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AVISO DE GATILHO
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AOS MEUS DEMÔNIOS INTERNOS QUE ME
VIRAM CRESCER
E A ME FORTALECER
COM MINHA PRÓPRIA DOR
LHES DEDICO ESTE LIVRO, QUE PROVÉM
DA MINHA MELHOR PARTE.
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ÍNDICE
Aviso de Gatilhos........................................................................ 4
Dedicatória.................................................................................. 5
Seja um afiliado.......................................................................... 6
Índice.......................................................................................... 7
Prólogo....................................................................................... 8
1. O Gene do imperador............................................................. 15
2. A Vítima e o Intruso............................................................... 32
3. Chamada Anônima................................................................. 46
4. A Desintegração..................................................................... 65
5. Potência................................................................................... 88
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PRÓLOGO
São Paulo, Brasil, 1992
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sardento — Inspira, e empurra! — Colocou sua mão
sobre minha barriga, fazendo uma certa pressão.
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relaxamento que escureceu minha visão e anestesiou
todos os meus sentidos.
O ambiente silenciou, o que me fez pensar por um
momento que estava morta, deitada em um chão
quente e suado, rodeada de sangue, mas não demorou
muito para eu voltar a realidade, sentindo uma leve
brisa gélida de vento que passou pela janela, roçando
na camada úmida de pele da minha bochecha. Sendo a
sensação mais acolhedora que tive em todos esses
míseros nove meses.
Naquele momento minha respiração havia voltado
repentinamente, e meus batimentos cardíacos
aumentavam como se houvesse uma alta dose de
adrenalina momentânea percorrendo em minhas veias.
Um choro fino desconsolado se intensificou
lentamente aos meus ouvidos, ecoando por todo o
cômodo.
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com cuidado, sendo possível ver o cordão umbilical
que ainda estava em intacto e se estendia até dentro de
mim. — É uma menina.
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A mulher chegou mais perto, analisando a cabeça suja
da criança.
— É sim, são clarinhos. — Raquel vincou a testa
aturdida. — Mas pode ser que apenas sejam loiros,
ainda não dá para saber. Espere algum tempo. —
Completou receosa.
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são como amendoados e grandes como os meus. —
Completei firmemente.
CAPÍTULO UM
O GENE DO IMPERADOR
LUCY
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ondulado armado que realçava o seu rosto de formato
triangular, agora estava escuro e sem vida num coque
espigado que mostrava todo seu rosto pálido numa
tonalidade oliva.
Assenti de leve com a cabeça, me sentando junto a ela.
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— Eu me sinto mal só de pisar naquele pátio. —
Suspirei arqueando as sobrancelhas. — Não estou
bem, mas é irrelevante para você, não é? — Ironizei
analisando-a de longe com um semblante apático.
— Sei que tudo têm sido difícil para você, mas é algo
que não deve se repetir. — Amélia exigiu, me olhando
no fundo dos olhos como se sugasse minha alma. —
Não dormi muito bem esses dias, e olha o tamanho das
minhas olheiras. Ainda assim preciso trabalhar para
manter esse lugar em pé.
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muda de assunto.
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namorado psicótico seu. — Concordei abocanhando o
arroz quente que parecia derreter. — Isso aqui está
divino, mãe. — Aprovei com a cabeça.
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procurando. Estou marcada — Murmurou me
lançando um olhar cruel com as pálpebras pesadas —
É com eles o meu problema.
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— Devagar, co-como assim? Você vai morrer? —
Sobressaltei assustada, negando a mim mesma estar
louca.
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Olhando de perto, era o desenho de uma pétala de
Ume com uma lua crescente na horizontal.
— Sobre o que é? — Questionei estarrecida no lugar.
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— Mãe. — Engasguei com minhas próprias palavras
sentindo meus olhos marejarem. — Como pode dizer
uma coisa dessas? — Meu rosto ferveu.
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respeitada, portanto, deve fazer jus para que isso
aconteça. Me ouviu?
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saia de lá. Está me escutando? Essa noite essa casa vai
acabar em um banho de sangue, e a única coisa que eu
te peço é para não chorar, e não gritar — Engoliu o
resto de bebida — Como brincávamos, se lembra?
Deve manter a paciência e tomar cuidado com o
barulho da própria respiração. Se não o intruso pode te
achar.
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e quanto a mim, eu talvez iria para um lar adotivo ou
coisa assim.
— Ok, vamos por partes — Neguei com a cabeça
tentando calcular, meu coração parecia que ia saltar
pela boca — Você está me contando que tem uma
dívida por mafiosos, e que, na verdade devo me
esconder? — Questionei apontando a mim mesma —
Esse tempo todo... — Cerrei os olhos e massageei a
têmpora. — Como sabe disso? E ainda presume que
será hoje?! — Dizer aquilo em voz alta soava como
uma piada, senti um riso abafado e nervoso escapar,
então abafei com o dorso da mão. — Isso é piada?
Você sabe que não é legal esse tipo de brincad...
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— Sim senhora. — As palavras saíram como um
murmúrio ofendido — Seria bem melhor se fosse uma
piada, né? — Afrouxei a postura baixando a cabeça
desanimada. — Só me promete... que vai acabar com
essa idiotice. — Respondi abatida.
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Seus olhos me fuzilaram como se eu tivesse acabado
de dizer uma ofensa.
— Nunca, jamais me peça isso de novo. — Crispou
apontando para mim — Isso é entre mim e eles. Se
quer tanto me ajudar, promete ficar dentro do seu
quarto até tudo acabar, e sem barulho. — Ergueu o
mindinho a minha frente, então retribuí o juramento
com relutância.
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— Mãe... — A encarei deixando algumas lágrimas
escaparem — E quando doer muito?
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CAPÍTULO DOIS
A VÍTIMA E O INTRUSO
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A porta deslizante da sala principal se abriu, e passos
pesados lentamente se aproximaram perto da mesa
onde Amélia estava sentada.
— Quanto tempo. — Uma voz grossa que queimava
como fogo sibilou sardônica num inglês fluente, se
aproximando da mesa no meu campo de visão — A
casa não é nada mau, nada mau mesmo... —
Seu rosto se aproximou acima de Amélia, deixando a
mostra sua grande cicatriz que ia da têmpora até o
maxilar inferior, coberta por algumas curtas mechas de
cabelo mal repicadas.
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— Atrapalhei seu último jantar Ame? — Soltou um
riso zombeteiro — Sabe por que estou aqui?
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Respondeu em tom irônico, soltando um riso abafado
— Mas a sua filha pode acabar como você daqui a uns
anos.
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quem é sua filha, e irá vê-la morrer aos poucos antes
de cortar a cabeça dela.
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calça, retirando um maço de cigarro e fisgando-o com
a boca.
— Aceita? — Ofereceu apontando para Amélia, que
recusou impaciente — Não vai ser educada e me
oferecer uma bebida? — Acendeu o tabaco com seu
isqueiro cromado, que incendiou a ponta soltando
aspirais de fumaça.
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receber o que me foi prometido.
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prefere complicar as coisas. — Chegou mais perto
erguendo proteção, e estendendo o braço para socá-la.
Os movimentos dele eram potentes, porém, lentos,
acabando em vantagem para minha mãe, que desviou
para o lado acertando-o um direto em seu rosto.
Os dois saíram do meu campo de visão, arrastando a
briga pelos cômodos, sendo possível apenas ouvir
murmúrios de ódio e dor.
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frontal que acertou em seu abdome, com uma força
inútil que o manteve incólume.
Desviando de seus ataques de socos frontais, o homem
acertou um soco em cheio na costela dela, que caiu
sem fôlego sobre a mesa quebrada, num gemido
dolorido.
Ele foi para cima da mulher, e sua mão pesada e
grande agarrou seu pescoço magro sem esforço,
apertando-o com facilidade e erguendo seu corpo até
acima da altura de seus olhos inexpressivos.
Um rubor nervoso me subiu, mas eu não conseguia me
mexer, estática e assustada sem saber como reagir
naquela situação.
O rosto de Amélia ficou vermelho escarlate, e as veias
de sua face dilataram. Seu corpo lutava com as pernas
tentando alcançá-lo com um chute, sendo inútil.
Ele ergueu uma faca de seu bolso com a mão oposta, e
sua lâmina tão fina quanto um papel refletiu contra a
luz.
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— Não, po-por favor, não — Amélia pediu sufocando
com uma voz dificultosa.
Sem hesitar, ele apunhalou-a em seu peito
repetidamente, alternando de maneira rápida com um
grito animalesco de prazer.
O rosto dela retorceu numa agonia e as lágrimas
desceram pelo seu rosto, junto de um estertor alto, sua
boca jorrou um sangue viscoso e escuro.
Reprimi o soluço que vinha junto das lágrimas com a
palma da mão. Numa tentativa de me convencer de
que aquilo era um delírio, numa súplica silenciosa.
Ele jogou seu corpo no chão, que caiu num estrondo
aos meus ouvidos.
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boca. Então a porta deslizante da entrada se fechou, e
em segundos, o barulho de carro derrapou na lama
descendo colina abaixo.
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mas eu conseguia suportar e manter meus olhos
abertos e atentos.
Retirei a carta amassada do bolso e dobrada em dois,
abrindo e manchando-a de sangue.
A letra inclinada e escrita à mão em itálico, continha
apenas o número de telefone e um nome.
Hanaoka Hidemi.
Andei até o telefone de mesa, discando cada número
um tanto hesitante.
O telefone chamou, e na quinta vez, uma pessoa
atendeu.
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CAPÍTULO TRÊS
CHAMADA ANÔNIMA
Tokyo, Japão.
