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PRÓLOGO

VINTE E DOIS ANOS ATRÁS

Meu amor,

Passo muito tempo olhando para o céu à noite. Isso rouba meu
fôlego. Parece impossível que existam tantas estrelas por aí. Às
vezes elas parecem próximas, como se eu pudesse alcançá-las e
tocá-las, e outras, distantes.

Um pouco como você.

Por não muito mais tempo, espero.

Encontre-me amanhã, nove horas no celeiro.

Sua,

Eu

O pedaço de papel é rosa pálido e forrado. Tem cheiro dela. Eu


o dobro ao meio, usando duas unhas para fazer um vinco nítido.

Hoje será um dia difícil. Um que eu mereço completamente,


um dia que eu trouxe para mim.

Meus filhos estão sentados à mesa, tomando café da manhã.


Não sei mais se posso me referir a eles como crianças. Eles tem
doze, quinze e dezessete. O mais velho, Wes, é praticamente um
homem. Ele sonha com os militares, em derrubar bandidos. Ele
carrega consigo a mesma centelha de indignação que senti quando
era mais jovem.

Agora, a única indignação que sinto é direcionada para dentro.


Eu não poderia estar mais desapontado com minha fraqueza se
tentasse.

— Bom dia, — minha esposa diz, caminhando até a mesa do


café. Ela mordisca a ponta de um pedaço de torrada com manteiga.
É tudo o que ela pode suportar agora. A voz dela é agradável,
porque estamos na frente dos nossos meninos.

Eu prejudiquei nosso casamento.

Estávamos quebrados antes, mas não irremediavelmente.

Pela primeira vez, desejo melhores amigos. O tipo de amigos


em quem poderia confiar. Se eu tivesse isso, talvez soubesse como
era normal andar nas ondas de um casamento de longo prazo. A
crise da vida e da idade não teria parecido tão angustiante. Talvez,
se tivesse alguém para conversar sobre tudo isso, eles teriam rido
conscientemente e me prometido que Juliette e eu não éramos um
caso especial, mas o mesmo que todo mundo. Ele teria me
garantido que o casamento de longo prazo é um pouco como estar
em um barco no meio de um furacão. Apenas amarre-se ao barco
e segure-se.

Eu não tenho amigos assim. Não sou um homem que confessa


meus sentimentos e medos. Isso me faria fraco, não para mim
mesmo, mas para os outros. De todos os presentes que meu
sobrenome me deu, ele também removeu algumas oportunidades.
Uma delas é confiar plenamente em qualquer pessoa além da
minha família. Tenho que agir com a impressão de que qualquer
coisa que eu disser a alguém que não tenha o sobrenome Hayden
pode e será usado contra mim.

É precisamente por isso que meu caso nunca pode ser


conhecido por uma única alma.

Juliette suspeitou. Quando confessei, ela já estava sabia de


alguma forma.

Estamos lutando pelo nosso casamento. Eu não percebi o


quanto a amava, ou a vida que construímos, até que estava em
perigo. Agora é tudo em que penso.

Quando olhei em seus olhos e disse a verdade, entendi que me


tornei metade do homem que pensava que era. Mas vou voltar lá.
Vou ser o homem que ela escolheu. Eu nunca, nunca vou
machucá-la novamente.

Eu a alcanço agora, enrolo meu dedo e corro um dedo ao longo


de seu antebraço. Ela observa meu dedo, e seu lábio treme. Ela
estende a mão para mim, e me preparo para que ela me afaste. Ela
engancha um dedo em volta do meu e o mantém lá. Seu olhar
levanta, encontrando o meu.

Há amor lá. Mágoa e dor, fúria e devastação. Mas muito amor.


É a isso que nos agarraremos enquanto reconstruímos nosso
relacionamento dos escombros.

— Rapazes, — diz Juliette, sua voz clara como um sino. Três


cabeças de cabelos escuros giram em direção à mãe.
Wes, Warner e Wyatt. Meus meninos. Engulo o nó na minha
garganta. Eu os amo mais do que jamais soube que era possível
amar. Iria quebrar seus corações se eles soubessem o que eu fiz
com a mãe deles. Eu rezo para que eles nunca descubram.

A mão de Juliette se espalha por sua barriga quase plana. —


Seu pai e eu vamos ter um bebê.

●●●

— Oi, — ela diz, saindo do lado do celeiro. Ela solta Lilly, seu
cavalo quarto de milha americano. Sua pelagem castanha e crina
carvão são quase idênticas ao meu árabe, Brutus. Ele caminha ao
meu lado enquanto cumprimenta Lilly. Se não fosse pelos cavalos
gêmeos, talvez nunca tivéssemos falado em primeiro lugar. Incrível
como a menor faísca pode resultar em um tremendo incêndio.

Ela coloca uma mecha de cabelo atrás da orelha. — Eu não


tinha certeza de que você seria capaz de me encontrar.

Ela é linda, mas não foi por isso que cometi o pior erro da
minha vida com ela. Os assuntos raramente são simples. Então eu
aprendi.

Ela vem até mim, sorrindo, e tenta colocar as mãos em meus


ombros. Eu me afasto dela. Agora que subi para respirar e vi o
rastro de dor que causei, não posso tolerar seu toque.

Ela pisca, confusa, seu sorriso caindo uma fração. — O que


há de errado?
Olho ao redor, embora eu saiba que estamos sozinhos. Juliette
e minha mãe foram à cidade para levar os meninos à escola e fazer
compras. Os cowboys estão todos fora para verificar o gado.
Normalmente eu iria com eles, mas disse a eles que precisava
pagar impostos. Realmente preciso pagar impostos, mas isso não
vem ao caso. A única pessoa na casa é meu pai, e ele não pode nos
ver daqui.

— Ouça, — digo a ela, mantendo meus olhos nos dela, mas


tomando muito cuidado para não tocá-la. — Nós precisamos
conversar.

Ela hesita. Espero, observando enquanto seu corpo congela,


então dá um longo suspiro. — Falar de que?

— Nós. — Não há nós.

— Você leu meu bilhete? — Ela estende a mão para mim


novamente, implacável quando eu tento dar de ombros. Seus
dedos cavam em meus ombros. Terei que afastá-la fisicamente
agora, e não quero machucá-la. Não mais do que estou prestes a
fazer.

— Eu li o bilhete. Ouça-me, por favor. — Olho em seus olhos.


Sinto-me terrível pelas palavras que ainda não falei, mas que devo.
— Precisamos acabar com isso. Imediatamente. Não vou deixar
minha esposa.

Ela arranca seu corpo. Lágrimas enchem seus olhos. — Você


disse que estava largando.

Minhas mãos passam pelo meu cabelo. Há tanta coisa para


me sentir culpado, mas acho que essas palavras podem ser meu
maior arrependimento. Elas foram proferidas no calor do
momento, e eu não quis dizer isso. Nunca tive a intenção de deixar
Juliette.

— Sinto muito, — digo a ela, e eu quero dizer isso. Vou me


arrepender pelo resto da minha vida, pelo que fiz com as duas
mulheres.

— Desculpe? — Ela ri da palavra, descrença e fúria se


infiltrando. — Você está arrependido?

— Sim. Profundamente.

Suas mãos formam punho ao seu lado. Eu vejo isso chegando,


e permito. Eu mereço. O soco cai no meu peito. Não é terrivelmente
doloroso, mas ainda dói.

— Seu filho da puta, — ela grita, me deixando agradecido por


ter mandado os cowboys para fora. Suas mãos voam pelo ar
enquanto ela grita. — Oh meu Deus. — Ela esfrega o rosto. — Oh
meu Deus, oh meu Deus. — Ela levanta as mãos e vejo suas
bochechas encharcadas de lágrimas. — Te odeio. — Ela aponta
para o coração. — Eu estava apaixonada por você, Beau. E agora
odeio você.

Estendo a mão, não sei porque. É difícil ver alguém com tanta
dor. Ela a afasta. — Não me toque, — ela grita. — Eu tenho que
sair daqui. — Ela enxuga os olhos e gira em direção aos cavalos,
puxando-se para cima.

Minha resposta está atrasada, meu processo de pensamento


está obstruído.
— Espere, — grito atrás dela. Mas ela se foi. E ela está no
cavalo errado.

Subo em Lilly e estalo minha língua, apertando seu meio com


minhas pernas. Ela começa a avançar, e eu a coloco em um trote.
Cynthia olha para trás, me vê e estico a mão para detê-la. Não por
partir, mas pelo que ela está prestes a fazer.

— Não, — grito, mas é tarde demais. Ela já chutou os lados de


Brutus para fazê-lo ir mais rápido.

Ela não sabe que Brutus veio de um lugar onde foi maltratado
e chutá-lo é a pior coisa que alguém pode fazer. Ele recua e Cynthia
se inclina para fora da sela.

— Espere, — grito, incitando Lilly a galopar.

Brutus torce o corpo, tentando se livrar do cavaleiro. Cynthia


segura firme, seu corpo muito rígido. Ela não tem experiência
suficiente para lidar com isso. Ele pula, pula de novo, e Cynthia o
solta. Ela desliza pelo ar como uma boneca de pano, aterrissando
a um metro e meio de Brutus. Chego alguns segundos depois, me
afastando de Lilly antes que ela pare. Cynthia está do lado dela, e
eu me agacho sobre ela, sem saber se posso movê-la. Afasto o
cabelo do seu rosto e vejo.

O corte.

O sangue.

A rocha.

Eu caio no chão, minhas mãos pressionam minhas coxas, e


eu balanço para frente e para trás. Há um som, é tão alto, e então
eu entendo. Sou eu. Estou gritando.
Mãos agarram meus ombros. — Filho. Fique quieto.

O rosto do meu pai bloqueia o sol, seus raios emanando de


sua cabeça.

Olho em seus olhos. — Foi um acidente, pai. Um acidente.

— Eu sei. Eu vi isso acontecer. Ouvi os gritos e saí na frente.


— Ele agarra meus braços, uma dor surda mal registrando quando
ele me puxa para ficar de pé. — Vá para a casa. Entre e não saia.

— O que você vai fazer?

— Tomar conta disso.

Isto.

Isto.

Isto.

Sua.

— Pai…

— Vai.

Eu me afasto. Brutus está longe de ser encontrado. Nunca vou


procurá-lo, também. Espero que ele continue correndo e fique
longe.

Faço o que meu pai diz. Entro na minha casa. Entro no quarto
que divido com minha esposa. Tiro cada peça de roupa e me forço
a encontrar meus próprios olhos no espelho.

Então, o mais forte que posso, dou um soco no peito. Duas


vezes.
1

“Eu acho que se uma garota quer ser uma lenda, ela deve ir em
frente e ser uma.”

- Calamity Jane1

NOS DIAS DE HOJE

Tem cheiro de madeira. Rico mogno. Profundo e picante.

O reitor da Arizona State University está atrasado para nossa


reunião. Uma reunião para a qual ele me chamou, veja bem, não
uma que eu procurei e certamente não uma que eu
voluntariamente concordei em participar. É por falta de escolha
que estou aqui, sentada neste assento de couro acolchoado em
frente à mesa reluzente, esperando alguém que prefiro não
conhecer pessoalmente.

Meu estômago afundou quando sua assistente, Rosemary,


ligou para o meu celular. Meu primeiro erro foi responder. Eu
deveria ter deixado ir para o correio de voz. Meu segundo erro foi
dizer a ela que estava disponível para conhecer o reitor. Eu deveria
ter dito que estava de volta na Hayden Cattle Company, má

1
Era uma famosa mulher aventureira que viveu nos tempos do Velho Oeste nos Estados Unidos,foi uma
guia ou batedora profissional (scout) e lutou contra os ameríndios.
recepção lá no rancho, sinal está fraco, acho que estou perdendo
você.

Mas se me atrevo a ser honesta comigo mesma, o verdadeiro


erro ocorreu quando fiz o que estou assumindo que fui chamada
aqui. O que realmente gostaria de saber é quem contou? A regra
número um da minha operação é que ninguém pode falar sobre
isso. Acho que não posso confiar em ninguém na era dos telefones
celulares e da gratificação instantânea. Idiotas.

A porta atrás de mim se abre. Sento-me com as costas retas e


espero que o reitor se aproxime. Na minha visão periférica, vejo
sua calça cinza escura, seu casaco combinando. Ele dá a volta na
mesa e puxa a cadeira. Seu cabelo está ralo em cima, e ele tem
uma grande verruga que combina com seu tom de pele na linha do
cabelo ao lado da orelha.

O rangido de protesto enquanto ele se acomoda em seu


assento é o único som na sala. Ele cruza os braços na frente de si
mesmo e se inclina para trás. Mais protestos da cadeira. — Você
tem estado ocupada, Srta. Hayden.

Sorrio. — Meus estudos me mantém muito ocupada.

Seu lábio puxa com um sorriso que ele consegue controlar. —


Certo. E suas atividades extracurriculares? Elas também a
mantém ocupada?

— Manter um GPA de 3,9 torna quase impossível para mim ter


atividades extracurriculares. — Este joguinho é... bem, para ser
honesta, é divertido. — Talvez ano que vem eu não tenha tantas
aulas exigentes.
Ele acena lentamente. — Você sabe que é contra a política da
universidade apostar no campus?

Faço o possível para não reagir. Sabia que isso estava


chegando. — Eu não tenho certeza do que você quer dizer?

— Senhorita Hayden, nós sabemos que você está operando um


jogo de pôquer semanal no seu dormitório.

Apalpo meu peito. — Eu? — sou ótima em muitas coisas, mas


mentir não é uma delas. Como meu irmão Wyatt, vejo as regras
como flexíveis. Eu vejo a mentira descarada como ofensiva. É algo
que tento não fazer.

— Dean Mueller, — começo, formando o começo da minha


defesa, — não sou uma mulher que entra em nada cegamente. Eu
fiz minha pesquisa e aprendi que um jogo de pôquer não licenciado
ainda pode ser legal se o jogo for jogado em um prédio residencial.
Por isso, foi tocado em minha residência. — Inclinando-me para
frente, removo a palma da mão do peito e a coloco sobre a mesa à
minha frente. — Além disso, não lucro com a hospedagem do jogo
e mantenho os valores muito baixos. Tudo isso o torna aceitável.

É imediatamente óbvio para mim que, embora impressionado,


Dean Mueller está atrás de sangue. A expressão arrependida em
seus olhos me diz tudo o que preciso saber. Um exemplo será feito
de mim.

Meus dedos tremem, e eu os deslizo sob minhas coxas quentes


para escondê-los. O resto de mim está imóvel, minhas costas
permanecem retas enquanto me preparo para ouvir minha
punição.
— Senhorita Hayden, devido a ofensas que são, francamente,
ilegais no estado do Arizona e puníveis por lei, não tenho escolha
a não ser pedir-lhe para se retirar do estado do Arizona e
desocupar seu dormitório imediatamente.

Meu estoicismo se quebra. Um suspiro desliza entre meus


dentes. — Retirar-me? — Minha voz falha. — Da Universidade? —
Achei que levaria uma advertência. Ser forçada a ser voluntária em
alguma instituição que beneficia o campus. — Não há algo que eu
possa fazer? Voluntária?

O reitor me observa reagir, então diz muito simplesmente: —


Não.

— Que tal... — O que estou prestes a dizer é um risco, mas


quem realmente se importa neste momento? — Restituição?

Seus olhos se estreitam. — Você está sugerindo um suborno?

— De jeito nenhum. — Balanço minha cabeça vigorosamente.


Mas também, sim. — Estou simplesmente sugerindo compensação
ou reembolso pelo dano que causei. Tipo, talvez eu possa financiar
um clube de Jogadores Anônimos no campus? — não tenho ideia
se isso é uma coisa, mas se não for, eu vou fazer isso.

Dean Mueller balança a cabeça lentamente de um lado para o


outro. — Retire-se imediatamente, Srta. Hayden. — Ele se levanta.
— Você tem sorte que eu estou lhe dando a opção de fazer isso. Se
eu descobrir que você não desistiu até o final da tarde de amanhã,
eu vou te expulsar.

Pego minha bolsa do chão ao lado de meus pés com sandálias


e enrolo meu braço pelas alças. Engulo minha emoção. — Claro,
— eu digo. De pé, saio da mesa e vou até a porta. Enquanto seguro
a maçaneta, o reitor diz meu nome e eu me viro.

Atrás dele há uma grande janela com vista para o campus, o


sol entra, iluminando-o de modo que ele parece estranhamente
etéreo. O Deus que reside sobre esta instituição, decidindo quem
fica e quem vai. Eu poderia lutar contra sua decisão. Fazer um
apelo. Ligar para o meu pai, pedir ao grande e mau Beau Hayden
para intervir e fazer uma doação. Não é que eu esteja acima de
fazer isso, mas eu o ouvi quando estava em casa para o casamento
de Jo e Wyatt. O HCC está lutando, embora não tenha ficado claro
porque.

E, no final das contas, Dean Mueller não está errado.

Ele se dirige a mim agora. — Senhorita Hayden, você é uma


jovem brilhante. Você tem algo que minha mãe chamava de
'moxie'2. Na maioria das vezes, isso lhe servirá bem. De vez em
quando, pode acontecer o contrário daqueles tempos.

Eu aceno e agradeço a ele, então saio do quarto. Evitando os


olhos de seu assistente, faço meu caminho para fora do prédio e
para o sol quente.

Moxie. A palavra rola na minha boca, equilibrando-se


precariamente na ponta da minha língua, e eu a coloco de volta na
minha bochecha, como um esquilo com uma bolota.

Minha família me chama de 'calamidade'.

O reitor diz que tenho coragem.

2
Significa uma pessoa cheia de energia, vitalidade , coragem ou determinação.
Não consigo descobrir se essas são coisas boas para ser.

●●●

— Eu não posso acreditar que você está saindo da faculdade.


Faltam apenas, tipo, mais dois meses antes do semestre acabar.
— Lindsay se joga na cadeira da mesinha que ocupamos no canto
do bar. Por mais chateada que ela esteja, tenho a suspeita de que
minha colega de quarto está ansiosa para ter nosso quarto só para
ela. Provavelmente tanto quanto estou ansiosa para não me
esconder debaixo das cobertas com meus fones de ouvido toda vez
que ela e Kurt estão brincando na cama dela.

— Por que eles não podem deixar você terminar o semestre,


pelo menos? — Jayce, nossa amiga do outro lado do corredor,
aumenta a reclamação de Lindsay. Ela enxuga uma linha de suor
do couro cabeludo e pega uma garrafa do balde de gelo no centro
da mesa. Ela abre a cerveja e toma um gole.

Faço o mesmo e digo: — Tive sorte de ele não ter chamado a


polícia. Não havia como argumentar. Ele me enganou.

Jayce e Lindsay compartilham um olhar conhecedor. — Não


seria a primeira vez que uma pessoa de autoridade se curvaria
sobre algo, — Lindsay diz, a garrafa de cerveja parada em seus
lábios.

Dou a ela um olhar, e elas riem. Nunca deveria ter confessado


meu outro pecado a elas. Talvez esse tenha sido meu primeiro erro.
Ou meu centésimo. Depende de como a contagem está sendo feita,
suponho.

A essa altura, talvez eu devesse estar feliz por ter sido pega
apenas pelo jogo, e não por dormir com meu professor.

— Austin está falando sério sobre mim, — argumento,


tentando soar como se não fosse afetada por suas provocações,
quando na realidade isso me faz sentir espinhosa. — Não importa
como começamos, ele gosta de mim.

Lindsay levanta as mãos em rendição. — Bem, bem. — A


música no bar muda, e as sobrancelhas de Lindsay se erguem. —
Eu amo essa música. Vamos. — Ela sai da cadeira e vai para a
pista de dança, os braços balançando acima da cabeça.

Jayce me dá um olhar exasperado. Ela não gosta do bar


country que a trouxemos. Ela é mais uma garota suada, do clube
techno. Dou uma espiada no meu telefone no caminho para me
juntar a Lindsay.

Nenhuma chamada perdida.

Tento não deixar isso me incomodar, mas a irritação se infiltra


em mim de qualquer maneira. Austin não retornou minhas
ligações ou mensagens hoje. Ele não sabe o que aconteceu mais
cedo no escritório do reitor. Ele não sabe que vou voltar para o
rancho da minha família.

E se ele me pedir para ficar aqui com ele? Agora que me retirei
da universidade, tão rápido quanto me disseram, não sou mais
uma estudante. Podemos parar de esconder nosso relacionamento.
Não nos vemos há muito tempo, apenas alguns meses, mas toda
essa situação pode ser o que nos obriga a ter 'a conversa'.

Danço com minhas amigas até ficarmos doloridas e nossas


gargantas ficarem secas. Digo a Lindsay e Jayce que vou nos dar
outra rodada e ir da pista de dança lotada para o bar igualmente
lotado.

Quando é minha vez, peço outro balde e sorrio educadamente


para o casal ao meu lado enquanto espero. Eles estão sentados no
bar, e eu observo enquanto eles tomam uma dose de Jack Daniels.
A mulher, uma beleza morena, faz uma careta para o homem. Ela
coloca a mão no peito dele, o diamante em seu dedo anelar
brilhando na luz do teto, e diz: — Ainda está tão horrível quanto
naquela noite. — O homem ri e responde: — Pelo menos desta vez
você vai aceitar uma bebida aberta de mim.

A mulher me nota ali e sorri para mim. — Estamos recriando


a noite em que nos conhecemos.

— Isso é adorável. — Sorrio para o casal. Isso me faz desejar


que Austin estivesse aqui.

— Isso é o que você deve esperar quando estiver velho e casado


como nós, — diz o homem, e sua esposa ri. Ele olha para ela e diz:
— Sem bebês esta noite. Não precisamos recriá-lo com precisão.

Meu queixo cai e a mulher de brincadeira dá um tapa no braço


dele. Ela sorri para mim. — Ele não está errado. Temos três filhos.
Isso é o suficiente.

O barman entrega o balde gelado. A esposa acena para mim


enquanto o marido pede outra dose, e eu volto para a mesa.
Quero ser esse casal um dia. Quero ter filhos e ainda estar
apaixonada pelo meu marido.

Agora sinto ainda mais falta de Austin. Depois de mais uma


hora de dança e do esgotamento do nosso balde de cervejas, eu me
curvo para a noite. Lindsay e Jayce me dão dor, mas eu às lembro
que tenho muito no meu prato agora.

Digo a elas que vou voltar para o dormitório para minha última
noite de sono lá, mas não volto. Em vez de virar à direita, vou à
esquerda. Ando quatro quarteirões, passo pelas lojas escuras e
restaurantes noturnos, e entro em um bairro.

Nunca estive na casa de Austin. Ele tem um colega de quarto


que ensina estudos de comunicação no campus oeste, então seu
lugar sempre esteve fora dos nossos limites. Ele também está
sempre ocupado preparando aulas e corrigindo trabalhos. E,
apesar da besteira que dei ao reitor mais cedo, estou realmente
ocupada mantendo meu 3,9 GPA. E, claro, operando uma mesa de
pôquer extinta. A maior parte do nosso tempo juntos era passado
no escritório de Austin, ou em pequenos restaurantes
aconchegantes, e naquela viagem de um dia para Canyon Lake.
Tivemos que ter cuidado. Mas não mais.

Encontro a rua que procuro e atravesso para o outro lado. As


casas aqui são pequenas, construídas na década de 1970, mas
charmosas. Nenhuma comunidade planejada à vista.

Tecnicamente, Austin não me disse onde mora. Eu vi em um


pedaço de correio saindo de sua bolsa em seu escritório na semana
passada. Não é minha culpa que seja o endereço mais fácil de
lembrar na história dos endereços. 4545 N. 45º Lugar. Um sim.
Isso é um presente.

Ele vai ficar emocionado quando ouvir minhas notícias. Depois


que ele superar a primeira parte, de qualquer maneira. Eu não
tinha contado a ele sobre o jogo. Uma vez que ele supere isso, e
minha retirada subsequente, ele ficará em êxtase. Na semana
passada, ele sussurrou em meu ouvido que desejava poder contar
ao mundo sobre nós.

Desejo concedido.

Encontro a casa com o número 4545 na frente. Meus ombros


tremem em antecipação, e começo a andar pela calçada curta até
a porta da frente. Uma luz de repente brilha de uma janela na
frente da casa, momentaneamente me cegando. Minha mão se
levanta para proteger meus olhos do brilho surpresa, e uma vez
que eles se ajustam, eu deixo cair meu braço. No canto da janela,
vejo uma sombra se movendo para frente e para trás. Em vez de ir
até a porta, rastejo até a janela e espio.

Sorrio automaticamente quando vejo Austin, mas o sorriso


está todo errado. Ele cai do meu rosto tão rapidamente quanto
apareceu. Com tanto amor, com tanto cuidado, ele segura um
bebezinho em seus braços, balançando a trouxa.

Este deve ser o filho da irmã dele. Alívio flui através de mim.
Ele me disse que sua irmã estava tendo um bebê. Aposto que ela
veio visitar. O que explica por que ele não atendeu minhas ligações
e mensagens hoje. Ele estava ocupado com sua irmã e seu novo
bebê.
Obviamente, este não é um bom momento. Voltarei de manhã,
à luz do dia, quando não estiver levemente embriagada e puder
causar uma boa impressão na irmã dele.

Pouco antes de me afastar da janela, uma mulher entra na


sala e vem ficar ao lado de Austin, com os braços estendidos. Ele
entrega o bebê para ela. Ela toca algo na alça de sua camisola, e
um triângulo de tecido cai, revelando um seio enorme. Eu sou a
favor de alimentar seu bebê da maneira que você achar melhor,
mas algo nessa cena parece muito, muito errado.

Como se eu tivesse uma bola de cristal, vejo o que vai


acontecer a seguir.

Mas, apenas para ter certeza de que meu coração realmente


entende o quadro completo, fico por aqui o tempo suficiente para
assistir Austin acariciar seu seio antes que o bebê pegue. Ela ri
desse jeito cansado, mas contente, com a cabeça inclinada para
trás lentamente, e ele a beija antes de sair da sala. Ela se acomoda
em uma cadeira de balanço e fecha os olhos. A cena seria linda se
não fosse tão nauseante.

Eu me afasto da janela e saio dali.

Acho que quando chove, chove.


2

DEZESSEIS MESES ATRÁS

Caso dependesse apenas de mim, não teria escolhido esta


casa.

Prefiro algo um pouco mais rústico. Carvalho quente, azulejos


de terracota desgastados, cortinas cremosas soprando na brisa e,
além da janela aberta, quilômetros de pouco mais que pinheiros e
céu azul. Como a casa em que morei por um tempo quando era
criança.

O chalé à beira-mar que dividi com minha esposa foi a escolha


dela. E aconteceu de eu amar o sorriso dela mais do que minha
preferência de design. Não havia chance de eu discutir com ela,
não naquele dia em que ela saiu pelas portas envidraçadas pretas,
os cantos de seu sorriso se estendendo em direção às orelhas. Nem
mesmo os brincos de diamante naquelas orelhas podiam brilhar
tanto quanto seus olhos quando ela pegou minha mão.

Que tipo de homem nega a sua esposa a casa dos seus


sonhos? Eu comprei isso. Bem ali, sem pensar duas vezes, me virei
para a corretora e disse a ela que aceitaríamos. Mais tarde, soube
que ela usou a comissão para levar seu eu recém divorciado em
férias extravagantes na praia. Bom para ela.

Eu tinha Brea. E tínhamos este chalé aconchegante, com suas


paredes brancas e telhas cinzentas e paisagem pré-desenhada.
Nós comíamos ao ar livre à noite, ambos nos movendo em nossas
próprias comidas na cozinha ao ar livre. Eu cuidava da
churrasqueira, ela cuidava dos legumes e saladas. Bebemos vinho
branco e conversamos sobre nosso dia de trabalho. Fizemos amor
na espreguiçadeira dupla, escondido da vista por treliças cobertas
de hera em ambos os lados do nosso quintal. Brea piscou para
mim quando ela os colocou, e imediatamente soube sua intenção.
Acabei me acostumando tanto com o som das ondas quebrando
que se tornou pouco mais do que um zumbido de baixo nível, como
uma música de fundo suave. Já não víamos o oceano como
poderoso e místico, mas como pano de fundo para nossas vidas
cotidianas.

Até o dia em que pegou o corpo de Brea, dobrou-o e a engoliu.

É comum sua esposa nadar completamente vestida? Eu queria


dar um tapa na cara do policial, mas fiz uma escolha muito mais
sábia e balancei a cabeça. Não.

Você já sabia que sua esposa estava deprimida? Ele continuou,


fazendo perguntas que pareciam mais como farpas cavando minha
pele fria. Talvez fossem rotineiros, mas pareciam intrusivos.

A primeira vez que perdi a mulher mais importante da minha


vida, eu tinha dez anos. Perder Brea marca a segunda vez que meu
coração foi arrancado do meu peito, e vou guardar a tristeza para
mais tarde. A única maneira de me manter de pé é afastar a dor,
trancando-a bem no fundo. Se não o fizer, posso seguir a minha
mulher até ao oceano.

●●●
— Eu me recuso a colocá-lo no mercado. — Meu peso
pressiona meus antebraços enquanto me inclino para frente na
mesa da sala de jantar na casa do meu pai. Já se passaram seis
meses desde que voltei para a casa que dividia com Brea. Contratei
alguém para limpar a metade do armário, os armários do banheiro,
o xampu do box do chuveiro. Uma segunda equipe guardou a
maioria de nossos pertences. O que resta é um esqueleto de uma
casa.

Meu pai gostou de me receber aqui, apesar dos comentários


passivo agressivos de sua esposa.

Eu não diria que fui uma boa influência para meu pai. No
começo eu bebi. Muito. Muito. Ele se juntou a mim. Quando o
relatório toxicológico de Brea voltou, mostrou um alto nível de
álcool no sangue. Eu estava bêbado quando li o e-mail.

Sua morte foi considerada um acidente, o que eu já sabia. Eu


também sabia que ela odiaria me ver bêbado todas as noites, então
eu desisti. Peru frio3, por dois meses inteiros. Estou de volta ao
meu copo de vinho habitual à noite.

Do outro lado da mesa, meu pai empurra seu prato vazio para
frente e para trás com os dedos. Ele balança a cabeça. — Você
deve.

— Não é sua decisão, — aponto— A casa é minha.

3
Um método mais rápido, mas desagradável, de parar um hábito viciante, como drogas ou álcool. Isso
significa que você simplesmente para totalmente, completamente.
— Não deixe sua dor atrapalhar seu julgamento. Essa casa já
vale o dobro do que você pagou por ela. — Ele aponta para mim.
— E você sabe disso.

Ele tem razão. Eu sei disso. Eu sei tudo o que há para saber
sobre o mercado imobiliário. Sou o CEO da Tower Properties, o
fundo de investimento imobiliário que meu pai e eu começamos há
dez anos. O que significa que estou muito ciente de que o mercado
atual não vai a lugar nenhum, mas vender agora me impediria de
me beneficiar de seu valor futuro. Mas nada disso me importa. A
casa que dividi com Brea tem um valor que não pode ser contado
em dólares.

Um som alto e metálico, talvez uma panela de cobre batendo


no balcão, vem da cozinha. A voz de Renée, determinada e irritada,
cospe: — Não se preocupem comigo, estou aqui trabalhando em
um fogão quente para vocês.

Meu pai e eu trocamos um olhar rápido antes que ele continue


como se nunca tivéssemos ouvido o que está acontecendo na
cozinha. — Pelo menos transforme-a em um aluguel. — Sua palma
achatada corta o ar verticalmente com sua declaração inflexível,
mas então seu estômago ronca audivelmente, e nós dois olhamos
para o saco de papel marrom resistente ao lado de seu assento.
Seu conteúdo provavelmente terminará sendo o nosso jantar. A
esposa do meu pai insiste em cozinhar, mas nunca aprendeu.
Suas tentativas fracassadas não fizeram nada para melhorar sua
habilidade.

Meus dedos flexionam e enrolam, e eu os coloco debaixo da


mesa em uma tentativa de esconder o que estou sentindo. Não
quero outra pessoa andando descalça pela minha casa, colocando
os pés nos mesmos lugares em que Brea andou. Não quero que
eles fiquem na pia da fazenda, enfiando as mãos na água com
sabão e olhando para o monstro azul agitado que roubou minha
esposa.

Meu pai me olha. Ele se senta. Ele não está acima do peso, ou
magro. Ele é um típico homem de sessenta anos, um corpo
afrouxado pelo tempo. Ele toma um gole de vinho, engole e diz: —
Você não é o único que experimentou a perda.

Solto uma respiração pesada. Acho que a morte de Brea trouxe


à tona muitos sentimentos dele sobre minha mãe. O mesmo é
verdade para mim.

Eu deveria perguntar a ele sobre isso. Eu realmente deveria.


Mas não posso. Ver além da minha própria dor sufocante é uma
tarefa impossível.

— Do jeito que você se sente agora... — Ele me olha como se


estivesse me avaliando, determinando se estou pronto para o que
ele está prestes a dizer. — Foi como me senti quando saímos de
Sierra Grande. Como se um pedaço de mim tivesse sido arrancado.

Eu pisco. Não esperava que ele dissesse isso. Nós nunca


falamos sobre a cidade que eu chamava de lar quando era mais
jovem. Sierra Grande, mais especificamente o rancho Circle B onde
morávamos, é um lugar em que penso com mais frequência do que
gostaria de admitir. A pequena cidade, com sua pitoresca High
Street e grande parque gramado, são moradores ecléticos que de
alguma forma todos se conheciam, o mercantil que vendia os
melhores doces, está tudo na minha memória como um momento
feliz da minha vida. É uma memória brilhante e limpa, e eu a
revisito com frequência.

Quando morávamos lá, éramos inteiros. Uma unidade de três


pessoas. Exceto no final, quando saímos da cidade como se
tivéssemos formigas em nossas roupas íntimas.

Só eu, meu pai e as cinzas da minha mãe. Viemos para a


Califórnia e espalhamos as cinzas, de todos os lugares, no oceano.

Meu pai mal podia esperar para estar longe do lugar onde
minha mãe morreu. O oposto era verdade para mim. Tudo o que
queria era estender meu saco de dormir ao lado da árvore que ela
havia encontrado e ficar lá para sempre.

— Ainda temos o rancho lá, — diz ele, tamborilando dois dedos


na mesa.

— Eu sei. Vi no portfólio.

— Estava pensando que você deveria ir lá e vendê-lo.

Eu pisco, surpreso. — Você quer que eu volte para Sierra


Grande? — A cidade sempre pareceu fora dos limites, tão proibido
quanto falar sobre isso.

— Pode ser bom para você. Você precisa de um projeto.

— Estou muito ocupado com o trabalho, — argumento.

Ele balança a cabeça. — Você precisa de uma mudança de


ritmo. Cenário diferente. Algum tempo para limpar sua cabeça.

— O lugar onde mamãe morreu? Tem certeza? — Ele não pode


estar falando sério, anos e anos evitando o lugar, e agora ele quer
me mandar para lá?
Ele olha para longe de mim.

Eu fiz isso. Disse o nome dela. A única coisa que nunca


fazemos. — Está na hora de vendermos o rancho, — diz ele
rispidamente. — Não faz sentido ficar com ele. Mantê-lo não vai
trazê-la de volta. Eu não dei um bom exemplo para você quando
se trata de luto, e está começando a aparecer.

Se a dor na minha garganta só de pensar em minha mãe é


alguma indicação, eu diria que ele está certo sobre isso.

Porque agora? Quero perguntar a ele, mas não faço, porque


acho que sei a resposta. A morte de Brea não apenas aumentou a
montanha de dor que vive dentro de nós, mas desenterrou a velha
dor, expondo-a a uma luz que não via há muito tempo. E, se meu
pai está sentindo algo como eu, é uma velha dor desejando ser
curada. Às vezes, o único caminho a seguir é voltar.

Para mim, de qualquer maneira. Quanto ao meu pai, não há


como ele fazer parte da venda. Se o mundo estivesse acabando e
Sierra Grande fosse a única cidade que sobreviveria, ele escolheria
a morte. Isso vai ter que cair sobre meus ombros.

— Você deveria ir, — ele insiste. — Vai tirar você da cidade por
um tempo. Lembro-me como é. Para onde quer que você olhe, você
a vê.

— É por isso que saímos tão rápido depois que mamãe


morreu? — Cada parte dessa conversa foi como atravessar um
campo minado, mas essa pergunta parece uma explosão
garantida.
Encontro seu olhar. Ele está mordendo o lábio inferior,
permitindo que ele deslize lentamente por entre os dentes. Parece
que uma eternidade se passou quando ele finalmente fala, e tudo
o que ele tem a dizer é: — Sim.

Espero mais, mas não chega.

Renée sai, franzindo a testa. — Queimei o jantar, — ela


anuncia, pegando o vinho do meu pai e terminando. Mantenho
minha careta por dentro. Esta mulher é o oposto da minha mãe.
Por que meu pai a escolheu? Como ele se apaixonou por ela?

No final, eu sigo o conselho do meu pai. Eu localizo um


corretor de imóveis em Sierra Grande, listo a propriedade, então
faço as malas e vou para o último lugar que me lembro de ter me
sentido verdadeiramente feliz antes de conhecer Brea.

É também o lugar que partiu meu coração de dez anos.


3

NOS DIAS DE HOJE

Austin ligou três vezes hoje. Mandei-o para o correio de voz


todas as vezes. Gostaria de responder e dar a ele um pedaço da
minha mente, mas eu não acho que posso. Não sem chorar. E a
última coisa que quero fazer é mostrar a ele o quanto estou
magoada.

Acordei esta manhã, exausta de uma noite de sono ruim, e


totalmente sabendo que esta noite, vou ter o tipo de sono que só
encontro quando estou em casa no rancho. Então arrumei meu
quarto e carreguei meu carro, dirigindo para o oeste e depois para
o norte em direção a casa.

De repente, mal posso esperar para chegar lá. Saí da


interestadual dez minutos atrás, passando pela pequena placa
declarando Sierra Grande em quinze milhas, e as palavras abaixo
dela, Home to the Hayden Cattle Company.

A Hayden Cattle Company. O legado da minha família, uma


fonte de orgulho infinito de quatro gerações e o maior rancho de
gado do Arizona. É uma instituição pequena, mas em rápido
crescimento, na cidade de Sierra Grande. Toda vez que chego em
casa, há novas estradas, novas lojas, novos restaurantes. Os
habitantes da cidade reclamam do crescimento e são rápidos em
apontar o dedo para o culpado.
Os Hayden.

Minha família não se importa. Estamos acostumados a ser


culpados pelas coisas. Ombros largos carregam cargas largas.

Além disso, Sierra Grande precisava da nova vida que minhas


cunhadas sopravam neste lugar. Dizer que meus irmãos se
casaram seria um eufemismo. Primeiro foi Dakota, que apareceu e
derrubou meu irmão mais velho, Wes, em sua bunda reclusa. Ela
comprou uma parcela de terra de Hayden, transformou-a no que
rapidamente se tornou o melhor restaurante, local para
casamentos e, uma vez por mês, mercado de fornecedores locais
no centro do Arizona. Trouxe turistas para a nossa cidade e
também o dinheiro para gastar. Os velhos rabugentos desta cidade
não se importavam muito com isso, porque se beneficiavam do
influxo de dinheiro. No mês passado ela foi destaque na revista
Arizona's Best, e fiz questão de mostrar o artigo a todos os meus
amigos.

E então veio Tenley. E o filme dela. E seu status de estrela de


cinema. Seguido por curiosos parando na cidade, na esperança de
vislumbrar a atriz aposentada que encontrou o verdadeiro amor
com um belo cowboy. Também conhecido como meu segundo
irmão mais velho, Warner. Indiscutivelmente o mais legal dos
meus três irmãos.

O verdadeiro alvoroço veio quando um dos moradores de


Sierra Grande, Jo Shelton, comprou um rancho abandonado e o
transformou em um campo de terapia para jovens problemáticos.
Meu outro irmão, Wyatt, a ajudou. Eles se apaixonaram, porque é
claro que sim. Há muito o que amar em Wyatt. Ele é meu irmão
favorito, Wes e Warner sabem disso, e tenho certeza que eles não
dão a mínima. Todos nós quatro irmãos Hayden sabemos que no
final do dia, não importa quem goste mais de quem, não há uma
única coisa que não faríamos um pelo outro. Essa declaração
também não está vazia. Tivemos mais do que algumas
oportunidades para torná-lo realidade.

E, no entanto, por mais que eu esteja ansiosa para chegar em


casa no HCC, me pego soltando o pedal do acelerador, fazendo
uma curva à direita em vez de ficar na estrada que me levará para
cima e me levará para casa. Ainda não descobri como vou contar
aos meus pais sobre o que aconteceu na universidade. Parar para
almoçar no restaurante da High Street vai me dar um pouco mais
de tempo para descobrir o que dizer. Ou não dizer.

Como se minha cidade natal estivesse me recebendo de volta,


encontro uma vaga de estacionamento aberta bem em frente ao
restaurante. Estou fora há três meses, mas já sei exatamente o que
estou prestes a cheirar quando abro aquela porta de metal e vidro
com a placa Sem camisa, sem sapatos, sem problemas. Para o
registro, eles não significam isso. Muitos tentaram.

Cebolas fritas. Óleo. Canela. Eu entro, inalando


profundamente. Uma voz familiar e melodiosa percorre as cadeiras
de madeira e as bancadas de plástico.

— Como eu vivo e respiro, é o meu Hayden favorito. —


Cherilyn, uma mulher que é tão importante nesta cidade quanto o
HCC, acena para mim. — Venha sentar, querida. Esta cabine tem
seu nome nela. — Ela bate em uma mesa vazia com tampo de
fórmica.
Faço o meu caminho e entro em seus braços carnudos e
abertos. Um nó repentino se forma na minha garganta. Fiz um bom
trabalho afastando os pensamentos do que vi na casa de Austin,
mas o abraço de Cherilyn o força a sair de trás da cortina.

Mais uma vez, eu o catapulto de volta para os recessos da


minha mente e saio de seus braços. Sorrio para ela e deslizo para
a cabine. — Como você tem passado, Cherilyn?

— O mesmo de sempre, — ela responde, piscando para mim.


— Expandir cinturas e fazer amigos.

Sorrio, e o nó na minha garganta desaparece. — Acho que vim


ao lugar certo, então.

— Patty derretido, meia batata frita / meio anéis de cebola,


milkshake de Oreo?

Minhas glândulas salivares entram em ação. — Sim, por favor.


Phoenix tem milhares de lugares para comer, mas nada é melhor
do que este restaurante.

Cherilyn dá uma risada alta. — Algo me diz que haveria


pessoas dispostas a discutir sobre isso se ouvissem você. — Ela
toca meu queixo carinhosamente. — Mas obrigada.

Ela se afasta. Inclino-me para trás, descansando minha


cabeça no couro falso que cobre a parte de trás da cabine, e fecho
meus olhos. A voz alegre de Cherilyn flutua pela sala enquanto ela
conversa com outras mesas. Isso me conforta de uma maneira que
não faz todo o sentido.

Há três anos, eu mal podia esperar para ir para a faculdade,


mas com o passar do tempo percebi o quanto não sabia o que
queria fazer. O foco a laser de Lindsay tornou isso ainda mais claro
para mim. Não tenho dúvidas de que ela será a jornalista que
sempre sonhou em ser. Ela conseguiu um estágio de verão em uma
das maiores emissoras de notícias do Arizona e fala
incessantemente sobre como mal pode esperar para conhecer uma
certa âncora feminina que ela idolatra há anos. Eu invejo sua
determinação, seu conhecimento do que ela quer.

Eu não tenho nada disso. Só sei o quanto amo esta cidade. O


rancho onde cresci. Minha família. Não tenho grandes planos como
as outras pessoas têm. Não que nada disso importe de qualquer
maneira. O reitor me fez um sólido ao permitir que eu me retirasse
ao invés de me expulsar, então pelo menos minhas transcrições
não terão essa marca.

Apesar dessa demonstração de bondade, o fato permanece.


Tenho 21 anos, e onde a maioria dos meus colegas está se
preparando para seus primeiros passos na carreira, fui derrubada
na minha bunda à margem.

Respiro fundo, determinada a não sentir pena de mim mesma.


Meus pulmões estão cheios de ar quando arrepios percorrem meus
antebraços, mesmo que não esteja frio aqui. Olho para os pelos
minúsculos e retesados e ao redor do quarto em busca da fonte do
calafrio repentino. Não há nenhuma razão óbvia para esse
sentimento, mas meu olhar pousa em um homem encaixando seu
corpo alto em um banquinho no balcão de refeições.

Ele usa um terno. Tênis de couro extravagante. Ele tira o


paletó azul-marinho e cuidadosamente a dobra ao meio,
colocando-o sobre uma coxa. Sua camisa branca se estende sobre
a parte superior das costas expansiva. Ele é grande, bem
construído e estranhamente me lembra meus irmãos. Se alguma
vez usarem um terno, quer dizer, o que nenhum deles usa. Ele vira
a cabeça, revelando seu perfil, e todos os pensamentos sobre meus
irmãos desaparecem. Este homem é incrivelmente bonito, com
uma mandíbula forte e um nariz perfeitamente reto. Ele está
completamente fora do lugar. Talvez seu Porsche tenha quebrado
enquanto ele passava.

Cherilyn se aproxima dele, trocando gentilezas. Ele não é


muito amigável, mas não é rude. Reservado. Algo em sua troca
parece confortável, como se ela o conhecesse. Interessante.

Ela gira, pega meu almoço da janela, então coloca uma água
gelada na frente do homem misterioso. Quando ela deixa meu
prato, pergunto tão casualmente quanto posso reunir: — Quem é
o terno no balcão?

Ela olha por cima do ombro, depois volta para mim. — Esse
seria Sawyer Bennett.

Dou uma espiada nele, admirando a forma como o tecido de


sua camisa se molda às curvas e elevações de seus braços. Olho
de volta para Cherilyn. — Por que eu sinto que conheço esse
sobrenome? — Está tocando uma campainha de uma maneira
improvisada.

— A família dele morava aqui há muito tempo. Antes de você


nascer. Bennett é o B no Circle B. Também conhecido como o nome
anterior do rancho de sua mais nova cunhada.

Aceno lentamente. Isso está ficando mais interessante a cada


detalhe desenterrado. — Por que ele voltou?
Cherilyn dá de ombros. — Ele voltou há um tempo atrás para
vender o rancho, mas começou a comprar outras propriedades
também. Ele é algum tipo de corretor de imóveis. Ele estava
abotoado quando chegou, mas eu o cansei. — Ela me dá um olhar
aguçado e abaixa o queixo para mim. — Ele tem alguns laços com
você.

Minhas sobrancelhas apertam. — Como é isso?

— Ele investiu no rancho de Jo quando ela precisava de


dinheiro.

— Ohhh... — Sabia que havia um investidor, só não sabia


quem. Quando ouço a palavra investidor, minha mente evoca um
velho. — Isso foi legal da parte dele, — digo, meus lábios enrolados
em torno do canudo largo saindo do meu shake.

Cherilyn olha para ele novamente, os olhos semicerrados em


suspeita. — Acho que sim. Não pode ter sido à toa. Tenho certeza
de que ele recebe uma porcentagem dos lucros pelo dinheiro que
investiu.

— Como a maioria dos investidores faz, — comento, dando


uma mordida no meu hambúrguer, e o gemido automático traz a
atenção de Cherilyn de volta para mim. — Você sabe o quanto eu
amo poder voltar aqui e pedir isso e ainda está tão bom quanto da
primeira vez que eu comi? Essa constância faz meu coração feliz.

— Estou feliz que você esteja feliz. — Cherilyn bate no meu


nariz e se afasta para cuidar de suas outras mesas.
E eu? Bem, eu estaria mentindo se dissesse que não olhei para
o balcão algumas vezes. Aquele homem, Sawyer Bennett, é difícil
de desviar o olhar. Lindo e um mistério? Ótima combinação.

Meu polegar bate na mesa enquanto mastigo minha comida,


minha mente na minha situação atual. Nenhuma faculdade. Sem
Austin. Tábua em branco, como dizem. Uma chance de reescrever
meu futuro.

Não sei muito sobre como será, mas uma coisa eu sei com
certeza.

Não será chato.

●●●

paro no meu porta-malas aberto, minha mão na minha bolsa,


puxando uma lufada de ar. O cheiro do rancho, um cheiro que
gostaria de ter engarrafado e levado comigo para a faculdade, é
uma carícia para meu orgulho ferido. Por mais que tente não
pensar em Austin, é impossível não pensar. Especialmente porque
ele me mandou uma mensagem duas vezes desde que saí do
restaurante, querendo saber o que estou fazendo e por que não
estava na aula hoje. Envio a ele um texto informando que
terminamos e para não entrar em contato comigo. Ele responde
querendo saber o porque, e eu ignoro. Planejo ignorar todas as
mensagens que ele me enviar até o fim dos tempos. Agora que sei
a verdade sobre ele, até mesmo uma única palavra para ele parece
errada.
Que tolo. Ele se casou. Ele deve ter adorado a adrenalina
daquela corda bamba em que se equilibrava. Quanto tempo mais
teria continuado se eu não tivesse descoberto? Acho que não
preciso gastar muito tempo pensando nisso.

Minha cabeça se inclina para trás, as pontas do meu cabelo


comprido fazem cócegas nas minhas costas, e o sol se derrama
sobre meu rosto. Ao longe, um cavalo relincha e eu sorrio. Conheço
esse som. Eu senti falta dela, e ela sentiu minha falta.

Puxando algumas das minhas malas menores do meu porta-


malas, eu as coloco sobre meus ombros e deixo meu porta-malas
aberto. Vou ter que voltar para minhas outras coisas. Subo os
degraus até a ampla varanda da frente da minha casa de infância.
A herdade é o meu lugar favorito para estar, além do meu local
secreto na beira da nossa terra, onde há uma cachoeira seca. No
final do verão, as chuvas chegam e a cachoeira corre.

A herdade é grande, feita de troncos de madeira e pedra em


vários tons de cinza. É rústico e intimidador para as pessoas que
não o consideram um lar, e de repente sou tomada de alívio. Mas
então lembro que meus pais não sabem que fui expulsa da
faculdade e ainda não sei o que dizer a eles sobre isso. A verdade
é provavelmente melhor, considerando que faltam dois meses para
o ano letivo terminar e eu sou tão esperta que eles me deixaram
fazer minhas provas finais e terminar mais cedo não vai funcionar.

Engulo em torno de meus nervos e empurro para dentro de


casa. A princípio, parece vazio, nenhum som vindo de qualquer
sala enquanto ando por ela. Mas então um ronco alto enche uma
sala pela qual já passei, e sorrio enquanto volto para a sala de
estar. Vovô está deitado no sofá de frente para a lareira do chão ao
teto, dormindo profundamente. Ele se contorce, e eu me afasto
silenciosamente e vou para o meu quarto para depositar minhas
coisas.

Estou na minha terceira viagem do meu carro para o meu


quarto quando minha mãe entra pela porta dos fundos. Ela
pressiona as mãos na parte inferior das costas e arqueia, fazendo
uma careta. Eu a vejo tirar luvas grossas de trabalho, sentar no
banco ao lado da porta e começar a calçar as botas.

Aproximo-me, meus sapatos fazendo barulho no piso de


madeira. Ela olha para cima e se assusta, no meio da remoção de
sua segunda bota.

— O que você está fazendo aqui? Você está bem? — Ela se


levanta e vem na minha direção, ainda de meias.

— Eu estou bem, mãe. Prometo. Só senti falta de vocês. — Não


uma mentira. — Casa para um fim de semana prolongado. —
Definitivamente uma mentira, e não uma que eu realmente queria
contar. Simplesmente escorregou. Começo a corrigir, pensando
que talvez seja melhor fazer um corte limpo, mas a reação dela me
impede.

Ela me puxa para um abraço, então me empurra para trás e


olha para mim. — Estou tão feliz que você está aqui. Estou
sentindo falta da minha garota.

A verdade gruda na minha garganta. Em vez disso, eu a abraço


novamente, inalando os cheiros familiares do rancho que se
aninham em seu cabelo. Meus irmãos consideram minha mãe
dura, e ela é, mas ela foi diferente comigo. Ela e meu pai tentaram
por tanto tempo por uma menina, e depois de alguns abortos, eles
desistiram. Então, um dia, surpresa! Ela já era mais velha e se
convenceu de que não estava nas cartas para eles. Entre o fato de
que sou o bebê da família, e eles nunca pensaram que me teriam,
tenho permissão para fugir com muito mais do que meus irmãos.

Algo me diz que jogar ilegalmente e ser convidada a desistir da


faculdade vai muito além da merda que eu fazia quando era mais
jovem.

Ela se afasta do nosso segundo abraço e me olha nos olhos. —


Algo mais?

Franzo os lábios e balanço a cabeça. Não quero ver a decepção


em seu rosto. Ainda não. Não quero ouvir que é como eu ir e fazer
algo assim.

Calamidade Jessie.

— Existe alguma coisa que eu possa ajudá-la? — Pergunto.

Mamãe entra no pequeno banheiro do outro lado do corredor


e abre a torneira da pia. — O fim de semana do vendedor no The
Orchard é este fim de semana. Eu poderia usar um par extra de
mãos para fazer o queijo de cabra que estou planejando vender.

— Coloque-me para trabalhar, — digo, tomando seu lugar na


pia quando ela termina de lavar as mãos. Ela espera que eu
termine, e entramos na cozinha. Pego um coador e o pano de queijo
fino, e ela pega uma panela e despeja o leite de cabra.

— Como estão suas cabras? — pergunto, observando-a mexer


o leite enquanto ela testa sua temperatura com seu termômetro
digital.
Ela sorri. — Freddy é tão engraçado. Ele odeia quando eu
presto atenção em Daisy. E Delilah faz essa coisa em que ela... —
Aceno como se estivesse ouvindo, mas estou pensando em como
seu rosto se ilumina quando ela fala sobre seus animais.
Costumávamos brincar que ela amava suas cabras mais do que
nós, e talvez estivéssemos apenas meio brincando. Alguns anos
atrás, houve um incêndio no celeiro e minha mãe perdeu algumas
cabras. Se não fosse pela bravura de Wes, (ou estupidez,
dependendo de quem está falando sobre isso), ela teria perdido
mais.

— Estou feliz que você esteja gostando delas, mãe.

— Eu preciso de algo agora que você está fora de casa. Wes é


o único que ainda vive no HCC. Você está na faculdade, e Warner
e Wyatt se mudaram para ficar com suas novas famílias. — O
termômetro atinge cento e oitenta graus, e ela tira a panela do
queimador. — Não que eu esteja reclamando. Estaria chutando a
bunda deles se eles fossem tão velhos quanto são e ainda
morassem em casa.

Meço o suco de limão e adiciono, ela mexe, depois adiciono o


vinagre e ela mexe de novo. — Tudo bem, — ela anuncia, usando
um pano de prato para limpar algumas gotas de leite do balcão. —
Trinta minutos de descanso e depois terminamos.

— Parece bom, mãe. Algo mais que eu possa fazer?

— Por que você não vai ver Hester Prynne? Wyatt a monta para
garantir que ela faça exercícios, mas ela sente sua falta.

— Boa ideia. — Eu beijo sua bochecha. — A propósito, vovô


está dormindo na sala de estar.
Mamãe sorri. — O homem dorme mais do que qualquer outra
coisa.

Uma pontada de preocupação me puxa. — Ele está saudável?

Mamãe inclina a cabeça para o lado. — Isso depende de como


você define saudável. Ele está velho, querida. Seu corpo está
cansado. — Ela faz uma careta. — Mas essa mente dele é afiada.
Eu não vou te dizer o que ele disse na semana passada. Seu filtro
se foi.

Sorrio. — Espero que eu possa fazê-lo dizer algumas coisas


ruins na minha frente.

Mamãe balança a cabeça. — Não se preocupe, ele vai. Ele não


dá a mínima para porra nenhuma mais.

— Mãe, — repreendo, agindo ofendida por seu palavrão.

Ela pisca para mim. — Apenas te aquecendo para o vovô.

Eu a deixo na cozinha e vou para o meu quarto para vestir


jeans. Agarro minhas botas mais altas de cada lado, deslizando
meu pé no couro flexível, e enrolo meus dedos quando elas estão
totalmente calçadas. Levanto-me e me olho no espelho de corpo
inteiro.

Jeans apertados enfiados no meu par de botas favorito e uma


camiseta amarrada na lateral. Esta é a pessoa que estava sentindo
falta, mas há apenas mais uma coisa que eu preciso. Sorrio para
o meu reflexo e pego meu chapéu de cowboy de camurça roxa.
Coloco na minha cabeça e olho mais uma vez.

Na medida.
4

Às vezes, Sierra Grande parece mais uma pessoa e menos uma


paisagem. Gramados verdes, árvores maduras, o Rio Verde
cortando a cidade. Vá para o sul e encontre o cacto. Siga para o
norte e acerte os pinheiros. A cidade aninha-se entre os dois,
casando-se com as paisagens. Mas tudo isso é beleza superficial.

Por baixo, é o coração deste lugar que o faz parecer humano.


As pessoas da cidade se preocupam umas com as outras. Eles
contam histórias sobre a enchente em 1988, quando o celeiro de
fulano de tal foi levado pela água e todos se reuniram para
reconstruí-lo. Ou quando o cachorro de Lucy Wilson desapareceu,
e ela estava cega demais para encontrá-lo, então todos apareceram
para ajudar. A história não tem um final feliz, infelizmente, mas
esse não é o ponto.

Os moradores de Sierra Grande agem como uma família. Eles


se apoiam, mostram amor através da ação e não têm medo de
irritar um ao outro.

Quando apareci pela primeira vez na cidade, presumi que não


teria nome na multidão, mas a garçonete do restaurante me
reconheceu imediatamente. Ela deu uma olhada para mim e disse:
— Há apenas uma outra pessoa que eu vi com olhos cinza como
uma tempestade de verão, e acho que você é ele.
Apresentei-me, embora não precisasse. Cherilyn me deu as
boas-vindas de volta a Sierra Grande, não me perguntou por que
voltei e não disse uma palavra sobre por que meu pai e eu saímos
do jeito que fizemos. Ela me trouxe um pedaço de torta e foi isso.
Um fragmento da minha reserva de voltar se desfez e comecei a
entender que retornar a um lugar que sem dúvida guardará
tristeza também pode conter alegria oculta.

Depois disso, fiz check-in no Sierra e disse a eles que minha


estadia era por um período indeterminado. Então me encontrei
com a corretora de imóveis, e ela me apresentou as ofertas para o
rancho. Eu poderia ter vendido por mais, mas o dinheiro não iria
aliviar a dor de deixar ir o último lugar em que vi minha mãe. No
segundo em que soube dos planos de Jo Shelton para o rancho,
soube que deveria ir para ela. A corretora de imóveis, Jericho,
discutiu comigo, mas eu a fechei. Não havia espaço para minha
mente mudar. Uma vez que o negócio foi concluído, Jericho me
convidou para sair. Educadamente recusei.

Rapidamente percebi que a cidade é uma mina de ouro.


Crescimento exponencial, mas o preço da terra ainda não subiu
muito. É o ponto mais doce em que um comprador pode se
encontrar, e comecei a tirar vantagem disso.

Então Jo se aproximou de mim. Ela me parou do lado de fora


da padaria no dia do muffin de mirtilo, e meu coração pulou na
garganta. Ela tinha o mesmo cabelo louro-branco que Brea, com a
adição de pontas rosa. Elas também compartilhavam olhos gentis
e um sorriso cativante. Quando ela me disse que precisava de um
investidor, eu sabia que não tinha chance. Eu não poderia dizer
não a uma mulher que me lembrava tanto Brea.

Eu não teria pensado que isso fosse possível, mas Sierra


Grande está começando a se sentir em casa. Muito disso é novo,
então não dói tanto quanto esperava. Há momentos, porém,
memórias que sobem à superfície como pedaços de um navio
afundado. Às vezes vejo minha mãe em um arco de sol, saindo do
Merc segurando um saco de caramelo de água salgada. Esses
momentos são quando não tenho certeza se é bom estar aqui, mas
acho que é melhor estar na Califórnia e lembrar da minha esposa.
Troquei uma nova dor por uma antiga dor.

A caminho do meu escritório alugado, paro na lanchonete para


ver Cherilyn. Peço o mesmo sanduíche de sempre. Assisto ao
mesmo canal de notícias do meio-dia. A única diferença hoje é a
mulher na cabine do outro lado da sala. Nunca a vi antes, mas
Cherilyn se dirige a ela como uma filha há muito perdida.

Quando a mulher se levanta, evito meu olhar. Há um espelho


na parede atrás do balcão, destinado a evitar que os servidores
esbarrem uns nos outros quando viram. Uso-o para olhar para
esta mulher. Ela é mais jovem do que eu pensava à primeira vista.
Suas bochechas estão cheias, seus lábios carnudos, mas são seus
olhos que me pegam de surpresa. Eles não guardam nenhum traço
de ingenuidade. Sábia além de sua idade e determinada. Nos três
segundos que ela leva para me ultrapassar, decido que não há
nenhuma maneira que eu queira contar com uma força como ela.
É uma coisa muito boa que eu ainda esteja apaixonado por
minha esposa, porque houve um dia em que essa mulher seria
exatamente o meu tipo.

●●●

Às vezes, faço essa coisa que é muito estúpida. E aqui estou


eu, fazendo isso agora.

Estaciono meu carro em frente ao Wildflower e saio. Não se


parece em nada com o Circle B das minhas memórias. Jo mudou
mais do que apenas o nome. Todo o lugar passou por uma
remodelação. Até o coração do lugar mudou. Jo está no centro
agora, um lugar que minha mãe ocupou uma vez.

Sou parcial com Jo, não apenas porque ela me lembra Brea,
mas porque ela também me lembra minha mãe. Atenciosa e
carinhosa, mas não uma tarefa simples.

Vou para o estábulo, onde a coisa estúpida que estou prestes


a fazer espera por mim.

Wyatt Hayden, marido de Jo, está lá dentro, mostrando a dois


meninos a maneira correta de escovar um cavalo. A equoterapia é
parte integrante do programa que Jo criou com a ajuda do
psicólogo que ela contratou, e Wyatt o lidera.

