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A GEOGRAFIA E O USO DA LINGUAGEM CARTOGRÁFICA NA

EDUCAÇÃO BÁSICA

BITAR, Juliana Carla Muterlle – SEED/PR1


julianamuterlle@yahoo.com.br

SOUSA, Cícero Luís de– SEED/PR2


ciceroluis@gmail.com

Eixo Temático: Didática: Teorias, Metodologias e Práticas


Agência Financiadora: Não contou com financiamento

Resumo:

Nas discussões com os professores da rede estadual de ensino, durante a realização das
oficinas de Disseminação da Política Curricular e da Gestão Escolar, realizada pela Secretaria
de Estado de Educação, nos trinta e dois Núcleos Regionais de Educação do Estado do
Paraná, surgiu a necessidade de refletir sobre as questões relativas à Cartografia, na disciplina
de Geografia. Para muitos professores do Ensino Fundamental e Médio a Cartografia é vista
mais como um conteúdo da Geografia do que propriamente uma linguagem a ser
desenvolvida com os alunos. As interpretações dadas a esta situação fizeram aumentar as
dificuldades dos alunos em interpretar e analisar mapas. Muitos permaneceram no estágio de
copiá-los e colori-los. O desenvolvimento da linguagem cartográfica é necessário desde os
primeiros anos do Ensino Fundamental. Cabe aos professores alfabetizar cartograficamente
seus alunos, de forma gradativa e continua. Não é possível deixar a alfabetização cartográfica
concentrada em poucos momentos da vida escolar do aluno. Como seria estudar um fenômeno
em Geografia sem saber onde ele ocorreu? Qual é sua exata localização? Como entender a
organização do espaço geográfico, sem o auxílio dos conhecimentos cartográficos? Portanto,
a Cartografia é entendida como uma linguagem de fundamental importância na construção do
conhecimento da Geografia. Para tanto, os professores devem estar preparados para utilizarem
os conceitos e saberes da Cartografia a fim de formarem alunos mapeadores, capazes de fazer
análises críticas e reflexivas envolvendo os conteúdos geográficos, pois, tanto a Geografia
como a Cartografia são ligadas ao mesmo objeto - a investigação do espaço.

Palavras chaves: Linguagem. Cartografia. Geografia. Ensino. Aprendizagem.

1 Professora de Geografia da Rede Estadual de Ensino e Técnica Pedagógico do Departamento de


Educação Básica (DEB) da Secretaria de Estado da Educação do Paraná (SEED/PR).

2 Professor de Geografia da Rede Estadual de Ensino e Técnico Pedagógico do Departamento de


Educação Básica (DEB) da Secretaria de Estado da Educação do Paraná (SEED/PR). Mestrando em Gestão do
Território pela Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG).
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O estudo do meio é, talvez, um dos mais antigos modos de fazer pesquisa. Na


modernidade o meio foi estudado pelas Ciências Biológicas nas investigações a respeito de
sua ação sobre os organismos. Esse tipo de pesquisa foi incorporado pelas ciências humanas e
sociais em estudos a respeito da influência do meio sobre o ser humano e as sociedades, em
uma visão determinista. (ANTUNES, MENANDRO, PAGANELLI, 1999, p. 129).
A criança começa a observar o espaço em que está inserida desde a sua fase de recém-
nascido. Ao observar tudo o que está em seu entorno, delimita o seu espaço, destacando-o
dentre outros. A cada etapa de sua vida vai estabelecendo novas relações e conhecendo novos
espaços. As etapas de desenvolvimento de uma criança, desde o engatinhar, sentar e andar
dão início ao processo de conhecimento do espaço. “Nesse processo de conscientização do
espaço ocupado pelo próprio corpo há dois aspectos essenciais: o esquema corporal e a
lateralidade.” (ALMEIDA, PASSINI, 1999, p. 18).
O desenvolvimento do esquema corporal na criança ocorre gradativamente, desde o
seu nascimento até estar concluído na adolescência. A visão de espaço em uma criança é
ampliada gradativamente e na medida em que vai ganhando autonomia em seus
deslocamentos. Quando consegue sentar-se sua visão muda, diferente do momento em que
estava engatinhando, aumentando ainda mais a partir do momento em que consegue se manter
em pé. Em todas as fases, na exploração de seu espaço de vivência, descobre como ele está
organizado e os elementos que o compõem, sendo assim, a criança pequena conquista ao
poucos a autonomia em seus deslocamentos horizontais pelo espaço onde está inserida.
Já na escola ela passa a freqüentar um espaço diferente de sua casa e de sua vizinhança

