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______ _ ARTIGO

SUPORTES TEÓRICOS PARA PENSAR LINGUAGENS


DOCUMENTÁRIAS1
Rodrigo de Sales

Resumo:
Este artigo consiste em uma breve revisão na literatura referente aos estudos e pesquisas que vêm
sendo realizados no Brasil predominantemente nos últimos cinco anos a respeito da construção de
modelos de representação do conhecimento, mais popularmente conhecidos como linguagens
documentárias. O propósito é identificar quais as principais teorias vêm fornecendo subsídios para as
respectivas pesquisas. Antes de mapear parte do campo epistemológico das linguagens documentárias,
será explicitada uma breve contextualização histórica e conceitual a respeito das linguagens
documentárias. Almeja-se concluir com a identificação de possíveis linhas ou tendências de pesquisa
acerca da construção de modelos de representação do conhecimento.

Palavras-Chave:
Linguagem documentária, Terminologia, Lingüística

THEORETIC SUPPORTS FOR THINKING DOCUMENTARY


LANGUAGES
Abstract:
This article consists of an brief literature revision regarding the studies and researches that are being
accomplished in Brazil predominantly in the last five years regarding the construction of models of
knowledge representation, more popularly known as documentary languages. The purpose is to
identify what are the main theories supplying aid to the respective researches. Before mapping the
epistemological field of documentary languages, a brief historical and conceptual contextualization
regarding the documentary languages will be made. Longing for concluding with the identification of
possible research lines or tendencies concerning the construction of models of knowledge
representation.

Keywords:
Documentary language, Terminology, Linguistics

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Artigo apresentado como conclusão da Disciplina Modelo de Representação do Conhecimento do Curso de Mestrado
em Ciência da Informação da UFSC.
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© Revista Digital de Biblioteconomia e Ciência da Informação,Campinas, v.5, n. 1, p 95-114, jul/dez. 2007– ISSN: 1678-765X.
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1 INTRODUÇÃO

Com o desenvolvimento do conhecimento científico e com a evolução das tecnologias de


informação e comunicação, o conhecimento passou a ser produzido e divulgado com
muita rapidez e em enorme quantidade. Em conseqüência disso, aumentaram as
dificuldades no processo de tratamento da informação2, principalmente no que diz
respeito ao armazenamento e à recuperação. Com isso, potencializa-se o investimento na
elaboração de linguagens artificiais que auxiliam as atividades de representação de
conteúdos informacionais, viabilizando um armazenamento de informações facilmente
recuperáveis. Essas linguagens próprias, denominadas linguagens documentárias – LDs,
são constituídas por um léxico de termos específicos de uma determinada área de
conhecimento, ou de um determinado contexto, e suas possíveis relações. Atualmente as
LDs são utilizadas como instrumentos no processo da análise documentária3. Cada área
do conhecimento possui sua própria linguagem de especialidade, e toda LD deve ser
ancorada pela linguagem de especialidade (ou linguagem especializada) a qual está
submetida. A especificidade das linguagens especializadas restringe seu uso aos
conhecedores de determinado conjunto de códigos muitas vezes não conhecido por
qualquer sujeito falante, pois as linguagens de especialidade são aquelas criadas e
comunicadas entre membros possuidores de um conhecimento específico. As linguagens
de especialidade possuem terminologias próprias (terminologias no sentido de conjuntos
de termos específicos de um determinado domínio), que não são de conhecimento geral.
Ressalta-se que toda linguagem de especialidade é concebida e aceita pelos membros da
área de conhecimento que abriga a respectiva linguagem, ou seja, é concebida tanto pelos
produtores das informações de um determinado domínio do conhecimento quanto por
seus consumidores (usuários).

Linguagens documentárias (LDs) são sistemas de signos que visam a uniformização do


uso da linguagem de especialidade, proporcionando uma representação padronizada do
conteúdo informacional, bem como uma recuperação da informação mais pertinente. Por
esse motivo, as linguagens documentárias são instrumentos fundamentais na atividade de

2
O conceito de informação empregado neste artigo será semelhante ao de Buckland (1991, apud
ALVARENGA, 2001) que consiste na noção de informação como ‘coisa’, como algo usado para informar.
Porém, ressalta-se que o termo ‘coisa’, no referido conceito, não remete à noção de substância material,
mas sim, à noção de bem tangível ou intangível.
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Antigamente as LDs eram consideradas produtos do processo de análise documentária, pois aquelas eram
geradas nesse processo.
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indexação da informação. Dentre os diversos tipos de linguagens documentárias, pode-se
citar os cabeçalhos de assunto, os glossários, os dicionários, os vocabulários
controlados, os sistemas de classificação decimal, as taxonomias, os tesauros e as
ontologias. Para efeito de esclarecimento, os modelos de representação do conhecimento
focados neste artigo são aqueles que se fundamentam como um sistema complexo de
termos e relações entre os termos, como os tesauros e as ontologias.