Ele diz olá para mim daquele jeito curto dele. Ele não é rude,
mas também não é muito amigável. Eu não fiz saber quem era
quando concordei em investir no rancho, e de alguma forma Wyatt
descobriu. Ele me perguntou sobre isso, e expliquei que voltei para
o lugar onde eu conseguia me lembrar de ser feliz pela última vez.
Era verdade, e Wyatt a aceitou como tal. Ainda posso sentir um
baixo nível de cautela dele. Acho que tem mais a ver com o
sobrenome dele do que comigo. Pelo que ouvi, os Hayden são
treinados para desconfiar. Quando você está no topo, sempre há
pessoas que querem te derrubar. Considerando que a Hayden
Cattle Company é o maior rancho de gado do Arizona, sua queda
pode ser catastrófica. Pesada é a cabeça que usa a coroa.

Tirando isso, realmente gosto do cara.

— Você vai cavalgar hoje? — Wyatt pergunta.

— Se você não se importa, — respondo.

Ele caminha até um cavalo cor de mel e mostarda. Não


conheço a raça de vista. Ainda estou aprendendo. Eu tive sorte o
suficiente que minhas aulas de equitação de quando era criança
voltaram para mim.

— Esta garota precisa de algum exercício, — diz Wyatt,


pegando uma sela da tachinha e prendendo-a nela.

Agradeço a ele e a levo para o sol. Antes de montar, corro dois


dedos pelo focinho dela para dizer olá. Quando estou ligado, olho
para a casa principal. Jo está na varanda. Ela acena para mim, e
aceno de volta.

●●●

É aí que entra a parte estúpida.


Se alguém me pegasse andando na propriedade do HCC,
haveria problemas. Talvez nos dias do Velho Oeste, um cowboy
atiraria em mim e me deixaria morrer. Neste dia moderno, eles
podem simplesmente me expulsar da propriedade.

Não tenho intenção de ser pego, porque gostaria de voltar


sempre.

Não estou procurando nada em particular. Não haveria


maneira de discernir em qual árvore minha mãe colidiu. Mas foi
aqui, em algum lugar ao longo da estrada da casa grande onde
moram os Hayden até o desvio para a cidade, que minha mãe deu
seu último suspiro.

Estou descendo o cume entre o HCC e Wildflower quando o


movimento chama minha atenção.

Uma mulher com um chapéu roxo de cowboy atravessa a parte


plana do rancho, a cerca de um quilômetro e meio da casa de
Hayden. E ela está voando.

O cabelo cor de mel se estende no ar atrás dela, seu corpo em


perfeito alinhamento, e ela se inclina ligeiramente para a frente.
Minha atenção é completamente capturada por essa mulher, e me
sinto estranhamente deslumbrado. Talvez seja o abandono com
que ela cavalga. Ou sua total confiança no animal, e a confiança
do animal nela. Eles são uma unidade, um duo, uma extensão um
do outro. Tenho quase certeza de que nunca fiz nada tão
emocionante.

Ela se aproxima da linha das árvores a toda velocidade. No


último segundo, ela puxa as rédeas para a esquerda, e o cavalo
enorme se move para o lado, diminuindo a velocidade, depois
desaparece entre as árvores. Eu gostaria de ter sido capaz de ver
mais de suas feições.

Uma respiração longa e pesada que não sabia que estava


segurando sai lentamente dos meus lábios. Ainda bem que ela
desapareceu de vista, porque eu estava começando a me sentir
hipnotizado.

Como se o passeio dela tivesse me esgotado, inclino-me para


trás na sela. Esfregando a mão na minha testa, junto meus lábios
e imagino como seria uma mulher assim pessoalmente.

Tenho a sensação de que ela é selvagem. Audaciosa. Ousada,


com uma boca inteligente. Ela provavelmente diz a palavra foda
como se ela quisesse dizer isso.

A mão pesada da culpa bate na minha bochecha. É a primeira


vez que realmente penso em uma mulher desde que Brea morreu.
Eu vejo mulheres o tempo todo, percebo quando elas são
fisicamente atraentes, mas é só isso. Ninguém chamou minha
atenção tão completamente. Não como a amazona, quem quer que
fosse.

Fecho os olhos, só por um momento, e me permito pensar um


pouco mais sobre a mulher. A culpa está lá, é claro, mas minha
curiosidade a supera. Talvez ela...

— Quem é você?

Meus olhos se abrem. Lá está ela, a quinze metros de


distância. Empoleirada em cima de seu cavalo, maçãs do rosto
esculpindo linhas desafiadoras em ambos os lados de seu rosto.
Seus olhos prendem meu olhar, e neles vejo o mais curto vislumbre
de reconhecimento. Eu a reconheço também. A mulher da
lanchonete. Ela me olha com suspeita arrogante.

Desço do cavalo, mantendo as rédeas na mão enquanto me


aproximo. Seu cavalo está no nível dos olhos com meu queixo. Ela
olha para mim e diz: — Eu lhe fiz uma pergunta. — Seu tom é
baixo, mas autoritário.

— Sawyer Bennett, — respondo, tentando não me maravilhar


com o quão bonita ela é. Seus olhos, azuis como um céu de verão
no final da tarde, me olham com um toque de diversão. Um
sentimento baixo e desconfortável percorre meu estômago.

— Eu já sabia disso, — diz ela.

Minha cabeça cai para o lado. — Então por que você fez a
pergunta?

— Queria ver se você ia mentir.

— Eu não sou um mentiroso.

— Considerando que você está andando em terra, que você


deve saber que não é pública, desculpe-me por não acreditar em
sua interpretação vaga de certo versus errado. — Ela agarra o rolo
com as duas mãos e se inclina para frente. — Por que você está
aqui?

Eu absolutamente não quero dizer a verdade a ela, e aquela


afirmação que fiz há dois segundos sobre não ser um mentiroso?
Ele sai pela janela. — Minha caçada começa em breve. Apenas
reconhecendo a área. — Esforço-me para manter uma cara séria.
Nem tenho binóculos para apoiar a mentira.
Ela resmunga uma risada incrédula. — Você não pode caçar
na terra de Hayden. — Ela aponta para mim. — E você não pode
estar aqui agora. Você está invadindo.

Sorrio para ela, esperando acalmá-la um pouco. — Não vou


contar se você também não.

Ela revira os olhos. — Alguém em algum lugar disse uma vez


que você é encantador e você ainda está montando essa falsidade.

Uma risada sai de mim. Eu não posso evitar. Ela é tão


descarada e ousada quanto eu pensei que ela seria. — Você está
dizendo que você acha que sou encantador? — O que estou fazendo
agora? Isso soou paquerador. Porque foi.

— Você tem sete segundos para explicar por que está


rastejando na minha terra. — Ela se recosta na sela, sua camiseta
subindo apenas o suficiente para mostrar uma parte de sua pele
cremosa. — Sete... seis...

Arrasto minha atenção de volta para sua contagem regressiva.


— Você disse que esta é a sua terra?

Ela assente e continua contando. — Cinco... quatro...

Não tenho ideia do que vai acontecer quando ela acertar um,
mas eu particularmente não quero descobrir. Coloco minhas mãos
no ar em um gesto inocente. — Observando os pássaros.

Ela interrompe sua contagem regressiva e franze a testa. —


Observando pássaros?

Concordo.

— Pensei que você não fosse um mentiroso. — Ela forma um


círculo com o polegar e os dedos da mão direita e o leva até o olho,
fingindo espiar. — Apenas reconhecendo a área. — Ela imita minha
mentira com uma voz exagerada.

Sorrio novamente. Eu não tinha imaginado ela sendo


engraçada. Mas o jeito que ela está olhando para mim me diz que
deveria parar de rir e começar a falar. Aponto para uma árvore
próxima. — Há uma família de cardeais aninhada lá em cima. —
Esta é, finalmente, a verdade. Eu vi o pássaro vermelho da última
vez que passei por aqui, seguido por seu companheiro de penas
marrons. — Você gostaria que eu os apontasse?

Ela olha para mim. — Não. Os cardeais estão sempre fazendo


ninhos nessas árvores nesta época do ano.

Aproximo-me e estendo a mão. — Você vai se apresentar? Eu


não gosto de me encontrar em tal desvantagem.

Ela olha para a minha mão. Agora que estou mais perto dela,
posso ver como suas coxas são fortes, como o jeans parece que foi
derramado em seu corpo. Ela tem uma sarda no lábio inferior e
uma pequena cicatriz prateada em sua mandíbula se curva para
baixo em seu pescoço. Em vez de apertar minha mão, ela puxa as
rédeas e o cavalo ouve obedientemente. Isso a afasta de mim, e me
pego gritando atrás dela, algo que nem penso antes de dizer. —
Seu cavalo tem um nome? Posso pelo menos saber disso?

Ela para. O cavalo não se vira, mas ela torce a metade superior
para olhar para mim. — Hester Prynne4.

4
Prynne é uma jovem pega em adultério e condenada a usar a letra escarlate 'A' no peito como marca de
seu crime. Hester suporta a vergonha de seu pecado e a condenação de sua comunidade com força silenciosa,
adotando o papel de mártir para a multidão enfurecida. Hester viveu por sete anos sob a sombra de sua letra
escarlate, criando sua filha e ajudando os pobres e doentes da comunidade. Após a morte do reverendo
É claro. — Como o personagem de A Letra Escarlate5?

Ela balança a cabeça, seu cabelo se movendo com o


movimento. — Você conhece uma Hester Prynne diferente?

Esse pequeno detalhe me diz muito sobre ela. Exceto o nome


dela. — Encaixa-se em você, — chamo.

Seus olhos se estreitam. — Você não me conhece.

— Ainda não. Mas estou prestes a fazer isso.

Um pequeno sorriso faz com que um lado de sua boca se


levante. Meu coração faz uma dança da vitória. Meu cérebro salta
do meu coração. Que diabos estou fazendo?

— Boa sorte com isso, Sr. Bennett. — Ela se vira e o cavalo a


leva embora.

Pressiono meus dedos na minha boca e a vejo ir. Eu não


pretendia flertar com ela, mas honestamente parecia impossível
não fazê-lo. Algo em sua personalidade chama a minha.

Está tudo bem? Flertar? Ser atraído por alguém? Com ela
sentada em seu cavalo na minha frente, a resposta foi um
retumbante sim. Mas agora que ela não está aqui, não sinto nada
além de culpa por minhas ações.

A curiosidade fica ao lado da culpa. Quem era aquela mulher?

Dimmesdale, seu parceiro em adultério, Hester sai por vários anos. Mais tarde, ela retorna para terminar sua
vida mais uma vez na periferia de sua comunidade, pegando sua carta novamente para continuar sua penitência.
5
A Letra Escarlate de Nathaniel Hawthorne é considerado um clássico da literatura americana. Situado
em uma pequena comunidade na Nova Inglaterra puritana, na década de 1640, é um romance rico em descrição
e introspecção. Hawthorne escreveu o romance em 1850 e o prefacia com um esboço chamado "The Custom-
House", o que sugere que ele criou o romance a partir de um documento que encontrou contendo relatos de
testemunhas oculares da história de Hester.
5

tenho que dizer a eles. Não posso continuar mentindo sobre o


motivo de estar de volta em casa. E há também aquele pequeno
problema de por que eu não vou embora quando o fim de semana
acabar.

Farei isso amanhã. Hoje é sobre família. Meus pais ligaram


para meus irmãos e pediram para eles virem para um churrasco
já que estou em casa e eles não estavam me esperando.

— Jessie, você pode levar isso para a Cowboy House? — Minha


mãe entra no meu quarto segurando uma caçarola. — Eu fiz
enchiladas para os cowboys. Não achei muito legal eles terem que
sentir o cheiro do nosso churrasco e não serem convidados. — Ela
faz uma careta e dá de ombros. — Somente família.

— Claro, sem problemas. — Coloco meu livro na cama e pego


o prato. Os olhos da minha mãe caem para todas as minhas malas
encostadas na minha cômoda. Não é nem tudo que eu trouxe, o
resto ainda está no meu carro. Eu poderia ter feito um trabalho
melhor mantendo os pertences fora de vista, mas... bem, foi meio
que de propósito. Estava esperando que ela visse tudo, somasse
dois e dois, e então nós conversaríamos. Dessa forma, ela teria
uma vantagem em sua resposta, e eu seria poupada da primeira
parte dela.
Ela aponta para minhas coisas e diz com firmeza. — Nós
vamos falar sobre isso mais tarde.

Aceno e saio do quarto, feliz como o inferno por ter um motivo


para escapar. Infelizmente, estou trocando um lugar que não
quero estar por outro. A Cowboy House é onde todos os cowboys
ficam, e normalmente não seria grande coisa se eu fosse até lá.
Mas no ano passado, no churrasco anual de cowboys, eu poderia
ter ficado bebendo uísque com os cowboys. Eu definitivamente
acabei ficando com um atrás de uma árvore, e não me lembro
quem era. Ops.

Foi a única vez que isso aconteceu, e não haverá repetição.


Estou de volta para casa para sempre, o que significa que não
posso sair correndo para a faculdade depois de travessuras como
essa e agir como se nunca tivesse acontecido.

É hora de parar de confiar no meu status de bebê da família e


intensificar. Quando peguei Sawyer Bennett em nossa propriedade
ontem à tarde, a adrenalina não era a única sensação surgindo em
mim. Também reconheci o claro alívio trazido por uma verdade
rápida e clara.

Minha terra. Isso é o que eu disse a ele, e quis dizer isso. O


HCC é meu, e senti um instinto parental de protegê-lo.

Bato na porta do prédio comprido e baixo. É semelhante ao


lugar no rancho de Jo, onde os campistas dormem, mas a Cowboy
House traz o logotipo da HCC na frente.

— Entre, — alguém grita.


Eu puxo a porta de tela e a abro com meu quadril, então abro
a porta e entro. Há uma sala de estar e cozinha, que é onde estou
agora, que divide a estrutura ao meio. Em ambos os lados da área
comum há corredores curtos com quartos, dois vaqueiros para um
quarto. Wes diz que isso o lembra do quartel do Exército.

Josh ergue os olhos de seu assento para a velha mesa de


madeira, uma revista Bass Master aberta. Ele se levanta
rapidamente quando vê que sou eu. — Senhorita Jessie, eu não
sabia que você estava em casa.

Abaixo meu queixo em saudação. Josh é um acessório no


HCC. Ele está aqui desde a minha memória mais remota. Ele
provavelmente é apenas dez anos mais velho que Wes, e ele é o
líder natural dos cowboys. Eles tendem a entrar na fila quando ele
fala.

Coloquei o enorme prato de vidro no fogão. — Você sabe que


não precisa me chamar de 'Senhorita'. — removo a tampa de papel
alumínio, deixando o cheiro de enchiladas encher o ar. Enrolando
o papel alumínio, eu o jogo no lixo e digo: — Minha mãe fez o jantar
para vocês.

— Isso foi muito legal da parte dela.

Eu giro, meus cotovelos dobrados e minhas mãos agarrando a


bancada, e estudo Josh. Ele está ficando mais velho, e embora
costumava pensar nele como bonito, ele está menos agora. Ele
perdeu um estilo de vida tradicional, casamento e filhos, a serviço
deste rancho? Ele é, como tantos, simplesmente prometido ao
estilo de vida exigente e inebriante?

Nunca vou perguntar a ele, é claro, mas estou curiosa.


— Ela gosta de cuidar de vocês. Você sabe como ela…

— O que. O. Porra que cheiro é esse? Quem está comendo sem


mim? — Denny vem ao virar, um punhado de toalha agarrado
perto do osso do quadril. Ele não usa nada além daquela toalha.

Limpo minha garganta e desvio o olhar.

— Vá se vestir, Denny, — diz Josh, mostrando sua autoridade.

— Eu não sabia que ela estava aqui, — Denny resmunga


enquanto ele recua pelo corredor.

— Sinto muito por isso, senhorita...

Paro-o com um olhar severo. — Já vi homens sem camisa


antes. Já fui à praia. — E tenho, você sabe, vinte e um anos. Não
sou uma criança.

— Certo. — Josh sorri educadamente. — Mas você é a


irmãzinha do chefe.

— Certo, — repito. Eu simplesmente amo como esses homens


me colocaram nesses papéis por toda a minha vida. A filha do
chefe, e agora que Wes assumiu o rancho do meu pai, a irmãzinha
do chefe. — Eu com certeza. — Devolvo seu sorriso educado. —
Aproveitem seu jantar. Você pode trazer esse prato de volta quando
todos terminarem com ele. — Deslizo da Cowboy House,
levantando poeira enquanto faço meu caminho para o gramado
verde na frente da propriedade.

Algum dia, todo mundo vai ter que parar de me ver como a
garotinha que costumava correr por aqui descalça, e começar a me
ver como a mulher que me tornei.
●●●

Estamos no quintal da casa, o sol do fim da tarde escondido


atrás dos pinheiros altos, quando Wes e Dakota aparecem ao redor
da casa. Wes me envolve em um abraço, muito familiar e um pouco
reservado. Ele moveria uma montanha por mim, mas não estamos
muito perto. Eu tinha apenas alguns anos quando ele partiu, e a
maioria das minhas primeiras lembranças dele inclui vê-lo quando
ele voltou para casa para R&R. Sua esposa, no entanto, é uma
história diferente. Eu adoro ela.

— Jessie, que surpresa agradável. — Dakota beija minha


bochecha, sua barriga pressionando em mim. Ela não está muito
longe, cerca de quinze semanas, mas já está maior do que da
última vez. Colt passa correndo, indo tão rápido quanto suas
pernas de quase dois anos podem levá-lo.

Pulo na frente dele e ele se assusta quando me vê, parando de


repente e envolvendo seus braços em volta das minhas pernas.
Corro minha mão por seu cabelo escuro, a cor exata do de Wes, e
ele olha para mim. Ele é filho de seu pai, quase como se Deus
tivesse pressionado um botão 'Duplicar', exceto por aqueles olhos.
Uma mistura perfeita de olhos castanhos e verdes, olhos
castanhos claros e brilhantes e cheios de malícia, assim como os
de Dakota.

— Sim, eu pensei que era hora de visitar. — Pego Colt,


segurando seu corpo se contorcendo suspenso no ar, e dou um
beijo em sua testa. — Oi amigo, — digo em voz alta, estremecendo
assim que faço isso. Coloco-o no chão e ele corre ao meu redor. Eu
vi enrugo meu rosto e solto um suspiro. — Sinto muito, — digo
para Dakota, abrindo meus olhos. — Eu sei melhor do que isso.

Ela encolhe os ombros. — Está tudo bem. É natural, Wes e eu


fizemos isso uma centena de vezes. Acredite em mim, se uma voz
elevada é tudo o que precisa para fazê-lo ouvir melhor, sua audição
já teria se recuperado.

— Ele é uma criança linda, — comento, observando-o passar,


indo na direção oposta. Wyatt está perseguindo ele, fazendo sons
de monstro que Colt definitivamente não pode ouvir, mas quando
ele olha para trás, ele pode ver as expressões faciais de Wyatt e os
dedos curvados levantados em ambos os lados de seu rosto. Wyatt
faz uma pausa em seu caminho passando por mim, beijando
minha bochecha rapidamente, então continua depois de Colt. —
Bom ver você, irmãzinha, — Wyatt chama antes de retomar seu
ato de monstro.

— Colt vai receber implantes cocleares em breve. — Dakota


sorri, e é igualmente feliz e triste.

— Como você se sente sobre isso? — Pego sua mão e a puxo


alguns metros para que possamos nos sentar no sofá ao ar livre.

— Aliviada. Nervosa. Triste porque meu bebê não foi capaz de


ouvir e já teve que enfrentar adversidades na vida. Aborrecida
comigo mesma por sentir pena dele.

Sorrio baixinho. — Conflito, então?

Seus olhos se enchem de lágrimas e ela apalpa sua barriga


florescente. — Os hormônios da gravidez não ajudam. — Ela
esfrega um círculo e aponta suas próximas palavras para baixo em
seu estômago. — Será menina?

— Posso? — pergunto, estendendo a mão achatada.

Dakota se inclina para trás. — Faça isso. Deus sabe que Wyatt
faz.

Balanço minha cabeça, correndo minha mão pela extensão. —


Para um homem que ama crianças, você pensaria que eles teriam
um deles. Não que Travis não seja de Wyatt, — apresso-me em
acrescentar. Ele está adotando o filho de quinze anos de Jo. Assim
que Wyatt e Jo completarem seu aniversário de casamento de um
ano, ele poderá legalizá-lo.

Dakota sorri. — Acontece que eu sei que eles estão tentando.

Suspiro animadamente, puxando meu lábio inferior entre os


dentes e dançando minha cabeça ao redor. — As três senhoras
estão fazendo um bom trabalho garantindo que haja uma próxima
geração de Hayden.

— E você? — Dakota me examina. — Você espera que eu


acredite que você está aqui porque você sentiu tanta falta de todos?

— Eu sou tão transparente?

Dakota balança a cabeça. — Não, eu sou muito boa em ler as


pessoas.

Retiro minha mão e Dakota se endireita. — É um homem?

Eu poderia beijá-la por não perguntar 'é um menino? '. Pelo


menos alguém por aqui percebe que não tenho mais quatorze
anos.
— Parcialmente, — respondo. — Você consegue guardar
segredo?

— Não se for machucar alguém ou exigir que eu minta para


Wes.

Sorrio para sua honestidade. — Tudo certo. — avanço para


que não sejamos ouvidos. — Eu me envolvi com meu professor. E
acontece que ele era casado, mas eu não sabia. Ele não usava anel.
Nunca houve uma indicação.

Dakota solta um suspiro ruidoso. — Eu sinto muito. Isso é


horrível.

— Fica pior…

Seus olhos se arregalam. — Quanto pior?

— Administrei uma mesa de pôquer clandestino do meu


dormitório. Aparentemente, era muito desaprovado. Alguém
relatou isso ao reitor, e eles me expulsaram. Mais ou menos. Eles
sugeriram que me retirasse.

— Jessie, — Dakota fala com tom de desaprovação.

— Eu sei. — O choque de tudo isso está passando, e estou


começando a me sentir extremamente tola.

— Porque você fez isso? — Ela parece menos desapontada


comigo do que minha mãe vai, então pelo menos eu tenho isso a
meu favor.

— Eu não sei. Foi divertido. Estava entediada.

— Essas não são boas razões para infringir a lei.


Franzo a testa. — Você infringe a lei quando acelera. Qual é a
diferença?

Dakota geme. — Você soa como Wyatt.

— Vou tomar isso como um elogio.

Dakota ri. — Considere um. Seus pais já sabem?

— Não, — respondo, estourando o som 'o'. Olho para a


churrasqueira, onde minha mãe está ao lado do meu pai. — Eles
vão olhar para mim com decepção, mas também como se a
situação não fosse muito chocante. — Aponto de volta para mim
mesma. — Calamidade aqui, lembra?

Dakota se aproxima de mim, envolvendo o braço em volta dos


meus ombros e me dando um aperto. — Você é muito mais do que
isso. E o que quer que você faça a seguir, você vai arrasar. Sei
disso.

— Obrigada, Dakota.

— Tenho você, querida. — Sua boca se abre em um animado '


o' e ela aplaude uma vez: — Por que você não vem ao mercado de
fornecedores amanhã e me ajuda? Hoje foi movimentado, e os
domingos são sempre mais loucos que os sábados.

— Hmm... — finjo pensar sobre isso. — Deixe-me verificar


minha agenda. Não tenho certeza se estou livre. Eu tenho um
monte de nada para atender.

Ela ri e me cutuca. — Esteja pronta às dez. Você pode andar


comigo e com sua mãe.

Concordo com a cabeça, e então Tenley e Warner chegam,


trazendo comoção com eles. Peyton está em seu telefone, mas
Charlie começa a correr com Colt, e a pequena Lyla chora como se
o céu tivesse caído. Minha mãe a leva de Tenley, e eu ouço Tenley
dizer que eles tiveram que acordá-la para vir aqui e ela está
chateada com isso. Ainda estou um pouco impressionada com
Tenley, não vou mentir. Eu cresci assistindo ela em filmes, como
não estar?

Olho para a cena, observando Warner cumprimentar Wes com


uma palmada nas costas. Wyatt se aproxima e entrega uma cerveja
a cada um, e eles dão um soco. Os meus irmãos. Cada um único,
mas cada um, um verdadeiro homem Hayden.

Meus pais, juntos na churrasqueira, o braço do meu pai em


volta da cintura da minha mãe. E Vovô, sentado em uma cadeira,
examinando tudo.

Sim, fui expulsa da faculdade. Sim, o cara que eu estava


saindo era casado.

Mas eu poderia ter ido a qualquer lugar.

E eu escolhi voltar para casa, porque este lugar é onde meu


coração está permanentemente enraizado.
6

— Bom dia, Jessie. — As botas do meu pai batem na mesa da


sala de jantar, e ele bagunça meu cabelo.

Dou a ele um olhar brincalhão e rude e arrumo meu cabelo.


— Olá, pai.

Ele volta alguns minutos depois com um burrito de café da


manhã. O vapor sobe de sua primeira mordida, e não tenho ideia
de como ele está mastigando uma comida tão quente.

— O que está na agenda hoje antes de você dirigir de volta para


a faculdade? — Ele estica uma perna e pega seu telefone,
navegando para seu aplicativo de notícias. Ele odeia ler as notícias
em seu telefone, mas não tem escolha, a menos que queira ligar a
TV. Os jornais não são entregues aqui.

— Vou ao mercado de fornecedores com mamãe e Dakota, e


então, — faço uma pausa para me recompor. Esta é uma chance
de contar a ele sobre a faculdade, e eu também posso aproveitá-la.
— Pai, eu...

— Pai, você precisava de mim para alguma coisa? — Wes entra


e olha com expectativa para nosso pai, inserindo-se na minha frase
sem um pingo de desculpas.

— Você não estava aqui ontem à noite? — Pergunto irritada.

Wes faz uma careta para mim. — É bom ver você tão cedo
também.
— Pare com isso, — meu pai rosna. Ele não está realmente
rosnando, por si só, ele só tem uma voz que soa como pneus
girando no cascalho solto e a maior parte do que ele diz soa como
um rosnado. — Josh e Ham vieram trinta minutos atrás. Eles
disseram que algumas vacas estão mostrando olhos mortos.

Wes suspira. Sua cabeça cai e ele roça sua bochecha


desalinhada com os nós dos dedos. — Porra.

— Concordo.

Olho de um homem para o outro. — O que são olhos mortos?

Meu pai responde. — Olhos que estão opacos. Afundados.

É descritivo o suficiente para que eu possa imaginá-lo com


muita clareza. Meu coração se contorce com a imagem. — O que
diabos causa isso?

— Seca, — eles respondem ao mesmo tempo.

— Seca?

— Sim, você sabe aquela coisa em que estamos? — Wes faz


uma careta como se eu fosse extraordinariamente estúpida. — Ou
você não assiste às notícias na ASU?

Abro minha boca, uma foda sincera pronta na minha língua,


quando Wes volta sua atenção para o meu pai. — Ontem à noite
Wyatt chamou o rancho de Jo de barril de pólvora. — Sua frase
tem um significado adicional, um que eu não entendo. Mas nosso
pai certamente sabe.

— Nem pense nisso. — Desta vez, papai está realmente


rosnando.
Sei melhor do que fazer a pergunta óbvia. Sento-me em
silêncio e mantenho meus ouvidos abertos, esperando aprender
ouvindo.

— Eu disse a Wyatt não, pai. Ele parecia chateado, mas ele


entendeu. Assim que eu contar a ele sobre os olhos mortos, ele vai
entender ainda mais.

Nosso pai assente. — Vamos dar um passeio esta manhã.

Wes o olha com incerteza. — Você tem certeza disso?

— Tão certo como eu nunca estive sobre qualquer coisa. Você


só pode contar com vacas alimentadas com capim que ficam tanto
tempo alimentadas com capim sem água.

— O que você acha que vai descobrir lá fora? — É minha


pergunta. Não posso evitar. Estou morrendo de curiosidade.

Papai olha para mim, seu olhar atento, enquanto decide se vai
compartilhar os problemas do rancho comigo. Ele dá uma mordida
no café da manhã, mastiga e engole, depois fala. — Quero dar uma
olhada na terra que faz fronteira com o nosso pasto. Foi comprada
há alguns anos e ninguém nunca fez nada com ela. Mas, por mais
seco que o solo esteja agora, isso me faz pensar que é mais do que
uma falta de chuva. Onde diabos está a água subterrânea?

— O que você acha que está acontecendo? — Wes pergunta.

Meu pai dá de ombros. — Deixe-me terminar meu café da


manhã e vamos descobrir.

— Posso ir? — A excitação toma conta de mim enquanto penso


em cavalgar com meu pai e Wes.

— Não, — eles respondem ao mesmo tempo, e é irritante.


Os músculos do meu rosto se contraem. — Por que não?

— Porque não sei no que estamos nos metendo, — diz meu


pai, — e não quero colocar você no meio disso.

— Besteira, — desafio. — Você acha que eu sou muito jovem.


Ou... — Inclino minha cabeça para o lado. — É porque eu sou uma
menina?

— Bem, agora... — meu pai começa.

— Espere aí, — Wes começa. Nenhum deles quer ser chamado,


nem querem ser culpados do que eu insinuei, mas isso é muito
ruim. Não é meu trabalho cuidar do nível de conforto deles.

— Eu não quero ouvir isso de nenhum de vocês. — Levanto-


me rapidamente, a cadeira raspando no chão de madeira. — É cedo
e tenho tempo suficiente antes de sair para a feira de fornecedores.
Vou preparar a Hester Prynne. Vejo vocês lá fora.

Paro na porta da frente para calçar minhas botas. Vovô está


sentado na cadeira de balanço da sala, com os olhos fechados. Eu
giro a maçaneta e, com uma bota para fora da porta, uma voz velha
e estridente atrás de mim diz: — Dê a eles o inferno.

●●●

— Você vê do que estou falando? — Meu pai acena com a


cabeça para a grama sobre a qual estamos cavalgando.
— Parece mais com feno, — Wes comenta, e eu sinto derrota
em seu tom. — Só mais um pouco e chegaremos ao limite da
propriedade.

Sei que este não é um passeio de prazer, estamos fazendo um


verdadeiro 'reconhecimento', como Wes chamou, mas é bom estar
aqui com Wes e meu pai. Não consigo pensar em um momento em
que tenha sido apenas nós três.

Aproximamo-nos da linha da propriedade, delineada por uma


cerca de madeira. Desço de Hester Prynne e dou um passo à frente
até meus quadris ficarem alinhados com o topo da madeira
deformada pelo sol. Colocando a mão sobre os olhos, olho para a
vasta terra. É mais baixo em altitude, mais deserto que o HCC. Ao
longe vejo uma casa, e além daquelas grandes máquinas
pontilham a paisagem. A partir daqui, parece que Colt jogou seus
pequenos brinquedos em um campo.

Pergunto-me o que eles estão fazendo aqui. E eu realmente


gostaria de saber por que eles precisam de enfardadeiras.

Meu pai diz alguma coisa, mas eu não o ouço. Alcanço a junta
da cerca, desconectando um trilho do poste e jogando-o de lado.

— Que diabos, Jessie? — Wes chama. — Isso é propriedade


privada.

— Você não quer saber por que esse lugar que nenhum de
vocês conhece tem enfardadeiras lá embaixo? — Eu passo uma
perna sobre a parte caída da cerca e me viro para olhar para meu
pai e Wes. — Tenho certeza que sim. Amarre meu cavalo, por favor.
— Então eu passo uma segunda perna na chamada propriedade
privada.
— Maldição, — ouço Wes resmungando. — Nós deveríamos tê-
la feito ficar em casa.

Dói, mas não demonstro. Em vez disso, continuo andando,


mas então lembro que meu pai não é tão ágil quanto eu, então paro
e espero por eles. Eles amarram todos os cavalos e passam por
cima da cerca.

Andamos em fila, bem no meio dos campos, para que quem


estiver naquela casa saiba que não temos nenhuma intenção
maliciosa. Estamos puramente em busca de informações.

Quanto mais nos aproximamos, mais a cena ao nosso redor


muda em minha mente. Se o que estou vendo estiver correto, isso
não é bom. — Espere. — Agarro o antebraço de Wes e ele diminui.
Papai também.

— O que há de errado? — Papai pergunta enquanto corro para


o primeiro acre de crescimento real. Eu arranco um pequeno
punhado do que está empurrando o solo.

— Sinta isso, — instruo, estendendo minha palma aberta.

— O que é aquilo? — Wes pergunta.

— Alfalfa, — respondo, tentando manter o orgulho da minha


voz. — Feno de alfafa. Conheça o motivo de sua perda de água
subterrânea.

Meu pai me olha. — Como você sabe disso?

— Tive aulas de agricultura na faculdade.

— Pensei que você estava em marketing?


— Eu estava. Mas eu estava complementando com aulas que
gostava mais.

Wes pega o que estou segurando, esfregando-o entre os dedos.


— Não parece feno.

— Isso é porque tem muita umidade agora. Também conhecida


como água. Dê algumas horas ao sol e ela secará. Essa… — aponto
para as enfardadeiras — … é a razão para isso.

— Então eles estão cultivando feno e enfardando-o? — Wes


suspira. — Isso não é um crime. Não há nada que possamos fazer
sobre isso.

Não posso discordar, por mais que eu queira.

O som estalando de uma porta de tela puxa todos os nossos


olhares para a casinha. Um homem está de pé, pernas mais largas
que os quadris, braços cruzados e balançando para trás nos
calcanhares. Ele é jovem, talvez quarenta, e por alguma razão eu
acho isso surpreendente.

— Esta é uma propriedade privada, — ele grita, seu tom


irritado e afiado com um desafio.

Wes se aproxima, e meu pai e eu o seguimos. — Olá, senhor,


meu nome é Wes Hayden. Este é meu pai e minha irmã. Somos
seus vizinhos. — Ele gesticula na direção do nosso rancho. Sua
voz é tão cordial quanto pode ser.

O homem olha para nós. Se o amigo tinha um rosto, o dele é o


oposto. — Não tenho certeza de quão bom é invadir a vizinhança.

Wes levanta a palma da mão. — Nenhum mal quis dizer.

— O que você quer?


Wes continua falando por nós. — Estávamos em um passeio e
pensamos em nos apresentar. Queria ter certeza de que você sabia
que mantemos muito açúcar por perto, caso você precise de uma
xícara em algum momento.

O homem abre um pequeno sorriso. — Puxa, obrigado. Vou


manter isso em mente.

— Você tem uma operação e tanto aqui. Eu não sabia que


havia um fazendeiro de feno logo atrás de mim. Me faz pensar por
que tenho ido até a cidade para comprar meu feno.

O homem balança a cabeça. — Você não pode comprar este


feno.

— Por que?

— Não é vendido aqui.

— Onde é vendido? — A voz de Wes continua a soar afável,


mas posso dizer que ele está fazendo o possível para manter seu
temperamento sob controle.

O fazendeiro dá a Wes um olhar longo e duro. Meu palpite é


que Wes gostaria de bater nele. — Ele é embalado e enviado para
um porto na Califórnia, depois despachado pelo oceano.

Faço um barulho de surpresa e indignação. Wes me envia um


olhar de advertência. Ele olha de volta para o homem, assentindo.
— Certo, certo. O que você vai fazer no verão? O feno é uma
colheita com sede e fica muito quente.

— Isso não é uma preocupação. Recebo bastante água


subterrânea.

— Isso está certo? — A voz de Wes está tensa.


O olhar do homem se estreita. — Por que você está realmente
aqui?

— Você está pegando todas as águas subterrâneas e não


deixando nenhuma para nós. Minhas vacas são criadas no pasto
e em breve não haverá grama suficiente para elas comerem.

— Isso não é problema meu.

Sei que Wes é o líder do HCC e, portanto, deveria ser o único


a falar, mas não posso mais ficar calada. — Você pode suspender
seu cultivo durante o verão? É quando mais precisamos de água.

Seria uma coisa se esse cara olhasse para mim com antipatia,
mas ele está olhando para mim como se eu o divertisse. Ele se
dirige a Wes como se eu nunca tivesse falado. — Boa sorte com
seu rebanho, vizinho.

Ele se vira e entra.

Meu sangue está quente. — Nós não podemos deixá-lo


continuar com isso, — eu assobio para Wes. — Ele está
essencialmente exportando água. Durante uma seca.

Wes começa a caminhada de volta. — Não há nada que


possamos fazer, Jessie.

— Como diabos não há, — grito.

— Mantenha sua voz baixa, — meu pai sibila. — Não gosto


desse cara e não quero que ele ouça você.

— Compre sua fazenda, Wes. Compre-o e assuma seus direitos


sobre a água.
Wes estabelece um ritmo muito rápido, mesmo para mim. Sua
cabeça está inclinada e ele diz: — Não há dinheiro para isso,
Jessie.

— Pega um empréstimo.

— Não funciona assim, — ele troveja. Ele olha para mim e vê


a dor em meus olhos. — Desculpe, — ele murmura. Para meu pai,
ele diz: — Vou ligar para Lonestar.

Outro comentário que não entendo, mas não importa porque


não sou o destinatário pretendido. Meu pai solta um suspiro de
raiva. — Eu odeio aquele filho da puta.

— Ele vai nos dar um preço justo, pai.

— Você quer dizer que ele vai nos foder pelo menos.

Wes dá de ombros e não diminui a velocidade. — O que mais


devo fazer? Em breve, diminuir o rebanho não será uma escolha,
mas uma necessidade. E preciso vender antes de todo mundo e há
muita oferta e pouca demanda.

Eu falo. — Talvez possamos explorar a possibilidade de


expandir o que o HCC oferece...

Wes olha para mim. — Pare de agir como se você soubesse o


que está acontecendo aqui. Ele alonga o passo, sabendo que não
posso acompanhá-lo.

Certo. Diminuo o ritmo para que meu pai e eu possamos andar


confortavelmente e colocar um espaço entre nós e a nuvem de
tempestade que caminha à nossa frente. — Wes está com raiva. —
É um comentário completamente desnecessário da minha parte.

— Wes está frustrado, e você continua cutucando ele.


— Tentar resolver um problema não é cutucar alguém. — Ele
não responde, então pergunto: — O que acontecerá com o HCC se
a seca continuar por muito mais tempo?

— Podemos ficar à tona por um tempo. Podemos não ter o


suficiente para comprar aquele idiota, mas temos o suficiente. O
verdadeiro problema são as vacas. Podemos alimentá-las com
ração regular, mas então teríamos que mudar toda a nossa
estrutura, e toda a nossa marca, para carne bovina comum, e não
é tão simples quanto parece. Vender algumas vacas seria o
próximo passo lógico. É isso que Wes quer dizer quando diz que
vai ligar para Lonestar. É um rancho no Texas.

É um soco no estômago. Vender gado? Diminuir o rebanho?


— Pai, desculpe-me.

— Nós vamos superar isso, querida. Nós sempre passamos. —


Ele me olha significativamente. — Hayden não foge de problemas.

Desvio o olhar. Parece que minha mãe contou a ele sobre todas
as minhas malas.

Wes está ao lado de seu cavalo quando o alcançamos. Seus


lábios formam uma linha tensa e reta.

— Filho, — meu pai começa, mas Wes balança a cabeça.

— Não, pai. Apenas não. — Ele coloca um pé no estribo de


Ranger e balança a perna. Ele olha para nós, e eu gostaria de poder
apagar o medo nos olhos do meu irmão mais velho. Acho que não
me lembro de ter visto lá antes. — Eu vou descobrir isso. — Ele
vira Ranger e espera que desamarremos nossos cavalos e o
sigamos.
Uma vez que estamos ambos em nossos cavalos, olho para
meu pai. A visão de seus ombros caídos rouba minha respiração.
Como Wes com medo, nunca vi meu pai desanimado. O homem é
uma lenda, sua presença formidável. Eu o vi erguer uma
sobrancelha e fazer meu par para o baile de formatura gaguejar.
Foi um jogo de poder, por completo, e eu agi envergonhada, mas
secretamente eu adorei.

Deve haver alguma maneira de ajudar Wes, e se ele for muito


cabeça-dura para me deixar ajudar, farei do meu jeito.
7

Isso não é o que eu estava esperando. A última vez que fui ao


mercado de fornecedores com minha mãe foi no verão passado,
quando estava em casa da faculdade. Em oito meses, cresceu para
ser duas vezes maior.

Coberturas de tendas brancas se estendem em longas filas,


fileira após fileira. A capela onde cada um dos meus irmãos se
casou fica ao longe. A algumas centenas de metros está The
Orchard, e a área externa pontilhada com jogos de quintal de
grandes dimensões.

Dakota pede licença para verificar a barraca de sanduíches


onde The Orchard vende almoço para os clientes. Ela também me
contou sobre três caminhões de comida que devem chegar a
qualquer minuto, e não para ofender o restaurante da minha
cunhada, mas eu definitivamente estou ansiosa para o caminhão
de pão frito nativo americano.

Os fornecedores podem chegar com até duas horas de


antecedência para iniciar a montagem. Alguns deles aproveitaram
isso, seus estandes erguidos e displays organizados e convidativos.
Outros caminham em dobro para suas barracas, de braços cheios
e puxando carroças. Minha mãe tem uma configuração bastante
fácil e ela está quase terminando, então eu saio para ajudar
algumas pessoas que parecem não ter como estar prontas a tempo.
Empilho sabonete caseiro para uma doce velhinha e, quando
saio da área dela, minhas mãos fedem. Eu paro no banheiro do
The Orchard e lavo a mistura de cheiros indutora de vômito, então
volto para fora e ajudo outra mulher a pendurar seus cobertores
caseiros em escadas de madeira. Depois de subir em uma escada
de verdade para pendurar placas de paletes pintadas à mão para
outra pessoa, eu me aventuro de volta para minha mãe.

O mercado começou oficialmente. É lento no início, depois


aumenta de forma constante à medida que a tarde continua.

Estou fazendo o troco para uma mulher e sua neta quando,


com o canto do olho, noto que alguém entra na fila.

A mulher e a neta vão embora com o troco e a tora de queijo


de cabra com ervas, e eu olho para o lado. Ele está lá, no final da
fila, uma cabeça mais alto que as três pessoas na frente dele.

Minhas sobrancelhas levantam, reconhecendo Sawyer, e uma


onda de excitação percorre minha espinha. Ele não sorri, mas todo
o seu rosto suaviza.

— Mel com crosta de amêndoa, — minha mãe diz sem olhar


para mim.

Tiro meu olhar de Sawyer e pego o queijo de cabra, embalando-


o naquelas caixas fofas que minha mãe comprou. Coloco um
adesivo circular que diz Hayden Goat Cheese na costura onde a
tampa se encaixa na caixa. A primeira vez que vi os adesivos,
perguntei a ela por que ela não inventou um nome só dela, nada a
ver com o HCC, e ela disse que é outra forma de anunciar o HCC.
Ela está certa, mas eu senti que ela deveria ter feito isso de
qualquer maneira. Teria sido legal vê-la com algo que era só dela.
Não olho para Sawyer novamente, temendo perder meu foco.
Mas então ele está lá, de pé na frente da minha mãe, e não há para
onde olhar, a não ser para ele.

Esta é a terceira vez que o vejo, mas suas feições ainda me


surpreendem. Ele se comporta rigidamente, as mãos enfiadas nos
bolsos dessa maneira distante, mas sinto algo por baixo. Como se
ele estivesse esperando, esperando que alguém aparecesse e lhe
dissesse que não há problema em ser ele mesmo.

Ele pede um queijo de cabra simples, e quando me afasto para


pegá-lo, ele caminha comigo, espelhando meu movimento ao longo
de seu lado da mesa. Posso sentir o olhar da minha mãe sobre nós.
Ninguém mais estava na fila atrás de Sawyer, então não há mais
nada para chamar sua atenção agora, exceto ele e eu.

— Descobri o seu nome, — diz ele, sua voz baixa. Ele se enrola
em mim de uma maneira para a qual não estou pronta. É muito
cedo. Minha vida está uma bagunça agora. Eu não deveria me
concentrar em resolver tudo antes de me permitir me sentir atraída
por alguém?

Coloco o pedido na caixa e levanto o queixo, olhando-o nos


olhos. A largura da mesa é tudo o que nos separa, e se eu não
soubesse melhor, diria que ele está inclinado para a frente. E se
estou sendo honesta, também estou.

— Oh sim?

— Jessamyn Hayden.

Ele parece satisfeito consigo mesmo. — Parabéns, super


detetive, — provoco. — Eu vou por Jessie, no entanto.
Ele estala. — Droga. Quase.

Demoro muito para aplicar o adesivo na caixa, apenas para


manter essa brincadeira. — Quem foi sua fonte?

— Waylon Guthrie.

Quase bufo minha risada, mas me seguro a tempo. — Claro


que foi. Ele é a única pessoa que me chama de Jessamyn.

— É um nome adorável.

— Obrigada. Mas acho que Jessie combina mais comigo.

Seu olhar roça meu rosto. — Com certeza sim.

São essas palavras doces, embrulhadas em flerte e entregues


como um elogio, que me fazem imaginar como seria se ele
pressionasse seus lábios nos meus.

— Jessie, você vai me apresentar ao seu amigo? — A voz da


minha mãe invade meus pensamentos.

Dou um passo para trás, virando-me para ela. Sawyer me


supera, no entanto.

Ele estende a mão. — Sra. Hayden, sou Sawyer Bennett.

A mão dela, já a meio caminho para ele, para no ar, a uns bons
vinte centímetros da dele. Seus olhos se arregalam, ela engole
visivelmente, então se recupera. Ela aperta a mão dele
rapidamente, murmurando que é um prazer conhecê-lo, e acena
para um transeunte, oferecendo uma amostra. Eles se aproximam
e ela os trata como um salva-vidas.
Olho para Sawyer, do topo de sua cabeça, exatamente onde a
mesa corta meu olhar. Quando não percebo o que fez minha mãe
agir de forma tão bizarra, pergunto: — Por que ela agiu assim?

Ele dá de ombros e balança a cabeça. — Eu honestamente não


tenho ideia.

Ele paga o queijo, e eu lhe entrego a caixa. Nossos dedos se


roçam, primeiro quando ele pega a caixa, e segundo quando
trocamos dinheiro. Na segunda vez, seu toque demora, e eu ouço
sua inspiração afiada.

— Obrigado, — diz ele rudemente, virando-se.

Eu o observo caminhar pela multidão, virando cabeças


enquanto caminha. Não é apenas seu rosto bonito, ou jeans pretos
que definitivamente não são Wrangler, que chamam a atenção. Há
algo no conjunto de seus ombros, a tensão ao longo de sua
mandíbula. Ele é um homem sobrecarregado por algo.

Eu rasgo meu olhar para longe, e para o olhar de espera de


minha mãe.

●●●

— Você sabia que Sawyer Bennett estava de volta à cidade?

O olhar do meu pai surge por cima de seu velho romance de


capa dura. Pomba Solitária. Ele tira os óculos de leitura de aro de
metal, passando a mão pelo cabelo enquanto olha para minha
mãe.
Ela não tinha uma palavra para me dizer depois que Sawyer
saiu da nossa barraca, mas baseado em sua pergunta ao meu pai
eu diria que ela não precisava da minha apresentação. Não é
surpreendente pensar que ela o conhecia de quando ele morava no
Circle B, mas o verdadeiro mistério é por que ela teria essa
resposta.

— Sim, — ele responde.

A postura de minha mãe é rígida, a de meu pai, relaxada. Ele


não se moveu da cadeira de couro amanteigada que o envolveu
quando se sentou para ler. O tique ao longo de sua mandíbula me
diz o quanto sua aparência é enganosa. O olhar deles, denso com
algo que não entendo, faz com que uma pedra estacione no meu
estômago.

Acho que gosto de Sawyer mais do que me permito acreditar.


Meu coração tem guardado segredos do meu cérebro.

— Por que você não me contou? Há tensão no tom de voz da


minha mãe enquanto ela se estica para evitar que outra coisa
penetre.

O olhar do meu pai pisca na minha direção, depois volta para


minha mãe. — Achei que você soubesse.

Estou perdendo a paciência. Esta conversa, se é que se pode


chamar assim, usa poucas palavras, mas diz muito mais. Nenhum
dos quais posso interpretar como algo significativo.

— Hum, olá? — Aceno minha mão no ar. — O que está


acontecendo?
Minha mãe olha para mim como se tivesse acabado de lembrar
que estou na sala. — Nada.

— Isso não é nada, — respondo. — Isso é alguma coisa, mas


não consigo descobrir o que. Você ficou em silêncio depois que eu
te apresentei a Sawyer, mas aparentemente eu não precisava
porque você já o conhece. E agora você está aqui trocando um
diálogo enigmático com papai. — Minhas mãos estão no ar ao meu
lado, palmas voltadas para cima, meus olhos arregalados em uma
postura de estou esperando.

Meu pai se inclina para frente, descruzando as pernas e


colocando o livro na mesa. — Anos atrás, antes de você nascer,
havia sangue ruim6 entre mim e o pai de Sawyer. Ele fez algo muito
ruim, e eu retaliei. Ele finalmente deixou a cidade e abandonou o
Circle B. — Ele ergue-se. — O resto é história. — Caminhando para
minha mãe, ele a pega em seus braços e beija o topo de sua cabeça.

— Foi um momento difícil, — acrescenta ela, o lado de sua


cabeça pressionado no peito do meu pai. — Ver Sawyer hoje foi um
choque para mim, só isso.

Parece que isso não é tudo, mas eu aceito o que eles estão
dando. Não preciso de todos os detalhes. O que eu precisava saber
era que não há nada fundamentalmente errado com Sawyer, ou eu
gostar de Sawyer.

Um obstáculo superado.

6
Ter más relações com alguém ou algum grupo.
O segundo aparece na minha frente. Sawyer carrega consigo
uma dor óbvia, elástica o suficiente para permitir que ele se estique
na minha direção, mas o suficiente para mantê-lo preso à fonte.

Quanto mais interações eu tenho com ele, mais eu espero que


algo apareça e leve uma tesoura para isso.
8

Eu amo isto.

Suor escorrendo de mim em córregos, meu cabelo emaranhado


na minha cabeça, grunhidos nada cavalheirescos enchendo o ar.
Leon, meu treinador, segura a bolsa para mim.

Jab, cruzado, uppercut, cruzado, gancho.

— De novo, — Leon vocifera.

De um modo geral, não me dou bem em receber ordens, mas


gosto do Leon. Até respeito o cara. Então eu faço tudo de novo.

Nós terminamos, e pego a alça da minha luva com meus


dentes, rasgando o velcro.

— Você foi bem, — diz Leon, caminhando ao meu lado até o


vestiário. — Houve um pouco de força extra lá hoje. O que foi isso?

Removo minhas luvas e enrolo e flexiono meus dedos. — Acho


que você está imaginando coisas.

— Claro. — Leon ri, certificando-se de que eu saiba que ele


não acredita em mim. Ele acena com a cabeça e sai, indo na
direção oposta.

Tomo meu tempo no chuveiro, pensando no que Leon disse.

Ele não está imaginando nada. Tenho tentado tirar uma certa
mulher da minha mente desde que a vi, e isso é um problema real
para mim. Eu amo Brea, mesmo que ela tenha partido. Vazio e
angústia facilmente sangram um no outro, e eu estive imerso neles
por tanto tempo. Eles são familiares. A dor é dolorosa, obviamente,
mas também pode ser reconfortante. Enquanto dói segurar Brea,
também a mantém perto. Não posso ter um sem o outro.

Mas então... Jessie. Sua força ousada me desarma, e em sua


presença sinto desconforto. Ela sacode o aperto que tenho em meu
coração, a tristeza que uso para manter as memórias de minha
esposa na vanguarda da minha mente.

Waylon me disse que sua família a chama de Calamidade. O


apelido não poderia ser mais preciso.

O que ela está fazendo com meu coração, minha mente e


minha alma, do jeito que ela está desafiando os três simplesmente
por entrar na minha vida?

Eu sei, sem sombra de dúvida, os resultados podem ser


calamitosos.

●●●

Faço o meu caminho de volta para Sierra Grande. A academia


de boxe de Leon está localizada em uma cidade próxima e, embora
Sierra Grande tenha uma academia, prefiro a fisicalidade do boxe.

Eu pulei o café esta manhã, então paro no Marigold's a


caminho do meu escritório. Estou de pé na minha porta de
passageiro aberta, tirando minha carteira da minha bolsa de
ginástica, quando ouço meu nome. Viro-me e vejo Jo e Wyatt se
aproximarem. Jo sorri largo, tão alegre e confiante, mas Wyatt é
muito mais mesquinho com sua saudação. Como de costume.

— Ei, Jo. — Dou a ela um aceno. — Wyatt, — estendo a mão.


Ele a sacode, abaixando o queixo para mim em vez de palavras
reais.

— O que você está fazendo? — Jo pergunta.

— Fiz um treino na academia de boxe e decidi parar para


tomar um café no caminho para o trabalho. Você?

Ela sorri. — Estávamos na escola assistindo Travis receber um


prêmio acadêmico e tomamos um café depois.

— Momento de pai orgulhoso, — respondo.

Wyatt toca o antebraço de Jo e diz: — Você vai contar a ele


sobre a situação da água?

Treino meus olhos em Jo. — Qual situação da água?

Jo envia a Wyatt um olhar irritado. — Tudo está bem.

— Eu sei que você quer resolver o problema sozinha, mas nem


tudo está bem, Jo.

Repito minha pergunta. — Que situação da água?

Jo solta um suspiro irritado. — Como tenho certeza que você


sabe, estamos na maior seca da história do Arizona. Tudo em
Wildflower é tão... seco. — Ela ri, mas o som é vazio. — Eu não
tenho uma maneira melhor de descrevê-lo. Wyatt está preocupado
com o fogo.

— Eu não estou preocupado, — ele emenda. — Acho


inteligente estar ciente da possibilidade, só isso. Há muitas vidas
em nossas mãos e precisamos ter certeza de que temos planos para
todos os resultados.

Jo se vira para Wyatt, um sorriso suave curvando um canto


de sua boca. — Você faz um bom trabalho amando essas crianças.

Wyatt dá de ombros ao elogio, mas vejo quando a mão dele


desliza em volta da cintura dela, a forma como os dedos dele se
curvam sobre seu quadril.

Lembro-me como era. De pé ao lado de Brea em uma festa,


inclinando-se e acariciando o topo de sua cabeça, respirando o
cheiro de seu xampu. É algo que um homem faz quando adora
uma mulher. Um flash de dor apunhala meu peito.

Wyatt olha para mim. — Pode haver uma solução.

— O que é isso? — Pergunto.

— Wes, meu pai e minha irmã foram explorar a fazenda que


faz divisa do HCC.

Meus ouvidos se animam com a menção de Jessie. — O que


eles encontraram?

— Uma fazenda de alfafa. Sugando até a última gota de água


e todo o lote do HCC. E também da Wildflower. Acontece que o
fazendeiro está enfadado e enviando para o exterior.

Assobio, longo e baixo.

— Exatamente, — diz Wyatt. — Minha irmã pediu a ele para


pelo menos parar durante o verão, quando está mais quente.

— Essa foi uma sugestão inteligente. — Não que eu esteja


surpreso. A inteligência de Jessie é óbvia.
— Sim, bem, ele recusou. Aparentemente ele é um idiota. —
Wyatt diz isso mais alto do que provavelmente pretendia, e
algumas senhoras sentadas em um banco do lado de fora da
cafeteria fingem agir ofendidas.

— Onde eu entro nisso? — Pergunto, indo direto ao ponto.

— Compre a fazenda. — Wyatt atira tão direto quanto eu, o


que eu aprecio.

— Essa é uma grande pergunta, — respondo.

— É um grande problema.

Eu corro minha língua ao longo do interior do meu lábio


inferior. — Vou pensar sobre isso.

Nos despedimos e nos separamos.

Pego meu café e vou para o meu escritório, repassando tudo


na minha cabeça. Não tenho intenção de comprar uma fazenda de
alfafa, mas, novamente, não é a colheita que eu compraria. É a
terra. A água. Se eu fizer isso, estarei ajudando Wildflower, claro,
mas ajudaria o HCC também.

Algo que faria Jessie feliz.

Apenas o pensamento disso faz os cantos dos meus lábios se


transformarem em um sorriso. Espero que a culpa acabe com o
momento, mas isso não acontece.

Aguardo mais um pouco, certo de que chegará com atraso.


Mas isso nunca acontece.

Em vez disso, o que sinto é alívio.

E isso me confunde mais do que tudo.


9

Sabia que isso ia acontecer, mas agora que está aqui, quero
fugir.

Entre o dia agitado de ontem no mercado de vendedores e os


sentimentos da minha mãe sobre ver Sawyer, eu evitei a grande
conversa sobre a faculdade.

Mas não por muito. Minha mãe me chamou para a sala e


perguntou por que ainda estou no rancho. E por que tenho tantas
malas no meu quarto.

Endireito meus ombros e olho através da mesa de centro para


meus pais, que estão ambos sentados no sofá à minha frente.
Respirando fundo, digo: — Pediram-me para desistir da faculdade
porque descobriram que eu estava operando uma mesa de pôquer.

Minha mãe pisca com força, repetidamente, até que ela


finalmente fecha os olhos. Meu pai se levanta, seu rosto contorcido
de raiva.

— Jessamyn Janice Hayden, é melhor você estar me contando


a pior piada da minha vida.

— Eu não estou brincando, pai. Desculpe-me.

— Você vai voltar, — ele troveja. Alcançando em seu bolso, ele


pega seu telefone. — Estou ligando para o reitor agora.
Cruzo as mãos no colo, mas tenho o cuidado de manter
contato visual com ele. — Não vou voltar.

Seu lábio inferior treme, e ele olha para minha mãe pedindo
ajuda. Eles estão casados há tanto tempo que ela pode ler sua
mente. Ela diz: — Você precisa se formar na faculdade, Jessie. Isso
é um grande erro.

— Talvez eu faça isso no futuro, ou faça isso online. Como


Warner. — Lanço um olhar para meu pai enquanto espero que ele
me desafie, mas não vou, então continuo. — Mas este rancho
precisa de mim, e eu quero estar aqui. Quero trabalhar.

Meu pai afunda de volta ao lado da minha mãe e joga o telefone


na almofada ao lado dele. — Não, — ele diz, a recusa abafada pela
mão que ele segura sobre a boca.

— Sim, — respondo. Sou muito teimosa para desistir tão


facilmente.

— Jessie, — minha mãe começa, adotando um ar calmo e


proposital. Ela faz isso quando está se preparando para
estabelecer a lei de forma pacífica. Já fui alvo desse método uma
centena de vezes e vi inúmeras outras com meus irmãos. Quando
se trata de mim, ela tem uma taxa de sucesso de cerca de
cinquenta por cento.

— A vida de rancho é difícil, querida. Requer um certo tipo de


amor e compromisso. — Ela olha para o meu pai. — E talvez até
um leve nível de insanidade.

Ele não abre um sorriso.

— Eu cresci aqui, mãe. Já sei de tudo isso.


— Você não sabe do jeito que nós sabemos, Jessie. — A
exasperação aparece em seu tom. — Você era uma criança durante
os tempos mais difíceis. O rancho não é só diversão e jogos.

— Sei disso também, — respondo, cravando meus


calcanhares. — Também sei que você está com problemas agora, e
eu posso ajudar.

— Wes vai lidar com isso, — meu pai diz asperamente.

— Tudo por ele mesmo? — Minhas sobrancelhas levantam. —


Ele vai sozinho entregar água para cada folha de grama na terra
Hayden?

— Temos funcionários, Jessie. Cowboys. Eles ajudam Wes


todos os dias.

— Wes perdeu seu segundo em comando quando Warner foi


ensinar. Wyatt não queria o cargo. Até onde eu posso dizer, ainda
está vazio.

Meu pai franziu o rosto. — Você está me dizendo que quer o


emprego? — Mas ele não está fazendo uma pergunta, não
realmente de qualquer maneira. Ele está incrédulo.

— Sei que sou sua última escolha. Você já desceu a linha de


todos os seus outros filhos.

— Você esteve fora na faculdade.

— Estou aqui agora, — grito. Meu controle sobre meu


temperamento está se tornando tênue.

— Absolutamente não. — A voz do meu pai é profunda e rica,


uma resposta final.
E eu não aceito.

— A última vez que verifiquei, meu sobrenome é Hayden. Isso


me torna tão bom quanto qualquer um dos meus irmãos em ser
um líder neste rancho. Aprendi a andar em solo Hayden como
meus irmãos. Aprendi a atirar aqui, assim como eles fizeram, e
aposto cada fôlego que me resta neste mundo que sou uma
atiradora melhor. — Meu cabelo caiu no meu rosto enquanto
minha cabeça balançava com a veemência de minhas palavras, e
eu o coloco atrás de ambas as orelhas.

Minha mãe suspira e balança a cabeça. — Não é…

Um pensamento bate em mim e eu a interrompo. — Você


nunca pensou em mim durante tudo isso, não é? — Meu olhar voa
dela para o meu pai. — Warner desocupa sua posição, não é
preenchido por Wyatt, e você nem pensa em seu quarto filho? Você
quer ter certeza de que este rancho é administrado por Haydens,
bem, adivinhe? — Aponto de volta para mim mesma. — Você tem
um. Bem aqui. Eu tenho ideias por dias, eu poderia trazer tanto
para este lugar. Você precisa diversificar. Todo o seu sustento é
baseado em gado, mas se você...

A cabeça do meu pai está balançando antes que sua boca se


abra, então eu o venci na sentença.

— Deixe-me adivinhar. Sou jovem. Sou uma mulher, e até


hoje, uma mulher nunca esteve em uma posição de liderança neste
rancho.

— Não, — meu pai diz. Sua palma achatada bate na mesa,


enviando uma onda estrondosa pela sala. — Sim, você é jovem,
mas sempre foi impetuosa. Você faz escolhas imprudentes, como
administrar um jogo de azar em seu dormitório. Você é uma
responsabilidade, e isso — ele aponta um dedo duro por cima da
mesa para mim, e parece um ataque físico, embora não esteja nem
perto de me tocar - … é por isso que você nunca foi considerada
para entrar no lugar de Warner.

