Avaliação final da disciplina de “teoria política de Karl Marx”
Professor(a): Jorge Chaloub
DEFINIÇÕES DA REVOLUÇÃO COMO CONCEITO E REFLEXÕES MARXISTAS
SOBRE A CATEGORIA NO BRASIL
RIO DE JANEIRO, 2023
O Brasil foi produzido como estado-nação, da forma que conhecemos hoje, a partir de uma dominação que tornou o território lucrativo e passível de exploração por parte dos colonizadores europeus. Os fatos históricos envolvidos na produção do país estão apoiados em uma sanguinária conquista de um espaço já habitado, cuja população cuidava e se desenvolvia, sendo interrompidos por um impulso de dominação legitimado pela necessidade de levar a cultura civilizada aos povos bárbaros. Ao passo em que o país foi se modernizando, principalmente a partir da instalação da coroa portuguesa no Rio de Janeiro, a desigualdade tornou-se cada vez mais escancarada e ensurdecedora. A escravidão, como fenômeno social fundamental para entender as relações de trabalho, o racismo e a marginalização no Brasil, lançou raízes profundas na forma de conduzir a política e estabelecer funções sociais aos diversos tipos de habitantes brasileiros: uns, menos humanizados, poderiam ser explorados e massacrados para servir às elites; outros, acumulavam privilégios e usavam a força para legitimar a realidade social como correta e efetivar a vitória do colonialismo. A desobediência civil e a reivindicação a partir de críticas conjunturais se tornaram motivo de perseguição, tortura e extermínio: no Brasil, o silenciamento das camadas populares (que compõem a imensa maioria da classe trabalhadora do país) sempre se fez de forma implacável, a cultura europeia hegemônica foi capaz de queimar séculos de conhecimentos, tradições e povos que carregam em si aquilo de mais brasileiro, o processo civilizador se faz absoluto, sempre forçando os oprimidos a se conformarem com as estruturas. As estruturas político-sociais do Brasil estão historicamente pautadas na ordem imposta de cima à baixo, imperativamente instaurada, os detentores do poder político se apropriam das posições importantes do sistema e administram a manutenção da realidade social, impedindo modificações e tentativas de romper com o status quo. Em tal sentido, a história política brasileira se desenvolveu a partir de um esforço ativo, constante, de reprimir insurgências sociais e tentativas de desafiar os grupos conservadores e reacionários que impedem o progresso social. As classes oprimidas da população foram constante e repetidamente dispersas ao longo de suas mobilizações e contestações da estrutura social, a capacidade de desarticular os movimentos contrários por parte da elite política é crucial para interromper anseios por outro Brasil e a chama da revolução. Ao passo em que outros países passam por processos de enfrentamento entre colonizados e colonizadores, visando encerrar a injustiça através da ação política, o povo brasileiro é influenciado a se engajar e se tornar crítico, buscando uma organização revolucionária que possa efetivamente impactar o sistema. É nesse viés que Caio Prado Júnior, sociólogo e historiador brasileiro, situa a questão da necessidade de uma revolução brasileira: o Brasil dos anos 1960 se encontra em um momento que beira à transformação brusca em sua estrutura. Ao passo em que as aspirações da grande massa não são atendidas, os detentores do poder priorizam manter a ordem social e a tensão crescente se desenvolve. Desequilíbrios sociais inquietam a população e a possibilidade de conformidade popular são reduzidas drasticamente, a necessidade de traçar um objetivo a ser conquistado se estabelece nas esquerdas brasileiras. Caio Prado Júnior descreve duas definições de revolução: “emprego da força para a derrubada de um governo e tomada do poder” e uma segunda, tida como a revolução em seu sentido real e profundo, “transformação do regime político-social, processo histórico de reformas e modificações” (PRADO JÚNIOR, 2004). De certa forma, podemos compreender que a primeira definição com frequência abre portas para que a segunda definição tome forma na realidade social de um país, inclusive pois a elite política dominante não cede o poder de forma benevolente ou pacífica para os grupos antagônicos. De forma crítica às esquerdas brasileiras, Júnior descreve a tentativa de estabelecer um modelo previamente concebido de revolução, contraído de outro país e de outra conjuntura social, como algo impossível de ser efetivado, impraticável. Essa questão se expressa principalmente na postura panfletária da esquerda de teorizar uma revolução socialista de antemão, se espelhando em países com conjunturas e realidades históricas radicalmente diferentes, concebendo uma ideia de solução