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o ensino e aprendizagem das noções, habilidades e

conceitos de orientação e localização geográficas:


algumas reflexões

Ângela Massumi Katuta"

Il RESUMO
O presente artigo objetiva contribuir com sobre o ensino e a aprendizagem das noções, habilidades e conceitos
de orientação e localização geográficas. Num primeiro momento, refletimos sobre o significado das palavras orientação/
I localização cotidianas e orientação;1ocalização Posteriormente, um breve esboço como esses
I conhecimentos são ensinados e aprendidos na escola para, logo em seguida, analisarmos essas práticas cotidianas a fim
de que o docente do Ensino Fundamental e Médio possa também refletir sobre a questão.

PAlAVRAS-CHAVES: orientação; localização; ensino; Geografia; território; mapas.

Da minha aldeia vejo quanto da terra se pode ver no à prática pedagógica docente, ocorre quando o
Universo... professor Geografia pede para seus alunos
Por isso a minha aldeia é tão grande como outra terra decalcarem mapas de vários locais, colocar o
qualquer nome dos estados, as respectivas capitais e os
Por que eu sou do tamanho do que vejo pontos cardeais ou sua orientação geográfica.
E não do tamanho da minha altura ... Observa-se que nas situações citadas acima,
Nas cidades a vida é mais pequena o mapa não passa de um recurso para localização
Que aqui na minha casa no cimo deste outeiro. e orientação de fenômenos. Entendemos que
Na cidade as grandes casas fecham a vista à chave, esse recurso didático é uma das representações
Escondem o horizonte, empurram o nosso olhar para pOSSlVelS serem utilizadas em classe e que o
longe de todo o mapa deve ser lido tal qual um que evoca
Tornam-nos pequenos porque nos tiram o que os em nós inúmeros significados sobre o mundo que
nossos olhos nos podem dar, nos cerca.
E tomam-nos pobres porque a nossa única riqueza é ver. Por isso, concordamos com Masson 1 quando
(Alberto Caeiro) esta afirma que as representações gráficas têm
duas finalidades diferentes no ensino de
Geografia. A primeira é a de servir para analisar
Pretendemos no presente artigo refletir sobre os elementos do espaço, a segunda para uma
o ensino e aprendizagem das noções, habilidades interpretação do mesmo, dentro de uma
e conceitos de orientação e localização hermenêutica própria da disciplina. Com base
geográficas porque o uso dos mapas, que se faz na afirmação acima poderíamos dizer que através
em geral no ensino de Geografia, é o de mera dos mapas poderíamos analisar os elementos
orientação e localização dos fenômenos, que presentes num determinado território para,
estão sendo alvo de estudos. Vale salientar que posteriormente, fazer interpretações acerca da
um outro tipo de uso dos mapas que costuma lógica da territorialidade dos mesmos. No
ser efetivado em sala de aula, e que está arraigado entanto, é preciso explicitar que as finalidades

Professora do Departamento de Geociências da Universidade Estadual de Londrina PR. E-mail: katuta@geo.uel.br

Geografia, Londrina, v. 9, n. 1, p. 5-24, jan./jun. 20()() 5

I
delegadas a esse meio de comunicação, no discutido brevemente sobre as funções do mapa
Ensino Fundamental e Médio dependem das no ensino de Geografia, na presente reflexão, nos
concepções de Geografia dos docentes que, regra ateremos somente à questão da aprendizagem e
geral, são muito diferentes entre si: do ensino das noções, habilidades e conceitos
de orientação e localização, pois este é o principal
(~ ..
Pune statÍque déerivant l'ordre du monde, e um dos primeiros usos que se faz dos mapas,
Fautre dynamique; productrke de noveau nas escolas do Ensino Fundamental e Médio.
savoir sur un monde non directement lisible, Optamos por centrar nossa análise no processo
vision d'emblée que donne du sens à ce qui de ensino e aprendizagem desses conhecimentos
n en pas d'emblée. '.:2 (Masson 3 )
J a fim de subsidiar as reflexões dos professores
dos diferentes níveis de ensino .
Observa-se pela citação acima que é em
função de uma determinada visão de ensino e
de Geografia, que se utilizam as representações QUE ORIENTAÇÃO? QUE LOCALIZAÇÃO?
gráficas e cartográficas de diferentes maneiras.
Se o professor concebe a Geografia, como Quando falamos em orientação e localização,
uma disciplina que tem por função descrever logo nos vem à mente o rumo e a ~1ÇJ:m!1':lf!.gl,º
lugares, o uso que se fará do mapa possivelmente (no sentido da localização) de um lugar, de uma
será o de mera localização e haverá maior ênfase casa, escola, bairro, cidade, estado, e outros. Para
na realização de descrições. Por outro lado, se o nos dirigirmos a determinado local, regra geral,
docente concebe a Geografia como uma sempre pensamos em virar à direta, à esquerda,
disciplina que tem por função ensinar ou ou seguir em frente até que a rua termine.
contribuir para que o aluno entenda melhor as Quando não sabemos direito o caminho
territorializações produzidas pelos homens, o uso adequado a ser seguido, ou que rumo tomar, em
que se fará do mapa possivelmente será outro, pois geral, perguntamos a alguém que nos possa
apesar de ser utilizado enquanto meio de orientação fornecer a informação sobre a localização, ou pelo
e localização, poderá também ser utilizado menos sobre a direcão que poderíamos seguir
enquanto recurso que pode encetar análises e para encontrar o referido local. Verifica-se nas
explicações geográficas da realidade mapeada. situações acima descritas que, no limite,
Temos que concordar com a mesma autora poderíamos muito bem passar sem um mapa, ou
quando esta afirma que a Geografia é um seja, nossa ida ou não a um local não dependeria
domínio do saber que consome e produz muitas somente do uso do mapa, enquanto meio de
representações gráficas, que por sua vez, possuem localização, mas essencialmente de pedir
diferentes usos dependendo do tipo de Geografia informações a qualquer transeunte.
que se produz. Algumas propiciam ou originam A atitude acima descrita é a mais comum entre
apenas descrições do espaço ("géographie de a maior parte da população do que a de procurar
bilans"); outras propiciam uma Geografia voltada num mapa a localização de algum lugar, mesmo
para a pesquisa ou de procura de mecanismos entre os alunos do Ensino Médio e Fundamental.
explicativos para determinadas territorialidades. Isso ocorre devido a inúmeros fatores, desde a
ausência e/ou o não acesso a mapas, falta de
"La premiére favorise des démarmes didactique hábito em usá-lo, dificuldade em orientar-se com
tradidoneUes de t;pe essendellement inductit; o mesmo, facilidade em obter informações,
centrées sur la acquisition de contenus factuel existência de placas informativas e outros. Grosso
et de savoir-faíre. La seconde privilégie des modo, nos deslocamentos diários e saberes
demarches h;pothético-déductives et des cotidianos relativos a um determinado local,
acquisitions de type plus conceptuel ou poucas pessoas necessitam e se recordam que
s'lnteréressant davantage aux processus poderiam utilizar-se mapas.
explicatifs liées à des atitudes pedagogiques Para nos orientarmos e nos localizarmos
centrées sur la construcdon des savoirs par les cotidianamente, principalmente na cidade, não
élêves. '>I (Masson5) há muita necessidade de sabermos o rumo dos
pontos cardeais, muito menos a latitude e
É importante ressaltar que apesar de termos longitude de determinado local, pois as
- - - _..._ - - ...._ - - - - - - ­ -----~------------------

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habilidades e noções espaciais que construímos, como semi-invariáveis, que são elementos que
satisfazem as nossas necessidades básicas de guardam uma certa invariância na paisagem, tais
deslocamento. como pontes, viadutos, linhas de trem, igrejas,
Orientar e localizar são ações que se aprende praças, prefeitura, hospitais, shopping center, e
desde o nascimento, que foram sendo portanto, servem como pontos de referência para
estruturadas a partir e com a construção a localização e orientação no espaço vivido. Além
progressiva da noção de espaç06 . Essas noções disso, esses invaríáveis ou semi-invariáveis,
certamente são importantes para o sujeito na sua aliados à possibilidade de pedir informações a
vida cotidiana, pois no limite, a ignorância dessas, alguém sobre a localização ou rumo de
pode trazer-lhe inúmeros problemas. determinado lugar constituem-se em meios de
As referidas noções vão se estruturando desde certa forma eficientes para o deslocamento de
o nosso nascimento e são aprendidas durante a qualquer sujeito. Portanto, para nos orientarmos
nossa vida, em função principalmente das e nos localizarmos não necessitamos, a priori, do
exigências materíais que a mesma nos impõe. É conhecimento das noções, habilidades e
importante salientar que cada sociedade conceitos de orientação e localização geográficas.
desenvolve mecanismos e esquemas É claro que esse conhecimento, em diferentes
diferenciados de orientação e localização, que niveis, poderia proporcionar mais autonomia no
vão depender em grande parte das suas condições deslocamento do sujeito, no entanto, o que se
materiais de vida, da forma como percebem o observa, regra geral, é que as pessoas não se
seu entorno, do seu entendimento sobre ele, da utilizam desses conhecimentos para orientação
forma como ocorre a interação entre o sujeito e e muito menos para localização.
o lugar, enfim da forma como as diferentes A maioria das pessoas se orienta e se localiza
sociedades se relacionam com os outros mesmo sem saber ou dominar os conhecimentos
elementos da natureza. geográficos de orientação e localização. Por isso
Depreende-se das afirmações acima que, faz-se necessário distinguir a orientação e
grosso modo, para nossos alunos pouco sentido localização pura e simples da orientação e

l
faz aprender noções, habilidades e conceitos de
orientação e localização geográficas para
orientarem-se e localizarem-se na cidade. Isso
porque nos diferentes espaços existem alguns
pontos de referência semi-fixos ou fixos, muito
conhecidos pelo público em geral e que servem
localização geográficas. Faremos isso num
primeiro momento, explicitando alguns
significados das palavras orientação e localização
para a maioria do público menos especializado.
Após termos consultado o dicionário Aurélio7
encontramos os seguintes significados:

Quadro 1- O significado das palavras Oríentação e Localização segundo o Dicionário Aurélio.

Locali~(lçª()

Ato ou arte de orientar( -se) Ato ou efeito de localizar(-se)


Localizar
I locar
I.

