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IGREJA
DE
JESUS
CRISTO
1
Dr. Reynaldo Purim. Ph. D.
CDD – 262
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APRESENTAÇÃO
Qual é a tarefa primordial da Igreja de Jesus Cristo? Varias
respostas têm sido dadas ao longo dos séculos a esta pergunta. Sem
sombra de dúvida, a expansão do Reino de Deus na face da terra
como resultado da propagação da vida e do ministério de Jesus
Cristo por parte dos seus seguidores é sempre a resposta mais
frequente. Essa propagação acontece como resultado da atuação do
Espírito Santo no coração e na mente dos crentes. A função do
Espírito, no dizer de Jesus, é de guiar os cristãos a "toda a verdade".
Á medida em que os que creram no Senhor Jesus Cristo começam a
compreender o significado da sua pessoa e da sua obra começa a
tomar corpo a Igreja de Jesus Cristo.
Glorificar a Jesus Cristo poderia ser apontado como a função
básica da Igreja. Mas, de acordo com a terminologia bíblica,
glorificar é sinônimo de revelar. É manifestando o que Jesus fez em
seu favor que os crentes revelam, ou glorificam, o seu nome na face
da terra. Assim, adoração e evangelização assumem conotações bem
próximas. A adoração da Igreja deve ser uma adoração consciente,
coerente e 1ógica (Romanos 12.1). Através dessa adoração, que
serve de base para sua proclamação, a Igreja está realmente
repetindo ao mundo o convite de Filipe a Natanael "vem e vê" (João
1.46). A vida da Igreja no mundo deve ser uma repetição desse
convite.
Ninguém melhor do que o Dr. Reynaldo Purim, pesquisador
experiente, durante longos anos, da verdade bíblica e teológica, para
escrever este livro sobre a Igreja de Jesus Cristo. De forma
resumida, mas profunda e substancial, o veterano obreiro nos
conduz os pensamentos no sentido de uma reflexão séria a respeito
da natureza e função da Igreja, lança as bases para uma eclesiologia
firmemente ancorada em o Novo Testamento.
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SUMÁRIO
Apresentação
Introdução
1. A Formação da Igreja
2. A Missão da Igreja
3. O Ideal Ético e Escatológico da Igreja
4. A Igreja Como Esfera da Atuação do Espírito Santo
5. A Igreja Como Intérprete Final de Todas as Coisas
6. A Igreja Como Apoio e Coluna da Verdade
7. A Glorificação de Deus na Igreja.
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INTRODUÇÃO
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A FORMAÇÃO DA IGREJA
As origens, ou o processo da formação da Igreja, a nosso
ver, ainda não tem merecido a devida atenção por parte dos
teólogos e dos mestres da História Eclesiástica. No entanto, sem
conhecermos as origens da Igreja, não podemos compreender
devidamente a sua natureza essencial, seu fundamento e a sua
obra. Aqui procuraremos focalizar apenas alguns rudimentos do
assunto, sem entrar em pormenores.
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5. A Igreja Como Corpo de Cristo
Para compreendermos a formação e o alcance do
significado maior da Igreja, não basta mostrarmos que ela é a
expressão visível do cristianismo. Isto não interpreta ainda, com
a devida ênfase, a sua relação ideal com Cristo. De acordo com o
ensino de Jesus e também de Paulo, a Igreja representa ainda a
identificação do próprio Cristo com aqueles que nele creem
como Salvador e Senhor. Em última análise, cristianismo é
Cristo no homem. Jesus disse: "Se alguém me amar, guardará
a minha palavra; e meu Pai o amará, e viremos a ele, e
faremos nele morada" (João 14.23). Quando Jesus falou,
dizendo: "Sobre esta pedra edificarei a minha igreja" (Mateus
16.18), expressou a ideia de sua identificação, como possuidor,
com a Igreja ou a coisa possuída. Falou da sua identificação com
a "minha Igreja" como fato que ainda estava por vir.
No seu livro A Glória de Deus na Vocação Cristã, o Dr.
Carver diz que a Igreja é a encarnação permanente de Cristo, ou
a sua crescente ou progressiva realização própria no processo de
alcançar as finalidades da sua encarnação quando, como Verbo
de Deus, se fez carne e habitou entre nós. É através da Igreja que
o próprio Cristo prossegue e leva a efeito a sua missão na
história. Na sua encarnação, o Cristo revelou-se na humanidade
como poder criador e redentor, missão esta que continua a levar
a efeito através da Igreja. É neste fato que está o caráter divino
da Igreja. Ela é divina não somente no seu estabelecimento ou
implantação na história; é divina também na sua continuação e
atuação como corpo de Cristo neste mundo e na subordinação a
ele como seu cabeça ou Senhor. Aqui está o significado supremo
da Igreja. Pertencer à Igreja, pois, não significa pertencer apenas
a uma instituição ou organização. Significa pertencer a Cristo,
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que está identificado, habitando na Igreja e operando nela e no
mundo, através dela. Pertencer à Igreja não é apenas ser membro
de uma comunidade humana de pessoas salvas, mas é ser
membro do corpo de Cristo ou do próprio Cristo, que continua
operando na história.
