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COMUNICAÇÃO

E EXPRESSÃO

Letícia Sangaletti
Comunicação oral
Objetivos de aprendizagem
Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados:

 Conhecer elementos de variação linguística.


 Interpretar as modalidades de fala e o grau de formalidade.
 Identificar os gêneros de cunho oral, textual e híbrido.

Introdução
A necessidade de comunicação é natural dos seres humanos e, para que
esta ocorra, línguas são usadas para promover as trocas. Interagir, influen-
ciar o próximo, explicitar sentimentos, trocar ideias são apenas algumas
das formas usadas para estabelecer relações interpessoais. Enquanto a
linguagem é a capacidade que o ser humano tem de se comunicar
e também todo e qualquer sistema de códigos que pode ser usado
como meio de comunicação entre sujeitos, a língua é, entre eles, o
código mais utilizado para estabelecer a comunicação. Já o código
é o conjunto de possibilidades que proporciona a comunicação
e, junto com a linguagem, permite que se construa uma língua,
caracterizando um povo, uma sociedade.
Neste texto, você vai acompanhar todo o processo que compreende a
comunicação oral e poder avaliar que não se trata de uma simples troca,
mas que existem diferentes elementos de variação linguística, modalidades
de fala e grau de formalidade, além de diferentes gêneros de cunhos oral,
textual e híbridos que fazem parte da comunicação oral. A língua pode
ser padrão (também chamada de linguagem formal e norma culta) ou
informal (linguagem coloquial), ou seja, a que usamos no dia a dia. Assim, o
uso que cada indivíduo faz da língua é a fala, que pode ser também formal
ou informal. Como vivemos em um país multicultural, e é natural que as
pessoas não falem da mesma forma, essa fala pode ser diferente de um
lugar para outro, de uma época para outra, assinalando a diversidade que
temos na língua e caracterizando o que chamamos de variação linguística.
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Elementos de variação linguística


A necessidade de se comunicar é natural aos seres humanos. A fim de que
diferentes formas de comunicação ocorram, ele utiliza linguagens. Por meio
delas, é possível realizar trocas. A linguagem é a capacidade que o ser humano
tem de se comunicar. Ela pode ser verbal e não verbal. Para Jakobson (2008),
a linguagem é um dos sistemas de signos que pode ser usado como meio de
comunicação entre sujeitos.
Já o código é o conjunto de possibilidades que proporciona a comunicação
e, junto com a linguagem, vai permitir que se construa uma língua. Esta
caracteriza um povo, uma sociedade. A língua pode ser padrão, (ou língua
formal e norma culta) ou informal (ou linguagem coloquial, a que se usa no
dia a dia). Assim, o uso que cada indivíduo faz da língua é a fala, que pode
ser também formal ou informal.
Variação linguística é a capacidade que a língua tem de se transformar e
se adaptar de acordo com alguns componentes, como o histórico, o social, o
regional e o estilo por meio do qual os indivíduos se manifestam verbalmente.
Ela é um movimento natural da língua, já que o sistema linguístico não é uni-
tário e comporta vários eixos de diferenciação. Assim, a variação pode ocorrer
em um ou em vários subsistemas de uma língua, seja fonético, morfológico,
fonológico, sintático, léxico ou semântico, promovendo a evolução da língua.

Níveis de variação linguística


Todo idioma se estabelece em vários níveis. Estes estão relacionados à forma
de pronunciar as palavras, que seria o nível fonético-fonológico. Também se
relacionam com a maneira de organizar os enunciados, no caso a sintaxe. Além
disso, têm relação com a maneira de escolher as palavras, que tange ao lexical
ou vocabular. Ainda estão em jogo o modo de dar sentido aos vocábulos, que é
o nível semântico, ou mesmo a maneira como a palavra é escrita ou utilizada,
no caso o nível morfológico. Observe alguns exemplos:

 Nível fonético-fonológico: está relacionado à diversificação das ma-


neiras de pronunciar palavras ou expressões. Por exemplo, gaúchos,
cariocas e nordestinos falam de forma diferente.
 Nível morfossintático: ocorre na variação da estrutura dos enunciados,
como na organização em períodos. Também há a conjugação de verbos
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irregulares como se fossem regulares. Exemplo: “manteu” em vez de


“manteve”, “ansio” quando o correto é “anseio”. Outro exemplo é o fato
de que em algumas regiões do Brasil se fala “você vai” e em outras
“tu vais” ou “tu vai”.
 Nível vocabular: diz respeito à utilização de diferentes palavras para
representar o mesmo objeto, fenômeno ou ser. Por exemplo: os termos
moleque, garoto, menino e guri significam a mesma coisa, assim como
mandioca, aipim e macaxeira. Outro exemplo de nível vocabular de
variação linguística é o uso de gírias.
 Nível semântico: esse nível está relacionado à variação no sentido que
as palavras adquirem ao longo do tempo, do espaço ou em diferentes
grupos sociais. Em Portugal, por exemplo, se usa a palavra alcatrão
com um sentido diferente do uso brasileiro. Aqui, alcatrão é um dos
componentes do cigarro; lá, se refere ao asfalto.

Tipos de variação linguística


No Brasil, a língua portuguesa possui diversos linguajares e é falada de várias
maneiras. Essas variações linguísticas são bastante evidentes. Afinal, cada
região teve sua história socioeconômica e por isso possui peculiaridades
linguísticas. Tais diferenças são compreendidas por meio dos elementos de
variação linguística, como questões históricas, geográficas, sociais e de estilo.
A variação linguística histórica é a maneira como a língua evolui ao longo
do tempo. São as mudanças que a língua sofreu ao longo da história. Como
exemplo, considere o pronome você. Ele se originou da expressão vossa mercê,
passou para vosmecê, virou vancê e chegou ao termo que se usa atualmente:
você. Isso quer dizer que a palavra evoluiu e se transformou ao longo do tempo.
Já a variação regional é chamada também de diatópica. Ela está relacionada
com palavras ditas em regiões diferentes, mas que significam a mesma coisa. Por
exemplo: aipim, mandioca e macaxeira são três palavras diferentes usadas para
designar a mesma coisa. Aqui também entra a parte fonética, como a forma de
pronunciar certas letras. O “r” no meio das palavras, por exemplo, é pronunciado de
forma diferente no Paraná e no Rio de Janeiro. Isso muda de acordo com a região.
A variação social ou diastrática tem a ver com os diferentes grupos sociais
e com os contrastes na linguagem. Pode ser por idade: quando o avô conversa
com a neta, as falas são diferentes. Por exemplo: “Seu avô era um pão” e
“Aquele menino é meu crush”.
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É difícil falar em diferenças culturais e variações de linguagem sem abordar o pre-


conceito linguístico. O estudioso Marcos Bagno, em seu livro Preconceito linguístico:
o que é, como se faz, recusa a noção que separa o uso da língua em certo e errado. O
autor apresenta alguns mitos sobre o preconceito linguístico, de modo a instigar seu
combate no dia a dia.
Para Bagno, o preconceito linguístico está ligado, em boa medida, à confusão que
foi criada, no curso da história, entre língua e gramática normativa.
Para o autor, esse preconceito é alimentado diariamente, especialmente pela mídia
e por livros e manuais que pretendem ensinar o que é “certo” e o que é “errado”. Além
disso, os instrumentos tradicionais de ensino da língua, que são a gramática normativa
e os livros didáticos, também contribuem para esse preconceito.
De acordo com Bagno (1999), o preconceito linguístico se baseia na crença de que só
existe uma única língua portuguesa digna deste nome. Esta seria a língua ensinada nas
escolas, explicada nas gramáticas e catalogada nos dicionários. Para Bagno (1999, p. 42):
“Qualquer manifestação linguística que escape desse triângulo escola-gramática-
-dicionário é considerada, sob a ótica do preconceito linguístico, ‘errada, feia, estropiada,
rudimentar, deficiente’, e não é raro a gente ouvir que ‘isso não é português’.
Um exemplo. Na visão preconceituosa dos fenômenos da língua, a transformação
de L em R nos encontros consonantais como em Cráudia, chicrete, praca, broco,
pranta é tremendamente estigmatizada e às vezes é considerada até como um sinal
do ‘atraso mental’ das pessoas que falam assim. Ora, estudando cientificamente a
questão, é fácil descobrir que não estamos diante de um traço de ‘atraso mental’ dos
falantes ‘ignorantes’ do português, mas simplesmente de um fenômeno fonético que
contribuiu para a formação da própria língua portuguesa padrão.”