ICHIRO
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vermelha com impaciência, me encarando com
semblante exausto que pedia socorro.
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Li os pequenos termos com tinta falha na impressão, e
preenchi com um carimbo, devolvendo-a.
— Estão todos dispensados. — Afirmei em voz alta
me levantando, e arrumando a lapela do terno cinza.
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O telefone no bolso vibrou, tomando minha atenção.
— Me aguarde só um minuto. — Ordenei levantando
o indicador, me virando para o lado oposto.
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O corredor com piso cinza polido, iluminado com
luzes semi diretas que se estendiam ao longo das salas
com portas de vidros escuras e persianas horizontais,
me pareceram infinitas por um momento. Enquanto eu
procurava algum tipo de resposta adequada para
aquela situação.
Amélia foi como uma filha que as entidades nos
enviaram para criarmos, sua partida da aldeia não foi
fácil para eu na época. E minha agonia em receber a
notícia de sua morte, me perseguia por muito tempo,
sendo algo inevitável.
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— O que aconteceu? — Sua voz assustada com um
tom aveludado chegou perto de mim, confusa.
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— A filha de Amélia está viva, isso significa que a
garota precisa de um lar, certo? — Indaguei apertando
o botão do elevador com impaciência — Ela ligou
para Hidemi.
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mãos, pronta para discar.
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cheirava aromatizante doce, de modo que meu nariz
queimava por dentro.
— Boa noite, Sr e Srtª Hanaoka. — O homem de
aparência velha e encolhida se virou, me lançando um
sorriso com um aceno de cabeça.
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uma área nossa, conseguíamos realizar reuniões de
emergências sem questionamentos paralelos.
Seus letreiros verdes agora estavam falhos enquanto a
garoa fina caía sobre, então entrei vasculhando cada
canto, onde não havia ninguém seguido de um silêncio
absoluto.
Uma mulher alta com as mãos estáticas e juntas a
frente do corpo, se dirigiu a mim com um sorriso de
orelha a orelha.
— Seja bem-vindo, senhor Hanaoka, me acompanhe.
— A jovem se inclinou num cumprimento, com uma
voz doce.
Seus passos rápidos que pesavam no assoalho
levaram-me até a última sala que se estendia ao longo
de corredor de paredes de shoji, aparentemente sendo
a única sala ocupada.
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com seus olhos pequenos ao me aproximar. Sentado à
mesa, sua mão segurava um envelope preto, e ao seu
lado, uma garrafa de saquê suava gelada sobre a
planície de madeira.
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— Por que acha isso? — Indaguei um tanto
desafiador, semicerrando os olhos.
35 anos
Formada em Arquitetura em Pernambuco.
Informações inúteis.
Amélia escolheu viver como uma pessoa comum todo
esse tempo, creio que para proteger a filha.
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Pigarreei virando a folha, dando de cara com a
pequena foto da garotinha. Seus olhos amendoados
finos pareciam perdidos e vazios, eram como os da
mãe.
O seu rosto era latino-americano e continham traços
bem desenhados, com os maxilares inferiores bem
marcados. Juntamente de seus cabelos que batiam nos
ombros, numa tonalidade tão branca que até ofuscava.
14 anos.
Lucy Guerra, ganhou medalhas de primeiro lugar em
ciências e geografia nas escolas do Brasil.
Aos doze ganhou dois troféus em primeiro lugar em
natação e literatura, na escola de Kanazawa.
Não há registros de filiação paterna.
Andréia Ferreira abriu um B.O em nome de Lucy
Guerra no ano de 1997 enquanto esteve no Brasil, por
agredir sua filha jogando uma cadeira em sua cabeça,
localizado na escola Farias Peixoto.
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Voltei meus olhos ao homem, acenando conclusivo, e
retirando outro envelope amarelo para ele, com uma
quantia gorda de propina em dinheiro.
Me levantei arrumando a lapela do terno com
indiferença, guardando as fichas na maleta.
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O carro estremecia a cada buraco que passávamos na
subida da colina enlameada pela chuva, que cessou
mantendo apenas uma garoa fina que mais pereciam
fagulhas trazidas pelo vento forte ao amanhecer.
A pequena casa branca tradicional se estendia no topo
da montanha era cercada por viaturas e ambulâncias.
Mais parecido com uma cena de horror ocultada
propositalmente.
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— A garota com certeza têm algum parentesco com os
Hanaoka, porque no ano em que Amélia saiu... Ela já
estava grávida.
Você sabe de algo? Pois se sabe, acho melhor me
contar antes que nosso tratado com os Murakami se
rompa, e isso se torne uma guerra. — Murmurei para
Yuriko, que se manteve estática ponderando com as
mãos finas pousadas sobre as pernas, evitando
qualquer contado visual por trás dos seus óculos.
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sério ajeitando sua prancheta na mão.
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carro, encarando o nada à sua frente com uma aflição
interna e os pequenos pés descalços, imundos de
sangue seco e lama.
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— Os livros. Todos eles. — Respondeu decidida.
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Lucy me encarou, acenando a cabeça levemente em
concordância.
— Ótimo.
Ergui um leve sorriso em resposta, abrindo a porta do
carro para a mesma, que entrou analisando cada canto
com receio.
CAPÍTULO QUATRO
A DESINTEGRAÇÃO
LUCY
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Tokyo é um lugar superestimado, mas eu enxergava
suas paisagens negativas, lembrando-me de que o mal
e o bem coexistem de maneira caótica.
Ali eu me sentia particularmente invalidada, vendo
aquelas pessoas indo e vindo com vidas corridas e
responsabilidades realmente preocupantes. E eu só
estava lá, como um peso morto.
65
fatos.
Ao meu lado oposto, uma mulher japonesa de cabelos
longos e escuros que decaía sobre seus ombros, de
aparência jovial hipnotizante mantinha seu rosto fino
me lançando um sorriso, com os lábios em tom
escarlate. Seus olhos eram cobertos por um óculos
imenso e quadriculado, o que a fazia aparentar ser uma
modelo acompanhante, ou agente do homem.
Hanaoka.
Talvez a filha mais nova.
Suas mãos também eram delicadas, e as unhas médias
e bem feitas, revestidas por uma camada fina de base
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vinil rosa-claro.
Baixei a cabeça encarando os meus pés, enlameados e
sujos de sangue numa comparação incessante com a
mesma, que aparentava ser perfeita.
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meu lado. O carro virou descendo pela rampa,
entrando direto ao estacionamento subterrâneo.
A quantidade de carros esportivos parecia surreal.
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ao meu polegar.
Ichiro percebendo meu desconcerto, deu um riso
abafado e puxou meus pulsos ajeitando a manga com
algumas dobras.
Senti meu rosto queimar de vergonha. — Está tudo
bem? — Yuriko me chamou com sua voz aveludada,
segurando meu ombro com gentileza, me virando para
ela.
Acenei com a cabeça, a encarando por uma fração de
segundos — Perfeito. Quero que ande apenas ao nosso
lado, isso é importante.
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— Vamos — A mulher jovem me lançou um sorriso
raso — Você está pronta Lucy? — Assenti em
concordância, sentindo meu estômago remoer como
em todas às vezes em que eu ficava nervosa.
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então a mulher saiu em nossa frente, girando o molho
de chaves em seu indicador, e examinando cada
detalhe dos dois lados do corredor, aparentando não
encontrar nada fora de lugar.
A segui, admirando aquele prédio igual a uma caipira,
parando no último quarto, que continha um número
4002 em itálico.
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— Agora você pode ter seu momento, se precisar de
algo não hesite em me chamar.
Sua mochila está na mesa ao lado da cama. — Dei
uma leve inclinada com a cabeça num agradecimento
indizível. Palavra alguma poderia expressar a
segurança que me acercou, tirando toda ânsia e estado
alerta que me encontrava.
O quarto era grande e aconchegante, e o mais
encantador dali era o privilégio da visão dos prédios
iluminados pelo céu nublado e escuro que banhava
todo o horizonte. Por trás da parede grossa de vidro
reforçado com respingos da chuva, senti uma nostalgia
perdurar.
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quando quiser comigo ou Ichiro. Basta pedir, e eu tiro
o dia para te mostrar tudo que nossa cultura tem para
oferecer. — Respondeu com um português de sotaque
puxado, que soou num êxtase contagiante.
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outra não sabia como reagir, entre uma onda
melancólica que me consumia.
Me bater até me machucar era inevitável em
momentos de crise, minha mão com o punho fechado
socou minha têmpora com força repetidamente, junto
de um choro baixo e agonizante. Mergulhei a cabeça
debaixo d'água por alguns segundos, soltando o grito
mais alto que eu conseguia para que ninguém pudesse
ouvir.
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checar se está tudo certo — Aprovei veemente,
sentando-me no sofá escuro e esticando o braço.
Uma enfermeira com cerca de quarenta anos deu
algumas palavras e apertou meu bíceps com um
aparelho de medir pressão, chegando mais perto com
um estetoscópio que circulava seu pescoço.
— Vai ser rápido — Posicionou os aparelhos,
apertando a pera de silicone.
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me lançando um sorriso calmo — Vamos realizar seu
hemograma, tudo bem? — A mesma questionou com
paciência, então acenei com a cabeça quieta, a
observando amarrar o garrote azul-marinho envolta do
meu bíceps.
Aquela altura, os murmúrios pela sala pareciam vozes
abafadas pelos pensamentos que me rodeavam, como
uma sobrecarga sensorial.
Fechei os olhos apagando tudo ao meu redor,
lembrando apenas do calor de quarenta graus no
interior de Pernambuco, misturado com cheiro do
chambaril na casa de viagem e grama recém cortada.
