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A Quinta da Regaleira

27/08/2008 Quinta da Regaleira


O Palácio da Regaleira é o edifício principal e o nome mais comum da Quinta da
Regaleira. Também é designado Palácio do Monteiro dos Milhões, denominação esta
associada à alcunha do seu primeiro proprietário, António Augusto Carvalho
Monteiro. O palácio está situado na encosta da serra e a escassa distância do Centro
Histórico de Sintra estando classificado como Imóvel de Interesse Público desde 2002.

Carvalho Monteiro,
ajudado pelo arquitecto italiano Luigi Manini, dá à Quinta de 4 hectares, o palácio,
jardins luxuriantes, lagos, grutas e edifícios enigmáticos, lugares estes que escondem
significados relacionados com a alquimia, Maçonaria, Templários e Rosa-cruz.
Modela a quinta em traçados que evocam a arquitectura românica, gótica,
renascentista e manuelina.

Localizada na Rua Barbosa du Bocage em pleno Centro Histórico de Sintra e bem


perto do Palácio de Seteais, a quinta beneficia do micro-clima da serra de Sintra, que
muito contribui para os luxuriantes jardins e os nevoeiros constantes que adensam a
sua aura de mistério.

A documentação histórica relativa à Quinta da Regaleira é escassa para os tempos


anteriores à sua compra por Carvalho Monteiro. Sabe-se todavia que, em 1697, José
Leite adquiriu uma vasta propriedade no termo da vila de Sintra que corresponderia,
aproximadamente, ao terreno que hoje integra a dita Quinta – a esta data parecem
remontar, pois, as origens da quinta em questão.

Francisco Alberto Guimarães de Castro comprou a propriedade – conhecida como


Quinta da Torre ou do Castro – em 1715, em hasta pública e, após as licenças
necessárias, canalizou a água da serra a fim de alimentar uma fonte ai existente.
Em 1800, a quinta é cedida a João António Lopes Fernandes estando logo, em 1830,
na posse de Manual Bernardo, data em que tomou a designação que actualmente
possui. Em 1840, a Quinta da Regaleira foi adquirida pela filha de uma grande
negociante do Porto, Allen, que mais tarde foi agraciada com o título de Baronesa da
Regaleira. Data provavelmente deste período a construção de uma casa de campo que
é visível em algumas representações iconográficas de finais do século XIX.

A história da Regaleira actual principia, todavia, em 1892, ano em que os barões da


Regaleira vendem a propriedade ao Dr. António Augusto Carvalho Monteiro por 25
contos de réis.

O célebre “Monteiro dos Milhões” nasceu no Rio de Janeiro em 1848, filho de pais
portugueses, que cedo o trouxeram para Portugal. Licenciado em Leis pela
Universidade de Coimbra, Monteiro foi um distinto coleccionador e bibliófilo,
detentor de uma das mais raras camonianas portuguesas, homem de cultura que
decerto influenciou, se não determinou mesmo, parte bastante razoável do misterioso
programa iconográfico do palácio que construiu para si, nas faldas da serra de Sintra.

In “Sintra Património da Humanidade”


Maçonaria e a Quinta da Regaleira
Chama-se esotérico a um conhecimento oculto, seja doutrina ou técnica de expressão
simbólica, reservado aos iniciados. O esoterismo é, pois, o conjunto de práticas e de
ensinamentos esotéricos, no contexto de uma tradição multifacetada que abrange
diferentes épocas, lugares e culturas. A Alquimia, a Maçonaria e os Templários, por
exemplo, incorporam teorias, rituais e procedimentos herméticos que se integram no
âmbito do esoterismo.

Na tipologia do misticismo judaico, firmado na procura de Deus e na experiência da


divindade, o esoterismo baseia-se, fundamentalmente, na lei das correspondências,
que visa encontrar, através do recurso à analogia, relações simbólicas entre o divino e
o terreno, entre o transcendente e o imanente, entre o visível e o invisível, entre o
homem e o universo. A passagem de uma a outra dimensão opera-se em cerimónias de
iniciação, por meio de encenações e rituais de carácter mágico, nos quais o neófito
recebe o segredo da transmutação, aceita a filiação no grupo de companheiros e acede
a um nível espiritual superior.
A Franco-Maçonaria antiga, dita
operativa, deriva das confrarias, das corporações, dos agrupamentos profissionais de
pedreiros livres e dos construtores das catedrais medievais. À defesa dos interesses
profissionais, juntavam os franco-mações preocupações de carácter filantrópico, moral
e religioso. Os grupos maçónicos, organizados em sociedades secretas e reunindo em
lojas, foram perdendo o carácter exclusivamente operativo e começaram a aceitar
membros estranhos à profissão mas que perfilhavam os mesmos ideais iniciáticos.

