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Como entender

teologia
estudos sobre o método teológico
Carlos Flávio Teixeira
organizador
Como entender
te o logia
estudos sobre o método teológico
Carlos Flavio Teixeira
organizador
~Igreja Adventista
Como entender
..-...-: do Sétimo Día·
Divisao Sul-Americana da lASO
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Secrdário: Edward Heidinger
te ologia
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estudos sobre o método teológico
,A Educa~io Carlos Flavio Teixeira
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1a edic;ao, 2019 - Engenheiro Coelho, SP


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lmprensa Universitária Adventista


Como entender teología:
1m prensa Universitária Adventista estudos sobre o método teológico

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Dr. Daniel Plenc


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Como entender teología 1Carlos Flavio Teixeira, organizador. Engenheiro Coelho: Unaspress,
2020. Dr. Culos Stcger
l imn:t~l.uk AJwntl•tn .1~ JliAt<l (UAP)

Dr. F;\bin IJ.1rius


400 ff. ( :cnlrn Uniwr..Uarin t\dwnlista de sao l'.1ulo (Unasp)

Dr. Roberlo l'ereym


ISBN 978-85-8463=181-2 (e-book) Universi.lnde t\d\·entista del Plata (VAl')
978-85-84ij3-156-8 limpressol
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Centrn lJniversitárin Adwntista Je S.\u P,mlo (Unasp)
1. Bíblia- lnterpa~o e crítica. 2. Hermenéutica Bíblica. 1Título. 11. Teixeira, Carlos Flávio. Dr. Luís Miguel Luna
Uniwrsidadc !>emana Unión (UI'cU)
CDD-220.6
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(Ell:!i!i!!>@!!@/ das Editoras Unlverslt:Anas
em breves cita~oes, com indca~áo da fonte.
Sumário

IN'rRC)l)l.<;/\() ............................................................................................... 13
Carlos Flavio Teixeira

Noc;oes

INTERPRETJ\(,.'i\.0 DAS IDEIAS EXPRESSAS


EM TEXTOS: O l\Ü:TODO FILOSÓFICO DI::
Pt::SQl iJSJ\ NAS C l f.:NCIAS I-Il lMANAS .................................................. 23
Fernando L. Canale
L ~ c<> J >< e cli ~ I Í rH ;{ >L '~ prclinrinarcs ..................................... ................................... ~5

Dil:n · rH ; a ~ l'lll r e "rlll' IOdo rilosúr ico de p esqui s;¡", " ruéiOdo fi losúrico '' l'
" llll' l ocl o lrtT illL' IH:·trl ico-L' xcgt'·l ico .... ...................................................................... '27

~o<, · ;ic> gcr ;¡J ele ll ll'l<><i<> .................. ................... ................................. ................. 2H
( 'oncl i <, · úc ~ li>nn;r i~ de> n rél odo ................. ...... ............................................... .. .... ;-30
( ' olj)Oi 'l l'~ do llll' IOdo riJo ~ úf i co de JI C~ C(IÍ ~ <t ......................... ............ .......... : ~'2

l . ir ri l a <,· <>c ~ ....... ........ ... ............... .. ... ...... ... ................ ................................ .... ......... r.!)
C'c lr ~ ick rac J >c ~ l'ir;t ~ ............. ...... ....................... .... .. .... ............................. ........... .>O

J{l'f (_ -r (· r c i ; r ~ ............. .... ..... .. ... ............ ...................... .. .......... ........ ............. .............. .) 1
ORIGENS E DESENVOLVIMENTOS DOS })l'~COI l"ll(."éi< >ril< >~úrica da Olto)~Ía cJ.issÍCa .................................................. 195
PRINCIPAIS MÉTODOS CONTEMPORÁNEOS :\ a lt l'rna t j,·a lllTIIIl'llt'lll ica hmdaml'lltal ........................................................... l97
DE INTERPRETA<;ÁO DA BÍBLIA .......................................................... 55
:\ Bíhlia co111o fundanll'llto para a dL·scontru~;1 ............................................ 199
Carlos Flavio Teixeira
En1 e1i l'(.·;~u >a titila i tiC le¡ >l'IIC li·ncia herllll'llt'llt ica .............................................. 201
Os métodos hermeneuticos e suas características .............................................. 59
l)et~ l' <> tl'lllJH> .................................................................................................. <JO'~- <

Os principais métodos hermcneuticos usados atualmente ................................ ()3


l)'~<Otr(.é> l' tc>l<~ia l>íhlica ....................................................................... 205
l\1étodos en1 retrospectiva .................................................................................. 11a
( 'c>Jt~ilera(_·{ rit1a~ ........................................................................................... 207
Considera<;óes finais .......................................................................................... 120
l~ci·r'tas .......................................................................................................... 207
Referencias .......................................................................................................... l21
O ivltT'<>D<> 1IIs·r(>RIC<>-CRÍ'T'IC() NA TEOLOGIA:
TEOLOGIA E FILOSOFIA: PRESSUPOSI<;ÓES FILOSÓFICAS
E~1 Bl'SCA DE Sl ';\ ES'rRl··rl"RA BASICA E DAS
E SEU IMPACTO METODOLÓGICO NA TEOLOGIA ....................... 131
IN'TERPHE'rA\'(>ES FIL<>S()FICAS SlT}lJACENTES .......................... 217
Roy Graf
Raúl Kerbs
Teología e filosofia: panorama histórico ........................................................... 136
l)•···· l 1lll ( l . ................................................ .. ................................................... 21H
•· .•.t I>"ll·t
Teología e filosofia no pcnsamento adventista: presente e futuro .................... 162
E m lm~ca el a e~t rut ura ~L'Ilcia el o llll'toclo
Especificando o relacionamcnto metodológico ................................................. l6~) histúrico-crít ico e de ~u as pres~uoic;<> ontolúgicas e epistemológicas ........ 220
Implicac;ócs para discussócs futuras ................................................................. 170 ( 'OllSIC. 1 l'"é(.O~
~ J>l'l' )"lllllllél
. ll'S
. . .............................................. .. •............................. 2:~6
e ()Jlsiderac;oes finais ........................................................................................... 171 Seguti<Ia J>arll' ..................................................................................................... 2:~7
l{eferencias .......................................................................................................... 173
E m bus(' a da cst rut ura cssencial do método
. )' . l)'~<}
hi~túr('o-cí ico e ele su a~ prcs~uoi·ú ontológicas e cptstcmo ogrcas ........ -< •

Desenvolvimentos A l'~trua do mt'·todo histúrico-crítico L' suas presuoi~·üc


outlú~icas l' l'pi~ILoúca: pcr~eti,·as e desa t-tos ..................................... 9~-·>.