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A MISSÃO DA IGREJA
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Para orientar e julgar a conduta visível do crente individual
com relação a outro, porém, a autoridade máxima objetiva ou
social é a igreja local. Cabe a esta, para fins sociais, ligar ou
desligar o irmão que peca e fazer isto com a concordância mútua
dos membros e com oração. Cabe à igreja local não somente
admitir pessoas convertidas no seu meio, como também deve
exc1uir, no caso de haver conduta pecaminosa. A base para a
atuação da Igreja está na consciência cristã de cada membro seu,
como individuo. A ação prática ou externa desta consciência
individual, porém, depende da ação coletiva da igreja baseada
em duas ou três testemunhas. A decisão da igreja precisa basear-
se neste princípio, para cujo cumprimento Jesus prometeu a sua
presença. Os aspectos práticos da conduta cristã dependem não
somente de motivos espirituais, mas também da sua
compreensão racional; dependem da fé em Cristo e do amor para
com ele, como também do conhecimento do que Jesus ordenou.
Para exercer-se a conduta cristã, não basta haver fé em Cristo. É
preciso haver também uma compreensão racional. Dai o
mandamento de Jesus: "Fazei discípulos ... ensinando-os a
observar todas as coisas que eu vos tenho mandado" (Mateus
28.19,20). O ensino dos crentes é uma tarefa da igreja como
coletividade local. Nela todos os membros devem concorrer ou
cooperar para a sua edificação mútua. Foi em relação ao
cumprimento deste mandamento de fazer discípulos e de ensina-
los que Jesus prometeu aos seus apóstolos e a todos os crentes a
sua presença até a consumação dos séculos. A conduta cristã
depende de conhecimento; depende de o crente ser guiado em
toda a verdade; depende da atuação humana e da divina por
parte do Espírito Santo e da presença de Jesus Cristo. Nisto está
o poder dos crentes para atuarem como testemunhas e intérpretes
de Jesus Cristo. Como exemplo do cumprimento deste ensino e
mandamento de Jesus, temos a atuação dos seus apóstolos e dos
que se converteram no dia de Pentecostes e depois. Após serem
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batizados e agregados, os novos convertidos perseveraram na
doutrina dos apóstolos.
4. Preparo no Desenvolvimento e Ministérios Eclesiásticos
Locais
Reafirmamos aqui que as igrejas não se estabeleceram como
sistemas ou organizações com funções e cargos prescritos.
Essencialmente, uma igreja de Cristo não é um sistema ou
organização formal, mas uma coletividade espiritual.
Certamente, a igreja precisa ter e tem organizações. As relações
entre os seus constituintes e Cristo, porém, são vitais e se
exercem semelhantemente às relações que há entre os membros
de um corpo como organismo vivo. Escrevendo sobre a
constituição da Igreja, o apostolo Paulo diz: "Pois em um só
Espírito fomos todos nós batizados em um só corpo" (1
Coríntios 12.13). A organização formal não é uma finalidade em
si. Na Igreja, a forma não é o essencial. O essencial nela são as
atividades espirituais e vitais que nela funcionam como
expressões da própria vida.
Nas igrejas do Novo Testamento, as organizações e funções
surgiram da necessidade que tiveram de determinadas
atividades. Na igreja em Jerusalém, por exemplo, foram eleitos
diáconos só quando surgiu a necessidade de dividir o trabalho
devido ao crescimento do mesmo. A atividade em si era mais
importante do que o cargo formal ou a pessoa que o ocupasse. O
crescimento da igreja em Jerusalém exigia que fosse feita uma
distribuição de suas atividades para que o seu progresso não
sofresse. Não sabemos ao certo se o diaconato, que mais tarde
encontramos como cargo formal em algumas igrejas, realmente
teve a sua origem com a eleição em Jerusalém. Sabemos, no
entanto, que a eleição de diáconos se fez ali por necessidade do
momento.
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A princípio, todas as atividades da igreja em Jerusalém eram
exercidas ou presididas pelos apóstolos. Eles davam testemunho
da ressurreição de Jesus Cristo, da qual eram testemunhas
pessoais. Também ensinavam. Eram os únicos que tinham
estado com Jesus e que puderam ensinar aos novos convertidos a
vida e obra de Jesus. Por circunstâncias históricas, inicialmente
os apóstolos eram os primeiros e únicos que atuaram e que
podiam atuar na igreja em Jerusalém, que estava em formação.
A preparação dos apóstolos para esta tarefa tinha sido obra de
Deus Pai, de Jesus Cristo e do Espírito Santo. O trabalho todo da
nova comunidade a princípio estava ao seu cuidado. Em face do
crescimento da igreja e da impossibilidade dos apóstolos
sozinhos darem conta do trabalho, levaram a igreja a eleger
diáconos que servissem às mesas ou na vida material da
coletividade. Tal decisão de trabalho foi possível diante do
doutrinamento que tinha sido ministrado pelos apóstolos.
Mais tarde encontramos, nas igrejas do Novo Testamento,
também outras funções para se atender às necessidades do
trabalho que precisava ser feito. Na enumeração das categorias
de obreiros que encontramos nas igrejas do Novo Testamento,
parece que a sua ordem obedece a cronologia do aparecimento
na igreja, ou igrejas, de determinadas funções. Na igreja em
Antioquia, por exemplo, que se estabeleceu depois da igreja em
Jerusalém, havia "profetas e doutores", ou pregadores e
professores (Atos 13.1). As atividades principais exercidas ali
eram evangelização e ensino. Não aparece ali nenhuma
referência a "apóstolos" no sentido histórico do termo.
