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À Gl.'. Do G.'. A.'. D.'. U.'.

A.'. R.'. L.'. S.'.


AMOR E FRATERNIDADE 3719
G.L.O.I.S.P
S.'. S.'. S.'.

A BALAUSTRADA

IIR.'.: Fioravante de Castilho Moreira


Grau: APRENDIZ MAÇOM - A.’.M.’.
Or.'. GRANDE LOJA INDEPENDENTE DE SÃO
PAULO, XXXXXXXXXXX DE 2023 E.'. V.'.

A BALAUSTRADA
Muitos irmãos já divagaram sobre a origem e o simbolismo da balaustrada,
também chamada em alguns rituais de “Grade da Razão”. A imaginação chega a tanto
que há quem defenda que a balaustrada é uma espécie de portal pelo qual o maçom, ao
atravessar, sai do mundo do si mesmo e conquista o terreno dos sonhos, do inconsciente,
da espiritualidade, dos mistérios e da magia. Deve ser por isso que de vez em quando
nos deparamos com irmãos dormindo no Oriente! Mas voltemos à vida real. 

A balaustrada é formada por uma sequência de balaústres que suspendem um


corrimão. Suas primeiras aparições foram encontradas, no que se sabe, sobre os templos
assírios. Balaustradas não estão presentes nas construções gregas e romanas, mas
reapareceram a partir do século XV, inicialmente em palácios de Veneza e Verona,
provavelmente influência da cultura árabe, por conta da dominação muçulmana na
península ibérica. Seu uso mais amplo na Europa teve início no século seguinte, sendo
adotado por artistas como Michelangelo. No século XVI, balaustradas foram largamente
utilizadas na construção de basílicas e catedrais e, a partir daí, ganhou espaço na
ornamentação de igrejas, servindo como delimitador entre a nave (ocidente) e o
presbitério (oriente), num nível mais elevado. É junto da balaustrada que os fiéis recebem
a comunhão.

Para compreendermos a razão da presença da balaustrada nos templos


maçônicos dos ritos de origem francesa e seus derivados (Escocês, Adonhiramita,
Moderno, Brasileiro), precisamos, inicialmente, realizar algumas considerações
pertinentes sobre “templos” maçônicos. 

Como é do conhecimento de todo maçom, a Maçonaria não surgiu em templos. As


primeiras Lojas que se tem notícia não se reuniam em locais sagrados, mas sim em
aposentos nos fundos ou em cima de tavernas, botecos, hotéis, canteiros de obras, etc.
Enfim, locais não muito “sagrados”, bem distintos dos “templos” maçônicos que se tem
hoje por aí, nos quais alguns maçons conservadores não deixam nem mesmo um(a)
profano(a) realizar a limpeza, por risco de profanar o solo maçônico sagrado, colocando
os Aprendizes para exercerem a tarefa da limpeza. 

Foi por volta da década de 60 do Século XVIII que surgiram os primeiros imóveis
construídos com objetivo exclusivo de funcionamento de Lojas Maçônicas, ainda na
Inglaterra. A iniciativa de tal movimento é creditada aos líderes maçons William Preston,
James Heseltine e Thomas Dunckerley. Mas esses imóveis não foram chamados de
Templos, nem passaram por cerimônias de sagração. Aliás, até hoje não são chamados
de Templos e não são sagrados, porque mantém o significado original dos locais de
reuniões dos maçons. São conhecidos por Lodge Room (Sala da Loja). Em outras
palavras, são apenas aposentos de reuniões maçônicas, assim como eram quando em
tavernas, por exemplo. A diferença é que, com as construções próprias, o local fica mais
bem guardado dos não maçons e não precisa ser preparado e desmanchado a cada
reunião. 

Na mesma década, movimento similar teve início na Maçonaria francesa.


Aparentemente, o primeiro local construído para uso exclusivamente maçônico na França
foi em Marselha, a cidade mais antiga daquele país, em 1765. A diferença entre o
movimento de construções maçônicas na Inglaterra e EUA para a França no Século XVIII
foi a de que a França é um país predominantemente católico e a influência religiosa teve
papel fundamental na concepção e ornamentação das construções. 

A influência católica na Maçonaria francesa pode ser observada, por exemplo, no


uso da nomenclatura “templo” e seu processo de inauguração. Baseado na Igreja, o local
de reuniões maçônicas passou a ser considerado um templo, necessitando, portanto, de
passar por uma sagração, costume esse comum à Igreja Católica Apostólica Romana,
mas inexistente em muitas outras igrejas. Reforçando, não se trata de uma prática
originalmente maçônica, mas sim religiosa. 