DESCC)NSTRU<;ÁO E TEOLOGIA: UMA J{l'ft"IHÍé~ ......................................................................................................... 2(}:)

PRC)PC)STA METODOLÓGICA ............................................................... IH:1 BREVE ANALISE DAS PRESSl ;p()SI\"()ES l\1ET()D()L<)GICAS DA
Fernando L. Canale INTEirrEX'rl.ALIDADE E DA EXEGESE INTRABÍBLICA ........... 27:-l
1cologia como tradic;ao interpretativa ............................................................... ! Ht i S. Teóftlo Correa
()que é desconstru<;ao:> .................................................................................... 1HH llliJ>e>riÚII<"Ía el<> llll.'hH)<> .................................................................................... 27:~
Priitcí¡>ios ltern1enéuticos ................................................................................... ! H~J 1\n:\"l' au;i l 1~<:. e1a lc<>ria .
. Illll'rte:xtua 1.................................................................... ')]t.
-
O rige m filosófica da hermenéutica teológica .................................................... 1~) 1 IIIIl'rll'Xltlaliclacll' ................................................................................................ 27.)
llenncnéutica teológica clássica ........................................................................ 1~) . 1c.·s <c.·
:\·lc><htiHiac 1 .tlll<.'l"ll'\:llla
. 1"1 1< ac lL' ...................................................................... -l)77
Análise da exegese intrabíblica .......................................................................... 278 ( '<>11!'-Í< lcra<.:'>~ fi 11a i~ .......................................................................................... 329
Pressuposic;óes da exegese intrabíblica ............................................................. 278 l{efl.·ri·• 1cÍa!'- ......................................................................................................... 332
Críticas a exegese intrabíblica............................................................................ 280
A I~P<>r.\:'CL DA ~IET<>DL()GA HIS'T'ÓRICA
J:o:sta o u deven1os esperar outra? ....................................................................... 282 NA INrEHP'C\~:() DA BÍBIJA .......................................................... 341
Proposta para a busca de conexoes intrabíblicas .............................................. 283 Jean Carlos Zukowski
Considerac;oes tinais .......................................................................................... 28'1·
1-list<'>rias C<>llH> Jtll:'t<><l<> ..................................................................................... 3~t4
Referencias ......................................................................................................... 285
Passo!'- para conhcccr a Deus atran:·s do estudo da Biblia ............................... 3,1.6
l~eftr(•Jcia!'- ......................................................................................................... 365
Perspectivas
ANEX() 1- !\~n:·r<)l(S DE ESTl TDO DA BÍBLIA................................ 369
IMPLCA~ÓES DO MÉTODO TEOLÓGICO NA ÍNDICl·: l~·:IS\'() ................................................................................... 383
DE-SCATOLGIZ~Á DO PENSAMENTO CRISTÁO ............... 295
Elmer A. Guzman
Por causa da tardan<;a da parousia, a igreja tcvc que
explicar a inteligibilidadc de sua mcnsagem ..................................................... 298
Por causa da tardn~ da parousia, a igrcja tevc que justificar a ausencia
de ]e sus e tentar atualizar sua presenc;a por meio da ador~ ........................ :101
Por causa da tardam;a da parousia, a igrcja teve que reformular
seu entendimento da linguagem a cerca de Deus em sua
rela~·c> COill a hurnanidadc .................................................................................. a05

Por causa da t:cndanc;a da parousia, a igreja ou acomoda


sua frustra<;ao ou espera o futuro retomo do Filho de Dcus ............................... aos
Considerac;óes finais ........................................................................................... a10
IleferéilCÍas .......................................................................................................... a1o

()S EFEITOS DA METODOLOGIA TEOLÓGICA


NAS DISTINTAS PERSPECTIVAS TRINITARIANAS
ADVENl"'ISTA E CATÓLICA ROMANA ............................................... 319
Agenilton Correa
Dedar~:ós trinitárias adventista do sétimo día e católica romana ................ a2o
Hennenéutica trinitária católica romana ........................................................... a21
Hennenéutica trinitária adventista .................................................................... :·J2()
-

Introdu<;ao

No mundo conte m po rfmeo, a produc;:ao e veicu lac;:ao de ideias religiosas


continu a como uma m arca inegável da natureza humana. No ambito cristao
nao é diferente. As c re nc;:as e as prát icas da fé crista tem sido direcionadas
pela permane nte e c rescen te produc;:ao do que se convencionou cha ma r de
"teología". O disc urso sobre Deus e sobre os temas relacionados a Deus tem
sido ininterrupto ao lo n go de toda a trajetória d a igreja crista. Praticamente
em todos os ramos, vertentes e denominac;:óes cristas ainda há uma bu sca
intencional, contí nu a e profícua pela (re)produc;:ao teológica. Ao contrá rio
do que s upunh a m a lgu n s, a teología continua despertando interesses, moti-
va ndo estudos, provocando reac;:óes e, sobretudo, definindo rumos.
Entreta nto, se por u m lado acrescente produc;:ao teológica abriu espac;:o
pa ra uma nova e va riada ga m a d e métodos e sistemas teológicos, por outro
lado a diversida d e teológica d a í resulta nte parece ter vindo acompanh ada
por notório a n a lfabe tis m o bíblico e u m intenso sincretismo teológ ico. Os
efeitos disso, n as c re nc;:as e p ráticas cristas, te m sido percebidos na diluic;:ao
d a identidade c ri s ta e n a resultante minimizac;:ao de seu senso de urgenc ia
mission á ri a, tudo isso num ambie nte de notória desunidade. Ta l situac;:ao tem
d esa fiado estudiosos a bu scare m as causas e reavaliarem os desdobramentos
d esse fenó m en o, co nfro ntando -os com indagac;:óes do tipo: que relac;:ao tem
os m éto dos d e inte rpre tac;:ao teológica com a emblemática condic;:ao da igreja
contempo ra nea? Seri a o m étodo uma fer ramenta neutra em si mesma? Se-
riam to d os os m étodos apropri ados para o e mpreendimento teológico? Por