Escrevendo aos coríntios, porém, sobre o aparecimento histórico
das categorias de obreiros na igreja, Paulo menciona os
seguintes: apóstolos, profetas e doutores (I Coríntios 12.28). Na
Carta aos Efésios, em que Paulo apresenta uma interpretação
completa do desenvolvimento e significado da Igreja, ele
menciona como seus obreiros: apóstolos, profetas, evangelistas,
pastores e doutores (Efésios 4.11). Parece que foi nesta ordem
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crono1ógica que estas atividades e categorias de obreiros
surgiram nas igrejas. Paulo menciona em primeiro lugar os
apóstolos. Por circunstâncias históricas, como já vimos, estes
eram os primeiros. Depois surgiram outras categorias, uns como
obreiros itinerantes, outros como permanentes ou efetivos nas
igrejas. Na sua Carta aos Romanos (12.5-8) Paulo só se refere às
operações na igreja, sem mencionar obreiros. Vê-se que, no
começo do cristianismo histórico, não havia nas igrejas nenhuma
organização, cargos ou funções, formas preestabelecidas ou
oficiais como pré-requisitos para a sua existência e
funcionamento. O que nelas havia eram determinadas atividades
essenciais à sua vida e que eram exercidas pelas pessoas· mais
qualificadas pelo Espírito Santo que podiam ser encontradas
para este fim.
Na história do cristianismo insipiente, a forma ec1esiástica ou
governo da Igreja, ou igrejas, surgiu gradativamente e
paralelamente com o crescimento do próprio trabalho. As igrejas
do Novo Testamento, repita-se, eram comunidades locais. No
Novo Testamento não encontramos nenhuma igreja ou sistema
de igrejas organizado de caráter geral ou regional. Não
encontramos nenhum sistema acima da igreja local. A igreja em
Jerusalém, por exemplo, era local por circunstâncias históricas.
No início, naturalmente, era esta que orientava a expansão do
cristianismo, não só na cidade, como também fora dela. Vemos
como esta igreja, ou os apóstolos, que ali estiveram, atuaram
com relação ao estabelecimento ou reconhecimento do trabalho
em Samaria e na Judeia. Na história do cristianismo, até a altura
dos acontecimentos narrados em Atos 9.30, só aparece o termo
"igreja" no singular. Até esta altura da história parece que o
trabalho todo, na expansão do cristianismo, estava diretamente
relacionado com a igreja em Jerusalém.
O estabelecimento da igreja em Antioquia, porém, foi um
trabalho praticamente independente da ação da igreja em
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Jerusalém. O evangelho entrou em Antioquia por intermédio dos
crentes dispersos por perseguições havidas em Jerusalém. A
igreja em Jerusalém certamente enviou Barnabé para Antioquia
em comissão. Este, porém, não era apóstolo no sentido histórico
do termo; não era um dos doze. A sua atuação no
estabelecimento da igreja em Antioquia foi de caráter local e
independente da igreja em Jerusalém, que o havia enviado. A
igreja em Antioquia não se estabeleceu como se fosse
dependente ou ligada à igreja em Jerusalém. Pelo contrário, a
igreja em Antioquia surgiu unindo-se os crentes ao Senhor (Atos
11.24). Surgiu como comunidade independente de Jerusalém
subordinada diretamente e exclusivamente ao Senhor. Depois o
trabalho desta igreja continuou independente de Jerusalém.
Barnabé, todavia, que tinha visto o estabelecimento e
desenvolvimento da igreja em Jerusalém sob a orientação dos
apóstolos, seguiu o método deste na orientação do trabalho em
Antioquia. Tomou providências, por exemplo, para que os
crentes em Antioquia fossem doutrinados e para que a
evangelização se intensificasse. A igreja em Antioquia cresceu
como comunidade local e sob a orientação de duas categorias de
atividades e obreiros: profetas e doutores, todos completamente
dedicados à obra. Na igreja em Antioquia não se mencionam
apóstolos como se tivessem sido obreiros seus. Estes não
tiveram nenhuma atuação imediata ou oficial ali. A igreja em
Antioquia surgiu como congregação local, autônoma e soberana.
Mais tarde, pela sua consulta à igreja em Jerusalém sobre a
questão da lei mosaica, de modo algum ela colocou-se em plano
de inferioridade ou dependência.
Também as igrejas que surgiram depois como fruto do
trabalho missionário de Paulo e Barnabé eram comunidades
locais e autônomas, independentes da igreja em Antioquia, de
onde haviam saído os missionários. Eram igrejas compostas de
convertidos em suas localidades, doutrinados pelos missionários
e que, sob a orientação destes, haviam escolhido para si bispos
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ou pastores (Atos 14.23). Mais tarde, no Concílio de Jerusalém a
liberdade e autonomia destas igrejas não foram postas em dúvida
pelos apóstolos (Gálatas 2.4,5,9). Assim, vemos na história do
cristianismo do Novo Testamento que a natureza da sua obra
exigia que as igrejas que se estabeleceram fossem locais, tendo
seus próprios obreiros, organização e funcionamento. O
estabelecimento de igrejas locais, autônomas e soberanas foi a
expressão da natureza do próprio cristianismo como religião
espiritual ou pessoal e coletiva no funcionamento. O
cristianismo atua através de igrejas locais, para a evangelização
ou para fazer discípulos e para o doutrinamento destes
discípulos, para a sua edificação espiritual e prática.
5. Relações e Cooperação entre as Igrejas do Novo
Testamento
O presente tópico sobre as relações das igrejas dos tempos
apostólicos realmente devia ser apresentado por um especialista
em Eclesiologia ou em História Eclesiástica, e não por um quase
leigo na matéria. Estudar as relações que devem existir entre as
nossas igrejas à luz do Novo Testamento não é tarefa fácil. No
Novo Testamento não encontramos nenhuma eclesiologia formal
ou estabelecida que servisse de orientação. Nem tampouco
temos ali uma terminologia eclesiástica que nos ajudasse no
estudo.