Os pássaros daqui, não tem o som único que me
maravilhava como no Brasil.
Outra coisa que me lembro foi quando nos atrasamos
pela primeira vez de volta em São Paulo, e choveu tão
forte que para correr até o metrô, pareceu uma
eternidade, com a água batendo nas canelas.
Aquelas memórias que eu gostaria de manter frescas,
estavam lentamente se apagando pelo tempo, e eram
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meus únicos gatilhos para um resgate de crise.
Tudo seria substituído por uma memória de um grito
agonizante, e do cheiro metálico do sangue em meu
nariz. Se isso é a vida, talvez não fosse para mim.
Não me sinto forte o suficiente para continuar uma
batalha que não foi começada por mim, mas que me
foi dado em mãos para terminar.
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— Precisamos sanar algumas questões sobre sua rotina
daqui em diante — Yuriko chegou perto,
questionando-me seriamente — Me acompanhe.
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— Hanaoka Meiko, a irmã mais nova de Ichiro.
Falecida há dezesseis anos. — Yuriko deu piscadas
seguidas, como se formulasse uma resposta mental.
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baixos — Fazia todos se apaixonarem, uma
aventureira nata. O seu rosto lembra o dela.
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— Como? Eu vou morar em uma... O que? —
Aumentei o tom, aturdida.
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— Tudo bem... Então apenas colabore comigo —
Suspirou — Não mostre seus cabelos a ninguém e
nenhum morador de lá, exceto nossa família. Me
entende?
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prato com cuidado.
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junto de um meio sorriso.
— Sabe, a comida parece ótima, não quero que pense
mal, mas já que perguntou... Eu amaria um bom e
velho café expresso, com pão na chapa com manteiga
— Respondi com um só folego.
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quiser. Só se quiser.
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CAPÍTULO CINCO
POTÊNCIA
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esvaíssem com facilidade.
Um silêncio perdurável logo trazia consigo, um grito
de horror, que, vinha de algum cômodo.
Prendi a respiração e fechei os olhos mentalizando, de
maneira que o peso sob meu corpo desapareceu,
possibilitando-me de sair do quarto.
Senti minhas pernas titubearem com um vento que
vinha da porta da frente, junto de gélidos flocos de
neve que entravam até o corredor escuro, iluminado
apenas pela fraca luz da cozinha.
Meu corpo parou estático na porta, e uma cena me
estarreceu, me fazendo tapar a boca com a mão para
evitar um grito.
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a lâmina de trinta centímetros que reluzia. Igual a que
ele usara para matar minha mãe.
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Suspirei aliviada, sentindo minha pele suada e meus
cabelos encharcados.
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Os médicos disseram que ela estava velha demais para
ter filhos, mas insistiu e deu no que deu. — A
expressão impassível em seu rosto transformou-se
num semblante pesado e melancólico, com o canto
interno das sobrancelhas repuxadas para cima,
enquanto girava o líquido na xícara.
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Yuriko acenou em concordância, se servindo do pão.
— Você será mentoreada todos os dias até encontrar
seu ponto de força. Não tenha pressa, o processo é
demorado.
96
— Estes são os poucos livros que descartaram. —
Abraçou os pulsos atrás do corpo, andando
sincronizadamente ao meu lado, pelos dois longos
corredores estreitos.
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Atendeu-o, virando se de lado com atenção e uma voz
baixa quase murmurando.
Rodei pela biblioteca, examinando cada título, agindo
como se entendesse do que se tratava.
Claramente ali não era meu lugar, inalcançável de
certa forma, e indecifravelmente lindo a olhos leigos.
Talvez por isso a minha reação maravilhada não
chegasse ao tom de indiferença de Yuriko para tudo
isso.
Por outro lado, eu também havia de imaginar como
seria o lugar no meio do nada no qual eles me
jogariam, supondo que, na verdade trabalhem para o
homem que matou minha mãe e isso seja apenas algo
para me atrair sem questionamentos, para no fim me
mandarem para algum orfanato, ou um prostíbulo
clandestino.
Se não, por que esse tempo todo minha mãe não
contou que sua família adotiva era podre de rica?
De qualquer maneira, eu não teria escolhas.
100
— Querida, está na hora de partirmos. — A mulher
concluiu desligando o telefone, e me encarando.
102
com um vilarejo e um vasto campo limpo, de grama
verde clara.
103
alongado e o chão preenchido por pedras largas e
naturais que o texturizavam, conectando até a escada
de cinco degraus para o deque da porta corrediça
principal.
104
— Exato — Seus olhos me faiscaram preocupados —
Algum problema?
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— Estou pronta. — Concluí para mesma, em um curto
suspiro fundo.
CAPÍTULO SEIS
A CASA DO VILAREJO
106
A velha me lançou um olhar de baixo para cima, com
seus olhos enrugados, vincando as sobrancelhas ao ver
meus cabelos. Seu semblante sério era amedrontador,
pintado em um tom de indiferença, diante de minha
presença ali.
Ela vestia um quimono estranhamente simples, de cor
preta com uma faixa cinza circulando sua cintura
larga, e os cabelos grisalhos presos num coque
apertado.
Ichiro chegou perto da mulher, a cumprimentando com
devido respeito e cautela.
107
relaxados.
— Prazer em conhecê-la, senhora Hanaoka. — Proferi,
olhando no fundo dos seus olhos castanho-escuro, com
receio em desviá-los — Me chamo Guerra Lucy.
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novamente me enrolando nas palavras enquanto a
seguia, retirando o sapato no degrau abaixo da entrada,
e calçando as suripas.
A casa tinha um formato retangular, com uma espécie
de jardim ocupando uma parte interna do terreno,
junto de arbustos perenes que acompanhavam o design
arcaico da entrada, marcado por uma trilha de pedras
texturizando o chão que levavam até uma pequena
ponte, onde abaixo se estendia um lago esverdeado,
com algumas carpas que nadavam livremente.
As únicas plantas que eu reconhecia do jardim, eram
as árvores de Ume, que ainda não estavam floridas
pelo início da estação, e os pinheiros budistas baixos
que dava um ar calmo e sério. Os crisântemos rosas e
os juníperos, deslumbravam sua aparência afunilada e
bem aparada, junto das prímulas japonesas que já
desabrochavam.
Amélia sempre que via prímulas magentas, levava
uma muda para casa, cantarolando em como a cor
combinava com seus olhos. Dizia que elas
110
significavam o amor duradouro, sendo a sua favorita.
Tudo aquilo era intocável, e devia dar um trabalho do
caralho para manter tudo tão lindo.
Dois andares eram separados por uma escada de
madeira, e em cada cômodo, uma imensidão
inexplorada.
Acompanhei a mulher com passos lentos até o meio do
jardim, onde passava para o lado oposto da casa,
separado por portas corrediças.
111
Serei sua mentora e tomarei suas aulas de kenjutsu.
Aqui é onde treinará, após concluir seus estudos
teóricos. — Falou tudo num fôlego só, voltando para
os corredores dentro da casa, de forma que eu precisei
apressar os passos para alcançá-la — No entanto,
deverá ler muitos livros para compreender toda a
essência da luta. — Parou bruscamente no meio do
caminho, virando para me encarar.
112
aldeia, e sua família as fabricam para nossas mulheres,
há séculos.
113
estrangeira inútil, principalmente em meios
acadêmicos. Não seria diferente com elas,
absolutamente não.
Primeiro vão olhar de cima abaixo e cochichar com a
amiga do lado, enquanto te encara com rabo de olho.
Depois disso, não contente, as duas vão dar risada
sincronizadas e encarar seu cabelo branco esquisito,
com uma expressão enojada.
Amélia brigava comigo porque ficava em casa
mofando, e não fazia amigos novos, mas isso
claramente nunca me ajudou.
— Ótimo. — Respondi engolindo seco.
Coloquei a mochila no gancho da parede, tentando
evitar mostrar qualquer desleixo como primeira
impressão.
O clima da casa em si, era tranquilo e agradável, com
o ambiente leve. Estar ali, era como morar em uma
época distante, mas num lugar que não me
pertencesse, por mais confortável que fosse. Talvez
por questão de adaptação cultural, e se eu quisesse me
114
encaixar numa rotina puxada para alcançar meus
objetivos, deveria haver constância.
*
Uma mulher alta esperava no corredor principal, com
as mãos atrás do corpo e o queixo erguido. Seu cabelo
grande e escuro, estava preso num rabo de cavalo, e de
longe ela me lançava um olhar feroz.
Andei acanhada na ponta dos pés até a mesma, que
parecia mais velha que Yuriko, com traços bem
parecidos. Seu maxilar inferior e as maçãs do rosto
eram bem salientes, com um semblante intimidador.
Vestindo uma calça escura, e uma jaqueta de couro
marrom apertada, que, demarcava seus bíceps grandes
e definidos, ela fez um gesto com os dedos para chegar
mais perto.
Ao lado esquerdo em seu pescoço, a gola tampava
115
uma tatuagem grande, preenchida por uma pétala de
ume, banhada por uma lua crescente acima e um
círculo externo, igual ao símbolo de clã demarcado no
papel da carta que Amélia me entregara naquele dia.
A mulher devia ser a mais velha dos Hanaoka,
consequentemente, mais parecida com Ichiro. Ela
transparecia uma superioridade que me dava arrepios,
e ao meu olhar, parecia a mais rebelde das irmãs, se é
que pararia por ali.
116
falta de vontade.
117
cabeça, então engoli seco, enxugando o suor que fluía
em minha testa.
118
repousar até melhorar.
