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Anais do 6º Encontro Celsul - Círculo de Estudos Lingüísticos do Sul

ANÁLISE DE DISCURSO E A IDEOLOGIA DO PROFISSIONALISMO: UM


CONFRONTO DE FALAS NO DISCURSOS DOS PROFISSIONAIS PROFESSORES

Lígia Wilhelms ERAS. Universidade Estadual do Oeste do Paraná (UNIOESTE). PG


Wander Amaral CAMARGO. Universidade Estadual do Oeste do Paraná (UNIOESTE). OR

ABSTRACT: In the confrontation of speeches, the representation of the profession is disclosed in says of the
professionals onslaught to them of fight for the professional recognition and that is established the strategy of the
mark and distinction as forms of dispute and maintenance of a place in the establishment of the fields and the
professional nominations.

KEYWORDS: Analysis of speeches, Professional Identity, Professors.

1. INTRODUÇÃO

Falar é um ato social dos mais corriqueiros, simples e quase mecânicos mas, ao mesmo tempo, revela-se
uma atividade em que o sujeito esmera-se no seu desempenho, no uso de metáforas, polifonias, simulacros,
imaginação, hibridação, imagem, alternações, argumentações. O ator seleciona as palavras utilizadas, o modo e a
entonação da voz da mensagem e mais, saberá o momento certo de inserir o seu texto em modo de interação. Há
sempre uma nova construção baseada no contexto em que esse discurso fincará seus alicerces para poder atuar. O
sujeito para interagir precisa de um conhecimento prévio, algo dado, para, enfim, poder referir-se em forma de
diálogo. O mesmo ocorre com o discurso. Ele é contextualizável.
Uma primeira condição a ser considerada em análise de discurso é a determinação de onde os sujeitos estão
instalados para elaborar determinados textos. Em nosso caso, falar da profissão e o seu lugar no espaço social. Mas a
profissão enquanto campo de constituição de afirmação e preservação de lugar, constrói sua fala pautada num lugar
que é reconhecido, que dá legitimidade a determinada construção de fala. Constitui um discurso profissional
institucionalizado. Em uma aproximação com o objeto de estudos da dissertação, o professor de ensino médio e
público, do Estado do Paraná, é o profissional que fala situado dentro da esfera institucional de uma das mais antigas
instituições, ou seja, a escola. O espaço profissional da Educação lança-se como um discurso ideológico em que a
escola tenta legitimar-se, embora a profissão viva um dilema de dupla implicação. Recebe outras falas na sua
construção identitária. Primeiro, pela via da ideologia do profissionalismo que insiste em convencer o trabalhador de
que ele é o “único” responsável por sua atuação e pelo alcance de sucesso profissional; segundo, o discurso
institucional, que provém do Estado, ou seja, na autoridade legal como a normatizadora do campo trabalhista do
professor no ensino público. Poderíamos perceber o discurso do professor ladeado por múltiplos conflitos de
formação discursiva.
A linguagem é a primeira instituição em que é possível identificar uma disputa por poder e um instrumento
para impor ou expor uma disposição de idéias. Assim, a Linguagem contextualiza -se por estar situada em uma
determinado ambiente e controle. A apresentação deste trabalho, tem o recorte de análise ponderando sobre o aspecto
da representação da profissão de professor pela via das falas destes mesmos profissionais.

2. TRABALHO, LINGUAGEM E PODER: A IDEOLOGIA DO PROFISSIONALISMO E O DISCURSO DO


TRABALHO ATUAL

Para o entendimento do fenômeno do trabalho e a profissão como uma esfera de marcação do indivíduo
dentro do campo do trabalho, iremos estabelecer uma reflexão teórica a partir da relação em que a Linguagem e o
Poder em uma perspectiva da constituição do profissionalismo e dos recursos estratégicos como alocações de
poderes. Como estarão presentes a relação do Poder e Linguagem nas posições e lugares das vozes. Uma das grandes
definições básicas está no fato de que a Linguagem é a primeira instituição social humana, por meio do qual a
sociedade é interiorizada e exteriorizada através da palavra ao indivíduo:
a linguagem é flexivelmente expansiva, de modo que me permite objetivar um grande
número de experiências que encontro em meu caminho no curso da vida. A linguagem
também tipifica as experiências, permitindo-me agrupá-las em amplas categorias, em
termos das quais tem sentido não somente para mim mas também para meus
semelhantes (BERGER: 1985, p. 59).

Aquele que consegue, por meio da linguagem, expressar e persuadir o outro, certamente terá o poder de
melhor manipular uma expressão simbólica, e valer-se de campos de ordenação do significado. Ao selecionar,
tenderá a promover determinado interesse de mensagem. Todo esse cuidado no momento de expressar-se, não é uma
simples produção e reprodução de mensagens, mas, é produção e reprodução de posições e significações. De onde
posso jogar o jogo da vida e como me reconhecerão nesse mesmo jogo. A palavra, segundo Bakthin, é assim um
signo ideológico por excelência:

o signo não existe apenas como parte da realidade, reflete e refrata as realidades. Pode
até distorcer a realidade mesma. Todo o signo está sujeito a uma reflexão e avaliação
ideológica. O domínio da ideologia é o domínio dos signos. (BAKTHIN: 1999, p. 09)