Classe social também pode apontar variações de linguagem. Isso tem a ver
com o tipo de cultura com que você tem contato. Além disso, o grupo social
em que os indivíduos estão inseridos, como nerds, skatistas, surfistas, indica
variação. Se você não faz parte de determinado grupo, pode não entender
parte da linguagem utilizada por ele.
A variação de estilo ou diafásica é a que tem relação com a situação de
uso da língua, do que é e do que não é adequado. O estilo pode ser formal e
informal, padrão e não padrão, coloquial e culto. O modo de usar a língua
vai se adequar ao momento. Por exemplo: diante de um juiz, o sujeito vai
formalizar a língua, mas quando está com a família, amigos ou em intimidade,
a tendência é falar informalmente.
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Você pode encontrar os mesmos tipos de variação com outros termos, escritos por
outros teóricos, como Marcos Bagno. O pesquisador explica que há diferenças entre
os termos utilizados nas definições de variações linguísticas. Observe (BAGNO, 2007):
 Dialeto: uso da língua em determinada região.
 Socioleto: variedade linguística de determinado grupo com características (sociais,
profissionais, econômicas) comuns.
 Cronoleto: variedade de certa faixa etária.
 Idioleto: modo de falar característico de um indivíduo.

A transcrição da língua falada é um recurso cada vez mais explorado pela literatura,
tendo em vista a vivacidade que dá ao texto. Observe, no trecho a seguir, algumas
das características da língua falada. Você pode perceber, por exemplo, o uso de gírias
e de expressões populares e regionais, além de incorreções gramaticais e repetições.
“– Menino, eu nada disto sei dizer. A outro eu não falava, mas a ti eu digo. Eu não sei
que gosto tem esse bicho de mulher. Eu vi Aparício se pegando nas danças, andar por
aí atrás das outras, contar histórias de namoro. E eu nada. Pensei que fosse doença, e
quem sabe não é? Cantador assim como eu, Bentinho, é mesmo que novilho capado.
Tenho desgosto. A voz de Domício era de quem falava para se confessar:
– Desgosto eu tenho, pra que negar?…” (REGO, 1979).

Modalidades de fala e grau de formalidade


As modalidades são as diferenças presentes entre fala e escrita. Isso porque
na língua falada há, entre falante e ouvinte, uma interação direta. Já na língua
escrita, a comunicação ocorre geralmente sem a presença de um dos sujeitos
participantes. Estando próximos durante a troca, falante e ouvinte podem
utilizar diversos outros elementos significativos que complementam o discurso
verbal no processo de comunicação. Há, por exemplo, gestos, entonação,
expressões faciais, entre outros.
Vistas como práticas sociais, já que o estudo da língua se funda em usos,
as duas modalidades de fala da língua portuguesa são a oral e a escrita (MAR-
CUSCHI, 2001, p. 1). Como manifestação da prática oral, a fala é adquirida
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de modo natural em contextos informais do dia a dia. Também se desenvolve