119
Fomos até lado oposto do lugar, onde haviam cerca de
seis meninas aparentando a mesma idade que eu,
alinhadas com certa distância, e todas com a postura
ereta, segurando arcos tão grandes quanto. Cada uma
vestia um quimono azul-marinho, com pregas em toda
sua frente e a parte superior eram peças brancas, com a
manga até o meio braço.
— Meninas. — A voz ardente de Hanaoka ecoou pelo
lugar, fazendo todas baixarem os arcos, olhando em
nossa direção — Esta é Guerra Lucy.
120
A única que se manteve incólume, foi uma garota da
última fileira de alunas, mantendo seu olhar curioso
para mim com uma expressão ilegível de longe.
— Vocês são melhores que isso. — Hisaya murmurou
apoiando as mãos na cintura, decepcionada — Estão
dispensadas, não quero mais ninguém aqui hoje. — O
silêncio constrangedor reinou, então todas as outras
saíram murmurando algo enquanto riam.
A menina que mantinha o olhar estático aos meus,
veio andando em direção. — Lucy, gostaria de lhe
apresentar a senhorita Shinkai. — Completou com um
curto aceno.
121
impressionou, porque todos os japoneses que conheci,
não suportavam perfumes marcantes.
— Prazer em conhecê-la senhorita Guerra, eu sou
Shinkai Minako. — Acenou a cabeça com um sorriso
singelo, sendo impossível não admirar sua beleza
hipnotizante — Irei te auxiliar na iniciação no Kyudo.
122
puxando a corda do arco acima dos olhos.
Sua respiração era retida em vantagem de sua mira,
soltando a mão, de maneira que a flecha zuniu aos
nossos ouvidos, cortando o vento com força, e quase
que instantaneamente, estava fincada ao meio do alvo.
A garota Ártemis fazia aquilo parecer fácil, e de certa
forma, sedutora.
123
Engoli seco virando para encarar a garota de volta, que
ajeitava outra flecha ao meio do arco, prestes a repetir
o movimento.
— C-claro... Mas você irá demorar para voltar? —
Indaguei acanhada, puxando a cutículas do dedo, de
maneira ansiosa.
124
CAPÍTULO SETE
SANGUE DO SEU SANGUE
125
incessante, que me assombraria por muito tempo.
Sussurros chegavam de maneira audível ao lado de
fora, então pude reconhecer uma das vozes que soava
pneumática, sendo da mentora Hanaoka Hidemi.
126
destreza.
— Com licença... — Murmurei baixo, de modo que
ela virou o rosto em minha direção, deixando um
sorriso raso surgir em seus lábios rosas e carnudos
com formato de coração.
Sentei-me, observando suas características de frente,
buscando alguma falha que eu pudesse a reprovar,
falhando miseravelmente.
O seu rosto era quase uma pintura renascentista, e toda
vez que ela me olhava, eu ficava estática e sem reação
alguma.
127
Ela gesticulava com confiança em meio as palavras
formais, enquanto dava leves arqueadas com suas
sobrancelhas finas.
O sol direcionava até ela, como se a atenção fosse toda
para si, de modo que a claridade fazia seus olhos
brilharem como jóias, sendo hipnotizante até o jeito
em que lecionava sem nenhum erro na dicção.
Eu já sabia da maioria das coisas que ela contava, e
lido boa parte de suas indicações, mas ainda sim
poderia ficar horas seguidas ouvindo seu sotaque
puxado, como uma música aos meus ouvidos.
— Acertar o alvo não é prioridade, e sim uma
possiblidade de repensar sobre si internamente. Talvez
uma maneira de olhar de um jeito diferente de como
você lida com a vida. — Shinkai Minako fixou-se em
meus olhos e parou por um segundo, virando a cabeça
um tanto curiosa — Senhorita Guerra, desculpe-me
perguntar... Mas qual é sua relação com os Hanaoka?
— Sua voz angelical e fina soou desprevinida num
ímpeto.
128
— Quer saber a verdade? — Cheguei mais perto
fazendo um suspense sarcástico, então ela arregalou os
olhos, encolhendo-se para ouvir — ...Nem eu sei,
talvez um tipo de dívida familiar, ou algo assim.
129
— Ela é uma inspiração para mim. — Seus olhos
agora brilhavam mais, e um sorriso semi aberto deixou
sua expressão entorpecida, como um açoite de
emoções. — Amélia representou o dojô da aldeia por
anos na categoria, destacando-se nos campeonatos.
130
Eu sentia a energia calorosa e extrovertida da garota
como algo positivo, até porque ela não parecia alguém
com quem eu devesse temer em dizer algo errado.
Shinkai era a primeira garota que consegui trocar
algumas palavras em anos, desde que cheguei, então
não poderia estragar tudo e contar que minha mãe não
é uma arquiteta rica, e está esperando-me no Brasil
com vida.
— É quase isso — Fiz um muxoxo entediado — Não
acho que voltarei tão cedo.
131
sem piedade, o deixando apodrecer com as feridas
abertas até a morte.
Princípios não existem quando o motivo é justo.
132
*
133
mais alta. A iluminação dentro do cômodo, clareava
uma prateleira de madeira, igual a um torii, embutida
na parede, com um pedaço grosso de corda de palha
trançada, preso acima. Dentro, havia um papel
retângular com algo escrito na vertical, preso no centro
da parede. E ali, era onde se encontrava uma katana,
com a bainha para cima e presa a um gancho.
134
Sentei-me em cima dos joelhos dobrados,
concordando calmamente.
— Amélia era orfã de uma casa cristã no Brasil, e ao
completar nove anos, sua serventia fora trocada por
dinheiro e sede de poder. Vinda através de um
embarcação clandestina, seu tio-avô, Murakami Goro,
a trouxe em uma de suas últimas viagens até o
vilarejo, a fim de cumprir a aliança entre clãs, o que
evitaria um genocídio. — Pigarreou, franzindo o
cenho — Sua tia-avó, Hanaoka Mayako, a resgatou
sem pensar duas vezes. Era repugnante a situação em
que seu tio havia a deixado. — Aquela altura, não
sabia como reagir, apenas concordar cabisbaixa —
Seus olhos são grandes como os dela, e possuem um
rancor visível. — Analisou-me com certa curiosidade
— Quer matar quem a assassinou, isso é justo, e não
irei impedi-la, mas deve reconhecer, que, tudo o que
aprender aqui, deverá ser manejado com tamanha
sabedoria, equilibrando a necessidade da defesa e do
135
ataque.
136
examinavam com destreza.
— Se morar em Tokyo, estará na boca do predador.
Aqui você ficará segura, e irá honrar as duas partes de
sua família.— Umedeceu os lábios finos e secos.
137
momento, sempre esperando sua melhora.
Amélia se mostrou muito experiente na arte do Kyudo,
e foi muito importante para os campeonatos, mas algo
a fazia se lamentar, por não estar onde uma garota da
idade dela deveria, em uma família normal. Então
quando completou dezenove ela resolveu voltar para o
Brasil, mas um ano depois voltou para acertar algumas
responsabilidades, e foi quando tudo aconteceu.
Deixou a aldeia muito rápido, no meio da madrugada,
como se algo urgente tivesse acontecido. — Hidemi
lançou um olhar sincero e calmo, talvez preocupada
como eu reagiria.
138
filha. — Uma pontada em meu peito me assolou, ainda
tentando conectar cada palavra. — Comparamos uma
amostra de sangue doado de Hiro, e o seu. Os
resultados confirmaram essa suposição, você é a filha
legítima de Hanaoka Hiro. — Exclamou mudando
foco de visão. Encarando meu cabelo, que media nos
ombros. — Está em seu sangue, esses cabelos
brancos... — Engoli seco com as mãos trêmulas e
suadas.
139
minha ascendência nipônica, ao qual eu estranhamente
não parecia surpresa, já que, antes de morrer, Amélia
me pedira para mostrar uma marca de nascença para
Hiro. Ligando os pontos com a história de Hidemi, faz
sentido.
Eu lembrava minha mãe em todos os aspectos, então
não conseguiria tirar uma base de como meu pai era,
apenas olhando para mim.
Talvez a agressividade impulsiva, ou até mesmo os
aspectos maquiavélicos controlados por remédios.
Coisa boa não é.
140
abstraindo.
— Ele sabe que tem uma filha?
141
treinadoras no vilarejo.
142
— Saiba, Lucy, que isto é uma passagem para sua
verdadeira face. Só você poderá prevalecer a paz com
sua força, esse é o seu destino. Deve aceitá-lo como
seu principal propósito.
143
CAPÍTULO OITO
O POÇO DAS CEREJEIRAS
145
entre o cômico e a angústia, com uma personalidade
totalmente oposta a minha, e isso me fazia gostar de
sua presença mais ainda.
146
ela tinha se referido, continha musgos ao seu redor de
concreto em um formato quadrado, parecendo
totalmente abandonado.
Shinkai estendeu uma toalha no chão com estampa de
pássaros em desenhos orientais, se sentando com as
pernas cruzadas, usando uma calça jeans boca de sino,
que marcava sua silhueta ectomórfica.
147
Abri um compartimento interno e escondido de minha
mochila, retirando um cigarro enrolado de maconha
antigo, que eu sempre comprava de um japonês gordo
da loja de conveniência próxima ao museu de
Kanazawa — Venha acompanhada pelo menos. — Dei
de ombros lascando o isqueiro que falhou duas vezes
antes de pegar, acendendo-o.
148
enamorando o cigarro, como se fosse tirar de minha
mão para fumar.
149
Talvez eu me arrependeria mais tarde, mas não
importava, já que estava com a única pessoa que me
acalmava naquele momento.
150
— Ei!— A garota implicou, franzindo a sobrancelhas
e cruzando os braços.— Por que ficou séria tão de
repente?