[...] a criança aprende a ver e analisar a realidade, entende as relações entre o


homem e a relação deles com o tempo e o espaço. Ao mesmo tempo, é estudado o
meio que a criança pode desenvolver a sua natural curiosidade, o sentido da
observação e a atitude crítica diante dos fatos da natureza e da sociedade. Tudo isso
permite que aos poucos a criança se torne mais autônoma e desejosa de buscar novas
e criativas soluções para os problemas que encontra, não só nas atividades escolares,
mas principalmente no dia-a-dia de sua vida (ANTUNES, MENANDRO E
PAGANELLI, 1999, p. 131).

Na escola, tendo o professor como um mediador do conhecimento, a criança estuda o


espaço de forma diferenciada, dependendo da idade e da série que está freqüentando. O aluno
deve participar como sujeito ativo na construção do conhecimento, ampliando seu
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entendimento sobre o espaço, considerando que o professor organiza suas aulas de maneira
que estas dialoguem a teoria com os saberes cotidianos.
É na escola com o auxílio do professor que a criança desenvolverá a lateralidade de
forma clara. Antes disso, obviamente que ela deve ter desenvolvido as primeiras relações
espaciais denominadas de topológicas elementares que começam a se estabelecer desde o
nascimento e são a base para o entendimento das relações espaciais mais complexas,
trabalhadas durante as atividades escolares na faixa dos 6 - 7 anos. Dessa maneira, as
primeiras relações espaciais construídas pelas crianças

são as chamadas relações espaciais topológicas elementares. Como o próprio


nome indica, são as relações espaciais que se estabelecem no espaço próximo,
usando referenciais elementares como: dentro, fora, ao lado, na frente, atrás, perto,
longe, etc. Não são consideradas distâncias, medidas e ângulos (ALMEIDA,
PASSINI,1999, p. 31, grifo nosso).

Uma atividade realizada na escola que auxilia a criança na construção das noções de
lateralidade a partir do esquema corporal é a construção do mapa do próprio corpo. Segundo
Almeida e Passini (1999) a criança deve compreender a diferença entre concreto e a
representação, preparando-se para a utilização dessas noções em outras representações.
Mapeando o próprio corpo a criança toma consciência de sua estatura, da posição de seus
membros e dos lados de seu corpo.
A cada etapa de seu desenvolvimento a criança estabelece novas relações, verificando
o que está próximo ao lugar onde mora, qual e como é a seqüência de estabelecimentos de sua
rua, como os elementos estão organizados no espaço, o que separa a sua casa da casa do
vizinho, ou o seu prédio com o prédio vizinho, enfim como os objetos que fazem parte do
espaço encontram-se organizados. Essas relações são a base para o entendimento do espaço
geográfico. A partir delas a criança estará preparada para aprofundar o entendimento sobre os
estudos que de fronteiras e as divisões políticas entre municípios, estados e países. Cabe
destacar que os conceitos geográficos também são importantes para o entendimento dessas
relações. Portanto a

(...) eficiência ou não do processo de ensino e aprendizagem vai depender, em


grande parte, da forma como o professor se relaciona com o saber a ser ensinado,
isso porque muitas vezes o mesmo também é um saber a ser aprendido, ou de outra
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forma, constitui-se num saber a ser ensinado e que não foi aprendido pelo docente
(KATUTA, 2000, p. 13).