Este artigo visa identificar na literatura da Ciência da Informação como vêm sendo
teoricamente embasados os estudos recentes realizados no Brasil sobre linguagens
documentárias, ou modelos de representação do conhecimento. Com o propósito não
somente de identificar os suportes teóricos, mas principalmente de identificar qual a
teoria que melhor fundamenta a realidade das linguagens documentárias, o artigo
apresenta uma breve análise sobre a Teoria Geral da Terminologia (TGT) e a Teoria
Comunicativa da Terminologia (TCT), por considerar necessária a aproximação da
Terminologia e da Ciência da Informação para estudos desta natureza. Para tanto, foram
consultados artigos de periódicos e relatórios de pesquisa, especialmente Teses e
Dissertações, publicados no Brasil nos últimos seis anos, correspondentes a linguagens
documentárias. Para a localização dos artigos e relatórios de pesquisa foi realizada uma
busca, livre de estratégias rigorosas, nos sítios das revistas científicas brasileiras da área
da Ciência da Informação e nas bases de Teses e Dissertações da Biblioteca Central da
Universidade Federal de Santa Catarina, além de consultas a Anais de Congresso. Livros
de autores/pesquisadores da temática em questão, foram utilizados principalmente para
embasar conceitualmente e teoricamente o respectivo trabalho

2 LINGUAGEM DOCUMENTÁRIA

Linguagens documentárias (LDs) são linguagens artificialmente construídas e


constituídas de sistemas simbólicos que visam “traduzir” sinteticamente conteúdos
documentais, utilizadas nos sistemas documentários para indexação, armazenamento e
recuperação da informação. Para Saracevic (1996), a recuperação da informação foi (e
continua sendo) a principal solução para o primeiro grande ‘problema’ da Ciência da
Informação, a “explosão informacional”. Anunciada em 1945 por Vannevar Bush, a
explosão informacional foi a mola propulsora das discussões incipientes no Pós-Segunda
Guerra e a geradora da referida Ciência. Tal afirmação evidencia a importância da
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recuperação da informação no universo da Ciência da Informação e, consequentemente, a
relevância das linguagens documentárias.

O léxico utilizado pela linguagem natural é composto pelo vocabulário de uma


determinada língua, ou seja, a relação de todas as palavras faladas por essa mesma língua,
enquanto o léxico adotado pela linguagem documentária “é a relação de termos e
símbolos empregados para a identificação temática nos sistemas de informação”
(CAVALCANTI, 1978, p. 21). Para a mesma autora, linguagem documentária consiste
em um conjunto de regras, símbolos e termos pré-estabelecidos com o intuito de indicar
assuntos de documentos. Faz-se necessário distinguir linguagem natural (LN) e
linguagem documentária (LD). Para Cintra et al. (2002), tanto a LN quanto a LD são
sistemas simbólicos instituídos que visam facilitar a comunicação. Porém, a primeira é
composta por palavras e seus diversos significados, ao passo que a segunda é composta
por palavras que assumem o papel de termos, ou seja, restringem seus significados de
acordo com um contexto ou de acordo com uma área específica do conhecimento.

Analisando sob uma ótica social, Cintra et al. (2002) afirma que a função das linguagens
documentárias vai além da simples tradução de conteúdos documentais; ela tem a função
de possibilitar que os diferentes segmentos sociais tenham adequado acesso aos estoques
de conhecimento. Sem as linguagens documentárias, não seria possível cumprir com o
caráter público da informação, pois são elas que garantem o compartilhamento social
entre estoques de conhecimento e usuários de informação. Numa visão também social
Lima (2004) reforça a afirmação acima alegando que a representação e a recuperação
eficientes da informação possibilitadas pelas linguagens documentárias potencializam a
construção de novos conhecimentos, fato este que contribui para o desenvolvimento da
sociedade, pois segundo a autora, os usuários de informações documentárias são
produtores de conhecimento em potencial. As afirmações de cunho social descritas
acima, demonstram a preocupação de fazer das linguagens documentárias verdadeiros
instrumentos capazes de possibilitar que a informação efetivamente cumpra seu papel
com a sociedade, ou seja, as linguagens documentárias se tornam imprescindíveis para
conectar a informação ao seu público, para daí poder exercer a transformação por meio
do conhecimento adquirido.

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Lima (2004) faz uso do termo informação documentária para denominar o signo
documentário que possibilita a articulação entre conceitos e termos de um domínio de
conhecimento, melhor dizendo, a informação documentária é o signo que, auxiliado por
uma linguagem documentária, representa o conteúdo informacional de um documento.
Para a autora, a informação documentária é o resultado de um processo de codificação
(realizado pelo indexador) e de um processo de decodificação (realizado pelo usuário que
acessa a informação). Contudo, é possível afirmar que informações documentárias são
unidades significantes codificadas (descritores). Unidades significantes são entendidas
neste texto como sendo o código que representa um conceito (significado) tendo como
base um referente (objeto), este último proveniente de uma percepção e de uma
interpretação social.

