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A Maçonaria Operativa e a

Maçonaria Especulativa
Uma visão conceitual

IrMaurilo Humberto, MM


ARLS Marrey Junior - GOP
BASEADO EM NICOLA ASLAN

Muito se tem dito, escrito e estudado sobre as origens da Maçonaria e de


seus admiráveis conceitos; principalmente sobre a maçonaria operativa e a sua
fase especulativa. E o que se observa, na realidade, é que os autores nos levam a
uma grande confusão e a falsos conceitos.

Não sabendo distinguir entre o lendário e o histórico, em tempos de


menor cultura histórica, muitos escritores da época consideraram a Instituição
Maçônica tão antiga quanto o mundo, imaginando-a uma continuação, em linha
reta, das sociedades iniciáticas da antiguidade, aspecto iniciático este que ela
apenas assumiu a partir do século XVIII.

Pensando assim alimentei minha curiosidade pela sua história, fazendo


um pequeno estudo, e nesta pesquisa deparei-me com a obra de Nicola Aslan, “A
História Geral da Maçonaria”.

Suas conjecturas trouxeram-me luz sobre aquilo que imaginava ser o início
da Maçonaria e sua evolução, encontrando nelas um natural caminho. Assim
sendo, suas explicações, de maneira prática, me deram um sentido para o
entendimento da evolução dos pedreiros livres.

Todas as grandes instituições humanas atravessaram vários períodos e


fases em sua evolução histórica, e a Maçonaria não podia fugir a esta regra.
Inicialmente, na Idade Média e Renascença, Corporação profissional, Associação
de mútuos socorros, exclusivamente até o início do século XVIII, e, finalmente
Sociedade Iniciática e sistema de moralidade até o presente momento, onde se
conservou o sentido de associação e mútuos socorros.

Sua história foi sempre tumultuada e complicada, não somente pelos


adversários, mas também pelos que se aprofundaram em seu estudo e não a
compreenderam.
Foi durante a fase de Corporação profissional que se criaram várias
histórias lendárias sobre a Arte da Construção, aliás como era exigido de todos os
ofícios e sociedades da época, quando não possuíam uma real história.

A Maçonaria Operativa nasceu na Europa, com as primeiras construções


de pedra, após as múltiplas incursões que os bárbaros realizaram no continente
entre os séculos V a X.

Esse período é denominado de “Reinado da Madeira”, tendo em vista que


todas as construções eram executadas com este material. Desaparecera o
pedreiro, substituído pelo carpinteiro. Terminado este período a Arte da
Construção estava esquecida, não se sabia onde se encontravam as boas
pedreiras, tão pouco se conhecia a arte de talhar a pedra e nem se encontravam
mais operários que entendessem os próprios rudimentos da escultura e da
edificação.

Após o século X, cessada as incursões bárbaras, voltaram os homens a se


preocuparem com obras de alvenaria e, sendo a Idade Média, a idade da fé, os
primeiros edifícios a serem construídos foram as Igrejas, as Catedrais e as
Abadias.

Os primeiros operários da construção formaram-se sob a direção do clero


regular e secular, único depositário da cultura e da arte daquela época. Os que
inicialmente se dedicaram a esta arte, tão antiga mas incipiente na Europa,
viram-se enfrentando problemas complexos, solucionados com métodos e
experiências lentamente adquiridos.

Assim, abobadando os edifícios, resolveram o grande problema dos


incêndios que destruíam os edifícios religiosos, surgindo a arquitetura romântica
e a eclesiástica. Praticaram aberturas nas paredes, em busca de solução aos
problemas de iluminação, evitando assim, o excesso de luminárias. Surgia, no
século XII, a arte gótica cujas principais características foram a preponderância
dos vazios sobre os cheios, o impulso em altura, ou verticalidade, e as abóbadas
em ogivas.

As estátuas, quando a Arte das esculturas ainda engatinhava pelos meados


dos séculos X e XI, apresentavam-se rígidas e toscas. Tinham, segundo Michelet,
“o aspecto sofrido da vida, sendo feias como a morte”. Mas a medida que os artistas
se aperfeiçoavam, as formas tornavam-se cada vez mais puras e delicadas,
adquirindo vida e beleza e, ainda segundo Michelet, “perdiam a rigidez da morte
para ganhar o esplendor da vida”.

