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Humberto Delgado

Diante de um país com um governo autoritário, conservador e centralizado, onde a censura e a


força militar eram ativas, aqueles que se opusessem tinham de ser dignos de extrema
coragem. Face ao cenário da época, com o vigor do Estado Novo em Portugal, Humberto
Delgado ficou conhecido como o “General Sem Medo”, precisamente por ir contra o regime
salazarista existente naquele momento.

Nascido em 1906, no concelho de Torres Novas, Humberto Delgado primeiramente seguiu


uma carreira militar, a partir de 1927, graduando-se como oficial. O mesmo serviu em várias
unidades militares tanto em Portugal, como em Angola e contribuiu em várias embaixadas
portuguesas durante a Segunda Guerra Mundial. Durante os anos 30, as suas opiniões sobre o
regime eram muito diferentes do que se revelariam ser no futuro. Delgado participou no
movimento de implantação da Ditadura Militar e era um apoiante de Salazar, principalmente
pelas suas fortes bases anticomunistas. Contudo, a guerra, juntamente da sua participação na
missão militar da construção de uma base aérea nos Açores e do seu cargo de representação
na NATO, acabou por causar grande impacto na sua maneira de pensar. Durante aquele
período, o contacto com o mundo ocidental atribuiu a possibilidade de experienciar a
eficiência de uma democracia, e assim, surgiu um questionamento acerca da legitimidade do
regime de António de Oliveira Salazar. Desta maneira, quando retorna a Portugal, o “General
Sem Medo” vê o país com outros olhos.

Vemos uma gradativa aproximação de Delgado aos liberais e a sua imagem adquiri um certo
teor ameaçador para o regime. A sua vivência nos Estados Unidos, por causa da NATO, realça
esse carácter politicamente perigoso, visto que tinha o apoio do país em que viveu e de uma
parte das Forças Armadas. Tinha assim, o potencial de ser o representante da oposição, e
assim aconteceu através da sua candidatura para Presidência da República no ano de 1958.
Tendo em conta que vigorava uma ditadura, as eleições não foram um trajeto fácil para os
opositores. Dificuldades foram enfrentadas na oficialização da candidatura, devido ao extremo
controle do regime relativamente a distribuição de assinaturas e também na própria
campanha, através da força da propaganda e da difamação. Apesar dos obstáculos, Humberto
Delgado conquistou grande apoio popular, visto que trazia a esperança da restauração da
liberdade, da justiça e principalmente da democracia. Desde o Norte até o Sul do país, existiam
movimentos a favor de sua vitória e o mesmo participava de comícios e reuniões para a
difusão das suas propostas e ideais. O nome atribuído a este general não era por acaso, e
vemos isso através da sua bravura ao expressar frequentemente o seu descontentamento com
o regime e a sua intenção de acabar com ele (“Obviamente demito-o!” – Humberto Delgado).
Independentemente da força do seu apoio popular, a sua derrota era quase inevitável,
considerando a fraude eleitoral e a manipulação que o regime de Salazar cometeu naquelas
eleições. A vitória foi então de Américo Tomás, favorecido pelo Estado Novo.

Após a sua derrota, Delgado ainda considerou a execução de um golpe de estado, devido a
ineficácia das eleições, contudo não houve muita recetividade. Desta maneira, devido ao
grande perigo a que estava vulnerável por ameaças da PIDE (Polícia Internacional e de Defesa
do Estado) e pela repressão por parte do regime, o mesmo procurou refúgio na Embaixada do
Brasil, que o acolheu por alguns meses. Após este período de tempo, exilou-se para o Brasil,
onde encontrou outros membros da oposição, que também foram exilados, e assim
desenvolviam e pensavam em ideias de agir contra o regime. Uma destas pessoas foi Henrique
Galvão, e por isso, Delgado foi contribuinte na captura do navio de Santa Maria, da Companhia
Nacional de Navegação. No mesmo ano, tentou participar da Revolta de Beja, uma tentativa de
golpe civil e militar contra o Estado Novo, contudo, esta sua ida a Portugal custou a perda do
estatuto de exilado no Brasil. A sua alternativa foi a Argélia, onde conquistou o apoio do seu
presidente, Ben Bella. Vemos que neste período, Humberto Delgado buscava apoio nas mais
variadas vertentes, como o PCP e alguns movimentos de independência de colónias
portuguesas. Todavia, existiam divergências entre ele e os outros setores, visto que Delgado
proliferava um ideal de acabamento do regime com a força das armas e não de forma mais
pacífica e lenta. Estes contratempos originaram um certo isolamento e distanciamento da
realidade portuguesa, que acabará por originar o seu fim. Na esperança de encontrar
apoiantes às suas ideias e ao fim do Estado Novo, o “General Sem Medo” não sabia que estava
envolvido numa armadilha. No dia 13 de fevereiro de 1965, na fronteira de Badajoz, estavam a
sua espera uma brigada da PIDE, liderados por Rosa Casaco. Esta foi a data de falecimento de
Humberto Delgado, juntamente da sua secretária brasileira Arajaryr Campos, que tiveram os
corpos encontrados no dia 24 de abril.

A luta de Humberto Delgado pela democracia abriu portas para que outras pessoas
conseguissem efetivamente derrubar o Estado Novo, algo oficializado pelo 25 de abril de 1974.
Por ser um dos primeiros opositores, a sua coragem era uma característica louvável, e ter tido
o sangue derramado pelos agentes da PIDE somente enfatizam o motivo pelo qual lutava
arduamente contra o regime de Salazar. Mesmo após a sua morte, Delgado se tornou uma
inspiração e um símbolo da luta pela liberdade e pela democracia em Portugal, tendo um
significativo impacto na história do país.

Maria Clara Marques, nº12, 12ºD

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