_ }
Como entender teologia Introduc;ao

que teólogos chegam a tao distintas interpa~os mesmo diante do mesmo origens e os elementos que constituem os métodos em teologia. O segun-
objeto de análise? E mais, por que produzem teologías tao opostas mesmo do aspecto - desenvolvimentos -, pode ser notado nos conteúdos dos ca-
quando adotam as mesmas técnicas de interpa~o? pítulos seguintes, os quais mostram o desenvolvimento dos métodos no
Embora responder a tais questoes nao seja tao simples, pode ser dito ambito da longa trajetória da igreja crista, com destaque para as causas e
que sua reflexao passa, necessariamente, pelo campo da hermeneutica. implica<;:oes teológicas dessa dinamica. O terceiro aspecto - perspectivas
Geralmente entendida como a arte e a ciencia da interpa~o, a herme- - completa o ciclo com conteúdos dos capítulos finais que evidenciam a in-
neutica é a subárea da teologia sistemática que se ocupa em estudar mais fluencia dos métodos em temas específicos na teología crista, sinalizando
detidamente o fenómeno da interpreta((iiO e suas implca~oes e caracteri- alguns de seus efeitos na práxis da igreja. Ao final da obra, é apresentado
za~oes. É com a ajuda da hermeneutica (aplicada no ambito dos estudos um Anexo lembrando ao leitor o consenso quanto aquestao dos métodos
bíblicos) que se notam e se observam importantes elementos envolvidos teológicos no ambito da Igreja Adventista do Sétimo Dia.
na formula((ao, disseminayao e desdobramentos da teología, dentre eles os Como todo material que reúne textos de vários proponentes, o con-
métodos envolvidos e os sistemas teológicos daí resultantes. A hermeneu- teúdo desta obra apresenta peculiaridades que caracterizam o perfil de
tica, quando pensada em nível mais amplo- chamada de macro-herme- pesquisa e escrita de cada autor envolvido. Entretanto, o leitor observará
neutico - confronta 0 estudioso da Bíblia a reconhecer e notar as no~es a convergencia dos conteúdos quanto a ado~ do princípio bíblico sola
que influenciam os métodos e consequentemente definem seus efeitos na Scriptura enquanto marca hermeneutica mais fundamental da propos-
produ((ao teológica, possibilitando reconhecer o impacto desse processo ta de discussao metodológica abordada em todo o material. Os autores
no analfabetismo bíblico, no sincretismo teológico e em outras problemá- propoem este princípio como a diretiva primária da tarefa interpretativa,
14
ticas que rondam o cristianismo. apresentando-a como necessária para a orienta~ apropriada em questoes 15
Esse desafiador cenário, tanto para os cristaos em geral, quanto para os de método, bem como a manutenc;:ao da configurac;:ao bíblica do sistema
adventistas em particular, sinaliza a relevancia de continuar refletindo seria- teológico da igreja remanescente. É a luz deste princípio que cada um dos
mente quanto aos métodos e sistemas teológicos. A ideia deste livro surgiu capítulos é apresentado.
do consenso quanto a tal necessidade, bem como a busca por disponibilizar O primeiro, intitulado "A interpretac;:ao das ideias expressas em tex-
materiais de estudos que subsidiemos seminários, igrejas, e demais institui- tos: o método filosófico de pesquisa nas ciencias humanas", de autoría do
~oes eclesiásticas na discussao introdutória ao tema. Esta obra é o primeiro Dr. Fernando L. Canale, professor emérito de teología sistemática no Semi-
fruto do engajamento de docentes reunidos no "FATESS- Fórum Adventista nário sediado na Universidade Andrews, abre o roteiro do livro. Apresenta
de Teólogos Sistemáticos e Históricos Sul-americanos", um grupo de estu- ao leitor as no<;:oes mais elementares envolvidas no conceito e estruturac;:ao
dos que congrega pesquisadores empenhados em análise da hermeneutica dos métodos de interpretac;:ao, inclusive no campo teológico. Este material
e seus desdobramentos na teología e, consequentemente, na práxis da igreja. é urna espécie de prolegómenos (noc;:oes preliminares) ao método teológico,
Aproxima pessoas de diferentes instu~oe de ensino teológico adventis- dada a sua riqueza na abordagem dos conceitos mais básicos necessários
ta no ambito Sul-americano, com o envolvimento de convidados de outras ao estudo do tema. N ele, o leitor tema sua dispo~a urna explicac;:ao con-
partes do mundo, todos interessados em conjuntamente refletir o tema ora cisa, mas suficiente, de cada realidade que compoe os métodos, o que lhe
proposto e suas conexoes, a partir da Bíblia e dos escritos de Ellen G. White. possibilita entender os conceitos prévios necessários para se adentrar as
O propósito é também contribuir teologicamente para reflexao do assunto discussoes que se seguirao nos demais capítulos.
nos variados níveis e frentes de atu~o da igreja. O segundo capítulo, intitulado "Origens e desenvolvimentos dos
Conforme sugere o próprio título da obra, o material abarca tres as- principais métodos contemporaneos de interpretac;:ao da Bíblia", de auto-
pectos de estudos que podem ser notados nos conteúdos dos nove capítulos ría do Dr. Carlos F. Teixeira, professor de teología sistemática no Seminá-
e um anexo. Atendo-se ao primeiro aspecto - noyoes -, os textos iniciais rio sediado no Centro Universitário Adventista de Sao Paulo, segue ofere-
trazem conteúdos mais fundamentais, que buscam esclarecer ao leitor as cendo ao leitor urna noc;:ao de quando, onde, por que, como, e com quem
Como entender teología Introdu9ao