Direção, guia, regra Tornar local; fixar ou limitar a


determinado local
I
Impulso, tendência, Fixar, limitar ou estabelecer
I . . . . . . . . . . . . . . . . . . . it-l~~l1ação...................... . . . . . .. em determinado...... 'é ......
,....................
Imaginar num determinado
r ponto,

f 'Como o referido dicionário só trazia uma definição que nos interessava, para a palavra looüização, inserimos
r os significados da palavra localizar, pois como o próprio dicionário afirma localização é o ato ou efeito de
localizar( -se).

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t
Observa-se que no dicionário não há importantes os conhecimentos, noções e
referência às redes e coordenadas geográficas, habilidades de orientação e localização
muito menos paralelos/meridianos e latitude/ geográficas, esses acabam sendo marginalizados
longitude. Os sinônimos referem-se a ações que pela prática pedagógica do professor, que se
qualquer sujeito, letrado ou não, realiza em nossa desenvolve a partir de alguns equívocos de
sociedade, portanto, o uso de mapas ou qualquer entendimento. Deve-se ensinar o aluno a se
outro recurso de representação cartográfica não orientar e localizar geograficamente, no entanto,
está explícito na efetivação de ambas as A devemos ter claro que essas noções, habilidades
conclusão que podemos tirar da leitura dos e conceitos não devem estar desvinculados de
sinônimos acima é que qualquer pessoa pode outros conteúdos, porque para empreendermos
realizar essas ações, mesmo sem saber ou ter uma análise geográfica temos que iniciá-la
acesso a conhecimentos geográficos específicos. respondendo às seguintes questões: O quê? e
É importante atentar para tal fato, pois há uma Onde? Observa-se que ambas as questões
confusão generalizada dos docentes da disciplina podem ser facilmente respondidas com o uso de
Geografia e das iniciais, que justificam mapas. No entanto, a segunda questão somente
a importância da aprendizagem das noções de pode ser respondida adequadamente a partir da
orientação e localização geográficas, para que o utilização de conhecimentos sobre orientação e
sujeito situe-se melhor no espaço em que vive. localização geográficas.
Quando a justificativa da aprendizagem desses É importante agora enfatizar que orientar e
conhecimentos torna-se essa, na verdade estamos localizar geograficamente tem outros sinônimos
cometendo, a priori, um equívoco que nos custará em dicionários e livros técnicos, no dicionário
caro, pois a realidade nos mostrará que os alunos, Cartográfico de Oliveira 8 esses termos são
por melhor trabalhadas que forem essas noções, definidos da seguinte maneira:
dificilmente as usarão na sua vida cotidiana. Ao - Orientaçã0 9 :
tomar consciência desse fato, tendemos a "O ângulo horizontal de um determinado
abandonar o ensino dessas noções, habilidades ponto medido na direção dos ponteiros do
e conceitos, que "não são mais importantes hoje relógio, a partir de um ponto de reférência, para
em dia", para nos preocupar com "aquilo que um segundo ponto. (..) O ângulo horizontalnum
realmente importa": a dinâmica que leva a determinado ponto medido no sentido dos
sociedade a (re)construir suas territorialidades. ponteiros do relógio) a partir de um datum de
Discorremos então a partir desse outro objetivo, referência para outro ponto. O mesmo que
sobre as diferentes sociedades, suas ângulo de orientação. r. ..) A direção horizontal
peculiaridades históricas, sem no entanto, nos de um ponto terrestre para outro} expressa como
referir ou sem dar acerca do local onde distância angular a partir duma direção de
esses fatos ocorrem ou ocorreram, omitindo referência. É medida, habitualmente} a partir de
freqüentemente até o fato de que por causa dessa OOO~ numa direção de referência, no sentido dos
dinâmica social, as territorializações são alteradas ponteiros do relógio) até 360 0 • Os termos
e muitas vezes também influem na primeira. orientação e azimute) tem às vezes) uso recíproco,

Essa atitude decorre exatamente da falta de mas} em navegação) o primeiro é aplicado, quase

clareza sobre o que significa ensinar o aluno a sempre) a assuntos terrestres} e o segundo à

orientar-se e localizar-se geograficamente, e para direção de um ponto da esfera celeste, a partir

quê servem esses conhecimentos. Muitos de um ponto da Terra. }}

docentes entendem que as orientações e - Orientado geodésica:

localizações que fazemos no dia-a-dia, as quais "Sistema de controle horizontal apoiado em


nos referimos acima, são sinônimos da orientação um lado, cujo azimute geodésico é conhecido'~
e localização geográficas. Inicia-se aí a confusão
que vai acompanhar o docente até que ele desista "Determinação exata de um ponto ou detalhe
ensinar esse conteúdo, "porque nem numa carta ou numa fotografia; traçado de
mesmo e muito menos os alunos os utilizam", acabamento depois da marcação dos pontos
para ensinar um outro "mais útil" para a vida principais} como um diagrama; traçado e
cotidiana do corpo discente. marcação (um ponto) como num papel
É preciso ressaltar que, apesar de serem miJjmetrado, por meio de suas coordenadas;

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construção (duma cLUva) pela marcação de um conhecimentos, noções e habilidades de
número de pontos na sua trajetóría/ colocação orientação e localização geográficas. Podemos
de dados de levantamento num mapa. " citar o caso de muitos muçulmanos que
Localizado geográfica: necessitam de conhecimentos básicos de
": ..posição geográBca". orientação e localização geográficas, para se
Posição geográfica: voltarem em direção à Meca a fim de fazerem
"A posição de um ponto da superf1de da Terra, suas orações. Um outro exemplo, que pode ser
expressa em termos de latitude e longitude) seja citado para ilustrar melhor nossa afirmação, é o
geodésica ou astronômÍca." do piloto de avião, cujo exercício da profissão
Observa-se pelas definições acima que há uma implica, necessariamente entre outros saberes,
diferença muito grande entre os sinônimos no domínio de conhecimentos sobre oríentação
descritos pelo dicionário Aurélio e pelo e localização geográficas.
Dicionário Cartográfico. A principal é que o Depreende-se, a partir do que foi exposto
segundo utiliza-se de um conjunto de acima, que quando vamos ensinar ou fazer
conhecimentos e termos científicos para que referência aos termos orientação e localização, é
ocorra a ação de orientar e/ou localizar preciso que se tenha claro sobre qual deles
geograficamente, esta, em geral é realizada por estamos falando (orientação e localização
quem já foi iniciado no conhecimento sistemático cotidiana ou orientação e localização
dessas noções, habilidades e conceitos. Por sua geográficas), para não incorrer no equívoco de
vez, o primeiro define os termos de acordo com acreditar que a aprendizagem de noções,
os significados atribuídos pela maioria das habilidades e conceitos de orientação e
pessoas, ou pelo significado de uso comum da localização geográficas são imprescindíveis para
população e que não está baseado em nenhum que o sujeito possa realizar seus deslocamentos.
tipo de conhecimento científico, mas em ações A aprendizagem desses conhecimentos é
cotidianas realizadas pela maioria das pessoas. importante para o estabelecimento de raciocínios
A partir dos sinônimos explicitados por ambos geográficos, ou para que haja um entendimento
os dicionários chega-se à seguinte conclusão: geográfico da realidade, é claro que isso talvez
existe uma diferença muito grande entre acabe implicando, na realização de
orientação e localização em nível de ações deslocamentos mais racionais e mais autônomos
cotidianas e orientação e localização geográficas. por parte do sujeito que tem domínio sobre esses
As primeiras imprescindíveis, a qualquer sujeito conhecimentos, o que não quer dizer que o
e aprendidas nas suas ações e relações cotidianas objetivo do ensino de Geografia tenha que se
com o espaço empírico e, as segundas, apoiar somente nessa justificativa. Entendemos
imprescindíveis a alguém que queira realizar que a mesma é válida mas insuficiente para
entendimentos geográficos sobre o mundo e justificar o ensino dos conhecimentos a que nos
aprendidas necessariamente na escola. referimos acima. O ensino das noções,
Depreende-se também das afirmações acima habilidades e conceitos de orientação e
que os conhecimentos, noções e habilidades localização geográficas se justificam, em grande
sobre orientação e localização geográficas, serão parte, na medida em que se constituem em
imprescindíveis aos sujeitos que quiserem conhecimentos básicos para que o aluno
estabelecer uma compreensão geográfica da estabeleça raciocínios de ordem geográfica, ou
realidade e, assim, estabelecer raciocínios de em outras palavras, para entender a lógica das
cunho geográfico. Isso não quer dizer que os territoríalizações produzidas pela humanidade.
mesmos são perfeitamente dispensáveis para É preciso ter claro que não podemos enfatizar,
quem não objetiva essa compreensão apenas que, em sala de aula, somente o trabalho com noções
bem ou mal, os sujeitos conseguem se orientar e de localização e orientação geográficas. A
localizar sem ter nenhum conhecimento sobre aprendizagem desses conhecimentos é
orientação e localização geográficas. É preciso importante, desde que eles estejam
salientar que, em algumas sociedades, a cultura, contextualizados, ou seja, desde que sirvam para
a inserção do indivíduo no mundo do trabalho, que o aluno possa entender melhor o território
os costumes, a religião, entre outros fatores, em que vive.
impõem a necessidade da aprendizagem de O que se observa em geral nos dias de hoje é

