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Cadeia de Custódia

Lei nº 13.964/2019 – Pacote Anticrime

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O CENTRO DE APOIO OPERACIONAL DAS PROCURADORIAS E
PROMOTORIAS DE JUSTIÇA CRIMINAIS – CAOP CRIM, previsto no artigo 68, inciso
X, da LCE n. 291/2014, corresponde a um órgão auxiliar da atividade funcional do
Parquet, que tem como finalidade precípua o fornecimento de subsídios aos órgãos de
execução atuantes na esfera criminal, com o fomento a uma atuação institucional
harmônica e articulada, respeitando-se a independência funcional.

I – APRESENTAÇÃO.

A temática abordada tem a finalidade de trazer à tona a importância da


discussão sobre a prova pericial, introduzida pela novatio legis nº 13.964/2019, e o que
ocorre quando tais provas não são submetidas à uma cadeia de custódia.

O intuito é demonstrar como os métodos utilizados desde a coleta até a


análise da prova pericial, podem ser decisivos para o sucesso da persecução penal,
sendo esses métodos, que ocorrem sequencial e padronizadamente, justamente o que se
chama de Cadeia de Custódia.

Ao que refere à cadeia de custódia, esta será o foco do Estudo Dirigido,


para que se possa alcançar melhor compreensão de sua importância na aplicabilidade
dos casos criminais e, em contrapartida, quais as consequências de sua inobservância,
ou seja, o que ocorre quando a cadeia de custódia não é realizada minuciosamente como
prescrito na legislação.

A cadeia de custódia em Prova Pericial, em termos mais técnicos, é um


processo pelo qual as provas passam por procedimentos padronizados, desde a sua
coleta, transporte, recebimento, análise e armazenamento, sendo toda essa sequência
acompanhada por responsável que deve documentar e garantir que nenhum vestígio se
perca, afim de que a persecução penal não seja prejudicada.

Com o advento da Lei Anticrime, o Congresso Nacional decidiu tornar


obrigatória tais procedimentos para todo o país, tornando sua observância vinculante
para os Estados.

O conjunto de medidas relativas à cadeia de custódia de vestígio


instituído pela lei anticrime, no mérito, é positivo e constitui avanço imprescindível para a
modernização da investigação criminal brasileira, ainda muito atrelada à prova
testemunhal.

O artigo 158 – A do Código de Processo Penal apresenta o conceito legal


de cadeia de custódia.

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Redação ANTES DA LEI Nº Redação DEPOIS DA LEI Nº 13.964/19
13.964/19

Art. 158-A. Considera-se cadeia de custódia o


conjunto de todos os procedimentos utilizados
para manter e documentar a história cronológica
do vestígio coletado em locais ou em vítimas de
crimes, para rastrear sua posse e manuseio a
partir de seu reconhecimento até o descarte.
Sem correspondência
§1º O início da cadeia de custódia dá-se com a
preservação do local de crime ou com
procedimentos policiais ou periciais nos quais
sejam detectada a existência de vestígio.

§2º O agente público que reconhecer um elemento


como de potencial interesse para a produção de
prova pericial fica responsável por sua
preservação.

§3º Vestígio é todo objeto ou material bruto, visível


ou latente, constatado ou recolhido, que se
relaciona à infração penal.

Resumidamente, a cadeia de custódia é a sistematização de


procedimento que tem por finalidade a preservação do valor probatório da prova pericial.

Assegura a preservação dos vestígios desde o contato primário até o


descarte dos elementos coletados, garantindo-se a sua qualidade através da
documentação cronológica dos atos executados, em consonância às normas técnicas
previstas nas etapas da chamada cadeia de custódia.

Segundo o Doutrinador, Frederico Marques, a relevância da evidência


técnica já era enfatizada:

“para quem as provas periciais contêm


em si maior dose de veracidade, visto que
nelas preponderam fatores de ordem
técnica que, além de mais difíceis de
serem deturpados, oferecem campo para
uma apreciação objetiva e segura de
suas conclusões. Para muitos, a prova
pericial que observa a cadeia de custódia
é a testemunha que não mente, jamais”1.

Vale destacar que o conceito da cadeia de custódia não é novo, e


aparece com as mesmas características em outras áreas de atuação estranhas ao meio
jurídico, como no caso de registro de documentos.

1
Elementos de direito processual penal – volume I. Campinas, Ed. BooKseller, 1997, p.155.
3
Já na nossa esfera Jurídica, a inovação implementada pela Lei nº
13.964/19 apresenta uma perspectiva contemporânea, na medida em que demonstra que
o legislador está atento à globalização, potencializada pelo avanço tecnológico, que de
forma galopante instrumentalizou também aos criminosos.

No entanto, a precaução com a preservação da prova pericial sempre


existiu, conforme disposto no artigo 6º, do Código de Processo Penal2.

Vale mencionar sobre os Crimes Cibernéticos, já que são dotados de


características peculiares, devendo o processo de identificação do vestígio ser ainda mais
cuidadoso, assegurando a idoneidade da informação digital obtida.

Nesses crimes, a obediência às etapas previstas na cadeia de custódia


garantirá o rastreamento e a preservação da prova, proporcionando maior efetividade na
aplicação da lei penal.

II - DA CADEIA DE CUSTÓDIA E AUTENTICIDADE DA PROVA.

Autenticidade consiste na certeza de que o objeto em análise provém das


fontes anunciadas e que não foi alvo de mutações ao longo de um processo,
assegurando-se a identificação e a segurança na origem da informação.

Cadeia de custódia de vestígios diminui a probabilidade de violação ou de


contaminação das provas coletadas garantindo-se a autenticidade do elemento de prova.

O que se busca com a preservação e a observância às etapas da cadeia


de custódia é um nível máximo de autenticidade da prova pericial, porém, caso ocorra
alguma falha em quaisquer das etapas que integram a cadeia de custódia, não ensejará
de pronto nulidade na prova obtida por meio do vestígio em tela.