Em um determinado momento, a escala do corpo já não é mais suficiente, a criança


começa a ter outros referenciais que lhe auxiliem na localização dos objetos no espaço
geográfico ampliando sua visão. Este processo é denominado de descentralização. Assim, a
criança que partia do uso do seu próprio corpo como referencial para a localização dos
objetos, começa a perceber que outros referenciais podem ser usados sem que isso altere a
localização das coisas. (ALMEIDA, PASSINI, 1999, p. 34)
Nos anos iniciais do Ensino Fundamental, a criança pequena não consegue abstrair
alguns conceitos, pois ainda não desenvolveu essa capacidade, o que ocorrerá gradativamente.
Primeiramente a criança observa o espaço de vivência que ela irá explorar, dessa forma,
adquirindo noções de espaço. É na escola que o entendimento da organização da sociedade
deve ser trabalhado para que ela tenha uma compreensão maior do espaço geográfico. Através
da participação do aluno nas atividades desenvolvidas na escola é que pode ocorrer a reflexão
sobre a formação e organização do espaço geográfico, assim como dos elementos que o
constituem. Simielli (2007) propõem

para o ensino fundamental, com alunos de 1ª a 4ª série, trabalhar basicamente com a


alfabetização cartográfica, pois este é o momento em que o aluno tem que iniciar-se
nos elementos da representação gráfica para que possa posteriormente trabalhar a
representação cartográfica (SIMIELLI, 2007, p. 95).

Ao educar o aluno para a visão cartográfica devemos considerar o próprio interesse da


criança por imagens o que refletirá positivamente no processo da alfabetização cartográfica.
Cabe ao professor oferecer os recursos adequados como fotos, figuras, gráficos, tabelas,
imagens de satélite, mapas, trabalhando de forma lúdica, explorando a linguagem visual. É
importante “desenvolver a capacidade de leitura e de comunicação oral e escrita por fotos,
desenhos, plantas, maquetes e mapas e assim permitir ao aluno a percepção e o domínio do
espaço. (SIMIELLI, 2007, p. 98)
O aluno antes de ser um leitor ou um decodificador dos signos existentes em um mapa,
precisa entender como mapear o seu espaço. O lugar onde sua residência está localizada, o
entorno de sua escola ou o caminho de sua residência até a escola são exemplos de iniciação
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na atividade de mapear. Torna-se mais significativo partir do espaço conhecido, para


posteriormente ampliar a representação para espaços maiores. Assim, o objeto a ser mapeado
deve ser do conhecimento do aluno. Esse recorte é importante para o aprendizado e para o
reconhecimento do lugar onde sua casa esta localizada, além do entorno de sua residência, ou
seja, a quadra, o bairro e posteriormente ampliando para a sua cidade.
Segundo Almeida e Passini (1999) as noções de espaço de uma criança passam por
sucessivas transformações. O espaço vivido é aquele onde a criança se movimenta, brinca,
desloca-se, organiza tudo de acordo com os seus interesses. No momento em que a criança
consegue memorizar os caminhos percorridos, lembrando como este apresenta-se organizado,
compreende o significado de espaço percebido. O espaço concebido é aquele em que os
alunos estabelecem relações espaciais, adquirindo a capacidade de entender sobre a área
retratada em um mapa.
Na escola, depois de passar por algumas etapas do processo ensino-aprendizagem, no
qual o professor trabalha com a criança o esquema corporal, a lateralidade, as noções
básicas de orientação e localização geográfica, desenvolvendo conceitos que auxiliem a
criança a entender o espaço, ela terá condições de descrever ou desenhar o percurso de sua
casa até na escola a partir de suas observações e a localização de onde mora. (ALMEIDA,
PASSINI, 1999, p. 26)
Outras atividades auxiliam no entendimento do espaço geográfico pelo aluno. Ir ao
pátio da escola para fazer a observação do movimento aparente do Sol possibilita ao aluno
identificar o nascente e o poente, auxiliando na compreensão dos pontos cardeais. Essas
noções básicas de orientação geográfica ocorrem por volta da 3ª série/4º ano, quando o aluno
já estabeleceu a distinção entre direita e esquerda. Nessa atividade ele estenderá a mão direita
para onde o Sol nasce para identificar a direção leste; a mão esquerda apontará para onde o
Sol se põem e identificará a direção oeste. Nesta posição terá à sua frente o norte e atrás o sul.
Esse tipo de atividade torna-se realmente significativo quando o docente deixa claro

