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SUMÁRIO
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NOSSA HISTÓRIA
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1. ETNOMATEMÁTICA, ABORDAGEM HISTÓRICO-CULTURAL DA
MATEMÁTICA
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Dentro do contexto social a matemática é uma ferramenta para a tomada de
decisões, fornecendo instrumentos para avaliar os resultados das ações
implementadas para a resolução escolhida. O conhecimento que é gerado pela
matemática em todas as culturas, através de tomada de decisões e de resoluções de
problemas, tem uma atitude subordinada ao social e cultural. A história representa de
maneira geral a história dos grupos sociais e a afirmação de identidade desses
mesmos grupos, com isso os educadores matemáticos querem simplificar o ensino da
matemática, valorizando o seu uso social: a matemática do dia-a-dia. Devemos
lembrar que toda a construção teórica da matemática, também nos deu os
melhoramentos tecnológicos, que fazem parte do século atual: o telefone celular, a
Internet, o laser, as televisões a cabo, etc.
Dica!
Nessa aula, Ubiratan D`Ambrosio fala um pouco sobre a matemática alternativa
cultural.
https://www.youtube.com/watch?v=kUCNDK7DeKs
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2. AS ETNOMATEMATICAS
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Figura 1 – O que é etnomatematica.
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etnomatemática. Assistindo a inúmeras cirurgias, Tod L. Schochey identificou na sua
tese de doutorado, práticas matemáticas de cirurgiões cardíacos, focalizando critérios
para tomada de decisão sobre tempo e risco e noções topológicas na manipulação de
nós de sutura. Maria do Carmo Villa pesquisou as maneira como vendedores de suco
de frutas decidem por um modelo probabilístico, a quantidade de suco de cada fruta
que devem ter disponíveis na barraca para atender satisfatoriamente, as demandas
da freguesia. N.M.Acioly e Sergio R. Nobre identificou a matemática praticada pelos
bicheiros para praticar um esquema de apostas atrativo e compensador.
A proposta da etnomatematica é aprimorar a matemática acadêmica, de forma
a incorporar os valores da humanidade, e de forma que o individuo seja atuante no
mundo moderno. Esse vínculo é importante para que a diversidade cultural esteja
atrelada na construção de uma sociedade mais humana, solidaria e critica.
Na sociedade moderna, a Etnomatemática terá utilidade limitada. Não se pode,
pensar hoje em aritmética e álgebra, que privilegiam o raciocínio quantitativo, sem a
utilização de calculadoras. O raciocínio quantitativo e o cálculo [ aritmético, algébrico,
integral] foi a razão de ser das calculadoras e computadores.
O uso de mídias tem suscitado novas questões às possibilidades do surgimento
de novos conceitos e de novas teorias matemáticas (BORBA, 1999). Atividades com
lápis e papel ou mesmo quadro e giz, para construir gráficos, por exemplo, se forem
feitas com o uso dos computadores, possibilitam a solução em menor tempo do que
o necessário mediante uso de caderno e lápis.
Pode parecer contraditório falarmos em uma matemática sofisticada quando
fazemos a proposta da Etnomatemática, mas justamente o essencial da
Etnomatemática é incorporar a matemática cultural, contextualizada, na educação
matemática e o uso de mídias amplia essa possibilidade, pois os recursos
tecnológicos têm favorecido as experimentações matemáticas, visto que o raciocínio
lógico com qualidade é essencial para situar-se no mundo moderno e chegar a uma
nova organização de sociedade, que permita exercer a crítica e análise do mundo
moderno que vivemos.
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3. A IMPLICAÇÃO DO CONHECIMENTO HISTÓRICO DA MATEMÁTICA NO
ENSINO
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4. O NASCIMENTO DA ETNOMATEÁTICA
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Segunda vertente: leitura amplificada da História da Matemática, a partir da
visão dos matemáticos que, de alguma forma, “criaram o substrato material e
intelectual para os matemáticos, e que se beneficiaram, utilizando, no cotidiano e nas
suas práticas, conhecimentos matemáticos”. (D’AMBROSIO, 2013).