Precisamos tratar aqui de relações entre igrejas no plural. O
Novo Testamento fala da Igreja e de igrejas, ponto este que
ainda pode parecer para nós um tanto obscuro. Nós, os batistas,
usamos o termo "igreja" no plural, como certamente o
encontramos no Novo Testamento. Os outros evangélicos
geralmente empregam o termo no singular. Também este
encontramos no Novo Testamento. Como é que vamos nos
orientar à luz do Novo Testamento, onde ambas as formas
ocorrem? Hoje em dia há muita discussão sobre a Igreja mesmo
entre os batistas. Para nossa orientação em matéria de relações
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entre igrejas, parece-nos o método acertado buscar descobrir as
relações que havia entre as igrejas daquele tempo.
Para o estudo deste tópico, precisamos buscar descobrir não
declarações formais ou doutrinárias, mas, sim, o exemplo e a
atuação prática das igrejas do tempo do Novo Testamento,
quando ainda não havia nenhuma organização ou relações
eclesiásticas estabelecidas pelo uso. Precisamos depender de
casos práticos e particulares quando ainda não havia praxes
como as que temos hoje em dia. Precisamos aprender dos
cristãos primitivos quando eles mesmos estavam dando os
primeiros passos na vida eclesiástica, não dependendo de
nenhuma doutrina já estabelecida, mas, sim, na base de
princípios inspirados pelo Espírito Santo, que estavam
motivando a sua vida cristã.
Para nós nos orientarmos hoje em dia na matéria de relações
entre igrejas na base do exemplo do Novo Testamento,
precisamos examinar a história do cristianismo insipiente, o
processo pelo qual se estabeleceu a Igreja cristã e como se
estabeleceram também as igrejas; precisamos procurar conhecer
a atuação e as relações que espontaneamente iam se
estabelecendo entre elas, relações estas que não surgiram na base
de alguma doutrina, mas que estavam sendo estabelecidas pelos
próprios cristãos, sob a direção do Espírito Santo. Precisamos
aprender daqueles crentes primitivos, assim como eles
aprenderam da direção divina. Nós aqui não podemos partir de
alguma doutrina já formulada. Antes precisamos formular
doutrinas, partindo estas da experiência e dos exemplos
históricos que encontramos no Novo Testamento. Este é, enfim,
o único caminho para estabelecermos uma doutrina adequada
sobre qualquer assunto pertencente à vida cristã. Devemos partir
da experiência ou dos exemplos, e não necessariamente de
qualquer doutrina formulada por terceiros.
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Para termos uma ideia das relações entre as nossas igrejas
hoje em dia, precisamos examinar como se estabeleceu a Igreja e
como se estabeleceram depois as igrejas (no plural) nos tempos
apostólicos, cuja história é relatada no Novo Testamento, ou
melhor, no livro de Atos. Vamos examinar aqui, portanto, a
história do cristianismo primitivo em Atos, dando atenção
especial a este aspecto particular de relações entre igrejas.
Certamente, não podemos estudar aqui a história do cristianismo
nos seus outros aspectos. Vamos examinar aqui, pois, o
desenvolvimento do cristianismo no livro de Atos com atenção
ao estabelecimento das igrejas e de relações que houve entre as
mesmas, processo este que, em última análise, constitui um
exemplo para nós hoje em dia e para todos os tempos. Vamos
notar primeiro como foi estabelecida a igreja em Jerusalém e
depois como foram estabelecidas as outras igrejas e em seguida
quais foram as relações entre elas.
a) O estabelecimento da igreja em Jerusalém.
O nosso assunto não exige nenhuma análise de como se
estabeleceu o cristianismo como a religião histórica ou a
primeira igreja cristã em Jerusalém. Para o nosso fim aqui, basta
mencionar que a igreja em Jerusalém teve o seu início no dia de
Pentecostes, como fruto da obra do Espírito Santo. Basta
mencionar que ela surgiu como comunidade espiritual. Depois
foi doutrinada e desenvolvida em organização e disciplina. Neste
seu processo de desenvolvimento, esta comunidade recebeu o
nome de "igreja". Os seus componentes, depois de doutrinados,
levaram o evangelho para outras partes quando foram dispersos
pelas perseguições. A princípio o cristianismo em Jerusalém era
uma só comunidade. Em Jerusalém havia uma só igreja. O
crescimento do cristianismo foi o crescimento desta igreja. A
esta iam sendo agregados todos os que iam se convertendo.
Nesta altura da história não havia outras igrejas. Isto continuou
assim por algum tempo.
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b) A expansão do cristianismo fora de Jerusalém.
O cristianismo passou a se propagar fora de Jerusalém como
resultado do trabalho dos crentes dispersos pelas perseguições.
Este foi o trabalho de leigos que tinham sido doutrinados e cujas
atividades já tinham aparecido também em Jerusalém, como, por
exemplo, de Estevão e outros. A expansão do cristianismo fora
de Jerusalém, como trabalho de leigos, estava sendo
supervisionada pela igreja em Jerusalém, ou pelos apóstolos.
