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UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO

INSTITUTO DE CIÊNCIAS HUMANAS E SOCIAIS


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM GEOGRAFIA

AS PERSPECTIVAS DA LEGALIDADE NA FRONTEIRA


CÁCERES/BRASIL E SAN MATÍAS/BOLÍVIA SOB A ÓTICA DA
GEOGRAFIA

MARCELA CANÇADO NOGUEIRA PARIS

ORIENTADOR: PROF. DR. LUIZ DA ROSA GARCIA NETTO

CUIABÁ, MT.
NOVEMBRO, 2013.
UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO
INSTITUTO DE CIÊNCIAS HUMANAS E SOCIAIS
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM GEOGRAFIA

AS PERSPECTIVAS DA LEGALIDADE NA FRONTEIRA


CÁCERES/BRASIL E SAN MATÍAS/BOLÍVIA SOB A ÓTICA DA
GEOGRAFIA

MARCELA CANÇADO NOGUEIRA PARIS

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Geografia


da Universidade Federal de Mato Grosso, como parte dos requisitos
para a obtenção do título de Mestre em Geografia, na área Ambiente e
Desenvolvimento Regional.

ORIENTADOR: PROF. DR. LUIZ DA ROSA GARCIA NETTO

CUIABÁ, MT.
NOVEMBRO, 2013.
Dados Internacionais de Catalogação na Fonte

P232p Paris, Marcela Cançado Nogueira

As perspectivas da legalidade na fronteira Cáceres/Brasil e San Matias/Bolívia


sob a ótica da geografia / Marcela Cançado Nogueira Paris. – Cuiabá, 2013.

xi, 114 f. ; 30 cm (incluem figuras e tabelas)

Orientador: Luiz da Rosa Garcia Netto

Dissertação (mestrado) -- Universidade Federal de Mato Grosso, Instituto de


Ciências Humanas e Sociais, Programa de Pós-graduação em Geografia, Cuiabá,
2013.

Bibliografia: f. 105-114
Catalogação na fonte: Maurício S.de Oliveira CRB/1-1860.

1.Divisão territorial - legalidade. 2. Fronteira Brasil-Bolívia. 3. Categorias


geográficas. I.Título.

CDU 911.3:32 (81/84)


UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO
INSTITUTO DE CIÊNCIAS HUMANAS E SOCIAIS
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM GEOGRAFIA

FOLHA DE APROVAÇÃO

TÍTULO: AS PERSPECTIVAS DA LEGALIDADE NA FRONTEIRA


CÁCERES/BRASIL E SAN MATÍAS/BOLÍVIA SOB A ÓTICA DA
GEOGRAFIA

AUTOR(A): MARCELA CANÇADO NOGUEIRA PARIS

Dissertação defendida e aprovada em 29 de novembro de 2013, pela comissão julgadora:

_________________________________________________
Prof. Dr. Luiz da Rosa Garcia Netto – Orientador
Universidade Federal de Mato Grosso

__________________________________________________
Prof. Dr. Cornélio Silvano Vilarinho Neto – Examinador Interno
Universidade Federal de Mato Grosso

__________________________________________________
Prof. Dr. Geovany Jessé Alexandre da Silva – Examinador Externo
Universidade Federal da Paraíba

__________________________________________________
Profª. Dra. Cleusa Aparecida Gonçalves Pereira Zamparoni – Suplente
Universidade Federal de Mato Grosso
À minha filha Alice: razão da minha vida.
Que me ensina a ser mãe e a ser criança de novo.
Que me ensina, a cada dia, o significado do amor e da paciência.
Que coloca mais cor na vida.
AGRADECIMENTOS

Diz um provérbio africano que “A sola do pé conhece toda a sujeira da estrada”.


Chegar até aqui não foi uma tarefa fácil, mas se cheguei devo agradecer a tanta gente que
sempre confiou em mim.

Ao meu orientador e amigo Luiz da Rosa Garcia Netto, por todos os ensinamentos que
me permitiram crescer a cada diálogo e que fez despertar em mim o desejo pela docência.

Ao Prof. Cornélio Silvano Vilarinho Neto, por ter aceitado o convite de fazer parte da
minha banca de mestrado e por toda a experiência profissional e apontamentos feitos que
deram mais qualidade à dissertação.

Ao Prof. Geovany Jessé Alexandre da Silva, por também ter aceitado o convite de
fazer parte da minha banca de mestrado e que fez sugestões e análises de extrema relevância
ao estudo proposto.

Aos professores do Programa de Pós Graduação em Geografia da Universidade


Federal de Mato Grosso, especialmente na pessoa das professoras Cleusa Aparecida
Gonçalves Pereira Zamparoni, Tereza Cristina Cardoso Higa e Nely Tocantins, pela
confiança, incentivo e disponibilidade com que sempre se dispuseram a me auxiliar.

Às professoras Giseli Dalla Nora e Amli Paula Miranda por todas as manifestações de
incentivo na minha caminhada enquanto mestranda.

Aos colegas de mestrado com quem pude compartilhar valiosos momentos de debate
acadêmico que certamente acrescentaram conteúdo e amizade na essência de cada um de nós.

À Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior – CAPES, cujo


apoio financeiro no primeiro ano de mestrado foi fundamental para viabilizar a caminhada no
universo das pesquisas acadêmicas.

Aos amigos e familiares que compreenderam a minha ausência e que sempre


confiaram nas minhas escolhas.

À Patrícia Valdez, cidadã boliviana, que me auxiliou nas pesquisas referentes à


Bolívia, tornando o caminho desconhecido menos tortuoso.

Ao companheiro Osvaldo Alexandre Paris pelo incentivo e estímulo no processo


seletivo de mestrado, bem como por ter emprestado a sua arte nas ilustrações da dissertação.

À minha mãe Marta Maria Cançado Nogueira de quem herdei a perseverança, o prazer
pelo estudo e a garra para superar as adversidades da vida. Por ser também o meu maior
exemplo de ser humano, de mãe e de mulher.

À Deus, por ter me mostrado, em cada etapa da vida, que eu sou capaz e por me dar
forças diariamente para atingir os meus objetivos.

Muito obrigada!
“Durante a Idade Média a fronteira não era mais do que uma ficção. Como poderia ser
diferente, se faltava toda instrumentação cartográfica de precisão. Foi a Renascença
que, ao criar o mapa geográfico, provocou a projeção material da idéia. O espírito
de simplificação traço manifesto da civilização moderna, introduz traçados visíveis e
precisos – fronteira linear, fronteira natural. Mais tarde, a Revolução Francesa
introduziu o conceito de Nação no vocabulário político, invocando uma noção que,
não sendo mais instável, pelo menos é mais subjetiva, a fronteira espiritual”.
Jacques Ancel, “Geographie des Frontieres” – 1938
LISTA DE FIGURAS

FIGURA 01 – Eixo da Rota Pantanal Pacífico.........................................................................13


FIGURA 02 – Caracterização da área de estudo – Cáceres/MT – Brasil e San Matías – Bolívia
...........................................................................................................................32
FIGURA 03 – Área de Abrangência da Amazônia Legal........................................................33

LISTA DE QUADROS

QUADRO 01 – Diferentes abordagens acerca da categoria geográfica território..................21

QUADRO 02 - Recursos naturais passíveis de integração da rota turística sob a


área de influência da RPP..............................................................................29
QUADRO 03 – Comparativo Cáceres – San Matias..............................................................35
QUADRO 04 – Trechos da Declaração Universal dos Direitos do Homem............................40
QUADRO 05 – Propostas de Emenda Constitucional sobre a Fronteira no Brasil..................49
QUADRO 06 - Ações do Governo Federal na Faixa de Fronteira.........................................52

QUADRO 07 - O tratamento dado à Faixa de Fronteira na América do Sul..........................77


QUADRO 08- Relações Bilaterais – Brasil e Bolívia ...........................................................84
QUADRO 09 - Propostas integracionistas e seus critérios de análise.....................................99
LISTA DE SIGLAS

ABNT Associação Brasileira de Normas Técnicas


A.C Antes de Cristo
ALCS Áreas de Livre Comércio
ANTT Agência Nacional de Transportes Terrestres

IBDFAM Instituto Brasileiro de Direito de Família


CADASTUR Sistema de Cadastro de Prestadores de Serviços Turísticos
D.O.U Diário Oficial da União
FAPEMAT Fundação de Amparo à Pesquisa de Mato Grosso
FIFA Federação Internacional de Futebol
FRONTUR Seminário Internacional de Turismo de Fronteira

GEEPI Grupo de Estudos Estratégicos e de Planejamento Integrado


GEFRON Grupo Especial de Segurança de Fronteira
IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
INCRA Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária
IPEA Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada
IPP Instituto Pantanal Pacífico
MDIC Ministério de Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior
MERCOSUL Mercado Comum do Sul
MI Ministério da Integração Nacional
OMT Organização Mundial de Turismo
PAP Programa Amazônia Protegida
PDFF Programa de Promoção do Desenvolvimento da Faixa de Fronteira

PDN Política de Defesa Nacional


PEC´S Propostas de Emendas Constitucionais
PIB Produto Interno Bruto
PRONASCI Programa Nacional de Segurança Pública com Cidadania
RPP Rota Pantanal Pacífico
SIMITUR Seminário Internacional sobre Migração e Turismo

SINIVEM Sistema Integrado Nacional de Identificação de Veículos em


Movimento
SIS Sistema Integrado de Saúde das Fronteiras
SUFRAMA Superintendência da Zona Franca de Manaus

TEC Tarifa Externa Comum


UFMT Universidade Federal de Mato Grosso
UFRJ Universidade Federal do Rio de Janeiro
UFRS Universidade Federal do Rio Grande do Sul
UNESCO Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura
SUMÁRIO

INTRODUÇÃO................................................................................................................12

1. A FRONTEIRA E SUAS CATEGORIAS GEOGRÁFICAS DE


ANÁLISE.....................................................................................................................18
1.1 O Território...................................................................................................................19
1.2 A Fronteira....................................................................................................................23
1.3 A Paisagem...................................................................................................................27
1.4 Caracterização da Área de Estudo................................................................................31

2. AS TRÊS DIMENSÕES DA FRONTEIRA.............................................................38


2.1.Para o indivíduo............................................................................................................38
2.2.Para o Estado.................................................................................................................42
2.3.Para o Direito Global....................................................................................................46
2.4.Projetos de Fronteira – Brasil.......................................................................................51

3. GEOGRAFIA DO TURISMO E DIREITO DO TURISMO: A DINÂMICA


NAS FRONTEIRAS E SUAS IMPLICAÇÕES.......................................................59
3.1.Considerações Preliminares..........................................................................................59
3.2.Geografia do Turismo...................................................................................................63
3.3.Direito do Turismo........................................................................................................66

4. UM ENSAIO DA FRONTEIRA CÁCERES – SAN MATIAS...............................73


4.1.O Direito Comparado na fronteira................................................................................73
4.2.A Zona de Fronteira Cáceres – San Matías...................................................................75
4.3.A “Refuncionalização” das fronteiras e as propostas integracionistas.......................93

CONSIDERAÇÕES FINAIS.........................................................................................101

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS..........................................................................105
RESUMO

O processo de integração econômica, social e cultural trazido pela globalização e pela


tendência de formação de blocos econômicos trouxe à tona o clichê de um mundo sem
fronteiras, com queda de barreiras alfandegárias, a livre circulação de mercadorias, serviços,
capitais e pessoas, com a desburocratização do direito de ir e vir. Nessa perspectiva, a
fronteira que antes era vista como linha de corte, limite de soberania nacional, passa a ser
percebida como espaço de contato, de coexistência e cooperação. A partir do conceito de
viabilidade da Rota Pantanal Pacífico, mas também diante da impossibilidade de estudar todas
as fronteiras descritas na respectiva rota, a zona de fronteira Cáceres/Brasil e San
Matías/Bolívia foi eleita como área de estudo, a fim de demonstrar que países fronteiriços,
com legislações distintas, todavia, com grandes potencialidades turísticas, podem fomentar a
cooperação e integração transfronteiriça, a partir da atividade econômica do turismo. Do
ponto de vista teórico metodológico, as análises foram fundamentadas, especialmente, a partir
de três categorias geográficas, a saber: o território, a paisagem e a fronteira. O Direito
Comparado também foi um método de análise, com base no qual se procurou interpretar e
harmonizar as legislações voltadas para o turismo, a fim de favorecer o processo de
integração. A dissertação tem caráter eminentemente conceitual e não foram aplicados
questionários ou feitas entrevistas. A partir da bibliografia eleita e das informações levantadas
foram elaboradas propostas integracionistas, visando à integração da zona de fronteira
Cáceres/Brasil e San Matías/Bolívia, com vistas a intensificar o turismo transfronteiriço. Ao
final, pretende-se promover uma reflexão acerca do conceito de fronteira, bem como
compreender o processo de “refuncionalização” que evidenciou a permeabilidade e
flexibilidade para estas regiões. O tema se reveste de importância à medida que integra
contexto regional matogrossense e discute assunto relevante para a Geografia. Além disso, a
pesquisa permite um diálogo interdisciplinar entre duas ciências sociais, a Geografia e o
Direito e tem sido objeto de frequente debate em eventos nacionais e internacionais, além de
ser uma preocupação da esfera governamental o que tem proporcionado a criação de
programas de desenvolvimento nas fronteiras.

Palavras-Chave: Legalidade. Fronteira. Categorias Geográficas. Brasil. Bolívia.


ABSTRACT

The process of integrating economic, social and cultural brought by globalization and the
trend of formation of economic blocs brought out the cliché of a borderless world, down trade
barriers, free movement of goods, services, capital and people, with the bureaucracy of the
right to come and go. In this perspective, the border was once seen as the cutting line, limit
national sovereignty, is perceived as a place of contact, coexistence and cooperation. From the
concept of viability of Rota Pantanal Pacific, but also because of the impossibility of studying
all boundaries described in its route, the border zone Caceres / Brazil and San Matías / Bolivia
was chosen as the study area in order to demonstrate that neighboring countries, with different
laws, however, with great tourism potential, can enhance cooperation and cross-border
integration, from the economic activity of tourism. From the standpoint of theory and method,
analyzes were based, especially from three geographical categories, namely: the territory, the
landscape and the border. The Comparative Law was also a method of analysis, based on
which it sought to interpret and harmonize legislation focused on tourism, in order to facilitate
the integration process. The dissertation is eminently conceptual and have not been made
questionnaires or interviews. From the bibliography elected and information gathered
integrationist proposals were prepared, aiming to integrate the border zone Caceres / Brazil
and San Matías / Bolivia, to intensify cross-border tourism. At the end, we intend to promote
a reflection on the concept of the border as well as understand the process of
“refunctionalization” showed that the permeability and flexibility for these regions. The topic
is of importance as it integrates matogrossense regional context and discusses relevant subject
for Geography. Furthermore, the survey allows an interdisciplinary dialogue between two
social sciences, geography and law and has been the subject of frequent debate in national and
international events, as well as being a concern from government which has provided the
creation of development programs in borders.

KEYWORDS: Legality. Border. Geographic categories. Brazil. Bolivia


12

INTRODUÇÃO

Pensar a fronteira significa pensar em dualidade, em pluralismo, em polissemia.


Estudar a fronteira requer, antes de tudo, se despir de pré-conceitos e derrubar mitos que
pairam no senso comum. Dialogar com a fronteira exige, acima de tudo, a percepção pelo
espaço e pelas vozes que de lá ecoam.
Neste contexto de pluralismo, a globalização, enquanto processo de integração
econômica, social e cultural, trouxe à tona o clichê de um mundo sem fronteiras, com queda
de barreiras alfandegárias, com a livre circulação de mercadorias, serviços, pessoas e capitais.
Ora, a globalização derrubou o mito das fronteiras para levantar a bandeira de um novo mito:
o da inexistência de fronteiras, como foi delineado por Raffestin (1993).
A partir daí, estudar a fronteira é um tema instigante que exige do seu observador um
olhar interdisiciplinar, em razão da dinâmica própria em que são construídas as relações
sociais e espaciais neste espaço. Tomado nesta perspectiva, a fronteira que antes era vista
como linha de corte, limite da soberania nacional, passa, num contexto, pós-moderno, a ser
percebida como espaço de contato, de coexistência e possível cooperação turística. E assim,
um novo turismo de fronteira é delineado, fazendo-se necessário estudar esse cenário que se
descortina.
Neste sentido, estudar a fronteira veio aliado à vontade de ampliar o tema “Rota
Pantanal Pacífico”, que se refere a um projeto de integração turística dos povos e das culturas
do continente sul americano, desenvolvido em 2007, pelo GEEPI – Grupo de Estudos
Estratégicos e de Planejamento Integrados – Departamento de Geografia/UFMT, que deu
origem ao Instituto Pantanal Pacífico (IPP, 2008). E, considerando que o referido projeto já
foi objeto de estudo de diferentes profissionais - arquiteto, jornalista e geógrafo -, e de que
ainda não havia um olhar jurídico a respeito da legislação dos países fronteiriços.
A proposta da Rota Pantanal Pacífico tem como objetivo a comprovação de que o eixo
Brasil (Mato Grosso), Bolívia, Peru e Chile, apresentado na Figura 01, tem condições de
consolidar uma rota de integração cultural, social, ambiental, econômica e, acima de tudo,
turística. O estudo fez uma análise das potencialidades turísticas entre os países, a fim de
confirmar que o eixo entre o Pantanal e o Oceano Pacífico, de aproximadamente, 4.500km,
seria viável turisticamente, tendo como efeito maior a integração da América Latina.
13

FIGURA 01: Rota Pantanal Pacífico

FONTE: PARIS, Osvaldo A., 2013. / Org. PARIS, Marcela C. N., 2013.

É válido acrescentar que o projeto da Rota Pantanal Pacífico se desenvolveu com


valoroso apoio acadêmico do Departamento de Geografia da Universidade Federal de Mato
Grosso e destacado apoio financeiro da FAPEMAT - Fundação de Amparo à Pesquisa de
Mato Grosso, o que possibilitou a realização de viagem expedicionária e o levantamento de
dados in loco.

Ademais disso, a pesquisa faz parte também de um dos trabalhos desenvolvidos pelo
Grupo de Estudos Estratégicos e de Planejamento Integrado (GEEPI), que é composto por
docentes e discentes da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT), bem como de outras
instituições de ensino superior, e que desde a 1ª viagem expedicionária coordena atividades e
estudos relacionados à Rota Pantanal Pacífico.
Entretanto, no presente estudo, a referida Rota funcionou como um pano de fundo
capaz de proporcionar uma discussão a respeito de países fronteiriços que a integram.
Certamente, seria inexequível um projeto de pesquisa, em nível de mestrado, que se
14

propusesse a estudar todas as fronteiras que delineiam a Rota Pantanal Pacífico, razão pela
qual o estudo necessitava de um recorte pontual.
Nesse sentido, o estudo põe sua lente de aumento sob a zona de fronteira Cáceres, no
Brasil e San Matias, na Bolívia, ainda que em alguns momentos a escala de abordagem
internacional ou nacional seja chamada a elucidar pontos específicos da Rota Panantal
Pacífico.
Diante do desafio interdisciplinar e da tendência cada vez mais assumida do fim dos
limites rígidos entre as disciplinas, especialmente as ciências sociais, foi desenvolvida essa
proposta: estudar a zona de fronteira Cáceres – San Matias, tendo como pano de fundo o
turismo, enquanto atividade econômica e o desafio de compreender e tentar equacionar
legislações distintas. Ambos os municípios integrantes da Rota Pantanal Pacífico e do estudo
de viabilidade desta Rota, desenvolvido em Dissertação de Mestrado, no ano de 2008, no
Programa de Pós Graduação em Geografia da Universidade Federal de Mato Grosso, pela
turismóloga Vanilde Alves de Carvalho, que foi a primeira Diretora do Instituto Pantanal
Pacífico – IPP.
É cediço que o estudo acerca das fronteiras assume grande importância no Brasil que
possui uma extensa faixa territorial de fronteira com diversos países, além da questão
estratégica de política internacional e econômica, como o Mercosul. Ademais, além de
estabelecer um diálogo interdisciplinar entre diferentes áreas do saber, ainda promove e
divulga um maior conhecimento das áreas fronteiriças traçadas pela referida Rota Pantanal
Pacífico.
No âmbito da ciência, o tema das fronteiras passou a ser objeto de debate em eventos
como o FRONTUR – Seminário Internacional de Turismo de Fronteira, que em 2010
completou sua sétima edição, e ainda, na esfera governamental tem fomentado programas de
desenvolvimento para o turismo de fronteira, por meio dos Ministérios de Integração Nacional
e do Turismo, no Brasil.
A Portaria nº 162, de 26 de agosto de 2011, publicado no Diário Oficial da União
(DOU), deu ao Frontur o status de programa do governo federal, com vistas a incrementar e
fomentar o turismo de fronteira. Contudo, o Frontur que apresentava três grandes focos de
discussão, a saber: o acadêmico, o empresarial e o político, perdeu o caráter de estudo e hoje
se encontra limitado ao rótulo de programa de governo, tendo perdido a essência dos debates
que envolviam diferentes profissionais e ciências.
O objetivo central desta dissertação é demonstrar que países fronteiriços, a exemplo de
Brasil e Bolívia, especificamente na zona de fronteira Cáceres e San Matias - apresentam
15

legislações distintas, mas em razão da proximidade e das potencialidades turísticas existentes,


podem promover a partir da atividade econômica do turismo, a cooperação e integração
transfronteiriça.
Assim, duas questões relevantes são levantadas para direcionar o estudo:
 Legislações distintas sobre fronteira, faixa de fronteira e limite poderiam desestimular
o turismo transfronteiriço? Seriam as fronteiras permeáveis e flexíveis?

 Se a globalização exalta a integração das fronteiras, estaríamos vivendo o fenômeno


da desfuncionalização parcial das fronteiras?
Em princípio, para que o objetivo central fosse alcançado, foi necessário identificar a
forma de caminhar, ou seja, estabelecer um cronograma de estudo com procedimentos
metodológicos claros e coesos. A primeira etapa foi a elaboração do projeto de pesquisa, onde
foi necessário escolher um assunto, delimitar o tema e formular a problemática. Tudo isso
aliado ao desejo de estudar o tema eleito: a fronteira.
Considerando a impossibilidade de deslocamento até a fronteira Cáceres-San Matías, a
pesquisa bibliográfica em livros e periódicos foi o procedimento eleito, a fim de reunir dados
e informações científicas necessárias para subsidiar o tema proposto, bem como auxiliar no
processo de consolidação dos conceitos trabalhados.
Na etapa da pesquisa bibliográfica foram feitos dois levantamentos distintos. O
primeiro consistiu no levantamento bibliográfico propriamente dito, destinado à coleta das
obras que, em tese, poderiam subsidiar e agregar valor ao estudo. Num segundo momento, foi
feito o levantamento das informações contidas nas obras selecionadas.
É válido acrescentar que na etapa de seleção de material observaram-se quatro
parâmetros, quais sejam: o temático, o linguístico, o cronológico e as fontes principais. O
parâmetro temático consistiu na seleção de material relacionado ao objeto de estudo; o
linguístico referiu-se a busca por obras em idiomas distintos sobre o tema. No presente caso, o
português e o espanhol. O parâmetro cronológico encampou obras de autores que pertenceram
a décadas distintas e, por fim, a seleção das principais fontes que se pretendia consultar,
dentre livros, periódicos, dissertações, etc. A partir daqui, a principal técnica utilizada foi a
leitura e o fichamento.
A leitura foi feita sob diferentes momentos e olhares. Houve, em princípio, uma leitura
seletiva de material e a leitura mais acurada destinada ao fichamento, a fim de reunir dados e
informações pertinentes à pesquisa.
16

Na etapa seguinte, de posse do aporte teórico necessário, foi feita a análise dos dados e
informações coletados. Considerando que a pesquisa tem caráter eminentemente conceitual,
não foram aplicados questionários ou entrevistas, em razão da impossibilidade de
deslocamento até a fronteira. Para tanto, foram analisados relatos de viagens expedicionárias
que tiveram a zona de fronteira Cáceres – San Matias como destino.
Propor uma reflexão teórica baseada na abordagem da fronteira fez com que clássicos
consagrados ajudassem na criação e estruturação do referencial teórico. Foi desta forma que
importantes conceitos epistemológicos foram buscados em Raffestin, na obra “Por uma
geografia do poder”, em Edward Soja, em “Geografias Pós-Modernas” e em Milton Santos,
nas obras “Por uma geografia nova”, o “Espaço Dividido” e no documentário “O mundo
global visto do lado de cá”.
É certo que outros autores deram suporte teórico ao entendimento das categorias
geográficas de análise eleitas, auxiliando assim tanto na compreensão, como na interrelação
entre as categorias território, paisagem e fronteira.
Considerando a dificuldade de encontrar literatura especializada sobre o tema,
especialmente acerca de San Matias, na Bolívia, e o acesso a periódicos já esgotados, a
internet foi uma ferramenta de extrema relevância para a consulta de artigos científicos e
periódicos jurídicos e geográficos.
De posse do aporte teórico necessário, foi utilizado o método de análise do Direito
Comparado, a fim de estudar legislações de países distintos, sob um mesmo aspecto. De outro
lado, em razão da impossibilidade de pesquisa in loco e diante da proposta de elaboração de
uma dissertação voltada para um viés mais conceitual do que empírico, foram analisados
relatos de viagens expedicionárias ocorridas entre 2006 a 2010, no percurso da RPP.
Esses relatos de viagens serviram para dar mais realismo a um estudo que envolve não
somente leis e territórios, mas pessoas que vão e vem, esporádica ou cotidianamente. O fluxo
de pessoas e o direito de ir e vir está amparado, portanto, nas concepções científicas e nas
experiências vividas na zona de fronteira.
Feito o desenho metodológico do estudo, cumpre apontar uma ferramenta
indispensável, adotada como referência, pelo Programa de Pós-Graduação em Geografia da
UFMT, para a elaboração e normalização da dissertação que foi o manual desenvolvido pela
Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ – que reúne as normas da Associação
Brasileira de Normas Técnicas – ABNT – destinadas a orientar e padronizar a produção
acadêmica.
17

Neste caminhar, a estrutura deste trabalho está composta de quatro capítulos. O


primeiro trata da fronteira e as categorias geográficas de análise eleitas, propondo um
verdadeiro mergulho epistemológico a partir de grandes referenciais teóricos, além da
caracterização da área de estudo. O segundo capítulo discorre acerca da fronteira sob três
óticas distintas: para o indivíduo, para o Estado e para o Direito Global, além de apresentar os
projetos em trâmite no Brasil e na Bolívia que envolvem a fronteira. O terceiro capítulo
retrata a Geografia do Turismo e o Direito do Turismo, enquanto abordagens contemporâneas,
criando uma interface entre essas vertentes do conhecimento. O quarto capítulo traz uma
abordagem da fronteira a partir da proposta de consolidação da Rota Pantanal Pacífico, com
foco na zona de fronteira Cáceres – San Matías e uma análise das legislações brasileira e
boliviana que envolvem a fronteira e o turismo, enquanto atividade econômica. Além disso,
há a apresentação de propostas a serem adotadas visando maior integração e cooperação
turística fronteiriça. Por fim, as considerações finais alcançadas e as referências bibliográficas
consultadas, além das obras que serviram como leitura de apoio, a fim de consolidar conceitos
e proporcionar a maturação do tema.
Por se tratar de um estudo de natureza conceitual com o intuito de equacionar
legislações distintas, a bem da atividade econômica do turismo, os resultados almejados
pretendem demonstrar que a fronteira passou por um processo de desconstrução, fazendo-se
necessária uma releitura acerca do seu entendimento. Além disso, impõe-se a criação de
políticas públicas que visem a integração fronteiriça dos países que abrangem a Rota Pantanal
Pacífico, especificamente a zona de fronteira Cáceres e San Matias. Ademais, porque a
atividade turística é, acima de tudo, o estabelecimento de parcerias.

Trata-se de uma pesquisa de relevância temática na área da Geografia e do


Desenvolvimento Regional, com análises acerca da produção do espaço geográfico. Além
disso, há destacada importância para o contexto de integração da América do Sul, além do
caráter multidisciplinar da pesquisa, vez que reúne duas áreas de conhecimento, a Geografia e
o Direito, permitindo uma discussão interdisciplinar para e além da academia.

Por último, espera-se que o presente estudo possa servir como um roteiro de passagem
para aqueles que pretendam debater a atividade econômica e legal do turismo, sob a ótica da
Geografia, bem como abrir caminho para uma futura discussão em nível de doutorado.
18

1. A FRONTEIRA E SUAS CATEGORIAS GEOGRÁFICAS DE ANÁLISE

Para se estudar e entender a ciência geográfica, pesquisadores dividiram-na em cinco


categorias de análises: o espaço, o lugar, a paisagem, a região e o território que juntos forma
m o espaço geográfico. Muitos autores como Sposito (2006) e outros, já mostraram as
diferentes abordagens existentes para estas categorias. A geografia é uma ciência social que
tem como objetivo de estudo o espaço geográfico.
Neste contexto, os estudos em Geografia não comportam mais uma análise isolada e
estanque de suas categorias. A ciência é uma só e as relações humanas e ambientais se
fundem e se sobrepõem a todo o momento, exigindo cada vez mais uma atuação
multidisciplinar. Estudar o espaço, a paisagem e o território são as premissas iniciais de um
estudo fronteiriço.
A partir desta ótica, pensar a fronteira pressupõe uma compreensão de diferentes
categorias geográficas, bem como um breve aporte jurídico, a fim de subsidiar o tema
proposto.
O conceito de espaço geográfico e território, por muitas vezes, pode ser confundido,
considerando os tênues limites entre ambos. O espaço geográfico é um conceito balizador na
geografia e constitui categoria analítica fundamental para começar a discussão sobre a
fronteira. Inegavelmente, ele é plural e, portanto, defini-lo não é uma tarefa fácil, em razão de
sua abrangência.
Lefebvre (1974) apud Souza (2012) destacou que o dilema conceitual se dá em razão
da tríade espacial que é o espaço físico, aquele caracterizado na construção de praças, cidades
e construções; espaço mental concebido pelas interpretações mentais e o espaço vivido que
engloba os dois anteriores, ou seja, o espaço simbólico e o vivenciado na rotina do dia a dia.
Para Castells apud Soja (1993), “o espaço não é um reflexo da sociedade, ele é a
sociedade”, posicionamento este que se faz evidente no estudo das fronteiras, uma vez que a
fronteira criada e suas vulnerabilidades refletem as políticas públicas adotadas ou o silêncio
intencional dos representantes políticos.
Sob a ótica de Santos (2002), o espaço é visto como essencial e destaca:
Como ponto de partida, propomos que o espaço seja definido como um conjunto
indissociável de sistemas de objetos e de sistemas de ações. Através desta ambição
de sistematizar, imaginamos poder construir um quadro analítico unitário que
permita ultrapassar ambiguidades e tautologias.
19

O autor arremata dizendo que “o espaço é a acumulação desigual de tempos.” Desta


forma, se há uma sociedade desigual, o espaço geográfico será desigualmente ocupado,
distribuído e significado, o que não ocorre de modo diverso nas fronteiras.
Ademais, com o advento da sociedade mundial, o espaço também se tornou mundial, é
o espaço social global, onde está inserido o espaço da fronteira que nos traz a ideia das escalas
geográficas que são tão importantes.
Considerando que o objetivo deste estudo não é desdobrar o conceito de espaço, mas
abrir caminho para uma discussão acerca da fronteira, este pequeno aporte teórico já permite
um diálogo entre as diferentes dimensões do espaço.

