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Fundamentos de

Análise Matemática
Material Teórico
Noções de lógica proposicional

Responsável pelo Conteúdo:


Prof. Dr. Francisco Augustin Machado Echalar

Revisão Textual:
Profa. Esp. Kelciane da Rocha Campos
Noções de lógica proposicional

• Introdução
• Conceitos iniciais
• Operações com proposições
• Regras de inferência e de equivalência
• Para praticar

OBJETIVO DE APRENDIZADO
· Conceituar o cálculo proposicional, apresentar suas técnicas e
relacioná-lo com o raciocínio dedutivo.

ORIENTAÇÕES
Nesta unidade, discutiremos a lógica proposicional. Trata-se, na verdade, de um primeiro
aprofundamento de questões que já apareceram na unidade anterior, como a questão
de determinar se uma afirmação é uma consequência logicamente necessária de outras.
Quando dizemos “é lógico que...”, é isso que estamos querendo dizer. No entanto, será
que é mesmo lógico?

Talvez você se surpreenda, mas essa lógica foi traduzida em fórmulas, tanto que em
muitos livros ela é chamada de Cálculo Proposicional. Esse processo de formalização
foi iniciado em meados do século XIX. Uma segunda possível surpresa é o fato de que o
assunto desta unidade não é a única lógica. Há outras lógicas. Falaremos disso ao longo
do texto.

Como continuidade da unidade anterior, valem as mesmas recomendações: o assunto pode


parecer difícil, pois trata de formas de pensamento com as quais você talvez não esteja
acostumado(a). Mais ainda, trata-se de estudar uma determinada forma de pensamento.
Por isso é muito importante que leia com atenção o material.

Provavelmente, você vai ter dúvidas. Registre-as. Pense sobre elas. Consulte o material
complementar. Pesquise sobre conceitos e demonstrações específicos. Procure refazer
os exemplos. Veja se entendeu cada um dos passos. Faça as atividades. Elas são parte
importante do processo de aprendizado.

Entender o conceito de inferência lógica aprofunda a compreensão do que é o raciocínio


dedutivo, que é, como dissemos anteriormente, entender um dos aspectos mais específicos
do saber matemático acadêmico.
UNIDADE Noções de lógica proposicional

Contextualização
O tema da unidade é a lógica proposicional. Uma preocupação central da lógica
são os argumentos. É um dos primeiros conceitos de que trataremos, mas aqui
vamos dar uma primeira noção. Um argumento, segundo o Dicionário Houaiss, é
uma “razão, raciocínio que conduz à indução ou dedução de algo”, ou ainda “prova
que serve para afirmar ou negar um fato”. A ideia é, então, usar um discurso racional
para fundamentar uma conclusão. A pergunta que a Lógica procura responder é:
“será que esse discurso realmente fundamenta essa conclusão?”.

Veja o seguinte exemplo: “você deve aceitar realizar tarefas que não são suas se
não quiser ser despedido(a).” A ideia é que, caso você não faça o que foi pedido,
você sofrerá uma consequência desagradável; logo, é bom que você faça o que foi
pedido. Conforme a situação, esse tipo de argumento (conhecido como argumento
de “apelo à força”) pode ser muito convincente. Mas será que ele é lógico? Veja,
ameaças de demissão não são argumentos racionais; a verdade da conclusão “é
bom que você faça o que foi pedido” não tem a ver com a força do argumento,
mas sim com a força do chefe.

Vejamos o seguinte exemplo da Matemática. Uma série infinita é uma soma com
infinitas parcelas. Talvez pareça estranha uma soma desse tipo, mas com certeza
3 3 3 3
você já usou algumas delas. Veja um exemplo: + + + + … Essa
10 100 1000 10000
soma nada mais é do que a dízima 0,3333... E, como você deve se lembrar, ela
tem um valor bem determinado: 3 + 3 + 3 + 3 + … = 0,3333… = 1 . No
10 100 1000 10000 3
entanto, isso não acontece com toda série. Veja a série a seguir, cujo resultado
estamos chamando de S: S = 1 – 1 + 1 – 1 + 1 – 1 + 1 – 1 ...

Vamos tentar calcular o valor de S de dois jeitos diferentes. No primeiro jeito,


agrupamos em duplas as parcelas, tal como elas aparecem na expressão acima:

S = (1 – 1) + (1 – 1) + (1 – 1) + (1 – 1) ... = 0 + 0 + 0 + 0 + ...

A ideia é que cada 1 terá um -1 que o anula e, consequentemente, teremos S = 0.

Mas veja o que acontece se começarmos o agrupamento a partir da 2ª parcela:

S = 1 + (– 1 + 1) + (– 1 + 1) + (– 1 + 1) + (– 1 + 1) + ... = 1 + 0 + 0 + 0 + 0 + ...

Desse jeito, cada – 1 terá logo em seguida um + 1 que o anula. Sobra apenas o
primeiro 1, e teremos, então, S = 1.

Qual o agrupamento correto? Isto é, qual o argumento correto? Percebe que


temos que pensar com cuidado como articulamos as ideias? Não é possível que duas
sequências de ideias aparentemente corretas deem resultados diferentes, concorda?

Pensar logicamente nos ajuda a ver mais claramente os argumentos. E estudar


lógica nos ajuda a aprimorar nosso pensamento lógico.

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Introdução
A Lógica estuda as formas do pensamento. Ela é diferente da Psicologia,
que procura entender a função pensamento no contexto da psique da pessoa.
Ela também é diferente do estudo de um pensamento específico sobre um tema
específico. Ela estuda a FORMA do pensamento. Esquisito, não? Ao final da
unidade isso deve ficar mais claro.

Lógica: parte da filosofia que trata das formas do pensamento em geral (dedução, indução,
Explor

hipótese, inferência etc.) e das operações intelectuais que visam à determinação do que é
verdadeiro ou não
Fonte: Dicionário Houaiss

Conceitos iniciais
Segundo a definição do Dicionário Houaiss, a lógica trata de dedução, indução,
formulação de hipóteses, inferências, isto é, formas de organizar o pensamento.
Elas adquirem sentido no contexto maior de identificar uma conclusão a partir de
um conjunto de dados prévios. As regras da Lógica permitem avaliar se a conclusão
obtida é verdadeira ou plausível.