Estes nunca vieram a ser dispersos pelas perseguições (Atos
8.1). A princípio a propagação do cristianismo fora de Jerusalém
estava relacionada com a igreja em Jerusalém ou sendo
acompanhada com seu interesse. Estava aos cuidados dos
apóstolos. Quando, por exemplo, os apóstolos ouviram da
pregação de Filipe em Samaria, enviaram Pedro e João para fins
de reconhecimento e de integração daquele trabalho de Filipe na
igreja em Jerusalém. O trabalho em Samaria ficou fazendo parte
da igreja em Jerusalém.
Também a entrada do evangelho para o meio dos gentios, que
se verificou no caso de Cornélio, em Cesaréia, foi uma extensão
do trabalho relacionado com a igreja em Jerusalém. Embora a
ida de Pedro à casa de Cornélio fosse da iniciativa divina, a
pregação ali foi testemunhada por um grupo de irmãos judaicos
vindo de Jope (Atos 11.12). O batismo na casa de Cornélio foi
feito com o consentimento silencioso dos fieis da circuncisão
(Atos 10.45). Depois, quando Pedro subiu a Jerusalém, os
apóstolos o chamaram para dar explicações e finalmente
admitiram que Deus tinha dado aos gentios o arrependimento
para a vida. Assim o trabalho feito na casa de Cornélio ficou
relacionado com a igreja em Jerusalém ou foi reconhecido por
ela. Até esta altura não havia ainda igrejas locais, a não ser a de
Jerusalém. Esta era a única. Era o trabalho desta que estava se
estendendo. A igreja em Jerusalém compreendia o cristianismo
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espalhado em toda a Judeia, Galiléia e Samaria. No tempo da
perseguição de Saulo, o que havia era "igreja" no singular, e não
"igrejas" (1 Coríntios 15.9; Gálatas 1.13). Até esta altura na
história do cristianismo ainda não havia lugar para o nosso
assunto sobre relações entre igrejas.
c) O estabelecimento da igreja em Antioquia.
Até esta altura da história, repetimos, só havia a igreja em
Jerusalém, com a qual estavam relacionados todos os cristãos,
tanto nessa cidade como também os dispersos em outros lugares.
Foi só com a entrada do evangelho em Antioquia da Síria que se
estabeleceu ali, vamos dizer, a segunda igreja neotestamentária.
O processo do seu estabelecimento é de suma importância para
nós, visto que estamos interessados nas relações entre as igrejas,
à luz do Novo Testamento. O evangelho entrou em Antioquia
pela atuação de crentes leigos dispersos, vindos de Jerusalém. O
estabelecimento da igreja foi, porém, orientado por Barnabé, que
tinha sido enviado pela igreja em Jerusalém, e não somente
pelos apóstolos (Atos 11.22), como o tinha sido o caso de Pedro
e João, que foram enviados a Samaria pelos apóstolos(Atos
8.14).
No estabelecimento da igreja em Antioquia, Barnabé seguiu o
exemplo e método que tinham sido postos em prática pelos
apóstolos em Jerusalém. Ao que parece, o estabelecimento da
igreja em Antioquia verificou-se num plano mais elevado do que
foi o da igreja em Jerusalém. Aqui, por exemplo, os novos
convertidos "agregaram-se" (Atos 2.41); em Antioquia os
crentes uniram-se "ao Senhor" (Atos 11.24). Constituiu-se ali
uma igreja autônoma. Barnabé não era apóstolo, um dos doze,
mas, no estabelecimento da igreja, fez um trabalho semelhante
ao dos doze apóstolos em Jerusalém. Providenciou, por
exemplo, para que os novos crentes em Antioquia fossem
doutrinados como o tinham sido os que se converteram em
Jerusalém no Pentecostes e depois. A igreja em Antioquia seguiu
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o método da igreja em Jerusalém, mas num plano mais
espiritual. No seu desenvolvimento não são mencionados sinais
e maravilhas como os que os apóstolos tinham feito em
Jerusalém. Em Antioquia os discípulos, pela primeira vez, foram
chamados "cristãos". Ali Cristo foi glorificado mais do que em
Jerusalém. O ponto de interesse para nós, no momento, é que o
estabelecimento desta nova igreja se fez nos moldes que os
apóstolos haviam seguido na igreja em Jerusalém.
d) O estabelecimento de mais outras igrejas.
Como resultado do desenvolvimento da igreja em Antioquia
veio o início formal do cumprimento da Grande Comissão de
Jesus no seu aspecto universal. Depois de doutrinada, aquela
igreja tornou-se, sob a direção do Espírito Santo, a primeira
agencia da obra missionária e concorreu para o estabelecimento
de mais outras igrejas como comunidades autônomas e
soberanas, e ligadas entre si pelos laços da fraternidade. Os
missionários que foram enviados pela igreja em Antioquia
saíram com o apoio desta para a sua primeira viagem
missionária, por exemplo, e organizaram outras igrejas como
comunidades locais, doutrinando-as e organizando-as e
estabelecendo nelas anciãos, por comum consentimento (Atos
14.23). Fizeram o trabalho como missionários de Antioquia,
trabalho este do qual depois deram relatório à igreja de onde
tinham sido enviados (Atos 14.27). É a missão suprema de uma
igreja cuidar que novas igrejas se estabeleçam. É o exemplo que
encontramos no Novo Testamento. Inicialmente, era a tarefa
empreendida deliberadamente só pela igreja em Antioquia.
Depois também outras igrejas, como a dos filipenses, por
exemplo (Filipenses 4.15,16), tomaram parte. O objetivo no
estabelecimento de uma igreja é que ela seja uma agência
missionária, tarefa esta que é obra cooperativa, pois é maior do
que os recursos de uma só igreja.