Termos, conceitos e características

Termos, conceitos e características são elementos comuns em toda linguagem


documentária. Para Dahlberg (1978), filósofa alemã criadora da Teoria do Conceito, a
soma total dos enunciados verdadeiros sobre um objeto forma o conceito desse objeto.
Segundo a autora, os enunciados são compostos por elementos do conceito, esses
elementos são as características do conceito, em outras palavras, características são os
atributos predicáveis do objeto.

Linguagens documentárias são formadas por um conjunto de termos, que são


considerados por alguns como designações verbais; os termos são considerados pelas
ISOs 704 (2000) e 1087-1 (2000) como sendo a unidade mínima da terminologia. Para
Lara (2004a) o termo é uma designação que corresponde a um conceito em uma
linguagem de especialidade. O conceito é, para o Manual de Elaboração de Tesauros
Monolíngües criado por Hagar Espanha Gomes em 1990, um construto mental que
representa um objeto individual material ou imaterial. Pode-se afirmar, pautado na Teoria
Comunicativa da Terminologia (TCT), que conceito é a representação mental de um
objeto, e que, somado a uma unidade lexical que o denomina, forma o “termo”4. Os
conceitos sempre estarão relacionados entre si, e o que determinará essas relações serão
as características inerentes aos conceitos.

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Esta definição de ‘terno’ fornecida por Cabré (1999) é a definição mais coerente segundo a perspectiva
deste trabalho.
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Em estudo mais aprofundado, Lima (2004) apresenta uma distinção entre termos e
descritores, pois não raramente se encontra na literatura um uso indiscriminado desses
dois signos que segunda Lima se distinguem em vários aspectos. Embasada por Lariviere,
Lima (2004) pontua o seguinte: os termos pertencem exclusivamente às linguagens de
especialidade, ao passo que os descritores podem pertencer às linguagens de
especialidade e à linguagem comum; os termos são geralmente extraídos dos
documentos, ao passo que os descritores geralmente são signos conhecidos dos usuários e
em hipótese alguma são criados; os termos remetem a um objeto da realidade, enquanto
que os descritores remetem a documentos que tratam dessa realidade; o termo se refere a
uma só realidade (monorreferencial), enquanto o descritor é escolhido
(preferencialmente) entre outros descritores para representar uma determinada realidade.
Lima (2004) aponta também algumas semelhanças entre termos e descritores, a saber:
ambos são unidades significantes que representam um conceito dentro de um domínio de
conhecimento; e ambos são unidades da linguagem natural e não códigos artificiais.

Outro trabalho que apresenta uma maior preocupação em definir o que é o termo dentro
de uma linguagem documentária, porém, menos detalhista em sua descrição, é o trabalho
realizado por Tristão; Fachin; Alarcon (2004). Nele as autoras alegam que o termo é o
elemento do conceito que sintetiza o próprio conceito, permitindo sua comunicação.
Afirmam ainda que o termo denota um referente, ou seja, trata-se de um signo que
representa um objeto. A tese de Lima (2004) converge com essa afirmação e
complementa que esse objeto/referente é percebido e interpretado numa práxis, numa
realidade social. Contrariando a afirmação de Tristão; Fachin; Alarcon (2004), o presente
trabalho adota como mais adequada a definição postulada por Cabré (1999), que enfatiza
ser o ‘conceito’ um elemento pertencente ao ‘termo’, pois o termo é composto por um
conceito e uma unidade lexical que o denomina.

3 SUBSÍDIOS TEÓRICOS ENCONTRADOS NA LITERATURA PARA PENSAR


AS LINGUAGENS DOCUMENTÁRIAS

Para um estudo consistente de linguagens documentárias, deve-se lançar mão, além das
disciplinas de Ciência da Informação, de duas práticas científicas, a Lingüística e a
Terminologia. Enquanto a Lingüística, de uma maneira geral, centra seus esforços
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teóricos na “palavra” como elemento de um processo de significação amplo (a palavra
por si própria), a Terminologia visa utilizar a palavra como “termo”, elemento de um
processo de significação restrito. Enquanto a primeira estuda a palavra como elemento
lingüístico, em sua origem, estrutura e significado5, a segunda se preocupa apenas com o
significado (conceito) do termo. Na Lingüística, o contexto redacional em que se insere a
palavra não é a prioridade, tornando assim, seu significado amplo e variável. Na
Terminologia, o contexto de redação onde está inserido o termo é prioridade para
conceituar seu significado, ou seja, a terminologia faz uso do contexto para demarcar
território e delimitar o uso dos termos.

Linguagens documentárias, são constituídas de elementos delimitados por um


determinado contexto ou por uma determinada área do conhecimento, melhor dizendo,
são constituídas por termos. Com efeito, são subordinadas a uma terminologia,
contextualizadas por um conteúdo documental ou por um domínio específico do
conhecimento. Porém, a sintaxe e a semântica (objetos da Lingüística) são fatores
relevantes na construção das linguagens documentárias. Outra noção lingüística que pode
ser utilizada para melhor pensar a essência das linguagens documentárias (LD como
sistema relacional de signos), é a noção semiológica de signos, significados e
significantes, postulada por Ferdinand de Saussure e revisitada por Roland Barthes. A
utilização da Lingüística para o processo de análise documentária data do início da
década de 1970, apesar de já ter sido esboçado no final da década de 1950.

