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Ilegitimidade

em Agrobom

Metodologia do Trabalho João Barbosa 112083


Historiográfico Igor Ferreira 110913
Pedro Esteves 112090
Prof. Paulo Teodoro de Matos
HMC-A1
João Barbosa 112083
Igor Ferreira 110913
Pedro Esteves 112090

Ilegitimidade em Agrobom (1829-1860)

Trabalho escrito de conclusão da unidade curricular, do segundo semestre do


primeiro ano da Licenciatura de História Moderna e Contemporânea de
Metodologia do Trabalho Historiográfico, orientada pelo
Prof. Dr. Paulo Teodoro de Matos.

Prof. Dr. Paulo Teodoro de Matos


Lisboa
2022/2023

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“Se fosse possível descobrir o primeiro e verdadeiro germe de todos os afetos
elevados e de todas as ações honestas e generosas de que nos orgulhamos,
encontrá-lo-íamos quase sempre no coração da nossa mãe.”

DE AMICIS,Edmondo. La vita militare: bozzetti. Firenze, Successori Le Monnier, 1869.

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Índice

Introdução ................................................................................................................. 5
I. Definições e conceitos ....................................................................................... 6
i. Mães-solteiras e filhos (i)legítimos ................................................................ 6
ii. Expostos ......................................................................................................... 8
II. Assentos de batismo .......................................................................................... 9
III. Contagem dos casos ..................................................................................... 11
i. Ilegitimidade Europeia Comparada .............................................................. 11
ii. Número de filhos por mulher ....................................................................... 13
IV. Análise dos assentos ..................................................................................... 15
i. Anna Maria e Luisa Moreiros ...................................................................... 15
ii. Maria, Rita e Marta Pinto ............................................................................. 15
iii. O caso de Anna Joaquina ............................................................................. 16
Conclusão ............................................................................................................... 17
Bibliografia ............................................................................................................. 18

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Introdução

O nosso trabalho insere-se no tópico da Ilegi5midade na Freguesia em Agrobom, Situada no


município de Alfândega da Fé, Bragança, no período de 1829 a 1860. Através da leitura dos
registos paroquiais da época, procurámos iden5ficar, os casos de nascimentos ocorridos fora do
casamento.

O obje5vo da nossa pesquisa era descobrir o número de nacimentos ilegí5mos que aconteceram
na freguesia de Agrobom nesse período, e tentar iden5ficar um padrão nesses casos.

Entramos também em mais detalhe nas caracterís5cas específicas dos casos mais relevantes,
assim como nos casos específicos numa perspe5va comparada.

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I. Definições e conceitos
i. Mães-solteiras e filhos (i)legítimos

Atualmente a designação de mãe solteira ou de filho ilegítimo não é juridicamente válida.


No passado europeu, moldado pelos ditames da religião em todos os aspetos do quotidiano,
prevalecia um discurso sexual rígido e centrado em torno do matrimónio. Por isso, a doutrina
católica acompanhada e vigiada pelos mecanismos comunitários, condenava severamente toda a
atividade sexual não conjugal. A vida das mães solteiras era bastante desafiadora devido às normas
sociais e culturais da época. A sociedade geralmente desaprovava a maternidade fora do
casamento, e as mães solteiras enfrentavam estigma, deficiência e dificuldades adicionais.
A maternidade fora do casamento era vista como um desvio moral e socialmente
inaceitável. As mães solteiras frequentemente eram marginalizadas, excluídas e enfrentavam o
preconceito da comunidade.
As opções disponíveis para as mães solteiras no eram limitadas. Alguns procuravam a
ajuda de familiares, enquanto outros recorriam a instituições de caridade ou abrigos para mães
solteiras. Algumas mulheres optavam por entregar os seus filhos para adoção, pois acreditavam
que seria difícil criar uma criança sozinha. Os filhos legítimos eram aqueles nascidos dentro do
casamento, ou seja, quando os pais eram legalmente casados. Eles eram reconhecidos como
herdeiros legais, tinham direitos de sucessão garantidos e, em geral, eram considerados membros
legítimos da família.
A conceção de "filhos ilegítimos" era baseada nas leis e normas sociais da época. Em
muitas sociedades ocidentais, a permissão de uma criança estava diretamente relacionada ao estado
civil dos pais, especialmente ao casamento, uma criança era considerada ilegítima se os seus pais
não fossem casados no momento do nascimento. Os filhos de pais solteiros eram frequentemente
rotulados como "ilegítimos" e, em algumas culturas, enfrentavam a exclusão e a estigmatização.
No entanto, é importante destacar que as atitudes em relação aos filhos ilegítimos variavam
entre diferentes culturas e regiões. Em algumas comunidades, as famílias forçadas assumem a
responsabilidade pelas crianças ilegítimas, enquanto em outras ocorria uma rejeição mais
acentuada.