Conclusão: ponto de vista a que se chega a partir de dados da observação, ou do raciocínio,


Explor

ou de discussão
Fonte: Dicionário Houaiss

Faremos aqui uma introdução à Lógica Proposicional. Você encontrará uma


apresentação mais abrangente e aprofundada no livro “Introdução à Lógica”, do
Prof. Cezar Mortari (MORTARI, 2001).

O elemento básico da Lógica Proposicional é a proposição.

Proposições: são sentenças declarativas às quais podemos atribuir um destes dois valores
Explor

lógicos: ou verdadeiro ou falso.

A sentença “que dia é hoje?” é uma proposição?

Perceba que proposições não podem ser nem perguntas nem ordens, porque
dizer que uma pergunta é falsa, ou que uma ordem é verdadeira, não tem
nenhum sentido.

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7
UNIDADE Noções de lógica proposicional

Por exemplo, a pergunta “Que dia é hoje?” não é uma proposição, mas a
sentença “Eu perguntei que dia é hoje” é uma proposição, porque posso dizer que
ela é verdadeira, se eu a tiver feito, ou falsa, se eu não a tiver feito. Do mesmo
modo, a ordem “Não estacione na vaga exclusiva” não é uma proposição, mas a
sentença “Mandei que João não estacionasse na vaga exclusiva” é uma proposição,
porque ela será verdadeira, se dei essa ordem a João, ou falsa, se não a dei.

Também não são proposições sentenças abertas, isto é, sentenças que têm algum
termo desconhecido. Por exemplo: x > 2, ou então X é um cantor. Enquanto não
soubermos quanto vale x, não podemos avaliar se essa sentença é verdadeira ou
falsa. Se soubermos que x = 1, no primeiro caso, e X é Roberto Carlos, então a
primeira sentença será uma proposição falsa e a segunda verdadeira.

Atenção! A presença de uma incógnita não implica que a sentença não seja uma
proposição. Por exemplo, “se x = 3, então x² = 9”

Entre os princípios da Lógica Proposicional estão o Princípio do Terceiro Excluído


e o Princípio da Não Contradição. O Princípio do Terceiro Excluído afirma que
uma proposição só pode ser falsa ou verdadeira. O Princípio da Não Contradição
afirma que uma proposição não pode ser simultaneamente falsa e verdadeira.

Vejamos um exemplo. Considere a seguinte afirmação: “A escada tem 23 degraus”.


Ela é uma proposição? Sim, porque você pode dizer que ela é verdadeira (se ela tiver 23
degraus) ou falsa (se não tiver 23 degraus). O princípio do terceiro excluído diz que não
há uma terceira possibilidade: ou a escada tem 23 degraus, e a afirmação é verdadeira,
ou a escada não tem 23 degraus, e a afirmação é falsa. Além disso, observe que a
afirmação não pode ser simultaneamente verdadeira e falsa: a escada não pode ao
mesmo ter e não ter 23 degraus – conforme o princípio da não contradição.

O que você acha? Há coisas na vida que não se encaixam nesses princípios? Na vida é tudo
Explor

preto ou branco? É possível eliminar todas as contradições do dia a dia?

Esses princípios definem alguns limites para a Lógica Proposicional. É importante


ter isso em mente quando você a estuda, mas também quando você a usar ao
apresentar argumentos matemáticos a seus alunos. O reconhecimento desses
princípios faz parte de aprender Matemática.

Como dissemos na contextualização, a lógica pretende analisar argumentos.


Chegou a hora de apresentá-los formalmente.

Um argumento é um conjunto de pelo menos duas proposições. Uma dessas proposições


Explor

é a conclusão do argumento. As outras são as premissas. O argumento pressupõe que as


premissas são provas da veracidade da conclusão.

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Todo argumento visa a justificar sua conclusão com base em suas premissas.
Em outras palavras, as premissas são provas para afirmarmos que a conclusão é
verdadeira. Quando as premissas são provas conclusivas da conclusão, dizemos
que o argumento é dedutivo; quando as premissas fornecem provas convincentes,
mas não são conclusivas, dizemos que o argumento é indutivo. Esse segundo tipo
de argumento é estudado com auxílio de ferramentas da Probabilidade.

O argumento dedutivo apresenta premissas que são provas conclusivas da conclusão.


Explor

O argumento indutivo apresenta premissas que são provas convincentes, mas não conclusivas.

A Lógica Proposicional é dedutiva. Nesse caso, as premissas do argumento


devem fornecer provas conclusivas de que a conclusão é verdadeira. Se essa
pretensão é procedente, isto é, se as premissas fornecem prova conclusiva,
dizemos que o argumento é válido; se essa pretensão não é procedente, dizemos
que o argumento é inválido. A Lógica estuda as condições em que o argumento
é válido ou não válido.
Todo raciocínio (ou argumento) dedutivo é válido ou inválido; a tarefa da lógica dedutiva
é esclarecer a natureza da relação entre as premissas e a conclusão em argumentos
válidos, e assim nos permitir que discriminemos os argumentos válidos dos inválidos.
(COPY, 1978, p. 35)

Um argumento dedutivo válido muito conhecido é: “Todos os homens são mortais.


Sócrates é um homem. Logo, Sócrates é mortal”. Temos aqui três proposições:
(1) todos os homens são mortais; (2) Sócrates é um homem; (3) logo Sócrates é
mortal. A primeira e a segunda proposições são premissas; a terceira proposição,
introduzida pela conjunção “logo”, é a conclusão. As outras duas proposições são
premissas. Esse é um argumento dedutivo porque, se as premissas são verdadeiras,
a conclusão não pode ser falsa.

Um exemplo de argumento inválido é: “Todo homem é bípede. Galinhas


são bípedes. Logo, galinhas são homens”. Esse argumento é inválido porque
as premissas (“todo homem é bípede” e “galinhas são bípedes”) não oferecem
prova conclusiva da conclusão. Ambas são verdadeiras, mas isso não é suficiente
para garantir que galinhas são homens. Observe que o fato da conclusão ser falsa
não é motivo para o argumento ser inválido. Do mesmo modo, não é porque
sua conclusão é verdadeira que o argumento anterior é válido. A validade de um
argumento está ligada a sua estrutura.

Observe mais um exemplo de argumento válido: “Todas as canetas daquele


estojo são vermelhas. Esta caneta foi tirada daquele estojo. Logo, esta caneta é
vermelha”. Esse argumento é também um argumento dedutivo: se todas as canetas
daquele estojo são vermelhas e esta caneta foi tirada daquele estojo, então ela é
vermelha. Trata-se de uma consequência lógica.