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e) À luz do exemplo prático do Novo Testamento, a
evangelização do mundo é o dever e ideal não só dos crentes
como indivíduos, mas também das igrejas como agremiações
locais. Vemos isto exemplificado na igreja em Jerusalém, cujo
trabalho se estendeu não somente naquela cidade, através dos
apóstolos, mas também pelas regiões ao redor através dos
crentes como indivíduos. Vemos isto exemplificado na igreja em
Antioquia, que por iniciativa deliberada enviou os seus melhores
obreiros a levar o evangelho para outras partes do mundo, com o
fim de estabelecer novas igrejas e centros de irradiação desse
mesmo evangelho.
As relações entre as igrejas do Novo Testamento começam
exatamente no fato de que cada igreja deve trabalhar para o
estabelecimento de outras igrejas como ela mesma foi
estabelecida. Cada igreja deve crescer, pois, através do
estabelecimento de novas igrejas que, por sua vez, venham a ser
centros para a propagação do evangelho, fazendo todas esta obra
em cooperação umas com as outras. Nos tempos apostólicos não
encontramos ainda organizações especializadas, como as nossas
convenções e juntas de missões, por exemplo, mas encontramos
o crescimento e expansão como o fruto da vida espiritual que
nelas havia. A primeira e principal relação das igrejas que
encontramos no Novo Testamento é a obra missionária, que é
não só a tarefa a ser feita pelas igrejas separadamente, mas
também em cooperação. É a primeira relação também que deve
unir as nossas igrejas.
f) Cooperação no estabelecimento de doutrinas ou na
solução de problemas de interpretação. Nos tempos
apostólicos, as igrejas cooperaram não só para fins
evangelísticos e missionários, mas também para a solução de
seus problemas de conduta cristã e para a interpretação
doutrinária do cristianismo. Além de crescerem numericamente,
as igrejas precisavam também definir-se doutrinariamente. As
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Escrituras Sagradas que as igrejas de então estavam usando eram
as do judaísmo - o Antigo Testamento. O cristianismo precisava
ser interpretado nos seus próprios termos em face do judaísmo,
por exemplo, do qual já se achava separado no terreno espiritual,
e cujas relações precisavam ser definidas formal ou
doutrinariamente.
A relação entre o cristianismo e a lei mosaica foi definida
formalmente no Concílio de Jerusalém. No terreno prático, já era
matéria vencida. O concílio nada modificou (Gálatas 2.6).
Resolver o problema formalmente, porém, foi uma tarefa que
não cabia apenas a uma igreja, mas a todas, ou ao menos as que
estavam na vanguarda da expansão do cristianismo. Embora
essencialmente já separadas do judaísmo, as igrejas precisaram,
para o fortalecimento dos seus laços de fraternidade e para a
resistência contra movimentos heréticos, de apoio moral mútuo
em matéria de doutrina e na desautorização de qualquer
movimento doutrinário herético. No Concílio de Jerusalém, este
apoio foi dado não somente na deliberação formal sobre a
doutrina, mas também no tratamento de "irmãos" por parte de
igreja para igreja (Atos 15.23), como também pelo envio de
obreiros como testemunhas pessoais da solução do problema
(Atos 15.25-27).
No Concílio de Jerusalém temos, pois, um exemplo de como
as igrejas devem cooperar na solução de conduta e de doutrinas.
As igrejas precisam cultivar e zelar pela unidade da fé. À luz das
igrejas do Novo Testamento não deve haver diferenças de
prática e doutrina entre as nossas igrejas. Embora sejam
congregações locais e autônomas, em matéria de fé/doutrina e
prática, as igrejas devem cultivar a unidade. Todas devem
obedecer a Cristo como seu cabeça e Senhor. A relação entre as
igrejas deve ser expressa como sendo um só "corpo" e um só
"espírito"; como um só Deus, uma só fé e um só batismo
(Efésios 4.4). Esta unidade de fé e prática precisa ser mantida e
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cultivada através de encontros de crentes e principalmente de
obreiros, como foi o caso de Antioquia e Jerusalém. E tarefa,
principalmente dos obreiros, zelar para que a evangelização não
seja prejudicada por divisões entre as igrejas em matéria de
doutrina e prática. No tempo do Novo Testamento as igrejas
eram responsáveis pelo que seus membros pregavam. A igreja
em Jerusalém, por exemplo, desautorizou os judaizantes que,
tendo saído dela, perturbaram a igreja em Antioquia. Uma igreja
não pode permitir que a unidade da fé seja perturbada por
elementos seus.
g) Entendimento quanto a campos de atividade. No
Concílio de Jerusalém ficaram também definidos os campos de
atividades externas das duas igrejas, de Jerusalém e de
Antioquia, e outras igrejas gentílicas. Ambas eram centros de
irradiação do evangelho. Cada uma teve suas preferências
naturais de nacionalidade. Conforme o que Paulo escreveu aos
gálatas (Gálatas 2.9), no Concílio de Jerusalém, ficou entendido
que ele e Barnabé trabalhassem entre os gentios; Pedro, Tiago e
João entre os judeus ou os da circuncisão. À luz deste exemplo,
há lugar para planejamento no trabalho da evangelização. As
igrejas nunca deviam criar problemas por causa de campos de
trabalho. A liberdade de cada um poder trabalhar onde quisesse
nunca devia prejudicar as relações de fraternidade entre as
igrejas.
h) Cooperação econômica para fins de beneficência.