Tal influência também é explícita na arquitetura da Loja. Tradicionalmente, as


portas que dão acesso à Sala da Loja (templo) devem ser angulares, pois uma entrada
reta (no eixo da Loja, de frente ao Oriente) “não é maçônica e não pode ser tolerada”.
Assim é nas Lojas inglesas e norte-americanas, por exemplo. Porém, a Maçonaria
francesa adotou uma porta central, assim como nas igrejas. Outra característica é quanto
ao piso da Loja, originalmente com o Oriente e o Ocidente no mesmo nível, tendo apenas
as estações do Venerável, 1º e 2º Vigilantes contendo degraus. Entretanto, a Maçonaria
francesa, também copiando a arquitetura de igreja as, adotou oriente mais elevado, com
balaustradas delimitando. 

Outras influências católicas menos perceptíveis são evidenciadas no uso de


incenso, ao denominar o posto do Venerável Mestre de “altar”, na presença do “mar de
bronze” para purificação, entre outras. E a partir da presença física de tais influências em
Loja, iniciou-se o “brainstorming” permanente dos ritualistas, um exercício eterno de
imaginação para conferir interpretações aos mesmos.

Notas:

[1] SADLER, H. Thomas Dunckerley, His Life, Labours, and Letters, Including Some Masonic and Naval
Memorials of the 18th Century. Londres: Diprose & Bateman, 1891.
[2] SMITH, G. The Use and Abuse of Freemasonry. New York: Masonic Publishing and
Manufacturing, 1783, p. 165.
[3] MACKEY, A. Encyclopedia of Freemasonry. New York: The Masonic History Company, 1914, p. 315-
316.

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O traçado deste Balaústre, bem como outros que já tenho apresentado gira à volta do
pensamento do grande filósofo e músico russo Vladimir Jankélévitch.

A aura fantasmática do silêncio surge como o alfa e o ómega do pensamento de


Jankélévitch, pelo que considero que toda a sua filosofia termina na senda apofática do
silêncio, debruçando-se no negro do nocturno. Por este motivo, vou referir-me à questão
do silêncio e à sua relação com a música, não concebendo o silêncio como uma instância
absorvente que reduz a realidade ao mutismo total, mas como instância musical, que nos
permite ouvir a essência inaudível dos sons.

A filosofia jankélévitchiana vai demonstrar-nos que o silêncio é, antes de mais, uma das
experiências mais profundas da natureza humana, pois só o homem tem a possibilidade
falar e, por conseguinte, só ele tem o privilégio de fazer silêncio. Segundo o autor, o
desenvolvimento da linguagem na nossa civilização constitui uma das formas mais nobres
de expressão do espírito humano, todavia, a palavra em comparação com a música será
sempre uma forma de ruído, um ‘ruído’ nobre relativamente às outras formas de ruído
presentes no mundo, mas nunca deixa de ser um ‘ruído’ ensurdecedor e perturbador para
quem deseja realmente ouvir a ‘voz do silêncio’. Deste modo, Jankélévitch critica o estatuto
da linguagem na vida humana, considerando-a como uma forma de ‘barulho’, com o intuito
de demonstrar que o discurso linguístico é um verdadeiro entrave à fruição da vida, um
entrave à ‘experiência’. É neste ambiente crítico e dilacerador de regras, que o autor nos
propõe o Silêncio como experiência primordial da vida, do amor e da música. Tal
derrubamento da linguagem tem como finalidade reconduzir o homem para a arte musical,
pois enquanto o homem estiver preso ao discurso não pode vivênciar a beleza dos sons.
Jankélévitch afirma que o amante da música tem tendência a desvalorizar a palavra, na
medida em que a linguagem surge como algo ameaçador, algo que pode perturbar o homem
e distrai-lo daquilo que é mais essencial, neste sentido, vai verificar-se uma certa oposição
entre a linguagem e a música. Em primeiro lugar, para se ouvir música, para se criar e
compor música é necessário, como condição fundamental, um vazio e um silêncio inicial,
por isso, quando o homem tenta perscrutar os sons deve fazer silêncio. A música e a
linguagem não podem, assim, existir em simultâneo, travando uma luta acirrada, que
desencadeia uma grande tensão entre ambas. Jankélévitch refere que quando a linguagem
e a música entram em ‘concorrência’, a prioridade deve ser concedida à música, pois o
homem deve calar as suas palavras para deixar ouvir e “falar” os sons.