O declínio das confrarias origina, por filiação directa, o aparecimento em 1717, em


Inglaterra, da Maçonaria moderna, dita especulativa, uma vez que já não existe
ligação à prática do oficio de construção, tendo utensílios como o esquadro e o
compasso adquirido um valor eminentemente simbólico.

A Maçonaria provocou, praticamente desde o início, a oposição da Igreja Católica,


embora muitos dos ensinamentos maçónicos, de inspiração cristã, preconizem a
crença nas virtudes da caridade, na imortalidade da alma e na existência de um
princípio espiritual superior denominado Grande Arquitecto do Universo. Grande
parte da simbologia maçónica, sobretudo a dos altos graus, inspira-se em correntes
esotéricas tais como a alquimia, o templarismo e o rosacrucianismo, inscritas em
diversos locais da Regaleira.

Apesar da diversidade de percursos que a Quinta da Regaleira oferece, todos os


caminhos podem conduzir a um aglomerado de pedras erguidas, com a aparência de
um menir, num dos locais mais belos da mata. E eis que uma curiosa porta de pedra
roda impulsionada por um mecanismo oculto e nos faculta a entrada para outro
mundo. É o monumental poço iniciático, espécie de torre invertida que mergulha nas
profundezas da terra. A terra é o útero materno de onde provem a vida, mas também a
sepultura para onde voltará. Muitos ritos de iniciação aludem a aspectos do
nascimento e morte ligados à terra.

De quinze em quinze degraus se descem os nove patamares desta imensa galeria em


espiral, sustentada por inúmeras colunas de apurado trabalho, que vão marcando o
ritmo e o aprumo das escadarias. Os nove patamares circulares do poço, por onde se
desce ao abismo da terra ou se sobe em direcção ao céu, consoante a natureza do
percurso iniciático escolhido, lembram os nove círculos do Inferno, as nove secções
do Purgatório e os nove céus do Paraíso, que o génio de Dante consagrou na Divina
Comédia.

Os capitéis dos
colunelos enrolam longas folhas de acanto. E lá no fundo, a carga dramática acentua-
se. Gravada em embutidos de mármore, sobressai uma cruz templária, aliada a uma
estrela de oito pontas, afinal o emblema heráldico de Carvalho Monteiro. As galerias
conduzem-nos, em autênticos labirintos, pelo mundo subterrâneo, aqui e além
porventura povoado de morcegos. De construção artificial, na sua maioria, estas
galerias aproveitam, no entanto, as características geológicas da mancha granítica da
Serra de Sintra. No interior, a abóbada divide-se entre os maciços de rocha mãe, de
um granito granular médio, geralmente de cor rosada ou parda, e zonas preenchidas
com pedra importada da orla marítima da região de Peniche. É esta pedra, desgastada
pelo mar e pelo tempo, que vai contribuir, sobremaneira, para a sugestão de um
mundo submerso.

Ao chegarmos ao exterior, esperam-nos a luz e os cenários minuciosamente


construídos. São animais fantásticos, artifícios de água em cascata, passagens de pedra
que parecem flutuar à superfície dos lagos, ou nuvens silenciosas de vapor que
dissimulam as entradas para este universo singular.

A simbólica alquímica parece estar presente em vários locais da Regaleira. Desde


logo, na Capela, na pintura da Coroação de Maria por Cristo, na qual a Virgem
ostenta, para além das três cores da Obra alquímica – o azul ou negro, o branco, o
vermelho ou rubro – uma faixa dourada que poderá simbolizar o Ouro Alquímico.

Também num alto


relevo existente nas traseiras da Capela, encontra-se representado um castelo com
duas torres, separado por uma zona de labaredas, e uma goela infernal. Trata-se de
uma figuração da tri-unidade do mundo e do homem: o mundo superior ou espiritual,
o mundo intermédio da alma e o mundo inferior (“ad infero” ou do inferno) material.
A torre rubra é o Atanor, ou forno alquímico.