Terceira vertente: “propõe uma pedagogia viva, dinâmica, de fazer o novo em
resposta a necessidades e estímulos ambientais, sociais, culturais (...). Assim, dá
espaço para a imaginação e para a criatividade. É por isso que na pedagogia da
Etnomatemática, utiliza-se muito o fazer cotidiano, a literatura, a leitura de periódicos
e diários, os jogos, o cinema, etc. Tudo isso tem importantes componentes
matemáticos.” (D’AMBROSIO, 2013).
Para Pollig, (2015).
A utilização da Etnomatemática vem como uma ferramenta para auxiliar o
docente em seu trabalho, dando-lhe alegria e prazer em lecionar, e traz um suporte
agregador na aprendizagem dos discentes, de maneira incentivadora e divertida,
mostrando-os que a matemática muitas vezes está em pequenas ações, trabalhos e
até mesmo brincadeiras, que é possível levar esses conhecimentos, que muitos
educadores desprezam, para as salas de aula, que matemática não é só aquela que
está em seus livros didáticos.(POLLIG. 2015)
Com esse conceito, é sabido que há pessoas que mesmo sem possuírem
formação escolar, conseguem desenvolver técnicas próprias para solucionar cálculos
e aplicar em suas necessidades profissionais.
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5. O PROGRAMA ETNOMATEMÁTICA
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A Matemática Acadêmica, que é universalmente praticada nos institutos de
pesquisa e nos sistemas educacionais, é uma categoria ampla de conhecimento, uma
construção abstrata originada nas culturas da bacia do Mediterrâneo e da
Mesopotâmia (Iraque antigo) e das civilizações do vale do Nilo. Podemos dizer que a
Matemática Acadêmica (e portanto a Matemática Escolar) tem como origem a
Etnomatemática dessa ampla região ao redor do Mediterrâneo. Essa construção
abstrata, muitas vezes chamada o estilo euclidiano, é baseada na lógica do tertium
non datur. O estilo euclideano é o protótipo de rigor matemático. Mas esse estilo e os
resultados obtidos a partir dele têm se mostrado insuficientes e inadequados como
estratégia para lidar com a complexidade de fatos e fenômenos de todos os ambientes
naturais e socioculturais. Muitos matemáticos acham que essas insuficiências não
devem ser consideradas na matemática elementar, não devem ser consideradas nas
escolas, desde o Fundamental ao Superior. Insistem que o estilo euclidano é a base
de toda a evolução do pensamento, não só matemático e científico, mas de todas as
áreas de conhecimento. O estilo euclideano é considerado padrão de rigor. Mas a
dicotomia do “é ou não é”, “certo ou errado”, “bom ou mau” e tantas outras formulações
do tertium non datur vêm sendo contestada, particularmente como estratégias de
desenvolvimento cognitivo. O “pode ser”, “talvez seja” vêm ganhando presença entre
pensadores, particularmente entre matemáticos e cientistas. Os trabalhos de Max
Planck, Albert Einstein, Luitzen E. J. Brouwer, Kurt Gödel e outros evidenciam isso,
assim como a matemática fuzzy.
Como aprendemos do eminente matemático Wen-Tsun Wu, a matemática na
China antiga tinha um método de pensamento e estilo de apresentação muito diferente
da matemática grega. Havia rigor seguindo um modelo distinto do estilo euclideano
(Wu, 1987).
Reconhecemos construções abstratas ao estudar a história da matemática na
Índia antiga, nas civilizações andinas, na África subsaariana, na Polinésia, de fato em
todas as civilizações do mundo. Pode haver alguma semelhança nas construções
abstratas em civilizações diferentes, mas elas são essencialmente distintas. Temos
de compreender os intelectuais, os artesãos, os profissionais, as pessoas, a
sociedade invisível nestas regiões, seus mitos e sistemas de valores, seus sistemas
de conhecimento. Tudo está em permanente mudança. Temos também de considerar
a dinâmica dos encontros de civilizações.