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No contexto jurídico, havia diferenças significativas entre os direitos e obrigações dos
filhos legítimos e ilegítimos. Os filhos legítimos tinham direito a herdar a propriedade da família,
enquanto os filhos ilegítimos geralmente não tinham direitos de herança.

“Mothers Darling”; Jan Frederik Pieter Portielje; 1870

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Definições e conceitos
ii. Expostos

Os filhos expostos eram “filhos de ninguém”.


Muitas vezes eram filhos de raparigas pobres, ou fruto de relações proibidas, ou mesmo
crianças encontradas por eremitas que os recolhiam e as educavam, mas mesmo assim, muitas
mães deixavam algumas marcas identificativas, a fim de futuramente os puderem reencontrar.
Em função disso, a Santa Casa da Misericórdia, em diversos locais no país, estabeleceu
rodas para o recolhimento de expostos. Antes disto, porém, ou nos locais em que não havia
rodas, a exposição dos filhos era praticada nas casas particulares. Para o estudo da exposição
particular, dispõem-se, normalmente, de informações constadas em documentação serial, como
por exemplo registos paroquiais, listas nominativas e/ou testamentos.

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II. Assentos de batismo
Os registos paroquiais são livros nos quais o pároco, ou o seu representante, regista os
acontecimentos na paróquia. Em particular, os registos paroquiais registam os nascimentos, através
dos batismos, os óbitos, casamentos e as comunhões. Ou seja, os registos paroquiais servem para
a administração dos sacramentos numa determinada paróquia.

A obrigatoriedade de compilar e preservar estes registos deriva do Concílio de Trento


(1545-1563), pois após o seu fim, ficou estabelecido que os párocos teriam de registar os batismos,
os casamentos e os óbitos dos seus paroquianos, destinados a uso particular. Isto está referido no
próprio Código de Direito Canônico- conjunto de normas jurídicas que regulam a organização da
Igreja Católica Romana, a hierarquia da mesma, os direitos e obrigações dos fiéis e os sacramentos
e sanções de contravenções das mesmas normas.

“Cân. 535 — § 1. Em cada paróquia haja os livros paroquiais, a saber: o livro dos baptismos, dos
matrimónios, dos óbitos e outros, de acordo com as determinações da Conferência episcopal ou do Bispo
diocesano; procure o pároco que estes mesmos livros sejam cuidadosamente preenchidos e diligentemente
guardados. § 2. No livro dos baptismos, averbem-se também a confirmação e aquelas circunstâncias que
acompanham o estado canónico dos fiéis, em razão do matrimónio, salvaguardado o prescrito no cân. 1133,
em razão da adopção, bem como a recepção de ordens sacras, a profissão perpétua emitida num instituto
religioso e ainda a mudança de rito; e refiram-se sempre estes averbamentos nas certidões do baptismo”
(Conferência Episcopal Portuguesa, Lisboa, 1983).

Um assento de batismo consiste na informação escrita pelo pároco nos livros de registos
paroquiais. No caso de Agrobom, a informação constada nos assentos consistia:

Filhos Legítimos

1. Data do batismo 5. Filho/a legitimo/a de … (nome dos


2. Local do batismo pais e sua freguesia)
3. Nome e função dentro da Igreja 6. Avós paternos e sua freguesia
Católica (abade, padre, etc.) 7. Avós maternos e sua freguesia
4. Nome do batizado/a 8. Padrinhos e sua freguesia
9. Assinatura do abade.

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Filhos Ilegítimos

1. Data do batismo 5. Filho/a natural de … (nome da mãe e


2. Local do batismo sua freguesia)
3. Nome e função dentro da Igreja 6. Avós maternos e sua freguesia
Católica (abade, padre, etc.) 7. Padrinhos e sua freguesia
4. Nome do batizado/a 8. Assinatura do abade.

Expostos

1. Data do batismo 4. Padrinhos e sua freguesia


2. Local do batismo 5. Assinatura do abade.
3. Nome da criança exposta

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III. Contagem dos casos
Após a leitura de todas os registos paroquiais de nacimentos em Agrobom entre as datas 1829 a
1860, foram contabilizados um total de 324 nascimentos, sendo 274 filhos legítimos, 31 filhos
ilegítimos e 19 expostos.

Tabela 1- Contagem dos assentos de baEsmo por décadas em Agrobom (1829-1860).

Anos Legítimos Ilegítimos Expostos Total

1829-1830 20 1 1 22
1831-1840 83 13 9 105

1841-1850 95 9 5 109

1851-1860 76 8 4 88
Total 274 31 19 324

Fonte: Arquivo Distrital de Bragança, 2011

i. Ilegitimidade Europeia Comparada


Esta afirmação leva a que a percentagem de filhos legítimos seja bem maior (84%), em relação
com os ilegítimos (10%) e os expostos (6%), mas, se esta constatação for considerada a nível
europeu, em nota-se, com esta análise, que a quantidade de filhos ilegítimos em Agrobom é
bastante significativa, em relação ao resto da Europa do século XIX.