1.1 O TERRITÓRIO:
A primeira noção que se deve ter de território é que o mesmo não equivale a espaço,
mas sim um recorte do mesmo. E a partir daí, entender que ele é definido e delimitado a partir
das relações de poder. Logo, sujeito a uma ação de dominação política.
Se uma linha cronológica imaginária fosse traçada para o estudo do território, o
primeiro expoente a trazer importantes contribuições para sua discussão seria Raffestin
(1993). Em sua clássica obra “Por uma Geografia do Poder”, o espaço é visto como um palco
pré-existente ao território, sendo este de caráter eminentemente político. E acrescenta:
É essencial compreender bem que o espaço é anterior ao território. O território se
forma a partir do espaço, é o resultado de uma ação conduzida por um ator
sintagmático (ator que realiza um programa em qualquer nível). Ao se apropriar de
um espaço, concreta ou abstratamente (por exemplo, por representação), o ator
“territorializa” o espaço. (p. 143)

A partir da definição de Raffestin, entende-se que o território traz três pontos a


considerar: primeiro, a noção de que o território se forma a partir do espaço geográfico; o
segundo é a necessidade de interação de um ator, dito sintagmático, com o espaço para formar
o território e de onde surgirá o terceiro ponto, a noção de territorialidade, como consequência
dessa interação.
Eis que surge, portanto, a noção de territorialidade que pode ser compreendida como o
processo de apropriação do espaço, que é construído dia a dia. Territorialidade essa entendida
como um tipo de comportamento que se associa à organização do espaço em esferas de
influência ou em territórios nitidamente delimitados.
Já Haesbaert (1997, p. 18) destaca três dimensões básicas para a compreensão do
território, a saber: uma jurídico-política, em que predominam as relações de poder; uma
20

cultural, atrelada a ideia de identidade social; e, ainda, uma econômica, sob a ótica das classes
sociais e do binômio capital-trabalho.
...esses três elementos não são mutuamente excludentes, mas integrados num mesmo
conjunto de relações sócio-espaciais, ou seja, compõem efetivamente uma
territorialidade ou uma espacialidade complexa, somente apreendida através da
justaposição dessas três noções ou da construção de conceitos “híbridos” como o
território-rede.

Há que se concordar com o autor, pois essas três dimensões retratariam os chamados
territórios-zona, territórios-rede e aglomerados de exclusão que se fundem como explica o
próprio autor. Souza (2001) apud Bordo (2001, p. 03) comunga deste mesmo entendimento de
que, mais do que relação de poder, o território detém uma dimensão culturalista, marcada por
conflitos em razão das diferenças culturais. Enquanto para Saquet (2007, p. 04), a natureza é
mais um viés de análise a ser considerado no estudo do território.
Todavia, a ênfase político-administrativa dada ao território, enquanto espaço “físico”
onde se localiza uma nação e onde se delimita uma ordem jurídica e política vem ao encontro
da concepção de território compreendida pela ciência jurídica.
O conceito de território, como componente do Estado, somente aparece com o Estado
Moderno. Entretanto, não há que se falar que os Estados Antigos, Grego, Romano e Medieval
não tivessem território. O que ocorre é que a concepção do termo surge no Estado Moderno,
com uma leitura pertinente ao contexto da época.
Para a ciência jurídica, os elementos do Estado são: o povo, o território e o governo
soberano, em que pesem as divergências doutrinárias que pairam sob este último elemento.
Nas palavras de Silva (2002, p. 98): “Território é o limite espacial dentro do qual o
Estado exerce de modo efetivo e exclusivo o poder de império sobre pessoas e bens.”
Já na concepção de Kelsen (1998, p. 22) território é o âmbito de validez da ordenação
jurídica que se chama Estado:

...o território é o espaço dentro do qual é permitido que os atos do Estado e, em


especial, os seus atos coercitivos, sejam efetuados. É o espaço dentro do qual os seus
órgãos estão autorizados pelo Direito Internacional a executar a ordem jurídica
nacional. Assim para que isso possa ocorrer é necessário que exista uma relação
entre o Estado e o Território.

O que se depreende da leitura é que tanto para Silva quanto para Kelsen, o território
representa o limite dentro do qual o Estado pode praticar o denominado jus imperi, ou seja,
onde é permitido exercer a autoridade, governar, aplicar atos coercitivos e o poder
jurisdicional.
Meireles (2012) comunga da mesma linha de entendimento, para quem o território é
um dos elementos originários e indissociáveis do Estado. Trata-se da base física, onde ocorre
21

a validade da sua ordem jurídica, ou seja, é o espaço certo e delimitado onde se exerce o
poder de governo sobre os indivíduos. Por fim, Meireles conclui que o conceito possui
conteúdo de natureza política, não se reduzindo ao significado geográfico.
Para efeito jurídico, o território compreende a superfície terrestre, o solo, o subsolo e o
mar territorial, onde as leis são aplicadas visando o interesse público e o bem estar social.
A partir daí, torna-se palpável perceber que a concepção de território tratada por
Raffestin, que revela relações marcadas pelo poder, não se distanciou muito do que a ciência
jurídica até hoje entende como sendo território. Poder e território são elementos autônomos,
mas relacionais.
Ademais, a complexidade do estudo sobre território e sua detecção são importantes
para diversos contextos, tais como: criação e aplicação de políticas públicas, serviços
públicos, dentre outros. Para Raffestin (1993), o espaço é a “prisão original”, enquanto o
território é a prisão que os homens constroem para si, ou seja, locais de possibilidades e de
relações efetivas.
Diante da imensidão e das diferentes abordagens acerca do conceito de território, faz-
se oportuno apresentar o Quadro 01, numa espécie de síntese, em ordem cronológica, de todas
as ideias expostas, com um breve apontamento dos elementos considerados em cada análise.

QUADRO 01: Diferentes abordagens acerca da categoria geográfica território

AUTOR - ANO DEFINIÇÃO ELEMENTOS DE ANÁLISE

KELSEN (1998) ...o território é o espaço dentro do qual é Limite para o exercício da norma
permitido que os atos do Estado e, em jurídica.
especial, os seus atos coercitivos, sejam
efetuados, é o espaço dentro do qual o - Relação contínua entre Estado e
Estado, e isso significa, os seus órgãos, Território
estão autorizados pelo Direito
Internacional a executar a ordem jurídica
nacional”. Assim para que isso possa
ocorrer é necessário que exista uma
relação entre o Estado e o Território.

CLAUDE É essencial compreender bem que o - Território se forma a partir do espaço;


RAFFESTIN (1993) espaço é anterior ao território. O território
se forma a partir do espaço, é o resultado - Interação ator + espaço =
de uma ação conduzida por um ator territorialidade;
sintagmático (ator que realiza um
- Territorialidade: apropriação do
programa em qualquer nível). Ao se
espaço
apropriar de um espaço, concreta ou
abstratamente (por exemplo, por
representação), o ator “territorializa” o
22

espaço. (p. 143)

ROGÉRIO Esses três elementos não são mutuamente - Três dimensões de análise que se
HAESBAERT (1997) excludentes, mas integrados num mesmo justapõem: jurídico política, cultural e
conjunto de relações sócio-espaciais, ou social.
seja, compõem efetivamente uma
territorialidade ou uma espacialidade
complexa, somente apreendida através da
justaposição dessas três noções ou da
construção de conceitos “híbridos” como o
território-rede.

MARCELO LOPES Mais do que relação de poder, o território Importância/valorização da dimensão


DE SOUZA (2001) detém uma dimensão culturalista, marcada culturalista
por conflitos em razão das diferenças
culturais.

SAQUET (2007) A natureza é mais um viés de análise a ser Importância da natureza (espaço físico)
considerado no estudo do território.

JOSÉ AFONSO DA Território é o limite espacial dentro do Limite para exercício do jus imperi
SILVA (2002) qual o Estado exerce de modo efetivo e
exclusivo o poder de império sobre
pessoas e bens. Ou, como expressa Kelsen:
é o âmbito de validez da ordenação
jurídica chamada Estado.

MEIRELLES (2012) Para quem o território é um dos elementos Território é elemento indissociável do
originários e indissociáveis do Estado. Estado
Trata-se da base física, onde ocorre a
validade da sua ordem jurídica, ou seja, é o Base física – validade da norma
espaço certo e delimitado onde se exerce o
Limite para exercício do poder de
poder de governo sobre os indivíduos. Por
governo
fim, Meireles conclui que o conceito
possui conteúdo de natureza política, não Conteúdo de natureza política
se reduzindo ao significado geográfico.

FONTE: Elaborado por PARIS, Marcela C. N., 2013.

A partir desse Quadro-Síntese, podem ser feitos alguns apontamentos. A priori,


observa-se que, ao longo do tempo, a definição de território apresentada passou por uma
espécie de evolução ampliativa, ou seja, os elementos individualmente considerados em cada
abordagem foram sofrendo uma espécie de aglutinação de significados e não de exclusão. Por
exemplo, o território visto por Raffestin (1993), formado em decorrência do espaço e
resultado da interação com um ator sintagmático, também passou a ser analisado sob uma
ótica culturalista, jurídica e social, uma vez que todos esses aspectos compõem a noção de
território.
23

Dessa forma, todos os conceitos apresentados estão em consonância com a proposta de


estudo que envolve a fronteira e vão ao encontro da dimensão geográfica e jurídica que se
propõe para estudar a atividade turística na fronteira Cáceres/Brasil e San Matías/Bolívia.

1.2. A FRONTEIRA:

Feitas estas considerações, a fronteira, enquanto definidora da dimensão do território,


é eleita como objeto de estudo. O termo fronteira deriva do latim, fronteria ou frontaria, que
indicava a parte do território situada in fronte, isto é, nas margens (MARTIN, 1998). Segundo
Steiman e Machado (2012), o termo fronte não foi originalmente aplicado a uma linha e sim a
uma área.
Mattos (1975) apud Garcia Netto (2009) conta que a fronteira foi uma inovação que
apareceu na Europa, no século XIII, quando seis nobres ingleses e seis escoceses, reunidos em
comissão, tentaram estabelecer os limites entre os seus reinos (ano de 1222), mas diante da
falta de consenso, o grupo não chegou a um entendimento.
A ideia de fronteira como limite surge na Europa, no bojo do Tratado de Westfalia, em
1648 (CASTROGIOVANNI; GASTAL, 2006), dando início ao sistema moderno de Estado-
Nação, com a concepção de espaço territorial sob jurisdição única.
Contudo, foi Lord Curzon, antigo Vice-Rei da Índia Britânica, quem destacou a
importância das fronteiras nas considerações geopolíticas, ao defender a ideia, consagrada em
Versalhes, quando da redivisão territorial da Europa, após a primeira Grande Guerra (SILVA,
2002).

Após a I Guerra Mundial, o conceito de linha de fronteira é substituído pelo de região


de fronteira, consagrado na legislação brasileira. A Lei nº 6.634 de 2 de maio de 1979 dispõe
sobre a faixa de fronteira e altera o Decreto-Lei nº 1.135 de 3 de dezembro de 1970. Em seu
art. 1º destaca:

É considerada área indispensável à Segurança Nacional a faixa interna de 150 km


(cento e cinqüenta quilômetros) de largura, paralela à linha divisória terrestre do
território nacional, que será designada como faixa de fronteira.
Oportunamente, será visto que a faixa de fronteira não é tratada de modo igual pelos
países da América do Sul. O Brasil e a Bolívia reconhecem o instrumento legal como
definição da área de fronteira, mas com medidas distintas. No Brasil, a faixa de fronteira está
reconhecida na Constituição Federal de 1988 e refere-se a 150km de largura, conforme
explicitado. Na Bolívia, a faixa de fronteira foi reconhecida na Constituição Federal de 1967,
24

reformada em 1994, e refere-se a 50km de largura (PUCCI, 2010). Do ponto de vista


acadêmico, vale dizer que a faixa de fronteira é sempre próxima à noção de limite.
Muitos geógrafos, internacionalistas, diplomatas e pensadores escreveram sobre o
tema das fronteiras. Em 2001, o geógrafo James Anderson reabriu a discussão acerca da
necessidade de retomar a teorização dos limites internacionais num mundo sem fronteiras, em
razão da permeabilidade crescente de fluxos de capitais, commodities, informação e pessoas
(STEIMAN; MACHADO, 2012. p. 14).
Não obstante, a maioria dos cientistas políticos considera como características
essenciais do Estado, o seu povo, seu território e suas instituições. Para Haushofer, citado por
Mattos (1975) apud Garcia Netto (2009 ), há mais uma: a fronteira.
Sobre as divisas que separam o território, surgem os conceitos de fronteira e limite. De
acordo com Paixão (2005, p. 44), o entendimento da fronteira tem-se mostrado confuso e
carente de investigações sob o prisma teórico ou pragmatista. E ainda completa:

Numa primeira tentativa de cerceamento conceitual desse termo, verifica-se que,


para muitos, o conceito de fronteira ainda tem como base a tradicional definição
encontrada nos dicionários e enciclopédias: a extremidade de uma região ou mesmo
país que se defronta ou limita com outros territórios (Ferreira, 2001). Nessa
definição os termos fronteira e limite ganham certa equivalência e, conjugados,
apontam para uma funcionalidade que os ressalta como um front.
É exatamente essa ambivalência conceitual que permeia o presente estudo.
Considerando que há muito a fronteira derrubou os limites conceituais dos dicionários e
deixou de ser parte do campo estritamente político, integrando especialmente também o
campo econômico, turístico e jurídico.
Numa tentativa de compreender a fronteira, alguns autores se arriscaram. Raffestin
(1993, p. 166), de posse dos conceitos de território e limite, discutiu a fronteira, tratando-a
como sinônimo de limite:
O limite é, portanto, uma classe geral, um conjunto cuja fronteira é um subconjunto.
Ainda aí é particularmente estranho que só a fronteira tenha uma conotação política
enquanto, de fato, todo limite possui uma, nem que seja só pelo fato de ele ser
sempre a expressão de uma manifestação coletiva, direta ou indireta. Na verdade, a
fronteira se insere numa categoria particular, pois os Estados-nações tomaram-na
como um sinal, no sentido pleno e próprio do termo.

Nas palavras de Corlet (1996, p. 11):

A fronteira não é um obstáculo em um território, mas um mecanismo que resulta de


toda e qualquer ação nesse território. A fronteira é invariável em termos estruturais.
Graças a ela, o capitalismo evolui, separa, diferencia, regula. A fronteira é múltipla
em suas funções, em seu significado.
Para tratar a fronteira, Steiman e Machado (Op. cit. p.06) buscaram também analisar a
formação dos blocos econômicos:
25

A atual tendência de formação de blocos econômicos regionais e as diásporas de


povos com nacionalidade compósita numa escala sem precedentes no passado,
provocaram uma mudança fundamental na abordagem das fronteiras e limites
internacionais.
As três considerações acerca da fronteira foram propositalmente apresentadas nesta
ordem para representar uma discussão crescente, a saber: a fronteira vista como limite, a
quebra do paradigma de fronteira enquanto obstáculo e a sua multiplicidade funcional e, por
fim, a fronteira inserida na conjuntura da formação de blocos econômicos e o desafio de
mudança na abordagem conceitual.
E nesse contexto de globalização, entendida aqui como a mundialização de mercados e
de recursos é que o conceito de fronteira prescinde de uma releitura. Seja pela abolição
simbólica das fronteiras, seja pela plasticidade que ganhou a sua compreensão. O fato é que,
ainda que a globalização tenha proporcionado a abertura dos mercados, outras fronteiras e
outras formas de proteção estarão sempre presentes, definindo novas costuras e recortes.
Outro ponto relevante é a questão da classificação das fronteiras. O embate está
evidenciado na literatura sobre o tema, podendo ser encontradas inúmeras classificações, a
fim de estabelecer uma tipologia acerca das fronteiras.
Haushofer, fiel às teorias nazistas, segundo Mattos (1975) apud Garcia Netto (2009)
classificou as fronteiras da seguinte forma: fronteira é uma zona de conflito, fronteira de
ataque; manobra, equilíbrio, defesa, decadência, apatia. Steiman e Machado (Op. cit. p.01)
por sua vez, cita a clássica divisão de fronteiras naturais e artificiais, de Frontiers, escrito por
Lord Curzon, vice-rei da Índia.
Contudo, independente da classificação adotada, em sua essência, a fronteira surge
para distinguir “o meu do teu”, para proteger o território nacional, para isolar um território, se
necessário, o que durante muito tempo foi o verdadeiro sentido da fronteira, e, ainda, facilitar
o intercâmbio quando conveniente, conforme esclarece o geógrafo Otto Maul, citado por
Mattos (1975) apud Garcia Netto (2009).
Com efeito, a tendência de flexibilização e permeabilidade das fronteiras traz à tona
também a discussão sobre os limites. Para muitos países já não importam tanto os efeitos da
existência dos limites internacionais, mas os efeitos da remoção desses limites ou pelo menos
de reduzir as descontinuidades que estes representam por muito tempo para a vida econômica
e social, para a circulação de idéias, mercadorias e serviços (STEIMAN; MACHADO, Op.
cit. p. 6). Limite não é sinônimo de fronteira, mas um depende do outro para explicar e
compreender seus conceitos.
26

Raffestin (Op. cit. p.153) destacou que toda tessitura implica a noção de limite e
ressaltou que definir, caracterizar, distinguir, classificar, decidir, agir, induzem a noção de
limite: é preciso delimitar. De fato, os limites acompanham o surgimento do homem e seus
significados variam no decorrer do tempo e dos contextos econômicos e políticos, cabendo-
nos compreender que a todo o tempo somos e seremos confrontados com os limites. Ou os
traçamos ou esbarramos neles.
Para complementar a noção de limite, Higa (2008) afirma que a palavra, de origem
latina, foi criada para designar o fim daquilo que mantém coesa uma unidade político-
territorial, ou seja, sua ligação interna.
Neste contexto, faz-se pertinente ainda tecer algumas considerações acerca da zona de
fronteira ou faixa de fronteira que constitui uma expressão de legalidade, associada aos
limites territoriais do poder do Estado. A faixa de fronteira é a área que envolve as faixas de
terras limítrofes de dois países que, no Brasil, corresponde a 150 km de largura e 16.886
quilômetros de comprimento (IBGE, 2010). No mapa, corresponde a uma fita que começa no
Oiapoque e termina no Chuí, abraçando as vertentes setentrional, oriental e meridional deste
“continente” que chamamos Brasil.
A noção de faixa de fronteira nasce no Brasil – Império, mais exatamente de uma lei
de 1850 que correspondia a 10 léguas de sesmarias, ou seja, a 66 quilômetros. Nas palavras do
General Jorge Armando Félix, no Seminário Perspectivas para a Faixa de Fronteira, realizado
em Brasília, em 2011, provavelmente, a legislação refletia receios históricos da pátria mãe
portuguesa, cercada pela grande Espanha.
Com a evolução da tecnologia militar, a Constituição brasileira de 1937 ampliou a
faixa de segurança nacional para 150 quilômetros, mantida até hoje pela Constituição Federal
de 1988, sendo descrita como fundamental para a defesa do território nacional, em seu art. 20,
§ 2º.
A faixa de fronteira aponta para um espaço de interação, uma paisagem específica,
com espaço social transitivo e composto por diferenças oriundas da presença do limite
internacional. Vale acrescentar que nem todos os países adotam a faixa de fronteira, como é o
caso do Chile, na América do Sul. A Argentina, por sua vez, não tem um instrumento legal
que defina a área de fronteira, apesar de considerá-la.
Do ponto de vista acadêmico, a faixa de fronteira é sempre próxima a linha limítrofe
que não pode ser ignorada, não só por ser instância burocrática administrativa, mas também
por representar um marco significativo na história dos países envolvidos
27

O que parece mais razoável é compreender a fronteira como aproximação, tendo o


século XX marcado o início dessa porosidade. Surge aqui a discussão envolvendo a Rota
Pantanal Pacífico que foi uma proposta, a partir de prerrogativas encaminhadas e traçadas
pelo Mercosul, além dos acordos comerciais que facilitaram, ao menos em tese, o trânsito de
pessoas entre os países da América do Sul.
A priori, é necessário compreender o que é a proposta turística da Rota Pantanal
Pacífico, que abrange seis das grandes ecorregiões da América do Sul, a saber: Pantanal,
Chaco, Ichus, Floresta dos Andes, Deserto do Atacama e Litoral. Para Garcia Netto (2009, p.
44):

A fisionomia dos lugares que integram o roteiro proposto da Rota Pantanal Pacífico,
expressa unidades de paisagens que vão do interior do Continente Sul-Americano,
Cordilheira dos Andes e Litoral da área tropical do mesmo. Pela variedade de
fatores, dentre os quais se destaca a variação do relevo, tem-se uma composição de
destacados contrastes das diversas paisagens que compõem o quadro natural, no
contexto mais amplo, da América do Sul.
Nas palavras de Carvalho (2008, p.35), idealizadora da Rota Pantanal Pacífico:

A proposta compreende a parte central do Brasil, ou melhor, o Centro-Oeste


brasileiro, a Bolívia de leste a oeste, o Peru com toda sua extensão sul, o norte do
Chile e o noroeste da Argentina, compondo dessa forma os cinco países do Centro
Sul Americano, ora denominados de Rota Pantanal Pacífico (Brasil, Bolívia, Peru,
Chile e Argentina).

Neste sentido, a riqueza de biomas e a grandeza dos patrimônios da humanidade que


integram a RPP nos remete a uma nova categoria geográfica fundamental, qual seja: a
paisagem.

1.3. A PAISAGEM:

Não cabe falar de turismo, enquanto atividade econômica, sem abordar esta categoria
analítica que é utilizada como produto de integração de países e de consumo para os turistas.
Para Bertrand (1971), a paisagem é uma certa porção do espaço, resultante da
interação dinâmica e instável de atributos físicos, biológicos e antrópicos que, reagindo
dialeticamente uns sobre os outros, fazem dela um conjunto indissociável.
Com efeito, não seria a simples junção de elementos geográficos que caracterizariam
uma paisagem, mas uma combinação dinâmica e instável dos elementos físicos, biológicos e
antrópicos, vez que a paisagem é total, é fruto da interação homem-natureza.
A leitura da paisagem no estudo do turismo, segundo Rodrigues (1999, p. 45) é uma
abordagem centrada no sujeito: “há pelo menos duas formas de entender o espaço geográfico.
28

A primeira delas, clássica e mais usual, é observar sua expressão fisionômica – a paisagem.”
E acrescenta:
Todas as definições de paisagem partem do ponto de vista de quem a contempla e a
analisa, como se a paisagem não existisse sem alguém que a observasse. Desde que
o observador é um sujeito, o conceito de paisagem é impregnado de conotações
culturais e ideológicas. Mesmo que se trate de uma foto e, portanto, de um quadro
estático, vários elementos podem interferir na captação da imagem, tais como o
ângulo escolhido, a incidência da luz, o jogo de luz e sombra, a distância, realçando
ou escondendo detalhes.

Em se tratando de paisagem e da relevância do olhar de cada observador, a Rota


Pantanal Pacífico ganha ricas dimensões, por apresentar grande variedade de ambientes,
ecossistemas e culturas, viabilizando a consolidação de uma rota turística atrativa, seja do
ponto de vista geográfico, histórico, cultural, arquitetônico ou econômico. A este respeito,
Paris discorre (2011, p. 24):
Do ponto de vista geográfico porque atravessa uma grande quantidade de
ecossistemas e países. Histórico, pelo fato de atravessar as áreas de disputas entre a
coroa portuguesa e espanhola que definiram as fronteiras atuais entre a América de
língua portuguesa e a de língua espanhola. Cultural, por deparar com povos de
diferentes origens, línguas e costumes, tais como: o povo Chiquitano, resultante das
missões jesuíticas remanescentes fronteiriças a Mato Grosso; os Aimaras, do
altiplano boliviano e os Quéchuas da Bolívia, sul do Peru e Norte do Chique que
representam o legado do grande Império Inca pré-colombiano (Alves, 2006). No
aspecto arquitetônico, tem-se a arquitetura atual-contemporânea dividindo o espaço
com a vasta e rica arquitetura de origem indígena, colonial e inca, bem como de
importantíssimos sítios arqueológicos.

Em que pese a RPP seja apenas o pano de fundo deste estudo, uma vez que o foco da
pesquisa concentra-se na fronteira Cáceres/Brasil e San Matías/Bolívia, é sempre válido
apresentar a sua escala maior, de dimensão internacional, a fim de contextualizar as suas
origens. Assim sendo, a Rota Pantanal Pacífico passa por cinco países, Brasil, Bolívia, Peru,
Chile e o norte da Argentina, conformados no entorno dos eixos centrais das rodovias
Interoceânica, Bioceânica e Pan-americana. Nos artigos de Carvalho (2008), a localização e a
proximidade dos atrativos, estrategicamente posicionados próximos uns dos outros, a uma
distância que justifica a proposição da rota. E acrescenta (p. 29):

Os territórios que compõem a área de estudo, bem como a Rota Pantanal-Pacífico,


são conhecidos por muitos nomes, principalmente devido à diversidade de suas
paisagens, clima, relevo e, especialmente, por sua diversidade cultural. Existe uma
grande concentração de políticas estratégicas que, direta ou indiretamente,
influenciam o/no território. O termo “Centro Sul Americano” foi adotado por
organismos governamentais que ditam as áreas prioritárias para os investimentos em
infra-estrutura, como é o caso da IISRA, a Iniciativa para a Integração da
Infraestrutura Regional Sul Americana.

A colocação de Carvalho sobre a paisagem traz a tona também o território, categoria


geográfica já discutida. Ela apresenta a relação entre as categorias e a importância da
29

dimensão culturalista, vez que a RPP está permeada por grande diversidade turística e
cultural.
No intuito de compreender melhor os países que compõem o objeto de estudo e seus
recursos naturais, passíveis de integração de uma rota turística, foi criado um quadro, com
base nas informações reunidas por Carvalho (2008). Senão, veja o Quadro 02, a seguir:

QUADRO 02: Recursos naturais passíveis de integração da rota turística na área de


influência da RPP.

Identificação das potencialidades de cada área sob influência da Aspectos Geográficos


RPP:

Brasil • Parque Nacional do Pantanal Mato-grossense Clima: Tropical quente-úmido


• Parque Nacional de Chapada dos Guimarães
• Parque Nacional da Serra do Bodoquena Relevo: Planalto Central e Planície
• Município de Bonito Pantaneira
• Vale do Guaporé
• Cidade de Cuiabá “Centro Geodésico da Região Geográfica: Centro Oeste do
América do Sul” Brasil

Bolívia Departamento de Santa Cruz: Localização: Centro Sul Americano

• Missões Jesuíticas dos Chiquitos Relevo: Altiplano, Cordilheira Oriental


• Parque Nacional Noel Kempff Mercado e Central e Oriente Boliviano.
• Cidade de Santa Cruz de la Sierra
• Forte Samaypata Região Geográfica: 03 regiões –
• EXPOCRUZ Andina Subandina e Planície.
• Romaria da Virgen de Cotoca
• Ruta del Che Climas: Tropical quente-úmido, frio e
seco.
La Paz:

• Lago Titicaca
• Copacabana
• Ilhas do Sol e da Lua
• Cumbre de Chacaltaya
• Vale dos Yungas
• Vale da Lua
• Sitio Arquiológico de Tiahuanaco
• Parque Nacional de Madidi

Oruro:

• Zona Franca
• Carnaval de Oruro
• Lago Poopo
• Sítios Coloniais

Departamento de Potosí:

• Centro Histórico de Potosí


• Casa da Moeda
• Salar de Uyuni
• Salar de Coipasa
30

• Lagoas Coloridas
• Vale encantado de Tupiza

Tarija:

• Vinhos de Camargo
• Pomares de Tomatitas
• Festivais Folclóricos de Tarija
• Vales

Departamento de Chuquisaca:

• Cidade de Sucre
• Centro Colonial
• Palácio de la Glorieta
• Cemitério Cental

Departamento de Cochabamba:

• Vila Tunari
• Cristo de la Concórdia
• Sítios Naturais
• Rotas Eco turísticas
• Pés dos Andes

FONTE: Dissertação de Mestrado de Vanilde Alves de Carvalho, 2008 – Análise da viabilidade de implantação
da Rota Pantanal – Pacífico (Brasil, Bolívia, Peru, Chile e Argentina), p. 21-28.
Org.: PARIS, Marcela C. N., 2013.

Todas as citações apresentadas, bem como o Quadro 02 elaborado veem demonstrar a


importância da paisagem nos estudos da Geografia do Turismo, vez que se trata de um
recurso turístico que envolve os sentidos do indivíduo, a experiência de cada um, a bagagem
cultural e a história de vida. Nesse sentido, Rodrigues (1999, p. 47) finaliza: “ler a paisagem é
muito mais complexo do que ver e perceber a paisagem. Envolve uma visão de mundo,
consciente e inconsciente, sempre subjetiva e permeada pelo imaginário.”
Contudo, a projeção internacional da Rota esbarra, primeiramente, nas barreiras
políticas existentes nos países que compõem o eixo, sendo necessário interesse público
efetivo, vez que estas fronteiras não podem mais ser entendidas como áreas longínquas e
isoladas, mas sim como regiões capazes de consolidar acordos jurídicos internacionais em
favor de um turismo transfronteiriço. E, especialmente, sob esses aspectos das barreiras
políticas e do descaso político é que as fronteiras de Cáceres/Brasil e San Matías/Bolívia não
recebem políticas públicas capazes de desenvolver a região fronteiriça que é tão rica em
potencialidades turísticas.
Assim sendo, é de extrema relevância analisar a postura jurídica de cada país
envolvido, valorizando o espaço fronteiriço como objeto de relações turísticas, uma vez que a
31

inobservância dos aspectos legais pode tornar demasiadamente burocrático e desestimulante o


turismo de fronteira.
O Brasil, por sua vez, como parte integrante do eixo turístico, prevê na Constituição
Federal de 1988, especificamente no Capítulo denominado “Dos Princípios Gerais da
Atividade Econômica”, inserido no Título “Da Ordem Econômica e Financeira”, dispõe que:
“A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios promoverão e incentivarão o
turismo como fator de desenvolvimento social e econômico”. Esse art. 180 permite duas
análises preliminares.
Numa primeira análise, é preciso entender o porquê do turismo ser tratado no capítulo
que versa sobre a Ordem Econômica e Financeira. É forçoso reconhecer que o turismo
beneficia economicamente as cidades e deve proporcionar desenvolvimento social. Desse
entendimento, segundo Vilani (2012), surge a justificativa do Direito na mediação entre os
impactos da atividade turística e a proteção dos patrimônios culturais da humanidade.
Num segundo viés, quando se fala em turismo internacional de fronteiras, é preciso ter
em mente que com o processo de globalização, de fato, o turismo vem se tornando um dos
segmentos expressivos da economia mundial. Acertadamente, Fernandes; Coelho (2011) apud
Vilani (2012) destacam que o turismo está inserido numa conjuntura de expansão global,
possui dinâmica própria e, desta forma, “não pode ser concebido como um fato meramente
conjuntural ou simplesmente passageiro”, razão pela qual estudar a Rota Pantanal Pacífico
envolve um estudo de paisagens e fronteiras sim, mas também todo um arcabouço jurídico
que dê guarida para a construção de políticas de turismo sólidas, a partir de elementos capazes
de promover um turismo como verdadeiro fator de desenvolvimento social e econômico.
Portanto, apresentadas as categorias geográficas de análise eleitas para este estudo de
fronteira e feitas considerações preliminares acerca da Rota Pantanal Pacífico, é hora de
apresentar qual a fronteira será objeto de estudo, fazendo um recorte nas fronteiras que
compõem a RPP.

