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Panorâmica

1998 – 42.129; 1999 – 46.861 e 2000 – 53.377. Nestes últimos


quatro anos, o nível de ocupação de Mondragón cresceu 55%. Ela
é o mais completo exemplo de uma economia solidária que não
é intersticial, mas possuidora de sua própria dinâmica. Ao con-
trário das cooperativas de produção na França, na Grã-Bretanha
e também no Brasil, que surgem majoritariamente da quebra de
empresas capitalistas, o agrupamento cooperativo de Mondragón
surge de um processo autônomo de acumulação, que se inicia
na comunidade católica de Mondragón e passa a se alimentar
das sobras reinvestidas pelas cooperativas e do financiamento
pela Caja Laboral Popular, a qual torna o cooperativismo desta
região da Espanha efetivamente independente da intermediação
financeira capitalista.
Os dados disponíveis indicam que a mcc está em constante
processo de transformação e que a prática autogestionária se
encontra sob pressões que se originam do gigantismo e do bu-
rocratismo, que se manifestam cada vez mais no funcionamento
do grupo. Não obstante, a cultura da economia solidária persiste
e possivelmente se enriquece em Mondragón, que se tornou
paradigma para cooperadores e estudiosos do mundo inteiro. O
exemplo de Mondragón vem inspirando outras iniciativas em
outras partes da Espanha e nos Estados Unidos.

8. Clubes de troca

Os clubes de troca são uma inovação recente na economia soli-


dária. Eles foram inventados mais ou menos ao mesmo tempo
no Canadá, na ilha de Vancouver, e na Argentina, em Bernal, em
meados da década de 1980. São, em ambos os casos, respostas
ao desemprego e à queda da atividade econômica provocada
por recessões. Os clubes de troca reúnem pessoas desocupadas
que têm possibilidades de oferecer bens ou serviços à venda e

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precisariam comprar outros bens e serviços, mas não podem


fazê-lo porque para poder comprar têm antes de vender e no
seu meio não há quem tenha dinheiro para poder comprar sem
ter vendido antes. Em outras palavras, a falta de dinheiro inibe
a divisão social do trabalho. Estas situações são muito comuns
em localidades atingidas por grande perda de empregos.
O clube de troca resolve o impasse pela criação de uma moeda
própria, que recebe um nome que em geral exprime a ideolo-
gia do clube: green dollar, real solidário, hora de trabalho etc.
O clube escolhe democraticamente – um voto por cabeça –,
determina a taxa de câmbio de sua moeda com a do país, o
valor total da emissão de sua moeda e sua repartição por igual
entre todos os membros. Com esta moeda local os membros
do clube começam a comprar bens e serviços uns dos outros.
Para facilitar o intercâmbio, os clubes promovem reuniões
e feiras de troca periodicamente, em que cada membro se
apresenta aos demais, descreve o que tem para vender e o
que precisa comprar. Ao fim das apresentações, os membros
se encontram e efetuam as trocas, usando a moeda do clube
como meio de pagamento. Também se recorre a jornais im-
pressos e eletrônicos para divulgar as ofertas e as demandas
entre os membros.
O clube de troca gera assim um mercado que só havia ante-
riormente em potencial. Economicamente, há vantagens para
todos: os que estavam parados passam a trabalhar e a ganhar,
os que estavam carentes satisfazem necessidades. Há, além
destas, vantagens culturais que todas as formas de economia
solidária proporcionam. Pessoas há tempo sem trabalho se
isolam socialmente, entram em crise familiar e pessoal. O
clube de troca favorece novos contatos, o início de novas
amizades, traz oportunidades de trocas não-econômicas de
afetos, favores, gentilezas. Em sua dinâmica, o clube atrai

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novos membros e permite que vários se associem em outros


empreendimentos solidários, tais como cooperativas de pro-
dução, de crédito, de compras e vendas.
Todas as transações do clube de troca são registradas por sua
direção e são divulgadas aos membros periodicamente, o que dá
total transparência à vida do clube. Pessoas desejosas de com-
prar serviços de alta responsabilidade, como cuidar de bebês ou
de pessoas doentes, podem se informar com outros membros
que já os adquiriram quanto aos diferentes provedores. A dire-
ção do clube pode detectar membros que só compram mas não
vendem, ou vice-versa, o que lhe permite intervir para abrir
estes pontos de estrangulamento da circulação do dinheiro do
clube. Ela pode, por exemplo, comprar dos que nada vendem
serviços para o próprio clube ou sugerir a eles que passem a
oferecer bens ou serviços que têm mais demanda. Quando o
clube cresce e se torna economicamente significativo, comer-
ciantes das imediações tendem a se associar, aceitando a moeda
do clube e usando-a para assalariar eventualmente membros
desocupados. Desse modo, cresce o nível de ocupação e se
enriquece a vida comunitária.
Há hoje clubes de troca na América do Norte, na Europa
Ocidental, na Oceania (nos países de língua inglesa são
chamados de lets (Local Exchange Trade System – sistema
local de intercâmbio) e na América Latina, em particular na
Argentina, onde eles atingiram dimensões inéditas. Calcula-se
que mais de meio milhão de argentinos estão em clubes de
troca, que se organizaram em rede, dentro da qual circulam
as moedas dos clubes, uns aceitando a moeda dos outros. A
grande expansão dos clubes de troca na Argentina se expli-
ca pela peculiaridade do sistema monetário do país, que só
permite a emissão de pesos (a moeda oficial) se houver a
entrada no país de dólares. Como estes se tornaram arredios,

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a Argentina está em recessão desde 1998, com sua economia


literalmente estrangulada pela falta de meios de pagamento.
Num ambiente como este, o papel econômico dos clubes de
troca se torna crucial, pois suas moedas locais suprem a falta
da oficial.

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