nas relações sociais que se estabelecem desde o momento em que uma criança
nasce e tem os primeiros contatos com a mãe. Desse modo, o uso da língua
natural e o aprendizado são formas de socialização e inserção cultural.
É necessário identificar os elementos que fazem parte da situação comu-
nicativa para compreender e analisar adequadamente um texto, seja ele falado
ou escrito. Nesse caso, os componentes seriam falante – ouvinte/escritor – e
leitor. Além disso, é importante considerar as condições em que cada texto
foi produzido. São elas que possibilitam a ação social ou de interação que é
estabelecida entre os sujeitos. Além disso, elas são distintas em cada modali-
dade. A fala, por exemplo, possui como características, entre outras tantas, o
uso da palavra sonora e a interação face a face. Portanto, requer a presença dos
interlocutores no mesmo espaço físico e de tempo; o planejamento simultâneo
ou quase simultâneo à execução; a espontaneidade e o imediatismo. Além disso,
pode ser repetitiva e redundante. Ela considera o contexto extralinguístico e
possui recursos como signos acústicos e extralinguísticos, gestos, entorno
físico e psíquico.
No texto oral, você pode encontrar características inerentes à língua falada.
Há, por exemplo, os marcadores conversacionais. Eles são elementos típicos
da fala que não integram o conteúdo do texto, apresentando valor tipicamente
interacional. Por exemplo: “bom”, “eu acho que”, “quer dizer”, “então”, “en-
tende?” e “né?”). Há também as marcas prosódicas. Elas estão relacionadas
à pronúncia. Um exemplo são os alongamentos, como nos termos “ouVIR::” e
“faLAR::” (marcados com ::). Outros exemplos são a entonação enfática, assim
como nas palavras do exemplo anterior, “ouVIR::” e “faLAR::” (marcado com
::); e as hesitações, como “na medida em que... ahn” (uso do marcador “ahn”
associado ao alongamento é uma marca prosódica). Outra característica é a
repetição. Por exemplo: “O rádio de pilha, né? Quer dizer, o rádio de pilha”.
A correção é outra das características, por exemplo: “O rádio eu acho que
tem um papel até... numa certa medida... ele provocou pelo alCANce que tem
uma revolução até maiOr do que a televisão...”. E há ainda a paráfrase. Ela
é a relação de equivalência semântica: “através do rádio de pilha... ele pôde
se ligar ao resto do mundo, saber que existem outros lugares, outras pessoas,
que existe um governo...” (ANDRADE, 2011).
Você deve observar também os graus de formalidade que se usam na fala.
Geralmente, em uma situação formal, o indivíduo culto procura seguir as
regras da língua e conversar usando a norma culta, procurando também não
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usar vocabulário vulgar. Há pelo menos dois níveis de língua falada: a culta ou
padrão e a coloquial ou popular. Além dessas, a linguagem coloquial também
é registrada quando há o uso de gírias, na linguagem familiar, na linguagem
vulgar e nos regionalismos e dialetos.

De acordo com Marcuschi (2000), tanto a variedade escrita quanto a falada apresentam:
língua padrão/variedades não padrão; língua culta/língua coloquial; norma padrão/
normas não padrão. Afinal, a língua em si não é um sistema único e abstrato, mas
heterogêneo e repleto de variação.

Com relação às nomenclaturas, Bagno (2001) questiona a que tipo de


norma culta se referem aqueles que lidam direta ou indiretamente com a
língua portuguesa, já que há dois sentidos para o termo: (1) o que é norma,
frequente e habitual; ou (2) o que é normativo, elaborado, regra imposta.
De acordo com o teórico, o primeiro conceito está ligado à linguagem que
é empregada para designar formas linguísticas existentes na realidade
social. Já o segundo sentido é o mais difundido. Ele tem circulação maior
na sociedade e já se tornou senso comum, virando mais um preconceito
do que um conceito. Isso pois trata a língua como única e estática, como
se existisse apenas uma maneira certa de falar ou discorrer. Bagno propôs
novas nomenclaturas, pois percebeu alguns impasses no uso da norma
culta. Observe:

 Norma-padrão: designa o modelo ideal de língua; algo que está fora


e acima da atividade linguística dos falantes.
 Variedades prestigiadas: indicam as variedades linguísticas faladas
pelo cidadão com alta escolarização e vivência urbana.
 Variedades estigmatizadas: assinalam as variedades linguísticas que
caracterizam os grupos sociais desprestigiados do Brasil.

