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ALBERTO CAEIRO Síntese

O meu olhar é nítido como um girassol... Motivos temáticos Marcas formais e estilísticas
Alberto Caeiro A postura antimetafísica Prosaísmo da linguagem
recusa do pensamento Versos longos
Alberto Caeiro será o poeta da simplicidade completa e total. É o homem de calma rejeição do social, por artificial
absoluta perante o não sentido da realidade: Irregularidade estrófica e métrica
A atitude sensacionista
Há metafísica bastante em não pensar em nada (...) sobrevalorização das sensações Versos soltos
O único sentido íntimo das coisas importância atribuída à visão
É elas não terem sentido íntimo nenhum. Ritmo lento
A defesa do objectivismo Linguagem simples e objectiva
É Pessoa quem afirma ter este heterónimo nascido em 1889 e falecido onde nasceu em observação objectiva do mundo
1915, vítima de tuberculose. A sua vida terá decorrido numa quinta do Ribatejo, onde seriam negação de atitudes de análise e Vocabulário e imagens do campo semântico
escritos quase todos os seus poemas, em especial o livro O Guardador de Rebanhos. “A obra interpretação da Natureza
fala por si, com a voz que lhe é própria, naquela linguagem que se forma na mente”. “Se, depois Recurso habitual ao presente do indicativo
A comunhão com a Natureza
de eu morrer, quiserem escrever a minha biografia,/Não há nada mais simples./Tem só duas
integração na Natureza Simplicidade sintáctica
datas – a da minha nascença e a da minha morte./Entre uma e outra coisa todos os dias são
identificação com os elementos naturais predomínio da coordenação
meus.” poesia deambulatória frequente recurso ao polissíndeto
Representando a reconstrução integral do paganismo, descreveu o mundo sem pensar
nele e criou um conceito de universo que não contém uma interpretação. O paganismo e o panteísmo naturalista Pobreza estilística
Alberto Caeiro não passa além do realismo sensorial; o único sentido oculto das coisas existência material como única verdade das tautologias
fica reduzido à própria percepção: cor, forma e existência. coisas comparações
Este Alberto Caeiro tem entretanto dois discípulos: Ricardo Reis e Álvaro de Campos. presença da divindade no mundo
metáforas
relação intrínseca com a Natureza
Caeiro é o poeta da aurea mediocritas, da simplicidade da vida rural. É o “Guardador de anáforas
rebanhos” a quem só interessa ver de forma objectiva e natural o que o cerca. É-lhe difícil a A vivência calma e pacífica paralelismos
aceitação exclusiva do presente (passado e
limpidez visual e dos outros sentidos que são complemento da vista. Posiciona-se contra a Pontuação lógica
futuro como conceitos elaborados)
metafísica e procura não pensar. Quando muito, pensa vendo e ouvindo. Mas confessa-se triste
quando tem de pensar por que lhe falta a luz para ver ou já pensa que existe. A contradição entre a teoria e a prática
Caeiro é o poeta da Natureza e, por isso, o próprio tempo não o define, na medida em poesia pensada e trabalhada
que ele está de acordo com os próprios ciclos naturais. O tempo é ausência de tempo, pois só disfarçada simplicidade
existe a realidade. Não há passado, presente ou futuro, mas todos os instantes são a unidade do
tempo em que se apresenta como um nada, pois o que existe é a Natureza na sua perpétua RICARDO REIS
renovação e sucessão captada pela experiência visual.
Só esta liberdade nos concedem
Caeiro é a nossa reconciliação com o universo, o regresso à idade idílica da harmonia Os deuses: submetermo-nos
com a Natureza que, aliás, não é idílica. Na verdade, Caeiro é o mero Sonho desse sonho. Nós Ao seu domínio por vontade nossa.
não podemos recuperar a alma grega que o cristianismo corroeu sem remédio. Não podemos ser Mais vale assim fazermos
pagãos sem inocência. Caeiro não é uma saída verdadeira do labirinto do Tempo, o nada vivo Porque só na ilusão da liberdade
em que estamos, como Pessoa o visiona. É uma porta pintada para nos fazer crer que tocamos A liberdade existe.
com mãos de vida e não de sombra o autêntico real. Ricardo Reis
Eduardo Lourenço, Fernando, Rei da Nossa Baviera Ricardo Reis também tem o seu bilhete de identidade: segundo Pessoa, nasceu no Porto
A temporalidade psíquica (de Caeiro) é estática: não recorda, não faz planos, nunca em 19 de Setembro de 1887, às 16h05m, e dentro da alma do poeta em 29 de Janeiro de 1914.
constrói – passa e cada instante é feito de uma duração igual à dos relâmpagos, ou à das flores, Educado por jesuítas, era médico e foi expatriado depois de 1919 para o Brasil.
ou à das árvores, ou à do Sol. É sempre um tempo objectivo que coincide exactamente com a Ricardo Reis é o heterónimo que projecta Pessoa para a Antiguidade da Grécia Clássica.
sucessão do curso normal dos dias, das noites e das estações e com a diferenciação dos estados É o poeta das odes, o poeta que, à semelhança de Horácio, na Roma antiga, se refugia na
atmosféricos ou da paisagem. Faz da Natureza uma verdade absoluta, realidade com que se deve aparente felicidade pagã que lhe vela e esbate o desespero. Proclama uma sabedoria
identificar na sua passagem à materialização ou à circunstância temporal. Nela, “as coisas não desenganada e surge como a apologia da inteligência de Fernando Pessoa. Em Páginas Íntimas
têm significação: têm existência”. e de Auto-Interpretação diz ele: “Pus em Ricardo Reis toda a minha disciplina mental vestida de
Maria da Glória Padrão, A Metáfora em Fernando Pessoa, Ed. Limiar música que lhe é própria.” É, no dizer de Gaspar Simões, através de Ricardo Reis que Fernando
Caeiro quer ajudar o espírito doente do homens (adoecido por séculos de Cristianismo) Pessoa se aproxima de si mesmo. Em Ricardo Reis vê-se não só o mundo de angústias que
a amar a realidade visível, por isso a “saber ver sem estar a pensar”, sem tentar “encontrar um afecta Pessoa, mas a apatia, a desilusão perante o mistério da vida sem soluções. Tudo é incerto,
sentido à coisas” que as remeta para um lado de dentro que a Natureza não tem – esse Além que nada fica de nada, nada somos, tudo passa, tudo muda.
o Cristianismo ensinou a venerar. Caeiro ensina a “ver, apenas ver” o que a claridade do sol e a Ricardo Reis oferece-nos uma filosofia de vida influenciada pelo epicurismo, pelo
curva do horizonte permitem. Por isso, a noite é má conselheira: sem o apoio no concreto, os estoicismo e pelo carpe diem (aproveitai o dia) do poeta romano Horácio.
olhos começam a delirar, a ver o que não está ali, a pensar no que as coisas significam. Mas as O epicurismo consiste na filosofia moral de Epicuro (341-270 a. C.), que defendia o
coisas não têm significado, têm existência. Caeiro ensina a criar raíz, e no Perto, a enjeitar o prazer como caminho da felicidade. Mas para que a satisfação dos desejos seja estável, sem
ilimitado, o infinito, o mistério: por isso nunca fala do mar que foi banido do seu universo. desprazer ou dor, é necessário um estado de ataraxia, ou seja, de tranquilidade e sem qualquer
Teresa Rita Lopes, Pessoa por Conhecer, Ed. Estampa perturbação.

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