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Gráfico 1- Percentagem de filhos legítimos, ilegítimos e expostos em Agrobom (1829-1860)

19; 6%
31; 10%

271; 84%

Legitimos Ilegitimos Expostos

Fonte: Arquivo Distrital de Bragança, 2011

De acordo com o livro The Making of the Modern Family (1975), do historiador Edward Shorter,
nos séculos XVIII e XIX, a ilegitimidade na Europa atingia taxas de ilegitimidade, desde 1% a
4%. Estes números são significativamente mais baixos do que a percentagem de ilegítimos que
encontrámos, que equivale a 6%. Esta diferença faz com que surjam novas questões sobre o caso
da ilegitimidade em Portugal. Claro que a comparação das taxas de ilegitimidade não é
completamente conclusiva, uma vez que estamos a comparar o continente europeu inteiro com
apenas uma pequena freguesia em Portugal.

No entanto, se considerarmos a taxa de ilegítimos em Agrobom como um valor de referência para


o resto do território português, surge então uma questão nova: “Porque é que a taxa de filhos
ilegítimos em Portugal é maior do que a do resto da Europa?”. Este estudo suscitou a curiosidade
sobre o número de ilegítimos nas outras freguesias de Portugal. Só após essa pesquisa é que
poderemos afirmar nitidamente se Portugal tinha, de facto, um número mais elevado de
nascimentos fora do casamento em relação à Europa.

No entanto, podemos de facto afirmar, com os resultados retirados do nosso estudo, que, em
comparação, a ilegitimidade em Agrobom era mais elevada que o resto da Europa em meados do
século XIX.

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ii. Número de filhos por mulher
Neste breve ponto identificamos o número de filhos ilegítimos por mãe. Identificamos três grupos:
mulheres com um filho, mulheres com dois filhos e mulheres com três filhos.

Gráfico 2- Número de filhos ilegítimos por mulher em Agrobom (1829-1860)

3 filhos 5

2 filhos 4

1 filho 22

0 5 10 15 20 25

Nº de filhos por mulher

Fonte: Arquivo Distrital de Bragança, 2011

Na totalidade dos casos ilegítimos, nunca houve mais de três filhos por mulher. Há, precisamente,
cinco casos de mulheres com três filhos: Thereza Ferreirinho, Ana Joaquina, Maria Jozé,
Leocadia Maria Barroso e Maria Joana.

• Thereza Ferreirinho teve o seu primeiro filho em 1853, o segundo em 1857 e o terceiro em
1858.
• Ana Joaquina teve o seu primeiro filho em 1854, o segundo em 1858 e o terceiro em 1860.
• Maria Jozé teve o seu primeiro filho em 1846, o segundo em 1847 e o terceiro em 1848.
• Leocadia Maria Barroso teve o seu primeiro filho em 1840, o segundo em 1842 e o terceiro
em 1850.
• Maria Joana teve o seu primeiro filho em 1834, o segundo em 1839 e o terceiro em 1850

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Quanto às mulheres com 2 filhos, encontrámos 4 casos: Maria Chaves, Anna Valles, Rita Pinto e
Esperança Maria.

• Maria Chaves teve o primeiro filho em 1855 e o segundo em 1857.


• Anna Valles teve o primeiro filho em 1835 e o segundo em 1839.
• Rita Pinto teve o primeiro filho em 1832 e o segundo em 1833.
• Esperança Maria teve o o primeiro filho em 1831 e o segundo em 1834.

Nos casos restantes, cada mulher teve apenas um filho.

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IV. Análise dos assentos
Após a análise dos 324 casos de filhos legítimos, ilegítimos e expostos, considerámos que
apresentar os 31 casos de filhos ilegítimos, seria extremamente cansativo para o leitor, uma vez
que muitos dos casos, são mais simples e com pouca singularidade. Com isto, irão ser apresentados
os três casos, que na opinião do grupo, são os mais inusitados e que poderão ou não, traçar uma
linhagem familiar.

i. Anna Maria e Luisa Moreiros


Na análise dos assentos de batismo do ano de 1831, encontrámos o caso de Thomasia Francisca,
filha natural de Luisa Moreiros, tendo os avós maternos Francisco Moreiros e Maria Rega e,
também no mesmo ano, o caso de Alexandrina Francisca, filha natural de Anna Maria Moreiros
e tendo também, os avós maternos Francisco Moreiros e Maria Rega. Aqui encontrámos o caso
de duas irmãs que são mães solteiras da freguesia de Agrobom. O último caso encontrado destas
duas irmãs, no período analisado, foi em 1834, no assento de batismo de Pantalião, filho natural
de Anna Maria, mas esta agora descrita como mãe viúva.