possiveimente foram iniciadas as principais perspectivas interpretativas da parte, sao destacados os macropressupostos sobre os quais está construído
Bíblia, hoje predominantes no meio cristáo. O texto busca mostrar como este método, evidenciando que tal interpretac¡:áo ontológica e epistemoló-
tais perspectivas se desenvolveram e como sáo hoje aplicadas na forma de gica nao provén1 do texto bíblico e nao se compatibiliza com seu conteúdo.
variados métodos hermeneuticos. O leitor observará neste material a aten- Ante tal constatac¡:ao, o leitor é lembrado da necessidade de urna metodolo-
c¡:áo dada aos pressupostos como nível mais amplo de caracterizacrao her- gía exegética que se baseie na concepc¡:áo bíblica da realidade (ontología) e
meneutica dos métodos, percebendo a influencia de noc¡:óes extrabíblicas do conhecimento humano (epistemología).
desde a origem e no desenvolvimento dos métodos abordados, resultando Para se refletir sobre tal metodología exegética, segue-se o sexto ca-
no que o autor chamou de "crise hermeneutica" perceptível no meio cristao. pítulo, intitulado "Intertextualidade e exegese intrabíblica: duas caras
Na sequencia, o terceiro capítulo intitulado "Teología e filosofia: pres- da mesma moeda? Breve análise das pressuposic¡:oes metodológicas", de
suposic¡:oes filosóficas e seu impacto metodológico na teología,, de autoría autoría do Dr. Teófilo Correa, professor de teología sistemática e antigo
do Dr. Roy E. Graf, professor de teología sistemática no Seminário sediado testamento no Seminário sediado na Adventist International Institute of
na Universidade Peruana Union, propoe ao leitor urna importante reflexao Advanced Studies. Nesse material, é feita urna breve, mas muito relevante,
sobre a relac¡:áo entre filosofia e teología ao longo da trajetória da igreja crista, análise dos pressupostos interpretativos implicados nas práticas metodo-
destacando-se a influencia da filosofia greco-romana no pensamento teoló- lógicas da intertextualidade e da exegese intrabíblica. Oferece ao leitor in-
gico cristáo. Além de trazer importantes aportes para evidenciar tal influen- sigths para perceber como os pressupostos inegavelmente acompanham o
cia como causa central da crise hermeneutica hoje enfrentada pelos cristaos, método e definem a intepretac¡:ao daí resultante, e que a atenc¡:áo cuidadosa
o texto propoe urna leitura adventista do problema e um posicionamento e m aos pressupostos evita que práticas interpretativas aparentemente análogas
favor da adoc¡:áo exclusiva da filosofia bíblica como resposta a tais desafios. sejam confundidas em termos de validarle metodológica. Esse texto ajuda-
16 17
O quarto capítulo, intitulado "Desconstruc¡:ao e teología: urna pro- rá o leitor a perceber ainda que a discussáo metodológica interessa a todas
posta metodológica", outro material de autoría do Dr. Fernando Canale, as áreas da teología, nao apenas a teología sistemática, o que incluí também
segue propondo ao leitor a desconstruc¡:áo-reconstruc¡:ao como ferramen- os estudos textuais e seus aspectos relacionados.
ta-resposta as influencias extrabíblicas que impropria e profundamente O sétimo capítulo, intitulado "Implicac¡:oes do método teológico na
impactaram e ainda estáo arraigadas na interpretac¡:ao teológica realizada de-escatologizac¡:áo do pensamento cristáo", de autoría do Dr. Elmer A.
no meio cristáo. O texto chama a atenc¡:áo para a necessidade de que tal Guzman, professor de teología sistemática no Seminário sedíado no Ins-
desconstruc¡:áo-reconstruc¡:áo ocorra com base unicamente na Bíbl ia, pos- tituto Adventista Paranaense, propoe urna observac¡:áo bastante oportuna
sibilitando que a partir do nível macro-hermeneutico a interpretacrao dos sobre os efeitos do método teológico em doutrinas essenciaís para a vida
elementos básicos da teología (Deus, homem, mundo, o todo inter-relacio- cristá e a igreja, no caso a escatología. Chama a atenc¡:áo para os efeitos
nado, o conhecimento, a revelac¡:áo, dentre outros) sejam balizados por no- da adoc¡:áo de pressupostos extrabíblicos na compreensáo e prática desta
c¡:oes ontológicas do paradigma histórico (espac¡:o-temporal) reivindicado doutrina desde o período pós-apostólico, e seus desdobramentos dentro e
nas Escrituras. fora da comunidade de fé. O leitor é lembrado que apenas um retorno as
Na sequencia é apresentado o quinto capítulo, intitulado "O método macropressuposic¡:óes bíblicas pode re-escatologizar a teología e práxis da
histórico-crítico na teología: em busca de sua estrutura básica e das inter- igreja crista, revertendo os efeitos causados pela de-escatologizac¡:áo provo-
pretac¡:oes subjacentes", de autoría do Dr. Raúl Kerbs, professor de filosofia cada pela adoc¡:ao de fontes estranhas a Palavra de Deus.
na Universidade Adventista Del Plata. N este material, organizado en1 duas O oitavo capítulo, intitulado "Os efeitos da metodología teológica
sec¡:oes, é oferecido um exemplo de desconstruc¡:áo ao analisar o método crí- nas distintas perspectivas trinitarianas adventista e católica romana", de
tico-histórico. Na primeira sec¡:áo, sao apresentados os principais autores, autoría do Dr. Agenilton Correa, professor de teología sisten1ática no Se-
suas noc¡:oes e articulac¡:áo de ideias que deram origem aos macropressupos- minário sediado na Faculdade Adventista da Bahia, traz urna aborda-
tos do que mais tarde viria a ser o método crítico-histórico. Na segunda gem comparativa entre as principais noc¡:oes implicadas nas doutrinas da
-------