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UNIDADE Noções de lógica proposicional

Observe que tanto o exemplo da caneta como o exemplo a respeito de Sócrates


têm o mesmo formato, apesar de falarem de coisas diferentes. Esse formato pode
ser descrito como: “se A é B e B é C, então A é C”. No primeiro exemplo,
A é “Sócrates”, B é “homem” e C é “mortal”; no segundo, A é “esta caneta”,
B é “tirada daquele estojo”, C é “vermelha”. Portanto, qualquer argumento que
apresente o formato “se A é B e B é C, então A é C” é válido, não importando
o que seja A, B e C. O uso de letras no lugar de sentenças permite que se dê
destaque ao formato do argumento, porque é no formato que aparece a validade
do argumento. A Figura 1 ilustra isso.

Figura 1 - Se cada elemento do conjunto A pertence também ao conjunto B (A está contido em B), e todo
elemento do conjunto B pertence também ao conjunto C, então a conclusão lógica é que todo elemento de A
também pertence a C.
Para que fique clara a importância do formato, substitua as sentenças por
letras no seguinte exemplo de argumento inválido: “Todos os maranhenses são
brasileiros. João é brasileiro. Logo, João é maranhense.” Nesse caso, A é João,
B é brasileiro e C é maranhense. O formato é: “Se A é B e C é B, então A é C”.
Observe que não é porque A e C são B, que A é C. A pode não ser C, nem por isso
as premissas (A é B e C é B) são menos verdadeiras. No exemplo, há brasileiros
que não são maranhenses: João pode ser mineiro, por exemplo.

Tomemos novamente o exemplo “Todo homem é bípede. Galinhas são bípedes.


Logo, galinhas são homens”. Podemos traduzi-lo do seguinte modo: Se A é B e C
é B, então C é A. Trata-se de algo equivalente ao exemplo do parágrafo anterior e
igualmente inválido, concorda?

A Lógica se preocupa com a forma como as premissas dos argumentos se


encadeiam para levar à conclusão. O próprio argumento tem uma forma padrão:
“Se as premissas forem verdadeiras, então a conclusão é verdadeira.” Essa estrutura
“se..., então...” é chamada de implicação. Simbolicamente, escrevemos P → Q,
onde P representa o conjunto de todas as premissas, Q representa a conclusão
e → representa a relação de implicação “se..., então ...”. Lemos essa expressão
(P → Q) como “se P, então Q”.

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Argumentos inválidos podem ser falaciosos. São nesse caso falácias formais. É
formal porque está ligado à forma do argumento. Veja este exemplo de uma falácia
formal: “Seu amigo disse que se ganhasse na Mega-Sena, iria para a Europa. Ele
foi para a Europa. Logo, ele ganhou na Mega-Sena”.

Falácia é qualquer argumento ou raciocínio falso que parece verdadeiro, isto é, cuja conclusão
Explor

não é justificada pelas suas premissas, mas parece que sim.

Há falácias não formais, cujo erro não está relacionado à forma do


argumento, mas sim ao uso de premissas falsas que parecem verdadeiras ou
então de premissas que parecem mais plausíveis que a conclusão, mas não o
são. Considere o exemplo: “Se você não concorda conosco, você está contra
nós. Como você nos fez uma crítica, você está contra nós.” A premissa é
falsa. Trata-se de um falso dilema, pois é possível discordar de alguém sem
necessariamente estar contra essa pessoa.

Operações com proposições


Considere o argumento apresentado na contextualização: “O primeiro cálculo
resulta em S = 0. O segundo cálculo resulta em S = 1. Não é possível que uma
soma tenha dois resultados diferentes. Logo, não é possível que os dois cálculos
estejam corretos”.

Quais são as premissas? E a conclusão?

A conclusão é fácil de identificar: é a proposição que segue a palavra “logo”.


Chamaremos essa proposição de Q. As outras proposições são as premissas. Na
verdade, apesar de não estar escrito assim, a ideia é a seguinte: “Considerando que
o primeiro cálculo resulta em S = 0 E que o segundo cálculo resulta em S = 1 E que
não é possível que uma soma tenha dois resultados diferentes, concluímos que...”.
Observe cada conectivo “e” em destaque. Cada um está combinando as duas
proposições, a que vem antes e a que vem depois dele, numa nova proposição.
Assim, se a primeira é a proposição A e a segunda é a proposição B, o resultado
da combinação feita pelo “e” é “A e B”. Perceba que esse resultado é uma nova
proposição. Em resumo, partimos de duas proposições e chegamos a uma terceira
combinação das duas primeiras. Chamamos isso de uma operação binária com
proposições. Como usamos o conectivo “e”, essa operação se chama conjunção.

Uma outra operação binária é a implicação, característica da estrutura de um


argumento, como mencionado anteriormente: “Se P então Q”, ou simbolicamente
P → Q. O argumento todo acima pode ser resumido pela seguinte proposição: “Se
A e B e C, então Q.”

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UNIDADE Noções de lógica proposicional

Neste item pretendemos discutir como determinar o resultado de diferentes


operações com proposições, isto é, o valor lógico (verdadeiro ou falso) da
proposição resultante da combinação de duas proposições cujos valores lógicos são
conhecidos. Cada operação tem uma ou mais palavras-chaves que a caracterizam.

Apresentaremos e discutiremos quatro operações lógicas: a conjunção (“E”),


a disjunção (“OU”), a implicação (“SE..., ENTÃO ...”) e a equivalência (“SE E
SOMENTE SE”). Além disso, apresentaremos uma operação que não é uma
combinação de duas proposições, mas a alteração do valor de uma proposição: a
negação (“NÃO”) – isto é, ela não é uma operação binária, mas sim unária (atua
sobre apenas uma proposição).

O resultado de uma operação lógica pode ser apresentado na forma de uma


tabela-verdade. Pela tabela-verdade, podemos obter o resultado de fórmulas lógicas
compostas por operações lógicas a partir dos valores das proposições iniciais. As
colunas iniciais apresentam as proposições iniciais; as colunas seguintes apresentam
o resultado de cada operação individual na ordem em que são realizadas; e cada linha
corresponde a uma possibilidade para a combinação de valores das proposições
iniciais. Se há duas proposições iniciais, como na conjunção ou na implicação, há
quatro possibilidades: as duas verdadeiras, a primeira verdadeira e a segunda falsa,
a primeira falsa e a segunda verdadeira, as duas falsas. E as tabelas-verdade da
conjunção e da implicação terão quatro linhas cada.