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o ensino e aprendizagem dessas noções, aprendizagem dessas noções, conceitos e
habilidades e conhecimentos de forma estanque, habilidades, mas que elas são básicas e
os professores trabalham de um a dois meses esse elementares para quem quiser estabelecer ou
"conteúdo" para depois ensinarem outros. Esse construir um raciocínio geográfico.
tipo de prática decorre de uma determinada
concepção de Geografia que é muito presente
em sala de aula, esta tenta trabalhar alguns O ENSINO E APRENDIZAGEM DAS
elementos da realidade, transformando-os numa NOÇÕES, HABILIDADES E CONCEITOS
série de conhecimentos especializados e DE ORIENTAÇÃO E LOCALIZAÇÃO
dicotômicos. Entendemos que tal prática deve GEOGRÁFICAS: UM BREVE ESBOÇO DO
ser superada, para que a disciplina de Geografia COTIDIANO ESCOLAR
se torne necessária do ponto de vista do aluno.
Deve-se privilegiar nessa disciplina o O mapa nas escolas em geral é usado, como
pensamento, o entendimento da realidade recurso para localização e orientação dos
geográfica pelo aluno e não somente a descrição fenômenos geográficos que serão ou estão sendo
e a memorização, como muitos docentes fazem estudados em sala de aula e a constatação é a
hoje em dia. principal atividade desenvolvida pela maioria dos
É preciso salientar que para se ensinar as professores de Geografia, que pouca importância
noções, habilidades e conceitos de orientação e dão ao entendimento de determinados territórios
e, muito menos, ao significados que estes
localização geográficas faz-se necessário uma
possuem para os alunos.
relação de ensino e aprendizagem que não
Como dissemos anteriormente, por causa de
privilegie meramente o ponto de vista técnico
inúmeros problemas decorrentes de uma má
desses conteúdos, mas que esteja preocupada
formação, na maioria das vezes, o professor
com a utilização dessas formas de orientação e
delega a escolha do conteúdo a ser trabalhado
localização para um melhor entendimento do
no ensino de Geografia ao livro didático, ou ao
espaço geográfico. Enfim, no que se ao
autor do mesmo. Num estudo sobre essa
Ensino Fundamental e Médio acreditamos que questão, Freitag lO , a partir da leitura de inúmeras
a relação pedagógica que se deve estabelecer pesquisas sobre o uso do livro didático pelo
entre professor, aluno e esse tipo de saber é professor, afirma que os mesmos fazem a
aquele citado logo acima. Não há a necessidade, indicação dos manuais a serem utilizados
por exemplo, dos alunos saberem toda a história baseados em critérios bem heterogêneos: aspecto
da construção dessas noções, e nem das gráfico, envio gratuito do livro pela editora,
condições materiais necessárias, para que esses presença na lista de documentos governamentais,
conhecimentos fossem engendrados, muito indicação por um colega. A escolha não se faz,
menos que os discentes saibam definí-los do portanto, a partir dos objetivos que o docente
ponto de vista técnico. tem em relação ao ensino e ao aluno e o pior é
necessário que o aluno saiba esses que esse processo todo ocorre de forma pouco
conhecimentos para que ele consiga situar-se nas crítica, pois segundo a mesma autora:
aulas de Geografia e também em relação aos
próprios conteúdos geográficos quando o '~ ..
O livro didático não funciona em sala
professor utilizar termos como: sudoeste asiático, aula como um instrumento auxiliar para
países das baixas, altas e médias latitudes, Europa conduzir o processo de ensino e transmissão
Oriental e Ocidental, Países meridionais, do conhecimento, mas como o modelo­
setentrionais, ocidentais, orientais, tropicais, padrão, a autoridade absoluta, o critério
equatoriais, e outros. Além disso, esse tipo de último de verdade. lveste sentido, os livros
conhecimento é básico, para quem quer parecem estar modelando os professores. O
estabelecer entendimentos geográficos da conteúdo ideológico do livro é absorvidopelo
realidade. É importante ter cuidado com o termo professor e repassado ao aluno de forma
sublinhado acima, porque não podemos acrítica e não di,tanciada. ); (Freita!ll )
confundir a palavra básico com central. Na
verdade, estamos querendo dizer que o ensino Na verdade, regra geral, o docente não
de Geografia não pode se esgotar na uma opção consciente dos conteúdos a serem

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estudados, em função dos objetivos que ele tem Apesar de termos afirmado anteriormente,
com o ensino. Por isso, determinados temas são que esse é um conhecimento básico, para quem
ou não trabalhados dependendo do livro didático quiser construir um entendimento geográfico da
adotado. Se por exemplo, os conteúdos sobre realidade verificamos que o ensino ou não do
orientação e localização geográficas são mesmo vai depender, na maioria das vezes, do
apresentados no início do livro didático, os livro didático adotado. É preciso, no entanto,
mesmos são trabalhados, regra geral, no início salientar que alguns professores ensinam esses
do ano. Caso o material didático não apresente conhecimentos apesar de não comparecerem no

, esses conteúdos, o professor não faz questão de


ensinar seus alunos, pois tem muito pouca clareza
da necessidade do ensino dessas noções,
habilidades e conceitos.
material ao qual fizemos referência (livro
didático). Em relação ainda aos livros didáticos,
poderíamos afirmar que, na verdade, autores
considerados "críticos" pouca importância dão a
J A falta de critérios críticos do professor para esse tipo de conhecimento, como se os fatos
avaliar o livro didático, acaba fazendo com que geográficos ocorressem "descolados" de
este último, seja o grande responsável pela determinados territórios, ou como se as relações
escolha dos conteúdos a serem trabalhados em das sociedades com os outros elementos da
sala de aula. Em outras palavras, existe uma natureza e com outros homens não implicassem
subordinação do professor em relação ao autor na transformação, (re)produção e/ou
do livro didático no que se refere à visão de manutenção de uma determinada
mundo, opções teórico metodológicas e portanto, territorialidade. Em outras palavras, não se
à escolha do conteúdo e à forma como este vai considera questões referentes à orientação e
ser ensinado. localização geográficas em função de que esses
Ao examinar alguns livros didáticos de conhecimentos são considerados, por alguns
Geografia para o Ensino Fundamental, autores, como elementos que fazem parte do
percebemos uma nítida diferença entre os ideário daquilo que chamamos comumente de
mesmos. Aqueles mais conhecidos como "Geografia 1hdicional".
tradicionais trazem, geralmente nos primeiros É preciso, no entanto, explicitar que não é
capítulos, tópicos que tratam do ensino e da porque não se enfatiza os conteúdos acima
aprendizagem dos conteúdos de orientação e citados que a Geografia será "critica". Houve,
localização geográficas. Os livros mais na verdade, um equívoco sobre o entendimento
conhecidos como críticos, muitas vezes, não do que era fazer "Geografia Crítica" nas escolas.
trazem esses conteúdos ou o fazem Confunde-se como afirma Santos 12 , até hoje,
"homeopaticamente", trazendo-os no final de aquilo que conhecemos como Geografia Crítica,
alguns capítulos em colunas denominadas: saiba com um amontoado de discursos panfletários
você sabia que ... , para saber mais, e outros. sobre os últimos acontecimentos, ou com um
Verifica-se então que, dependendo do livro discurso político-partidário que, na maioria das
didático adotado em sala de aula, o professor tem vezes, ao invés de contribuir para a construção
maior ou menor possibilidade de trabalhar ou de uma efetiva cidadania, ou para a formação de
não com os conteúdos acima citados. uma pessoa que tenha mais autonomia
Em relação aos livros que trazem, nos intelectual, acaba contribuindo,
primeiros capítulos, conteúdos sobre orientação contraditoriamente, para a sua marginalização em
e localização geográficas, é preciso destacar que relação ao acesso dos conhecimentos socialmente
os mesmos dão um tratamento estanque a esses construídos pela humanidade.
conteúdos. Muitas vezes, observamos que os Tendo em vista essa primeira diferenciação,
mesmos são trabalhados em apenas um capítulo no tratamento dos conteúdos de orientação e
do livro para, logo em seguida, serem localização geográficas, a partir dos livros
abandonados. Em outras palavras, trabalha-se didáticos, passaremos a refletir sobre como tem
exaustivamente esses conteúdos durante certo sido a relação do professor do Ensino
período, para depois estes serem esquecidos Fundamental e Médio com esse tipo de
ou marginalizados, como se a compreensão conhecimento.
geográfica da reaHdade não prescindisse dessas :\' o que se refere à prática pedagógica do
noções, habilidades e conceitos. professor, podemos fazer uma série de

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l
L_ _ _ _ __
-
considerações. Iniciaremos pela forma como esse isso não fica muito claro para o aluno. Em outras
conhecimento é ensinado, ou seja, apesar do palavras, este último não ê provocado a ponto
saber ser o mesmo, no processo de ensino e de tentar encontrar utilidade para os
aprendizagem ele passa por uma transformação: conhecimentos sobre orientação e localização
de apenas "saber" transforma-se em "saber a ser geográficas, não que o professor tenha que chegar
ensinado". na aula e dizer explicitamente: "A função
O saber a ser ensinado no que se refere a aprendermos noções básicas de orientação é .... "
orientação e localização geográficas, é trabalhado . Mas o docente tem que deixar claro que essas
regra geral, da seguinte forma: num primeiro noções sempre serão utilizadas para o
momento o professor das séries iniciais trabalha entendimento da realidade geográfica, através
algumas noções de lateralidade (direita, sua prática pedagógica. Quando se estudar as
esquerda, à frente, atrás, em cima e em baixo) territorializações produzidas pelas pessoas, o
para, em seguida, nas aulas de Estudos Sociais professor poderia a todo momento, utilizar
e/ou Geografia trabalhar com os pontos cardeais. termos geográficos que pressupõem o uso das
são ensinados a partir da observação do noções de orientação e localização geográficas,
lado onde o Sol nasce (nascente), e se põe a fim de que os alunos se familiarizassem com os
(poente). A partir do estabelecimento do termos e os incorporassem ao seu vocabulário.
nascente e do poente e, a partir do momento em Além disso, poderia-se também estabelecer uma
que o aluno consegue fazer distinção entre direita série de situações nas quais os alunos, a partir do
e esquerda, ensina-se, aproximadamente na 3 a lugar em que estivessem sentados, pudessem
série do Ensino Fundamental (2° ciclo), noções apontar para o rumo ou orientação de
básicas de orientação geográficas. determinados lugares.
As noções citadas logo acima, regra geral, são Para que o professor se relacione com o
ensinadas a partir de uma fígura e/ou através de conhecimento a ser ensinado da forma acima
experiências no pátio com as crianças. Fala-se brevemente descrita é preciso, antes de mais
para elas apontarem para a direção onde o Sol nada, que o mesmo saiba esse conhecimento e o
nasce com a mão direita, ou para verificarem no tenha incorporado às suas práticas cotidianas. Se
livro didático, a partir de uma figura dada que, essa relação com o saber não for colocada nesses
em geral, ê a de uma pessoa apontando para a termos para o professor, ou se a relação do
direção em que o Sol nasce, com a mão direita. docente com o "saber a ser ensinado" não for
direção, diz o professor para seus alunos: é essa, provavelmente vai ocorrer o que sempre
o nascente ou leste. isso, afirma-se para os ocorreu: o trabalho na escola com conteúdos
mesmos que à esquerda está o poente ou oeste, estanques e mal elaborados, que quase não
à frente o norte e atrás o sul. Após a realização servirão para nada, a não ser, como nos disse uma
dessas atividades no pátio, ou leitura do texto vez um aluno que entrevistamos "Para tirar notas
do livro didático, dá-se por encerrada o ensino nas provas".
dessa noções, habilidades e conceitos. A segunda consideração decorre da primeira,
Às vezes, com uma dose bem grande de boa pois a partir da forma com a qual o professor se
vontade, o professor faz alguns exercícios ou relaciona com o saber sobre orientação e
tenta orientar geograficamente a sala de aula, em localização geográficas, (regra geral, entende que
relação aos pontos cardeais. Sobre isso temos ê algo difícil de aprender, pois ele mesmo
duas considerações a fazer. demorou para fazê-lo e, muitas vezes não se
A primeira é a de que, na verdade, não utiliza desse conhecimento), ele tenta simplificar
estamos criticando as atividades que o professor o ensino, portanto, também a aprendizagem,
está realizando. Nossa crítica se situa mais acerca falando por exemplo, para o aluno que o Sol
do contexto em que o ensino desses nasce para o lado da porta da sala de aula, e se
conhecimentos se dão (a relação do professor põe para o lado da janela, de forma a simplificar
com o conhecimento a ser ensinado), ou seja, o conhecimento. Muitas vezes isso não ocorre
apesar do docente muitas vezes enxergar ou saber por má vontade, mas por causa de orientações
quais serão as utilidades ou vantagens de se recebidas de outras instâncias (coordenadores,
adquirir determinados conhecimentos, para o supervisores pedagógicos e outros, yue o docente
entendimento do espaço geográfico, geralmente considera mais competente tecnicamente