Como entender teologia Introdu~a

Trindade conforme proposta nas teologías adventista e católica romana. método teológico e seus desdobramentos no ambito da teología e práxis da
Sinaliza a diferenfa notável entre ambas as perspectivas como res~lt_ado igreja, tendo a Bíblia como única fonte de dados teológicos e guiando-se
da adot;áo de diferentes macropesui~ó em tais sistemas teologtcos. por toda ela em sua interpretac;:ao teológica. Que seu método seja, em todo
O leitor notará nesse texto a importancia do método teológico adotado o tempo e lugar, sola Scriptura!
na formula~ e interpa~áo da doutrina da Trindade, além de perceb_er
que muitas acus~óe feítas aIASD sobre 0 tema decorrem de uma noc;:ao Engenheiro Coelho, SP, Brasil, primavera de 2019.
super f tcta . · 1d os cnticos ' · quanto aos niveis hermeneuttcos "' · · P rofundos
mats
que permeiam a discussao. . Dr. Carlos Flavio Teixeira
O nono e último capítulo, intitulado "A importancia da metodlg~ Organizador
histórica na interpa~o da Bíblia", de autoría do Dr. Jean C. Zukowskt,
professor de teología histórica no Seminário sediado no Centro Uni;er~­
tário Adventista de Sao Paulo, finaliza o livro sinalizando a importancia
do método histórico para interpa~o da Biblia e propóe dicas práticas de
como aplicá-lo no estudo das Escrituras. Este texto lembra ao leitor a pers-
pectiva e o método histórico (historicidade, nao o historicismo), conf?rm~
reivindicados na Biblia, como paradigma para sua interpretac;:ao. O lettor e
lembrado que, mesmo em meio ao confuso panorama hermeneutico con-
temporaneo, é possível se aproximar e estudar as Escrituras sem suspeita e
18 indfer~a, deixando-se ser guiado pelo Espirito Santo e na Palavra., . 19
Ao conhecer os conteúdos mencionados, o leitor perceberá a logtca
intencionada na disposi'(ao dos capítulos desta obra, organizados. na se-
guinte forma sequencial: (1) ~oes gerais do ~ét?do, (~) perspecuva pa-
noramica do problema, OU SeJa, a crise hermeneuttca (ongens e desdobra-
mentos), {3) a causa central do problema, (4) urna proposta de análi~e do
roblema, (5) aplic~o da proposta de análise (desconstruc;:ao) ao metodo
histórico-crítico, {6) a importancia de reflexáo do tema em todas as. áreas
da teología, (7) mostra dos desdobramentos do tema na escatologta,_ (8)
ostra dos desdobramentos na teología (em sentido estrito), e (9} dtcas
Jl1 nto ao tema para a prática interpretativa do leitor.
qua , .
0 Jeitor notara que o conteúdo proposto neste 1tvro, conforme en un-
. do em seu título, é de fato introdutório. Em urna obra de tal caráter, os
~a •tes estabelecidos a priori como escopo de abordagem lembra ao estu-
d ¡.~l ¡oso que muitas de_suas inquietaroes .
. ente demandarao a contlnuidade nos temas propostos buscando-se
y
ficaráo sem ser respondidas. Possi-

ve1.111fundamento em outros estudos complementares. e ontudo, a d espetto .


apro
.:~ . lirota~es, ... é · d · t
o sincero eseJo dos autores que es e conteu o strva ao ' d ·
tle tal 5 . Q . .b . -
ósito que o mot1vou. ue, pela gra~ de Deus, seJa urna contri utc;:ao
prop ue leitor entenda melhor as importantes questóes relacionadas ao
para q 0
Teologia e filosofia: pressuposi<;oes 1
filosóficas e seu impacto metodológico
na teologia

Roy Graf

Reswno 1: A rela<;:ao entre teología e filosofia sempre foi controversa, particularmen-


te a rela<;:ao metodológica entre ambas. Até que ponto esse relacionamento é legíti-
mo? Deveria a filosofia fornecer conteúdo ateología para que esta possa desenvolver
sua tarefa? Quais sao as implica<;:6es dessa discussao para a teología contemporanea,
especialm ente a teología adventista? O objetivo deste capítulo é abordar o problema
da rela<;:ao m etodológica entre teología e filosofia de urna perspectiva adventista. O
estudo explora o impacto m etodológico que a filosofia tem exercido sobre a teología
ao longo da história do cristianismo, particularmente no nível das pressuposi<;:6es
ontológicas e epistemológicas. Também analisa a discussao sobre o relacionamento
entre teología e filosofia no contexto do pensamento adventista e prop6e uma ma-
neira de compreender essa rela<;:ao em harmonía como princípio sola Scriptura.