Pode haver fórmulas mais complexas, com mais de duas proposições iniciais. Se
há três proposições iniciais, há 8 possibilidades diferentes: VVV, VVF, VFV, VFF,
FVV, FVF, FFV, FFF. Se há n proposições iniciais, há 2n possibilidades diferentes.

Começamos pela conjunção. A conjunção é uma operação lógica de valor


verdadeiro se as duas proposições que ela combina são verdadeiras. Pegando o
exemplo com que iniciamos este item, a ideia é que as três premissas (“O primeiro
cálculo resulta em S = 0. O segundo cálculo resulta em S = 1. Não é possível que
uma soma tenha dois resultados diferentes”) sejam verdadeiras juntas, por isso as
ligamos por meio de “e”s. Se uma das proposições for falsa, a conjunção é falsa.

Considere um outro exemplo: “Alan é motorista de ônibus e sindicalizado”. Essa


proposição somente será verdadeira se a primeira proposição (“Alan é motorista de
ônibus”) e a segunda proposição (“Alan é sindicalizado”) forem as duas verdadeiras.
Se uma das duas for falsa, a conjunção é falsa. O Quadro 1 representa a tabela-
verdade da conjunção. Observe que a conjunção é dada pela fórmula A∧B. O
símbolo ∧ representa o “E”. A conjunção A∧B é lida como “A E B”.

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Quadro 1 – Tabela-verdade da conjunção .

A B A∧B
V V V

V F F
F V F
F F F

A disjunção é uma operação lógica que tem valor verdadeiro se uma de suas
duas proposições é verdadeira. O conectivo característico é o “OU”. O resultado
da operação de disjunção, então, é “A ou B”, o que significa: a proposição A é
verdadeira, ou a proposição B é verdadeira, ou as duas são verdadeiras. A disjunção
é falsa somente se as duas proposições forem falsas.

Considere a sentença: “Alan é motorista de ônibus ou sindicalizado”. Essa


proposição é verdadeira se a primeira proposição (“Alan é motorista de ônibus”) ou
a segunda proposição (“Alan é sindicalizado”) é verdadeira, ou ainda as duas juntas
forem verdadeiras. A proposição inicial será falsa apenas se as duas proposições
que a compõem forem falsas, isto é, se Alan não for nem motorista de ônibus
nem sindicalizado. O Quadro 2 apresenta a tabela-verdade da disjunção. Observe
que representamos a disjunção pela fórmula A∨B. O símbolo ∨ significa “OU”.
A disjunção A∨B é lida como “A OU B”.

Quadro 2 – Tabela-verdade da disjunção A∨B .

A B A∨B
V V V
V F V
F V V
F F F

Passemos agora à implicação, que já mencionamos rapidamente. Como


dissemos, a implicação tem a forma “se A, então B”.

Na implicação, a proposição A (que exprime a condição) é chamada de antecedente e a proposição


B (que exprime a consequência se a condição é verdadeira) é chamada de consequente.

Suponha que um amigo seu diga: “Se eu ganhar na Mega-Sena, então eu vou
para a Europa.” Em que circunstâncias você pode dizer que essa frase é falsa?

Observe que se ele não ganhar na Mega-Sena, você não poderá dizer que ele
mentiu. Se ele não ganhou o prêmio nem foi para a Europa, a frase nem por isso
é falsa. A frase diz o que ele fará se ele ganhar o prêmio. Não diz absolutamente
nada sobre o que ele fará se não ganhar o prêmio. Concorda?

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UNIDADE Noções de lógica proposicional

O mesmo vale para o caso em que ele não ganhe na Mega-Sena e ainda assim
for para a Europa. Ele pode ter ido para a Europa por ter conseguido dinheiro com
a venda de um carro, por exemplo. Ou por ter ganhado uma herança de um tio
distante que ele nem conhecia. Repetimos: a frase inicial não diz nada sobre o que
acontece se o rapaz não ganhar na Mega-Sena. Então, você não pode dizer que
ela é falsa nesse caso.

Qualquer implicação do tipo “se A, então B” diz apenas e exclusivamente que


se a afirmação A é verdadeira, então a afirmação B é verdadeira. Ela não diz o que
acontece se A é falsa. Se A for falsa, B pode ser falsa ou verdadeira, porque “se A,
então B” não diz nada sobre o que ocorre se A é falsa.

A única coisa que essa afirmação diz é que se A é verdadeira, B não pode ser
falsa. Se isso acontecer, se A for verdadeira e B falsa, então essa será a única
situação em que a implicação “Se A, então B” será considerada falsa. O Quadro 3
representa a tabela-verdade da implicação.

Quadro 3 – Tabela-verdade da implicação A → B.


A B A→B
V V V
V F F
F V V
F F V

Considerando o exemplo discutido, a frase do seu amigo “se eu ganhar na


Megasena, vou para a Europa” só é falsa se ele de fato ganhar o prêmio e não for
para a Europa. Em todos os outros casos, a frase é verdadeira.

Uma outra formulação possível diz que “se A, então B”, A é uma condição
suficiente para B, mas B é apenas uma condição necessária para A. Isto é, se A
for verdadeiro, necessariamente B também será (por isso A é condição suficiente
para B), mas se B for verdadeira, não podemos dizer que A também é. Para
que consideremos que A é verdadeira, B tem que ser verdadeira (daí condição
necessária), mas só isso não basta, pois pode acontecer de B ser verdadeira sem
que A seja. No exemplo, supondo que a frase é verdadeira, se você sabe que seu
amigo ganhou na Mega-Sena, pode concluir que ele vai para a Europa; mas se seu
amigo está na Europa, você não pode concluir nada, apenas sabe que é possível
que ele tenha ganhado na Mega-Sena.

Na linguagem coloquial, usualmente se considera que existe uma relação causal entre o
antecedente e o consequente de uma implicação. Em termos lógicos, isso não é necessário. A
proposição “Se eu fizer um bolo então 3 + 2 = 5” é uma afirmação legítima e verdadeira, eu
fazendo ou não o bolo.

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Importante! Importante!

A definição de implicação, mais especificamente a implicação material, contradiz


algumas noções do dia a dia. Por exemplo, ela não diz que o antecedente deve ser
verdadeiro para que o consequente também seja. Mais ainda, atribui o valor verdadeiro
à implicação quando o antecedente é falso. Há formulações alternativas que tentam
evitar isso, no entanto elas criam outras complicações. Apresentamos a formulação
tradicional da implicação material.