12 f ;,",n",."f,~ Londrina, v. 9, n. I, p. 5·24, jan./jun. 2000


falando), de que o professor deve trazer o se e localizar-se no mapa, utilizando somente esse
conhecimento para "perto do cotidiano do recurso, é uma atividade que implica na utilização
aluno". É preciso frisar que o docente muitas de determinadas noções, habilidades e conceitos.
vezes com o intuito de fazer com que o aprendiz Orientar-se e localizar-se na realidade é uma
entenda o que ele quer explicar, simplifica e outra diferente, agora, fazer isso no mapa e na
I incorre no perigo de mistificar e/ou deturpar o realidade, simultaneamente, ou utilizar um mapa
conhecimento, dando margem para para se orientar e se localizar no mundo é outra,

I entendimentos do tipo: "para saber onde o Sol


nasce preciso saber em que lado está a porta" (a
totalmente diferente que requer noções,
habilidades e conceitos utilizados na primeira e
porta torna-se o invariante), ou "o Sol sempre segunda atividades descritas anteriormente.
nasce a leste, que está sempre à minha direita, É preciso salientar que o sujeito consegue
então se eu apontar com a mão direita em direção fazer orientações e localizações geográficas no
ao quadro negro, o leste vai estar nessa direção, mapa até mesmo guiando-se por pistas, e apesar
se apontar para o fundo da sala o muda de de não ter adquirido os esquemas mentais para
posição ... ". Verifica-se que a hipótese de que o realizar esses atividades, pode conseguir realizá­
Sol nasce a leste é correta, mas a outra, de que las utilizando-se de outros mecanismos ou pistas.
"o leste está sempre à minha direita" está O aluno não precisa necessariamente ter
equivocada. desenvolvido e aprendido as noções, habilidades
Como pode se observar, a eficiência ou não e conceitos de orientação e localização
do processo de ensino e aprendizagem vai geográficas, para resolver alguns exercicios
depender, em grande parte, da forma como o elaborados pelo professor, é daro que isso vai
professor se relaciona com o saber a ser ensinado, depender, em grande parte, do nível de exigência
isso porque muitas vezes o mesmo também é um desse último. No entanto, o que podemos
saber a ser aprendido, ou de outra forma, observar nos exercícios de sala de aula é que
constituí-se num saber a ser ensinado e que não não exigem muito raciocínio mas, em grande
foi aprendido pelo docente. parte, memorização.
Entendemos que isso ocorre muito No caso da orientação e localização no espaço
freqüentemente, principalmente nas séries empírico, como já dissemos anteriormente, a
iniciais do Ensino Fundamental (10 e 2° Ciclos), maioria das pessoas orientam-se e localizam-se
por causa da qualidade questionável da formação por pistas ou representações empíricas do espaço
a que esses docentes estão sujeitos. real (o muro, a árvore, a igreja e outros), alguns
A partir da 5 a série do Ensino Fundamental, semi-invariáveis que servem de ponto de
ou se retorna novamente aos conhecimentos referência. Denominamos esses objetos dessa
sobre orientação geográfica, para depois ensinar forma porque apesar desses elementos não
localização, ou parte-se diretamente para o modificarem-se diariamente, num certo intervalo
ensino da localização geográfica. Com relação a de tempo tal fato pode ocorrer, ao contrário do
isso, é importante lembrar que, na maioria das Sol e outros pontos de referência astronômicos,
vezes, quando o professor ensina o processo de que não variam numa escala de tempo curta, ou
orientação geográfica na realidade, o sujeito está cuja variação ocorre num intervalo de centenas
em determinado local, tentando se orientar a e até milhões de anos. No caso desse tipo de
partir de algum invariável disponível (Sol, Lua, localização e orientação, faz-se necessário a
outras Estrelas ou Constelações). Ao iniciar-se o utilização somente das noções de espaço que
r ensino da localização geográfica, passa-se a
utilizar mapas, e o aluno nesse processo se coloca
desenvolvemos desde o nosso nascimento e que
foram seriamente estudadas por Piaget e
~ como observador e não mais como ser que fazia
parte ou que estava inserido no espaço. Verifica­
Inhelder 13 •
O problema se torna maior para o usuário na
~ se portanto, uma ruptura entre os espaços onde terceira situação citada acima, pois o sujeito deve
ocorreu a orientação geográfica, daquele em que fazer diversas idas e vindas do real, para a

, se vai fazer a localização geográfica. No primeiro,


o sujeito está no espaço, fazendo parte dele, no
segundo torna-se mero observador.
Do fato acima exposto, decorre que orientar-
representação e desta para o primeiro. Deve
adequar seus sistemas de orientação e
localização, ao sistema do mapa que é geográfico,
e realizar as idas e vindas do real para a sua

l
I
f
Geografia, Londrina, v. 9, n. 1, p. 5-24, jan./jun. 2000 13

I
-- ....... _--~~~-

representação, até que consiga orientar-se e/ou devemos nos questionar sobre a relevância do
localizar-se no espaço. que foi aprendido. Muitas vezes, em relação às
Na verdade, é nessa situação que o aluno noções, habilidades e conceitos de orientação e
deveria "amalgamar", relacionar, fundir os dois localização geográficas, o aluno aprende com o
tipos de representações de orientação e professor que esses conhecimentos nâo têm
localização (cotidianas e geográficas) . No importância nenhuma, ou que eles nunca
entanto, como freqüentemente vemos, o ensino utilizá-los ao longo da sua passagem na escola, a
de Geografia dificilmente chega nesse nível. não ser nos dias da prova.
Regra geral, o que se observa é o professor Na verdade, como todo objeto de reflexão
enfatizar ora uma, ora outra atividade, não geográfico pode ser localizado e orientado, todos
ocorrendo, portanto, a necessária fusão entre os estudos da Geografia deveriam partir da
ambas. orientação e localização geográficas das
A ruptura entre as perspectivas do observador diferentes territorialidades produzidas pelo
nos espaços de orientação e localização acima homem. Esse, poderia ser o ponto de partida,
citados, explica o fato de que muitas vezes os para o estabelecimento de raciocínios, para o
alunos não conseguem distinguir a direção das entendimento do espaço geográfico.
latitudes e longitudes, ou nem sabem que ambas A importância da aprendizagem desses
tem direções opostas, exatamente para que se conhecimentos, se dá na medida em que
possa localizar algum ponto na Terra, (a também vâo auxiliar o aluno na leitura e
localização através coordenadas geográficas entendimento dos mapas, que representam as
implica, necessariamente, na existência de territorializações produzidas pelo homem.
perpendiculares), ou pior, não sabem que a
localização de um ponto depende de duas
coordenadas: latitude e longitude 14 . O ENSINO E APRENDIZAGEM DAS
O processo de ensino e aprendizagem de NOÇÕES, HABILIDADES E CONCEITOS
noções de orientação e localização geográficas, DE ORIENTAÇÃO E LOCALIZAÇÃO
quando ocorre, se dá nos moldes acima GEOGRÁFICAS: O COTIDIANO ESCOLAR
esboçados, ou seja, a relação que o professor tem REVISITADO À PARTIR DE ALGUNS
com o "saber a ser ensinado" e a relação que o PONTOS DE VISTA
aluno tem com o "saber a ser aprendido" não é
das melhores. Ambos se relacionam com esse Afirmamos anteriormente, que o trabalho
conhecimento, como se ele somente existisse com mapas em classe, nas aulas de Geografia,
para o professor avaliar o aluno e, para o aluno resume-se ao uso dos mesmos como meio de
ser avaliado pelo professor. orientação e localização geográficas. Em função
Em relação ao trabalho com os conceitos de disso, fizemos um breve esboço de como se dá,
paralelos/meridianos e latitude/longitude, regra geral, o ensino e aprendizagem das noções,
verifica-se também o mesmo procedimento de habilidades e conceitos de orientação e
ensino. Em outras palavras, esses conhecimentos localização no cotidiano escolar.
também são trabalhados, regra geral, de forma Tendo em vista as práticas retratadas
estanque do restante do conteúdo "geográfico", anteriormente, iremos tentar revisitá-Ias, a partir
ou em outras palavras, os conhecimentos de algumas teorias que procuram refletir mais
considerados como geográficos são trabalhados amplamente sobre a questão do processo de
separadamente das noções, habilidades e ensino e aprendizagem.
conceitos de orientação e localização geográficas. A partir da análise da produção de trabalhos
Tendo em vista o que foi exposto, é mais do na área de Educação e ensino de Geografia,
que provável que o aluno manterá as mesmas observamos ao longo da nossa reflexão que
relações com esse saber que o professor. parece existir um fosso entre as metodologias de
Depreende-se então que, na verdade, o aluno ensino propriamente ditas, e o restante da
poderá reproduzir a relação que o docente produção científica na área. Na verdade, as
mantém com o saber a ser ensinado. primeiras parecem, grosso modo, não dar conta
Nesse sentido, podemos afirmar que o ensino das dificuldades de ensino e aprendizagem, pelas
é sempre muito eficiente. O aluno sempre quais passam os professores e alunes. Isso se deve
aprende, no entanto, enquanto educadores ao entendimento dicotomizado de dois processos

--~~-~---~--------- ....... - _..