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O Programa Etnomatemática é conceitualmente projetado como um programa
de ampla investigação da evolução das ideias, das práticas e do conhecimento da
espécie humana em diferentes ambientes culturais. Essencialmente, implica uma
análise de como grupos de seres humanos geraram formas, estilos, artes e técnicas
de fazer e de saber, de aprender e explicar, como lidam com situações e resolvem os
problemas do seu cotidiano, do seu ambiente natural e sociocultural. Ao conceituar
Etnomatemática, no sentido amplo, pratiquei um abuso etimológico com a apropriação
“livre” de raízes gregas: techné [tica] significando maneiras, estilos, artes e
técnicas; matema significando fazer e saber, as explicações, os entendimentos, o
ensinar e apreender para lidar com situações e resolver problemas de seu
próprio etno, que significa o meio ambiente natural, socioculturais e imaginário. Assim,
usando essas raízes gregas, as maneiras, estilos, artes e técnicas [ticas] para fazer e
saber, explicar, entender, ensinar e apreender [matema] no meio ambiente natural,
sociocultural e imaginário [etno], podem ser sintetizados em uma palavra
composta: ticas de matema em distintos etnos ou tica+matema+ etno ou,
reorganizando a frase, etno+matema+tica ou simplesmente Etnomatemática. É fácil
entender como essa construção etimológica conceitual deu origem à
palavra Etnomatemática. Embora vários especialistas, particularmente antropólogos,
etnógrafos e sociólogos, pesquisem disciplinas acadêmicas em diferentes etnos,
como são a etno+botânica, a etno+musicologia, a etno+linguística, a
etno+metodologia e várias outras etno+disciplinas, inclusive etno+matemática, eles
baseiam suas pesquisas do ponto de vista de um observador, e recorrem a categorias
do pesquisador, tentando encontrar semelhanças entre a cultura do pesquisador e a
cultura do pesquisado. Sem dúvida, são pesquisas válidas. Mas é muito importante,
para fundamentar essas pesquisas, identificar categorias próprias da cultura que se
está estudando. Minha conceituação de etno+matema+tica reconhece estratégias
cognitivas específicas de uma cultura para lidar com a realidade e categorias
adequadas para construir conhecimento dessa cultura.
Um exemplo são os conceitos de tempo e de medição de tempo, que estão
ligados ao desenvolvimento da aritmética. Expressam conhecimentos produzidos a
partir de observações astronômicas e de uma visão específica de mundo. As culturas
mediterrâneas desenvolveram uma forma específica de medir o tempo. Culturas da
Amazônia, assim como culturas do Ártico e de outras regiões do planeta, terão outras
observações astronômicas e, como consequência, outras visões de mundo.
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Produzem, socializam, atualizam e ensinam seus conhecimentos sobre tempo e sobre
a medição do tempo. A pesquisa de João Severino Filho, junto ao povo Apyãwa, na
Amazônia, mostra como essa cultura conceitua tempo e sua medição e como produz,
atualiza e ensina esse conhecimento como parte intrínseca à sua prática cultural. A
pesquisa só pode ser desenvolvida liberando-se das categorias acadêmicas e,
tratando-se de culturas orais, recorrer a narrativas para entender suas maneiras de
explicar e justificar essas práticas. Isso possibilitou ao autor contemplar, em toda sua
complexidade, conceitos de rigor apoiados na personalidade e no jeito, do
povo Apyãwa, de interagir com o outro e com seu meio natural (Severino Filho, 2015).
O Programa Etnomatemática vai muito além do conhecimento das culturas
indígenas. Reflete também sobre impactos de novos desenvolvimentos científicos e
tecnológicos no conhecimento matemático estabelecido no mundo acadêmico. O uso
dos computadores para provar o teorema das Quatro Cores, há quase cinquenta anos,
nos leva inevitavelmente a estender as fronteiras do saber e fazer matemático,
questionando a lógica tradicional sobre as quais se baseia a matemática no estilo
euclidiano. Essa temática também foi abordada por Wu-Wen Tsun. Observando que
na China antiga havia mais preocupação com calcular, principalmente áreas e
volumes, do que com demonstrar, como era o caso da Grécia antiga, Wu introduz o
conceito e a metodologia de mecanização de provas, com ampla utilização de
computadores. Seu foco é o desenvolvimento de algoritmos em vez de axiomatização
e de abstrações para resolver sistemas de equações polinomiais multivariadas e
aplicações à geometria elementar (Wu, 2000).