Você pode observar essas distinções na Figura 1.


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Figura 1. Nomenclaturas propostas por Bagno.


Fonte: Bagno (2001).

Você pode observar que existe uma zona intermediária entre as variedades
prestigiadas e as estigmatizadas. As influências de umas sobre as outras são
intensas e constantes. Para Bagno (2001, p. 80), “Isso é mais do que natural numa
sociedade complexa como a brasileira contemporânea, sobretudo por causa dos
meios de comunicação de massa (principalmente a televisão e o rádio)”.
A norma padrão fica no alto, na estratosfera da abstração, do virtual. Para
o teórico, ela exerce uma influência muito forte sobre o imaginário de todos
os brasileiros. Porém, essa influência diminui na medida em que se afasta das
camadas sociais privilegiadas. Essa norma-padrão está ligada à escola, ao en-
sino formal. Só se aproximam dela os brasileiros que conseguiram passar pelo
funil da educação formal, percorrendo até o fim o trajeto de formação escolar.
Por outro lado, há autores que apontam três níveis de linguagem que co-
laboram para compreender como o indivíduo falante pode se manifestar em
diferentes situações. De acordo com Preti (1994), é possível dividir os níveis
de fala em espécies. Observe:

 Formal (ou culto): usado em situações de formalidade, possui o pre-


domínio de linguagem culta, ou seja, obedece à gramática normativa.
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Geralmente é usado em situações que exigem tal posicionamento


do falante, como em discursos, sermões, apresentações de trabalhos
científicos.
 Coloquial (ou informal): é habitual em situações familiares ou de
menor formalidade. Tem predomínio de linguagem popular, linguagem
afetiva, expressões obscenas. É a manifestação espontânea da língua.
Nela, os falantes usam gírias, vocabulário às vezes pejorativo, formas
subtraídas ou cortes das palavras e conjugação verbal inadequada.
Também é pontuada por problemas de concordância verbal e nominal
e outras marcas da oralidade, como “né”, “daí”, “a gente”, etc. Esse
nível independe de regras e está presente nas conversas entre amigos
e familiares, por exemplo. Na internet, é comum encontrar o nível
coloquial em textos de diálogos, ou em redes sociais e em programas
de mensagens instantâneas.
 Comum: recebe contribuições de um e de outro.

Veja, na Figura 2, o nível de formalidade utilizado antigamente. Esse


também é um exemplo de variação linguística histórica.

Figura 2. Formalidade e variação linguística histórica.


Fonte: Biblioteca Digital Luso-Brasileira.
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Gêneros de cunho oral, textual e híbrido


Ao compreender como é a funcionalidade dos textos na interação dos indi-
víduos, você também investiga os diferentes textos utilizados para a comu-
nicação na sociedade. Isso leva a uma discussão sobre gêneros, já que eles
estão presentes em todas as circunstâncias e ações humanas. Afi nal, em
qualquer lugar em que exista linguagem, há gêneros textuais ou discursivos,
orais ou escritos.
Como as esferas de produção da linguagem são diversas, também há uma
multiplicidade de gêneros em diferentes situações e em formatos diversos.
No supermercado, por exemplo, você encontra panfletos, placas, indicações
de ofertas e a conta no caixa.
Desse modo, cada esfera elabora seus gêneros. E faz isso conforme aspectos
sociais próprios, finalidades comunicativas e especificidades das situações
de interação em que os enunciados estão sendo produzidos.
A denominação de gênero discursivo foi apresentada pela primeira vez
pelo autor russo Mikhail Bakhtin (1979). Ele caracterizou os gêneros como
tipos relativamente estáveis de enunciados. De acordo com o teórico, os gê-
neros de que os interlocutores sociais fazem uso nas interações verbais são
tão variados e heterogêneos quanto a diversidade de esferas de circulação
social nas interações verbais e as diferentes atividades humanas. Para Bakhtin
(1979), nas inúmeras esferas de circulação, o uso da língua ocorre ou em forma
de enunciados ou pela heterogeneidade de gêneros que os constitui. Você
pode encontrar uma diversidade de gêneros discursivos que se modificam e
se ampliam, dependendo dos contextos social e histórico em que circulam,
conforme as condições e finalidades de cada uma das esferas.