Quando o cristianismo começou em Jerusalém, diz a Escritura
que não havia entre os crentes, necessitado algum (Atos 4.34).
Mais tarde, vemos que este mesmo espírito refletiu também nas
relações entre as igrejas do Novo Testamento. Depois que
cessou a comunidade de bens em Jerusalém, o livro de Atos
relata (11.27) a primeira cooperação econômica entre as igrejas
apostólicas. Foi quando o profeta Ágabo e outros visitaram a
igreja em Antioquia. Depois de ter sido doutrinada sob a direção
34
de Barnabé e Paulo, a igreja recebeu a visita destes profetas
vindos de Jerusalém. Ágabo predissera em Antioquia que viria
uma grande fome em todo o mundo ou Império Romano. Os
crentes da igreja em Antioquia, quando ouviram da situação dos
irmãos na Judeia, resolveram enviar, como de fato enviaram,
ajuda por intermédio de Barnabé e Paulo. Os irmãos em
Antioquia certamente tiveram conhecimento da comunidade de
bens que tinha havido em Jerusalém depois de Pentecostes,
quando ali entre os crentes não tinha havido necessitados.
Manifestaram a mesma atitude. Sentiram estarem unidos com os
irmãos da Judeia e também participaram das suas necessidades.
Fizeram o mesmo que tinha sido feito em Jerusalém, entre os
irmãos, para que entre eles não houvesse necessitados.
Contribuíram com o que estava ao seu alcance para as
necessidades dos irmãos na Judeia. Atuaram como possuidores
do mesmo sentimento de união e comunidade de bens que deve
haver entre os crentes como igrejas.
As outras atividades cooperativas dos crentes no terreno
econômico nos tempos apostólicos eram também relacionadas
com o mesmo socorro aos pobres na Judeia e com a obra
missionária. Em Gálatas 2.10, Paulo declara que, depois da sua
primeira viagem missionária e depois do Concílio em Jerusalém,
ele e Barnabé foram solicitados por Pedro, Tiago e João para
que, no seu ministério entre os gentios, se lembrassem dos
pobres. Paulo acrescenta também que se esforçou por fazê-lo.
Na segunda Carta de Paulo aos Coríntios, capítulos 6 a 9, vemos
como os macedônios cooperaram sacrificialmente para este fim.
Embora nos tempos apostólicos não houvesse instituições de
beneficência, havia, no entanto, o espírito e prática de
beneficência. Para socorrer os necessitados na Judeia, tomaram
parte, por exemplo, os macedônios e coríntios. Embora as igrejas
fossem locais e independentes, na necessidade sentiram-se
unidas como membros do mesmo corpo. As igrejas precisam
zelar pelos necessitados que são domésticos da fé, mesmo
35
quando estes sejam de outras igrejas (2 Coríntios 8.1,7). É o
espírito que deve caracterizar as relações entre as igrejas. Os
métodos não são prescritos, mas estão a cargo das próprias
igrejas.
i) Relações entre as igrejas na formação do ministério da
palavra. Na história das igrejas apostólicas, é interessante
observar nelas o desenvolvimento e o estabelecimento formal do
ministério da palavra. Certamente não podemos examinar aqui o
assunto em detalhes. Notemos apenas o seguinte: Na história do
livro dos Atos notamos que, inicialmente, a evangelização e o
doutrinamento dos convertidos era a tarefa que estava a cargo
dos obreiros. Em Jerusalém, por exemplo, e por circunstâncias, a
tarefa era dos apóstolos. Estes pregaram e ensinaram. Depois
também outros crentes, doutrinados pelos apóstolos, tornaram-se
obreiros, diáconos e pregadores. Os apóstolos acompanharam e
orientaram também o desenvolvimento do trabalho externo. O
reconhecimento de novos trabalhos e estabelecimento de novas
igrejas era a tarefa dos obreiros, apóstolos, profetas e outros.
Foi através dos obreiros que as igrejas de Jerusalém e
Antioquia vieram a estabelecer outras novas igrejas. Barnabé,
por exemplo, foi enviado de Jerusalém a Antioquia. Depois
Barnabé e Paulo foram enviados pela própria igreja em
Antioquia para a obra missionária. Foram estes obreiros que
orientaram a organização ou a eleição de bispos nas novas
igrejas. A escolha de pessoas para o ministério nos seus aspectos
humanos, conforme o exemplo do Novo Testamento era uma
tarefa principalmente a cargo dos obreiros, e não só das próprias
igrejas. Assim como Paulo e Barnabé, por comum
consentimento das igrejas (Atos 14.23), estabeleceram bispos
nas igrejas implantadas na sua primeira viagem missionária, por
exemplo, assim também, mais tarde, Paulo incumbiu Timóteo e
Tito para estabelecerem bispos nas igrejas de Éfeso e Creta,
respectivamente (1 Timóteo 1.3; Tito 1.5). No tempo do Novo
36
Testamento, a constituição do ministério não pertenceu
exclusivamente a uma igreja local, mas era uma tarefa
cooperativa das igrejas através dos seus obreiros. As instruções
quanto a qualificações de bispos, por exemplo, não foram dadas
a igrejas, mas, sim, a obreiros, que tiveram esta missão a
cumprir. A chamada para o ministério é obra de Deus; a
constituição de bispos em uma igreja é obra do Espírito Santo
(Atos 20.28). Se alguém deseja entrar no episcopado, então os
outros que já estão no ministério devem examinar as suas
qualificações. As igrejas do Novo Testamento cooperaram, para
este fim, umas com as outras, através dos seus obreiros. É
exemplo também para todos nós. O reconhecimento do
ministério era, portanto, um laço de união entre as igrejas do
Novo Testamento. Igrejas havia que dependiam de ajuda
espiritual de obreiros de fora e estes eram enviados por Paulo,
como, por exemplo, Timóteo, Tito e outros.
