma estrutura, a mesma função sintáctica e a mesma
função semântica. Dito de outro modo, os elementos coordenados têm que ser formalmente iguais,
i.e., só é possível que um substantivo seja coordenado com outro substantivo, que um sintagma
preposicional seja coordenado com outro sintagma preposicional, mas nunca um substantivo pode
ser coordenado com um adjectivo, nem um sintagma preposicional com um sintagma nominal (…)
Segundo a classificação da gramática tradicional, existem as seguintes frases coordenadas:
• Copulativas: indicam adição; são principalmente introduzidas pelas conjunções e
locuções: e, também, nem, não só...como/mas também.
• Adversativas: indicam oposição; são principalmente introduzidas pelas conjunções e
locuções: mas, porém, todavia, contudo, no entanto.
• Disjuntivas: indicam alternativa; são principalmente introduzidas pelas conjunções e
locuções: ou, ou...ou, seja...seja, quer...quer.
• Conclusivas: indicam conclusão; são principalmente introduzidas pelas conjunções e
locuções: logo, portanto, assim, por consequência, por conseguinte, por isso.
• Explicativas: indicam explicação; são principalmente introduzidas pelas conjunções e
locuções: pois (posposto), isto é, ou seja, por exemplo, ou melhor, a saber, quer dizer, ou por
outra.
A coordenação pode ainda ser sindética (quando existe uma conjunção explícita a
introduzir o constituinte coordenado) ou assindética (quando há omissão da conjunção; é
substituída por uma vírgula; equivale a repetir a conjunção <e>):
xii) Gosto de amêndoas de chocolate e de amêndoas de licor. (coordenação
sindética)
xiii) Gosto de amêndoas de chocolate, de licor, de frutos, etc. (coordenação
assindética)
(…)
1.2. Subordinação
Na gramática tradicional, "subordinação" designa o tipo de relação sintáctico-semântica
que permite ligar apenas frases, ao contrário do que acontece com a coordenação que permite unir
também constituintes não frásicos, como palavras e sintagmas.
As estruturas de subordinação apresentam algumas propriedades que permitem distingui-las das
estruturas de coordenação. Uma delas é, por exemplo, o facto de as estruturas subordinadas
desempenharem sempre uma função sintáctica dentro da oração principal, que pode ser de
complemento, no caso das orações substantivas e relativas, ou de adjunto, no caso das orações
adverbiais:
i) O António perguntou quem ia a Budapeste [Frase Principal+Subord. Completiva, Compl. Directo].
ii) Luís de Camões, poeta do século XIV, escreveu os Lusíadas [[Subord. Completiva, Aposto
+Frase Principal].
iii) Apaga a luz quando saíres [[Frase Principal+Subord. Adverbial Tempora, Adjuntol].
Outra propriedade que caracteriza as frases subordinadas é a sua possibilidade de
mobilidade, sem que isso afecte a gramaticalidade da frase, como pode verificar-se nos seguintes
exemplos:
43
iv) Ele informou apenas que ia chegar tarde [[Frase Principal +Subordinada Completiva].
v) Que ia chegar tarde, ele informou apenas [[Subordinada Completiva +Frase Principal].
vi) Fiz areserva por Internet, para que não ficasse sem alojamento [[Frase Principal +
Subordinada Adverbial Final].
vii) Para que não ficasse sem alojamento, fiz a reserva por Internet [[Subordinada Adverbial
Final +Frase Principal].
A subordinação é estabelecida através de conjunções subordinativas que introduzem
variados nexos gramaticais. Existem, portanto, três grandes grupos de frases subordinadas:
1. Completivas ou Substantivas, equivalentes a um nome ou sintagma nominal, pelo que só
desempenham funções típicas de um sintagma nominal; são argumentos ou complementos da
frase principal, pelo que desempenham as funções sintáticas de sujeito, objecto directo, objecto
indirecto e complemento preposicional; dividem-se tradicionalmente em:
Integrantes: introduzidas pela conjunção <que> e pedidas por verbos declarativos,
volitivos, de actividade mental ou por construções impessoais (ser + adjectivo, como <é
importante, é necessário...>).
Interrogativas indirectas: introduzidas pela conjunção <se>, por advérbios e pronomes
interrogativos e pedidas por verbos interrogativos.
Infinitivas: têm o predicado no infinitivo e não são introduzidas por conjunção alguma;
são pedidas por construções impessoais (ser + adjectivo, como <é importante, é
necessário...>).