Nesta seção são apresentados alguns estudos recentes (relatados em artigos e relatórios de
pesquisa) realizados no Brasil correspondentes a linguagens documentárias de modo a
ressaltar os suportes teóricos adotados pelos pesquisadores.

A Teoria do Conceito de Ingetraut Dahlberg, que analisa o conceito como a soma total
dos enunciados verdadeiros de um objeto, pontuando informações a respeito de suas
características, relações, categorias e definições, é a teoria que vem freqüentemente
fornecendo subsídios teóricos aos estudos de representação do conhecimento na área da
Ciência da Informação.

5
É importante frisar que esta definição das características da Lingüística se inscreve no estudo etimológico
e principalmente na definição estruturalista de Ferdinand de Saussure, que serviu de suporte para Roland

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Dentre as teorias da Terminologia que ancoram os estudos mais recentes de organização e
representação do conhecimento, merecem destaque a Teoria Geral da Terminologia
(TGT) de Eugen Wüster, Teoria da Socioterminologia de François Gaudin e a Teoria
Comunicativa da Terminologia (TCT) de Maria Teresa Cabré. A TGT, dotada de uma
perspectiva prescritiva e normativa, é responsável pelo fornecimento dos primeiros
supostos de trabalhos terminológicos. A Socioterminologia dotada de uma perspectiva
descritiva, dando ênfase ao uso social da língua, possibilita maior variação e flexibilidade
lexical e conceitual, o que proporciona uma maior aproximação entre mecanismos de
informação e usuários. A TCT, embasada pela Socioterminologia, fundamenta-se em
aspectos comunicativos das línguas naturais. Paralelo a isso, a Teoria da Gramática
Funcional de Simon Dik, também vêm sendo aplicada no campo da Ciência da
Informação, postulando fundamentos preciosos aos estudos de linguagens documentárias.
Essas perspectivas teóricas serão melhores descritas no decorrer deste artigo.

É relevante ressaltar que existem na literatura trabalhos como os de Mendonça (2000),


Café (2003, 2006), Bufrem (2005) e Pereira e Bufrem (2005), para citar alguns, que
enfatizam ser necessário uma relação estreita entre Lingüística e Ciência da Informação
para melhor entender e construir linguagens documentárias. Por meio de um estudo
bibliométrico referente aos temas abordados nos artigos dos fascículos da Revista Ciência
da Informação, no período de 1972 a 1998, Mendonça (2000) constatou que, em média,
apenas 01 (um) artigo contendo como tema a interseção entre lingüística e ciência da
informação foi publicado por ano, durante os 26 anos investigados. Para a autora, que
sugere a inserção da disciplina Terminologia nos currículos dos cursos de graduação e
pós-graduação da área da ciência da informação, essa baixa produção literária (que
aborda o respectivo tema) compromete a qualidade da organização do conhecimento e da
recuperação da informação efetuadas por profissionais da área. Com base no estudo de
Mendonça (2000), é seguro afirmar que essa baixa produção literária afeta diretamente o
processo de construção de linguagens documentárias, pois tanto a eficiência da
organização do conhecimento quanto à eficiência da recuperação da informação estão
diretamente ligadas à eficácia da linguagem documentária que será empregada para os
respectivos processos. Essa afirmação leva à conclusão de que a lingüística e a
terminologia devem fazer parte do processo de construção de linguagens documentárias.

Barthes pensar os elementos da semiologia.


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Café (2003), em trabalho que visa contribuir para a formação de base de conhecimento,
muito pesquisada no tratamento automático da linguagem natural, propõe uma
interpretação sob a luz da Teoria da Gramática Funcional (que abrange análise da sintaxe,
da semântica e da pragmática dos termos) para elaborar uma metodologia de construção
de softwares que se empenhem em reconhecer automaticamente segmentos lexicais em
textos. Esse estudo é um exemplo categórico de uma análise qualitativa de termos-
descritores. Nele, a autora, ancorada pela Teoria de Simon Dik, analisa descritores
compostos (constituídos por mais de uma unidade lexical) de textos escritos em
português do Brasil na área de Biotecnologia de Cultura de Tecidos e Plantas. Esses
descritores, denominados pela autora de unidades terminológicas complexas (UTCs), são
submetidos a uma análise lingüística de natureza humana. A análise de UTCs apresentada
por Café (2003) é um esforço intelectual que converge com a atual tendência em
recuperação automática da informação, que é a construção de sistemas de tratamento de
texto integral. A autora, ao dissertar a respeito das contribuições da Gramática Funcional
na delimitação de segmentos descritores de informação, afirma que a relação entre a
Lingüística e a Ciência da Informação é indispensável, pois ao lidar com o processamento
automático de conteúdos de informação fazendo uso da linguagem natural, e ao elaborar
ferramentas de recuperação de informação, é possível evidenciar a importância da relação
entre as respectivas áreas.