1.4 CARACTERIZAÇÃO DA ÁREA DE ESTUDO:

A área de estudo eleita é a fronteira Cáceres/Brasil e San Matías/Bolívia, a partir da


proposta de um novo turismo de fronteira amparado pelas categorias geográficas
apresentadas, especialmente a paisagem, enquanto produto e potencialidade turística.
O município de Cáceres está localizado no Estado de Mato Grosso, na área do
Pantanal Matogrossense. Foi criado no período do ciclo do ouro, no século XVIII, em razão
32

da preocupação dos governantes em povoar e conquistar essa área que segundo o Tratado de
Tordesilhas pertencia aos espanhóis (JANUÁRIO, 2004).
De acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE, 2010), Cáceres
possui uma população de 87.942 habitantes, numa extensão territorial de 24.351,408km2. A
altitude é de 118m acima do nível do mar e coordenada 16º11’42” de Latitude Sul e
57º40’51” de Longitude Oeste de Gr., distante 209,70km da capital do Estado de Mato
Grosso, Cuiabá (JANUÁRIO, 2004).
O município faz fronteira com a Bolívia, conforme Figura 02, sendo sua maioria
fronteira seca e em linha geodésica, e por razões de defesa da soberania e segurança, foram
criados ao longo da faixa lindeira uma série de destacamentos e subdestacamentos que
funcionam como bases de apoio.

FIGURA 02: Caracterização da área de estudo – Cáceres/MT – Brasil e San Matías -


Bolívia

FONTE: PARIS, Osvaldo A., 2013. / Org. PARIS, Marcela C. N., 2013.

De acordo com a Figura 03, o município de Cáceres está inserido na Amazônia Legal
que corresponde a 59% (cinquenta e nove por cento) do território brasileiro e engloba a
totalidade de oito Estados (Acre, Amapá, Amazonas, Mato Grosso, Pará, Rondônia, Roraima
e Tocantins) e parte do Estado do Maranhão (a oeste do meridiano de 44ºW), perfazendo 5
milhões de km2. O conceito da Amazônia Legal foi instituído em 06 de janeiro de 1953, por
33

meio da Lei nº 1.806, e seus limites territoriais decorrem da necessidade de planejar o


desenvolvimento econômico da região e, por isso, não se resumem ao ecossistema de selva
úmida, que ocupa 49% do território nacional e se estende também pelo território de oito
países vizinhos. Os limites da Amazônia Legal foram alterados várias vezes em consequência
de mudanças na divisão política do país, de acordo com o Instituto de Pesquisa Econômica
Aplicada (IPEA, 2008).
Além disso, é importante acrescentar que o conceito de Amazônia Legal não se
confunde com o bioma Amazônia. Por exemplo, a cidade de Cáceres está inserida na
Amazônia Legal, mas faz parte do bioma Pantanal. Portanto, a Figura 03 apresenta os Estados
que fazem parte da Amazônia Legal, mas não necessariamente estão inseridos no mesmo
bioma.

FIGURA 03: Área de abrangência da Amazônia Legal

FONTE: PARIS, Osvaldo A., 2013. / Org. PARIS, Marcela C. N., 2013.
34

Ainda sobre Cáceres, o município é banhado pelo rio Paraguai que fornece aos
moradores e apreciadores, o turismo de pesca esportivo e o maior Festival Internacional de
Pesca do mundo em águas fluviais. A Bacia Hidrográfica do município é a Bacia do Prata e o
clima é caracterizado como tropical, quente e úmido, com temperatura média anual de 22ºC e
26º. A cobertura vegetal do caracteriza-se pelo predomínio dos cerrados e do pantanal, onde é
possível apreciar uma rica e variada fauna e flora (JANUÁRIO, 2004).
É extremamente válido considerar que a distância de Cáceres até a linha de fronteira é
de 90km em estrada asfaltada e as cidades bolivianas, situadas ao longo da fronteira que
possuem contato com Cáceres são: San Matias a 100km; San Ignácio de Velasco a 380km e
San Rafael e San Miguel a 420km (HIGA, 2008). Estas cidades fazem parte do Circuito das
Missões Jesuíticas que é patrimônio da humanidade e pertence ao rol das potencialidades
turísticas da Rota Pantanal Pacífico.
Por sua vez, a Bolívia é dividida em 9 departamentos, 112 províncias, 312 municípios
e 1.384 subdistritos. Sobre esta divisão, Carvalho esclarece (2008, p. 23):
E por isso foi feito a caracterização de seus departamentos individualmente, porque
cada um deles tem uma função específica, que é a de construir a relação com os
territórios fronteiriços com os países vizinhos, ou de servir de elo e de conectividade
bilateral.

De acordo com as respectivas Constituições, vê-se que a organização político-


administrativa da Bolívia difere-se do Brasil, enquanto aquele é uma República Democrática,
dividida em 9 departamentos, esse é uma República Federativa, dividida política e
administrativamente em 27 unidades federativas, sendo 26 estados e o Distrito Federal.
Na Bolívia, o Departamento de Santa Cruz está situado no oriente boliviano. A capital
é a cidade de Santa Cruz de La Sierra. Constitui a maior zona de fronteira do país com o
Brasil e tem por função estabelecer os vínculos entre o oriente boliviano e o Brasil Central
(CARVALHO, 2008).
Segundo Higa (2008, p. 24), “no território boliviano, quatro municípios integram a
zona de fronteira, os quais fazem parte duas províncias de Velasco e de Angel Sandoval,
ambas pertencentes ao Departamento de Santa Cruz.” A província de Velasco abrange os
municípios de San Ignácio, San Miguel e San Rafael, enquanto a província de Angel
Sandoval tem San Matías como capital.
De acordo dados do Censo de 2001, disponíveis no site do Instituto Nacional de
Estadística de Bolívia (INE, 2013), San Matías é a única unidade municipal de Angel
Sandoval que é uma província da Bolívia, localizada no Departamento de Santa Cruz. San
35

Matías apresenta uma população de 5.370 habitantes, predominantemente precária e rural,


numa extensão territorial de 32,030km2.
Tem como principal atividade o comércio de produtos importados, numa espécie de
zona franca bem precária, com os mais diversos gêneros e a agricultura praticada ainda é de
subsistência. (HIGA, 2008). A cidade ainda representa nada mais do que a porta de entrada
para as missões jesuíticas, além de estar a 10km de distância da fronteira brasileira, com a
qual se limita ao Norte e ao Leste. O que divide os dois países é o Corixa: um ribeirão que
nasce num morro com água transparente (INE, 2013).
Em razão da precariedade da infraestrutura básica e da proximidade com a cidade de
Cáceres, o município de San Matias mantém estreita comunicação no que tange ao
atendimento em saúde e educação. Ademais, o comércio é fomentado por diversos acordos
bilaterais, como o de Roboré, considerando que na fronteira há um significativo número de
comerciantes bolivianos e brasileiros (NUNES, 2008).
Para demonstrar as características dos dois municípios fronteiriços, o Quadro 03
confronta informações de área, economia, bioma, população e distância da fronteira. Vale
acrescentar a dificuldade em obter dados pertencentes à cidade de San Matías, em que pese a
potencialidade turística.

QUADRO 03: Quadro Comparativo Cáceres/Brasil e San Matías/Bolívia

CÁCERES - BRASIL SAN MATÍAS - BOLÍVIA

ÁREA 24.351,408km2 32.030km2

ECONOMIA - Agropecuária - Extrativismo Madeireiro

- Agricultura (subsistência)

BIOMA - Pantanal, Cerrado e Amazônia - Pantanal

POPULAÇÃO 87.942 5.370

DISTÂNCIA DA 90km 10KM


FRONTEIRA

FONTE: Censo 2010, IBGE. Disponível em: < http//www.ibge.com.br/cidades> / Atlas Estadístico de
Municípios da Bolívia, INE, 2013. Disponível em: < http://www.ine.gob.bo>. / Org. PARIS, Marcela C. N.,
2013.

Em linhas gerais, faz-se pertinente esclarecer que, em 1958, o Brasil e a Bolívia


assinaram os Acordos de Roboré que somavam 31 documentos, dentre eles 10 convênios, 11
36

protocolos e 10 notas reversais que se referiam à exploração de petróleo e gás natural em


território boliviano por empresas privadas brasileiras. Os Acordos de Roboré foram
atualizações do Tratado de 1938 e a aproximação com o Brasil fazia-se necessária,
especialmente, para evitar que outros países vizinhos usurpassem cada vez mais a soberania
boliviana (VILARINO, 2006).
Fato é que o comércio em San Matías e Cáceres é fomentado por acordos bilateriais,
especialmente o de Roboré. Contudo, de acordo com Nunes (2008, p. 105), todas as
diferenças apontadas nessa área da fronteira Brasil/Bolívia se manifestam e expõem a questão
da temporalidade, pois em muitos aspectos as comunidades da Chiquitania parecem viver em
outro tempo, com valores e comportamentos que fogem aos padrões da atualidade.
A propósito, a área do Oriente boliviano é chamada de Chiquitania, em idioma
português ou “La Gran Chiquitania”, em idioma espanhol. Os chiquitos constituem um
agrupamento indígena que vive disseminado, podendo ser encontrados em Cáceres, mas a
maior parte vive na zona de fronteira com a Bolívia (PARIS, 2011). Ainda, de acordo com o
referido autor citado:

É ao longo desse “eixo rodoviário” que se comunica a Chiquitania boliviana ao


Estado de Mato Grosso, um território de caráter simbólico-cultural e religioso
composto pela maior densidade de igrejas missionárias remanescentes das reduções
jesuíticas do século XVIII, todas muito bem conservadas. Dessas, três são
declaradas patrimônios culturais da humanidade: San Miguel, San Rafael, e a de
Santa Ana, além da igreja da antiga missão de San Ignácio de Velasco, não tombada
pela UNESCO – Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a
Cultura.” (p. 21)

E ainda, a respeito da relação estabelecida entre a fronteira boliviana, o Mato Grosso e


o turismo, Nunes esclarece: (2008, p. 106):

A área da fronteira boliviana com o estado de Mato Grosso apresenta grande


potencialidade turística, em função da presença do pantanal na Província de Angel
Sandoval e, principalmente, do patrimônio arquitetônico e cultural das missões
jesuíticas, instaladas no século XVIII e presentes nos municípios de San Ignácio de
Velasco, San Rafael, San Miguel e Santana, integrantes da província de Velasco.

O que esses dois autores destacam é a riqueza cultural das missões jesuíticas, sendo
que a zona de fronteira Cáceres/Brasil e San Matías/Bolívia é a porta de entrada para conhecer
um pouco mais dessa cultura que é declarada patrimônio da humanidade pela UNESCO.
E por falar em relações criadas na fronteira, o processo de globalização e a formação
dos blocos econômicos estruturados na América do Sul, especialmente o Mercosul que,
visando a facilitação dos deslocamentos humanos instituiu regras para desburocratizar o
trânsito e o acesso de turistas nos países membros e associados. Um novo ordenamento dos
espaços se fez.
37

Os Tratados do Mercado Comum do Sul - Mercosul - propuseram um novo


ordenamento dos espaços quando Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai assinaram, a partir de
26 de março de 1991, o Tratado de Assunção. O objetivo central é a integração dos quatro
Estados-Membros por meio da livre circulação de bens, serviços e fatores produtivos, a partir
de uma tarifa externa comum (TEC), da adoção de uma política comercial comum, da
coordenação de políticas macroeconômicas e setoriais e da harmonização de legislações nas
áreas pertinentes.
De acordo com o Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior
(2013), a tarifa externa comum (TEC) foi prevista no Tratado de Assunção, a partir de 01 de
janeiro de 1995, mas diante das dificuldades encontradas, pairou sobre ela verdadeira
ineficácia. A ideia central era incentivar a competitividade entre os Estados-membros,
contudo, um dos principais entraves foram os sistemas de tributação distintos o que bloqueou
uma eficaz união econômica.
Numa primeira tentativa de solucionar a dificuldade, foi criada uma lista de
convergência onde seriam apontados alguns produtos que seriam exceção à TEC, sobre os
quais incidiria a tributação normal. A partir daí, outro problema surgiu: a lista de exceção se
tornou tão extensa que inviabilizou a pretendida integração econômica.
O Mercosul caracteriza-se pelo regionalismo aberto, ou seja, tem por objetivo não só o
aumento do comércio, mas também o estímulo às trocas com outros países. (ITAMARATY,
2013). Em dezembro de 1994, foi aprovado o Protocolo de Ouro Preto, que dispôs acerca da
estrutura do Mercosul e deu-lhe personalidade jurídica internacional.
Além dos Estados-Membros, o Mercosul conta com Estados Associados, como é o
caso da Bolívia e do Chile (1996), do Peru (2003) e da Colômbia e do Equador (2004). Há
ainda os participantes, desde 2012, como é o caso do Suriname e da Guiana.
É importante esclarecer que o Mercosul se pauta pelas regras do Direito Internacional
Público, não existindo uma autoridade central, capaz de impor regras, restando aos Estados a
busca por soluções diretas, por mediações, por políticas públicas. O ideal integracionista do
referido bloco depende, acima de tudo, de vontade política que por meio de concessões
mútuas pode tornar mais viável o desenvolvimento integrado, não só econômico, mas também
social, ambiental e turístico.
A ideia que se pretende passar é que a criação dos blocos econômicos pode estreitar
ainda mais as relações entre as categorias geográficas eleitas: o território, a paisagem e a
fronteira, especialmente, por meio de normas integracionistas que visem minimizar as
desigualdades e fomentar as potencialidades de cada país.
38

2. AS TRÊS DIMENSÕES DA FRONTEIRA

2.1.PARA O INDIVÍDUO

Para propor uma análise da fronteira faz-se necessário estabelecer, preliminarmente, os


três parâmetros eleitos para análise, a saber: a fronteira sob a ótica do indivíduo, do Estado e
do Direito propriamente dito.
Na lição de Montoro (1984, p. 299), as expressões “sujeito de direito” e “pessoa” são
equivalentes na linguagem jurídica. O conceito originário de pessoa referia-se a máscara que
usavam os atores, dotada de um dispositivo para amplificar a voz (em latim: per-sonare).
Para o jurista, pessoa física é o homem, enquanto sujeito de direitos e obrigações. Eis
que surgem duas importantes indagações: todo homem é sujeito de direito ou só o homem é
sujeito de direito? Montoro (1984, p. 300) esclarece:

Não há dúvida de que – em nosso ordenamento jurídico – “todo homem” é sujeito


de direitos ou obrigações, e, portanto, é pessoa. Mas nem sempre foi assim. Durante
muitos e muitos séculos negou-se essa qualidade aos escravos, às mulheres, aos
estrangeiros.

Interessante é a explicação dada por Montoro (1984, p. 301) quanto a proteção aos
demais objetos de regulamentação jurídica:

É certo que existem leis de proteção aos animais, a plantas, a lugares e edifícios
históricos, etc. Mas, na realidade, tais elementos são “objeto” da regulamentação
jurídica e não “sujeito” ou titular de direitos. O que se tem em vista em tais casos é a
conservação desses objetos, prédios, plantas ou animais, por serem úteis ao homem
ou à sociedade. E, em certos casos, procura-se reprimir a manifestação de crueldade
e selvageria, por serem sentimentos anti-sociais. Da mesma forma, quando falamos
dos direitos de um prédio, como a servidão, na verdade estamos usando uma
expressão figurada, pois o direito, no caso, pertence ao proprietário do prédio e não
ao próprio prédio.

Nas palavras de Carvalho (2012, p.06), “não basta a pretensão de querer conhecer o
direito e a sociedade que o cria e o aplica; é preciso também querer conhecer-se.” É
necessário conhecer o indivíduo que cria, ordena, normatiza e é representado pelo Estado e
pelas leis. O mesmo autor ainda acrescenta (p. 06):

Sabemos que vivemos em um mundo onde os Estados governam boa parte de


nossos atos. Mas os Estados não agem por si só; não são entidades metafísicas que
pairam sobre nossas cabeças. Eles são governados por indivíduos que os
representam.

Trocando em miúdos, o que ambos os autores dizem é o que está previsto


objetivamente no artigo 1º do Código Civil Brasileiro, ou seja, que todo ser humano é dotado
39

de personalidade jurídica e, portanto, dotado de aptidão genérica para buscar seus direitos e
contrair obrigações.
Assim sendo, o indivíduo, enquanto pessoa, deve ser o primeiro elemento de análise
no estudo da fronteira. Nesse sentido, a doutrina civil brasileira entende majoritariamente que
pessoa é todo ente físico ou jurídico suscetível de direitos e obrigações, (DINIZ, 2011). Por
sua vez, pessoa natural ou física é o ser humano considerado como sujeito de direitos e
deveres. O Código Civil Brasileiro, de 2002, preceitua em seu artigo 1º que toda pessoa é
capaz de direitos e deveres na ordem civil. Leite e Strauss (2012) esclarece que pessoa é
alguém que pode exigir seus direitos, mas em caso de violação dos deveres, pode ser punido.
Gagliano e Pamplona Filho (2009) acrescentam que o Código Civil Brasileiro de
2002, por sua vez, entende que o conceito de personalidade jurídica é moldado em primeiro
plano pela psicologia, no entanto, para o Direito, personalidade é a aptidão genética para se
titularizar direitos e contrair obrigações na ordem jurídica, ou seja, é a qualidade para ser
sujeito de direito.
Em seguida, pode-se indagar: mas em que momento a pessoa física adquire a
personalidade jurídica? O Código Civil Brasileiro adotou a Teoria Natalista, segundo a qual, a
personalidade jurídica começa do nascimento com vida, mas a lei põe a salvo, desde a
concepção os direitos do nascituro.
Neste momento, faz-se prudente dois esclarecimentos: o que se considera nascimento
com vida e o que vem a ser o nascituro. O Direito socorreu-se da Resolução nº 01/1988, do
Conselho Nacional de Saúde, que estabelece que nascimento com vida significa o
funcionamento do aparelho cárdiorespiratório, com a consequente separação da mãe. Vale
destacar que o Brasil adotou posição diferente do Código da Espanha que à luz da dignidade
humana entende que a aquisição da personalidade jurídica não exige forma humana nem
tempo mínimo de sobrevida.
Interessante apontar que, em relação ao natimorto, há projeto de lei em trâmite na
Câmara dos Deputados (Projeto-Lei nº 5171/13) que visa estender aos natimortos o direito de
incluir na certidão de nascimento o nome e o sobrenome, uma vez que, atualmente, constam
na certidão apenas o nome dos pais e a data de óbito. (IBDFAM, 2013). A referida proposta
visa preencher uma lacuna existente na Lei de Registros Públicos – Lei nº 6.015/73.
O nascituro é o ente concebido, mas ainda não nascido, ou seja, ainda não é
considerado pessoa, goza apenas de expectativa de direitos. A pessoa, por sua vez, é dotada de
direitos decorrentes da personalidade, dentre eles, o direito à vida, à liberdade, à saúde, à
honra, à imagem, à integridade física e intelectual, à privacidade, à intimidade.
40

Nesta esteira de raciocínio, segundo Leça (2012), a legislação internacional sobre os


Direitos Humanos, em seu conteúdo, considera o indivíduo como destinatário das normas do
direito internacional e protegido como indivíduo humano ou como membro de um grupo de
pessoas.
A Declaração Universal dos Direitos Humanos, demonstrada no Quadro 04, adotada e
proclamada pela Resolução 217 A (III), da Assembleia Geral das Nações Unidas, em 10 de
dezembro de 1948, prescreve, em seu artigo sexto que, toda pessoa tem o direito de ser, em
todos os lugares, reconhecida como pessoa perante a lei.

QUADRO 04: Trechos da Declaração Universal dos Direitos do Homem

Direitos Fundamentais da Pessoa Física:


Declaração Universal dos Direitos do Homem
Na Declaração Universal dos Direitos do Homem estão assim formulados os direitos
fundamentais da pessoa física.
Art. 1- Todos os homens nascem livres e iguais em dignidade e direitos. São dotados
de razão e consciência e devem agir em relação uns aos outros com espírito de
fraternidade.
Art. 3 – Todo homem tem direito à vida, à liberdade e à segurança pessoal.
Art. 6 – Todo homem tem direito de ser, em todos os lugares, reconhecido como
pessoa perante a lei.
Art. 7 – Todos são iguais perante a lei e tem direito, sem qualquer distinção, a igual
proteção da lei. Todos têm direito a igual proteção contra qualquer discriminação que
viole a presente Declaração e contra qualquer incitamento a tal discriminação.
Art. 9 – Ninguém será arbitrariamente preso, detido ou exilado.
Art. 13 – Todo homem tem direito à liberdade de locomoção e residência dentro das
fronteiras de cada Estado.
Art. 15 – Todo homem tem direito a uma nacionalidade.
Art. 17 – Todo homem tem direito à propriedade, só ou em sociedade com outros.
Art. 23 – Todo homem tem direito ao trabalho, à livre escolha de emprego, a condições
justas e favoráveis de trabalho e à proteção contra o desemprego.
Art. 26 – Todo homem tem direito à instrução. A instrução será gratuita, pelo menos
nos graus elementares fundamentais. A instrução elementar será obrigatória. A
instrução técnico-profissional será acessível a todos, bem como a instrução superior;
está baseada no mérito.
Fonte: MONTORO, André F., 1984, p. 310. / Org. PARIS, Marcela C. N., 2013.

Direitos Humanos são direitos de todos e é válido asseverar o valor jurídico da referida
Declaração. A Corte Internacional de Justiça reconheceu como sendo um costume
internacional, vinculando assim, todos os Estados.
Contudo, não há unanimidade se o indivíduo é sujeito do Direito Internacional.
Durante o Workshop “Cidadania e Nacionalidade no Direito Internacional”, Lima (2009)
41

ressaltou o impasse: “num direito composto por Estados, o indivíduo tem papel secundário:
não é sujeito do direito das gentes.” Mas para os defensores dos Direitos Humanos, a resposta
será oposta: “não se pode excluir a subjetividade jurídica do indivíduo no plano
internacional.”
A doutrina, por sua vez, quando questionada se o indivíduo é sujeito de direito
internacional, se divide em duas correntes de entendimento. A primeira entende que somente
os Estados e organizações internacionais são sujeitos de direito internacional, vez que podem
celebrar tratados e criar normas. A segunda corrente entende que o indivíduo tem aptidão de
exercer direitos em determinadas áreas de direito internacional e contrair obrigações, tal como
ser imputada responsabilidade penal.
No plano internacional, a doutrina acrescenta mais um elemento, não bastando que o
indivíduo seja sujeito de direitos e obrigações, mas deve ter capacidade para exercê-los. Lima
(2009) ilustra:
O direito internacional clássico, formulado principalmente no século XVIII -XIX e
início do XX, não concede ao indivíduo essa capacidade. Para esses doutrinadores, e
principalmente para aqueles de cunho mais positivista como é o caso de Triepel e
Dionísio Anzilotti, como sujeitos de direito internacional figuram apenas os Estados,
soberanos e absolutos no criar e atuar sob as normas internacionais. Este é um
posicionamento que vai ao encontro da prática internacional do período. Para estes
autores, onde também figuram Rolando Quadri e NOME Sereni, os indivíduos são
equiparados a barcos, aeronaves ou fronteiras, como se o direito internacional
simplesmente versasse sobre eles. Dentro desta concepção cabe ao Estado a
representação jurídica de seus nacionais no plano internacional, sobretudo através da
representação diplomática.

A fim de estabelecer o contraponto, Carvalho (2012) assevera que o indivíduo é quem


está por trás de todas as relações internacionais, em que pese o Estado ainda seja o ator
principal no espaço global. Para ele, o indivíduo é, juntamente com o Estado e o sistema
global, uma perspectiva a ser explorado, afinal, o indivíduo age em nome do Estado, mas
também é ele quem sofre as consequências.
O que se pode conceber, a partir das afirmações dos autores, é que há uma dicotomia
doutrinária no que se refere à capacidade dos indivíduos como pessoas do Direito
Internacional. Salvo melhor juízo, trata-se de posição equivocada aqueles que defendem que a
pessoa física não é sujeito de Direito Internacional Público. Ora, não é preciso que a pessoa
celebre tratados em seu nome para que seja considerada sujeito de Direito Internacional, mas
basta apenas que o indivíduo possa se sujeitar às normas de Direito Internacional.
Sem a pretensão de esgotar o tema, compartilha-se da ideia de que o indivíduo tem o
direito de ser reconhecido em todos os lugares perante a lei, sem necessidade de socorrer-se
ao princípio da dignidade da pessoa humana, ainda que em território fronteiriço.
42

Portanto, há divergência quando a personalidade internacional do ser humano –


indivíduo -, mas é indiscutível a sua caracterização como nacional, como povo de um
determinado Estado.
Somado a isto, o que se pretende extirpar é a ideia de o indivíduo se reduz a
problemas de segurança nacional na fronteira, como o tráfico de drogas e o contrabando.
Neste sentido, Ramalho Júnior e Oliveira (2006, p. 03) ressaltam:

Não é, apenas, a capacidade de representatividade do homem, bem como, não


apenas a função na segurança nacional ou sua agenda negativa que tornam a
fronteira fascinante, ímpar e, acima de tudo, mágica. São seus ritos, seus símbolos
próprios, seus habitantes e suas instituições.

É nesta dialética exposta pelo referido autor que o estudo da fronteira deve-se pautar:
perceber o indivíduo como o primeiro elemento integrador de qualquer política pública, como
a força motriz que faz surgir todo e qualquer estudo de turismo fronteiriço, envolvendo tanto
quem atravessa a fronteira, como aquele que ali reside, que ali trabalha que ali estabelece
relações fronteiriças. São também os ritos e costumes dos indivíduos que tornam a fronteira
fascinante e não somente suas problemáticas.
Para Costa, Cisne e Oliveira, (2010, p. 06), o sujeito deve ser analisado ainda sob a
ótica da atividade turística, aonde o “eu” viajante relaciona-se com o “outro”. E assim
propaga:
A fronteira proporciona não só aos turistas, mas também aos moradores desse
espaço a (con)vivência e a possibilidade de contato/encontro. Essa vivência e
convivência nesses espaços ambíguos garantiriam aos seus sujeitos a possibilidade
de trânsito – físico e cultural – transfronteiriço, consagrando-lhes certas
especificidades que representariam a condição fronteiriça. Esta pode ser entendida
como um savoir passer (saber passar), adquirido pelos habitantes das áreas de
fronteira, acostumados a acionar diferenças e semelhanças nacionais, lingüísticas,
jurídicas, étnicas, econômicas, religiosas, que ora apresentam vantagens, ora o
cerceamento de trânsitos e direitos (DORFMAN, 2009). Nesse sentido, a
experiência da vida na fronteira forneceria aos seus habitantes os instrumentos
necessários para articular as diferenças identitárias, propiciando-os tornarem-se,
simultaneamente, portadores e passadores de bens simbólicos ou materiais que
expressam as contradições e diferenças manifestas no lugar fronteira.

Da leitura acima, depreende-se que no olhar do indivíduo, a fronteira envolve um


mundo de possibilidades e tem um grau de extroversão que perpassa os territórios originais.
No olhar geográfico, é um mundo repleto de mundos, cabendo ao turismo, identificar as
forças e trabalhar esses mundos (CASTROGIOVANNI, 2009).

2.2.PARA O ESTADO:

Entretanto, esse mundo de possibilidades requer normatização, ordem e delimitação


geográfica. Eis aqui a segunda matriz essencial de estudo da fronteira: o Estado, enquanto ator
43

da realidade fronteiriça e para quem a segurança é palavra de ordem. Afinal, em que pese os
indivíduos sejam os atores reais da fronteira e quem traça e esbarra nos limites criados, é o
Estado soberano quem dita formalmente as regras do jogo e, para quem a segurança é sempre
a palavra de ordem.
Ramalho Júnior e Oliveira (2006, p. 03) acentuam esta posição:
Com a criação do Estado-Nação, e o consequente surgimento da modernidade, a
ótica do poder central sempre caminhou em direção de uma unidade, das forças
armadas, território, língua e leis que estivessem de acordo com uma lógica nacional.

É importante destacar que o Estado é o sujeito clássico do Direito Internacional e o


Direito emana do Estado que é uma instituição jurídica. Pode-se dizer que há uma relação de
simbiose entre ambos – Estado e Direito – uma vez que a sociedade depende do Direito para
se organizar, mas pressupõe a existência de um poder controlador, um poder político que é o
Estado-instituição. Fato é que vários elementos são comuns a ambos que constituem
instrumento a serviço do bem-estar da coletividade.
Por seu turno, Raffestin (1993, p. 165) acrescenta: “De fato, desde que o homem
surgiu, as noções de limites e de fronteiras evoluíram consideravelmente, sem no entanto
nunca desaparecerem”. É evidente que os significados do limite variaram muito no decorrer
do tempo.
É inegável que houve mudança na concepção, na compreensão e no entendimento da
fronteira, inclusive enquanto legislação. E por mais que sejam celebrados acordos e aplicadas
políticas nas áreas de fronteira, seja com intuito político, econômico ou social, a fronteira
sempre será um ponto de tensão e ainda está eivada de burocracias.
Neste sentido, a globalização não implicou em ausência de regras e extinção das
fronteiras. Ao contrário, outras fronteiras surgiram e se definiram, outras formas de proteção e
ocupação tomaram forma e outros modos de fiscalização foram implementados pelos Estados.
A despeito da globalização e dos seus efeitos, Silveira reflete (2005, p. 07):
A globalização, sendo um processo complexo, implica uma maior proximidade entre
os países, bem como o fluxo de mercadorias, objetos, ideias, pessoas e tem gerado,
desde a sua “fase embrionária” - entre o século XVI e XVIII, a partir das grandes
viagens transoceânicas e os processos de conquista a eles associados -, sem dúvida,
um nível até então nunca visto de integração; no entanto, como contrapartida gerou
uma série de assimetrias marcadas pelo caráter etnocêntrico que é capaz de veicular.

(...)

...como se as fronteiras territoriais, de caráter obviamente político, pudessem


permitir a queda daquelas fronteiras que são de ordem simbólica, marcadas pela
identidade nacional (possuindo clivagens e fronteiras culturais, dada a presença de
grupos étnicos diversos em seu interior), além das fronteiras culturais que são
relativas ao credo, à etnia e a sua dimensão fenotípica, pelo gênero ou pela condição
de ser pertencente a um país considerado periférico, por exemplo.
44

Por sua vez, Milton Santos destacou, por ocasião do documentário “O mundo global
visto do lado de cá”, um filme de Silvio Tendler (2011), que a globalização deve ser
compreendida sob três enfoques distintos. Primeiro, a globalização como fábula, que é a visão
romântica que nos fizeram acreditar, que uniria países, pessoas e culturas. Num segundo
momento, a globalização como perversidade, que é o mundo como ele de fato é. A realidade
que estabeleceu fronteiras econômicas e sociais ainda maiores. E, por fim, a figura de outra
globalização, num mundo como ele poderia ser, onde a globalização e o território devem ser
matrizes da vida econômica, política e social.
Por falar em globalização, a sociedade moderna se estruturou na forma de Estados
que, de acordo com a concepção clássica, à grosso modo, quer dizer nações politicamente
organizadas.
Para entender o Estado é necessário recorrer às suas origens. De acordo com Lopes
(2010, p.03):

Os gregos, cujos Estados não ultrapassavam os limites da cidade, usavam o termo


polis, cidade, e daí veio política, arte ou ciência de governar a cidade. Os romanos,
com o mesmo sentido tinham civitas e respublica. No século XVI em diante o termo
Estado foi aos poucos tendo entrada na terminologia política dos povos ocidentais: é
o État francês, Staat alemão, State inglês, Stato italiano e em português e espanhol
Estado.