2. Relativas ou Adjectivas, equivalentes a um adjectivo ou sintagma adjectival, pelo que só
desempenham funções sintácticas e semânticas típicas de um sintagma adjectival; são
introduzidas por pronomes (que, quem, o qual, cujo) ou advérbios relativos (onde); dividem-
se em:
Relativas restritivas: restringem a extensão do conceito expresso pelo substantivo a que
atribuem uma qualidade.
Relativas explicativas: exprimem um comentário acerca do substantivo que descrevem;
estão entre vírgulas.
Relativas livres: desempenham uma função sintáctica de complemento em relação à frase
principal e não costumam ter antecedente nominal expresso.
3. Adverbiais, equivalentes a um advérbio ou sintagma adverbial, exprimem circunstâncias de:
Tempo: São principalmente introduzidas pelas conjunções e locuções: quando, enquanto,
mal, apenas, logo que, desde que, até que, antes que, depois que, assim que, sempre que,
todas as vezes que.
Causa: São principalmente introduzidas pelas conjunções e locuções: porque, que, como,
pois, porquanto, visto que, pois que, já que, uma vez que.
Concessão: São principalmente introduzidas pelas conjunções e locuções: embora, que,
ainda que, mesmo que, bem que, nem que, apesar de que.
Condição: São principalmente introduzidas pelas conjunções e locuções: se, caso, a não
ser que, salvo se, desde que, a menos que, no caso que, sem que.
Fim: São principalmente introduzidas pelas conjunções e locuções: para que, a fim de que,
que18.
18
In: Diciopédia X [DVD-ROM]. Porto, Porto Editora, 2006.
44
e mas ou logo pois (posposto)
nem porém ou...ou pois isto é
não só...... mas todavia ora...ora portanto ou seja
também contudo quer...quer por conseguinte por exemplo
no entanto seja...seja por isso ou melho,
entretanto nem...nem assim a saber
quer dizer
ou por outra
19
Adaptado de: http://www.educacao.te.pt/jovem/index.jsp?p=117&idArtigo=335
Consultado em 8.11.2008.
45
2. Tipos e formas de frases
21. Tipos de frase – Podemos ter quatro tipos de frases, consoante a mensagem a
transmitir numa comunicação emissor-receptor20:
a. Frase declarativa ou enunciativa: informa sobre um acontecimento ou situação.
Antes de sair verifiquei se estava tudo em ordem.
b. Frase interrogativa: frase que formula uma interrogação, directa ou indirecta.
O que me querias dizer? (directa)
Perguntei-lhe o que é que ele me queria dizer. (indirecta)
c. Frase imperativa: frase que formula uma ordem, um pedido, um conselho, uma exortação,
uma hipótese.
Começa a trabalhar!
Compre-me este livro!
Vai, antes que seja tarde!
d. Frase exclamativa: frase que exprime sentimentos e emoções - espanto, admiração,
alegria, amor, ódio, indignação, etc.
Detesto esta comida!
Oh, que maravilha de criança!
Que belo presente!
Que horror de guerra!
2.2. Formas de frase – Temos igualmente quatro formas de frases, que são alternativas, isto é, a
presença de uma implica a impossibilidade da outra:
a. Frase afirmativa: frase que exprime uma afirmação.
O homem é um animal racional.
b. Frase negativa: frase que exprime um negação.
O cão não é um animal racional.
c. Frase activa: frase na qual o sujeito pratica a acção.
O Tiago comeu o gelado inteiro.
d. Frase passiva: frase na qual o sujeito sofre a acção.
O gelado inteiro foi comido pelo Tiago.
20
A este propósito convém, recordar o esquema da comunicação proposto por R. Jakcobson, e a sua relação com as
respectivas funções da linguagem:
CONTEXTO
(f. referencial)
DESTINATÁRIO MENSAGEM
(f. emotiva (f. poética) (f. informativa)
CONTACTO
(f. fáctica)
CÓDIGO
(f. metalinguística)
46
I. Ficha de trabalho (aplicação e consolidação de conteúdos)
4. Redija uma oração para cada um dos tipos de coordenação e de subordinação estudados.
47
Sumário: Texto literário
1. Conceito de texto literário (versus texto utilitário)
2. Categorias da narrativa: acção, personagens, tempo e espaço;
3. Análise do texto.
I. Texto
A AIA21
21
Cf. Eça de Queirós, Contos. Copiado de: http://alfarrabio.di.uminho.pt/vercial/queiros5.htm
48
e a acender de novo a caçoleta dos seus perfumes; seria no Céu como fora na
terra, e feliz na sua servidão.