Eu posso tomar muito. Opiniões negativas rolam de mim como


uma gota de suor no sol escaldante do verão. Mas isso? Isso pica.

O fogo dentro de mim foi apagado. Estou farta desta conversa.


Minha mão bate no meu joelho enquanto penso no que fazer a
seguir, e rapidamente resolvo uma ideia. — Vou me mudar para a
cabana de Warner por um tempo, enquanto descubro meus
próximos passos.

— Jessie, eu não quis dizer... — As palavras do meu pai


fracassam.

— Sim, você fez. — ergo-me. — E tudo bem. Você disse a


verdade. — Lambo meus lábios, reunindo minha coragem. —
Então aqui está a minha verdade. Eu amo esta terra tanto quanto
Wes. Tanto quanto qualquer um de vocês. E talvez eu tenha vivido
minha vida de uma maneira que os outros consideram impulsiva.
Mas não consigo pensar em ninguém que você contrataria. Para
ajudar Wes que iria sangrar por este rancho. Também sou um
Hayden, e não há nada que eu não faria para manter este rancho.
O que pesa mais? Um punhado de más escolhas, ou meu
compromisso com os mais de cem anos de sangue, suor e lágrimas
de Hayden que saturam esta terra? — Começo a me virar, mas
volto por um segundo e aponto para o brasão da família acima da
lareira. — Legado. Lealdade. Honra. Quem mais incorpora todos
os três valores? Eu não quero uma resposta, papai. Eu já sei. A
verdadeira questão é se você quer.

Vou para o meu quarto, o mesmo quarto que usei como


berçário. As paredes viram três cores diferentes de tinta, mas são
as mesmas paredes que eu olhei com olhos de recém-nascido.

Começo a reembalar o que desembalei quando cheguei. A sala


está vazia quando passo de volta, os braços cheios de meus
pertences. Eu carrego meu carro e dirijo até a cabana de Warner.

Quando chego, percebo que não tenho chave, então deixo tudo
na varanda coberta e volto para a casa. Quando entro no meu
quarto, há uma única chave de casa de ouro no final da minha
cômoda. Eu não preciso perguntar o que ela desbloqueia, ou quem
o colocou lá. Só poderia ter sido minha mãe.

Com a chave guardada em segurança no bolso de trás, carrego


mais coisas do meu quarto. Eu não tenho caixas, então me
contento com mochilas e sacolas velhas. Até tiro os lençóis da
cama, para não ter que lidar com isso quando voltar para o
Warner.

Preciso parar de pensar nela como a casa de Warner. Agora, é


minha. Estou assumindo. Uma apropriação de terras. Se for
preciso, coloco uma bandeira no jardim da frente.

A chave desliza na fechadura e abro a porta com o pé,


mantendo-a aberta e pegando duas malas. Eu entro, de pé no
vestíbulo e olhando ao redor. Warner não levou muitos móveis com
ele, apenas alguns itens aqui e ali. Tenley queria recomeçar juntos,
e eles foram para Phoenix escolher todos os móveis novos.
Encontrei-os para almoçar quando eles estavam entre as lojas.
Ando pela casa e entro no quarto principal. A mobília de
Warner ainda está lá, menos sua coleção de livros. Enquanto estou
aqui, eu tiro os lençóis da cama e os jogo no chão em uma pilha.

Na sala, retiro um quadro da parede e volto para a varanda,


voltando com minha foto favorita.

— Pronto, — digo orgulhosamente para a sala vazia. Eu me


afasto e olho para o desenho a carvão de um eu muito mais jovem
empoleirado em Hester Prynne. Minha mãe tirou uma foto minha,
minha cabeça inclinada, meu chapéu de cowboy bem posicionado
na minha cabeça. Pareço confiante e sublimemente feliz. Wyatt
tirou a foto e a transformou no desenho a carvão para o Natal.
Sempre foi meu presente favorito.

— Agora estou em casa, — sussurro. — A cabana de Jessie.

●●●

Passo a semana seguinte transformando a cabana em minha.


Almofadas e cobertores novos, alguns enfeites de parede baratos e
velas que fazem este lugar cheirar mais floral do que eu preferiria.
Mendigos não podem escolher, e não havia uma grande variedade,
então eu os comprei de qualquer maneira.

Tenho visto minha mãe e meu pai quase todos os dias, e Wes
também. Wes nem perguntou por que eu ainda estou no rancho
em vez de voltar para a faculdade, o que significa que ele não dá a
mínima ou ele está tão preocupado. Meu pai me oferece acenos
concisos e resmunga, e minha mãe jura que nunca o viu tão
estressado. Isso a preocupa, e a mim também. Depois de seu
ataque cardíaco há alguns anos, o estresse é a última coisa que ele
precisa. Neste ponto, estou tentando ficar fora do caminho dele e
ajudar minha mãe o máximo possível com as centenas de tarefas
que ela tem no rancho. Eu gosto de ajudá-la, mas cuidar de cabras
e fazer queijo de cabra não é onde eu deveria estar. Quero estar na
sela. Quero gerenciar as operações.

Ontem eu assisti Wes e os cowboys cavalgando para levar as


vacas para um novo pasto, na esperança de encontrar grama
melhor. Fiquei imaginando que estava lá fora também, e esse
devaneio ainda está na minha cabeça, mesmo agora, enquanto
estou arrumando minhas roupas no armário. Meu telefone no
bolso de trás começa a vibrar, e isso invade meus pensamentos.

Marlowe, de acordo com a tela piscando.

— Olá, melhor amiga, — cumprimento, segurando o telefone


entre meu ombro e minha orelha para que eu possa usar as duas
mãos.

— Você veio para casa no fim de semana passado e não me


contou? — Seu tom acusatório contém mágoa velada.

— Não é como parece, eu prometo. Eu ia ligar para você


amanhã. — Tenho evitado ligar para ela. Não é como se eu tivesse
boas notícias para compartilhar. Pego o telefone antes que meu
pescoço comece a doer pelo ângulo estranho. — Tenho muito para
lhe dizer.

— Está tudo bem? — Seu tom muda para preocupação.


Imagino-a deslizando em torno do 'M' que ela usa em uma corrente
de ouro no pescoço.
— Penso que sim? — Não sei por que isso sai como uma
pergunta, exceto que eu não tenho certeza se tudo está realmente
bem. Tudo parece muito fluido agora, minha vida um líquido
espirrando onde apenas duas semanas atrás era um sólido. —
Você quer me encontrar para uma bebida?

— Você quer dizer este fim de semana? Você já está voltando?

— Ainda estou aqui. — Fico na ponta dos pés para colocar um


moletom na prateleira de cima do armário. — E pare de fazer essa
cara.

— Não estou fazendo careta.

— Você está definitivamente apertando as sobrancelhas


juntas.

Ela exala uma risada. — Você é boa.

— Então, que tal aquela bebida e eu te conto tudo? Estou livre


esta noite. — Na verdade, estou livre todas as noites no futuro
próximo.

— Que tal o Bar N?

Enrugo meu nariz. Estou surpresa que ela tenha sugerido


isso. Sierra Grande tem mais a oferecer do que o celeiro em ruínas
que alguém teve a brilhante ideia de transformar em bar.
Aparentemente, a conversão esgotou toda a sua criatividade,
porque o melhor nome que eles poderiam inventar é tão sem
imaginação quanto parece. É como chamar um cachorro de Cão.

— Porque lá? — Eu pergunto, não querendo ofender minha


melhor amiga desde que tínhamos doze anos. — Que tal The
Chute?
— Eu fui lá no fim de semana passado.

— Bem, eu nunca fui. Fiz vinte e um no mês passado, e esta é


a primeira vez que volto. — Não que eu não tenha tentado minha
identidade falsa no bar mais movimentado da cidade. Os
bartenders eram rigorosos, e depois que eles contaram a Wyatt
sobre minha tentativa de entrar, decidi não abusar da sorte.

Fazemos um plano e desligo. Bebidas no Bar N, e mais bebidas


e comidas no Chute. Antes de me preparar para encontrar
Marlowe, vou dar uma volta. A primeira coisa que vejo quando saio
pela porta da frente é a velha cabana de Wyatt. É um quarto de
milha de distância, e vazia. Ele se mudou para Wildflower para
ajudar Jo a administrar o lugar. Estou feliz como o inferno por ele.
Se alguém merecia encontrar seu verdadeiro amor, era ele. Ele
esperou anos para se sentir tão bem quanto com Jo.

Olho para cima enquanto ando, estudando os pinheiros


balançando, o vento sussurrando através deles. Eles são magros e
tão altos. Em uma delas, vejo uma confusão de galhos, uma
cardeal sentada no centro. Isso me lembra Sawyer Bennett. Eu
gostaria de vê-lo novamente em breve, mas não tenho certeza de
como fazer isso acontecer.

Enquanto observo, um cardeal escarlate entra voando,


acomodando-se na borda do ninho. O chilrear começa, a fêmea o
acolhendo em casa. Observo por mais um momento, depois volto
e vou para minha nova casa para me preparar para ver Marlowe.

●●●
Saí cedo o suficiente para pegar as flores favoritas de Marlowe.
Sua linguagem de amor são presentes, e receber flores a deixa feliz.
Não importa de quem são. Sou mais uma pessoa de atos de serviço.
Uma vez eu disse a Marlowe: Você pode deixar de me comprar um
presente de aniversário, mas espero que me ajude a enterrar um
corpo. Ela me lembrou que é filha do prefeito e tem que manter as
mãos limpas. Não se preocupe, eu disse a ela, porque tenho três
irmãos e um pai que conhece lugares onde um corpo nunca será
encontrado.

Novamente, brincando. Mas também, não realmente. Marlowe


parecia aterrorizada.

Verifico minha maquiagem no retrovisor, passando a ponta do


meu dedo logo abaixo do meu lábio inferior para limpar uma
mancha de brilho labial. Olho para trás na estrada e desacelero
para uma curva. Assim que estou na curva, vejo uma caminhonete
à frente. Está estacionado na estrada, um macaco colocado sob a
parte de baixo para mantê-lo na posição vertical. Há dois homens,
um colocando um pneu novo enquanto o outro rola o pneu
presumivelmente furado e o joga na caçamba do caminhão. Não
há espaço na estrada para passar por eles, porque eles decidiram
trocar o pneu no meio da estrada. Diminuo a velocidade quando
os alcanço e, pelo para-brisa dianteiro, vejo um porta-armas na
janela traseira. E duas armas no rack. Não muito chocante,
considerando que ambos estão vestindo camisas de camuflagem.

Paro. Seus olhos estão fixos em mim, e parece que devo


cumprimentá-los de alguma forma. Tudo sobre eles grita que eles
estão se preparando para caçar na minha terra, e eu tenho certeza
de que eles não estavam indo para o HCC para uma ligação social.

Abaixo minha janela. — Como tá indo? — Sou muito


cuidadosa para manter minha voz uniforme. Forte. Nenhum traço
de cadência feminina. É uma pena épica eu sentir a necessidade
de fazer isso.

— Quase terminando, — diz o trocador de pneus, olhando para


mim. — O que você está fazendo aqui?

— Provavelmente não é a mesma coisa que você.

Ele gargalha. — Não, a menos que você esteja caçando. — Seus


olhos viajam o mais baixo que podem ir, o que não é muito longe
porque estou sentada em um maldito carro, mas sua intenção é
clara, e isso não é tudo o que ele realmente queria? — Estou
começando a desejar que você fosse o jogo.

Minha pele arrepia. Cada célula do meu corpo trabalha em


conjunto para conter minha língua afiada. — Isto é propriedade
privada. Vocês não podem caçar aqui.

— Tenho certeza que está tudo bem, querida. — É o outro


falando. Ele se parece exatamente com o trocador de pneus.
Medíocre.

— Não está bem. Esta é a minha terra. Vocês precisam sair


dela.

Ambos os homens me lançam olhares lentos e preguiçosos. O


trocador de pneus pisa no macaco e abaixa o caminhão. — Você
ouviu isso? — Ele olha para o amigo. — Esta é a terra dela.
Seu amigo ri. — O que você vai fazer sobre isso? Sair desse
carro e chutar nossas bundas?

Claramente ambos sabem que não vou sair do meu carro.


Posso ser impulsiva e impetuosa, mas tenho um forte senso de
autopreservação. Pego meu telefone e abro meus contatos, em
seguida, pressiono o telefone no meu ouvido.

— Oi, xerife Monroe. Aqui é Jessie Hayden. Dois caçadores


estão invadindo o HCC cerca de três milhas acima do desvio da
cidade, e eles se recusam a sair. — Faço uma pausa, mantendo
meu olhar fixo nos homens que agora estão boquiabertos para
mim. — Ótimo, vejo você em breve.

Desligo, mas mantenho meu telefone na mão. Apenas no caso.


— Ele está a caminho. Fiquem à vontade para ficar por aqui se
quiserem uma apresentação.

Acontece tão rápido. O trocador de pneus corre em minha


direção, e procuro o botão para fechar a janela. O tempo diminui,
cada milissegundo quantificável, à medida que o som da janela se
fechando torna-se ensurdecedor. Ele me alcança, levantando a
mão como se estivesse me dando as costas, mas há muito vidro
entre nós agora. — Boceta, — ele cospe em mim, antes de entrar
em sua caminhonete e correr ao meu redor, girando e criando um
círculo de poeira. Meus punhos se fecham e meu coração bate forte
enquanto espero que a nuvem empoeirada se acalme, rezando a
Deus para que eles não estejam lá quando ela clarear.

Eles se foram. Minha expiração é longa e alta.

Minha mão trêmula muda de direção, pensando no que


acabou de acontecer e na minha ideia de fazer um telefonema.
Talvez seja uma boa ideia colocar o número do celular do xerife
Monroe no meu telefone. Apenas no caso.

Tenho certeza que Wyatt tem.


10

Quando chego ao Bar N, já tirei os caçadores da cabeça. Tudo


que quero é uma bebida, e para minha sorte, estou no lugar certo.

Não é divertido pedir uma bebida aqui, agora que posso fazê-
lo legalmente. Há dois anos que entro neste lugar, usando uma
identidade falsa da maneira mais flagrante. A garçonete, Paula,
sabia exatamente quem eu era e que não tinha idade legal para
beber. Mas, como dizia minha identidade, eu era Bailey Johnson,
uma jovem de 22 anos de Ohio.

— Oi Paula. Posso tomar um refrigerante de vodka, por favor?

Ela acena. Sua cabeça está parcialmente raspada, e ela tem a


parte não raspada virada sobre a cabeça e presa para trás com
uma presilha elaborada. — Eu tenho que identificar você.

Entrego minha identidade real. O leve arqueamento de suas


sobrancelhas é minha única confirmação de quão falsa ela sempre
soube que minha identidade anterior era. Paula me entrega minha
bebida e entrego seu dinheiro, então vou para minha melhor
amiga.

Marlowe está sentada em uma mesa distante, de costas para


a entrada. Ela se levanta e seus olhos se iluminam quando me vê.
Ela atravessa mesas e cadeiras, braços abertos e sua bolsa sobre
a mesa. Este não é o tipo de lugar onde você precisa se preocupar
com seus pertences. É tão provável que a pessoa na mesa vizinha
também seja seu verdadeiro vizinho. Então, a menos que você seja
um idiota imprudente que toca música alta no meio da noite ou se
recusa a aparar seu gramado, seus pertences pessoais estão
seguros.

— Ei, senhora adorável, — canta Marlowe, me envolvendo em


um abraço.

Eu sorrio em seu cabelo castanho ondulado. — Ei.

Ela me dá um aperto extra e tento evitar que minha bebida


transborde. Nós nos sentamos à mesa e ela bebe sua cerveja. —
Conte-me tudo, — ela instrui, apontando a boca de sua garrafa
para mim quando ela termina de beber. — Não deixe nada de fora.

Então eu faço. Ela já sabia que estava saindo com Austin, e


ela está quase tão chocada ao saber que ele é marido e pai quanto
eu.

— Não entendo como uma pessoa pode ser tão dúbia. Já é


difícil viver uma vida, quem quer a dor de cabeça de fazer
malabarismos com duas? — Ela faz uma careta. — Você vai contar
para a esposa?

Cutuco o gelo na minha bebida com o canudo vermelho que


Paula incluí-o. — Qual é o ponto?

O nariz de Marlowe enruga. Ela parece desapontada comigo.


— Você tem o dever de salvá-la de um homem que, vamos ser
honestas aqui, é muito provável que seja um namorador em série.
Sem ofensa, — acrescenta ela.

— Nenhuma. Eu sei que não sou especial. — Dói um pouco,


essa pequena verdade. Meu ego preferiria que fosse tão irresistível
que Austin não pudesse deixar de se desviar, mas é muito mais
provável que a emoção fosse a droga.

Marlowe me dá uma olhada. — Você sabe que não foi isso que
eu quis dizer. Claro que você é especial. Eu só não acredito que
você seja a última.

Meu próximo pensamento é nojento, e faz os cantos dos meus


lábios virarem para baixo. — Talvez eu também não tenha sido a
primeira. — É a primeira vez desde que peguei Austin que
realmente me sinto triste. Eu não o amava, mas gostava dele.
Tivemos uma coisa boa acontecendo. Deixo de lado o sentimento
ruim. — Não importa. Acabou agora. Para a frente e para cima. —
Com essas palavras, a imagem de Sawyer surge em minha mente.
Abro a boca para mencioná-lo, mas Marlowe já está falando.

— Ouça, ouça, — ela grita alegremente, batendo o fundo de


sua garrafa contra o fundo do meu copo. — Você terá que
confrontá-lo eventualmente. Quero dizer, você está na classe dele.

Faço uma careta de dentes nus e balanço a cabeça. — Não


mais. — Toda a história se espalha, e várias expressões passam
pelo rosto de Marlowe à medida que a história avança.

— Jessie... — Meu nome é falado como uma exasperação.

— Eu sei, — eu suspiro. — Foi estúpido.

A cabeça de Marlowe se inclina para o lado. — Foi realmente


muito inteligente. Mas muito tolo.

Um sorriso relutante levanta um canto da minha boca. — Foi


divertido. Até que eu tive problemas por isso, de qualquer maneira.

— O que vem a seguir para você?


— Tentando convencer meus pais a me deixarem trabalhar no
HCC.

Os olhos de Marlowe se arregalam e seus lábios franzem. Ela


sabe tudo sobre meus sentimentos quando se trata de como minha
família me vê. — Como vai isso?

— Não tão bem. — reviro os olhos. — E a parte mais


perturbadora é que eles precisam da minha ajuda. — Inclino-me
para frente em meus antebraços. — Ajuda de verdade. A seca vai
afogá-los… — estremeço — … má escolha de palavras. A seca vai
matá-los lentamente. Eles têm que começar a usar aquela terra
para outros propósitos. — Sento-me na cadeira, tentando domar o
fogo que reacende em meu coração.

— Você falou com Wes?

— Ele vai ficar do lado do meu pai.

— Você não sabe disso.

Eu toco o topo de sua mão. — Não o defenda só porque você


tinha uma queda por ele antes de ele se casar.

Ela ri. — Ele não era aquele por quem eu tinha uma queda.

Suspiro. — Você nunca admitiu gostar de um dos meus


irmãos.

— Por que você acha que eu estava sempre dirigindo até lá


para ver você?

— Eu meio que pensei que era pela minha excelente escolha


na música country da velha escola.

— Isso ajudou, — diz ela, encolhendo um ombro.


— Qual irmão?

Seu queixo balança para frente e para trás. — Definitivamente


não vou contar.

— Eles estão casados agora, o que importa?

— Você nunca me deixaria esquecer isso.

— Verdade.

Vou até Paula e pego mais uma rodada, e depois disso


decidimos que estamos mais do que prontas para as batatas fritas
no Chute.

Fica a apenas alguns quarteirões de distância, então


caminhamos. A música nos alcança muito antes de chegarmos às
portas da frente. Marlowe bate seu ombro no meu. Entramos em
uma sala cheia de corpos. Música de alguns alto-falantes
diferentes chove sobre todos. Placas vintage decoram as paredes
de madeira, e o bar fica perto dos fundos. Nós vamos lá primeiro,
e eu peço para nós duas.

O barman pede nossas identidades, e entrego. Ele olha para


ela, olha para mim, e faz isso mais duas vezes.

— O que? — pergunto.

Ele balança a cabeça incrédulo. — Esta é a melhor falsificação


que eu já vi.

Franzo a testa. — Isso é porque é real.

Ele bufa. — OK, claro.

Agora estou irritada. — Isso é.

— Sem ofensa, mas…


— Eu realmente odeio quando as pessoas dizem isso. Você
sabe claramente que está prestes a me ofender, então você já está
se defendendo. — Meus braços se cruzam e espero que ele
responda.

Ele engole dessa maneira, como se quisesse ter certeza de que


sei o quão irritado ele está, mas não pode realmente me dizer
porque ele quer manter seu emprego. — Eu fui para a escola com
Wyatt. Lembro-me quando você o atacou como um cachorrinho.
Você era um bebê. Não tem como você ter vinte e um anos.

Meus dedos se fecham em um punho ao redor da alça da


minha bolsa. Todo mundo no mundo está envelhecendo, por que
eu não estaria também? — Faça as contas, — eu digo, ao mesmo
tempo que uma voz profundamente masculina do bar diz: — Por
que você não liga para ele?

Conheço essa voz. Isso faz meus ombros se curvarem em uma


fração, e meu estômago apertar.

Eu me inclino sobre o bar e olho para baixo. Dois assentos


adiante, com uma cesta de batatas fritas e um copo meio vazio de
vinho tinto, está Sawyer. Ele se apoia em um cotovelo, o polegar
esfregando o lábio superior, e seu olhar se fixa em mim.

Tiro meus olhos dele para que eu possa olhar para o barman.
— Você poderia ligar para ele. Ou você poderia simplesmente
acreditar em mim porque estou dizendo a verdade.

O barman me examina, e leva tudo que tenho para não lhe


mostrar o dedo médio. Isto é ridículo. Então ele pega um copo e
começa a fazer minha bebida. Quando ele coloca no guardanapo
de bebidas na minha frente, ele tem um ar sobre ele, como se ele
tivesse me feito um grande favor e esperasse que eu me sentisse
grata.

Prefiro balançar meu pé no ápice de suas coxas.

Levanto meu copo no ar, pegando o olhar de Sawyer, e aceno


para ele. Ele responde com um gole de seu vinho, um mergulho de
queixo também. E há algo extra, uma intensidade em seus olhos,
um movimento de seu pomo de Adão em sua garganta bem
barbeada. Engulo e quebro nosso olhar, a tempo de ver o barman
dar a bebida a Marlowe sem qualquer pesar.

Ela faz um pedido de batatas fritas, então se vira para mim


com um olhar de desculpas. — Sinto muito, — ela murmura.

— Você é a filha do prefeito, — reclamo. — De todas as pessoas


que ele deveria estar ligando e não acreditando, é você.

Ela enrola um braço em volta do meu. — Desculpe pela sua


sorte. Você é famosa demais para o seu próprio bem.

— Infame, você quer dizer. — escovo a carranca do meu rosto.


— Como está Brix? — pergunto, para mudar de assunto. Brixton
é o sobrenome de um cara com quem crescemos. Ele atende por
Brix, e ele e Marlowe começaram a se ver há alguns meses.

Ela encolhe os ombros. — Ele está bem, eu suponho.

— Não soe tão animada.

Ela sorri em torno de seu canudo. — Ele é chato. E eu não


quero namorar um cara da cidade.

— Isso significa que você terá que realmente se mudar para


fora da cidade para conseguir isso. — aponto, estendendo a mão
sobre o bar e pegando uma fatia de limão de um recipiente de
frutas cortadas.

Marlowe solta um suspiro ruidoso. — Estou ciente.

Nossas batatas fritas chegam e continuamos conversando,


passando dos planos de reeleição de seu pai para o novo bebê de
sua irmã. Eu mantenho minha atenção em Marlowe, que é um
trabalho em si, porque tudo que quero fazer é espiar Sawyer. Não
tenho ideia se ele ainda está lá, porque as pessoas entre nós são
caras grandes e corpulentos, mas eu não o vi se levantar para sair,
então acho que isso significa que ele está lá.

Marlowe boceja enormemente e acena com a mão. — Desculpe,


— ela se desculpa, bocejando novamente enquanto diz a palavra.
— Acabei de bater em uma parede7. — Ela pega o cheque dobrado
do bar. — Deixe-me pegar isso. Você pode pegar da próxima vez.

Ela paga, e eu intencionalmente ignoro o barman quando ele


tenta fazer contato visual comigo. Não sei o que ele quer, mas sei
que não estou interessada.

Nós nos afastamos do bar, e tenho a chance de procurar por


Sawyer. Seu assento está vazio. Tudo foi retirado de seu lugar. A
decepção me enche, como se tivesse perdido alguma coisa.

Estou a poucos passos da saída quando uma mão envolve meu


cotovelo, me puxando de volta suavemente. Eu olho para a mão,
os dedos longos e masculinos enrolados ao meu redor, pele com
pele. Minha carne formigando, o calor correndo onde ele me toca.

7
Gíria para quando você fica sem energia.
Meu olhar levanta, seus olhos cinzas como um ímã. Estamos
mais perto do que nunca. Arrepios ondulam sobre mim, da cabeça
aos pés. Eu não acredito em amor à primeira vista, mas isso? É
algo.

— Você está saindo? — Sua voz é baixa, urgente.

— Parece que sim, — digo suavemente, minha língua saindo


para umedecer meus lábios.

— Jessie? — A voz de Marlowe se eleva na segunda sílaba. —


Você vem?

Olho para minha melhor amiga, suas sobrancelhas


desenhadas em curiosidade confusa.

— Fique. — A palavra calma desliza de Sawyer, caindo sobre


mim.

— Vou ficar por aqui, — respondo a ela. Ela dá uma longa


olhada em Sawyer, então assente lentamente. — Falo com você
mais tarde.

Sawyer dá um passo para trás, sua mão cai, e ele aponta de


volta para o bar.

Eu estava certa quando pensei nele como um ímã, mas isso


não é tudo o que ele é. Há algo nele, como uma veia correndo pelo
tendão, que me lembra um predador.

Essa atração parece primordial. Cru.

Esta é a primeira vez que me vejo querendo ser uma presa.

●●●
Conduzo -nos a uma mesa, escolhendo propositadamente a
que está fora da vista do barman. Ele claramente sabe quem sou,
e prefiro não ser fofoca se puder evitar.

Sawyer sai para pegar outra rodada e volta alguns minutos


depois carregando bebidas. Ele desliza um refrigerante de vodka
na minha direção, e agradeço.

Usando mãos grandes e fortes, ele levanta as mangas de sua


camisa de manga comprida. O tecido se amontoa na depressão do
músculo perto de seus cotovelos. Ele não fala, mas seus olhos
estão nos meus, e seus cílios grossos e com franjas escuras varrem
sua pele com um longo piscar. — Sinto muito pelo que aconteceu
com você mais cedo. — Ele aponta para o bar.

Eu olho por cima, meu aborrecimento queimando. — Alguém


já lhe deu tanto trabalho quando você tentou pedir uma bebida?

Ele esfrega o queixo enquanto considera minha pergunta. —


Eu não acredito.

— É uma merda. — A raiva rasteja em minha voz,


provavelmente mais do que realmente deveria sentir sobre essa
situação. Estou brava com os caçadores, por me tratarem como
eles fizeram. Com meu pai, por não me permitir trabalhar no HCC.

As sobrancelhas de Sawyer se erguem. — Isso é tudo o que


está incomodando você esta noite?

Meu cabelo cai no meu rosto quando balanço minha cabeça,


então eu o pego e coloco sobre meu ombro. Conto a ele sobre meu
pai primeiro e depois sobre os caçadores. Sua mandíbula aperta
durante a minha segunda história, uma de suas mãos se fechando
em punho.

— Desculpe-me, eu não estava lá para ajudá-la. — Ele relaxa.


— Pelo menos estava por perto para ajudar com o babaca do
barman.

Minhas sobrancelhas se mexem. — Você não foi tão útil, para


ser honesta.

Sawyer aperta seu peito. — Você me feriu.

Um sorriso puxa minha boca. — A verdade dói às vezes.

Sawyer coloca dois dedos na base de sua taça de vinho,


girando em círculos e fazendo o líquido vermelho girar. — Você diz
como se soubesse.

— Infelizmente sim. — O cabelo castanho claro e a vibe nerd


de Austin passam pela minha mente.

Sawyer se inclina para frente, aqueles olhos tempestuosos me


capturando novamente. — Me diga mais.

— O que você quer saber?

— Quem te machucou com a verdade?

Isso tudo está parecendo muito pesado de repente, mas ele


está perguntando, e acredito que Sawyer tem algumas verdades
para compartilhar. Talvez se eu lhe contar a minha, ele me diga a
dele.

— Por que deveria confiar em você? — pergunto. Ainda parece


que deveria colocar algum tipo de luta.
— Eu não lhe dei uma razão para não fazer isso. — Sua voz é
profunda, retumbando pela mesa como um mini terremoto.

Gosto dessa resposta. Gosto da ideia de ganhar algo


simplesmente por não ter quebrado ainda.

— Eu estava na faculdade até alguns dias atrás. Estava vendo


meu professor. E eu o peguei. Em flagrante. — Os olhos de Sawyer
se arregalam em antecipação às minhas próximas palavras. —
Com sua esposa.

Sawyer pisca. —Pensei que sabia o final dessa frase. Acontece


que eu não sabia.

Minha risada é oca. — Pelo que vale, não sabia que ele era
casado. — Imagino Austin entregando um bebê pequeno e
empacotado para sua esposa. — Ou que ele teve um novo bebê.

Sawyer suga uma respiração. — Às vezes as pessoas não são


quem se apresentam. O que ele tem a dizer por si mesmo?

Dou de ombros, agindo como se não me importasse, mas a


verdade é que dói. — Eu não o confrontei. Apenas uma mensagem
para dizer a ele que acabou e para não entrar em contato comigo.

— Ele ligou?

Concordo. — Muitas vezes. Deixei ir para o correio de voz.

— Eu diria que ele merece o tratamento do silêncio.

— E mais. Mas estou muito cansada para punir.


Emocionalmente, — acrescento, quando o vejo verificar o relógio.
— Fisicamente, estou bem. Aproveitando minha bebida. — Eu
inclino minha cabeça e sorrio para ele. — Por que você veio para
Sierra Grande?
— Eu precisava de uma mudança de cenário.

Sorrio. — Como pinheiros na encosta de uma montanha com


cardeais?

Ele dá uma risada curta. — Sim.

— Diga-me por que você estava realmente na propriedade do


HCC, Sawyer. Confiei em você com a minha verdade. É a sua vez
de confiar em mim com a sua.

Seu sorriso recua. O lado de seu polegar bate na mesa.


Quando seu olhar encontra o meu, vejo uma dor insuperável
subindo como uma onda. — Minha mãe sofreu um acidente de
carro na estrada que leva ao HCC. Eu não sei exatamente onde
aconteceu, então às vezes eu ando por aí e olho. Eu... — Seu queixo
se move para frente e para trás rapidamente. — Não sei o que estou
procurando. Todas as evidências já se foram. Talvez eu esteja
esperando por um sentimento, como um instinto. - Ele bufa uma
risada vazia. — Talvez esteja procurando algum tipo de evento de
outro mundo, como se ela estivesse me alcançando de onde quer
que as pessoas vão quando morrem. — Ele dá de ombros. — Então,
aí está. Invasão por um bom motivo.

Estendo a mão, passando meus dedos sobre seu antebraço. —


Eu realmente sinto muito pelo que aconteceu com você, Sawyer.
— Não sei mais o que dizer. Nunca ouvi falar de um acidente de
carro tão perto do HCC, muito menos um que resultou em morte.

— Eu realmente sei como diminuir o clima, hein? — Sua


risada vazia flutua no ar entre nós.
Aceno para longe de suas palavras. — Você quer falar mais
sobre sua mãe? Sou uma ótima ouvinte.

Ele balança a cabeça, e vejo a emoção em seus olhos


desaparecer. É como se ele tivesse fechado uma cortina. A tensão
em suas bochechas afrouxa, e a dor em suas feições se dissipa.
Isso me faz pensar quando ele ficou tão bom em empurrar tudo
para longe.

Ele olha para a minha mão, ainda parada em seu braço. É


difícil decifrar o que ele está sentindo neste momento. Devo mover
minha mão? Estou deixando-o desconfortável?

— Eu provavelmente deveria sair, — diz ele calmamente.

Meus lábios se curvam e eu pego minha mão de volta.

Ele empurra o copo vazio para o fundo da cabine e pisca. —


São quase dez. Vou me transformar em uma abóbora se não estiver
de volta ao meu quarto até lá.

— Você está hospedado no The Sierra?

Ele concorda.

— Isso soa deprimente.

— Obrigado, — ele fala inexpressivo. Eu rio.

— Só quero dizer que parece apertado. Eu preciso de espaços


abertos. Se eu tivesse que olhar pela janela para a High Street
todos os dias... — Minha voz desaparece. Não sei como terminar
essa frase.

Sawyer me olha com as sobrancelhas levantadas, esperando.


Quando fica claro que não tenho nada a dizer, ele se levanta. A
música muda, a batida fica mais lenta. — Que tal uma dança? —
Ele me oferece uma mão. — E então eu vou embora.

— Uma dança, — concordo, deslizando do meu lado da cabine.


Balanço um dedo para ele. — Não fique à mão. — Que piada, se
suas mãos flutuassem, eu não faria nada para devolvê-las ao seu
devido lugar.

— Não há mãos errantes aqui, eu lhe asseguro.

Sawyer me leva para a pista de dança. Ele levanta minha mão,


me girando em um círculo lento, antes de colocá-la em seu ombro.
Eu ajusto meu braço, envolvendo-o frouxamente ao redor de sua
parte superior das costas. Ele agarra minha outra mão e a traz em
seu peito.

Ele cheira a sabonete e colônia, e outra coisa que não consigo


descrever. Minha cabeça cai contra seu peito, e ele respira longa,
lenta e profundamente. Minha cabeça muda com o movimento.

Nós balançamos com a música, e eu fecho meus olhos. Sua


mão, ainda na parte superior das minhas costas, começa a se
mover. É apenas o polegar no início, deslizando sobre a minha
pele. Mas então todos os seus outros dedos se juntam, e isso se
torna uma carícia.

Relaxo nele, deixando-o me abraçar. Em toda a loucura dos


eventos recentes, me sinto segura. Sólido e forte. Estou nos braços
de um homem. Não o covarde que traiu sua esposa enquanto ela
carregava seu filho.

Não estou preparada para o quanto eu gosto.


A música termina. Muito cedo, eu acho. O que eu digo é: —
Obrigada pela dança, Sawyer.

Eu o deixo antes que ele possa me deixar. Paro na cabine para


pegar minha bolsa e sair do Chute.
11

Conrad McCafferty. Esse é o nome do fazendeiro de alfafa. Ele


também é um filho da puta.

É uma designação apressada de se fazer, visto que eu só o


conheço há aproximadamente trinta segundos, mas parece certo.

Ele saiu de sua varanda no momento em que entrei. Ele é mais


jovem do que esperava. Na minha cabeça, eu o imaginava como
um homem velho. Ele tem uma cabeça cheia de cabelo castanho,
mas é cortado rente e não parece certo, como se ele tivesse dito ao
barbeiro para usar um quatro e eles acidentalmente usaram um
dois.

Ele é alto, mas acima do peso, seu rosto parece um furão. De


algum lugar da casa, ouço tiros, vozes, comandos militares e
percebo que é um videogame.

— Posso ajudar? — ele diz, com um olhar que diz que ajuda é
a última coisa que ele gostaria de me dar.

Poderia muito bem cortar direto a ele. — Estou aqui para fazer
uma oferta em sua propriedade.

— Não estou interessado.

— Por que não? Você ainda não ouviu meus termos.

Ele me olha desconfiado. — Isso tem alguma coisa a ver com


a vinda dos meus chamados vizinhos?
— Eu não sei de quem você está falando.

— Os Haydens vieram aqui e tentaram jogar seu peso. Odeio


quando pessoas assim pensam que deveriam conseguir o que
querem apenas por serem quem são.

Eu odeio quando as pessoas usam mais do que sua parcela de


água e o efeito a jusante significa que outras pessoas não têm o
suficiente.

Aceno e dou de ombros como se eu não tivesse a menor ideia.


— Não tenho nada a ver com eles. — E por que eles seriam assim
chamados? A terra deles se choca contra a dele. Tenho certeza que
isso os torna vizinhos. — Eu possuo um fundo de investimento
imobiliário chamado Tower Properties. Cheguei a Sierra Grande há
menos de um ano e tenho comprado propriedades e investido.

— Eu não quero me mexer, — diz ele, cruzando os braços como


se estivesse se preparando para uma discussão.

— Por que não? Você está sozinho aqui fora. — gesticulo ao


redor do lugar. — Há muitas mulheres na cidade que adorariam
namorar você. Ou homens, se essa for sua preferência. O ponto é,
você vai ganhar o suficiente para comprar um bom lugar na cidade
e depois nadar o resto, se você quiser.

Ele olha para trás de mim, direcionando seu olhar para a casa
em frente à sua. Seus olhos varrem a estrada, para todas as outras
casas.

É uma configuração estranha. Sua casa é a mais antiga, sua


propriedade a maior de longe. O resto das casas são quase
idênticas umas às outras, pequenos cortadores de biscoito com
jardas uma fração do tamanho dele. Meu palpite é que um
desenvolvedor doméstico entrou e desenvolveu em torno da
fazenda.

— Você não precisa se preocupar com minha vida social. —


Ele coça o antebraço e olha mais uma vez para o outro lado da rua.
— Eu gosto daqui.

— Posso lhe dar meu cartão? Você pode me ligar depois de


pensar sobre isso. Escrevi o preço que estou disposto a pagar no
verso do cartão. — Tiro o cartão do bolso, oferecendo-o como se
estivesse dando um bocado de comida a um animal selvagem. Ele
se aventura para fora da varanda para tirar de mim.

— Entrarei em contato, — digo, recuando. Entro no meu carro


e saio da garagem dele. Do outro lado da casa de Conrad, uma
mulher está no jardim da frente. Duas crianças correm ao redor
de suas pernas, e ela levanta a mão e acena para Conrad. Ele sorri
e abaixa a cabeça, com as mãos nos bolsos.

Eu mudo para o carro, deixando a fazenda, mas meus


pensamentos estão presos atrás de mim.

Alguns minutos com Conrad foram tempo suficiente para ter


um mau pressentimento sobre o cara. Não quero tirar conclusões
precipitadas, mas algo nele é inquietante. Eu gostaria de saber
mais sobre ele, mas dado o quão defensivo ele é, isso não vai ser
fácil.

Minha mão arranha minha mandíbula e eu coço o crescimento


de barba de um dia, minha mente rolando sobre maneiras que eu
posso aprender sobre Conrad.
Então eu me lembro.

●●●

Subo as escadas para a varanda da frente. A porta está


escancarada, a parte de baixo é mantida no lugar por algum tipo
de elevador, e a pessoa com quem vim conversar usa uma
furadeira para aparafusar as novas placas de ataque.

Espero o som agudo cessar e pergunto: — Como você


conheceu meu passado?

Wyatt olha para mim e abaixa a ferramenta elétrica. Subo as


escadas para que estejamos em terreno plano. Ele cruza os braços,
sobrancelhas levantadas, e me avalia, decidindo se deve me dizer
a verdade. Um suspiro escapa de seus lábios enquanto ele espia
de volta para a casa, depois de volta para mim e inclina a cabeça
para mais perto. — Há um garoto na cidade que é muito experiente
em tecnologia para seu próprio bem. Felizmente, isso se alinha
com meus objetivos na maioria das vezes.

Uma pontada de irritação se acende. — Você o fez olhar para


mim?

— Possivelmente. Mas você despertou a curiosidade dele


sozinho com aquele seu carro chique e o jeito que você se veste. —
Olho para minha calça azul-marinho e minha camisa passada. —
Eu não pretendia manter em segredo quem eu era quando vim
para Sierra Grande, mas também não tive muita vontade de
anunciar.
Ele continua. — Você se destaca como um polegar dolorido,
meu amigo.

Franzo a testa, e ele ri. Chega de falar sobre o quão mal eu fiz
um trabalho de assimilação. Pelo menos eu posso montar um
maldito cavalo. — Você pode me conectar com esse garoto?

— Por que?

— Aquele fazendeiro de alfafa. Ele não quer vender, mas acho


que posso cansá-lo. Além disso, algo está estranho lá fora. Ele não
é um fazendeiro, de jeito nenhum.

Suas sobrancelhas se erguem condescendentemente. — Você


pode identificar um fazendeiro?

— Um fazendeiro fica sentado o dia todo jogando Call of Duty?

Wyatt se acalma, beliscando o lábio inferior enquanto pensa.


Ele pega o telefone e me envia o contato. Minha mente corre,
tentando pensar em desculpas para precisar do número de Jessie,
mas não consigo pensar em nenhuma. Eu não posso pedir isso
diretamente a ele. Dada a maneira como ele age sobre todo o resto,
só posso imaginar o quão protetor ele é com sua irmãzinha.

— Diga a ele que lhe dei o número dele. E não o chame de El


Capitan, sob nenhuma circunstância. — Wyatt revira os olhos. —
Ele está tentando fazer disso uma coisa.

Concordo. — Entendido. Qual é o nome dele?

— Eldridge Farley.

Assobio baixo. — Se esse fosse o meu nome, eu também


atiraria no El Capitan.
Wyatt ri. Uma risada genuína, e eu me sinto orgulhoso de mim
mesmo. — Se esse fosse o meu nome, — ele diz, — eu até escolheria
Seymour Butts.

Jo aparece atrás de Wyatt e nos dá um olhar de desaprovação.


— Mantenha suas vozes baixas. Garotos do ensino médio adoram
apelidos estúpidos como esses, e eu não preciso que haja uma
competição sobre quem pode dizer o apelido mais idiota de todos.

Wyatt pisca para ela. — Quem disse alguma coisa sobre um


apelido?

Ela faz uma careta para ele e dá um tapa em seu braço. Para
mim, ela pergunta: — Tudo bem?

Concordo com a cabeça e enfio as mãos nos bolsos da calça.


— Pergunta, Jo. Você acha que eu preciso de roupas novas?

Ela arregala os olhos na direção de Wyatt. — Seriamente?

Ele levanta as mãos como se fosse inocente, mas eu respondo


antes que ele possa. — Ele não disse nada, — eu asseguro a ela.
— Acabei de perceber que me sobressai como um polegar dolorido.

O canto do lábio de Wyatt se curva em um sorriso.

Jo parece que não acredita em uma única palavra da minha


boca. — Eu não acho que você precise de roupas novas,
considerando seu trabalho. Se você trabalhasse em um rancho,
esses tecidos bonitos não duravam um dia.

— Devidamente anotado, — aceno com a cabeça para eles. —


Obrigado, Wyatt. Vou sair do seu cabelo agora.
Assim que saio de Wildflower, ligo para Eldridge Farley. Uso
seu primeiro nome quando ele atende, e ele diz: — Não me chame
pelo meu primeiro nome.

— Desculpe por isso. Wyatt Hayden me deu sua informação


e…

— Você é um amigo de Wyatt?

— Sim. — Com base em seu tom de voz, não tenho certeza de


que seja uma boa coisa. Além disso, identificar-me como um amigo
pode ser forçado, mas nesta circunstância eu vou seguir em frente.

— Ele me chama de El Capitan.

Isso me faz rir. — Ele me disse que você tentaria isso. Que tal
nos contentarmos com Farley?

— Farley funciona. E aí?

Dou a ele o nome completo de Conrad e digo a Farley que


preciso de algo que possa usar contra ele. Ele não concorda até
que eu explique por que estou procurando informações. — Sou um
hacker com uma bússola moral, — explica ele. Ele parece muito
orgulhoso de si mesmo.

Nós concordamos com um preço, depois que ele negocia


comigo mais alto do que eu comecei, mas não tão alto quanto eu
estava preparado para ir.

Desligo com Farley e volto para o meu quarto de hotel. De pé


na janela, olho para a High Street. É hora do almoço, e o lugar está
enchendo. Alguns restaurantes diferentes abriram para negócios,
mesmo no pouco tempo que estive aqui. Talvez eu vá almoçar em
algum lugar. Jessie estava certa. Estas quatro paredes estão
começando a se fechar sobre mim.

●●●

Contento-me com a nova delicatessen, simplesmente porque


há uma fila na porta. Todas essas pessoas devem ter um bom
motivo para esperar na fila.

Uma mulher e seu filho impaciente se aproximam e ficam atrás


de mim. Sei quem ela é, embora nunca tenhamos nos conhecido
formalmente. Uma pessoa não pode viver nesta cidade e não
conhecer um Hayden. Se Jessie não estivesse na faculdade a maior
parte do tempo que estive aqui, tenho certeza de que a teria
conhecido. Olha quanto tempo levei para conhecê-la quando ela
voltou.

O nome da jovem mãe é Dakota, acredito. A esposa de Wes


Hayden. Já a vi na cidade antes, e no mercado local ela coloca em
seu restaurante, mas não Wes. Wyatt me diz que dirige o HCC, e
acho que o rancho é onde ele passa a maior parte do tempo.

A criança que ela segura é jovem, talvez nem dois. Ele quer
descer. Ele quer tocar em tudo. Ele quer comer os dedos depois.

Olho para trás e sorrio educadamente para ela. Ela me oferece


um sorriso de desculpas. — Eles não vêm com manual de
instruções, — brinca. Com base no tamanho e formato de sua
barriga, tenho certeza de que ela está grávida novamente. Não que
eu vá perguntar. Essa é uma daquelas coisas que você não
pergunta a uma mulher.

— Ele não é um incômodo, — asseguro a ela. — Apenas um


garoto ocupado.

A criança, Colt, ela o chamou um minuto atrás, se afasta


rapidamente dela e vai direto para o balcão. Ele não terá problemas
em passar por baixo dela e entrar na cozinha. Ela larga a bolsa e
corre atrás dele. Ela se lança na frente dele, então diz seu nome e
lhe dá um olhar de desaprovação. Ela o levanta e ele luta contra a
jaula que ela formou com os braços.

— Esqueci todos os brinquedos dele em casa, — ela explica


quando volta para a fila. Colt enterra o rosto no peito dela.

Eu olho em volta, então pego um folheto desatualizado de um


quadro de avisos na parede. Amasso e jogo de mão em mão. —
Você quer esta bola, amigo?

Ele não responde, e Dakota diz: — Ele está com deficiência


auditiva. Na maioria das vezes surdo, na verdade. — Ela bate nas
costas dele e ele se vira lentamente, olhando para sua mãe. Não é
até agora que noto o pequeno aparelho auditivo. É a cor exata do
cabelo dele. Entrego-lhe a bola improvisada e ela a pega, depois a
mostra a ele. Ele a pega e amassa ainda mais em seu pequeno
aperto. Ele olha para mim.

— Bola, — digo, apontando para a mão dele. Em seguida,


pressiono as pontas dos dedos de cada mão, com as palmas
separadas, e sinalizo com a bola. — Bola, — repito, apontando para
o papel em sua mão. Faço isso mais três vezes. Seus olhos
permanecem fixos em mim. Ele larga o papel e me imita. Não se
parece em nada com o sinal que fiz, mas esse não é o ponto.

Dakota suspira. — Ele acabou de... você acabou de...? —


Lágrimas brotam em seus olhos. — Oh meu Deus.

Sorrio para o garoto. — Ele é muito brilhante.

A pessoa atrás do balcão pede meu pedido e uma segunda


pessoa se aproxima para ajudar Dakota.

Estou sentado em uma mesa do lado de fora, desembrulhando


meu sanduíche, quando Dakota se aproxima com Colt a tiracolo.
Empurro a cadeira vazia na minha frente com meu pé e faço sinal
para ela se sentar. — Você gostaria de se juntar a mim? A maioria
dos assentos estão ocupados.

— Eu ia levar essa comida para casa… - ela levanta a sacola -


… mas depois do que aconteceu, eu gostaria de fazer algumas
perguntas. Se você não se importar.

— Por favor, — digo, me movendo para o lado e enrolando o


papel pardo em que meu almoço estava embrulhado.

Ela se senta e coloca Colt em seu colo. De sua bolsa ela tira
um pequeno recipiente de fatias de maçã e dá a ele. Ele começa a
mastigar alegremente. Ela respira fundo e estende a mão. — Eu
sou Dakota Hayden. E você é?

— Sawyer Bennett. — vou pegar sua mão para apertar, mas


ela estala os dedos enquanto eu ainda estou alcançando.

— Eu conheço você. Você comprou o rancho de Jo. Jo é minha


cunhada.
Concordo. — Não entenda que eu sou um idiota, mas eu sei
quem você é.

Ela balança a cabeça e dá uma mordida em seu almoço. — Às


vezes esqueço meu sobrenome localmente infame. — Ela mastiga,
engole e pergunta: — Você é fluente em ASL?

Tenho que acenar minha resposta porque estou mastigando.


Eu limpo minha boca com um guardanapo. Antes que eu possa
falar, ela está fazendo outra pergunta.

— Foi difícil aprender? Porque eu procurei aulas para mim e


Colt, mas eles estão todos em Phoenix e são duas horas de carro
de ida e volta, e nós precisaríamos ir o suficiente para que
pudéssemos realmente obter o benefício disso. E eu realmente
quero que o pai dele faça isso também, mas ele trabalha tanto que
não tem como ele fazer isso. — Ela respira fundo e ri,
envergonhada. — Sinto muito. Estou tão aliviada por conhecer
alguém que sabe ASL.

Eu rio. — Está tudo bem. Há quanto tempo você sabe que Colt
é deficiente auditivo?

— Por um tempo. Comecei a perceber que ele não estava


respondendo à minha voz. — Dakota enxuga as mãos com o
guardanapo e olha para o topo da cabeça de Colt. — Nós o levamos
a um fonoaudiólogo em Phoenix, e eles confirmaram.

— Ele está usando um aparelho auditivo, então suponho que


sua perda auditiva seja neurossensorial?

— Perda auditiva mista. Ele vai fazer implantes cocleares em


breve. — Seus lábios torcem enquanto ela fala e eu posso dizer que
há algo mais que ela não está dizendo, algo que a está
perturbando.

Concordo. — Você começou a ensinar-lhe linguagem de


sinais?

— Estou tentando, — diz ela. — Não é fácil.

— Eu sei, — respondo. Lembro-me das aulas que tive à noite,


tentando me atualizar o mais rápido possível. Por mais que eu
tentasse, levei muito tempo para me tornar fluente.

— Você... — ela hesita, mordiscando o lábio inferior. — Você


acha que poderia trabalhar comigo e Colt? Quero dizer, tenho
certeza que você está muito ocupado. É só…— ela corta, e eu
percebo que ela está chorando. — Eu me sinto tão sozinha. Quero
ser capaz de me comunicar com meu filho. E Wes trabalha o tempo
todo, e eu só quero que ele coloque seu filho antes daquele maldito
rancho. — Dakota leva a mão à boca, os olhos arregalados. —
Desculpe. Estou tão envergonhada. São apenas os hormônios da
gravidez falando. Eles são uma bomba. — Ela ri
desconfortavelmente.

— Sem problemas. — Termino meu sanduíche e jogo o papel e


o guardanapo no lixo próximo. — Eu não sou um professor de
forma alguma, mas eu poderia ajudá-la a começar.

— Obrigada. — Ela acaricia a cabeça de Colt. Por mais precoce


que tenha sido na fila da delicatessen, ele agora entrega o mesmo
foco à tarefa de comer.
— Não é um problema. Nunca mais usei sinais, então isso será
bom para mim. Manter a linguagem fresca. — Eu não elaboro
sobre por que eu aprendi ASL em primeiro lugar.

Dakota pergunta onde devemos nos encontrar, e eu digo a ela


que vou ficar em um quarto de hotel. Nós dois concordamos que
provavelmente não é o melhor lugar para nos encontrarmos. —
Esta cidade está cheia de velhas fofoqueiras sem nada melhor para
fazer. Eles vão ter a fábrica de boatos agitando em um instante, e
eu não preciso dessa dor de cabeça.

— Cem por cento de acordo, — digo. Atrair a raiva do irmão


Hayden mais velho é a última coisa que quero. Ainda não o conheci
cara a cara, mas já ouvi histórias. Além disso, há uma Hayden
totalmente diferente que chamou minha atenção.

— Você pode ir para o rancho? — Dakota faz uma careta como


se estivesse preocupada por estar me incomodando: — Dessa
forma, Colt terá todos os seus brinquedos e talvez seja mais
receptivo ao aprendizado.

Concordo novamente, e ela me dá o endereço. Já sei como


chegar lá, graças às minhas caronas, mas não digo isso a ela.
Decidimos o local e a hora, e ela se levanta para ir embora. Seus
braços estão cheios de Colt e a bolsa que ela carrega, então eu jogo
o lixo para ela.

Antes que ela vá embora, ela diz: — Sawyer, eu quase não parei
aqui para almoçar. Eu vi a fila e eu ia continuar dirigindo. Mas
algo em mim me disse para enfrentar a fila com Colt. Estou tão
feliz por ter feito isso. Tenho a sensação de que tudo mudou.
Ela me deixa com essas palavras, e eu me pergunto se ela sabe
o quão profundas elas são. Bastou uma decisão dela, e agora
alguém vai ajudar ela e seu filho a aprender a se comunicar um
com o outro. Bastou uma decisão de Brea e ela se afogou no
oceano. Que decisão estou tomando agora que está afetando o
resultado da minha vida? Estou me permitindo sentir atraído por
Jessie, em vez de vê-la como nada mais do que o sexo oposto.
Ainda assim, eu ainda tenho que obter o número de telefone dela
ou convidá-la para um encontro. Nada parece tangível agora. De
certa forma, ainda sinto que estou flutuando acima de tudo, um
espectador desta vida.

Mas talvez esteja acontecendo de qualquer maneira. Pequenas


escolhas, como afluentes que correm para córregos e,
eventualmente, convergem com rios poderosos.
12

Eu o cutuquei.

O agricultor de alfafa.

Apenas um pequeno empurrão na direção que eu quero que


ele vá.

Depois que Wyatt me disse que Sawyer tentou comprar a


fazenda e o idiota recusou, pensei que talvez pudesse influenciar
o resultado.

O correio foi entregue hoje.

Agora vou colocar meu chapéu de paciência e ver o quão


influente posso ser.

Silenciosamente, claro. Do lado de fora.

Deus me livre de fazer qualquer coisa eficaz à luz do dia.


13

— Estamos trabalhando em uma estratégia de longo prazo que


levará ao aumento do valor do quotista. Nossa equipe apresentou
várias ideias, todas minuciosamente pensadas. Assim começa
nossa apresentação.

Inclino-me para fora da câmera e bocejo silenciosamente.


Reuniões como esta são a pior parte do meu trabalho.

A voz de André continua sem parar, e eu me esforço para ficar


acordado. Ou presente, no mínimo. É difícil quando minha cama
está a apenas alguns metros de distância. Normalmente recebo
ligações assim do meu escritório, mas não consegui sair a tempo
hoje e fiquei preso aqui.

Ele está no meio de sua apresentação quando meu telefone


vibra com uma mensagem de texto de um número desconhecido.

Aceito sua oferta.

Sento-me em linha reta, totalmente em atenção. Tanto para


precisar de Farley para desenterrar sujeira.

Sei de quem é a mensagem, mas para o caso de eu mandar


uma mensagem confirmando que é Conrad. Ele responde
afirmativamente. Escrevo um e-mail para meu advogado,
instruindo-o a redigir um contrato de venda. Não tenho esperança
de ouvir o resto desta ligação agora, estou muito nervoso.

Eu mando uma mensagem para Conrad.


Meu advogado está redigindo os papéis. Vou tê-los para
você o mais rápido possível.

Ele responde com seu endereço de e-mail, me dizendo para


não tentar contatá-lo na propriedade porque ele não estará lá. Ele
se mudou esta manhã.

Que diabos?

O cara se recusa a ceder, e de repente ele está correndo? O


que aconteceu?

— Sr. Bennett, a conexão está ruim?

Volto para a reunião. — Foi, mas está melhor agora. Desculpe


por isso.

André repete sua última pergunta, eu respondo, e passamos


mais cinco minutos discutindo quando deve ser a próxima
reunião. Incrível quanto tempo perdemos tendo reuniões sobre
quando ocorrerá nossa próxima reunião.

Desligo e respiro fundo, então mando uma mensagem para


Farley dizendo a ele para cancelar sua escavação. Adrenalina corre
através de mim. Sempre acontece quando estou à beira de um
acordo. Balanço meus braços ao meu lado, tentando liberar um
pouco da energia. É quase impossível. Devo estar na casa de
Dakota e Wes em algumas horas, e não quero aparecer parecendo
que acabei de beber um bule inteiro de café expresso.

Para ser honesto, não é apenas a energia sobre um acordo


iminente que me deixa hiperativo. Espero ter a sorte de ver Jessie
enquanto estiver no HCC. Eu estava sonhando acordado durante
a ligação com minha equipe, pensando em desculpas que eu
poderia inventar para pedir a Dakota que ligasse para Jessie. Até
agora eu vim vazio.

Decido ir correr, o que normalmente não suporto, mas preciso


fazer alguma coisa com meus membros. Uma trilha próxima
serpenteia sobre o Rio Verde e para os choupos, e é longa o
suficiente para que eu possa correr e ter tempo suficiente para
tomar banho e me trocar antes de sair para o HCC. Eu troco
minhas calças e camisas típicas por uma camiseta e shorts. Eu
amarro meus sapatos, coloco meus fones de ouvido e saio do hotel.

Tenho duas mensagens de voz que preciso ouvir, então começo


minha corrida com elas. Quero tirá-las do caminho para que eu
possa passar o resto ouvindo o tipo de música que vai me manter
correndo. A primeira é minha administradora, perguntando se
posso comprar o almoço para o escritório amanhã.

A segunda é do meu advogado, pedindo detalhes adicionais


sobre o contrato de venda. Ligarei para ele quando terminar minha
corrida. Estou pegando meu telefone para mudar para música
quando ouço. Minha própria voz, vindo pelos meus ouvidos, mas
as próprias palavras são de Brea. Ela me escreveu um bilhete e me
pediu para falar no meu correio de voz. Um dia, ocorreu a ela que
ela nunca tinha conseguido deixar uma mensagem de voz antes, e
ela queria.

Eu tinha esquecido que estava lá. Ou eu me obriguei a


esquecer, não tenho certeza.

— Oi, Sawyer. Esta é Brea. Sua esposa com a bunda bonita. Eu


só quero que você saiba que eu te amo até a lua e de volta. Um dia,
eu vou ter seus bebês.
Minha voz faz uma pausa, e minha risada ressoa no telefone.
Ouço o estalo de um beijo, e então digo, em palavras que são
minhas: — Eu te amo, minha mulher de bunda bonita.

O correio de voz termina. Meus joelhos se dobram. Vou até um


choupo, agarrando seu tronco na tentativa de me equilibrar, mas
é frágil. Então eu agito em vez disso. Meus olhos estão quentes, e
as lágrimas se formam.

Uma mão toca minhas costas e eu pulo para longe.

Jessie está a dois pés de mim, os olhos arregalados.


Preocupação e medo passam por eles. — Sawyer, você está bem?

Eu rasgo meu olhar do dela, enxugando meus olhos no ombro


da minha camisa. — Estou bem, — vocifero.

— Você não parece bem. — Ela ajusta seu peso. Suas


bochechas estão rosadas. Seu sutiã esportivo e leggings me dizem
que ela estava correndo também.

— Por que você está tão longe de casa? — A pergunta luta em


meu peito. É difícil pensar em qualquer coisa além das palavras de
Brea.

— Não posso correr no HCC. Não há trilhas boas. E aqui é


bonito.

Suspiro e olho para os meus sapatos. Ouvi a resposta dela,


mas eu realmente não estou ouvindo. — Eu preciso voltar, — digo
a ela. Pego meu telefone e encontro minha música. — Vejo você
mais tarde, — murmuro enquanto a música enche meus ouvidos.
Ela diz alguma coisa, mas não consigo ouvir porque o volume
está muito alto. Eu posso ter perdido o que seus lábios disseram,
mas não há como perder o que ela comunica com seus olhos.

Ela está preocupada comigo. E curiosa.

Mas acima de tudo, feri seus sentimentos.

●●●

Dakota me manda uma mensagem enquanto estou fazendo a


curva de Sierra Grande para a estrada que leva ao HCC.

Pego meu celular e leio a mensagem. Dakota está me pedindo


para ir para a casa principal em vez da casa dela. Ela se refere a
ele como a herdade. Ela me diz que será a primeira casa que vejo
assim que eu fizer a curva e passar sob a placa HCC. Esta é uma
informação útil, porque sempre que viajo de Wildflower para a
terra do HCC, nunca me aventurei perto da casa de Hayden.

Vou fazer, Eu digo de volta, sem perguntar por que.

Meu estômago aperta com o pensamento de ver Jessie


novamente. Algumas horas atrás eu estava inventando maneiras
de vê-la, e agora estou ensaiando minhas desculpas.

Meus pneus giram sobre a estrada, e eu examino as vistas.


Um lado da estrada é grama, mais amarela e quebradiça do que
deveria ser, e o outro nada além de árvores. Em algum lugar ao
longo desta estrada, minha mãe perdeu a vida, e eu nem sei por
que ela estava andando por aqui.
Meu estômago se revira enquanto dirijo, e penso no modo
como a cozinha costumava ser quando Wildflower era o Circle B.
Minha mãe tinha um prato para seu creme de café em forma de
vaca. Meu peito aperta com a memória. Mesmo uma ferida
envelhecida pode quebrar um coração novamente.

Eu sou nada menos do que grato pelas memórias boas de


minha mãe. Viro à direita, passando por baixo da grande placa de
metal declarando que esta é a Hayden Cattle Company.

A estrada não pavimentada levanta poeira, então eu acelero. A


propriedade se ergue à distância, e o simples fato de eu poder vê-
la claramente daqui mostra o quão grande ela é. Como um sistema
fluvial, há uma estrada que sai daqui, indo para a esquerda, e
trinta metros acima, outra estrada que serpenteia para a direita.
Ambas as estradas desembocam nos pinheiros e desaparecem.