151
Como meu dia a dia me tornaria futuramente? Uma
empresária, uma espadachin, ou uma máquina mortal,
o tudo isso ao mesmo tempo.
— Minako, o que acha de recomeços?
152
— Como eu sei o que devo aperfeiçoar? —
Questionei suspirando fundo.
153
não conseguia distinguir se aquilo era uma forma
amigável, ou maliciosa das garotas japonesas tratarem
suas amigas.
Me mantive quieta sem falar nenhuma palavra,
aproveitando o ambiente confortável no poço das
cerejeiras, com alguém que eu conhecia a pouco
tempo, mas dividia uma conexão única.
Eu devia ceder, talvez por algum momento, e sentir o
seu doce toque sem estranheza, mas uma certa aflição
fluía do meu peito, me inquietando ao senti-la.
154
— Óbvio que não... Você jamais seria um incômodo.
— Revirei os olhos com um riso baixo — Todos
gostam de você, incluindo eu, é claro. — Dei de
ombros rindo para Shinkai, que ficou com o rosto num
vermelho vivo, junto de um sorriso constrangido. —
Tem que ver o jeito que Hidemi se refere a você,
parece até alguma entidade-gênio.
155
— Lucy, você demorou. — Hidemi cantarolou quando
abri a porta deslizante da entrada.
156
— Mas é claro! — Minako puxou meu braço com as
suripas roxas até o corredor — Com licença... Vamos
lavar as mãos. — Minako levou em direção ao
banheiro com um riso leve e baixo.
157
de tamanho grande. Mesmo com a beleza daquela
comida, eu não conseguia parar de olhar cada
movimento de Minako, como se eu precisasse daquilo,
por muito tempo, e alí estava ela, comendo Sukiyaki
com um sorriso espontâneo das piadas que Yuriko
soltava na mesa, sobre como o funcionário da
tesouraria enviou um email romântico para o prédio
inteiro sem querer, na tentativa de chamar a filha do
contador para sair.
Eu percebia Shinkai lançando alguns olhares de
relances, mas de forma amigável demais com um
sorrisinho sujo de molho. Aquilo me deixava...
confusa.
158
cenho de volta repreendendo-a, de modo que ela
percebeu no mesmo momento.
— Ah... É, claro, mas a postura deve ser trabalhada
primeiro com muita atenção para fazer o uso correto
do arco. — A mesma respondeu com uma voz
amigável, engolindo a comida com pressa para falar.
— Mas é fácil, com a prática ela pega o jeito.
Hidemi sorriu de volta calada, dando um ar orgulhoso
em si, que se manteve até o fim do jantar.
159
na vertical, separando o quintal da casa.
O vizinho ao lado, que aparentemente era um pouco
mais velho que Shinkai, vinha em sua direção, com
um sorriso claramente cego de paixão. O garoto tinha
um rosto bonito, mas um ranço que cheirava de longe,
parecido com um típico homem hétero que conseguia
qualquer camponesa do século XXI deste lugar, apenas
respirando e existindo.
Não daria para competir com aquele cabelo escorrido
até a nuca, o nariz empinado e o rosto masculino com
os maxilares inferiores salientes.
160
desconforto soou certeiro em sua voz, puxando meu
braço para perto de si. — Essa é minha amiga Guerra
Lucy, creio que o mínimo que deve fazer é apresentar-
se antes de se dirigir a mim.
161
— Você deve se preparar, a reunião foi adiada, e
amanhã, Hanaoka Hiro pode chegar a qualquer
momento.
Senti um aperto em peito surgir, e a garganta secar.
Yuriko cruzou as longas pernas pálidas, suspirando de
maneira fleumática, como se soubesse como eu me
sentia, e aquela empatia me parecia familiar, como a
primeira vez em que ela me vira, ensanguentada e sem
destino.
162
Concordei quieta, encolhendo o corpo na cama em
posição fetal, dando de costas para Yuriko, que tentava
me motivar do outro lado da cama.
— Tudo bem... Vou deixá-la descansar. — Um suspiro
ressoou junto de seu murmúrio, parando na linha
externa da porta deslizante — Lembre-se, ele te amará
independente de tudo, é a filha primogênita dele. Você
é invencível, Lucy, saiba reconhecer isso.
O silêncio imortal após bater a porta parecia
angustiante, então meus olhos marejaram, expelindo
cada gota que transbordava, misturado com o
sentimento de culpa que vinha à tona.
163
CAPÍTULO NOVE
UMA HANAOKA
165
pendendo a frente de seu rosto. — Onde está minha
filha? — Questionou no imperativo, com os olhos
puxados analisando o rosto de cada advogado, antes de
parar em mim, estático e surpreso.
166
com um sorriso, se afastando para olhar meus cabelos
brancos, maravilhado. — Isso é... Impressionante.
167
a vi vomitando no jardim perto da área de treino.
Ela recusou meus cuidados e apenas disse que estava
enjoada do chá de Ume que eu havia preparado.
Até analisei se a causa havia sido o armazenamento
incorreto, ou na hora da secagem das folhas... Mas as
ervas de Ume estavam normais.
— Não.
No dia seguinte em que ela teve náuseas, estranhei a
falta dela no dojô e na residência, então tentei contatá-
la, mas já era tarde. — Hiro ajeitou a lapela do terno
lançando-me um olhar protetor de longe. O que me fez
o comparar com Ichiro por alguns momentos, mesmo
não sendo nem um pouco iguais. — Ela já havia
partido para o Brasil. Alguns registros podem
168
confirmar isto. — Completou bebericando o copo
d'água a sua frente.
169
lembrar que eu não tinha ciência alguma da filiação
paterna de Lucy. Já que Amélia era parte de nossa
família, apenas aceitei cuidar da garota em algum caso
extremo. Não vejo erro de minha parte.
170
novidade se referirem a mim como uma Hanaoka.
Respirei fundo sentindo o ar entrar pelos meus
pulmões igual a um mantra om silencioso.
— Senhor Hanaoka Hiro — Os interrompi, de forma
que minha voz soou calma e aguda, fazendo com que
todos me lançassem um olhar atento de volta. — Antes
de falecer, minha mãe pediu que eu lhe mostrasse uma
marca de nascença ao qual ela alega ser importante. —
Senti as palavras saírem num fôlego só, então respirei
fundo e puxei a gola leve em V do quimono,
mostrando a ele, a marca riscada em minha clavícula,
mais parecida com um corte desenhado à mão, numa
tonalidade escura.
171
confiante de si.
172
quatro dias. Se demorarmos para levar ao público,
poderá trazer desconfiança às autoridades, e não
teremos tempo de fazer aliança com os Murakami.
173
Sua filha única, Guerra Lucy, foi recolhida e segue
abrigada por uma família, que ainda não foi
divulgada qual é, por sigilo policial. Tendo a grande
possibilidade de uma grande imprensa estar por trás
de tudo.
174
poucos, me sentindo acuada — Quem matou minha
mãe, disse que Goro ainda não sabia de minha
existência... Mas quando descobrir, não irá hesitar em
me matar com as próprias mãos. — Fechei os olhos
tentando me lembrar de cada palavra dita pelo
estrangeiro norte americano, na noite da colina.
175
chuvosa. — Me lembro... — A cicatriz da têmpora até
o maxilar do homem ia se tornando mais lúcido,
quanto mais eu focava — Ele era um norte
americano... E tinha uma cicatriz grande no rosto.
Talvez um militar, pois ele era autoritário e usava uma
calça camuflada.
176
De qualquer maneira, uma hora ele irá descobrir.
177
ótimo.
— Tanto faz — Revirei os olhos, dando de ombros
com indiferença.
178
agachado sob o arbusto cheio de flores magentas —
Há muitos anos atrás, eu as plantei esperando que
Amélia voltasse, e as visse na entrada. Sabendo que
sempre seria bem-vinda. — Um sorriso leve surgiu em
seus lábios finos e simétricos.
179
cabeça sincero.
180
noite.
Uma carpa.
Eu gostaria de ser uma carpa.
Não devia ser tão trabalhoso comer e cagar grão, para
no final de tudo, ainda ser respeitada como um
símbolo espiritual.
Pensar nisso me fez rir. E é até gratificante poder
sorrir novamente, deixando vazio de lado por um curto
espaço de tempo.
Eu ainda me sentia culpada em estar bem com a
situação, sabendo que há pouco tempo eu fizera juras
de morte. Apesar de tudo, eu não havia me esquecido,
e não poderia trazer minha mãe de volta.
181
segurando uma bandeja de servir, com duas xícaras
dentro, e um bule. Andando em passos alertas, ele se
sentou na beira do corredor externo, servindo-as com o
líquido.
— Lucy, sente-se comigo. — Ordenou gentilmente,
sentando-se no deque — Gosta de chá de Ume?
182
gustativas, e o sabor fresco com uma pitada adocicada
me enfeitiçar.
Cada sabor tinha seu equilíbrio, sem ser nada
enjoativo.
— Puta merda. — Arregalei os olhos e meu corpo
estremeceu, passando por um momento em todas as
cenas boas de minha vida. — Essa é a melhor bebida
que eu já experimentei, sério.
Direto.
Me recolhi, ficando cabisbaixa e muda.
— O que tem? — Vociferei impaciente.
183
— Mas ela não deve ser lembrada dessa forma.
Você é minha filha, então quero que me ajude a fazer
um cerimonial para Amélia. — Ergui minha cabeça, o
encarando de sobrancelhas vincadas, e o semblante
rendido.
184
compreender. — Admiti, numa lembrança nostálgica.
— Eu puxei ela nesse quesito.
De fato.