Campos e Gomes (2003), estudando a organização e a representação dos domínios do


conhecimento seguindo os princípios da teoria da classificação facetada de Ranganathan,
afirmam que a importância fundamental da organização do conhecimento está ficando na
superficialidade dos estudos voltados à representação de conteúdos de informação no
ambiente em Rede, pois os princípios das classificações de assuntos são adotados nos
dias atuais somente na organização da informação de suportes físicos tradicionais. As
autoras ressaltam que
Os princípios apresentados por Ranganathan para a elaboração de uma base
teórica sólida, visando a construção de classificação bibliográfica, como pode ser
observado, é de fundamental importância para a organização de domínios de
conhecimento. A representação de um domínio do saber, se configura como
princípio norteador para a organização de documentos e informação. Dessa
forma, consideramos que um repensar sobre estudos seminais, como o de
Ranganathan, possam trazer novos rumos para conceitos atuais como o de
organização de domínios do conhecimento. O desenvolvimento desses estudos,
no âmbito de modelos teóricos de representação, permitirá ao profissional de
informação a possibilidade de atuar cada dia mais num espaço interdisciplinar

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que englobe questões ligadas à epistemologia, à lógica, à teoria cognitiva, à
computação e à terminologia. (CAMPOS E GOMES, 2003, p. 162)

Nota-se na literatura que um número considerável de estudos relacionados à linguagem


documentária são embasados teoricamente pela Teoria do Conceito de Dahlberg e pela
Teoria Geral da Terminologia de Wüester. Segundo Tristão; Fachin; Alarcon (2004), para
a compreensão do conceito e de suas relações é imprescindível adotar princípios da
Teoria do Conceito, pois se trata de um método indicado para a fixação do conteúdo do
conceito, conseqüentemente, determinante para o posicionamento desse dentro de um
sistema de conceitos. Esse preceito converge com afirmações proferidas anteriormente e
posteriormente por Moreira (2003), Gomes e Campos (2004), Moreira; Alvarenga;
Oliveira (2004), Pereira e Bufrem (2005) et al., Pereira e Bufrem (2005), além de
utilizarem as teorias do Conceito e da Terminologia, lançam mão da Teoria da
Classificação Faceta de Ranganathan para analisarem princípios e métodos de
organização e representação de conceitos para as linguagens documentárias.

Com o objetivo de compreender melhor os conceitos terminológicos, buscando


transcender o uso normalizado dos termos e dando ênfase à importância da Terminologia
na construção de linguagens documentárias, Lara (2004b) afirma que a ciência da
informação ao assumir a responsabilidade de organizar e transferir informação deve
necessariamente inserir em suas atividades de representação do conhecimento, sobretudo
na construção de linguagens documentárias, princípios descritos pela lingüística
documentária e, principalmente, pelas teorias da terminologia.

Discutindo sobre estruturas classificatórias subjacentes às linguagens documentárias,


Batista (2004), refletindo a respeito das redes de conceitos sob a égide da teoria dos jogos
de linguagem de Wittgenstein, do labirinto tipo rede de Umberto Eco, e do modelo do
rizoma de Deleuze e Guattari, afirma que, assim como o usuário da língua é
convencionalmente treinado a utilizá-la, o usuário da informação pertencente à
comunidade científica também depende de linguagens pré-estabelecidas que explorem
semelhanças entre conceitos de um determinado domínio do conhecimento, determinando
seu uso.

No âmbito da era digital, Gomes e Campos (2004), Moreira; Alvarenga; Oliveira (2004)
convergem em afirmar que a maioria dos trabalhos referentes à indexação e recuperação
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de informação realizados com recursos automáticos, está operando somente com base na
freqüência de ocorrências de palavras pertencentes aos documentos submetidos à análise,
ou seja, abrangendo somente aspectos estatísticos. O emprego somente de dados
estatísticos não abrange os aspectos semânticos dos conteúdos dos documentos,
comprometendo a qualidade da indexação e permanecendo muito aquém da indexação
realizada por especialistas. Porém, os respectivos autores não mencionam trabalhos que
vêm sendo realizados por pesquisadores da área da ciência da informação empenhados
em desenvolver métodos de indexação automática considerando elementos semânticos
contidos nas informações textuais. Estudos de Kuramoto (1996) e Moreiro, Marzal e
Beltrán (2003) são exemplos de esforços voltados à qualidade da indexação e
recuperação da informação tomando por base estruturas da linguagem natural, como
sintagmas verbais e nominais, buscando identificar aspectos semânticos dos conteúdos
informacionais. Souza (2005), em trabalho realizado após as afirmações de Gomes e
Campos (2004), Moreira; Alvarenga; Oliveira (2004), avançando os estudos de Kuramoto
(1996) e Moreiro; Marzal ; Beltrán (2003) propõe uma nova metodologia para indexação
automática utilizando sintagmas nominais. Mesmo que os estudos de indexação e
recuperação pautados em sintagmas não sejam ainda uma tendência de pesquisa
amplamente difundida, a menção desses trabalhos deve ser incluída nas revisões de
literatura, e os seus esforços devem ser continuados, pois se o paradigma da ciência da
informação está voltado ao usuário da informação, não há mais como fugir da idéia de
que a recuperação da informação ancorada somente em indexações quantitativas não
facilitam a recuperação de informações pertinentes por parte do usuário.