A herdade cresce em tamanho quanto mais me aproximo. É


feita de madeira e pedras ricas, marrom-avermelhadas, com
grandes colunas de pedra que revestem a frente. O telhado é cinza
escuro, uma chaminé de pedra projetando-se para o céu. Algumas
árvores pontilham o jardim da frente, e uma passarela leva de uma
calçada improvisada até um pequeno conjunto de escadas.

Caminhonetes com o logotipo HCC estão estacionadas ao


acaso na frente. Eu paro e adiciono meu SUV à mistura. Como
meu traje nesta cidade, parece fora de lugar.

A porta da frente é enorme, uma aldrava no centro, tenho


certeza, deve parecer intimidadora. Está fazendo seu trabalho.
Estou suficientemente intimidado.
Bato três vezes e espero. A porta se abre, e lá está ela, o batente
da porta superando-a.

Não Dakota, como eu esperava, mas Jessie. Seu cabelo está


úmido, emoldurando seu rosto e um pouco selvagem, e seus olhos
são brilhantes. Ela é linda de coração.

Ela agarra a porta. — Dakota me disse que você estava vindo,


— diz ela, um pouco sem fôlego. Ela muda seu peso e inclina a
cabeça. — Você está bem?

A parte de trás do meu pescoço aquece. — Desculpe-me por


ter brigado com você, Jessie. Você me pegou em um momento
ruim.

— Eu entendi isso, — diz ela lentamente. Ela dá um passo


para trás para me permitir entrar na casa. — Entre.

Entro e saio do caminho da porta enquanto Jessie a fecha. Ela


se inclina contra ela, olhando para mim. Ela usa um top branco
enfiado em jeans apertados. Descalça. Suas unhas estão pintadas
de vermelho. Meus olhos examinam seu corpo lentamente, e eu sei
que ela está me observando. Quando chego ao rosto dela, vejo seus
olhos azuis e calorosos, e ela espera que eu diga alguma coisa. Eu
gosto de como você me deixa beber você.

O canto da minha boca se afasta, arrependido. — Sinto muito.


— Minha voz está baixa. — Eu te devo uma explicação...

— Você não me deve nada. Mas eu vou ouvir se você quiser


falar sobre isso.

Abro a boca, mas ouço meu nome em algum lugar da casa.


Dakota entra na sala. — Sawyer? — Ela olha de mim para Jessie.
— Pelo jeito que você saiu correndo do quarto quando ele bateu na
porta, eu não preciso fazer apresentações?

Olho para Jessie, meus lábios persuadidos em um sorriso por


esta pequena revelação.

Ela sorri. — Nós nos conhecemos antes. Eu estava em um


passeio. Ele estava vindo de Wildflower e nós nos cruzamos.

Dakota assente lentamente. — Certo. Certo. Bem, Sawyer,


todo mundo está aqui

Eu paro. — Todos?

Seus lábios se apertam em um pedido de desculpas. — Eu


meio que esperava que você pudesse mostrar a todos alguns
sinais. Quando eu disse ao meu marido que você concordou em
nos ajudar, ele disse que seria ótimo se Colt pudesse se comunicar
com sua família. Espero que você não se importe.

Ela parece genuinamente preocupada que eu diga não. Deve


ser um inferno se preocupar com seu filho como Dakota se
preocupa com Colt.

— Claro que não, — respondo, sorrindo educadamente.


Normalmente não me sinto nervoso na frente das pessoas, mas os
nervos estão se acumulando no meu estômago. Deve ser o efeito
Hayden.

Jessie toca meu antebraço, e minha atenção volta para ela. A


curiosidade se enfurece em seus olhos.

— Aprendi duas coisas sobre você desde que acordei esta


manhã. — Ela levanta um dedo. — Um, você sabe ASL.

Minhas sobrancelhas levantam. — E dois?


— Algo te machucou. Bem fundo. — Ela bate no centro do meu
peito com dois dedos. — Aqui.

A emoção fica presa na minha garganta, prendendo as


palavras que eu deveria estar dizendo a ela. Tudo o que posso fazer
é engolir a maneira como me sinto ao ver a ternura em seus olhos
e o calor de seu toque.

Desvio meu olhar. Dakota espera pacientemente, e quando eu


começo em sua direção, ela olha ao meu redor e mira em Jessie.
Seus olhos comunicam algo, e aposto que Jessie está
respondendo, usando essa forma silenciosa de conversa.

Dakota me mostra a casa, me levando para a enorme sala de


estar. Dois sofás de couro se enfrentam, uma mesa no centro
ladeada por poltronas estofadas. Uma lareira gigantesca do chão
ao teto se instala atrás de um sofá, as toras do lado de dentro
apagadas.

— Olá a todos, — Dakota acena, chamando a atenção de todas


as pessoas na sala. Reconheço Jo, Travis e Wyatt, junto com Beau
e Juliette. Ela me apresenta a Wes, que tem Colt no colo. Os
próximos são Warner e Tenley, e eu tento o meu melhor para agir
como se conhecer Tenley Roberts (Hayden?) não fosse grande
coisa. Também conheço os filhos deles, mas suponho que os dois
mais velhos são do primeiro casamento. Os acontecimentos em
Hollywood nunca foram minha praia, mas Brea adorava os filmes
de Tenley, e eu me lembro especificamente dela se sentindo
escandalizada um tempo atrás quando o namorado de Tenley a
traiu. A última apresentação é um homem mais velho, e quando
Dakota o chama de Leroy, ele acena com a mão e diz: — Me chame
de vovô. Esse tem sido meu nome por tanto tempo, é como eu
assino meus cheques.

Wes bufa. — Você não assina cheques.

Wyatt dá uma risadinha. — Quem mais usa cheques?

— Vovô, quando ele vai ao supermercado. — Warner entra


nisso.

Todos os três meninos Hayden são recebidos com um dedo


médio velho e enrugado, e eles riem.

— Então, — diz Dakota em voz alta, interrompendo a troca. —


Como vocês sabem, Colt fará sua cirurgia de implante coclear em
breve. Mas mesmo com os implantes, ele pode não ganhar
capacidade auditiva total. O que significa que precisamos
considerar medidas adicionais para ajudar a garantir que Colt seja
capaz de se comunicar conosco, e nós com ele. Sawyer Bennett —
ela gesticula em minha direção, e muitos pares de olhos se fixam
em mim — … se ofereceu para me ensinar um pouco de ASL. E
vocês também, já que vocês Hayden'd meio que entraram nisso. —
Ela olha incisivamente para Wes.

Tenley e Jo riem, e as sobrancelhas de Beau se juntam. —


Hayden'd?

Dakota assente. — É quando você entra em uma situação e


começa a comandá-la.

Ele a avalia. — Isso é uma coisa ruim? Ou boa?

Ela abaixa a cabeça de um lado para o outro. — Isso depende


da circunstância.
Ele faz uma carranca bem-humorada. Seu olhar oscila em
minha direção, e nossos olhos se encontram. A brincadeira
provocante desaparece. Algo nele muda. Ele coloca a mão na coxa
de sua esposa. É a coisa mais estranha, e não consigo explicar por
que a sala de repente parece espessa.

— O que é ASL? — alguém pergunta.

É um alívio instantâneo quando tiro minha consciência do


chefe da família Hayden e encontro a fonte da pergunta. Charlie,
se estou me lembrando bem, filho de Warner. — Língua de Sinais
Americana, — eu respondo.

— Como você sabe a língua de sinais? — É a mais velha de


Warner, Peyton, perguntando de seu lugar no chão ao lado de seu
irmão.

— Conheci alguém que era completamente surda. É a única


maneira de ela se comunicar. — Eu me preparo para a dor
lancinante que atravessa meu coração toda vez que me refiro a
Brea no passado. Ela não aparece, e eu não tenho tempo para
questioná-la.

Começamos com o básico. Eu nunca ensinei ASL antes, então


estou chamando o que me lembro de minhas próprias aulas. Para
o propósito da família Hayden, acho melhor eles aprenderem o que
Colt aprenderá primeiro. Isso significa palavras que o ajudarão a
pedir o que ele precisa. Começo com sono, como, bebo, com fome,
mais, tudo pronto, para cima e para baixo.

Dakota e Wes se moveram para o chão e sentaram-se com


Colt, trabalhando com ele enquanto aprendem. Tento manter
minha atenção em todos os Haydens, ajudando enquanto vamos,
mas estou observando Jessie mais. A ponta de sua língua
pressiona o centro de seu lábio superior enquanto ela se
concentra, e é a coisa mais fofa. Wyatt faz uma piada sobre seu
hábito de fazê-lo, e ela lhe dá um movimento de queixo, um
equivalente ao dedo médio. — Que tal isso para assinar?
Comunicação bastante clara.

Wes revira os olhos e Warner luta contra um sorriso. Tenley,


Jo e Dakota riem abertamente dela. Tenley faz uma piada sobre
como os irmãos podem fazer isso, mas eles não aguentam, e Jessie
joga a cabeça para trás na risada. Seu cabelo cai em cascata pelas
costas, suas bochechas cheias e redondas, e seus olhos estão
fechados. Ela obviamente adora se irritar com seus irmãos.

Eu gosto de vê-la aqui, em seu elemento. Ela é o centro de


gravidade, uma força magnética. Todos na família são atraídos por
ela, e é fácil entender o porque.

Ela é efusiva, uma luz, capaz de trazer um sorriso ao rosto de


alguém. Eu sei que sim, porque agora estou com um sorriso bobo.

A lição continua, principalmente comigo dizendo as palavras


que cobrimos e ajudando a família a lembrar o sinal
correspondente. Apesar do fato de estar me dirigindo a pessoas
diferentes, meu corpo está ciente de tudo que Jessie faz.

A maneira como ela afasta o cabelo dos ombros, balança os


calcanhares no chão e franze a testa quando erra um sinal.

— Tente não se sentir desencorajado se você não consegue


lembrar, ou se certos sinais são mais difíceis de lembrar do que
outros. Neste ponto de nossas vidas, nossos cérebros estão
ajustados em seus caminhos. O centro de linguagem não gosta de
ser desafiado. — Esta é quase uma citação exata da mulher que
dava minhas aulas.

Depois de mais alguns minutos, decido terminar. Há apenas


tanto tempo que uma pessoa pode praticar. O que eles realmente
precisam fazer é usá-lo na vida real. Como a maioria das coisas, é
melhor absorvido em tempo real.

Eu aceno para Dakota e Wes. — Continue com Colt em todas


as oportunidades. Ele vai pegar esses sinais rapidamente. Veja
como ele aprendeu rápido a bola.

Aceno educadamente para a família Hayden, sorrindo e


dizendo de nada quando eles me agradecem. Eu vou sair, e
Juliette, que tem sido a mais quieta de todo o grupo de longe, fala.

— Você gostaria de ficar para o jantar?

Por alguma razão, olho para o meu relógio. Como se eu tivesse


outro lugar para estar. É uma desculpa para uma pausa enquanto
me recomponho, para não demonstrar a surpresa que sinto.
Juliette me deu a nítida impressão de que ela não se importa
comigo.

Ela balança a cabeça encorajadoramente, como se estivesse


me cutucando para dizer que vou ficar. — Estará pronto em trinta
minutos. Tenho certeza de que meus meninos estão prontos para
o happy hour, no entanto. — Ela olha para cada filho, e eles se
sentam eretos quando seu olhar pousa neles.

— Sim, — Wes diz.

— Por que não? — acrescenta Warner.


E então, de Wyatt. — Um pato de uma perna só nada em
círculo?

Jo revira os olhos para ele. — É uma coisa boa que você é


bonito, — diz ela, e ele passa um braço em volta dela e a beija longa
e alto, arrancando gemidos de seus irmãos.

— Chega, chega, — anuncia Juliette, usando uma mão no


joelho de Beau para se levantar. — Cada um por si. Peguem suas
bebidas. — Ela desaparece, suponho, para a cozinha.

Há um aperto no fundo do meu coração. Minha mãe adorava


cozinhar.

Wyatt me traz um uísque. — Espero que você não goste de


bebidas tão chiques quanto seu carro, porque você está sem sorte.
Nada de martinis rosa aqui.

O cara gosta de me dar merda, e eu não me importo. Um


terapeuta provavelmente me diria que tem algo a ver com ser filho
único e sempre desejar um irmão. Eu pego o copo oferecido. —
Uísque funciona.

Na verdade, o uísque não funciona. Para mim, é vinho ou gin


tônica no verão. Eu morreria antes de dizer isso a um dos irmãos
Hayden. Jessie se senta, aninhada nas almofadas do sofá, me
observando com uma risada contida em seu rosto.

Inclino minha cabeça para ela. — O que? — eu digo. Minha


pele arrepia, mesmo a esta distância, o ar entre nós carregado de
eletricidade.

Ela sorri e balança a cabeça, os olhos semicerrados. Seus


olhos caem para o copo que estou segurando. — Onde está minha
bebida? — ela pergunta, talvez para Wyatt, mas também para
talvez ninguém em particular.

— Você precisa fazer vinte e um anos, Calamidade. — É


Warner falando, sentado com seus próprios dois dedos de uísque.

— Eu já tenho, idiota.

Ele aponta para seus dois filhos mais velhos. — Você se


importaria de observar seu idioma?

— Você se importaria de não falar comigo em um tom


patriarcal? Aposto que você fazer Peyton tolerar ou esperar isso de
um homem é muito mais prejudicial do que um palavrão que ela,
sem dúvida, ouviu inúmeras vezes.

Warner levanta as mãos. — Eu vou sentar perto da fogueira.


— Ele sai, e um por um todos vão saindo.

Wyatt, o último a sair, dá um tapinha nas costas de Jessie. —


Você com certeza sabe como limpar um quarto.

Ela cruza os braços. — Não estou errada.

Ele para e olha para ela. — Não. Você não está errada, Cal. —
Ele lhe dá uma bebida. Não um vinho branco, como ele serviu para
Tenley e Jo, mas um uísque. Ele dá a ela com uma piscadela. —
Você é foda. Não se esqueça disso.

Ela pega o copo e ele se afasta. Seus olhos estão sobre ele
enquanto ele vai. — Ele é o meu favorito, — diz ela, quando ele
desaparece de vista.

— Seus outros irmãos sabem disso?

— Indubitavelmente.
Engasgo com o líquido âmbar que acabei de engolir. — Essa é
uma palavra de dez dólares.

— Eu fui para a faculdade, — diz ela, sua piada entregue em


um tom elevado. Seus olhos deslizam para longe, como se ela
estivesse pensando em algo.

— O que? — pergunto, falo sem som com a boca.

Ela balança a cabeça. — Não é nada. — Ela fica. — Idiotas ou


não, você quer se juntar aos meus irmãos lá atrás? Wes é bom em
ferraduras, mas isso é só porque ele fica quieto enquanto joga e
todo mundo fala merda. Mantenha sua boca fechada e isso vai
deixá-lo louco.

— Um sim. — concordo. — Mostre-me o caminho.

Ela se aproxima, e eu fico parado. Estou enraizado no lugar,


hipnotizado pelo balanço de seus quadris naquele jeans escuro, a
curva de sua cintura naquela regata branca. Ela para perto de
mim. Sua risada escapa apenas de um lado de sua boca. — O que?
— ela pergunta, quase timidamente. Não é uma qualidade que
pensei que Jessie pudesse possuir.

— Você é muito bonita, — digo baixinho. Digo isso como uma


admissão, embora qualquer pessoa com olhos totalmente
funcionais possa ver por si mesma. O que eu gostaria de dizer é
que seus olhos combinam com a cor do mar em determinada hora
do dia, quando o sol está baixo no horizonte. E que a pele dela é
polida do mesmo jeito que vi em garotas surfistas, provando que
as mulheres da Califórnia podem não ser tão diferentes das
mulheres do Arizona. O sol beija os dois.
— Por que você diz isso como se fosse uma coisa ruim? — Ela
está diretamente na minha frente, seu ombro a apenas alguns
centímetros do meu peito.

— Você me assusta, — admito. Seria bom se tivesse algum


sentimento de orgulho, mas parece que me abandonou.

Ela gira, seu olhar bravo em cheio. — Sawyer Bennett?

Eu engulo e aceno.

— Você também me assusta.

Então ela sai. E que escolha tenho a não ser segui-la?

Janto com a família Hayden. Gosto imensamente da


companhia deles. Muito? Os irmãos dão um ao outro uma grande
porção de merda, mas está claro por baixo de tudo o quão
profundamente eles se amam. Felicidades a qualquer adversário
que decida enfrentar os quatro.

Durante o jantar, Wyatt menciona a fazenda de alfafa. Estou


com alguns uísques cheios até então, então eu declaro: — Eu
comprei.

As vozes ficam quietas. O som de garfos raspando pratos é um


som solitário na sala. — Você comprou a fazenda de alfafa? — Beau
pergunta.

Concordo. — Meu advogado está redigindo todos os papéis e


vamos assinar amanhã. Não se preocupem, — acrescento, — estou
encerrando as operações. Tanto o HCC quanto o Wildflower
receberão sua cota de água.

Beau se levanta, indo para a despensa da cozinha. Wes


assobia, baixo e lento.
Wyatt esfrega as palmas das mãos. — Esperei minha vida
inteira por isso.

Beau volta com uma garrafa. Macallan 25. Ele carrega dois
copos. O rosto de Wyatt cai.

— Sawyer. — Beau diz meu nome e nada mais. Ele despeja o


uísque em copos frescos, empurrando um na minha direção. —
Gostaria de agradecer pessoalmente pelo que você fez pelo HCC.
Podemos ser um benfeitor inadvertido, mas isso não diminui
minha gratidão.

Eu aceno, oprimido. — Senhor, — começo, mas ele me


interrompe.

— E obrigado, por esta tarde. Por vir aqui e nos mostrar como
se comunicar com meu neto. — Ele engole em seco, e eu tenho a
sensação de que fui deixado em uma exibição secreta de um
emocional Beau Hayden.

— O prazer é meu, senhor.

Ele bebe o uísque, e eu sigo o exemplo. Gostaria de possuir


uma paleta mais refinada, para poder apreciar adequadamente o
sabor. Ele recoloca a garrafa na despensa. Wyatt me cutuca. —
Que porra é essa, cara? Nenhum de nós tem permissão para ter
essa merda. Ele a guarda para ocasiões especiais.

Jessie coloca as mãos nos meus ombros por trás, e é tudo que
posso fazer para não inclinar minha cabeça de volta para ela. —
Acho que você não é tão especial.
Ele lhe envia um olhar sujo, então me oferece uma mão. —
Obrigado, — diz ele, apertando minha mão. — Para garantir que a
Wildflower tenha o que precisa para operar.

Estou sobrecarregado. Não fiz nada de extraordinário. Fiz o


que era decente.

Juliette serve a sobremesa, um bolo de biscoito gelado que ela


disse ser a receita da mãe de Beau, e voltamos para fora. O
Macallan 25 desce suave. Assim como o próximo uísque que Wes
serve para mim. Beau e Juliette vão para a cama muito antes de
sairmos da lareira a gás. Os casais se separam, um por um.
Primeiro é Warner e Tenley, que têm o caminho mais longo para
casa. Os próximos são Wyatt e Jo, depois Wes e Dakota.

Jessie olha para mim. Ela está cansada, pisca longa e


lentamente, seus cílios roçando sua pele.

— Você está bêbado, — diz ela, girando uma chave para


desligar a fogueira.

— Não, eu não estou. — Eu não estou bêbado, por si só. Mas


eu definitivamente não deveria estar dirigindo.

Ela inclina a cabeça, me considerando. — Você pode pelo


menos me seguir até minha cabana?

Concordo. Isso eu posso fazer.


14

O passado sempre voltará para assombrá-lo.

São ditados como esse, entre outros, que não parecem reais.
Até que eles apareçam em forma humana, de pé na frente de sua
barraca de queijo de cabra e olhando ansiosamente para sua única
filha.

Sawyer se parece com sua mãe em alguns aspectos. Ele tem o


lábio superior cheio, com um pronunciado arco de cupido. E seus
longos cílios. Além disso, ele é filho de seu pai.

— Tenho certeza que não foi fácil. — Beau vem atrás de mim
em nosso banheiro, colocando o queixo no meu ombro. Seus
braços se entrelaçam em minha cintura, seu olhar procurando o
meu no espelho.

Mesmo depois de todos esses anos, o arrependimento aparece


instantaneamente. Apesar do que aconteceu há tanto tempo, meu
marido é um homem leal. Essa lealdade se estende até mesmo ao
seu remorso. Ele nunca estará livre disso. Eu o perdoei. Perdoar a
si mesmo é uma besta separada.

Eu olho para trás para meu marido de quase quarenta anos.


A pele de Beau carrega as marcas do estresse e do tempo passado
sob o sol muitas vezes brutal do Arizona. Seus pés de galinha e
vincos na testa têm residência permanente em seu rosto. Assim
como o meu. Parece-me agora, provavelmente por causa do
ressurgimento de Sawyer em nossas vidas, que nosso casamento
está tão desgastado quanto nossa pele.

— Fiz o que esperava que alguém fizesse por um dos meus


filhos se a situação fosse inversa. — Eu estava distraída durante
toda a aula de ASL, considerando se deveria convidar Sawyer para
jantar.

Afrouxando o aperto de Beau na minha barriga, eu me viro


para ficarmos cara a cara. — Ele estar aqui criará um problema
eventualmente. Você viu o jeito que ele olha para Jessie? — Meus
braços envolvem seu pescoço e eu o deixo me puxar para perto.
Ele precisa me abraçar tanto quanto eu preciso ser abraçada por
ele.

— Eu teria que ser cego para não perceber. — A voz de Beau


cai sobre mim, e um arrepio desliza pela minha espinha.

Mesmo depois de todo esse tempo, através de pequenas


transgressões e dos erros mais colossais, Beau mantém meu
coração.

— Como você está se sentindo? — pergunto.

Ele pressiona sua testa contra a minha. — Como se você fosse


um anjo.

Consigo um sorriso. — Você é um doce, mas não é a isso que


eu estava me referindo.

Ele respira e exala uma corrente de ar quente de seu nariz. —


Como se uma bomba tivesse sido jogada no centro da minha
família, e estou esperando que ela exploda.
— Eles vão ficar bem, sabe? Se a bomba explodir. Nossos filhos
vão passar por isso.

— Eles não deveriam precisar. — O arrependimento se foi,


substituído por desgosto.

Dou de ombros. — É tarde demais para isso. — Você não


deveria ter feito o que fez naquela época. Eu não digo isso. Não vai
ajudar a situação. E comentários como esse também não me fazem
sentir melhor.

— Vamos. — Saio de seu abraço e ele me segue até nossa


cama. Entramos e deslizamos para debaixo das cobertas. Ele
estende a mão para mim, me aconchegando em seu peito.

Fizemos nossos bebês neste quarto. Lutamos e amamos,


discutimos e consolamos. Essas paredes nos viram através de
alguns de nossos melhores e piores momentos. Elas continuarão
a fazê-lo.

A semente que Beau plantou há mais de vinte anos finalmente


brotou. O que virá disso é uma incógnita. Rezo para que Jessie não
seja a mais atingida quando a verdade vier à tona.

Com toda a honestidade, como ela pode não ser? Afinal, o filho
da amante de Beau, há muito falecida, está crescido e está de olho
em nossa filha.

Se isso não é justiça poética, não sei o que é.


15

Ela está tentando ficar quieta, mas eu a ouço de qualquer


maneira. O baque suave e abafado de pés descalços pisando no
chão de madeira. Ela não se aproxima, e eu não me movo para
espiar por cima do encosto do sofá. Gostaria de vê-la, no entanto.
Seu cabelo provavelmente está bagunçado. Talvez esteja um pouco
enrolado nas costas, rosnados suaves pelos quais ela ainda não
passou uma escova. O farfalhar do tecido flutua no ar enquanto
ela se move. Talvez ela use pijamas combinando. Talvez ela use
uma camiseta grande demais.

Faz muito tempo que não ouço esses sons. Eles não eram
especiais, ou notáveis, até que deixaram de existir. Eu não sabia
que sentia falta deles até agora, ouvindo Jessie fazê-los.

Há um puxão no centro do meu peito, um puxão rápido do


órgão que mantenho trancado. Não quero pensar em Brea. Eu não
quero machucar. Quero pensar em Jessie.

Deito no sofá, ouvindo os sons do café sendo preparado,


percolando e fermentando. Minutos depois, o cheiro vem da
cozinha.

Empurro-me para sentar. A cabana é um conceito amplo, e


posso ver diretamente onde Jessie está. Com uma mão apoiada na
borda do balcão, ela fica na ponta dos pés e alcança um armário
mais alto. Sua camisola curta, amarelo-claro, sobe pelas pernas,
revelando coxas bronzeadas e tonificadas e a curva inferior de sua
bunda.

Eu pisco e desvio o olhar, uma pontada de culpa rastejando


através de mim, como se eu tivesse visto algo que não era para
meus olhos. De pé, eu me abaixo e pego o cobertor que usei na
noite passada, dobrando-o. O movimento chama a atenção de
Jessie. Nossos olhos se encontram, e mesmo do outro lado da sala,
sinto seu desconforto.

— Você gostaria de um pouco de café? — ela pergunta, sua voz


tensa, apontando para as canecas que ela colocou no balcão.

Aceno, contornando o sofá e me aproximando. — Sim por


favor. — São minhas primeiras palavras do dia, e soam ásperas.
Eu limpo minha garganta. Jessie pega um copo, desta vez de um
armário que não exige que ela se estique, e serve um copo de água
para mim.

— Obrigado, — digo a ela, bebendo metade do copo em um


gole.

— De nada, — ela responde. Seu olhar estava no meu pescoço,


mas agora ele levanta para encontrar meus olhos. — Você está
bem?

Concordo. — Eu não costumo beber muito, mas estou bem.

Sua cabeça balança. — Eu estava me referindo a você


acordando aqui. Não sabia como você se sentiria sobre isso.

Oh.

Ela continua. — Você só parece... hesitante às vezes. Dois


passos para frente, um para trás. — Seus olhos se contraem e sua
cabeça se move para frente e para trás em movimentos rápidos e
minúsculos. — Desconsidere isso. Não foi uma reclamação. Você
tem o direito de fazer o que precisa fazer. — Ela se vira, servindo
café em duas canecas. Ela adiciona meio a meio ao dela, e quando
ela estende a caixa para mim, eu aceno para longe. — Não,
obrigado.

Ainda estou digerindo seu comentário mais recente. Eu tenho


o direito de superar esses novos sentimentos por uma mulher que
não é Brea tanto quanto Jessie tem o direito de saber sobre ela. Se
eu contar a ela agora, isso escurecerá este momento, talvez até
mesmo lance sua sombra sobre tudo o que se desenvolve entre
nós. Como não poderia?

Estudo as curvas suaves de Jessie, a cavidade de sua


garganta, a subida e descida de seu peito. E decido não contar a
ela. Ainda não.

Ela caminha até uma abertura ao lado da cozinha, e eu a sigo.


Através dele há uma pequena sala de lama8, a lavadora e secadora
em frente a uma bancada com uma bandeja para botas embaixo
dela. Ganchos se agarram à parede, mas nada fica pendurado
neles. Outra porta leva para fora, e saímos para o ar da manhã.

Pinheiro fresco e limpo. Sujeira e sol. É primavera e as manhãs


são frias. O vapor sobe de nossas xícaras de café e me transporta
de volta no tempo, para um lugar não muito longe daqui, quando
eu era criança e a vida era boa.

8
Área para remover os sapatos.
Silenciosamente, eu inalo tudo. O cheiro do rancho, o ar frio e
as lembranças quentes. Absorvo todos eles. Faz tanto tempo desde
que eu tive uma manhã como esta, e assim como os passos suaves
de minha esposa, eu não sabia o quanto eu amava até que ela se
foi.

— É lindo aqui fora. — Eu tomo um gole do café preto quente.

Jessie olha para mim. — Você se lembra muito de morar em


Wildflower? O Circle B, quero dizer? — Um pouquinho de sono está
com crostas no canto do olho esquerdo, e isso a humaniza. Ela é
tão audaciosa, tão autoritária, que é fácil pensar que ela é algum
tipo de princesa guerreira de outro mundo.

— Por muito tempo afastei as memórias, mas desde que voltei


para Sierra Grande, algumas delas voltaram. — Tomo uma bebida.
— Algo dentro de mim sempre ansiava por essas visões. Esses
cheiros. — gesticulo para a paisagem. — Isso parece onde eu
pertenço.

— Foi assim que me senti quando me mudei para a faculdade.


Este rancho significa tudo para mim. — Ela olha de volta para a
parede de árvores ao redor de sua casa. Seu cabelo não está
bagunçado do jeito que eu imaginei quando a ouvi pela primeira
vez se movendo. Está enrolado no topo de sua cabeça em um
coque, e isso a faz parecer mais alta do que é. Nossos ombros estão
quase se tocando, e eu sinto o movimento do ar quando ela leva a
xícara à boca. — O que significa tudo para você, Sawyer?

Uma pergunta tão boa. — Não tenho certeza. — Quando


cheguei aqui, havia algo que significava tudo para mim. Alguém.
Mas agora temo que algo mais esteja começando a se tornar
importante. E agora que alguém está escapando, escoando pelas
rachaduras em meus dedos.

— Nunca tive dúvidas. — Jessie olha de volta para mim com


aquele olhar firme e claro. — O HCC é meu primeiro amor. Será
meu último amor.

Concordo. Entendo a devoção singular.

— Você tem um dia ocupado pela frente, eu estou supondo?


— Ela interrompe a conversa pesada com uma pergunta básica: —
Comprando propriedades e salvando fazendas sozinho?

Eu aceno e sorrio para seu tom de provocação. — Sim, eu sei.


É melhor ir lá.

Sua boca se abre para falar, mas é interrompida pelo estalar


de galhos, pelos passos pesados de botas. Os olhos de Jessie se
arregalam, mas ela respira fundo e endireita os ombros. Oh merda.
Eu sei como é essa cena.

Beau e Wes viraram a esquina da cabana de madeira. Ambos


os homens param de repente quando nos veem, então continuam.

— Olá, — eu os cumprimento primeiro, tentando soar o mais


inocente possível.

A boca de Wes forma uma linha dura e reta. A expressão


amigável da noite anterior está tão ausente de seu rosto quanto o
copo de uísque de sua mão.

Beau olha de mim para Jessie. Sua expressão é impossível


para mim ler. A essa altura, ele deve estar pensando que eu dormi
com a filha dele. Abro minha boca para dizer a ele que é
simplesmente um caso de ter bebido demais na noite passada, mas
Jessie fala primeiro.

— Eu não aprecio o jeito que vocês dois estão olhando para


mim. Sou uma adulta. — A raiva vibra em suas palavras, seus
movimentos de mão, talvez até sua respiração.

A mandíbula de Beau aperta. — Cristo, isso de novo? Todos


nós sabemos sua idade, Jessie.

— Você? — Ela dá um passo em direção ao pai. Sua camisola


balança em torno de suas pernas. Eu não posso deixar de admirá-
la, a maneira como ela se levanta e desafia seu pai quando ela
acredita que ele está errado, e que ela não dá a mínima para o que
está vestindo.

— Diga-me, pai. Quando você tinha vinte e um anos, o vovô foi


à sua casa e julgou você do jeito que você está me julgando agora?
Ou ele deu um tapinha nas suas costas mais tarde, um parabéns
silencioso por ter transado?

Beau me fixa com um olhar duro enquanto Jessie


praticamente confirma o que ele supõe, mas não poderia estar
mais longe da verdade. Tanto para as incursões que fiz com ele na
noite passada. Ele olha de volta para ela. — Você precisa tomar
cuidado com sua boca, mocinha.

— Por que? — Seu tom é mais calmo agora, mas ela é ardente.
— Por que você quer que eu cuide da minha boca? Porque eu estou
deixando você desconfortável?

Wes esfrega a ponta do nariz. — Tudo isso é desconfortável,


Jessie. — Ele olha incisivamente para o que ela está vestindo.
— Então? Você veio aqui para me encontrar. Para minha casa,
onde eu estava tomando café e apreciando a vista com Sawyer. Se
isso te deixa desconfortável, não é problema meu. Não é meu
trabalho ajustar meu comportamento para atender ao seu nível de
conforto. Especialmente não quando estou em minha própria casa.

— Este é o lugar de Warner, — resmunga Beau.

— Não mais, — Jessie balança a cabeça. — É meu. — Ela olha


para os dois homens, desafiando-os a continuar.

Wes está à altura da ocasião, encarando Jessie na mesma


medida. Ele se eleva sobre ela, mas sua aura é tal que ela é igual
a ele.

— O que você queria, Wes? Você veio aqui para me encontrar.

Ele enfia a mão no bolso de trás. Ele desdobra uma mala postal
de cores vivas e brilhantes. — Você sabe algo sobre isso?

Os lábios de Jessie se apertam. Wes balança a mala direta no


ar. Não consigo ver o que diz, mas com certeza reconheço a
imagem.

— Posso ver isso? — pergunto, com a mão estendida.

Wes me dá.

— Que diabos... — minha voz falha. É o agricultor de alfafa no


que parece ser uma foto policial. O texto grande e em negrito ao
lado dele diz: Este homem é um criminoso sexual registrado.
Abaixo está um endereço de site.

Agora faz sentido. Por que ele me vendeu de repente. Por que
ele saiu da cidade. Viro-me para Jessie.
— Você fez isso?

Sua expressão é estoica. — Senti que era meu dever garantir


que as pessoas que moravam perto dele soubessem do risco que
ele representava.

Penso na mulher do outro lado da rua. Agora não tenho certeza


se ele tinha uma queda, ou estava pensando em algo mais sinistro.
Meu estômago se revira com o pensamento.

— E se ele fosse simplesmente um homem que teve um


relacionamento com um rapaz de dezesseis ou dezessete anos
quando ele tinha dezoito? — Wes pergunta a Jessie. — Isso
acontece também, você sabe. E se a garota tivesse um pai
chateado, e ele prestou queixa, — ele dá de ombros com um ombro.
— Boom. Delinquente sexual registrado.

Jessie junta o cabelo com uma mão, depois o deixa cair. —


Infelizmente, não há como saber os detalhes do crime, apenas o
endereço do infrator.

Wes olha para ela como se não acreditasse em suas palavras.


— Você pode ter arruinado a vida dele, Jessie.

Ela bufa. — Dificilmente. Ele vai se mudar para outro lugar e


registrar seu novo endereço como deveria. E o HCC e Wildflower
vão ter sua água novamente, graças a Sawyer. Problema resolvido.

Wes deixa de lado a exasperação e sorri de má vontade. — Você


é malditamente louca da melhor maneira, Calamidade. — Ele
esfrega a nuca. — Você se importaria de vir para a herdade esta
manhã? Eu gostaria de ouvir algumas de suas ideias.
Jessie acena com a cabeça, mordendo furtivamente o canto
interno do lábio. Acho que ela está tentando esconder sua
empolgação.

Wes me dá um olhar de soslaio. — Nós vamos sair agora.


Obviamente nós assumimos que você estava sozinha quando
entramos aqui.

— Sem problemas, — Jessie diz levianamente, ainda sem


aproveitar a oportunidade para esclarecer por que estou aqui, e
adoraria saber por que. Estou prestes a falar, mas pensei melhor
e mantenho minha boca fechada. Ela deve ter um motivo.

Beau e Wes se despedem e vão embora.

— Você enviou essas malas diretas? — Já sei que ela fez, mas
tenho que perguntar novamente porque não é algo que eu pensaria
em fazer.

— Enviei um para cada pessoa que mora em sua rua.

— E tudo que você fez foi procurá-lo naquele site?

Ela acena. — Tive um mau pressentimento sobre ele naquele


dia em que entramos em sua propriedade. Chame isso de intuição
feminina.

— Incrível. — coço a barba na minha mandíbula. — Por que


você deixou seu pai e Wes pensarem que dormimos juntos?

— Por um lado, não é da conta deles o que eu faço na


privacidade da minha própria casa. Por dois motivos, eu não
preciso proclamar minha inocência. Dormir com você não
significaria que eu fiz algo ruim, então por que eu fiz isso? preciso
garantir que eles saibam que eu não fiz isso?
Eu esfrego meu queixo. — Esses dois pontos são válidos.

— Muito obrigada. — Ela pega minha caneca vazia e entra.

Vou para o sofá que era minha cama ontem à noite e coloco
minhas meias e sapatos. Jessie caminha comigo até a porta da
frente.

Faço uma pausa no limiar, olhando para ela. Com cuidado


para evitar que meus olhos se desviem pelo corpo dela, digo: —
Obrigado por me deixar ficar aqui. Dirigir teria sido uma má ideia.

Ela estende a mão. — Me passa seu telefone.

Pego meu telefone do bolso e o entrego. Ela abre uma nova


mensagem de texto e começa a digitar.

— O que você está fazendo?

— Não me interrompa, — ela sorri maliciosamente para mim,


então olha para baixo e continua digitando. — Estou muito
ocupada agora. — Ela aperta enviar. Um ding abafado vem de sua
bolsa na mesa da cozinha.

Ela me devolve o telefone e abre a porta da frente. — Tenha


um ótimo dia. Vejo você mais tarde.

Olho para ela com suspeita no meu caminho pela porta, e ela
me dá um sorriso largo. — Tchau, — ela diz brilhantemente. A
porta se fecha.

Balanço minha cabeça enquanto desço os três degraus e saio


para o meu carro. Uma vez que estou dentro, pego o telefone e olho
para as minhas mensagens, depois rio. Ela mandou uma
mensagem para si mesma, dizendo Oi, Jessie. É Sawyer. Jantar
amanhã à noite? Eu te pego às sete.
As bolhas de resposta aparecem enquanto estou lendo. Seu
texto aparece.

Não tenho certeza, Sawyer. Eu sinto que você deveria


trabalhar um pouco mais para um encontro comigo.

Sorrio e olho para a cabana. Jessie está à vista na janela da


sala, me observando. Um sorriso toma conta do meu rosto, e eu
começo a digitar. Tento não pensar no que dizer e digito com o
coração.

Você é linda, inteligente, engraçada e sexy. Você também


faz uma xícara de café. Você poderia, por favor, me dar a
honra de jantar comigo?

Meu dedo paira sobre o botão enviar. É demais? Pode ser. É


como eu a vejo? Sim. Eu o envio e a vejo ler quando chega. Seus
olhos se arregalam e ela sorri e balança os ombros de brincadeira.
Ela leva o telefone à boca e fala sua resposta. Eu leio seus lábios,
então já estou sorrindo quando sua mensagem aparece.

Senhor, tenho um encontro.

Ela pisca para mim e sai da janela.

Estou sentindo uma centena de emoções diferentes quando


dirijo pela longa estrada que leva de volta à cidade. Tanto que nem
penso no acidente de carro da minha mãe.
16

Entro na casa dos meus pais, tirando os sapatos e deixando-


os ao lado da porta.

Na sala de estar, um fogo arde na lareira de pedra do chão ao


teto, os sofás de couro parecem macios e amanteigados como
sempre, e as fotos emolduradas nas paredes são as mesmas de
anos atrás.

Wes está de pé na cozinha com Dakota quando eu entro, e


antes que eles me vejam eu a ouço dizer as palavras ajuda e o mais
rápido possível. Colt está em seu quadril, uma perna carnuda
pendurada sobre seu estômago florescente.

Eu não tenho certeza no que eu entrei, mas não parece


agradável.

— Ei, pessoal, — digo, olhando para frente e para trás entre


eles. — Apenas pegando um café, — minto, indo até o armário para
pegar uma caneca. O silêncio pesado prolonga os quatro segundos
que levo para preenchê-lo. Recuo, dizendo: — Wes, venha falar
comigo quando terminar.

Meu café espirra na minha xícara na minha pressa, e tomo um


grande gole para evitar derramar. — Droga, — eu murmuro,
mordendo minha língua depois de queimá-la.

Saio da cozinha e entro na sala de jantar. Vovô está sentado


sozinho na cabeceira da mesa, com uma grande xícara de café
preto e um prato de ovos mexidos. O carteiro Wes veio me
perguntar sobre esta manhã que está na mesa ao lado de seu
prato.

— Oi, vovô. — Sento-me a dois assentos de distância. — Quer


alguma companhia?

Ele sorri, seus olhos brilhando. — Parece-me que você já


respondeu a pergunta para mim.

Minhas mãos envolvem minha caneca. Eu realmente não


preciso de uma segunda xícara, mas que diabos. — Foi mais uma
formalidade.

Vovô termina seus ovos e não diz uma palavra enquanto toma
seu café. Quando sua xícara não passa de borra, ele se recosta em
seu assento e dirige seu olhar claro e sábio para mim. — Como vai,
garotinha?

Sorrio para o carinho. — Eu provavelmente já estive melhor,


vovô. Mas eu definitivamente estive pior.

— Eu estive lá uma ou duas vezes. O que está acontecendo?

— Wes quer saber algumas das minhas ideias para o rancho.


E estou feliz com isso, não me entenda mal. — Mordisco a ponta
da minha unha do polegar. Tenho tentado descobrir meus
sentimentos desde que Sawyer saiu uma hora atrás. — Quero
trabalhar no rancho também, mas Wes e papai são resistentes. E
isso me irrita.

— Porque você quer trabalhar aqui?

Levo um segundo para reunir meus pensamentos. Eu sei que


vovô tem o ouvido do meu pai, e ele é uma das poucas pessoas que
meu pai pode realmente ouvir. Esta é uma oportunidade de falar o
que penso sem discutir com ninguém. — Eu amo este lugar. Este
rancho, ele… - lágrimas piscam o fundo dos meus olhos - …está
tecido em minha alma. O solo, as árvores, o riacho que corre ao
longo do pasto oitenta e dois. A maneira como a grama cresce a
beira do quintal, e se você passar por ele no final do verão, as
joaninhas pegam carona nas suas roupas. Meu coração pertence
aqui, e eu não preciso viajar pelo mundo para confirmar isso.

— Ser rancheiro é muito mais do que apenas boas lembranças.


É um trabalho duro que pode quebrar um homem, — ele abaixa o
queixo para mim, — ou mulher, tanto física quanto mentalmente.
Seu pai e Wes já sabem disso, e eles estão tentando protegê-la.

— Eu não preciso de proteção. — Aponto para a mala direta


na mesa ao lado de seu prato vazio. — Esse foi o meu trabalho. Fiz
o idiota sair correndo e vender seu lugar.

Ele suspira lentamente, mas mantém os lábios fechados para


que o som fique baixo. — Você provou que é inteligente. Não que
você precisasse. Mas você também é tão selvagem quanto eles, e
as memórias das pessoas são longas. —Franzo a testa. — Isso é
limitante.

— Não quando seu sobrenome é Hayden. Você não é uma


vaqueira vindo aqui pedindo um emprego. Você é a irmã mais nova
do dono e a filha do dono anterior. Você terá que trabalhar duas
vezes mais e duas vezes mais para mostrar a todos do que você é
feita.

Meu queixo levanta. — Estou à altura da tarefa.


— Jessie? — Wes caminha atrás de mim. Ele dá a volta na
mesa e fica ao lado de Vovô. Seus olhos parecem cansados, e eu
não acho que as rugas entre suas sobrancelhas tenham relaxado
desde que voltei para casa. — Sei que pedi para você vir aqui, mas
podemos fazer isso mais tarde? Hoje já foi uma verdadeira cadela,
e estou ficando sem foda para dar.

Engulo minha decepção. — Você precisa de uma mão extra


hoje?

Ele suspira, mais ou menos do mesmo jeito que vovô fez, baixo
e devagar com os lábios fechados. — Não.

— Mentira.

Um músculo em sua mandíbula se contrai. Eu sou


provavelmente a última coisa que ele quer lidar depois de sua
conversa tensa com Dakota, mas isso é muito ruim. — Você
precisa de ajuda, certo? — Meus braços se abrem. — Ta-da. A
ajuda chegou.

— Já passamos por isso, Jessie.

— Nós realmente não temos, Wes. Você está sem um segundo


em comando desde que Warner saiu para ensinar na faculdade e...

— Deixe-me ver se entendi. Você aparece aqui esperando que


eu faça de você meu segundo em comando, mesmo que você nunca
tenha trabalhado em um rancho de gado? Só por causa do seu
sobrenome?

— Primeiro de tudo, — levanto um dedo. — Talvez eu nunca


tenha sido um funcionário oficial, mas cresci aqui. Eu sei alguma
merda, Wes. Eu não caí da traseira de um caminhão de nabo. —
espio Vovô. Ele está sorrindo. Até Wes abriu um sorriso.

— Essa era a coisa favorita da vovó a dizer. — Sua voz


suavizou. Ele me olha um pouco melhor agora, com os olhos de
um irmão mais velho. — Você tem um segundo ponto a fazer?

Levanto um segundo dedo. — Não tenho expectativas. Estou


aparecendo, pronta para trabalhar. O que eu sei de crescer aqui
não é a metade do que você faz, eu entendo. Mas gostaria de
aprender, Wes. — Minha mão volta para baixo, minha palma
pressiona a mesa. Mantenho um olhar firme sobre o dele e o
observo considerar.

— Estamos espalhando estrume hoje. — Suas sobrancelhas


levantam, esperando por mim para protestar ou reclamar.

— Excelente.

— Precisamos pulverizar ervas daninhas.

— Incrível, me dê um pulverizador.

Ele fica quieto, me estudando. Eu gostaria de dizer a ele para


parar com isso, mas percebo que não tenho muita margem de
manobra agora.

Então Wes, o mais intimidador de todos os meus irmãos, diz:


— Vá ver se mamãe tem luvas que você pode emprestar.

Mantenho o sorriso do meu rosto. Forço a emoção de escorrer.


Calmamente, eu me afasto da mesa e me levanto. Quando estou
saindo da sala, ouço vovô dizer a Wes: — Houve um tempo em que
você faria o que fosse preciso para ter este rancho.
Pego o segundo par de luvas da minha mãe no banheiro e volto
para a mesa. Vovô se foi.

— Tudo pronto? — Wes pergunta.

Concordo. — O que vovô estava dizendo quando eu saí?

Wes acena para mim. — Esqueça ele, ele está a poucos tijolos
de uma carga em um bom dia.

— Foda-se, — diz Vovô. Ele está vindo da cozinha segurando


uma segunda xícara de café.

Wes ri. Vovô dá um tapinha nas costas dele, e Wes faz o


mesmo, mas levemente. Às vezes eu esqueço que Wes teve mais
tempo com vovô do que qualquer um de nós, crianças.

— Vocês dois aproveitem seu dia, — diz Vovô. Ele se arrasta


para mim, e eu beijo sua bochecha de papel.

— Vamos, — Wes diz, saindo da sala.

Eu sigo, forçando minha excitação e meus nervos para baixo.

●●●

Porra. Duro.

É isso que todo esse trabalho é. Não que eu já não soubesse


disso, mas caramba. É apenas o final da primavera, e ainda há rios
de suor escorrendo entre meus seios. A bunda do pântano não é
mais algo de que Lindsay reclamou em voz alta em nossas
caminhadas pelo campus da ASU em agosto. É oficialmente uma
coisa muito real para mim.
Olho Wes, a apenas seis metros de distância, enquanto ele fala
com alguns dos cowboys. Principalmente ele se dirige a Josh, que
é o líder não oficial do grupo. Wes ignora Troy intencionalmente,
não que eu o culpe, mas isso me faz rir. Troy tenta, mas é sempre
um pouco tímido.

Eu tenho pulverizado ervas daninhas pelo que parecem horas


e adivinhem? Ainda há mais ervas daninhas. É como um concurso
de comer tortas onde o único prêmio é mais torta. Estou entediada
e tenho algo a dizer. Então, no verdadeiro estilo de calamidade, eu
abro minha boca.

— Wes, você pode vir aqui por um segundo?

Wes pausa sua frase, o pescoço girando na minha direção. Os


cowboys olham, bocas apertadas em linhas apertadas, como se
minha interrupção de Wes fosse um grande negócio. — Sim? — ele
diz, sobrancelhas levantadas em sua testa. Ele se dirige a mim de
onde está, recusando-se a fazer o que eu pedi e vir na minha
direção.

— Por que estou pulverizando todas essas ervas daninhas de


novo?

— Porque não posso ter muito mais para crescer aqui além
desses malditos dentes-de-leão, e não posso deixar que as vacas
os comam.

— Certo, — digo lentamente, colocando meu pulverizador no


chão. Um dos cowboys dá uma risadinha, e eu adoraria saber
quem é para poder tirar o sorriso de comedor de merda de seu
rosto. — Então aqui está o problema. Dentes-de-leão indicam solo
pobre e compactado...
— Não merda.

Eu olho para Wes, mas continuo. — Suas raízes estão


realmente fazendo o trabalho de quebrar o solo. — Isto é, palavra
por palavra, o que aprendi quando estava pesquisando na internet
esta manhã. Talvez eu seja uma impulsiva, mas vim preparada. —
Então não basta matá-los e seguir em frente. Pense nisso de forma
proativa em vez de reativa. Sim, você tem ervas daninhas, mas elas
estão fazendo um trabalho para você. Se as eliminarmos,
precisamos substituir sua função e arejar o solo nós mesmos.

Wes me dá um longo e duro olhar. — Você vai ser a única a


fazer isso? Porque eu posso te dizer agora, eu não tenho um único
segundo de sobra.

Meus ombros se endireitam. — Eu vou fazer isso. — Não que


eu tenha a menor ideia de como fazer isso, mas vou descobrir. Eu
vou dar um jeito.

Uma risada concisa e dissimulada explode de meu irmão. Ele


balança a cabeça e esfrega o polegar sobre o lábio inferior. — Você
tem todas as respostas, hein? Você não trabalhou nesta terra um
dia em sua vida, mas você chega aqui com a cabeça cheia de
grandes ideias.

No início desta manhã ele apareceu na minha casa me pedindo


para compartilhar essas ideias com ele, e agora ele está sendo um
idiota. Sua discussão com Dakota deve ter sido uma loucura. —
Eu cresci aqui também, idiota. E só porque eu não sou a escolhida,
o filho número um, não significa que eu não tenha contribuições
valiosas.

— Como enviar uma mala direta?


Envio a ele o olhar mais sujo que posso reunir.

— Novidade, Jessie. Mesmo sem aquela alfafa sufocando a


terra, ainda precisamos de algo da Mãe Natureza. — Ele aponta
para o céu. — Chuva.

Estou muito bem ciente disso. E, infelizmente, a água de cima


não é algo que eu possa produzir magicamente. Ou enviar um e-
mail.

— O fato é, — respondo, afundando meus calcanhares, — que


você tem dentro de suas habilidades para fazer algo sobre este solo
agora. Você não tem que esperar pelo padrão climático certo, sobre
como está seco. Prepare o solo para que, quando chover, você
esteja na melhor posição para se beneficiar dele.

Wes me encara. Percebo que estou exagerando, mas não sou


empregada dele, então tecnicamente posso dizer o que quero. Seu
pulso bate em seu pescoço, e eu não tenho ideia do que ele está
pensando. Ele é tão bom em manter suas emoções sob controle.

Diferente de mim. — O que você acha? — pressiono. — Eu


poderia…

— Foram realizadas. — A voz de Wes soa com determinação.


Eu quero discutir, mas eu sei melhor. Desafiar o chefe do rancho
na frente de seus subordinados não vai me levar a lugar nenhum
rápido.

Viro-me, apontando o bico do meu pulverizador para outro


dente-de-leão. Sim, é uma erva daninha. Mas tem uma função.
Uma proposta. Na verdade, está fazendo um bem.
Meu irmão, o chefe de fato dos irmãos Hayden, precisa
melhorar seu jogo de pecuária.
17

— Estamos fechando o hotel enquanto lidamos com o


problema.

Empalideço com o gerente geral do The Sierra. — Você está


fechando o hotel inteiro?

Ele se desculpa novamente. — É necessário. A inspeção de


cupins mostrou que temos um problema, e muito possivelmente
um perigo para a segurança de nossos hóspedes. Isso não é uma
precaução, Sr. Bennett, mas uma resposta a um problema muito
real. — Ele gesticula para a recepção. — Geraldine ficará feliz em
ligar e instalá-lo em um dos outros hotéis da região.

Aceno brevemente. — Isso não será necessário, posso fazer


meus próprios arranjos. Obrigado. — Subo as escadas para o meu
quarto, onde, por instrução do gerente, devo arrumar todas as
minhas coisas e desocupar o hotel imediatamente.

Enquanto dobro minhas calças e prendo camisas de botão,


isso me lembra o que Wyatt e Jo disseram sobre minhas roupas.
Talvez eu devesse fazer algumas compras antes do meu encontro
com Jessie hoje à noite.

Arrumo tudo e saio da Sierra. Coloco tudo na parte de trás do


meu carro e uso meu telefone para procurar um lugar para fazer
compras. Boutiques pontilham a High Street, mas muitas delas
não carregam as roupas que eu estou interessado em usar. Não
sou um cowboy e não preciso me vestir como um.

Mando uma mensagem para Jo, perguntando a ela onde um


cara pode conseguir roupas que ficam em algum lugar entre
Wrangler e casual de negócios. Ela me manda o nome de duas lojas
que Wyatt gosta, que são perfeitas. Ele nunca parece um cowboy
cem por cento.

No momento em que termino as compras, não tenho tempo


para fazer o check-in em um novo hotel. Eu ligo, encontro um lugar
que tem uma vaga e vou ao HCC para pegar Jessie para nosso
encontro.

Estou nervoso como o inferno. Faz anos desde que estive em


um primeiro encontro. E eu pensei que nunca teria que ir em outro
novamente. Brea deveria ser meu último primeiro.

Dirijo pelo mesmo caminho que fiz há dois dias, desviando


naquela estrada de terra que notei enquanto dirigia em direção à
propriedade. Na época eu não sabia que era como chegar à cabana
de Jessie.

Paro e desligo o motor, limpando as palmas das mãos suadas


na frente do meu jeans antes de sair. Meu coração dispara e
respiro fundo. Eu deveria ter trazido flores? Olho em volta e,
quando não vejo nenhum, prometo pegá-los para o nosso próximo
encontro.

Próximo encontro? Ei, amigo. Talvez eu precise desacelerar.

Jessie abre a porta antes que eu possa bater. — Oi, — ela diz,
sem fôlego. — Eu vi você da janela.
Gosto de como ela é honesta. Ela não me fez esperar na frente,
em contagem regressiva para não parecer muito animada. Nada
com Jessie é fabricado. O que vejo é o que recebo. E porra, eu gosto
do que vejo.

Um vestido rosa-melancia desliza por suas pernas, atingindo


o meio de suas coxas. Seus sapatos lhe emprestam alguns
centímetros de altura, mas ela ainda é mais baixa do que eu por
uns bons dez centímetros.

— Você está linda, — digo a ela. Finjo entregar-lhe um buquê.


— Estas são as flores que eu não pensei em comprar até que fosse
tarde demais.

Ela pega as flores de mentira e torce o nariz. — Eu odeio rosas,


— diz ela.

— É uma coisa boa que eles são girassóis, — respondo.

Ela ri e abandona o ato. — Eu gosto de você, Sawyer Bennett.


— Ela sai e fecha a porta atrás de si. — Vamos. Mostre-me um
bom tempo.

●●●

— Onde estamos indo? — Jessie pergunta, apoiando o


antebraço na porta. Ela olha para mim com expectativa enquanto
eu navego para fora das terras de sua família.

Eu olho para ela, então de volta para a estrada. Viro à


esquerda e sigo em direção à cidade. — Você gosta de comida
francesa? Há um lugar a cerca de vinte minutos da cidade.
— Claro que sim, e estou morrendo de fome também.

— Perfeito.

— Então, Sawyer, me conte mais sobre você. É uma pergunta


obrigatória para o primeiro encontro.

É uma abertura para contar a ela sobre Brea, mas parece um


momento terrível. — Não há muito a dizer. Você já conhece a maior
parte. Eu trabalho no setor imobiliário. Sei andar a cavalo. Gosto
do meu café preto.

— Diga-me coisas que eu já não sei.

Falo as primeiras coisas que me vêm à mente. — Minha cor


favorita é azul marinho. Odeio menta, mas amo sorvete de menta.
Prefiro estar quente do que frio.

Jessie faz um som com os lábios, deixando-me saber que os


detalhes que estou compartilhando não são suficientes. — Acho
que há muito mais em você do que você deixa transparecer.

Meus lábios se estendem pelo meu rosto e minhas


sobrancelhas se juntam. — Oh sim?

— Mm-hmm, — diz ela, sua voz vibrando no meu carro.

Mantenho meus olhos treinados na estrada, mas o calor de


seu olhar aquece minha pele.

— Acho que você vai ter que ficar por aqui e ver. — Atrevo-me
a olhar para ela. Sua língua se lança para deslizar sobre o lábio
inferior.
— Fale-me sobre você, — digo, diminuindo a velocidade
enquanto me aproximo de uma curva. — Por que sua família a
chama de Calamidade?

Ela enfia uma cortina de cabelo atrás do ombro. — Eles me


chamam de Calamidade Jessie desde que era pequena.
Aparentemente era bem selvagem, correndo loucamente pelo
rancho. — Um pequeno sorriso aparece em seu rosto. — E eu
xingava muito.

— Como uma criança?

Ela acena. — Isso é o que me disseram. Calamidade vem de


Calamity Jane.

Eu olho para ela, tentando imaginá-la como uma criança, de


bochechas rechonchudas e xingando como um marinheiro. Neste
momento, é impossível. Pernas longas e bronzeadas se estendem
de seu vestido, e ela preenche a parte de cima. Ela parece muito
feminina para o meu cérebro imaginá-la como uma criança.

Forço meu olhar de volta para a estrada. — Não parece que


você aprecia o apelido.

— Seus sinônimos são desastre e tragédia. Você apreciaria


isso?

Balanço minha cabeça lentamente. — Não posso dizer que eu


faria.

Ela fica quieta por alguns minutos, olhando pela janela


enquanto passamos pelos pinheiros altos. Estamos no ponto com
a transição dura de árvores para arbustos, sinalizando que
estamos saindo da terra de Hayden, quando ela rompe o silêncio
com uma pergunta. — Qual é a coisa mais assustadora que você
já fez?

— Estou fazendo isso agora. — As palavras saem antes que eu


tenha tempo de pensar nelas.

Jessie está em silêncio. De todo o tempo que passei perto do


raciocínio rápido e da boca inteligente de Jessie, o silêncio dela é
o mais enervante.

— E você? — pergunto, e a luz fica verde.

Estamos dirigindo novamente. Ela está respondendo minha


pergunta, e o momento já passou.

— Eu faço coisas assustadoras todos os dias.

Eu rio. Não posso evitar. — Você? Você parece ser a pessoa


mais destemida que eu já conheci.

— Tenho medo todos os dias. Receio que Wes não me deixe


fazer parte do HCC. Receio ser forçada a encontrar uma carreira
pela qual tenho apenas metade da paixão. Ontem, Wes Deixou-me
ajudar no rancho. Tentei dizer a ele algo que aprendi sobre o solo,
e agora temo que ele nunca mais me deixe pisar além do quintal
da casa.

— Ele não queria ouvir?

— Nem um pouco. Mesmo sendo ele quem veio até mim e me


pediu para contar a ele meus pensamentos. Ele ficou sem
paciência, eu acho.

— Talvez leve algum tempo para ele se acostumar com a


informação.
Jessie suspira. — Vovô me disse que tenho que trabalhar duas
vezes mais para provar a Wes e aos cowboys que estou falando
sério.

— Como você se sente sobre isso?

— Com raiva. Como se eu quisesse provar a mim mesma do


meu jeito.

Eu paro em um local aberto em frente ao restaurante. Virando-


me para Jessie, digo: — Faça-me um favor?

— O que é isso?

Inclino-me para frente e sorrio para ela. — Dê-lhes o inferno.

Ela sorri. — Eu pretendo.

●●●

— Ughhhhh, — Jessie diz, uma mão na barriga. — Esqueci


como a comida francesa pode ser rica.

Eu rio dela. — Você comeu tanto quanto eu.

— Eu sei, — ela choraminga, — não me lembre. Talvez eu tire


um cochilo no porta-malas enquanto você nos leva para casa. —
Ela se vira para olhar para o banco de trás. — Não importa. Por
que parece que tudo que você possui está no seu porta-malas?

— Porque tudo o que possuo que está atualmente em Sierra


Grande está no meu porta-malas.

Ela encara a frente novamente. — Por que?


— A Sierra tem cupins. Fui expulso, junto com todos os outros
hóspedes.

— O que? — Ela fica boquiaberta para mim. — Como isso não


foi um tópico de conversa no jantar?

— Infestações de pragas não são uma boa conversa para


jantar.

— Concordo. Onde você vai ficar?

Revejo minha conversa com a pessoa do hotel para quem


liguei, tentando lembrar o nome. Foi um pouco cafona, e muito no
nariz. — Durma tranquilo? Descanse aqui? Algo assim. Todo o
resto estava cheio.

— Durma aqui? — Jessie grita. — Não. Absolutamente não.


Você vai trocar cupins por percevejos. E então eu não vou querer
nada com você por aproximadamente noventa dias.

— É quanto tempo leva para se livrar dos percevejos?

— Eu não sei. Foi um número aleatório.

Rio. — Você é engraçada.

— Você vai se arrepender se ficar lá. — Ela estala os dedos. —


Você pode ficar comigo. Problema resolvido.

— Certo. Seu pai adoraria isso.

— Ele já pensa que dormimos juntos. Quem se importa? E


assim, você pode passar um tempo com Colt. Dakota disse que
pediu para você se encontrar apenas com ela e Colt e ajudá-lo.

Jessie faz um bom ponto. Dakota me ligou ontem e perguntou,


dizendo que me pagaria para trabalhar com ele. Não tenho
intenção de aceitar o pagamento dela, e toda a intenção é ajudar o
garotinho o máximo que puder.

— Vê? — Jessie se recosta, sorrindo satisfeita. — Você está


considerando isso.

— Faz sentido. Especialmente porque eu posso trabalhar de


qualquer lugar. — Aluguei um escritório porque trabalhar no
quarto de hotel era deprimente. Mas trabalhar na cabana de
Jessie? Parece o paraíso.

— Esse é o seu jeito de dizer sim?