A lógica do poder está na forma como o ator social consegue legitimar-se e sobrepor-se a uma realidade no
poder de alocar recursos. A linguagem atua na esfera das representações simbólicas, e consegue definir, identificar e
desqualificar a partir de critérios de inclusão e exclusão. Marx definiria o Poder de forma mais radical. É aquele que
ocorre por meio da dominação, num discurso violento, a medida que se faz uma transação de sentidos e de modos de
existência. Prega a igualdade, mas promove a desigualdade. Para isso, a ideologia se descola da realidade. Há um
ocultamento da realidade em favor de uma classe social:

os pensamentos da classe dominante são também, em todas as épocas, os pensamentos


dominantes, ou seja, a classe que tem o poder material dominante numa dada sociedade
é também a potência dominante ‘espiritual’. A classe que dispõe igualmente dos meios
de produção intelectual, de tal modo que o pensamento daqueles a quem são recusados
os meios de produção intelectual está submetido igualmente a uma classe dominante. Os
pensamentos dominantes são apenas a expressão ideal das relações materiais dominantes
concebidas sob a forma de idéias, e portanto, a expressão das relações que fazem de uma
classe dominante; dizendo de outro modo são as idéias de seu domínio
(MARX/ENGELS: 1986, p. 55)

O domínio da linguagem, garante o poder de atuação de troca, barganha, convencimento através de outro
domínio de uso: o mundo das ideologias. “o trabalho da ideologia é produzir evidências colocando o homem na
relação imaginária com suas condições materiais de existência”. (ORLANDI: 2002). Note-se, o indivíduo seleciona,
usa e rodeia -se de estratégicas, porém, há um grande dilema. Somente consegue isso, porque pode atuar apenas em
um contexto determinado. Consequentemente, deve adequar-se a esse modo de determinação da vida.
O próprio campo profissional, no qual está inserido nosso objeto de estudo - o professor - constitui-se em
um campo de excelência em que existe uma determinação e uma forma de discriminação que se dá pela pertença ou
não ao campo profissional, ou, ao uso adequado das sentenças lingüísticas que combinam-se a determinados campos
profissionais e de saberes. É preciso saber distinguir o que, como e onde dizer, descobrindo um meio de
acessibilidade.
Como um recorte para essa discussão, dentro do fenômeno do trabalho, a profissão aparece como uma
esfera específica em que o homem vive a relação indivíduo e sociedade na forma de papéis sociais e ganha controles
mais complexos no contexto social de multiplicidades sociais que somos. Nas várias vozes em debates, há os que não
acreditam mais na categoria trabalho como modo de existência, já que está fadada a um possível fim, reproduzindo
uma realidade desumana e permeada por desajustes; e há ou tros, que acreditam no trabalho em um novo caráter, ele
é plural, diverso e complexo, com uma tendência a intensificação do individualismo. O indivíduo é quem deve ao
trabalho adequar-se, sob pena de não ser filtrado na metáfora do funil que transformou-se o mercado de trabalho
atual e a difusão da ideologia do profissionalismo.
Na discussão da ideologia da profissionalismo que permeia a composição dos campos profissionais, temos
FREIDSON (1996), que procura organizar um quadro de referência sobre as questões teóricas enfrentadas por uma
análise sistemática das profissões. Para ele, a profissão tem a seguinte definição:

como um meio prático que liga corpos de conhecimentos, discurso, disciplinas e campo
aos meios sociais, econômicos e políticos, por meio dos quais seus expoentes humanos
ganham poder em exercê-lo (FREIDSON: 1996, p. 140).

Na busca pela apreensão, do como e porque, a posição de diferentes profissões e seus corpos de
conhecimento e qualificação variam em diferentes tempos e espaços. Freidson cita uma série de variantes
profissionais: o tipo de trabalho reconhecido oficialmente; tipo de especialização; a determinação da própria divisão
de trabalho pelas ocupações; controle dos próprios mercados de trabalho; ensino profissional; profissionalismo;
ideologia e valores. Surge a discussão ideológica que move hoje o mundo do trabalho e a esfera de atuação das mais
diversas profissões. A ideologia do profissionalismo vem permeando a esfera de atuação do mercado de trabalho. As
profissões ganham uma distribuição social de conhecimento altamente complexos. Como definição de
profissionalismo, temos formulação designada:

processo pelo qual uma ocupação organizada, geralmente mas nem sempre por alegar
uma competência esotérica especial e cuidar da qualidade de seu trabalho e de acesso a
ele e controlar o direito de determinar e avaliar a maneira como o trabalho é realizado.
(FREIDSON: 1998, p. 98)

Na atual conjuntura, há mais um novo elemento, que também classifica a posição, o lugar de onde o homem
fala e age: a realidade da insegurança. Quem possui e quem não possui trabalho em um cenário que representa o
fenômeno do desemprego na atualidade. Aliado a isso, nosso contexto vive algumas particularidades, que auxiliam a
constituição de uma ideologia do profissionalismo. Podemos citar a globalização econômica, a tecnologia da
informação, a crise do Estado de Bem Estar-social, a Reforma do Estado, a decadência dos setores públicos e a
corrupção. O que permeia a construção ideológica da busca do profissionalismo, segundo Freidson, é um processo
social que mobiliza o indivíduo a buscar o desenvolvimento das suas ações individuais, com vistas a
sobrevalorização do desempenho da função como uma forma de engajamento e ajustamento ao mercado:

É o conceito de ocupação, e particularmente de profissão, que nos fornece o vínculo


sociológico entre o conhecimento especializado ter o potencial prático de desenvolver
uma tecnocracia, mas antes o fato de ocupações e/ou órgãos organizados, líderes e classe
terem acesso exclusivo a tal conhecimento. O conhecimento em si não dá poder especial:
somente o conhecimento exclusivo dá poder aos seus detentores. E tal poder é obtido
precisamente no princípio ocupacional de organização, pelo qual o recrutamento, o
treinamento e o desempenho do trabalho de criar, disseminar e aplicar conhecimento são
controlados pelas “ocupações do conhecimento (FREIDSON, 1998, p. 104)

O conhecimento específico tornará o indivíduo apto a possuir a senha de entrada ao mercado. Na verdade
é um jogo de “autonomias” em que a lógica da competência, consequentemente deve passar pela prática da
flexibilidade, ser capaz de refazer-se, reconstruir-se, reformular-se. É uma eterna construção de si, que modela
carreira e indivíduo profissional. A ideologia do profissionalismo traz “o imperativo da aprendizagem, obriga a
manutenção do aprender a aprender, aprender a pensar, a estar preparado, colocar-se diante do desconhecido”.
(SILVA:2003). Desta forma o processo está sempre inacabado e o indivíduo não está nunca satisfeito com o seu
desempenho.
Essa ideologia do Profissionalismo, ganha uma voz, porque fala sobre um discurso ideológico da
desqualificação. O emprego, é justificado pela busca incessante, eterna e não plena de qualificação, como
justificativa de um mercado perversificador da vida humana. O homem não mais está seguro sobre essa esfinge. É
uma lógica que atua sobre a sociedade com a fala de quem reconhece algumas atuações, como mais nobres, mais
qualificadas, mais preparadas, e outras atuações e práticas de trabalho com o selo de não- reconhecidas. É a lógica do
capital, que se esconde por trás da linguagem da ideologia do profissionalismo, entregando toda uma
responsabilidade de constituição ao indivíduo, quando na verdade é uma formação ideológica que esconde os
verdadeiros interesses movidos, para salvaguardar a vida econômica do capital financeiro e a ciranda das profissões.
O professor, neste contexto, vivência as mesmas angústias desta modernidade retratada com relação ao
profissão. Trabalha com a matéria-prima de grande valor na esfera social, que assume hoje o acesso ao
conhecimento. Porém, não ocupa, no campo das profissões, uma posição nobre ou de destaque. Vive uma trajetória
de carreira movida pela flexibilidade, desprestígio e baixa atratividade de ascensão profissional e salarial,
especialmente, na realidade do ensino público, em que o trabalhador da educação não tem seu Plano de Cargos e
Salários constantemente reavaliados. Sua identidade é permeada por um sentimento de descrédito com relação ao
Estado, que gerencia as políticas públicas de ensino, não estabelecendo um “dialogismo”, conforme expressão
bakthiana, entre professores e Estado, repercutindo em constantes mobilizações. O Estado fala, sobre duas
dimensões: a de ordem e a de desqualificação do professor, ao gerir a Educação e o reflexo de descaso, com a
situação pública de ensino. O trabalhador da educação vive um processo contraditório de falência do ensino público
e a ideologia do profissionalismo,

um Estado que entra no processo produtivo como mecanismo imperativo de


salvaguardar os interesses do capital no seu conjunto. Trata-se de um ‘patrão’ que, além
da violência instaurada nas relações de produção, acresce a possibilidade da violência e
da exploração política (...) a centralização do capital faz desaparecer a figura do
capitalista individual (...) e surgem as grandes organizações anônimas; de outro lado as
transformações que ocorrem na produção, no processo do trabalho, vão borrando as
fronteiras entre trabalho produtivo e improdutivo. Destroem-se, esterilizam-se e criam
novos trabalhos, porém sob uma nova relação (FRIGOTTO: 2002, p. 21)

3. A CONFRONTAÇÃO DO DISCURSOS DOS PROFESSORES: UMA ANÁLISE DISCURSIVA DA


PROFISSÃO

Como vimos no decorrer deste percurs o, os discursos são processos, são lugares e falares, constituídos de
uma condição histórica determinada e de uma prática em que o sujeito revela estratégias e meios de existência,

a AD problematiza a atribuição de sentido(s) ao texto, procurando mostrar tanto a


materialidade do sentido como os processos de constituição do sujeito, que
instituem o funcionamento discursivo de qualquer texto. (ORLANDI: 1987, p.
13)

Em um estudo de análise discursiva, busca-se confrontar o discurso institucional, de fala marcada, em uma
determinada instância social, que transmite uma mensagem e reflete o sujeito e sua existência. ORLANDI (2002)
sugere em seu livro “Análise de Discurso: Princípios e Procedimentos”, a análise que mobilize a possibilidade de
um entremeio, a descrição e a interpretação no texto:

o analista de discurso, á diferença do hermeneuta, não interpreta, ele trabalha(n)


os limites da interpretação. Ele não se coloca fora da história, do simbólico ou da
ideologia. Ele se coloca em uma posição deslocada que lhe permite contemplar o
processo de produção de sentidos em suas condições. (ORLANDI: 2002, p. 61)