Circulando em diferentes esferas, os gêneros refletem o conjunto de temas e relações


possíveis nas formas de enunciar ou dizer algo. Assim, o enunciado está sempre nas
relações sociais. Ele constitui a unidade formal da língua e incorpora o estilo, a com-
posição e o tema. Bakhtin considerava esses aspectos indissoluvelmente vinculados.
Também afirmava que eles se concretizam em forma de gêneros.
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De acordo com o teórico Marcuschi (2005), os gêneros surgem como formas


da comunicação para atender a necessidades de expressão do ser humano. Eles
são conformados por influência do contexto histórico e social das diversas
esferas da comunicação humana. Para o estudioso, os gêneros textuais são
como “[...] entidades sociodiscursivas e formas de ação social incontornáveis
de qualquer situação comunicativa [...]” (MARCUSCHI, 2005, p. 19).
Isso quer dizer que os gêneros podem se modificar com o passar do tempo.
Eles podem surgir e desaparecer, além de se diferenciar de uma cultura para
outra. São dinâmicos e heterogêneos, variando de um diálogo informal até
as teses de doutorado, por exemplo. Você pode encontrá-los nas formas oral,
escrita e híbrida. Para Marcuschi (2008), não existe comunicação que não
seja feita por meio de algum gênero. Mesmo um indivíduo falante que não
possua saber técnico tem capacidade para se comunicar e ser compreendido
por seu interlocutor.
Marcuschi (2002, p. 22-23) explica que:

Usamos a expressão gênero textual como uma noção propositalmente vaga


para referir os textos materializados que encontramos em nossa vida diária e
que apresentam características sócio-comunicativas definidas por conteúdos,
propriedades funcionais, estilo e composição característica.

De acordo com o Marcuschi (2005), alguns exemplos de gêneros textuais seriam:


telefonema, sermão, carta comercial, carta pessoal, romance, bilhete, reportagem
jornalística, aula expositiva, reunião de condomínio, notícia jornalística, horóscopo,
receita culinária, bula de remédio, lista de compras, cardápio de restaurante, instruções
de uso, outdoor, inquérito policial, resenha, edital de concurso, piada, conversação
espontânea, conferência, carta eletrônica, bate-papo por computador, aulas virtuais
e assim por diante.

Marcuschi (2008) explica que os gêneros orais e escritos estão relacionados,


mas fala e escrita não são idênticas. O que dá tal classificação para cada uma
é a forma em que se originou. Por exemplo, um texto jornalístico não deixa
de ser um texto escrito por ter sido apresentado em um telejornal.
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Existem gêneros das culturas orais que nunca farão parte de culturas
caracteristicamente escritas, e vice-versa. Também é importante você lembrar
que a fala nem sempre reproduzirá a escrita, ou a escrita reproduzirá a fala.
Elas podem caminhar juntas sem anular as peculiaridades de uma ou outra.
Por outro lado, Marcuschi (2008) indica que os gêneros textuais não podem ser
considerados estanques. Eles são como entidades dinâmicas da materialização
de ações comunicativas. Podem ser híbridos, de modo a atingir determinados
objetivos comunicativos.