A r ela<;:ao entre teología e fi losofia, pa r ticularmente a rela<;:ao metodoló-


gica entre ambas, sempre foi controversa e difícil de definir. Gerhard Ebeling

1
Veiculado origi nalm ente como "Theology and philosophy: philosophical presuppositions and its me-
thodological impact in theology". T radu zido do or igina l em ingles por Matheus Cardoso.
Teologia e filosofia: pressuposi<;:oes filosóficas e seu impacto metodológico na teologia
Como entender teologia

(1978, p. 53), por exemplo, descreveu essa complexa rela<;ao, ou "parceria", Hatch (1897, p. 125, grifo nosso) avalia essa absorc;ao da filosofia no
nestes termos: pensamento cristao di zendo que "dentro de um século e meio depois que o
cristianismo e a filosofia entraram em íntimo contato pela primeira vez, as
Essa parceria entre teología e filosofia te m mostrado m u itas modifica«roes. Tal ideias e os métodos da filosofia tinham fluído em tal extensao para o cristia-
escala abrange desde a mais íntima interpenetra«rao até a hostilidade mais nismo, e ocupado um lugar tao grande nele, a ponto de torná-lo nao menos
externa, desde a filosofia que reivindica ser teología até aqueta que entende a urna filosofia do que urna religiao". Sob essas circunstancias, os primeiros
si própria aluz de seu contraste coma teología, desde urna teología que parece autores cristaos desenvolveram um "hábito filosófico da mente", e um dos
se dissolver na filosofia até aquela que se esfor«ra para libertar-se de qualquer resultados foi "a tendencia de especular, isto é, fazer inferencias a partir de
contato coma filosofia. Entre os extremos, encontram-se as tentativas, em definic;oes, reunir as inferencias em sistemas e averiguar afirmac;oes por sua
numerosas combina«róes e grada«róes, de distinguir teología e filosofia de tal coerencia ou incoerencia lógica com tais sistemas" (HATCH, 1897, p. 136).
modo que elas permane«ram em comunica«rao urna com a outra. Embora a avaliac;:ao de Hatch do desenvolvimento filosófico sistemá-
tico do pensamento crisHio durante os primeiros séculos possa parecer ne-
Esse problema pode ser percebido por meio das diferentes posturas de al- gativa, deve-se perguntar se os primeiros pensadores cristaos tinham outra
guns Pais da Igreja. A postura de rejeic;ao completa é ilustrada tradicionalmente opc;ao. Como poderiam evitar expressar sua fé de maneira compreensível
com urna declarac;ao bem conhecida de Tertuliano. Depois de citar Colossenses para o contexto cultural greco-romano? Que outra coisa eles poderiam fazer
2:8 e se referir a experiencia de Paulo em Atenas, ele concluí: "O que, de fato, usando as ferramentas de expressao e interpretac;ao5 da cultura que os cer-
Atenas tema ver com Jerusalém? Que concordancia há entre a Academia e a cava? No entanto, essa estratégia ocultava problemas graves. De acordo com
Igreja? Ou entre os hereges e os cristaos?" (Tertuliano, Prescrip:Zo contra os here- Justo González (2010, p. 316),
132 133
ges 7, apud ROBERTS; DONALDSON; COXE, 1989, v. 3, p. 246). 2 Surpreenden-
temente, isso nao significa que Tertuliano tenha evitado completamente a filoso- muitas das dificuldades que o pensamento cristao enfrentou em seu desen-
fia. Como observa Edwin Hatch (1897, p. 134), Tertuliano "expressa as verdades volvimento foram o resultado de urna tentativa de reconciliar o que era dito
cristas em termos filosóficos e argumenta contra seus oponentes - por exemplo, a respeito de Deus na tradi«rao judaico-crista original como que parecía ser
contra Marcion -usando métodos que podem servir como exemplos típicos dos conhecido a respeito de Deus por meio do que a tradi«rao grega chamava
atuais métodos de controvérsia entre escalas filosóficas". 3 de urazao" - que certamente nao é a única maneira de entender a razao.
A postura de aceitac;ao quase completa da filosofia pode ser ilustrada
com Justino Mártir. Mesmo antes de Tertuliano, Justino Mártir praticamen- A relac;:ao entre teologia e filosofia permanece controvertida também
te identificou, pelo menos até certo ponto, as doutrinas cristas com ensina- no panorama teológico contemporaneo. Por um lado, alguns teólogos con-
mentos filosóficos anteriores de pensadores gregos como Platao, os estoicos servadores que se veem alinhados com tradic;oes protestantes e reformadas,
e outros poetas e filósofos. 4
que os poetas e filósofos a quem vocés honram, e em outros pontos somos mais completos e mais divi-
nos em nosso ensinamento, e se somente nós apresentamos provas do que afirmamos, por que somos
2
Tertuliano (Prescrifdo contra os hereges 7) acrescenta que "nossa instruc;ao vem do 'Pórtico de Salo- injustamente odiados mais do que todos os outros? Pois quando dizemos que todas as coisas foram
máo', o qual ensinou que 'o Senhor deve ser buscado em simplicidade de corac;ao'. Fora com todas as produzidas e arranjadas em um mundo por Deus, parecemos proferir a doutrina de Platao; e quando
tentativas de produzir um cristianismo manchado de composic;ao estoica, platónica e dialética! Nao dizemos que haverá urna queima de tudo, parecemos proferir a doutrina dos estoicos; e quando afir-
queremos nenhuma disputa curiosa depois de possuir a Cristo Jesus, nenhuma inquiric;ao depois de mamos que as almas dos ímpios, sendo dotadas de sensac;ao mesmo após a morte, sao punidas, e que as
desfrutar do evangelho! Com nossa fé, nao desejamos mais nenhuma crenc;a. Pois esta é a nossa fé almas dos justos sao libertas da puni~ao, desfrutando de uma existéncia bem-aventurada, parecemos
excelente, que nao há nada em que devemos crer além". dizer as mesmas coisas que os poetas e filósofos."
3
Hatch (1897, p. 133-134) fornece exemplos adicionais dessa atitude ambigua em relac;ao a filosofia em
5
De acordo com Enrique Dussel (1974, p. 17), a "cristandade" (que ele distingue de "cristianismo")
autores crisHios primitivos como Taciano e Hipólito. usou as ferramentas helenísticas de expressao e interpretac;ao para interpretar a natureza humana. Em-
4
Combase em sua doutrina do logos, Justino (Primeira apología 20 apud ROBERTS; DONALDSON; bora Dussel descreva dessa maneira a mudan~ produzida no cristianismo em rela"ao a doutrina do
COXE, 1989, v. 1, p. 169-170) afirmou: "Se, portanto, em alguns pontos ensinamos as mesmas coisas homem, essa descril;ao também é aplicável a todo o escopo das doutrinas cristas.
Como entender teología Teologia e ñlosoña: presuoi~ filosóficas e seu impacto metodológico na teología