Renato Mendes Rocha discute mais aprofundadamente essas dificuldades


Explor

da implicação no seu artigo ROCHA, R. M. Implicação lógica e material: es-


clarecendo pequenas confusões comuns. Intuitio, vol. 6, nº. 2, 2013, p. 239-252.
Disponível em http://goo.gl/WcTe2z
Acesso em: 13 set. 2015.

Nossa próxima operação é a equivalência. A equivalência é caracterizada pelo


termo “SE E SOMENTE SE”: A é verdadeira se e somente se B é verdadeira.
Em outras palavras, ela tem valor verdadeiro quando as duas proposições que ela
combina têm valores iguais: ou as duas são falsas, ou as duas são verdadeiras. Do
contrário, a equivalência tem valor falso. A equivalência entre as proposições A e
B será representada simbolicamente por A ↔ B.

A equivalência pode ser entendida como a conjunção de


duas implicações: “A se e somente se B” é a mesma coisa
que “Se A, então B, E se B, então A.” Simbolicamente
(A↔B)↔((A→B)^(B→A)):

Por exemplo, dado um número inteiro x, x² é par se e somente se x é par.


Nesse caso, a proposição “x² é par” é equivalente a “x é par”, ou seja, não é
possível que x seja par sem que seu quadrado também seja, e vice-versa.

Em termos práticos, a equivalência significa que podemos trocar A por B e


vice-versa, porque seus valores são sempre os mesmos. Se isso é possível, então
a equivalência é verdadeira. Se isso não é possível, isto é, se há um caso em que
A é verdadeiro e B é falso, então a equivalência é falsa. Um exemplo em que a
equivalência é falsa: “x² é positivo se e somente se x é positivo”; ora, x² é sempre
positivo, mas x pode ser negativo. Basta pensarmos em x² = 9 e x = -3. O Quadro
4 mostra a tabela-verdade da equivalência. Como dissemos anteriormente, ela só
será verdadeira se ambas as proposições tiverem o mesmo valor lógico.

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UNIDADE Noções de lógica proposicional

Quadro 4 – Tabela-verdade da equivalência A↔B.


A B A↔B
V V V
V F F
F V F
F F V

A última operação de que trataremos, a negação, é uma operação unária, isto


é, atua apenas sobre uma proposição. Se a proposição é verdadeira, sua negação
é falsa; se a proposição é falsa, a negação é verdadeira. No Quadro 5, isso é
apresentado na forma de uma tabela-verdade. Simbolicamente, a negação de A é
representada por ¬A, que se lê “NÃO A”.

Quadro 5 – Tabela-verdade da negação ¬A.


A ¬A
V F
F V

Considere o exemplo: A é “Alan é motorista de ônibus”, sua negação ¬A é “não


é verdade que Alan seja motorista de ônibus”, ou então “Alan não é motorista de
ônibus”. Se B é “Alan é sindicalizado”, sua negação ¬B é “não é verdade que Alan
seja sindicalizado”, ou algo semelhante.

Essas operações podem ser combinadas para formar proposições bastante


complexas. Vejamos dois exemplos. Primeiro este aqui: “Todo homem é bípede.
Galinhas são bípedes. Logo, galinhas são homens”. Façamos as traduções para a
linguagem simbólica. O resultado relativo às proposições isoladas está sintetizado
no Quadro 6.

Quadro 6 – transcrição de proposições do exemplo “Todo homem é bípede. Galinhas são bípedes. Logo, galinhas
são homens”.
Proposição inicial Proposição reescrita Representação simbólica
Todo homem é bípede Se x é homem então é bípede A→B
Galinhas são bípedes Se x é galinha então é bípede C→B
Galinhas são homens Se x é galinha então é homem C→A

Combinando essas proposições num argumento, temos o seguinte:

((A→B)∧(C→B))→(C→A)

Façamos a tabela-verdade dessa proposição. O resultado está no Quadro 7.

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Quadro 7 – Tabela-verdade de ((A→B)∧(C→B))→(C→A). Para simplificar os rótulos das colunas, vamos
chamar (A→B)∧(C→B) de P e a fórmula completa de R.

A B C A→B C→B P C→A R


V V V V V V V V
V V F V V V V V
V F V F F F V V
V F F F V F V V
F V V V V V F F
F V F V V V V V
F F V V F F F V
F F F V V V V V

Observe que há um caso em que a proposição é logicamente falsa: quando A é


falso. Isto é, quando não é verdade que homens são bípedes. Ou seja, o argumento
não é válido, pois pode ocorrer das premissas serem verdadeiras e a conclusão
válida. Observe também que a não validade do argumento decorre da sua estrutura
lógica e não do valor lógico de suas premissas e conclusões.

Uma proposição como a acima é uma contingência: em algumas situações ela é


verdadeira, em outras ela é falsa.

Vejamos um segundo exemplo: “Os brasileiros são homens. Homens


são mortais. Logo os brasileiros são mortais.” Façamos as traduções para a
linguagem simbólica. O resultado relativo às proposições isoladas está sintetizado
no Quadro 8.

Quadro 8 – transcrição de proposições do exemplo


“Os brasileiros são homens. Homens são mortais. Logo, os brasileiros são mortais.”
Proposição inicial Proposição reescrita Representação simbólica
Brasileiros são homens Se x é brasileiro então é homem A→B
Homens são mortais Se x é homem então é mortal B→C
Brasileiros são mortais Se x é brasileiro então é mortal A→ C

Combinando essas proposições num argumento, temos o seguinte:

((A→B)∧(B→C))→(A→C)

Façamos a tabela-verdade dessa proposição. O resultado está no Quadro 9.

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UNIDADE Noções de lógica proposicional

Quadro 9 – Tabela-verdade de ((A→B)∧(B→C))→(A→C). Para simplificar os rótulos das colunas, vamos


chamar (A→B)∧(B→C) de P e a fórmula completa de R.

A B C A→B B→C P A→C R


V V V V V V V V
V V F V F F F V
V F V F V F V V
V F F F V F F V
F V V V V V V V
F V F V F F V V
F F V V V V V V
F F F V V V V V

Observe que a fórmula é verdadeira quaisquer que sejam os valores lógicos das
proposições A, B e C. Esse tipo de fórmula é chamado de tautologia. Isso indica
que o argumento é válido. Isto é, a estrutura lógica do argumento garante que se as
premissas forem verdadeiras, obrigatoriamente a conclusão será verdadeira.

