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Estratégica do Exército
Abr 26 Postado por Gen Ex Richard Fernandez Nunes em Defesa
As discussões levadas a cabo para a implementação dessa visão foram abrangentes e inéditas,
devido à dificuldade de obtenção de literatura capaz de considerar as condicionantes específicas
da expressão militar de um país com a trajetória histórica e as dimensões geográfica, política e
estratégica do Brasil. Tentativas de adaptação de doutrinas estrangeiras, particularmente
praticadas em blocos e alianças multinacionais, definitivamente não fornecem soluções aplicáveis
à nossa realidade sui generis.
Como resultado de todo esse esforço, vários documentos foram elaborados. Algumas portarias do
Comandante do Exército e do EME, como a que instituiu as regras para o emprego das mídias
sociais, começaram a ser publicadas em 2019. Mas foi no ano seguinte que o arcabouço
normativo se completou. A Portaria nº 1.237-C Ex, de 23 de novembro de 2020, que aprova a
Diretriz Geral de Comunicação Estratégica no Âmbito do Exército, consolida e integra conceitos,
responsabilidades e ações a realizar.
A propósito do uso deste acrônimo tão peculiar ao Exército, cabe ressaltar que o recurso a esse
expediente para simplificar o entendimento e a memorização de conceitos vem de longa data, mas
tem-se intensificado com o volume extraordinário de informações disponibilizado na Era do
Conhecimento. Por serem úteis ao tema deste artigo, serão discutidos o VUCA e o BANI.
E daí? Como sair desse atoleiro? O estudo do lançoiii, neste caso, perde qualquer noção de
simplicidade.
Analisar essas características pode ser útil, se não para a obtenção de balizamento mais claro ao
planejamento, pelo menos para se evitar certas armadilhas capazes de turvar o pensamento e as
atitudes. Se é lícito supor que estamos diante de ambientes voláteis, incertos, complexos e
ambíguos, é indispensável que os diversos sistemas que compõem a Instituição sejam integrados,
alinhados e sincronizados. Se entendermos a comunicação estratégica como um sistema de
sistemas, podemos reduzir significativamente as ameaças e potencializar o aproveitamento das
oportunidades, com vistas à consecução dos objetivos estratégicos do Exército.
Mas o que parecia complicado ficou ainda mais instigante. Em 2018, o norte-americano Jamais
Cascio, a partir da premissa de que o Mundo VUCA não favorecia mais o entendimento acerca da
conjuntura atual, cunhou o acrônimo BANI (“brittle”/frágil, ansioso, não linear e incompreensível),
que também logrou se popularizar, impulsionado pela perplexidade causada pela pandemia da
COVID-19. Em sua visão, o Mundo VUCA admite a ideia de planejamento, desde que considerada
a interligação de múltiplos sistemas; quando isso não funciona, surge o Mundo BANI, para
expressar o caos resultante e nos fazer refletir sobre a necessidade de esboçar cenários capazes
de nos proporcionar caminhos plausíveis a seguir.
Ainda assim, cabe a pergunta: e daí? Como lidar com isso? Longe de cair em desânimo, é
necessário aprimorar nosso ESAON, nossa capacidade de interpretação da realidade, a fim de se
evitar a mera aceitação dessas características globais como condicionantes incontornáveis.
Se os mundos VUCA e BANI ainda não tiverem despertado suficiente inquietação, que tal uma
provocação ao pensamento crítico? No que diz respeito ao entendimento da dimensão
informacional, sugiro cunharmos outro acrônimo: PSIC! Não, talvez não seja o que sugere. Não se
trata de rotular o ambiente como psicótico, desconectado da realidade. Para muitos pode ser isso
mesmo, mas o que tenho observado é que estamos diante de um mundo precipitado, superficial,
imediatista e conturbado.
A conturbação tem encontrado terreno fértil na polarização exacerbada que tem caracterizado as
relações sociais por todo o mundo. O que se observa é a preferência pelo dissenso em detrimento
do consenso, a primazia das controvérsias e o desprezo pelo diálogo. Esse comportamento
chama a atenção em certas plataformas de mídias sociais, onde o que mais se encontra são
ofensas e demonstrações de intolerância. Na chamada mídia tradicional não é diferente. Certas
matérias mais se assemelham a provocações irresponsáveis, alimentadas por atípicos bombeiros,
que apagam incêndio com gasolina. É preciso reagir com lucidez a esse desafio. Se
considerarmos como premissa que “quem me irrita me domina”, responder a certos provocadores
pode ser exatamente a resposta por eles esperada. A maturidade proporcionada pela
comunicação estratégica – alinhada, integrada e sincronizada – pode indicar a melhor linha de
ação a adotar.
Por fim, é de se destacar que, ante a carência de referências típica desta época em que vivemos,
há que se fortalecer o ethos militar, única garantia de preservação da autenticidade e da
relevância da Instituição. Além do desenvolvimento de competências pessoais e de capacidades
organizacionais, o que é fundamental para se fazer um adequado ESAON, com vistas à melhor
condução da comunicação estratégica, nos ambientes VUCA, BANI, ou até mesmo PSIC, é a
permanente observância dos princípios éticos e dos valores morais que têm notabilizado o
Exército Brasileiro ao longo de sua extraordinária trajetória histórica.
i Definição proposta em artigo publicado após apresentação sobre o tema no XXI Ciclo de Estudos
Estratégicos da ECEME, em julho de 2019 (Nunes, R. F. A Comunicação Estratégica do Exército e
a Dimensão Informacional. Coleção Meira Mattos: revista das ciências militares, v. 13, n. 48, p. v-
xi, 8 nov. 2019.)
iii Em situação de combate, para progredir no terreno, o militar deve condicionar-se a responder
aos seguintes questionamentos: Para onde vou? Por onde vou? Como vou? Quando vou?
iv Em 2020, por proposta do CCOMSEx, o COTER aprovou o Caderno de Instrução de
Comunicação Social – Formação Básica, que orienta a instrução a ser ministrada a todos os
militares incorporados ao Exército acerca deste e de outros assuntos correlatos.