Você está na página 1de 10

EXPANSÃO DA UNIVERSIDADE BRASILEIRA E A

ORGANIZAÇÃO SINDICAL DOCENTE: OS DESAFIOS DO


ANDES-SN

Alexandre Galvão Carvalho


3º SECRETÁRIO DO ANDES-SN
COORDENAÇÃO DO GTPFS
COODENAÇÃO DO SETOR DAS IEES-IMES

PALESTRA PROFERIDA NO ENCONTRO PÓS 35º CONGRESSO


DA REGIONAL NORTE II DO ANDES-SN
SANTARÉM-PA
18/03/2016
Bom dia!
Saúdo os companheiros da RN2 e me sinto honrado em participar
deste Encontro e poder contribuir para o debate sobre este tema.
Inicio minha intervenção com algumas reflexões apresentadas no
último Encontro Nacional do setor das IEES-IMES, realizado na
ADUNICAMP, em setembro do ano passado, cujo tema foi:
“EXPANSÃO, MULTICAMPIA E PRECARIZAÇÃO”.
Em primeiro lugar, é preciso considerar que no período de 1995-
2013 houve expansão das IES. Isto é indiscutível. Esta expansão e
sua privatização ocorrem no mesmo diapasão e atendimento das
mudanças contemporâneas ocorridas na produção e valoração do
capital e reestruturação produtiva que tende a ser sistematizada no
Brasil a partir dos anos 80. Junto a isto, deve ser levado em
consideração a reforma gerencial do Estado brasileiro, posta em
movimento em 1995, no governo FHC (Bresser Pereira) e em curso
até os dias atuais, que é a matriz politica e teórica para a reforma
das demais instituições, cujo objetivo é a mercantilização do
trabalho nas IES públicas, com o objetivo de tornar sua gestão
próxima a das empresas.
É neste cenário que se verifica profundas modificações no
cotidiano das instituições, nas relações do Estado com as
instituições públicas e o trabalho do professor e pesquisador nas
IES. O aumento das matrículas de IES presencial e EAD cresceram
315%. Houve também um expressivo aumento das IES privadas e
ações do governo federal para a expansão das IES públicas, não na
mesma proporção das IES privadas, pela multiplicação dos campi,
programas de reestruturação, como REUNI, a expansão da Rede
Federal de Educação Científica e Tecnológica -IFE’s).
Diante da necessidade histórica de ampliação de vagas para
o IES no nosso país, a expansão da rede estadual não foi
expressiva.
A iniciativa privada teve um crescimento das matrículas na
ordem de 407%. Enquanto na rede pública, o crescimento de
matrículas foi de 175%. Há, portanto, uma crescente intensificação
na privatização do Ensino Superior, sendo que o REUNI representa
apenas 0,6% do avanço da expansão do público em relação ao
privado. O aumento da rede privada não significa ausência de
financiamento estatal na educação, pois as IES privadas gozam de
privilégios estatais (FIES, por exemplo), empréstimos com juros
baixos (BNDES). O PNE retrata esta realidade de maneira muito
clara.
É preciso observar também que dentre as características da
nova tendência da educação superior se encontra a quebra do
modelo de indissociabilidade entre ensino-pesquisa e extensão e o
estimulo a novas modalidades de formação e de pesquisa. Nos
meandros dessa diversificação se encontram o REUNI, a EAD e o
Ensino Federal e Tecnológico. O consórcio CEDERJ – EAD reúne 7
universidades públicas no Rio de Janeiro. O modelo UAB é
referência para o consórcio. Em uma pesquisa realizada com os
tutores mostrou que estes não tem direitos trabalhistas, vivem de
bolsas, são responsáveis por turmas de 150 alunos. Portanto, o
tutor é um professor superexplorado, com trabalho precarizado.
11% das matrículas das IES públicas estão no Ensino
profissional e tecnológico. A abertura do IF é, em muitos casos,
produto de negociação de empresários com governo.
Finalmente é lembrar que o crescimento do número de
docentes em exercício, que não acompanhou o crescimento das
IES, o que resulta em uma intensificação do trabalho, isto se for
levado em consideração apenas os dados da graduação.

Portanto, as transformações ocorridas nas Universidades Públicas


Brasileiras nos últimos anos resultaram em um processo de
expansão precarizada, como, por exemplo, o REUNI, que dentre
outras mudanças, criou e ou incrementou a multicampia nas IFES.
Essa prática já é antiga nas IEES, que convivem com a multicampia
como produto de interesses políticos e falta de planejamento
adequado.

