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Mestrado em Multimeios
Seminários Avançados I - Desenvolvimento de Videojogos:
Teoria e Prática
Campinas
2023
Do ódio ao tutorial de YouTube
Grande parte do problema para quem estuda game-design – ou pretende
estudar – é que o teor e o rigor de escrita exigidos por corpos acadêmicos não se vê em
boa parte dos textos e livros já publicados a respeito do tema. Já no prefácio do livro,
Schell dá seu argumento arrebatador: “Não acho que ler este livro, ou qualquer outro,
irá te transformá-lo em um designer de jogos [...]” – então pronto, feche o livro e vá
buscar informações noutro lugar – e diga-se de passagem, esta mesma sentença está
escrita num subcapítulo intitulado “Por que odeio livros”. Textos como de Jesse Schell e
Schuytema são mato nas grandes fileiras de livrarias e bibliotecas que se prezam a
reservar o menor espaço que seja em suas prateleiras para este tipo de leitura. Leituras
dedicadas para que os interessados nesta matéria possam ter algum grau de leitura ou
filosofia – no sentido de pensar sobre o que se estuda, e não somente executar: que é
justamente onde erram estes autores – são raríssimos.
O que leva a concluir que é um universo pouco explorado pelos pensadores,
isto quer dizer, isto se algum dia já fora explorado. Também faz pensar sobre a crise do
mercado editorial estadunidense. Como lá fora o polo da indústria por um curto
período de tempo, para poder construir uma indústria seriam necessários professores
e alunos antes, depois os profissionais que povoariam as cadeiras dos estúdios. No
bom e velho modo de produção capitalista, amplificado por um sistema de ensino
modernista.
Ao alegar que “odeia livros”, Schell demonstra o pensamento médio do norte-
americano, em que a eficiência é a prioridade do trabalho. Afirma já no primeiro
capítulo “apenas faça” [comece a criar um game, o conhecimento vem com a prática],
desconsidera toda a barreira de entrada que qualquer um que de fato queira fazer um
game enfrenta. Criar e desenvolver jogos, além de dedicação, precisa de uma indústria
de hardware consolidada, já construída e mão-de-obra de sobra, o que até se
encontrava nos EUA dos anos 90, mas que rapidamente estoura sua bolha em 2008,
levando junto parte da capacidade produtiva da indústria dos games. Desde 2008 que
já existe a necessidade de “modernizar” as cadeias de produção no ramo da
Computação Gráfica – e por modernizar, compreende-se afrouxar as leis trabalhistas
para pagar o profissional da área por encomendas, e não como um profissional com
salário mensal.
Obviamente que é uma indústria insustentável: games levam meses, ou até
anos, para serem produzidos. Não é tão simples quanto “apenas faça”. Pessoas
precisam do almoço para amanhã, não para quando o game lançar e fizer sucesso –
inclusive se fizer sucesso. Schell é o clássico profissional que escreveu um livro sem
raciocinar muito sobre o tema, e era diretor de um estúdio de artes interativas da
Disney – Schell literalmente está na Disney – e que, claro, não consegue passar de um
raciocínio simples para um mais elaborado. Seu livro é quase uma palestra de coaching.
Verdade seja dita? Papel aceita qualquer coisa. Inclusive quando o argumento é
falso. Ademais, estes livros e textos são elaborados sustentados pela autoridade de
quem o escreveu – afinal de contas, “você não vai discordar do diretor da Disney, né?”
– e não que o que está escrito possa agregar à alguma ciência que já exista ou criar
uma nova.
Aí vai um bate-bola-jogo-rápido: no primeiro capítulo tenta motivar com
palavras de motivação motivamentos para o leitor desmotivado. E apesar de afirmar
que “não pretende ensinar game-design com o livro”, discorre um texto de 464 páginas
sobre o assunto, com pequenos passo-a-passos sobre questões específicas. No
segundo capítulo disseca algumas questões sobre a experiência de um jogo (game). Se
o leitor busca reflexões e respostas sobre o que aflige o game-designer, desafios
filosóficos e soluções já encontradas, não encontrará neste livro, passe para o próximo.