Todas as artes ligadas à construção expandiram-se e vicejaram nas


catedrais medievais. O talhador de pedra, o Freemason, o Maçom Operativo, ao
mesmo tempo modesto artífice e talentoso artista, surgia deixando estampada a
sua arte, a sua alma e o seu pensamento.

Na Inglaterra, os reis da dinastia normanda, todos grandes construtores,


deram o maior impulso à arte da edificação e assim, nos primeiros vinte anos que
se seguiram à conquista da Inglaterra (1066-1086) foram erigidas naquele País
quase 5000 Igrejas.

Especializados na talha da Freestone1 ou pedra calcárea, os talhadores


foram muito solicitados. A esta pedra devem eles a origem do seu nome
profissional. Foi assim que o Freestone Mason tornou-se, por abreviação
Freemason e, posteriormente, quando traduzido para o francês, Franc-Maçon.

As “Lojas”, na realidade verdadeiros alpendres cobertos de palha ou telha,


permitiam que os talhadores de pedra se dedicassem as suas tarefas durante o
mau tempo. Destinadas ao trabalho, às refeições e ao repouso, e também às
discussões sobre os problemas da profissão, nelas não se podia passar a noite.

O Aprendiz fazia um aprendizado de sete anos antes de se tornar


Companheiro, ou seja, um talhador qualificado, mestre em seu ofício, habilitado
a contratar pedreiros e sob sua direção, realizar os trabalhos da profissão.
Também chamados Mestres Maçons, os Mestres da Obra eram os arquitetos
encarregados da construção de um edifício de grandes proporções, competindo-
lhes solucionar os problemas técnicos à medida que surgissem.

Porém, ao lado da Corporação profissional, existia a Confraria, colocada


sob a invocação de um santo. Ela tratava da parte social, que consistia geralmente
em realizar procissões solenes, missa, preces, banquetes e beneficências. Durante
a Idade Média a religião dominava totalmente a vida social.

Depois da Peste Negra2 ou bubônica (1347-1348), que assolou a vida na


Europa, a Inglaterra viu-se obrigada a organizar o trabalho humano. Em 1364,
todos os operários foram obrigados a aderir a uma instituição chamada
Companhia (Livery Company) do ofício a que pertenciam. Os Maçons Operativos
formaram então uma das 91 companhias da cidade de Londres e ela não estava
compreendida entre as 12 mais importantes.

1
pedra calcária, que antes da descoberta das jazidas da Inglaterra, eram importadas de Caen, na
Normandia e que se prestava admiravelmente ao delicado trabalho de escultura
2
Peste negra é a designação por que ficou conhecida, durante a Idade Média, a peste bubónica
(português europeu)
ou bubônica (português brasileiro), pandemia que assolou a Europa durante o século XIV e
dizimou entre 25 e 75 milhões de pessoas, sendo que alguns pesquisadores acreditam que o
número mais próximo da realidade é de 75 milhões, um terço da população da época.
No entanto, a Reforma, de um lado, e o estilo renascentista de outro,
puseram um ponto final na construção das majestosas Catedrais Góticas, das
monumentais Abadias e dos imponentes Palácios.

O estilo renascentista, de construção mais simples e menos dispendiosa,


substituíra vantajosamente o difícil estilo ogival, característica impar das
construções góticas. Desta forma, perdendo os seus melhores clientes, a
Corporação dos Talhadores de Pedra foi definhando aos poucos e, finalmente,
depois do Grande Incêndio de Londres (1666), entrou em franca decadência.

Foi assim, num esforço para resistir à inevitável ruína, que as Lojas, ou
melhor, Confrarias a elas anexadas a partir do século XVI, começaram a abrir suas
portas aos maçons aceitos, que ingressaram na Fraternidade como protetores,
honorários ou especulativos. Estes membros fortaleciam seus quadros e ao
mesmo tempo sustentavam a caixa de socorros da Confraria.

Os velhos registros da “Venerável Companhia dos Maçons da Cidade de


Londres”, comprovam a existência, de 1619 a 1678, de uma sociedade à parte,
chamada a Aceitação, abrigando Maçons Operativos e Maçons Especulativos. Os
membros da Companhia não eram, obrigatoriamente, membros da Aceitação,
assim como estes não faziam parte da Companhia, porém, ninguém tem o
conhecimento do que se passava em suas reuniões.