Eu olho para ela. Seus olhos estão bem abertos, antecipando


minha resposta.

— Sim.

— Sim?

— Sim.
18

Estou parado na porta, olhando para o quarto, tentando não


deixar minhas emoções transparecerem no meu rosto. Não tenho
como dormir lá. Meu corpo inteiro é maior que a cama.

— Isso é um gêmeo.

Jessie me avalia, riso em seus olhos. Ela está de pé no meio


da sala e aponta um dedo para a parede. — Você prefere a cama
de beliche no antigo quarto de Charlie?

Meu olhar se estreita para ela. Sou um homem adulto há


muito tempo, mas aqui estou eu escolhendo entre a antiga cama
de solteiro de uma adolescente e o velho beliche de um menino.

— Qual é o tamanho da sua cama? — pergunto.

— King.

Eu faço um gozo no rosto, e ela sorri. — Quatro de você


caberiam em um king, Jessie.

— O que você está dizendo?

Nós nos encaramos. Um confronto. Ela segura meu olhar,


firme como pode ser. — Você nem me beijou ainda. Não estamos
dormindo na mesma cama.

Você nem me beijou... ainda. Nós dois sabemos que está


chegando. Como não poderia? Dada a forma como meu corpo
responde a apenas estar na mesma sala que ela, parece uma
conclusão precipitada. E ainda assim, há uma distância tão
grande entre saber que isso vai acontecer e colocar esses
pensamentos em ação.

— Eu não estava sugerindo que eu dormisse na sua cama. —


olho além dela, para a cama mais adequada para seu dono
anterior. — Posso ter lençóis novos?

Jessie revira os olhos e sorri. — Bem, sim. Há roupa de cama


limpa no armário.

Pego a bolsa aos meus pés e dou uma olhada. Ele navega pelo
ar e pousa na cama. Faço o mesmo com os próximos dois. — Lar
Doce Lar.

— Bom, — Jessie diz, andando até mim. Ela passa pela porta,
seu antebraço roçando o meu. Ela fica na ponta dos pés e dá um
beijo na minha bochecha. Seus lábios são macios, seu beijo suave
e fugaz. Ela faz uma pausa perto da minha bochecha, seus lábios
pairando, me dando a chance de virar o rosto. Apenas uma
polegada ou duas e meus lábios poderiam colidir com os dela. Eu
poderia segurá-la em meus braços, passar minhas mãos por seu
cabelo, saboreá-la.

Estas polegadas parecem milhas.

Jessie volta a apoiar os pés no chão. — Obrigada pelo jantar.


Vejo você pela manhã.

●●●
De manhã, descobri que Jessie tinha nada de mantimentos
para fazer o café. Nós fazemos o nosso caminho para a cidade.

Nossa aparição juntos no supermercado não passa


despercebida. Uma mulher que não reconheço, mas Jessie
cumprimenta, nos dá uma longa olhada.

— Esposa do xerife Monroe, — Jessie sussurra quando


estamos longe o suficiente. — Juro por Deus, ela é a maior
intrometida desta cidade. Dê três dias, e todos saberão que você
vai ficar comigo.

— Como ela vai saber se ninguém contar a ela?

— Ela é uma detetive melhor do que seu marido jamais foi. Um


cão de caça, aquela.

Olho para a esposa do xerife. A velha desvia o olhar de nós, e


eu rio. — Tinha que acontecer em algum momento, eu suponho.
— Talvez soe arrogante, mas eu realmente gosto da ideia de as
pessoas saberem sobre mim e Jessie. Não tenho certeza do que há
para saber, já que ontem à noite ela me lembrou quão pouco
beijamos até agora, ou seja, nada. Ainda assim, se as pessoas
presumirem que estamos juntos, eu consideraria um equívoco
afortunado. Se ela tem que estar associada a alguém, eu quero que
essa pessoa seja eu.

— Claro que sim, — Jessie responde, adicionando tortilhas à


cesta.

— Você não está preocupada que essa fofoca torne mais difícil
para você conseguir um encontro nesta cidade? — Desvio o olhar
depois de fazer a pergunta. Estou pescando. Porque, não sei
exatamente.

— Sawyer. — O jeito que Jessie diz meu nome, todo suave e


doce assim, faz minha respiração bater na minha garganta. Eu
encontro seu olhar.

— Não vou a restaurantes franceses nem deixo ninguém ficar


em minha casa. Isso responde à sua pergunta?

Ela me encara de volta. Seus olhos azuis bebê são um mar


sem fim, no qual quero nadar. Como seria me deixar ir com ela?
Para tê-la? Para deixá-la me ter?

Porra, eu gosto dessa mulher. Ela não joga. E ela não merece
nada menos de mim. Preciso contar a ela sobre Brea. Ela precisa
saber o motivo da minha hesitação.

Engulo e aceno. — Sim, isso responde minha pergunta.

Jessie nos leva para o próximo corredor, e quando vou pegar


um pote de salsa, ela me para. — Eu não permito essa salsa em
minha casa.

Levanto uma sobrancelha e aponto para a marca diferente ao


lado dela. — Não, — diz ela, com um aceno de cabeça. — Deste
jeito. — Ela me leva para a seção de produtos, escolhendo coentro,
uma cebola branca e uma cabeça de alho. Em seguida, ela pega
tomates em cubos enlatados e flocos de pimenta vermelha seca,
então se vira para mim.

— Salsa é a única coisa que posso fazer, mas faço muito bem.

Eu rio. — Longe de mim mudar isso.


Recolho os itens para o jantar, agora que sei que Jessie não
cozinha, e saímos. A caixa nos dá um olhar tão longo quanto a
esposa do xerife, mas ela não diz nada. Jessie sorri para ela e faz
conversa fiada.

Observo seu sorriso relaxado, a facilidade com que seu corpo


se move, como ela se sente confortável em sua pele. Como pode
alguém tão jovem como ela ser tão composta?

Faço essa pergunta exata quando voltamos para o meu carro.

Ela se move, então ela está de frente para mim, uma perna
dobrada no joelho e apoiada no assento. — Gosto de pensar que
tenho vivido duas vidas. Uma como filha única, a outra como filha
de quatro irmãos. Meus irmãos são tão mais velhos que eu que
tecnicamente posso ser considerada filha única. Obtive os
benefícios de ambas as ordens de nascimento. — Ela morde o lábio
inferior. — E talvez as desvantagens.

Antes que eu possa responder, ela segue sua resposta com


uma pergunta. — Você tem algum irmão?

Meus dedos batem no volante. A proximidade dos irmãos


Hayden me faz sentir falta de algo que nunca tive.

Balanço minha cabeça. — Sempre desejei um irmão, mas não.


Filho único.

Jessie dá um tapa de brincadeira no meu ombro. — Eu posso


me identificar parcialmente com você.

— E meio que não.

— O copo está meio cheio ou meio vazio?


— Meio vazio. Sempre. Por que se preparar para ficar
desapontado?

Jessie sorri. — Concordo. Foda-se essa merda de atitude


positiva.

Eu sorrio, e me ocorre que sorrio muito quando estou perto


dela. Eu gosto disso. Penso. Não tenho certeza. Posso gostar? É
confuso.

Apareci nesta cidade um homem quebrado, e agora Jessie,


apenas em virtude de ser ela mesma, está juntando os pedaços e
me recompondo.

— Você vai começar a dirigir? — Ela parece impaciente. — Há


mantimentos em seu carro, e ainda é uma viagem de vinte minutos
de volta para o rancho.

O rancho.

— Certo, — digo, voltando do lugar. — Vamos para o rancho.

Eu gosto do jeito que soa. Como se destacar no ar limpo da


manhã, tomando café e cheirando a pinho.

Acima de tudo, eu gosto de Jessie.

●●●

Frango inteiro, lavado e seco. Manteiga dobrada sob a pele.


Limões inteiros cortados ao meio e aninhados na cavidade.

— Você pode, por favor, pegar a assadeira? — pergunto a


Jessie, que não para de me lembrar como está com fome. Mesmo
depois que ela preparou sua salsa, que reconhecidamente é melhor
do que qualquer salsa comprada em loja que eu já comi, ela ainda
está pulando ao meu redor como um passarinho faminto. Estou
aprendendo que ela tem um baixo limiar de fome.

Ela desliza a assadeira para mim. Eu levanto o frango,


enrolando o barbante ao redor do pássaro. Eu uso uma faca de
cozinha para cortá-lo e depois amarro.

Jessie apoia um cotovelo no balcão, me observando.

— O que? — pergunto, enquanto pego o frango e o transfiro


para a panela.

— Eu não tinha você atrelado ao tipo de cozinha.

Eu franzo a testa para ela enquanto lavo minhas mãos. — Por


que não?

— Você é muito bonito.

Faço uma careta e limpo minhas mãos em uma toalha de


cozinha. — Bonito demais?

Ela me olha de cima a baixo. — Sim, você sabe... meio...


precioso.

Deslizo a panela no forno e a fecho, voltando-me para ela.


Minhas sobrancelhas levantam. — Bonito e precioso? É assim que
você me vê? — Se assim for, isso não está indo tão bem para mim.

Seus lábios franzem, liberando lentamente. — Você é muito


organizado. Parece alguém que preparou o jantar para ele. Ou
pediu. Não alguém que fica na frente de um fogão quente.

Aceno lentamente. — Eu não acho que você está me elogiando.


Ela ri. — Não estou, eu acho. Mas também não estou
insultando você, pelo menos eu não quero dizer isso dessa
maneira.

— Eu não estou insultado.

— Bom.

— Gostaria que você me visse de forma diferente, no entanto.


— expiro silenciosamente, tentando liberar um pouco do
nervosismo que sinto por dentro.

Suas pontas de cabeça, seu cabelo em cascata pelo ar como


uma cachoeira. — Como você gostaria que eu te visse? — Sua voz
é mais profunda, mais rouca.

Minhas mãos enfiam nos bolsos. — Como um homem.

Ela engole audivelmente. — Eu sei muito bem que você é um


homem, Sawyer. — Seus lábios se separam, um pequeno espaço
aparece entre eles, e ela respira fundo.

Foda-se.

Ela está esperando que eu dê o primeiro passo. A ousada,


corajosa e efervescente Jessie quer que eu vá até ela. E eu quero.
Eu realmente, realmente quero. Mas, assim como ontem à noite,
quanto mais espero, mais os centímetros se transformam em
quilômetros.

Agora está quieto por muito tempo, e não há como voltar atrás.
Eu não sei o que dizer. — Vinho, — deixo escapar, lembrando da
garrafa que colocamos no freezer quando voltamos. Pego e sirvo
dois copos. A parte externa dos copos fica imediatamente nublada
com a temperatura gelada. Ela tira um do balcão. Ela parece...
irritada. Junte-se ao clube. Estou irritado comigo também.

— Saúde, — digo, segurando meu copo.

— Para?

Faço uma pausa, com o copo no alto, pensando. — Para o


Hotel Jessie.

Ela ri e bebe.

— Vai levar mais ou menos uma hora antes que o frango esteja
pronto, e preciso começar a preparar o arroz. Você — olho para
fora onde estávamos alguns dias atrás, quando Beau e Wes
chegaram— quer relaxar lá fora? Está bom agora.

— Boa ideia. — Jessie pega seu telefone e sai. Ela se acomoda


em uma cadeira e puxa as pernas para si mesma. Ela abre o
telefone e não consigo ver claramente daqui, mas parece que ela
está lendo alguma coisa.

Estou torrando o arroz seco quando meu pai liga.

— Oi, pai, — digo, segurando o telefone entre meu ombro


erguido e minha cabeça inclinada. Eu adiciono o arroz à água
fervente, depois reduzo para ferver e cubro com uma tampa.

— Como está indo lá fora? — ele pergunta. Nós conversamos


a cada poucas semanas, e esta é sempre sua primeira pergunta.
Ele sabe que estou comprando propriedades, mas não lhe
expliquei completamente o quanto gosto de Sierra Grande.

Descanso um quadril contra o balcão e olho pela janela onde


Jessie está sentada. O sol escurece, tingido de âmbar como o
cabelo dela. As árvores bloqueiam a visão do horizonte, mas o céu
acima está começando a ficar roxo de um lado, formando um arco
através da extensão como veias.

— Bem, — respondo, sabendo que não será suficiente. — Eu


conheci alguém.

— Oh sim? — ele pergunta, seu tom cauteloso. Ele sabe em


primeira mão como o caminho para seguir em frente pode ser
instável. — Conte-me sobre o seu alguém.

— O nome dela é Jessie Hayden, e ela é..

— Hayden? — O tom jovial desapareceu.

— Sim, — digo lentamente. — Por que?

— Nada. Nada. Eu preciso ir. Renée está me ligando.

— Pai…

— Tchau, filho. Cuide-se. — Ele desliga. Eu coloco meu


telefone de volta no meu bolso. A conversa, ou a falta dela, me
atormenta. A reação dele deve ter algo a ver com minha mãe e onde
ela morreu. Tão perto da terra de Hayden, praticamente à direita.
Pensei nisso quase todas as vezes que passei por aquela estrada,
inclusive quando levei Jessie para um encontro ontem à noite e
hoje quando fomos à cidade fazer compras. Mas há mais? Meu pai
tem um motivo maior para se assustar com o nome Hayden?

Olho para o meu telefone, polegar pronto para discar para ele,
mas o movimento através da janela pega meus olhos.

Jessie se levanta. Ela joga o telefone na cadeira e caminha em


frente à casa. Ela se aproxima das árvores, curvando-se. Ela junta
um punhado de terra e a observa escorregar por entre os dedos,
depois esfrega o polegar contra dois dedos. O que ela está
pensando?

Jessie se endireita e olha para o céu com determinação, os


últimos raios de sol a banhando. Ela tem o espírito de um cavalo
ininterrupto, mas também há algo de terno nela. Um exterior de
couro cru escondendo seda.

Algo no sobrenome dela aborreceu meu pai. E eu adoraria


saber do que se tratava.

Eu o chamo de volta. Ele toca e toca, então vai para o correio


de voz. Eu desligo.
19

Quando Marlowe liga e exige saber sobre esses rumores que


está ouvindo na cidade, não sei o que dizer.

Tentei a verdade, mas agora ela está gritando comigo. — Não


há nenhuma parte do meu cérebro que possa compreender como
você permitiu que ele fosse morar com você.

Já defendi isso tantas vezes que já estou ficando cansada


disso. Para Greta, quando eu estava comprando muffins de mirtilo
ontem. Sim, tudo bem, tenho idade suficiente para ter um homem
morando comigo. Para Maia, quando eu estava pegando alguns
itens no Merc. Não me importa que nossos pais fossem adversários.
Até o velho Waylon Guthrie, que gostaria de salientar, estava três
folhas ao vento quando ele tropeçou em mim perguntando sobre
eu 'vivendo em pecado' com um Bennett. Seus vapores de álcool
são ofensivos, não respire em mim. Morar em uma cidade pequena
pode ter suas desvantagens.

— E, — continua Marlowe, — por que estou ouvindo sobre isso


de alguém além de você? Isso dói.

— Eu sei, — sussurro, servindo meu café. A porta do quarto


de Sawyer estava fechada quando passei alguns minutos atrás,
então presumo que ele ainda esteja dormindo. — Espere, —
sussurro, deixando meu telefone cair no bolso do meu cardigã
enorme. Eu adiciono creme ao meu café, pego uma maçã e saio.
— Estou de volta, — digo a Marlowe, sentando em uma
cadeira.

— Ótimo. Posso continuar gritando com você.

— Não, você não pode. O Sierra teve um problema de cupim…

— Estou ciente. Eles têm que demolir e reconstruir.

— Isso é horrível. — Meu coração está com o casal que é dono


do lugar. — Sawyer vai ficar aqui, é temporário. Além disso, era
minha cabana ou Durma Aqui.

— Eca. Vá limpar sua boca.

— Exatamente.

— Como está o sexo?

Coloco minhas pernas no meu peito e uso um braço para


mantê-las no lugar. — Nós não estamos dormindo juntos.

— Por que não? Você parece desapontada, a propósito.

— Isso é porque estou decepcionada. Nós nem nos beijamos


ainda.

— E mesmo assim ele está morando com você?

— Você já sabe a resposta para isso.

— Você já pensou sobre o fato de seus pais se odiarem no


passado?

Estou começando a me arrepender de contar a ela sobre isso.


Quando eu liguei para dizer a ela que Sawyer e eu iríamos a um
encontro, eu também incluí o que eu aprendi com meus pais
depois do mercado de fornecedores. Eu deveria saber que ela o
guardaria para usar em uma discussão futura.
Um falcão preto pousa no topo de um pinheiro, pousando ali
enquanto seu pescoço gira. Ele está caçando. — Dificilmente, —
respondo a Marlowe, meus olhos no pássaro predador. — Meus
pais não se importam.

— O que Sawyer pensa sobre isso?

Suspiro e olho de volta para a base das árvores. — Não sei se


ele sabe.

— Você não falou sobre isso? — Ela grita, e puxo o telefone


para longe da minha cabeça. Eu espero alguns segundos, então o
trago de volta ao meu ouvido.

— Tenho medo. Com Sawyer, tenho que andar com calma.


Algo aconteceu com ele, em algum lugar ao longo do caminho. Eu
posso ver isso em seus olhos. Ele quer me beijar, mas se detém.

— Sabe, isso é algo que você poderia perguntar a ele também.


Suas habilidades de comunicação estão faltando. — Seu tom é
seco.

— Não quero assustá-lo. — Gosto de Sawyer o suficiente para


aceitar o que puder dele, pelo menos por enquanto. Não serei
paciente para sempre, mas tenho capacidade de esperar um pouco
mais.

— Certo. Posso ser honesta com você?

— Você não estava sendo honesta esse tempo todo?

Ela ignora minha pergunta. — Você tem uma tendência a


correr pela vida de frente, com seu coração liderando. Você ama
em voz alta e faz grandes coisas para as pessoas sortudas o
suficiente para serem amadas por você. Mas, — ela hesita, e eu
acho que isso é onde ela está prestes a ser dolorosamente honesta
comigo. — Eu acho que talvez você tenha estragado tudo desta vez.
Os Bennetts viveram aqui há muito tempo, mas eles deixaram a
cidade de repente e sem explicação. Você não acha que há algo
mais na história do que apenas sangue ruim entre seus pais?

— Eu não sei. Talvez, — admito, mesmo que eu não queira. —


Você já ouviu falar que não deve procurar, porque pode não gostar
do que vai encontrar?

— Deus, você realmente é a filha de Beau Hayden.

Sua reclamação brincalhona me faz rir. — O que está feito está


feito, Marlowe. Eu não vou expulsá-lo. Eu gosto dele, e gosto de
quem sou quando estou com ele. Ele me deixa ser a pessoa que
estou tentando me tornar. Você sabe o quanto isso é importante
para mim.

— Sim, eu entendo. E estou feliz que você encontrou alguém


que pode fazer isso por você. Acho que você nunca encontraria isso
olhando na piscina de encontros de Sierra Grande.

— Definitivamente não. Eu preciso seguir em frente agora.


Começando por falar com meu irmão para me deixar ajudar no
rancho. Não estou mais na faculdade, e não tenho um emprego.
Se eu não contribuir de alguma forma, vou enlouquecer aqui.

Por mais que eu ame esta cabana, com suas colunas de pedra
tão parecidas com a herdade e as árvores que cercam o lugar, não
posso ficar aqui o dia todo. Preciso de algo para fazer. Preciso
trabalhar no rancho do jeito que eu quero. Tenho lido e pesquisado
a cada minuto livre e tenho muito valor para agregar a este lugar.
— Eu sei, Jessie. Eu sei. Você ama esse rancho ao ponto do
absurdo.

Eu rio baixinho. Seja como um insulto ou um elogio, estou


levando como um elogio.

Nos despedimos e coloco o telefone de volta no bolso. Termino


meu café e entro.

Sawyer está no balcão. Observo seu perfil enquanto ele bebe


um copo de água. Sua garganta ondula a cada gole, e eu gostaria
de poder arrastar meus dedos sobre a barba por fazer escurecendo
sua pele. Talvez dê a volta e empurre minha mão em seu cabelo
sedoso e escuro. Ele está sem camisa, vestindo apenas um par de
calças de moletom justas. Um brilho de suor cobre suas costas.

Não sei identificar pelo nome todos os diferentes músculos das


costas, mas sei que em Sawyer eles são desenvolvidos. Grande,
curvado, subindo alto e mergulhando baixo. Ele é todo homem,
todo sexy, todo tentador. E tão malditamente fechado.

Eu poderia forçar a conversa e comunicar da maneira que


Marlowe acha que deveríamos. Pedir a ele para me dizer suas
reservas e colocar nossa atração em campo aberto. Mas tenho a
sensação de que Sawyer precisa vasculhar o que quer que seja por
conta própria. A linha do tempo dele é diferente da minha, e eu
quero respeitar isso.

— Olá, — digo, desviando meu olhar. Eu ando até a pia,


colocando minha xícara de café dentro.

— Bom dia, — ele responde. Sua voz é quente.


Viro-me para encontrar seus olhos. Gotas de suor na linha do
cabelo. Isso ajuda a me distrair de olhar para o peito dele. — Por
que você está suado? — Pergunto.

— Treinando na sala. Eu vim aqui e vi que você estava no


telefone, então fiz um circuito rápido. Tenho uma sessão com meu
treinador hoje e gosto de fazer algumas coisas para ajudar a
aquecer meus músculos e fazer o sangue fluir.

Concordo com a cabeça, pensando em todas as partes dele


onde o sangue pode fluir. Para me distrair, me viro para a geladeira
e pego tudo o que preciso para fazer o café da manhã. — Você se
exercita na academia da cidade?

— Há uma academia de boxe em Brighton. Gosto de ir lá.

— Hmm, — respondo, colocando pão na torradeira. Então é


assim que ele consegue todos aqueles músculos bem definidos.
Boxe.

— Você já experimentou? — Sawyer vai até a geladeira,


pegando uma caixa de ovos.

— Não, — respondo, olhando para dentro da torradeira para


as bobinas quentes e vermelhas.

Ele pega uma tigela e começa a quebrar ovos. É a minha


chance de espiar seu abdômen, e eu aproveito.

Oh sim. Assim como eu pensei. Filas e mais fileiras de


abdominais. Não há como as pontas dos dedos, ou uma língua
para esse assunto, deslizar facilmente sobre isso. Esses são
abdominais esburacados, do tipo que fazem um caminho difícil para
baixo. O melhor tipo.
Pop! A parte superior da torrada espreita. Eu o agarro,
estremecendo com o calor, e coloco em um prato.

— O que você está fazendo hoje? — Sawyer despeja a mistura


de ovos em uma panela. Ele está falando tão casualmente, é como
se ele não percebesse que está seminu.

Espalho manteiga na minha torrada e dou uma mordida. —


Estou indo para a herdade para forçar Wes a me deixar trabalhar
no rancho.

Sawyer olha para mim enquanto mexe os ovos. — Não me


parece que Wes tenha passado muito tempo sendo forçado a nada.

Eu franzo a testa, não porque discordo, mas porque sei que ele
está certo. — Sei o que estou enfrentando.

Seus olhos aquecem quanto mais ele olha para mim. — Você
sabe o que você é?

Eu engulo e suspiro. — Inflexível. Obstinada. Teimosa. —


Marquei as características em meus dedos, então deixo cair minha
mão.

Ele balança a cabeça. — Essas são basicamente sinônimos da


mesma palavra. E eu acho que você pode ser algumas dessas
coisas, até certo ponto. — Ele sorri, mas eu o observo com olhos
cautelosos. Eu não sei onde isso vai dar.

— Mas a determinação não é apenas vários graus de teimosia?


Alguém pode chamá-la de teimosa, mas alguém pode dizer que
você é determinado. Você é obstinada ou tenaz? — Ele pega um
prato e coloca seus ovos nele. — São os dois lados da mesma
moeda. Tudo o que estou dizendo é que nunca conheci uma pessoa
tão determinada, motivada e tenaz como você. E se você passou a
vida inteira ouvindo que é teimosa, inflexível, obstinada deixe-me
ser o primeiro a jogar a moeda para você.

Oh. Meu coração. Talvez todas as coisas pelas quais sou tão
conhecida sejam realmente boas.

Sawyer caminha em minha direção, o prato na mão esquerda,


e estende a mão direita. Minha respiração para na minha garganta.
É isso? O momento em que ele finalmente me agarra e beija a
respiração dos meus pulmões?

Sua mão navega para frente, em direção ao meu quadril. O


quadril eu pressionei na gaveta. A gaveta que contém os talheres.

Sawyer sacode a gaveta e ela se move contra mim. — Você está


guardando os garfos? Existe uma senha?

Passo de lado. — Sem senha, — murmuro, pegando meu


segundo pedaço de torrada. — Obrigada por dizer todas essas
coisas legais sobre mim. Me deseje sorte com Wes. — Eu me viro e
saio da sala, levando toda a minha paciência comigo.

●●●

Eu vim para a herdade procurando por Wes, mas encontrei


meus pais primeiro e decidi avisá-los sobre Sawyer ficar comigo.
Eles não vão à cidade há alguns dias, então eu sei que eles não
foram informados pelo boato. Eu não tenho ideia se eles vão
aparecer na minha cabana inesperadamente, ou pior, ver Sawyer
na minha casa e assumir que ele é um invasor.
— Você fez o que? — Meu pai aproxima a orelha de mim, como
se tivesse me ouvido incorretamente.

— Pedi a Sawyer para morar comigo. Ele precisava de um lugar


para ficar. A Sierra...

— Eu sei sobre o Sierra. Você está tentando me dizer que não


havia outro lugar em Sierra Grande para uma pessoa ficar?

— Na verdade não. Ele provavelmente poderia ter alugado um


apartamento ou algo assim, mas precisava de um lugar
imediatamente. Tenho muito espaço e gosto dele. Então perguntei
se ele queria ficar.

— Geralmente vocês namoram por um tempo antes de


morarem juntos. — Minha mãe esfrega a mão sobre os olhos.

— Nós nem estamos namorando, mãe. Quero dizer, nós já


fomos a um encontro. Se vocês estão preocupados com a gente
indo rápido demais, não fique. Ele leva as coisas em um ritmo de
caracol. — Espero que eles estejam entendendo a imagem sem que
eu precise desenhar um diagrama.

Alívio inunda o rosto do meu pai. Ele parece muito feliz com a
suposição que fez quando encontrou Sawyer na minha casa
naquela manhã estava errada. — Eu ainda não gosto disso, Jessie.
— Ele e minha mãe compartilham um olhar profundo e
conhecedor. Eles estão fazendo aquela coisa de falar com os olhos.

— Está tudo bem, pai. Prometo. Além disso, assim Sawyer


pode passar mais tempo ajudando Colt. E isso beneficia a todos.

— Ei, pessoal. Reunião de família? — Wyatt entra na sala de


estar.
Ele diz olá para meus pais e me dá um abraço de lado. — Por
que você está aqui? — Pergunto-lhe.

— Papai me pediu para ir com ele ver um cavalo que ele está
pensando em comprar.

— Sua irmã está pegando vadios de novo. — O tom da minha


mãe é frio, e isso me surpreende. Achei que já tínhamos superado
isso. Ela foi legal com Sawyer quando ele estava aqui ensinando a
todos um pouco de ASL básico, e agora ela está frígida?

— Isso é rude, mãe. Sawyer não é um gato sarnento.

— Por que Sawyer é um vira-lata capturado? — Wyatt


pergunta, e eu dou a ele um olhar sujo por usar a palavra.

— Porque ele vai ficar comigo.

— Por causa do Sierra?

Concordo.

Wyatt franze a testa. — Isso vai levar meses.

Meu aborrecimento aumenta. — Eu não disse que ele ficaria


comigo até o fim dos tempos.

Wyatt levanta a mão em uma demonstração de inocência. —


Ok, ok. Estou um pouco surpreso. Eu não sabia que você e Sawyer
eram uma coisa.

Jogo minhas mãos para cima. — Nós estivemos em um


encontro. Isso dificilmente é o suficiente para nos chamar de uma
coisa. — Minha frustração com o ritmo lento de Sawyer está
começando a se infiltrar.
Wyatt acena com a cabeça, coçando a parte de trás da cabeça
com dois dedos. — Sawyer te contou sobre a esposa dele?

Minha cabeça se inclina para trás, como se eu tivesse levado


um tapa. É pior porque estou aprendendo isso na frente das
pessoas que pensam que estou louca por deixá-lo se mudar. —
Que esposa?

— Ex-mulher, eu acho. Ele é viúvo.

Pisco com força. — Você deveria ter liderado com isso.

Wyatt pressiona os lábios, depois os separa lentamente. — Eu


não sei muito sobre o casamento, honestamente. Mas quando eu
soube quem era Sawyer depois que ele comprou a Wildflower, eu
perguntei a ele por que ele estava de volta à Sierra Grande. Até o
último lugar em que ele se lembrava de se sentir feliz.

Algo corta meu peito. Tristeza por Sawyer. Simpatia pelo que
ele experimentou. E tanto entendimento sobre por que ele é do jeito
que é.

— Tenho certeza que ele teria me dito eventualmente. — Eu


sorrio, mas parece fraco.

Wyatt me estuda. — Você tem certeza que sabe o que está


fazendo, Calamidade?

— Eu com certeza não sei o que estou fazendo, mas quando


isso me parou?

Minha bravata funciona. Isso faz meu pai grunhir irritado, e


Wyatt ri. Minha mãe morde o lábio inferior e olha a um milhão de
quilômetros de distância.
— Eu amo todos vocês, eu realmente amo. — saio da sala. —
Mas em algum momento, vocês vão ter que me deixar viver e não
questionar tudo que faço só porque vocês não entendem. — Mando
um beijo para os três e saio da vista deles.

Tanta coisa para esperar para ver Wes. Acho que preciso de
uma pausa da minha família por hoje.

Eu os amo muito, mas não consigo descobrir a pessoa que


estou me tornando se minha família está constantemente me
lembrando quem sempre fui.
20

Estou subindo as escadas quando uma garganta limpa. É


Jessie, empoleirada no balanço da varanda da frente que pende do
teto. Ela tem uma perna enrolada no banco, a outra plantada
firmemente no chão. Seu rosto está livre de maquiagem e ela usa
um top decotado, shorts e um cardigã fino. Seu cabelo parece
úmido.

— Como foi com Wes? — pergunto, chegando mais perto.

Ela não diz nada. Sua cabeça inclina, expondo o comprimento


de seu pescoço, sua pele delicada da cor de creme fresco. Há uma
sensação de puxão no meu peito, um puxão que sobe pela minha
garganta. Tento pensar em Brea, mas quando o faço, tudo que vejo
é Jessie. Isso me faz querer correr e me esconder naquela cama
infantil em que estou dormindo.

Em algum momento, algo tem que dar. Uma barragem só pode


reter tanta água até estourar.

Paro, de pé na frente dela, e quando ela se aproxima, eu aceito


o convite silencioso e sento ao lado dela. — Você trabalhou no
rancho hoje?

Ela balança a cabeça.

Ah, isso explica. Ela está emocionada porque não deu certo
com Wes.
— Fui para a herdade, mas ele não estava lá, e eu não queria
esperar por ele. Então deixei um bilhete para ele em sua cabana,
dizendo que estou preparada para implorar, pedir emprestado e
roubar meu caminho de volta ao rancho.

As palavras de Jessie são ditas com menos entusiasmo do que


o habitual. Algo a deixou muito chateada. — Admiro sua
persistência, — digo a ela.

Ela pega as cordas soltas na parte inferior de seu short. — Eu


não sabia que você era viúvo.

Eu encaro seu perfil, tentando desacelerar meu coração


acelerado. — Como você soube?

— Wyatt mencionou isso.

Desvio o olhar, mordendo o interior da minha bochecha.

— Por que você não me contou? — Ela parece curiosa, mas


não magoada. Olho para baixo e vejo seus dedos se moverem para
a bainha de seu cardigã.

— Eu não gosto de dizer as palavras em voz alta. Elas soam


erradas. Às vezes parece que foi ontem. — Agora vejo o rosto de
Brea, claro como o dia em minha mente. Engulo o nó na minha
garganta com a imagem. Eu me inclino para frente, equilibrando
os cotovelos nos joelhos. Meu olhar se concentra no piso de tábuas
de madeira, mas vejo o oceano quebrando, o spray salgado. —
Tínhamos um lugarzinho na praia. Brea saiu para nadar um dia.
E ela nunca mais voltou. — Lágrimas rolam pelo meu rosto. Dói-
me pensar no que ela deve ter experimentado. Mesmo que ela fosse
capaz de gritar por socorro, eu não sei se ela teria. Ela falava muito
raramente, preferindo ASL. Mas talvez, em um momento de
pânico, ela tenha tentado usar a voz.

— Ela foi recuperada dezessete horas depois. Eu fui um


maníaco por essas dezessete horas, procurando na praia por
quilômetros, nadando mais longe do que jamais nadei. — Meus
olhos se fecham enquanto afasto a imagem dela sendo puxada da
água. A equipe de recuperação me disse para ir embora, mas
recusei. Lamento isso profundamente agora. A imagem está
gravada em meu cérebro, e se eu pudesse estalar os dedos e fazê-
la desaparecer, eu faria.

A palma da mão de Jessie encontra minhas costas. Ela roça a


mão contra mim em movimentos tranquilizadores. — Há quanto
tempo você estava casado?

— Cinco anos. — esfrego meus olhos.

— Sinto muito pela sua perda, Sawyer.

Estico meu pescoço para olhar para ela. Seus olhos são
brilhantes. Ela parece tão triste.

Meu olhar permanece travado nela enquanto tento conciliar


esse sentimento em meu peito. Estou me partindo em dois, uma
rachadura feita por um terremoto. Por uma calamidade.

Calamidade Jessie.

Eu vim para esta cidade, certo de que nunca precisaria


superar o que aconteceu com Brea. Ao meu casamento. Como é
que eu não estou apenas precisando lidar com isso, eu estou
querendo?
— No espírito da honestidade, — Jessie começa, virando seu
olhar completo para mim. — Você sabe sobre seu pai e meu pai?

Minhas sobrancelhas puxam. Sobre o que ela está falando?

— Vou tomar isso como um não. — Seus lábios torcem. — Não


sei detalhes. Eu não pedi por eles, mas podemos, se você quiser.
Tudo o que sei é que havia sangue ruim entre nossos pais na época
em que você morava no Circle B.

Então é por isso que meu pai surtou quando ouviu o


sobrenome de Jessie. Teria sido bom se ele tivesse me contado
sobre isso. Ele provavelmente não queria dizer nada que
atrapalhasse minha progressão, e temia que isso fosse acontecer.

A resposta de Juliette para mim faz muito mais sentido. Mas


a resposta de Beau não é nada tímida para confundir. Ele parece
um homem que guardaria rancor, então por que ele está me dando
boas-vindas?

Ele me pegou com sua filha, por assim dizer, e não me matou
com as próprias mãos ou atirou no chão enquanto eu fugia de suas
terras como um desenho animado. Não faz muito sentido.

— Nós formamos um belo par, hein? Você está com medo de


seguir em frente, e nossos pais costumavam se odiar. — Jessie ri,
mas é vazio.

Ambas as coisas são verdadeiras, e nenhuma vai me afastar


dela. É o que decido neste exato momento.

Sento-me ereto, e envolvo um braço em volta de seus ombros,


e ela se inclina, um meio abraço. Não é o momento certo para o
nosso primeiro beijo. Ainda não. Não quero que venha logo após
esse tipo de conversa, em um clima sombrio. Jessie merece coisa
melhor.

Eu olho para o topo de sua cabeça, abaixando meu nariz até


que ele paira logo acima de seu cabelo.

Ela não tem cheiro de Brea.

Ela é cem por cento, total e inequivocamente, Jessie.


21

O bilhete que deixei para Wes funcionou.

De segunda a sexta-feira, além de um sábado despejando


touros. Isso é quantos dias Wes me pediu para ajudar.
Honestamente, eu pensei que tinha pregado o último prego no
caixão quando tivemos nossa discussão sobre dentes-de-leão.

Ao longo da semana consegui colocar na conversa algumas das


ideias que tenho para o HCC. Aposto que poderíamos transformar
um punhado de terras não utilizadas da HCC em uma fazenda para
escolher. As atrações sazonais fariam bem aqui e criariam um senso
de comunidade. Pergunto-me quanto as pessoas pagariam para
alugar lotes para uma horta comunitária?

Não só Wes absorveu cada palavra, ele não discutiu comigo


sobre o que eu disse.

Será que ele realmente me acha útil? Bem informada? De


valor?

Suspiro.

Meu corpo inteiro dói, mas eu nunca admitiria isso em voz


alta. Todas as noites eu tomo um banho, a água tão quente quanto
eu posso suportar. Eu me estico todas as manhãs e noites,
estremecendo na primeira vez que levanto os braços acima da
cabeça.
Nunca me senti mais como se eu merecesse um dia de folga.
Domingo, domingo abençoado. O dia do Senhor, minha avó Janice
o chamava. Então ela xingaria na segunda-feira. Deus, eu sinto
falta dela.

Sawyer está no quintal, sentado em uma cadeira que comprou


esta semana. Ele reclina, e ele achou que era gravidade zero. Ele
perguntou se eu queria uma, e eu disse a ele que estou
perfeitamente bem colocando minha bunda em cadeiras que não
parecem um passeio de carnaval. Ele riu e estendeu a mão,
brincando puxando uma mecha do meu cabelo. Ele também
adicionou uma churrasqueira ao ar livre no meu quintal, e essa é
uma adição que definitivamente usaria.

A tensão sexual entre nós se tornou quase insuportável.


Sempre quis que ele desse o primeiro passo, e agora que sei que
ele é viúvo, duvidei dessa postura. Ainda assim, está me matando
lentamente. Eu sinto isso nele também, desejo saindo de sua pele.

Todas as noites assistimos TV juntos, lanchamos no sofá e


rimos das mesmas piadas. E se eu não estivesse me dando um
doce alívio quando me enfio debaixo das cobertas depois de dizer
boa noite para ele, acho que estaria em pedaços no chão da minha
sala agora. Aqui jazem fragmentos de Jessie, ela morreu de desejo
extremo.

Quanto mais eu conheço Sawyer, mais eu gosto dele. Antes de


dormir ele deixa os ingredientes do café da manhã prontos, eu
pensei que era nerd até que eu o vi arrastando seus pés cansados
para a cozinha uma manhã, olhos em fendas sonolentos, e
descuidadamente estendeu a mão para o botão da cafeteira. Eu
gostei de ver isso sobre ele. Ele é tão organizando o tempo todo,
tão composto. Testemunhar essa parte de sua personalidade me
fez sentir como se estivesse em um segredo. Um segredo especial
de Sawyer.

— Bom dia, — digo, juntando-me a ele uma vez que eu servi


uma xícara para mim e adicionei creme.

Ele dá uma olhada. O sol cobre o topo de sua cabeça, polindo


seu cabelo castanho em tons de caramelo. Seus olhos, no entanto,
permanecem cinza tempestuoso. A luz do sol não pode mudar isso.

— Você dormiu bastante, — ele comenta, colocando o telefone


em sua coxa. Até agora, eu sei que ele lê notícias de várias fontes
todas as manhãs.

— Semana longa, — respondo, tomando meu café e


estremecendo com a temperatura. — Mas não ouse dizer a Wes
que eu disse isso.

— Nunca, — ele responde, me dando uma piscadela sobre sua


xícara de café. — Quais são seus planos para hoje?

Houve um tempo não muito longe de agora em que eu poderia


ter dito algo como um brunch embriagado com Lindsay e assistindo
a um filme. Agora, isso não está nem no reino das coisas que eu
quero fazer. Estou tão satisfeita por estar onde estou, que não
consigo imaginar como isso costumava ser minha norma de
domingo.

— Preciso pegar algumas coisas para a casa. — inclino minha


cabeça de volta para a cabana que está se sentindo cada vez mais
como a minha a cada dia. E a de Sawyer. A minha e a de Sawyer.
Que bizarro. — Você?

— Gostaria de explorar. Eu não vi muito do HCC.

Sopro meu café. — Foda-se as compras para a casa. Isso pode


acontecer no final da tarde. Que tal eu te levar para um lugar que
considero um dos lugares mais especiais do HCC?

Sawyer assente. — É um encontro. — Seus olhos encontram


os meus, cinza penetrando em azul, uma tempestade sobre o
oceano.

Eu abaixo minha cabeça e bebo meu café. — É um encontro,


— eu ecoo.

●●●

— Por favor, não me dê um daqueles cavalos que Wyatt é


conhecido por domar. — Sawyer me dá um olhar de advertência.

Reviro os olhos e saio para o estábulo. É um pouco de uma


caminhada, mas eu não me importo. Está lindo fora.

— Eu nem chegaria perto de um desses cavalos, e estou


cavalgando desde que posso andar. — sorrio para ele. — Não se
preocupe, eu vou te dar a égua que cada um dos netos aprende a
montar.

Sawyer faz um barulho com os lábios. — Ótimo. O que vem a


seguir, uma mesa e cadeiras de tamanho infantil? Já estou
dormindo em uma cama de solteiro. — Ele envolve a mão em volta
do pescoço e a rola, fazendo alguns círculos em ambas as direções.
Apenas para enfatizar, eu sou positivo.

— Por que você não compra uma cama maior?

— Vou pedir uma quando voltarmos.

— Enquanto você está nisso, talvez invista em um par de botas


de verdade. — sorrio para ele.

Sawyer olha para seus pés. — São botas.

— Não botas de caubói. Você está em um rancho de gado.

— Então? Estes funcionam. E vi Wyatt usando um par muito


parecido. — Ele me dá um olhar aguçado. — Botas de caubói não
são minha praia.

— Que tal chapéus de cowboy? Eles são sua coisa?

— Não sei. Eles são seus?

— Chapéus de cowgirl? Claro. Eu tenho o suficiente deles.

— Não. — Ele balança a cabeça. — Chapéus de cowboy. Eles


são sua coisa?

Oh. Ahhhh. — Sou conhecida por apreciar um chapéu de


cowboy em um homem uma ou duas vezes. Mas não é minha praia,
necessariamente.

— Qual é a sua coisa? — Ele enfatiza a última palavra.

— Não sei. — Passo minha mão sobre a casca irregular do


tronco de um pinheiro quando passamos por ele. — Tendo a gostar
de pessoas legais. Homens que são fortes. Duro e robusto, gosto
de pensar, embora eu não saiba se realmente vi um homem por
quem me senti atraída em uma situação em que ele foi chamado
para ser duro e robusto. Crescer em torno de homens ajudou a
moldar o que acho que um homem deve ser. — E Austin não era
nenhuma dessas coisas. Depois de colocar distância entre mim e
a ASU, é difícil saber o que vi nele em primeiro lugar. Acho que é
seguro dizer que estou tão longe dele. Aparentemente, ele está tão
longe de mim também, já que seus telefonemas cessaram apenas
alguns dias depois que terminei as coisas com ele.

— Então, — Sawyer enfia as mãos nos bolsos enquanto


caminhamos. — Você está dizendo que gosta de homens que são
bons, fortes, durões e robustos.

— Entre outras coisas.

— Tal como?

— Bem, me disseram que sou um punhado. Determinada,


teimosa e tenaz, para citar alguns. — sorrio para ele. — Então acho
que minha coisa é uma pessoa que não tenta me diminuir. Preciso
ser capaz de ocupar espaço em uma sala. — gesticulo ao meu
redor. — Se fosse forçada a ser pequena, acho que isso poderia me
matar. Não literalmente, mas mataria meu espírito.

Sawyer me cutuca com o ombro. — Isso é uma palavra de


advertência?

Eu rio. — Só se você optar por tomá-la como uma. — Quero


perguntar a ele qual é a coisa dele, mas estou com muito medo.
Não quero fazê-lo pensar em sua esposa.

Eu quero que esta manhã seja sobre nós. Não é que eu não
queira que ele se lembre dela, só não quero que isso aconteça neste
exato momento. É perfeito demais. Muito agradável.
Chegamos ao estábulo e entramos. Cheira a cavalos e feno,
couro e madeira. Apresento Sawyer a Priscilla, a égua gentil que
ele montará. Ela é velha, falida e não vai dar trabalho a ele. Um
passeio tranquilo é exatamente o que ela vai fornecer, e
exatamente o que queremos.

Sawyer passa a palma da mão pela lateral dela. — Acho que


ela gosta de mim, — diz ele, parecendo orgulhoso.

Eu não tenho coragem de dizer a ele que ela é assim com todo
mundo. Não quando ele está sorrindo para mim desse jeito. — Ela
definitivamente gosta de você.

Em seguida, passo para Hester Prynne e a preparo para


montar. Eu deslizo uma sela sobre ela e afivelo as correias, então
dou a ela um pouco de amor. Ela move seu rosto sob meu toque.
— Eu também te amo, garota, — sussurro.

Quando eu era mais jovem, ela era uma extensão de mim. Eu


a montava menos à medida que ficava mais velha e mais ocupada.
E então, é claro, ir para a faculdade significava que eu só a via
quando voltava para casa. Wyatt a montou para mim quando
estava fora, certificando-se de que ela recebesse amor e atenção.
Ele me mandou uma mensagem uma vez enquanto estava fora
para me dizer que ela parecia triste e ele achava que ela sentia
minha falta.

— Esta pronto? — pergunto a Sawyer.

Ele coloca sua desculpa para uma bota de caubói no estribo.


Ele balança a perna, se senta na sela e faz um aceno de cowboy.
— Depois de você.
●●●

— É aqui em cima, — digo de volta para Sawyer, arriscando


um olhar rápido em sua direção. Ele é natural na sela, seu corpo
relaxado e rolando junto com os movimentos de Priscilla.

Ele não parece um cowboy, mas acho que não precisa. Ele é
apenas... Sawyer. Alto, forte, seguro. Cowboy é uma atitude
realmente. Muito parecido com pecuarista. É mais em como você
aborda a vida, não necessariamente a ocupação em si. E fica bem
em Sawyer.

Chegamos ao bosque de ciprestes carecas, e estico o braço,


afastando os galhos frágeis enquanto Hester Prynne passa.

Ela para do outro lado, e Sawyer se junta a mim. — Não há


muito agora, mas quando há uma boa chuva, o pequeno lago
enche, e a elevação forma uma pequena cachoeira. A água escorre
por todos aqueles pedregulhos… - faço uma pausa, apontando
para as rochas enormes - … e soa reconfortante à medida que flui.

Sawyer olha para mim. — Este é o seu lugar favorito no


rancho?

— Sim. Eu sei que não parece muito agora. — A água está


quase seca, a terra rachada é a única evidência de que ela existiu.
— Mas eu prometo, é incrível quando chove. E tem mais. Deixe-me
mostrar um segundo motivo. — Desmonto e levo Hester Prynne até
uma árvore onde amarro suas rédeas. Sawyer faz o mesmo com
Priscilla.

— Tudo bem, estou pronto. Mostre-me os segredos do rancho.


— Vamos. — começo e gesticulo para que ele me siga. Seu
passo longo me alcança imediatamente, então ele o encurta para
ficar ao meu lado.

— Está bem ali, — aponto para o outro lado do pequeno lago


seco.

— Aqueles arbustos? — ele pergunta.

— Não apenas qualquer arbusto, — anuncio, sorrindo. Eu


alcanço, arrancando uma fruta madura e jogando na minha boca.
— Amora. As mais deliciosas que você já provou.

— Sou alérgico, — diz.

Minha boca se abre. — O que? Sério?

Ele sorri, e eu de brincadeira bato em seu braço. — Idiota.

Ele ri e puxa uma fruta do arbusto. Ele coloca na boca e


mastiga. — Deliciosa.

— Eu te disse, — respondo, juntando mais dois e comendo-os.

Ele estende a mão por cima de mim e arranca mais algumas.


— Aqui é onde você pode me encontrar a partir de agora.

A felicidade quente se espalha pela minha barriga. Eu amo


poder compartilhar isso com ele, este lugar especial que é apenas
mais uma razão pela qual amo este rancho com todo o meu
coração.

Sawyer mastiga e engole, e não posso deixar de rir. Há suco


em seu lábio inferior. Eu estendo a mão, usando a ponta do meu
polegar para afastá-lo. O suco se foi, mas a cor roxa permanece.
Meu olhar se levanta para encontrar o dele, e o sorriso no meu
rosto morre.

Seus olhos cinzentos são uma tempestade, uma tormenta,


uma tempestade agitada e violenta. Ele engole com tanta força que
seu pomo de Adão sobe e desce.

— Peço desculpas. — Minha mão volta para o meu lado. —


deveria ter perguntado antes de tocar em você assim. Eu não sei
por que…

— Faça isso novamente. — Não é um sussurro ou um


comando, mas algo intermediário.

Meu corpo inteiro desperta, os pelos minúsculos que cobrem


minha carne ficam em alerta. Minhas pernas são de alguma forma
fortes o suficiente para me manter em pé, embora eu tenha certeza
de que elas são feitas de vapor agora.

Eu sigo sua instrução, levantando minha mão, meus olhos


fixos nos dele. Meu polegar roça seu lábio inferior, exercendo mais
pressão do que da última vez, permitindo que meu toque empurre
a plenitude. Seus olhos se fecham e eu arrasto meu dedo em sua
boca. Um gemido baixo escapa dele, fazendo meu polegar vibrar.

Seus olhos se abrem, a fome queimando através deles. Ele


estende a mão para mim timidamente. Como deve estar na cabeça
dele agora? O desejo o impelindo para frente, a culpa o prendendo
ao seu passado. Deve ser um inferno. Ele alcança meu quadril, sua
mão enrolando em torno de mim. Eu desenho uma respiração
trêmula. Ele arrasta dois nós dos dedos pelo meu lado, viajando
pela minha garganta. Ele imita meu toque, arrastando aqueles dois
dedos sobre meus lábios entreabertos. — Seus lábios são roxos
também.

Minha língua sai instintivamente, como se um pouco de


umidade fosse de alguma forma remover a mancha. Sawyer
observa o movimento. Ele respira fundo e se inclina para frente.
Centímetros separam nossos peitos, mas ainda sinto as batidas
aceleradas de seu coração.

— Sawyer, — sussurro, e ele faz uma pausa, sua respiração


quente em meus lábios. — Você está pronto para isso?

Ele está no precipício. Ele muda de marcha à ré? Ou ele solta


o freio e continua?

— Estou pronto para tudo mudar, Jessie.

Eu posso dizer que ele quer dizer isso. Sua voz tem tanta
convicção que seria impossível não acreditar nele.

Ele abaixa sua boca na minha, e por um momento ela fica lá,
congelada, como se ele não pudesse acreditar que está
acontecendo. Então ele descongela, e de repente estou me
perguntando como é possível que este seja nosso primeiro beijo.
Ele pressiona seus lábios contra os meus habilmente, como se
tivéssemos feito isso uma centena de vezes. Minha boca se abre e
sua língua varre para dentro, e agora estou perfeitamente ciente
de que esse homem incendiou meu mundo inteiro na primeira vez
que o vi. Não há outra explicação para este calor, esta intensidade.

Seus braços me envolvem, trazendo-me contra ele. Minhas


mãos correm por seu pescoço e passam por seu cabelo, minhas
unhas arranhando levemente seu couro cabeludo.
Eventualmente precisamos respirar, mas ele não se afasta. Ele
arrasta a boca para o lado, da mesma forma que comecei tudo isso,
arrastando meu polegar em seu lábio, e coloca um beijo no canto
da minha boca. — Isso foi... fenomenal. — Ele ofega as palavras,
seu peito se expandindo no meu enquanto ele respira.

Eu aceno, a sombra rígida em seu rosto raspando contra mim.


— De longe, o melhor beijo que já tive.

Sawyer não concorda com meu sentimento. Eu não o culpo


por isso, mas eu gostaria que ele dissesse de qualquer maneira.
Uma pequena mentira, porque me tornei vulnerável com essas
palavras.

De algum lugar nas proximidades, os sons de gemidos cheios


de dor enchem o ar. Do outro lado do lago desidratado, Hester
Prynne relincha. Olho para ter certeza de que ela está bem e
percebo o movimento além das árvores. Sem dizer uma palavra
para Sawyer, vou para o meu cavalo.

Atrás de mim, Sawyer pergunta o que há de errado, e eu


aponto por cima do ombro com um dedo. O movimento não parou,
e por entre as árvores vejo cascos de cavalos.

Estou correndo agora, desamarrando Hester Prynne o mais


rápido que posso. Pode não ser nada, mas não parece. Algo sobre
os gemidos me deixa nervosa. Subo e desço por entre as árvores.
Pelos sons atrás de mim, suponho que Sawyer esteja fazendo o
mesmo.

No momento em que chego, não há nada para ver e nenhuma


maneira de dizer para que lado os cavalos foram.
— Filho da puta, — assobio, e Sawyer olha para mim com
olhos questionadores.

Movo as rédeas para a esquerda e faço um som com a boca,


incitando Hester Prynne a agir. — Precisamos descobrir que som
era aquele, — digo a Sawyer.

Ele cavalga ao meu lado e, embora eu esteja distraída com


nossa busca, em algum lugar no fundo da minha mente, estou
impressionada com suas habilidades de cavalgar. Estamos indo
mais rápido do que estávamos no caminho para cá.

A vinte metros de distância, vejo o motivo dos sons de choro.


Dois filhotes de leão da montanha circulam sua mãe, empurrando-
a com o focinho. Ela está deitada de lado, imóvel.

Desacelero, aproximando-me lentamente. Não porque estou


sendo cautelosa, mas porque já sei o que vou ver.

— Nós provavelmente deveríamos ficar para trás, — diz


Sawyer, mas balanço minha cabeça.

— Ela está morta. Não há como ela nos deixar chegar tão perto
se ela não estivesse.

Ficamos três metros para trás, num esforço para não assustar
os cavalos ou os filhotes, e mesmo daqui vejo a ferida aberta, a
carne ensanguentada. Eu balanço minha cabeça, raiva me
enchendo, e estico meu pescoço. É inútil, no entanto. Quem atirou
nela e a deixou para morrer já se foi. Talvez eles fossem levá-la, e
então perceberam que Sawyer e eu estávamos por perto.

— Quem diabos faria isso? — Sawyer pergunta, enojado. — E


por que? Ainda não é temporada de leões da montanha.
Lágrimas picam meus olhos. — E ela é uma mãe. Esses
filhotes não sobreviverão sem ela. Eles dependem dela para comer
por dois anos, e eu não acho que eles tenham nem metade dessa
idade.

— O que você vai fazer?

— Precisamos ir para casa e ligar para o departamento de caça


e pesca e contar a eles sobre os filhotes. Eles virão buscá-los.
Mesmo que de alguma forma consigam sobreviver e crescer, eles
não podem estar aqui. Caçar o gado.

— Você acha que a mãe estava aqui para caçar o rebanho?

Olho para o olhar vazio e vidrado do grande felino, sua língua


grossa pendendo para fora da boca. — Ela pode ter sido.

— Então talvez quem fez isso, você fez um favor?

Eu balanço minha cabeça. — Não. Se ela tivesse sido vista


viva, nós teríamos chamado o departamento de caça e pesca e a
denunciado. Eles enviariam um caçador para expulsá-la da terra.
Não se tratava de eliminá-la, mas de colocá-la em um lugar onde
ela e seus filhotes pudessem viver. — Minha mandíbula aperta até
doer. — Alguém tirou essa escolha. E eles infringiram a lei
enquanto faziam isso. — Viro meu cavalo, parando e olhando nos
olhos de Sawyer. O calor do nosso beijo ainda queima, mesmo que
seja difícil pensar no momento. — Vamos voltar para que eu possa
ligar sobre os filhotes.

Devolvemos os cavalos ao estábulo e os colocamos lá. Sawyer


não me beija de novo, mas ele pega minha mão enquanto
caminhamos de volta para minha cabana.
Ligo para o departamento de caça e pesca, mas é domingo. O
melhor que posso fazer é deixar uma mensagem.

Meu humor pelo resto do dia está arruinado. Alguém está


caçando na minha terra. Não apenas caçando. Eles estão matando
de maneira imprudente e cruel.

E eu não vou ter isso.


22

Estou tentando dormir há muito tempo. Uma tarefa


impossível.

Jessie ficou arrasada com o leão da montanha. Eu queria


trazê-la de volta aqui e fazer todas as coisas com ela que eu estava
segurando. A barragem foi aberta. Mas seu coração estava doendo,
e a preocupava saber que há caçadores no HCC.

Quando fazer amor com ela, preciso que ela esteja totalmente
envolvida. E depois de um beijo como o que tivemos hoje mais
cedo? O que fazemos com nossos corpos será nada menos que
extraordinário. Eu já posso dizer.

Eu me abaixo, ajusto o que está acontecendo na frente da


minha calça e me nego a liberação pela qual estou morrendo de
vontade. Todas as noites da semana passada eu não me neguei.

Suspirando, rolo e estremeço quando o osso do lado de fora do


meu pulso encontra o canto da mesa de cabeceira. A dor
surpreendente me deixa ainda mais feliz por ter encomendado uma
cama nova esta noite. Não tenho ideia de quanto tempo vou ficar
com Jessie, mas não posso continuar dormindo em uma cama
pequena demais para mim. Logo estarei de volta em uma cama
destinada a um homem do meu tamanho. Eu empurro o edredom
e me levanto. Faço uma pausa, pairando ao lado da cama e
contemplando meu próximo passo.
Quero ir para Jessie. Eu gosto de seu cabelo macio e desse
doce interior que ela esconde atrás de seu exterior duro.

Talvez eu possa simplesmente me deitar com ela. Segura-la em


meus braços.

Saio do meu quarto e ando pelo corredor. Paro do lado de fora


de sua porta fechada, respiro fundo e a abro. Leva um momento
para meus olhos se ajustarem, e quando isso acontece, eu franzo
a testa. A cama dela ainda está perfeitamente arrumada, apesar
de termos dado boa noite há uma hora.

Saio do quarto dela e procuro por ela no resto da cabana. Eu


até acendo as luzes externas e ando pelo perímetro. O carro dela
sumiu.

Uma bola de ansiedade rói meu estômago. Jessie poderia ter


uma centena de razões pelas quais ela foi embora. Ela não tem que
se reportar a mim.

Brea tinha uma centena de motivos para estar ausente


naquele dia também. Nem ela teve que se reportar a mim. Mas eu
nunca fui capaz de afastar a sensação de que se eu tivesse reagido
mais cedo à sua ausência, as coisas teriam sido diferentes.

Apago as luzes, volto para dentro e ligo para Jessie. Vai para
o correio de voz.

Eu poderia ir até a propriedade e dizer a eles que Jessie está


desaparecida, só que ela não está realmente desaparecida. O carro
dela sumiu, o que significa que ela foi a algum lugar. Tarde da
noite.
Então eu me sento no balanço da varanda da frente, banhada
na escuridão total, e espero.
23

— Depressa, — sussurro, dando-lhe o meu olhar mais severo.

Ele enfia a cabeça pela camisa e fica em pé, sua boca uma
linha dura. — Você apareceu na minha casa tarde da noite para
ajudá-la a caçar pessoas que você nunca viu. Acalme-se e deixe-
me vestir.

— Eu não precisava vê-los. Ela era fresca, Wes. Aposto cada


folha de grama seca nesta terra que quem fez isso ainda está lá
fora, caçando em propriedade privada. Terreno HCC. Odeio o que
eles fizeram, não importa onde foi feito, mas eu odeio ainda mais
porque aconteceu em nossa propriedade. — Sim, eu disse nossa.
Meu sobrenome é Hayden também.

Viro-me para olhar para Dakota e ela dá de ombros se


desculpando. — Estou com Wes nessa, — ela diz. — Você me
assustou pra caralho quando bateu na porta.

Wes resmunga algo ininteligível, enfiando os pés nas botas.


Ele se inclina sobre Dakota e a beija. — Volto em breve. — Ela
começa a abraçá-lo, mas ele balança a cabeça rapidamente e
suavemente desenrola os braços dela.

Que porra foi essa?

Dakota não parece chateada com sua rejeição, então eu


também não ligo para isso. Eu me despeço dela e partimos a
cavalo. Em retrospectiva, provavelmente foi o fato de eu ter
aparecido com o cavalo de Wes, Ranger, que o fez me levar a sério.

— Diga-me mais uma vez o que aconteceu, — Wes ordena, o


nariz de Ranger apenas um fio de cabelo na frente de Hester
Prynne. Claro que o cavalo do meu irmão insistiria em ser o líder.

— Sawyer e eu saímos para um passeio, — começo, minhas


bochechas esquentando quando eu lembro dos lábios de Sawyer
nos meus, sua língua explorando minha boca, do jeito que eu perdi
a cabeça quando ele passou a mão pelo meu pescoço. Felizmente
meu rubor está escondido pela noite. Wes é um monte de coisas,
inclusive observador. Se o sol estivesse brilhando, ele pegaria
meus pensamentos em um instante.

— Não sabia que o cara sabia andar a cavalo, — comenta Wes.

Reviro os olhos. Outra coisa que ele não pode ver. Sei que Wes
gosta de Sawyer, especialmente considerando o tempo que Sawyer
está passando com Colt, mas ele dá merda como Wyatt. Estou
começando a pensar que meus irmãos estão se sentindo protetores
comigo.

— Ele morava em um rancho, — lembro Wes.

— Eu não preciso do lembrete, — Wes contra-ataca.

Para Wes, as histórias do Circle B onde Sawyer viveu não são


lendas de Sierra Grande, mas memórias reais. Eu costumo
esquecer isso.

— De qualquer forma, — digo incisivamente. — Ouvimos esse


som de lamento. E então notei cavalos se movendo atrás de
algumas árvores. Estávamos no lago na extremidade noroeste de
nossa propriedade.

— Aquele com as amoras?

— Exatamente.

— Tentei ir atrás deles nos cavalos, mas eles já tinham ido


embora quando passei por entre as árvores.

— Então você não estava a cavalo quando tudo isso


aconteceu?

— Não. — faço uma cara. Por que isso importa?

— O que você estava fazendo? Eu pensei que você estava


cavalgando?

Merda. Ele vai ser um ótimo pai para um adolescente.

— Nós paramos para colher amoras. — Isso é verdade. Apenas


não um golpe a golpe de tudo o que aconteceu.