O Programa Etnomatemática focaliza as práticas matemáticas no cotidiano de
profissionais, artesãos, do homem comum, da sociedade invisível. Por exemplo,
Evanilton Rios Alves, em uma pesquisa exemplar com marceneiros, ouviu de um de
seus entrevistados “A minha matemática é mais ou menos simples, uso medida linear,
profundidade, altura, largura. Tiramos a medida de um quarto, uma sala, divide pra
achar a medida dos móveis. É isso, matemática simples (sic)”. A proposta do
pesquisador foi como utilizar o que apreendeu dos marceneiros na formação inicial de
professores no curso de Licenciatura (Alves, 2010). Um outro exemplo é a pesquisa
de Tod L. Shockey sobre a prática de cirugiões cardíacos, cujas perguntas diretrizes
são: i) que matemática esses cirurgiões utilizam para lidar com quantidade, espaço e
probabilidades na prática cirúrgica; ii) qual o papel de procedimentos e conhecimentos
conceituais e intuitivos nesse contexto (Shockey, 2000; 2002).
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Seguem dois exemplos de orientandos que mostram, conceitual e
metodologicamente, quão amplo é o Programa Etnomatemática. Ao conversar com
meu aluno Ricardo Morelo sobre sua história de vida e seu interesse de pesquisa,
prática que sempre adoto com meus orientandos, soube que ele é neto de imigrantes
libaneses e lembra-se de que, quando criança, sua avó lhe ensinara como fazer
operações no modo libanês. Assim surgiu o tema de sua pesquisa: descrever a
maneira apreendida com a avó, relacionar com a maneira ensinada nas escolas
brasileiras e procurar raízes históricas para ambos os métodos e como se
influenciaram mutuamente (Morelo, 2016). Outro exemplo é do aluno Sergio Perine
que em conversa me disse que sua religião era a umbanda. Interessei-me sobre o que
é umbanda, uma religião brasileira surgida no início do século XX como uma mescla
de kardecismo e de candomblé. Ficou clara a apropriação de símbolos, de natureza
geométrica, própria dos cultos africanos. Assim surgiu a Geometria Sagrada presente
nos cultos da umbanda. A partir daí a pesquisa de Sergio orientou-se para estudos de
Geometria Sagrada, uma área muito ativa no mundo acadêmico (Perine, 2017).
Os exemplos apontados mostram como a recuperação de valores culturais
revela conhecimentos matemáticos muito relevantes e podem ser um componente
importante na redução da ansiedade matemática, um dos responsáveis pelo mau
desempenho de alunos nas escolas.
Em todos esses exemplos, nota-se a capacidade de representar, em forma
analógica, uma semelhança dos objetos e eventos da realidade externa e interna. A
partir daí há condições para representações simbólicas e para os matema que se
organizam como linguagem e a “matemática mais ou menos simples” a que se refere
o artesão entrevistado por Alves. Está assim preparado o caminho para memória do
fazer/saber, para imaginação e criatividade, para sentimentos, como belo e feio, e
para fantasia. Tudo isso constitui a cultura do indivíduo.
A vertente historiográfica do Programa Etnomatemática é essencial, pois o
programa trata da geração e da evolução do conhecimento na academia e nas
práticas do cotidiano da sociedade invisível. A conceituação de pesquisa se aplica aos
estudos históricos de culturas extintas e da dinâmica de encontro de culturas, no
presente e no passado. Um exemplo na história da matemática é como, no século
XIII, a introdução da nova tecnologia da aritmética com algarismos indo-arábicos por
Leonardo Fibonacci mudou radicalmente não só a matemática dominante, mas
também a Filosofia Natural e as demais ciências, e possibilitou a emergência da
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economia capitalista e as implicações em um novo modelo de organização social.
