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A indissociabilidade entre Ensino, Pesquisa e Extensão no Ensino Médio de

Pernambuco: Um relato de experiência na formação docente em Ciências


Sociais
Lucas Leon Vieira de Serpa Brandão1
Anderson Vicente da Silva2
Leozina Barbosa de Andrade3

INTRODUÇÃO
O Projeto Interdisciplinar de Ensino, Pesquisa e Extensão (PEPE) é um componente
curricular obrigatório no Curso de Licenciatura em Ciências Sociais da Universidade de
Pernambuco, levando em consideração a formação em torno dos eixos da educação, assim
como se estabelece como meio para o processo de ensino-aprendizagem. (PROJETO
PEDAGÓGICO DO CURSO DE LICENCIATURA EM CIÊNCIAS SOCIAIS, 2016)
O PEPE se destina a conexão significativa entre a investigação do fenômeno educativo
e o planejamento e execução de atividades que contemplem o ensino e a extensão como
práticas e ressignificação dos conhecimentos produzidos, e tem como compromisso a
formação docente qualitativa através da ação do trabalho pedagógico mediado pela realidade.
O PEPE desconstrói a análise de Buarque (2003), quando o mesmo afirma que a o
conhecimento universitário se vê murado e defasado, longe das realidades sociais. A iniciativa
do PEPE demonstra a capacidade de reinvenção na formação do licenciado em Ciências
Sociais, contribuindo para tornar o trabalho docente mais consciente e envolvido com a
realidade social.
Esse componente curricular se caracteriza pela permeabilidade, transversalidade e
continuidade na formação docente pautada na indissociabilidade entre ensino, pesquisa e
extensão. Além disso, o PEPE se configura como um componente prático na formação do
licenciado em Ciências Sociais de forma consecutiva por seis semestres, onde cada
aluna/aluno elege um tema (objeto de estudo relacionado à educação), que permeará sua
trajetória formativa na licenciatura. Assim, o presente trabalho relata a experiência obtida no
PEPE a partir de uma sequência de intervenções didáticas em uma escola de referência em
Ensino Médio de Pernambuco, com as duas turmas do 3º ano.

1
Licenciando em Ciências Sociais pela Universidade da Pernambuco. E-mail: lucas.serpa@upe.br.
2
Professor Adjunto de Metodologia do Ensino em Ciências Sociais da Universidade de Pernambuco. E-mail:
anderson.silva@upe.br.
3
Professora Assistente do Curso de Licenciatura em Ciências Sociais da Universidade de Pernambuco. E-mail:
leozina.andrade@terra.com.br.
A experiência pedagógica que contribuiu para esse relato teve como tema “Acesso e
Permanência no Ensino Superior Público”. Essa experiência tem como campo, a comunidade
de Santo Amaro/Recife e as inter-relações estabelecidas entre essa e o Campus Santo Amaro
da Universidade de Pernambuco, de modo a contribuir para compreensão das políticas
públicas de inclusão social e das problemáticas, que envolvem o ingresso e permanência no
ensino superior público estadual por parte dos estudantes de Ensino Médio residentes na
comunidade.

METODOLOGIA
Para iniciar o referido trabalho, efetivou-se uma revisão da literatura (SOUZA, 1996;
BUARQUE, 2003; ZAGO, 2006; OLIVEIRA et el, 2007; MÉSZÁROS, 2008; APRILE &
BARONE, 2009; SOUSA SANTOS, 2011; LEOPOLDO; SILVA, 2014; SOUZA, 2017;
CHAUÍ, 2018; FERNANDES, 2020), que contribui para refletir e situar o debate acerca da
universidade brasileira e suas políticas de acesso e permanência, além das relações
estabelecidas entre as instituições de ensino superior e a vida urbana. Para orientar a
experiência com os estudantes do Ensino Médio acerca das expectativas e representações
construídas sobre o ensino superior e a relação com a Universidade de Pernambuco,
construímos uma proposta didática composta por cinco encontros, constituídas por aulas,
oficinas e atividades dirigidas com e por estudantes de duas turmas do terceiro ano do ensino
médio da Escola de Referência em Ensino Médio Aníbal Fernandes. Foram pesquisados 38
alunos, de ambos os sexos, com idades entre 16 e 21 anos.
As atividades foram orientadas a partir dos conteúdos da sociologia, relacionados a
desigualdade e estratificação social levando em consideração o método da pesquisa-ação
(TRIPP, 2005) como estratégia educacional onde a pesquisa aprimora o ensino, e em
decorrência, o próprio aprendizado, tendo como base o método da prática social de João Luiz
Gasparin (2007), onde o processo é permeado pela prática social, sua problematização,
instrumentalização com novos dados e contextos, catarse e retorno a uma nova prática social
de forma a propor saltos qualitativos, e onde os sujeitos são co-construtores da pesquisa, do
ensino e da extensão, determinando seus percursos e caminhos.