Na questão da recuperação eficiente da informação através da normalização


terminológica, Gomes e Campos (2004) ressaltam que os autores (sobre tudo os
cientistas) também podem contribuir para a precisão da comunicação da informação ao
adotarem em seus textos termos normalizados de acordo com linguagens documentárias
de sua área de domínio.

Como proposta de elaborar uma metodologia para construção de linguagens


documentárias, Cervantes (2004) busca na Terminologia, na Terminografia e na Teoria
do Conceito elementos para fundamentar teoricamente sua pesquisa de Mestrado. A
autora justifica sua fundamentação afirmando que a Terminologia, estudando signos de
designação de linguagens de especialidade, é uma área cuja prática envolve “a criação de
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termos, sua análise, processamento, apresentação e uso na comunicação especializada”
(CERVANTES, 2004, p. 57), sendo o recolhimento, a constituição, a organização e a
difusão dos termos sob a forma de dicionário terminológico, uma incumbência da
Terminografia. Cervantes (2004) faz uso também do substantivo Terminótica, para
designar o tratamento de termos com recursos automatizados, ou seja, a Terminótica é a
Terminologia automatizada. Na Teoria do conceito, Cervantes (2004) busca bases mais
consistentes para a compreensão do que é conceito no que tange representação e
recuperação da informação.

Em estudo que visa determinar uma metodologia mais adequada para a representação de
domínios de conhecimento, levando em conta objetivos de aplicações ligados às áreas da
Ciência da Informação, da Ciência da Computação e à da Terminologia, Campos (2004)
investiga e discute a problemática representacional nas referidas áreas, fato que permite a
representação do conhecimento em diversos domínios, objetivando identificar um núcleo
comum de conceitos fundamentais para modelar o conhecimento. Para tanto a autora
resgata a teoria da classificação facetada de Ranganathan e a teoria do conceito de
Dahlberg (na ciência da informação), o modelo orientado a objetos e a ontologia formal
(na ciência da computação) e a teoria da terminologia de Wüester. No trabalho de
Campos (2004), a representação do conhecimento, em busca de uma modelização ideal
de domínios, é abordada com base no método de raciocínio, nos objetos de representação
e na relação entre os objetos de representação.

Convergindo com os pensamentos de Mendonça (2000) e Café (2003), Pereira e Bufrem


(2005) também afirmam ser imprescindível a relação entre e lingüística e documentação
para aprimorar a organização e a recuperação da informação (consequentemente
aprimorar a construção de linguagens documentárias), e acrescentam, embasadas na
literatura, que o diálogo deve ser composto pela terminologia, pela ciência da informação
e pela ciência da computação. As autoras afirmam que trabalhos como os de Wanderley
(1973), Baranow (1983), Medeiros (1986), Miranda (1989), Boulanger (1995), Faulstich
(1995 e 1995a) e Peixoto (1995) (PEREIRA; BUFREM, 2005), são enfoques
diversificados que tratam o cientista da informação a partir de contribuições da
Lingüística, da Terminologia e da Socioterminologia. Bufrem (2005) contempla ainda a
literatura voltada à relação indispensável entre a Lingüística e a Documentação com uma
resenha crítica do livro El contenido de los documentos textuales: su análisis y
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representación mediante el lenguaje natural, de José Antonio Moreiro González, que
segundo a autora trata-se de um “contexto teórico exaustivamente analisado e discutido,
em que se realizam aproximações atuais relativas à análise documental” (BUFREM,
2005, p. 5).

Com os estudos levantados até aqui, fica evidente a indispensável necessidade de


considerar aspectos concernentes à Lingüística, à Terminologia e à Documentação para
refletir, no âmbito da Ciência da Informação, a conceitualização, a teorização, a
elaboração, a aplicação e a avaliação das linguagens documentárias. Contudo as teorias
mais freqüentes nos estudos aqui apresentados são a Teoria do Conceito, a Teoria da
Classificação Facetada, a Teoria Geral da Terminologia (TGT), a Teoria Comunicativa da
Terminologia (TCT) e a Socioterminologia. A próxima seção apresenta mais detidamente
os fundamentos da TGT e da TCT, duas perspectivas terminológicas distintas, e até certo
ponto antagônicas, que formam duas vertentes de estudo.

