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Filosofias de Pirandello

“Seis Personagens à procura de um autor”


Unidade Curricular: Atelier de Leitura Dramática V
3º Ano – Artes Dramáticas – Formação de Atores 2020/2021
Docente: Daniel Jonas
Discente: Beatriz Costa

Pirandello, com Seis personagens à procura de um autor, oferece ao


espetador/leitor uma visão/leitura, a meu ver, muito ativa da ação dramática e bastante
diferente daquela a que estamos habituados. Do ponto de vista em que nos transmite uma
sensação de incerteza pois não nos é mostrada uma história concreta sobre personagens
fictícias que para nós se tornam reais, mas sim duas histórias paralelas em que é assumido
que algumas personagens não passam disso e onde em momentos se recorre à narração
da história passada, que também se vai tornando presente, utilizando tempos passados e
futuros.

Toda esta confusão, que se torna cada vez menos complicada com o decorrer do
enredo, funciona como que um círculo fechado onde as seis personagens estão presas e
condenadas a percorrer infinitamente as suas histórias, os seus dramas e sofrimentos.
Paralelamente a este loop infinito em que as seis personagens vivem, as restantes seguem
a sua ação dramática com a normalidade temporal e são mostradas como as reais e
humanas, com tudo o que isto significa.

Com esta demonstração de oposições de tipos de personagens vejo aqui uma re-
oposição, melhor dizendo, uma inversão. A uma primeira vista parece-nos que as
personagens ficcionais serão as que o autor intitula de “personagens”, mas apesar de
ficcionais estas serão as verdadeiras, as que não pretendem dar uma ilusão ao espetador,
as que admitem ser o que são perante o espectador. Já as personagens atores, diretor,
ponto, contra-regra, etc. que nos parecem ser reais, confiáveis e naturalistas na verdade
não o são, iludem-nos para que acreditemos nisso.

Toda esta teoria sobre a ilusão, a ficção e o real é incrivelmente explicada nos
diálogos entre as personagens da peça pelo autor. E aqui vemos uma certa ironia de
Pirandello pois a personagem Pai ataca os atores de serem uma ilusão para o público
sendo que ele próprio é uma personagem que tem o nome de “personagem” e na realidade
é também um ator. Então esta personagem que ataca as outras e ainda nos parece ser a
mais credível, está na verdade a iludir duplamente o espetador.

Há ainda um tema abordado na obra que se assemelha com o anterior. A dualidade


entre o existir e o ser. Onde o autor conclui, mais uma vez através do diálogo das
personagens, que a existência é básica e todos existem, mas “ser” já é algo mais complexo
e que só as personagens possuem, pois só elas têm o seu caráter bem traçado e
imortalizado para a eternidade em palavras.

Todas estas filosofias sobre a existência, a realidade, a ficção e a ilusão são


bastante interessantes, e mais interessante ainda é a forma como nos são demonstradas.
Para nos transmitir todas estas teorias, Pirandello, usa a ilusão, a ficção, e o jogo da
realidade e da existência, o que, irónica e/ou intencionalmente, define indireta e
subtilmente o teatro e o ato de representar.

A palavra é outro dos temas que tem direito a algum protagonismo entre os vários
temas das filosofias presentes nos diálogos. A importância da palavra é ressaltada
algumas vezes, como no momento em que se diz que as personagens são mais reais e
“são” mais do que “existem”, pois estão assentes e imortalizadas em palavras, o que nos
mostra a grande relevância e poder que a palavra tem. Mas tanto poder tem também o seu
lado negativo como nos diz o Pai, é através de palavras que nos expressamos e
comunicamos, mas o que para emissor tem um significado para o recetor pode ter o
significado exatamente oposto. Assim a palavra tem realmente um grande peso na
humanidade positiva e negativamente.

São imensos os temas sobre os quais Pirandello discorre e desconstrói, e todos


eles pertencem ao grande tema que é o teatro. Esta desconstrução sobre o teatro é subtil
e demonstrada através de personagens que ao longo da peça debatem estes temas, que
surgem como um acaso, em caminhos secundários, mas que fazem parte do percurso
dramático das personagens.
Proposta de encenação
Figurinos:

• Os atores estarão a usar roupas confortáveis de ensaio, de vários tons da


mesma gama de cores, cinzento escuro e preto.
• O diretor da companhia terá umas calças de sarja, um polo e um sobretudo
elegante, tudo dentro dos mesmos tons da roupa dos atores.
• As personagens diferenciam-se por usarem um estilo casual e atual com
cores e padrões alegres, que fazem o contraste com o drama das suas
histórias e sentimentos negativos, mas conferem-lhes vivacidade e o “ser”.
Estes figurinos serão elaborados com tecidos pouco maleáveis e nas
bainhas de casacos, saias e calças será introduzido um arame para que
resulte num efeito estático, dando a ideia de que estas personagens não
serão tão reais como parecem. E assim apesar de parecerem mais reais pelo
estilo da roupa e cores percebe-se que existe algum elemento que nos
transmite inércia e monotonia.
• As restantes personagens como o assistente, o contra-regra, o maquinista,
o secretário, e porteiro usam roupa de trabalho, as camisolas com o
logótipo do teatro, para tornar a ação mais verosímil.

Encenação:

• As personagens “personagens”, estarão já em cena antes do espetáculo


começar, no átrio do teatro, onde os espetadores aguardam a entrada na
sala de espetáculo. Aqui existirá uma cena extra onde estas personagens,
que se encontram dispersas entre o público, pedem informações sobre
autores e possíveis encenadores na bilheteira e até ao próprio público.
Depois disto voltam a camuflar-se entre o público.
• O palco está despido de adereços ou cenários e a cortina está aberta com
alguns atores em palco que fazem aquecimentos e convivem.
• Quando o público entra na sala a cena inicial já está a decorrer com alguma
improvisação até que as portas se fechem e aí inicia-se a verdadeira cena.
• A entrada das personagens “personagens” é feita pelo fundo da plateia, no
corredor central.
• Todas as indicações cénicas presentes na peça mantêm-se até ao momento
das mortes finais. Depois disto, quando a confusão se gera e todas as luzes
se apagam desaparecem todos os atores e adereços presentes, ficando
sozinho em palco o diretor da companhia, confuso e desorientado. Ao fim
de algum tempo de procura pelas pessoas que ali faltam e de muita
confusão, sente-se perdido e ele sai do palco apressado.
• A pouca luz que resta volta a apagar e a cena do projetor verde final com
os contornos das personagens numa tela aparece, finalizando assim o
espetáculo.

Caraterização:

• A caraterização de todas as personagens será o mais naturalista possível


para que possam ser trabalhadas as expressões faciais na sua essência.

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