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UNIVERSIDADE FEDERAL DO TRIÂNGULO MINEIRO

Instituto de Educação, Letras, Artes, Ciências Humanas e Sociais - IELACHS


Departamento de Linguística e Língua Portuguesa – DLLP
Cursos de Letras

Amabile Raylene dos Santos


Débora de Almeida Silva
Lívia Pimentel Ribeiro

ANÁLISE DO DISCURSO NAS AULAS DE LÍNGUA PORTUGUESA: CAMPANHAS


PUBLICITÁRIAS E O DISCURSO PERSUASIVO

Uberaba
2023
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Amabile Raylene dos Santos


Débora de Almeida Silva
Lívia Pimentel Ribeiro

ANÁLISE DO DISCURSO NAS AULAS DE LÍNGUA PORTUGUESA: CAMPANHAS


PUBLICITÁRIAS E O DISCURSO PERSUASIVO

Trabalho apresentado à disciplina Análise do


Discurso, do Curso de Letras da Universidade
Federal do Triângulo Mineiro, como requisito
parcial de aprovação.

Professora: Dra. Janaína Zaidan Bicalho Fonseca

Uberaba
2023
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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO 4
2 APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DO CORPUS 5
3 O CONJUNTO DE CORPUS NA AULA DE PORTUGUÊS 10
4 CONSIDERAÇÕES FINAIS 13
REFERÊNCIAS 14
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1 INTRODUÇÃO

Em consonância com Orlandi (2005), a Análise do Discurso (AD) é uma abordagem teórico-
metodológica que objetiva assimilar como os sentidos são constituídos e permeados na
linguagem, levando em consideração o contexto social, histórico e político em que tais
discursos são elaborados. Assim, considerando os pressupostos da Análise do Discurso, o
presente trabalho busca analisar um corpus, mobilizando os conceitos de discurso, formação
discursiva, interdiscurso/dialogismo, ethos, ideologia, entre outros, na medida em que
incidirem na coletânea referenciada.
De acordo com a autora supracitada, o discurso se configura em uma prática social, isto é, um
fenômeno não isolado ou restrito à individualidade, mas intencionalmente e diretamente
atrelado às relações e condições sociais; tais discursos são construídos e de certa forma,
interpretados, em conjunturas intrínsecas e refletem as ideologias e predileções dos sujeitos
compreendidos no ato da comunicação; há um enfoque na relação inerente entre linguagem e
ideologia, e para Orlandi, a linguagem não é neutra e reflete as posições ideológicas que
delineiam a maneira com que os sentidos serão trabalhados em um determinado texto.
Outro conceito introduzido por Orlandi, são as “formações discursivas”, que compreendem
um conjunto de discursos que compartilham a mesma base de sentidos e estão ligados a certas
práticas sociais e institucionais; tais formações discursivas responsabilizam-se por estremar os
sentidos cabíveis em um contexto. Ainda nesse escopo, a polifonia também é uma noção
imprescindível na AD de Orlandi, e refere-se à existência de inúmeras vozes e discursos nos
textos; assim, os discursos são atravessados por outras vozes, opiniões, posições ideológicas e
formações discursivas, o que torna a construção de sentido complexa e heterogênea. No que
diz respeito ao sujeito do discurso, conceito também mobilizado na supracitada AD de
Orlandi, este caracteriza-se como o lugar de fala, ou lugar de enunciação, ou seja, o sujeito
constitui-se a partir da linguagem, ocupando posições vinculadas ao social e institucional;
nesse sentido, este sujeito é atravessado pelas formações discursivas e pela ideologia.
Posto isso, a AD segundo Eni Orlandi, é uma abordagem que procura salientar as relações
entre linguagem e ideologia, propiciando uma cognição crítica acerca dos discursos e práticas
discursivas na sociedade; assim, visamos nesse trabalho revisitar tais conceitos e aplicá-los
em campanhas publicitárias e, através dessas ferramentas, analisar as estruturas discursivas e
as condições que permeiam a produção de sentido em diferentes contextos comunicativos.
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2 APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DO CORPUS

Publicidade 1

Campanha Publicitária Bom Bril, 2006


Disponível em: https://pt.linkedin.com/pulse/propaganda-e-o-mundo-das-ideias-israel-souza

A figura acima pertence a campanha publicitária de 2006 da empresa brasileira “Bom Bril”,
fabricante de produtos de higiene e limpeza doméstica; no anúncio, se estabelece uma relação
com o enunciado que se procura construir e o produto que pretende vender, nesse caso, a
palha de aço. Assim, a publicidade faz uso da imagem de Charles Chaplin, uma figura célebre
do mundo artístico e reconhecido por suas imitações para asseverar a ideia de que o produto é
insubstituível e inimitável, assim como seus benefícios e utilidade.