O referido autor também delineia as noções de Estado que foram surgindo


historicamente. No século IV, a.C, Aristóteles já escrevia sobre o Estado na sua obra “A
Política, onde começou a abordar a organização política de Atenas e Esparta, os órgãos do
governo e uma classificação preliminar de todas as formas de governo existentes. Aristóteles
pode ser considerado o fundador da ciência do Estado.
Na mesma época, Platão escreveu “A República” (2007), descrevendo o Estado ideal,
como devia ser de acordo com a sua compreensão de homem e mundo. Foi Cícero, no século
II, a. C, que fez a primeira análise jurídica e moral do Estado romano, do que ele era e do que
deveria ser. Foi Maquiavel quem lançou os fundamentos da política, como a arte de atingir,
exercer e conservar o poder, no século XVI (LOPES, 2010, p. 03).
Em que pese o objetivo deste estudo não seja aprofundar sob o aspecto do surgimento
do Estado, tampouco acerca da origem e evolução dos tipos de Estado – teocrático, grego,
romano, medieval e moderno – faz-se prudente compreender o Estado moderno, nas palavras
de Lopes (2010, p. 03):

O Estado moderno é uma sociedade à base territorial, dividida em governantes e


governados, e que pretende, dentro do território que lhe é reconhecido, a supremacia
45

sobre todas as demais instituições. Põe sob seu domínio todas as formas de atividade
cujo controle ele julgue conveniente.
O Estado pode coercitivamente impor sua vontade a todos que habitam seu
território, pois, seus objetivos são os de ordem e defesa social para realizar o
bem público. Por isso e para isso o Estado tem autoridade e dispõe de poder, cuja
manifestação concreta é a força por meio da qual se faz obedecer. Assim, Estado é a
organização político-jurídica de uma sociedade para realizar o bem
público/comum, com governo próprio e território determinado.

Em consonância com esse entendimento, é possível destacar que a doutrina de hoje


apresenta três direções em que o Estado caminha: uma social, que analisa o Estado do ponto
de vista social, abrangendo seu processo de formação; uma política, que visa o bem estar da
coletividade; e uma jurídica que examina a estrutura jurídico-normativa do Estado.
Portanto, o Estado se desenvolveu como forma de sociedade política, sendo
justamente o objetivo de ordenação da vida da coletividade a sua razão de existir. Não se
confunde com Nação, tendo em conta que, enquanto o Estado merece consideração jurídica,
nação é termo que alude a aspectos culturais e históricos.
Há certo consenso em se apontar como elementos formadores do Estado os
seguintes: território (espaço em que atua a ordem jurídica nele estabelecida, dimensão
espacial do Estado), povo (conjunto dos nacionais, dimensão pessoal do Estado), governo (ou
poder) e soberania (que ostenta como características a supremacia no plano interno e a
independência no externo), (OLIVEIRA, 2011, p. 36/37). E, é exatamente neste ponto, que os
objetos de estudo se entrelaçam na Geografia e no Direito.
Vale destacar que, para alguns autores, a soberania integra o terceiro elemento, vez
que o governo pressupõe a soberania, sob o argumento de que o se o governo não é
independente e soberano, não existe Estado perfeito.
Contudo, afastando-se da polêmica acerca da soberania dos Estados, em razão do
processo de globalização, importa que estas organizações possuam duas espécies de
representação, qual seja: a internacional, verificada a partir do relacionamento com outros
Estados (prevista no artigo 4º da Constituição Federal) e a interna, estruturada de acordo com
as características adotadas por cada Estado.
Fato é que os Estados já vivem o alerta da importância de promover a integração das
fronteiras, bem como de fomentar o turismo fronteiriço, como uma ponte que liga culturas
distintas e torna o turismo como uma atividade atrativa e especial nas áreas fronteiriças. Sobre
esta peculiaridade, Castrogiovanni (2009, p.07) expôs:

O Turismo de Fronteira, a princípio, parece ser difícil por que temos dificuldades em
romper os limites do território e trabalharmos com os não-limites do espaço de
fronteira. Os fronteiriços o fazem com a maior desenvoltura. Na realidade, a
46

burocracia com que os Estados, ditos soberanos, lidam com os limites, parece ser a
maior dificuldade para as fronteiras, enquanto entre lugares, fortalecerem a
identidade de lugares turísticos!

Por sua vez, Banducci Júnior (2011, p. 12) descreve a peculiaridade do turismo
fronteiriço, mas não deixa de lado a informalidade e ilegalidade que permeia estes espaços.

O turismo, portanto, promove novos arranjos territoriais, mobilizando pessoas,


capital e bens simbólicos, alimentando as referências sobre o “outro” e reordenando
as situações de contato e interação. Do mesmo modo, induz a que práticas ilegais ou
não regulamentadas, tais com o comércio informal e o contrabando, ganham novos
atores, que modificam as relações de força entre os mandatários locais, obrigando a
sociedade a se ajustar às novas conformações sociais ditadas pelo crime e a
ilegalidade.

O que os citados autores trazem à tona é a burocracia instituída nas fronteiras e ainda
as relações estabelecidas nesse espaço que podem ser institucionalizadas ou ilegais, sendo o
papel do Estado decisivo. E não poderia ser diferente, vez que além de ser o regulamentador
daquela porção territorial, a ele cabe a normatização harmônica entre os Estados envolvidos
quando a intenção é promover a integração.

Ora, em que pese a existência de uma ordem jurídica e um poder político central,
cruzar a fronteira é um ato de liberdade, de necessidade de se arriscar e conhecer a diferença,
como poeticamente expôs Silveira (2005, p.13). Mas diante da dinâmica espacial das
fronteiras, tal movimento tem implicações, acima de tudo, jurídicas que devem ser bem
definidas, a fim de evitar entraves desnecessários e rusgas entre os Estados fronteiriços.
Por último, em análise acerca do homem e do Estado, Maluf (1988, p. 325) destaca a
necessidade de se equacionar os dois termos, não podendo o Estado desrespeitar as
prerrogativas naturais da pessoa humana tampouco o homem prescindir da autoridade estatal.

2.3 PARA O DIREITO GLOBAL:

Após a análise da fronteira sob a ótica do indivíduo e do Estado, é hora de discorrer


acerca da fronteira para o Direito, enquanto ciência social. E neste sentido, o primeiro
esclarecimento a ser feito é que Direito não se confunde com a lei, uma vez que aquele é mais
amplo, mais extenso, além de estar composto de princípios e valores.
Carvalho (2012, p.05), em texto para introdução de aula, faz um apontamento
pertinente: “O estudo do direito internacional, desde um ponto de vista formal, faz-nos
compreender como nasce, aplica-se e extingue-se as normas internacionais. Mas pouco nos
diz sobre o porque se cria, aplica-se e revoga-se tais normas.” E ainda dentro deste contexto, o
47

mencionado autor completa que criado para estabelecer fronteiras, relações comerciais e as
condições para a paz entre os Estados, novos atores surgiram no espaço internacional, novas
relações se formaram e uma nova leitura deve ser posta em prática, a fim de se debruçar sobre
o mundo de hoje. A partir daí, indaga-se, estamos, de fato, na era do direito global? Como
ficam as fronteiras diante deste panorama que se descortina?
Para Staffen (2013), os processos de globalização criaram uma nova ordem
supranacional, permitindo a livre circulação de capital, mercadoria, bens e serviços. E
arremata:
O declínio do Estado Constitucional nacional e a ascensão de um paradigma global
de Direito decorre, substancialmente, da penetração de critérios econômicos
privados nos assuntos e políticas públicas dos Estados, logisticamente apoiado pelos
avanços tecnológicos. A globalização econômica produz um processo de
globalização jurídica por via reflexa, bem como a globalização também dos
comportamentos jurídicos, tal qual a opção pessoal e facultativa por precedentes na
tradição do civil law entre outros “costumes”.

Como acertadamente expôs o referido autor, faz-se premente, na medida das


possibilidades, uma globalização jurídica, especialmente nos assuntos pertinentes à fronteira.
Nesse sentido, expôs o professor Luiz Flávio Gomes (2008, p. 01):

O velho conceito de soberania de cada Estado está em crise porque os Estados


soberanos (isoladamente) não conseguem solucionar problemas globais. Na questão
do tráfico de drogas, por exemplo, pouco vale a atuação de um só país (ainda que
sua iniciativa seja adequada). Problemas mundiais requerem um controle, um
Direito e uma Justiça globais.

E assim temos visto. Cada fronteira é uma fronteira, dentro das suas singularidades e
complexidades. E assim temos feito. O Brasil tem procurado celebrar acordos com os países
vizinhos, a fim de minimizar os impactos negativos, decorrentes especialmente de condutas
criminosas. É fato que enquanto o sistema doméstico ainda se debruça demasiadamente para
solucionar os problemas decorrentes da segurança, o Direito Global estende-se para além das
fronteiras do Estado Nacional. A respeito do direito doméstico e global, respectivamente,
Sundfeld ( 2001, p. 01) sinaliza:

Tomo por direito doméstico aquele enclausurado nos limites do Estado Nacional,
isto é, cujas fontes encontram-se nesse Estado (em sua Constituição, em suas leis,
em seus regulamentos...), cujos mecanismos de aplicação e proteção são operados
exclusivamente por seus órgãos (é dizer: por sua Administração e seu Judiciário) e
cujo conteúdo, se não foge à influência externa — afinal, idéias e interesses
econômicos jamais foram contidos pelos mapas — é basicamente construído em
função das necessidades de organização da vida econômica, social e política
internas ao País.

E acrescenta ainda:
48

Evidentemente, a simples existência de órgãos e de fontes normativas internacionais


nem constitui novidade nem basta para caracterizar uma “nova era”. Esta é derivada,
portanto, não do surgimento, mas da intensificação do fenômeno. Afora a
globalização econômica, dois outros fatores vêm concorrendo para isso.

Como se vê, de acordo com Sundfeld (2001), dois fatores internacionais tomam corpo:
a internacionalização dos direitos humanos e a integração regional. Com relação ao primeiro,
é necessário recorrer a Bobbio (1992) que destaca que o grande problema dos direitos
fundamentais hoje não é o seu reconhecimento, mas a sua proteção. Ou seja, o problema é de
cunho jurídico e não filosófico, uma vez que não se discute mais quais são os direitos, a sua
relativização se decorre de conquista histórica ou natural. Discute-se quais os meios para
proteger e fazer valer os direitos humanos.
Cabe, neste momento, uma análise da fronteira. Um cidadão que viaja, para fazer
turismo na Bolívia, pode ser coagido na fronteira, a pretexto de revista, documentação
irregular ou qualquer outro motivo que vai contra aos seus direitos.
No que pertine à integração regional, cabe ao Estado atuar em diferentes escalas, não
só local, mas especialmente regional, fronteiriça e global. São mudanças pontuais no ambiente
normativo que podem resultar em mudanças efetivas, assim como a quebra do paradigma
estadocêntrico da segurança. Nas palavras de Abreu (2004, p.11):
Durante décadas, houve a predominância do paradigma realista de segurança,
expresso da seguinte forma: a segurança está diretamente relacionada ao poder do
Estado, que se protege contra perigos externos. Esta definição estadocêntrica de
segurança delimita a fronteira entre “ordem” doméstica e “anarquia” internacional.
Isso resulta em um dilema de segurança, pois o que pode ser justificado por um
Estado como medidas legítimas de aumento de segurança, provavelmente será
percebido por outros como o surgimento de uma ameaça militar. No entanto, o foco
na dimensão militar de segurança das grandes potências, típico do período da Guerra
Fria, tem sido reexaminado; assim como a definição de segurança vem sendo revista
para abranger outras dimensões como a diminuição da pobreza e o desenvolvimento
sustentável.

As palavras de Abreu trazem à tona um assunto inadiável e que nos permite refletir:
qual seria o momento da ruptura do paradigma da segurança para a fronteira enquanto região
de oportunidades.
Em consonância com este entendimento, em 2012, Sprandel realizou uma busca
acerca das propostas envolvendo a faixa de fronteira no Senado Federal e na Câmara dos
Deputados, no Brasil, conforme demonstra o Quadro 05. A conclusão a que se chegou é que a
faixa de fronteira da forma como foi pensada pela Constituição Federal de 1988 não condiz
com o momento em que o discurso internacional versa sobre a integração regional e
globalização.
49

QUADRO 05: Propostas de Emenda Constitucional sobre a Fronteira no Brasil

As Propostas de Emenda à Constituição (PEC´s)


Identificação Ementa Autor Localização/Situação
Atual
1 PEC 49/2006 Dá nova redação ao Senador Sérgio Plenário do Senado
§ 2º do artigo 20 da Zambiasi Federal, desde
Constituição, para (PTB/RS) e 22/03/2011,
dispor sobre a outros. aguardando inclusão na
alteração da faixa de ordem do dia.
fronteira

2 PEC 235/2008 Dá nova redação ao Deputado Comissão de Constituição


§2º do artigo 20 da Mendes Ribeiro e Justiça (CCJ) da Câmara
Constituição, Filho dos Deputados, desde
para dispor sobre a (PMDB/RS) e 03/06/2011, tendo como
alteração da faixa de outros. relator o deputado Sibá
fronteira. Machado (PT/AC).
3 PEC 409/2009 Altera a redação do Deputado Comissão de Constituição
artigo 129, inciso Marcelo Ortiz e Justiça (CCJ) da Câmara
VII, e do artigo 144 (PV/SP). dos Deputados, desde
da 21/03/2012, tendo como
ConstituiçãoFederal, relator o dep. Paes Landim
bem como (PTB-PI).
acrescenta à
Constituição Federal
os artigos 144A,
144- B e 144-C,
instituindo a
autonomia da
polícia judiciária
4 PEC 6/2009 Altera o artigo 159 Senadora Plenário do Senado
da Constituição Marisa Serrano Federal, desde
Federal e (PSDB/MS) e 23/02/2011,
acrescenta o artigo outros. aguardando inclusão na
97 ao Ato das ordem do dia.
Disposições
Constitucionais
Transitórias, para
criar o Fundo de
Desenvolvimento
dos Municípios de
Fronteira.
Fonte: SPRANDEL, Márcia A., 2012. Fronteiras/Artigos. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L6634.htm>. Acesso: 26.05.2013.
Org. PARIS, Marcela C. N., 2013.

Analisando o texto inicial da PEC nº 49/2006, que propõe a alteração dentre os


argumentos elencados pelo autor do projeto, destacam-se: legislação infraconstitucional
obsoleta em descompasso com a realidade internacional; a integração regional e formação de
blocos econômicos, bem como, uma importante consideração acerca das regiões fronteiriças:
50

Hoje, os mecanismos de segurança, controle e informação instantânea dos quais


dispõe o Estado transformam a legislação brasileira de faixa de fronteira em obsoleta
e comprometedora do desenvolvimento regional. As regiões fronteiriças são
sacrificadas pela Geografia e pela História. Não há mais razão para que o sejam também
pelo Direito e pela Política.

O que se depreende dessa leitura é que na zona de fronteira está a maior fragilidade
para aplicar a dinâmica do mundo globalizante, da tendência integracionista, sendo necessária
uma “ressignificação” da concepção de fronteira, que levará naturalmente a necessária
mudança de paradigmas, atrelando-se não somente a proteção da soberania nacional, mas uma
abertura efetiva ao desenvolvimento regional.
É válido demonstrar que a PEC 49/2006 foi proposta em 23/11/2006 e desde o dia
22/03/2011 aguarda inclusão na pauta para julgamento.
Por sua vez, a PEC nº 006/2009, que dispõe acerca da criação do Fundo de
Desenvolvimento dos Municípios de Fronteira, tem o objetivo de reduzir as desigualdades
regionais e promover a melhoria das condições de vida da população dos municípios da
região de fronteira do Brasil. Tal como a PEC nº 49/2006, a de nº 006/2009 também aguarda
inclusão na pauta para julgamento, desde 23/02/2011.
De acordo com o Ministério da Integração Regional, a região fronteiriça brasileira
abrange 15.719km de linha divisória terrestre, em 11 unidades da Federação e abriga cerca de
10 milhões de habitantes. E como justificativa, o referido projeto expôs:

A principal marca da Fronteira brasileira é sua enorme diversidade, pois, se um terço


de sua extensão é localizado em terras indígenas, há diversas cidades brasileiras que se
separam de cidades de outros países por apenas uma rua. Assim, a existência de vazios
econômicos e demográficos contrasta com a presença de municípios brasileiros com
problemas decorrentes da vizinhança de cidades onde o governo de seus países lhes
concede regime fiscal especial.

Essa citação traz uma reflexão importante acerca da relação entre fronteira e terras
indígenas no Brasil, uma vez que grandes porções territoriais indígenas localizam-se em
regiões próximas à fronteira do País, o que faz com que a discussão ganhe contornos de
defesa da soberania nacional.
Portanto, a demarcação de terras tradicionalmente ocupadas pelos índios cabe à União,
de acordo com o artigo 231, da Constituição Federal vigente e compete ao Presidente da
República a homologação de referida demarcação administrativa.
Nesse sentido, a título de curiosidade, eventual conflito armado entre índios e
posseiros, por exemplo, como o caso da Terra Indígena Raposa do Sol, converte-se em
51

assunto de segurança pública, em razão da proximidade com a fronteira, sendo dever do


Estado garantir a integridade e a inviolabilidade dessas mesmas fronteiras.

2.4 PROJETOS DE FRONTEIRA – BRASIL:

Em síntese, é possível perceber a demora na tramitação, apreciação e aprovação de um


projeto de lei no Brasil, especialmente, se a matéria não estiver dentre aquelas consideradas
relevantes. E ainda que existam projetos em trâmite, abordando a questão da fronteira, na
maioria das vezes, a questão da segurança ainda é o tema central.
Feita esta análise da fronteira sob a ótica do indivíduo, do Estado e do Direito Global,
faz-se pertinente destacar que o Brasil tem se mobilizado, bem como tem incitado à
participação parte de seus Ministérios, desenvolvendo a partir deles projetos que discutem a
fronteira e visam maior integração fronteiriça com os países da América do Sul.
Em consonância com estas propostas legislativas acima descritas, o Ministério da
Integração Nacional criou em 2005 a Proposta de Reestruturação do Programa de
Desenvolvimento da Faixa de Fronteira – Bases de uma Política Integrada de
Desenvolvimento Regional para a faixa de fronteira, onde o governo federal deu clara
prioridade tanto ao desenvolvimento regional quanto à integração da América do Sul.
A ideia constante da referida Proposta de Reestruturação foi abandonar os projetos
desarticulados e fragmentados que vinham sendo desenvolvidos até então, sem qualquer
planejamento ou orientação programática, com uma visão estritamente assistencialista. A
mencionada Proposta esclarece (BRASIL, 2010, p. 06):
Do ponto de vista das relações internacionais, a concepção anterior do Programa
colocava toda a ênfase na ideia da fronteira como peça fundamental da defesa
nacional e da imposição de barreiras às ameaças externas, implicando, de fato, a
imposição de limites nas relações com os países vizinhos.

Ou seja, a antiquada visão de que a fronteira era vista enfaticamente pura e somente
como assunto de segurança nacional. A nova proposta, elaborada por um grupo de
pesquisadores e estudiosos renomados do País, dentre eles, Lia Osório Machado, Rebeca
Steiman e Rogério Haesbaert, que tentou estabelecer um elo entre a rigidez acadêmica e as
vicissitudes que circundam a realidade fronteiriça.
À época, o então Ministro da Integração, Ciro Gomes, destacou a importância de
superar a visão da fronteira como um “espaço problema” em favor de uma concepção que
privilegia a região como “um espaço pleno de oportunidades de desenvolvimento”, de união
com os nossos vizinhos e de valorização da cidadania.
52

Se é na fronteira que começa o Brasil, além da segurança, passou-se a adotar a vertente


do desenvolvimento. E acerca destes dois aspectos, a Proposta de Reestruturação do Programa
de Desenvolvimento da Faixa de Fronteira (2010, p. 33) resume:
A segurança na faixa de fronteira é obtida por meio de ações próprias das Forças
Armadas e dos órgãos de segurança, conforme determinação constitucional. A
segurança contribui para o desenvolvimento ao cooperar efetivamente com ações
decorrentes da missão atribuída às Forças Armadas pela Constituição Federal. Às
três forças armadas o texto constitucional indica que lhes cabe, também, cooperar
com o desenvolvimento nacional e a defesa civil.
Uma das diretrizes da Política de Defesa Nacional (PDN) remete à vivificação da
faixa de fronteira, que é traduzida na área da defesa por ações das mais variadas, tais
como: o Programa Calha Norte; o Projeto Rondon, as operações de combate ao
desmatamento; a “colonização” empreendida pelos pelotões especiais de fronteira do
Exército na Amazônia; o Correio Aéreo Nacional da Aeronáutica; a assistência
hospitalar por meio de navios da Marinha; os projetos nacionais de infraestrutura em
estradas, portos, pontes, aeroportos e ferrovias; os projetos de regularização
fundiária; a cooperação com a defesa civil; as ações cívico-sociais e outras advindas
da cooperação com setores governamentais.

(...)

A vertente do desenvolvimento na concepção estratégica nacional é materializada


nos programas de desenvolvimento e na concessão de incentivos especiais. O
Programa de Promoção do Desenvolvimento da Faixa de Fronteira (PDFF) do
Ministério da Integração Nacional (MI) é um exemplo dessa vertente e tem como
objetivo articular a questão da soberania nacional com o desenvolvimento regional,
em suas dimensões econômica, social, institucional e cultural.

Sob a perspectiva da defesa, as iniciativas levadas a efeito na faixa de fronteira com


vistas ao desenvolvimento constituem fator de segurança, mesmo que, ao aplicá-las,
o político ou o gestor não tenha em mente essa finalidade subjacente. Trata-se de
uma relação intrínseca, indissociável, que se caracteriza na medida em que tensões
sociais são mitigadas por consequência da melhoria da qualidade de vida das
populações, tanto as nacionais quanto as estrangeiras localizadas no entorno e que
também se beneficiam, gerando um clima de paz e integração regional crescente.

Para tanto, o Brasil tem desenvolvido ações nas regiões fronteiriças, visando o seu
desenvolvimento, a sua proteção, bem como a integração com os países vizinhos. Tais ações
envolvem diferentes abordagens e, consequentemente, trouxeram à tona dificuldades
particulares das suas respectivas áreas de atuação. Contudo, não deixa de ser um marco
significativo e propulsor da integração fronteiriça, sob diferentes aspectos. Senão, veja o
Quadro 06 abaixo:

QUADRO 06: Ações do Governo Brasileiro na Faixa de Fronteira

AÇÕES DO GOVERNO FEDERAL NA FAIXA DE FRONTEIRA


Programa Ministério Resumo Dificuldades
Programa Calha Ministério da Defesa Foi criado em 1985 - Vazios demográficos
pelo Governo Federal - Pouca (ausência)
Norte
com o objetivo de presença dos
“aumentar a presença equipamentos estatais
do poder público na nas áreas de saúde,
53

região abrangida pelo comunicação, educação


programa, contribuindo e transporte.
para a defesa nacional,
proporcionando
assistência às suas
populações e fixando o
homem na Região”.
Dessa forma visa
promover a ocupação e
o desenvolvimento
ordenado da Amazônia
Setentrional,
respeitando as
características
regionais, as diferenças
culturais e o meio
ambiente, em harmonia
com os interesses
nacionais.
Programa de Ministério da Foi inserido no Plano - Necessidade de
Promoção do Integração Nacional Plurianual de pessoal nos órgãos
Desenvolvimento da Investimentos (PPA fiscalizadores na
Faixa de Fronteira 2004-2007) para dar fronteira;
(PDFF) - dinamismo às ações de - Baixo índice de
governo na faixa de execução orçamentária;
fronteira com o objetivo - Baixa articulação
de retomar o processo junto aos parlamentares
de desenvolvimento da na formulação de
região. emendas.

Projeto SIS - Ministério da Saúde Iniciado em 2006, o


Fronteira projeto tem como meta
melhorar o serviço de
saúde na fronteira,
com término previsto
para o ano de 2011.
Projeto Fronteiras Ministério da Justiça – O projeto tem como - Dificuldade no
(SINIVEM) e Departamento de objetivos realizar o processo de execução;
Questões Migratórias Polícia Federal mapeamento dos - Maior clareza nas
- Programa criminosos, por meio de atribuições do
PRONASCI um amplo e irrestrito Departamento da
Fronteiras processo de cooperação Polícia Federal e órgãos
entre os órgãos estrangeiros
governamentais de equivalentes;
inteligência - Interiorização dos
policial, numa tentativa serviços;
de reduzir os índices de - Garantia de imunidade
criminalidade nas profissional e pessoal
regiões dos agentes fronteiriços
transfronteiriças, e
mitigar os impactos das
correntes dos fluxos
migratórios em direção
ao território nacional.
Programa Amazônia Exército Brasileiro O Programa Amazônia - Carência de
Protegida (PAP) Protegida vai aumentar mecanismos que
de 23 para 51 o atual garantam a perenidade;
número de pelotões de - Necessidade de
fronteira na floresta, transformação em
além de criar novas programa de governo e
54

brigadas. Essa aporte de recursos.


reestruturação estará
concluída
até 2018 e incluirá a
modernização dos
pelotões existentes.
Projeto Intercultural Ministério da Educação Tem como propósito
Bilíngue Escolas de promover a construção
Fronteira de uma identidade
regional bilíngüe e
intercultural como
marco de uma cultura
de paz e de cooperação
inter-fronteiriça.
Concertação de Ministério do Turismo FRONTUR –
Fronteiras Seminário
Internacional de
Turismo de
Fronteiras: O principal
objetivo do Frontur é
atrair as atenções para o
turismo gerado num
cenário
de fronteiras, reunindo
todos os órgãos e
entidades relacionados
ao turismo
transfronteiriço para
discutir e encontrar
soluções que facilitem a
movimentação do fluxo
internacional de
turistas.
SIMITUR –
Seminário
Internacional sobre
Migração e Turismo:
é uma parceria entre os
Ministérios do Turismo
e da Justiça, que visa
repassar a agentes da
Polícia Federal e da
Polícia Rodoviária
Federal, localizados nas
fronteiras do
Brasil, informações
sobre a importância do
turismo para a
economia brasileira na
geração de
emprego e renda e do
tratamento adequado
aos turistas estrangeiros
que cruzam as
fronteiras brasileiras.

CADASTUR - Sistema
de Cadastro de
Prestadores de
Serviços Turísticos:
55

foi a cessão tecnológica


do Cadastro de
Prestadores de Serviços
Turísticos, o Cadastur
brasileiro, à Secretaria
de Turismo do
Paraguai. A ideia é
manter e ampliar esses
acordos de cooperação
técnica, com vistas à
criação de um cadastro
geral dos prestadores de
serviços turísticos da
América do Sul, bem
como a elaboração de
um selo de qualidade de
turismo para o bloco, de
forma a melhorar a
integração fronteiriça e
os entraves à circulação
de pessoas e prestação
de serviços.

Questões Migratórias Ministério do trabalho e No caso do Brasil, não


Emprego existe um marco
regulatório único para
tratar fluxos de
trabalhadores
transfronteira. Em
geral, adota-se uma
política diferenciada,
formatada de acordo
com
o lugar geográfico, os
interesses brasileiros e a
relação com o país
vizinho.
Regularização Instituto Nacional de Tem como um de seus
Fundiária em Faixa de Colonização e Reforma objetivos priorizar a
Fronteira Agrária (INCRA) regularização fundiária
e a ratificação de títulos
em faixa de fronteira,
uma vez que, por meio
de tal atuação, o
produtor rural passa a
ter acesso à assistência
técnica, ao
licenciamento
ambiental e, ainda, ao
crédito para
investimentos na
produção
Facilitação de Agência Nacional de Tem como finalidade
Transportes Transportes Terrestres desenvolver uma
Rodoviários em (ANTT) e o Ministério política clara e
Fronteiras de Turismo consistente que permita
o gerenciamento
eficiente do transporte
turístico terrestre
brasileiro vinculando o
56

sistema de
Cadastro do Ministério
do Turismo (Cadastur)
ao Sistema de
Certificação da Agência
Nacional
de Transportes
Terrestres. A intenção é
unificar as informações
e criar um selo a ser
afixado nos
veículos, que
possibilitará ao agente
fiscalizador fácil
percepção da a
regularidade do
transportador turístico.
Áreas de Livre Ministério de Na Região Norte, várias
Comércio – ALCs Desenvolvimento ações vem sendo
Indústria e Comércio realizadas para apoiar
Exterior – (MDIC) –, projetos de produção,
Superintendência da infraestrutura
Zona Franca de Manaus econômica, pesquisa e
(SUFRAMA) desenvolvimento,
capacitação de recursos
humanos e promoção
do turismo.
FONTE: Bases para uma Proposta de Desenvolvimento e Integração da Faixa de Fronteira – Grupo de
Trabalho Interfederativo da Integração Fronteiriça, 2010, p. 34 a 39. Disponível em:
<http://www.integração.gov.br>.
Org. PARIS, Marcela C. N., 2013.

Considerando os projetos que envolvem o Ministério de Turismo - Concertação de


Fronteiras e Facilitação de Transportes Rodoviários em Fronteiras, ambos envolvem as
regiões fronteiriças.
O FRONTUR – Seminário Internacional de Turismo de Fronteira, que em 2010
completou sua sétima edição, a partir da Portaria nº 162, de 26 de agosto de 2011, publicada
no Diário Oficial da União (DOU) passou a ser um programa do governo federal, com vistas a
incrementar e fomentar o turismo de fronteira, em ação conjunta do Ministério de Integração
nacional e do Ministério do Turismo, no Brasil.
À época, o Ministro do Turismo Pedro Novais (2011) ressaltou:

Precisamos dinamizar, ordenar e estimular o fluxo de turistas com os países


vizinhos. A América do Sul é um mercado importante para o turismo brasileiro. O
debate de propostas e soluções para eliminar os entraves fronteiriços é fundamental
para o desenvolvimento da região.