— Então você monta em HP e começa para as árvores?

— Praticamente, — respondo, afastando minha irritação por


ele ter encurtado o nome de Hester Prynne. Ela não é um
computador. — Quem estava lá já se foi, mas Sawyer e eu
procuramos a fonte do som original e encontramos os filhotes. E a
mamãe. — A tristeza toma conta de mim. — Tinha que ter sido
quem estava montando aqueles cavalos.

— Por que você não ouviu o tiro?

Dou de ombros. — Silenciador?

— Você acha que alguns caçadores vieram aqui com um


silenciador?
— Como vou saber? Talvez sejam uns idiotas ricos que
gastaram dinheiro em armas e agora estão loucos para usá-las.
Merdas como essas acontecem.

— Estou ciente, — Wes diz rudemente, e isso me lembra de


esfriar. Wes luta com TEPT de seu tempo no exército. Não estou
tentando provocá-lo. — Então, qual é o seu plano? — ele pergunta.

— Meu plano era voltar para o lugar onde eu vi o leão da


montanha e ir de lá. Mas... — desacelero meu cavalo e aponto para
o céu. — Talvez eu não precise.

Wes também para e olha para cima. A lua está minguando,


então não temos muito o que passar em termos de luz, mas há um
dedo inconfundível de fumaça se enrolando acima das árvores a
cerca de um quilômetro e meio de distância.

Wes acena para mim, e continuamos. — Então você estava


mostrando a Sawyer sua parte favorita do rancho?

Eu recuso. — Como você sabe que é o meu lugar favorito?

Sua risada suave flutua na minha direção. — Você pedia muito


para ir lá quando era pequena.

— Eu não me lembro disso.

— Claro que não. Você era muito jovem. Mas eu me lembro.


Levei você lá antes de embarcar.

Não tenho certeza do que dizer. Ouvir que ele me levou para o
meu lugar favorito me faz sentir estranha. Triste que eu não me
lembro disso, e desejo que eu fizesse.

— Sim, mostrei a Sawyer. — Não tenho certeza do que mais


dizer. Tudo nesta conversa é desconfortável, por diferentes razões.
— Ouvi dizer que vocês são colegas de quarto agora.

Eu franzo a testa. — Mamãe e papai têm bocas grandes.

— Wyatt me disse.

— Claro que ele fez. — solto um suspiro irritada. — E você? —


Vamos ver se ele gosta que as mesas sejam viradas contra ele. —
O que foi aquele abraço estranho na sua casa? Dakota tentou te
abraçar e você a empurrou.

— Estou amarrado, Jessie, — explica Wes. — Dakota entendeu


imediatamente.

— Oh. — Então me lembro da conversa tensa que tive na


propriedade algumas semanas atrás. Eu pergunto a ele sobre isso
e ele leva quase um minuto inteiro para responder.

— Primeiro, eu deveria me desculpar com você. Pedi que você


viesse me ver, e quando você chegou, eu briguei com você. A vida
tem sido estressante ultimamente. Mais do que eu esperava. — A
tensão em sua voz se estende pelo espaço que nos separa. Eu
tenho o desejo incomum de abraçá-lo. — Dakota quer que eu me
afaste do rancho enquanto trabalhamos com Colt. Ela está
sobrecarregada com a deficiência dele, o que eu entendo. Mas eu
tenho que trabalhar. Se eu não trabalhar, tudo desmorona. Esses
implantes cocleares custam dinheiro e... — ele faz uma pausa,
pesando as palavras. — Todo mundo está dependendo de mim. E
estou com falta de mão.

— Você não tem que ser.

— Você conhece o negócio. O rancho sempre foi dirigido por


Haydens. Warner desistiu, e Wyatt não está interessado.
— A última vez que verifiquei, sou um Hayden.

— Jessie, você sabe…

— Shh, — digo rapidamente, enquanto uma luz no nível dos


olhos brilha nas proximidades. Viro meu cavalo e tomamos um
caminho tortuoso em direção à fumaça.

Quanto mais nos aproximamos da fonte, mais posso ver Wes.


Ele olha para mim, indicando através das árvores com o queixo.
Um homem descansa em uma cadeira, seus pés esticados em
direção ao fogo ardente.

Um incêndio nesta terra seca? Golpe número dois.

Nós rastejamos até chegarmos à beira da clareira onde eles


montaram acampamento. Os olhos do homem estão fechados.
Roncos suaves deslizam entre os lábios entreabertos.

Eu suspiro, minha mão voando para minha boca. É um dos


babacas de algumas semanas atrás, os caçadores que encontrei
no caminho para encontrar Marlowe. Meu sangue ferve quando me
lembro deles, sua caminhonete chique e xingamentos sujos, o jeito
que eles giravam terra ao redor do meu carro, rindo. Tão
desdenhoso. Mais do que isso, porém, era a maneira como eles
achavam que mereciam se comportar como quisessem.

Do meu alforje, tiro um pedaço de corda.

— Jessie, — Wes sussurra um aviso, mas eu levanto a mão.

— Confie em mim, — sussurro de volta.

Ele fica em silêncio.


Eu desço silenciosamente do meu cavalo e avanço, chegando
por trás do cara adormecido. Com cuidado, deslizo a corda sobre
a cabeça do cara adormecido. A julgar pela garrafa meio vazia de
Bourbon caro a seus pés, eu diria que o peso da corda
provavelmente não o acordará.

Dois minutos depois, o segundo homem, o que carregava a luz


que vimos, tropeça no acampamento. Ele leva alguns segundos
para registrar os dois corpos adicionais, mas quando o faz, ele
gagueja até parar. Ele enfia a mão no bolso, mas Wes é mais
rápido, sacando sua pistola primeiro.

O cara bate em todos os bolsos, seus olhos voando em direção


a sua barraca.

Inclino minha cabeça. — Aposto que você gostaria de ter essa


arma com o silenciador agora. — É um salto supor que é isso que
ele tem, mas aparentemente não muito longe de um. Ele não nega.

Seus olhos estão selvagens, seu alarme fazendo com que ele
se contorça.

— Mas não sou uma mãe indefesa com filhotes. Pode ser um
pouco mais difícil atirar em mim.

Seus olhos estão em mim, a fogueira refletida em suas íris. —


Eu já vi você antes. — Sua voz treme, mas seu tom contém
indignação justa.

— Certo. A primeira vez que nos encontramos, você me


chamou de boceta e tentou me bater. Eu disse que você não era
bem-vindo para caçar na minha terra. E mesmo assim, — abri
meus braços. — Olha você aqui.
— Você está brincando comigo, sua puta louca? — ele brada.

O volume faz com que seu amigo se mexa. Ele se senta e olha
ao redor, piscando enquanto observa a cena. Ele olha para a corda
e, quando ela é registrada, começa a entrar em pânico. — Cuidado
aí, — estendo a mão em advertência. — Ela está preparada para
levá-lo para um passeio.

Os olhos de todos se arregalam. Incluindo o de Wes. Seus


braços permanecem imóveis, sua arma apontada para o homem
desamarrado na beira do acampamento.

Olho para o homem cujo pescoço sustenta minha corda. A


mesma corda que enrolei no pescoço de Hester Prynne. — Eu não
me mexeria, se fosse você, — aconselho-o. — Ou gritar. O máximo
que você pode fazer é respirar. Talvez mijar nas calças, se quiser.

— Por que você está fazendo isso? — o outro cara pergunta.

— Há muita coisa que posso tolerar. Mas algo que não


suporto? O indefeso sendo predado. Você fez isso hoje. Mesmo
depois que foi dito por mim … - eu aponto de volta para mim - …
ficar fora desta terra. Você deve ter pensado que eu estava
brincando.

Ele torce a mão na frente de si mesmo, palmas voltadas para


fora. — Olha, olha, não queremos problemas.

— Ah, sério? Foi por isso que você atirou na leoa da montanha
com os filhotes hoje? Com um silenciador? Quando ainda não é
temporada de caça? Em propriedade privada? Parece-me que
problemas é exatamente o que você queria. — Eu sorrio para ele.
— Podemos fazer um acordo aqui, esta noite, sob a lua e as estrelas
e o próprio Deus?

— Sim, sim, — o homem com a corda em volta do pescoço


rosna.

— Você dá o fora da minha terra. E você fica fora da minha


terra. Para sempre.

Ambos os homens acenam. Wes recua, mantendo a arma


apontada para o homem na beira do acampamento. Ele monta
primeiro, e eu paro com o pé no estribo.

— Solte-o, — grita o homem, apontando para a corda. — Solte-


o. Nós concordamos.

— Hum. — Monto Hester Prynne. — Não tenho certeza se


acredito em você.

— Eu prometo, — o homem com a corda geme. — Por favor.


Por favor. Eu tenho filhos.

— Assim como aquele leão da montanha. Você a matou na


frente de seus filhos.

— Sinto muito. Sinto muito. — Ele está chorando.

Eu levanto minha perna, preparada para chutar Hester


Prynne. E eu faço. Mas, um momento antes, eu uso a faca que
Warner me deu cinco anos atrás para cortar a corda.

Wes e eu partimos, galopando pela nossa terra, o ar da noite


batendo em nossas bochechas. Nós não paramos por muito tempo,
e quando paramos, ele está sorrindo de orelha a orelha. A
felicidade se espalha através de mim ao ver meu irmão mais velho
sentindo alegria pura.
— Você é inacreditável, Calamidade.

É a primeira vez em muito tempo que meu apelido não soa


como uma coisa ruim.
24

Jessie me deixa no estábulo depois que recuso sua oferta de


me acompanhar de volta à minha cabana. Preciso de algum tempo
para descobrir merda.

Não tenho certeza do que pensar dela. Tudo o que pensava


sobre minha irmã parece ter sido mais do que um pouco errado.
Eu não gosto de pensar em como eu tenho enganado ela. Além
disso, não há muito que possa fazer sobre isso agora.

Mas há algo diferente que posso fazer daqui para frente.


Dakota estava certa quando disse que eu precisava me afastar do
rancho enquanto resolvemos os problemas de audição de Colt. Eu
sabia que ela estava certa, é claro. Minha esposa é uma mulher
inteligente. Uma espécie de guerreira. Mas ela precisa de mim
agora, e meu filho também.

Estou passando pelo jardim da frente, minhas botas dobrando


as folhas de grama a cada passo, quando uma voz profunda navega
pela escuridão.

— O que você está fazendo, Wes? — É meu pai, parecendo


confuso e cansado.

Mudo de rota e sigo para as escadas, subindo duas de cada


vez. Ele está sentado em uma cadeira, um tornozelo cruzado sobre
o joelho oposto. A calça do pijama e o cabelo bagunçado me dizem
que ele estava tendo uma noite malsucedida de sono.
Não estou com muita vontade de sentar, não depois da noite
que acabei de ter, então encosto minha bunda no parapeito da
varanda e cruzo os braços. — Jessie veio e me pegou. Me disse que
tinha encontrado um leão da montanha morto na borda noroeste.

— Causas naturais?

Balanço minha cabeça lentamente, ainda conciliando o que vi


esta noite com tudo que eu pensava da minha irmãzinha. — Bala.
Recente, também, de acordo com Jessie.

Espero enquanto meu pai tem a reação esperada. Quando ele


termina de xingar, ele pergunta: — E agora?

Eu balanço minha cabeça. — Nada. Jessie cuidou disso.

Ele descruza as pernas e se inclina para frente, apoiando os


cotovelos nos joelhos. — Cuidou disso, como?

Conto toda a história do começo ao fim, e meu pai interrompe


algumas vezes para fazer perguntas. A admiração e conflito que
sinto? É claro como o dia em seu rosto também. — Ela foi como
você, papai. Essa é a melhor maneira que posso descrever. Ela fez
o que você teria feito. Dei-lhe segurança, mas ela comandou a
situação.

As mãos do meu pai se erguem e ele pressiona as laterais dos


dedos contra os lábios enquanto pensa. — Jessie fez tudo isso?
Nenhuma direção sua?

— Nada disso foi ideia minha. Ela entrou naquela situação


com absoluta confiança. Ela estabeleceu a lei e, quando eles a
desafiaram, ela mostrou a eles qual seria a consequência do
descumprimento. — Respiro fundo, uma respiração que estou
segurando desde que Warner deixou seu cargo no HCC. — Vou
pedir a ela que administre o rancho comigo. Seja meu segundo em
comando. Ela tem ideias, pai. Boas. Ela é tudo o que este rancho
precisa.

Ele balança a cabeça lentamente, os minúsculos músculos ao


redor de seus olhos se contraindo enquanto ele reflete sobre
minhas palavras. — Ok, filho. Eu confio no seu julgamento.

Concordo. — Está combinado então. Eu vou falar com ela


amanhã. Eu não acho que há uma chance de ela dizer não.

— Duvido. Só vi o amor dela por este rancho em outra pessoa.


— Ele me olha significativamente. — Você e Jessie são muito mais
parecidas do que eu imaginava.

Olho para as minhas botas, mas os cantos da minha boca se


erguem. — Durma um pouco, velho. — empurro para fora do
corrimão.

— O mesmo para você, — ele diz.

Volto para minha cabana, para minha esposa grávida e meu


filho, meus passos mais leves do que há muito tempo.
25

Uma silhueta alta e preenchida me cumprimenta quando


chego a minha cabana. Sawyer. Ele está na varanda escura,
encostado em uma coluna. Eu desço do meu carro e vou até lá.
Quanto mais me aproximo, mais vejo a preocupação em seus
olhos.

— Tudo certo? — ele pergunta. Acho que é o jeito dele de


perguntar onde estive sem fazer a pergunta diretamente.

— Estou bem, — respondo, subindo as escadas. Há apenas


três deles, e agora estou no patamar. — Wes e eu saímos e
encontramos aqueles caçadores. Eu não acho que eles vão voltar.

Foi de longe a coisa mais ousada que já fiz. Minhas mãos


tremeram durante todo o trajeto de volta ao estábulo, e acho que
Hester Prynne sentiu. Ela estava nervosa também.

Eu nunca teria ido embora com aquele homem amarrado atrás


de mim. A arrogância era para mostrar. Uma mensagem. Acho que
ele entendeu.

Medo e preocupação enrugam seus olhos. — O que você fez?

— Nós demos a eles um aviso.

— Que tipo de aviso?


Eu desmorono e digo a ele. Sawyer permanece imóvel, seu
rosto uma máscara de descrença quando eu conto a ele sobre a
corda e o cavalo.

— Eu não teria feito isso, — asseguro a ele. — Meu objetivo


era incitar medo suficiente para que eles não voltassem. E, espero,
algum respeito. — Eles não me mostraram nenhum respeito na
primeira vez que os encontrei, e fui legal. Então, desta vez, segui
um novo caminho. Para algumas pessoas, é preciso percorrer uma
estrada diferente para chegar ao mesmo destino.

Entramos na casa e acendo a luz do teto da cozinha, piscando


com o brilho depois de passar as últimas duas horas no escuro.
Tudo que eu quero é um copo de água.

— Você está uma bagunça, — diz Sawyer, vindo atrás de mim.


Eu olho para baixo. Uma camada de sujeira cobre meu jeans.

— Wes e eu tivemos uma pequena corrida perto do final do


passeio. Eu ganhei. — sorrio orgulhosamente. — Devemos ter
levantando muita poeira.

— Suas mãos, — diz Sawyer, seus olhos nas minhas palmas.


— Elas estão queimadas?

— Um pouco, — admito, olhando para as marcas vermelhas.


— Queimadura de corda. Fui um pouco descuidada quando estava
preparando.

— Você tem alguma coisa para isso?

— Há algum bálsamo no armário de remédios no banheiro.

Ele se afasta, retornando com o tubo. — Sente-se, — diz ele,


apontando para a cadeira.
Eu afundo, deixando meu corpo relaxar na madeira. Não é
confortável, mas neste momento é tudo que eu preciso.

Sawyer fica de joelhos, apoiando um antebraço em sua coxa e


se inclinando para frente. — Deixe-me ver, — diz ele,
desatarraxando a tampa e estendendo a mão. Coloco minha mão
virada para cima na dele. Delicadamente, como se estivesse
tocando vidro fino, ele alisa o bálsamo sobre as escoriações.

Gemo baixinho. Eu não quero.

Ele para, os olhos preocupados em mim. — Machuquei você?

Eu balanço minha cabeça rapidamente. — Não.

Seus dedos se movem do meu ferimento, mas permanecem na


minha pele. — Eu fiz o oposto de te machucar? — Seus olhos
procuram os meus, suavizando nos cantos, e seu lábio inferior se
afasta em antecipação à minha resposta.

Meu coração dispara pelo meu peito, batendo por todo o meu
corpo. — Eu gosto quando você me toca.

Ele solta minha mão e segura minhas bochechas nas suas. —


Eu quero desaparecer em você, — diz ele, sua voz baixa
retumbando profundamente em mim, deslizando em fendas
escondidas.

Fecho meus olhos contra suas palavras, seu olhar firme, as


emoções que sinto saindo dele. — Você tem certeza que está pronto
para isso?

— Eu nunca estive pronto para nada tanto quanto estou


pronto para você.
Isso é tudo o que é preciso. Nossos lábios se encontram, e
mesmo que nossas bocas não tenham mais gosto de amoras, o fogo
incrível está lá, a descrença absoluta de que isso é novo para nós.

Estamos explorando línguas, membros errantes, mãos que


vagam. Sawyer, ainda em um joelho, puxa minha camisa sobre
minha cabeça, seguida pela sua. Ele se afasta para olhar para
mim, e eu removo meu sutiã. Ele agarra meus quadris, me
arrastando para frente na cadeira. — Enrole suas pernas em volta
de mim, — ele instrui, então nos coloca de pé. Sua língua desliza
sobre meu pescoço e minhas mãos enrolam em seu cabelo
enquanto ele nos leva para o meu quarto.

Ele me deita na cama, e são necessários dois de nós para


trabalhar esses jeans apertados sobre meus quadris. Ele sorri para
mim, um sorriso incongruente para aqueles olhos tempestuosos.

— Finalmente, — diz ele, jogando o jeans no chão. Ele sai da


calça do pijama ao mesmo tempo que deslizo minha calcinha pelas
minhas pernas. Ele fica ao lado da cama e olha para mim. Não
consigo decifrar sua expressão, exceto para dizer que ele parece
surpreso. Seus olhos percorrem meu corpo, então ele se inclina
sobre mim.

Ele arrasta as pontas dos dedos sobre a minha pele até que
cada centímetro quadrado de mim esteja em atenção.

— Sawyer, — imploro, me contorcendo.

Subindo na cama, ele me cobre como um cobertor e separa


meus lábios com um deslizar de sua língua. Nós nos beijamos por
tanto tempo que eu fico impaciente, e quando empurro meus
quadris nele, eu o sinto sorrir contra mim. Ele se senta, se
acomodando entre minhas coxas abertas, e sorri para mim.

— Onde está sua paciência? — ele pergunta, arrastando-se ao


longo de mim.

Meu núcleo aperta em antecipação. — Muito longe.

— Puta merda, — ele diz de repente, se afastando.

— O que há de errado, — pergunto, sentando em meus


antebraços e piscando com a mudança repentina. Ele está se
lembrando da mulher que veio antes de mim?

— Eu não tenho camisinha.

Cinco palavras gloriosas. Suspiro de alívio.

— Eu faço. — Apontando, digo: — Mesinha de cabeceira. —


Ele estende a mão e o encontra facilmente. Eu não moro aqui há
tempo suficiente para criar uma gaveta desorganizada de
cabeceira.

Uma vez que está no lugar, ele agarra meus quadris e me puxa
para a beirada da cama. Ele se inclina sobre mim, e sem hesitação,
empurra para dentro. Suspiro contra sua bochecha com a
deliciosa sensação de plenitude, e ele vira o rosto, pressionando
seus lábios contra os meus. Eu não sei como ele consegue ser
gentil e impiedoso dentro da mesma ação, mas ele consegue.

Ele me fode sem reservas, e eu combino com ele. Estamos


suados e ferozes, sua boca procurando meu peito, necessitada de
mim. Nunca me senti tão querida. Tão desejada.

Ele nos rola, e agora estou em cima dele. É uma posição em


que nunca estive, e fico tensa. Sawyer assume, segurando meu
traseiro, me levantando. Ele faz o trabalho no início até eu
encontrar um ritmo e assumir. O calor aumenta, e mesmo quando
meu corpo sobe e desce, dentro de mim só aumenta. Mais e mais
alto, até minhas pernas tremerem contra ele e meus dedos
agarrarem seu peito. Minha cabeça inclina para trás, e é a primeira
vez que sinto algo tão intenso e requintado.

Eu grito seu nome, e não acho que eu queria, mas isso o


estimula, e assim que eu estou descendo do meu alto, ele me puxa
com ele. Ele me beija com tanta emoção, me segurando apertado
enquanto ele fica tenso e empurra, então para.

Fico mole, um peso morto em seu peito expansivo. Sua mão


corre pelas minhas costas.

— Eu... — eu tento dizer. — Nunca é... — suspiro baixinho. —


Esses sentimentos. Eu nunca senti nada assim.

Sawyer não diz nada, e depois de alguns segundos, inclino-me


para o lado e rolo na cama. Ele tira a camisinha, dá um nó na
ponta e a joga no chão.

— Venha aqui, — diz ele, com os braços estendidos. Eu volto


para ele, e ele se dobra sobre mim. Seus lábios escova meu cabelo.
— Eu disse que você me assusta, mas é mais do que isso. Você me
apavora.

— O suficiente para fazer você querer parar?

Sawyer prende a respiração, e embora eu saiba que ele está


recebendo oxigênio, eu tenho a sensação de que ele está
respirando em mim.

— O suficiente para me fazer nunca querer parar.


Eu não sei como responder, e eu não sei se uma resposta é
mesmo necessária. Os eventos da noite se instalam em mim, e de
repente estou exausta.

Estou quase dormindo quando registro seus lábios contra meu


pescoço, suas palavras suavemente ditas flutuando sobre mim. —
Eu também nunca senti nada assim.

●●●

Wes está batendo na minha porta. Eu sei que é ele porque ele
mandou uma mensagem alguns minutos atrás, me dizendo que
estava a caminho. Meu palpite é que ele se lembrou de que não
estou morando sozinha no momento e pensou que talvez quisesse
se anunciar.

Boa ideia da parte dele, considerando o que acabou de


acontecer na sala de estar. Sawyer e eu acordamos juntos,
preparamos o café, e quando começou a preparar, ele virou os
olhos famintos para mim. Fingi correr, mas ele me pegou
facilmente e começou me curvando sobre o sofá.

Olho para a janela da sala, verificando se as cortinas estão


completamente fechadas, e termino de amarrar meu roupão.

— Oi, — cumprimento Wes, abrindo a porta pela metade.

Ele está de pé no tapete de boas-vindas que eu adicionei na


semana passada, a sujeira chovendo de suas botas enquanto ele
as limpa. Ele diz olá e pede para entrar.
Olho para a sala de estar. Ainda está em um estado de
desordem, mas devo dizer não?

— Claro, — abro a porta e gesticulo para dentro. Wes entra,


dá uma olhada nas almofadas no chão e nos papéis que foram
obviamente empurrados para fora da mesa de centro, e cora. O que
me faz corar.

— Então, — ele começa, virando as costas para a bagunça. —


Parece que você e Sawyer estão se dando bem.

— Não me dê sermão. Você tem dois filhos. Eles são como


troféus sexuais vivos.

Surpreendentemente, Wes começa a rir. — Eu tinha um


sargento que chamava seus filhos de 'troféus de merda'. Mas não
na frente de sua esposa.

Sorrio também e, ao mesmo tempo, tento não me maravilhar


com a forma como essa conversa está me fazendo sentir mais igual
do que nunca. — Eu não acho que você veio aqui para me dizer
isso. O que está acontecendo?

— Conversei com papai e gostaria de pedir que você se junte a


mim na administração do HCC.

Minha respiração foge, bloqueando em outro lugar dentro de


mim. Eu apalpo meu peito. — Wes, isso é uma piada? Porque isso
é... tudo. Isso significa tudo para mim.

— Você merece isso, Jessie. Eu sei que todos nós a chamamos


de Calamidade, mas às vezes acho que esse apelido é merecido, e
outras vezes me pergunto se o apelido lhe deu licença para se
comportar de certas maneiras.
— Talvez um pouco dos dois, — admito. Ele tem razão.

— Depois do que aconteceu ontem à noite, a maneira como


você defendeu nossa propriedade e nosso nome, me fez perceber
que estamos vendendo você a descoberto. Talvez o que este rancho
precise é de um pouco de sangue jovem. Alguém para introduzir o
HCC em uma nova era.

Eu quero abraçar Wes, mas estou nua sob meu roupão, então
me conformo com um aperto de mão. Eu acho que ele entende,
porque ele cora de novo, o que não é algo que eu me lembre de Wes
ter feito. É estranho e reconfortante, essas coisas novas que estou
aprendendo sobre ele. Estou conhecendo meu irmão mais velho de
uma maneira que me privava devido à nossa diferença de idade.

— Oh, — digo, lembrando do correio de voz que ouvi depois


que vi a mensagem de Wes. — O departamento de caça e pesca me
ligaram de volta. Eles estão enviando um caçador para encontrar
os filhotes. Alguém chamado John Reynolds. Ele vai parar na
herdade para se apresentar antes de começar.

— Entendido, — Wes diz, balançando a cabeça. Ele sai, e eu


cubro meu rosto com as mãos. Quero gritar, guinchar, pular e
dançar. Estou muito sobrecarregada para fazer isso, então, em vez
disso, fico aqui, meus gritos excitados reverberando por todo o
meu corpo.

O HCC. É tudo que eu sempre quis.

Sawyer entra na sala. A umidade escurece seu cabelo. Ele


acabou de tomar banho.
Estou tentando entender como minha vida está se encaixando
tão perfeitamente, mas é difícil.

Então tento não pensar nisso. Eu envolvo meus braços ao


redor do pescoço de Sawyer, e digo a ele minhas boas notícias. Seu
sorriso chega aos ouvidos. Mais tarde naquela noite, ele me leva
para jantar, para na loja de vinhos a caminho de casa e compra a
garrafa de champanhe mais cara.

Ficamos bêbados, e Sawyer faz coisas gloriosamente


indescritíveis no meu corpo.

Minhas bochechas doem de tanto sorrir.


26

— Onde está sua cabeça, Sawyer? — Leon recua, soltando as


mãos. — Essa é a quinta vez que você comete um erro.

— Eu estou bem, — resmungo, enxugando minha testa na


parte interna do meu braço.

— Venda suas mentiras para alguém burro o suficiente para


comprá-las.

Meu corpo inteiro está exausto demais pelo esforço físico para
rir, mas consigo acenar com a cabeça. — Novamente.

Leon se prepara, levantando as mãos cobertas de almofadas.


— Então o que é? — ele pergunta na primeira vez que eu bati nele.

— Eu disse que estou bem.

Ele faz uma cara. — Você não é você mesmo hoje.

— Estou lutando, — admito. Jab, jab.

— O que está acontecendo?

Estou confuso como o inferno, não que eu vá dizer a Leon.


Neste ponto, tenho certeza de que estou me apaixonando por
Jessie. Ela governa meus pensamentos. Minhas escolhas.
Adormeço todas as noites com ela em meus braços. Nós dois juntos
parece o par mais óbvio do mundo. Minha atração por ela é um
incêndio, não confinado e descontrolado.
Não é uma coisa ruim, não mesmo. Mas isso está me forçando
a um lugar desconfortável. Tenho que examinar o que estou
fazendo com a minha vida, e para onde ela vai a partir daqui. Eu
congelei quando Brea morreu, e agora estou descongelando, e está
fazendo uma bagunça enorme.

— Há apenas um monte de merda para percorrer, Leon.

— Então você veio ao lugar certo, meu amigo. — Ele tira suas
luvas, jogando-as em um banco próximo. — Já volto, — diz ele, e
quando volta, está usando suas luvas de boxe. — Vamos treinar.

Limpo minha garganta e balanço meus ombros, tentando


mantê-los soltos. Nunca lutei antes, e ele sabe disso. Eu não peço
a ele para ter calma embora. Esta é provavelmente a melhor coisa
para mim agora.

Leon dá dicas à medida que avançamos.

Amplie sua postura.

Mantenha seu peso no pé da frente.

Siga.

Então ele me acerta bem na bochecha. Eu engulo a dor e


continuo.

Um minuto depois, terminamos. Leon me dá um tapinha nas


costas com a mão enluvada. — Você se saiu bem pela primeira vez.
Desculpe pela sua bochecha, — diz ele. — Sangrando um pouco.

— Tudo certo.

Dois caras entram, vestidos para se exercitar e carregando


sacolas de ginástica. Eu reconheço um de algum trabalho que ele
fez no Wildflower. Ele deve me reconhecer também, porque seus
olhos se iluminam. — Rancho Wildflower, certo? — ele pergunta,
aproximando-se com a mão estendida. — Connor Vale. Eu fiz um
monte de trabalho lá antes de sua abertura.

Concordo. — Eu pensei que era de onde eu te conhecia. Sou


Sawyer Bennett.

Ele estala os dedos. — Sawyer, isso mesmo. — Ele aponta para


seu amigo. — Este é Finn Jeffries.

Leon vem por trás deles e coloca as mãos em seus ombros. —


Talvez vocês dois possam convencê-lo a dizer qual é o problema
dele. Ele não quis me dizer nada, mas tenho certeza que tem a ver
com uma mulher.

— Obrigado, Leon, — digo inexpressivo.

Connor e Finn riem. — Estive lá, — Finn diz conscientemente.

— Uh, sim, — Connor concorda. — Qualquer coisa que valha


a pena ter vale a pena trabalhar duro, e isso inclui uma mulher.
Isso é o que meu pai sempre disse. — Um lampejo de dor cruza
seu rosto, e tenho a sensação de que falar sobre seu pai no passado
é um desenvolvimento recente.

— Obrigado rapazes. — aceno para Finn. — Foi um prazer


conhecê-lo. Eu vou deixar você fazer o seu treino.

Depois de tomar banho e parar em Sugar Creek para aqueles


muffins de mirtilo de morrer, estou voltando para Sierra Grande.
Não me sinto muito melhor depois do boxe, mas me sinto mais
leve. Leve o suficiente para ligar os Rolling Stones e bater meu
polegar na batida do volante.
Do nada, há um baque. Uma colisão. Uma tosse cortante do
meu carro.

— Porra, — gemo, tirando meu pé do acelerador e freando com


cuidado. Meu carro sai mancando da estrada e para.

Não há nada ao redor por milhas. Estou entre Brighton e


Sierra Grande, numa espécie de terra de ninguém. Montanhas
elevam-se de cada lado de mim, e eu estou no fundo delas. Sem
serviço de celular.

Abro o capô e saio, caminhando para a frente do meu carro.


Levanto o capô, coço a parte de trás da minha cabeça e olho para
a máquina complicada na minha frente.

Eu não entendo nada de motores.

Pego meu telefone para pesquisar na internet por uma razão


pela qual um carro pararia no meio do caminho, então lembro que
não tenho serviço. Minhas mãos correm pelo meu cabelo,
apertando em minha frustração.

Quantas milhas são para Serra Grande? Onze ou mais? O


mesmo para Brighton. Estou equidistante, preso entre duas
cidades. É desarmante como estou mal equipado para lidar com
esta situação.

Aposto cem dólares que Jessie conhece um motor de carro.

Jessie, com seu cabelo cor de mel e rosto lindo. Suas maçãs
do rosto salientes e sua prontidão perpétua, como qualquer desafio
que surja em seu caminho, serão enfrentadas com força. Há algo
sobre isso que eu acho inegavelmente atraente.
Não posso passar mais tempo pensando em Jessie. Eu tenho
que sair dessa situação. O que significa que estarei voltando para
Sierra Grande. Não vou nem calcular quanto tempo isso vai levar.
Saber não vai mudar nada.

Volto para o meu carro, pego minha garrafa de água e checo


duas vezes se tenho minha carteira e meu telefone atualmente
inútil. Hora de caminhar.

Estou a três quilômetros de distância, minha mente cem por


cento em Jessie agora que não tenho nada além de tempo em
minhas mãos, quando uma caminhonete modelo antigo vem
engasgando na estrada. Não há muito sobre o motorista que eu
possa ver daqui, exceto o cabelo. Eu reconheceria aquela cor
vermelha tingida de garrafa em qualquer lugar.

— Sawyer, — Greta chama, rolando até parar. Ela pressiona


um antebraço na base da janela aberta e se inclina para fora. — O
que você está fazendo aqui?

— Vou dar um passeio, — respondo, e Greta ri sua gargalhada


grossa e calorosa.

— Mais como aquele seu carro chique não poderia lidar com a
estrada de volta.

Sorrio para ela. Apesar de ter problemas imprevistos no carro,


Greta é uma pessoa que sempre me faz sorrir. Ela é uma das
primeiras pessoas que conheci quando apareci na cidade, e a vejo
pelo menos uma vez por semana para a entrega de seus muffins
de mirtilo.

Concordo. — Você pode estar certa sobre isso, Greta.


— Digo-lhe uma coisa, — diz ela, olhando para o leste, — estou
a caminho da padaria Lady J agora. Seu caminhão de entrega
quebrou ontem e ainda está na loja. Ajude-me a carregar todos
aqueles muffins e eu vou dar-lhe uma carona de volta para Sierra
Grande.

— Feito, — respondo, andando e entrando.

Conversamos um pouco enquanto avançamos, e Greta sorri


para meu carro chique na beira da estrada quando passamos por
ele.

— Não me choca que você goste de coisas finas. — Ela pisca


para mim. — Sua mãe estava sempre bem vestida e elegante.
Unhas bonitas, cabelo enrolado. — Ela aponta para as pontas de
seu cabelo com a palma da mão quando diz isso.

É difícil me concentrar no que ela está dizendo agora, porque


tudo em que consigo pensar é na minha mãe. E o esmalte rosa que
ela sempre usava, e o modelador de cachos desconectado na
bancada do banheiro.

Eu não tinha ideia de que essas memórias existiam no meu


cérebro, e agora elas estão aqui e parecem reais o suficiente para
serem tocadas. Como se eu pudesse entrar no que é agora o quarto
de Jo e Wyatt no Wildflower e ver a bolsa de maquiagem da minha
mãe no balcão, seu roupão com estampa floral pendurado no
gancho da parede.

— Você conhecia minha mãe? — pergunto a Greta, fazendo


tudo ao meu alcance para esconder meu coração despedaçado.
Ela encolhe os ombros. — Tanto quanto uma pessoa pode
conhecer um conhecido. Eu só abri uma loja alguns anos antes de
você e sua família chegarem. A tua mãe tinha uma queda pelos
meus scones de limão. Mas ela foi a única pessoa que os comprou,
e eu parei de fazê-los depois…- o olhar de desculpas de Greta trava
em mim. — Ouça-me, indo e vindo. Você provavelmente apreciaria
um pouco de paz e sossego.

— Está tudo bem, Greta. Você não precisa evitar falar sobre
ela. — digo isso de improviso, como se não fosse grande coisa, mas
minhas mãos estão tremendo. Os micro movimentos não são de
dor, no entanto. É emocionante falar sobre ela. Para ouvir sobre
ela. Por muito tempo ela foi uma invenção, e essas anedotas a
tornam real.

Mas Greta deve pensar que estou apenas a aplacando, porque


ela muda de assunto e me conta sobre imigrar para os Estados
Unidos quando tinha quatorze anos. Ela diz que sentiu falta da
Ucrânia no início, mas depois conheceu um homem quando tinha
apenas dezessete anos e se casou com ele dois anos depois. — Eu
não o amava no começo, — ela admite. — Mas com o tempo, o
amor cresceu. Raramente há respostas certas. — Seu encolher de
ombros me diz o quanto ela acredita nessas palavras. — Às vezes,
há apenas as respostas mais adequadas. E elas terão que servir.

Eu sorrio para ela. Ela diz: — Você gosta de sabor de limão,


Sawyer?

Concordo.
Ela acaricia minha coxa maternalmente. — Bom. Porque eu
estava pensando que talvez eu devesse colocar scones de limão de
volta no meu cardápio.

É neste exato momento que percebo o quanto a cidade de


Sierra Grande está começando a se sentir em casa novamente.

●●●

Greta me deixou na oficina, e tenho 45 minutos de espera até


que o guincho chegue com meu carro. Para passar o tempo,
devolvo o telefonema do meu amigo Sebastian.

Eu uso o termo 'amigo' vagamente. Sebastian é um pouco


idiota, e ele nunca foi minha escolha de amigo em primeiro lugar.
Ele era um amigo da família de Brea e sempre aparecia em eventos,
embora nunca se encaixasse. Quando questionei Brea, ela
explicou que ele era filho do cliente de seu pai. Sua presença fez
mais sentido depois disso.

Depois que Brea morreu, Sebastian decidiu que era seu


trabalho me ajudar a superar minha dor. Eu não tive coragem de
dizer a ele para bater na areia. Isso foi um grande erro da minha
parte, porque ele apareceu em Sierra Grande para uma visita
surpresa. Eu não acho que ele vai voltar, não depois de seu
encontro com Beau Hayden.

— Bennett, — Sebastian explode no telefone, soando mais


duro do que qualquer homem adulto deveria. — O que é bom,
irmão?
— Não muito, — inclino-me contra a parede na frente da
oficina. O cheiro de odor corporal e carne do almoço estava me
incomodando, então vim aqui para respirar.

— Você não está ficando cansado da vida de cidade pequena


ainda?

Penso no rancho Hayden e na cabana de Jessie. Quando me


sento na varanda dos fundos e olho para o céu, parece que é a
primeira vez em muito tempo que consigo respirar de verdade.

— Não exatamente, — respondo.

— Você conseguiu conhecer Tenley Roberts? Estou


namorando uma garota nova e ela estava falando sobre como a
atriz trocou LA por Sierra Grande, e percebi que você meio que fez
a mesma coisa.

— Uh, sim, eu a conheci. Ela é legal. — De jeito nenhum vou


dizer a ele que Tenley é a cunhada da mulher que estou
namorando.

— Você deveria fazer amizade com ela e pegar alguma sujeira.


Aposto que você poderia ganhar dinheiro vendendo suas
informações.

Meus olhos se fecham e eu balanço minha cabeça. Os ternos


caros que Sebastian usa não podem limpar seu código moral sujo.
— Eu vou passar.

— Então pelo menos compartilhe essa merda comigo. Eu te


coloco nos lucros, sessenta e quarenta. Eu poderia usar o dinheiro.
Você me deve, de qualquer maneira.

Eu franzo a testa. — Como é isso?


— Você não fez nada além de rir depois que aquele filho da
puta cowboy atropelou meu carro no posto de gasolina.

— Eu não diria que ele atropelou seu carro. Empurrou, sim. E


isso foi culpa sua. Você estava sendo um idiota.

— Eu pensei em pegar um dedo do meio, não ter meu carro


empurrado para fora do caminho por aquele caminhão gigante.

Sorrio silenciosamente com a memória de Beau no banco do


motorista, seu rosto estoico. Sebastian definitivamente
subestimou como Beau nivela sua própria marca pessoal de
justiça.

— Parece que me lembro de alguém dentro daquele caminhão


te dando uma surra. — Wyatt. Ele deu a Sebastian um dedo do
meio rígido enquanto eles passavam. O reboque vira a esquina. Ele
está adiantado, e eu sou grato. — Tenho que ir, — digo. Se eu
nunca falar com Sebastian novamente, será muito cedo. Da
próxima vez que ele ligar, não ligarei de volta.

Desligo e fico parado, observando o motorista do caminhão de


reboque trabalhar na plataforma e na corrente. Meu carro sai do
caminhão e eu pago o cara. Ele está perdendo um pedaço do nariz,
como se um cachorro mordeu, e eu faço o meu melhor para não
olhar.

Os mecânicos colocam o carro na baia e, depois de alguns


minutos olhando o motor, voltam para a área de espera e me dizem
que é minha correia dentada. Eles não têm um em estoque para
este tipo de carro, diz ele. Por trás de suas palavras há uma
diversão que eu até esperaria que eles tivessem uma. Ele me diz
que pode conseguir um até amanhã, e tê-lo pronto para mim no
dia seguinte.

Eu sei melhor do que perguntar a ele se ele sabe como posso


conseguir um carro alugado. Agradeço a ele e vou para fora. A
mercearia fica a algumas ruas de distância, então vou lá e pego
um wrap9 de peru pronto e uma garrafa de água, depois me
acomodo no parque que fica no meio da cidade. Vou esperar um
pouco, sabendo o quão ocupada Jessie está no rancho, depois ligo
para ela e...

— Olá, Sawyer.

Assusto-me e me viro. Eu não tinha ouvido ninguém se


aproximando, mas Beau está ali, a poucos metros de distância.

Seus Wranglers10 não são tão firmes quanto os de seus filhos,


mas ele ainda consegue parecer uma pessoa que eles usariam em
uma campanha publicitária. Rosto enrugado, olhos astutos e um
ar grisalho sobre ele. O cowboy consumado.

E o pai de Jessie.

Sento-me em linha reta no banco, então decido ficar de pé.


Aperte a mão de Beau. Começo a dizer alguma coisa, mas percebo
que é estúpido comentar sobre o tempo.

Fui reduzido a um adolescente atrapalhado.

9
É um sanduíche que é recheado e enrolado. Uma tortilha.
10
Jeans apertados usados por cowboys, caras do campo e esses tipos.
Beau se senta no final do banco. Sento-me e movo meu
recipiente de comida vazio para o outro lado de mim, para que não
fique entre nós.

Ele cruza o tornozelo sobre o joelho oposto e olha para a High


Street. — Lembro-me de quando tudo isso era diferente. Os prédios
estão ficando mais altos agora. Mais chique. As roupas são mais
caras do que eu me lembro de serem. — Ele ri uma vez. — Escute-
me. Estou começando a soar como um homem velho. — Ele olha
para mim. — Sinta-se à vontade para revirar os olhos. Isso é o que
eu costumava fazer quando meu pai me contou como ele pagou
um centavo por um hambúrguer.

Sorrio. Não há chance de eu estar revirando os olhos. Não só


ele é o pai de Jessie, ele é o fodido

Beau Hayden. — Quando eu reclamava de algo quando era


jovem, meu pai me dizia que andava para a escola na neve e era
uma subida nos dois sentidos.

Beau abre um sorriso. De repente me lembro do que Jessie


disse sobre Beau e meu pai. Não sei nada além do que ela me disse,
porque meu pai não respondeu nenhuma vez que tentei ligar para
ele.

— Como esta seu pai? — Beau pergunta, coçando o nariz. Sua


indiferença parece forçada.

— Tudo bem, suponho. Jessie me disse que vocês se


conheciam antigamente?

Beau assente lentamente. — Nós fizemos. Também não


gostávamos muito um do outro.
— Por que não?

A boca de Beau se abre como se ele fosse responder, mas ele


faz uma pausa, e eu sinto sua mudança de tudo o que ele ia dizer
para a resposta que ele decide dar. — Eu acho que seu pai deveria
ser o único a responder isso. Se fosse um dos meus meninos
fazendo a pergunta, eu esperaria que ele me fizesse a mesma
cortesia.

— Claro, — respondo rapidamente. A não resposta de Beau


traz alívio. Se o sangue entre ele e meu pai fosse tão ruim, ele
provavelmente não hesitaria em me dizer. Permitir que meu pai
tenha a chance de falar o lado dele primeiro implica um nível de
respeito. E isso, por sua vez, me diz que o rancor entre nossos pais
não é um problema para mim e Jessie.

Mudo de assunto e conto a Beau sobre meus problemas com


o carro. Ele sorri com a minha história, e vejo Wyatt em suas
feições. — Isso é o que acontece quando você não dirige uma
caminhonete, — ele brinca, me dando merda. — Você precisa de
uma carona de volta para o rancho?

— Sim, senhor, — aceno com a cabeça para ele. — Eu


apreciaria. Isso vai me impedir de ligar para Jessie. Ela está
ocupada. — Ela está empenhada em administrar o rancho com
Wes, e estou muito orgulhoso dela por lutar para alcançar seu
objetivo.

— Isso ela é, — responde Beau, ficando de pé. — Você está


pronto para ir?

Jogo meu lixo em uma lixeira próxima e ando com ele até sua
caminhonete. Ele fica quieto por uma boa parte do caminho para
fora da cidade, mas quando ele pega o desvio para o rancho, ele
olha na minha direção.

— Wyatt me disse que você costumava ser casado.

— Eu era, — aceno. Os nervos disparam pelo meu estômago.


— Estou viúvo agora.

— Lamento muito ouvir isso.

— Obrigado.

— Você namorou muito desde a morte de sua esposa?

Eu mordo de volta um sorriso. Beau está pescando, tentando


descobrir o que estou fazendo com sua filha. — Jessie é a primeira.

Ele concorda. — Ela é um punhado, aquela menina. Mas ela


merece o melhor. E ela vai te dar o seu melhor também. — Ele
desvia o olhar da estrada por tempo suficiente para me fixar com
um olhar significativo. — Certifique-se de que você é digno disso.

Um sentimento rasga meu peito, como se uma profunda honra


tivesse sido concedida a mim. A chance de ser o homem de Jessie.
Cuidar dela, intervir e ocupar o lugar de seu pai.

Jessie diria que ela pode preencher seus próprios sapatos, e


ela não está errada. Mas ela também não está completamente
certa. Ela pode se virar sozinha, mas quão melhor nós dois
podemos ser se estivermos juntos?

Um pensamento eufórico me atinge, repentina e


violentamente. Alguns dos melhores dias da minha vida ainda não
aconteceram.

Com este simples entendimento, um peso flutua do meu peito.


Eu não tenho que ficar preso no lugar, colocando toda a minha
energia em luto por minha mãe e Brea. Meu coração sabe disso
desde o momento em que conheci Jessie. A inclinação de sua
cabeça, a elevação de seu queixo, o brilho em seus olhos, todos
eles me chamaram do meu esconderijo com segurança atrás da
minha dor. Foi meu cérebro que permaneceu teimoso. Engraçado
como o coração e o cérebro podem entrar em guerra um com o
outro.

A bandeira branca foi levantada. Meu coração ganhou.

— Eu não vou machucar sua filha, Beau. Você tem minha


palavra.

Ele não diz mais nada até chegarmos à cabana de Jessie, e


mesmo assim, tudo o que ele diz é adeus. Mas ele está satisfeito
com a minha resposta.

Entro, trabalho mais algumas horas e depois preparo o jantar.

Meus passos são leves. Meus membros soltos. O corpo físico


se apega à emoção, e quando você escolhe liberar as dores de
ontem, o corpo sabe disso.

Não estou dizendo que nunca mais pensarei em Brea e sentirei


um clarão rasgar meu peito. Eu espero totalmente. Mas isso vai
me debilitar como costumava fazer? Não.

Ainda há pontas soltas para amarrar na Califórnia. Mas para


agora?

Sierra Grande está cada vez mais parecendo minha casa para
sempre.
27

Sawyer brinca com Colt por uma hora quase todas as manhãs.
Ele disse a Dakota que a melhor maneira de Colt aprender ASL é
através da repetição.

Sawyer é natural. Não apenas com o ensino, mas com Colt. Eu


acho que ele está surpreso com o quão fácil ele leva para isso.
Quando Colt pega uma nova placa, um sorriso exultante ilumina
o rosto de Sawyer, e isso faz algo ao meu coração. Sawyer não está
apenas sendo gentil com Colt por minha causa. Ele tem uma alma
genuinamente gentil e um desejo de ajudar Colt a entender o
mundo.

Cada um de nós traz para o nosso relacionamento nossos eus


passados, e ASL é o que Sawyer carregou com ele para este
próximo passo de sua vida. E eu honestamente amo isso nele. Ele
tem um pequeno superpoder para acompanhar todas as suas
outras qualidades maravilhosas.

Dizer que as coisas estão indo bem entre nós seria um


eufemismo. Eu tive dificuldade em me arrancar de seus braços
esta manhã e me colocar nos movimentos de me preparar para o
meu dia. Eu consegui, é claro, mas apenas por pouco.

Assim que saí pela porta, Dakota chegou com Colt e duas
sacolas de brinquedos. Ela está aprendendo ASL também, mas é
mais difícil para adultos. Cão velho, novos truques.
Beijei o topo da cabeça de Colt, abracei Dakota, e vi Sawyer
pegar a mão de Colt. Os pequenos dedos de Colt envolveram dois
dos de Sawyer, e meu coração deu um passo vacilante. Há algo
especial entre Sawyer e Colt, e sei que não sou a única que vê e
sente. Quando Sawyer começou a jogar com Colt, eu temia que
Wes ficasse irritado, chateado ou com ciúmes. Acho que se eu
estivesse no lugar dele, no fundo gostaria de ser o herói que
poderia ajudar meu filho.

Mas Wes me surpreendeu por ser completamente o oposto. Ele


é grato por Sawyer, e pelo que ele pode ensinar a Colt. Para mim,
é o melhor exemplo de amor altruísta. O aprendizado de Colt e o
aumento da qualidade de vida excedem em muito o orgulho e o ego
de Wes.

Por mais que tivesse gostado de ficar e assistir Sawyer jogar


com Colt, e me juntar a mim, o dever me chamava, então continuei
meu caminho.

Wes e eu passamos o dia cortando, enfardando e empilhando


feno. Dividimos os cowboys em dois grupos. Metade fica e nos
ajuda, a outra metade sai para verificar as vacas pastando. No final
da tarde, Wes me informa que vai tirar alguns dias de folga na
próxima semana para ir a Phoenix para a cirurgia de Colt.

— Você vai ficar por conta própria, — diz ele, seu tom quase
um aviso.

— Estou ciente, — respondo, olhando ao redor para ter certeza


de que somos os únicos no celeiro antes de tirar minha camisa de
manga comprida. Estou usando uma regata branca por baixo, mas
não quero estar em uma peça de roupa tão pequena na frente dos
cowboys. Minúsculos pedaços de feno caem no chão enquanto eu
sacudo minha camisa. — Vou ficar bem, — asseguro a ele.

— Sei que você vai, — ele responde. Não tenho certeza se ele
está falando sério, ou se ele acha que se disser o suficiente ele vai
se convencer de que é verdade.

Terminamos o dia antes do pôr do sol. Estou exausta e suja, e


o chuveiro chama meu nome. Mas primeiro, quero parar e ver
Hester Prynne. Eu não pude montá-la hoje, então o mínimo que
posso fazer é dar-lhe um presente. Eu faço o meu caminho para o
estábulo depois de uma rápida parada para pegar uma maçã na
cozinha da casa.

Os cavalos estão todos prontos para o dia. Eles me


cumprimentam quando eu afasto a porta e entro. Hester Prynne
está perto dos fundos, então ando naquela direção, olhando para
os cavalos pelos quais passo para ter certeza de que tudo está
como deveria. Ela relincha quando me vê, e corro um dedo em seu
focinho para dizer olá.

— Este fim de semana, ok? Vamos dar um longo passeio. —


Ela cheira a maçã no meu bolso e eu a alimento com ela. Fico mais
um pouco com ela, depois vou para minha cabine.

Um arrepio de excitação percorre minha espinha, sabendo que


Sawyer está lá esperando por mim.
28

Sawyer faz amor comigo de manhã. É o tipo lento, sem pressa.


Amor de sábado de manhã, com toques persistentes e pontas de
narizes coladas. Estou tomando anticoncepcional agora, então não
há mais barreira entre nós. É uma proximidade que aprecio. Amor,
mesmo.

Até agora, sei que estou apaixonada por ele. Dizer a ele como
me sinto é complicado. Ele tem muito mais bagagem do que eu.
Eu venho para a mesa com o que agora parece ser uma aventura
boba com um professor. Sawyer traz uma vida passada e um
desgosto muito real.

Ele nunca fala sobre isso, mas só posso imaginar como é difícil
se permitir seguir em frente comigo. Por enquanto, vou manter o
que sinto para mim mesma e aceitar o que ele pode dar.
Atualmente, isso significa seu corpo. É suficiente para mim. Esta
forma de comunicação é muito eficaz.

— Goza comigo, — ele murmura, lábios roçando os meus com


cada impulso.

— Tão perto, — sussurro. Sawyer alcança entre minhas


pernas, trabalhando enquanto meus músculos da coxa se enrolam
e eu me estilhaço embaixo dele.

Seu corpo fica tenso. Ele me beija, e nós gememos na boca um


do outro, engolindo os gritos de prazer.
Sawyer cai em cima de mim, seu peso quase demais, mas não
tanto que eu não possa suportar. Eu arrasto minhas unhas em
suas costas, levemente fazendo cócegas nele. — Isso foi magnífico,
— comento, olhando para o teto. Seus ombros tremem com sua
risada. — Você acredita que temos que continuar vivendo uma vida
normal depois disso?

Ele vira a cabeça para o lado para poder falar. — Terrível.

Ficamos quietos e passamos mais alguns minutos quando eu


o lembro que prometi uma carona para Hester Prynne hoje. — Você
quer se juntar?

— Não se eu tiver que montar Priscilla novamente.

— Wes terá um acesso de raiva se você montar Ranger. Mas


Warner não se importará se você montar Titan. Ele não é tão
apegado ao seu cavalo quanto Wes.

— Ou você, — diz Sawyer, levantando-se para pairar sobre


mim. Ele dá um beijo na minha testa e sai de cima de mim. —
Vamos comer primeiro.

●●●

— Eu não sei. Não tenho certeza se ele gosta de você. — Titan


faz um barulho irritado e balança a cabeça. Seu casaco preto
brilha à luz do sol.

— Ele está bem, — insiste Sawyer, enquanto Titan dá alguns


passos para mostrar seu descontentamento. — Ele só está bravo
porque quer que o piloto seja Warner. Ele vai se acostumar comigo.
Passamos pela propriedade e aceno para o vovô. Ele está
sentado na varanda, com as mãos cruzadas no colo. Vamos cada
vez mais longe, passando pelas vacas que ainda pastam e pelos
touros que estão fazendo o que podem para inseminá-las.

Evito os pinheiros e os choupos e desço em altitudes mais


baixas, onde a terra se achata e parece um mar de amarelo. Ainda
estamos muito altos para os saguaros aparecerem, mas eles estão
lá fora, bem distantes.

Paramos por um momento, e eu sento na sela, olhando para


tudo. Quase me tira o fôlego, esse amor que sinto. Pela minha
terra, minha herança, o que os homens antes de mim construíram.
Olho para Sawyer sentado em Titã ao meu lado. Para Sawyer. Ele
me rouba o fôlego também. E meu coração. Ele roubou isso
também.

Ele está usando o chapéu de cowboy que eu dei a ele, e ele o


tira, pressionando-o contra o peito e se inclinando para me beijar.

Sorrio para Sawyer e começo a atravessar a planície.


Pensamentos vagam pela minha mente, principalmente sobre o
quão perfeito este momento é. Este dia. Como estou animada para
o que vai acontecer a seguir na minha vida.

É um daqueles pensamentos que devem vir com um aviso em


seus calcanhares.

O que acontece a seguir é tudo menos perfeito.

Três quartos de milha depois, Hester Prynne dá seu último


passo. Acontece tão de repente, esse movimento defeituoso. Um
passo profundo, um abaixamento antinatural de um lado, o
equivalente de um a um grito de cavalo. Ela cai, todos os membros
se dobram, mas apenas um está quebrado. Meus joelhos puxam
para cima e eu afundo com ela, rolando para o lado. Sawyer grita
meu nome, mas mal posso ouvi-lo. Meus próprios gritos e soluços
são muito altos em meus ouvidos.

— Não, não, não, — choro, tentando chegar perto do meu


cavalo, meu primeiro amor, mas Sawyer me segura. Hester Prynne
tenta sem sucesso se levantar, e ele está me impedindo de
atrapalhar suas tentativas frenéticas.

Olho para fora, olhando para a terra, e vejo o que perdi antes.
Buracos de toupeiras. — Foda-se, — grito, cobrindo meus olhos.

Sawyer puxa seu telefone do bolso de trás e liga para Dakota.


— Você pode, por favor, dizer a Wes que precisamos de um
veterinário? O cavalo de Jessie está ferido. — Ele faz uma pausa.
— Onde estamos, Jessie?

— Sudeste. A alguns quilômetros de onde o rio Rioja encontra


o Verde.

Sawyer repete. — Vem aqui o mais rápido que puder. Eu... —


Ele para, olhando para mim. — Eu não acho que é bom.

Balanço minha cabeça. Não porque ele está errado, mas


porque ele está certo e não posso acreditar.

— Jessie, mesmo que eles se apressem, ainda vai demorar um


pouco. Há uma sombra lá atrás onde você pode esperar por eles.

— Absolutamente não, — digo, minha voz dura. Afundo na


frente de Hester Prynne. Ela se acalmou agora. Acaricio seu
focinho e olho em seus olhos grandes. Há tanta alma neles. — Eu
não vou deixá-la.

Sawyer se acomoda ao meu lado. O sol bate forte enquanto os


minutos passam. Sawyer tira sua camisa e a coloca sobre mim.

— Obrigada, — sussurro. Meu coração parece ter sido


escavado com uma faca cega.

— Fale-me sobre ela, — diz Sawyer. Eu sinto seu beijo no lado


da minha cabeça. — Conte-me sobre a primeira vez que você a viu.

— Ela era uma potra. Eu assisti a mãe dela dar à luz. Por
muito tempo depois, pensei que todos nós nascemos em sacos. —
Lágrimas ardem em meus olhos. — Eu não a montei por alguns
anos, não até que ela estivesse totalmente madura. Enquanto
esperava que ela fosse forte o suficiente para carregar meu peso,
brinquei com ela. Alimentei ela. Andei com ela. Ela era como todas
as crianças. Muito brincalhona. — Meu rosto está coberto de
umidade quando começo a soluçar. Não posso falar depois disso.

Wes dirige com o veterinário, Dr. Zahn, atrás dele. Ele a


examina e me diz o que já sei. A perna dela está quebrada. Ele
começa a me contar o prognóstico, mas eu o impeço. Não preciso
ouvir. Eu já vi isso antes. Simplesmente nunca senti isso. Assim
não.

— Sei o que você tem que fazer. Apenas faça.

Wes fala. — Jessie, acho que você deveria ir primeiro. Ninguém


deveria ter que ver seu cavalo sacrificado.

Eu me surpreendo ao concordar.
Wes dá as chaves do caminhão para Sawyer. — Leve-a para
casa. Eu ajudarei o Dr. Zahn a fazer os preparativos e montar Titan
de volta.

Fazer arranjos. Para a remoção do corpo de Hester Prynne.


Uma nova rodada de lágrimas derrama de mim. Abraço meu irmão
e o vejo tentando segurar as próprias lágrimas. Sawyer segura
minha mão e abre a porta do passageiro para mim. Subo para
dentro e mantenho meus olhos no meu amado cavalo no espelho
lateral.

E eu choro. Choro e choro até minha cabeça latejar. Chegamos


à nossa cabana, e Sawyer me carrega para dentro. Ele me deita na
cama que considero nossa, e me traz remédio para dor de cabeça
e um copo de água.

— Era apenas para ser um passeio divertido, — sussurro,


deitada de lado e olhando pela janela do quarto, meu olhar na terra
que trabalho duro todos os dias.

Nunca me senti tão traída por isso.


29

Vi esse desgosto. conheço esse desgosto.

Não há nada que possa fazer por Jessie agora, exceto estar lá
para ela. Eu faço o jantar para ela naquela noite. Ela pega nele.

Eu faço seu café da manhã, almoço e jantar no dia seguinte.


Ela o move com seu utensílio.

Jessie me disse que culpa a terra. Entendo a necessidade de


culpa. De que outra forma uma pessoa dá sentido ao sem sentido?
O luto é um antagonista por si só. Um ladrão da realidade, um
metamorfo.

Ela sai do nosso quarto na segunda-feira de manhã. Ela está


vestida, seu cabelo preso em um rabo de cavalo, e ela consegue
dar um pequeno sorriso. — Eu pareço com o chefe?

Wes parte hoje para a cirurgia de Colt em Phoenix. Jessie


assumirá seu papel enquanto ele estiver fora. — Você parecia o
chefe para mim muito antes de ser realmente o chefe.

Ela pisa em meus braços abertos e me abraça. — Obrigada por


tudo neste fim de semana. Você cuidou de mim.

Enrolo um dedo sob seu queixo e peço que seus olhos


encontrem os meus. — Eu gosto de cuidar de você. — As palavras
parecem tão naturais quanto nosso primeiro beijo, tão familiares
quanto a primeira vez que a toquei. Como se tudo fosse uma
eventualidade e não precisássemos nos preocupar com nada disso.
Jessie fica na ponta dos pés e me beija antes de sair para a
reunião que ela convocou com os cowboys.

Eu a observo ir, me sentindo grato por ela ter conseguido se


levantar e sair pela porta esta manhã. Não é a primeira vez que me
surpreendo com a força dela. Duvido que seja o último.

Jessie administra o rancho pelos próximos três dias, até Wes


chegar em casa da cirurgia de Colt, e depois mais dois dias, porque
Wes quer ficar em casa com seu filhinho. É uma bênção, porque
permite que ela mantenha sua mente longe da perda de Hester
Prynne.

Passamos o fim de semana em êxtase doméstico. Cochilamos


na rede, ajudo Jessie a planejar um jardim no quintal, e à noite
bebemos vinho demais e faço amor com ela na mesa da cozinha.
Jessie chama isso de foda, o que me dá a maior oportunidade de
todos os tempos.

— Essa não era a minha definição de foder, — digo a ela,


levantando minha cabeça em desafio. Ela me desafia a mostrar a
ela o que eu considero que a palavra significa, assim como eu sabia
que ela faria.

— Você caiu direto na minha armadilha, — digo a ela,


balançando as sobrancelhas.

Ela sorri e bate na ponta do meu nariz. — Eu sei.

Duas horas depois, depois de uma tigela compartilhada de


sorvete de menta, eu a instruo a ficar de quatro. Então pego um
punhado daquele cabelo loiro mel e mostro a ela exatamente o que
quero dizer.
Adormecemos abraçados um ao outro.

É absolutamente, absolutamente perfeito.

●●●

Jo me ligou mais cedo e me pediu para passar. Ela disse que


acha que encontrou algo que pertencia à minha família.