que essas noções sempre serão utilizadas para o entendimento da realidade


geográfica, através de sua prática pedagógica. Quando se estudar as territorialidades
produzida pelas pessoas, o professor poderia a todo momento, utilizar termos
geográficos que pressupõem o uso das noções de orientação e localização
geográfica, a fim de que os alunos se familiarizem com os termos e os
incorporassem ao seu vocabulário. Além disso, poderia-se também estabelecer uma
série de situações nas quais os alunos, a partir do lugar em que estivessem sentados,
pudessem apontar para o rumo ou orientação de determinados lugares (KATUTA,
2000, p.12).
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Durante a alfabetização cartográfica o aluno desenvolverá as noções de

visão oblíqua e visão vertical, imagem tridimensional, imagem bidimensional,


alfabeto cartográfico (ponto, linha e área), construção da noção de legenda,
proporção e escala; lateralidade/ referência, orientação. O desenvolvimento destas
noções contribui para a desmistificação da cartografia como apresentadora de mapas
prontos e acabados. O objetivo das representações dos mapas e dos desenhos é
transmitir informações e não simplesmente objeto de reprodução (SIMIELLI, 2007,
p. 98).

As noções propostas por Simielli (2007) precisam ser superadas e entendidas pelos
alunos. O aluno entre 6 e 7 anos, muitas vezes apresenta dificuldade em entender a visão
vertical e oblíqua, considerando que no seu cotidiano ele tem uma visão lateral dos elementos
que compõem o espaço geográfico. Transpor essa dificuldade requer do professor subsídios
como a utilização de elementos presentes no dia-a-dia da sala de aula. A própria borracha ou a
mesa utilizada pelo aluno servirá no entendimento dessa noção, pois ele terá condições de
visualizar estes objetos de cima, tendo assim uma visão vertical dos mesmos. Outro recurso
são as imagens de satélite disponibilizadas na Internet, possibilitando a visão vertical até
mesmo da residência do próprio aluno. Essas imagens também auxiliam no entendimento da
noção de escala, pois é possível aproximar e distanciar a imagem do solo, aumentando ou
diminuindo a visualização dos detalhes que se pretende pesquisar.
O aluno consegue entende a imagem tridimensional com mais facilidade, pois faz
parte de sua realidade é algo concreto. A passagem da imagem tridimensional para a
bidimensional é um pouco mais complexa. O desenvolvimento dessa noção ocorre a partir do
momento em que o aluno, entre 7 e 10 anos, constrói maquetes que representam a imagem
tridimensional. Por exemplo, com a maquete da sala de aula, o aluno poderá visualizar a sala
de cima, numa visão vertical. Dessa forma ele tem condições de projetar a representação em
uma imagem bidimensional. O desenvolvimento dessa noção exige do aluno um certo grau de
abstração.
Para Simielli (2007) “as representações cartográficas são feitas a partir de elementos
básicos: pontos, linha e área”. A complexidade dos desenhos amplia-se de acordo com a faixa
etária e a série freqüentada pelo aluno. Utilizar a escola como ponto de partida, no
entendimento das representações cartográficas e da legenda facilita a compreensão, pois
partimos do concreto para o abstrato. Como o lugar é conhecido pelo aluno, uma
possibilidade é fotografar a escola. A partir da imagem da escola o aluno fará a representação,
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tendo a visão lateral como foco. A estruturação da legenda é iniciada através dos elementos da
foto. Posteriormente com o auxilio das imagens de satélite a representação passará para a
visão oblíqua. Nesse processo o aluno amplia seu entendimento sobre a representação
cartográfica e a legenda.
Almeida e Passini (1999) defendem que somente aos 11-12 anos é que a criança
começa a entender o espaço concebido. A partir dessa fase a criança compreenderá, por
exemplo, a área representada em um mapa.
A linguagem cartográfica é introduzida gradativamente, através do trabalho
pedagógico realizado pelo professor. Portanto, para saber

