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inconformismo do presente. Mas esse presente não pode ser visto como algo parado, estático,
mas sim em constante movimento. Segundo GEBRAN (1996), ao desenvolver uma Geografia
que analise a realidade social da criança, permitindo a compreensão do espaço, não como algo
estático que existe só para ser descrito, mas como uma realidade que está sendo construída pelo
homem, será encaminhada para a compreensão dos fenômenos geográficos como processos em
movimento, historicamente caracterizados por mudanças qualitativas e quantitativas.
Essa realidade está inserida num todo, numa totalidade. O estudo fragmentado da
realidade não leva o aluno a lugar algum. Muitas vezes o ensino não passa de uma decoração
exagerada, da enumeração e da descrição de fatos isolados. Segundo AZAMBUJA (1991), a
Geografia comprometida com o cidadão deve ensinar o ato de pesquisar, pois, ao trabalhar com a
realidade, o aluno vai perceber os motivos humanos nos estudos das informações e que
compreender o todo é mais importante que saber tudo.
Compreender a realidade significa pensar criticamente sobre ela. Desta forma, a Geografia
escolar pode também ser um instrumento de transformação, desde que se livre dos seus
parâmetros tradicionais de pontos geográficos, rios, picos (GEBRAN, 1990). A mesma autora, na
sua tese de doutorado é mais incisiva ao afirmar que a Geografia escolar “precisa deixar de ser
apolítica, pois ela é justamente um modelo politicamente conservador, produtor de uma
cidadania contemplativa, inerte.” (GEBRAN, 1996:11). No mesmo sentido, ALMEIDA (1999:
83), aponta que Geografia tem por finalidade “munir os alunos de conhecimentos que lhes
permitam agir de modo mais lúcido ao tratar das questões que têm a ver com a ocupação e
gestão do espaço em diferentes níveis. O ensino de Geografia tem, portanto, papel decisivo na
formação para a cidadania.”
Para VESENTINI (1999), os grandes problemas do período atual apresentam-se em escala
planetária. Assim sendo, é extremamente importante, muito mais do que no passado, que haja no
sistema escolar uma(s) disciplina(s) voltada(s) para levar o educando a compreender o mundo em
que vive, da escala local até a planetária, dos problemas ambientais até os econômicos e culturais.
Enfim, o papel do ensino de Geografia é trazer à tona as condições necessárias para a
evidenciação das contradições da sociedade pelo e no espaço, para que no seu entendimento e
esclarecimento possa surgir um inconformismo e, a partir daí, uma outra possibilidade para a
condição da existência humana.
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Esses trabalhos estavam embasados principalmente na obra: PIAGET, Jean e INHELDER, Bärbel. A representação
do espaço na criança. Porto Alegre: Artes Médicas, 1993.
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mais abstrato, formal, pois deixa as relações corporais para relações estabelecidas por meio da
reflexão.
Quadro 1
PERÍODOS DO RELAÇÕES ELEMENTOS
OPERAÇÕES MENTAIS
DESENVOLVIMENTO CONSTRUÍDAS CARTOGRÁFICOS
-relação significante
Pré-operatório -função simbólica -símbolos/legenda
significado
-inclusão/exclusão
-interioridade/exterioridade
-relações espaciais
Operatório -proximidade -limites e fronteiras
topológicas
-ordem
-vizinhança
-conservação da forma
-coodenação de pontos de
-relações espaciais -projeções cartográficas
vistas
projetivas -orientação geográfica
Intermediário do operatório -descentração espacial
para o formal -orientação do corpo
-proporcionalidade -escala
-relações espaciais
-horizontalidade -coordenadas
euclidianas
verticalidade geográficas
Fonte: PASSINI, E.Y. Alfabetização cartográfica e o livro didático: uma análise crítica. Belo Horizonte: Lê,
1994
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funções de que é portador. (...) um não pode ser entendido sem o outro. Não há como vê-los
separadamente.” (SANTOS, 1997:83).
Para esse entendimento do espaço geográfico é necessário que a categoria filosófica
totalidade seja chamada para ajudar na explicação. Como entender essa indissociabilidade de
ações e objetos num espaço fragmentado, hierarquizado? É possível?
Hoje, graças a presença do meio técnico científico e informacional está cada vez mais
lúcido que o espaço geográfico, seja em qualquer uma de suas categorias analíticas: lugar, região,
território e paisagem, carrega objetos e ações geradas no confronto de forças locais e globais,
sendo essa última mais forte e densa.
Desta forma, a idéia de construção do conceito de espaço pautado unicamente por e partir
de atividades cartográficas seguindo uma sequência hierárquica de operações mentais e relações
construídas não dá conta da complexidade do período atual. A criança continua passando pelas
fases do vivido, percebido e concebido, mas nesses há relações que extravasam essa rigidez, uma
vez que nos espaços do vivido e do percebido há ações e objetos claramente visíveis geradas em
escalas mais distantes, que implicam operações e relações mentais mais abstratas e complexas.
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Segundo SANTOS (1978:169), “o espaço das sociedades não é a soma dos espaços
correspondentes a cada sociedade particular existente, tampouco esse espaço social é
exclusivamente o habitat dos homens, graças à nova natureza das relações intra-sociais e entre
sociedades. (...) O espaço social é muito mais que o conjunto de habitats.”
A totalidade enquanto um conceito é uma abstração. Logo, a totalidade que também é
sinônimo de espaço geográfico, faz desse uma abstração. Mas, não é possível pode trabalhar
apenas no nível da abstração. É preciso encontrar as ferramentas para abarcar concretamente a
totalidade sem desintegrá-la, principalmente na Educação e, nesse texto em particular, no ensino
da Geografia para crianças.
Para SANTOS (1988:13), “as noções de estrutura, processo, função e forma, essas velhas
categorias filosóficas e velhas categorias analíticas devem ser retrabalhadas para que, neste
particular, possam prestar novos serviços à compreensão do espaço humano e à constituição
adequada de sua respectiva ciência. (...) A forma nos apresenta a coisa, o objeto geográfico; sua
função atual nos leva ao processo que lhe deu origem, e este, o processo, nos conduz à
totalidade.”
Essas categorias são essenciais para que se faça o recorte analítico, mas sem perder de
vista noção de totalidade. Pensando em espaço geográfico, essas categorias analíticas ainda
permanecem no campo da abstração filosófica. Nesse sentido, faz-se necessário buscar nas
manifestações concretas do espaço: lugar território, região e paisagem, paisagem2, o suporte para
lançar as categorias analíticas da filosofia.
Se num estudo for definido o território como o suporte geográfico para se dar a
explicação, para que esse não perca o sentido de totalidade, deve-se, então, analisá-lo utilizando
as categorias analíticas forma, função, processo e estrutura. Essas quatro categorias analíticas
conferem a cada categoria geográfica a noção de totalidade. Na verdade, tanto as categorias
geográficas quanto as filosóficas são essenciais, logo, uma não pode ser feita sem a outra, elas
são, pois, amalgamadas.
Das categorias geográficas, o lugar é a que apresenta a maior possibilidade de dar a
dimensão do real no ensino de Geografia para os dois primeiros ciclos (1ª a 4ª séries) do Ensino
Fundamental.
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Anotações do curso: Geografia para o Ensino Fundamental e Médio: um apoio aos Parâmetros Curriculares
Nacionais, realizada no dia 21/10/2000, ministrada pelo Prof. Dr. Ricardo A. Castillo.
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