Essas transformações se expressam também na inexistência e ou


desestruturação da carreira de servidores e nos ataques aos
direitos conquistados na luta e nos cortes abruptos de verbas,
agravados por ajustes fiscais. Em seu conjunto estes elementos
têm contribuído para a intensa precarização do trabalho.

Além disso, é inegável que nos últimos anos, a nossa categoria


passou também por uma grande renovação. Em uma realidade de
intensa precarização do trabalho, que se expressa por exemplo na
corrosão dos salários, e na perda da integralidade das
aposentadorias, parte da categoria tem sido instada a sucumbir ao
produtivismo, mola propulsora de uma mentalidade individualista,
que grassa em um ambiente extremamente competitivo e pouco
solidário.

Em face desse quadro, se apresenta como desafio intensificar o


trabalho de base com o intuito de formar uma militância que
conheça e defenda o projeto de nosso sindicato, que se organiza
pela base, com autonomia em relação aos patrões, governos,
partidos e reitorias, tendo como referência os interesses da classe
trabalhadora.

A CONCEPÇÃO E A ORGANIZAÇÃO DO SINDICATO NACIONAL

Desde sua fundação como Associação, em 19 de fevereiro de 1981,


transformado em Sindicato em novembro de 1988, por ocasião do
seu II Congresso Extraordinário da Associação Nacional dos
Docentes (ANDES), ocorrido no Rio de Janeiro (RJ), o Sindicato
tem promovido intensos debates e tomado deliberações acerca de
sua estrutura organizativa.

Tais discussões, promovidas no âmbito das Seções Sindicais, nos


grupos de Trabalho, em Encontros, Seminários, CONADs e
Congressos, têm pautado princípios gerais, concepção, práticas
sindicais classistas, que têm caracterizado a construção histórica de
nosso Sindicato.

Assim, mudanças inclusive estatutárias, implementadas no decorrer


desse processo, propiciaram a reafirmação e a manutenção do
ANDES-SN enquanto sindicato organizado pela base, autônomo e
classista.

Essa singular estrutura sindical permite organização por local de


trabalho com autonomia política, jurídica, administrativa e
financeira, materializadas nos princípios e nas políticas aprovadas
nas instâncias deliberativas do ANDES-SN, positivadas em seu
Estatuto.

MULTICAMPIA
No 16o Congresso (João Pessoa, PB, 1997), foi reafirmada a
necessidade de uma sistemática discussão junto às bases acerca
da organização do ANDES-SN, em particular sobre o conceito de
“local de trabalho”, face à existência do sindicato em universidades
multicampi. Esta discussão continua atual, com a grande
quantidade de IES multicampi no setor das estaduais e a grande
expansão das IFES, nas quais muitas passaram a viver a realidade
multicampi.

Em nossa concepção sindical, o conceito de local de trabalho é a


instituição e não o campus em que o docente está lotado. Contudo,
as seções sindicais têm adotado diferentes estratégias com o fim de
envolver a categoria na vida sindical.

A expansão precarizada tem imposto ao Sindicato lutas cotidianas


por melhores condições de trabalho nas instituições. A multicampia
fomenta e aprofunda a fragmentação, dificultando a mobilização.
Nesse contexto, a comunicação sindical assume importância
estratégica na mobilização da categoria. Assim ganha relevância a
comunicação por meio de boletins e jornais locais, em conjunto com
os veículos e materiais produzidos pelo ANDES-SN.