Nesse sentido, assim como evidenciado por Orlandi e partindo dos pressupostos da Análise do
Discurso, as relações entre as referências histórica e artística e o que o anúncio procura
construir, compreendem o interdiscurso, isto é, a maneira com que dialogam entre si e traçam
conexões um com o outro para se constituírem; há a mobilização interdiscursiva a partir dos
sentidos provocados entre eles. Além de materializar uma intertextualidade, já que o texto da
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publicidade remete à uma grande figura do mundo artístico, podemos observar a mobilização
interdiscursiva a partir das posturas de sentido entre um e outro.

Posto isso, no enunciado “Imitamos o mais imitado para lembrar que só Bom Bril é
inimitável”, é preciso resgatar as ideologias contidas, sendo estas a promoção da venda e
constatação da efetividade, utilidade e superioridade do produto; a intenção ao utilizar a figura
icônica de Chaplin é justamente comprovar a excelência e qualidade daquilo que é oferecido
ao consumidor.

Destarte, para que a interação entre os textos seja efetivada, é necessário acionar a memória e
relembrar quem foi Charles Chaplin, bem como seu trabalho e contribuição artística (ator,
comediante, diretor, compositor, roteirista, cineasta, editor e músico), notabilizado pelo seu
excelente e memorável trabalho. Além disso, os vários trabalhos e papéis desempenhados por
Chaplin também remetem à representação atribuída ao Bom Bril, de ser um produto útil para
diversas atividades domésticas. Dessa maneira, a memória e o esquecimento são outros
conceitos que necessitam ser colocados em movimento para construir o sentido do texto
número 2 (figura de Charles Chaplin) e como este se valida na intenção da publicidade.

Por tudo isso, entende-se que a formulação do discurso presente nos textos, se baseia no
contexto de constituição, a qual se assenta, justamente, nas relações interdiscursivas de
processamento da memória. Podemos dizer, então, que o texto número 2, a partir da figura
icônica de Chaplin, mobiliza discursos de excelência, exclusividade, utilidade e qualidade –
construídos para o propósito de consolidação da venda – acionando as formações discursivas
para esse propósito; no texto 1, não é diferente. O objetivo do discurso se concentra na venda,
assim, o texto 2 é utilizado para validar o texto 1, à medida em que se compõem para
construir o enunciado que se deseja.
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Publicidade 2

Campanha Publicitária Bom Bril, 2010


Disponível em: https://medium.com/@observadm/analise-do-discurso-an%C3%BAncio-publicit%C3%A1rio-do-bom-
bril-3bea9db7acd0

A publicidade acima, pertencente à marca brasileira “Bom Bril”, de produtos de limpeza e


higiene, circulou na mídia em 2010, em meio ao contexto de eleição do segundo turno entre a
candidata à presidência Dilma Rousseff e José Serra. A partir dos discursos apresentados no
texto 1 (publicidade): “Nem situação, nem oposição. Para um Brasil limpo, Bom Bril é a
solução” e “Bom Bril. Preferido por 1001% dos brasileiros” estabelece-se uma clara relação
com as figuras políticas utilizadas no texto 2, bem como o sentido que se procura construir
entre os dois textos. Essa relação, processa o que Orlandi, na Análise do Discurso, classifica
como interdiscurso, ou seja, o cruzamento de discursos entre os textos, nesse caso, se valendo
das formações discursivas política e publicitária.
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A publicidade também materializa essa intertextualidade, visto que elenca o produto, a palha
de aço, como um terceiro concorrente à presidência, e este seria o único capaz de limpar o
Brasil, em detrimento dos demais candidatos; para ter essa compreensão, é necessário acessar
a memória de um discurso político de combate à corrupção no país, a qual remete à sujeira.
Dessa forma, podemos observar a mobilização interdiscursiva a partir da composição dos
sentidos existentes entre um e outro. Assim, é necessário acionar no texto 2, as ideologias
presentes, que nesse caso seria a disputa entre os dois candidatos à presidência e no texto 1,
que tensiona vender um produto e elencá-lo como a solução para a “sujeira” do Brasil,
constatando de fato sua eficiência enquanto produto de limpeza.

Nesse sentido, a memória é tratada como interdiscurso, no sentido de que é o saber discursivo
que torna possível todo o dizer e que retorna sob a forma do pré-construído, o já-dito que está
na base do dizível. Assim, o enunciado utilizado na publicidade da marca permeia outro
enunciado já dito anteriormente, no caso, a disputa presidencial. Para que a publicidade possa
fazer sentido ao consumidor, é necessário que se rememore o cenário político no contexto
social em que estão inseridos e que ocorra o apagamento através do esquecimento ideológico,
ou seja, a maneira pela qual somos afetados pela ideologia, sendo ela neste contexto, política.