Importante! Importante!

Observe que, apesar de um argumento válido ser representado por uma fórmula que
é sempre verdadeira, isso não quer dizer que a conclusão é verdadeira. O argumento
válido garante apenas que quando as premissas forem verdadeiras, a conclusão será
verdadeira. Não diz nada sobre o que ocorre se as premissas forem falsas.

Terminamos falando das regras de precedência das operações. Se numa mesma


proposição houver partes entre parênteses, negações, disjunções, conjunções,
implicações e equivalências, por onde se deve começar? É um verdadeiro cálculo.
Do mesmo modo que em Matemática, primeiro se faz o que está entre parênteses.
Depois as negações. Em seguida, as conjunções e disjunções. Depois as implicações,
e por último as equivalências

Ordem de precedência das operações:


1) Operações entre parênteses.
2) Negações.
3) Disjunções e Conjunções.
4) Implicações.
5) Equivalências.

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Regras de inferência e de equivalência
Há uma série de fórmulas tautológicas muito úteis ao analisar argumentos. Elas
podem ser divididas em dois grupos: regras de inferência e regras de equivalência.
As fórmulas lógicas podem ser bastante complicadas e essas regras nos permitem
trabalhar com elas de um modo parecido ao que os produtos notáveis e as regras
da álgebra nos permitem manipular equações até resolvê-las.

As regras de equivalência são regras que nos permitem trocar uma proposição
por uma outra proposição. Isso é possível porque elas são logicamente equivalentes,
isto é, sempre que uma é verdadeira a outra também é, e vice-versa. O quadro 10
apresenta uma lista das principais regras de equivalência.

Quadro 10 – Regras de equivalência.


Nome da Regra Expressão Expressão equivalente
P∨Q Q∨P
Comutatividade
P∧Q Q∧P
(P∨Q)∨R P∨(Q∨R)
Associatividade
(P∧Q)∧R P∧(Q∧R)
¬(P∨Q) (¬P∧¬Q)
Leis de De Morgan
¬(P∧Q) (¬P∨¬Q)
Condicional P→Q (¬P∨Q)
Dupla negação ¬¬P P
Fonte: Gersting (2001, p. 16).

A primeira regra diz o seguinte: que P e Q é equivalente a Q e P; que P ou Q


é equivalente a Q ou P. A segunda regra diz que dois “ou”s em sequência podem
ser calculados na ordem que for mais conveniente. O mesmo vale para dois “e”s
em sequência. Você pode provar essas equivalências construindo a tabela-verdade
correspondente. Por exemplo, para primeira regra referente ao “ou”, construir a
tabela-verdade de (P∨Q)↔(Q∨P) .

As regras seguintes correspondem à negação do “OU” e à negação do “E”. Você


nega o “OU” usando um “E”. Você nega um “E” usando um “OU”. Explicaremos
isso a seguir.

Essas leis são chamadas Leis de De Morgan em homenagem ao matemático e lógico inglês
Explor

Augustus de Morgan (1806-1871). Sua obra principal é “Lógica formal ou cálculo de inferência”,
em que trata da lógica do ponto de vista algébrico. Ele e George Boole (1815-1864), fundador
da lógica matemática moderna, contribuíram para o ressurgimento da lógica no século XIX.
Mais detalhes sobre esse matemático você encontra em: http://ecalculo.if.usp.br/historia/morgan.htm

Comecemos pela negação da conjunção. Lembra que a conjunção é falsa quando


uma das duas proposições é falsa?Não é necessário que as duas sejam falsas. Basta
uma. Por isso, para negar o “E” usamos o “OU”. Portanto, quando dizemos que

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UNIDADE Noções de lógica proposicional

A∧B é falsa, isso significa que A ou B são falsas. Simbolicamente, escrevemos


¬(A∧B)↔(¬A)∨(¬B). Analise em particular as três últimas colunas do Quadro
11, que mostra a tabela-verdade dessa equivalência. Observe que os valores da
antepenúltima e da penúltima são idênticos. Por conseguinte, as duas fórmulas são
equivalentes, o que se traduz como verdadeiro em todos os casos na última coluna.

Quadro 11 – Tabela-verdade de ¬(A∧B)↔(¬A)∨(¬B).


Para simplificar os rótulos das colunas, R representa a fórmula completa.

A B A∧B ¬A ¬B ¬(A∧B) (¬A)∨(¬B) R


V V V F F F F V
V F F F V V V V
F V F V F V V V
F F F V V V V V

Em termos verbais, a negação de “Alan é um motorista de ônibus e sindicalizado”


é “Alan não é um motorista de ônibus OU não é sindicalizado”.

Vejamos agora a negação da disjunção. Uma disjunção é falsa quando as duas


proposições que ela combina são falsas. Assim, quando dizemos que A OU B
é falsa, isso significa que A E B são falsas. Se uma das duas fosse verdadeira,
a disjunção também seria. Logo, as duas têm de ser falsas. Simbolicamente,
escrevemos ¬(A∨B)↔(¬A)∧(¬B). A tabela-verdade está representada no Quadro
12. Do mesmo modo que para a conjunção, analise em particular as três últimas
colunas. Observe que os valores da antepenúltima e da penúltima são idênticos. Por
conseguinte, as duas fórmulas são equivalentes, o que se traduz como verdadeiro
em todos os casos na última coluna.

Quadro 12 – Tabela-verdade de ¬(A∨B)↔(¬A)∧(¬B).


Para simplificar os rótulos das colunas, R representa a fórmula completa.
A B A∨B ¬A ¬B ¬(A∨B) (¬A)∧(¬B) R
V V V F F F F V
V F V F V F F V
F V V V F F F V
F F F V V V V V

Em termos verbais, a negação de “Alan é um motorista de ônibus ou é


sindicalizado” é “Alan não é um motorista de ônibus OU não é sindicalizado”.

Passemos agora para a regra do condicional. Essa regra nos diz que qualquer
implicação é equivalente a uma disjunção. Veja, a implicação P → Q diz que se P é
verdadeiro, Q também é. Isso é equivalente a dizer que P é falso ou Q é verdadeiro.
Verbalmente, com o exemplo discutido na implicação, temos que “se eu ganhar

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na Mega-Sena, vou para a Europa” é equivalente a “Não ganho na Mega-Sena,
ou vou para a Europa”. Você não acredita que são equivalentes? Se chamarmos
“Ganho na Mega-Sena” de A e “vou para a Europa” de B, a frase “se eu ganhar
na Mega-Sena, vou para a Europa” é traduzida por A → B. A frase “Não ganho
na Megasena, ou vou para a Europa” por sua vez é traduzida por ¬A∨B. Você não
acredita que são equivalentes? Façamos a tabela-verdade da equivalência das duas
fórmulas. Ela está representada no Quadro 13.

