Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
PANORAMA GERAL
*
Coordenadora do Laboratório de Pedagogia do Movimento Humano e do Curso de Bacharelado em Educação Física da
Escola de Educação Física e Esporte da Universidade de São Paulo.
**
Coordenador do Curso de Licenciatura em Educação Física da Escola de Educação Física e Esporte da Universidade de
São Paulo.
Rev. paul. Educ. Fís., São Paulo, v.13, p.78-87, dez. 1999. N.esp.
Pedagogia do movimento humano 79
Rev. paul. Educ. Fís., São Paulo, v.13, p.78-87, dez. 1999. N.esp.
80 OKUMA, S.S. & FERRAZ, O.L.
(1983), que utilizou as variáveis tempo de espera, aprendizagem e desenvolvimento humano em todo
tempo em atividade, grau de adequação e o ciclo de vida. Esse conhecimento é
porcentagem de sucesso na tarefa para determinar a imprescindível e, portanto, deve ser integrado à
eficiência no ensino. Além disso, as pesquisas em produção científica dessa área para auxiliar na
ensino, utilizando delineamentos experimentais elaboração e implementação de programas de
mais clássicos, testaram os efeitos de diferentes educação física. Sendo assim, há necessidade de
condições específicas de aprendizagem como os que outras áreas, como Aprendizagem e
métodos de ensino diretivo e solução de problemas, Desenvolvimento Motor, Fisiologia do Esforço,
o método global ou partes, ou a quantidade e tipo Biomecânica, Psicologia, Antropologia e
de “feedback”. Essas investigações buscaram Sociologia da Educação Física, enfatizem temas
estabelecer parâmetros para a adaptação de profissionais por meio de pesquisas aplicadas.
modelos genéricos de ensino a situações Esse parece ser o desafio do
particulares (Metzler, 1982; Mosston & Ashworth, Departamento de Pedagogia do Movimento
1986; Siedentop, 1986). Humano e, especificamente, do Laboratório de
Atualmente, as pesquisas em Pedagogia do Movimento (LAPEM), que
Pedagogia do Movimento têm utilizado apresentaremos a seguir.
metodologia qualitativa para entender como o
processo ensino-aprendizagem acontece no
ambiente “natural” da prática pedagógica dos O LABORATÓRIO DE PEDAGOGIA DO
professores. Utilizando técnicas derivadas da MOVIMENTO HUMANO - LAPEM
antropologia, psicologia e sociologia, as pesquisas
nessa abordagem têm descrito detalhadamente e O Laboratório de Pedagogia do
em profundidade o que os professores e aprendizes Movimento Humano da EEFEUSP foca suas
fazem e pensam (Daólio, 1992; Darido, 1997; investigações tanto na área de ensino, como na de
Harrington, 1987). Diferentemente das análises formação profissional, tendo como objetivo
descritivas, os pesquisadores qualitativos não principal o desenvolvimento de linhas de pesquisa
observam o “ambiente est udado” com categorias que visam a organização e síntese de
de análise pré-determinadas. Imergindo no conhecimentos básicos sobre o ser humano e a
contexto que está sendo investigado, pressupõem atividade física, para aplicá-los no
ser possível o entendimento da realidade social desenvolvimento de programas e métodos de
com toda sua complexidade e especificidade educação física. Caracteriza-se pelo
(Locke, 1989). A literatura científica nessa desenvolvimento de pesquisas eminentemente
abordagem tem proporcionado conhecimentos aplicadas, tendo suas áreas de atuação na Educação
sobre a prática pedagógica dos professores, Física não Formal (não escolar), Educação Física
articulando as decisões de planejamento, as Formal (escolar) e Educação Física Adaptada
diferentes formas de implementação e as (escolar e não escolar).
possibilidades de avaliação de programas em
educação física.
