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Brasil-Europa em fragmentos?

15 Deus do universo

No Brasil, o domingo realmente é um dia de descanso. Para muitos, no


Sul do Brasil, é o dia perfeito para fazer um churrasco. Ou seja, carne, muita
carne sobre as brasas e entre os dentes. Uma verdadeira bomba de CO2.

Caminho pelas ruas desertas de Chapecó e entro num restaurante, onde


costumava almoçar, dois anos atrás. Quero presentear a proprietária com um
livro, porque ela é citada no mesmo ao comentar a mentalidade da cidade.
O time de futebol da cidade desce do ônibus e se empanturra em 15
minutos. Nessa cidade relativamente europeia, “branca”, o número de afro-
descendentes no time chama a atenção. Aqui, o futebol é um reflexo da socie-
dade brasileira como ela é de fato: diversa, multicor. Por um momento, uma
grande agitação toma conta do restaurante. Antes e depois, está tudo calmo.
Um domingo à tarde tranquilo, com cachaça da região como aperitivo e um
almoço saudável, sem carne nem exagero, mesmo que nos encontremos na
“capital da carne”. Cachaça pura, sim – caipirinha é para os turistas.

Ao pagar a conta vejo claramente que se trata de uma família católica,


com uma imagem de Nossa Senhora Aparecida atrás do balcão, cercada de

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Luc Vankrunkelsven

crucifixos, e outra de Maria. Mas meu olhar é atraído por algo mais! Ao lado
dos interruptores de luz, sobre a caixa de entrada da energia elétrica, ela
pendurou uma oração que ela ganhou de alguém. A oração diz:

“Muito obrigado por este local sagrado de trabalho! Deus


ilumine, oriente e proteja a todos aqueles que aqui entra-
rem.
Deus, muito obrigado pela sua segurança e proteção. Em
cada centímetro de área desta empresa (ou casa) abençoa-
da, Deus se manifesta, purificando-a em definitivo. Muito
obrigado, Deus!
Aqueles que aqui vierem com maus pensamentos, ao cru-
zarem esta porta abençoada, Deus Sumiyoshi, protetor do
universo, purifica as mentes, tornando-os nossos melhores
amigos. Deus zela e protege este local sagrado de trabalho,
fazendo com que os meus clientes, fornecedores, colegas,
parentes, amigos e vizinhos tenham a satisfação de estar
conosco e de partilhar nossa amizade.
Muito obrigado!”

Esse texto, e o fato de ele poder estar exposto tranquilamente ao lado de


Nossa Senhora, me trazem de volta ao Brasil que existe na realidade. Assim
como, recentemente, encontrei atrás do santuário “Bom Jesus de Pirapora” –
centro de peregrinação católico – um círculo com oferendas de “macumba”,
incluindo “Cachaça 51”, cerveja e alimentos, para os participantes do ritual e
para os espíritos. De mesmo modo, no Nordeste, os praticantes do candomblé
também frequentam, sem escrúpulos, uma igreja católica.

Chapecó não é somente a capital da carne. Também é uma maionese de


dezenas de culturas e religiões.
E Deus viu que era muito bom.

Chapecó,
22 de março de 2009.

(1) Sumiyoshi, uma divindade japonesa:


http://www.fjsp.org.br/agenda/05_07_hajime.htm;
http://tertu1.blog.uol.com.br/arch2004-10-17_2004-10-23.html

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