Particularmente importante foi o desenvolvimento das grandes navegações e as
consequentes conquistas e colonização. Em praticamente todos os períodos de
história da humanidade algo semelhante se passa. Na pré-história isso é bem
mostrado em (D’Ambrosio, 2017).
O Programa Etnomatemática recorre a fontes materiais, como monumentos e
artefatos, escritos e documentos, mas também a fontes orais, preservadas nas
memórias e nas práticas. Fatos, datas e nomes dependem de registros, mas também
de outras conceituações de tempo e de lugar. O conceito amplo de fontes mostra que
é necessário o diálogo com informantes, que são intelectuais, artesãos, profissionais,
o povo, membros da chamada sociedade invisível.
A metodologia de pesquisa do Programa Etnomatemática consiste
essencialmente nas etapas:
Como práticas ad hoc e solução de problemas se desenvolvem em
métodos?
Como métodos se desenvolvem em teorias?
Como as teorias se desenvolvem em invenção científica?
Não vou dar exemplos de como essa metodologia é praticada. Isso pode ser
visto em inúmeras publicações, incluindo dissertações e teses. Recomendo a
coletânea de trabalhos publicada na revista ETD-Educação Temática Digital (ETD,
2017) e no site Meus Recursos Etnomatemáticos, mantido por Daniel C. Orey.
A globalização provoca um questionamento sobre as culturas locais. Há um
consenso internacional que culturas milenares lidaram com sabedoria com seu meio
ambiente, embora seja muito difícil conciliar conhecimentos que foram organizados e
estruturados em diferentes ambientes naturais e socioculturais. Isso foi muito bem
estudado pelo historiador inglês G. E. R. Lloyd, FRS. Embora seu principal interesse
seja medicina, sua observação aplica-se a todas as áreas de conhecimento:
[...] a biomedicina [com dependência em uma bateria de testes] pronuncia-se
sobre um caso individual e pretende afirmar o que os pacientes efetivamente sentem.
Mas também as elites mais ou menos articuladas de estilos alternativos de medicina,
focalizam a complexidade do que se acredita sentir-se verdadeiramente bem, e
certamente seria temerário supor que a biomedicina nada tem a aprender com suas
rivais [que são as medicinas tradicionais]. (Lloy.2009, p.101)
O mesmo se aplica à matemática, particularmente no seu ensino.
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No encontro se reconhece o outro, o diferente, a essencialidade do outro e a
dependência mútua de si mesmo e do outro e a natureza como a sustentação comum
da vida. Isso leva a um comportamento primordial, o que implica a continuidade da
vida, em seu sentido mais amplo. Esse comportamento primordial eu chamo a ética
da diversidade:
respeito pelo outro com todas as diferenças;
solidariedade com o outro na satisfação de todas as suas necessidades;
colaboração com o outro na preservação do suporte comum para a vida.
Essa ética precede qualquer noção de cultura e é mais ampla do que a
subordinação a um sistema de valores. De fato, é transcultural.
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6. A PRÁTICA E A ETNOMATEMÁTICA
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quantas eram necessárias para preencher o determinado local. Em outra profissão já
exercida pelo entrevistado, ele precisava dominar o cálculo de medidas menores e
que são apresentados no 7º ano. O aluno frequentou somente ate o 5º ano então, o
que fica é o questionamento, onde ele aprendeu a calcular e a fazer as determinadas
operações com números tão pequenos (decimais)?
São essas maneiras utilizadas pelo aluno que são consideradas possíveis pelo
Programa Etnomatemática, no meio social e cultural em que ele está inserido. “O
conhecimento adquirido é o mesmo que se da na escola, mas a maneira de se fazer
é diferente” (SOUZA; LIMA. 2010). É possível que, ao apresentar a situação a um
aluno de 6º ano, ele não saiba transpor o conhecimento, isso ocorre por muitas vezes
os alunos aprenderem a fazer o cálculo, mas não raciocinarem sobre o que estão
fazendo.