Segundo o entendimento do doutrinador Rogério Sanches sobre a


temática, ocorrendo à falha em alguma etapa da cadeia de custódia, a prova permanece
lícita e legítima, podendo ser questionada quanto a sua autenticidade. Seu valor será
maior ou menor quanto mais ou menos se respeitou o procedimento da cadeia de
custódia. Não pode ser descartada pelo juiz, mas valorada, conforme preceitua o artigo
182 do Código de Processo Penal3.
2
Art. 6º - Logo que tiver conhecimento da prática da infração penal, a autoridade policial deverá:
I – dirigir-se ao local, providenciando para que não se alterem o estado e conservação das coisas, até a chegada dos
peritos criminais; (Redação dada pela Lei 8.862/1994.)
II – apreender os objetos que tiverem relação com o fato, após liberados pelos peritos criminais; (Redação dada pela
Lei 8.862/1994.)
III – colher todas as provas que servirem para o esclarecimento do fato e suas circunstâncias;
IV – ouvir o ofendido;
V- ouvir o indicado, com observância, no que for aplicável, do disposto no Capítulo III do Título VII, deste Livro,
devendo o respectivo termo ser assinado por duas testemunhas que lhe tenham ouvido a leitura;
VI – proceder o reconhecimento de pessoas e coisas e a acareações;
VII – determinar, se for o caso, que se proceda a exame de corpo de delito e a quaisquer outras perícias;
VIII – ordenar a identificação do indiciado pelo processo datiloscópicos, se possível, e fazer juntar aos autos sua folha
de antecedentes;
IX – averiguar a vida pregressa do indiciado, sob o ponto de vista individual, familiar e social, sua condição econômica
e estado de ânimo antes e depois do crime e durante ele, e quaisquer outros elementos que contribuírem para a
apreciação de seu temperamento e caráter;
X – colher informações sobre a existência de filhos, respectivas idades e se possuem alguma deficiência e o nome e o
contato de eventual responsável pelos cuidados dos filhos, indicado pela pessoa presa. (Acrescentado pela Lei
13.257/2016)
3
Cunha, Rogério Sanches. Pacote Anticrime – Lei nº 13.964/2019: Comentários às Alterações no CP, CPP e
LEP/Rogério Sanches Cunha – Salvador: Editora JusPodivm, 2020, página 180.

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III - DO INÍCIO DA CADEIA DE CUSTÓDIA.

Conforme dispõe o artigo 158-A, § 1º, CPP, o marco inicial da cadeia de


custódia do vestígio pode ocorrer de três formas:

Preservação do local do crime: neste o objetivo principal é evitar que a cena do crime
seja adulterada ou contaminada.

Procedimentos Policiais: o primeiro vestígio é obtido a partir de diligências inauguradas


através de ação policial, militar ou não.

Procedimentos Periciais: o vestígio da atividade ilícita é detectado através do trabalho


técnico.

IV - AGENTE PÚBLICO E O DEVER DE PRESERVAÇÃO DO


ELEMENTO PROVA.

Agente Público é definido como todo aquele que exerce, ainda que
transitoriamente ou sem remuneração, por eleição, nomeação designação, contratação
ou qualquer forma de investidura ou vínculo, mandato, cargo, emprego ou função pública.

O Agente Público tem o comprometimento da tutela da evidência


probatória, impondo um discernimento responsável quando a identificação da prova apta
a integrar a cadeia de custódia.

V - DOS VESTÍGIOS E SUAS ESPÉCIES.

Vestígio pode ser qualquer objeto, instrumento, marca, rastro, mancha,


sinais sensíveis aos sentidos, presente em um local de crime, podendo ter relação com o
fato delituoso.

Pode ser perceptível ou latente. Entende-se por vestígio perceptível


quando captado pelos sentidos humanos, sem a necessidade de revelação por meio de
técnicas forenses, e, latente, quando invisível ou oculto, demandando a utilização de
técnica ou metodologia adequada para a revelação.

O perito, no atendimento ao local do crime, atuará no sentido de analisar


todo e qualquer vestígio associado ao fato, registrando a cena e arrecadando o que for
necessário à sua comprovação e ao esclarecimento da autoria.

Redação ANTES DA LEI Nº Redação DEPOIS DA LEI Nº 13.964/19


13.964/19

Art. 158-B. A cadeia de custódia compreende o


rastreamento do vestígio nas seguintes etapas:

I – reconhecimento: ato de distinguir um elemento


como de potencial interesse para a produção da
prova pericial;

5
II – isolamento: ato de evitar que se altere o
estado das coisas, devendo isolar e preservar o
ambiente imediato, mediato e relacionado aos
Sem correspondência vestígios e local de crime;

III – fixação: descrição detalhada do vestígio


conforme se encontra no local de crime ou no
corpo de delito, e a sua posição na área de
exames, podendo ser ilustradas por fotografias,
filmagens ou croqui, sendo indispensável a sua
descrição no laudo pericial produzido pelo perito
responsável pelo atendimento;

IV – coleta: ato de recolher o vestígio que será


submetido à análise pericial, respeitando suas
características e natureza;

V – acondicionamento: procedimento por meio do


qual cada vestígio coletado é embalado de forma
individualizada, de acordo com suas
características físicas, químicas e biológicas, para
posterior análise, com anotação da data, hora e
nome de quem realizou a coleta e o
acondicionamento;

VI – transporte: ato de transferir o vestígio de um


local para o outro, utilizando as condições
adequadas (embalagens, veículos, temperatura,
entre outras), de modo a garantir a manutenção
de suas características originais bem como o
controle de sua posse;

VII – recebimento: ato formal de transferência da


posse do vestígio, que deve ser documentado
com, no mínimo, informações referentes ao
número de procedimento e unidade de polícia
judiciária relacionada, local de origem, nome de
quem transportou o vestígio, código de
rastreamento, natureza do exame, tipo do vestígio,
protocolo, assinatura e identificação de quem o
recebeu;

VIII – processamento: exame pericial em si,


manipulação do vestígio de acordo com a
metodologia adequada as suas características
biológicas, físicas e químicas, a fim de se obter o
resultado desejado que deverá ser formalizado em
laudo produzido por perito;

IX – armazenamento: procedimento referente a


guarda, em condições adequadas, do material a
ser processado, guardado para realização de
contra perícia, descartado ou transportado, com
vinculação ao número do laudo correspondente;
6
X – descarte: procedimento referente à liberação
do vestígio, respeitando a legislação vigente e,
quando pertinente, mediante autorização judicial.

O dispositivo acima mencionado traz em seu bojo as etapas de


rastreamento do vestígio, um processo de rastreamento ininterrupto cronologicamente.