A conscientização crescente de que a EDUCAÇÃO FÍSICA NÃO ESCOLAR
Educação Física é uma área profissionalizante, tem
demonstrado a necessidade de pesquisas aplicadas Linha de Pesquisa: Comunicação Não-
que objetivem uma investigação sistemática dos Verbal
temas profissionais (Bressan, 1982; Ellis, 1990;
Locke, 1990; Siedentop, 1990) e esse aspecto Uma das linhas de pesquisa
enfatiza a importância da área de Pedagogia do instituída na Educação Física não Escolar foi a
Movimento. Entretanto, isso não significa Comunicação Não-Verbal, que estuda os
independência total em relação às pesquisas fenômenos psico-sociais da comunicação inter-
básicas, pois a Educação Física ainda não possui individual e inter-grupal do ser humano, por meio
uma base de conhecimentos próprios para sustentar da análise de diferentes unidades de comunicação
seu desenvolvimento (Tani, 1996). não verbal, relacionadas ao corpo e à educação
Apesar da evolução nos estudos em física.
Pedagogia do Movimento, com um número cada
vez maior de pesquisas, há carência de Projeto em andamento: Comunicação não verbal: o
conhecimento a respeito dos processos de conhecimento e as habilidades de emitir e receber
Rev. paul. Educ. Fís., São Paulo, v.13, p.78-87, dez. 1999. N.esp.
Pedagogia do movimento humano 81
Rev. paul. Educ. Fís., São Paulo, v.13, p.78-87, dez. 1999. N.esp.
82 OKUMA, S.S. & FERRAZ, O.L.
de atividade física para idosos é a condição observado nas recomendações feitas durante o 5o.
funcional que eles apresentam, de modo que as Congresso Mundial de Atividade Física,
diferenças individuais sejam respeitadas e que Envelhecimento e Esporte, realizado no mês de
propostas adequadas sejam oferecidas (ACSM, agosto de 1999, nos EUA. Foi proposto como o
1998). Portanto, os profissionais de Educação grande desafio para os profissionais que estudam e
Física devem conhecer as amplas dispersões na trabalham com idosos, aprenderem a integrar a
capacidade e “performance” motora dos idosos e atividade física num amplo contexto social,
seus padrões de atividades normais. Isso, como já cultural e econômico de envelhecimento ativo.
comentado, não está totalmente esclarecido, o que Outra recente sugestão, advinda das
demanda mais pesquisas para tal elucidação. proposições feitas pelas Nações Unidas, mediante
Pela enorme variabilidade inter- seu Programa para a Velhice, é a da necessidade de
individual vem-se considerando que programas de criação de programas intergeracionais, seguindo-se
atividade física para idosos devem ter prescrições a tendência da Gerontologia contemporânea. A
individualizadas. Entretanto, atualmente, há um proposta é de que se integre idosos com crianças,
consenso de que os programas mais efetivos devem jovens e adultos, num ambiente educacional, onde
ser multidimensionais, com combinação de há aprendizagem mútua. Iniciativas desse tipo têm
atividades cardiovasculares, de força muscular, de se mostrado produtoras de mudanças de atitude em
flexibilidade, de equilíbrio e de coordenação relação ao envelhecimento e ao velho nas gerações
(Chodzko-Zaiko, 1999; Clark, 1998; Okuma, 1998; mais novas, modificando estereótipos que existem
Van Norman, 1995). acerca dessa população e melhorando as relações
A despeito do conhecimento sobre os com os velhos e com o próprio envelhecer. Além
benefícios que a atividade física traz, a proporção disso, parece que programas intergeracionais têm
de idosos que a pratica regularmente é baixa, no se mostrado com potencial para aumentar a
mundo todo, como mostram os dados, por qualidade da experiência em tal contexto, o que por
exemplo, dos EUA (15% dos idosos são sua vez poderia ser um forte motivador para a
praticantes, Chodzko-Zaiko, 1999) e do Japão manutenção das pessoas em programas de
(40% dos homens e 38% das mulheres, Ohata, atividade física.