Nas cocheiras, sinais de Alquimia voltam a estar presentes, em duas esculturas que
formam símbolos clássicos da Arte de Hermes: a serpente que morde a cauda,
simbolizando a Unidade, origem e fim da Obra, e a luta entre as duas naturezas, aqui
representada por dois dragões, cada um mordendo a cauda do outro. Igualmente
susceptível de uma leitura alquímica é a gruta ogival, onde Leda, segurando uma
pomba na mão, aparece numa escultura à beira de um pequeno lago, enquanto Zeus,
disfarçado de cisne, a fecunda bicando-a na perna. Trata-se de uma alegoria pagã ao
mito, ou mistério, da Imaculada Conceição, ou concepção, que decorre num lugar
escuro e húmido.

A alquimia tem por objectivo a transmutação real ou simbólica dos metais em ouro e
por fim último a salvação da alma. As operações alquímicas são realizadas num
Atanor, ou seja, num forno alquímico de combustão lenta, com um cadinho e um
balão nos quais se pretende espiritualizar a matéria e materializar o espírito. Este
propósito essencial da Alquimia operativa, executada em laboratório, é a obtenção da
Pedra Filosofal, simbiose entre matéria e espírito, da qual poderia resultar, segundo os
alquimistas, além da transmutação dos metais em ouro, a realização de um dos desejos
ancestrais da humanidade: o elixir da longa vida, capaz de proporcionar saúde e eterna
juventude. Neste sentido, há quem considere a procura alquímica como uma metáfora
da condição humana. A Alquimia assumiu, depois do século XVIII, um carácter
manifestamente religioso, dedicando-se sobretudo ao estudo das relações espirituais e
energéticas entre o homem (microcosmo) e o universo (macrocosmo). A partir de um
trabalho erudito de equivalências e analogias, aceita-se que o universo nos engloba e
nos interpela num só movimento existencial – ele é ao mesmo tempo transcendência
(Outro) e nós próprios.

Parece evidente que a concepção religiosa do mundo que preside à Regaleira assenta
no Cristianismo, mas num Cristianismo escatológico, que tem a ver com o fim dos
tempos. Quer recorramos à lição da escatologia cósmica, que prenuncia o fim do
universo e da humanidade, quer nos atenhamos à escatologia individual, que assenta
na crença da sobrevivência da alma depois da morte, é a mesma ideia obsessiva que
encontramos. É também um Cristianismo gnóstico, apoiado em discursos míticos e em
conhecimentos sagrados que prometem a salvação dos fiéis e o retorno dos espíritos.
É, enfim, um Cristianismo imbuído de ideais neo-templários, associados ao Culto do
Espírito Santo, que encontramos na tradição mítica portuguesa.

Os templários foram monges-soldados, cuja ordem militar, fundada no período das


Cruzadas em 1119, visava proteger os lugares santos da Palestina contra o perigo dos
infiéis. Os votos de pobreza e castidade não impediram os Cavaleiros da Milícia do
Templo de enriquecer e de desempenhar um importante papel económico e político,
tanto no Oriente como na Europa, a ponto de criarem poderosos inimigos, como o rei
Filipe IV de França e o Papa Clemente V, que levaram à perseguição e à extinção da
ordem em 1314, sob acusações, porventura falsas, de blasfémia e imoralidade. Em
1317, D. Dinis de Portugal afectou os bens dos templários à Ordem de Cristo, que
muitos aceitaram como sua sucessora.

Desaparecidos os templários não desapareceu o templarismo, cujo espírito, resumido


na defesa dos lugares sagrados e na luta contra o mal, renasceu em várias correntes e
organizações iniciáticas como sendo a afirmação simbólica da sobrevivência da
Ordem do Templo. A cruz templária no fundo do poço iniciático, a cruz da Ordem de
Cristo no pavimento da Capela, bem como todas as outras cruzes dispostas na Capela,
testemunham a influência do templarismo no ideário sincrético de Carvalho Monteiro.
Há ainda, na Regaleira, referências rosacrucianas, em alusão à corrente esotérica
iniciada no séc. XVII, de tendência cristã, utilizando os símbolos conjuntos da rosa e
da cruz. O movimento Rosa-Cruz propunha reformas sociais e religiosas, exaltava a
humildade, a justiça, a verdade e a castidade, apelando à cura de todas as doenças do
corpo e da alma. Tornou-se grau maçónico de várias Ordens e, ainda hoje, existem
escolas esotéricas e sociedades secretas que pretendem assumir-se como reaparições
do mito Rosa-Cruz.