Nesse sentido, destacamos os processos de identificação de nossa análise. Os professores enquanto sujeitos
profissionais que pertencem a um camp o de existência e de disputa de sentidos filiados a uma ideologia do
profissionalismo. Nesta linguagem atual, que mobiliza os sujeitos na busca por habilidades, como moedas correntes
de capital social e cultural, ligam o imagético, relembrando o passado promissor dos professores na existência de
uma memória discursiva. Ora fala de uma memória do aqui-agora, da sua inscrição como indivíduo deste tempo, e
ora revive a memória dos professores de um passado na exaltação de uma profissão como o modelo de
respeitabilidade. Na verdade, este passado histórico convocado, não é um passado vivido por esses professores que
aqui falam.

3.1 Os Discursos dos Professores: Três discursos, Três histórias. Em cena os professores

Estão dispostos três transcrições de fragme ntos discursivos referentes a três histórias profissionais, de
atuações e vivências de professores. Estes falam a partir da representação da profissão. Localizados no contexto do
ensino médio e público no município de Toledo.

Professor Possêidon
“ Eu trabalho na (empresa estatal), na área de cadastro de rede, e aliás eu sou formado em técnico de eletromecânica
industrial (...) a minha família é toda de professor (...) mas eu sempre gostei disso, mas eu não achava a remuneração
adequada e eu ganhava muito bem, quando eu comecei a trabalhar e depois acabei é conciliar os dois serviços e eu
fiquei num que eu ganhava bem e no outro que eu me divertia (...) eu acho que dar aula pra mim eu me divirto".

“Ser professor você é responsável pelo que você faz, você tem que gostar, (...) talvez você seja a ponte entre o
sucesso e o fracasso de alguém, você sendo fraco você pode deixar essa pessoa marcada pro resto da vida, é emoção,
você tem que ser show".
"A profissão de professor é uma coisa que é de dentro para fora, ela vem do coração ...".

"O professor antigamente era melhor colocado, ele era mais importante, chegava e chamava o professor, era quase
um doutor (...). Hoje em dia as pessoas até queriam a profissão, mas pagam muito mal (...). Buscam a profissão
(outras profissões) mais por dinheiro do que por paixão".

"Não acho justo que o cara vai ter que estudar a vida inteira para ter uma profissão e ela não ser conivente com o que
ele ganha, eu não acho que é culpa da sociedade em si, as próprias pessoas permitem ser mal remuneradas".

Professora Atenas
“Tenho um atelier que é uma profissão paralela ao magistério. Faço porque eu sou obrigada. Gosto. Mas, pelo fato de
eu ter 40 horas no Estado, eu não faria se eu não fosse obrigada a fazer, porque é muito, muito puxado. Eu, por
exemplo, na 4ª feira, eu tô trabalhando segunda, de manhã, à tarde e à noite, terça de manhã, a tarde e à noite, quarta
de manhã, à tarde e à noite. Quando chega 4ª feira à noite parece que eu tô entrando em paranóia já, de tão estress ada
fisicamente (...). Eu até largaria um padrão do Estado, hoje eu tenho um padrão que eu tô pra me aposentar, já
poderia estar aposentada, só não me aposentei por causa da idade, daí me pegaram pela idade (...), não é que eu quero
me aposentar, (...), mas daí eu vou me dedicar mais a quem quer saber de Artes".

“É um sentido de vida complicado (...) de muita responsabilidade, eu falo isso porque, você percebe quando você
serve para ser um professor (...) não pode ter medo do aluno, não pode ter medo do seu conteúdo, não pode ter medo
de dizer, (...) o professor tem que gostar do que faz (...) quando realmente ele é professor ele é mais do que faz (...)
ele é mais do que muitos elementos que representa a sociedade. Por quê ? A gente convive muito com as crianças,
com os adolescentes que me beijam todos os dias (...) eles têm a necessidade de fazer isso com a suas mães (...) eu já
tenho mais de 20 anos no magistério...".

"E é se doar, o professor tem que se dar, mas ao mesmo tempo tem que se respeitar como profissional (...) se vê o
professor como apenas um doador (...) não existe respeito e muitas vezes os professores ficam magoados com isso".

Professora Héstia
“As mudanças que aconteceram nas demais profissões, o enxugamento do pessoal devido à informatização. Já na
escola aconteceu o contrário. Nós continuamos ainda com aquele quadro, giz, papel, folha, retroprojetor. O que está
ainda distante dessa maneira de informatização (...) e depois nem todos os professores estão preparados para atuar
com isso (...). Então, por mais que houvesse uma mudança, muitos não estariam preparados, nem eu talvez estivesse
preparada, mas eu acho que estamos ainda muito voltados ao ensino tradicional".

“Não somos só professores, somos pai, mãe, psicólogo, um pouco de tudo, sabe, essa é a maior problemática. A
sociedade em si está ela toda desestruturada. Isso faz com que o aluno não esteja só preocupado em aprender (...)
vem pra se socializar com toda uma problemática por trás".