interpretar cartas geográficas e ser capaz de produzir representações próprias, do


espaço, são habilidades que todo o aluno que terminou o ensino fundamental deveria
ter no entanto, para realizar tais tarefas com desenvoltura é necessário uma série de
conhecimentos que são adquiridos num processo de alfabetização que envolve
linhas, cores e formas (GENTILE, 2002, ).

A linguagem cartográfica permite entender as diferentes territorialidades organizadas e


definidas pelas sociedades humanas, espacializando os fenômenos naturais ou culturais
ocorridos, estabelecendo a relação da Cartografia com a Geografia. A linguagem cartográfica
permite a apreensão e compreensão da distribuição espacial dos fenômenos, contemplando as
especificidades do objeto de estudo da Geografia.
Segundo Katuta e Souza (2001, p. 56) a Cartografia corresponde à arte, o método e a
técnica de representar a superfície terrestre e seus fenômenos. A dimensão da arte
corresponde à estética da representação, as cores utilizadas, o traçado em si; o método indica
a possibilidade de análise geográfica, interpretação e reflexão das informações cartografadas;
e a técnica diz respeito à precisão do traçado e das informações contidas no mapa. A
alfabetização cartográfica ocorre com a transposição didática da cartografia básica e da
cartografia temática com o intuito de formar alunos leitores de mapas. Portanto o

avanço nos níveis de leitura de mapas e gráficos permite ao leitor tornar-se


reflexivo e crítico: ver o problema, analisá-lo e investigar caminhos para sua
solução. Criar circunstâncias desafiadoras para que ocorram avanços nos níveis de
leitura é um dos objetivos da “Alfabetização Cartográfica” (PASSINI, 2007, p. 144).
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A autonomia intelectual do professor deve ser respeitada e ele deve definir quais
estratégias utilizará para ensinar a leitura cartográfica, considerando o domínio dos conceitos
geográficos que a envolvem em cada conteúdo abordado. Os professores devem ser usuários
críticos de mapas e mediadores da aprendizagem dos alunos para que estes se tornem leitores
competentes de mapas. Quanto mais os professores estiverem preparados, melhores serão os
resultados da aprendizagem dos alunos. Assim, se

(...) o professor concebe a Geografia, como uma disciplina que tem por função
descrever lugares, o uso que se fará do mapa possivelmente será o de mera
localização e haverá maior ênfase na realização de descrições. Por outro lado, se o
docente concebe a Geografia como uma disciplina que tem por função ensinar ou
contribuir para que o aluno entenda melhor as territorializações produzidas pelos
homens, o uso que se fará do mapa possivelmente será outro, pois apesar de ser
utilizado enquanto meio de orientação e localização, poderá também ser utilizado
enquanto recurso que pode encetar análises e explicações geográficas da realidade
mapeada (KATUTA, 2000, p.6).

Considerando toda a discussão proposta na alfabetização cartográfica para as distintas


séries do Ensino Fundamental e entendendo como fundamentais para a assimilação dos signos
que compõem a linguagem cartográfica, é necessário pensar a abordagem dada pelo professor
na utilização dos mapas no cotidiano escolar. Associado ao conhecimento adquirido (ou não)
pelo aluno na sua caminhada escolar, o enfoque primordial na discussão dos conteúdos
geográficos, que utilizem ferramentas fornecidas pela linguagem cartográfica, é o que Katuta
(1997) chama de “leiturização cartográfica”. O conhecimento dos elementos que compõem
um mapa é fundamental para a leitura deste, mas a garantia de uma abordagem geográfica
ocorre com a leitura do fenômeno representado cartograficamente. De acordo com Katuta
(1997, p. 45)