E justamente em razão da necessidade de dinamização, que o programa contempla 11


Estados brasileiros, quais sejam: Acre, Amapá, Amazonas, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul,
Pará, Paraná, Rio Grande do Sul, Rondônia, Roraima e Santa Catarina. Contudo, as ações
57

serão concentradas em quatro deles: Mato Grosso e Amazonas, considerando que estes são
Estados-Sede da Copa do Mundo FIFA-2014; no Acre, em razão da Carreteira Interoceânica,
que fará a ligação entre Rio Branco e Lima; e, ainda, no Amapá, em razão da integração
Brasil-França.
Por último, o outro programa do Ministério do Turismo que envolve as regiões
fronteiriças é o CADASTUR - Sistema de Cadastro de Prestadores de Serviços Turísticos –
seja pessoa física ou jurídica, que atuem na cadeia produtiva do turismo, executada pelo
Ministério do Turismo, em parceria com órgãos oficiais de turismo de qualquer unidade da
federação. O referido programa foi criado para promover a ordem e a formalização dos
prestadores de serviços no Brasil, por meio do instrumento do cadastro, criando um banco de
dados que visa facilidade de acesso e maior confiabilidade nas informações dadas aos turistas.
Esta ferramenta funciona no Brasil, mas foi cedida, por exemplo, ao Paraguai, com vistas à
criação de um cadastro geral dos prestadores de serviços turísticos da América do Sul, o que
na prática ainda não ocorreu.
Por sua vez, o SIMITUR – Seminário Internacional de Migração e Turismo, parceria
entre os Ministérios do Turismo e da Justiça, talvez o projeto que teve menos repercussão em
termos práticos, visa repassar aos agentes da Polícia Federal e da Polícia Rodoviária Federal,
localizados nas fronteiras do Brasil, informações sobre a importância do turismo para a
economia brasileira. De acordo com o site do Ministério do Turismo, em linhas gerais o
projeto retrata:
A ideia surgiu como uma das alternativas para melhorar o fluxo de turistas nas
fronteiras, depois de constatada a inviabilidade de investimentos brasileiros em
reformas nas Áreas de Controle Integrado, cujos centros de turistas ficam do outro
lado da fronteira brasileira, conforme o Acordo de Recife, de 1993.

É possível verificar nas linhas gerais do projeto do SIMITUR, o objetivo de alcançar


melhoria no fluxo de turistas nas fronteiras, o que vem confirmar o ideal supracitado pelo
Ministro do Turismo, Pedro Novaes, à época do FRONTUR. Ora, percebe-se que a
preocupação com a dinamização da zona de fronteira e o fluxo de turistas tornou-se
recorrente.
De acordo com o referido Ministério, somente duas edições do SIMITUR foram
realizadas, a primeira na cidade de Bagé (RS) e a segunda em Manaus (AM), ambas em 2006.
A ideia é que o seminário servisse de exemplo para ações semelhantes e parcerias com os
demais países vizinhos da América do sul, a fim de obter resultados mais eficazes.
Diante do panorama de projetos expostos, pode-se entender que de todos estes
programas propostos pelo Ministério de Turismo, o CADASTUR mantém-se ativamente no
58

Brasil, sendo que em pesquisa virtual acerca do SIMITUR, a busca configura-se inócua, vez
que nenhuma informação atualizada é possível de ser encontrada, senão notícias
desatualizadas.
Assim sendo, a discussão acerca da fronteira a partir do tripé – indivíduo, Estado e
Direito, bem como os projetos brasileiros em trâmite que envolvem a faixa de fronteira
permitem a elaboração de uma reflexão relevante, qual seja: o momento da ruptura do
paradigma da segurança para a fronteira enquanto região de oportunidades.
O dilema da segurança nas fronteiras sempre esteve presente nos planos de governo,
sendo assunto recorrente em razão dos delitos transnacionais, especialmente o contrabando e
o tráfico de drogas que fizeram surgir ações em rede entre órgãos de segurança pública.
Contudo, os programas propostos no Quadro 06, veem demonstrar que, especialmente,
a partir do século XX, os planos de governo desenvolveram um novo olhar sob a fronteira,
como região de oportunidades, de atividade turística, de integração de povos e culturas.
Em consonância com esse entendimento é que foi criado o tripé indivíduo – Estado –
Direito, sob o argumento de que não é possível estudar a fronteira com o foco apenas no
Estado, com os olhos voltados para a segurança e a soberania. Para discutir a fronteira, faz-se
necessário observar o indivíduo, o fluxo de pessoas, o ir e vir constante. É preciso normatizar
a segurança, mas não se esquecer da troca que essa relação fronteiriça pode proporcionar.
Nesse sentido, houve, de fato, uma quebra de paradigma e os projetos governamentais
e as parcerias regionais começaram a vislumbrar melhorias no serviço de saúde, educação e
turismo na fronteira, além de passar a perceber que ali não existiam somente delinquentes,
mas trabalhadores de zona fronteiriça e cidadãos.
Em razão da dificuldade de contato e de acesso a projetos bolivianos que
supostamente envolvam a fronteira, não foi possível estabelecer uma análise sobre a mudança
ou não de visão dos bolivianos acerca da fronteira.
59

3. GEOGRAFIA DO TURISMO E DIREITO DO TURISMO: A DINÂMICA NAS


FRONTEIRAS E SUAS IMPLICAÇÕES

3.1 CONSIDERAÇÕES PRELIMINARES

Para discorrer acerca do direito internacional na fronteira, se faz prudente algumas


considerações preliminares acerca do Direito, das indicações constitucionais sobre o turismo,
bem como Direito Internacional propriamente dito e, na sequência, o que é Direito do
Turismo, ramo recente da ciência jurídica que vem conquistando o seu lugar nos debates
acadêmicos. É o Direito acompanhando a evolução da sociedade e se adequando a realidade
global.
Sobre a nobre missão de estudar o Direito, Ferraz Júnior (1988) apud Pinto Nieto
(2001, p.11) reflete:
O direito é um dos fenômenos mais notáveis na vida humana. Compreendê-lo é
compreender uma parte de nós mesmos. É saber, em parte, por que obedecemos, por
que mandamos, por que nos indignamos, por que aspiramos mudar em nome de
ideais, por que, em nome de ideais, conservamos as coisas como estão. Ser livre é
estar no direito e, no entanto, o direito também nos oprime e nos tira a liberdade. Por
isso, compreender o direito não é um empreendimento que se reduza facilmente a
conceituações lógicas e racionalmente sistematizadas. O encontro com o direito é
diversificado, às vezes conflitivo e incoerente, às vezes linear e consequente.
Estudar o direito é, assim, uma atividade difícil, que exige não só acuidade,
inteligência, preparo, mas também encantamento, intuição, espontaneidade. Para
compreendê-lo, é preciso, pois, saber e amar. Só o homem que sabe pode ter-lhe o
domínio. Mas só quem o ama é capaz de dominá-lo rendendo-se a ele.

A ciência jurídica não propicia somente a formação de uma consciência jurídica.


Antes de tudo, como qualquer outra ciência, ela requer do seu aprendiz, o amor pelo que faz,
pelo que estuda e pelo que anseia. A árvore jurídica possui inúmeras ramificações, podendo
seu operador admirar-se das suas mais variadas ramificações.
Todavia, o Direito é um só, é uno. Não é cabível falar em mais de um Direito. Não
raro, as ciências criam ramos, divisões e subdivisões, a fim de facilitar a compreensão e
apreensão dos inúmeros conceitos, princípios e teorias existentes. Apresentar a ciência
detalhada pode tornar o estudo mais proveitoso, além de permitir a identificação com um ou
outro ramo específico.
Em princípio, o Direito era dividido em Público e Privado. O primeiro tem a ver com o
Poder Público, com o Estado, mas as regras que compõem o Direito Público também visam à
conduta humana, mas sob um enfoque social, coletivo (PINTO NIETO, 2001, p. 18). Por sua
vez, o Direito Privado tem por objetivo maior, a tutela dos interesses individuais, conforme
Meirelles (2012, p. 26) dispôs: visa “assegurar a coexistência das pessoas em sociedade e a
60

fruição de seus bens, quer nas relações de indivíduo, quer nas relações do indivíduo com o
Estado”.
Contudo, como os fatos sociais não são estanques e modificam-se constantemente, o
Direito passou a tutelar os interesses difusos e coletivos, a fim de preencher as lacunas
existentes. Este ramo caracteriza-se pela tutela dos interesses da sociedade, enquanto
coletividade ou grupo social. (PINTO NIETO, 2001, p. 19)
Por sua vez, o Direito Constitucional é um ramo do Direito Público, fundamental à
organização, ao funcionamento e à configuração política do Estado. Exerce papel de direito
público fundamental, estabelecendo a estrutura do Estado, a organização das instituições e
órgãos, o modo de aquisição e exercício do poder, bem com a limitação desse poder, por meio
dos direitos e garantias fundamentais (PAULO; ALEXANDRINO, 2009, p. 03). Neste
sentido, os autores complementam:

Afirma-se que o Direito Constitucional é muito mais do que apenas um ramo do


direito público. Ele consubstancia a matriz de toda a ordem jurídica de um
específico Estado. Figurativamente, o Direito Constitucional é representado como o
tronco do qual derivam todos os demais ramos da grande árvore que é a ordem
jurídica de determinado Estado.

O que o referido autor delineia é a supremacia do Direito Constitucional. E, assim


sendo, a Constituição Federal Brasileira de 1988, em vigor, também chamada de Carta
Magna, elevou o turismo no ordenamento jurídico brasileiro. Vale destacar que esta
Constituição ficou conhecida como “Constituição Cidadã”, vez que ampliou os direitos e
garantias fundamentais, além de estabelecer normas abrangentes de proteção à infância, ao
consumidor, ao meio ambiente, dentre outros.
Contudo, se por um lado, a referida Carta merece aplausos, como acertadamente
dispôs Pinto Nieto (2001), por ter sido a primeira a tratar do termo turismo de forma expressa,
por outro lado, tratou a atividade turística de forma extremamente genérica, deixando lacunas.
O artigo 6º da Constituição Federal estabelece que:

Art.6º. São direitos sociais a educação, a saúde, o trabalho, o lazer, a segurança, a


previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos
desamparados, na forma desta Constituição. (grifo nosso)

É importante ressaltar que é direito constitucional de todos: o lazer, cabendo ao Estado


proporcionar meios para que todos possam desfrutá-lo, principalmente pelo desenvolvimento
do turismo. Contudo, mesmo sendo necessário, o lazer não é suficiente, como acertadamente
apresentou Margarita Barreto, no prefácio da obra de Pinto Nieto (2001): “o turismo,
permitindo ao indivíduo que se distancie de seu meio e de seu cotidiano, torna-se cada vez
61

mais uma necessidade para o bem estar humano”, razão pela qual o legislador não se limitou a
tratar do lazer, mas dispôs sobre o turismo também.
O artigo 24, inciso VII da Constituição Federal disciplina que:
Art.24. Compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar
concorrentemente sobre:

(...)

VII – proteção ao patrimônio histórico, cultural, artístico, turístico e paisagístico;


(grifo nosso)

Este artigo pressupõe duas análises fundamentais. A primeira delas é que os


municípios brasileiros não foram contemplados com a possibilidade de legislar com os demais
entes federativos acerca da proteção ao patrimônio turístico. Ocorre aqui a chamada repartição
vertical de competência legislativa, ou seja, diferentes entes federados poderão legislar sobre
o tema, considerando que caberá à União estabelecer as normas gerais e aos demais entes
federativos atuar de forma suplementar (PAULO; ALEXANDRINO, 2009, p. 306). Certo é
que, havendo inércia legislativa da União, os Estados e o Distrito Federal poderão atuar de
forma plena.
Outra questão relevante é que o supracitado artigo com o correspondente inciso
limitou-se a falar sobre proteção ao patrimônio turístico e não discutiu nenhum princípio
relativo ao turismo.
O artigo 180 da Constituição Federal também aborda o turismo. Vale destacar que
referida matéria está inserida no título VII – Da Ordem Econômica e Financeira, no Capítulo I
que versa sobre os princípios gerais da atividade econômica. Assim dispõe:

Art.180. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios promoverão e


incentivarão o turismo como fator de desenvolvimento social e econômico.

Numa primeira análise é de ver-se que o legislador constituinte tratou o turismo como
atividade econômica vital para o desenvolvimento da nação. E, num segundo momento, cabe
observar os princípios expostos, a saber: o princípio da promoção ao turismo, o princípio do
incentivo ao turismo e o princípio do desenvolvimento do turismo. É necessário compreender
cada eixo norteador, vez que todos eles refletem no tratamento jurídico infraconstitucional do
turismo e dos atores envolvidos neste contexto, Badaró (2006).
Nas palavras de Pinto Nieto (2001, p. 44), promover uma atividade significa dar o
impulso a ela, fazê-la avançar. O papel do Estado no turismo, portanto, é criar condições para
que ela cresça, detectando suas necessidades e fornecendo meios para que ela se realize. Quer
62

dizer, ao Estado cabe uma ação fiscalizadora e promotora de condições favoráveis ao


desenvolvimento do turismo.
Por seu turno, incentivar é fomentar, estimular. Este princípio complementa o anterior,
cabendo ao Estado criar meios para incentivar essa atividade, seja reduzindo a carga
tributária, seja concedendo linha de crédito, seja oferecendo treinamento de pessoal ou
criando polos turísticos. Em resumo: não cabe ao Estado a realização de atividade turística,
mas sim a promoção e o fomento nessa área.
Para Pinto Nieto (2001, p.45) é neste momento que começam a surgir os problemas,
uma vez que:
É nessa órbita que nosso país mais demonstra a condição de subdesenvolvimento.
Dada a escassez de recursos básicos para atender com a mínima dignidade o
brasileiro, é natural que o Estado acabe tendo prioridades maiores do que o
desenvolvimento do turismo. Antes disso, urge dar condições ao cidadão para que
ele tenha atendimento na área da saúde, que receba educação, moradia etc. Daí que
os recursos para o incentivo ao turismo notadamente tornem-se escassos.

O autor traz à tona o fato de que diante da escassez de recursos para a saúde, a
educação e a segurança, sem sombra de dúvida, o lazer fica comprometido, sendo que diante
das dificuldades de arrecadação e aplicação de recursos, o incentivo estatal ao turismo torna-
se reduzido.
Por fim, depreende-se que a promoção e o incentivo ao turismo são elementares para
alcançar o último princípio: o desenvolvimento do turismo. Badaró (2006, p.21) aduz:

Obrigam-se, portanto, os administradores públicos e legisladores a observar e


utilizar o turismo como alternativa constitucionalmente eleita para o
desenvolvimento nacional (art. 3º, II, CF/88), visto que o setor demanda fartos
investimentos em infra-estrutura e estímulos diversos, retribuindo com emprego e
altas receitas tributárias. O desenvolvimento social do turismo deve focar a
erradicação da pobreza e a marginalização, bem como a redução das desigualdades
sociais e regionais como instrumentos para se galgar a dignidade da pessoa humana
e a cidadania.

Nas palavras do autor, o que a Constituição Federal vigente fez, foi estabelecer um rol
de princípios capazes de orientar os agentes políticos no que se refere ao turismo, uma vez
que a atividade foi destacada como fator de desenvolvimento, em razão dos postos de
emprego e arrecadação de receitas que proporciona.
Feito isto, a priori, vale ressaltar que, no plano das ideias, o Direito Internacional
deriva do Direito Natural – jus gentium -, ou direito das gentes (NUNES, 2011, p.54). Para
Pimenta Bueno (1863) apud Accioly (2000, p. 01/02) assim se faz a compreensão:
... o direito internacional público ou das gentes, jus gentium publicum ou jus
publicum intergentes, é o complexo dos princípios, normas, máximas, atos, ou usos
reconhecidos como reguladores das relações de nação a nação, ou de Estado a
63

Estado, como tais, regulamentadores que devem ser atendidos tanto por justiça como
para segurança e bem-ser comum dos povos.

Em breves linhas, o Direito Internacional é um ramo da ciência jurídica que, por meio
de normas e princípios próprios regula as relações entre os Estados, embora a teoria e a
prática também considerem como atores, as organizações internacionais. Ademais, pode ser
dividido em Direito Internacional Público e Privado. O primeiro reúne o conjunto de normas
aplicáveis nas relações entre países, entre os entes estatais e públicos, enquanto o segundo lida
com situações entre entes privados ou ainda que públicos, que figurem na condição de
particulares. (MARA, 2011).

3.2. GEOGRAFIA DO TURISMO

Não foi somente o Direito que ampliou os seus horizontes de estudo. A Geografia
também o fez. Um dos trabalhos mais antigos, onde foi usada a expressão “Geografia do
Turismo”, data de 1905, escrito na cidade austríaca de Graz, por J. Stradner, citado por
A.L.Gómez (1988:46) apud Rodrigues (1999, p.40):

Stradner (1905) fue el introductor em la bibliografía germana especializada del


término Geografía del Turismo (Fremdenverkerhrs Geographie), el cual, desde
entonces, há servido para designar a la rama de nuestra disciplina que se há ocupado
de analizar de uma manera particular ciertos impactos producidos por lo que de uma
manera amplia pudiéramos llamar el fenómeno del ócio.

Os primeiros trabalhos acerca do referido tema apontavam para uma reflexão acerca
do ócio, conforme fez menção o autor supracitado. Mas a expressão “Geografia do Turismo”
foi usada pela primeira vez na década de sessenta, no estudo pioneiro de W. Christaller, na
obra “Some considerations of tourism location in Europe”.
No Brasil, a primeira manifestação do tema ocorreu a partir da tese “O turismo interno
no Brasil”, apresentada no concurso de livre-docência do departamento de Geografia da
Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRS), por Kleber M.B. Assis, em 1976,
conforme informação de Galvão Filho (2005). A partir daí, foi aberta a porta para a produção
de novos trabalhos que, apesar de ainda tímidos, encararam o terreno árido.
Em razão do capitalismo e do acelerado desenvolvimento do turismo, ligado à
prosperidade econômica que o estudo do turismo no âmbito da Geografia começou a tomar
forma consistente. (RODRIGUES, 1999, p.40) Ademais disso, o citado autor ainda acrescenta
a importância de uma abordagem multidisciplinar e da dificuldade em definir o fenômeno
turístico. No primeiro caso, destaca:
64

Em face da sua complexidade o turismo deve ser abordado em âmbito


multidisciplinar, particularmente pelo conjunto das ciências sociais, integrando,
além dos aspectos histórico-geográficos, os aspectos econômicos, psicológicos,
sociológicos, antropológicos e jurídicos.

Sobre o fenômeno turístico fala sobre a dificuldade em definir-se o que é urbano, em


contraposição ao que é rural e traz a lume a dicotomia da sociedade x natureza:

Assim pensando, creio não ter sentido defender os estudos do turismo em Geografia
sob o rótulo de Geografia do Turismo e, muitos menos, de Geografia Turística. Os
estudos de Milton Santos demonstram, cada vez mais, uma forma de pensar o
espaço que dispensa adjetivações.

Essa dualidade, para Rodrigues (1999, p. 76), traduz um interesse recíproco da


Geografia e do turismo, um pelo outro e a respeito deste diálogo interdisciplinar há relevantes
contribuições teóricas.
Primeiramente, Gonçalves (2008) apud Grizio (2011, p. 99) discorre acerca do
interesse da ciência geográfica pelo estudo do turismo.
A Geografia se interessa pelo estudo do turismo porque o espaço configura-se como
o principal campo de apropriação da atividade turística. O turismo se beneficia da
ciência geográfica pela capacidade de análise espacial que a Geografia imprime em
seus estudos. O espaço, sendo uma das categorias de análise mais importante do
universo geográfico, concede ao turismo um entendimento profundo das relações
que envolvem o par sociedade/ambiente.

Por sua vez, Castro (2006) apud Grizio (2011, p. 99) relaciona o turismo às categorias
geográficas de análise.
... diante da espacialidade da prática turística, observa-se a necessidade da inclusão
de uma abordagem geográfica do turismo na formação do geógrafo. A autora
destaca que a atividade turística se desenvolve sob o esteio do território, da
paisagem e do lugar, categorias que “imprimem identidade ao conhecimento
geográfico, permitindo a interpretação de fenômenos com dimensão espacial.

Grande contribuição também é exposta por Beni (2001) apud Grizio (2011, p.99)
acerca da pluralidade conceitual do turismo diante das variadas análises pertinentes feitas
pelas diversas ciências.
Em suma, o fato de o turismo encontrar-se ligado, praticamente, a quase todos os
setores da atividade social humana é a principal causa da grande variedade de
conceitos, todos eles válidos enquanto se circunscrevem aos campos em que é
estudado. Não se pode dizer que esse ou aquele conceito é errôneo ou inadequado
quando se pretende conceituar o turismo sob uma ótica diferente, já que isso levaria
a discussões estéreis. Estas poriam justamente em evidencia as limitações
conceituais existentes sobre o fenômeno

Os autores mencionados discorrem acerca da necessidade de não apontar rótulos para


a ciência geográfica quando o objeto de estudo eleito é o turismo enquanto atividade
econômica. Ora, há que se comungar do mesmo posicionamento, uma vez que não se pretende
ramificar a Geografia, mas sim propor um pensamento geográfico capaz de analisar o uso do
65

território e a percepção da paisagem decorrentes da atividade econômica promovida pelo


turismo.
É claro que há na literatura quem seja avesso ao estudo de uma geografia do turismo
ou ao caminho para o qual se desenvolvem as pesquisas. Contudo, esse não é o
posicionamento adotado, tampouco é o objetivo do presente trabalho um confronto de ideias e
opiniões nesse âmbito.
Fato é que o turismo, enquanto atividade econômica, ganha espaço nas pesquisas
mundiais, especialmente, em razão do seu caráter interdisciplinar e multiplicador, vez que age
diretamente na economia, na política e no ambiente global, reproduzindo e desenvolvendo o
espaço geográfico. O turismo, sob este aspecto, reflete na produção de bens e serviços, no
movimento de pessoas e na circulação de receitas tanto em nível local quanto regional
(GRIZIO, 2011).
Em consonância com este entendimento, Coriolano (2005, p. 21) destaca a
necessidade de se estudar a Geografia para melhor compreender o turismo, vez que este se
concretiza no espaço geográfico. Neste sentido, assevera:
Lugar e mundo, enquanto objeto da análise geográfica, apresentam-se como
singularidade ou fragmento e globalidade que formam a totalidade. São eles que
integram os roteiros turísticos. É tarefa da Geografia, especialmente da Geografia do
Turismo ler o mundo, explicar e interpretá-lo, para entender a mobilidade dos fluxos
turísticos. O mundo é formado pelo conjunto de lugares produzidos em cotidianos
políticos, sociais, culturais e naturais que constitui territórios, formados de múltiplos
espaços e tempos, em permanentes transformações, e está condito em cada lugar.

O citado autor atrela o conceito de lugar ao estudo do turismo. Com a globalização,


emergiu o sentimento de acessibilidade e o direito de ir e vir das pessoas, com ênfase na
possibilidade de conhecer lugares até então isolados, especialmente, em razão da excessiva
burocratização. Veio à tona uma maior valorização dos lugares, das escalas locais. Como
dizia Milton Santos (CORIOLANO, 2005), “cada lugar é, à sua maneira, o mundo”.
Neste sentido, o Mercosul, enquanto bloco econômico e reflexo da atividade
capitalista adotou políticas de atuação local, de modo a aproveitas as potencialidades locais e
regionais, além de criar possibilidades de alargamento das relações internacionais em suas
relações estritamente consideradas, bem como em suas relações globais.
De fato, um legado da globalização foi permitir as pessoas a conhecerem uma outra
modalidade de turismo, com deslocamentos fomentados mundialmente e desburocratizados
por ações públicas fundamentais, onde as zonas de fronteira passaram a ter outra visibilidade,
além somente da questão da segurança pública.
66

O turismo nas zonas de fronteiras permite o contato dos turistas com os moradores
fronteiriços, possibilita a troca de experiências dos que vão e vem e daqueles que assistem o
fluxo de pessoas. De certo, todos são ávidos consumidores de conhecimento e o
enriquecimento é mútuo.
Assim sendo, a atividade turística guarda estreito interesse à ciência geográfica. Numa
análise interessante, Coriolano (2005, p. 18) exalta a narrativa Divina Comédia, de Dante
Alighieri, a partir daqueles que acompanhavam os visitantes, numa comparação ao atual guia
de turismo. Por fim, a referida autora destaca que é preciso compreender os lugares e interagir
com as culturas visitadas para que a fala e o discurso obtenham valor e significado entre os
ouvintes.
E, justamente, por ser a Geografia uma ciência que estuda a Terra enquanto morada do
homem (CONTI (2002) apud CORIOLANO (2005, p. 21)) é que cabe a essa ciência refletir
acerca de toda interferência espacial, bem como qualquer interação estabelecida entre homem
- natureza. Ademais, a denominada “Geografia do Turismo” nada mais representa que o
pensamento geográfico está atenta aos desdobramentos que a atividade turística gera na
sociedade e no estudo das categorias geográficas.

3.3. DIREITO DO TURISMO:

O fortalecimento das regiões de fronteira e dos espaços vizinhos configurou um


contexto particular: o direito de ir e vir que permeia o ideal do turismo e dos desejos humanos
de sempre descobrir e redescobrir. O fato de permitir que as pessoas se desloquem de modo
livre e estabeleçam relações que podem se delinear em turismo de pesca, de compra, de
aventura, de cunho exploratório, dentre outros, dinamiza a fronteira a partir das
potencialidades locais.
Justamente a partir daí, faz-se necessário regulamentar o turismo como atividade de
interesse público que demanda proteção ao meio ambiente, ao patrimônio histórico e a
cultura, vez que a interferência no espaço, nos homens e na cultura é fator incontroverso.
Nasce aqui, o Direito do Turismo, abrangendo diversos ramos jurídicos.
Neste sentido, Py (2000) apud Costa (2013, p.06) define o que é o Direito do Turismo,
considerando o Direito das Gentes:

(...) conjunto de instituições e regras jurídicas para os quais o móvel turístico é


determinante, seja porque trata de desenvolver a atividade turística, seja porque estas
regras têm por objetivo a proteção específica do consumidor turístico ou a profissão
turística, seja porque elas tenham por finalidade conciliar turismo e ordem pública.
67

Assim como foi exposto por ocasião da Geografia do Turismo, o Direito do Turismo
também não se trata de uma nova ciência jurídica, mas de um novo olhar dessa ciência a
respeito do turismo enquanto atividade econômica capaz de refletir nas relações sociais e na
normatização do setor.
Já para Badaró (2006, p. 17), duas características marcantes descrevem essa vertente
do Direito, a saber: a maleabilidade e a transcendentalidade. A primeira reflete um ramo
jurídico com conceitos, regras e teorias menos rígidas, menos categóricas, menos fixas, em
razão da própria dinâmica do turismo. A segunda surge em decorrência da maleabilidade e
reflete uma abordagem transversal e integrada de todos os outros ramos do direito, superando
as barreiras do público e do privado.
Surge aqui o Direito do Turismo, ramo jurídico autônomo, maleável e heterogêneo,
que teve como berço a Europa, na segunda metade do século XX, mais especificamente, na
França. Para o supracitado autor trata-se de um ramo jurídico que busca estabelecer as
medidas jurídicas cabíveis e solucionar conflitos oriundos desse campo de atividade.

A França, berço do direito do turismo, juntamente com outros países da União


Européia, está contribuindo muito para a evolução científica desse novo ramo do
direito. Nesse sentido, a Constituição francesa de 27 de outubro de 1946 já trazia,
em seu “Preâmbulo”, a afirmação de que a nação garantia a todos, entre outros
direitos, o repouso e o lazer, destacando a importância do turismo como necessidade
social fundamental. (Badaró, 2006)

Nesse sentido, para estabelecer um rápido panorama da disciplina Direito do Turismo


a nível mundial, pode-se destacar que o movimento teve início na França, mas que somente
em 1999 incluiu este novo ramo jurídico, a fim de estudar as relações oriundas da atividade
turística e seus desdobramentos.
Na União Europeia, a disciplina alcançou sua consolidação a partir do programa
plurianual em prol do turismo europeu. O referido plano aliado a liberdade de circulação
incentivou não somente a atividade turística propriamente dita, mas também estimulou que os
países membros contribuíssem para a formação do novo ramo jurídico.
Dois conceitos constitucionais se fazem essenciais para discorrer acerca do direito do
turismo, são eles: o exercício da liberdade e o direito de ir e vir. A liberdade é tema profundo
e é tratada sob diferentes escolas filosóficas. Não é objetivo deste estudo aprofundar sobre o
tema, mas se faz prudente discorrer, ainda que brevemente, sobre alguns aspectos.
Sobre a ideia de liberdade ao longo dos séculos, Paulo e Alexandrino (2009, p. 109)
destacam:
68

A ideia de liberdade de atuação do indivíduo perante o Estado traduz o cerne da


ideologia liberal, de que resultaram as revoluções do final do século XVIII e início
do XIX. A doutrina essencial do laisse faire exigia a redução da esfera de atuação do
Estado e de sua ingerência nos negócios privados a um mínimo absolutamente
necessário.

(...) do lema da Revolução Francesa – liberdade, igualdade e fraternidade -, foi sem


dúvida a liberdade o axioma mais encarecido originalmente pelo Liberalismo. Como
ideologia da classe burguesa triunfante sobre o Absolutismo, interessava mais aos
capitalistas de então a defesa da liberdade negocial do que uma atuação tendente à
obtenção de uma igualdade material, efetiva, no seio da sociedade.

O conceito de liberdade humana, segundo Rivero (1973) apud Silva (2002, p. 232) é
“um poder de autodeterminação, em virtude do qual o homem escolhe por si mesmo seu
comportamento pessoal.” Um pouco mais além, Silva (2002, p. 232) acrescenta que
“liberdade consiste na possibilidade de coordenação consciente dos meios necessários à
realização da felicidade pessoal”.
Há que adotar os dois conceitos apontados acima, vez que eles vão ao encontro da
atividade turística que é feita conscientemente, sob os auspícios da liberdade individual.
Liberdade esta que foi conquistada aos poucos pelo homem. Como bem destacou Silva (2002,
p. 231) é válido afirmar “que a liberdade consiste na ausência de toda coação anormal,
ilegítima e imoral” e, portanto, todas as leis que limitem este exercício devem estar
fundamentalmente descritas, sem abuso de autoridade.
Outro dado interessante decorre da maneira como os franceses fatiam o conteúdo da
liberdade, a partir de três prerrogativas: a liberdade de ir e vir, a segurança individual e a
liberdade de intimidade. Contudo, para nós, brasileiros, as formas de expressão da liberdade
da pessoa física se revelam sob duas modalidades, a saber: a de locomoção e a de circulação,
sendo essa manifestação da primeira (Silva, 2002, p. 236). E ainda acrescenta:

Direito à circulação é manifestação característica da liberdade de locomoção: direito


de ir, vir, ficar, parar, estacionar. O direito de circular (ou liberdade de circulação)
consiste na faculdade de deslocar-se de um ponto a outro através de uma via pública
ou afetada ao uso público. (p. 238)

É exatamente esta modalidade de liberdade que interessa ao presente estudo e,


consequentemente, à atividade do turismo. Por mais que o Estado, detentor da soberania,
possa restringir os direitos fundamentais do indivíduo e intervir no domínio turístico, ele não
poderá impedir o direito de ir e vir. Há que se resguardar o interesse público, a salubridade, a
paz social, a segurança, a partir de instrumentos reguladores e harmônicos. Neste contexto,
Badaró (2005, p. 107) esclarece:

O turismo é uma atividade consumidora de espaços raros e frágeis, como uma


montanha mais alta, o litoral e locais pitorescos. Convém, portanto, que a
69

administração pública zele por esses espaços, impondo limites ao turismo, enquanto
atividade consumidora, e que, ao mesmo tempo, estabeleça garantias para ele.