“Não é mais visto como profissão gratificante como um tempo atrás (...). Agora nós temos muitos professores
atuando, isso também prejudica (...). Tem muito professor que tem umas duas ou três aulinhas. Então, na verdade, ele
é professor, mas quase não aparece na estrutura em si".

Como já ponderamo s, buscamos seguir o método de abordagem de análise propostos por Eni Orlandi
(2002), na análise de um discurso. Como dispositivo teórico que permite entender esse processo de busca e
demarcação da identidade profissional, utilizamos o autor Pierre Bourdieu (1998), que define esses processos nos
campos da produção simbólica, definindo-os como um microcosmo da luta simbólica entre as classes e seus
interesses de luta interna do campo. Os produtores destes campos servem os interesses de grupos exteriores ao
campo de produção. O professor não impõe seu poder por conta do capital econômico e sim pelo capital cultural.
No expressivo conceito de habitus de Bourdieu, nos propõe a entender contexto de construção de
identidade.

Sistema de disposições duráveis, estrutura estruturadas predisposta a funcionarem como


estruturas estruturante(...) princípio que gera e estrutura as práticas e as representações
que podem ser objetivamente reguladas sem que por isso sejam o produto de obediência
de regras, objetivamente adaptadas a um fim sem que tenha necessidades de projeção
consciente (...) ou do domínio das operações (...) sendo coletivamente orquestradas sem
serem o produto da ação organizadora de uma maestro. ( BOURDIEU, apud ORTIZ:
1983, p.15)

Portanto o habitus gera estruturas, orienta ações, interioriza as classificações, presidem escolhas, baseada
na situação de campo. É social e individual, externo e interno, sendo produto de relações objetivas onde cada um tem
um habitus de ser, ou melhor, uma trajetória social. Em nosso caso, uma trajetória profissional que define posturas,
situações diferenciadas de acordo com a marca e a distinção do ofício. Essenciais na forma de perceber o professor
definindo sua função a partir da necessidade social da Educação e a partir disso, desenvolver estratégias para
promover a identidade profissional de professor no contexto da “sociedade da informação”.
O habitus vem acompanhado da noção de campo. Refere-se a idéia de espaço, a posição em que os
agentes se encontram, onde as relações específicas é que determinam formas de interações. Essas interações ocorrem
dentro de um espaço social e simbólico define o grau de propriedade de capital econômico, cultural e político. Nestes
campos se definem as coisas mais sutis e práticas do dia-a-dia. Linguagem, gostos, opiniões. Nestas, as posições
sociais aproximam os iguais, segregando os contrários. Pelo menos, essa proximidade pressupõe algum tipo de
união. Os simples gestos ou posturas podem revelar uma forma de habitus. O habitus está situado dento de um
campo, o ator social age em relações objetivas que exprimem poder. Campo seria “espaço entre as posições dos
agentes a priori fixados- locus – a luta concorrencial entre interesses práticos”. (BOURDIEU: 1998)
Dentro do campo, o indivíduo ganha mais um papel. É um elemento ao qual se pode identificar um grupo,
que pode inclusive ter ainda um lugar institucionalizado para falar. O falar do professor é proferido da escola como
sua instituição. Seu “habitus”, atuando na forma de se assumir uma identidade. Esse habitus reproduzirá as trocas
desiguais dos poderes, onde assume o papel de gerador e unificador mas também é responsável pela identificação de
diferenças simbólicas inclusive no uso da Linguagem e o uso de determinado poder. O autor usa uma interessante
metáfora em que o habitus é o narrador do campo “dos personagens que o habitam”.
Ao mesmo tempo, dentro de uma identidade profissional, e constituição de um habitus, convive a
identidade investida de uma tendência de flexibilidade, exigida pela atuação profissional em meio à mudança, as
mutações na realidade social como um todo e dentro do mundo das profissões. O que justifica, o reconhecimento
pela capacidade flexível, e a busca por elementos de legitimidade de sua função.
A luta por uma identidade que tenta legitimar-se pela importância que ganha o conhecimento e a presença
indissociável da Educação como um diferencial diante de outras profissões diante do quesito necessidade social
desse campo, temos a identidade do professor querendo se redefinir no fato de que::
existir não é somente ser diferente, mas também ser reconhecido legitimamente diferente
e em que, por outras palavras, a existência real da identidade supõe a possibilidade real,
juridicamente e politicamente, garantida de afirmar oficialmente a diferença (...) aquilo
que é diferente, encerra o princípio de dominação de uma identidade sobre a outra, da
negação de uma identidade por outra. (Id, p. 129)

O Estado participa aqui como agente modelador da identidade enquanto órgão regulador dessa política
educacional. Dessa disputa interna, da busca individualizada pela sobrevivência geradas pela estrutura. Cria-se
elementos para a fragmentação da categoria profissional percebida especialmente em períodos de greve. O principal
inibidor do último movimento, a “Greve tartaruga”, foi o corte no repasse de verbas para pagamento e a
fragmentação do movimento dos professores em torno de um consenso.
Os professores utilizam a “manipulação de identidade”, reafirmando a condição de profissão mal
valorizada, de modo a despertar e a reverter a identidade desprivilegiada ou estigmatizada na idéia de heroísmo do
ofício. Essa mobilização, visa atingir diversos atores que interagem com sua profissão, na busca por uma reafirmação
e uma posição dentro do social. Na luta pelo seu espaço, vem diretamente relacionada o nome e à função de sua
nomeação. Como profissão professor, utilizando capital simbólico cultural há o uso da estratégia do respaldo à sua
identidade enquanto profissional. Estes são os chamados “conflitos simbólicos da vida cotidiana” a que Bourdieu
remete-se.