paralelamente aos fatos históricos da realidade. Neste sentido, o pensamento estaria abrindo mão do vislumbre da ação, o que significa que este projeto não considera os eventos e situações que estão em curso no Brasil. Fazendo uma leitura marxista, Caio Prado critica fortemente os comunistas brasileiros, que não se baseiam na teoria política de Marx para entender como a teoria da revolução brasileira deve ser desenvolvida, concebida e enfim praticada. No terreno da realidade social, o homem é sujeito passivo e ativo, o pensamento e a ação devem caminhar juntos para dar sequência ao que efetivamente acontece, se tornando fato histórico. Portanto, em uma ótica revolucionária ideal, Júnior aponta que a natureza da revolução só pode ser identificada depois da determinação de objetivos claros. Como estudioso da teoria política de Karl Marx, Caio Prado Júnior argumenta que as soluções para a revolução brasileira devem ser encontradas no processo histórico nacional, e que os comunistas preocupados em teorizar uma revolução socialista de antemão, sem objetivos fundamentais que a norteiam, não são verdadeiramente marxistas e acabam por sabotar a tentativa de mobilização social. Usando uma metáfora, podemos compreender que o revolucionário deve perseguir e analisar o que “acontece” em oposição ao que “é”, se atentando aos fenômenos pertencentes à conjuntura do Brasil para fundamentar o esforço teórico. O foco prioritário do revolucionário marxista é a reivindicação em questão, o objetivo a ser alcançado, objetivo esse que deve ser arduamente conquistado através da luta tendo em vista que reformismo com tendências socialistas são a contrapartida da narrativa política brasileira. O primeiro ponto a ser tratado na concepção de uma ação prática revolucionária é a estipulação de uma reivindicação central, sem motivações ocultas, que enriqueça a estratégia revolucionária e a direcione a um ponto comum. O que discerne um revolucionário qualquer de um revolucionário marxista é a capacidade de seguir até o fim aquilo que foi apontado como objetivo, inclusive se aliando a diferentes grupos visando a concretização desse fim. Segundo o autor, “Qualquer greve - e isso se pode e deve generalizar para os demais incidentes da luta revolucionária, seja qual for sua fase, etapa ou momento - tem uma significação própria e em si.” (JÚNIOR, 2004), o que torna descartável a necessidade de conceber um sentido ideológico prévio à revolução, que pode ser pensado em momentos posteriores. A dialética marxista dos fatos históricos aplica a ideia de que os comunistas focarão no incidente em curso, na conjuntura presente, e nos objetivos que emergem desta realidade, para dar continuidade à uma revolução embasada. A crítica de Júnior à teorização brasileira da revolução está fundamentada na ignorante necessidade de presumir um espectro ideológico às revoluções (sejam estas burguesas, socialistas e etc.), tentando ajustar a institucionalidade pública à modelos estrangeiros impossíveis de serem transpostos, negando a necessidade de se adaptar à conjuntura. A esquerda brasileira se encontra enfraquecida, de acordo com Júnior, por uma incapacidade de acatar objetivos e priorizar a ação em curso, acabou sendo iludida diversas vezes ao se aliar com quadros políticos demagógicos, que ocultam seus interesses em prol da manutenção das estruturas sociais e do status quo. O autor aponta a necessidade de recorrer à dialética marxista como possibilidade de efetivar o instinto revolucionário dentro do que o Brasil dispõe, podendo mirar suas questões pendentes. O método dialético marxista busca interpretar a realidade social e extrair dela as demandas, objetivos, soluções e possibilidades existentes, de forma que a continuidade dos fatos históricos ensine aos revolucionários as alternativas em campo. A ação política revolucionária, munida de embasamento teórico, tem poder de fazer uma leitura política da conjuntura que viabilize seus anseios, considerando que o momento presente é também resultante de processos passados, e admitindo a ação prática revolucionária como possibilidade de transformação da realidade histórico-social.
Referências bibliográficas: PRADO JUNIOR, Caio. A Revolução Brasileira. Brasiliense, 2004, cap. 1 (A Revolução Brasileira) e cap. 7 (A Revolução e o Anti-imperialismo).
A Confederação Nagô-Macamba-Malunga dos Abolicionistas: O Movimento Social Abolicionista no Rio de Janeiro e as Ações Políticas de Libertos e Intelectuais Negros na Construção de um Projeto de Nação Para o Pós-Abolição no Brasil
BERG, Isabela - O Ambiente Dos Monumentos, A Paisagem Dos Ambientes Uma Leitura Do Pensamento e Da Prática de Gustavo Giovannoni Na Tutela de Sítios de Valor Patrimonial