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Bourdieu - Sociologia da Ciência (Sociologia Crítica)

O campo científico é o lugar, o espaço, de jogo de uma luta concorrencial.


O que está em jogo especificamente nessa luta é o monopólio da autoridade científica definida, ou
seja, a capacidade técnica e poder social; ou, se quisermos, o monopólio da competência científica,
compreendida enquanto capacidade de falar e de agir legitimamente (isto é, com autoridade),
que é socialmente outorgada a um agente determinado.

recordar que o próprio funcionamento do campo científico produz e supõe uma forma específica de
interesse

Assim, eles constituem em metodologia universal o quantitativismo, instaurando, como medida de


toda prática científica, o padrão mais favorável às suas capacidades intelectuais e institucionais

A luta pela autoridade científica, espécie particular de capital social que assegura um poder sobre os
mecanismos constitutivos do campo

luta em que cada um dos agentes deve engajar-se para impor o valor de seus produtos e de sua
própria autoridade de produtor legítimo, está sempre em jogo o poder de impor uma definição da
ciência que mais esteja de acordo com seus interesses específicos.

A definição mais apropriada será a que lhe permita ocupar legitimamente a posição
dominante e a que assegure, aos talentos científicos de que ele é detentor a título pessoal ou
institucional, a mais alta posição na hierarquia dos valores científicos

Existe assim, a cada momento, uma hierarquia social dos campos científicos − as disciplinas − que
orienta fortemente as práticas e, particularmente, as "escolhas" de "vocação".

O poder simbólico embuí agentes de legitimidade social e determina quais práticas serão aceitas ou
reprovadas no convívio social. O mesmo se aplica à comunidade de Estados e como autoridade e
poder são legitimados através de práticas ou de instituições

Juntos, os conceitos até agora apresentados trazem importantes implicações para as RI:
demonstram que as estruturas que regem as relações internacionais são amplamente
modificáveis pelos agentes e, portanto, não são a-históricas

É na tentativa de capturar essa complexidade de atores e percepções nas relações internacionais que
Bourdieu oferece subsídios interessantes. Onde se situaria, no entanto, o Estado nesta miríade de
campos e agentes? Bourdieu aponta que a gênese do Estado moderno é “inseparável do processo de
unificação dos diferentes campos sociais, econômico, cultural e político” principalmente pela
paulatina (quasi)monopolização da violência simbólica.

Neste sentido, os realistas foram bem-sucedidos na sua empreitada de poder, impondo os


instrumentos de conhecimento e de expressão sobre o internacional (taxonomias) de forma
arbitrária mas ignoradas como tal e definindo assim a realidade social
Aqui, podemos incluir o próprio fazer acadêmico como um vetor de poder simbólico. Teorizar as
relações internacionais é discernir os elementos constitutivos da ordem internacional e operá-
los para a obtenção de poder. Os neorealistas, por exemplo, criam uma teoria onde apenas alguns
atores contam, as grandes potências, e, portanto, o jogo internacional é limitado a estes players.

A gênese do realismo como um libelo da prudência contra o idealismo é nada mais que um mito
fundador

A idéia de colocar a necessidade de se pensar as RI com “prudência” como uma maneira de


evitar a catástrofe da guerra pode ser entendida como a grande tentativa de estampar uma
utilidade social às RI no seu momento de fundação.

Essa característica fica explícita em O homem, o estado e a guerra de Kenneth Waltz (2004) em
que, segundo o autor, o único caminho para a construção da paz é o entendimento da guerra. A
paz torna-se, par excellence, um binômio com a guerra. São por razões como esta que
determinadas obras continuam a ter um apelo quase irresistível e são despersonalizadas de seu
poder simbólico para serem elevadas a um nirvana do pensamento puramente filosófico, ou seja,
neutro

Bourdieu, na verdade, revela as contradições da ciência e da sua produção sem desbancar no abismo
pós-moderno da relatividade absoluta.

Podemos inferir que a gênese das RI, associada ao “Primeiro Debate” e À suposta vitória do
Realismo é um mito fundador necessário para que um novo campo do conhecimento se estruture.
As RI surgem como campo do conhecimento de vocação interdisciplinar, recebendo influências da
ciência política, da sociologia, da economia e do direito, mas precisava se auto-afirmar enquanto
ciência autônoma. Assim, estrutura-se uma autoridade científica capaz de definir o que é o campo
de RI e como se legitima um pensamento científico nessa área do conhecimento, assim como sua
suposta vocação dedicada à compreensão do fenômeno da guerra entre as grandes potências.

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