~ .. ~

14 :reo<gra'I12, Londrina, v, 9, n. 1, p. 5-24, jan./jun. 2000


que não devem ser entendidos separadamente: são as dificuldades efetivas que seus alunos
ensino e aprendizagem. Entendemos que os possuem para aprender determinado assunto.
mesmos estão intimamente ligados, pois somente Na verdade, quando o professor não
poderemos propor formas de ensino se tivermos considera as dificuldades dos alunos no processo
clareza das dificuldades de ensino e de ensino, está negando o fato de que se constrói
aprendizagem que professores e alunos passam conhecimentos novos ou, se aprende sempre a
nesse processo. partir das representações prévias que os últimos
É preciso salientar que existem pesquisas que têm. Segundo Santosl 7 :
se preocupam com um ou outro fenômeno, ou
seja, ou se preocupam somente com a questão ': .. é com estas representaçôes espontâneas
da aprendizagem, ou, num outro extremo, se que a criança inicia a aprendizagem formal J)

preocupam somente com a questão do ensino.


Ao nosso ver, dar ênfase somente a um ou outro Nota-se no caso do ensino de Geografia, um
componente do processo de ensino e certo descaso em relação à essas representações.
aprendizagem não proporciona a resolução dos Em função disso, é importante explicitarmos um
problemas de aprendizagem dos alunos. Muitas conceito de representação que nos auxilie no
vezes, esse suposto problema materializa-se em entendimento daquelas elaboradas pelos alunos.
função da dificuldade de ensino do professor e/ Santos 18 cita De Ketelle, ao explicitar seu
ou constitui-se por causa de dificuldades de entendimento sobre o conceito de representação
aprendizagem dos alunos. Por isso, é necessário e que tomaremos emprestado:
para tentar entender o processo de ensino e
aprendizagem de conteúdos específicos, olhar " ... entendemos as representaçôes como
para o problema na sua totalidade, ou seja, sínteses mentais de informações) maÍs ou
precisamos considerar os três elementos que menos carregadas afectivamente) que a pessoa
participam do processo de ensino e constró~ mais ou menos conscientemente) a
aprendizagem: professor, aluno e conhecimento partir do que ela própria t; do que foi e do
(a ser ensinado, pelo primeiro e, a ser aprendido que projeta e guia seu comportamento. São)
pelo segundo). pois) visôes de mundo e vísôes de nós próprios
Segundo Johsua e Dupin 15 : inseridos nesse mundo) construídas em
função da dialédca bipolar sujeit%bjeto, De
"La structure didactique est en eflet facto pressupomos que a realidade é sempre
consdtuée non de trois pôles superposés apercebida de forma pessoal pelo sujeito
professeur, l'éleve le savoir - mais des
J sendo essa percepção dependente das
relatíons ternaires entretenues par ces trois representaçôes preexistentes em cada um.
pôles) lesquelles ne se manifestent qu en J Assim) a representação que temos do mundo
situatíon d enseignement."16
J
é sempre subjedva. É como se fôssemos um
espelho onde se constrói uma representação
o que tem ocorrido ultimamente, que da realidade que tem a ver com essa realidade
contraria o que os autores afirmaram acima no mas também com o espelho onde ela se
que se ao ensino de Geografia, é que projeta. Por conseguinte) a mesma realidade
alguns pesquisadores se ocupam em elaborar está na origem de múltiplas representações
propostas de trabalho para determinados diferentes, )J

conteúdos e outros preocupam-se somente com


a questão da aprendizagem. Essa atitude, a nosso Pela exposição acima, pode-se afirmar que se
ver, pode acabar provocando a efetivação de o professor não tiver noção das representações
práticas de ensino muito pouco eficientes. dos alunos, no que se refere ao assunto a ser
Ensino, aprendizagem e saber fazem parte de trabalhado em sala de aula, dificilmente poderá
uma totalidade que, se analisadas propor estratégias de ensino eficientes, O que
separadamente, podem acabar materializando­ pode acabar fazendo com que, ao final do
se em práticas pedagógicas inócuas pois, muitas processo, o docente não consiga repensar a sua
vezes, o professor utiliza determinadas técnicas prática pedagógica, culpando a metodologia
ou formas de ensino sem saber, na verdade, quais utilizada e/ou, na pior das hipóteses, este pode

lIE,c)lZn,na. Londrina, v. 9, n, 1, p. 5-24, jan./jun. 2000 15


acabar taxando seus alunos de despreparados, grande grupo. Escolhe situações desafiadoras
imaturos, ou incapazes para a aprendizagem de ( ..) adequadas a cada grupo e às crianças que
determinados conteúdos. o compõem. Prevê e imagina soluções
Atualmente, alguns autores têm trabalhado possíveis das crianças aos problemas que
com o conceito de contrato didático 19 . Segundo possam surgir e pensa já em estratégias e
os mesmos, este estabelece-se no processo de novas questões que possam desafiá-las ou
ensino e aprendizagem, e distribui papéis encaminhar soluções. »
diferentes a professores e alunos em relação a
um objeto de conhecimento. Parte-se do Pelo que foi explicitado acima, observamos
pressuposto de que esses sujeitos possuem dois que o terceiro tipo de relação é o que seria ideal
registros epistemológicos diferentes sobre o para que o processo de ensino e aprendizagem
conhecimento, que vão distinguir os seus papéis se efetivasse. Os dois primeiros tipos, regra geral,
no contrato didático. É a existência do mesmo correspondem ao que ocorre atualmente na
que permite que essa estrutura didática funcione prática docente, situam-se num posicionamento
de maneira equilibrada. que vai do autoritarismo a uma certa liberdade
Brousseau citado por Koch20 , analisou três incondicional. Acreditamos que apesar do último
tipos de contratos didáticos que caracterizam três contrato ser o mais adequado, do ponto de vista
tipos de relações entre os elementos: professor, da concepção de aprendizagem que defendemos,
aluno e saber. Observamos que, em geral, são podemos afirmar que esse, é quase inexistente
esses três tipos de contratos que se materializam nas nossas escolas dos diferentes niveis de ensino.
na sala de aula. No último contrato, aprender e ensinar são
No primeiro tipo de relação: ações diferenciadas, e nela estão inseridas pelo
menos dois sujeitos que participam desse
"... o proFessor detém o monopólio do processo: aquele que ensina (professor) e aquele
conhecimento) escolhe o que e como que aprende (aluno). Aprender nessa concepção,
"transmitir" aos seus alunos) em geral significa elaborar conhecimentos como resposta
partindo de definições e/ou explicações e pessoal a uma pergunta. Esses conhecimentos,
depois propondo problemas. Para ele) todos devem funcionar ou ser modificados de acordo
sabem o mesmo) isto é, nada sobre o assunto com as exigências do meio. Ensinar por outro
que vai tratar. ( ..) ... o erro aparece aqui não lado, significa executar diferentes papéis para
como inerente ao processo (e portanto Fonte conduzir uma situação didática de ensin021 •
de conhecimentos) mas como desvio de O saber científico, que é ensinado na escola
aprendizagem. » ao contrário do que muitos educadores pensam,
deve necessariamente ser modificado
N um segundo tipo de relação, o professor (transposition didactique) de saber erudito deve
acredita que é o aluno que aprende e ele, passar a saber a ser ensinado e daí a ser aprendido
enquanto docente, não ensina nada. A partir pelo aluno, como afirmam Johsua e Dupin22 :
dessa concepção há uma valorização dos acertos,
e não pode ocorrer a intervenção docente na "On peut estimer que la transposition
capacidade de alguém aprender. Isso mantém os didactique concerne dans un prem1er temps
alunos um tempo maior com suas hipóteses les transFormations suivantes:
parciais ou equivocadas, pois fica a cargo dele -7 objet de savoir-'7 objet à enseigner-'7objet
ou do coletivo, a busca ou superação de um d'enseignement "23
estado de saber para outro. Podemos verificar a
existência desse tipo de contrato, em geral, nos Na verdade, o que os autores queriam
entendimentos equivocados alguns salientar com essa afirmação é que numa situação
educadores que acreditam que o professor não pedagógica (de ensino e aprendizagem) se
ensina, mas aprende com o aluno. distinguem várias representações de ciência, em
No terceiro tipo de relação: outras palavras, em torno de um mesmo saber
existem representações diferenciadas de
"O proFessor planeja} reBete) decide o que diferentes atores sociais que, segundo Santos24 ,
propor a cada grupo ou a cada a/uno, ou ao são as seguintes:

16 úe,7gnltJa, Londrína, v. 9, n. 1, p. 5-24, jan./jun. 2000


((Ciência do cientista: representações acontecimentos que ocorrem nos outros
consensuais da comunidade cientiBca, ou seja, elementos da natureza, tais como: direção em
representações que o cientista tem da ciência que o Sol "aparece" ao observador situado no
que produz; Planeta 1erra, inclinação dos raios solares de
Ciência do professor: representações que o forma diferenciada ao longo das estações do ano;
plvfessor tem da ciência curricular que ensina; Possibilidade de entrar em contato com alguém que
Ciência da criança: representações) mai'i ou poderia fornecer informações oralmente, e/ou
menos imediatas) que a criança tem da possibilidade de se orientar e se localizar através
realidade cientíBca e tecnológica que a cerca; elementos semi-invariáveis encontrados na área
Ciência do aluno: representações que o aluno urbana (placas, árvores, viadutos, pontes, prédios,
adquire (readquire) da ciência do cientista lojas, praças, igrejas e outros);
através da aprendizagem escolar.)) Falta de acesso aos mapas em geral, em função
do baixo nível de renda de boa parte dos nossos
Observa-se que as representações acima alunos da rede pública de ensino;
explicitadas trazem, a priori, a diferenciação do - Inexistência de possibilidades de mobilidade
sujeito enquanto aluno e criança. O primeiro é horizontal, ou seja, em função também do
um sujeito confrontado com um projeto baixo nível de renda, nossos alunos não têm
pedagógico, o segundo é um sujeito psicológico. possibilidade vivenciar expenencias que os
No entanto, pode-se afirmar que essa separação levem a sentir, na sua vida cotidiana, a
é apenas momentânea, pois a autora afirma em necessidade de usar o mapa enquanto meio de
outro ponto da sua obra que: orientação e localização geográficas;
Dificuldade de relativização das noções, pois
"... a criança enquanto sujeito psicológico e o para nos orientarmos na realidade, no mapa e
aluno enquanto sujeito epistemológico não na realidade com o mapa, necessitamos de
tãzem parte de conjuntos disjuntos. Assim, noções de orientação e localização geográficas
as representações construídas no dia-a-dia da relativas. Muitos alunos não conseguem
criança - passo obrigatório na construção do entender que o estado de São Paulo pode
conhecimento - são muitas vezes obstáculo a situar-se ao sul (do estado de Minas Gerais),
essa mesma criança) enquanto aluno de ao norte (do estado do Paraná), no sudeste (do
clencias~ para que se aproprie de Brasil), ao mesmo tempo. Além disso, para
conhecimentos cientíBcos. '!Z5 indicar a direção (rumo) de outros países, do
local onde estou, preciso ter agilidade ao usar
Depreende-se do exposto acima que é essas relações, pois os Estados Unidos pode
importante, num primeiro momento, a separação estar à direita, esquerda, ou em qualquer outra
da criança (sujeito psicológico) e do aluno (sujeito direção dependendo da posição do sujeito em
epistêmico), pois segundo a autora, algumas relação ao referido país;
representações que construímos no nosso - Dificuldade no estabelecimento da relação
cotidiano constituem-se em obstáculo para a todo-partes, pois como muitos alunos não têm
aprendizagem de conhecimentos científicos. representações sobre os vários municípios e
N o que se refere às dificuldades de estados existentes em seu país e, numa outra
aprendizagem e portanto, de ensino dos escala, também não têm representações dos
conceitos, noções e habilidades de orientação e continentes e países existentes no mundo,
localização geográficas, e ao uso do mapa, tendem a construir uma noção dos mesmos de
poderíamos afirmar que existe uma série de justaposiçã0 26 ;
fatores que poderiam ser considerados como Impossibilidade de visualização, a partir do local
obstáculos à aprendizagem: em que \"'Íve, com seus próprios sensores físicos
Falta de observação dos astros, do céu em geral (olhos), áreas ou superfícies da Terra muito
pela criança urbana, ou seja, a maioria das e:ll.1:ensas, o que dificulta a elaboração de imagens
atividades urbanas, ao contrário daquelas mentais27 do planeta, dos continentes; a imagem
denominadas de rurais, não exigem do sujeito mental dos mesmos deve ser construída portanto,
a elas ligado a observação ou o conhecimento, na escola, em contato com mapas de diferentes
mesmo em nível de senso comum, dos escalas e temas.

GeograBa, Londrina, v. 9, n. 1, p. 5-24, jan./jun. 2000 17


-
A nosso ver, na vida cotidiana, construimos aprendizagem. "tábula rasa" do aluno,
muitos conhecimentos, ou nos é exigido outros como se ele nunca tivesse ouvido falar sobre
conhecimentos que tendem a obstaculizar o uso determinado conhecimento para,
de mapas e coordenadas geográficas, enquanto posteriormente, cobrar em provas e trabalhos a
representações que nos propiciariam um aprendizagem que supostamente o professor lhe
determinado entendimento da realidade. outorgou em classe.
É preciso agora, explicitar um conceito As razões que podem explicar esse fato são
extremamente importante para a concepção de muitas: má formação profissional, salários
ensino que estamos tentando desvelar, é o de aviltados, relações autoritárias presentes na
obstáculo epistemológico. Bachelard no seu livro estrutura de ensino, falta de incentivo na
"A formação do espírito cienmico"28 que: implementação de pesquisas na área de
educação, falta de visão crítica em relação ao
({Os professores de ciências imaginam que o processo de ensino e aprendizagem, entre outros.
espírito começa como na aula) que é sempre Como afirmamos anteriormente, apesar de
possível reconstruir uma cultura falha pela pouco freqüente na rede de ensino, o terceiro
repetição da lição) que se pode fazer entender contrato, já explicitado anteriormente, é o que
uma demonstração repetindo-a ponto por exige um professor que agregue dentro de si
ponto. Não levam em conta que os competência técnica, que, em uma concepção
adolescentes entram na aula de física com ampla, se desdobra em compromisso político
conhecimentos empíricos já constituídos: não com uma educação de qualidade.
se trata) portanto) de adquirir uma cultura A orientação e localização geográficas são
experimenta~ mas sim de mudar cultura conhecimentos que devem ser aprendidos pelos
experimental, de derrubar os obstáculos já seres humanos na escola e que não se
sedimentados pela vida cotidiana." desenvolvem, espontaneamente, como as noções
de localização e orientação no espaço vivido, que
Observa-se que o conceito de obstáculo foram estudadas por Piaget e Inhelder. A esse
epistemológico pode nos auxiliar a repensar as respeito é importante lembrar que a humanidade
práticas escolares cotidianas, pois o professor levou séculos para a estruturação desse
muitas vezes não consegue compreender porque conhecimento, pois houve a necessidade do
seu aluno não aprendeu o que lhe foi ensinado, desenvolvimento de uma série de condições
ou não entende como o aluno pôde se apropriar materiais necessárias para a sua construçã0 30 .
do conhecimento como demonstrou em algum Além disso, nem eram todas as pessoas que
instrumento de avaliação. tinham acesso a esse tipo de conhecimento,
É preciso considerar, portanto, as apenas os estudiosos e exploradores da época é
representações cotidianas dos alunos, para que que entraram em contato com o mesmo, o
se possa apreender e/ou entender quais são os homem comum, ou seja, aquele que não
obstáculos que dificultam a aprendizagem de necessitava desses conhecimentos para sua
determinado conhecimento.l'\este sentido, trata­ sobrevivência não teve acesso ou este era restnt:o
se também de rever o entendimento do O que pudemos verificar após as leituras,
significado que o "erro" do aluno tem para o principalmente dos estudos presentes na obra
professor. Segundo Koch 29 : Piaget e Inhelder31 "A representação do espaço
na criança", é que eles nos auxiliam para o
"O "erro fator importante para o professor
J) entendimento da forma como o sujeito se orienta
descobrir quehipóteses faz(em} seu(s} ailmo(s), e se localiza no seu espaço vivido, como o mesmo
aparece aqui não como inerente ao processo (e vai construindo "espontaneamente"32, noções
portanto fonte de conhecimentos)) mas como espaciais que o auxiliarão nas percepções e
desvio de aprendizagem." representações das ações e dos objetos . Isso
porque estavam preocupados com a
Percebe-se que o erro ainda é concebido pelo estruturação da representação do espaço, ou com
professor e pela escola, não como uma a questão de como se dá a evolução espontânea
representação do aluno a ser re-trabalhada, re­ das noções e representações do espaço no ser
arranjada, mas como um desvio de humano, na sua relação com o meio físico e social.
- - - - - - - - _.... _ _...... - - - - - - - - ­ ------------
18 Geografia, Londrina, v. 9, n. 1, p. 5-24, jan./jun. 2000

É preciso notar que, para os autores, a ação de social. Não há a preocupação com o aluno, ou
representar consiste em evocar objetos em sua com os conhecimentos que os mesmos aprendem
ausência ou duplicar a percepção em sua na escola. Na verdade Piaget, procura através do
presença. Para que isso ocorra, faz-se necessário "Método Clínico"34 verificar quais são os
a diferenciação e coordenação entre significantes mecanismos do pensamento responsáveis pela
e significados. Por exemplo, posso evocar a idéia mudança de comportamento da criança, "do não
de cadeira ou sua imagem, na sua ausência, e/ou poder fazer" para o "poder fazer". Observamos
na sua presença posso observar a sua constituição, uma preocupação com a lógica do pensamento
se é de madeira ou outro material qualquer, quais da criança, ou seja, uma preocupação com as
outros objetos foram utilizados para a sua características de cada fase do pensamento que
fabricação. Consigo estabelecer esses norteia e diferencia a atitude de "não poder
pensamentos pois já sei diferenciar o objeto da fazer" com a outra de "poder fazer".
palavra que o representa. Melhor explicando, Em função do que foi exposto anteriormente,
com início da estruturação da representação e é preciso que se tenha claro que a transposição
da linguagem, aprendo que existem símbolos que direta das teorias piagetianas para a proposição
representam o objeto na sua ausência, esses são de conteúdos para o ensino de Geografia, como
os signos que são símbolos coletivos e arbitrários, vem ocorrendo, pode resultar em ações
que podem ser utilizados para nos referirmos ao pedagógicas cuja eficiência no que se ao
objeto do qual estamos falando. No caso da entendimento geográfico da realidade podem ser
representação que se à construção da questionadas. Na verdade, não estamos
noção de espaço, ou seja, no caso da querendo afirmar que os entendimentos
representação espacial, Piaget diz que ela é uma piagetianos sobre o desenvolvimento cognitivo
ação interiorizada e não simplesmente a do sujeito não auxiliam o fazer pedagógico,
imaginação de um dado exterior qualquer. apenas estamos querendo problematizar uma
Do exposto acima, pode-se observar uma atitude, que vem se tornando comum na rede
certa diferença entre a concepção de oficial de ensino, principalmente nas séries
representação desse último, daquela dos autores iniciais, que é a de ensinar noções e habilidades
aos quais nos referimos e que trabalham com o espaciais aos alunos, sem considerar as
ensino. Na verdade, as concepções de representações já desenvolvidas pelos mesmos.
representação apesar de serem próximas, cada Lerner35 , ao citar Piaget, para mostrar que o

l uma delas possui sua especificidade pois o foco


de análise da psicologia piagetiana é o sujeito
epistêmico e o de Santos, por exemplo, se refere
próprio autor tinha consciência da limitação de
suas pesquisas no que se refere ao aspecto citado
acima, afirma o seguinte:
ao sujeito epistêmico, mas numa relação
pedagógica de ensino. "Pelo seu lado, Piaget (1974) estava tão
O núcleo de preocupação central das convencido de que a missão da escola é
pesquisas de Piaget foi, como diz Castorina 33 : comunicar o saber científJco e os produtos