Assim como muitos alunos entrevistados pelos autores, o trabalhador
apresentado anteriormente teve que sair da escola em busca de trabalho e sustento
para a família e/ou pelo fato de que a escola ficava muito longe de suas casas, o que
dificultava ainda mais o acesso a ela. Eh através de motivos como esse que fica fácil
entender a função da EJA e o quanto ela eh importante.
Os pesquisadores consideraram fundamental relacionar etnomatematica com
a EJA pelo fato de ser possível verificar na pratica o quanto esses alunos possuem
conhecimento social e, sobretudo, matemáticos. A EJA, para eles, deve considerar ao
aluno como detentor de muitos conhecimentos para que a escola sirva de instrumento
capaz de ampliar seus conhecimentos e complementar aquilo que já domina. “Levar
uma forma de ensino pautada nas concepções da Etnomatemática para as salas de
Educação de Jovens e Adultos é um assunto que necessita do cuidado de um novo
trabalho de pesquisa em ampliação a esta.” (SOUZA; LIMA. 2010).
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Figura 2 – Matemática da Etnia Paresi (Cultura Indigena)
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7. A ETNOMATEMÁTICA E A MATEMÁTICA ACADÊMICA
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exclusivamente na busca de ganhos simbólicos no campo científico ao qual
pertencemos. No entanto, não se trata de negar à matemática popular sua dimensão
de autonomia, tão cara às teorias relativistas. (Ibidem, p. 89)
Diante de todo exposto eh que assentamos a crença na contextualização, nos
moldes delineados por Ubiratan D’Ambrosio como um importante subsidio a
pedagogia etnomatematica. A promoção da contextualização e do diálogo é um
avanço para a inserção e aceitação da etnomatematica, valorizando sua proposta e o
aluno que a acompanha.
Dica!
Entrevista de Ubiratan sobre a matemática humanística.
https://www.youtube.com/watch?v=YYXoBpZy6Fo
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8. A MATEMÁTICA E O AMBIENTE CULTURAL DO ALUNO
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necessário ultrapassar a noção de matemática apenas como uma maneira de resolver
questões de ordem prática.
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9. AÇÕES PEDAGÓGICAS
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10. ETNOCIÊNCIA
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povos não-letrados neste meu sentido. Por outro lado esses autores também
acreditam que a matemática só passou a existir com a escrita, no sentido de
representar por letras as palavras e que a Etnomatemática não faz parte da História
da Matemátaica ocidental. Se lembrarmos o quanto a matemática egípcia, portanto
oriental, contribuiu para a matemática grega, teríamos que perguntar como esta
matemática egípcia não estaria dentro do que para eles seria a matemática ocidental?
Isto sem deixarmos também de levarem conta todo conhecimento matemático
mesopotânio, que também foi fortemente usado na construção da matemática grega.
Gostaria de citar também um etnolinguístico Favrod, que em seu livro tenta uma
definição de sua ciência como: “ A Etnolinguística tenta estudar a 3 língua ou a
linguagem nas suas relações com o conjunto da vida cultural e social”. Numa das
primeiras aproximação para a Etnomatemática, Paulus Gerdes se apropria muito bem
desta definição e escreveu: “A Etnomatemática tenta estudar as idéias matemáticas
na suas relações com o conjunto da vida cultural e social”, o que também bem
caracteriza o que Struik chamou em 1986 de “Sociologia da Matemática”.
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11. PRIMEIRAS TENTATIVAS DE CONCEITUAÇÃO
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que os estudantes trazem para a escola, oriundos de seus contextos sociais;
conceitos estes contruidos socialmente ou de origem antropológica, quando passados
de uma geração à outra.
Mas, mesmo com estas três inclusões, ainda é difícil precisar um conceito para
Etnomatemática, foi pensando nisto que Bishop escreveu: “... é um conceito que ainda
não encontrou sua definição. Em face das idéias e afirmações que temos, talvez fosse
mais apropriado não usar ainda este termo na busca de um melhor entendimento –
ou, se optarmos por utilizá-lo, devemos precisar claramente a conceituação que
estiver sendo a ele aplicada.”