Se ler um texto escrito é atribuir significados ao mesmo e (re) elaborar nossos


conhecimentos acerca da realidade que nos rodeia, podemos igualmente afirmar que
ler um mapa é também atribuir significados, (re) construir representações, revisitar
ou rever as que possuímos a partir dessa representação. O leitor do mapa, de acordo
com os conceitos, representações dos mais variados tipos e sua visão de mundo,
pode atribuir significados ao mesmo, desde que seja provocado a fazê-lo, e/ou desde
que a necessidade lhe seja colocada, papel esse que cabe ao professor.
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Em busca de indicar formas de leiturização para que o professor aborde os conteúdos


da Geografia através da utilização de mapas e outros elementos propostos na linguagem
cartográfica, Castrogiovanni (2003, p. 34) esclarece o significado e a importância destes,
argumentando que “ler mapas significa dominar o sistema semiótico da linguagem
cartográfica.” Segundo ele, “o mapa é síntese. É uma representação codificada de um espaço
real”. Para tanto, “ler mapas, significa decodificar e, portanto, representar mentalmente sua
mensagem”.
Castrogiovanni (2003) propõe uma leiturização plena de um mapa e consequentemente
dos fenômenos geográficos apontando passos como a leitura e interpretação do título,
verificação da escala, entendimento da legenda, observação do mapa, descrição dos
significantes, reconstrução de um novo mapa e comparação entre ambos. As especificidades
do processo de leiturização pode ocorrer em diferentes mapas, podendo aplicar-se naqueles
extraídos da internet, de atlas ou apresentados – entre as carências da linguagem cartográfica
– nos livros didáticos.
A responsabilidade em analisar os livros didáticos disponíveis no mercado, discernir
como ensinar a cartografia às crianças e adolescentes considerando sua maturidade é mais
umas das responsabilidades do professor. São poucos os livros didáticos disponíveis no
mercado que trabalham a Cartografia diluída em todos os anos, da 5ª a 8ª série do Ensino
Fundamental. Geralmente a Cartografia é trabalhada de forma concentrada na 5ª série, no
início do livro, muitas vezes desconsiderando a maturidade dos alunos e a importância de
outras disciplinas, necessárias para o entendimento da linguagem cartográfica.

Ao examinar alguns livros didáticos de Geografia para ao Ensino Fundamental,


percebemos uma nítida diferença entre os mesmos. Aqueles mais conhecidos como
tradicionais trazem geralmente nos primeiros capítulos, tópicos que tratam do ensino
e da aprendizagem dos conteúdos de orientação e localização geográfica. Os livros
mais conhecidos como críticos, muitas vezes, não trazem esses conteúdos ou o
fazem ‘homeopaticamente”, trazendo-os no final de alguns capítulos em colunas
denominadas: saiba que ..., dependendo do livro didático adotado em sala de aula, o
professor tem maior ou menor possibilidade de trabalhar ou não com os conteúdos
acima citados (KATUTA, 2000, p. 11).

Os livros didáticos de Geografia devem auxiliar os professores no desenvolvimento


dos conteúdos. O professor não pode ficar refém desse material, subordinado a organização e
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a seqüência de conteúdos estabelecidos no livro. Deve desenvolver um trabalho que reflita no