Tabata & Mochizuki, 1999). Embora o nível de Considerando-se esse panorama,
participação em programas de atividade física varie pode-se compreender a inserção dos projetos de
de país para país, em nenhum deles a inatividade pesquisa desenvolvidos em alguns dos aspectos
física deixa de ser considerada um problema de levantados, o que é descrito a seguir:
saúde pública significante. Ainda não se sabe com
clareza sobre a complexidade de fatores que levam Linha de Pesquisa: Educação Física na
satisfação social e, para alguns, bem-estar Programa “Autonomia para a Atividade Física
espiritual (Chodzko-Zaiko, 1999). A necessidade (PAAF)”: análise de sua eficácia;
de tal integração vem sendo a mais recente
sugestão entre os especialistas da área em relação
aos programas para idosos, o que pôde ser
Rev. paul. Educ. Fís., São Paulo, v.13, p.78-87, dez. 1999. N.esp.
Pedagogia do movimento humano 83
Projeto Vida Ativa - Efeitos do PAAF sobre o mediante breve análise histórica, os diferentes
comportamentais e ambientais nos implica que esse componente curricular tem sido
comportamentos de adesão e não-adesão de “aprovado” ao longo do tempo!
idosos a programas de atividade física Em que pese os diferentes sistemas
sistemática; educacionais com variadas orientações ideológicas,
Rev. paul. Educ. Fís., São Paulo, v.13, p.78-87, dez. 1999. N.esp.
84 OKUMA, S.S. & FERRAZ, O.L.
(Mariz de Oliveira, 1991; Tani, 1998b). Rompendo indefinição de uma área básica de conhecimento
com a influência militar e médica, professores de (Tani, 1996), além das questões gerais da
várias instituições de ensino superior, formados em escolarização. Essas últimas ressaltam os
cursos de pós-graduação em diversas áreas do problemas advindos da passagem de uma
conhecimento, elaboraram novos fundamentos e escolarização reduzida para uma escolarização de
propostas pedagógicas para a educação física massas, o hiato entre teoria e prática educacional e
escolar (Betti, 1996). Esse período, marcado por as condições de trabalho adversas, tais como
intensos debates, resultou em uma quantidade salário, material didático, número de alunos, entre
substancial de publicações de livros, teses e na outros, como exemplifica Carvalho (1997).
criação de vários periódicos. A Lei de Diretrizes e Bases da
Um fato importante, decorrente Educação Nacional (Brasil, Lei 9.394/1996)
desse processo, foi a reestruturação dos cursos de estabelece como princípio e finalidade da educação
preparação profissional e a conseqüente criação do escolar o pleno desenvolvimento do educando, seu
bacharelado diferenciado da licenciatura, no caso preparo para o exercício da cidadania e sua
específico da Escola de Educação Física e Esporte qualificação para o trabalho. Embora haja consenso
da USP, pressupondo-se que a atuação do sobre o objetivo de promover o desenvolvimento
profissional de educação física também pode integrado dos aspectos físicos, emocionais,
ocorrer fora do contexto escolar, como academias, cognitivos e sociais do aluno como um ser
clubes e centros esportivos de lazer, entre outros, indivisível, divergências têm surgido, no contexto
além da possibilidade do trabalho profissional de da educação escolarizada, em virtude do que seja
assessorias na construção de equipamentos, trabalhar com esses aspectos valendo-se de cada
instalações, organização de eventos esportivos e de disciplina curricular.