Todavia, também ela tremia pelo seu principezinho! Quantas vezes, com ele
pendurado do peito, pensava na sua fragilidade, na sua longa infância, nos anos
lentos que correriam antes que ele fosse ao menos do tamanho de uma espada, e
naquele tio cruel, de face mais escura que a noite e coração mais escuro que a
face, faminto do trono, e espreitando de cima do seu rochedo entre os alfanges da
sua horda! Pobre principezinho da sua alma! Com uma ternura maior o apertava
então nos braços. Mas se o seu filho chalrava ao lado – era para ele que os seus
braços corriam com um ardor mais feliz. Esse, na sua indigência, nada tinha a
recear da vida. Desgraças, assaltos da sorte má nunca o poderiam deixar mais
despido das glórias e bens do mundo do que já estava ali no seu berço, sob o
pedaço de linho branco que resguardava a sua nudez. A existência, na verdade,
era para ele mais preciosa e digna de ser conservada do que a do seu príncipe,
porque nenhum dos duros cuidados com que ela enegrece a alma dos senhores
roçaria sequer a sua alma livre e simples de escravo. E, como se o amasse mais
por aquela humildade ditosa, cobria o seu corpinho gordo de beijos pesados e
devoradores – dos beijos que ela fazia ligeiros sobre as mãos do seu príncipe.
No entanto um grande temor enchia o palácio, onde agora reinava uma
mulher entre mulheres. O bastardo, o homem de rapina, que errava no cimo das
serras, descera à planície com a sua horda, e já através de casais e aldeias felizes
ia deixando um sulco de matança e ruínas. As portas da cidade tinham sido
seguras com cadeias mais fortes. Nas atalaias ardiam lumes mais altos. Mas à
defesa faltava disciplina viril. Uma roca não governa como uma espada. Toda a
nobreza fiel perecera na grande batalha. E a rainha desventurosa apenas sabia
correr a cada instante ao berço do seu filhinho e chorar sobre ele a sua fraqueza
de viúva. Só a ama leal parecia segura – como se os braços em que estreitava o
seu príncipe fossem muralhas de uma cidadela que nenhuma audácia pode
transpor.
Ora uma noite, noite de silêncio e de escuridão, indo ela a adormecer, já
despida, no seu catre, entre os seus dois meninos, adivinhou, mais que sentiu, um
curto rumor de ferro e de briga, longe, à entrada dos vergéis reais. Embrulhada à
pressa num pano, atirando os cabelos para trás, escutou ansiosamente. Na terra
areada, entre os jasmineiros, corriam passos pesados e rudes. Depois houve um
gemido, um corpo tombando molemente, sobre lajes, como um fardo. Descerrou
violentamente a cortina. E além, ao fundo da galeria, avistou homens, um clarão
de lanternas, brilhos de armas... Num relance tudo compreendeu – o palácio
surpreendido, o bastardo cruel vindo roubar, matar o seu príncipe! Então,
rapidamente, sem uma vacilação, uma dúvida, arrebatou o príncipe do seu berço
de marfim, atirou-o para o pobre berço de verga – e tirando o seu filho do berço
servil, entre beijos desesperados, deitou-o no berço real que cobriu com um
brocado.
Bruscamente um homem enorme, de face flamejante, com um manto negro
sobre a cota de malha, surgiu à porta da câmara, entre outros, que erguiam
lanternas. Olhou – correu ao berço de marfim onde os brocados luziam, arrancou
a criança, como se arranca uma bolsa de ouro, e abafando os gritos no manto,
abalou furiosamente.
O príncipe dormia no seu novo berço. A ama ficara imóvel no silêncio e na
treva.
Mas brados de alarme atroaram de repente o palácio. Pelas janelas perpassou o
longo flamejar das tochas. Os pátios ressoavam com o bater das armas. E
desgrenhada, quase nua, a rainha invadiu a câmara, entre as aias, gritando pelo
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seu filho. Ao avistar o berço de marfim, com as roupas desmanchadas, vazio, caiu
sobre as lajes, num choro, despedaçada. Então calada, muito lenta, muito pálida,
a ama descobriu o pobre berço de verga... O príncipe lá estava, quieto, adormecido,
num sonho que o fazia sorrir, lhe iluminava toda a face entre os seus cabelos de
ouro. A mãe caiu sobre o berço, com um suspiro, como cai um corpo morto.