As falas transcritas dos professores são retiradas do acervo de exercícios de técnica de entrevistas, na
experiência de entrevistas realizadas com professores do ensino médio e público no ano de 2001. É importante
enfatizar, que este era um momento fragilizado da profissão em que os professores vivenciavam um momento
extremo de conflito com o Estado, na gestão do governo do Estado do Paraná - Jaime Lerner(1995-2002), em
freqüentes mobilizações gerais e greves tartarugas. Movimentos fragmentados que revelam uma profissão associada
ao desprestígio da educação na ordem pública.
A aplicação das perguntas seguiam um roteiro de questões elaboradas na forma de perguntas abertas e
aplicadas sobre a forma de diálogo. Foram desenvolvidas três entrevistas de cunho mais exaustivo. Somente a
entrevista do Professor Possêidon foi realizada em local de serviço paralelo a sua atuação como professor. Os demais
entrevistados foram entrevistados em suas residências.
Como forma de preservar a identidade pessoal e profissional dos entrevistados, numa questão de ética
científica, decidimos citá-los, durante a transcrição através de heterônimo s, retirados da cultura grega, citando os
entrevistados com nomes de deuses gregos, que tinham em suas figuras mitológicas virtudes e defeitos como forma
de falar do humano. Utilizaremos, então, para as três pessoas entrevistadas, três nomes relacionados a essa mitologia.
O primeiro entrevistado chamaremos de "professor Possêidon", a segunda entrevistada, de "Atenas", e a terceira
entrevistada , de "Héstia".
O primeiro entrevistado, o professor Possêidon, é casado e leciona em três colégios de nossa região1 ,
somente no período noturno e para turmas do ensino médio. Não tem a profissão de professor como a sua principal
profissão, enfatizando bem sua formação "multifuncional", deseja pela ideologia do profissionalismo apesar de dizer
que gosta muito da profissão de professor e ter na família o principal referencial, em que praticamente todos estão
envolvidos com o exercício deste ofício.
A segunda entrevistada, a professora Atenas, apresenta maior experiência no magistério dentre os
entrevistados, atua já há 20 anos, e leciona a disciplina de Artes. Tem um trabalho paralelo ao magistério, dedica-se a
um atelier montado em sua casa, ministrando aulas de pintura e confeccionando seus próprios quadros como
atividade complementar. Trabalha tanto no ensino médio como no fundamental, durante os três turnos de atividade,
com dois padrões de 20 horas cada, em dois colégios de nossa cidade. Também tem uma trajetória pessoal e de vida
diversificada, pois já atuou como bancária e até como guia turística. É divorciada e tem filhos.
Já a terceira entrevistada, a professora Héstia, começou sua carreira lecionando com a licenciatura curta até
concluir a pós-graduação. Atua somente em um colégio durante os três horários de aula, com dois padrões de 20
horas cada, trabalhando tanto no ensino fundamental como no ensino médio, ministra as disciplinas de Ciência e
Matemática. Ser professor, também, durante muito tempo, não foi a sua principal profissão. Atuou, por alguns anos,

1
O professores entrevistados estão vinculados ao ensino médio no município de Toledo.
em uma grande empresa estatal da cidade como escriturária. Hoje, além das aulas, dedica-se também à administração
de um "mercadinho" de propriedade familiar.
A ênfase da entrevista girou em torno dos elementos constitutivos da construção identitária desse
profissional. Resolvemos enfatizar os aspectos relacionados à trajetória pessoal e profissional, que revelam muito
dos pequenos e importantes detalhes rotineiros da sua vida, o papel de professor, sabendo-se que sua experiência
singular revela muitos aspectos freqüentes das trajetórias profissionais dos professores, e assim se vão autodefinindo.
A vocação, ou a idéia do “talento”, é uma extensão da trajetória profissional e pessoal e revela o que de fato
impulsionou a exercer a profissão e sua visão profissional neste século XXI, diante das mudanças a que a profissão
está sujeita e das novas tendências da sociedade.