O referido autor sugere que cabe ao Estado a normatização do turismo, observando os


princípios regentes da atividade turística e os direitos individuais e coletivos que são
abarcados pela liberdade, igualdade e o direito de ir e vir das pessoas. É necessário sopesar os
direitos e os limites indispensáveis ao exercício do turismo.
Feitas estas considerações, cumpre indagar qual a posição do Brasil e da América do
Sul diante da originalidade do Direito do Turismo, vez que o mesmo se faz pelo conjunto de
regras jurídicas provenientes dos mais distintos ramos da ciência jurídica.
Considerando que as regras jurídicas visam estabelecer padrões de conduta do ser
humano e que o Direito do Turismo vem a ser um conjunto de regras e princípios que
norteiam a atividade turística nacional e internacional e, sendo o Brasil um país emissor e
receptor de turísticas, não poderia ficar alheio ao dinamismo dessa atividade.
Mas o que se vê é que enquanto a União Europeia, no século XX e XXI uniu forças a
favor do turismo europeu, a América do Sul ainda trata a atividade turística de modo
desorganizado. Senão, veja-se (BADARÓ, 2005, p. 169):
...a União Europeia tem concentrado seus esforços no sentido de harmonizar a
atividade do turismo com suas demais atividades, buscando, assim, estabelecer um
elo entre a política, a economia e a cultura dos países membros, de maneira a atingir
o desenvolvimento sustentável do setor.

Ora, é verdade que as políticas públicas e as normas destinadas à atividade turística na


União Europeia são distintas da normatização da América do Sul, afinal, há enorme
desigualdade econômica, social e política entre os países. Contudo, apesar das divergências,
faz-se prudente fazer uma leitura dos contextos políticos, dos processos globalizantes e
institucionais que afetam o processo de integração e fomento da atividade turística.
Segundo o mesmo autor, no que se refere ao Direito do Turismo sob a ótica do
Mercosul: “a maioria das normas estipuladas pelos Estados membros são apenas atos
administrativos disponibilizados em grande quantidade, mas com eficácia reduzida no campo
prático e dinâmico do turismo”.
Ou seja, os países membros do Mercosul ainda vivem de decretos, portarias,
deliberações normativas e resoluções que versam sobre o turismo, não havendo uma
harmonização dos ordenamentos jurídicos, a fim de fomentar a atividade turística e
incrementar os setores econômicos, políticos e sociais de forma ampla.
Todavia, não se quer aqui ressaltar que o plano da União Europeia não apresentou
falhas, o que se pretende é destacar a importância de uma sistematização da legislação
70

turística, visando facilitar a circulação de turistas e uma maior integração do setor público e
da iniciativa privada, com a elaboração de ações conjuntas e políticas públicas voltadas para o
turismo.
Nesta linha de raciocínio, os procedimentos administrativos para o cruzamento de
fronteira, como é o caso da Rota Pantanal Pacífico, devem prever acordos internacionais que
adaptem as formalidades legais, sanitárias e alfandegárias, facilitando a liberdade de viajar e o
acesso do maior número de pessoas ao turismo internacional. Badaró (2005, p. 143)
acrescenta:
Os acordos entre grupos de países visando harmonizar e simplificar tais
procedimentos devem ser encorajados. Os impostos e os encargos específicos que
penalizem a indústria turística e atentem contra sua competitividade devem ser
progressivamente eliminados ou reduzidos.

Há que se concordar com o autor, no sentido de que o turismo é transfronteiriço e não


deve abrir mão do controle formal, mas os Estados devem antever as dificuldades encontradas
pelos turistas e buscar meios de solucionar e não refugar os turistas. O que se vê, na prática, é
que os Estados fronteiriços buscam desenvolver ações conjuntas de segurança, de proteção
territorial, de estabelecimento de medidas contra o tráfico, mas não se vê a mesma disposição
em estabelecer políticas públicas voltadas para o desenvolvimento, incentivo e fomento do
turismo. No caso do Brasil, princípios, inclusive, descritos na própria Constituição Federal de
1988.
Ora, em 2011, a presidente da República Federativa do Brasil, Dilma Rousseff lançou
oficialmente o Plano Estratégico de Fronteiras que tem por objetivo o fortalecimento da
prevenção, controle, fiscalização e repressão dos delitos transfronteiriços e dos delitos
praticados na faixa de fronteira brasileira, conforme disposto no artigo 1º, do Decreto Lei nº
7.496/2011.
A iniciativa, instituída por decreto presidencial, prevê uma série de operações
integradas entre órgãos de segurança pública federal e as Forças Armadas, bem como a
necessidade de integração dos países fronteiriços, vez que não se faz prevenção e atuação
eficiente sem o comprometimento e cooperação de todos os países envolvidos.
A ideia de colocar homens em fileira para proteger os mais de 17 mil quilômetros de
fronteira não é viável, tampouco faz sentido. O Plano Estratégico partiu do ideal de promover
mais coesão e integração do Brasil com os países sul-americanos, conforme bem salientou o
Ex-Ministro da Justiça Nelson Jobim, à época do lançamento do programa (MINISTÉRIO
DA DEFESA, 2013).
71

Seguindo este raciocínio é que se propõe uma análise da fronteira não somente sob o
enfoque da segurança pública, mas sob a ótica do turismo fronteiriço que também envolve
cooperação, integração e planejamento.
Em consonância com a Lei Geral de Turismo (Lei Federal nº 11.771/2008) e suas
teorias, os territórios fronteiriços podem ser analisados sob os mais variados aspectos e essa
riqueza deve ser vista como uma ferramenta capaz de quebrar paradigmas que envolvem a
fronteira. As atividades relacionadas ao turismo, talvez sejam capazes de sugerir um
desenvolvimento, a partir do planejamento integrado e ordenamento jurídico harmônico.
Neste contexto, Paixão (2006, p. 71) estabelece, ainda, nuances de turismo,
apresentando a diferença entre turismo pela fronteira, turismo na fronteira e turismo de
fronteira. Esse último, na linha do pensamento proposto, Yázigi (2009) parafraseia:
(...) é aquele onde, apesar de possíveis semelhanças com as duas tipologias
anteriores (paisagens, valores culturais etc), ocorrem nuances: esses elementos
podem ser apreendidos sob a territorialidade de países ou de seus fracionamentos
administrativos , mascarando realidades. Para Roberto Paixão, mesmo cidades
afastadas por pequenas distâncias podem entrar no mesmo circuito turístico
valorizado por suas comunidades. Daí que tende a ser uno em sua reprodução,
especialmente quando há conurbações – mas, na sua existência depende de
entendimentos bilaterais, organização e divisão de calendários de eventos etc.

Certamente que a implementação de um projeto de turismo de fronteira bem


consolidado deve perpassar por todas essas vertentes citadas, mas deve extrapolar, ir além
dos acordos regionais e internacionais, devendo criar mecanismos de gestão e integração
coordenados e planejados, nunca se esquecendo de que as populações e comunidades locais
devem estar associadas às atividades turísticas e as políticas turísticas também devem abordá-
los como atores do processo.
Sobre planejamento, Garcia Netto (2009, p. 07) destaca que há inúmeros conceitos,
considerando o fato de ser algo essencial em todas as áreas, em todos os segmentos e
atividades. E acrescenta:
O planejamento faz parte de tudo que se pretende realizar, organizar, promover,
criar, enfim, está implícito em todas as atividades humanas. No turismo, o
planejamento é imprescindível para o êxito da atividade e para o sucesso do
empreendimento.

Mais especificamente, acerca do planejamento turístico, Bissoli (1999) apud Garcia


Netto (2009, p. 07):
O planejamento turístico é um processo que analisa a atividade turística de um
determinado espaço geográfico, diagnosticando seu desenvolvimento e fixando um
modelo de atuação mediante o estabelecimento de metas, objetivos, estratégias e
diretrizes com os quais se pretende impulsionar, coordenar e integrar o turismo ao
conjunto macroeconômico em que está inserido. Deve se entender como uma ação
social, no sentido de que vai ser dirigido à comunidade, e racional, na medida em
72

que é um processo que tende a estabelecer uma série de decisões com um alto grau
de racionalização.

Por sua vez, o planejamento não deve ser considerado e coordenado apenas para
adotar políticas de segurança pública na fronteira, mas também para tratar do turismo que vive
silencioso e tímido nessas regiões.
Com relação ao turismo transfronteiriço e a importância da cooperação entre Estados é
que, no final do século XX surge um novo ramo do Direito Internacional, o Direito
Internacional ao Desenvolvimento que, segundo especialistas, é fruto das próprias
contradições vividas no mundo contemporâneo (MEDEIROS, 2013). Ainda para a
mencionada autora, “a cooperação passou a ser vista como um direito essencial que buscava
realizar o desenvolvimento econômico, social, finalista, teleológico e político, de todos os
povos.”
Finalmente, conclui-se que todas estas novas leituras proporcionadas pela ciência
geográfica e pelo Direito permitem uma releitura das relações internacionais entre os países,
permitindo uma nova significação do fluxo de pessoas, de bens e serviços, razão pela qual o
turismo de fronteira pode buscar no direito fundamento para o seu desenvolvimento, mas o
Estado sempre deve fazer parte destes projetos, não apenas promovendo a segurança pública,
mas fomentando a integração e a cooperação a partir da cultura e das potencialidades
turísticas existentes.
73

4. UM ENSAIO DA FRONTEIRA CÁCERES – SAN MATIAS

4.1 O DIREITO COMPARADO NA FRONTEIRA

A discussão sobre fronteira ganha espaço na mídia e nas ciências. São diferentes
abordagens como também diferentes pesquisadores que se debruçam no estudo das fronteiras
sob ângulos distintos. A temática tem tamanha importância e influência não só para as
pessoas, individualmente consideradas, mas também para os Estados soberanos.
Para adentrar numa análise a respeito das reais possibilidades e fragilidades da
integração do turismo de fronteira, envolvendo Brasil e Bolívia, tendo como pano de fundo a
Rota Pantanal Pacífico, faz-se necessária uma análise preliminar acerca de três pontos
fundamentais: o Direito Comparado, bem como as Faixas e Zonas de Fronteira.
O Direito Comparado é o ramo da ciência jurídica que estuda as diferenças e as
semelhanças entre os ordenamentos jurídicos de diferentes Estados. A rigor, não é uma
ciência, mas um método descritivo que auxilia no estudo de diversos ramos do Direito (Paulo
e Alexandrino (2009, p. 03).
Nas palavras de Godoy (2008), a essência do direito comparado é a comparação e a
asserção não é tautológica, ou seja, redundante e acrescenta:
Percepções de qualidade não podem sugerir que se indiquem direitos melhores ou
piores. Os direitos são apenas diferentes. O estudioso do direito comparado deve
estar preparado para a armadilha que a disciplina lhe põe a todo o momento. O
exercício da comparação não se fundamenta, necessariamente, em orientação que
exija montagem de planisfério qualitativo. Em princípio, direitos não são melhores
nem piores, mais ou menos avançados, mais ou menos iluminados. Os direitos são
diversos. (...)

Multiplique-se o problema para os vários modelos jurídicos que há. Nosso sistema
normativo não é universal, nossas instituições não existem em todos os direitos.
Muito mais do que metáforas, rodeios de linguagem ou explicações alongadas, o
direito comparado subsume problema de domínio de língua que afasta da disciplina
monoglotas e juristas que não se dispõem a entender além das fronteiras do direito
que pretensamente dominam.

As ideias trazidas pelo referido autor trazem à tona a necessidade de se compreender o


que é o Direito Comparado. Vale dizer que com o aumento do comércio, do fluxo de pessoas,
dos direitos dos cidadãos e com a intensificação das relações entre os povos, os países que
buscam a integração em blocos também tentam harmonizar suas legislações, a fim de facilitar
o processo de integração. E é justamente na busca por uma interpretação homogênea que o
Direito Comparado ganha maior relevância.
74

É fato que sempre existiu, de alguma forma a comparação, a gente sempre olha o que
o outro está fazendo para aplicar e interpretar os nossos direitos. Portanto, o Direito
Comparado não visa à busca pelo ‘melhor direito’, pois isso levaria em conta culturas e
hábitos, mas visa ser uma ferramenta de aproximação entre os países, auxiliando no sentido
de compreender melhor como outros países lidam com um mesmo assunto ou como podem
vir a fazê-lo.
Vale dizer que há certa tradição brasileira de utilização do método de Direito
Comparado, assim como outros países da América do Sul, a fim de repetir argumentações
desenvolvidas por legislações estrangeiras ou até mesmo a citação de autores de outros países,
auxiliando na interpretação do Direito doméstico e nas relações com outros países.
Além da função de servir como ferramenta de aproximação, quando se compara
experiências jurídicas ou busca-se a harmonização, os países envolvidos passam a ter certa
clareza de modelos jurídicos que podem dar certo.
Não há, contudo, um consenso acerca da natureza do direito comparado: se é ciência
ou se é método. Silva apud Vergani (2007, p.30), constitucionalista, defende o
posicionamento de que o Direito Comparado é um método de estudos jurídicos de vários
ordenamentos estrangeiros em confronto metódico. Para o referido autor, não é uma ciência
jurídica em sentido técnico, porque não é um ramo da ciência jurídica, como o Direito
Constitucional ou o Direito Administrativo. Não faz parte do direito positivo, vez que não
elabora regras de conduta humana e, se há alguma regra, ela tem apenas a natureza de modo
de conduzir-se no método comparativo.
De outro lado, há quem defenda que a comparação jurídica é uma ciência autônoma.
Nas palavras de Ivo Dantas (2000, p. 56), trata-se de estudo científico:
Mesmo que um grande número de estudiosos entenda que o Direito comparado é,
simplesmente, método – o método comparativo aplicado às Ciências jurídicas –
assim não pensamos, inclusive porque, conforme raciocínio de QUIRINO RIBEIRO
aplicado à Educação Comparada, “o fato de a disciplina se utilizar,
obrigatoriamente, do método comparativo, não a reduz a este, até porque a
comparação é o ato final de um estudo comparativo. Antes de alcançá-lo deve, o
comparatista, coletar e interpretar fatos e, para tanto, utilizar-se-á de outros métodos,
advindos de outros campos científicos.

Longe de se chegar a um consenso e considerando que qualquer que seja a posição


adotada terá reflexo academicamente, o que é de extrema importância é que quando da análise
da pluralidade de ordens jurídicas, sempre haverá um direito local a ser considerado, além
daquele posto, normatizado e codificado.
75

Em sua clara lição, Ivo Dantas (2000, p.29) alerta:


(...) todo o Direito estrangeiro que se toma por matéria de estudo – deve constituir o
objeto de uma apreensão global; em segundo lugar, tratando-se desta feita de
sistemas diferenciados, deve constituir uma análise particular (...) Esta compreensão
global do sistema, em seus dados históricos e nas suas condições sócio-econômicas
de aplicação, torna-se, destarte, a condição primeira para uma utilização
verdadeiramente científica do método comparado.

Nesse sentido, a importância da utilização do Direito Comparado na fronteira é única,


uma vez que se torna imprescindível observar as legislações dos países envolvidos, bem como
as condições sócio-econômicas que os envolve, a fim de promover uma aplicação harmoniosa
e consentânea com a realidade de ambos, a partir das análises particulares.
Feitas estas considerações acerca do Direito Comparado e a importância da leitura não
somente de sistemas jurídicos distintos, em vigor, em diferentes países, mas também a
necessidade do conhecimento do meio social e das práticas institucionais de cada fronteira. A
partir deste ponto, faz-se necessário (re)pensar alguns termos ligados a territorialidade, tais
como: limite, fronteira e seus desdobramentos – faixa e zona de fronteira. Certo é, e
esclarecido já foi, que limite não é sinônimo de fronteira, mas um depende do outro para
aclarar o entendimento.

4.2. A ZONA DE FRONTEIRA CÁCERES – SAN MATÍAS

Os limites sempre existiram na formação da humanidade. Para Machado (2005), a


palavra limite tem origem latina e foi criada para designar o fim daquilo que mantém coesa
uma unidade política territorial, ou seja, sua ligação interna.
A fronteira já foi marco de conflitos, embates, trocas e hoje afetam todo o País, pois é
através dela que ocorre o tráfico de drogas, de armas e de pessoas. O efeito disso não é só
regional, foge à escala local-global.
Do ponto de vista acadêmico, a faixa de fronteira é sempre algo próximo ao limite.
Ainda nas palavras de Machado (2005), a faixa de fronteira constitui uma expressão de júri –
de legalidade, de Direito - associada aos limites territoriais do poder do Estado.
Na legislação brasileira, faixa de fronteira está descrita na norma insculpida no artigo
1º da Lei nº 6.634, de 6 de maio de 1979, onde dispõe que: “É considerada área
indispensável à Segurança Nacional a faixa interna de 150 km (cento e cinquenta
quilômetros) de largura, paralela á linha divisória terrestre do território nacional, que será
designada como faixa de fronteira.”
76

De acordo com o Grupo Retis de Pesquisa – Programa de Fronteira, do Departamento


de Geografia da Universidade Federal do Rio de Janeiro, que atua desde 1994, grande parte
das propostas legislativas que envolvem à fronteira e a faixa de fronteira apontam para temas
ligados à segurança e ao controle ininterrupto das fronteiras, mas já é notável um aumento em
temas ligados à integração e cidadania.

A Zona de Fronteira, por sua vez, aponta para um conceito de interação, uma
paisagem específica, com espaço social transitivo e composto pelas diferenças oriundas do
próprio limite internacional. Trata-se de área que envolve as faixas de terras limítrofes dos
dois países, como é o caso das cidades-gêmeas. Neste sentido, Garcia Netto (2009, p. 27) diz:

No eixo da Rota existem alguns casos de cidades gêmeas, como as cidades de


Desaguadero que está dividida pela fronteira entre a Bolívia e o Peru, e, tanto no
lado boliviano quanto peruano, tem o mesmo nome e mantém as mesmas
características. La Quiaca, na província de Salta, e Villazón, no Departamento de
Potosí, também são cidades gêmeas, divididas pela fronteira entre os dois países.

Nesse sentido, a concepção de zona ou faixa de fronteira, de acordo com o que dispõe
o artigo 20, § 2º, da Constituição Federal, é a faixa de até cento e cinquenta quilômetros de
largura, ao longo das fronteiras terrestres, considerada fundamental para a defesa do território
nacional. A ocupação e utilização desta área são regulamentadas por lei. Portanto, a zona de
fronteira é a porção do território nacional que, em razão da proximidade com a fronteira,
merece atenção especial.
O Brasil apresenta aproximadamente 15.719km (quinze mil setecentos e dezenove
quilômetros) de extensão fronteiriça, sendo que ao longo da faixa de fronteira estão cerca de
588 municípios brasileiros, onde vivem cerca de 10 milhões de habitantes (PUCCI, 2010, p.
31). De acordo com o IBGE (2013), há 25 (vinte e cinco) municípios fronteiriços no Estado
de Mato Grosso. Já maior fronteira que o Brasil faz é com a Bolívia, sendo 3.423km (três mil
quatrocentos e vinte e três quilômetros) de extensão.
Na América do Sul, cinco países reconhecem a Faixa ou a Zona de Fronteira como
uma unidade espacial distinta e sujeita à legislação específica, conforme apresenta o Quadro
07 abaixo:
77

QUADRO 07: O tratamento dado à Faixa de Fronteira na América do Sul

FONTE: PUCCI, Adriano S., 2010. / Org. PARIS, Marcela C. N., 2013.

A propósito, para compreender um pouco mais a respeito da área de estudo em análise


que é a zona de fronteira Cáceres – San Matías, inseridos na Rota Pantanal Pacífico, faz-se
necessária uma análise ampla a respeito dos seus respectivos países Brasil e Bolívia. Em que
pese a abordagem de estudo envolva a mencionada zona de fronteira, a compreensão do
cenário internacional não pode ser ignorada tampouco compromete o cenário eleito para o
estudo.
O nome oficial é República Federativa do Brasil e tem Brasília como sede da Capital
Federal. É o maior País da América do Sul e tem 8.515.767.049km2 de extensão territorial,
sendo vasta área de litoral banhada pelo Oceano Atlântico. O Brasil faz fronteiras com
Venezuela, Guiana, Suriname, Guiana Francesa, Colômbia, Peru, Bolívia, Paraguai,
Argentina e Uruguai. A moeda e o idioma oficiais são, respectivamente, o real e o português.
De acordo com o Censo de 2010 (IBGE), a população do País está estimada em 198.360.943
habitantes e o produto interno bruto (PIB) foi de US$ 2.476.651, no ano de 2011.
Por sua vez, o nome oficial da Bolívia é Estado Plurinacional da Bolívia e tem Sucre
como a capital oficial, sendo La Paz, a sede do Governo. O país está localizado na América
do Sul e tem 1.098.580km2 de extensão territorial. A moeda e o idioma oficiais são,
respectivamente, o boliviano e o espanhol. De acordo com o Censo de 2012 (IBGE), a
população do país está estimada em 10.248.042 milhões de habitantes e o produto interno
bruto (PIB) foi de US$ 23.949, no ano de 2011.
A respeito da história, dos colonizadores, das etnias e da política da República da
Bolívia, uma breve descrição (IBGE, 2010):
78

País localizado na parte central da América do Sul, sem saída para o mar. Tem
fronteiras com o Brasil, Paraguai, Argentina, Chile e Peru. O topônimo Bolívia foi
cunhado a partir do nome de Simón Bolívar, militar venezuelano, responsável pela
independência da sua Venezuela e também da Colômbia, Equador, Peru e Bolívia.

No período pré-colombiano, a mais remota civilização a ocupar o território atual da


Bolívia foi a dos Tiahuanaco. Posteriormente, vieram os Collas, sendo depois
subjugados pelos Incas.

Com a chegada dos espanhóis, a civilização incaica foi dominada. Em 1548,


fundaram a cidade de La Paz e, em 1561, a de La Plata, que posteriormente também
foi chamada de Charcas, Chuquisaca e Sucre, nome que permaneceu. Por isto, Sucre
é conhecida como "a cidade dos quatro nomes".

No Século XVI, foi descoberta uma verdadeira montanha de prata em Potosi. Até o
início do Século XIX, essa foi a mina mais famosa e mais rica do mundo.

No início de 1809, começaram os primeiros movimentos no rumo da independência


do Vice-Reino do Prata, do qual as terras da atual Bolívia faziam parte. A
insurreição de La Paz foi sufocada com o fuzilamento de seu líder, Pedro Domingo
Murillo. Outros conflitos separatistas irromperam, sendo contidos pela
administração colonial espanhola.

Em 6 de agosto de 1825, Simón Bolívar e o também venezuelano Antonio José de


Sucre y de Alcalá proclamaram a independência da nova República Bolívar,
posteriormente chamada somente de Bolívia. Sucre foi seu primeiro presidente,
governando o país até 1828.

A partir dali, diversos caudilhos ocuparam o governo boliviano. O país passou por
diversas convulsões, incluindo guerras contra o Chile (1879-1883) e o Paraguai
(1932-1935). No Século XX, golpes militares destituíram presidentes para
instalarem outros no poder, que, por sua vez, eram também destituídos pelo golpe
seguinte. Esse cenário durou até 1980, quando a normalidade democrática chegou à
Bolívia e lá permanece até hoje. Atualmente, o país é governado por Evo Morales,
ex-líder cocalero, descendente de índios bolivianos.

Sob a ótica do turismo, no ano de 2010, o Brasil recebeu 5.161.000 turistas contra
807.000 turistas recebidos na Bolívia no mesmo ano, segundo dados do The World Bank
(IBGE, 2010). Em que pese a riqueza cultural e natural da República Boliviana, é o país que
pior recebe turistas no mundo inteiro, descrito no Relatório de Competitividade em Viagem e
Turismo, de acordo com o Fórum Econômico Mundial (2013).
Considerando a escassez de estudos sobre regiões de fronteira internacional, em
decorrência da situação duplamente marginal que as tem caracterizado, vez que grande parte
destas regiões está isolada dos centros nacionais de seus respectivos estados, quer pela
ausência de redes de transporte e comunicação, quer pelo menor peso político e econômico
que possuem, a respeito das fronteiras da Rota Pantanal Pacífico, Garcia Netto destaca ( 2009,
p. 27):
Uma das características da maioria das fronteiras da Rota, exceto pela fronteira
chilena e peruana localidade no eixo da Rodovia Panamericana, entre as cidades de
Tacna, no Peru, e Arica, no Chile; as demais estão longe dos grandes centros e não
contam com assistência efetiva dos órgãos que as regem. Uma das mais isoladas
socialmente é a fronteira Chile – Bolívia na região de Tambo Queimado; no Brasil
entre Cáceres e San Ignácio de Velasco. Referente à assistência pública no que diz
79

respeito a segurança, saneamento, comunicação, saúde e em alguns casos educação,


devido às longas distâncias dos centros administrativos.

Um grande problema enfrentado pelas cidades situadas em zona de fronteira é a


precariedade na infraestrutura, bem como o descaso político, especialmente por estar distante
dos centros administrativos e, consequentemente, das tomadas de decisões pelos gestores
públicos.
Contudo, em seu trabalho de dissertação, Alves (2006, p. 147) destacou a importância
da cidade fronteiriça de Cáceres, elevando-a a função de polo regional integrador:
A cidade de Cáceres, localizada à margem esquerda do rio Paraguai, exerce a
importante função de pólo regional. É a cidade que apresenta a melhor localização
estratégica em termos de convergência e distribuição de fluxos, a apenas 215 Km da
capital do Estado de Mato Grosso, e passagem rodoviária obrigatória que dá acesso
ao oeste de Mato Grosso e ao eixo noroeste do Brasil, através da rodovia BR-174,
interligando-o a outras rotas de acesso ao Pacífico que vêm sendo implementadas
lentamente ao longo das últimas décadas, como a “Estrada do Pacífico” finalizada
recentemente no Estado do Acre.

De fato, considerando a realidade das cidades fronteiriças, Cáceres pode ser tratada
como município privilegiado, especialmente, em razão da sua localização geográfica que
permite o fluxo de pessoas e mercadorias. Todavia, seguindo a linha de entendimento do
mesmo autor, ainda há três sub-eixos potenciais para o estreitamento das relações
socioeconômicas na fronteira do Brasil com a Bolívia, sem passar necessariamente por
Cáceres. São três as opções, a saber:

a) Vila Bela da Santíssima Trindade – Espírito – San Ignácio = 251 km


b) Pontes e Lacerda – San Vicente – San Ignácio, via Ponta do Aterro = 290 km
c) Porto Espiridião – San Vicente – San Ignácio, via Ponta do Aterro = 322 km

Contudo, o autor faz um contraponto entre a potencialidade do eixo e a carência de


redes de transporte e assistência pública na região, o que vem ao encontro daquela situação
marginal apontada por Netto quando da exposição acerca das zonas de fronteira. Segundo
Alves (2006) apud Paris (2011, p.22):

Todos estes trajetos encontram-se sem pavimentação, constituindo-se em estradas de


terra susceptíveis a deterioração rápida nos períodos sazonais de chuvas intensas,
tornando-os desvantajosos em relação ao acesso por Cáceres, cujo acesso à fronteira
boliviana encontra-se totalmente asfaltado ao longo da BR-070.

E acrescenta:

...até 1985 a principal via de comunicação entre San Ignácio de Velasco e Cáceres
era via Porto Espiridião, através do trecho que vai de Ponta do Aterro rumo ao leste,
80

passando pelo Destacamento Fortuna, do Exército brasileiro, em direção a Porto


Esperidião... Então, a antiga rota por Porto Esperidião, outrora de maior importância
estratégica em termos de uma integração mais ampla, agora se restringe a interligar
o município de Porto Esperidião e sul dos municípios brasileiros de Pontes e
Lacerda e Vila Bela com os municípios da província de Velasco, possibilitando, em
conjunto com os outros dois sub-eixos de integração intermunicipais, a consolidação
futura de uma rede urbana de fronteira.

O que todas essas citações retratam é a precariedade dos sub-eixos levantados por
Alves. Ora, todos eles representam ‘opções de acesso’, mas não concorrem com o trajeto
Cáceres – San Matías, que, apesar das dificuldades de acesso, possui o potencial para
integração econômica e turística, além de apresentar melhores condições de pavimentação e
consolidação fronteiriça.
Seguindo essa esteira de entendimento, Paris (2011, p.33) relatou a precariedade da
locomoção e hospedagem no trajeto Cáceres – San Ignácio de Velasco, acrescentando que o
alto índice de tráfico de drogas e roubo de veículo tornam a travessia burocrática, sendo
necessária uma boa dose de disposição e coragem para ultrapassar essas barreiras e desfrutar
das belezas naturais e culturais que permeiam a zona de fronteira.
A fim de tornar o trajeto mais palpável, Paris (2011, p.34) faz um relato descritivo,
elencando as dificuldades observadas:

(...) o turista brasileiro necessita ter um perfil aventureiro para abdicar do conforto e
da segurança para percorrer os 550 Km do trajeto Cuiabá - San Ignácio, seja de carro
particular ou transporte coletivo.

(...) A opção mais confortável para a realização desse trajeto é através de veículo
próprio, uma vez que não há linha de ônibus que faça esse percurso de uma única
vez.

(...)

A partir de Cáceres, inicia-se uma viagem de aproximadamente 10 horas para


percorrer os quatrocentos quilômetros ainda restantes até San Ignácio. Nesse trajeto,
faz-se necessária a troca de veículos no decorrer do caminho. A primeira é do ônibus
pela van, na rodoviária de Cáceres e que levará o viajante até o distrito de Corixa,
divisa com a Bolívia, a 100 km de Cáceres, mais precisamente no Grupo Especial de
Fronteira - GEFRON. As vans não têm permissão para entrar em território
boliviano, portanto, a opção é descer e pegar um táxi boliviano da fronteira para
percorrer 7 km, agora em estrada de terra, até a primeira cidade boliviana, San
Mathias.

Em San Mathias, o viajante fará o registro de entrada em solo boliviano e poderá


pegar um ônibus direto a San Ignácio ou Santa Cruz de La Sierra.

Diante da experiência relatada por Paris, eis uma importante observação levantada por
Garcia Netto (2009, p. 28) em relação ao produto turístico, que “é produzido no mesmo lugar
onde é consumido”, ou seja, há de se ter uma preocupação com a circulação de pessoas, bens
81

e serviços, não bastando a atração dos turistas, mas a oferta de um produto a ser consolidado a
partir da satisfação daqueles que o experimentam.
As informações mais precisas acerca dos povos chiquitanos é trazida pelo major
Frederico Rondon e exposta por Silva (2008) apud Paris (2011, p. 16):
Os Chiquitos constituem o agrupamento indígena mais numeroso do Pantanal.
Vivem disseminados, nos Municípios de São Luiz de Cáceres e Mato-Grosso, em
cujas fazendas e usinas se empregam como vaqueiros ou lavradores. A maior parte,
porém, vive na zona de fronteira com a Bolívia, em rancharias de cinco a dez
moradores isolados, fazendo pequena lavoura ou caçando animais silvestres para o
comércio de peles. Vestem-se como os nossos sertanejos. O traje das mulheres é
mais simples que o de nossas caboclas.