4 A TGT E A TCT

Seguindo uma corrente investigativa em evolução no Brasil (Enilde Faulstich e Marisa


Bräscher, para citar algumas) e no mundo (François Gaudin e Maria Teresa Cabré), para
citar alguns), Café (2006) faz uso da abordagem funcionalista para pensar a respeito da
organização do conhecimento e das atuais tendências da Terminologia, ressaltando a
evolução das teorias da Terminologia, que tanto tem contribuído para a representação do
conhecimento fornecendo subsídios teóricos para a elaboração de linguagens
documentárias. Cabe aqui fornecer uma explanação a respeito da perspectiva
funcionalista. A ótica funcionalista, diferentemente da formalista, que
6
metodologicamente se estrutura da função sintática para a semântica , entende a
linguagem como um instrumento de interação social utilizada para a comunicação de
interlocutores reais. A perspectiva funcionalista busca entender a instrumentalidade da
linguagem inserida nas situações sociais, como uma atividade cooperativa estruturada.
Para tanto, a visão funcionalista parte do princípio que a função pragmática é que rege a
semântica e a sintaxe nas expressões lingüísticas. Não se detendo às distintas correntes

6
O paradigma formalista, que considera a linguagem como um objeto abstrato baseado no conjunto de
sentenças, acredita que só é possível entender o significado do discurso por meio da análise sintática, sendo
esta a responsável em reger a semântica e o pragmatismo do texto.
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funcionalistas , pode-se afirmar em concomitância com Castilho (1994), Pezatti (1994),
Neves (1997) que a gramática sob a égide da perspectiva funcional é uma atividade
social.

A Teoria Geral da Terminologia (TGT) foi a primeira a tratar sistematicamente a


terminologia como uma disciplina, concebendo assim os primeiros alicerces da teoria
moderna. Na década de 1930, o engenheiro austríaco Eugen Wüster (1898-1977),
preocupado em criar um instrumento de trabalho que desfizesse a ambigüidade na
comunicação tecno-científica, publica em 1938 o The Machine Tool, dicionário
especializado na área de engenharia. Com uma preocupação puramente metodológica e
normativa (ainda não teórica), Wüster traça as primeiras linhas de sua teoria
terminológica (a TGT). Décadas depois, mais precisamente em 1968, Wüster deixa de
lado a prática metodológica para estudar a fundo a natureza dos termos. Para Cabré
(1993) a Terminologia é abordada por Wüster como uma matéria autônoma descrita pela
TGT e definida como um campo próprio em relação a outras ciências e outras disciplinas.
Melhor dizendo, a Terminologia é considerada pelo criador da TGT como uma disciplina
de encruzilhada entre a Lingüística, a Ciência Cognitiva, a Ciência da Informação, a
Comunicação e a Informática.

Em síntese a TGT é uma teoria de caráter prescritivo, pautada em uma linguagem ‘ideal’
que desconsidera a flexibilidade efetiva do processo comunicativo no ambiente
especializado, e visa a normatização8 (padronização) internacional dos termos
especializados.

Na década de 1990, com base no funcionamento da comunicação especializada e com


uma visão descritiva, surge a Socioterminologia que, fundada por François Gaudin em
1993, estuda as terminologias na análise da língua, privilegiando seu uso social,
contrapondo a atribuição formal de rótulos postulados pela Teoria de Wüster. A Teoria de
Gaudin abre caminho para outros trabalhos que seguem a influência de estudos
lingüísticos e comunicacionais para pensar a Terminologia. Os estudos de Enilde

7
Neves (1997) discorre sobre o funcionalismo conservador (que apenas aponta os elementos inadequados
do formalismo), o funcionalismo moderado (que além de ressaltar os pontos inadequados do formalismo,
propõe uma análise funcionalista da estrutura) e, o funcionalismo extremado (que nega a estrutura e se
baseia unicamente na função, desconsiderando a sintaxe).
8
Entende-se o termo normatização como referente à ‘tornar norma’, pronta e acabada. Diferentemente do
que se entende por normalização, que remete à ‘tornar normal’, recomendação de uso.
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Faulstich, da Universidade de Brasília, e de Maria Teresa Cabré, da Universidade
Pompeu Fabra de Barcelona, são exemplos dessa tendência teórica. Gaudin (1993),
afirmando que a terminologia não pode ser estudada isoladamente, sem se considerar o
contexto social, econômico e comercial, constrói os pilares da Socioterminologia. O autor
lança mão da sociolingüística, que considera o contexto social, cultural e político, para
analisar o emprego da língua francesa, e afirma que a prática terminológica não pode de
forma alguma ser dissociada do conhecimento do campo de atuação dessa prática,
levando em consideração o texto produzido nesse campo, seu público, sua ação e sua
utilidade. Segundo Gaudin (1993), as características da Socioterminologia possibilitam
estudar o funcionamento dos léxicos profissionais que efetivamente são utilizados na
comunicação entre os pares de um domínio de conhecimento ou profissional. Outra
característica marcante da Socioterminologia é se reportar à origem dos termos,
verificando não somente sua recepção e aceitação na comunidade especializada, mas
principalmente identificando as causas do fracasso ou as razões do sucesso de seu uso
efetivo. Tal fato, faz com que a respectiva teoria transcenda a terminologia escrita e
normativa. É evidente que a Socioterminologia atua nas práticas lingüísticas e sociais
concretas, e para tanto, localiza-se nas leis que unem trabalho e linguagem.
Concomitantemente ao desenvolvimento da Socioterminologia surge a TCT.