O Estatuto do ANDES-SN é bastante flexível e possibilita


diversas formas de organizar a categoria em realidades multicampi.
Como, por exemplo, em uma única seção sindical, em seções
sindicais regionais ou locais, e ainda em seção sindical
multiinstitucional. Portanto, a realidade e a experiência locais é que
devem definir a organização sindical.
Considerando que o local de trabalho é a instituição, o
horizonte é pensar em uma única seção sindical por instituição,
contemplando possibilidades intermediárias construídas a partir da
experiência vivida em cada realidade.
As experiências de organização sindical em universidades
multicampi são diversificadas. Eis alguns exemplos:
1. Uma subseção por campus, com diretoria eleita. As
assembleias são realizadas nas unidades, seguidas de
assembleia geral ou plenária, onde se toma uma posição final.
Quanto às questões financeiras, cada subseção tem um
percentual garantido das contribuições dos filiados e outra
parte vai para a seção central;
2. Organização centralizada em uma única direção de seção
sindical e cada campus tem um diretor que faz parte da seção
sindical. As assembleias gerais são realizadas em rodízio. A
tesouraria é uma só, com diretores financeiros nos campi. Não
tem conselho de representante;
3. Uma única seção sindical com secretarias adjuntas em cada
campus. Os recursos ficam na Seção Sede e é assegurada
que cada secretaria adjunta possa usar até 70% do que ela
arrecada.
4. Seçao sindical centralizada, mas mantém uma estrutura de
votação em separado por meio de assembleias por campus.
Os votos são levados para a Assembléia Geral da Secção
Sede. Há conselho de representante por campus para
assessorar a diretoria da Seção Sede;
5. A direção é organizada por centro, que também elege um
membro para o conselho de representante e esses
conselheiros participam na assessoria da diretoria.
6. Seções sindicais independentes.
Eis algumas dificuldades de organização sindical nos modelos
de multicampia:
A) Distância entre os campi inviabiliza participação direta quando
tudo fica centralizado na seção sede;
B) quantidade de filiados com diferença de arrecadação que
segmenta a participação;
C) assembleias gerais em subseções fragmentam os
encaminhamentos;
D) dificuldades de participação de todos, mesmo quando existe
uma subseção; representantes (delegados) com a participação
indireta das assembleias gerais nas seções sedes no estilo de
federação, contrariando o princípio da participação direta da base
nas decisões do sindicato; a depender da forma de estruturação, as
subseções podem acabar isolando a categoria da totalidade da luta
docente;

Portanto, considerando
- as decorrências da multicampia no que se refere à precarização
do trabalho nas universidades e as dificuldades organizativas que
ela impõe para a participação democrática;
- que o debate acumulado no ANDES-SN sobre essa problemática
sugere que pode não haver uma solução organizativa única para
dar conta das especificidades dos setores que o compõem –
federais, estaduais, municipais e particulares;
- os princípios que referenciam o ANDES-SN, consubstanciados no
Caderno 2: organização pela base e por local de trabalho;
horizontalidade pautada na democracia, com deliberações pela
base (assembleia, plenária, congresso etc.); diretoria como
instância executiva; autonomia das seções sindicais, inclusive para
pensar sua estrutura em função da realidade multicampi e da
estrutura da instituição de ensino superior (organizada por
faculdade, instituto, departamento, centro etc.);

Parece-nos claro que não devemos nos opor, por princípio, à


expansão das IES por meio da multicampia, ou por meio de um
processo de interiorização dessas instituições, contudo, o que nos
faz questionar a opção por essa alternativa é a forma como ela vem
sendo realizada, propiciando uma expansão sem financiamento
público necessário à qualidade do trabalho acadêmico; sem o
devido planejamento, sem um diagnóstico das necessidades
regionais e locais; sem a garantia de condições adequadas de
trabalho – de docentes e de funcionários técnico-administrativos –
para o cumprimento do tripé ensino, pesquisa e extensão; com
fragmentação geográfica do local de trabalho; sem políticas reais de
acesso e permanência estudantil.

35º congresso do andes-sn


SOBRE A MULTICAMPIA E A INTERIORIZAÇÃO DAS IES
A expansão e a interiorização das IES devem ser garantidas com as
seguintes condições: 1. como parte de um projeto de IES pública,
gratuita, laica e de qualidade e socialmente referenciada;
1.1 que as seções sindicais façam levantamento das condições de
trabalho ante a heterogeneidade de situações da multicampia.
1.2 o projeto de expansão deve ser submetido e aprovado pela
comunidade universitária. 2. planejadas, democraticamente, com
base em diagnóstico das necessidades locais e de modo que
assegurem a indissociabilidade do ensino, da pesquisa e da
extensão, com garantia de carga horária adequada para todas as
modalidades;
3. financiadas com verba pública, com aporte de recursos perenes,
que assegure condições dignas de trabalho e de estudos;
4. contratação de professores e de servidores técnico-
administrativos efetivos, por meio de concurso público e o fim de
todas as formas de precarização do trabalho docente;
5. não fragmentação geográfica do local de trabalho, sem a
obrigatoriedade de os professores desenvolverem suas atividades
em campus multicidade ou em mais de uma localidade, a exemplo
dos cursos interdepartamentais;
6. enquanto houver ocorrência de casos, em que há a fragmentação
geográfica do local de trabalho, que sejam garantidas as condições
dignas de trabalho para todo docente submetido a tal situação.
7. política de moradia e de transporte dos docentes nos locais e nas
cidades em que trabalham.
8. política efetiva de acesso e de permanência estudantil.
9. o tema multicampia deve continuar pautado e debatido nos
encontros e nas reuniões dos setores.
10. condições adequadas para a realização de trabalho nos órgãos
colegiados das IES, com garantia da participação efetiva de todas
as representações dos diferentes campi.

Você também pode gostar