Então eu pude perceber, que enquanto eu estivesse
viva, Amélia também estaria. Sendo sua última parte
que sobrou neste vasto mundo.
185
CAPÍTULO DEZ
PROFECIA
186
Os sons dos galhos das árvores que balançavam
contra o vento, e os pássaros na cantoria me levavam
ao êxtase da paz interior.
— O que eu faço agora? — Indaguei confusa, ainda
com os olhos cerrados e as sobrancelhas tensionadas.
Pétalas novas
Caem sobre a grama verde
Como um ciclo que renova.
187
céu no horizonte.
Sentados sob as árvores, estávamos longe da aldeia,
parecendo monges budistas perambulando pela mata.
188
e chutes? Talvez?
189
Hiro inspirou fundo, mantendo-se sério. Com as duas
palmas esticadas em minha direção, frente ao
abdômen, atento a qualquer ataque de minha parte.
Soltei um grito raivoso, partindo para lhe dar um soco.
Mas sem esforço algum, ele segurou meu punho
esquerdo, torcendo-o para fora, de maneira que eu que
tombei no chão, imobilizada.
Me mantive caída, e sem hesitar, foquei em sua perna
defronte, tentando puxá-lo para baixo com um golpe
nas juntas, mas com rapidez, ele alterou, chutando
minha perna de ataque com força.
Ele estava pegando leve, era visível.
190
Bufei levantando-me envergonhada, ajeitando a roupa
enquanto praguejava mentalmente.
A procura de seus pontos fracos, me vi falhando
miseravelmente.
— Você e sua avó são iguais. Falam a mesma coisa
sobre profecia, mas nunca contam o que isso quer
dizer. — Rebati dando as costas, andando de um lado
para o outro, insatisfeita.
191
— Nosso clã, tinha, em sua maioria, filhas mulheres
em toda a árvore genealógica, e no período sengoku, a
família entrou em ascensão, trazendo consigo as terras,
que, geravam um grande lucro pelas aldeias. —
Umedeceu os lábios, fazendo uma pausa pensativa —
Então, a primogênita de Mahina, Hanaoka Hana,
acabou tendo um caso com Aratani Kagemori, o filho
de um mediúnico conhecido do vilarejo, e assim
nasceu Aratani Hanaoka Tomoko.
193
Eu simplesmente estava boquiaberta.
— ...E vocês... Supõem que eu sou essa espadachin da
profecia? — Especulei um tanto sugestiva.
194
apenas por ser o filho bastardo de Hanaoka Takeo.
195
tornasse menos inútil. — Goro irá tentar me matar
quando descobrir minha existência, e você sabe que é
verdade... Então se me quer viva, deve entender que
nosso destino está em jogo. A única saída é eu aceitá-
lo de bom grado, ou morrer negando a verdade. —
Hiro não respondeu, mantendo seus olhos fixos aos
meus — Eu até entendo sua forma de me proteger,
mas uma hora isso irá me queimar.
Eu odeio promessas... Mas tenho uma última a
cumprir com minha mãe, portanto, não irei fugir do
meu destino. — Peguei minha boina jogado ao chão,
prendendo cada mecha para dentro com a ponta dos
dedos, e parti descendo a montanha a frente de Hiro.
196
— Hidemi irá discordar de mim de qualquer jeito, e
uma hora ou outra lhe passará os conhecimentos de
luta corporal adaptados por nossa família. Ou seja...
você será a próxima a aprendê-lo, mas será a primeira
a conhecer golpes únicos guardados a sete chaves. —
Respirou tomando fôlego, completando — Golpes que
nem eu aprendi.
Hidemi também pensa que você deve seguir seu
destino, então qual é a força da minha palavra aqui? —
A melancolia em seu rosto se tornou evidente, o que
me magoou por um momento. Não o suficiente para
me cegar, então permaneci em silêncio, buscando
qualquer coisa que me entretesse no chão, para
simplesmente não precisar ver sua decepção
transparecida — Não se preocupe, adiarei sua
iniciação nos treinos, mas não será tão fácil quanto
pensa. Deve superar esses remédios, e depender de si,
não de antidepressivos manipulados.
197
voltando a descer o morro.
198
apagado, e eu seria diferente e com uma personalidade
nova, que me traria mais amigos.
Ledo engano.
Apesar de tudo, aquela casa na colina foi meu refúgio
por muito tempo, além do meu vazio interno.
199
em pessoa, não acreditaria.
— Aqui é perfeito. Sinto que nunca estive tão bem em
um lugar. — Concluí mordendo o lábio inferior,
constrangida — Tem pessoas muito legais... E bonitas.
— De canto de olho, senti Hiro me dar uma encarada
intensa, com um sorriso que ia de orelha a orelha.
200
lado de Hiro, que sempre se mantinha inabalável
quando o assunto era estar em público. Um
cumprimento aqui, outro ali, ele fazia uma parada
básica na barraca de peixes frescos da feira, que se
estendia pela estrada de terra principal do vilarejo.
Onde algumas senhoras cantarolavam o nome de Hiro
como uma música, chamando-o para conversar sobre
como o mesmo estava mais bonito a cada ano que se
passava, e sobre suas filhas mais novas que ainda
estavam solteiras e trabalhavam na capital.
— Mas quem é essa garotinha aí com você? — Uma
das idosas apontou para mim, como um tipo de bicho
exótico.
Quieta, lancei um olhar direto para ele, esperando que
respondesse por mim, antes que eu dissesse algo de
errado.
201
arregalarem os olhos, desacreditadas. Nos comparando
em cada detalhe.
Correspondi com um sorriso, e um aceno de cabeça
quieto. — Filha de Guerra Amélia, a senhora se
lembra? — Hiro interpelou, confiante.
202
vilarejo que o queridinho 'imperador' Hanaoka Hiro
tinha uma filha fora do casamento.
Eu deveria arrumar um jeito de contá-la,
urgentemente.
203
congelar.
204
— Esse sábado? É claro que sim. Que horas eu vou?
205
— Seu tom sarcástico me fez querer rir, e matá-la ao
mesmo tempo.
206
era um lugar simples e bem tradicional como o resto
do vilarejo, onde as pessoas sentadas em bancos de
madeira comiam e bebiam tranquilamente.
207
conseguir uma única amiga verdadeira desde que
cheguei no Japão. — O encarei diretamente com
impaciência — Minako acha que estou de férias aqui
por um tempo, e irei voltar para uma casa inventada,
no Brasil.
Até o fim do dia ela saberá que sou uma maldita
bastarda, e sabe como vai me receber? Você sabe? —
A veia em minha testa saltou, então as narinas
expandiram, quase me levando a um colapso nervoso
— Pois ela nunca mais irá me receber. — Bati as duas
mãos fortemente na planície da mesa, o que fez ele dar
um sobressalto, atraindo olhares alheios.
208
desviando a atenção de seu rosto.
209
coisas — Também sei recitar toda a introdução de
Pálido Ponto Azul de cor e salteado. Li e reli quase
todas as obras do Machado de Assis, Graciliano
Ramos, Carl Sagan, Charles Darwin, Richard Dawkins
e Miyamoto Musashi.
Sei falar Japonês, Inglês, Espanhol e Português, mas a
única coisa que eu mais queria esse tempo todo era
saber sobre você, e nunca tive esse privilégio. — Me
recolhi, bebendo o refrigerante quieta.
211
Pelos livros, isso são absolutos sinais de alguém que
morreu por dentro.
CAPÍTULO ONZE
CERIMÔNIA INTERROMPIDA
212
o dia de hoje. Mesmo que meus pesadelos do ocorrido
continuem frequentes, as meditações me ajudaram
bastante sobre a lucidez deles, então já era um bom
começo.
213
Bufei espreguiçando o corpo, retomando a realidade.
— Eu não vou usar nenhum vestido, ou yukata. —
Reafirmei, a encarando com uma expressão plena. —
Se é o que está pensando.
214
encontrava pendurado no cabide de parede, onde era
possível admirar o paletó cinturado, com uma camisa
branca de botões por baixo, e uma gravata escura. A
calça tinha a altura perfeita, como se tudo fosse feito
exatamente para mim.
Cada detalhe de costura, escolha de linhos e tecidos,
revelavam uma qualidade que eu jamais sonhara em
vestir.
Yuriko tem bom gosto, e realmente caía bem em
minha estrutura mesomórfica, de bíceps e quadril mais
largo.
215
— ...Eu... Consigo fazer isso. — Murmurei a mim
mesma no espelho do banheiro — Estou pronta. —
Respondi em tom alto e claro, saindo do quarto com o
resto de noradrenalina que me restava.
217
O forte frescor amadeirado de incenso entrou por
minhas narinas, nauseando-me instantaneamente.
Uma quantidade absurda de arranjos de flores violetas
rodeavam o grande altar, com a foto recente de Amélia
enquadrada acima, trazendo o resto de vida que faltava
ali. Ao lado, jazia as cinzas na pequena urna branca de
cerâmica lisa. Suspirei ajoelhando-me diante da
bancada, que continha um incensário redondo
prateado, onde uma fumaça trêmula e paralela
incendiava o topo de lascas de madeira em pó.
Deitei a cabeça sobre o dorso das mãos, sentindo uma
última conexão de despedida entre nós.
218
Levantei, despejando com a ponta dos dedos, uma
pitada das lascas na brasa.
Coloquei-me ao lado de Hiro, que me observava com
piedade, e antes de tornar a falar, deu uma inclinada
com o corpo em minha direção.
— Não sabia que orava. — Murmurou com um sorriso
de canto.
219
joelhos. Não demorou muito para que suas lágrimas de
angústia começassem a descer por seu rosto
demasiadamente, desabando a chorar, queito e
cabisbaixo, encolhendo os ombros.