A formação dos Chiquitos está intimamente relacionada com as missões jesuíticas e o


nome “chiquitos”, em espanhol, que quer dizer pequenos foi dado pelos colonizadores
espanhóis, aparentemente em razão de suas casas que tinham portas baixas, conforme
apresenta o Guia de Turismo da Publifolha (2006).
Sobre estes povos e cultura, Paris (2011, p. 17/18) esclarece:

As primeiras missões espanholas da Companhia de Jesus, fundadas pelo espanhol


Iñigo Lopes de Oñez y Loyola e reconhecidas pela Igreja em 1540 (COSTA, 2006),
chegaram à Bolívia, em meados do século XVI, tiveram como meta, a difusão da fé
católica através da expansão da igreja e submetendo os convertidos a sua doutrina e
obediência.
Os jesuítas que ingressaram em território chiquitano, região correspondente ao local
onde foi implantada a Missão Chiquitos, eram procedentes de países europeus como,
por exemplo, Espanha, Itália, Alemanha, Áustria e Suíça e possuíam uma formação
artística muito sólida, principalmente na música e na arquitetura. Naturalmente, no
processo de conversão à fé cristã, os jesuítas introduziram como método de
socialização várias atividades artísticas, como a literatura, o teatro, a dança, o canto,
entre outras formas artísticas.
Após sucessivas expedições, empreendidas a partir de Buenos Aires e Assunção,
através do rio Paraguai, ao longo dos séculos XVI e XVII, foi constatada a
inexistência dos míticos “grandes reinos ricos em ouro e prata”, iniciando-se então a
busca por escravos, atraindo expedições escravagistas vindas pelo oeste a partir da
“nova” Santa Cruz de la Sierra e pelo leste a partir das terras portuguesas, de onde
partiam sucessivos assaltos às aldeias de “índios chiquitos”, principalmente ao longo
dos séculos XVII e XVIII.
Passados mais de 300 anos do domínio da região pelas Missões Jesuíticas (1691 a
1767), o legado histórico, cultural e arquitetônico se mostra como um grande
potencial econômico e turístico das cidades. Entre outras obras arquitetônicas, as
igrejas são a grande atração e foram construídas pelos jesuítas missionários e são
exemplares únicos resultantes da arquitetura barroca adaptada à cultura, materiais e
técnicas indígenas.

Do lado brasileiro, a população de origem chiquitana do município de San Matias, na


Bolívia, mantém relação diária com o município de Cáceres, no Brasil, vez que Porto Limão,
Distrito de Cáceres abriga, inclusive, famílias de origem chiquitana.
82

O estabelecimento de tais relações abrange também o turismo, uma vez que o próprio
Pantanal Boliviano ainda conta com a parceria do município de Cáceres, conforme dispôs
Paris (2011, p. 30):
Ainda tratando do turismo, enquanto atividade econômica, o município de San
Matias abriga toda a parte norte do Pantanal Boliviano, com possibilidades
para desenvolver o ecoturismo e o turismo de aventura, mas atualmente, a
infraestrutura hoteleira que atende a sua demanda turística também está
instalada na cidade de Cáceres. Desta forma, apesar das desconfianças e
preconceitos existentes em função das diferenças culturais inerentes a brasileiros e
bolivianos, faz-se sentir a forte “presença” de cidadãos bolivianos em Cáceres, de
modo que, no cotidiano das duas cidades, são dispensados os procedimentos de
identificação e registro dos cidadãos estrangeiros. (grifo nosso)

Verifica-se, portanto, que o município de Cáceres e San Matías mantém estreita


relação entre si, seja sob o aspecto legal ou sob a ótica da atividade econômica do turismo,
vez que ambas as cidades desenvolvem suas atividades turísticas de modo cooperativo e não
concorrentemente.
Para ratificar esta falta de estrutura do lado boliviano da fronteira, veja-se o que
apresenta o Guia de Turismo da Bolívia, publicado pela Publifolha (2006, p. 176):

Aproximadamente 80% do Pantanal ficam em território brasileiro, mas os cerca de


15% situados na Bolívia (o resto pertence ao Paraguai) é, na opinião de muitos, bem
mais preservado – sobretudo porque o lado boliviano é praticamente desabitado.
Pelo menos no papel, o Pantanal do lado de lá também se encontra mais protegido:
tanto no norte quanto ao sul de Puerto Suárez, grandes áreas encontram-se nos
limites da Area Natual San Matías e do Parque Nacional Otuquis, que, juntos,
cobrem quase 40 mil quilômetros quadrados. No entanto, o isolamento e a falta de
desenvolvimento que permitiram a conservação dessa parte do Pantanal também
dificultam bastante as visitas.

Vê-se que, em que pese a carência de infraestrutura turística boliviana, no município


de San Matías, o mesmo conta com maior preservação do bioma Pantanal. Sob este olhar, os
municípios de Cáceres e San Matías podem estabelecer uma ferramenta de integração entre as
fronteiras, qual seja: o turismo.
Ainda a respeito da zona de fronteira entre os países, Bruslé (2011, p. 48) ensina:
La frontera de Bolivia con Brasil se ubica en la parte central del continente,en una
zona donde las densidades humanas siempre han sido bajas porque la sociedad
colonial no llegó a ocupar esos espacios alejados de los centros de poder. A nivel de
Bolivia, esa frontera de más de 3.400 kilómetros está ubicada en la parte oriental del
país, en la zona que siempre estuvo menos ligada al núcleo nacional boliviano. El
alto nivel de desvinculación territorial hace de este espacio fronterizo una zona de
margen dentro del territorio nacional. Pero lãs cosas cambian rápidamente: la
construcción de carreteras, la migración, la integración continental son motores de
dinámicas territoriales nuevas. Poco a poço los esquemas de desarrollo se inscriben
en nuevas escalas y nuevos territorios, nacional y mundial.
83

Ademais disso, nas palavras da referida autora, a fronteira da Bolívia com o Brasil é
um exemplo da ambivalência de separação e união que envolve os espaços vizinhos, uma vez
que dependendo do nosso olhar, a fronteira pode ser ponte ou barreira, Bruslé (2011, p. 48).
O grande paradoxo é que na formação da República Boliviana, as fronteiras sempre
foram débeis e isoladas, além da perda de grandes poções territoriais em embates com países
vizinhos, inclusive com o Brasil, no que se refere ao atual Estado do Acre, a partir do Tratado
de Petrópolis, firmado em 17 de novembro de 1903. Foi exatamente a partir desse documento
que ficou definitivamente estabelecida a fronteira entre Brasil e Bolívia.
A este respeito, Bruslé destaca (2011, p. 53):
En un país que perdió en el primer siglo de su vida independiente más de la mitad de
su territorio, ese poder de las fronteras es primordial. Lo paradójico es que esas
fronteras demostraron sus debilidades durante toda la historia de Bolivia (siempre se
han retirado) cuando su papel era el de asegurar la permanencia de Bolivia. Todo el
pensamiento geopolítico de Bolivia, que se transmite a los niños, radica en el
axioma que dice que Bolivia seguirá existiendo mientras tenga un territorio. El
problema es que, desde su nacimiento, todo era dudoso en Bolivia: la legitimidad de
su creación, la existencia de su nación y sobre todo su porvenir.

Ainda sobre a República da Bolívia, Chiavenato (1981) apud Vilarino (2005, p.07),
nos conta que:
...de 1870 a 1935, a Bolívia teria perdido 56,5% de seu território. Na primeira data, o
país possuía 2.243.000 Km2. Perdeu 120.000 km2 para o Chile, incluindo todo o seu
litoral, em 1879. Para o Brasil, foram 490.437 Km2, em territórios do Acre e faixas
no Mato Grosso. Para a Argentina, 170.000 Km2 no Chaco Central e na cordilheira
do Atacama, e, com a Guerra do Chaco, 250.000 Km2 para o Paraguai, totalizando a
perda de 1.265.437 Km2.

É certo que as perdas territoriais da Bolívia contribuíram para a construção de um país


frágil e com dificuldades em estabelecer laços. Diante do envolvimento em guerras e dilemas
fronteiriços, talvez o processo de integração seja um verdadeiro desafio.
Como visto, polimorfismo das fronteiras nos apresenta espaços de tensão e zonas de
contato, com dinâmica própria, com transações formais e informais e, ainda, com ações
concretas dos habitantes muitas vezes mais efetivas que as normas de controle efetivamente
criadas. A partir daí, inclusive, a concepção (ou seria o senso comum), de que fronteira é terra
sem lei, onde quem aproveita é o fora da lei.
A partir destes apontamentos que envolveram o Direito Comparado, a zona de
fronteira Brasil-Bolívia e uma breve caracterização dos países diante de suas potencialidades
turísticas, duas indagações merecem reflexão:
 As diferentes legislações sobre turismo e fronteira, leia-se também zona de
fronteira - do Brasil e da Bolívia, são capazes de permitir a consolidação formal de
uma região turístico fronteiriça integrada, sob a tutela dos Estados?
84

 Considerando que a globalização exalta a integração das fronteiras, estaríamos


vivendo o fenômeno da desfuncionalização parcial das fronteiras?

Em que pese às legislações distintas dos países em análise, muitos acordos já foram
celebrados. O primeiro deles foi em 1958 e foi denominado Acordo de Roboré, assinado em
cidade de mesmo nome. Em verdade, o referido acordo incluía 31 instrumentos diplomáticos
que versavam sobre a exploração do petróleo da Bolívia, a ferrovia Corumbá – Santa Cruz de
La Sierra e a circulação de mercadorias bolivianas.
Em apertada síntese, é possível apresentar um esboço das relações bilaterais
estabelecidas entre Brasil e Bolívia, com amparo nos dados fornecidos pelo Ministério das
Relações Exteriores, de acordo com o Quadro 08 abaixo:

QUADRO 08: Relações Bilaterais – Brasil e Bolívia

CRONOLOGIA DAS RELAÇÕES BILATERAIS – BRASIL E BOLÍVIA

1825 Mato Grosso incorpora a província de Chiquitos. D. Pedro I declara o ato nulo.
Tratado de La Paz de Ayacucho estabelece linha Madeira-Javari como
1867 fronteira comum. – Tratado da Amizade
Chile e Bolívia rompem relações diplomáticas. Brasil representa Bolívia em
1872 Santiago.
1879 Início da Guerra do Pacífico. O Brasil permanece neutro.
1887 Tratado de Amizade, Comércio e Navegação, que todavia não é aprovado.
1899 Ex-diplomata espanhol Luís Galvez R. Arias proclama a independência do
Acre.
1902 Revolução Acreana de Plácido de Castro (60 mil brasileiros opõem-se ao
Governo boliviano e arrendamento ao norte-americano Bolivian Syndicate).

1903 Modus vivendi sobre o Acre é assinado com a Bolívia para cessação das
hostilidades.
1903 Tratado de Petrópolis. Acre é incorporado ao Brasil, que paga indenização de
2 milhões de libras à Bolívia e se compromete a construir ferrovia Madeira-
Mamoré.
1912 Inaugurada a ferrovia Madeira-Mamoré
1958 Acordos do Roboré (exploração de petróleo, obras ferroviárias e cooperação
econômica)
1969 Tratado da Bacia do Prata (Argentina, Brasil, Bolívia, Paraguai e Uruguai)
1973 Acordo para construir gasoduto entre Santa Cruz de la Sierra e a refinaria de
Paulínia - SP
1984 Presidente Figueiredo vai a Santa Cruz, em 1ª viagem de um Presidente
brasileiro à Bolívia
1992 Acordo de Compra de Gás Natural Boliviano. Construção de gasoduto de 3
mil km
1996 Área de Livre Comércio entre o Mercosul e Bolívia
85

1996 Acordo para isenção de Impostos para Implementação do Gasoduto Brasil-


Bolívia
2003 Ministro Celso Amorim visita La Paz, à frente de uma Missão Brasileira de
Cooperação
2004 Referendo boliviano decide nacionalizar setor de hidrocarbonetos
2004 Acordo de Facilitação para o Ingresso e Trânsito de seus Nacionais em seus
territórios.
2004 Visita Presidencial a Santa Cruz de La Sierra, em que se firma acordo bilateral
de perdão da dívida boliviana bilateral no valor atual de US$ 53 milhões.
Acordo-Quadro BNDES para Bolívia. Nenhum projeto chegou a ser
financiado.
2005 Ministro Celso Amorim faz visita a La Paz, em apoio à transição política
conduzida pelo então Presidente Eduardo Rodríguez. Acordo, por troca de
Notas, sobre regularização Migratória.
2006 Visita do Presidente eleito Evo Morales ao Brasil
2006 Bolívia regulamenta nacionalização do setor de hidrocarbonetos
2006 Início das negociações com Petrobras sobre nacionalização dos seus ativos.
2006 Ministro Celso Amorim visita La Paz. Criam-se GTs sobre questões agrárias e
migratórias.
2006 Ministro das Relações Exteriores e Cultos, David Choquehuanca, visita o
Brasil.
2007 Visita de Estado do Presidente Evo Morales ao Brasil
2007 Chanceler Choquehuanca visita o Brasil para tratar das usinas no Rio Madeira.
2007 Visita do Presidente Lula a La Paz. Petrobras anuncia novos investimentos na
Bolívia. Firmam-se acordos de cooperação e de financiamento para a Bolívia.
2008 Visita do Vice-Presidente García Linera e do Ministro Carlos Villegas a
Brasília
2008 O Governo boliviano convida o Brasil a integrar “Grupo de Países Amigos da
Bolívia”, com vistas a promover a facilitação do diálogo entre Governo e
oposição.
2008 Viagem do Ministro Celso Amorim a La Paz e Santa Cruz de la Sierra, em que
manteve contatos com o Presidente Morales, o Vice-Presidente Linera e o
MNE Choquehuanca, lideranças de oposição e representantes da sociedade
civil, no contexto do processo de facilitação do diálogo promovido pelo
“Grupo de Países Amigos da Bolívia”.
2008 Na véspera da Reunião Extraordinária de Cúpula da UNASUL, em Brasília,
Ministro Celso Amorim recebe o Chanceler David Choquehuanca, em
encontro que tratou prioritariamente da situação interna boliviana.
2008 O Presidente Lula visita Riberalta, na Amazônia boliviana, ocasião em que foi
firmado protocolo sobre financiamento brasileiro para construção de estrada
entre Riberalta e Rurrenabaque, de 510 km, parte integrante do Projeto viário
“Hacia el Norte”.
2008 O Presidente Lula mantém reunião bilateral com o Presidente Morales, à
margem do encontro quadripartite de Manaus, do qual participaram também a
Venezuela e o Equador.
2008 O Presidente Lula reúne-se bilateralmente com o Presidente Morales, à
margem da Cúpula da América Latina e do Caribe sobre Integração e
Desenvolvimento (CALC), em Sauípe.
2009 Os Presidentes de Brasil e Bolívia realizam Encontro de Fronteira, entre
86

Puerto Suárez e Ladário. Inauguram dois trechos do futuro Corredor


Interoceânico Brasil-Bolívia-Chile. Aprofundam as discussões sobre
infraestrutura regional, narcotráfico e comércio bilateral.
2009 Realizada, em Brasília, Reunião de Alto Nível sobre os Projetos Hidrelétricos
do Rio Madeira
2009 Ministro David Choquehuanca visita o Brasil.
2009 Ministro Celso Amorim visita La Paz por ocasião da comemoração do
Bicentenário da Gesta Libertária.
FONTE: Ministério das Relações Exteriores. Site: <http://www.itamaraty.gov.br/temas/temas-
politicos-e-relacoes-bilaterais>. Acesso em: 27.07.2013.
Org. PARIS, Marcela C. N., 2013.

O Quadro 08 acima retrata os acordos oficiais celebrados entre o Brasil e o Estado


Plurinacional da Bolívia, especialmente no que tange as relações exteriores e internacionais
entre os países. Contudo, a realidade fronteiriça é diversa, possui dinâmica própria e, como já
dito, é onde as ações concretas locais tem mais força que a norma vigente. Sobre o poder de
exercício das zonas fronteiriças, Serrano (2011, p. 23) relata:

Los actores fronterizos contribuyen cotidianamente a la construcción de uma región


socioeconómica transnacional; es decir: “Las fronteras pueden desplazarse,
desdibujarse, trazarse nuevamente. Pero no pueden desaparecer, son constitutivas de
toda vida social”. (Grimson, s.f.: 22). De hecho, una buena parte de los fronterizos
hablan más de un idioma, conocen los tipos de cambio y precios de ambos lados de
frontera, cruzan constantemente la línea con motivos laborales, comerciales y
educativos, establecen relaciones de amistad y parentesco, realizan actividades
socioculturales y comparten algunos servicios públicos. En la frontera predominan
más las acciones concretas de los habitantes que las normas de control.

O autor relata a realidade diversa da fronteira. Ela representa a constituição de uma


vida típica, de um povo que, geralmente, tem conhecimento de mais de um idioma, conhece
as taxas de cambio e os preços de ambos os lados da fronteira e vivem relações fronteiriças de
amizade, trabalho e parentesco. Entretanto, o mais relevante é que as ações concretas da
fronteira se sobrepõem aos padrões impostos e os mecanismos de controle criados.
E diante desta dinâmica da fronteira, nem sempre as relações são institucionalizadas,
nem sempre são legais. Há o estabelecimento de relações comerciais, de trocas comerciais, da
utilização dos serviços de saúde e de transporte, bem como da segurança formada e armada.
Por outro lado, na zona fronteiriça, inclusive nesta que envolve a área de estudo, há o
narcotráfico, os delinquentes que se aproveitam dos locais de maior vulnerabilidade. É
inclusive como expõe Serrano (2011, p. 24):
Es más, las fronteras son lugares donde proliferan las actividades ilícitas, generando
violencia y terror en la población local que sufre las consecuencias funestas de la
acción criminal de lós cárteles del narcotráfico y las bandas delincuenciales (Beck,
2003; Glenny, 2008; Curbet, 2006). Las bandas del crimen organizado tienen
eslabones en ambos lados de frontera; como ocurre en la frontera México-Estados
87

Unidos y las fronteras de países sudamericanos Colombia-Ecuador, Perú, Brasil y


Venezuela16; o Bolivia-Brasil.

O referido autor ainda acrescenta (2011, p. 33):

De igual forma, en la región fronteriza com Brasil, las iniciativas bilaterales de


integración y desarrollo se orientan hacia la cooperación en la comercialización de
mercaderías y El control de actividades ilícitas (contrabando, asentamientos
irregulares, tráfico de drogas y armas, internación de vehículos robados y trata de
personas); esto en los puntos más vulnerables como Cobija-Brasileia,
Guayaramerín-Guajará Mirin, San Matías-Cáceres y Puerto Quijarro-Corumbá;
(grifo nosso)

O mencionado autor retrata um aspecto negativo da zona de fronteira que é a prática


dos crimes transnacionais que refletem em todo o território nacional. E é “aí que reside a forte
vocação da fronteira, subverter a lógica do poder central e criar suas próprias representações,
tendo como referência suas condições”, segundo Ramalho Júnior e Oliveira (2006, p. 03).
Grande parte das relações fronteiriças não são institucionalizadas, não estão
normatizadas, muitas vezes são relações de sobrevivência, como acertadamente descreveu
Castrogiovanni (2009, p. 05): “Quem vive na fronteira não vive pensando no outro como um
inimigo, mas na possibilidade de fazer do outro uma continuação do seu território de relações
e de possibilidades para sobreviver na fronteira.” E assevera (p. 09):
Quando residimos em área de fronteira e atravessamos a fronteira para vivermos é
muito difícil saber se estamos indo ou vindo. Esta sensação é construída através do
sentido de flutuação que só a fronteira parece nos permitir ter. É necessário
estabelecer uma geopolítica de sobrevivência de fronteira. Como dizem os
fronteiriços “temos que saber o que se passa lá e o que pode se passar aqui”...
“Temos que saber o que se pensa do lado de lá sobre nós aqui, só assim podemos
viver a fronteira na fronteira”.

O autor utiliza a expressão ‘geopolítica de sobreviência’. Ora, para viver na fronteira é


necessário que cada um cuide de si e conserve um certo conhecimento do que se passa dos
dois lados. A sensação de flutuação vem para ilustrar esse modelo de sobrevivência, vez que
um homem de fronteira submete-se a diversas relações, sejam elas instituicionalizadas ou não.
Em sua obra e proposta “O Estatuto da Fronteira Brasil – Uruguai”, Pucci destaca uma
relação fronteiriça que apesar das transações informais, conseguiu e sobrevive às crises
conjunturais (2010, p. 30)
A complexa dinâmica das relações sociais neste espaço preexiste à ação planejada
dos Estados limítrofes e, por isso mesmo, sobrevive às suas crises conjunturais, pois
é capaz de engendrar mecanismos de integração informal, que poderão funcionar
através dos canais oficiais, sempre e quando estes sejam dotados dos requisitos de
atualidade, praticidade e celeridade indispensáveis ao exercício desembaraçado da
cidadania fronteiriça.

Conforme apontado pelo referido autor, é preciso trazer à baila que as fronteiras
também permitem viver um espaço de integração, amparado pelo turismo, capaz de funcionar
88

como uma ponte entre povos, culturas e riquezas naturais, como é o caso de Cáceres e San
Matías que integram a Rota Pantanal Pacífico.
Nessa linha de entendimento, assim como o Brasil, a Bolívia também possui um Lei
Geral de Turismo, aprovada em 25/09/2012 e denominada “Bolivia te espera” nº 292/2012. A
atividade turística invoca os princípios da inclusão, redistribuição, equidade, igualdade,
responsabilidade, solidariedade e complementaridade.
Por sua vez, a Lei Geral do Turismo do Brasil, fruto do projeto de Lei nº 3.118/2008,
deu origem à Lei nº 11.771/2008. A lei apresenta 47 artigos, divididos em seis capítulos,
assim denominados: Disposições preliminares; Da política, do plano e do sistema nacional de
turismo; Da coordenação e integração de decisões e ações no plano federal; Do fomento à
atividade turística; Dos prestadores de serviços turísticos e Das disposições finais.
O primeiro capítulo traz o elemento finalístico da lei, define a atuação do Ministério
do Turismo e apresenta um conceito de turismo, para fins legais que é exatamente o fornecido
pela Organização Mundial de Turismo (OMT, 2001), qual seja:
Art. 2º Para os fins desta Lei, considera-se turismo as atividades realizadas por
pessoas físicas durante viagens e estadas em lugares diferentes do seu entorno
habitual, por um período inferior a um ano, com finalidade de lazer, negócios ou
outras.

Oliveira (2009) escreveu uma artigo bastante esclarecedor no que tange a Lei Geral do
Turismo e, em apertada síntese, apresentou uma visão macro a respeito da norma em vigor.
Dentre as análises apresentadas, há pontos e contrapontos de extrema importância, senão
vejamos:
a) A regulamentação proposta constitui verdadeiro avanço em se tratando de
planejamento turístico e, consequentemente, implementação de políticas públicas
por parte do Estado brasileiro;
b) Em que pese a importância do tema, a regulamentação da matéria está na
contramão da tendência mundial de desregulamentação do setor, uma vez que a
regulamentação excessiva pode burocratizar demais uma atividade essencialmente
privada;
c) A lei preferiu deixar de lado questões polêmicas como a finalidade do turismo, por
exemplo, se saúde ou negócios seriam motivos de viagem turística;
d) No capítulo que trata da política do turismo, a lei faz verdadeira promessa de que o
desenvolvimento do turismo gerará empregos e distribuição de renda, em que pese
a realidade não seja assim tão matemática;
89

e) A norma insculpida no artigo 5º traz os objetivos da Política Nacional do Turismo,


quais sejam: democratizar o turismo, reduzir as desigualdades sociais e
econômicas de ordem regional, promovendo a inclusão social pelo crescimento da
oferta de trabalho e melhor distribuição de renda;
f) Por ser multidisciplinar, o turismo depende do apoio de várias pastas do governo,
tais como a segurança, o transporte, a saúde e a urbanização.

Para a autora, estes objetivos somente serão alcançados se todos os órgãos, entidades e
pessoas responsáveis pelo turismo não conseguirem sanar o problema de falta de paridade das
políticas federais em nível estadual e municipal.
Em análise oposta e pouco menos otimista, Ferraz (2008, p. 02) entende que “a lei
reguladora desse papel público deveria detalhar o exercício dessas funções de promoção e
incentivo, o que não parece ser o caso da Lei n. 11.771/2008, que dá preferência, ao menos
quantitativa, à função fiscalizadora.”
Por último, o referido autor define a lei como tímida, óbvia e repetitiva (p. 02):

Óbvio é dizer que a Política Nacional de Turismo é composta por leis e normas
voltadas ao planejamento e ordenamento do setor, e — não poderia ser diferente —
observará princípios constitucionais (art. 4º).

Repetitivos são seus objetivos, compostos por um conjunto de vinte saudáveis


intenções (art. 5º) que poderiam ser resumidas a uma só: o desenvolvimento
organizado do setor, gerando renda e emprego sem degradação do meio ambiente.

Tímido ao condicionar o Plano Nacional de Turismo à aprovação do Presidente da


República (art. 6º), como se não tivesse ele atribuições mais relevantes e não se
limitasse a assinar o documento que lhe for apresentado pelo Ministro do Turismo.

Também é óbvia a Lei Geral do Turismo ao tratar da composição do Sistema


Nacional do Turismo (art. 8º), e repetitiva ao enumerar seus oito objetivos (art. 9º),
que também poderiam ser resumidos a um só: gerar o desenvolvimento do turismo.

E tímida, ao não nomear, desde já, componentes estratégicos para o interessante


Comitê Interministerial de Facilitação Turística (art. 11) — afinal, o setor é total
dependente de outros órgãos — como Polícia Federal, Aduana, ANAC e Infraero.

Seja como for, óbvia ou repetitiva, otimista ou tímida, o que resta nítido é que a Lei
Geral de Turismo do Brasil apresenta avanços e falhas. Não caracteriza um retrocesso, ao
contrário. De fato, há instrumentos que não foram regulamentados, deixando lacunas, o que
pode possibilitar um planejamento turístico consistente, visando o desenvolvimento de
políticas públicas para o setor, inclusive para o turismo internacional (OLIVEIRA, 2009).
E talvez este seja um dos modos em que a fronteira se torne permeável e flexível,
aparentemente, sem atritos, por meio do turismo, por meio de um planejamento turíst ico
90

integrado que vise o desenvolvimento das potencialidades turísticas fronteiriças e com vistas
ao fomento das culturas e costumes na fronteira.
Afinal, a dinâmica das fronteiras pode ter a interpretação e o olhar de cada observador.
Em reunião do Comitê de Integração Bilateral, o Secretário de Estado de Meio Ambiente de
Mato Grosso, José de Lacerda Filho destacou que enquanto estão discutindo moeda única na
Europa, sob o viés da integração, por que a América do Sul precisa considerar a fronteira
como área de risco (OBSERVATÓRIO DA FRONTEIRA, 2013)?
Não se pretende aqui comparar o tratamento que se dá ao turismo na América do Sul
com o modelo europeu adotado. Primeiramente, porque o processo de colonização e
formação, respectivamente, obedeceram tempos e espaços distintos. De fato, a disparidade
social e econômica gerou cenários institucionais distintos e, consequentemente, a
normatização a que o povo é submetido também.
O que se deseja abordar é a plausibilidade de invocar a fronteira sob o viés da
integração, dentro do cenário em que a América do Sul está inserida. Assim como o Direito
Comparado auxilia no sentido de compreender melhor como outros países lidam com
determinado assunto, a visão e o tratamento dado à fronteira na Europa podem servir para
uma (re)significação de conceito.
A propósito, o Comitê de Fronteira já refletia uma mudança de paradigmas. Criado por
Acordo por troca de Notas em La Paz, em 11 de março de 1997, constituem foros bilaterais
para o tratamento de temas de interesse comum da região fronteiriça, sob a jurisdição das
repartições consulares do Brasil e da Bolívia.
Contudo, com a inatividade e estagnação dos ditos Comitês desde 2005, em março de
2011 ficou acordada a implantação do Comitê de Integração Bilateral Cáceres/San Matías,
cujo objetivo maior é promover a integração política, econômica, social, física e cultural entre
as duas cidades. Este Comitê foi oficializado em 25/04/2013.
Em que pese os conflitos legais existentes, a cooperação transfronteiriça não é uma
utopia. É a busca pela valorização de um espaço de fixos e fluxos de pessoas, como descreveu
Costa, Cisne, Oliveira (2012, p. 01):
Para além do limite político, estabelecem-se múltiplos limites, neste espaço de fixos,
mas principalmente de fluxos, criando certas especificidades que garantem aos seus
sujeitos a possibilidade de trânsito físico e cultural transfronteiriço, e garantem aos
turistas a experiência da onipresença, de estar ao mesmo tempo em dois países.

Considerando o sentido dado pelas autoras, Mato Grosso é um dos Estados da


federação que mais exporta, ficando em 7º lugar, no ano de 2009 e, ainda, por ser vizinho da
Bolívia, mantém com ela, relações frequentes. Ademais, tal fronteira possui um movimento
91

muito intenso e obriga o governo de Mato Grosso, em alguns casos, a tratar dos assuntos mais
variados, diretamente com o governo boliviano (GATO, 2013).
Nesse aspecto, Mato Grosso e Bolívia já celebraram algumas parcerias, tais como o
combate à febre aftosa e o GEFron. No primeiro caso, a relação com a Bolívia foi substancial
para criação de um cordão fito-sanitário que vacinava e fiscalizava a fronteira. No segundo
caso, o foco era a segurança e o combate ao tráfico, armas e furto de veículos. (GATO, 2013).
Para o referido autor, a respeito da atividade do GEFron (2013, p. 09):

Outra ação realizada na fronteira com a Bolivia, por MT, tinha foco na segurança. O
Grupo Especial de Fronteira (GEFron) previa o trabalho integrado da Polícia Militar,
Civil e o Corpo de Bombeiros, em uma região de 980 Km de extensão, sendo 750
Km de limite seco e 230 Km de limite aquático, constituída de 25 municípios e uma
população de 240.000 habitantes, com uma economia pujante na produção de grãos
e criação de gado.

O GEFron tem como objetivos a integração das ações policiais, redução de ameaças
e riscos para produtores rurais e condutores de veículos, diminuição da participação
de policiais com o crime, predominância da legalidade nas atividades desenvolvidas
na região, redução da criminalidade em Mato Grosso e em outros estados da
Federação e a interação policial com a comunidade.

