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Aula 10 – 30 de Agosto de 2023

Prof. Antonio Caminha M. Neto


30 de agosto de 2023

O teorema da melhor aproximação


Se V é um espaço euclidiano e S ⊂ V , o complemento ortogonal de S é
o subconjunto S ⊥ de V , definido por
S ⊥ = {u ∈ V ; u⊥v, ∀v ∈ S}.
Lema 1. Sejam V um espaço euclidiano.
(a) Para todo S ⊂ V , temos que S ⊥ é um subespaço de V .
(b) Se W é um subespaço de dimensão finita de V e B = {e1 , . . . , en } é uma
base de W , então u ∈ W ⊥ ⇔ u⊥ei , para 1 ≤ i ≤ n.
Prova.
(a) Tome u, v ∈ S ⊥ e α ∈ K, sendo K = R ou C. Então, para w ∈ S, temos
⟨u + αv, w⟩ = ⟨u, w⟩ + α ⟨u, w⟩ = 0,
| {z } | {z }
=0 =0

de forma que u + αv ∈ S ⊥ . Portanto, S ⊥ é um subespaço de V .

(b) Evidentemente, se u ∈ W ⊥ , então u⊥ei , para 1 ≤ i ≤ n. Reciprocamente,


suponha que u⊥ei , para 1 ≤ i ≤ n. Se v ∈ W , então v = ni=1 αi ei , para
P
certos α1 , . . . , αn ∈ K, com K = R ou C. Portanto,
n
X n
X
⟨u, v⟩ = ⟨u, αi ei ⟩ = αi ⟨u, ei ⟩ = 0,
i=1 i=1
| {z }
=0

de forma que u⊥v, para todo v ∈ W . Mas isso é outra forma de dizer que
u ∈ W ⊥.
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O resultado a seguir é conhecido como o teorema de ortogonalização


de Gram-Schmidt.
Teorema 2 (Gram-Schmidt). Sejam V um espaço euclidiano e (u1 , u2 , . . .)
uma sequência LI de elementos de V . Então, existe uma sequência (v1 , v2 , . . .)
de elementos não nulos de V satisfazendo as seguintes condições:
(a) vk ⊥ Span{v1 , . . . , vk−1 }, para todo k ≥ 2.
(b) Span{v1 , . . . , vk } = Span{u1 , . . . , uk }, para todo k ≥ 1.
Ademais, a sequência (v1 , v2 , . . .) é única, a menos de multiplicação de seus
elementos por escalares.
Prova. Inicialmente, mostremos, por indução sobre k ≥ 1, a existência de
uma sequência (vk )k≥1 satisfazendo as condições dos itens (a) e (b).
Para k = 1, tome v1 = u1 . Suponha, por hipótese de indução, que, para
k = l, existam v1 , . . . , vl ∈ V \ {0} satisfazendo as condições dos itens (a) e
(b). Para k = l + 1, procuremos vl+1 da forma
l
X
vl+1 = ul+1 − aj v j ,
j=1

com a1 , . . . , al ∈ K escalares a determinar. Pelo lema anterior, para que


vl+1 ⊥ Span{v1 , . . . , vl }, basta que vl+1 ⊥v1 , . . . , vl . Mas, para 1 ≤ j ≤ l,
l
X
⟨vl+1 , vj ⟩ = ⟨ul+1 − ai vi , vj ⟩
i=1
l
X
= ⟨ul+1 , vj ⟩ − ai ⟨vi , vj ⟩
i=1
= ⟨ul+1 , vj ⟩ − aj ||vj ||2 ,
de sorte que (vj ̸= 0 ⇒ ||vj || =
̸ 0)
⟨ul+1 , vj ⟩
⟨vl+1 , vj ⟩ = 0 ⇔ aj = .
||vj ||2
Se vl+1 = 0, então
l
X
ul+1 = aj vj ∈ Span{v1 , . . . , vl } = Span{u1 , . . . , ul },
j=1
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o que não é o caso. Portanto, vl+1 ̸= 0, o que garante que {v1 , . . . , vl , vl+1 }
satisfaz o item (a).
Quanto a (b), note que
l
X
vl+1 = ul+1 − aj vj
j=1

∈ Span{ul+1 } + Span{v1 , . . . , vl }
= Span{ul+1 } + Span{u1 , . . . , ul }
= Span{u1 , . . . , ul , ul+1 },
logo, Span{vl+1 } ⊂ Span{u1 , . . . , ul , ul+1 }. Mas aı́,
Span{v1 , . . . , vl , vl+1 } = Span{v1 , . . . , vl } + Span{v1+1 }
⊂ Span{u1 , . . . , ul } + Span{u1 , . . . , ul , ul+1 }
= Span{u1 , . . . , ul , ul+1 }.
A inclusão contrária pode ser estabelecida de maneira totalmente análoga,
uma vez que
l
X
ul+1 = vl+1 + aj v j
j=1