O que se sabe é que, inicialmente dela fizeram parte fidalgos, proprietários


de terras, oficiais e eclesiásticos, protetores naturais dos talhadores de pedra e
que a partir de 1660, a ela pertenceram também letrados, naturalistas, médicos,
arqueólogos e outros profissionais.

Desta forma, enquanto as Lojas Operativas dos Freemasons ingleses


entravam em franca decadência, a Fraternidade dos Freemasons Aceitos que, em
determinada época, se separaram da Venerável Companhia dos Maçons
Operativos de Londres, mantinha a tradição de mútuos socorros da Confraria e
de proteção aos irmãos durante as viagens que faziam por todo o País.

Pouco se sabe sobre a Maçonaria durante o século XVII, embora escritores


como Elias Ashmole, Robert Plott, Randle Holme, John Aubrey a ela se referissem
em suas obras. Porém, todos esses escritores se referem à Fraternidade dos
Maçons Aceitos e não às Lojas Operativas.

Finalmente, em 1717, quatro Lojas compostas, em sua maioria, de Maçons


Aceitos, que celebravam as suas reuniões em tavernas3 e cervejarias de Londres,

3
- em nossos dias o termo Taverna tem um significado algo chocante, que não tinha na época,
como não o tem atualmente o vocábulo Hotel. Nos séculos XVII e XVIII, a taverna era uma
hospedaria em que se reuniam pessoas de todas as categorias.
realizaram, ao que parece, uma reunião preparatória na Taverna da Macieira e
resolveram criar a Grande Loja de Londres, que passou a denominar-se Grande
Loja da Inglaterra, quando se expandiu além do perímetro urbano londrino.

A reunião de 24 de junho de 1717, da qual resultou a fundação da Grande


Loja, teve lugar na Cervejaria do Ganso e da Grelha4. Com a fundação da Grande
Loja de Londres, a Maçonaria enveredou por caminhos novos, rumo a um destino
que os fundadores jamais se atreveriam nem mesmo a sonhar. Todavia, o único
texto que se conhece a tão importante acontecimento histórico consta das
Constituições de 1738, redigidas pelo Rev. Dr. James Anderson.

Pareceu estranho a alguns críticos que numa época que se escrevia tanto,
não tenha ocorrido a ninguém relatar os acontecimentos daquele dia de São João
de 1717. Se tudo se passou como relatou Anderson, é bem possível que as
testemunhas presenciais não chegaram sequer a suspeitar que aquele ato se
revestiria, posteriormente, de extraordinária importância.

Entretanto, aquela pequena obediência já com as características


especulativas, constituída em 1717 sob a autoridade da Grande Loja de Londres,
graças aos princípios salutares que ela pregava e ao sadio ambiente que ela
proporcionava, cresceu e se multiplicou vertiginosamente.

As quatro Lojas de 1717 já eram 16 em 1721, subindo a 30 em 1723, ao mesmo


tempo em que a Maçonaria se estendia pelo continente europeu e pela América.
Em 1725, a Grande Loja da Inglaterra tinha 64 Lojas sob sua jurisdição e 102 em
1732.

Em pesquisa no site inglês no mês de janeiro de 2009, 292 anos após


aquele encontro, tem-se a informação que, sob a jurisdição da Grande Loja Unida
da Inglaterra, existem 1512 Lojas distribuídas em 47 Distritos ou Províncias
Maçônicas espalhadas pelo mundo; somente em Londres há 1480 Lojas em
atividade e no cadastro geral consta o registro de 9842 Lojas.

Ao admitir em seu seio homens de todas as religiões, de todas as


nacionalidades, de todas as raças, de todos os partidos, a Maçonaria mostra ao
homem um caminho e um ideal cristalizado na trilogia: Liberdade, Igualdade,
Fraternidade. Constitui o cimento por meio do qual, e acima das religiões e dos
partidos, os homens podem se unir e se chamarem de Irmãos.

janeiro de 2009

4
- o prédio foi demolido em 1896, mas tem-se guardada a tabuleta representando um ganso e
uma grelha, que ostentava por cima da porta.

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