Senti uma pontada no peito, como se eu devesse o
acudir, mas era lindo de ver a falta de fragilidade que
ele passava, o que mostrava sermos mais parecidos do
que imaginava.
220
madeira envernizado, pensativa — Que horas são?
Eu havia me esquecido.
223
Seu rosto redondo com traços de rugas no bigode e na
testa, revelavam sua idade avançada, com uma
aparência em torno de uns sessenta anos. Os cabelos
grisalhos tinham pontos de calvice e apesar de tudo,
ele tinha uma forte presença de um senhorzinho que
vivia tranquilamente.
224
maneira que seu aroma temperado e irresistível me
fizesse salivar no mesmo momento.
— Sirva-se, por favor. — Minako exigiu, tentando
decifrar minha reação — Queremos que provasse
primeiro. Fomos nós que fizemos.
225
começando a comer junto de Minako — Sabe, está
sendo ótimo para minha filha, dar aulas voluntárias
para você, senhorita Guerra. Ela disse que você está
conseguindo avançar rápido. — Minako deu um gole
d'água, tentando esconder o rosto envergonhado.
226
dela. — Sonohara interpelou admirado, abocanhando
uma colherada da sopa.
228
semblante neutro de Sonohara me fez questionar meu
próprio poder de persuasão. Talvez a fofoca de que
Hiro era meu pai, já devia ter chegado ao seus
ouvidos.
229
— Eu agradeço pela paciência comigo... E por ter me
chamado para um jantar. — Pigarreei encolhendo os
ombros. — São pequenos momentos, mas são muito
importantes para mim. — Sorri de canto, saindo portão
afora.
230
virando-me para sair, mas um puxão em meu braço me
fez voltar a encará-la. De maneira que uma pressão
macia apertou-se contra meu rosto, fazendo-me dar
conta de que eram os lábios quentes e rosados de
Minako que estavam colados em minha bochecha.
231
CAPÍTULO DOZE
OBSESSÃO
234
Particularmente, esse tipo de situação, tornava essa
família mais normal e interessante.
Não que eu goste de conflitos, mas meu caso não seria
o ponto central de atenção, por ser uma nova
descoberta entre eles.
Ao entrar no corredor interno, Yuriko me aguardava
com um sorriso esboçando calmaria, disfarçando após
dar um grito com suas crianças.
235
sofrido.
236
suas bochechas rechonchudas, como se tivessem
pegado bastante Sol.
237
Imediatamente a menina mais alta segurou as mãos a
frente do corpo, como se liderasse o que cada uma
fosse falar.
— Eu me chamo Ono Hanaoka Haruna, e minha irmã
se chama Ono Hanaoka Haruhi.
É um prazer conhecê-la senhorita Lucy. — Com a
resposta da mais alta, as duas se curvaram
formalmente, o que me deixou extasiada com tamanha
fofura, me confundindo com os próprios sentimentos
anti-natalistas.
238
Depois de quase descarregar minha bateria social com
as gêmeas, me rendi em ir até a casa de Minako contar
sobre os meus cabelos, após sua provação de amizade
mútua de um beijo e uma rosa. Completamente normal
aos meus olhos, não sei ela.
Ao fim da rua, onde havia uma pequena mercearia,
Hiro saía com algumas sacolas de pano branco em
cada braço, caminhando em passos devagares e
rítmicos.
— Senhor Sonohora! — O chamei em voz alta, de
maneira que todos os outros moradores olhassem de
volta curiosos.
239
encarando o peso que ele carregava, deixando sua pele
enrugada irritada e vermelha. — Deixa que eu te ajudo
a levar, por favor. — Completei puxando uma de suas
bolsas de pano, onde haviam verduras transbordando,
o que é difícil de se ver por aqui.
240
— C-claro. — Gaguejei parando a frente do seu portão
com grade de ferro — Muito obrigado. Irei procurá-
la.
Foi muito bom falar com o senhor.
241
intensa, ao qual os galhos estremeciam quando
soprados com força.
Pisando em terra, os pedregulhos começavam a se
formar, direcionando o caminho até dentro do local,
então o fiz, buscando com os olhos vidrados, algum
sinal de Minako.
O interior do lugar estava vazio, havendo apenas uma
bolsa de malha de esportes escura, jogada sobre o
tatame, sendo a mesma que usou a primeira vez que
nos conhecemos.
242
comprimindo um beijo longo e demorado. Minako não
relutou, permanecendo os punhos soltos ao lado do
corpo.
243
Hanaoka, com uma postura abalada e encolhida por
todo o caminho.
Seu rosto angelical e sorridente não parava de vir a
minha mente. Como se fosse viciante lembrá-la, sofrer
repetindo seu nome com destreza, soando como um
grito de dor.
Mi na ko.
Não era paixão, mas sim, algo... totalmente diferente
com ela. Sua presença era quase uma eutanásia diante
de tamanha dor, e eu não podia perder isso tão rápido,
por causa de um marmanjo velho, que, mal sabe beijar
uma garota.
244
preto e liso decaíam grudadas em sua testa —
Desculpe o atraso, meu pai...
245
— Olha... Não foi isso que eu quis dizer. — Concluiu
tentando me alcançar. — Apenas sigo ordens.
246
fodido minha vida.
247
Posicionei, repuxando o braço contra o peso do grosso
fio que unia cada lado do arco, com a postura aberta e
os braços na altura dos ombros.
Soltei os dedos, sentindo o sopro de ar passar perto de
meu rosto, e em segundos, a flecha estava totalmente
fincada com uma precisão inexata no alvo.
Era um começo.
248
— Talvez se eu praticar mais... Eu consiga melhorar
— Soltei um murmúrio seco, quase que inaudível.
Ajustei outra flecha no arco, voltando a posição dos
pés abertos inicialmente.
249
vermelho.
— Você acabou de dizer que não existe erros no
Kyudo. — Ironizei aumentando o tom de voz.
250
fato. — Admiti fungando alto, de modo que ela me
encarou ofendida e boquiaberta. — Não vê o óbvio. —
Farpei, não resistindo em chegar perto dela,
intimidando-a de peito estufado e sugando sua alma
pelo olhar. — Por acaso sabe o que é um beijo de
verdade? Aposto que não. —
Ela cambaleou para trás quando meu rosto ficou de
frente para o dela, encarando-a mortalmente. Soltou
um suspiro envergonhado, desviando o olhar.
— Acorda. Você tem dúvidas sobre seus próprios
gostos, mas saiba que não irá conseguir manter essa
máscara por tanto tempo.
251
forma cômica.
252
CAPÍTULO TREZE
PODER E JUSTIÇA
254
— Você tem que aprender a ter estabilidade
emocional, Lucy. Sonohara Shinkai era sua mentora
de Kyudo. — Hisaya andava de um lado para o outro
com as mãos juntas atrás do corpo, tentando achar
algum meio de consertar a situação, pacientemente —
O que faremos agora?
255
em mim com um semblante sereno.
256
Acenei com a cabeça levemente, escondendo as mãos
trêmulas debaixo da mesa.
— Certo. — Engoli seco levantando-me para sair —
Estou preparada, mas preciso ir agora. Tenho algumas
coisas a terminar.
257
Não fuja do seu destino. Me prometa.
258
vê-la, estarrecida por sua beleza surreal intacta.
A sensação da estática quando cheguei perto de seu
corpo, me fez arrepiar por inteiro, como um
sentimento único e inexplicavelmente bom.
— Oi... — Suspirei dando um sorriso sem graça.
259
beijo com Kobashi, e descontei em você... Não foi
justo. — Minako me lançou um olhar atônito, como se
seu brilho rapidamente voltasse — Podemos entrar?
Quero te contar tudo, mas é uma longa história...
260
CULPOU?! — Interpelou aos gritos, estressando-se
com um rosto amável, mesmo que franzido.
Não contive, então soltei um riso constrangido — Está
rindo de que? Somos amigas ou não?
Tudo no seu tempo, não posso te culpar de não me
contar algo que te faz desconfortável só de pensar.
261
baú acima do altar do kamiza, onde a profecia se
mantinha guardada. Dentro, havia um grande papel
grosso e antigo, então o desenrolei, abrindo a grande
mensagem escrita em hiragana com tinta nanquim, e
colocando sobre o tatame para que Minako lesse —
Isso significa que haverá uma guerra em breve.
PASSAGEM DA EMISSÁRIA
262
pescoço.
Seu visível sinal ao pisar em terra, será seus cabelos
naturalmente brancos e ofuscantes, carregando
consigo uma katana que levará muitas almas, antes de
matar o traidor de sangue indígno.
263
Hanaoka sempre tiveram a obsessão nas mulheres da
família exatamente por isso, então a sua vida toda você
será tratada como uma princesa ou algo do tipo.
264
na aldeia, eu mato. — Ergueu o punho, socando o ar
seguida de uma risada cômica.
*
Junto de um silêncio mortal, Hiro se mantinha sério no
volante, alternando entre me encarar pelo retrovisor, e
olhar a frente pensativo.
265
Ichiro o caminho inteiro, lia uma papelada no banco da
frente, sem nem desviar os olhos, enquanto Yuriko e
Hidemi ao meu lado, tagarelavam coisas fúteis, que,
eu nem me esforçava para entender.
266
sentindo uma fraqueza indizível me assolar.
267
de rosto familiar, que chegou mais perto de nós,
vestindo roupas formais e salto alto.
— Takamatsu. — Hiro entoou seu nome, dando um
passo a frente dela e acenando levemente a cabeça.
