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Calcutá
Desde os anos noventa, vozes críticas se erguem contra
a religiosa, que acusam de ser uma fanática amiga de
ditadores e de não dar cuidados profissionais aos
doentes
Madre Teresa, canonizada neste domingo pelo papa Francisco, sem dúvida é a figura
católica mais respeitada e admirada na história da Índia. No entanto, desde os anos
noventa várias vozes se ergueram para criticar seu lado obscuro, “sobre o qual nem no
Ocidente nem na Índia querem ouvir falar, porque ninguém quer saber que seu ícone da
compaixão, Prêmio Nobel da Paz, era uma fanática religiosa amiga de ditadores, ricos e
corruptos. Aos pobres pediu resignação e os ajudou a morrer, mas sem lhes dar cuidado
profissional”, diz Aroup Chatterjee. Esse médico de Calcutá, residente em Londres, tem
sido seu crítico mais consistente. Escreveu o livro Mother Teresa The Final Veredict
(Madre Teresa, O Veredito Final) e esteve por trás do documentário Hell’s Angel (Anjo
do Inferno) do reconhecido jornalista norte-americano Christopher Hitchens, que em
Embora a religiosa sempre tenha afirmado que não fazia política, deu seu
reconhecimento, entre outros, ao ditador do Haiti Jean-Claude Duvalier e ao regime
totalitário de Enver Hoxha, na Albânia. Também recebeu algumas doações que foram
muito criticadas, como as de Charles Keating, preso pela maior fraude financeira da
história dos Estados Unidos até finais dos oitenta. Quando Keating foi para a prisão,
longe de devolver o dinheiro que lhe havia entregue (pelo menos 1 milhão de dólares,
cerca de 3,25 milhões de reais ), madre Teresa intercedeu no tribunal pedindo
misericórdia.
Chatterjee afirma ser impossível saber as doações recebidas pela congregação das
Missionárias da Caridade, fundada por Madre Teresa, mas diz que são milhões e
milhões de dólares. “Com essa fortuna poderia ter ajudado os doentes a viverem
melhor”, diz. O médico considera que Madre Teresa dedicou sua vida a expandir o
catolicismo mais fundamentalista, pregando o culto ao sofrimento. “Não dava nenhum
analgésico forte aos moribundos, mesmo nos casos mais extremos, e os cuidados não
eram profissionais. Careciam da mais básica higiene, sofriam condições de tortura.” Ele
reconhece que a situação melhorou nos últimos anos, mas acentua que ainda é péssima.
Os voluntários não tinham preparo, segundo Gonzáles. “Um deles deu de comer a um
paralítico, que se engasgou e morreu. Eu estive na cremação de 12 pessoas, algumas das
quais acredito que poderiam ter sobrevivido”, diz González, ainda consternado. Na sua
opinião, os missionários não são amigos dos pobres, mas promotores da pobreza. Ao
regressar a Miami, juntou dinheiro para fundar a ONG Responsible Charity Corp. Diz
que suas contas são transparentes, que em 2014 seu orçamento foi de 65.000 dólares
(212.000 reais). “As missionárias poderiam fazer muito mais com tudo o que recebem.”
As Missionárias da Caridade se recusaram a responder às perguntas de EL PAÍS.
Os críticos da madre sabem que ainda são poucos os que querem escutá-los. Mas ficam
satisfeitos ao ver que a mídia começa a fazer eco das críticas à Madre Teresa. “Das
ONGs se exige transparência e profissionalismo. Por que não das Missionárias da
Caridade? Passados quase 20 anos da morte de Madre Teresa, causam mais danos do
que ajudam”, diz González.