Quadro 13 – Tabela-verdade de (¬A∨B)↔(A→B).


Para simplificar os rótulos das colunas, R representa a fórmula completa.
A B ¬A ¬A∨B A→B R
V V F V V V
V F F F F V
F V V V V V
F F V V V V

Observe o resultado final: é uma tautologia, ou seja, as duas formulações são


equivalentes logicamente, quaisquer que sejam os valores de A e B.

Finalmente, a última regra é a dupla negação, isto é, a negação de uma negação.


A negação de uma proposição que já é a negação de uma proposição é equivalente
à proposição original. No exemplo, A é “Alan é um motorista de ônibus”, ¬A é
“Alan não é um motorista de ônibus”, a negação de ¬A , representada por ¬¬A,
é “não é verdade que Alan não é motorista de ônibus”, isto é, “Alan é motorista
de ônibus”. Em resumo, a negação de uma negação é uma afirmação. A segunda
negação anula os efeitos da primeira. No Quadro 14, temos a tabela-verdade da
negação da negação.

Quadro 14 – Tabela-verdade da dupla negação A.


A ¬A ¬¬A
V F V
F V F

Observe que, como dissemos, a negação da negação equivale à afirmação


original. Simbolicamente, escrevemos: ¬¬A↔A .

Passemos às regras de inferência. A grande diferença com relação às regras de


equivalência é que as regras de inferência só funcionam num sentido. Isso quer
dizer que se a regra diz que de P podemos concluir Q, isso não quer dizer que de
Q podemos concluir P. Só para lembrar, se uma regra de equivalência diz que P
equivale a Q, diz também que Q equivale a P. O Quadro 15 apresenta as principais
regras de inferência. A primeira coluna apresenta o nome da regra, a segunda
apresenta aquilo que é conhecido e a terceira, aquilo que podemos escrever sabendo
aquilo que é conhecido.

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UNIDADE Noções de lógica proposicional

Quadro 15 – Regras de inferência.


Nome da Regra A partir de Podemos deduzir
Adição P P∨Q
Simplificação P∧Q P, Q
Modus Tollens ¬Q,(P→Q) ¬P
Modus Ponens P,(P→Q) Q

Fonte: Gersting (2001, p. 16).

A regra da adição diz o seguinte: Se P é verdade, então P∨Q é verdade, e


podemos escrever essa fórmula. A regra da simplificação diz que se a proposição
composta P∧Q é verdade, cada uma das proposições individuais P e Q também é,
e podemos escrevê-las isoladamente. Essas duas regras podem ser expressas pelas
fórmulas a seguir. Para verificá-las, basta construir suas tabelas-verdades.
• Adição: P→ P∨Q
• Simplificação:

P∧Q→Q

P∧Q→P

O Modus Tollens diz o seguinte: se sabemos que P→Q, e sabemos que Q é


falso (sua negação é verdadeira), podemos concluir que P é falso (sua negação é
verdadeira), isto é, podemos substituir ¬Q∧(P→Q), por ¬P. O Modus Ponens diz o
seguinte: se sabemos que P→Q, e sabemos que P é verdadeira, podemos concluir
que Q é verdadeira, isto é, podemos substituir P∧(P→Q), por Q. Também essas
duas regras podem ser expressas pelas fórmulas a seguir. E para verificá-las, basta
construir suas tabelas-verdades.

Modus Tollens: ¬Q∧(P→Q)→¬P

Modus Ponens: P∧(P→Q)→Q

Todas essas regras, como dissemos, são ferramentas para manipular fórmulas
lógicas. Faremos um exemplo para mostrar isso. Considere a seguinte fórmula:

(A→(B∧C))∧((B∧C)→D)∧(D→E∨(¬E→F))∧A∧¬E→F

Ela é uma tautologia? Isto é, o lado esquerdo da última implicação é condição


suficiente para o lado direito (o F)? Você pode fazer isso por meio de tabela-verdade,
mas ela terá 128 linhas e mais de quinze colunas.

Vamos mostrar que sim usando as regras acima. Vamos fazer isso passo a passo,
numerando-os. Cada passo corresponde a algo que pode ser escrito a partir daquilo
que já se sabia. Os primeiros passos são os mais simples, constituem a transcrição
de cada uma das premissas presentes no antecedente da implicação acima.

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Passo Justificativa

1. (A→(B∧C)) Premissa

2. ((B∧C)→D) Premissa

3. (D→E∨(¬E→F)) Premissa

4. A Premissa

5. ¬E Premissa

Agora começa o trabalho dedutivo. É preciso combinar essas cinco premissas


com auxílio de alguma das regras, visando a obter simplificações. Olhe por
exemplo o passo 1 e o passo 4. Percebe que podemos aplicar neles o modus
ponens para simplificar A→(B∧C) escrevendo apenas (B∧C)? Agora que temos
(B∧C), observe que ela é o antecedente da implicação do passo 2. Podemos usar
novamente o modus ponens e obter D isolado. Ora, D por sua vez é o antecedente
de uma implicação, a do passo 3. Usando novamente o modus ponens, obtemos
E∨(¬E→F). Tudo isso está sintetizado a seguir.

5. (B∧C) Modus ponens sobre passos 4 e 1

6. D Modus ponens sobre passos 5 e 2

7. E∨(¬E→F) Modus ponens sobre passos 6 e 3

Observe que simplificamos bastante a expressão. Agora precisamos usar os passos


5 e 7 para obter o F. Vamos transformar o “ou” do passo 7 numa implicação. Para isso
precisamos fazer uma negação. Isso pode ser feito com a dupla negação, substituindo E
por ¬¬E. Em seguida usamos a regra do condicional para fazer aparecer a implicação.
Em seguida basta aplicar duas vezes em sequência o modus ponens.

8. ¬¬E∨(¬E→F) dupla negação sobre o E do passo 7

9. ¬E→(¬E→F) regra do condicional sobre o passo 8

10. ¬E→F Modus ponens sobre passos 9 e 5

11. F Modus ponens sobre passos 10 e 5

E está provado que a fórmula é uma tautologia. Acaba ficando mais simples do
que montar uma tabela-verdade gigante.