Mobilizando todos esses conceitos, podemos dizer que por meio das relações de força, o lugar
de fala define o sujeito; assim, compreende-se que sua relação é sempre tensa, visto que há a
constante contradição e, de certa forma, quebra a expectativa entre o discurso político e o
ressignifica. Ou seja, para que os novos dizeres façam sentido dentro da campanha
publicitária, é necessário que haja o apagamento do significado anterior e atribuição de um
novo significado ao novo contexto; daí as relações tensas e inacabadas entre os sujeitos.
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Publicidade 3

Campanha Publicitária Bom Bril, 1998


Disponível em: https://www1.folha.uol.com.br/fsp/ilustrad/fq14029819.htm

A propaganda em questão foi retirada do comercial de 1998, da marca brasileira "Bom Bril",
conhecida por seus produtos de higiene e limpeza, e traz em si a finalidade de divulgação e pr
omoção do detergente "Limpol". A propaganda apresenta o ator Carlos Moreno, reconhecido
como o garoto-propaganda da Bom Bril, caracterizado como Che Guevara, uma figura históri
ca icônica. No cerne dessa representação, reside uma paródia, na qual uma das citações famos
as do comandante: "Hay que endurecer pero sin perder la ternura", é adaptada ao contexto pub
licitário: "Hay que endurecer con la gordura sin perder la ternura con las manos jamás!". Essa
adaptação confere à propaganda um caráter cômico que permeia toda a mensagem transmitida.

Ao relacionarmos a campanha publicitária com os elementos da Análise do Discurso, compre


endemos uma relação direta, tal como a mobilização da intertextualidade apresentada na carac
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terização do ator e do enunciado que este trás consigo. Além da conexão de interdiscursos que
são apresentados, tal como Orlandi foca na Análise do Discurso em relação à linguagem, pode
r e as ideologias que estão presentes nos enunciados.

Para que haja a compreensão do interdiscurso, o espectador deverá mobilizar a memória e o e


squecimento, sendo este caracterizado pelos dizeres, tal como o já dito e o que está sendo dit
o. Neste contexto, para a compreensão da publicidade, devemos relacionar a figura histórica d
e Che Guevara e seus feitos, além do enunciado em questão e aplicá-las na propaganda, sendo
caracterizado o esquecimento para a ressignificação da mesma, uma vez que o sentido do enu
nciado torna-se completamente diferente. Vale ressaltar ainda, que ao fazer uso da memória c
ompartilhada e coletiva que o público possui em relação à figura célebre de Che Guevara, a pr
opaganda cria uma reviravolta e possível estranhamento, pois ela opta por empregar um efeito
de sentido cômico, tal como a sátira para comercialização, além de estar aplicada em uma figu
ra histórica.

Outro elemento característico presente no interdiscurso é a constituição de sujeito e sua ideol


ogia. O primeiro traz a materialidade linguística, isto é, o sujeito se expressa por meio da ling
uagem, sendo moldado por suas circunstâncias, contextos, construções sociais que influencia
m a maneira como a linguagem é empregada para transmitir significados e ideias, tal como a i
deologia presente na comunicação. No contexto da propaganda o sujeito é representado pela c
aracterização do ator na figura histórica em associação com o detergente ‘Limpol’ em constru
ção ao significado em que o sujeito se dá ao conseguir lidar com a “gordura” isto é a sujeira, s
em perder a “ternura”, esta reforça a eficácia do produto ao mesmo tempo que questiona a ret
órica revolucionaria do comunista, sendo criado uma ideologia dualista, isto é, confirmando o
que Orlandi salienta, sendo a relação do sujeito sempre tensa.

3 O CONJUNTO DE CORPUS NO ENSINO DE PORTUGUÊS

O corpus deste trabalho, sendo composto por anúncios de campanhas publicitárias de uma
marca brasileira extremamente popular, Bom Bril, tem um alcance elevado a públicos de
todas as idades, inclusive estudantes que correspondem à faixa etária da escola regular. Isso
contribui para a compreensão dos alunos em relação às atividades propostas de análise dos
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textos em questão. Assim, os conceitos abordados pela AD podem ser trabalhados mais
facilmente com os estudantes.
Embora esses conceitos não possam ser estudados com a profundidade proporcionada pelo
estudo direto da AD, como é feito durante o curso de Letras, é plenamente possível
desempenhar análises discursivas fundamentais para a formação de alunos da educação
básica. O docente responsável por turmas de Ensino Médio ou até mesmo Ensino
Fundamental 2, pode mobilizar elementos como memória, tipos de discurso, intertextualidade
e interdiscursividade, ideologia, posturas de sentido, etc; adaptando esses conteúdos ao
contexto de sala de aula, de modo a captar o interesse e agregar na formação dos alunos.
O ano escolar selecionado para a proposta das atividades a seguir, corresponde ao 8°ano do
Ensino Fundamental, sendo pautada na habilidade a seguir, prevista pela (BNCC, 2018):
“(EF89LP05) Analisar o efeito de sentido produzido pelo uso, em textos, de recurso a formas
de apropriação textual (paráfrases, citações, discurso direto, indireto ou indireto livre).”, além
de conceitos abordados anteriormente na análise do corpus neste trabalho.