j) Relação entre as igrejas expressas pelo uso de cartas
de recomendação ou de apresentação. Elas podiam ser
favoráveis, como também desfavoráveis. Os judaizantes, por
exemplo, foram desautorizados pela carta do Concílio de
Jerusalém. Temos também outros exemplos de obreiros
recomendados favoravelmente, como, por exemplo, Febe
(Romanos 16.1) e Apolo (Atos 18.27). As igrejas do Novo
Testamento eram responsáveis umas perante as outras pelo que
seus membros, obreiros e conhecidos estavam fazendo. É
interessante observar, nas cartas de Paulo, o seu zelo pela
uniformidade de doutrina, ordem e disciplina nas igrejas.
Algumas das suas cartas eram, por exemplo, cartas circulares.
Os ensinamentos dados a uma igreja eram também para as outras
(1 Tessalonicenses 4.16). Escrevendo particularmente aos
coríntios, Paulo diz que determinadas recomendações dadas a
eles foram dadas também as outras igrejas. Ele diz: "É isso o
que ordeno em todas as igrejas" (1 Coríntios 7.17). Diz ainda:
"Não vos torneis causa de tropeço nem a judeus nem a gregos,
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nem a igreja de Deus" (1 Coríntios 10.32). Menciona a igreja
aqui no singular. Qualquer escândalo numa igreja é ofensa a
todas ou a Igreja de Deus em geral. Toda conduta irregular é
desprezo a Igreja de Deus (1 Coríntios 11.22). À luz do ensino
do Novo Testamento cada igreja deve zelar pela sua conduta,
pois esta atinge a todas, ou para o bem ou para o mal. À luz das
recomendações as igrejas do Novo Testamento, as igrejas de
hoje devem manter o espírito de fraternidade, unidade
doutrinária, disciplina, beneficência e cooperação ministerial.
3
O IDEAL ÉTICO E ESCATOLÓGICO
DA IGREJA
4
A IGREJA COMO ESFERA DA ATUAÇÃO DO
ESPÍRITO SANTO
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Não somente a igreja como comunidade local, mas também as
igrejas coletivamente constituem o campo de atuação do Espírito
Santo. Disto temos exemplo no Concílio de Jerusalém ou na
reunião de elementos das igrejas em Antioquia e em Jerusalém.
Embora poucas vezes apareça mencionado o Espírito Santo com
relação àquele concílio, está evidente que o que se fez ali foi
feito com a cooperação ou direção do Espírito Santo. Tanto a
própria ideia de se realizar aquele concílio foi obra do Espírito
Santo, como também o foi o seu resultado final. A solução do
problema doutrinário ali lançado foi o parecer do "Espírito
Santo" (Atos 15.28), embora não apareça nenhuma menção de
uma atuação específica. É através das igrejas e a sua cooperação
mútua que o Espírito Santo guia os crentes para a solução dos
seus problemas doutrinários. É através das igrejas que o Espírito
Santo leva a efeito a obra de Jesus Cristo na evangelização do
mundo. É ele quem guia os crentes em toda a verdade, através
do raciocínio coletivo baseado nas Escrituras Sagradas.
É nas igrejas como comunidades locais, ou por intermédio do
culto e da pregação que nelas se fazem, que o Espírito Santo fala
ao crente como indivíduo, interpretando para ele a revelação
dada por Cristo e por sua ordem escrita para ser lida nas igrejas.
O Espírito Santo não fala de si mesmo. Quando ele fala, fala de
Cristo. Guia o crente na compreensão da verdade que está em
Cristo como pessoa histórica e também glorificada. A Igreja é o
campo por excelência, onde o Espírito Santo glorifica a Cristo
nos crentes, interpretando a Escritura Sagrada, a qual, na
linguagem de Paulo, é a "espada do Espírito". Certamente, o
Espírito fala também ao crente como indivíduo, mas o campo e
o método por excelência e estabelecido de modo permanente
para a atuação do Espírito Santo é a igreja como coletividade
local. Daí a importância desta como lugar onde se lê e estuda a
Palavra de Deus e onde o Espírito Santo glorifica a Cristo como
Salvador e Senhor. Por esta razão, disse o próprio Cristo
glorificado a João: "Bem-aventurado aquele que lê e bem-
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aventurados os que ouvem as palavras desta profecia"
(Apocalipse 1.3). Para justificar a sua razão de ser e para
cumprir a sua missão, cada igreja precisa estar compenetrada de
que ela é esfera por excelência da operação do Espírito Santo
para aqueles que nela se reúnem. O crente não pode negligenciar
a sua igreja, a congregação, sem desprezar a Cristo e o Espírito
Santo. Grande é o privilegio em ser a Igreja de Jesus Cristo.
Grande é também a responsabilidade desta como esfera da
operação do Espírito Santo. É através da igreja como
congregação local que Cristo e o Espírito Santo falam através da
palavra de Deus escrita aos que nela se reúnem.
A IGREJA
COMO INTÉRPRETE FINAL DE TODAS AS COISAS
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Pastor Dr. Reynaldo Purim
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