De um modo geral, a palavra foi sempre valorizada no domínio filosófico – na verdade, o


que é a filosofia senão uma reflexão por meio de palavras? – Se percorrermos toda a
história da filosofia poderemos assistir à emergência da linguagem e do poder do Logos na
Antiguidade Clássica, onde reinava a soberania do Logos e da palavra. Os cidadãos da polis
reuniam-se na Ágora, local central na sociedade grega, onde os homens dissertavam sobre
os mais diversos assuntos, e a Ágora vivia de palavras, pois o discurso retórico ocupava um
lugar fundamental no pensamento grego. Na filosofia platónica, o filósofo era apresentado
como um ser excepcional que se encarregava de “mostrar” a verdade às pessoas através do
‘discurso’, na medida em que o sábio deveria conduzir os homens à verdade através do
‘diálogo’ e da habilidade retórica, que encontra na ironia socrática a sua fonte de inspiração.
A retórica deveria estar, pois, ao serviço da sabedoria e, usada correctamente, poderia
encaminhar as almas para o mundo dos Arquétipos. Deste modo, o filósofo aparece-nos
como um “retórico” ao serviço do Bem.

O Iluminismo vai acentuar igualmente o poder da palavra, erguendo a palavra como a


expressão mais elevada da racionalidade humana. Kant acreditava que através do diálogo
racional se poderia estabelecer ‘paz perpétua’ entre os homens, pois o objectivo do diálogo
era desfazer mal-entendidos e estabelecer uma harmonia universal. Os homens
esclarecidos acreditavam que existia um horizonte de racionalidade acessível a todo ser
humano e que, através da palavra, a humanidade poderia chegar a um entendimento.
Todavia, o Romantismo, posicionando-se contra o Iluminismo, apresenta a palavra não
como ‘meio de entendimento’ entre os homens, mas como uma ‘meio de expressão da
alma’, da sua intimidade, do seu lirismo profundo. O aparecimento do Romantismo traz
consigo a elevação da palavra poética, na medida em que, para os românticos, Schiller e
Novalis, a poesia era a arte suprema que permitia contactar com a essência da verdade. A
palavra não era, assim, entendida apenas na sua função comunicativa ou retórica, passa a
ser encarada como um elemento revelador, possuindo fundamentalmente uma função
hermenêutica. Os românticos consideravam que era preciso interpretar, decifrar um
sentido oculto e desvendar um ‘segredo’ que envolve todo o universo. Neste sentido, a
hermenêutica está associada ao deus Hermes, o mensageiro dos deuses, que é portador de
uma mensagem ou de um sentido primordial para a humanidade. Hermes era um
intermediário que enviava as mensagens dos deuses aos homens e as mensagens dos
homens aos deuses, estabelecendo a ligação entre o divino e o humano. A partir da figura
de Hermes surgiu a ‘hermenêutica’, que se constitui como ciência no século XIX,
demonstrando uma grande importância no Romantismo. Schleiermacher, amigo de
Schlegel, partilhava os ideais românticos e ‘revolucionou’ a noção de hermenêutica
tradicional, introduzindo a hermenêutica enquanto ciência, que não se cinge à interpretação
de textos, mas apresenta um sentido superior: interpretar a vida. A ciência hermenêutica
deixa de ter, por conseguinte, um sentido meramente técnico e começa a ganhar um
sentido filosófico profundo.

Schleiermacher pretendia constituir uma ‘doutrina universal da interpretação’, onde o


pensamento e a linguagem formavam uma espécie de unidade. Partindo do pressuposto de
que todo o ser humano só pode pensar por intermédio de palavras, Schleiermacher entende
que os conceitos e os juízos mantêm uma relação de interdependência. Se existe uma
unidade fundamental entre pensamento e linguagem, então, a compreensão da realidade
depende das possibilidades da própria linguagem, pois, através da linguagem, o homem
pode criar pensamentos, na medida em que a linguagem é configuradora de uma certa visão
do mundo. Daí a importância da hermenêutica, que está ligada à ciência suprema, a
Dialéctica. Não pode existir Dialéctica, nem pode haver uma aproximação à verdade sem o
auxílio da hermenêutica, visto que a concepção da verdade depende sempre da
interpretação. Como tudo se apresenta de um modo relativo e parcial, e tudo se encontra
dependente de uma determinada visão do sujeito, não pode haver pretensão de criar uma
linguagem universal, pelo que Schleiermacher conclui que a verdade só pode ser objecto de
uma intuição (Anschauung) e sentimento (Gefühl). Tudo vai girar em torno de uma
hermenêutica mística que é a base da nossa cosmovisão. Só resta ao homem sentir e intuir
o Absoluto, e neste aspecto, Schleiermacher distancia-se do Iluminismo, não acreditando na
existência de uma linguagem universal que fosse compreendida por todos os homens, pois
o universal é sempre pensado dentro das possibilidades de uma determinada linguagem
específica.

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