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Mas e a norma culta, também chamada de norma-padrão, como fica nessa história?
A norma culta é indispensável e tão importante quanto as variações linguísticas. A norma culta rege um
idioma, aponta caminhos e deve ser estudada na escola para que assim todos tenham acesso às diferentes formas
de pensar a língua. Se, ao falarmos, escolhemos um vocabulário coloquial, menos preocupado com as regras
gramaticais, ao escrevermos devemos sim optar pela linguagem padrão, pois, um texto repleto de expressões
típicas pode não ser acessível para todos os tipos de leitores. Quando dizemos que a norma culta deve ser
priorizada nos textos escritos, estamos nos referindo, sobretudo, aos textos não literários, que cobram maior
formalidade de quem escreve.
Claro que todas as variedades linguísticas são eficazes na comunicação e possuem valor nas comunidades
em que são faladas. Apesar disso, existe entre as variedades uma que tem maior prestígio social, pois é
utilizada como exemplo: livros, documentos, cartas, comerciais, jornais, revistas, programas de tevê e por pessoas
que tiveram mais acesso aos estudos: é a língua padrão, também conhecida como variedade padrão ou norma
culta.
Essa é uma variedade de prestígio. Mas quando se fala de prestígio, o termo prestígio não deve ser
entendido como qualificador dessa variação em detrimento das outras. Usa-se o termo prestígio apenas porque
os falantes dessa variedade linguística gozam de prestígio social (escritores, médicos, advogados, etc).
Essa variedade linguística é necessária em diferentes momentos de nossa vida social: ao fazermos uma entrevista
para conseguir um emprego, ao apresentarmos um trabalho escolar, ao participarmos de um debate, ao
escrevermos uma carta para uma autoridade da prefeitura, ao fazermos um requerimento, etc. Dada sua
importância, a escola se propõe a ensinar a variedade padrão a todas as crianças e jovens do país, preparando-os
para ingressar na vida social.
O importante é se atentar que as variações linguísticas comprovam a organicidade da língua: ela não está
encerrada nos dicionários ou gramáticas; está viva, na boca do povo, seus verdadeiros donos. Na língua falada
não pode existir certo ou errado, o mais importante é que as pessoas se entendam, que a comunicação seja feita
de maneira eficiente. Você já observou que mesmo quem não domina as regras gramaticais é capaz de elaborar
enunciados compreensíveis? Mesmo não entendendo da sintaxe da língua, somos capazes de colocar as palavras
nos seus devidos lugares, respeitando o princípio da gramaticalidade e da inteligibilidade, elementos
fundamentais para que a comunicação aconteça satisfatoriamente.
Somos falantes hábeis, capazes de perceber quando e como empregar cada uma das variedades. Sabemos
que há situações em que devemos preferir a variedade padrão, pois será a mais adequada, aquela que estabelecerá
uma maior sintonia entre os interlocutores. Sabemos também que há situações em que as variedades não padrão,
permeadas por suas gírias e regionalismos, cumprem a contento a missão de comunicar. Não há problema algum
em alternar os dois registros, o importante é observar a pertinência de cada um deles, pois um será mais adequado
do que o outro, observadas as necessidades da comunicação. A linguagem foi feita para a comunicação, por isso,
comunique-se mais e sem medo de errar. Já que na verdade, na maioria das vezes não é um erro que está se
cometendo, mas sim o uso inadequado da variante linguística.
O que se deve fazer é, se atentar para a adequação linguística, princípio segundo o qual não se fala mais
em “certo” ou “errado” na avaliação de uma determinada variedade linguística. Fala-se, pois, se a variedade em
questão é adequada ou não à situação comunicativa (contexto) em que ela se manifesta. Isso significa que, em
um contexto formal ou solene, seria adequado o uso da linguagem formal (padrão, culta) e inadequado o uso de
uma variedade informal (coloquial). Da mesma forma, em situações informais, deve-se usar uma variante
informal (coloquial) em detrimento da linguagem formal (padrão, culta). E ter claro que o que é adequação
linguística é essencial para todos, família, escola, mídias, enfim, para a sociedade, pois só assim se poderá
contribuir para o fim do preconceito linguístico.
Variações Linguísticas
Quando falamos em variação linguística, analisamos os diferentes modos em que é possível expressar-
se em uma língua, levando-se em conta a escolha de palavras, a construção do enunciado e até o tom da fala. A
língua é a nossa expressão básica, e, por isso, ela muda de acordo com a cultura, a região, a época, o contexto, as
experiências e as necessidades do indivíduo e do grupo que se expressa. Veja quantos fatores empregamos para
adequar a nossa fala à situação e ao grupo em que nos encontramos.
Não é preciso que a distância seja tão grande: dentro do próprio Brasil, vemos diferenças de léxico
(palavras) ou de fonemas (sons, sotaques). Há diferenças entre a capital e as cidades do interior do mesmo estado.
Observemos alguns exemplos de diferenças regionais: “Mandioca”, “aipim” ou “macaxeira”? Os três nomes estão
corretos, mas, dependendo da região do Brasil, você ouvirá com mais frequência um ou outro. O mesmo vale
para a polêmica disputa entre “biscoito” e “bolacha”, que se estende para todo o território nacional.As gírias
também variam bastante regionalmente: cerveja pode ser conhecida como “bera” em regiões do Paraná, “breja”
em São Paulo e “cerva” no Rio de Janeiro.
Preconceito Linguístico
Tendo tantas variações e nuances, pudemos ver que cada contexto social traz naturalmente um modo mais
ou menos adequado de expressão, sendo importante entender que as variações linguísticas existem para
estabelecer uma comunicação adequada ao contexto pedido. Apesar disso, as diversas maneiras de expressar-
se ganham status de maior ou menor prestígio social baseado em uma série de preconceitos sociais: as variações
linguísticas ligadas a grupos de maior poder aquisitivo, com algum tipo de status social, ou a regiões tidas como
“desenvolvidas” tendem a ganhar maior destaque e preferência em relação às variedades linguísticas ligadas a
grupos de menor poder aquisitivo, marginalizados, que sofrem preconceitos ou que são estigmatizados.
Desenvolve-se, assim, o preconceito linguístico, que se baseia em um sistema de valores que afirma que
determinadas variedades linguísticas são “mais corretas” do que outras, gerando um juízo de valor negativo ao
modo de falar diferente daqueles que se configuram como os “melhores”. O preconceito linguístico nada mais
é do que a reprodução, no campo linguístico, de um sistema de valores sociais, econômicos e culturais.
“O preconceito linguístico deriva da construção de um padrão imposto por uma elite econômica e intelectual
que considera como “erro” e, consequentemente, reprovável tudo que se diferencie desse modelo. Além disso,
está intimamente ligado a outros preconceitos também muito presentes na sociedade, como preconceito
socioeconômico, preconceito regional, preconceito cultural, preconceito racial e a homofobia” (Marcos Bagno)
No entanto, ao estudarmos as variações linguísticas, percebemos que não há uma única maneira de
expressar-se e que, portanto, não há apenas um modo certo. A língua e sua expressão variam de acordo com uma
série de fatores. Antes de tudo, ela deve cumprir seu papel de expressão, sendo compreendida pelos falantes e
estando adequada aos contextos e às expectativas no ato da fala. Dessa forma, o ideal do preconceito linguístico,
que gera juízo de valor às diferentes variações linguísticas, não deve ser alimentado.