De acordo com a Portaria nº 82/2014, da Secretária Nacional de


Segurança Pública - SENASP4 (em anexo), as etapas da cadeia de custódia são
distribuídas em duas macrofases: interna e externa.

Na fase externa, estão elencadas as etapas relacionadas aos passos


entre a preservação do local do crime ou apreensões aos passos dos elementos de prova
e chegada do vestígio ao órgão pericial encarregado de processá-lo. Compreendendo a
preservação do local do crime, a busca, o reconhecimento, fixação, a coleta, o
acondicionamento, o transporte e o recebimento do vestígio.

Na fase interna, compreende todas as etapas entre o ingresso do


vestígio no órgão pericial até a conclusão do laudo e remessa ao órgão pericial até a
conclusão do laudo e remessa ao órgão requisitante, compreendendo as etapas de
recepção, conferência, classificação, guarda e/ou distribuição do vestígio, análise pericial
propriamente dita, guarda e devolução do vestígio de prova, guarda de vestígios para
contra perícia e o registro da cadeia de custódia.

Destaque-se que a mencionada Portaria é anterior à alteração legislativa


trazida pelo Pacote Anticrime, sendo que ao tempo de sua edição servia apenas como
parâmetro face as cautelas ali descritas, não consistindo em normativa cogente e por isto
poderia ser seguida integralmente, parcialmente ou sequer ser estritamente observada.
Contudo, suas diretrizes foram alçadas ao texto legal de modo que a Portaria permanece
inalterada, contudo a necessidade em sua observância conquistou maior contudência.

Passamos então a uma breve análise de modo sucinto aos incisos do art.
158 – B, do CPP.

No que tange ao inciso I, que trata sobre o reconhecimento, revela-se


uma importante etapa, pois, exige maior cautela nos casos de crimes onde o vestígio está
concentrado em conteúdo latente.

O inciso II, que trata sobre o isolamento traduz na ideia de preservação


do local no estado em que foi primariamente detectado, com objetivo de evitar eventual
contaminação.

O inciso III, que disciplina sobre a fixação, o legislador faculta a


ilustração, seja por fotografias, filmes ou desenhos, de modo a robustecer o trabalho e o
conhecimento dos destinatários da prova acerca de todas as características do objeto
periciado.

O inciso IV, que regulamenta a coleta de vestígios, segundo a Portaria nº


82/2014 SENASP, a mesma deverá ser realizada por profissionais de perícia criminal,
contudo, em caso de ausência destes, poderá ser realizada por pessoa investida de
função pública, nos termos do artigo 159 e §§, Código de Processo Penal.

4
https://www.justica.gov.br/Acesso/convenios/portaria-no-89-convenios-pericia-2014-versao-28-07-14.pdf
7
O inciso V, que expressa sobre o acondicionamento dos vestígios
seguem padrões definidos em manuais específicos, de órgãos policias e periciais,
destacando a importância na sua individualização e identificação dos responsáveis por
esse processo, com todas as anotações pertinentes, assim como, data, com o fito de
preservar da melhor forma possível a prova.

Em suma, todos os vestígios coletados deverão ser registrados


individualmente em formulário próprio no qual deverão constar, no mínimo as seguintes
informações:

a) especificação do vestígio; quantidade;

b) identificação numérica individualizada;

c) local exato e data de coleta;

d) órgão responsável pela coleta, com o nome e identificação funcional do agente coletor;
e) órgão responsável pela entrega (transporte), com o nome e identificação funcional do
agente entregador;

f) órgão de destino (transferência da custódia), com o nome e identificação funcional do


agente recebedor e o protocolo de recebimento;

g) assinaturas e rubricas; número de procedimento e respectiva unidade de polícia


judiciária a qual o vestígio estiver vinculado.

Os incisos VI e VII, marcam a transição entre as fases interna e externa


das etapas da cadeia de custódia.

O inciso VIII, que trata sobre o procedimento, seu estudo está expresso
no Manual de Procedimento Operacional Padrão, sob a coordenação da SENASP,
estabelecendo diretrizes técnicas para o manuseio do vestígio.

O inciso IX, que disciplina sobre armazenamento, traduz que cada órgão
pericial deverá ser dotado de espaço adequado com condições técnicas específicas
capazes de preservar as características do material a ser processado, e após a perícia,
dependendo do tipo de material (objeto de exame), deverá uma pequena quantidade ser
guardada para possibilitar a eventual realização de nova perícia em decorrência de
contestação do laudo anterior (uma contra perícia).

O inciso X, corresponde sobre o descarte, neste caso, temos como


exemplo, às perícias realizadas nas substâncias entorpecentes (drogas), parte do
material que foi analisado é guardado para a contra perícia, o restante, deve ser
descartado, em razão da dificuldade de segurança que sua manutenção acarreta. O
descarte ocorre mediante autorização judicial e obedece a um procedimento rigoroso e
específico.

Redação ANTES DA LEI Nº Redação DEPOIS DA LEI Nº 13.964/19


13.964/19

Art. 158-C. A coleta dos vestígios deverá ser


realizada preferencialmente por perito oficial, que
dará o encaminhamento necessário para a
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central de custódia, mesmo quando for
necessária a realização de exames
complementares.

§ 1º Todos vestígios coletados no decurso do


inquérito ou processo devem ser tratados como
Sem correspondência descrito nesta Lei, ficando órgão central de
perícia oficial de natureza criminal responsável
por detalhar, a forma de seu cumprimento.

§ 2º É proibida a entrada em locais isolados bem


como a remoção de quaisquer vestígios de locais
de crimes antes da liberação por parte do perito
responsável, sendo tipificada como fraude
processual a sua realização.

VI - SUJEITOS DA COLETA DOS VESTÍGIOS NA CADEIA DE


CUSTÓDIA.

Por perito oficial, devemos entender o agente com formação universitária


investido na carreira através de concurso público, podendo iniciar a execução de suas
funções após o curso de formação preparatória específica.