Pontos de interesse
Carvalho Monteiro tinha o desejo de construir um espaço grandioso, em que vivesse
rodeado de todos os símbolos que espelhassem os seus interesses e ideologias.
Conservador, monárquico e cristão gnóstico, Carvalho Monteiro quis ressuscitar o
passado mais glorioso de Portugal, daí a predominância do estilo neomanuelino com a
sua ligação aos descobrimentos. Esta evocação do passado passa também pela arte
gótica e alguns elementos clássicos. A diversidade da quinta da Regaleira é
enriquecida com simbolismo de temas esotéricos relacionados com a alquimia,
Maçonaria, Templários e Rosa-cruz.

Bosque
O bosque ou mata que ocupa a maioria do espaço da Quinta, não está disposta ao
acaso. Começando mais ordenada e cuidada na parte mais baixa da quinta, mas, sendo
progressivamente mais selvagem até chegarmos ao topo. Este disposição reflecte a
crença no primitivismo de Carvalho Monteiro.

Patamar dos Deuses


O Patamar dos Deuses é composto por 9 estátuas dos deuses greco-romanos. A
mitologia clássica foi uma das inspirações de Carvalho Monteiro para os jardins da
Regaleira.

Poço Iniciático
Uma galeria subterrânea com uma escadaria em espiral, sustentada por colunas
esculpidas, por onde se desce até ao fundo do poço. A escadaria é constituída por nove
patamares separados por lanços de 15 degraus cada um, invocando referências à
Divina Comédia de Dante e que podem representar os 9 círculos do inferno, do
paraíso, ou do purgatório. Segundo os conceituados ocultistas Albert Pike, René
Guénon e Manly Palmer Hall é na obra ‘A Divina Comédia’ que se encontra pela
primeira vez exposta a Ordem Rosacruz. No fundo do poço está embutida em
mármore, uma rosa dos ventos (estrela de oito pontas: 4 maiores ou cardeais, 4
menores ou colaterais) sobre uma cruz templária, que é o emblema heráldico de
Carvalho Monteiro e, simultaneamente, indicativo da Ordem Rosa-cruz.
O poço diz-se iniciático
porque se acredita que era usado em rituais de iniciação à maçonaria e a explicação do
simbolismo dos mesmos nove patamares diz-se que poderá ser encontrada na obra
Conceito Rosacruz do Cosmos.

A simbologia do local está relacionada com a crença que a terra é o útero materno de
onde provém a vida, mas também a sepultura para onde voltará. Muitos ritos de
iniciação aludem a aspectos do nascimento e morte ligados à terra, ou renascimento.

O poço está ligado por várias galerias ou túneis a outros pontos da quinta, a Entrada
dos Guardiães, o Lago da Cascata e o Poço Imperfeito. Estes túneis, outrora habitados
por morcegos afastados pelos muitos turistas que visitam o local, estão cobertos com
pedra importada da orla marítima da região de Peniche, pedra que dá a sugestão de um
mundo submerso.

Capela da Santíssima Trindade


Uma magnífica fachada que aposta no revivalismo gótico e manuelino. Nela estão
representados Santa Teresa d’Ávila e Santo António. No meio, a encimar a entrada
está representado o Mistério da Anunciação – o anjo Gabriel desce à terra para dizer a
Maria que ela vai ter um filho do Senhor – e Deus Pai entronizado.

No interior, no altar-mor vê-se Jesus depois de ressuscitar a coroar uma mulher que
pode ser Maria ou Madalena (de uma maneira mais contraditória). Do lado direito
Santa Teresa e Santo António repetem-se, desta vez em painéis de mosaico. Do lado
oposto um vitral com a lenda do sítio da Nazaré. No chão estão representados a Esfera
Armilar ou Globo Celeste e a Cruz da Ordem de Cristo, rodeados de pentagramas
(estrelas de cinco pontas).

A Torre da Regaleira
Foi construída para dar a quem a sobe a ilusão de se encontrar no eixo do mundo.
O Palácio
O edifício principal da quinta é marcado pela presença de uma torre octogonal. Toda a
exuberante decoração esteve a cargo do escultor José da Fonseca.

 A Maçonaria em Portugal
 A Cruzada dos Descobrimentos
 Pensamentos, Sensações e Emoções de um Aprendiz
 O Templo de Salomão

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