I
culturais em gerai que lamentava não poder
"... como se passa de um estado de menor contribuir com dados psicológicos úteispara
conhecimento para outro de maior o ensino dos diferentes saberes espedfJcos,
conhecimento. Isto ~ se um sujeito em uma incitando a avançar nesse sentido.. ,"
l situação determinada não pode resolver certos
~ problemas e depois de um certo tempo consegue Verifica-se pela afirmação da autora, que o
fazer isso, a questão é estabelecerosmecanismos próprio Piaget tinha consciência de que seus

I~ responsáveispor talmudança entre o anãopoder


fazer" (que do ponto de vista do sujeito é outro
J
pouer r .1
IEiZel/ e o "~J r
puuer lazer "
..."
estudos sobre o sujeito epistémico não poderiam
auxiliar, ou auxiliavam muito pouco a pesquisa
na área de ensino e aprendizagem, e que este é
, Verifica-se que a afirmação acima nos propicia
um campo de estudos que deveria ser também
pesquisado.
! elementos para a compreensão do Boa parte dos profissionais, que buscam
desenvolvimento cognltlvo, do sujeito possibilidades de contribuições da teoria
epistêmico, que interage com o meio físico e piagetiana, para o ensino (conhecidos pelos que

Geografia, Londrina, v. 9, n. I, p. 5-24, jan./jun. 2000 19


criticam esse poslclOnamento como (. .. ) ao deduzir objetivos educacio11ais da
aplicacionistas), tentam converter o estudo das psicologia) esquecemo-nos de que a escola
estruturas intelectuais em objetivos de ensino. está inserida numa sociedade e que as
Um exemplo disso, no caso do ensino e finalidades da educação só podem emanar da
aprendizagem das noções de latitude e longitude, realidade social. (Leme?7 ).
JJ

no ensino fundamental, é o trabalho de Goes 36 ,


que elaborou tarefas operatórias para a Tendo em vista as considerações acima, é
preparação da construção das noções de latitude importante deixar claro que nossa reflexão não
e longitude, com base nas noções de referencial, procura propor nenhuma atividade de ensino e
direção e distância. A autora parte do pressuposto aprendizagem, pelo contrário, nos propomos
de que o professor deve, antes de ensinar os apenas a fornecer subsídios para os docentes
conhecimentos referentes à latitude e longitude, elaborem suas próprias reflexões sobre a questão.
trabalhar com tarefas operatórias (de É preciso reconhecer que, apesar de se
classificação, seriação, aprendizagem de relações preocuparem com o sujeito em diferentes níveis,
espaciais topológicas tais como em cima, a psicologia genética (sujeito epistêmico) e a
embaixo, atrás, em frente, direita, esquerda), que didática (aluno), têm pontos em comum, pois
irão preparar o aluno para melhor aprender ambas se ocupam da transformação do
conhecimentos geográficos. Verifica-se portanto, conhecimento. A primeira, preocupando-se com
que esse entendimento, coloca enquanto objetivo as estruturas lógicas que vão se desenvolvendo
e conteúdo do ensino de Geografia, apenas o na relação do sujeito com aquilo que
trabalho com algumas estruturas intelectuais que denominamos de meio físico e social e, a
permitiriam uma melhor aprendizagem do saber segunda, com a aquisição de saberes socialmente
ensinado na escola. construídos, cujo não acesso, pode implicar numa
Sobre isso, é necessário lembrar que muitos marginalização ainda maior dos alunos das classes
alunos, conseguem executar tarefas operatórias menos favorecidas, pois estes, quase não têm
em diferentes níveis, ou seja, não é porque o possibilidade de entrar em contato com esse
aluno não consegue trabalhar com eixos de saber a não ser na escola. Pode-se depreender
coordenadas geográficas (latitude e longitude) então que os teóricos, ainda que
que ele não utiliza, ou tem dificuldade em utilizar possuindo preocupações diferentes, não são tão
dois ou mais eixos de coordenadas para a estanques assim, pois ambos se preocupam com
realização de tarefas cotidianas. Pelo contrário, a questão da transformação do conhecimento.
o aluno pode conseguir executar ações no seu É importante deixar claro que as teorias de
cotidiano, como saber jogar Batalha Naval, mas Piaget sobre a representação do espaço na criança
quando for trabalhar com eixos coordenadas, nos auxiliam a entender, por exemplo, a ausência
aplicados a determinados conteúdos, poderá não de alguma operação em nível de desenvolvimento
conseguir fazê-lo. O problema então é descobrir cognitivo que pudesse estar influenciando na
quais são os obstáculos epistemológicos que aprendizagem dos alunos. Um aluno que não
fazem com que esse aluno tenha dificuldade em consegue um eixo de coordenadas de
lidar com determinado saber e, não estabelecer latitude e longitude pode ter essa dificuldade por
tarefas operatórias com o objetivo de que as vários motivos, inclusive pela falta de domínio
dificuldades sejam sanadas. Muitas vezes, apesar dessa operação em relação a conteúdos
da realização das tarefas operatórias, o aluno não específicos de localização.
consegue vencer a barreira da situação de não N o que se à aprendizagem das noções,
aprendizagem. habilidades e conceitos de orientação e
Essas posturas didáticas conhecidas como localização geográficas, especificamente, existem
"aplicacionistas" atualmente têm sido criticadas poucos autores que trabalham com a questão.
por dois motivos principais: Como já citamos anteriormente, Góes explícita
as noções que poderiam ser trabalhadas em sala
... tanto porque desvirtuam o sentído das de aula, para facilitar o ensino e/ou preparar
pesquisas psicogenéticas quanto porque estruturas cognitivas, para a aprendizagem de
desconhecem a natureza da instituição conceitos de latitude e longitude.
escolar. Em termos de referências bibliográficas no

20 Geografia, J.JV'HJJ,um, v. 9, n. 1, p. 5-24, jan./jun. 2000

Brasil, sobre o assunto da nossa reflexão, figuras sempre está à direita do observador, pode
encontramos na verdade um conjunto de propiciar certas confusões na aprendizagem dos
materiais (Propostas de ensino, livros didáticos, alunos. Melhor explicando, a visão das figuras
livros de apoio à prática pedagógica docente) com que o aluno vê nos livros apontando para a
propostas já elaboradas de como ensinar o aluno direita, pode fazer com que ele sub-entenda, caso
a se orientar e localizar geograficamente. o professor se descuide desse detalhe, que o leste
Regra geral, essas propostas seguem uma vai estar sempre à direita do observador.
mesma lógica que é a de ensinar os alunos a se Como a maioria dos escritos que encontramos
orientarem e depois, através de algumas sobre a aprendizagem das noções de orientação
atividades de exercício operatórias (Batalha e localização geográficas, segue mais ou menos
Naval para o uso de um eixo de coordenadas, as orientações descritas acima, resolvemos tomá­
por exemplo), procuram dar dicas de como los como exemplos de ensino aprendizagem, ou
ensinar os alunos a fazer localizações a partir do de exemplos das relações dos alunos e
uso das latitudes e longitudes. professores, com esse tipo específico de
No que se refere a forma de apresentação conhecimento.
desse assunto, nos livros didáticos Geografia Na verdade, em função de questões que não
em geral, vale a pena tomar emprestada as nos cabe entrar em detalhe no momento, a
observações de Goes 38 : prática pedagógica docente foi se tornando cada
vez mais dependente do livro didático, por isso,
"Os livros didáticos analisados começam a via de regra, o primeiro se torna o efetivador das
trabalhar o emprego de pontos de referência práticas e conteúdos trabalhados em sala de aula.
a partir de observações do Sol Nas primeiras Poderíamos até afirmar que, na maioria das vezes,
séries do primeiro grau) é iniciado o ensino o livro didático é o responsável pelos conteúdos
das direções cardeais através da observação escolhidos para o trabalho em classe, bem como da
do nascente. Atémesmo em livros destinados metodologia de ensino adotada para a
à segunda série aparecem ilustrações em que aprendizagem, como já observamos anteriormente.
um menino de braços abertos tem à sua direita função disso, verificamos que o trabalho
o leste) à esquerda) o oeste) etc. com os conhecimentos referentes a orientação e
Estabelecidas as direções) passa-se às plantas localização geográficas, fazem parte somente das
e mapas. A amplitude do espaço representado primeiras semanas de estudo, para
aumenta gradativamente) da casa e da sala­ posteriormente serem substituídos por outros
de-aula até o mapa múndi Na quinta série conteúdos. Verifica-se então que orientação e
do primeiro grau) por volta dos onze anos, o localização geográficas são conteúdos
aluno entra em contato com representações trabalhados separadamente, ou de forma
esféricas da Téna. JJ estanque de outros fenômenos considerados
geográficos.
Observa-se pelos comentários da autora que, Não é preciso entrar mais em detalhes sobre
regra geral, realmente é isso o que observamos o que encontramos nos livros e manuais
nos lh7foS didáticos, ou o que se faz para ensinar didáticos, acerca do ensino dos conhecimentos
noções orientação e localização geográficas, acima citados. Essa tarefa foi muito bem realizada
quando se trabalha com as mesmas. Num anteriormente por Goez. Apenas poderíamos
primeiro momento, se ensina as noções de dizer que esses materiais nos serviram como
orientação geográficas, utilizando uma figura que elementos para refletir a relação entre professor,
normalmente, traz um menino de braços abertos aluno e saber, no contexto da aprendizagem desse
apontando a sua direita para o Solou para a conteúdo em particular.
direção onde ele nasce (nascente ou leste), a sua Observamos que, em geral, há uma ruptura
esquerda para a direção onde ele se põe (poente muito grande dos livros de metodologia, com os
ou oeste). Costuma-se falar para os alunos, a de Educação em geraL Os primeiros, sempre
partir dessas posições anteriores, que tudo o que propondo atividades que não consideram as
está a sua frente será norte e, tudo que estiver representações dos alunos e, portanto, investindo
atrás, será sul. É importante salientar que essa em contratos didáticos pouco eficientes, e os
visão do movimento do invariante (So1), que nas segundos, refletindo sobre uma concepção de