as quais apoiam o princípio sola Scriptura, consideraram a filosofia como derivados da filosofia. Desta maneira, a filosofia se torna, em alguma medida,
um elemento que deveria ser considerado metodologicamente estranho a urna fonte para a teologia. 7
teología. Isso é especialmente verdadeiro no caso de teólogos bíblicos. Por No campo da teología católica, evidentemente, a filosofia sempre de-
exemplo, Gerhard F. Hasel (1974, p. 184), um erudito do AT, destaco u que sempenhou um papel central e explícito (DULLES, 1992, p. 119-133). Avery
Dulles (1992, p. 119) explica isso desta maneira:
urna interpa~o válida e normativa da mensagem dos autores bíblicos,
portanto, deve averiguar, antes de tudo, o que eles queriam dizer e, nes- É impossível realizar o projeto da teología sistemática sem compromisso
te grau, deve ser urna apresnt~áo descritiva. Os meios para conseguir explícito com op~es filosóficas específicas. Até hoje, a teología católica se
isso náo sáo a lógica o u a metafísica de u m sistema filosófico o u científico
baseia especialmente nos axiomas e categorías da filosofia grega, filtrados,
estranho aos escritores bíblicos, por mais interessante que esse modo de
em alguns casos, por pensadores romanos ou árabes. Após os primeiros
interpa~o seja para outros propósitos. experimentos como estoicismo, os Pais [da Igreja] passaram a preferir
alguma vari~o de platonismo. Embora Aristóteles tivesse sido urna in-
Por outro lado, alguns academicos, particularmente na tradic;ao conser- fluencia de longa data, sua filosofia nao se tornou predominante até a Alta
vadora evangélica, propoem que o papel da filosofia na teología deveria ser Idade Média. Tomás de Aquino, o maior dos teólogos católicos, construiu
de uso instrumental. lsso implica, segundo Millard Erickson (1998, p. 56), seu sistema com base em urna forma platonizada de aristotelismo.
que "embora a filosofia seja empregada, nao haverá comprometimento com
algum sistema filosófico como tal. Em vez disso, insistiremos na autonomía Dulles considera que a teología da igreja deve manter esse tipo de rela-
da teología; assim, a explicac;:ao do conteúdo revelado nao precisará se ajustar c;:ao com a filosofia e nao precisa se limitar ao diálogo com a filosofia tomis-
134 135
a nenhum sistema filosófico em particular". N este sentido, a filosofia pode ser ta. Para ele, "o diálogo com urna variedade de sistemas é consoante com a
usada instrumentalmente com os propósitos de elucidar conceitos teológicos, tradic;ao filosófica católica, nao menos do que em suas formas escolásticas"
detectar pressuposic;:oes por trás de um sistema de ideias, determinar a impli- (DULLES, 1992, p. 133). Esse diálogo entre teología e filosofia é essencial
cac;ao de urna ideia ou tornar os teólogos conscientes da necessidade de ave- para a teología católica porque, "para cumprir sua tarefa, a teología precisa
riguar afirmac;:oes que alegam ser verdadeiras (ERICKSON, 1998, p. 59-61).6 de algum tipo de arcabow;:o metafísico ou 'fundac;ao' que sustente logica-
No entanto, estudiosos protestantes modernos parecem sugerir que a mente as afirmac;oes da doutrina crista" (GUARINO, 2005, p. 39).
filosofia pode fornecer conteúdo para a teología. lsso nem sempre acontece Como é evidente, há u m alto grau de discordancia no que diz respeito
de maneira direta, mas por meio das fontes teológicas extrabíblicas que eles a relac;:ao metodológica entre teología e filosofia. A luz desse contexto é ne-
aceitam como essenciais para o ofício da teología. Paul Tillich (1 967, v. 1, p. cessário inquirir: Essa relac;:ao deve ser formal? Deveria a filosofia fornecer
40), por exemplo, considera que as fontes da teología incluem nao apenas a conteúdo a teología para que esta possa desenvolver sua tarefa? Quaís sao
Bíblia, mas também "história da igreja, história da religiao e a cultura,. O as implicac;oes dessa discussao para a teología contemporanea, especial-
problema com essa abordagem teológica é que essas disciplinas e a cultu- mente a teología adventista? Em resumo, este capítulo pretende responder
ra sao desenvolvidas e moldadas de acordo com critérios e pressuposic;oes a seguinte pergunta: qual deveria ser a relac;:ao metodológica entre teolo-
6 Curiosamente, Erickson (1998, p. 300, 343) usa conteúdos filosóficos em sua teología de urna maneira
gía e filosofia? O objetivo desta pesquisa, portanto, é efetuar urna aborda-
que é claramente inconsistente com seu uso instrumental proposto da filosofia quando define a natureza gem do problema da relac;:ao metodológica entre teología e filosofia de urna
ontológica de Deus em termos semelhantes ao modelo aristotélico-tomista. Um problema semelhante perspectiva adventista.
pode ser observado em Geisler e Feinberg (1980). Para os autores, "nao se pode fazer teología sistemática
sem o auxflio da filosofia. A Bíblia fornece os dados básicos para a teología crista, mas a teología nao é sis- 7
Essa ideia de urna multiplicidade de fontes na teología, além da Bíblia, incluindo a filosofia, também
temáticaatéqueseja 'sistematizada"' (GEISLER; FEINBERG, 1980, p. 74-75). No entanto, quando buscam está presente em alguns teólogos adventistas como Fritz Guy (1999, p. 137-157) e Richard Rice (1991, p.
definir a natureza de Deus, aparentemente resolvem a questao com base em pressuposic;:oes filosóficas 192-205). Rice (1991. p. 197), por exemplo, propoe que "a reflexao filosófica [teologia natural] tem um
implicitas, em vez de presuoi~ bíblicas (GEISLER; FEINBERG, 1980, p. 75). papel a desempenhar na teologia". Ver também Whidden (1997, p. 211-216).
Como entender teología Teologia e filosofia: pressuposic;oes filosóficas e seu impacto metodológico na teologia