A perspectiva me deixa nervoso. E um pouco doente.

Eu aprendi que havia um monte de coisas deixadas para trás


nesta casa quando saímos da cidade, itens que meu cérebro de dez
anos não notou. Jo me disse uma vez que havia uma cozinha
totalmente equipada quando ela assumiu o rancho. Como se
alguém pudesse entrar e começar a preparar o jantar. Ela me
ofereceu os utensílios de cozinha, já que era tecnicamente
propriedade da família Bennett. Eu recusei. Se qualquer coisa, eu
teria doado. Eu certamente não poderia enviá-lo para o meu pai.

Entro pela porta da frente do Wildflower. Costumava haver


uma parede separando a sala de estar e a sala de jantar, mas Jo a
derrubou. Muito pouco sobre o interior da casa é semelhante a
quando morava lá, mas ainda é familiar para mim. Minha mãe
andou por esses andares. Ela me confortou na minha cama depois
de um pesadelo. Ela serviu manteiga de amendoim e sanduíches
de banana para mim na copa e leu livros sobre pesca comigo.

Jo aparece atrás de um armário na cozinha. — Sawyer, aqui,


— ela chama, acenando para mim.
Eu entro. A cozinha é um desastre. Jo sorri feliz, afastando o
cabelo dos olhos. — Você já fez o almoço para um bando de
meninos? Que tarefa.

Ela não quer uma resposta, porque ela provavelmente já sabe


disso.

— Aqui. — Ela gira, levantando uma caixa do balcão. Eu pego


dela e olho para a tampa. Não parece nada de especial, mas há
uma sensação de afundamento no meu núcleo.

— Encontrei isso bem no fundo do meu armário, na prateleira


mais alta. — Jo passa um dedo por cima. — Tirei o pó da tampa.
Mas não posso garantir o interior. Eu não abri, então não tenho
ideia do que você encontrará aí.

Seguro a caixa na minha frente, virando-a para um lado e para


o outro. Sem marcas, sem nomes. — Como você determinou que
isso pertence a mim?

Jo dá de ombros. Ela se volta para os almoços. — A quem mais


pertenceria?

Ela tem um ponto. Eu agradeço a ela e vou embora. Coloco a


caixa no banco do passageiro, então subo no banco do motorista e
olho para cima. Acho que não quero aquela caixa me encarando
enquanto dirijo. Uma sensação sinistra passa por mim. Não sou
uma pessoa supersticiosa, mas estou agindo como uma agora. Eu
saio, removo a caixa e a coloco no porta-malas.

●●●
Jessie está ocupada trabalhando. Estou totalmente sozinho
aqui na cabana.

Faço um bule de café e olho para a caixa que coloquei na mesa


da cozinha enquanto a bebida forte se infiltra. Uma parte de mim
quer arrancar a tampa e descobrir o que está dentro. Há outra
parte de mim, igual em tamanho, que nunca quer saber o que a
caixa contém.

Eu me sirvo de uma xícara de café e abro a caixa.

Roupas? Eu vasculho os suéteres. Eles estão cobertos de


poeira. Encontro duas aranhas mortas, uma maior que a outra,
mesmo com as pernas dobradas, e estremeço quando minha mão
roça seu corpo petrificado. E então, aninhado nas dobras de uma
jaqueta de veludo cotelê, quase como se alguém a tivesse colocado
ali de propósito, está um livro encadernado em couro. Minha unha
do polegar deixa uma marca descolorida ao riscar a capa. É
amarrado com uma corda feita do mesmo material.

É a corda que me diz o que é isso. Um diário.

Engulo o nó na minha garganta. Abro o diário. Lágrimas


brotam instantaneamente em meus olhos. A letra da minha mãe.

2 de abril de 1999

Uma fazenda de gado! Eu não posso acreditar. Conseguimos.


Nós realmente fizemos isso. Não temos ideia do que estamos
fazendo, mas e daí?! Vamos aprender de pé. Hora de comprar umas
botas e um chapéu novo!
30 de abril de 1999

Sawyer está instalado na escola primária e está feliz. Ele fez


alguns amigos, e eles parecem legais. Fiz um amigo também, no meu
passeio matinal.

13 de agosto de 1999

O que aconteceu hoje... bem, não era para acontecer. Amo o meu
marido. Nós estamos felizes. É que, às vezes, me sinto triste. E ele
me pegou em um momento azul.

4 de setembro de 1999

Quem é o homem com quem me casei? Onde está o homem com


quem me casei? Isso era para ser divertido. A criação de gado
transformou-o numa pessoa que não reconheço. Ele fala
constantemente sobre a indústria de carne bovina e trazendo vacas
para o mercado. E os Hayden. Ele é obcecado pelos Haydens. Ele
não é o único.

28 de outubro de 1999

Por que devo ficar e sofrer se não estou feliz? Essa é a pergunta
que tenho me feito. O que isso ensina a Sawyer? É melhor que ele
veja sua mãe se preocupando com seu bem-estar e felicidade? Ou
vou machucá-lo, não importa o que eu faça?

31 de dezembro de 1999
Mais algumas horas, e será um novo ano. A virada de um
século. Esse negócio de Y2K é um absurdo. Este é o ano em que
finalmente serei feliz.

4 de janeiro de 2000

Conseguimos. Eu fiz isso. Não parecia ilícito ou errado. Parecia


a melhor decisão que já tomei.

14 de fevereiro de 2000

Eu amo-o.

16 de março de 2000

Vou começar uma nova vida com o homem com quem devo estar.
Nunca estive mais feliz do que estou agora.

Lágrimas escorrem pelo meu rosto. Sou um homem adulto,


mas estou chorando como uma criança de dez anos de novo. Não
pela mãe que perdi, mas pela que nunca conheci.

Ela estava traindo meu pai quando morreu. Ele devia saber.
Essa deve ser a razão pela qual ele nunca fala sobre ela. Por que
saímos da cidade com pressa, por que ele deixou tantos de nossos
pertences para trás. Ele estava furioso com ela, não queria as
coisas dela. Ele não queria ser lembrado dela.

Eu ligo para ele, mas ele toca e toca. Tomo café que já está frio.
É amargo, mas não mais amargo do que a verdade.
Ele me liga de volta vinte minutos depois, e eu não me mexi.

Aperto o botão do alto-falante. — Olá?

— Desculpe, eu perdi sua ligação. Como está indo?

— Você sabia, pai?

Ele não diz nada. Preciso explicar minha pergunta? Ele


entende apenas pelo som torturado da minha voz?

— Sabia de que, Sawyer?

Por que ele está me fazendo dizer isso? Não é óbvio? — Mamãe
estava traindo você quando ela morreu.

Ele puxa uma respiração ruidosa e a libera. — Sim eu sabia.

Meu mundo gira, se inclina, voa fora de seu eixo. Eu não posso
dizer como me sinto agora. Raiva, tristeza, confusão, desgosto. Eu
me sinto enganado, mas não sei por que. Ela traiu meu pai, mas
de certa forma, parece que ela me traiu. Na nossa família. Como
ela poderia?

— Quem era? Com quem ela traiu?

— Sawyer, eu não acho que vai beneficiar você saber.

— Diga-me antes que comece a perguntar por aí. — É uma


ameaça, e não está vazio. — Quero o nome do filho da puta. —
Fecho os olhos com força depois de dizer isso, percebendo como
essa palavra é doentiamente precisa para essa situação.

— Estou avisando, você não vai querer saber.

— Diga-me, — digo, meus dentes pressionam juntos com tanta


força que dói.

— Beau Hayden.
O telefone cai na mesa. Meus ouvidos latejam. Minha visão
está nublada, preta por todos os lados e túneis no meio. Vejo a
terra de Beau, seu gado, sua mão estendida tilintando contra meu
copo cheio de uísque caro enquanto ele me agradece. Ele sabia
quem eu era. Ele sabia, naquele exato momento, quem eu era. Ele
me trouxe para sua casa, me permitiu ajudar sua família, tudo
isso sabendo o que ele fez com a minha.

Minha mãe morreu aqui. Ela deve ter vindo vê-lo quando
aconteceu.

Maldito Cristo. Seguro minha cabeça, balançando para frente


e para trás na cadeira.

— Filho? — A preocupação na voz do meu pai flutua no ar.

Pego o telefone de volta. — Estou aqui.

— Sua mãe e eu estávamos tendo problemas. Você não pode


colocar toda a culpa nela, ok?

— Por que você não me contou?

— Não teria ajudado você saber. E, francamente, não era da


sua conta.

— Ela estava vindo vê-lo quando ela morreu? É por isso que
ela estava naquela estrada?

— Eu... eu não posso dizer com certeza. Dada a direção que


ela estava dirigindo, meu palpite é que ela estava com ele.

De repente eu entendo porque meu pai escolheu Renée.


Sempre achei estranho ele se casar com alguém do lado oposto da
minha mãe, mas agora entendo.
— Eu preciso ir, pai. Preciso de um tempo sozinho.

— Sawyer, não faça nada precipitado. Você pode conhecer os


fatos, mas não sabe nenhum detalhe.

— Amo você, pai. — desligo. Tenho pena dele tanto quanto


estou com raiva dele. Eu não sei se ele merece minha raiva, mas
eu sinto isso em todas as direções agora.

A raiva mais quente, mais vermelha e mais concentrada, bem,


isso é reservado para Beau Hayden.
30

Encontro Sawyer sentado no escuro. A última luz do dia entra


pela janela da sala, permitindo-me ver que ele está no sofá, os
cotovelos apoiados nos joelhos, o queixo apoiado na mão.

— Oi, — digo timidamente, acendendo uma luz. Ele pisca com


o brilho.

Tiro minhas botas dos meus pés e olho para cima quando ele
não responde. Eu não entendo a expressão em seu rosto. É
determinado, mas também de coração partido. Alguma coisa deve
ter acontecido em relação a sua esposa. Ele recebeu uma ligação
sobre ela? Algum operador de telemarketing procurando por ela?
Ele está em espiral por causa disso?

Vou até ele, de pé no espaço entre seus joelhos. — Você está


bem?

Ele olha para mim, piscando, como se tivesse acabado de


perceber que estou lá. — Estou bem.

— Você não soa bem.

Ele não diz nada. Não tenho ideia do que devo fazer agora. Vou
até a cozinha e abro a geladeira, procurando algo para fazer para
o jantar. Sawyer geralmente cozinha, mas a cozinha está livre de
qualquer indício de uma refeição sendo preparada. Pego o pão e a
manteiga, o queijo fatiado.
— Espero que você esteja bem com queijo grelhado, — chamo,
então percebo que ele está atrás de mim, de pé ao lado da mesa.
Eu vou até ele, envolvendo meus braços ao redor de sua cintura.
— Sawyer, aconteceu alguma coisa?

Ele olha para mim. Seus olhos cinzas brilham, a tempestade


neles furiosa. — Beije-me, — ele sussurra.

— O que? — Não é o pedido dele que me confunde, mas o tom


dele.

— Por favor, — ele acrescenta, e seu pedido machuca meu


coração.

Eu fico na ponta dos pés, trazendo minha boca para a dele.


Ele me beija suavemente, lábios suavemente cedendo, seus olhos
fechados. Eu mantenho o meu aberto.

Seus braços envolvem minha cintura e ele me levanta, nos


girando como um só, até minhas costas encontrarem a parede. Eu
grunhi em sua boca com o contato, e seus olhos se abrem. Ele se
afasta um centímetro para olhar para mim. Sua expressão é
indecifrável, e sei que algo o aborreceu. Machucado. Ele parece
ferido.

Seus lábios descem para o meu pescoço, e ele me beija


rudemente da minha orelha até a minha clavícula. O que quer que
tenha acontecido, talvez não tenha sido tão terrível, não se isso o
fez me querer assim. Eu não estou me importando com esse lado
de Sawyer.

Ele alcança a bainha inferior da minha camisa e a levanta


sobre a minha cabeça. Eu ajudo a desabotoar meu sutiã, e suas
mãos passam pela minha pele, me segurando. Sua cabeça
mergulha para baixo, levando-me em sua boca. Eu gemo. Ele
morde, não com força, mas não exatamente gentil, e suspiro com
o prazer misturado com dor. Ele mantém contato visual comigo,
sua boca deslizando pelo meu estômago. Ele abaixa meu jeans
sobre meus quadris, deixando minha calcinha no lugar. Seu hálito
quente flui através do tecido fino. Ele pressiona a testa no meu
estômago, como se estivesse tentando se recompor. Abro a boca
para dizer algo, mas não tenho palavras.

E então sou incapaz de falar. Sawyer está de joelhos, sua boca


está lá, e embora ele já tenha estado nessa posição antes, ele
nunca esteve tão... tão... livre. Não demorou muito para que
minhas pernas começassem a tremer e estivesse pressionando a
parede para ficar de pé.

Sawyer se levanta, mas não olha para mim. Ele me puxa para
fora da parede, me gira novamente, colocando a mão nas minhas
costas e me dobrando sobre a mesa. E mais uma vez, eu não me
importo.

Ele me penetra com mais força do que o normal, mas dado


tudo o que levou a este ponto, estou esperando por isso. Eu até
gosto. Tudo está bem, até que de repente não está. Até que dói. Eu
não sei se é o ângulo, ou a força de seus golpes, mas eu grito de
dor.

Sawyer congela. Ele ainda está dentro de mim. — Machuquei


você?
Levanto em meus antebraços e aceno. Seu corpo deixa o meu,
e ele me puxa para cima, pressionando minhas costas em sua
frente.

— Sinto muito, — ele murmura com voz grossa. — Sinto


muito.

— Sawyer, está tudo bem. Foi um acidente. — Uma pequena


gota de umidade molha meu ombro. Vejo a lágrima rolar pelo meu
braço. — O que aconteceu?

— Eu não posso te dizer.

Eu me viro para encará-lo. — Você não pode me dizer?

Ele balança a cabeça, não encontrando meus olhos. — Vamos.


— Ele pega minha mão, me levando para o banheiro, onde ele liga
o chuveiro. — Vou fazer um queijo grelhado enquanto você toma
banho.

Então ele sai. Ele está tão nu quanto eu.

Aturdida, passo sob o spray, deixando-o bater em mim. O calor


pressiona minha pele, mas por dentro sinto frio. A preocupação rói
meu estômago. Desligo a água, seco o cabelo com uma toalha e me
visto. Quando saio, Sawyer está vestido novamente. Dois
sanduíches de queijo grelhado estão em pratos à mesa.

Sawyer espera por mim. Ele não pega seu sanduíche até que
eu me sente e pegue o meu, dou uma mordida. — Você
simplesmente não vai me dizer o que te deixou chateado o
suficiente para me foder assim?

Seus olhos se nublam de vergonha. — Eu nunca te


machucaria de propósito.
— Eu sei. Mas havia uma emoção diferente nisso que eu já vi
em você. Algo te aborreceu, e me preocupa que você esteja se
recusando a me dizer o que aconteceu.

— Eu só... — Seus ombros caem. — Não posso te dizer, Jessie.

— Porque isso me machucaria?

Ele acena lentamente.

Eu me levanto, o sanduíche na minha mão. — Você já tem. —


Pego meu prato e, antes de pensar, ele voa da minha mão para a
parede. Exatamente onde minhas costas pousaram mais cedo.

Vou para o meu quarto e tranco a porta atrás de mim.


31

Jessie tinha ido embora quando acordei esta manhã.

Eu me sinto terrível sobre a noite passada. Não queria


machucá-la. No segundo em que ouvi a dor em sua voz, saí do
papel que me permiti ocupar.

Afundei em minha dor a tarde toda até Jessie voltar para casa.
E então eu a vi, e apesar de amá-la, fiquei emocionado.

E eu não posso dizer a ela uma maldita palavra disso. Porque


eu a amo. Não posso destruir o mundo dela como o meu tem sido.
Ela não pode saber o que seu pai fez. Mesmo tão frustrada quanto
ela fica com ele, ele é seu herói. Não vou ser o único a tirar isso
dela.

Tenho que inventar alguma coisa. Alguma razão para a


maneira como me comportei ontem à noite. Vou ter que encontrar
uma maneira de continuar como era antes, sem deixar
transparecer o quanto estou sofrendo. Como estou com raiva.

Mas como? Como posso ficar com Jessie, dado o que sei do pai
dela?

Como posso sair? O que eu poderia dizer que faria sentido para
ela?

Quanto mais penso nisso, mais tenho certeza de que isso não
pode acabar bem. Não quando tudo que quero fazer é bater na
porta da frente da propriedade e confrontar Beau. Eu ainda não,
por muitas razões, uma das quais é que não confio em mim para
vê-lo agora. Eu não tenho muito temperamento, mas dadas as
condições certas, quase qualquer um pode explodir.

Meu pai ligou três vezes esta manhã. Ele finalmente deixou
uma mensagem de voz, me perguntando como estou e me
implorando para ficar calmo e lembrar que tudo isso aconteceu há
muito tempo. Ele tem uma vantagem de mais de vinte anos para
superar tudo isso.

Existe um estatuto de limitações para mentiras e enganos? É


algo que eu tenho pensado repetidamente na minha cabeça, e não
tenho uma resposta.

Há outras respostas que estou procurando também. Aquelas


que não estão sujeitas a opinião. Algo sobre o fato de minha mãe
estar tendo um caso com Beau quando ela morreu está realmente
me irritando, e não apenas pela razão óbvia. Há mais na história?
Parece improvável, mas… e se?

Parece insano, mas o que é insanidade neste momento? Eu já


estou fora de mim com o choque. Neste ponto, tudo é possível.

Desde que acordei esta manhã, meus pensamentos passaram


da raiva em brasa para algo mais sombrio. Talvez seja apenas o
sofrimento passando por mim, mas eu sou o tipo de pessoa que
precisa ver alguma coisa depois de ter uma ideia.

É por isso que estou aqui. Abro a porta da frente da delegacia


e entro. A pessoa na recepção pergunta como eles podem me
ajudar.

— Xerife Monroe, por favor?


O cara pega o telefone, fala baixinho e depois desliga. — Ele
estará pronto para vê-lo em alguns minutos.

Alguns minutos acabam sendo vinte.

— Você pode entrar, — o cara me informa, apontando para o


escritório na parte de trás da estação.

O xerife Monroe se levanta quando entro. Isso não é tarefa


fácil. Ele é mais velho, e há muito dele para levantar.

Ele aperta minha mão oferecida. — O que posso fazer por você,
Sr. Bennett?

Não sei exatamente como ele sabe meu nome, mas deve ter
algo a ver com o fato de ser uma cidade pequena. — Há quanto
tempo você é o xerife?

Ele faz um barulho com a boca, como se pensar tão longe não
fosse possível. — Mais do que você está vivo, provavelmente.

— Isso é o que eu estava esperando que você dissesse. —


Inclino-me para frente. — Não tenho certeza do quanto você sabe
sobre minha família, mas minha mãe morreu aqui quando eu
tinha dez anos.

Ele assente gravemente. — Lembro-me. Que tragédia. Bateu


em uma árvore.

— Isso mesmo. No HCC.

— Não exatamente. Foi na estrada que corre paralela ao


rancho. — Ele coça o peito. — Três pés para a esquerda e estaria
no HCC.

— Você realmente se lembra disso.


— Eu respondi ao chamado.

Engulo em seco. — Você viu minha mãe?

Ele me olha com tristeza. — Eu fiz.

— Ela morreu instantaneamente? Do impacto? — Sempre me


perguntei se ela tinha permissão para essa pequena gentileza.
Viva, viva, viva, morta. Um pontinho no tempo.

— Sim. Ela não sofreu.

— Houve uma autópsia?

Seus olhos se estreitam. — Existe uma razão para você não


estar fazendo essas perguntas ao seu pai? Supondo que ele seja de
mente e corpo sãos, ele deveria estar de posse dessa informação.

— Meu pai não gosta de falar sobre ela. Ainda dói muito. —
Essa é outra mentira em que tenho acreditado minha vida inteira.
Ele não queria falar sobre ela porque não queria que eu soubesse
sobre seu caso. Não falar sobre ela era mais fácil do que mentir.

— Não houve necessidade de uma autópsia. A autópsia


confirmou o que já sabíamos. Trauma contundente devido à
colisão com a árvore.

Meus lábios torcem. Há mais que eu quero dizer. Quero


perguntar se ele questionou Beau, ou se viu uma razão para isso.
Não sei como perguntar isso sem chamar muita atenção
indesejada para minhas perguntas. — Posso ver uma cópia do
relatório da polícia?

— Pode apostar, — responde o xerife Monroe. — Nós não


estávamos usando nosso sistema eletrônico na época, então ele
está enterrado em arquivos. Fale com Bradley na recepção e
preencha um formulário de solicitação.

Agradeço a ele por seu tempo e apoio. Antes de sair, ele diz: —
Sei que é difícil de suportar, mas me escute. Estou neste trabalho
há muito tempo, e a única coisa que posso dizer com absoluta
certeza é que acidentes acontecem. tão horríveis quanto
imparáveis. Procurar uma rima ou uma razão não vai adiantar
nada.

Minha cabeça balança, aceitando suas palavras. — Eu aprecio


isso, xerife.

Paro na recepção ao sair. Bradley me entrega um formulário e


o pega depois que preencho. — Quando posso esperar o relatório?
— pergunto.

— Temos uma recuperação de quatro a seis semanas.

— Quatro a...? — Se eu fizesse negócios dessa forma, estaria


desempregado. — Parece que você tem espaço em sua agenda
agora. — Ele não parece estar fazendo muito mais do que jogar um
jogo em seu telefone.

Ele balança a cabeça. — Regras são regras.

Eu não digo outra palavra. Saio da estação, olhando para trás


uma última vez ao sair, e vislumbro o xerife em sua mesa. Ele está
olhando pela janela, seu lábio inferior apertado entre dois dedos.
Ele parece um milhão de milhas de distância. Ou duas décadas.

Preciso voltar para a cabana de Jessie para aceitar a entrega


da minha cama. Não sei se vou precisar mais, mas quando liguei
para a empresa de móveis a caminho da cidade, eles me disseram
que era tarde demais para cancelar. A cama já estava no
caminhão.

Meu relacionamento com Jessie está sete tons de fodido, e a


cama pode acabar sendo uma grande lembrança não utilizada do
nosso tempo juntos. O pensamento pega meu coração frágil e lhe
dá um aperto malicioso.

Ou eu sigo em frente e minto para ela todos os dias pelo resto


de nossas vidas, ou digo a verdade e vejo isso partir seu coração.

O jogo é soma zero. E nunca teríamos que jogar se Beau e


minha mãe não tivessem um caso.

Estou quase no limite da cidade quando uma ideia me ocorre


e viro meu carro. O xerife disse que os arquivos provavelmente
nunca foram transferidos para um computador, mas não posso
deixar por isso mesmo. Tenho que esgotar a possibilidade.

Partes da morte de Brea provavelmente sempre serão um


mistério para mim. Não posso experimentar isso duas vezes. Eu
não posso deixar isso passar até que saiba, cem por cento, que
minha mãe batendo naquela árvore foi um acidente. E não quero
esperar que o departamento de polícia tome seu tempo.

●●●

Farley me deixa entrar em seu apartamento. Ele é muito mais


jovem do que esperava. Possivelmente ainda no ensino médio.

Eu vou apertar sua mão, mas ele diz, — Sup, — e se afasta.


Hum. OK.

Sigo-o pelo corredor curto até seu quarto. É apertado e cheira


a adolescente. É um perfume sobre o qual não quero pensar muito.

Farley se senta em sua mesa, onde há um grande computador,


e olha para mim, esperando.

— Preciso que você descubra se houve uma autópsia feita em


uma mulher vinte e dois anos atrás.

— Isso vai te custar. Eu vou descobrir todo tipo de merda, mas


os sistemas governamentais são uma merda. Para não mencionar
um crime federal.

— Vou te pagar o que você quiser.

Ele me observa. — Você sabe que é perfeitamente possível que


os resultados não estejam em um computador, certo?

— Então me disseram. Quero que você olhe de qualquer


maneira.

Ele resmunga. — Vinte e dois anos atrás, havia charretes


puxados por cavalos e coisas assim.

Eu dou a ele um olhar fulminante. — Não exatamente.

Ele olha para sua tela escura. — Quinhentos dólares. Agora


mesmo.

Abro meu telefone e transfiro o dinheiro para ele. — Vai


trabalhar.
32

— Jessie, há uma entrega aqui para você. — Um dos cowboys


espreita a cabeça no celeiro.

Suspiro e ando para fora, piscando contra o sol brilhante. Um


caminhão de entrega branco com o nome de uma loja de móveis
ao lado está parado. Esta deve ser a cama de Sawyer.

Eu não tenho ideia se ele vai dormir nela. O pensamento pega


meu coração já torcido e dá um aperto extra.

— Siga-me, — grito para o motorista, apontando para a


caminhonete do rancho que me foi dado ontem. Levo-o para minha
cabana e indico qual quarto.

Ele e a outra pessoa com ele carregam a cama em pedaços. Ele


para na porta do quarto de Sawyer. — Já tem uma cama lá.

— Ok? — tento manter minha irritação sob controle. Preciso


voltar ao que estava fazendo.

— Fomos pagos para entregar e montar, não desmontar e


transportar.

Eu digo a eles para esperar, então vou para o meu quarto e


pego algum dinheiro. — Aqui. — volto, segurando uma nota de cem
dólares. — Isso será suficiente para cobrir tudo?

O motorista o tira da minha mão. — Sim.


Espero na cozinha enquanto eles começam a trabalhar. Já que
estou aqui, faço o almoço para mim. Estou na metade do processo
quando o cara entra na cozinha. — Tudo feito. Eu preciso que você
assine isso dizendo que você recebeu a cama. E, — ele coloca um
livro encadernado em couro de algum tipo sobre a mesa. —
Encontramos isso entre o colchão e as molas da cama velha.

— Obrigada, — digo, olhando para o livro.

Assino o recibo que ele está segurando, então tranco a porta


atrás deles quando eles saem.

Volto para a cozinha e olho para o livro. Poderia ser de Peyton,


mas não acho que seja. Uma jovem não seria descuidada com seu
diário. Eu estive lá. Quando eu tinha a idade de Peyton, teria pego
meu diário em uma casa em chamas antes de sair correndo do
meu quarto.

O que significa que é do Sawyer.

Eu bato meus lábios franzidos com dois dedos. Querer lê-lo faz
de mim uma pessoa horrível?

Seu comportamento foi bizarro ontem à noite, e ele admitiu


que algo aconteceu. Ele também me disse que não posso saber,
porque vai me machucar. Tenho imaginado os piores cenários
durante todo o dia. Por horas, estive convencida de que ele me
traiu, mesmo que não pareça algo que Sawyer seja capaz. Mas o
que mais poderia ser?

Estou olhando para o livro quando uma chave desliza na


fechadura da porta da frente. Treino meu olhar para a porta,
observando quando ela se abre e Sawyer entra. Primeiro, ele olha
para mim, depois para a mesa. Seus olhos se arregalam.

Ele vem em minha direção, de braços abertos. — Jessie. — Ele


diz meu nome com cautela.

Estendi a mão para detê-lo. — Eu não li. É o seu diário. Eu


acredito em privacidade.

Sawyer puxa uma cadeira e se senta. Seus antebraços se


apoiam na mesa, e ele me olha com seriedade. Permaneço de pé, e
o diário está entre nós. — Não é meu, — diz ele, passando a mão
pelo cabelo.

— De quem é isso?

Um longo tempo se passa antes que ele responda, talvez dez


segundos. Parecem uma eternidade. — Jo encontrou em
Wildflower. Era da minha mãe.

Eu levanto meu queixo, então o abaixo polegada por polegada


enquanto processo esta informação. — Isso é o que te chateou
tanto na noite passada?

Ele concorda.

Eu cutuco a capa. — E há algo aqui que você não pode me


contar? Porque vai me machucar?

— Exatamente, — ele responde, sombrio.

Alcanço o diário. Nunca foi uma escolha. Prefiro saber a


verdade e lidar com a dor do que ser enganada. Não consigo
imaginar como a mãe de Sawyer, que morreu antes de eu nascer,
poderia me machucar agora.
Abro o diário. Leio cada entrada até que ela termine.

— A quem ela está se referindo? — pergunto, mas eu já sei.


Não sei como, mas a resposta está aí, uma pedra pesada no
estômago.

Sawyer faz uma careta como se estivesse prestes a ficar


doente. — Seu pai. Liguei para meu pai e ele me contou.

Eu engasgo com um soluço. — Sua mãe... dormiu com meu


pai? — O significado das palavras empoeira a superfície,
afundando. — Ela desrespeitou minha mãe.

A mandíbula de Sawyer se contrai. — Como seu pai


desrespeitou meu pai? Ele dormiu com a esposa de outro homem.
— Ele parece horrorizado.

Não posso ouvir isso agora. Eu não posso ver isso agora. Não
meu pai. Meu pai com a lealdade férrea à sua família. Um homem
que, sem dúvida, se colocaria entre uma bala e qualquer um de
seus entes queridos.

— Oh. Oh. Não, não, não. — Fecho os olhos contra a verdade,


mas não funciona. Vejo apenas uma versão mais jovem do meu
pai, com uma mulher nos braços. Uma mulher que não é minha
mãe.

Sawyer me puxa para seu peito, suas grandes mãos segurando


minha cabeça em seu coração galopante. Eu me agarro a ele,
recusando-me a aceitar essa nova informação como realidade.

Impossível. Isso não pode ser desaprendido.

Meu peito se abre. A dor é atroz e requintada.

— Fui ver o xerife hoje. — A emoção quebra sua frase.


— Por que? — pergunto, meu rosto ainda pressionado contra
ele. Eu não quero me mudar deste lugar. Ele tem um cheiro limpo
e fresco, e o que quer que o faça Sawyer. O homem que segura
meu coração.

— Minha mãe morreu naquela estrada lá fora. — Seu braço se


move, e mesmo que eu não possa vê-lo da minha posição, eu sei
que ele está apontando para além do HCC, para a estrada que leva
à cidade. — E agora eu descobri que ela e seu pai estavam tendo
um caso?

Minha mente faz a conexão imediatamente. — Sawyer, não. —


Eu me afasto do cheiro que me acalmou um segundo atrás, e olho
para ele. — O que aconteceu com sua mãe foi um acidente.

Ele dá de ombros de um jeito talvez, mas talvez não. Dou um


passo para trás, abandonando o conforto que encontrei em seu
peito.

— O que você está implicando?

Seus lábios pressionam juntos. Ele não quer dizer isso, mas
ele vai insinuar? Eu não acho.

— Diga as palavras, Sawyer.

— É muito conveniente, Jessie. — Uma ponta de súplica força


seu tom. Suas mãos percorrem seu rosto. — Nossos pais estavam
dormindo juntos quando minha mãe morreu.

Viro meu queixo para longe de suas palavras ridículas. Meu


pai nunca...

Exceto que ele poderia. Pode ser. Eu não sei. Eu pensei que o
conhecia, mas o que eu sei mais?
Continua Sawyer. — O xerife disse que ele estava lá no dia do
acidente. Que a causa da morte dela era clara.

Meus ombros caem de alívio, mas suas próximas palavras


afastam o sentimento. — Eu não poderia deixar por isso mesmo.
Estou analisando mais a fundo.

— Você suspeita que o acidente da sua mãe não foi um


acidente? — Meu tom é incrédulo. — Vamos fingir que é verdade.
Então quem a matou? O meu pai? — Meus dedos passam pelo meu
cabelo, arranhando meu couro cabeludo.

— Eu não quero que seja verdade, Jessie. Mas o que você faria
se fosse eu? — Ele pega minhas mãos, juntando-as nas suas. A
tempestade em seus olhos se transferiu para mim. Sinto-me como
um navio lançado em um furacão. — Se você tivesse perdido um
pai quando você era jovem, e então você descobrisse algo assim
sobre eles? Eu te conheço, Jessie. Você esgotaria todas as
possibilidades.

Ele tem razão. Eu viraria cada pedra.

E sei o que tudo isso significa. Se tirarmos as revelações


chocantes, só há um final para nós.

— Nós não podemos ficar juntos, — choro, sobrecarregada


com todas as emoções que correm por mim.

— Eu sei, — Sawyer sussurra, sua voz falhando. — Eu sei.

Ele solta minhas mãos, mas apenas para capturar meu rosto
e olhar nos meus olhos. Uma nova rodada de lágrimas é liberada.
Eu estava errada. Não quero saber a verdade e lidar com a dor. Eu
quero ser enganada.
Sawyer me segura por um longo tempo, então me solta. — Vou
voltar para a Califórnia. Não posso ficar aqui. Não posso estar no
HCC, nem mesmo em Sierra Grande. — Ele balança a cabeça. —
Tenho que colocar um espaço entre mim e este lugar. Para o meu
bem-estar, e o seu também. Odeio seu pai agora. Odeio minha mãe
um pouco também. — Ele engasga com a admissão, lágrimas
enchendo seus olhos.

— Eu entendo, — choramingo, minha voz tremendo. Agora, eu


odeio meu pai também.

Eu não digo uma palavra quando Sawyer sai da sala. Choro


silenciosamente. Ele volta com suas malas prontas.

— Deixei uma das minhas camisas na sua cama. Se você


quiser usá-la para dormir de vez em quando... — ele para. —
Gostaria de saber que você está no próximo estado, vestindo minha
camisa.

Eu o observo enquanto ele fala, ouvindo o que ele tem a dizer,


mas não absorvendo. Estou muito ocupada memorizando a
maneira como ele fala mais do lado direito da boca, como ele
gesticula, o arco de suas sobrancelhas.

Isso realmente não pode ser para nós. Certo? Foi bom, fomos
bons e, do nada, o roteiro virou. Eu tenho que saber mais. Ele não
pode sair assim.

— Então o que acontece agora? Voltamos a falar? Acabamos


mesmo? — cubro minha boca com minha mão para suprimir um
soluço. Dizer as palavras em voz alta é demais para mim. Sawyer
larga as malas e vem até mim. Com ternura, ele segura meu rosto.
— Eu não tenho todas as respostas. Ainda não.
Respiro fundo, me recuperando por dentro. Do lado de fora,
levanto o queixo, puxo os ombros para trás.

Sawyer observa, seus olhos brilhando com lágrimas não


derramadas. Ele toca meu queixo. — Lá está ela. A mulher
indomável por quem me apaixonei.

— Você me ama? — O controle tênue que tenho na minha


compostura está escorregando. — Eu gostaria que você não tivesse
me dito isso. — Leva a dor e aumenta dez vezes.

As lágrimas em seus olhos transbordam. — Eu não poderia ir


embora sem ter dito a você. Você me ajudou a abrir meu coração.
Você me mostrou como amar novamente.

A indignação gira em meu estômago. O futuro se desenrola em


minha mente, e vejo outra pessoa, uma mulher sem nome e sem
rosto, colhendo os benefícios do que fiz por Sawyer.

Eu coloquei no trabalho e um dia alguém pode ganhar o


prêmio.

— Apenas vá, — digo, meu tom áspero. Eu quero me


aconchegar sozinha com meu coração partido.

Sawyer dá um passo para trás. Ele pega suas malas, e me


afasto. Não posso vê-lo sair pela porta da frente.

Espero até saber que ele se foi, então respiro dez vezes fundo.
Pegando meu telefone, mando uma mensagem para toda a minha
família, pedindo uma reunião familiar o mais rápido possível.

A razão para o meu coração partido duas vezes.

Essa segunda ponta está prestes a responder pelo que ele fez.
33

Todos estão reunidos. Mandei Peyton e Charlie para uma sala


diferente para brincar com Lyla e Colt.

— O que está acontecendo, Jessie? — Wes parece irritado.


Desapareci por volta do meio-dia para aceitar a cama e nunca mais
voltei, e agora estou atrapalhando o dia de trabalho dele com essa
reunião.

Todos os meus três irmãos estão sentados no sofá. Tenley e


Dakota sentam-se lado a lado nas poltronas. Jô está faltando. Ela
provavelmente teve que ficar no Wildflower. Meu pai, minha mãe e
meu avô estão sentados no sofá em frente aos meus irmãos. E eu,
a caçula da família, estou na frente de todos eles.

Quantos dos meus irmãos já sabem sobre a mãe de Sawyer?


Wes, provavelmente. Possivelmente Warner. Talvez até Wyatt. Eles
eram adolescentes quando o caso estava acontecendo. É provável
que eu seja a única que não sabia.

Seguro o diário. — Deparei-me com isso hoje. Sawyer o tinha,


depois que foi encontrado em Wildflower.

Entrego o diário ao meu pai. Seus olhos me questionam, mas


gesticulo para o livro em sua mão. — Abra. Dê uma olhada.
Pertencia aos nossos vizinhos, quando Wildflower era o Circle B.

Os olhos do meu pai escurecem. Assim como a da minha mãe.


A maneira como ela tratou Sawyer faz muito mais sentido agora.
Ele gasta menos de trinta segundos no diário. Vou ficar ao lado
dos meus irmãos.

— Crianças, — o olhar pesado do meu pai varre nós quatro. —


Eu não acho que nós... eu, — ele corrige, mandando um olhar
rápido para minha mãe, — nunca planejamos dizermos isso. Mas
parece algo que devemos fazer agora, considerando o que Jessie
descobriu.

Meus irmãos não sabiam. Eu olho para suas expressões


curiosas, mas relutantes. Uma pequena parte de mim se sente mal
por chamar todos juntos, por forçar isso ao meu pai.

— Foi há muito tempo, quando a família Bennett morava no


Circle B. Funcionava como um rancho muito parecido com o
nosso. Ken Bennett foi bom por um tempo, um fazendeiro que eu
respeitava. Mas ele baixou o custo de sua carne e foi como jogar
uma banana de dinamite no mercado. Isso estragou tudo e quase
fez o HCC quebrar. Eu não conseguia descobrir como ele estava
ganhando dinheiro suficiente para operar, porque eu certamente
não estava.

— Então você redirecionou sua fonte de água e forçou sua


terra a uma seca, — diz Wyatt. — Nós sabemos, pai.

Olho para ele bruscamente. — Eu não sabia disso. Nenhum


choque aí, no entanto.

Wyatt encontra meu olhar momentaneamente, então olha de


volta para nosso pai.

— Sim, Wyatt. Isso é verdade. Mas houve outra coisa que


aconteceu. — Meu pai coloca uma mão pesada e firme no joelho
da minha mãe e aperta tranquilizador: — Eu fiz a pior escolha da
minha vida naquela época, um erro do qual vou me arrepender até
dar meu último suspiro.

Meu estômago cai. Sei o que ele vai dizer, mas não consigo
entender. Parece impossível, embora eu mesmo tenha lido as
palavras.

— Tive um caso com Cynthia Bennett.

Silêncio de todos, e então, — Que porra é essa? — É a explosão


de Wyatt.

Uma respiração pesada de Warner.

— Eu me lembro daquela época, — Wes diz, sua voz soando


de dentro para fora. — Lembro-me de Cynthia Bennett. Vindo aqui.
Achei que ela fosse amiga da mamãe. — Arrepios pontilham os
braços de Wes. Dakota estende a mão, seus dedos roçando seu
antebraço. Ele observa seu toque enquanto flui para frente e para
trás sobre sua pele, então ele olha para o nosso pai. Nunca vi Wes
parecer tão... devastado. — Como você pôde fazer isso com a
mamãe? Para nós? Estávamos todos morando nesta casa naquela
época. Como você pode?

— Eu não tenho desculpas, Wes, mas…

— Você está certo, você não tem uma desculpa, — diz Warner.
Meus olhos se arregalam com o veneno em sua voz. Eu não sabia
que Warner era capaz de soar assim.

A cabeça do meu pai está pendurada, apoiada pelas mãos.


Nunca, em todos os meus vinte e um anos, vi meu pai parecer
patético. Não quero que ele seja essa pessoa. Quero que ele seja
meu pai forte e imperturbável. Quem é esse homem falível com o
queixo no peito?

Minha mãe se senta, puxando os ombros para trás, e se dirige


a nós. — Vocês não sabem nada do que estava acontecendo
naquela época. Foi há mais de duas décadas. Vocês têm permissão
para ter uma resposta emocional a esta notícia, mas vocês não vão
se debruçar sobre isso. Não seremos uma família que usa isso em
nossos baús nas próximas décadas. Isso não vai nos quebrar. —
Ela aponta para o brasão na lareira, as palavras inscritas nele.
Legado. Lealdade. Honra.

— Essas palavras viram muito mais do que qualquer um de


nós sabe. Sim, essa surpresa é dolorosa. Mas não é o primeiro
segredo desta família, e não será o último.

Estou admirada com minha mãe. De sua força e equilíbrio.


Mesmo agora, neste momento que só pode ser doloroso para ela,
ela vai sobreviver e nos carregar ao lado dela.

Vovô se levanta, movendo-se mais rápido do que eu vi em um


tempo. — Estou convocando uma reunião também. Entre mim e
meus netos.
34

Meus netos tiveram o tapete puxado debaixo deles.

Crianças pobres.

Olho de rosto em rosto, de expressões chocadas a olhos que


revelam a dor no coração. Lembro-me do dia em que cada um dos
meus netos nasceu. Eu estava no hospital, esperando para
cumprimentá-los.

Eles precisaram de mim em vários momentos ao longo dos


anos. Principalmente quando eram jovens e precisavam de uma
mão para subir as escadas ou consertar uma corrente de bicicleta.
Então, novamente, recentemente, quando cada um teve que
superar todos os danos durante os anos, eles não vieram me pedir
ajuda. Aqueles eram os anos que eles precisavam para cometer
seus próprios erros, para que quando chegasse a hora, eles
soubessem como fazer as escolhas certas por si mesmos. Eu
gostaria de acreditar que ajudei Wes com Dakota, Warner com
Tenley e Wyatt com Jo.

Temo que para Jessie com Sawyer, bem, isso está além do que
posso consertar. Neste momento, meus netos precisam de mim
para enfaixar sua imagem do casamento de seus pais.

Estamos sentados nos fundos, a herdade se erguendo atrás


dos quatro. Todos esperam, quietos e atentos, que eu fale.
Invoco as palavras que minha esposa usaria e espero que ela
esteja sentada ao meu lado em espírito. — Eu sei que vocês estão
todos chateados com seu pai, — começo.

Wyatt resmunga, como se a palavra que escolhi para descrever


seus sentimentos nem sequer começasse a cobrir isso. Eu
esperava isso dele. Ele é o mais desafiador dos quatro, com Jessie
logo atrás.

— Vai levar muito tempo para vocês superarem o que


acabaram de descobrir. — Olho para Jessie, e ela morde o lábio e
desvia o olhar. Aposto que ela se sente culpada por denunciar seu
pai, mas a verdade é que eu vi isso acontecer a um quilômetro e
meio de distância. Assim que Sawyer Bennett pisou na herdade,
eu sabia que as placas tectônicas estavam mudando em nossa
base familiar. Os terremotos são conhecidos por trazer tanto lixo
quanto tesouros.

— Uma coisa que vocês precisam entender é que cada


casamento é diferente. — Olho para Warner. Ele sempre foi o mais
calmo dos quatro. — Seu casamento com Tenley é diferente do seu
com Anna?

— Noite e dia, — ele responde rapidamente, cruzando um


tornozelo sobre o joelho oposto. Wes franze a testa para as pernas
de Warner ocupando seu espaço e se aproxima.

— Isso é o que eu pensei. Outra coisa que você precisa


entender é que os casamentos geralmente mudam com o passar
dos anos. As pessoas que seus pais eram naquela época, mesmo o
casamento inteiro, é diferente hoje do que era quando o caso
ocorreu.
A dor salta sobre seus rostos com a palavra caso. — Vocês
também precisam saber que o que vocês aprenderam hoje
raramente é o produto da má escolha de uma pessoa. Geralmente
são muitas rachaduras, muitas rupturas e várias dores que se
acumulam ao longo do tempo. Não apenas de seu cônjuge, mas da
vida. Vocês todos fariam bem em lembrar disso. — olho para eles,
por sua vez, até Jessie. — Vocês tem que saber que o único lugar
para resolver seus problemas é aqui… — bato no peito — … e aqui
- bato na cabeça. — Nenhum dos seus problemas podem ser
resolvidos externamente, então não vão procurar. Foi o que seu pai
fez, e eu sei que é uma pílula amarga para vocês engolirem. Seu
pai é tão humano quanto vocês e eu. Mas ele também é um maldito
bom fazendeiro, um bom pai e um marido amoroso. O que ele fez
vinte anos atrás não o define. Ele expiou, trabalhou em si mesmo,
aprendeu o que estava quebrado em si mesmo e em seu
casamento, e depois consertou. Não há nada mais que você possa
pedir a uma pessoa além de trabalhar em si mesma todos os dias
até que ela morra.

Eles estão todos em silêncio, mas é Wes quem está pensando


mais. Não estou surpreso com isso. Ele é o mais velho e se lembra
mais. Ainda consigo imaginar uma época em que ele fosse a única
criança correndo por este lugar.

Wes se recosta, uma longa perna para fora. — Você sabia que
estava acontecendo na época?

Eu olho para minhas mãos, a pele como papel e contando todo


o meu tempo sob o céu do Arizona. É aqui que minha verdade
ficará pegajosa. Como meu pai costumava dizer quando dirigia o
HCC, Todos merecem saber um pouco, e nenhum deles deve saber
tudo.

— Eu descobri isso eventualmente, sim.

— E você disse a ele para parar? — Jessie faz esta pergunta


com um olhar suplicante em seus olhos. Tudo o que ela sabia
sobre os adultos que a criaram foi desafiado hoje. Ela precisa
acreditar que seu avô é o tipo de homem que impediria seu filho
de continuar com um comportamento estúpido.

— Seu pai aceita que lhe digam o que fazer tão bem quanto
qualquer um de vocês. Mas eu disse a ele que desaprovava sua
escolha.

Eles estão quietos novamente. E honestamente? Estou


cansado. Não é preciso muito para me cansar mais. Mas há uma
coisa que eu estou curioso sobre.

Olho para minha neta. — Onde está Sawyer?

Os olhos de Jessie se enchem de lágrimas. Ela raramente


chora. É um mau sinal.

— Ele saiu.

— Deixou sua cabana para ficar na cidade? — Wyatt pergunta.

Sua cabeça balança e ela passa a mão sob os olhos. — Para


voltar para a Califórnia. Nós dois concordamos que depois do que
descobrimos, — seu lábio inferior treme, — não faz sentido. Ele
está tão chocado e magoado quanto o resto de nós.

— Há uma parte de mim que deseja que ele tivesse queimado


o diário, — murmura Wyatt.
— Foi sua esposa quem deu a ele, — Wes conta.

Wyatt o fixa com um olhar foda-se. É uma coisa boa que


Warner fica entre eles.

E no final, do outro lado de Wyatt, Jessie soluça baixinho com


os punhos pressionados contra os olhos.

Wyatt se levanta e gentilmente a empurra para seu lugar. —


Vamos, Calamidade. Não chore. — Ele se senta de volta em seu
lugar vago e coloca o braço em volta dela. Warner acaricia sua
perna. — Sempre pensei que quando você chorasse, as lágrimas
sairiam em forma de letras e formariam palavrões, como uma sopa
de letrinhas desbocadas.

Os ombros de Jessie tremem de tanto rir, embora seu lábio


inferior esteja saliente e ela ainda esteja chorando.

— Gostei dele, — Wes anuncia. São essas palavras que tiram


as mãos de Jessie de seus olhos. Ela olha para Wes.

— Você gostou de alguém? Sempre pensei que você


simplesmente tolerava outras pessoas.

Wes resmunga uma risada. — Sim, bem. Estou ficando fraco


na minha velhice.

Eu amo isto. Ver meus netos discutirem e amarem,


provocarem e conversarem. Acho que eles se apreciam agora, e
essa apreciação se aprofundará à medida que envelhecem. Isso me
dá a garantia de que o nome Hayden permanecerá forte, muito
tempo depois que eu me for.

Eles partem. Os meninos vão para suas esposas. Jessie sai


depois que ela entra na despensa e toma uma dose de Macallan
25. Eu não vou denunciá-la. Sou conhecido por beliscar aquela
garrafa uma ou duas vezes.

Beau vem me encontrar na varanda da frente depois que todos


se foram. Os cantos de sua boca se abaixam. Linhas se acumulam
ao redor de seus olhos. Ele se senta ao meu lado e olha para a
terra que fizemos inúmeras coisas, boas e ruins, para proteger.

— Fodi tudo, pai.

— Não, filho. Você fodeu tudo naquela época. Hoje, você foi o
homem que eles precisavam que você fosse. Você assumiu a
responsabilidade por sua escolha e não deu desculpas para isso.

— Eu sinto que deveria fazer algo por Sawyer.

— Tarde demais. Ele está voltando para a Califórnia.

Ele suspira. — Aposto que Jessie está com o coração partido.

— Ela está definitivamente com o coração partido, e


esperançosamente quase bêbada agora. — Também a vi sair com
uma garrafa de vinho de sua mãe.

— Bom para ela. — Ele coça o queixo. — Você já pensou


naquele dia?

Não preciso perguntar a que dia ele se refere. — Não se eu


puder evitar.

Beau respira fundo e pergunta: — Eu sei tudo sobre o que


aconteceu?

— Eu não preciso dizer exatamente o que aconteceu para você


saber exatamente o que aconteceu. — nunca, em todos os anos
desde aquele dia, forneci-lhe um relato passo a passo, o que tiraria
sua negação.

O olhar nos olhos do meu filho é insondável. — Eu sei. Mas,


às vezes, quando penso nisso, me pergunto se ela teria sobrevivido
se eu tivesse feito algo diferente. Talvez eu pudesse ter salvado a
vida dela.

Encaro Beau. Comecei com dois filhos e uma esposa. Aqui


estou eu, chegando ao fim da minha vida, e sou apenas eu e meu
único filho. Ele está velho agora, e eu estou mais velho, mas
caramba, eu amo aquele garoto. Eu tinha feito o que precisava
fazer para protegê-lo. Para proteger nosso nome e nosso legado,
Wes e até Colt.

Todos eles merecem saber um pouco, e nenhum deles deve


saber tudo.

Eu acaricio seu braço. — Ela se foi. Não havia nada que você
pudesse ter feito.
35

Saí de Sierra Grande imediatamente, passando a noite em


algum motel de merda em outra cidade do vale Verde. Acordei esta
manhã e dirigi direto para a casa de praia. Na saída, liguei para a
corretora que me vendeu o lugar e pedi que ela me encontrasse.
Eu posso estar vendendo em alta e perdendo um crescimento
adicional em valor, mas e o custo para mim? Para o meu coração
e minha vida? Eu não posso me segurar nesta casa por anos, do
jeito que meu pai se segurou no Circle B.

Vender a casa de praia é outra maneira de seguir em frente.


Qualquer passo é importante agora. Meu coração parece que foi
esculpido com um garfo. Poderia muito bem acelerar a todo vapor
e limpar o quadro.

Tive a viagem de seis horas para pensar em como acabei nessa


posição. E para onde quero ir a partir daqui. É fácil olhar para os
eventos do último ano e meio e ver o que aconteceu, como pontos
de dados ao longo de um gráfico. É mais difícil trazer a lupa e
examinar o invisível. Mas era aí que eu precisava me concentrar, e
o fiz. Através do deserto seco e árido e das árvores de Joshua de
galhos pontiagudos, me forcei a ficar cara a cara com os fatos.

Minha esposa se foi.

Sou viúvo e sempre serei.

Uma parte de mim nunca deixará de amar Brea.


E então, os fatos mais recentes, aqueles que destruíram minha
vida pela segunda vez em dezoito meses.

Minha mãe estava traindo meu pai quando ela morreu.

Estou apaixonado pela filha do homem com quem ela traiu.

É esse último que não consigo entender. Os outros fatos? Os


pontos de dados. Mas Jessie? Ela não é dados. Ela é emoção e
sentimento, pele quente e toque macio. Uma mulher que conhece
sua mente e espírito e não tem medo de quão grandes são ambos.

Estou completamente apaixonado por ela.

Mas como conciliar isso com quem nós dois somos?


Descobrimos uma história compartilhada, e é feia e dolorosa.
Como voltamos disso?

Estou vinte minutos adiantado para encontrar a corretora de


imóveis, então ando pela casa. Todo o lugar precisa de uma boa
limpeza. Não está imundo, mas traz os detritos de um lugar sem
manutenção. Todas as fotos se foram, o que resta são ossos, na
verdade. Móveis, tapetes, almofadas. Mesmo assim, vejo Brea aqui.
Enrolada no sofá com um livro, seu cobertor favorito jogado sobre
os pés porque eles estavam sempre frios.

No pátio dos fundos, chuto para o lado as folhas secas de


buganvílias fúcsia espalhadas pelo chão de ladrilhos. Abro a grade
de aço inoxidável. Tão chique, com seu defumador integrado e
luzes incandescentes internas iluminando tudo. Prefiro a grelha
simples que comprei para Jessie.
Finalmente, arrasto meu olhar para o lugar que tenho evitado.
Não é uma tarefa pequena, porque é interminável e barulhento,
sua presença comanda.

O oceano.

Eu sigo a calçada até a beira do gramado e fico ali. Brea


adorava o oceano. Ela não precisou usar linguagem de sinais para
me dizer. A primeira vez que ficamos aqui e apreciamos a vista, ela
agarrou meu braço e acenou com a cabeça enfaticamente. Seus
olhos esmeralda brilharam e ela sorriu. Eu me virei, encontrei os
olhos da corretora de imóveis que nos mostrava a listagem e dei a
ela um polegar para cima.

Há uma batida na porta, e eu atendo. — Anissa, olá. — Eu me


afasto, dando as boas-vindas à mesma mulher que me vendeu esta
casa. — Entre.

Anissa tem cerca de cinquenta anos, seu cabelo curto escuro


como carvão. Ela entra, virando-se para me cumprimentar. Seu
rosto tem pena que eu não quero ver. — Sinto muito por sua perda,
Sr. Bennett. Que tragédia. Fui ao funeral, mas não o abordei.
Francamente, não sabia o que dizer.

Aceito suas palavras com um simples aceno de cabeça. —


Obrigado. — Entro na sala e paro. — Eu gostaria de anunciar a
casa com você. Valor de mercado. Não espere por várias ofertas.
Isso não precisa se tornar uma guerra de lances. Sei que é um
mercado de vendedores, mas não estou interessado em ir junto
com tudo o que isso implica. Consiga um preço justo, escolha
pessoas que vão adorar esta casa do jeito que Brea amou. É tudo
o que peço.
Discutimos mais algumas coisas, entrego-lhe uma chave e
saio. A casa sempre será uma parte de mim, mas não quero mais
nada com ela.

Ainda assim, a finalidade me tira o fôlego. Eu passo alguns


momentos me reunindo no meu carro.

Antes de mudar para o carro, olho para o meu telefone. Não


sei quantas vezes hoje verifiquei meu telefone, mas são muitas.

Nem uma vez encontrei o que procuro. Jessie não ligou nem
mandou mensagem. Eu não sei se ela vai. Ela é tão teimosa quanto
obstinada, e tem lealdade em espadas. Admiro esses traços,
mesmo agora, quando estou enfrentando eles.

Mas há um texto de Farley.

Odeio dizer isso, mas não há nada a ser encontrado sobre


sua mãe, pelo menos não eletronicamente. Sem autópsia,
como já lhe disseram.

Acho que sabia que ia ser o caso, mas tinha que tentar. Eu
tinha que ter certeza. Como disse a Jessie, tinha que esgotar as
possibilidades. E estou aliviado que a trilha estava fria. Seria muito
mais doloroso se houvesse algo a ser encontrado.

Uma parte de mim quer mudar de direção e refazer meus


passos até Sierra Grande e direto para a cabana de Jessie. Mas
tenho trabalho a fazer primeiro. E não tenho ideia se Jessie vai me
aceitar.

Jogo meu telefone de volta no porta-copos e puxo para fora.


Minha próxima parada é a casa do meu pai, para uma discussão
há muito esperada.
●●●

Meu pai fica chocado quando atende a porta e me vê.

Ele se afasta e acena para mim. — Entre, entre. — Há um


guardanapo enrolado em sua mão, e ele o usa para limpar a boca.
— Você gostaria de um jantar?

Hesito, e ele sorri conscientemente. — Eu cozinhei.

— Então sim.

Renee e eu conversamos enquanto meu pai arruma meu prato.


Minha indiferença por ela não vai mudar esta noite, mas farei um
esforço no futuro. Eu sei mais agora sobre por que ele a escolheu.

Eles voltam sua atenção para o noticiário noturno enquanto


eu como. Quando termino, Renée pega meu prato e agradeço. Ela
diz ao meu pai que vai limpar a cozinha. Talvez o negócio deles seja
que quem cozinha, o outro limpa a bagunça. Ou talvez ela esteja
nos dando tempo juntos.

Papai me leva para fora. A noite está fresca. Seu vizinho está
ao telefone no quintal, discutindo com alguém sobre alguma coisa.

Isso me faz sentir falta da cabana de Jessie. Nunca


experimentei o verdadeiro silêncio até que me sentei do lado de
fora da casa dela.

Meu pai se ajeita na cadeira. — Eu não acho que meu


macarrão com molho de carne valeu uma viagem de seis horas,
Sawyer.

Eu dou uma risada. — Não, não foi. Sem ofensa.


Ele levanta as mãos. — Nenhuma tomada. Por que você não
me diz por que você está realmente aqui?

Inclino-me para frente na minha cadeira, as mãos agarradas


no espaço entre meus joelhos. — Coloquei a casa de praia no
mercado hoje.

Ele fica quieto por um instante, então diz: — Isso deve ter sido
difícil.

— Foi. Mas foi necessário.

— Necessário para que?

Respiro fundo. — Seguindo em frente. Algo que você conhece


um pouco.

Uma risada vazia ressoa em sua garganta. — Claro que sim.


Aprendo um pouco mais sobre isso todos os dias também. Não
acabou para mim. Meu palpite é que nunca vai acabar para você
também. Quando você realmente ama alguém, eu não acho que
você os supera. Você simplesmente os adiciona ao seu coração e
continua. Brea sempre será uma parte de você e de sua experiência
de vida. Você não precisa esquecê-la ou superá-la. Mas você
precisa seguir em frente. A estagnação não é boa para ninguém.

— Segui em frente com Jessie Hayden. — Apenas dizer o nome


dela me faz querer segurá-la em meus braços, afastar o cabelo do
rosto, beijar a cicatriz em sua mandíbula. — Eu me apaixonei por
ela, mesmo que isso me confundisse muito. Era como se não
pudesse ser parado.

— Então o que diabos você está fazendo aqui?


Balanço minha cabeça. — Amantes desafortunados, suponho.
Uma versão de cidade pequena de Romeu e Julieta.

Papai limpa a garganta. — Isso é um cop-out11.

Meus lábios se curvam em sua franqueza. — Como eu deveria


estar com ela agora? Mamãe traiu com o pai de Jessie. Mamãe
morreu na estrada que leva do HCC para a cidade. Ela devia estar
dirigindo para longe de Beau. Por que mais ela estaria naquela
estrada? — Minha voz falha.

Papai balança a cabeça lentamente. — Na vida, há verdades


que não conhecemos. Também não sei muitos detalhes sobre
aquele dia. Posso presumir que ela estava dirigindo para longe de
Beau, mas não tenho como saber com certeza. E eu tive que fazer
as pazes com isso. Se você se concentrar em tudo o que não
conhece, isso o consumirá.

— Não sei como você sobreviveu a tudo isso, pai. — Isso me


faz olhar para ele de uma nova maneira.

— Por mais traído que eu me sentisse, também sabia que não


estava sendo um bom marido. Ou mesmo uma boa pessoa. Sua
mãe e eu seguimos um fio de cabelo quando compramos aquele
rancho, e não sabia o que era. O inferno que eu estava fazendo.
Cometi muitos erros e meu orgulho me impediu de confessá-los.
Eu não era homem o suficiente para admitir minhas limitações, ou
aprender. Isso afetou meu casamento. Isso não são desculpas pelo
que sua mãe fez. Apenas razões. — Ele solta um suspiro pesado.

11
É uma gíria para o ato ou uma instância de recuar de uma situação ou compromisso ou evitar a
responsabilidade por algo.
— Eu não quero que você pense que ela era uma pessoa ruim. Todo
mundo é falível, dado o conjunto certo de circunstâncias.

— Isso é deprimente.

Ele dá de ombros. — Depende de como você escolhe vê-lo. Pode


ser deprimente, ou pode ser libertador. Assim que você permite
que alguém seja humano e cometa um erro, você se liberta de
esperar a perfeição.

Sinto seu olhar em mim, então eu o olho nos olhos.

— E você, Sawyer? Você vai deixar que erros cometidos


décadas atrás determinem sua felicidade hoje?

Renee enfia a cabeça para fora da porta dos fundos. —


Querido, eu vou dormir. Sawyer, foi bom ver você.

Eu sorrio para ela e aceno. Meu pai se levanta, então olha para
mim. — Você é bem-vindo ao quarto de hóspedes pelo tempo que
precisar.

Agradeço e aceito sua oferta. Vai demorar um pouco para


vender a casa e assinar os papéis. Não tenho ideia do que vou fazer
depois disso. Talvez, por enquanto, eu devesse levar tudo um dia,
um passo, uma respiração de cada vez.

Tomo um banho e me preparo para dormir. Quando me deito,


vejo Jessie. Fecho os olhos e me lembro do cheiro dela, minhas
mãos passando por seu cabelo macio e sedoso, seu sorriso
travesso. Há muito sobre ela que eu amo.

Amava.

Amo.
Eu belisco a ponte do meu nariz. Amei e perdi. Eu me atrevi a
amar novamente.

Mas tê-lo roubado de mim mais uma vez?

Um castigo cruel e cruel.

Quando adormeço, é o nome de Jessie em meus lábios. Seu


rosto tatuado em minha alma.
36

Ouvi dizer que o tempo cura todas as feridas.

Que merda.

Faz duas semanas desde que Sawyer saiu da minha vida. Meu
coração não está menos machucado. Se alguma coisa, tudo o que
meu coração fez foi dobrar em si mesmo. Penso nele
constantemente. Eu o quero o tempo todo, com uma força que me
assusta.