E nesse instante um novo clamor abalou a galeria de mármore. Era o capitão
dos guardas, a sua gente fiel. Nos seus clamores havia, porém, mais tristeza que
triunfo. O bastardo morrera! Colhido, ao fugir, entre o palácio e a cidadela,
esmagado pela forte legião de archeiros, sucumbira, ele e vinte da sua horda. O
seu corpo lá ficara, com flechas no flanco, numa poça de sangue. Mas ai! dor sem
nome! O corpozinho tenro do príncipe lá ficara também, envolto num manto, já frio,
roxo ainda das mãos ferozes que o tinham esganado!... Assim tumultuosamente
lançavam a nova cruel os homens de armas – quando a rainha, deslumbrada, com
lágrimas entre risos, ergueu nos braços, para lho mostrar, o príncipe que
despertara.
Foi um espanto, uma aclamação. Quem o salvara? Quem?... Lá estava junto
do berço de marfim vazio, muda e hirta, aquela que o salvara! Serva sublimemente
leal! Fora ela que, para conservar a vida ao seu príncipe, mandara à morte o seu
filho... Então, só então, a mãe ditosa, emergindo da sua alegria extática, abraçou
apaixonadamente a mãe dolorosa, e a beijou, e lhe chamou irmã do seu coração...
E de entre aquela multidão que se apertava na galeria veio uma nova, ardente
aclamação, com súplicas de que fosse recompensada, magnificamente, a serva
admirável que salvara o rei e o reino.
Mas como? Que bolsas de ouro podem pagar um filho? Então um velho de
casta nobre lembrou que ela fosse levada ao tesouro real, e escolhesse de entre
essas riquezas, que eram como as maiores dos maiores tesouros da Índia, todas
as que o seu desejo apetecesse...
A rainha tomou a mão da serva. E sem que a sua face de mármore perdesse
a rigidez, com um andar de morta, como num sonho, ela foi assim conduzida para
a Câmara dos Tesouros. Senhores, aias, homens de armas, seguiam num respeito
tão comovido que apenas se ouvia o roçar das sandálias nas lajes. As espessas
portas do Tesouro rodaram lentamente. E, quando um servo destrancou as janelas,
a luz da madrugada, já clara e rósea, entrando pelos gradeamentos de ferro,
acendeu um maravilhoso e faiscante incêndio de ouro e pedrarias! Do chão de
rocha até às sombrias abóbadas, por toda a câmara, reluziam, cintilavam,
refulgiam os escudos de ouro, as armas marchetadas, os montões de diamantes,
as pilhas de moedas, os longos fios de pérolas, todas as riquezas daquele reino,
acumuladas por cem reis durante vinte séculos. Um longo ah, lento e maravilhado,
passou por sobre a turba que emudecera. Depois houve um silêncio, ansioso. E
no meio da câmara, envolta na refulgência preciosa, a ama não se movia... Apenas
os seus olhos, brilhantes e secos, se tinham erguido para aquele céu que, além
das grades, se tingia de rosa e de ouro. Era lá, nesse céu fresco de madrugada,
que estava agora o seu menino. Estava lá, e já o Sol se erguia, e era tarde, e o seu
menino chorava decerto, e procurava o seu peito!... Então a ama sorriu e estendeu
a mão. Todos seguiam, sem respirar, aquele lento mover da sua mão aberta. Que
jóia maravilhosa, que fio de diamantes, que punhado de rubis, ia ela escolher?
A ama estendia a mão – e sobre um escabelo ao lado, entre um molho de
armas, agarrou um punhal. Era um punhal de um velho rei, todo cravejado de
esmeraldas, e que valia uma província.
Agarrara o punhal, e com ele apertado fortemente na mão, apontando para
o céu, onde subiam os primeiros raios do Sol, encarou a rainha, a multidão, e
gritou:
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– Salvei o meu príncipe, e agora – vou dar de mamar ao meu filho!
E cravou o punhal no coração.
II. Conceitos
1. http://127.0.0.1:6066/Texto narrativo
A narrativa pode ser definida como relato de acontecimentos que remetem para o
conhecimento do Homem e das suas realizações no mundo. É uma forma de literatura que
compreende o romance, a novela, o conto e a epopeia.
A nível de texto, pode ser entendida como um encadeamento discursivo, nas suas relações
com os acontecimentos que relata e o acto que o produz.