Nesta linha prudência, que compartilho, Gerdes chama, então, de Acento
Etnomatemático referindo-se a pesquisa em si e de Movimento Etnomatemático
quando for utilizado pedagogicamente. Para ele “Etnomatemáticos salientam e
analisam as influências de fatores sócioculturais sobre o ensino, a aprendizagem e o
desenvolvimento da matemática.”, isto para se referir aos pesquisadores nesta área
de conhecimento.
Este estudo leva a ver a Matemática como um produto cultural, e, então, cada
cultura, e mesmo sub-cultura, produz sua matemática específica, que resulta das
necessidades específicas do grupo social. Como produto cultural tem sua história,
nasce sob determinadas condições econômicas, sociais e culturais e desenvolve-se
em determinada direção; nascida em outras condições teria um desenvolvimento em
outra direção. Pode-se então dizer que o desenvolvimento da matemática é não-
linear, como querem alguns matemáticos.
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12. POR UMA TEORIA DA ETNOMATEMÁTICA
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Uma segunda maneira de ver a Etnomatemática é como uma pesquisa em
História da Matemática. Esta concepção tem seu lugar resguardado pela comunidade
científica e há vários pesquisadores que estudam a Etnomatemática neste ponto de
vista. Esta visão é baseada na crença de uma evolução cultural, então os grupos
étnicos estariam em um certo estágio histórico da matemática, deixando para o
estágio mais superior a matemática ocidental.
Estudemos, então, o seu desenvolvimento como teoria educacional, pois é com
este sentido que usarei o termo Etnomatemática.
Na tentativa então de encarar a Etnomatemática como uma teoria educacional,
voltemos a Kuhn. Temos que entender primeiramente o que é para ele um paradigma
, pois “ o paradigma tem que existir antes da teoria”, e nosso propósito e ver se a
Etnomatemática como teoria educacional é de fato uma teoria. O que vem a ser um
paradigma para Kuhn? “ Filosoficamente, o paradigma é um artefato que pode ser
utilizado como expediente na solução de enigmas.” e a “ciência normal” se caracteriza
pela solução de enigmas. “O cientista normal é um adepto da solução de enigmas -
não apenas um mero ` solucionar de problemas`, mas uma solução de enigmas - que
consiste, prototipicamente, a `ciência normal`”. “Cientísta normal” aqui no sentido
daquele que pratica a ciência normal.
Então, paradigma é para ele a instrumentação da ciência para a resolução de
enigmas. Assim, para “qualquer enigma que deva ser solucionado pelo emprego do
paradigma, este terá de ser uma construção, um artefato, um sistema, um instrumento
com seu manual de instrução - para que possa ser utilizado com êxito - e um método
de interpretação do que esse instrumento faz.”.
As principais críticas à Etnomatemática Segundo Sebastiani Ferreira (1997), as
maiores críticas à Etnomatemática foram as de Milroy, Dowling e Taylor. Milroy fala
do paradoxo da Etnomatemática quando pergunta: “como pode alguém que foi
escolarizado dentro da Matemática Ocidental convencional ‘ver’ qualquer outra forma
de matemática que não se pareça com esta matemática, que lhe é familiar?” Dowling
se refere ao discurso da Etnomatemática que, segundo ele, é uma manifestação
ideológica. Ele diz que a sociedade é heteroglóssica, composta de uma pluralidade
de comunidades culturais, e as comunidades são monoglóssicas; e como a
Etnomatemática faz falar estas comunidades, então ela tem um discurso ideológico
monoglóssico, onde o falar de um subgrupo é privilegiado em relação ao falar de toda
a sociedade que o contém. Taylor afirma que a Etnomatemática tem um discurso
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político pedagógico, mas não epistêmico, ou seja, ela tenta discutir
epistemologicamente, mas seu discurso fica somente na relação político-pedagógica.
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REFERÊNCIA
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