Possêidon tem uma realização profissional diferente ao dar aula, pelo fato de transmitir conhecimentos, e
estar em constante aprendizado através dessa atuação. Ao comentar sobre a profissão, toca na questão da
remuneração, um dos elementos centrais na construção da identidade nesta profissão. A remuneração, por ser uma
aferição pública de valor ao trabalho dos professores, é um ponto delicado de discussão. Foi uma das grandes
bandeiras de mobilização dos profissionais professores que lutaram durante toda a gestão do governador do Estado
do Paraná Jaime Lerner (1995-2002); Houve sete anos consecutivos sem reajustes salariais e modificações no
Planos de Cargos e Salários. Havia freqüentes mobilizações. Estas muito fragmentadas em sua maioria. Com o início
da nova gestão do Estado do Paraná, na posse do governador eleito Roberto Requião (2003-2006), após intensas
negociações, concessão, bloqueio e nova discussão mediante o argumento da Lei de Responsabilidade Fiscal do
Estado, foi concedido, sobre pressão da categoria trabalhista, o percentual de 33 % de reajuste salarial e revisão no
Plano de Cargos e Salários. A categoria, cogita a possibilidade de novas discussões, pois o reajuste não reflete um
aumento fixo e a defasagem destes períodos. Estes dados atuais, foram cedidos pelo Sindicato dos Professores – APP
Sindicato de Toledo. No discurso de ambas as gestões públicas, “que o Paraná abraça os seus professores”, nota-se
que são apagadas as falas dos longos processos de movimentos trabalhistas, que dirime em pequenas concessões a
política de reformulação salarial do trabalhador da educação e a estrutura de investimento voltada ao setor do ensino
público.

Quanto à vocação e à situação da profissão, os professores resgatam muitos aspectos positivos, quando
dizem o que os impulsionou a “abraçar” a profissão e como vêem o sentido da mesma. Também percebem que a
mudança é um ponto central na nova postura do professor enquanto profissional, fazendo pensar sua atuação nesse
futuro. Aqui, é possível visualizar a influência da ideologia do profissionalismo num dilema em que a escola mudou,
mas isso pouco se reflete na constituição do ensino público, que pouco acompanha o ritmo da sociedade da
informação – segundo os professores - mas a ideologia do profissionalismo atua como imperativo aos indivíduos.
A profissão, é sentida quase como um "ethos profissional". É a sua distinção profissional com relação a
outras profissões. O resgate da profissão enquanto algo que é interior na forma de se assumir o papel de professor, o
distingue e faz mobilizar o seu espaço de luta por uma identidade reconhecimento no campo de profissões, a nível de
micro- construção do grupo dentro da institucionalidade.
Atenas fala do sentido do ofício. A maneira como vê seu ofício mostra um apego a um valor
transcendente, ou seja, o médico está ligado ao valor da vida e o professor no valor de ensinar, do conhecimento. É
esta a credencial que o diferencia e o torna relevante. É isto que move seu princípio de identificação a partir da
profissão. É uma distinção profissional institucional que representa a Educação.
A maneira como Héstia vê a profissão coloca o papel do professor muito mais como mediador, não mais
com a idéia de que professor é o detentor do saber, mas informa e é percebido como um instrumento de
decodificação das informações. Essa idéia aproxima-se muito da idéia de escola-empresa.
Quando fala do fator mudança dentro da profissão de professor, Héstia percebe o fenômeno que transformou
de modo especial o mundo das profissões, mas, nota que a profissão de professor de maneira particular, não acatou,
segundo ela, todas essas mudanças. Em sua ótica, percebe que pouco mudou. Percebe a problemática da profissão no
seu outro mais próximo, o aluno, na falta de interesse em estudar e o fato de conviver com uma sociedade tão
desestruturada, resgatando um multipapel que o profissional acaba assumindo diante dessas situações.
Num retorno ao tempo, retomando a profissão do professor no passado e comparando com a de hoje,
comenta o fato de haver muitos professores em tempo parcial (com outra profissão principal) competindo com os
professores propriamente ditos, em regime de dedicação integral. Ela acredita que esse regime parcial e precário,
dentro do qual muitos professores estão atuando, possa estar gerando um desprestígio da profissão.
Na percepção de outros atores, que atuam na configuração de seu eu enquanto professor, temos o outro-
aluno, uma referência de identificação, pois, falando do outro-aluno fala-se também de si mesmo. O entrevistado
Possêidon vê dificuldade no ensino médio quanto ao fato de a maioria dos alunos vir de diversas escolas e também
por não estarem habituados a ter aula à noite. Cita também o problema dos alunos que estudam e trabalham. Mais
uma vez, identifica o "outro", o aluno que participa do seu processo interativo na construção da sua identidade.
O Estado é convocado nas questões trabalhistas, que envolvem o ofício de professor, por ser a instância que
regula a estrutura educacional, uma vez que esse professor do recorte de estudo pertence ao ensino médio público,
sob responsabilidade de gestão desse Estado. Os planos de cargos e salários não representa um acordo, mas antes
um distanciamento no diálogo entre professores e Estado, ocasiona uma série de conflitos, as greves, manifestações e
indignações expressas nas falas dos sujeitos da educação. O professor mostra o desinteresse em participar desse
plano de cargos e salários sugerido pelo Estado com breves atualizações e aperfeiçoamentos. Isso reflete-se na
constituição da identidade profissional do professor, no fator motivacional, podendo implicar em uma baixa
qualidade da educação, com um profissional não estimulado pelas políticas públicas.