Na narrativa literária, com recurso frequente à ficção, por vezes socorrendo-se de
acontecimentos históricos, há uma expressão do mundo exterior e objectivo. Em geral, a
enunciação surge na terceira pessoa (por vezes, na primeira pessoa, quando o narrador assume o
papel de personagem), predominando a função referencial ou informativa da linguagem.
O texto narrativo, que permite uma comunicação através do discurso do narrador e da
história recriada, apresenta um discurso múltiplo e complexo que recorre, essencialmente, à
narração, à descrição, ao diálogo e ao monólogo.
2.1. As personagens (agentes da narrativa em torno dos quais gira a acção) podem
distinguir-se quanto:
c. ao relevo ou papel desempenhado como principais ou protagonistas (à volta das quais
decorre a acção), secundárias (participam na acção sem um papel decisivo) e figurantes
(servem apenas para funções decorativas dos ambientes); podem, também, ser individuais
ou singulares e colectivas.
d. à composição ou concepção e formulação, as personagens definem-se como modeladas ou
redondas (com densidade psicológica, capazes de alterarem o comportamento ao longo da
narrativa), planas (sem vida interior, sem alteração do comportamento ao longo da acção,
nem evolução psicológica) e tipos (personagens planas, representantes de um grupo
profissional ou social).
2.2. O espaço
2.2.1. O espaço físico (e geográfico) é formado pelo lugar onde decorre a acção, podendo
dizer-se
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- interior ou exterior,
- fechado ou aberto,
- público ou privado;
2.2.2. O espaço social e cultural caracteriza o meio em que vivem as personagens, a
situação social e económica ou os valores culturais, as tradições e os costumes; o espaço
psicológico exprime vivências que cada personagem tem do espaço físico ou de um espaço de
emoções e sensações.
Os ambientes, como cenários importantes para retratar situações, hábitos, atitudes, valores,
resultam dos espaços físicos, sociais, culturais e psicológicos.
2.3. O tempo dá conta da sucessão dos anos, dos dias, das horas em que acontece a história
ou dura a acção. Diz-se
- tempo cronológico se indica as datas e sucessão dos acontecimentos;
- tempo histórico o que corresponde à época ou ao momento em que decorre a acção;
- tempo do discurso ou da narrativa o que obedece à sequência do próprio
enunciado;
- tempo psicológico o que exprime a vivência subjectiva das personagens, que
permite uma percepção do decorrer do tempo.
3. O Resumo23
22
«Texto narrativo» In: Diciopédia X [DVD-ROM]. Porto, Porto Editora, 2006. (Adaptado)
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Extraído e adaptado de:
http://www.netprof.pt/netprof/servlet/getDocumento?TemaID=NPL070101&id_versao=11889
24
José Esteves Rei, Curso de Redacção II – O Texto, Porto, Porto Editora, 1994.
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Aspectos a considerar na redacção do resumo:
- respeitar a ordem pela qual o autor apresenta as suas ideias;
- manter o fio condutor do texto original;
- reduzir o texto original a um quarto da sua extensão;
Estilo a adoptar:
- o texto-resumo deve ser neutro e revelar uma linguagem clara e concisa;
- utilizar o discurso de 3ª pessoa;
- evitar a repetição de frases do texto (se for absolutamente necessário colocá-las
entre aspas);
- não utilizar o diálogo, se ele existir no texto original;
- distinguir o que é significativo do que não é;
- escolher apenas as ideias fundamentais;
- fazer um esforço de análise e de síntese.
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III. Ficha de trabalho (aplicação e consolidação de conteúdos)
2. Categorias da narrativa
2.1. Onde se passa a acção.
2.1.1. Sublinhe todos os elementos do texto que permitem localizar a acção no
espaço.
2.2. Quando se passa a acção.
2.2.1. Sublinhe todos os elementos do texto que permitem localizar a acção no
tempo.
2.3. Quem entra na acção.
2.3.1. Enumere as personagens. _______________________________
_________________________________________________________
2.3.2. Caracterize-as, a partir de elementos do texto.
2.3.2.1.Hierarquize-as, em função da sua maior ou menor importância no desenrolar
da acção. _____________________________________
___________________________________________________________
2.4. Estrutura da acção.
2.4.1. Indique a acção central e as secundárias, se as houver.
2.4.2. Divida o texto em partes (que considere lógicas) e sintetize-as.
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