Geografia, Londrina, v. 9, n, 1, p. 5·24, jan./jun, 2000 21

I
educação ideal, mas sem contribuir para a 5 MASSON, M., Representations graphiques et
questão do processo de ensino e aprendizagem. geographíe, p. 174.
Pudemos verificar que o caminho mais profícuo 6 Sobre a construção da noção do espaço na
para pensar o referido processo na área de criança consultar: PIAGET, J. e INHELDER,
Educação, ou em propostas de ensino eficazes, B., A representação do espaço na criança.
é aquele de interface entre as ciências cognitivas, 7 FERREIRA, A. B. de Dicionário Aurélio
a epistemologia, a teoria da comunicação e básico da língua portuguesa, p. 399-469 passim.
obviamente, a Geografia. 8 OLIVEIRA, c., Dicionário Cartográfico, p.
Ensinar e aprender são ações a serem 314-438 passim.
pensadas, refletidas e conduzidas pelo 9 Como o dicionário traz nove sinônimos, todos
especialista na área de ensino. Para isso, o mesmo eles com explicações; optamos por transcrever
deve ter a habilidade, de pelo menos, propor somente alguns, ou seja, aqueles que nos seriam
estratégias de ensino do conhecimento científico, úteis para diferenciar, orientação e localização
que considerem o saber do aluno e/ou suas geográficas, de orientação e localização cotidianas.
representações, o professor precisa saber também 10 FREITAG, B. e outros., O livro didático em
quais são os obstáculos epistemológicos a serem questão.
vencidos, no que se refere à aprendizagem de 11 FREITAG, B. e outros., O livro didático em
determinados conteúdos. questão, p. 111.
A dificuldade do saber pedagógico, a 12 Santos, D., Conteúdo e objetivo pedagógico
nosso ver, é grande em função das poucas no ensino da Geografia.
pesquisas na área de ensino, que compartilham 13 Sobre o desenvolvimento das noções de espaço
da concepção que ora discutimos. Apesar disso, na criança ver: PIAGET,]. e INHELDER, B.,
é possível, fazer a transposição teorias e A representação do espaço na criança.
reflexões produzidas em diversas áreas do 14 Quando se lê sobre as dificuldades dos alunos
conhecimento, para entender questões referentes a impressão que se tem é que elas só ocorrem
ao ensino de Geografia, o que possibilitaria a no Ensino Fundamental e Médio, é preciso
elaboração de novos entendimentos e debates e salientar que mesmo os alunos da graduação
portanto, o enriquecimento da diversidade de tem essa dificuldade. Muitos deles não sabem
análises e propostas de fazeres pedagógicos que que para se localizar um ponto na superficie
são elementos necessários quando se pensa em terrestre é preciso de duas coordenadas com
qualidade de ensino. sentidos diferentes (norte/sul, leste/oeste),
outros alunos imaginam que o leste acompanha
o deslocamento da sua mão direita, enfim
NOTAS poderíamos dar inúmeros outros exemplos com
os quais nos deparamos ao longo da nossa prática
1 MASSON, M., Representations graphíques et pedagógica, que expressa as dificuldades de
geographie. aprendizagem desses conhecimentos por alunos
2 Ir ... uma estática descrevendo a ordem do de diferentes níveis de ensino.
mundo, a outra dinâmica, produzindo novos 15 ]OHSUA, S. e DUPIK, J., Introduction à la
saberes sobre um mundo não diretamente didactique des sciences et des mathématiques,
legível, visão que dá sentido ao que não é p. 249.
obtido na primeira impressão." 16 A estrutura didática é com efeito constituída
:, MASSON, M., Representations graphiques et não de tres pólos superpostos o professor, o
geographie, p. 159. aluno, o saber - mas de relações ternárias
4 A primeira favorece encaminhamentos didáticos mantidas pelos mesmos, os quais manifestam­
tradicionais do tipo essencialmente indutivo, se somente em situação de ensino.
centrados numa aquisição de conteúdos factuais 17 SANTOS, M. E. V M. dos., Mudança
e de habilidades. A segunda privilegia raciocínios conceptual na sala de aula: um desafio
hipotético dedutivos e aquisições mais conceituais pedagógico, p. 22.
ou se interessa mais em processos explicativos e 18 SANTOS, M. E. V M. dos., Mudança
estão ligados a atitudes pedagógicas centradas na conceptual na sala de aula: um desafio
construção do saber pelos alunos. pedagógico, p. 19.

22 GeograiJa, Londrina, v. 9, n, 1, p. 5·24, jan./jun. 2000


19 Sobre esse assunto ver ]OHSUA, S. e DUPIN, 31 Sobre esse assunto ver: PIAGET, J. e
J., Introduction à la didactíque des sciences et INHELDER B., A representação do espaço na
des mathématiques. ; BROUSSEAU, G., Os criança.
diferentes papéis do professor. 32 Entenda-se espontaneamente quando a
20 KOCH, M. c., O contrato didático numa aprendizagem não ocorre a cargo de nenhuma
proposta pós-piagetiana para a construção do instituição socialmente reconhecida.
número, p. 78-80 passim. 33 CASTORINA, J. A., O debate Piaget-Vygotsky:
21 Sobre esse assunto ver: BROUSSEAU, G., Os a busca de um critério para sua avaliação, p.
diferentes papéis do professor. In: SAI2, C. P. 16.
1., Didática na matemática: reflexões 34 Para maiores esclarecimentos sobre o Método
psicopedagógicas. Nesse texto, o autor afirma Clínico ver: CARRAHER, T. N., O método
que o professor é o condutor da ação didática, clínico: usando os exames de Piaget.
dentro da qual ele exerce inúmeros papéis. 35 LERNER, D., O ensino e o aprendizado
22 ]OHSUA, S. e DUPIN, J., Introduction à la
escolar: argumentos contra uma falsa oposição,
didactique des sciences et des mathématiques, p.94.
p.194. 36 GOES, L. E. L., O ensino/aprendizagem das
23 Nós podemos estimar que a transposição
noções de latitude e longitude no primeiro grau.
didática se refere, num primeiro momento, às 37 LERNER, D., O ensino e o aprendizado
transformações seguintes: ~ objeto de saber
escolar: argumentos contra uma falsa oposição,
~objeto a ensinar ~ objeto de ensino.
p.95.
24 SANTOS, M. E. V. M. dos., Mudança
38 GOES, L. E. L., O ensino/aprendizagem das
conceptual na sala de aula: um desafio
noções de latitude e longitude no primeiro grau,
pedagógico, p. 20.
p.
25 SANTOS, M. E. V. M. dos.) Mudança
conceptual na sala de aula: um desafio
pedagógico, p. 41.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
26 Segundo Piaget, em sua obra "O raciocínio da
criança", ao pesquisar a noção de país, afirma
BACHELARD, G. A formaçiio do espírito científico.
que num primeiro estágio da mesma, a criança
Rio de Janeiro: Contraponto, 1996. 314p.
não tem noção do país e das cidades que ela ouve BROUSSEAU, G. Os diferentes papéis do professor.
falar, por isso justapõe essas diferentes instâncias In: SAIZ, C. P. I. Dídática da matemática: re±1exões
territoriais, como se fossem a mesma coisa. psícopedagógicas. Porto Alegre: Artes Médicas,
27 Segundo Piaget e Inhelder, na sua obra ''A 1996. p. 48-72.
representação do espaço na criança", a imagem CASTORINA,].A. O debate Piaget-V:vgotsky: a busca
é uma imitação motora, é uma acomodação da de um critério para sua avaliação. In:
ação própria do sujeito sobre o objeto. CASTORINA, J. A. e outros. Piaget-Vygotsky:
28 BACHELARD, G., A formação do espírito novas contribuições para o debate. 2.ed. São
científico, p. 23. Paulo: Ática, 1996. p. 7-50.
29 KOCH, M. c., O contrato didático numa FERREIRA, A. B. de H. Dicionário Aurélio básico de
língua portuguesa. Rio de Janeiro: Nova Fronteira,
proposta pós-piagetiana para a construção do
1988. p. 399-469.
número, p. 79.
FREITAG, B. e outros. O livro didático em questão.
30 A esse respeito ver KATUTA, A. M., Um breve
São Paulo: Cortez, 1989.159p.
histórico sobre a construção de mapas e o seu GOES, L. E. L. O ensino/aprendizagem das noções
uso por alunos de 5 á e 8á séries do 10 grau de latitude e longitude no primeirograu. Rio Claro,
Estudo de caso. Nesse estudo, procurou-se 1982. 182p. Mestrado em Geografia IGCE,
fazer um resgate da história da construção de Campus de Rio Claro, Universidade Estadual
mapas, dos conhecimentos necessários para Paulista Júlio Mesquita Filho.
que pudéssemos ter esse meio de comunicação ]OHSUA, S. e DUPI:\,]. Introduction àla didactique
tal qual nós o conhecemos nos dias de hoje. des sciences et des mathématiques. Paris: Presses
Além disso, procurou-se verificar se existe um Univel"Sitaires de 1993. 422p.
paralelo entre a história da construção de A. M. Um breve histórico sobre a
construção de mapas e o seu uso por alunos de 5 a
mapas e aqueles feitos pelos alunos de e 8á
a 8 a séries do 10grau - Estudo de caso. Presidente
séries do atual Ensino Fundamental.

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I
Prudente, 1993. 207p. Monografia de bacharelado OLIVEIRA, C. Dicionário Cartográfico. 4u ed. Rio
em FCT, Universidade Estadual de Janeiro: 1993. 646p.
Paulista Júlio de Mesquita Filho. PIAGET, J. O raciocfnío da criança. Rio de Janeiro:
KOCH, M. C. O contrato didático numa proposta Record, s.d.
pó-píagetiana para a construção do número. In: PIAGET, J. e INHELDER, B. A representação do
GROSSI, E. P. e BORDIN, J. (orgs.) espaço da criança. Porto Alegre: Artes Médicas,
Construtivismo pós-piagetiano: um novo 1993.507p.
paradigma a aprendizagem. Petrópolis: SANTOS, D. Conteúdo e objetivo pedagógico no
Vozes, 1993. p. 65-81. ensino de Geografia. Caderno Prudentino de
LERNER, D. O ensino e o aprendizado escolar: Geografla, nO p. 20-61,1995.
argumentos contra uma falsa oposição. In: SANTOS, M. E. V. M. dos. lVfudança conceptual em
CASTORINA J. A. e outros. Piaget-Vygotsky. sala de aula: um desafio pedagógico. Lisboa: Livros
novas contribuições para o debate. São Horizonte, 1991. 261p.
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GeograpllÍe. Les Sciences et l'education, nO
159-174,1993.

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