Existe uma formação discursiva imbricada de uma prática docente de atuação que auxilia o professor a
significar a si e aos outros e a localizar-se em uma fala, polêmica, pela disputa por sentidos e de resistência, diante da
situação contraditória entre a moeda do conhecimento x o não reconhecimento profissional do mundo das profissões.
Quando ORLANDI (1987), reporta-se aos discursos pedagógicos, comenta que estes, não obedecem propriamente
uma tipologia específica, e por isso, são polêmicos, mas também autoritários, em uma mescla de discursos, assim
com a realidade é disposta também desta forma de uma ampla variedade social e cultural.
Por diversas vezes, o professor recorre a legitimação do saber, como detenção de poder marcada por uma
credencial “ estudei para isso”. Os jogos de sentidos estão claros. Existe um “não-dito” aqui. Quando o professor diz,
“sou professor, estou preparado para ser professor”, ele está querendo dizer, ao mesmo tempo implicitamente, que é
alguém diferente. Ele tem uma marca distintiva que não torna sua atuação, em contraposição, semelhante a qualquer
atuação. E quer ser reconhecido na instância pública por isso. A diferenciação se dá por meio do princípio de
inclusão e exclusão do grupo profissional e depois e movido por uma nova distinção pessoal. O dito e o “não-dito”
estão presentes.
É interessante perceber que o professor, mesmo que queira, não consegue discursar a partir do seu eu. Ele
está investido de um local próprio de movimentação a ele permitido. Em nosso caso, o professor sempre se remeterá
a esfera da escola. Fala dos seus dilemas da falta de avanço na estrutura escolar em detrimento das exigências da
ideologia do profissionalismo; fala do eu- aluno, que mantém uma idéia estreita e relacional; fala do Estado e de sua
relação conflitiva e permeado por ausência de dialogismos. O Estado apaga as falas dos movimentos e das
reivindicações. Geralmente, esses discursos apagam as responsabilidades, porque estas ganham um caráter público e
coletivo. Tanto da parte do Estado como da parte dos professores. Portanto, o discurso do professor revela o mais
alto grau de institucionalidade, “a instituição é vista como um domínio do indivíduo para a sua adequação ás
exigências do poder que sobre ele se estabelece, ou , em outros termos, para ‘manter sobre ele uma coerção sem
folga”. (BALEN: 1983, p. 76). A esfera de reprodução desigual da vida e de poderes em sociedade, está mantida na
ação da sociedade, percebidas mais nitidamente quando circundadas pela ação da instituição.
O processo discursivo apresenta uma formação ideológica marcada pela distinção, em que o professor
também é influenciado pela ideologia do profissionalismo, no sentido de fazê-lo acreditar que tem um talento, uma
habilidade que precisa de um modelo. Toda a situação aqui depurada, revela a intenção da troca desigual do capital,
escondida na relação de quem possui ou não um emprego, e de quem pode ou não ser reconhecido no mercado de
trabalho. O professor, especificamente, vive um dilema de seu tempo. É desqualificado de dupla maneira: pela
linguagem do capital dentro do mundo das profissões; e pelo Estado em um movimento desordenador das relações
de trabalho, marca pejorativa na gestão pública de política trabalhista. O indivíduo é induzido pelo mercado a pensar
que a “culpa” por não ter um emprego, por não ser reconhecido socialmente, é de inteira responsabilidade pessoal,
quando no entanto, esconde-se, por trás dos encantamentos da ideologia do profissionalismo, um grande sistema que
possui interesses determinantes e que movimentam o mercado hoje.

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS

A análise de discurso, é um recurso teórico e metodológico interessante não somente com relação ao olhar
do discurso propriamente dito, mas como este associa -se ao universo social, ampliando o entendimento não somente
da dimensão da Linguagem, mas em uma dimensão do sujeito e da sociedade. O presente trabalho coaduna-se com o
interesse de análise sociológica da problemática da identidade profissional dos professores, demonstra uma das
possibilidades de “entremeio” que a análise de discursos propõe. Neste objetivo, o trabalho buscou privilegiar o
aspecto da representação da profissão enquanto formação discursiva e ideológica conjugando o debate sobre a
ideologia do profissionalismo atrelada ao fenômeno do trabalho em nossa atualidade.
Pelo discurso dos professores - todos falando da representação da profissão - é possível perceber o
movimento das formações ideológicas e a presença da ação da ideologia do profissionalismo, como um imperativo
social. Mobiliza a construção de marcas de distinção profissional e identitárias, em que os indivíduos buscam
qualificação e desempenho. Há uma linguagem escondida, que estabelece a lógica da desqualificação do mercado de
trabalho, dita as regras de distribuição desigual da existência humana por meio do trabalho, e pelo seu
reconhecimento ou não- reconhecimento no contexto público de atribuição de valores e prestígio. Essa lógica
aparece como um encantamento do público, seduzidos pelo mundo dos talentos e suas recompensas. O professor
vive essa experiência diluída na profissão, através da flexibilidade e busca constante de um aperfeiçoamento de si.
Revela uma dupla investida contra o reconhecimento do profissional professor, proveniente de um mercado
excludente e ditador e d e um Estado que atende a uma lógica ideológica de mercado não somente presa a uma esfera
estatal de Poder, mas, a interesses maiores, movidos por um efeito globalizante da economia e das oportunidades
distribuídas em posições diferenciadas de falares.

RESUMO: No confronto de discursos, a representação da profissão está revelada nas falas dos profissionais
investida de luta pelo reconhecimento profissional e que estabelece a estratégia da marca e distinção como formas de
disputa e manutenção de um lugar no estabelecimento dos campos e das nomeações profissionais.

PALAVRAS -CHAVES: Análise de discursos, Identidade Profissional, Professores.

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