No texto, “Analisando o discurso” de Helena Hathsue Nagamine Brandão, temos uma
introdução ao conceito de discurso, partindo exatamente da primeira pergunta possível: o que é o discurso? O discurso, diferente da ideia geral atribuída ao termo, não se trata apenas de texto ou de um monólogo. Claro, estas afirmações não estão incorretas, mas aqui se fala sobre o que é o discurso sob a luz da ciência da linguagem. Para se produzir um discurso, é necessária a linguagem, esta que usamos no dia a dia, para conversar e discutir. Esta linguagem não funciona sozinha, imagine, por exemplo, um exercício de gramática em que uma frase qualquer deve ser desmembrada para que se classifique os verbos presentes, neste caso, a frase em si não possui sentido algum, servindo apenas como uma estrutura-boneco a ser desmontada como exemplo. Para produzir a linguagem cotidiana, o contexto é necessário, não somente para construir o sentido, mas também para produzir uma estrutura e conteúdo adequados a função pretendida, esta forma produzida e adaptada é o que podemos chamar de discurso. O discurso nada mais é do que a atividade comunicativa entre interlocutores, estes que, como criaturas históricas, carregam as suas individualidades, que, obviamente ou não, intencionalmente ou não, estão sempre presentes no discurso produzido por eles. O discurso, como dito acima, é algo que, para muito além do gramatical, se comunica com o EU que o produz, que por sua vez imprime no texto aquilo suas condições, ideias, vivências, pretensões e até mesmo limitações. É interativo, é a maneira como dois se relacionam e agem um sobre o outro, se adequando ao contexto, trabalhando com suposições, inferências e referências, se relacionando com outros textos, por isso, se diz que o discurso é dialógico (ou polifônico), relações estas que habitam todos os discursos, seja como acordo ou como oposição. A análise do discurso, também chamada de AD, nasceu na França, na década de 60, período politicamente conturbado, onde o movimento estudantil exigia a reforma do ensino. Neste contexto, estudiosos da área usaram os discursos políticos apresentados como objeto de estudo. A AD era definida inicialmente como “o estudo linguístico das condições de produção de um enunciado”, ou seja, uma abordagem discursiva do enunciado, levando em conta o contexto de criação, sua intencionalidade, ideologia, cultura, visão do outro e de si, local, época e relação com outros textos. O discurso é também um local de manifestação ideológica, onde embates são travados e relações de poder são estabelecidas através do dialogismo, as relações de poder estruturais são evidenciadas também em diálogos. Estas ideologias marcam as formações discursivas, textos que se relacionam em aliança e que, muitas vezes, também compartilham as mesmas relações de oposição. Por vezes, textos exatamente iguais em termos de gramática possuem sentidos diferentes e até mesmo opostos devido as formações discursivas. Como é possível perceber com base no que foi dito acima, o discurso é algo que se imprime nos textos, é a forma como ele se torna concreto, isto é, deixa o campo das ideias e se apresentam, mas este papel não é unicamente reservado ao texto, sendo o texto apenas uma das formas de concretização do discurso. É necessário ter conhecimentos extralinguísticos para compreender os diferentes textos, para compreender o discurso que lhes é impresso. Os gêneros do discurso, são a forma que se classificam os discursos destinados às diferentes esferas e funções sociais, às quais o texto se adapta, por isto, é necessário que o individuo saiba fazer esta alocação e reajuste, pois a discrepância fará com ele fique, de certa forma, deslocado do meio. Estes gêneros são caracterizados por diferentes dialetos, formas, cadências e situações, enfim: possuem características típicas. De acordo com Bakhtin, estas convenções caracterizam a economia da linguagem, portanto, como nos diz Marcuschi, os falantes costumam enunciar em qual gênero determinado texto ocorreu ou será produzido. Quando falamos de gêneros discursivos, de acordo com Bakhtin, existem dois: os gêneros discursivos primários (ou livres) e os gêneros discursivos secundários (que seguem modelos construídos socialmente), o primeiro caracteriza os textos que normalmente enunciamos e adquirimos espontaneamente, através da vivência, como diálogos e telefonemas. O segundo, por outro lado, caracteriza textos que são produzidos mais complexamente (de certa forma), como “uma troca cultural” ou com funções mais específicas, como: textos científicos, teatro, política etc. Esses textos podem até incorporar aqueles dos gêneros primários, mas nunca os executar propriamente, como em teatro, que há a representação de um diálogo, mas não um diálogo em si. Não apenas a intenção e o local influenciam a concretização do discurso, mas também o avanço tecnológico e social, bem como o próprio desenvolvimento da língua, que nunca está parada, se transformando junto com a tecnologia e a sociedade como um todo, o conjunto se adapta a nova realidade. Vale ressaltar, também que, embora as convenções de gênero existam, elas não são exatamente leis, elas são respeitadas para que se adequem ao contexto, mas muitas vezes elas podem ser alteradas em determinados pontos (incorporando outros gêneros ou os misturando), mas sempre mantendo parte das suas características essenciais (veículo, forma, cadência etc). Muitas vezes, essas alterações ocorrem de acordo com a intenção e necessidade do discurso, como o teatro e o conto, que incorporam diálogos, trechos argumentativos e mais. Por fim, compreender a língua como discurso não é apenas algo que nos ajuda a entender o processo da construção de sentido, mas também das relações de poder estabelecidas dentro da sociedade, da forma como se manifestam as diferentes ideologias e sobre como identifica-las, compreende-las sob uma nova perspectiva, compreender mais afundo como se dá um fenômeno fundamental para a existência social, para a construção do eu, tanto dentro como fora do discurso.