A coleta dos vestígios deverá ser realizada preferencialmente por perito


oficial, porém, em determinadas situações quando não for possível a realização da coleta
dos vestígios por perito oficial, poderá o agente encarregado momentaneamente
proceder à coleta, o que justifica a inclusão do termo preferencialmente (e não
obrigatoriamente) previsto no art. 158 – C, do Código De Processo Penal.5

Contudo, a pessoa responsável momentaneamente deverá observar


todos os procedimentos técnicos previstos na novatio legis, sob pena de contaminar a
cadeia de custódia. É atribuição do órgão central, elaborar orientações técnicas e
específicas sobre os procedimentos destacados na lei.6

Em suma, ao realizar a interpretação literal do dispositivo 158 – C, do


Código de Processo Penal, conclui-se que não é obrigatório que a coleta de vestígios
seja feita por perito oficial.

VII – DA AUSÊNCIA DE PERITO OFICIAL PARA A REALIZAÇÃO DA VIII

5
A coleta dos vestígios deverá ser realizada preferencialmente por perito oficial, que dará o
encaminhamento necessário para a central de custódia, mesmo quando for necessária a realização de
exames complementares.
6
Art. 158-C. A coleta dos vestígios deverá ser realizada preferencialmente por perito oficial, que dará o
encaminhamento necessário para a central de custódia, mesmo quando for necessária a realização de
exames complementares.

§ 1º Todos vestígios coletados no decurso do inquérito ou processo devem ser tratados como descrito
nesta Lei, ficando órgão central de perícia oficial de natureza criminal responsável por detalhar, a
forma de seu cumprimento.

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VIII - COLETA DE VESTÍGIOS. A REALIDADE DO ESTADO DO ACRE.

A nova legislação prescreve que a coleta dos vestígios deverá ser


realizada preferencialmente por perito oficial (a sistemática anterior do Código de
Processo Penal exigia dois peritos judiciais, subscrevendo o laudo).

Contudo, é sabido que no Estado do Acre não há peritos oficiais


suficientes para suprir a demanda, diante deste contexto, não há qualquer impedimento
de lançar mão de duas pessoas idôneas portadoras de diploma de nível superior
preferencialmente na area do exame, são os chamados peritos não oficiais ou peritos
louvados, neste caso há o aproveitamento da Sumula nº 361 do Supremo Tribunal
Federal7.

Em suma, caso sejam nomeados peritos não oficiais ou peritos louvados,


será necessário à nomeação de duas pessoas, sob pena de nulidade da prova,
consoante dispõe o art. 159, § 1º, do Cógido de Processo Penal.

IX - DA FRAUDE PROCESSUAL.

O art. 158-C deve ser lido de acordo com as características do tipo penal
da fraude processual, que não pode se caracterizar pela simples entrada em local
isolado, nem mesmo pela mera retirada de vestígios, havendo necessidade de
comprovação da existência de dolo voltado à conduta prevista ao tipo correspondente,
vez que inadmite a modalidade culposa, conforme abaixo transcrito:

Art. 3478. Inovar artificiosamente, na


pendência de processo civil ou
administrativo, o estado de lugar, de coisa
ou de pessoa, com o fim de induzir a erro
o juiz ou o perito:
Pena – detenção, de três meses a dois
anos, e multa.
Parágrafo único – Se a inovação se
destina a produzir efeito em processo
penal, ainda que não iniciado, as penas
aplicam-se em dobro.

A Lei de Abuso de Autoridade, por sua vez, em dois tipos penais,


criminaliza formas especiais de fraude processual, ambas sem previsão para modalidade
culposa, como se observa a seguir:

Art. 23. Inovar artificiosamente, no curso


de diligência, de investigação ou de
processo, o estado de lugar, de coisa ou
de pessoa, como fim de eximir-se de
responsabilidade ou de responsabilizar
criminalmente alguém ou agravar-lhe a
responsabilidade:
Pena – detenção, de 1 (um) a 4 (quatro)
anos, e multa.

7
Súmula 361 – No processo penal, é nulo o exame realizado por um só perito, considerando-se impedido o que tiver
funcionado, anteriormente, na diligência de apreensão.
8
Código Penal
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Parágrafo único. Incorre na mesma pena
quem pratica a conduta com o intuito de:
I - eximir-se de responsabilidade civil ou
administrativa por excesso praticado no
curso de diligência;
II - omitir dados ou informações ou
divulgar dados ou informações
incompletos para desviar o curso da
investigação, da diligência ou do
processo.

Art. 24. Constranger, sob violência ou


grave ameaça, funcionário ou empregado
de instituição hospitalar pública ou
privada a admitir para tratamento pessoa
cujo óbito já tenha ocorrido, com o fim de
alterar local ou momento de crime,
prejudicando sua apuração:

Pena - detenção, de 1 (um) a 4 (quatro)


anos, e multa, além da pena
correspondente à violência.

Com efeito, na sequencia da análise das inovações trazidas sobre o tema


na legislação processual penal observamos o que se segue:

Redação ANTES DA LEI Nº Redação DEPOIS DA LEI Nº 13.964/19


13.964/19

Art. 158-D. O recipiente para acondicionamento


do vestígio será determinado pela natureza do
material.

§ 1º Todos os recipientes deverão ser selados


com lacres, com numeração individualizada, de
forma a garantir a inviolabilidade e a idoneidade
do vestígio durante o transporte.
§ 2º O recipiente deverá individualizar o vestígio,
preservar suas características, impedir
Sem correspondência contaminação e vazamento, ter grau de
resistência adequado e espaço para registro de
informações sobre seu conteúdo.

§ 3º O recipiente só poderá ser aberto pelo perito


que vai proceder à análise e, motivadamente, por
pessoa autorizada.

§ 4º Após cada rompimento de lacre, deve se


fazer constar na ficha de acompanhamento
vestígio o nome e matrícula do responsável, a
data, o local, a finalidade, bem como as
informações referentes ao novo lacre utilizado.

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§ 5 º O lacre rompido deverá ser acondicionado
no interior do novo recipiente.
Redação ANTES DA LEI Nº Redação DEPOIS DA LEI Nº 13.964/19
13.964/19

Art. 158-E. Todos os Institutos de Criminalística


deverão ter uma central de custódia destinada à
guarda e controle dos vestígios, e sua gestão
deve ser vinculada diretamente ao órgão central
de perícia oficial de natureza criminal.

§ 1º Toda central de custódia deve possuir os


serviços de protocolo, com local para
conferência, recepção, devolução de materiais e
documentos, possibilitando a seleção, a
Sem correspondência classificação e a distribuição de materiais,
devendo ser um espaço seguro e apresentar
condições ambientais que não interfiram nas
características do vestígio.

