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22/02/2024, 14:46 Antônio Carlos Robert de Moraes, Geografia Histórica do Brasil

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Confins
Revue franco-brésilienne de géographie / Revista franco-brasilera de geografia

17 | 2013
Número 17
Resenhas

Antônio Carlos Robert de


Moraes, Geografia Histórica do
Brasil
São Paulo: Ed. Annablume,. 160 páginas

Arnoldo Lima
https://doi.org/10.4000/confins.8301

Référence(s) :
Antônio Carlos Robert Moraes, Geografia Histórica do Brasil: Capitalismo, território e periferia, São Paulo: Ed.
Annablume,. 160 p. ISBN 978-85-391-0215-0

Texte intégral

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1 Antônio Carlos Robert Moraes é professor titular do Departamento de Geografia da
Universidade de São Paulo. Também é um autor proeminente nas áreas de metodologia,
história da geografia e política territorial. Entre seus livros, destacam-se: Bases da
formação territorial do Brasil1; Território e História no Brasil2 e Ideologias
Geográficas3. Em Geografia Histórica: Capitalismo, território e periferia, Moraes
apresenta uma coletânea de textos produzidos em diferentes épocas e contextos de suas
pesquisas acadêmicas, que trazem como elemento comum o uso da Geografia Histórica

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como instrumental metodológico voltado a aprimorar a interpretação da dinâmica de
ocupação territorial e da análise do processo de desenvolvimento.
2 O seu ponto de partida são as peculiaridades de propagação do sistema capitalista e
de seus respectivos mecanismos na consolidação de formas particulares de uso,
ocupação e exploração do espaço geográfico. Sob essa perspectiva é que se
desenrolaram as diferentes “vias de desenvolvimento”, propulsionadas por
“espacialidades diferenciais” durante a estruturação territorial do mundo moderno.
3 O autor enfatiza que foi a dimensão espacial do território a conquistar, e conquistado,
durante o período colonial e pós-colonial, o elemento central na história de movimento
e funcionamento das sociedades na América Latina. A gênese das divisões espaciais
coloniais, baseada na distribuição dos recursos naturais e no posicionamento
geopolítico-estratégico, somadas à origem do colonizador e de suas estruturas
administrativas, teve um papel decisivo na diferenciação dos processos de
desenvolvimento latino-americano.
4 Um dos argumentos centrais do livro seria que as delimitações físicas e territoriais
impostas pelos impérios europeus nas áreas periféricas coloniais serviram ironicamente
como instrumento de referência para a gênese de uma identidade nacional. Ao criarem
“identidades territorializadas”, as potências coloniais abriram caminho para a
consolidação de sentimentos de emancipação que foram basilares na formação dos
Estados territoriais modernos. Especialmente nas vias de desenvolvimento no
continente americano, o conceito de território se firmou como lócus estruturante na
formação de identidade e da perspectiva de um estado soberano de direito. O território
foi, portanto, o primeiro referencial de afirmação da soberania no novo mundo.
5 O autor ressalta que o Brasil é um exemplo clássico dessa lógica de formação. A sua
base de estruturação não foi consolidada sob o conceito de nação, mas sim pela
prioridade de manutenção, consolidação e expansão de seu espaço territorial. Ou seja, a
ideia de formação do país esteve ligada muito mais ao valor de seu território do que à
sua unidade político-cultural. Sob essa lógica, por exemplo, se justificou a conquista e
dominação dos sertões, lugares vistos como não civilizados e que deveriam ser
incorporados pela conquista produtiva do solo.
6 Moraes ressalta que a ausência de elementos de unidade e de identidade realçados
pelo imenso mosaico de biomas, ecossistemas, povos e línguas distribuídos nesses
sertões realçou ainda mais a importância central da soberania e controle territorial. A
Coroa portuguesa e posteriormente o Império brasileiro buscaram incessantemente a
consolidação de “limites incertos em terras desconhecidas”, tendo por base a convicção
de seu direito dinástico na lógica de controle e expansão dominial.
7 Foi essa dimensão que deu origem à distinção entre “território usado” e “território”. O
primeiro, caracterizado por núcleos economicamente integrados e dotados de certa
estrutura produtiva, e o segundo, ligado ao conceito de direito sobre um espaço físico.
Logo, as áreas não integradas ou os ‘fundos territoriais’ deveriam ser parte de uma
missão moral e civilizatória, incorporados ao “corpo nacional”. O autor destaca que tal