processo de ensino-aprendizagem dos alunos.
Para entender a cartografia são necessários alguns conteúdos trabalhados na disciplina
de matemática, por exemplo, regra de três simples, porcentagens, escala, entre outros, os
quais são desenvolvidos por essa disciplina somente na 6ª e 7ª série. Como um aluno de 5ª e
6ª série desenvolverá alguns conteúdos propostos nos livros didáticos de Geografia, sem o
auxilio de outras disciplinas? Faz-se necessária uma integração mínima das áreas do
conhecimento para que ocorra um maior crescimento dos alunos, levando-os à reflexão e não
uma carga de informações, as quais são esquecidas no próximo ano letivo, pois não foram
vistas com significado, ou não foram trabalhadas de forma contextualizada levando em
consideração o espaço onde o aluno está inserido, sua visão de mundo e seu conhecimento
adquirido.
Como fazer Geografia sem o uso da Cartografia? Os mapas são importantes para o
ensino da Geografia? Trabalhar com mapas seria algo arcaico? Ministramos aulas com mapa
ou aulas de mapas? Trabalhar Geografia sem o uso das diferentes linguagens: a cartográfica, a
imagética, a gráfica, a escrita, entre outras teríamos um ensino estéril e árido. O mapa torna-se
relevante na discussão e entendimento de fatos e fenômenos geográficos ou as temáticas
estudadas. O ensino da Geografia tornar-se-ia algo mais significativo com a espacialização de
fatos e fenômenos que dariam sentido ao estudo da Cartografia.

A Geografia e a Cartografia têm como objeto de investigação o espaço. Na


articulação do conteúdo e forma, a utilização de diferentes linguagens melhora a
significação do espaço geográfico. Essas representações abrem possibilidade para
que o conhecimento sobre O espaço se aprofunde e se amplie. A leitura permite ver
o objeto e o objeto pode ser lido numa coordenação de ações que faz o sujeito passar
de um conhecimento menor para um conhecimento melhorado (PASSINI, 2007, p.
147).

Foi observado durante as oficinas de Disseminação da Política Curricular e Gestão


escolar, realizado pela Secretaria de Estado de Educação, do Estado do Paraná, que muitos
professores ministram aulas de mapas de forma muito mais intensa que a utilização dos
mesmos como auxílio ao ensino de conteúdos geográficos, conseqüentemente o mapa torna-se
o objeto de estudo da Geografia. A Geografia Escolar é deixada de lado e as aulas de técnicas
de Cartografia são priorizadas. De que forma é possível utilizar a Cartografia como uma
linguagem que auxilie no ensino da Geografia?
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Trabalhar com mapas não significa apenas colorir e copiar, ou simplesmente mostrar
os mapas para os alunos, isso não garante o ensino da Cartografia, é necessário levar o aluno à
reflexão, a construção a partir de seu conhecimento do lugar, do seu entorno, do concreto para
o abstrato, do particular para o geral. A função de um mapa é diferenciada para cada usuário
e para o que se pretende com ele. Nesse sentido, um professor vê o mapa diferente de um
aluno,

o interesse que eles tem, ou deveria ter, em relação ao mapa é o de utilizá-lo para
estabelecer raciocínios geográficos, visando ao entendimento da territorialidade
produzida pela sociedade é preciso lembrar, no entanto, que para que isso ocorra
faz-se necessário a aprendizagem de noções, habilidades e conceitos importantes
para que a leitura do mapa seja profícua e sua utilização ultrapasse, assim, a mera
reprodução dos contornos dos mapas políticos, como temos visto ocorrer inúmeras
vezes. (SOUZA J. DE S., KATUTA, A. M. 2001, p. 113).

O estudo de diferentes mapas deve considerar a faixa etária do aluno, dos anos iniciais
do Ensino Fundamental. Entre 06 a 09 anos de idade o trabalho deve ficar focado na
alfabetização cartográfica, iniciando com elementos das representações gráficas e
posteriormente com as representações cartográficas.
Portanto as

representações cartográficas são feitas a partir de elementos básicos, que são:


pontos, linhas e retas. Parte-se de desenhos mais elementares, mais simples, do
cotidiano da criança. Em um primeiro momento, representam-se elementos como:
copo de água, apontador, estojo escolar, enfim, elementos que a criança tenha no seu
cotidiano. Somente a partir daí iremos para áreas maiores, ou seja, as fotos aéreas,
com as quais a criança fará diferentes desenhos numa primeira etapa, simplesmente
olhando o que tem na foto e passando essa imagem para o espaço bidimensional; em
uma segunda etapa, ela fará a transposição desses diferentes espaços, fazendo a sua
representação cartográfica através de seleção dos elementos que ela tem na foto
(SIMIELLI, 2007b, p. 91).