§ 2º Na central de custódia, a entrada e a saída


de vestígio deverão ser protocoladas,
consignando-se informações sobre a ocorrência
no inquérito que a eles se relacionam.

§3º Todas as pessoas que tiverem acesso ao


vestígio armazenado deverão ser identificadas e
deverão ser identificadas e deverão ser
registradas a data e a hora do acesso.

§ 4º Por ocasião da tramitação do vestígio


armazenado, as ações deverão ser registradas,
consignando-se a identificação do responsável
pela tramitação, a destinação, a data e horário da
ação.

X - CENTRAL DE CUSTÓDIA.

De acordo com o dispositivo, faz necessário a criação de uma central de


custódia nos Institutos de Criminalística, com o fito de concentrar a custódia das provas
periciadas, caso ainda não exista.

O artigo 157 – E, acrescida pela Lei nº 13.964/19 no Código de Processo


Penal, é o acréscimo de uma nova função aos órgãos periciais, que demandará melhor
estruturação para atender ao dispositivo acima mencionado, e, consequentemente
demandará também de investimento dos governos.

Em suma, vale mencionar que esse conjunto de medidas exigirá dos


institutos de perícia a realização de concursos públicos, procedimentos licitatórios, curso
de capacitação, e ainda, capacidade orçamentária9.

9
Registra-se que o Supremo Tribunal Federal, até o dia 29/01/2020, não havia determinado a suspensão cautelar do
presente dispositivo.
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XI - CONTROLE DAS PESSOAS COM ACESSO AOS VESTÍGIOS.

O cadastramento de todas as pessoas com acesso ao vestígio permitirá


que se faça uma espécie de inventário da prova.

O registro histórico, além das pessoas, também deve abarcar as ações


adotadas nessa tramitação, ou seja, todas as fases e procedimentos deverão ser
rigorosamente anotadas, sob pena de comprometimento da idoneidade da cadeia de
custódia.

Redação ANTES DA LEI Nº Redação DEPOIS DA LEI Nº 13.964/19


13.964/19

Art. 158-F. Após a realização da perícia, o material


deverá ser devolvido à central de custódia,
devendo nela permanecer.

Parágrafo único. Caso a central de custódia não


possua espaço ou condições de armazenar
Sem correspondência determinado material, deverá a autoridade policial
ou judiciária determinar as condições de depósito
do referido material em local diverso, mediante
requerimento do diretor do órgão central de perícia
oficial de natureza criminal.

XII - CONDIÇÕES DO DEPÓSITO DOS VESTÍGIOS.

O artigo tem o foco de enfatizar o papel fundamental dos órgãos periciais


no que tange a preservação do material coletado relacionado à infração penal,
destacando a sua responsabilidade no processo de custódia legal.

XIII - CONSEQUÊNCIAS DA INOBSERVÂNCIA DA CADEIA DE


CUSTÓDIA.

A importância de se almejar uma decisão justa exige a observância das


diretrizes trazidas sobre a cadeia de custódia, que permitam a análise de todo o caminho
procedimental de coleta e manuseio da prova pericial e identificação dos envolvidos.

O Pacote Anticrime inseriu no Código de Processo Penal o conceito de


cadeia de custódia no art. 158 – A “caput”, com a mera leitura podemos concluir que o
desrespeito à cadeia de custódia não induz necessariamente a nulidade da prova pericial,
e sim uma mera irregularidade a princípio.

Vale enaltecer, que a observância às diretrizes pertinentes à cadeia de


custódia, acrescidas ao Código de Processo Penal pela inclusão dos artigos 158 - A ao
artigo 158 - F, por meio da Lei 13.964 de 24 de dezembro de 2019, denominada PACOTE
ANTICRIME seguiu como elemento basilar as cautelas já existentes na Portaria Nº
82/2014 - SENASP (anexa).

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XIV- CONCLUSÃO.

As ciências forenses têm se tornado imprescindíveis para o avanço


qualitativo das investigações criminais no Brasil e internacionalmente.

As provas científicas conferem dados objetivos de alta confiabilidade para


que o trabalho de investigação criminal se desenvolva corretamente. A importância das
provas periciais está estritamente ligada a decorrência natural a determinadas situações
jurídicas, tais como : à presunção de inocência, à vedação a provas ilícitas, e à proibição
da confissão mediante tortura, superando assim, práticas que vinham sendo adotadas,
em graus diversos desde a antiguidade.

De acordo com a legislação vigente, podemos veementemente afirmar


que ao Estado compete demonstrar cabalmente que alguém praticou um delito, sempre
respeitando os direitos individuais, é natural que se busque o máximo de certeza
científica para a justa condenação criminal do indivíduo.

A presente novatio legis, trazida pela lei anticrime busca proteger a


qualidade da prova pericial, estabelecendo diversas normas de procedimento para a
coleta, manuseio e armazenamento dos vestígios forenses, com o fito de preservar sua
inalterabilidade/integridade, e, por conseguinte a confiabilidade dos exames periciais e
sua relevância para uma moderna investigação criminal.

Frisa-se que a presente inovação trazida pelo Pacote Anticrime no que


tange à cadeia de custódia é bastante semelhante às diretrizes fixadas pelo Ministério da
Justiça e Segurança, através da Portaria nº 82/2014 da Secretaria Nacional de segurança
Pública - SENASP10.

A Portaria nº 82/2014 da Secretaria Nacional de Segurança Pública –


SENASP instituiu uma série de procedimentos obrigatórios para a Força Nacional de
Segurança Pública e, sendo um ato administrativo, é obvio não ser vinculativo para as
unidades periciais do Estado11, no entanto, por meio da lei anticrime, o Congresso
Nacional decidiu tornar obrigatório tais procedimentos para todo país, tornando sua
observância vinculante para toda Federação.

Vislumbra-se que não se trata de inovação feita por capricho ou sem


base técnica, mas de estabelecimento de um padrão de qualidade no trato dos vestígios
forenses, compatível com alto valor da prova pericial para a elucidação de fatos.

Para que seja implementado as medidas obrigatórias da presente


inovação possivelmente será necessário a contratação e treinamento de pessoal,
aquisição de bens e serviços, mudanças de rotinas e estabelecimento de novos
procedimentos internos. É claro que esse conjunto de medidas exigirá dos institutos de
perícia a realização de concursos públicos, procedimentos licitatórios, cursos de
capacitação, redação de normas internas, e, ainda, capacidade orçamentária.