Para responder a essas perguntas, este capítulo será dividido em duas (1967, v. 1, p. 18), o problema coma questao acerca da filosofia "reside em parte
sec;:óes. A primeira sec;:ao desta pesquisa usa urna abordagem histórica a rela- no fato de que nao há urna definic;:áo universalmente aceita de filosofia". 8 Sob
c;:ao entre teología e filosofia, destacando os protagonistas dessa discussao ao essas circunstancias, ele propoe urna definic;:áo bastante abrangente de filosofia
longo da história. A intenc;:ao é detectar um modelo ou padrao da relac;:ao me- como "aqueJa abordagem cognitiva da realidade na qual a realidade como tal é o
todológica entre teología e filosofia. A primeira sec;:ao, entao, discute (1) o pano objeto. A realidade como tal, ou a realidade como um todo, nao constituí o todo
de fundo filosófico grego da teología crista, com referencia específica a Par- da realidade; é a estrutura que torna a realidade um todo e, portanto, um objeto
menides, Platao e Aristóteles; (2) a relac;:ao entre teología e filosofia com base potencial de conhecimento" (TILICH, 1967, v. 1, p. 18). Evidentemente, a teolo-
em importantes teólogos cristáos como Agostinho, Pseudo-Dionísio, Aquino gía também está interessada na realidade, incluindo aspectos específicos da rea-
e Calvino; e (3) o impacto do arcabouc;:o filosófico moderno e pós-moderno de lidade como Deus, o ser humano, o mundo e a relac;:ao entre Deus e sua criac;:ao.
pensamento na teología cristá. Assim, esse fato é naturalmente parte da razao pela qual a relac;:áo metodológica
A segunda sec;:áo elucida a relac;:áo metodológica entre teología e filosofia entre teología e filosofia tem sido difícil de estabelecer ou definir.
de urna perspectiva adventista. Para alcanc;:ar esse objetivo, a sec;:ao é dividida
em tres partes. A primeira resume a recente discussao sobre o tema na teología
adventista. A segunda parte sugere maneiras específicas de entender a relac;:ao AN'TECEl)E:\'l'ES FILC>S()FICC)S
entre teología e filosofia de urna perspectiva adventista. Finalmente, a terceira c;HEC;<)S 1):\ 'rE<)L()(;IA CRIST'A
parte propóe algumas implicac;:óes da discussao anterior para o futuro da teo-
logía adventista. Embora se considere que a filosofia ocidental tenha iniciado com Ta-
les de Mileto, 9 o mais importante filósofo pré-socrático, da perspectiva da
136 137
relac;:áo entre teología e filosofia, é, sem dúvida, Parmenides. A filosofia
TEOLOGIA E FILOSOFIA: PANORAMA HISrr()RICO grega, desde os seus primórdios, estava preocupada com a relac;:ao entre "o
Um e os Muitos" (COPLESTON, 1985, v. 1, p. 77). Os gregos podiam per-
ceber que a realidade é instável, mutável. As coisas nao apenas mudam sua
CC)NSII)ERA<;C)ES PRELIMINARES localizac;:áo, mas também há mudanc;:a em qualidade, quantidade, substan-
cialidade (gerac;:ao e corrupc;:ao) (MARiAS, 1980, p. 12). Qual seria, entao,
Duas observac;:óes adicionais devem ser mencionadas antes de prosse- o fator unificador da realidade? Os gregos queriam saber qual é a raiz per-
guirmos. A primeira é metodológica. A enfase desta sec;:ao nao está necessa- manente e imutável da realidade. Em outras palavras, queriam determinar
riamente na abordagem explícita a relac;:áo entre teología e filosofia sugerida qual é o substrato da realidade. Os primeiros filósofos tentaram encontrar
por pensadores cristaos como Agostinho, Aquino, Calvino e outros. Em- esse elemento unificador em diferentes elementos físicos ou cosmológicos,
bora a abordagem explícita ao tópico proposta por esses importantes teó- como a água (Mileto), o ar (Anaxímenes) ou princípios mais abstratos,
logos possa ser proveitosa, a enfase desta sec;:áo está no próprio fenómeno como o apeirón (substancia sem limites) (COPLESTON, 1985, v. 1, p. 25) e
da relac;:áo entre essas duas disciplinas. A razáo para isso é o fato de que a os números (pitagóricos). 10
avaliac;:ao do que deveria ser a relac;:ao entre teología e filosofia nao consiste
necessariamente no que eles de fato fizeram, como o caso de Tertuliano pode
ilustrar. Portanto, a questao importante aquí é o que realmente foi efetuado " Como explica Tillich (1967, v. 1. p. 18), "toda filosofia propóe urna defin~ao que concorda com o
no tocante a relac;:ao metodológica entre teología e filosofia. interesse, propósito e método do filósofo".
9
Copleston (1985, v. l, p. 24), por exemplo, afirma que "em Tales vemos claramente a transi~o do
A segunda observac;:áo está relacionada com a compreensao do conceito de
mito para a ciencia e a filosofia, e ele mantém seu caráter tradicional como iniciador da filosofia grega".
filosofia. Embora o conceito de teología crista possa ser familiar para o leitor, a 10
Para urna explana<;ao mais ampla sobre os filósofos pré-socráticos físicos ou cosmólogos, ver Copies-
definic;:ao de filosofia é provavelmente mais controvertida. Como diz Paul Tillich ton (1985, v. l, p. 22-37).

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