Considerando o rol de ações integradas, vale acrescentar que a Agenda MT-Bolívia,


por sua vez, também prevê pautas que envolvem o turismo. E se Brasil e Bolívia já se uniram
no combate à aftosa e na implementação de maior segurança, o turismo passa a ser uma
parceria possível, especialmente, considerando que referidos países assinaram acordo para
promover o turismo na Copa do Mundo de 2014 e Olimpíadas de 2016, ambos eventos a
serem realizados no Brasil. Foi desta forma que o jornal El País noticiou em 02 de dezembro
de 2012, a fim de encaminhar as atividades de promoção turística para os dois países, com
destaque para a Chiquitania Boliviana, o parque de Noel Kempff Mercado, em Santa Cruz,
dentre outros. (ERBOL, 2012)
A propósito, o Parque Nacional Noel Kempff Mercado possui uma área de 16 mil
quilômetros quadrados no extremo nordeste da Bolívia, exatamente na fronteira com o Brasil.
A respeito do parque, duas considerações, uma positiva e outra negativa não podem ser
deixadas de lado. A primeira delas é a grande variedade de ecossistemas – florestas tropicais,
savanas áridas e zonas de cerrado, além da rica fauna e flora. Há onze espécies de macacos e
mais de 630 espécies de aves, além dos principais mamíferos encontrados na Amazônia.
Contudo, a localização remota do parque, no entanto, torna a visita cara e difícil, uma
vez que “a fronteira sul fica a 200 quilômetros da cidade mais próxima, San Ignácio de
Velasco, em Chiquitos, que, por sua vez está a 400 quilômetros de Santa Cruz”, conforme
apresenta o Guia de Turismo da Publifolha (2006, p. 175).
92

Entretanto, ainda que a flexibilidade e a permeabilidade da zona de fronteira Brasil –


Bolívia encontre barreiras, seja por aspectos legais distintos, seja pela distância dos grandes
centros reguladores, seja pela informalidade, tem-se que buscar os contornos possíveis, a fim
de elevar a fronteira como área de contato.
Assim sendo, algumas ações concretas podem ser sugeridas, com o intuito de
promover a integração turística, especialmente na zona fronteiriça que envolve Cáceres/Brasil
e San Matias/Bolívia inseridos na Rota Pantanal Pacífico e, a partir daí, propor uma revisão de
conceitos e reflexões acerca da fronteira.
Vale ressaltar que as sugestões envolvem tanto aspectos teóricos quanto experiências
reais, adotadas em outras zonas fronteiriças brasileiras que, em que pese, possuam contextos
socioespacial e cultural distintos, podem auxiliar o processo de permeabilidade da fronteira.
Partindo da premissa de que a fronteira é um lugar de ambivalência, de dualidade e de
contradições e que o processo de globalização aumentou significativamente os fluxos, ou seja,
a circulação de mercadorias, informações, capitais e pessoas no espaço geográfico mundial, o
entendimento acerca da fronteira também precisa ser renovado.
Nas palavras de Silveira (2005, p.18), se a fronteira existe é porque há uma dimensão
membranosa, permeável ou porosa que possibilita o fluxo de elementos diversos, pois é da
natureza da fronteira que por ela ocorra a passagem, o fluxo e a interdição. Há fluxo de
pessoas, de ideias, de substâncias, de sonhos, de sentidos vários.
Hissa (2006, p.40), em consonância com este entendimento de permeabilidade das
fronteiras, destaca:
A fronteira, em se analisando ao longo da história, pretendeu desenhar uma imagem
de pedra e precisão: os muros são o seu símbolo, com toda a sua concretude.
Entretanto, apesar da imagem de intransponibilidade, os muros são apenas
camuflagem, pois o espaço vivido é mais amplo e complexo do que os limites e
fronteiras possam determinar.

A autora tenta desmistificar a metáfora de que a fronteira é um muro alto,


intransponível e esclarece tratar-se de verdadeiro disfarce, posto que o conteúdo encontrado
na zona de fronteira é tão rico que a noção de limite jamais poderia suportar tamanha
limitação.
Por fim, Max e Oliveira (2009) retratam que a descontinuidade política, administrativa
e social que caracteriza a fronteira exige sempre uma análise cuidadosa e complexa das
relações cotidianas, indispensáveis para o amadurecimento e evolução das práticas de
integração e cooperação dessas regiões.
93

4.3 A “REFUNCIONALIZAÇÃO” DAS FRONTEIRAS E AS PROPOSTAS


INTEGRACIONISTAS:

Diante da globalização, fenômeno recente na história da humanidade, que permitiu os


deslocamentos humanos e da globalização da indiferença que não se importou com as zonas
áridas e contraditórias das fronteiras, defende-se com o meio termo. Ora, o processo de
abertura de mercados abriu também a oportunidade de revisão de conceitos e a possibilidade
de fomentar a cultura do encontro na fronteira.
Neste sentido, Guichonnet e Raffestin (1974) apud Max e Oliveira (2009) propuseram
uma diversidade de funções para a fronteira, considerando o entendimento de que as
fronteiras servem a diversos propósitos. Para estes autores, diante das mudanças que ocorrem,
os efeitos das fronteiras podem ser reduzidos, ocorrendo o fenômeno da “défonctionnalisation
dês frontières”, ou seja, a “desfuncionalização” das fronteiras.
O instituto da “desfuncionalização” das fronteiras é, portanto, a impossibilidade de
conter o fluxo de pessoas, mercadorias e serviços, em razão das zonas de integração e
articulação.
Para Evangelista (1998), o ideal seria denominar este processo de “refuncionalização”
e não “desfuncionalização” como foi pretendido. E acrescenta:
A noção de desfuncionalização adotado por Raffestin & Guichonet, no entanto,
pode ter para nós uma outra forma de leitura tendo em vista ao que analisamos sobre
a questão do limite institucional, sendo mais apropriado não pensarmos
propriamente em desfuncionalização e sim refuncionalização, ou seja, os limites
continuariam existindo porém institucionalmente refuncionalizados, com novos
conteúdos que expressariam outras formas reguladoras, talvez não tão marcantes ao
verificado antes da refuncionalização, porém, ainda capazes de regular a ação dos
atores sociais embora estes possam não ser mais os mesmos da situação anterior ao
da refuncionalização

De fato, há divergência doutrinária a respeito da melhor denominação para o processo


de permeabilidade das fronteiras. A título de curiosidade, vale acrescentar que tanto o prefixo
‘des’ quanto o ‘re’ são prefixos de origem latina e enquanto o primeiro tem sentido de
negação, ação contrária, o segundo tem o sentido de repetição e reciprocidade.
Defende-se, neste momento, a ideia de “refuncionalização” da fronteira, no sentido de
que o processo de abertura de mercado, fluxo de pessoas e a desburocratização legal tenham
promovido um novo modelo de funcionamento, distinto do anteriormente vigente.
Contudo, em que pese a discussão acerca da expressão mais correta seja puramente
acadêmica, o fato é que a importância maior reside na capacidade dos países fronteiriços
viverem experiências que visem a cultura do encontro, tornando realizável um turismo
integrado.
94

Seguindo este propósito, seguem algumas propostas, visando a integração da zona de


fronteira Cáceres/Brasil e San Matias/Bolívia, com vistas a intensificar o turismo.

A) A “turistificação” por meio de políticas públicas e privadas;

Nas palavras de Merigue (2005), a “turistificação” é um processo de implantação,


implementação ou suplementação da atividade turística em espaços turísticos ou com
potencialidade para o turismo. É o caso de toda a Rota Pantanal Pacífico que possui grandes
riquezas naturais e potencial turístico diversificado. Contudo, o referido autor destaca dois
pontos fundamentais: a necessidade de planejamento e a cooperação, favorecendo assim a
“turistificação” binacional e não a espacialização unilateral da fronteira, o que dificulta a
integração, como dispôs Paixão (2005, p. 67).
De acordo com Coriolano (2005, p. 119), diz-se que um território está “turistificado”
quando foi alvo da interferência de políticas públicas e privadas, apresentando atividades
hegemonicamente priorizadas aos turistas e não aos residentes. É assim que os espaços são
valorizados, disputados, especulados, apropriados e utilizados.
Fomentar o turismo de fronteira na América do Sul significa, antes de tudo, lidar com
a dinâmica da zona de fronteira, bem como elevar o turismo num patamar de relevância tal
qual os demais assuntos que o envolvem, como por exemplo, a segurança.

B) Formulação de políticas públicas e privadas com obediência aos requisitos para


acordos bilaterais, visando o fomento ao turismo na Rota Pantanal Pacífico;

Cabe destacar que qualquer política neste sentido deve levar em conta as
desigualdades intra e inter-regionais, as transações formais e informais realizadas entre as
cidades de fronteira, bem como a diversidade socioeconômica e cultural, a fim de criar ações
para todos e não um turismo excludente.
Vale ressaltar que o termo política é utilizado em sentido amplo, podendo ser
compreendido como ações que visem à promoção turística, tais como: a criação de feiras
internacionais de turismo, pacotes turísticos específicos para a Rota Pantanal Pacífico, dentre
outros. A ideia abrange, inclusive, a desburocratização nos procedimentos de cruzamento de
fronteira. O que se propõe é uma adaptação das exigências legais, facilitando ao máximo a
liberdade de viajar e aumentando, consequentemente, o turismo internacional.
95

C) Observância e aplicação dos princípios constitucionais voltados ao turismo;

A Constituição Federal de 1988 do Brasil prevê, expressamente, três princípios a


serem observados, quais sejam: o incentivo estatal ao turismo, a promoção estatal do turismo
e a elevação do turismo à condição de fator de desenvolvimento social e econômico.
A Bolívia, por seu turno, tem como princípios a inclusão, a redistribuição, a igualdade,
a responsabilidade, a solidariedade e a complementaridade.
Considerando que os países em análise não adotam princípios excludentes e que os
princípios são os denominados mandamentos de um sistema, é possível estabelecer o peso de
cada um, a fim de reger uma atividade turística baseada em princípios constitucionalmente
estabelecidos.

D) Adoção da disciplina de Direito do Turismo nas universidades - Ensino, Pesquisa


e Extensão;
São poucas as universidades brasileiras, por exemplo, que adotam na grade curricular,
dentre as disciplinas obrigatórias, o ensino de Direito do Turismo. A relevância é tamanha que
envolve tanto o território nacional como internacional, o direito do consumidor, por se tratar
de relação de consumo, bem como todo um estudo normativo com base nos princípios
previstos constitucionalmente.
Badaró (2005, p. 89) sugere ainda a necessidade do direito como instrumento para o
planejamento do turismo.
Nessa linha de entendimento, vale destacar o artigo 207 da Constituição Federal
vigente que versa sobre o princípio da indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão,
sendo este último compreendido como sendo uma ação junto à comunidade, a qual
disponibiliza ao público externo o conhecimento adquirido com o ensino e a pesquisa
desenvolvidos. Para tanto, a disciplina Direito do Turismo poderia ser adotada, especialmente,
nas modalidades do ensino e pesquisa universitária.

E) Codificação do Direito do Turismo;

Todas as normas que envolvem a questão turística são esparsas no ordenamento


jurídico nacional e são encontradas como circulares, portarias, leis, dentre outros atos
administrativos. Badaró (2005, p. 168/169) esclarece:

O direito do turismo na União Europeia encontra-se, atualmente, consolidado,


graças ao programa plurianual a favor do turismo europeu, que, seguindo diretrizes
96

estabelecidas pelo conselho europeu, incentivou não somente a atividade turística


em si mas também a criação, por parte dos países membros, de um novo ramo de
direito, que veio a dar suporte legal ao turismo e ás áreas conexas a ele.

Guardadas as peculiaridades da União Europeia, é plausível a proposta de criação de


um código do turismo, assim como existe, por exemplo, um Código Penal e Civil, no Brasil,
que reúne, em um único texto ou corpo, as leis esparsas sobre determinado tema, observando
critérios de uniformidade e cronologia.
Nesse sentido, os membros da Organização Mundial do Turismo (OMT) aprovaram,
em 1999, em Santiago do Chile, o Código Mundial de Ética do Turismo, que foi inspirado em
vários instrumentos legais internacionais, a fim de estabelecer os princípios balizadores do
turismo. O citado código destaca que somente a cooperação permitirá proteger o futuro do
setor turístico. Como dito alhures, o turismo se faz com parcerias e não com concorrência.
Em linhas gerais, o Código Mundial de Ética do Turismo estabelece alguns princípios
básicos a fim de reger as relações de turismo, bem como a atividade turística em si, devendo
ser observados por todos os países. O referido diploma foi direcionado tanto para os governos
como para os agentes, promotores e empregados privados, além, é claro, dos turistas. Badaró
(2005, p. 131) esclarece:

Levando em consideração o crescimento rápido e contínuo da atividade turística,


resultante de motivações de lazer, negócios, cultura, religião ou saúde, e que produz
poderosos efeitos, positivos e negativos, sobre o meio ambiente, a economia e a
sociedade dos países emissores e receptores de fluxos turísticos, sobre as
comunidades locais e populações autóctones e sobre as relações e trocas
internacionais, a Organização objetivou, nos princípios do código, externar de forma
clara os pressupostos que regem a atividade turística, bem como demonstrar suas
características.

Vários são os temas elencados no Código Mundial de Ética do Turismo, a saber:


contribuição do turismo para a compreensão e o respeito mútuo entre homens e sociedades; o
turismo enquanto instrumento de desenvolvimento individual e coletivo; o turismo enquanto
fator de desenvolvimento sustentável; o turismo enquanto fator de aproveitamento e
enriquecimento do patrimônio cultural da humanidade; o turismo como atividade benéfica
para os países e para as comunidades de destino; as obrigações dos agentes de
desenvolvimento turístico; o direito do turismo; a liberdade de deslocamento turístico; o
direito dos trabalhadores e empresários da indústria turística e, por fim, a aplicação efetiva
dos princípios enunciados no referido Código.
Vale dizer que há entendimentos contrários acerca da codificação, sob o argumento de
que ela não traz segurança jurídica para o cidadão. Contudo, esse não é o entendimento
adotado e, salvo melhor juízo, a proposta de codificação da legislação turística abre espaço
97

para a consolidação do tema, vez que norteia o cidadão comum. Além disso, uma legislação
esparsa a respeito de determinado tema dificulta a compreensão e a harmonização dos
ordenamentos jurídicos, uma vez que envolve culturas, povos e legislações distintas.

F) (Re) Leitura do conceito de fronteira à luz do turismo

A última proposta apresentada, talvez, seja a única que não se amolda como uma
diretriz de ação propriamente dita. A proposta de (re) leitura do conceito de fronteira à luz do
turismo deve ser a consequência de um processo de compreensão e estudo da fronteira, a fim
de promover mudanças na formulação de políticas públicas e privadas, na codificação do
Direito do Turismo e, até mesmo, na interpretação dos princípios constitucionais voltados ao
turismo.

A origem latina da palavra fronteira vem de “fronteria” ou “frontaria” que indicava a


parte do território situada “in fronte”, ou seja, nas margens (Machado, 2005). As fronteiras já
foram reconhecidas como limites, como barreiras, como indutoras do cerceamento da
liberdade de ir e vir, como ponto de separação e repulsa, onde a segurança sempre foi assunto
que esteve na ordem do dia. É como se limite e fronteira guardassem similitude de
significado.
Com o processo de globalização, entendido no estrito contexto de abertura de
mercados e circulação livre de pessoas, mercadorias e serviços, a fronteira passou a permitir
novas leituras, especialmente, em razão da plasticidade dada as estruturas, de acordo com
Courlet (1996).
A fronteira é dicotômica e ao longo da história continuou sendo limite, mas passou a
carregar a concepção de limite de contato, de aproximação, de perspectiva de integração de
culturas e povos distintos. É como se houvesse uma metamorfose conceitual, como dispôs
Paixão (2005).
Na literatura voltada para o tema, é comum encontrar definições que não tratam a
fronteira somente como limite, barreira ou ponto de separação. A fronteira passou a ser
refletida assim:
... é no sentido de enxergar a fronteira não de forma estrábica, mas com uma visão
ampliada e focada, tomando os cuidados de nos despirmos dos pré-conceitos que já
temos estabelecidos que a integração deva ser tratada como instrumento que utilizará
a aproximação e a cooperação entre os povos como meios para alcançar os objetivos
do bem comum. ( CARVALHO, 2012, p. 09)

... fronteira significa uma área onde ocorre a justaposição de culturas, por onde
circulam não apenas mercadorias, ideias, sonhos, mas silêncios que só quem vivem
98

a/na fronteira consegue escutar. Para outros, fronteira tem um sentido linear, o de
limite, de linha divisória, de cercamento onde as possibilidades se fazem
dependendo das porosidades na qual estas barreiras se apresentam. Fronteira é limite
e ao mesmo tempo desafio em passar os seus limites. (CASTROGIOVANNI, p. 01)

Por sua vez, Januário (2004, p.94 e 95), em estudo expedicionário em Cáceres/MT,
apresenta a noção de fronteira sob três olhares de quem lá vive: os militares, os moradores e
os responsáveis pela educação. Senão, veja:

Para os militares, eles são os “guardiões da fronteira”, são eles quem mantém o
ordenamento desse espaço, tido como um local perigoso, que precisa ser
constantemente vigiado a fim de manter a soberania nacional. Revelam uma postura
paternalista, de poder e dominação. Essa área de limite entre os países seria território
deles, local de combate, de treinamento, de alerta permanente, de relatórios
constantes. A fronteira é percebida como um espaço que tem que estar sob o
controle da corporação... “(...)se não fosse a gente aqui esse lugar seria uma terra
de ninguém”, enfatiza um militar destacado na região. (grifo nosso)

Para os responsáveis pela educação no município de Cáceres, a concepção de


fronteira aproxima-se muito da dos militares. Ela é real e trata-se de um lugar
perigoso, de um espaço que tem uma conotação negativa.

A noção de fronteira para o morador local é bem distinta da noção do militar, das
instituições oficiais e de boa parte da população do estado de Mato Grosso. Para os
moradores locais, a fronteira não se configura em um espaço concreto, em linhas e
limites estabelecidos. Ela é como se fosse transparente, etérea. É como se não
existisse. As pessoas transitam de um lado para outro como se vai na casa do vizinho
do outro lado da rua.

Não existe, para os moradores das comunidades locais esta distinção entre “cá” e
“lá”, entre estou no Brasil e estou na Bolívia. Estar lá, na Bolívia, significa para eles
estar em San Matias. Para os militares, estar lá, na Bolívia, é estar do outro lado do
córrego, é estar a um passo depois dos marcos da fronteira.

Relevante também, a percepção de Frijof Capra (1995), em seu livro Sabedoria


Incomum, onde relata as impressões de viagem feita pela Europa (p. 29 e 30):

A impressão que mais se sobressaiu nessa viagem foi me dar conta de quanto as
fronteiras nacionais europeias são divisões artificiais. Reparei que língua, os
costumes e as características físicas das pessoas não mudam de madeira abrupta nas
fronteiras, e sim gradual, e notei que as pessoas de ambos os lados das divisas
frequentemente tinham muito mais em comum umas com as outras do que, digamos,
com os habitantes da capital de seu país.

Diante desses diferentes olhares, Januário (2004) lança aquela concepção mais
acadêmica, a qual adotou para pensar a fronteira, qual seja, o ponto de encontro e
proximidade das diferenças, como passagem entre mundos, como comunicação entre
diferentes culturas, etnias e ambientes, enfim, “a fronteira deve ser pensada como espaço em
movimento, um espaço em permanente ressignificação, um universo dinâmico que mantém a
sua originalidade e especificidade”. E assevera: “Compreender que não existe apenas ‘a
fronteira’, mas sim, ‘várias fronteiras’ inseridas nesse espaço de vivências”.
99

O que todos os autores supracitados trazem são os novos olhares que pairam sob a
fronteira e o turismo surge como um mecanismo integrador de zonas fronteiriças com
imensurável riqueza natural, com potencialidades turísticas capazes de promover uma
atividade consolidada desde que focada nos princípios que regem o setor.
Portanto, a relação que se pretende estabelecer entre a “refuncionalização” da
fronteira e as propostas integracionistas é que ambas são diretrizes a serem implementadas, a
fim de potencializar o modelo de funcionamento e porque não sugerir, de comportamento que
se instaurou nas fronteiras.
Dessa forma, são sugeridas propostas de aplicação viável na zona de fronteira Cáceres
– San Matías, bem como estabelecidos critérios de análise geográfica e jurídica. No caso de
eleição do critério geográfico, a ideia foi aliar a proposta às categorias geográficas de análise
discutidas no presente trabalho. No caso do critério jurídico, a intenção foi apresentar qual
ramo do Direito ou interpretação deve nortear a proposta, conforme exposto no Quadro 09, a
seguir:

QUADRO 09: Propostas integracionistas e seus critérios de análise

PROPOSTAS INTEGRACIONISTAS CRITÉRIO CRITÉRIO


GEOGRÁFICO JURÍDICO
A) A “turistificação” por meio de - Espaço
políticas públicas e privadas - Paisagem ---------------------------------
- Fronteira
B) Formulação de políticas - Fronteira - Normas de Direito Internacional
públicas, obedecidos os - Território para celebração de tratados
requisitos para acordos
bilaterais
C) Observância e aplicação dos - Direito Comparado
princípios constitucionais ---------------------------- -Princípios Constitucionais da
voltados ao turismo atividade turística
D) Adoção das Disciplinas - Aborda tanto as categorias geográficas de análise quanto
Geografia e Direito do Turismo interage com outros ramos do Direito (Internacional, Consumidor)
nas Universidades
E) Codificação do Direito do - Consolidação de legislação
Turismo ----------------------- esparsa
F) (Re) Leitura do conceito de - É a proposta que permite a sugestão e a consequência de todas
fronteira à luz do turismo das anteriores.
FONTE: Elaborado por PARIS, Marcela C. N., 2013.
100

Ora, é verdade que as propostas integracionistas acima delineadas precisam estar em


consonância com as pretensões políticas que vislumbrem o desenvolvimento fronteiriço, com
o tempo das populações locais e a promoção da atividade econômica do turismo. Além disso,
as mencionadas sugestões podem ser adequadas e propostas para outras zonas de fronteira.
Vale acrescentar que as sugestões apresentadas não extrapolam os critérios adotados,
ou seja, a falta de infraestrutura, a carência de pessoal qualificado e a melhora na oferta do
produto turístico não fazem parte da análise proposta, uma vez que penetraria em campo
estranho ao estudo inicialmente sugerido e comprometeria a linha de estudo perfilhada.
Ademais, uma análise minuciosa de todas as fronteiras que desenham a Rota Pantanal
Pacífico, suas implicações geográficas e jurídicas para favorecer a atividade econômica do
turismo demandaria um tempo excessivamente maior para pesquisa e estudo, razão pela qual
o cenário eleito se limitou a fronteira Cáceres – San Matías, o que não impede que futuros
trabalhos complementem ou agreguem valor a este estudo.
O que parece mais razoável é compreender e defender a fronteira como aproximação,
tendo o século XX marcado o início dessa porosidade. E, em última análise, compreender que
apesar desse conceito de área de conflito, as diferenças e divergências existentes na zona de
fronteira podem ser atrativas para o turismo e traduzidas inclusive como potencialidades
turísticas, visando o bem comum e uma finalidade social.
Por fim, é imperioso asseverar que o Mercosul trouxe regras facilitadoras, a fim de
propiciar maior integração entre os países da América do Sul. A desburocratização do direito
de ir e vir e o direito à liberdade, em sentido amplo, estão em consonância com a norma
insculpida no artigo 4º da Constituição Federal Brasileira de 1988 que rege o Brasil nas suas
relações internacionais e destaca como princípio integrador a ser perseguido a busca pela
integração econômica, política, social e cultural dos povos da América Latina, visando à
formação de uma comunidade latino-americana de nações.
Não se pode negar que a fronteira sofreu um processo de “refuncionalização” e esse
novo modelo de funcionamento permite não só a adoção de medidas integracionistas, como
também dá lugar ao diálogo interdisciplinar que aqui foi proposto. Ciências sociais distintas
podem conversar entre si e somar forças para promover avanços culturais, sociais, jurídicos,
econômicos e turísticos.
101

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Enquanto a ideia deste trabalho resumia-se ainda a um projeto de pesquisa, alguns


critérios foram estabelecidos para escolha do tema. O primeiro deles envolvia a busca por
uma temática de interesse regional, que funcionasse como subsídio para futuras pesquisas. O
segundo critério estava relacionado a uma fonte acessível de pesquisa, bem como tempo
disponível para debruçar sobre a leitura que exigiria, de certa forma, um certo grau de
domínio do assunto.
Ao se aproximar do fim da pesquisa, tornou-se factual que todo processo de
aprendizagem e investigação implica em descobrir e reinventar nossos próprios limites.
Organização, dedicação e humildade intelectual foram os grandes norteadores desta
dissertação de mestrado.
Considerando a escolha do tema e a delimitação da área de estudo – fronteira
Cáceres/Brasil e San Matias/Bolívia, a Geografia e o Direito forneceram o aporte teórico,
necessário e possibilitaram a delimitação dos caminhos por onde a pesquisa deveria
prosseguir, sem fugir da linha de conhecimento Desenvolvimento Regional.
Ao longo do estudo, algumas dificuldades se fizeram presentes. A partir da escolha da
Rota Pantanal Pacífico restou nítida a impossibilidade de estudar todas as zonas de fronteira
que permeiam a referida rota. A falta de tempo, as inúmeras legislações pátrias, os conflitos
particulares de cada país com seus vizinhos, bem como a diversidade cultural e social seriam
um obstáculo de difícil transposição em tempo tão curto. Era preciso então, eleger um país
que fizesse fronteira com o Brasil e integrasse a RPP.
Neste sentido, a escolha da Bolívia, dentre todos os países da Rota Pantanal Pacífico
se deu em razão da extensa faixa de fronteira que se configura entre os dois países, além de
abarcar mais de 50% (cinquenta por cento) de toda a proposta turística da RPP. Além disso, as
fragilidades e possibilidades que a Bolívia estabelece com o Brasil em termos de relações
internacionais é um convite ao estudo e a investigação.
Em decorrência disso, outra dificuldade pujante foi limitar a abordagem ao cenário
Cáceres – San Matías, uma vez que para focar uma lente tão próxima, ou seja, estabelecer um
recorte tão pontual foi preciso considerar a escala Brasil – Bolívia. E assim, em alguns
momentos, o estudo se fez com esse movimento flutuante, ora voltado para a escala macro,
ora inabalável em seu propósito de despojar a zona de fronteira, na escala local, Cáceres – San
Matías.
102

Com relação à pesquisa propriamente dita, a constatação primeira é que as fontes não
eram tão volumosas, mas exigiu uma garimpagem cautelosa sobre o tema. Se fez presente a
necessidade por aquisição de livros, a consulta a periódicos, a visita frequente à bibliotecas
universitárias, bem como uma pesquisa meticulosa pela internet que deu acesso a diversos
artigos científicos, teses e dissertações de mestrado, mas também exigiu diligência para não
dar crédito a materiais desprovidos de autoria e embasamento científico.
Estudar a fronteira sob a ótica geográfica não bastava, era preciso ir além e adotar a
atividade econômica que serviria de base de estudo, ocasião em que o turismo, ou melhor, a
atividade turística foi eleita, vez que está relacionada com as condições geográficas e o ir e vir
das pessoas que vivem na fronteira. E, incorpora ainda o valor paisagístico, cultural, territorial
e histórico, a fim de transformar-se em espaço de consumo a ser regulamentado pelo Direito.
Toda e qualquer relação prescinde de normatização legislativa. Não seria diferente na
fronteira. A particularidade desta porção territorial é a necessidade latente de harmonização
normativa, por envolver países distintos, com culturas e costumes diferentes.
A partir deste contexto, a pesquisa procurou apresentar as categorias geográficas
fundamentais para análise da fronteira. A importância do conceito de território, definição esta
que, historicamente, sempre foi alvo de disputas, inclusive nas relações internacionais entre
Brasil e Bolívia, no caso do Estado do Acre. Também foi criada uma tríplice dimensão de
análise da fronteira, amparada pelo tripé sujeito-Estado-Direito, vez que todos estes elementos
interagem diuturnamente na zona de fronteira, chocam-se e buscam integração, apesar de
muitas vezes não falarem a mesma língua.
Contudo, compreender as categorias geográficas e estabelecer uma tríplice dimensão
da fronteira não responderiam as indagações preliminares. Era preciso considerar a
globalização, a abertura de mercados, o fluxo de capitais e de pessoas, que buscam exercer o
seu direito de ir e vir. O Mercosul suavizou a burocracia na fronteira, mas a segurança sempre
foi a abordagem recorrente nos planos de governo e nas estratégias impostas à fronteira.
Em que pese a visão negativa da fronteira como espaço de contrabando, tráfico de
drogas, roubo e furto de veículos, a fronteira incorporou uma nova vertente, além daquela de
limite, de espaço de tensão, de área de conflito, conforme caminhou por séculos. A fronteira
passou a ser vista como possibilidade de contato e intercâmbio cultural, como possibilidade
de sobrevivência para aquele povo que vive, que atravessa a fronteira todos os dias, seja para
trabalhar, seja para cuidar da saúde, seja para levar o filho na escola.
A propósito, no decurso da pesquisa, ficou latente a relevância do objeto de estudo e a
necessidade de entender e estudar a fronteira de modo interdisciplinar, razão pela qual a
103

Geografia do Turismo e o Direito do Turismo ocuparam um capítulo de destaque, aonde foi


possível demonstrar a importância do Direito Internacional na regência das relações entre
Estados, a necessidade da harmonização de instrumentos legais a fim de fomentar o turismo
fronteiriço, viabilizando assim a valorização da paisagem turística e do espaço geográfico.
Um outro aspecto a se considerar é importante: a globalização que promulgou a
abertura de mercados, capitais e fluxo de pessoas nunca foi tão romântica. O que se vê é a
globalização da indiferença, especialmente, nas zonas de fronteira, onde os viventes se julgam
esquecidos e subjulgados, na maioria dos casos. Outro sinal do esquecimento é a
infraestrutura precária, com vias de acesso perigosas e desgastantes que afastam o turista e
evidenciam o abandono do setor público e privado.
Todos os levantamentos teóricos e experiências relatadas em viagens trouxeram à tona
também as limitações deste trabalho, quais sejam: a impossibilidade de abordagem de todos
os problemas constatados na zona fronteiriça de Cáceres-San Matias, as situações de conflito
que marcam as zonas de fronteira e a escassez de discussão em busca de alternativas por parte
dos governos locais e centrais e, ainda, a míngua de estudos fronteiriços diante da grandeza do
tema.
Apesar das questões negativas detectadas, o presente trabalho vislumbrou
possibilidades: (1) de adoção de medidas com vistas a impulsionar a cultura do encontro na
fronteira; (2) localmente, à adoção das disciplinas Direito do Turismo e Geografia do Turismo
nas universidades, como disciplinas obrigatórias previstas nas grades curriculares dos cursos
de Geografia, Direito e Turismo, por exemplo, uma vez que possuem objeto próprio e
relevância teórica e prática, além de desenvolver e estimular o estudo constante e integrado;
(3) adoção de medidas na e para a fronteira; (4) a necessidade de negociação permanente dos
países fronteiriços, a fim de criar políticas públicas que promovam e desenvolvam a fronteira;
(5) a valorização dos aspectos culturais, históricos, sociais e suas potencialidades turísticas.
Assim as atenções deixariam de estar voltadas somente para a questão da segurança pública,
como muito se fez no passado.
O estudo acerca da fronteira impõe também um certo ritmo e disciplina para a
pesquisa. Quer-se dizer que quando o tema abordado é a fronteira, diferentes ciências sociais
e humanas são inconscientemente chamadas para dar guarida aos argumentos. Em que pese às
relações internacionais estabelecidas e as pinceladas de política internacional, o estudo buscou
pautar-se em duas ciências essenciais: a Geografia e o Direito, numa abordagem
interdisciplinar e dialética.
104

Há, de fato, uma mudança de paradigma na concepção da fronteira. Elas não deixaram
de existir e, provavelmente, nunca deixarão. Sempre haverá um mecanismo de proteção,
submetido a novas ou velhas relações de poder. O que ocorre é um processo de (re) definição,
de (re) leitura da fronteira diante do rearranjo pelo qual o mundo passou com a dita
globalização. Certo é que as fronteiras ainda se apresentam frágeis, mas a consolidação de
uma rota turística com cooperação e atuação política bilateral poderia auxiliar no
desenvolvimento de territórios dito abandonados, além de permitir uma discussão acadêmica
salutar para a América do Sul, com a valorização humana e social.
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