O presente estudo dirigido tem o escopo de apresentar a compreensão


da nova legislação com detalhes sobre as suas especificidades, abordando o artigo 158 –
A à 158 – F, do Código de Processo Civil.

10
Publicada no Diário da União de 18/07/2014, nº 136, Seção I, pág. 42.
11
Portaria nº 82/2014 – SENASP: “Art. 1º - Ficam estabelecidos, na forma do Anexo I desta Portaria, Diretrizes sobre
os procedimentos a serem observados no tocante à cadeia de custódia de vestígios.
Art. 2º - A observância da norma técnica mencionada no artigo anterior para a ser de uso obrigatório pela Força
Nacional de Segurança Pública.
14
Conforme acima já mencionado a presente inovação trazida pelo Pacote
Anticrime no que tange à cadeia de custódia é bastante semelhante às diretrizes fixadas
pelo Ministério da Justiça e Segurança, através da Portaria nº 82/2014 da Secretaria
Nacional de segurança Pública – SENASP, as diferenças são mínimas e merece
destaque.

O artigo 158 – A corresponde ao Anexo I, item I da portaria nº 82/2014 –


SENASP e traz conceitos de “cadeia de custódia” e “vestígio”, especificando ainda
quando se inicia a cadeia de custódia e quem está obrigado a preservá-la.

Por sua vez, o art. 158 – B corresponde ao Anexo I, item II da portaria nº


82/2014 – SENASP e especifica e conceituam as dez etapas da cadeia de custódia12.

O art. 158 – C, “caput” e § 1º corresponde ao Anexo I, item 3.1, da


portaria nº 82/2014 – SENASP e estabelece que a coleta será “realizada
preferencialmente por perito oficial”, esse procedimento não é imprescindível, porém
adequado, não obsta que outros agentes o façam em caso de impossibilidade de coleta
por perito oficial. Vale salientar, que se a coleta for realizada por pessoa diversa ao perito
oficial, aquele deverá seguir os protocolos estabelecidos de modo a não prejudicar a
análise do acervo probatório.

O art. 158 – C, § 2º traz uma inovação que não poderia ser instituída por
uma portaria, trata-se da tipificação como fraude processual das condutas de entrar em
locais isolados, assim como a remoção de quaisquer vestígios de locais de crime antes
de sua liberação por parte do perito responsável. Configura tipo penal incriminador na
modalidade dolosa, pois, não há previsão expressa de responsabilização a título de
culpa. Contudo, caberá a acusação demonstrar que a pessoa violou intencionalmente a
cena do crime ou que descumpriu de modo intencional seu dever objetivo de cuidado,
sem se importar com a produção do resultado danoso, é o chamado dolo eventual.

Com relação ao artigo 158 – D, corresponde ao Anexo I, itens 3.2, 3.3,


3.4, 3.6, 3.7 e 3.8, da portaria nº 82/2014 – SENASP, a compilação é praticamente
idêntica.

No que tange ao artigo 158 – E, corresponde ao Anexo I, itens 4.1. 4.2,


4.3, 4.4 e 5.1, da portaria nº 82/2014 – SENASP, traz um aperfeiçoamento de redação,
estabelecendo o dever de instituição de uma central de custódia em cada Instituto de
Criminalística a qual destina a função de guarda e controle dos vestígios.

De acordo a previsão expressa no artigo 158 – F, a central de custódia é


órgão responsável pelo armazenamento dos vestígios mesmo após a realização das
perícias, devendo permanecer sob sua guarda até que seja determinado o descarte do
material. Em caso de ausência de espaço ou condições de armazenamento na central de
custódia, a legislação permite que os vestígios sejam armazenados em outro local, trata-
se de uma medida excepcional13. Caso haja essa necessidade de armazenamento em
local diverso da central de custódia, tal medida, será concedida por meio de decisão
judicial ou policial, mediante requerimento suscitado pelo Diretor do órgão central de

12
Reconhecimento, isolamento, fixação, coleta, acondicionamento, transporte, recebimento, processamento,
armazenamento e descarte.
13
Art. 158 – F - Após a realização da perícia, o material deverá ser devolvido à central de custódia, devendo nela permanecer.
Parágrafo único. Caso a central de custódia não possua espaço ou condições de armazenar determinado material, deverá a
autoridade policial ou judiciária determinar as condições de depósito do referido material em local diverso, mediante requerimento do
diretor do órgão central de perícia oficial de natureza criminal.

15
perícia oficial de natureza criminal.

A inobservância à cadeia de custódia não induz necessariamente a


nulidade da prova pericial, e sim uma mera irregularidade, cabendo ao magistrado a
realizar a valoração da prova.

Conclui-se que o conjunto de medidas relativas à cadeia de custódia de


vestígios instituído pela lei anticrime é positivo e constitui um avanço imprescindível para
a modernização da persecução criminal brasileira.

XV - REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.

Cunha, Rogério Sanches. Pacote Anticrime – Lei nº 13.964/2019: Comentários às


Alterações no CP, CPP e LEP/Rogério Sanches Cunha – Salvador: Editora JusPodivm,
2020.

Lei anticrime comentada/ André Clark Nunes Cavalcante ... {et al.} – Leme, SP: JH
Mizuno, 2020.

Silva, Márcio Alberto Gomes. Inquérito Policial – uma análise jurídica e prática da fase pré-
processual/ Márcio Alberto Gomes Silva – Salvador: JusPODIVM, 5. ed., revista, ampl. e
atualiz.2020.

Rio Branco/AC, 13 de maio de 2020.

Assinado digitalmente por


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Aretuza de Almeida Cruz


Promotora Titular da Oitava Promotoria Criminal
Coordenadora do Centro de Apoio Operacional das
Procuradorias e Promotorias Criminais – CAOP CRIM

16
ANEXO - I

PORTARIA Nº 82, DE 16 DE JULHO DE 2014.

MINISTÉRIO DA JUSTIÇA

SECRETARIA NACIONAL DE SEGURANÇA PÚBLICA

DOU de 18/07/2014 (nº 136, Seção 1, pág. 42).