A criação da TCT ganha forças na segunda metade da década de 1990, momento em que
a Teoria Geral da Terminologia recebe inúmeras críticas por seu caráter reducionista e
idealista. Não deixando de considerar a importância da TGT para o estudo sistemático da
terminologia, mas sim, evoluindo o pensamento terminológico de acordo com as
necessidades reais de comunicação do universo tecno-científico, Cabré (1999) ressalta
que a perspectiva prescritiva e normativa da TGT limita a comunicação profissional
devido à inflexibilidade ao se tratar os termos, seus conceitos e características. Para a
autora, esse reducionismo ocorre devido às crenças idealistas de que os conceitos
preexistem às expressões; de que o conhecimento tecno-científico é uniforme e universal;
de que a estruturação de um campo de conhecimento independe de seu contexto; de que
os âmbitos especializados são neutros e consensuais; e a crença de que o termo
normalizado apresenta as características mais significativas para todas as situações.

A TCT, diferentemente da TGT que enaltece as diferenças entre Lingüística e


Terminologia, visa considerar as concomitâncias existentes entre ambas disciplinas para
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traçar uma teoria de base lingüística que analise as unidades terminológicas tendo em
conta a dimensão textual e discursiva dos termos. Em vez de restringir seus fundamentos,
a TCT busca uma teoria generalizada levando em consideração que a Terminologia é
interdisciplinar (integrando aspectos da Lingüística, das Ciências Cognitivas e das
Ciências Sociais) e transdisciplinar (atua em todas as disciplinas, pois não há
representação e comunicação eficiente do conhecimento sem uma terminologia).

Segundo Cabré (1999), a TCT não considera os termos como unidades isoladas que
constituem seu próprio sistema, mas sim, considera-os como unidades que se incorporam
no léxico de um falante no momento em que este adquire o know how de especialista por
meio da aprendizagem do conhecimento especializado.

Na esfera da Terminologia, ficam evidentes duas vertentes teóricas distintas. A primeira,


liderada pelos postulados da TGT, desenvolve o raciocínio sob uma perspectiva formal e
prescritiva, e, a segunda, liderada pela Socioterminologia e pela TCT, postula seus
fundamentos sob a abordagem funcionalista do uso lingüístico.

5 CONCLUSÕES

Os modelos de representação do conhecimento despontam na atualidade como


instrumentos capitais nos processos de tratamento da informação, mais especificamente
no processo de análise documentária que é responsável pela representação temática da
informação. Tal afirmação leva a inferência de que as linguagens documentárias são
primordiais para uma eficiente indexação e recuperação da informação.

Conforme exposto neste trabalho, são diversas as teorias que estão fornecendo subsídios
para a fundamentação teórica dos estudos de linguagens documentárias, como a Teoria do
Conceito, a Teoria da Classificação Facetada, a TGT, a Socioterminologia, a TCT,
Sociolingüística e a Lingüística Funcional. Por ser a linguagem documentária um
instrumento de controle terminológico, não é descabido afirmar que sua fundamentação
teórica deve ser pautada em teorias cujo objeto seja a unidade terminológica, ou seja, o
termo. O fato dessas linguagens documentárias serem empregadas em ambientes de
comunicação especializada, seja de um determinado campo do saber seja de uma
determinada área profissional, as tornam instrumentos requisitados em situações ‘reais’
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de comunicação. Dessa forma, uma teoria de base lingüística, que leve em consideração
as variáveis possíveis em um processo de comunicação, e que opere sob uma abordagem
funcionalista, pautada no pragmatismo do discurso efetivamente proferido e consumido
nos ambientes especializados, é imprescindível para fundamentar as reflexões a cerca das
linguagens documentárias.

Como visto, a TGT zela pelo formalismos e pela idealização do discurso especializado,
ao passo que a ótica funcionalista da TCT se ocupa com a comunicação especializada
realmente utilizada. Isso permite inferir que, além de incorporar e complementar a Teoria
do Conceito, acrescentando a idéia de que o ‘conceito’ é parte do ‘termo’, e além de
avançar os estudos terminológicos apontando as insuficiências da TGT, a TCT progride
rumo a uma teoria que dialoga diretamente com a prática. Sendo assim, aponta-se a TCT
como uma teoria capaz de fundamentar os estudos de linguagens documentárias de modo
que essas operem como instrumentos pertinentes a situações reais da comunicação
especializada.

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Rodrigo de Sales
Mestrando em Ciência da Informação – UFSC
Bacharel em Biblioteconomia – UFSC
Bolsista de Desenvolvimento Tecnológico Industrial do CNPq - Nível G
Membro do Núcleo de Pesquisa em Informática, Literatura e Lingüística – NUPILL/UFSC.
rodrigo_biblio@yahoo.com.br

Recebido em: 07/11/2006


Aceito para publicação em: jan. 2007

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