Atividades:
A partir da leitura dos três textos publicitários em questão e de seus conhecimentos acerca de
análise discursiva, responda:
1-Você conhece a marca “Bom Bril”? Se sim, quais as memórias você possui relacionadas à
empresa e seus produtos?
2-Na sua opinião, é necessário conhecer a marca para compreender devidamente os anúncios?
Justifique.
3- Em cada um dos anúncios analisados, há a representação de personalidades notáveis. Você
as conhece? Quem são?
4-De que forma o conhecimento acerca dessas personalidades e suas respectivas atuações na
sociedade e na história podem contribuir para a compreensão dos textos?
5-Quais as formações discursivas estão presentes em cada um dos anúncios?
6-Cada um dos textos analisados, apresenta interdiscursividade, ou seja, estabelece relações
entre discursos dentro deles. Observando suas respostas às perguntas acima, com base em sua
compreensão textual, identifique os interdiscursos presentes em cada um dos anúncios e
explique como se dá a interdiscursividade em cada um deles.
Publicidade1:________________________________________________________________
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Publicidade2:________________________________________________________________
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Publicidade3:________________________________________________________________
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Neste ponto do trabalho, você deverá apresentar como o conjunto de corpus selecionado por você
poderia fazer parte das aulas de português na educação básica, considerando o domínio teórico da
Análise do discurso.
Para isso, além de argumentar sobre, demonstre, por meio de atividades e/ou tarefas como o
professor poderia se valer do corpus nas suas aulas.
Trata-se, portanto, de três passos:
1. Argumentação sobre a validade do corpus como instrumento de ensino e
aprendizagem e da Análise do discurso como abordagem possível em sala de aula;
2. Elaboração de atividades e/ou tarefas que considerem o corpus selecionado. Seja claro
sobre o ano escolar (ou anos escolares) para o qual as atividades são adequadas;
3. Para cada atividade e/ou tarefa, você deve apresentar possibilidades de respostas, além
de orientações básicas para o professor em sala de aula.

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS
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Neste escopo, ressalta-se a importância do trabalho com a Análise do Discurso nas aulas de
Língua Portuguesa, visto que essa propõe o exame do uso da linguagem, isto é, a compreensão
daquilo que permeia o que está sendo dito; através dessa abordagem, os alunos são incentivados a
questionar e entender melhor como a linguagem é um meio importante para influenciar opiniões,
moldar narrativas e exercer um certo poder sobre o que se busca expressar, permitindo que estes
analisem informações e tracem paralelos de maneira mais sofisticada.
Apesar de não se conseguir trabalhar tais conceitos da AD de forma mais aprofundada durante os
anos escolares, é possível colocar em xeque algumas questões importantes durante as aulas,
mobilizando conceitos como memória, tipos de discurso, intertextualidade e interdiscursividade,
ideologia, posturas de sentido, formatando tais conteúdos de acordo com o contexto da turma, a
fim de gerar interesse e contribuir na formação dos estudantes. Outro ponto importante, é ressaltar
aos alunos que a neutralidade não existe; sendo assim, através da AD, é possível depreender que
quando se fala de ideologia, por exemplo, esta traz consigo um sujeito que é um ser social, político
e também cultural.
A língua, na perspectiva da AD é considerada opaca e heterogênea, não sendo transparente e
homogênea como muitas vezes apresentada em sala de aula, com atividades e questionamentos
superficiais; a função do docente, nesse sentido, consiste em apresentar aos alunos as assimetrias
presentes nos discursos, tomando por base a ideia de que estes são ferramentas fundamentais na
prática política.
Trazendo para a sala de aula tais reflexões, o docente incita nos alunos a perceberem diferentes
interpretações de um mesmo texto, visto que não há um sentido único, além de tais ferramentas
serem importantes nesse momento de desenvolvimento, levando em consideração a formação do
indivíduo enquanto ser social, inseridos em um contexto onde língua é poder.

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REFERÊNCIAS

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