Estabelece as Diretrizes sobre os procedimentos a serem observados no tocante à


cadeia de custódia de vestígios.

A SECRETÁRIA NACIONAL DE SEGURANÇA PÚBLICA DO MINISTÉRIO DA JUSTIÇA,


no uso das atribuições que lhe conferem o art. 45, do Anexo I, do Decreto nº 6.061, de 15
de março de 2007 e o art. 40, do Regimento Interno aprovado pela Portaria nº 1.821, de
13 de outubro de 2006, do Ministério da Justiça; e

considerando que a cadeia de custódia é fundamental para garantir a idoneidade e a


rastreabilidade dos vestígios, com vistas a preservar a confiabilidade e a transparência da
produção da prova pericial até a conclusão do processo judicial;

considerando que a garantia da cadeia de custódia confere aos vestígios certificação de


origem e destinação e, consequentemente, atribui à prova pericial resultante de sua
análise, credibilidade e robustez suficientes para propiciar sua admissão e permanência
no elenco probatório; e

considerando a necessidade de instituir, em âmbito nacional, a padronização da cadeia


de custódia, resolve:

Art. 1º - Ficam estabelecidas, na forma do Anexo I desta Portaria, Diretrizes sobre os


procedimentos a serem observados no tocante à cadeia de custódia de vestígios.
Art. 2º - A observância da norma técnica mencionada no artigo anterior passa a ser de
uso obrigatório pela Força Nacional de Segurança Pública.
Art. 3º - O repasse de recursos pela Secretaria Nacional de Segurança Pública para
fortalecimento da perícia criminal oficial nos Estados e no Distrito Federal levará em conta
a observância da presente norma técnica.
Art. 4º - Esta Portaria entra em vigor na data de sua publicação.

REGINA MARIA FILOMENA DE LUCA MIKI

ANEXO I

DIRETRIZES SOBRE CADEIA DE CUSTÓDIA

1. Da cadeia de custódia

17
1.1. Denomina-se cadeia de custódia o conjunto de todos os procedimentos utilizados
para manter e documentar a história cronológica do vestígio, para rastrear sua posse e
manuseio a partir de seu reconhecimento até o descarte.
1.2. O início da cadeia de custódia se dá com a preservação do local de crime e/ou com
procedimentos policiais ou periciais nos quais seja detectada a existência de vestígio.

1.3. O agente público que reconhecer um elemento como de potencial interesse para a
produção da prova pericial fica responsável por sua preservação.

1.4. A busca por vestígios em local de crime se dará em toda área imediata, mediata e
relacionada.

1.5. A cadeia de custódia compreende o rastreamento do vestígio nas seguintes etapas:

a) reconhecimento: consiste no ato de distinguir um elemento como de potencial


interesse para a produção da prova pericial;
b) fixação: é a descrição detalhada do vestígio conforme se encontra no local de crime ou
no corpo de delito, e a sua posição na área de exames, ilustrada por fotografias,
filmagens e/ou croqui;
c) coleta: consiste no ato de recolher o vestígio que será submetido à análise pericial
respeitando suas características e natureza;
d) acondicionamento: procedimento por meio do qual cada vestígio coletado é embalado
de forma individualizada, de acordo com suas características físicas, químicas e
biológicas, para posterior análise, com anotação da data, hora e nome de quem realizou
a coleta e o acondicionamento;
e) transporte: consiste no ato de transferir o vestígio de um local para o outro, utilizando
as condições adequadas (embalagens, veículos, temperatura, etc.), de modo a garantir a
manutenção de suas características originais, bem como o controle de sua posse;
f) recebimento: ato formal de transferência da posse do vestígio que deve ser
documentado com, no mínimo, as seguintes informações: número de procedimento e
unidade de polícia judiciária relacionada, local de origem, nome de quem transportou o
vestígio, código de rastreamento, natureza do exame, tipo do vestígio, protocolo,
assinatura e identificação de quem recebeu;
g) processamento: é o exame pericial em si, manipulação do vestígio de acordo com a
metodologia adequada às suas características biológicas, físicas e químicas, a fim de se
obter o resultado desejado que deverá ser formalizado em laudo;
h) armazenamento: é o procedimento referente à guarda, em condições adequadas, do
material a ser processado, guardado para realização de contraperícia, descartado ou
transportado, com vinculação ao número do laudo correspondente;
i) descarte: procedimento referente à liberação do vestígio, respeitando a legislação
vigente e, quando pertinente, mediante autorização judicial.

2. Das etapas da cadeia de custódia

2.1. As etapas da cadeia de custódia se distribuem nas fases externa e interna.

2.2. A fase externa compreende todos os passos entre a preservação do local de crime
ou apreensões dos elementos de prova e a chegada do vestígio ao órgão pericial
encarregado de processá-lo, compreendendo, portanto:
a) preservação do local de crime;
b) busca do vestígio;
c) reconhecimento do vestígio;
d) fixação do vestígio;
e) coleta do vestígio;
f) acondicionamento do vestígio;
18
g) transporte do vestígio;
h) recebimento do vestígio.

2.3. A fase interna compreende todas as etapas entre a entrada do vestígio no órgão
pericial até sua devolução juntamente com o laudo pericial, ao órgão requisitante da
perícia, compreendendo, portanto:
a) recepção e conferência do vestígio;
b) classificação, guarda e/ou distribuição do vestígio;
c) análise pericial propriamente dita;
d) guarda e devolução do vestígio de prova;
e) guarda de vestígios para contraperícia;
f) registro da cadeia de custódia.

3. Do manuseio do vestígio.

3.1. Na coleta de vestígio deverão ser observados os seguintes requisitos mínimos:

a) realização por profissionais de perícia criminal ou, excepcionalmente, na falta destes,


por pessoa investida de função pública, nos termos da legislação vigente;
b) realização com a utilização de equipamento de proteção individual (EPI) e materiais
específicos para tal fim;
c) numeração inequívoca do vestígio de maneira a individualizálo.

3.2. O recipiente para acondicionamento do vestígio será determinado pela natureza do


material, podendo ser utilizados: sacos plásticos, envelopes, frascos e caixas
descartáveis ou caixas térmicas, dentre outros.

3.3. Todos os recipientes deverão ser selados com lacres, com numeração
individualizada, de forma a garantir a inviolabilidade e idoneidade do vestígio durante o
transporte.