lazer. Considerando-se, em particular, o
Um outro aspecto fundamental é a componente curricular Educação Física, como
verificação da proposição de uma variedade de propor e implementar um projeto pedagógico em
abordagens sendo elaboradas e disseminadas nos que ele não seja simplesmente justaposto aos
cursos de formação e aperfeiçoamento profissional demais? Como estabelecer uma intervenção
em vários estados brasileiros. Contudo, estudos pedagógica onde a especificidade de cada área seja
recentes (Darido, 1997; Lopez Moraga, 1997; integrada em um todo maior, considerando,
Resende, 1995) têm constatado que a mudança entretanto, que as capacidades humanas
qualitativa substancial no dia-a-dia da ação constituem-se em espaços diferenciados? Além
pedagógica do professor na escola, resultante do disso, a noção de desenvolvimento do educando
impacto dessas publicações e discussões, ainda não precisa ser adjetivada, pois desenvolver-se implica
ocorreu. seguir uma direção. Mas, que direção é essa? É
Ao que tudo indica, apesar da para repetir ou transformar o já instituído? É para
proposição de uma variedade de abordagens para o acumular conhecimentos úteis? Mas, úteis para
desenvolvimento da educação física escolar em quem e para quê? Essa tomada de posição é
forma de livros como a humanista (Oliveira, 1985), fundamental na escolarização, uma vez que
a psicomotricista (Negrine, 1983), a educação é um processo permanente de valoração
desenvolvimentista (Tani, Manoel, Kokubun & (Machado, 1995).
Proença, 1988), a construtivista (Freire, 1989), a O pressuposto de que a educação em
histórico-crítica (Soares, Taffarel, Varjal, uma instituição escolar não pode ocorrer
Castellani Filho, Escobar & Bracht, 1992) e em independentemente do ensino de conteúdos
forma das várias propostas curriculares municipais, escolares tem sido tema freqüente nas discussões
estaduais e, especialmente, os Parâmetros acadêmicas e entre os profissionais da
Curriculares Nacionais para o Ensino Básico do escolarização. Conforme nos esclarece Carvalho
Ministério de Educação e Cultura, o salto (1997), escolarização implica em ensino e a noção
qualitativo ainda está para acontecer. do verbo “ensinar”, seja qual for a definição que
Vários problemas têm sido se tenha de desenvolvimento, pede uma estrutura
apontados como causas dessa situação, entre eles, o triádica. Sempre que há ensino, “há alguém que
distanciamento do ambiente acadêmico em relação ensina, algo a ser ensinado e alguém a quem se
ao meio profissional (Betti, 1996; Bracht, 1993; ensina”. Embora pareça trivial, argumenta o autor,
Resende, 1995), a falta de uma identidade essa é a especificidade e concretude do trabalho do
acadêmica da educação física e a decorrente professor: demonstrando o compromisso da
Rev. paul. Educ. Fís., São Paulo, v.13, p.78-87, dez. 1999. N.esp.
Pedagogia do movimento humano 85
educação escolar com as realizações históricas que Educação Física Adaptada (Teixeira, 1998).
constituem os conteúdos, as disciplinas e os valores Também tem sido imprescindível
socialmente escolhidos. para a evolução da área, o desenvolvimento de
Considerando-se esse panorama da pesquisas básicas que procuram compreender os
Educação Física Escolar é que alguns dos projetos mecanismos e processos envolvidos na
de pesquisa estão sendo desenvolvidos no LAPEM, especificidade de cada deficiência e sua
os quais são descritos a seguir: manifestação numa situação particular. Sendo
assim, as pesquisas em Educação Física Adaptada,
Linhas de Pesquisa recentemente, passaram de um enfoque
eminentemente aplicado, onde buscava-se adequar
Desenvolvimento Curricular: estudo dos procedimentos, materiais e instalações para que
aspectos filosóficos, históricos e pedagógicos pessoas portadoras de necessidades especiais
ligados à construção de currículo, à elaboração pudessem desenvolver sua motricidade, para um
de programas, a integração vertical e tema de investigação científica mais amplo, em que
horizontal dos componentes da grade são efetuadas tanto pesquisas básicas quanto
curricular de educação física na escola aplicadas.
brasileira; Todavia, os propósitos, meios,
Rev. paul. Educ. Fís., São Paulo, v.13, p.78-87, dez. 1999. N.esp.
86 OKUMA, S.S. & FERRAZ, O.L.
Rev. paul. Educ. Fís., São Paulo, v.13, p.78-87, dez. 1999. N.esp.
Pedagogia do movimento humano 87
Rev. paul. Educ. Fís., São Paulo, v.13, p.78-87, dez. 1999. N.esp.