DESENVOLVIMENTO
Ainda hoje, a universidade se encontra numa posição de favorecimento a
sedimentação dos conceitos de classe e estratificação social, encontrando-se
descontextualizada do momento político-social do Brasil e desvinculada de qualquer projeto
verdadeiro de mudança social. Dessa forma, ganham cada vez mais relevância as discussões
sobre inclusão social no ensino superior, no intuito de garantir soluções as problemáticas
pertinentes ao tema e seus desdobramentos.
As discussões sobre inclusão social no ensino superior permitem introduzir os
estudantes da comunidade de Santo Amaro na análise da realidade social e contribui para a
dialética formativa entre os estudantes do Ensino Médio e os licenciandos em Ciências
Sociais da Universidade de Pernambuco. Permite também, que a comunidade que está no
entorno a Universidade, perceba-se como parte integrante da realidade universitária, inserida
nela e por ela no seio social, e participe importante das suas decisões, reivindicando acesso e
permanência a seu interior, conquistando a disseminação do conhecimento, aproximando-se
de sua realidade e efetivando a universalização do ensino. Ao que diz respeito à formação, o
componente curricular PEPE, atribuí a formação docente amplo valor significativo,
possibilitando diferentes e orientadas maneiras de atuação no campo escolar, permitindo que
Universidade contribua para inserção da comunidade em seus percursos na produção do
conhecimento.

CONCLUSÕES
Embora 60,52% dos alunos pesquisados residissem em Santo Amaro, nas
proximidades do Campus Santo Amaro, 65,22% desses nunca estiveram na Universidade em
si, apesar de 52,17% conhecerem alguém que estudasse nessa. Vale destacar também que
todos os pesquisados são da Classe E, segundo a tabela Classe Social x Renda do IBGE,
sendo que 34,78% tem renda familiar menor que 1 salário mínimo por pessoa, e apenas
26,09% fazem parte do programa de transferência de renda, o Bolsa Família.
O distanciamento da universidade foi evidente através da externalização dos objetivos
e aspirações pessoais. Enquanto dois alunos apenas responderam e assinalaram a ausência de
desejo em ingressar em uma universidade pública, boa parte da turma se mostrou espantada
com a informação de que a universidade pública é gratuita.
Por fim, vale salientar, que a pesquisa ainda não está concluída. Em sua segunda fase,
a fase de socialização, ocorrida no segundo semestre de 2019, foram identificados 36 alunos
ingressantes no curso de Licenciatura em Ciências Sociais da Universidade de Pernambuco,
dos quais, nenhum foi identificado até o momento como residente no bairro de Santo Amaro,
o que evidencia, de forma amostral, que a comunidade não está ingressando no Campus Santo
Amaro, ou seja, não há permanência, uma vez que não há acesso. Além disso, apesar da
Universidade de Pernambuco reservar 20% de suas vagas para serem ocupadas por alunos que
tenham cursado integral, exclusiva e regularmente todo o ensino fundamental, séries finais, e
ensino médio em escolas da rede pública municipal e estadual, o Campus Santo Amaro não
reflete seu entorno. Assim, a pesquisa demostra que o contato permanente com o ensino, a
pesquisa e a extensão, ainda na formação docente, permite a ampliação do olhar sociológico,
se mostrando imprescindível para uma formação docente humanizadora.

REFERÊNCIAS

UNIVERSIDADE DE PERNAMBUCO. Conselho Universitário. RESOLUÇÃO CONSUN


Nº 006/2007. Pernambuco: UPE, 2007.

APRILE, Maria Rita; BARONE, Rosa Elisa Mirra. Educação superior: políticas públicas para
inclusão social. Ambiente Educação, São Paulo, v. 2, n. 1, p.39-55, jan. 2009. Disponível
em: <http://publicacoes.unicid.edu.br/index.php/ambienteeducacao/article/view/534/505>.
Acesso em: 14 jun. 2018

CHAUI, Marilena. Em defesa da educação pública, gratuita e democrática. Belo


Horizonte: Autêntica, 2018.

FERNANDES, Florestan. Universidade Brasileira: reforma ou revolução? São Paulo:


Expressão Popular, 2020.

LEOPOLDO E SILVA, Franklin. Universidade, Cidade, Cidadania. São Paulo: Hedra,


2014.

MÉSZÁROS, István. Educação para além do capital. São Paulo: Boitempo, 2008.
SOUSA SANTOS, Boaventura de. Universidade do Século XXI: para uma reforma
democrática e emancipatória da Universidade. São Paulo: Cortez, 2011.

SOUZA, José Geraldo de. Evolução Histórica da Universidade Brasileira: Abordagens


preliminares. Revista da Faculdade de Educação - Puccamp, Campinas, v. 1, n. 1, p.42-58,
ago. 1996.

SOUZA, Renato Antônio de. Sociologia da Educação. São Paulo: Cenage, 2011.

TRIPP, David. Pesquisa-ação: uma introdução metodológica. Educação e Pesquisa, São


Paulo, v. 31, n. 3, p. 443-466, set. 2005.

ZAGO, Nadir. Do Acesso à Permanência no Ensino Superior: percursos de estudantes


universitários de camadas populares. Revista Brasileira de Educação, [Brasil], v. 11, n. 33,
p.226-370, mai. 2006.

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