Um último exemplo. Provar que a fórmula P∧(Q→R)∧((P∧Q)→(S∨¬R))∧Q→S


descreve um argumento válido, isto é, é uma tautologia. A seguir apresentamos a
dedução e suas justificativas:

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UNIDADE Noções de lógica proposicional

Passo Justificativa
1. P Premissa
2. (Q→R) Premissa
3. (P∧Q)→(S∨¬R) Premissa
4. Q Premissa
5. R Modus ponens sobre passos 4 e 2
6. (P∧Q) Conjunção sobre passos 1 e 4
7. (S∨¬R) Modus ponens sobre passos 6 e 3
8. (¬R∨S) Comutatividade sobre passo 7
9. R→S Condicional sobre passo 8
10. S Modus ponens sobre passos 9 e 5

Para praticar
1) Dada a fórmula ¬(A → B) ^ (A v C): (a) determine o número de linhas e de
colunas que terá sua tabela-verdade; (b) construa a tabela-verdade.

2) Considere o seguinte argumento: “Chove ou faz sol. Se faz sol, as minhocas


morrem. Não chove. Logo, as minhocas morrem.” Traduza esse argumento
para uma fórmula e construa sua tabela-verdade. Esse argumento é válido?

3) Considere as seguintes afirmações: “Se hoje é quinta-feira, então 2 + 2 =


4”; “Se hoje é quinta-feira, então 2 + 2 = 5”; “Se 2 + 2 = 5, então os seres
humanos são imortais.” Em que circunstância cada uma delas é verdadeira?
Por que a resposta anterior contradiz o senso comum?

4) Demonstre dedutivamente que o argumento da questão 2 é válido.

Respostas
1) Dada a fórmula ¬(A→B)∧(A∨C): (a) determine o número de linhas e de
colunas que terá sua tabela-verdade; (b) construa a tabela-verdade.

a) São três proposições elementares, então a tabela terá 2³ = 8 linhas. São 3


proposições elementares e 4 operações. A tabela terá 7 colunas.

b) A B C A→B ¬(A→B) (A∨C) ¬(A→B)∧(A∨C)


V V V V F V F
V V F V F V F
V F V F V V V
V F F F V V V
F V V V F V F
F V F V F F F
F F V V F V F
F F F V F F F

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2) Considere o seguinte argumento; “Chove ou faz sol. Se faz sol, as minhocas
morrem. Não chove. Logo, as minhocas morrem.” Traduza esse argumento
para uma fórmula e construa sua tabela verdade. Esse argumento é válido?

A: Chove

B: Faz sol

C: Minhocas morrem

Chove ou faz sol: A∨B

Se faz sol, as minhocas morrem: B→C

Fórmula completa: (A∨B)∧ (B→C)∧¬A→C

(A∨B)∧
A B C A∨B B→C ¬A (A∨B)∧ (B→C) (A∨B)∧ (B→C)∧¬A
(B→C)∧¬A→C
V V V V V F V F V
V V F V F F F F V
V F V V V F V F V
V F F V V F V F V
F V V V V V V V V
F V F V F V F F V
F F V F V V F F V
F F F F V V F F V

O argumento é válido, pois a tabela-verdade da fórmula é uma tautologia.

3) Considere as seguintes afirmações: “Se hoje é quinta-feira, então 2 + 2 =


4”; “Se hoje é quinta-feira, então 2 + 2 = 5”; “Se 2 + 2 = 5, então os seres
humanos são imortais.” Em que circunstância cada uma delas é verdadeira?
Por que a resposta anterior contradiz o senso comum?

“Se hoje é quinta-feira, então 2 + 2 = 4” – é sempre verdadeira, mesmo quando


não é quinta-feira.

“Se hoje é quinta-feira, então 2 + 2 = 5” – só é falsa às quintas-feiras. Nos


outros dias é verdadeira, apesar do consequente ser falso.

“Se 2 + 2 = 5, então os seres humanos são imortais.” – é sempre verdadeira


apesar do antecedente e do consequente serem falsos.

Elas contradizem o senso comum porque este valoriza as relações de causa


e efeito, enquanto a implicação matemática é definida sem essa preocupação,
apenas com base nas alternativas da tabela-verdade.

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UNIDADE Noções de lógica proposicional

4) Demonstre dedutivamente que o argumento da questão 2 é válido.

(A∨B)∧ (B→C)∧¬A→C

1. (A∨B) hipótese
2. (B→C) hipótese
3. ¬A hipótese
4. (¬¬A∨B) dupla negação sobre 1
5. (¬A→B) condicional sobre 4
6. B modus ponens sobre 3 e 5
7.C modus ponens sobre 2 e 6

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Material Complementar
Indicações para saber mais sobre os assuntos abordados nesta Unidade:

Vídeos
Tutorial - Regras de Inferência
O vídeo do CEFOR apresenta exemplos comentados da demonstração da validade de
argumentos com o uso de regras de inferência. Acesso em: 13 set. 2015.
https://www.youtube.com/watch?v=2cWtiTy5Lwc&feature=youtu.be

Raciocínio lógico - Equivalência Lógica (aula 5)


Você encontra aqui uma apresentação, do canal Raciociniomaislogico, de equivalências
e implicações lógicas. Acesso em: 13 set. 2015.
https://www.youtube.com/watch?v=kEjTiK139fo&feature=youtu.be

Sites
Você encontra um material muito interessante sobre falácias no site Enciclopédia das
Falácias. Acesso em: 13 set. 2015.
http://falaciasonline.wikidot.com/start

Leitura
O amor é uma falácia
Ainda sobre falácias, há um texto excelente do escritor estadunidense Max Schulman.
Esse texto foi traduzido para o português e está disponível em vários sites.
http://www.cella.com.br/conteudo/conteudo_99.pdf

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UNIDADE Noções de lógica proposicional

Referências
GERSTING, J. Fundamentos matemáticos para a ciência da computação.
4ª. ed. Rio de Janeiro: LTC, 2001.

MORTARI, C. Introdução à Lógica. São Paulo: UNESP, 2001.

ROCHA, R. M. Implicação lógica e material: esclarecendo pequenas confusões comuns.


Intuitio, vol. 6, nº. 2, 2013, p. 239-252. Disponível em: <http://revistaseletronicas.
pucrs.br/ojs/index.php/intuitio/article/viewFile/15950/10453>. Acesso em: 13
set. de 2015.

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