No link e no código a seguir, você pode assistir a uma


reportagem do Jornal Hoje que trata da riqueza linguística
do Brasil (ZIMMERMAN, 2014):

https://goo.gl/0UxH5z

Você pode aprender um pouco mais sobre a relação da


comunicação oral com a escrita assistindo ao vídeo “Ora-
lidade e escrita”, da TV Escola. Essa produção aborda os
diversos textos verbais que você pode encontrar no seu
cotidiano e que fazem parte da sua cultura. Para assistir,
acesse o link ou o código a seguir (BRASIL, c2017):

https://goo.gl/Z5CrpF
56 Comunicação oral

ANDRADE, M. L. C. V. de O. Língua: modalidade oral/escrita. In: UNIVERSIDADE ESTA-


DUAL PAULISTA. Caderno de formação: formação de professores didática geral. São
Paulo: Cultura Acadêmica, 2011. v. 11, p. 50-67.
BAGNO, M. Nada na língua é por acaso: por uma pedagogia da variação linguística.
São Paulo: Parábola, 2007.
BAGNO, M. Norma linguística e preconceito social: questões de terminologia. Veredas,
Juiz de Fora, v. 5, n. 2, 2001.
BAGNO, M. Preconceito linguístico: o que é, como se faz. 2. ed. São Paulo: Loyola, 1999.
BAKHTIN, M. M. Os gêneros do discurso. In: BAKHTIN, M. M. Estética da criação verbal.
São Paulo: Martins Fontes, 1979. p. 277-326.
BIBLIOTECA DIGITAL LUSO-BRASILEIRA. O Mercantil: jornal noticioso, commercial e
político. Rio de Janeiro: BDLB, c2017. Disponível em: <https://bdlb.bn.gov.br/acervo/
handle/123456789/48028>. Acesso em: 18 set. 2017.
Comunicação oral 57

BRASIL. Ministério da Educação. Oralidade e escrita. Brasília, DF: TV Escola, c2017. 1


vídeo. Disponível em: <http://tvescola.mec.gov.br/tve/video/perspectivas-lingua-
-portuguesa-oralidade-e-escrita>. Acesso em: 18 set. 2017.
JAKOBSON, R. Linguística e comunicação. 21. ed. São Paulo: Cultrix, 2008.
MARCUSCHI, L. A. Da fala para a escrita: atividades de retextualização. São Paulo:
Cortez, 2000.
MARCUSCHI, L. A. Gêneros textuais: definição e funcionalidade. In: DIONISIO, A. P.;
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MARCUSCHI, L. A. Gêneros textuais: definição e funcionalidade. In: DIONISIO, A.
P.; MACHADO, A. R.; BEZERRA, M. A. Gêneros textuais e ensino. 4. ed. Rio de Janeiro:
Lucerna, 2005.
MARCUSCHI, L. A. Letramento e oralidade no contexto das práticas sociais e eventos
comunicativos. In: SIGNORINI, I.; MARCUSCHI, L. A. (Org.). Investigando a relação oral/
escrito e as teorias do letramento. Campinas: Mercado de Letras, 2001. p. 23-50.
MARCUSCHI, L. A. Produção textual, análise de gêneros e compreensão. 3. ed. São Paulo:
Parábola, 2008.
PRETI, D. Sociolinguística: os níveis de fala. 7. ed. São Paulo: EDUSP, 1994.
REGO, J. L. Pedra bonita. 9. ed. Rio de Janeiro: J. Olympio, 1979.
TURMA DA MÔNICA. Chico Bento no shopping (1997). [S.l.]: YouTube, 2012. 1 vídeo.
Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=ffKjDBFvPxY>. Acesso em:
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ZIMMERMAN, A. ‘Sotaques do Brasil’ desvenda as diferentes formas de falar do bra-
sileiro. Jornal Hoje, 02 set. 2014. Disponível em: <http://g1.globo.com/jornal-hoje/
noticia/2014/08/sotaques-do-brasil-desvenda-diferentes-formas-de-falar-do-brasi-
leiro.html>. Acesso em: 18 set. 2017.

Leituras recomendadas
NOVO MILÊNIO. História da imprensa de Santos (1). [S.l.: s.n.], 2012. Disponível em: <http://
www.novomilenio.inf.br/santos/h0318z01.htm>. Acesso em: 17 set. 2017.
PRETI, D. O discurso oral culto. 2. ed. São Paulo: Humanitas, 1999.

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