ii. Maria, Rita e Marta Pinto


Na continuação da análise dos assentos de 1832, encontrámos o caso de Joze Joaquim, filho natural
de Rita Pinto e que tinha uma avó materna, Maria Pinto, também mãe solteira. Achámos este caso
curioso e investimos na investigação desta família, sendo que, no ano seguinte, em 1833,
encontrámos o assento de Joze Luis, outro filho natural de Rita Pinto, o que levou à consideração
de ser um caso isolado de mãe e avó solteiras. Em 1838, detetámos o caso de João Evangelista,
filho natural de Martha Pinto, com avó materna também Maria Pinto. Podemos concluir deste caso
que Maria Pinto, foi mãe solteira de duas filhas, Rita e Martha, que por sua vez, eram também
mães-solteiras, criando assim uma ideia geracional de mãe para filhas.

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iii. O caso de Anna Joaquina
O último caso que irá ser abordado, será o mais extenso, pois criou uma rede de relações familiares
um pouco peculiar. Após a pesquisa inicial que iria até 1850, foi requisitado por parte do professor
orientador que alargássemos o período de análise por mais 10 anos, sendo assim, até 1860. Com
isto, na análise dos assentos de 1853, encontrámos o caso de Fábio, filho natural de Umbelina Sá,
mãe solteira, tendo os avós maternos Joze António de Sá, da freguesia de Castro Vicente, e Maria
Bernarda. Em 1854, encontrámos o assento de Albino dos Santos, filho natural de Anna Joaquina
e com avós paternos Joze António de Sá e Maria Bernarda, ou seja, Anna Joaquina era cunhada de
Umbelina de Sá. Em 1858 e 1860, analisámos os assentos de batismo de Acácio Augusto e João
Agnnibal, ambos filhos naturais de Anna Joaquina e com avós maternos João Malheiro e Maria do
Carmo, o que para nossa surpresa, estes foram legitimados a 22 de maio de 1864, como filhos de
João António Augusto, da freguesia de Agrobom. Isto leva-nos a acreditar que João António
Augusto é pai de Acácio, Albino e de João, sendo que apenas dois foram legitimados, e filho de
Joze António de Sá e de Maria Bernarda, o que nos motivou a reconstruir uma provável “árvore
genealógica”.

Figura 1- Provável “árvore genealógica” de Anna Joaquina (1853-1860).

Fonte: Arquivo Distrital de Bragança, 2011

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Conclusão
Em primeiro lugar, identificamos que a ilegitimidade enfrentada pelas mães solteiras surge, muitas
vezes, de construções sociais e preconceitos arraigados. A pressão social e o julgamento moral em
torno da maternidade fora do casamento têm consequências negativas, tanto para as próprias
mulheres quanto para os seus filhos. Essa visão estigmatizante contribui para a exclusão e para a
falta de apoio institucional e social enfrentada por essas famílias.

Além disso, evidenciamos que a ilegitimidade vivenciada pelas mães solteiras está relacionada à
falta de reconhecimento dos seus direitos e à limitação de acesso a recursos e oportunidades. A
ausência de políticas públicas adequadas para apoiar essas mulheres no exercício da maternidade
e para garantir o pleno desenvolvimento dos seus filhos contribui para a perpetuação de
desigualdades e vulnerabilidades.

No geral, este trabalho foi interessante e desafiador, analisar os vários casos que encontramos nas
fontes primárias e toda a pós analise e descobrir a relação entre os vários casos.

Teve como ponto negativo talvez as fontes que não eram tão percetíveis, já como pontos positivos
analisar o número de filhos por mãe e a ilegitimidade em comparação com a média europeia e
descobrir a relação entre as várias estatísticas.

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Bibliografia
• Porto Editora – Roda dos enjeitados na Infopédia [em linha]. Porto: Porto Editora. [consult.
2023-04-28 19:48:12]. Disponível em https://www.infopedia.pt/$roda-dos-enjeitados
• MATOS, Paulo Lopes. O nascimento fora do matrimónio na Freguesia da Ribeira Seca da
Ilha de São Jorge (Açores): 1800-1910. Núcleo de Estudos de População e Sociedade (NESP)
Universidade do Minho – Instituto de Ciências Sociais, Guimarães, 2007
• LASLETT, Peter and OOSTERVEEN, Karla. Long-Term Trends in Bastardy in England: A
Study of the Illegitimacy Figures in the Parish Registers and in the Reports of the Registrar
General, 1561-1960. Population Studies, Vol. 27, No. 2 (1973), pp. 255-286 (32 pages), Taylor
& Francis, Ltd.
• SHORTER, Edward, The Making of The Modern Family, 1975

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