ideologia legitimou a construção do país tendo por base a formação e consolidação de
suas fronteiras e de um forte aparelho de estado centralizador.
8 Moraes relata que mesmo com o processo de modernização, propagado
mundialmente no final do século XIX, não houve rompimento dessa lógica no Brasil.
Novamente foram favorecidas ações direcionadas a continuação de uma base ideológica
do espaço construído. Mesmo sob a égide de um novo governo republicano, foram
marginalizados os investimentos em saúde e educação em favorecimento de uma
política preocupada em eliminar os traços arcaicos e antigos por formas espaciais
modernas. A propagação de ferrovias, luz elétrica, máquinas, motores, estruturas e
sistemas de engenharia simplesmente serviram como um “aparelhamento do
território”.
9 O autor destaca que a própria criação do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
durante a Era Vargas cumpriu um papel decisivo de informação e dominação espacial.
Nessa fase, os valores de pertencimento e de consolidação de unidade nacional foram
realçados pela valorização do patrimônio nacional e natural. Segundo o autor, esse
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parece ao menos ter sido ao menos um pressuposto positivo que possibilitou a criação
dos primeiros parques nacionais de conservação e de normas de exploração das
riquezas naturais, como os códigos de mineração, de florestas e de águas.
10 Tal materialidade da construção do espaço, como elemento essencial de unidade
nacional, prosseguiu durante o Plano de Metas de JK, em que a ocupação do Brasil
central foi viabilizada pelas “próteses territoriais” materializadas, entre outras, pelas
cidades artificiais, rodovias e usinas hidrelétricas. O golpe militar de 1964 reforçou
ainda mais a visão territorialista e de planejamento territorial integrado, ampliada pela
ótica de doutrina de segurança nacional dos governos militares.
11 O autor deixa claro que foi equivocada a trajetória de “planos modernizantes”
centrados muito mais para os espaços físicos do que para seus atores sociais. Ele
sustenta que houve uma miopia em achar que as formas construídas induziriam a
sociabilidade. Apesar disso, Moraes ao final do livro critica a recente propagação de
uma nova corrente de análise geográfica baseada na tríade globalização, neoliberalismo
e pós-modernismo, a qual defende o esvaziamento da soberania dos Estados Nacionais
frente ao planejamento territorial.
12 Moraes é categórico ao afirmar que ainda cabe ao Estado o papel condutor básico na
articulação interinstitucional e na implementação de diretrizes de voltadas à gestão
territorial, especialmente para responder as demandas de responsabilidade
socioambiental. Ele vai além, afirmando que as próprias dimensões da sustentabilidade,
muito mais que objetivos vagos e abstratos, devem ser incorporadas como diretrizes
oficiais concretas na esfera de planejamento, como, por exemplo, na construção de
políticas, planos e programas de ordenamento e gestão territorial.
13 São convincentes os argumentos do autor quanto à relevância da geografia histórica
como campo totalizador da ciência geográfica. A coletânea de textos passa a impressão
de que a geografia histórica parece de fato possuir o instrumental mais apropriado para
dar conta da intrincada análise de movimentos, características econômicas, políticas e
culturais que se sobrepõem na produção do espaço. Muito embora alguns textos
pareçam repetir aspectos anteriormente explorados pelo autor, dando a sensação de
repetição dos argumentos, Geografia Histórica é um bom livro, mas o seu texto denso
não é recomendado para o público em geral, sendo mais apropriado para
pesquisadores, docentes e discentes da geografia bem como das demais ciências.

Notes
1 Moraes, A.C.R. Bases da formação territorial no Brasil, 1ª edição. Ed. Hucitec, 1999.
2 Moraes, A.C.R. Território e História no Brasil, 1ª. ed. São Paulo: Annablume / Hucitec, 2002. v.
1. 200p
3 Moraes, A.C.R. Ideologias Geográficas, 4ª. ed. São Paulo: Hucitec/Annablume, 2002. v. 1. 156p.

Pour citer cet article


Référence électronique
Arnoldo Lima, « Antônio Carlos Robert de Moraes, Geografia Histórica do Brasil », Confins [En
ligne], 17 | 2013, mis en ligne le 24 mars 2013, consulté le 22 février 2024. URL :
http://journals.openedition.org/confins/8301 ; DOI : https://doi.org/10.4000/confins.8301

Auteur
Arnoldo Lima
Geógrafo, mestre e doutorando no Centro de Desenvolvimento Sustentável da Universidade de
Brasília, arnoldosan@gmail.com

Droits d’auteur
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