A continuidade do processo de alfabetização cartográfica dar-se-á na 5ª e 6ª série, do


Ensino Fundamental. (SIMIELLI, 2007, 95). Poderíamos pensar que os alunos de 7ª e 8ª
série, por terem passado pelo processo de alfabetização cartográfica já tenham condições de
analise e localização de fenômenos, de correlacionar às informações em dois ou mais mapas e
sintetizar o que analisaram. Nem sempre isso ocorre algumas vezes é necessário retomar aos
elementos da alfabetização cartográfica, como “visão oblíqua e visão vertical, imagem
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tridimensional, imagem bidimensional, alfabeto cartográfico (ponto, linha e área), construção


da noção de legenda, proporção e escala; lateralidade/ referência, orientação” (SIMIELLI,
2007, p.98).
Assim, como na 7ª e 8ª série, os alunos no Ensino Médio devem ter condições de
analisar e localizar, correlacionar e sintetizar.

Considerações Finais
A Geografia deve usufruir do mapa para o entendimento do que se pretende estudar
em todos os níveis de ensino, em todas as séries. Concentrar o uso da cartografia na 5ª série
do Ensino Fundamental ou no 1º ano do Ensino Médio leva a alguns questionamentos. Como
nas demais séries não utilizaremos mais a linguagem cartográfica? O ideal para o
desenvolvimento de um bom trabalho, o uso da cartografia deveria ser uma constante em
todas as séries/ anos do Ensino Fundamental ao Médio. Trabalhar com mapas não significa
dar aula de mapas, mas usufruir da linguagem cartográfica para espacializar os fenômenos e
fatos estudados pela Geografia, desenvolvendo a Cartografia Escolar, garantindo a
transposição didática do que é trabalhado na Cartografia Temática durante a graduação em
Geografia.
Portanto temos diferentes mapas para diferentes usuários é importante fazer essa
diferenciação com os alunos. Vale ressaltar a necessidade de levar o aluno à leitura dos
elementos que compõem os mais diversos mapas. O potencial de leitura depende da trajetória
escolar dos alunos. Obviamente que o aluno de 4ª série/5° ano tem um potencial de leitura
diferente do aluno de 1º ano do Ensino Médio. Os elementos cartográficos apresentados aos
alunos são aprofundados gradativamente e concomitantemente aos conteúdos trabalhados na
disciplina de Geografia.
Quando se refere ao fazer pedagógico aplicado nas aulas de Geografia para o Ensino
Fundamental e Médio da rede de educação básica do Estado do Paraná, considera-se que a
Secretaria de Estado da Educação mantém constantes programas de formação continuada que
objetivam discussões pedagógicas entre professores da área de Geografia e que abordam a
linguagem cartográfica na perspectiva da leiturização corroborada com o processo de
alfabetização. O processo que envolve discussões teórico-metodológicas em torno da
utilização da linguagem cartográfica como ferramenta de discussão dos conteúdos
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geográficos, garantindo reflexões sobre a (re) organização espacial, resulta em metodologias


repensadas e – mesmo que parciais – novas abordagens à Cartografia escolar.

REFERÊNCIAS
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Paulo: Contexto. 1999. 7 ed.

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KATUTA, A. M., SOUZA, J. G. DE. Geografia e conhecimentos cartográficos. A


cartografia no movimento de renovação da geografia brasileira e a importância do uso de
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KATUTA, A. M. O Ensino e aprendizagem das noções, habilidade e conceitos de orientação


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__________Uso de mapas = alfabetização cartográfica e/ou leiturização cartográfica?


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GENTILE, P. O tesouro nos mapas: a cartografia nos permite ler e interpretar a realidade e
pode entrar no currículo desde a Educação Infantil, com brincadeiras e jogos. Revista Nova
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