268
Alguns repórteres enfiavam um microfone em minha
cara, e na de Hiro, aguardando com os rostos sedentos
de ganância, uma resposta que nenhum de nós se deu o
luxo de responder.
269
de uma sobrecarga sensorial que aguçava junto da
vertigem no grande espaço, ocupado por pessoas
amontoadas.
270
Ele acenou para as mulheres da família
silenciosamente, pousando os pequenos olhos
escondidos entre as gorduras faciais em mim — Então
essa é a filha de Hiro, hum? — Levantei-me
novamente, semi curvando o corpo levemente.
271
neurologistas nacionais. — Suas falas robotizadas
pareciam tão interessantes, que até eu parei para
escutá-la. Focada no seu modo se expressar
abertamente, passando confiança em cada palavra —
A vítima teve diagnóstico de neurodivergência logo na
infância, sendo muito afetada em ambiente casual e
escolar. Gostaria de fazer um adendo, já que estamos
falando de um caso de tutela que relaciona ao caso de
homicídio em processo investigativo, mesmo que já
tenhamos a documentação de Guerra Amélia, mãe da
vítima, direcionando a tutela para Hanaoka Hidemi,
ainda assim gostaria que ouvisse uma das testemunhas
de Guerra Amélia.
272
— Testemunha, faça sob palavra de honra, o
juramento de dizer a verdade do que souber e lhe for
perguntado.
273
senhora franziu o cenho, discordando veemente. — Já
que nos documentos, em caso de extrema urgência,
você seria responsável pela tutela.
274
Um silencioso momento percorreu entre nós, sentados
à mesa, mas a senhora Hanaoka prosseguiu com
convicção.
— Amélia fora uma sobrinha de consideração muito
importante para a nossa família, por isso aceitei de
bom grado cuidar de sua filha em algum caso extremo.
— Completou cordialmente.
275
Realizamos a transcrição do relato dos especialistas
relatando o ocorrido, com um anexo de cada de
resultado. — Inspirou, retomando fôlego — Isso é
tudo. — Semi curvou o corpo, voltando a se sentar ao
meu lado e bebericar a água no copo suado de
gotículas geladas que escorriam lentamente.
276
Hiro sentado à minha frente, lançou um olhar
fleumático e interessado, com as sobrancelhas
levemente arqueadas.
277
No primeiro segundo que conheci os Hanaoka, me
senti segura. Todos esses dias eu tenho conhecido um
pouco mais sobre sua cultura e as pessoas do vilarejo.
— Inspirei olhando para Hiro de volta, que sorria com
os olhos brilhando — Na verdade, eu nunca me senti
tão bem acolhida em toda minha vida. Está sendo
incrível conhecer uma parte da minha família que
nunca tive contato antes.
278
CAPÍTULO QUATORZE
O AVANÇO DO PEQUENO
279
Eu faço parte de uma família com primeira mudança
de poder feminino, instaurando Hanaoka Mahina,
como a líder do clã após a morte de seus pais, junto de
sua filha primogênita, fruto de uma relação proibida
com o herdeiro do clã rival, Yamazaki.
Hanaoka Mahina é quase um nome canônico no
vilarejo, sendo a responsável em alternar todas as
técnicas de luta, e aceitando unicamente mulheres
como espadachins para protegerem seu clã, o que
mudou significativamente as estatísticas de ataques
rivais à aldeia, e ao seu império. Consequentemente
melhorando a qualidade de vida dos moradores, até
nos dias de hoje.
280
— Senhora Hanaoka, tem algo que posso ajudar? —
Seguindo-a pelos corredores da casa, interpelei atônita,
de maneira que ela me encarou com seus olhos
puxados e abriu um sorriso raso, que, marcava as
linhas em seu buço.
281
Hidemi acenou com a cabeça levemente,
compreendendo em silêncio.
— Amanhã, realizarei sua iniciação. — Respondeu
confiante — Terá de se comprometer com a técnica
milenar do Clã.
Apenas eu, a anciã da família, e seu avô Ichiro,
sabemos os movimentos secretos que Hanaoka Mahina
adaptou. Então passarei todos os meus conhecimentos
a você, tendo em vista que deverá manipula-los com
extrema competência, colocando sempre a lógica a
frente de suas emoções.
282
será sua palavra contra a de um pai de primeira
viagem, abobado por qualquer escolha da filha de
treze anos. Ele poderá nunca aceitar, mas respeitará
sua escolha porque é acima de tudo, seu pai.
Pode até não parecer, mas Hiro tem o coração mais
puro que já conheci, ele é sensível demais e teme te
perder. — Completou aquietando-se — Peço que
entenda o lado dele.
283
Hesitei diante de tamanha beleza, mas no fim me
rendi, permitindo sentir seu peso tornar-se parte do
meu corpo, como um só.
Retirei a bainha preta em detalhes entalhados,
hipnotizando-me pela perfeição extraordinária do fio
que ia estendendo-se com uma leve curva em seu
corpo sem desvio algum na lâmina, junto do brilho que
a polia. Na base da espada, um kanji era marcado na
horizontal em tamanho médio.
Coragem.
284
puros e sinceros — Isso é muito especial para mim.
Cuidarei como minha vida.
286
Suspirei sentindo seu sarcasmo n'alma, enquanto ela se
espreguiçava no canto como quem não quer nada.
A cada volta eu fazia dez flexões, terminando com o
braço dormente e ofegante.
Eu realmente era sedentária, e aquilo acabaria a partir
de hoje.
— Só isso? — A questionei apoiando as mãos sobre o
joelho ao finalizar, inspirando e expirando com
dificuldade.
287
vilarejo, eu tentava decifrar sua idéia com uma certa
atenção.
Andar na aldeia sem a boina, ainda me causa
estranheza, como se eu estivesse despida, mas não era
mais nenhum segredo, levando em conta os olhares
feios e cochicho que os velhos faziam ao passar por
Hidemi e eu. Apenas cumprimentando-a, como se eu
fosse invisível ou um bicho peçonhento.
Talvez todos achassem que aquele branco em meu
cabelo era fruto de descoloração química, ou nem
sequer repararam, o que me poupou muitas perguntas
um tanto retóricas. Piorando o fato de ser a filha fora
do casamento, e ainda por cima, latino-americana.
288
Sardinha, salmão fresco, farinha, ovos, verduras, leite,
queijo.
289
Bufei me rendendo, puxando uma unidade da pilha
com tanta força, que as veias em minha testa saltaram
como fios de aço, e meu rosto tornou a ficar num
vermelho vivo.
Em impulso, joguei os oitenta quilos por cima das
costas, segurando as duas pontas de pano em cada mão
até pagarmos para sair.
290
com um aceno curto e um sorriso, o que me irritava
imensamente, enquanto eu apenas carregava
praticamente um soldado em minhas costas e era
totalmente ignorada.
Na subida até a casa, apenas pude rezar por minha
coluna, observando com a cabeça a encurvada, a
estrada íngreme que se estendia até o alto.
292
Arregalei os olhos e franzi o cenho, incrédula.
— Então carregar um saco de arroz e subir uma colina
não fizeram parte de um treino? — Bufei sarcástica.
293
Automaticamente, minhas mãos chicotearam,
agarrando a tesoura acima da pia de mármore, e então,
por milésimos de segundos, me deixei levar pelo
impulso, puxando a primeira mecha e passando a
lâmina sem hesitar, fazendo cortes irregulares por
todos os lados, desde o topo até a lateral.
297
— Pegue sua Shinai e entre em posição. — A mentora
ordenou em voz alta. — Fiquei frente à frente dela,
com os braços descansadas ao lado do corpo e a
postura ereta.
A mesma, segurava igualmente, um bastão de treino,
levantando-o com as duas mãos, segurando a ponta e o
meio do cabo. Seus cotovelos retos levavam a shinai
até o meio das costas, voltando como se partisse o ar,
em um fraco deslize de pés que alternava para frente e
para trás — Suburi. — Voltou à sua posição inicial,
completando. — Você deve saber realizar de maneira
correta antes de qualquer coisa.
298
que os murmúrios de dor soassem alto.
299
Se Hidemi esperava que eu parasse por ali, ela havia
se enganado.
Abri a base das pernas de lado, com os joelhos um
tanto flexionados e os dois cotovelos dobrados na
altura do ombro, agarrando a shinai numa curta
distância dos olhos enquanto ela vinha para atacar,
defendendo suas tentativas de estocar minha cabeça e
os lados da costela. Deslizei de corpo baixo, acertando
um corte cego em sua perna, ficando às suas costas,
mas não demorou muito para ela se virar com um
chute circular, atingindo uma parte do meu punho, de
modo que o bastão de madeira voasse para longe das
minhas mãos.
300
abraçando os punhos atrás do corpo, andando de um
lado para o outro gesticulando com a cabeça. — Se
errar um pequeno movimento... poderá morrer por si
própria.
Entende isso?
301
EXTRA
GORO
Tokyo, Japão
302
Passei a mão no cabelo, ajeitando os fios que
escapavam do lugar — Mas não ficará assim. —
Completei, bebericando o whisky quente na taça de
gleincarn.
303
sobrenatural?
304
em mãos.
— Eu tenho uma idéia, senhor Murakami. — Sugeriu
com um forte sotaque entre suas falas puxadas. — Mas
não é algo pequeno.
305
AGRADECIMENTOS
306
mais, estará completo para todos, que, apreciam
uma boa leitura.
SOBRE A AUTORA
307
Sarah Peres, mais conhecida no meio literário
como Caos Peres, é uma escritora brasileira
independente que publicou seu primeiro livro
aos dezessete anos, intitulado como A Última
Espadachin, sendo a obra que deu início à saga
de quatro volumes.
308