∈ Span{vl+1 } + Span{v1 , . . . , vl }
= Span{v1 , . . . , vl , vl+1 }.
Para a unicidade, suponha que (v1′ , v2′ , . . .) seja outra sequência em V \{0}
satisfazendo as condições dos itens (a) e (b). Mostremos, por indução sobre
k ≥ 1, que vk′ e vk são colineares, para todo k ≥ 1.
Para o caso inicial, como Span{v1′ } = Span{u1 } = Span{v1 }, temos que
v1′ e v1 são colineares. Suponha, por hipótese de indução, que vk′ e vk sejam
colineares, para 1 ≤ k ≤ l. Então,

vl+1 ∈ Span{v1′ , . . . , vl′ , vl+1

} = Span{v1 , . . . , vl , vl+1 } ⇒
l
X

⇒ vl+1 = αi vi + αl+1 vl+1
i=1
l
X

⇒ vl+1 − αl+1 vl+1 = αi vi := zl ∈ Span{v1 , . . . , vl }.
i=1
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Pela hipótese de indução e pelo lema anterior, temos que



vl+1 ⊥ Span{v1′ , . . . , vl′ } = Span{v1 , . . . , vl } ⇒ vl+1

⊥zl .

Como vl+1 ⊥ Span{v1 , . . . , vl }, também temos vl+1 ⊥zl , logo, vl+1 −αl+1 vl+1 ⊥zl .

Mas, como zl = vl+1 − αl+1 vl+1 , segue que zl ⊥zl , logo, zl = 0; assim,

vl+1 = αl+1 vl+1 , conforme desejado.
O corolário a seguir elabora a demonstração do teorema anterior em um
algoritmo, conhecido como o algoritmo de ortonormalização de Gram-
Schmidt.
Corolário 3 (Gram-Schmidt). Todo espaço euclidiano V , de dimensão n,
possui uma base ortonormal {e1 , . . . , en }, a qual pode ser obtida a partir de
uma base qualquer (u1 , . . . , un ) mediante o emprego do seguinte algoritmo:
• Faça e1 = 1
||u1 ||
u1 .

• Uma vez calculados e1 , . . . , ek , para um certo inteiro k tal que 1 ≤ k <


n, faça
k
X 1
e′k+1 = uk+1 − ⟨uk+1 , ei ⟩ei e ek+1 = e′k+1 .
i=1
||e′k+1 ||

Prova. Suponha que, para um certo inteiro 1 ≤ k < n, o conjunto {e1 , . . . , ek }


seja ortonormal e gere o mesmo subespaço que {u1 , . . . , uk }. Então, e′k+1 ̸= 0
(pois, do contrário, uk+1 pertenceria a Span{e1 , . . . , ek } = Span{u1 , . . . , uk })
e, para 1 ≤ j ≤ k,
k
X
⟨e′k+1 , ej ⟩ = ⟨uk+1 − ⟨uk+1 , ei ⟩ei , ej ⟩
i=1
k
X
= ⟨uk+1 , ej ⟩ − ⟨uk+1 , ei ⟩⟨ei , ej ⟩
i=1
Xk
= ⟨uk+1 , ej ⟩ − ⟨uk+1 , ei ⟩δij
i=1
= ⟨uk+1 , ej ⟩ − ⟨uk+1 , ej ⟩ = 0.

Portanto, {e1 , . . . , ek , e′k+1 } é ortogonal, logo, {e1 , . . . , ek , ek+1 } é ortonormal.


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Além disso, argumentando como na demonstração do teorema anterior, é


imediato verificar que Span{e1 , . . . , ek , ek+1 } = Span{u1 , . . . , uk , uk+1 }.
Em particular, {e1 , . . . , en−1 , en } é ortonormal e Span{e1 , . . . , en−1 , en } =
Span{u1 , . . . , un−1 , un } = V . Então, {e1 , . . . , en−1 , en } é base ortonormal de
V.

Corolário 4. Se V é um espaço euclidiano de dimensão m e W é um su-


bespaço de V de dimensão n, então V possui uma base ortonormal {e1 , . . . , em }
tal que {e1 , . . . , en } é base de W . Uma tal base ortonormal é dita adaptada
a W.

Prova. Tome uma base (u1 , . . . , um ) para V , tal que (u1 , . . . , un ) seja uma
base para W . Aplicando o algoritmo de ortonormalização de Gram-Schmidt
a (u1 , . . . , um ), terminamos com uma base ortonormal {e1 , . . . , em } para V ,
tal que Span{e1 , . . . , en } = Span{u1 , . . . , un } = W . Então, {e1 , . . . , en } é
uma base ortonormal para W .

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