3.4. O recipiente deverá individualizar o vestígio, preservar suas características, impedir


contaminação e vazamento, ter grau de resistência adequado e espaço para registro de
informações sobre seu conteúdo.

3.5. Todos os vestígios coletados deverão ser registrados individualmente em formulário


próprio no qual deverão constar, no mínimo, as seguintes informações:
a) especificação do vestígio;
b) quantidade;
c) identificação numérica individualizadora;
d) local exato e data da coleta; e. órgão e o nome /identificação funcional do agente
coletor;
f) nome /identificação funcional do agente entregador e o órgão de destino (transferência
da custódia);
g) nome /identificação funcional do agente recebedor e o protocolo de recebimento; h.
assinaturas e rubricas;
i) número de procedimento e respectiva unidade de policia judiciária a que o vestígio
estiver vinculado.

3.6. O recipiente só poderá ser aberto pelo perito que vai proceder à análise e,
motivadamente, por pessoas autorizadas.

3.7. Após cada rompimento de lacre, deve se fazer constar na ficha de acompanhamento
de vestígio o nome e matrícula do responsável, a data, o local, a finalidade, bem como as
informações referentes ao novo lacre utilizado.
19
3.8. O lacre rompido deverá ser acondicionado no interior do novo recipiente.

4. Da central de custódia

4.1. Todas as unidades de perícia deverão ter uma central de custódia destinada à
guarda e controle dos vestígios. A central poderá ser compartilhada entre as diferentes
unidades de perícia e recomendase que sua gestão seja vinculada diretamente ao órgão
central de perícia.

4.2. Na central de custódia, a entrada e a saída de vestígio deverá ser protocolada,


consignando-se informações sobre a ocorrência/ inquérito que a eles se relacionam.

4.3. Todas as pessoas que tiverem acesso ao vestígio armazenado deverão ser
identificadas e deverá ser registrada data e hora do acesso.

4.4. Quando da tramitação do vestígio armazenado, todas as ações deverão ser


registradas, consignando-se a identificação do responsável pela tramitação, destinação,
data e horário da ação.

4.5. O procedimento relacionado ao registro deverá:

a) ser informatizado ou através de protocolos manuais sem rasuras;


b) permitir rastreamento do objeto/vestígio (onde e com quem se encontra) e a emissão
de relatórios;
c) permitir a consignação de sinais de violação, bem como descrevê-los;
d) permitir a identificação do ponto de rompimento da cadeia de custódia com a devida
justificativa (responsabilização);
e) receber tratamento de proteção que não permita a alteração dos registros
anteriormente efetuados, se informatizado. As alterações por erro devem ser editadas e
justificadas;
f) permitir a realização de auditorias.
5. Das disposições gerais

5.1. As unidades de polícia e de perícia deverão ter uma central de custódia que
concentre e absorva os serviços de protocolo, possua local para conferência, recepção,
devolução de materiais e documentos, possibilitando a seleção, classificação e
distribuição de materiais. A central de custódia deve ser um espaço seguro, com entrada
controlada, e apresentar condições ambientais que não interfiram nas características do
vestígio.

5.2. O profissional de perícia poderá devolver o vestígio em caso de não conformidade


entre o conteúdo e sua descrição, registrando tal situação na ficha de acompanhamento
de vestígio.

5.3. Enquanto o vestígio permanecer na Delegacia de Polícia deverá ser mantido em


embalagem lacrada em local seguro e apropriado a sua preservação. Nessa situação,
caso haja necessidade de se abrir o lacre para qualquer fim, caberá à Autoridade Policial
realizar diretamente a abertura ou autorizar formalmente que terceiro a realize, observado
o disposto no item 3.7.

ANEXO II
GLOSSÁRIO

20
Agente Público: todo aquele que exerce, ainda que transitoriamente ou sem
remuneração, por eleição, nomeação, designação, contratação ou qualquer forma de
investidura ou vínculo, mandato, cargo, emprego ou função pública.
Área Imediata: área onde ocorreu o evento alvo da investigação. É a área em que se
presume encontrar a maior concentração de vestígios relacionados ao fato.
Área Mediata: compreende as adjacências do local do crime. A área intermediária entre o
local onde ocorreu o fato e o grande ambiente exterior que pode conter vestígios
relacionados ao fato sob investigação. Entre o local imediato e o mediato existe uma
continuidade geográfica.
Área Relacionada: é todo e qualquer lugar sem ligação geográfica direta com o local do
crime e que possa conter algum vestígio ou informação que propicie ser relacionado ou
venha a auxiliar no contexto do exame pericial.
Código de Rastreamento: trata-se de um conjunto de algarismos sequenciais que possui
a capacidade de traçar o caminho da história, aplicação, uso e localização de um objeto
individual ou de um conjunto de características de um objeto. Ou seja: a habilidade de se
poder saber através de um código numérico qual a identidade de um objeto e as suas
origens.
Contraperícia: nova perícia realizada em material depositado em local seguro e isento
que já teve parte anteriormente examinada, originando prova que está sendo contestada.
Contraprova: resultado da contraperícia.
Equipamento de Proteção Individual (EPI): Todo dispositivo ou produto, de uso individual,
destinado à redução de riscos à integridade física ou à vida dos profissionais de
segurança pública.
Ficha de Acompanhamento de Vestígio: é o documento onde se registram as
características de um vestígio, local de coleta, data, hora, responsável pela coleta e
demais informações que deverão acompanhar o vestígio para a realização dos exames.
Lacre: meio utilizado para fechar uma embalagem que contenha algo sob controle, cuja
abertura somente poderá ocorrer pelo seu rompimento. Ex.: lacres plásticos, lacre por
aquecimento, fitas de lacre e etiqueta adesiva.
Pessoa Investida de Função Pública: indivíduo em relação ao qual a Administração
confere atribuição ou conjunto de atribuições.
Preservação de Local de Crime: manutenção do estado original das coisas em locais de
crime até a chegada dos profissionais de perícia criminal.
Profissionais de Perícia Criminal: profissionais que atuam nas diversas áreas da perícia
criminal, como médicos legistas, peritos criminais, papiloscopistas e técnicos de perícia.
Vestígio: é todo objeto ou material bruto, de interesse para elucidação dos fatos,
constatado e/ou recolhido em local de crime ou em corpo de delito e que será periciado.

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