Encontrei Marlowe para almoçar hoje. Fizemos algumas


compras, principalmente para artigos domésticos. Tenho
adicionado uma lista em minha cabeça toda vez que me deparo
com algo que percebo que preciso e não tenho em minha casa. Meu
banco de trás está cheio de sacolas de compras.

Ignoro a herdade, onde devo estar em uma hora para um


jantar em família que com certeza será estranho. Estamos
atrapalhando nosso caminho e sairemos do outro lado mais fortes.
Mas as dores do crescimento são, bem... dolorosas.

Há um carro estacionado na frente da minha cabana, e por


um breve segundo, meu cérebro engana meu coração para pensar
que é Sawyer. Eu não sei por que. Não é nem da mesma cor do
carro dele.
Mas conheço este veículo. E eu definitivamente nunca pensei
que esse dia chegaria. Eu espio no espelho retrovisor, checando
meu reflexo, então paro completamente na frente da minha casa.

Austin se inclina contra a porta do motorista fechada, braços


cruzados. Ele é alto, sua cintura fina, seus braços musculosos
apenas o suficiente para não serem desagradáveis. Ele não mudou.

Ele uma vez parecia tão desejável, quase de outro mundo.


Agora eu olho para ele e penso em como ele é patético.

Eu saio e giro, de frente para ele por cima do teto do meu carro.
— Por que você está aqui?

— Olá para você também. — Seu sorriso é arrogante.

Balanço minha cabeça para ele. — Não tente isso comigo.

Ele bate o polegar contra o braço. — Você não quer saber como
eu te encontrei? — Há um traço de orgulho em sua voz.

Meu queixo se inclina. É um movimento arrogante, que vi meu


pai e meus irmãos fazerem mil vezes. — Nem um pouco, — digo
com firmeza.

— Você me enfeitiçou.

Isso é mágoa que ouço em sua voz? Quão rico.

— Foi a coisa mais gentil que eu poderia fazer por sua esposa
e bebê.

Seus olhos se arregalam. Ele pisca e esfrega a mão na boca. —


Eu não percebi...

— Que eu sabia? Sim. Eu sei. — não estou interessada em


dizer a ele como eu sei. Nunca estive menos interessada em uma
conversa em toda a minha vida. — Por que você está aqui? —
Repito, minha voz é menos gentil do que antes.

Ele se aproxima, e o observo com cautela. Ele cruza na frente


do meu carro e para do outro lado da minha porta aberta, de modo
que ela forma uma barreira entre nós. — Ouvi o que aconteceu
com você. Com a faculdade. Sinto muito.

Pisco e desvio o olhar. — Foi uma bênção disfarçada.

— Como assim? — Sua voz é suave e chama minha atenção


de volta para ele. Isso me lembra de como começamos em primeiro
lugar. Como ele me convidou para seu escritório horas depois que
entreguei um trabalho, e me disse que achava que eu poderia fazer
melhor. Sua voz tinha sido suave e carinhosa também, e parecia
um abraço quando precisava de um.

Eu preciso de um abraço agora também, mas seus braços são


o último lugar em que quero me encontrar.

— Estou administrando o rancho agora. Com meu irmão.

Ele sorri torto. — Seu sonho se tornou realidade.

Sim, ele fez. E ainda assim eu perdi muito ao longo do


caminho.

Ele alcança a porta e coloca uma mecha de cabelo atrás da


minha orelha. Seus dedos percorrem a parte externa do lóbulo da
minha orelha. Meus ombros se amontoam e eu me movo de seu
alcance. — Não acho que sua esposa gostaria que você me tocasse
assim.

Ele suspira e enfia as mãos nos bolsos. — Eu não quis traí-la.


Não era meu plano. Mas você, Jessie, você estava apenas, — ele
balança a cabeça, — você se sentiu como a pessoa com quem
deveria estar. Você veio junto tarde demais. Ou talvez eu tenha
resolvido cedo demais. Isso significa que eu nunca vou ter você?
Eu tenho que aceitar minha posição, simplesmente porque fiz a
escolha errada?

Estremeço com suas palavras. Considerando o que aprendi


recentemente sobre meu próprio pai e sua infidelidade, o que
Austin está dizendo tem um impacto. — Essa é a frase mais fraca
que já ouvi um homem falar. Deixe seu casamento porque é certo
para você, não porque você conheceu alguém que você gosta mais
do que sua esposa. Por enquanto, pelo menos. — Fecho a porta do
carro e abro o banco de trás, tirando as malas. — Estou ocupada.
Você precisa sair.

Ele fica enraizado em seu lugar, então corto em volta dele e


vou em direção a minha casa.

Atrás de mim, Austin diz: — Falei com o reitor. Ele concordou


em reintegrar você.

Eu paro e me viro. — Por que você faria isso?

— Você é inteligente, Jessie. Você tem muito potencial. Não


quero vê-lo desperdiçado.

Meus braços se erguem, na altura da minha cintura e


carregados de sacolas. Gesticulo para a terra que nos cerca. —
Obrigada, mas não, obrigada. Estou feliz aqui.

— Você não parece ser.

— Foda-se, Austin.
— Você gostou de mim, uma vez. Eu não sou um homem mau,
embora eu tenha feito uma coisa ruim.

— Conheço homens bons. Fui criada por homens bons. Só


porque você não é ruim, não significa que você é bom. — Eu giro e
continuo. Ele não diz outra palavra, e eu destranco a porta e entro.
Dou alguns minutos, então espio pela janela da frente para ver se
ele saiu. Ele se foi.

Meu telefone toca com uma notificação. Um texto de Austin.

Não desperdice esta oportunidade porque você está com


raiva de mim.

Meus dedos pairam sobre o telefone, posicionados enquanto


meu cérebro vasculha uma resposta rápida. No final, apago a
mensagem, bloqueio o número dele e abro minha última conversa
com Sawyer. Li-o quatro vezes. Uma conversa mundana sobre o
que fazer para o jantar.

Se ao menos pudesse ser transportada de volta para aquela


época, tão recente como era, quando essa era nossa maior
preocupação.

●●●

O jantar em família é tão estranho quanto eu pensei que seria.


Onde antes éramos uma equipe barulhenta e risonha,
conversando uns com os outros e enviando farpas bem-
humoradas pela mesa, esta noite estamos quietos. A conversa é
inventada. Forçada. Meu pai tenta manter a conversa em
movimento, o que pode ser a maior e mais óbvia mudança de
todas. Um Beau Hayden tagarela é enervante.

Graças a Deus pelos meus sobrinhos e sobrinhas. Eles


fornecem entretenimento muito necessário e alívio cômico. Só mais
um pouco e os implantes de Colt serão ativados. Por enquanto,
todos nós usamos ASL para nos comunicarmos com ele. Toda vez
que alguém assina, isso me lembra Sawyer. Mas com toda a
honestidade, quase tudo me lembra Sawyer.

Isso é o que um coração apaixonado faz. Ele anseia, mesmo


quando não tem mais um alvo físico para atingir.

Depois do jantar, meu pai me pede ajuda com a sobremesa.


Eu o sigo até a cozinha, sabendo que isso não é sobre a torta que
minha mãe fez.

Ele puxa uma faca do bloco e corta a primeira das duas tortas
ao meio. — Como você está? — ele pergunta.

Observo-o dividir a torta. O aroma de maçãs e canela enche o


ar.

— Tudo bem, — respondo.

Ele olha para mim, seus olhos comunicando sua descrença.

— Eu não estou bem, — murmuro. Retiro uma pilha de pratos


de um armário e um punhado de garfos de uma gaveta.

Meu pai termina de cortar a segunda torta e coloca a faca na


pia. Ele passa um momento reunindo seus pensamentos, de costas
para mim, ombros curvados. — Sinto muito, Jessie. — Ele se vira
para mim enquanto fala. Ele parece mais velho do que parecia um
mês atrás. Achei que tirar um segredo do seu peito deveria fazer
você se sentir melhor, mas não parece ser o caso dele. Ele
obviamente ainda está carregando esse peso. Conhecendo meu
pai, ele insistirá em carregá-lo mesmo quando todos lhe disserem
que ele pode deixá-lo de lado.

— Espero que você saiba o quanto eu te amo, — ele continua.


— O quanto eu amo seus irmãos, e especialmente sua mãe.

Seu amor por nossa família nunca esteve em dúvida. — Eu


sei, pai.

— E lamento que as coisas não tenham dado certo com


Sawyer. Isso é minha culpa também.

Concordo. Minha garganta parece grossa com a menção de seu


nome. — Pai... — Eu paro, decidindo como dizer o que eu queria
dizer a ele. — Sawyer achou estranho a mãe dele ter morrido tão
perto do HCC, enquanto vocês estavam... você sabe. — Não posso
dizer a palavra caso. Não na cara dele, de qualquer maneira. — Ele
pediu ao xerife o relatório da polícia daquele dia.

Eu avalio a reação do meu pai. Não há nenhum. Nem mesmo


um tique ao longo de sua mandíbula.

Eu engulo o nó na minha garganta. — Tem alguma coisa


estranha nisso?

Ele se inclina contra a pia, cruzando os braços sobre o peito.


— Posso ver por que ele pensaria isso. Se fosse minha mãe, minha
mente iria para lá também. Mas a resposta é não. A morte de
Cynthia foi um acidente. Um terrível e trágico acidente.

Alívio toma conta de mim. — Isso foi o que eu pensei.


Meu pai me puxa para um abraço. Seu cheiro é o mesmo desde
que eu era uma garotinha. É a primeira vez desde que Sawyer
partiu que me sinto confortada.
37

montei Titan hoje, e tudo o que faz é me lembrar da última


pessoa que vi montando nele. E também, do cavalo que não posso
mais montar.

As cinzas de Hester Prynne estão prontas para serem


recolhidas, de acordo com o correio de voz deixado esta manhã.
Vou pegá-las amanhã. Meu coração dói só de pensar nisso, mas é
um sentimento familiar. Meu coração está em pedaços de qualquer
maneira.

Dezessete dias desde que Sawyer partiu. Não que esteja


contando.

Depois do trabalho, peguei uma garrafa de vinho na minha


cabine, parei na casa de Wes e pedi sua pistola. Ele me olhou com
cautela, perguntou por que eu a queria, então tirou a arma do cofre
e a entregou. Ele deve achar que minha razão é boa o suficiente.

Chego ao local onde Hester Prynne quebrou a perna e saio.


Abafo um soluço e enxugo uma lágrima. Três segundos antes de
ela entrar naquele buraco, eu achava que minha vida era perfeita.
Aqui estou agora, e perdi meu cavalo e o homem por quem estou
apaixonada.

Abro o vinho, bebo da garrafa porque não há ninguém aqui


para se importar, e deito de bruços ao lado do monte de terra mais
próximo. Eu fiz minha pesquisa. Esses roedores gostam de
anoitecer, e um tiro certeiro é a única maneira de se livrar deles.
O veneno está fora de questão, porque você não pode ter outros
animais comendo-os e sendo envenenados também. Toupeira tem
uma baixa taxa de sucesso. Digite: o.22.

Espero. E espero. Eu ainda sou como pode ser. Uma cabecinha


peluda aparece, e eu enrolo meu dedo no gatilho. Respire
silenciosamente. E…

Faróis balançam na minha direção, um caminhão ao longe. A


toupeira cai de volta em seu buraco.

— Droga! — Estou de pé, pisando forte na direção do veículo.


A caminhonete de Wes se aproxima, diminui a velocidade e desliga.
Ele sai e contorna a frente.

— Muito obrigada, idiota. Eu tive uma chance.

Ele acena para mim e abre o banco do passageiro. Vovô?

Wes pega duas cadeiras dobráveis na traseira da caminhonete


e caminha lentamente até mim, vovô ao lado dele.

— O que está acontecendo? — pergunto.

Wes arruma as cadeiras e tenta ajudar Vovô a se sentar. Vovô


golpeia suas mãos. — Mantenha suas patas sujas para você,
garoto.

Wes sorri e se afasta. — Pensei que talvez fosse a sua vez de


receber as palavras de sabedoria do vovô. Ele me ajudou uma vez...

— Só uma vez? — Vovô pergunta sarcasticamente.


Wes dá uma olhada na parte de trás de sua cabeça de cabelos
brancos. — Ele pode ter algo bom a dizer sobre o que você está
passando, Jessie. Ou talvez não. Talvez ele seja muito velho.

Vovô levanta o dedo médio no ar. Wes pisca para mim e


estende a mão. — Devolva-me minha arma. — Eu a entrego,
embainhada em seu coldre. — Traga-o de volta para a herdade
quando terminar aqui.

— Você entendeu. — Wes decola. Eu me acomodo ao lado do


vovô.

Ele olha para o campo e zomba. — O lugar está cheio de


toupeiras. Pequenos filhos da puta. Eu odeio essas coisas.

— Mesmo. — Se pudesse estalar os dedos e todos eles caíssem


mortos, eu o faria.

— Você está atirando neles? Isso é tudo que você pode fazer.

— Eu estava tentando até você aparecer e eu perdi a


oportunidade.

— Hmph, — ele resmunga. — Wes veio me buscar e me disse


que haveria uísque.

Ando até onde estava deitada na terra e pego a garrafa de


vinho. Ele olha com desgosto quando entrego a ele. — Esta é uma
bebida de senhora.

Reviro os olhos. — Oh, por favor. Não seja tão idiota.

Ele ri uma risada de velho. — Sua avó costumava chamar as


pessoas assim.

— Eu lembro.
Ele toma um gole de vinho, faz uma careta e me entrega a
garrafa. — Essa merda é horrível.

— Mais pra mim.

— Eu não disse que não iria beber. Só que é horrível.

O sol está se pondo mais longe agora, o céu passando de


laranja profundo para roxo e rosa. Não estou mais em posição de
atirar em uma toupeira, mas a cada poucos minutos vejo uma
cabeça sair de um buraco. Se ao menos tivesse uma pedra e um
estilingue, estilo Davi e Golias.

— Como está esse seu coração? — Vovô mergulha direto no


motivo pelo qual ele foi trazido aqui.

— Dói, mas vou superar isso. Pelo menos tenho o rancho para
me manter ocupada.

— É melhor você ter cuidado, ou você vai acabar como Wes


antes de conhecer Dakota.

— Wes teve TEPT dos militares e é por isso que ele se enterrou
no rancho. Não um coração partido.

— Então? Você vai construir um muro em volta do seu coração


e se enterrar no rancho. Mesma diferença. — Ele bate no joelho. —
Alguns corações partidos duram uma vida inteira.

— Você não é romântico? — franzo a testa para ele. — Sawyer


tinha outras coisas acontecendo também. Como lidar com sua dor
por sua esposa.

— Pare de soprar fumaça na minha bunda. Talvez ele estivesse


de luto por sua ex- esposa, mas ele se apaixonou por você, Jessie.
Abro a boca para argumentar, mas ele me para e continua. —
Aquele menino estava passando muito tempo com seu sobrinho e
ensinando-o, além de ensinar sua família. Ele não estava fazendo
isso apenas pela bondade de seu coração, mesmo que tenha
começado assim. Ele fez porque ele te ama.

Tomo um grande gole de vinho e entrego. — O amor nem


sempre vence, vovô. Às vezes, outros problemas são muito
pesados.

Ele pega a garrafa. — Finja que você está em um navio e ele


está afundando. Não há coletes salva-vidas. Você pode afundar
com seu navio ou pular e nadar, mas ainda corre o risco de se
afogar. O que você faz?

— Saltar e nadar, obviamente.

— É assim que é o amor. Se você acha que Sawyer vale a pena,


pule do maldito barco. Comece a nadar.

— Mas nossos pais...

— Todos os relacionamentos têm problemas a serem


superados em um sentido ou outro. Você desiste desse
relacionamento por esse problema, você só encontrará outro com
outra pessoa no caminho. O que estou realmente dizendo é que se
você quer estar com Sawyer, você deveria estar. Todo o resto são
detalhes.

Eu me inclino para trás na minha cadeira e puxo meus joelhos


para cima e meus pés para dentro. — Você tem mais alguma coisa
a dizer?
— Sim, — diz ele. — Também gostaria de acrescentar que você
é um punhado e Sawyer gosta disso em você. É preciso um certo
tipo de homem para lidar com uma pessoa tão forte quanto você,
Jessie. Forte em personalidade, mas também em vontade. Nem
todo mundo é forte à altura da tarefa.

Olho para ele. — Como você se tornou tão sábio?

— Eu sou velho pra caramba, é assim. E presto atenção.


Então, você vai me ouvir e ligar para Sawyer?

Meus lábios torcem enquanto penso. — Talvez. Mas foi uma


decisão mútua. Ele me deixou também. Acho que ele deveria
trabalhar um pouco para isso. — pisco para vovô.

Ele sorri. — Essa é a minha garota.

O sol se põe abaixo do horizonte. Levanto-me e alcanço o vovô.


— Vamos para casa.

Vovô me lança um olhar sujo e murmura para si mesmo. —


Juro por Deus, se meus netos não pararem de agir como se eu não
pudesse sentar ou ficar de pé sozinho, vou levar um cinto em suas
bundas nuas.

Torço meu nariz em desgosto brincalhão. — Acho que você


pode ser preso por isso hoje em dia. Provavelmente por mais de
uma razão.

Ele ri, mas me deixa carregar as duas cadeiras e o vinho.


Coloco as cadeiras no porta-malas e o levo até a casa.

Ele desaparece dentro e eu dirijo de volta para o meu lugar.


Termino o vinho, tomo um banho e me deito. Olho para o
travesseiro que Sawyer usou, minha mão traçando o espaço vazio
na cama onde seu corpo costumava ficar.
38

Parei para almoçar na herdade antes de voltar para o trabalho.


Dakota está aqui com Colt, e ela acabou de se juntar a mim na
frente. Colt está dentro com minha mãe.

— Você está pronta para a consulta na próxima semana? —


pergunto, limpando uma mancha do meu sanduíche de salada de
ovo do meu lábio inferior. Wes, Dakota e Colt estão indo para
Phoenix para ligar o implante coclear de Colt.

— Claro que estou, — responde Dakota, fazendo uma careta


enquanto se mexe. Ela está grávida de sete meses e diz que está
oficialmente desconfortável. — Vamos ativar esse dispositivo para
que possamos seguir em frente. E eu posso começar a prestar mais
atenção no próximo pequeno. — Ela esfrega o estômago. — Sinto
que estou muito atrasada. Quando estava grávida de Colt, estava
pronta meses antes da data do parto. Desta vez, Colt ocupou tanto
do meu tempo e atenção que não consegui concentrar em sua
irmã.

Acaricio sua barriga. — Vou te ajudar.

Ela pega seu sanduíche. — Você está muito ocupada esses


dias.

— Minhas noites são livres.

Ela me dá um olhar conhecedor. — Você nunca vai falar sobre


isso?
— Dói demais. — Isso, e não quero revelar nada disso. Toda
vez que falo sobre isso, é como quebrar um pedaço da minha
tristeza. Quero manter tudo junto, essa mágoa que sinto por
Sawyer, e mantê-la perto.

Se eu não tiver notícias dele até o final desta semana, vou ligar
para ele. Vou inventar alguma razão, algo que ele deixou para trás,
só para ouvir a voz dele. Ele vai ver através de mim, mas tudo bem.

Ela bate no meu ombro. — Estou aqui se você precisar de


alguém para ouvir.

Dou um sorriso falso. — Obrigada.

Dakota aponta para o céu. — Parece que podemos finalmente


pegar um pouco de chuva. Não consigo me lembrar da última vez
que isso aconteceu.

Eu sigo para onde ela está apontando. No oeste, o céu está


escuro. Mas ao nosso redor, não há nada além de céu azul. — Vou
acreditar quando vir. — Tem estado apenas ensolarado e seco, e
toda vez que a previsão indica chuva, não há nem mesmo uma
nuvem de tempestade perdida flutuando. Estou começando a
pensar que os meteorologistas pedem chuva simplesmente porque
estão entediados em dizer a mesma coisa todos os dias.

Minha mãe sai da herdade, segurando a mão de Colt. Ela


entrega um prato com meio sanduíche para Dakota. — Ele não vai
comer nada por mim. Talvez você possa fazê-lo comer.

Dakota pega o prato. Ela pega seu sanduíche e oferece a Colt.


Ele balança a cabeça. Dakota abre a boca como se fosse comê-la,
e o braço de Colt dispara para detê-la. Dakota faz uma
demonstração de compreendê-lo e o estende novamente. Ele se
inclina para frente e dá uma mordida.

Minha mãe ri. — Bom saber para a próxima vez. — Ela olha
para fora. — Ah, olhe. Eles nem mesmo previram chuva, mas
podemos conseguir um pouco.

Uma hora depois, começa a chover. Apenas uma pitada, não o


suficiente para nos incomodar enquanto trabalhamos. Estamos
marcando e vacinando os bezerros hoje. Verdade seja dita, não
suporto estar presente em nenhum dos dois, mas me forço a fazer.

Estamos no celeiro quando a chuva realmente começa. Ele


bate no telhado, e Josh entra correndo, com as roupas
encharcadas.

— Está saudando? — Wes pergunta, olhando para o teto.

— Você pensaria, pelo que parece, — responde Josh, passando


a mão pelo cabelo molhado. — Mas não é. Apenas chovendo muito
bem.

— Huh, — Wes diz, sobrancelhas se juntando.

— O que? — pergunto. — É chuva, Wes. É o que estávamos


esperando.

— A chuva que vem tão rápido e forte pode levar a uma


inundação repentina.

— Há um dique para evitar que isso aconteça, lembra? Não


fique tão preocupado o tempo todo. Apenas aproveite a chuva.
Estenda os barris e colete.

— Eles estão fora, Jessie. Bem ao lado das calhas, onde


deveriam estar. Os tanques também estão prontos. — Ele me dá
um longo olhar. Não é indelicado, mas é firme. — Você não é a
única que é boa em seu trabalho.

Houve um tempo em que esse comentário teria me irritado e


uma resposta sarcástica teria saído da minha língua. Hoje em dia,
estou me sentindo um pouco mais apreciado, então digo: — Bom
trabalho, irmão.

Wes desvia o olhar, mas usa sua visão periférica para


encontrar meus olhos e sorrir para mim. Franzo meus lábios e
escondo meu sorriso.

Terminamos a tarde, e não para de chover. Chove e chove,


como se os céus estivessem liberando tudo o que retiveram por
meses a fio. Doze horas depois, a chuva se transformou em
chuvisco, e agora é apenas uma neblina.

Estou colocando luvas em minhas mãos para me preparar


para o segundo dia de marcação e vacinação quando minha mãe
corre para o celeiro. Ela vem para o meu lado e coloca os lábios
perto da minha orelha.

— Sawyer está aqui, — ela diz baixinho.

Meu coração cai de joelhos. — O que? Ele está aqui? Na


herdade?

Ela acena. — Ele parou quando eu estava andando por aqui.


Dakota levou Colt para explorar a casa depois da chuva, e eu
estava vindo para ver se você precisava de ajuda. — Ela segura as
luvas em suas mãos, evidência do que ela estava dizendo.

Olho pelas portas do celeiro, mas não consigo vê-lo daqui.


Respiro fundo, tentando diminuir minha frequência cardíaca
frenética. Ela bate no meu peito e sobe pela minha garganta de
qualquer maneira.

Tirando minhas luvas, eu corro a mão pelo meu cabelo e me


viro para minha mãe. Ela sorri para mim, e não há nada além de
felicidade e apoio nesse sorriso. — Não viva em nosso passado,
Jessie. Não há nada para você lá atrás.

— Obrigada, mãe, — sussurro, beijando sua bochecha.

Eu corro do celeiro. Parece que faz anos desde que eu o vi,


quando na realidade foram apenas semanas. Eu viro e lá está ele,
parado ao lado de seu carro. Ele está olhando para baixo, com as
mãos nos bolsos. Meu Deus, esse homem é lindo. Meu coração
salta, gira, gagueja. Ele está vestindo o jeans que comprou
enquanto estava comigo e uma camisa que não reconheço. Quanto
mais me aproximo, mais vejo seus lábios se movendo. Ele está
praticando o que vai dizer?

Paro a alguns metros de distância e limpo a garganta para


chamar sua atenção. Ele olha para cima. Sua garganta balança.
Nós nos encaramos, os segundos passando. A névoa cobre nossos
rostos.

Sawyer caminha pelos poucos metros que nos separam. Ele


me agarra ao mesmo tempo que eu o alcanço, agarrando dois
punhados de sua camisa.

Seus lábios pressionam os meus, e ele me beija como se fosse


a terra sedenta que foi privada de água. Minhas mãos deslizam por
seu cabelo úmido. Meu corpo inteiro treme, e sei que não é a
chuva.
— Senti sua falta, — diz ele, respirando fundo e me beijando
levemente. — Senti tanto a sua falta.

As pontas dos nossos narizes se esfregam quando eu aceno.


— Nós vamos descobrir. Tudo. Nós vamos fazer funcionar.

— Sim, — ele respira, o cheiro de canela se misturando com o


cheiro de chuva. — Me desculpe, eu fugi quando ficou difícil. Eu
estava chateado e precisava me entender. Mas a única coisa que
não tinha que descobrir era o que eu sentia por você. Você foi
minha constante.

—Eu sei.

—Não importa o que aconteceu no passado ou acontecerá no


futuro, eu te amo. — Ele me beija de novo, e é o beijo mais doce da
minha vida porque suas palavras ainda estão em meus ouvidos. —
Eu te amo, — ele sussurra novamente quando se afasta.

Fecho os olhos e sorrio. — Eu também te amo, Sawyer. Me


desculpe por deixá-lo ir. Eu estava chocada demais para lutar, mas
se chegar um momento em que eu precisar lutar por nós, não
cometerei esse erro duas vezes.

— Eu... — Sawyer faz uma pausa, sua expressão mudando. —


O que foi esse som?

A mudança repentina de humor faz soar o alarme. — Que


som?

Então eu ouço. Um estrondo, como um trem. Exceto que não


há trilhos de trem perto de Sierra Grande. — Vá, — Sawyer diz com
urgência, me empurrando em direção à herdade.

— Sawyer, o que…
Então eu vejo. E eu grito.
39

— Jessie, vá, — eu a empurro novamente, apenas um pouco


mais forte do que antes. Eu tenho que levá-la para um terreno
mais alto.

Havia tantas coisas que eu queria dizer a ela, tantas coisas


que eu queria fazer com ela, mas agora recuperar o tempo perdido
é a última coisa em minha mente.

Alguém atrás de mim grita. Wes vem do celeiro, acenando com


os braços. Não consigo ouvir o que ele está dizendo. Ele está muito
longe, e o som estrondoso está ao nosso redor agora.

Quando aparece, não é o que eu esperava ver. Um rio negro


desce sobre nós, a apenas cem metros de distância. Parece grosso,
como lodo, marrom e preto e cheio de terra. Paus, galhos de
árvores e qualquer outra coisa que ele pegue enquanto rola. Parece
que vai fluir para um lado da casa. Vai deixar uma bagunça, mas
todos devem ficar bem, desde que subam as escadas e cheguem à
varanda.

Jessie está correndo e apontando, mas ela está indo na direção


errada. Ela está indo em direção à enchente.

Eu corro atrás dela e ouço Wes gritando atrás de mim. Ele está
gritando por Dakota e Colt.

Olho em volta, tentando entender, e então entendo.


Do outro lado da enchente que se aproxima rapidamente estão
Dakota e Colt. Ela está deitada no chão de lado, sua barriga
enorme, e ela está meio rastejando, meio se arrastando. Colt corre
na frente dela. Eu olho para suas perninhas, correndo como o
inferno, mas ele está sorrindo. Ele não tem ideia do perigo à sua
frente. Eu não entendo o que aconteceu com Dakota, mas eu sei
que se ela pudesse estar correndo agora, ela estaria.

Não há como Colt atravessar o pátio antes que a lama e os


gravetos o derrubem e muito possivelmente o levem embora. Vi
vídeos de inundações repentinas e sei que este é o começo. A água
está chegando.

Dakota, no chão atrás de Colt, grita por ele.

Wes, correndo todo o caminho do celeiro, grita por ele.

Ele.

Não pode.

Ouvir.

A lama chegou até nós agora, e eu caio de joelhos, acenando


para chamar a atenção de Colt. Eu uso minhas mãos para dizer a
ele para ficar. Eu assino para a mamãe. Ele se vira para olhar para
Dakota, que ainda está rastejando em seus antebraços, usando
apenas uma perna para se impulsionar para frente.

Um som como um trem enche o ar novamente. O chão ronca.


A lama afina e a água vem, caindo da elevação mais alta, um rio
aparecendo do nada. Ele se ramifica, livre de nada. Não há valas
ou aterros, nem sacos de areia. A água é livre para fazer à terra o
que quiser.
E Colt é varrido.

Sobre a corrente de água, o lamento de Dakota perfura o ar.

Meu corpo entra em ação. Corro paralelamente ao fluxo, meu


peito queimando com o esforço. Colt, milagrosamente, está de
costas, mas ele é girado e pode haver apenas alguns segundos
antes que a água o derrube. Há um ponto à frente onde talvez eu
possa ficar na frente da água enquanto ela avança.

Eu empurro mais forte, corro como nunca antes, e corro para


a água corrente. Tem mais de quinze centímetros de profundidade,
o suficiente para derrubar um homem adulto. Mas há algo a ser
dito sobre a adrenalina, e eu a sinto pulsando através de mim
agora. Movo-me rapidamente, nunca dando tempo suficiente à
água para trazer sua força total contra mim. Mergulho na frente
de Colt, para que ele seja parado pelo meu corpo, e eu envolvo
meus braços ao redor dele, empurrando seu rosto para o céu. A
água sobe rapidamente, cada vez mais alto, e leva a mim e a Colt
para longe. Eu o coloco sobre meu peito, e minhas costas sofrem
o arranhão de pedras afiadas, as punhaladas de galhos de árvores.

O corpo inteiro de Colt está tremendo, e o meu também.

Há uma árvore à frente, bem no centro da água corrente.


Seguro Colt firmemente com um braço, colocando-o em mim como
uma bola de futebol enorme. Eu estendo a mão, me espreguiçando,
e meus dedos apenas acariciam enquanto passamos.

Quero soluçar, mas em vez de sair da minha boca, parece que


meu corpo inteiro está soluçando.
Colt merece viver. Isso é o que eu continuo dizendo a mim
mesmo, repetidamente, repetindo como um mantra. Isso me
estimula a olhar para frente, planejando a próxima árvore. E
quando vejo, estou mais preparado. Não posso controlar a forma
como a água nos empurra, mas posso usá-la. Inclino-me para um
lado, me guiando, e quando estamos perto, eu me agarro nela.

Tudo dentro de mim se alegra. Com minhas pernas dobradas


ao redor do tronco magro de choupo, eu mantenho Colt no meu
peito e seguro pela preciosa vida.

Eu respiro fundo na tentativa de diminuir a frequência


cardíaca de Colt. Quero que ele sinta que estamos bem, mesmo
que ele não possa ouvir minha garantia sussurrada.

— Sawyer, — uma voz grita. O som da água é alto em meus


ouvidos, mas freneticamente procuro a terra. Uma caminhonete
HCC, dois homens no banco recém-formado. Beau e Wes. Outra
pessoa sai. Vovô.

A árvore era um salva-vidas, mas ver esses homens? É meu


primeiro gosto de esperança desde que peguei Colt.

Beau amarra duas cordas a uma árvore. Ele olha para eles e
de volta para nós. Wes pega as cordas das mãos de seu pai e
começa a enrolar uma em torno de sua cintura, mas Beau balança
a cabeça. Não consigo ouvir nada do que estão dizendo, mas estão
em desacordo. Wes aponta para nós, e Beau balança a cabeça com
veemência. Vovô pega as cordas de Wes e amarra uma em sua
cintura. Beau e Wes dizem a ele que não, posso ler em seus lábios.
Ele os ignora. Vovô se amarra em um pedaço de corda, enrola o
segundo e se agarra a ele. Ele entra na água.
As mãos de Beau e Wes pressionam juntas em posição de
oração em suas bocas. Os lábios de Wes se movem enquanto ele
sussurra sua oração. Se Beau está rezando, ele está fazendo isso
silenciosamente.

Vovô amplia sua postura. Ele caminha devagar, dando cada


passo com muito cuidado e propósito. Ele nos alcança e não diz
uma palavra. Ele enrola a corda em volta da minha cintura e dá
um nó. — Não solte esse garoto, — ele rosna, então dá um sinal de
positivo para Beau e Wes.

Wes puxa as cordas, removendo a folga, e então, de mão em


mão, os dois homens começam a nos puxar. Eu ajudo o máximo
que posso, mas não há muito que eu possa fazer sem arriscar Colt,
e ele é a razão de tudo isso.

Uma torrente fresca de água atravessa. Wes e Beau, dois


homens fortes, saudáveis e capazes, lutam para nos puxar através
da pressão e força da água corrente. Atrás deles, vejo o que eles
não veem.

A árvore que nos amarraram se curva, cedendo ao peso que foi


forçada a suportar. Os olhos do vovô encontram os meus. Ele
também vê.

— Depressa, — grito, como se isso fosse ajudar. Não vai. É


simplesmente uma questão de força e peso, força e energia.

Vovô olha nos meus olhos. Não consigo ler o que ele está
pensando, porque a expressão não faz sentido para a
circunstância.
Ele olha para Wes e Beau, lutando apesar de suas forças
combinadas. A água se estende, circundando a árvore, girando em
torno das botas de Wes e Beau. Quanto tempo antes que eles sejam
varridos também?

Algo tem que dar. Se eu entregar Colt ao Vovô, eles estarão


mais propensos a chegar em segurança. Se eu me desamarrar,
talvez consiga sair dessa situação em algum lugar ao longo do
caminho. Mas também... talvez não.

Vovô chega debaixo d'água, o ombro se movendo enquanto seu


braço trabalha em alguma coisa. Sua mão limpa a superfície, e a
aparência da faca me confunde a princípio. Ele aperta um botão,
a lâmina aparece e tudo faz sentido.

— Não, — grito, mas é tarde demais. Vovô se cortou.

Até este momento, tudo tinha sido tão alto. A água, os gritos,
minha pulsação nos ouvidos. De repente, está em silêncio. Eu não
ouço nada. Não consigo ver nada além do que podem ser as
palavras finais de Vovô. E não fazem sentido.

Desculpe-me.

Os gritos me atingem. Beau e Wes, seu não é um uivo


penetrante. Wes empurra o ombro de seu pai, balança a cabeça,
aponta para mim e Colt com dois dedos. Wes, sempre o líder, está
orientando seu pai a agir apesar de seu sofrimento.

Começamos a nos mover. Colt, reunido em meus braços com


o rosto pressionado contra meu peito, ainda está em silêncio. Temo
que agora ele esteja em choque.
Sem o peso de um segundo homem, Beau e Wes nos
aproximam cada vez mais deles. Chego a um ponto em que sou
capaz de usar meu próprio peso corporal contra a corrente e
pressiono meus pés no fundo. Estou exausto, meus músculos
quase fatigados, mas saio da água.

Wes arranca Colt dos meus braços, e eu caio de joelhos.

— Filho, filho? — Beau diz com urgência.

Minhas mãos estão nas minhas coxas, minha cabeça inclinada


como alívio e agonia me atravessam em igual medida. O coração
de Jessie vai quebrar mais uma vez quando ela souber sobre seu
avô.

Um braço envolve meus ombros, me puxando para os meus


pés. — Filho, vamos. — Beau me leva até sua caminhonete. Pensei
que ele estava falando com Wes, mas ele estava se referindo a mim.
Filho.

Beau está ao telefone, contando ao xerife Monroe sobre seu


pai.

— Beau, — diz o xerife, sua voz audível na cabine do


caminhão. — É improvável que ele sobreviva.

— Eu sei. — Beau apalpa a testa, os dedos cavando.

— Leve esses meninos para o hospital. Eu cuido daqui.

Eu sento na frente. Wes se deita no banco de trás sem camisa.


Ele removeu as roupas molhadas de Colt e eles estão pele com pele.
A transferência de calor está ajudando a aliviar o tremor de Colt.
Isso, e estar com seu pai.
— Sente-se, Sawyer, — Beau instrui. As lágrimas caem
silenciosamente em seu rosto. — Tente descansar antes de
chegarmos lá.

— Não posso sentar, — digo a ele, inclinando-me para a frente


nos quadris para mostrar a ele minhas costas. Minha pele está tão
rasgada quanto minha camisa.

— Cristo, — murmura Beau. Ele estende a mão sobre o


console, tocando a parte de trás da minha cabeça suavemente. —
Eu não mereço o que você fez por mim hoje.

Talvez ele não saiba.

Talvez ele faça.

Eu não me importo mais. Não posso passar minha vida


permitindo que os erros do passado de outras pessoas ditem meu
futuro. Não quero pensar nele com minha mãe. Eu não quero odiá-
lo.

— Eu amo sua filha, Beau. Tudo que eu quero é seguir em


frente com ela.

Beau coloca a mão de volta no volante. Ele franze os lábios e


balança a cabeça. — Você é um homem melhor do que eu já fui,
Sawyer. Minha filha tem sorte de ter você.

Chegamos ao hospital. Colt e eu somos levados de volta


imediatamente. Eles iniciam um IV para fluidos e, assim que o
tubo está em meus braços, fecho os olhos e desmaio.
40

Um final nobre.

Isso é tudo o que um homem pode esperar.

A água da enchente me joga de um lado para o outro. Isso dói.


Tudo machuca.

Alguns corações partidos duram uma vida inteira.

Isso foi o que eu disse a Jessie. Eu quis dizer isso. Eu quebrei


meu próprio coração há muito tempo.

Tirei as chaves do bolso de Cynthia Bennett, montei seu cavalo


de volta ao seu rancho e peguei seu carro. Posicionei o carro dela
na estrada, de frente para a árvore. Eu a coloquei no banco do
motorista. Coloquei a maior pedra que pude encontrar no pedal do
acelerador.

Eu assisti o carro bater na árvore. E pouco antes disso,


Cynthia se levantou e seus olhos se abriram.

Como Beau, pensei que ela estava morta.

Ela morreu instantaneamente um segundo depois.

Eu nunca disse a Beau.

Apenas o xerife Monroe sabia a verdade, e ele se certificou de


que ficasse escondida. Como muitos de nós, o homem da lei fez
muitas coisas boas, e também algumas ruins.
O que fiz agora não apaga o que fiz naquela época. Mas, meu
Deus, espero que quando eu chegar ao céu, eu possa olhar Cynthia
nos olhos e dizer a ela que salvei seu filho. Eu sabia o que Sawyer
estava pensando. Ele teria entregado Colt para mim e desamarrado
sua corda se eu não tivesse me cortado primeiro.

Este é o meu final, e eu não poderia ter escrito melhor.


41

O peito de Sawyer sobe e desce, um ritmo pelo qual sou


profundamente grata. Quando ele desapareceu da minha vista, a
água da enchente varrendo ele e Colt para longe, eu tinha certeza
de como tudo iria acontecer.

As inundações repentinas são poderosas, e muitas vezes


terminam em desgosto.

Hoje, há dois finais.

Meu coração está radiante. Também está quebrado.


Engraçado como um coração pode compartilhar emoções tão
opostas, mas igualmente abrangentes.

Desejo tocar o rosto de Sawyer, passar as pontas dos meus


dedos sobre sua bochecha. Eu quero que ele acorde e me beije.

Ele está deitado de lado. A enfermeira disse que suas costas


precisavam de pontos em vários lugares. Onde ele não está
enfaixado, está vermelho. Em breve ele estará machucado.

Seu cabelo cai sobre sua testa. Ele é tão bonito, tão corajoso e
altruísta. Meu coração, transbordando de amor por ele,
transborda, escorrendo através de mim.

Seus olhos se abrem lentamente, piscando e se ajustando. —


Jessie, — ele sussurra.
Estou fora da minha cadeira, inclinando-me para olhá-lo
naqueles olhos cinzentos deslumbrantes. Neles, vejo meu futuro.
Meu para sempre.

— Sawyer, — choramingo, meu medo e tristeza alcançando


aquele amor que tudo consome que eu sinto por ele.

— Seu avô, — ele começa, sua voz um gemido de dor. — Ele


esta…?

Meus olhos ardem. Balanço minha cabeça. — Ele faleceu,


Sawyer.

Sawyer fecha os olhos, e uma única lágrima escorre,


deslizando de lado antes de encharcar o travesseiro. — Ele se
sacrificou.

Eu aceno, o nó na minha garganta crescendo. — Ele morreu


onde nasceu. Nas terras do HCC. Ele amava aquele rancho mais
do que tudo, e é exatamente onde ele teria escolhido para que isso
acontecesse.

Sawyer abre os olhos. Ele parece tão triste. — Logo antes de


cortar a corda, ele disse 'Sinto muito'. O que ele quis dizer? Por
que ele estava arrependido?

— Tem certeza que você ouviu corretamente?

Ele acena com a cabeça, mordendo o interior do lábio inferior


enquanto pondera sobre isso.

Meus dedos deslizam sobre sua mandíbula, raspando a barba


por fazer. — Se você não me ligasse antes do fim da semana, eu ia
arranjar uma razão para ligar para você. Eu não podia deixar isso
acabar entre nós.
Ele pega minha mão e dá um beijo na parte interna do meu
pulso. — Vendi minha casa na Califórnia. Tudo que estava
guardado. Vai servir a outra pessoa agora. — Ele suspira, e o ar
aquecido corre contra a minha pele. — Nunca houve uma chance
de eu ficar longe de você. Percebi rapidamente que meu coração
não estava à altura da tarefa.

Suas palavras refletem exatamente o que está em meu


coração. Quantas noites eu dormi pensando nele? E então acordei
na manhã seguinte, os pensamentos continuando como se meu
cérebro tivesse pressionado pausa enquanto dormia. Aqui está ele
agora, na minha frente. Ensanguentado e machucado, mas ele
está aqui. Ele voltou para mim.

— Colt está bem? — ele pergunta. Ele não parece muito


preocupado embora. Ele o viu por todo o caminho até que foram
levados para compartimentos separados na sala de emergência.

— Perfeitamente saudável, graças a você.

Ele não responde ao meu reconhecimento. Acho que ele não


gosta. Em vez disso, Sawyer estuda minha mão. — Por que você
está usando um anel em seu dedo de casamento?

O canto da minha boca se transforma em um sorriso. — Eles


me disseram que eu não poderia ver você a menos que eu fosse da
família. Então eu peguei emprestado o anel de Dakota e disse a
eles que sou sua esposa.

— Gosto de quão persistente você pode ser quando algo fica


no seu caminho. — Ele vira minha mão, seu dedo fazendo cócegas
na palma da minha mão enquanto ele traça as linhas. — Isso é
algo que você acha que poderia ser algum dia?
— Persistente? — faço a pergunta errada de propósito. — Se a
situação exigir.

Ele olha para mim através de seus cílios escuros. — Minha


esposa?

Sua pergunta me emociona, mas também estou devastada.


Minha reação é diluída e não representa como isso realmente me
faz sentir por dentro.

Minha cabeça balança para cima e para baixo, um sorriso por


favor curvando meus lábios para cima. — Sim. Você é isso, Sawyer.
Não há mais ninguém para mim.

— Bom. — Sawyer sorri, mas também é triste. — Me beija.

Beijo-o suavemente, porque não sei como ele está se sentindo


e ele passou por muita coisa hoje. Ele agarra a parte de trás da
minha cabeça e me mantém perto. Ele não é gentil.

Ele me beija como um homem que temia por sua vida hoje. Se
ele se preocupa com seus ferimentos, ele não demonstra. Seus
dedos se curvam sobre meu osso do quadril e sua língua invade
minha boca.

Alguém limpa a garganta. Nós nos separamos. A cabeça de


Wes espia pela cortina azul clara do hospital. Ele puxa tudo para
trás. — Desculpe interromper, — ele abaixa a cabeça em
desculpas, — mas...

Dakota aparece ao lado de Wes, com o pé em uma bota de


caminhada. Ela pisou em um pequeno buraco enquanto explorava
com Colt e sofreu uma torção de nível dois no tornozelo. Ela
também evitou por pouco cair de bruços, e os arranhões nas
palmas das mãos e na perna direita mostram como ela se arrastou
desajeitadamente atrás de Colt.

Dakota caminha com ternura pelo pequeno espaço e se alinha


ao lado da cama de Sawyer. — Obrigada, — diz ela, gratidão
saturando sua voz. — Eu nunca serei capaz de agradecer o
suficiente pelo que você fez hoje.

Sawyer acena para longe de sua declaração. — Eu estava mais


perto dele. Qualquer pessoa decente teria feito o mesmo.

Da borda da pequena sala, Wes fala. — Isso não é verdade. Já


vi muita gente decente congelar em um momento de crise. Você foi
um herói hoje.

Sawyer pisca com força. — Sinto muito pelo vovô. Por sua
perda.

Wes morde o lábio inferior para estancar o transbordamento


de lágrimas que brilham em seus olhos. — Aquele bastardo
complicado.

Suas palavras nos fazem soltar uma gargalhada. — É claro


que ele faria o que fez. — Wes esfrega um olho. — Provavelmente
é por isso que ele insistiu em ser o único a ir lá. Ele sabia que
poderia chegar a isso, e ele não queria que mais ninguém tomasse
essa decisão.

— Wyatt e Warner estão vindo aqui? — pergunto a Wes, que


estava ligando para eles quando eu estava mostrando o anel de
Dakota para a enfermeira. Deslizo-o do meu dedo e entrego de volta
para ela, mas não cabe em seu dedo quando ela tenta.
— Malditos dedos inchados, — diz ela, apontando para sua
grande barriga. — Apenas use-o até voltarmos para a herdade.
Tenho medo de perdê-lo se estiver no meu bolso.

— Wyatt e Warner estão nos encontrando na herdade, — Wes


diz, respondendo minha pergunta. — Eu queria ser o único a
contar a eles sobre o vovô, mas eles já tinham ouvido falar na
cidade. Algo como uma inundação repentina no HCC e a passagem
de um Hayden contribui para uma boa conversa. Uma vez que foi
chamado à polícia, eu sabia que ia se espalhar instantaneamente.

O guincho metálico de ganchos sendo arrastados por uma


haste reverbera pela sala do tamanho de uma caixa de sapatos. A
enfermeira de Sawyer estreita os olhos para o número de pessoas
ao redor dele. Rapidamente deslizo o anel de volta no meu dedo.

— A menos que vocês sejam a esposa do Sr. Bennett, vocês


precisam sair. — Ela dá uma olhada em Wes e Dakota. — Por favor,
— ela acrescenta.

Wes faz uma careta. — Esposa? Quem é…

Dakota o empurra em direção à saída. — Vejo vocês na


herdade, Sr. e Sra. Bennett.

A enfermeira me dá um olhar de reprovação antes de voltar


sua atenção para Sawyer. — Você está pronto para sair daqui e ir
para casa com sua… — seus olhos piscam para mim, então de
volta para ele — … esposa?

Ela lhe dá as instruções de alta, explicando os cuidados com


a ferida e quando fazer o acompanhamento com o médico.
Na saída, com o braço de Sawyer em meu ombro e meu braço
em volta de sua cintura, paramos para espiar Colt. Wes e Dakota
ouvem atentamente a enfermeira de pé ao lado da cama de Colt,
para não os interrompermos. Colt vê Sawyer, e um sorriso se
espalha em seu rosto pequeno.

Sawyer acena para Colt, e saímos da sala de emergência.

Minha mãe e meu pai sentam na sala de espera. Tudo sobre o


meu pai está para baixo. Seus ombros caem, os cantos de seus
lábios apontam para o tapete marrom pouco atraente. Minha mãe
passa os dedos pelo cabelo na parte de trás de sua cabeça. Eles
nos veem ao mesmo tempo e ficam de pé.

Meu pai faz a coisa mais chocante que já o vi fazer. Ele abraça
Sawyer. E Sawyer retribui o abraço.

●●●

De alguma forma, acabei de encerrar a semana mais confusa


da minha vida.

Toda noite eu adormeço nos braços de Sawyer. Todas as


manhãs ele me acorda com um beijo no meu pescoço. E durante
todo o dia, meu coração dói quando penso em quem está faltando
no rancho.

Sawyer não soltou minha mão ontem no funeral. Não durante


o serviço, a saudação depois, ou a recepção na herdade. Sawyer
deu ao meu coração um lugar para ir, não importa a emoção.
Warner e Wyatt ficaram, é claro, devastados com a notícia do
falecimento de Vovô e não surpresos com a forma como isso
aconteceu. Warner falou no funeral, seu elogio eloquente
colocando lágrimas nos olhos de todos os presentes. Wyatt, que
não estava atrás de um microfone, chamou Vovô de 'filho da puta
escorregadio' enquanto as lágrimas escorriam por seu rosto. Jo o
consolou.

Sawyer e eu estamos tendo uma manhã preguiçosa de


domingo, daquelas com café cremoso e alongamentos lentos.
Estou sentada no sofá, lendo as notícias locais em um iPad
equilibrado no meu colo. Sawyer se levanta para reabastecer seu
café, mas quando ele se senta ele não tem uma xícara.

— Você está perdendo o que você fez, — aponto.

Ele pega minhas pernas e as puxa em suas coxas. Usando o


polegar, ele esfrega o peito do pé no meu pé direito. Eu sorrio para
ele sobre a borda do tablet.

— Você terminou de ler? — Esperança levanta as


sobrancelhas.

Deslizo o iPad para a mesa de centro, junto com minha caneca


meio cheia. — Eu posso ter.

Ele sorri maliciosamente. — Bom. — Ele rasteja pelo meu


corpo, envolvendo um braço em volta da minha cintura e me
deslocando para que eu fique embaixo dele. Ele abaixa a boca para
minha clavícula, beliscando ao longo de seu comprimento. Minhas
unhas correm por seus braços, cuidadosamente evitando suas
costas. Só mais um pouco de tempo e ele estará totalmente curado,
com apenas cicatrizes para contar a história do que ele fez pela
minha família.

Sua boca se move pelo meu pescoço, arrastando ao longo do


meu queixo, e então ele me beija.

Ficamos assim, beijando por tanto tempo que meus lábios


doem. Provavelmente terei irritação ao redor da minha boca por
causa de sua barba, mas vale a pena.

A mão de Sawyer percorre meu estômago, e finalmente leva


isso de PG12 para R13. Ele se acomoda entre minhas pernas e se
enterra dentro de mim. Eu sinto isso por todo o meu corpo, mas
principalmente no centro do meu peito.

Sem pensar, minhas unhas cravam em suas costas. Ele


endurece e eu arranco minhas mãos. — Oh meu Deus, eu sinto
muito.

Ele me deixa, então entra novamente, olhando para onde


estamos ligados. — Se este é o meu prêmio, terei prazer em aceitar
a dor.

Eu sorrio para ele, minha mão arrastando sobre seu peito. Eu


desenho um coração sobre seu coração real. Sawyer segura minha
mão e a levanta, beijando meus dedos.

Quando acaba, ele se deita em cima de mim. Eu amo o peso


dele. Eu amo-o.

12 Alguns materiais podem não ser adequados para crianças. Os pais são instados a
dar "orientação parental". Pode conter alguns materiais que os pais podem não gostar para
seus filhos pequenos.
13 A classificação para menores de 17 anos requer acompanhamento dos pais ou
responsável adulto. Contém algum material adulto. Os pais são convidados a aprender mais
sobre o filme antes de levar seus filhos pequenos com eles.
Permanecemos assim enquanto podemos, e então somos
forçados a nos levantar. — É melhor tomarmos banho antes de
irmos para a herdade. — O brunch de domingo na herdade parece
ainda mais especial hoje. A morte de Vovô nos lembrou de como a
vida é preciosa. Com que rapidez isso pode ser tirado de você.

Entramos no chuveiro. Sawyer lava meu cabelo, dedos


massageando meu couro cabeludo.

Eu me inclino em suas mãos. — Você deveria desistir desse


seu trabalho chique e começar um negócio de massagem no couro
cabeludo.

Ele me vira, guiando minha cabeça de volta para o spray. — O


que você diria se eu lhe dissesse que estava pensando em deixar
meu emprego?

— Por que? Seu pai disse que está bem com você trabalhando
remotamente. — O único pedido do pai de Sawyer era que ele
aparecesse pessoalmente no escritório uma vez por mês.

Ele adiciona condicionador ao meu cabelo. — Estive pensando


em deixar a Tower Properties e formar meu próprio show individual
aqui. Esta cidade está crescendo, e eu gostaria de dar toda a minha
atenção a ela.

Eu fico na ponta dos pés para beijá-lo. — Você tem meu apoio.

Terminamos de tomar banho, conseguindo de alguma forma


manter a tarefa, e nos preparamos para o brunch com minha
família.

Estou saindo pela porta da frente quando Sawyer me


interrompe com uma pergunta.
— Quantos anos você quer ter quando se casar?

Eu o encaro. — Por que?

Ele dá de ombros. — Apenas fazendo planos.

A felicidade borbulha no meu estômago, mas um pensamento


a acalma um pouco. — Vinte e um parece um pouco jovem.

— Talvez. — Ele desliza as mãos nos bolsos. — Então,


novamente, você sempre fez o que queria sem muita preocupação
com as convenções.

Ele tem razão. Eu sorrio para ele. — Faça-me sua pergunta


novamente.

— Quantos anos você quer ter quando se casar?

Meus braços deslizam ao redor de seu pescoço. —


Independentemente da idade que tenho quando me propuserem.

Sawyer sorri. Ele pega minha mão e eu o sigo escada abaixo.

Os últimos meses foram cheios de perdas.

Mas também ganhos surpreendentes.

E o mais profundo de todos é o homem segurando minha mão,


abrindo caminho diretamente para o meu futuro.
EPÍLOGO
UM ANO DEPOIS

— Pare, pare, — diz Tenley, empurrando Dakota para fora do


caminho. Ela escolhe um batom diferente dos vários tubos na
mesa lateral. — Essa cor é muito quente para ela. — Ela destampa
o batom e o aplica nos meus lábios. — Pronto, — ela diz
orgulhosamente, me virando para o espelho de três dobras do chão
ao teto.

— É perfeito, — eu declaro, estalando meus lábios. Jo ri de


mim. Como eu, Jo acha que muito disso é desnecessário.
Enquanto eu estiver no final do corredor com Sawyer, todo o resto
são apenas detalhes.

Tenley e Dakota discordam. Elas querem as nove jardas


inteiras, e eu não me importo. Até elas, eu nunca tive irmãs. Se
elas querem me vestir como uma boneca, bem... façam isso.

— Ele vai perder a cabeça, — diz Dakota, olhando para mim


com a cabeça inclinada. Ela sorri calorosamente para mim.

Eu mexo minhas sobrancelhas e bebo meu champanhe. —


Esse é o ponto, certo? Noite de lua de mel, aqui vamos nós!

— Oh, por favor. — Tenley bate no meu braço. — Vocês moram


juntos. Não aja como se aquele homem não estivesse gostando da
vaca quando quer. — Ela se vira para Dakota. — É assim que vai?

Dakota revira os olhos e ri. — Ele não vai comprar a vaca se


conseguir o leite de graça.
— Merda. — Tenley sacode um punho. — Eu tentei.

Jo geme e Dakota se dobra de rir.

Olho para minha mãe, tão quieta em seu assento. Ela está
bebendo champanhe e me vendo experimentar vestidos de noiva.
Não é típico dela ficar calada. Recolho a barra do sétimo vestido
que experimentei, um grande vestido de princesa que detesto, e
vou até ela.

— Mãe? Tudo bem por aqui?

Seu sorriso de resposta é grosso. — Oh, estou bem. Apenas


observando minha filha e tentando não chorar.

— Eu acho que todos os dias, este seria um dia aceitável para


chorar.

— Sim, — ela diz suavemente. — É impressionante ver vocês


quatro juntas. Quatro mulheres Hayden.

— Em breve será Hayden-Bennett, — lembro-a.

Ela toca minha perna. Não consigo senti-lo através das


camadas de tule, seda e miçangas, mas o gesto me aquece. —
Certo, claro.

Na maior parte, ela ama Sawyer. Mas de vez em quando, sinto


uma pontada dela, uma pequena dor.

Sawyer não tem problema com minha recusa em deixar meu


sobrenome. Estou feliz por ser uma Bennett, mas Hayden é meu
direito de nascença. O sobrenome, e tudo o que ele engloba, é
tecido no meu ser.
Eu brinquei com Sawyer que ele poderia usar meu sobrenome.
— Nós seríamos muito modernos, — disse. A resposta dele? — Um
Bennett pertence aqui.

Eu não posso discutir com isso. Não estou interessada em


apagar a mãe dele. Ela merece ser lembrada tanto quanto qualquer
outra pessoa. Ela ainda está representada na cidade novamente,
com um bolinho de limão na The Bakery. Poucos sabem porque foi
recentemente adicionado ao menu, mas aqueles de nós que sabem,
sorriem com o segredo.

Não vou fingir que todos os dias são arco-íris e borboletas. Não
tem. Meu pai e Sawyer tiveram uma longa conversa logo após o dia
em que Sawyer voltou ao HCC e salvou Colt. Meu pai se desculpou
por seu papel em ferir a família de Sawyer. Sawyer aceitou o pedido
de desculpas, mas ainda está tentando perdoar meu pai. E sua
própria mãe. É muito para ele tomar, e ele não está sozinho nesse
sentimento.

O pai de Sawyer e sua madrasta chegarão alguns dias antes


da cerimônia. Nossos pais nos garantiram que seu sangue ruim
secou há muito tempo, mas não espero que seja fácil. Contanto
que eles apoiem nosso casamento, nada mais importa.

Há momentos em que Sawyer e eu nos sentimos magoados e


tristes, ou às vezes indignados, pelas escolhas feitas por nossos
pais. Quando esses momentos chegam, nos forçamos a lembrar
quem foi que cometeu o crime.

Não nós.

Estamos separados deles e voltamos à promessa de nosso


amor toda vez que pensamos no que eles fizeram. Agradeço a Deus
todos os dias por não haver nada para Sawyer encontrar em sua
busca pelo que aconteceu com sua mãe. Às vezes, coisas ruins são
simplesmente coisas ruins.

O atendente da loja traz outra garrafa de champanhe. É o


nosso segundo, provavelmente graças a Tenley. Quando
aparecemos para nosso compromisso, a mulher deu uma olhada
em Tenley e nos conduziu de volta à sua sala privada. Vantagens
de ter uma cunhada famosa.

Dakota serve as taças. Jo recusa, e Dakota lhe dá um olhar


duro. — Você não bebeu quase nada do primeiro copo que eu servi.
— Seus lábios franzem e seus olhos se arregalam. — Você tem
notícias?

— Wyatt e eu estamos esperando. — Ela sorri, mas seus lábios


tremem. — Eu só, hum, eu não quero ficar muito animada ainda.
É cedo. Estou de oito semanas. E antes, vocês sabem...

— Ei, — digo, correndo para o lado dela. — Estamos


emocionados por você. — Meu coração se contorce com o medo em
seus olhos. Jo sofreu dois abortos espontâneos no ano passado.

Minha mãe se levanta e se aproxima. De todos nós, ela entende


o que Jo está sentindo mais do que ninguém. Ela segura os ombros
de Jo e a olha nos olhos. — Tudo vai ficar bem. — Então ela envolve
Jo em um abraço.

Eu jogo meus braços em torno de ambas. Eu não posso evitar.


Tenley e Dakota se juntam, e agora é um grande abraço de
mulheres -Hayden.
Nós nos afastamos, e a vendedora sorri para nós timidamente.
— Espero que você não se importe, mas eu peguei um telefone… -
ela aponta para o telefone de Dakota - … e tirei uma foto. Isso foi
muito doce.

Dakota agradece e manda a foto para todos nós.

Trinta minutos depois, eu encontro o único. O vestido perfeito.

Almoçamos e voltamos para Sierra Grande.

Mais tarde naquela noite, deitada na cama com Sawyer ao meu


lado, digo a ele que escolhi um vestido.

Ele beija minha testa. — Não me diga nada sobre isso. Eu


quero ser surpreendido.

— Pronto para outra surpresa? Jo está grávida.

Ele sorri. — Eu sei. Wyatt me disse hoje.

Enquanto todas as senhoras foram comprar vestidos de noiva


em Phoenix, os homens foram à casa de Warner e pescaram à beira
do rio, seguido de um churrasco e jogos no gramado. Ouvi dizer
que meu pai comprou uma nova garrafa de Macallan 25 para a
ocasião, e Wyatt finalmente conseguiu aquele copo que estava
esperando.

Meus irmãos passaram a amar Sawyer. Eles fizeram a coisa


do irmão mais velho dando-lhe um discurso sobre o que fariam se
ele quebrasse meu coração, blá, blá bla, mas foi superficial. Sawyer
já havia se fechado nas dobras da família.

No dia do meu casamento, Wes, Warner e Wyatt vem ao quarto


onde estou me arrumando. Wyatt me abraça com força, não tímido
quando me diz que sempre serei sua irmãzinha. Warner beija
minha testa e me diz que sou uma linda noiva. Wes, geralmente
desconfortável com demonstrações de emoção, diz rispidamente:
— Eu te amo, Cal. Isso é tudo o que tenho a dizer. Eu não sou bom
em frases extravagantes como esses tolos. — Eu jogo meus braços
em volta do meu irmão mais velho. Suas palavras simples são tudo
que eu preciso.

E assim, em um dia frio de outono, com o sol alto no céu e o


choupo deixando um amarelo-ouro brilhante, um Hayden casou-
se com um Bennett.

— Esposa, — Sawyer sussurra, transformando a palavra em


uma reverência. Seu olhar contém calor e amor, e é apenas uma
fração do que ele sente por mim.

— Marido, — respondo, dizendo a palavra pela primeira vez


como uma mulher casada.

O pastor diz a Sawyer que ele pode me beijar. Sawyer passa


um braço em volta das minhas costas, uma mão enrolando no meu
cabelo. Meu rosto se inclina, nossos lábios se encontram, e é o
beijo mais doce da minha vida.

Nossa família e amigos torcem. Sawyer se afasta, sorrindo para


mim. — Você está pronta para fazer isso?

Estou radiante com tanta força que chega a ser doloroso. —


Nunca estive tão pronta.

Sawyer pega minha mão, me guiando pelo corredor e para o


nosso futuro.

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